Petição inicial de ação indenizatória contra o Estado de São Paulo

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  • 7/30/2019 Petio inicial de ao indenizatria contra o Estado de So Paulo

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    Petio inicial de ao indenizatria contra o Estado de So Paulo, movida por ex-presidirio submetido s mais

    degradantes experincias numa cela de cadeia, inclusive sevcias sexuais. Este trabalho foi agraciado como a

    melhor pea jurdica de 2004 pelo Conselho Federal da OAB e Escola Nacional de Advocacia, recebendo o prmio

    Evandro Lins e Silva, em sua segunda edio.

    PROCURADORIA GERAL DO ESTADO - PROCURADORIA REGIONAL DE TAUBAT - PROCURADORIA DEASSISTNCIA JUDICIRIA

    EXMO(A). SR(A). DR(A). JUIZ(A) DE DIREITO DA VARA CVEL DA COMARCA DE TAUBAT:

    J. L. C. X., brasileiro, solteiro, servente de pedreiro, portador do RG n......... -SSP/SP, residente e domiciliado na Rua...... nesta,pelo Procurador do Estado, que esta subscreve, no exerccio das funes afetas Defensoria Pblica ( "ex vi" do art. 134 C.F. c.c. art. 10da A.D.C.T. da Carta Paulista) por isso dispensado de apresentar instrumento de mandato por fora do disposto no art. 16,pargrafo nico, da Lei Federal n 1.060/50, vem, fundamentado nos arts. 5, X c.c. 37, 6 ambos da Constituio Federal e art. 100, V,"a", nico, do C.P.C., intentarAO INDENIZATRIA em face da FAZENDA PBLICA DO ESTADO DE SO PAULO, comendereo para citao junto a Procuradoria Geral do Estado, sito na Av. So Luis, 99, 4 andar, Centro, So Paulo-SP, lastreado nos motivosfticos e jurdicos abaixo aduzidos:

    " Eram vinte e cinco homens. Eram vinte e cinco homens, entre uma porta de ferro, e midas e frias paredes. Eram vinte ecinco homens espremidos, empilhados, esmagados de corpo e alma, num cubculo onde mal caberiam oito pessoas. Eram vinte e cincohomens espremidos, empilhados, esmagados de corpo e alma, mais o desespero, o tdio, a desesperana e o tenebroso cio, numaimunda cela onde mal caberiam oito pessoas. Eram vinte e cinco homens colocados no imundo cubculo para morrer. Para morrer

    aos poucos. Para morrer de forma que parecesse natural. Para morrer. Para morrer sem feder. Para morrer sem estremecer asrelaes internacionais dos cidados contribuintes. Para morrer simplesmente".

    ( PLINIO MARCOS)

    MEMRIAS DO CRCERE...

    A Justia Penal foi implacvel!

    Pelo menos com o ora demandante, foi.

    Por no ter tido recursos econmicos para adimplir uma msera pena pecuniria que lhe foi imposta em decorrncia de infrao ao art.32 da Lei das Contravenes Penais que tipifica a conduta de dirigir sem habilitao o autor viu essa coima ser convertida em 10 dias dedeteno a pedido da Promotoria de Justia, e, no infausto dia 16 de agosto de 1994, foi preso e despejado em uma das superpovoadas einfectas celas da cadeia pblica local, iniciando-se, assim, a vingana pblica que lhe penitenciou pela inspida violao s leis dos "homenslivres".

    A cela era conhecida como "xadrez 04". Ali no se encontravam criminosos que malbarataram o patrimnio pblico em privatizaesobscuras, nem mesmo banqueiros que suprimiram, em meio ciranda financeira, economias poupadas com sacrifcios de seus clientes.Tambm nunca nenhum congressista que vive a parasitar verbas oramentrias em benefcio prprio ir ali adentrar.

    A cela, assim como os demais cubculos erigidos no sistema prisional do Estado, destinada, apenas, queles que atentaram contra asacrossanta propriedade privada, aos que ousaram manipular alucingenas substncias e aos que, por fora de uma indesejada misria, notinham como pagar pena de multa por dirigir sem habilitao...

    Havia 11 homens num espao onde caberiam, no mximo, quatro pessoas.

    O autor, desacostumado com o hostil e degradado ambiente "ressocializador" do crcere jamais havia tido qualquer desventura maissria com a Justia logo foi identificado como "novato" pelos demais condminos daquele pestilento depsito humano.

    Como "novato" num lugar onde as leis derivam da total ausncia do Estado, teria que ser, ainda que foradamente, "a noivinha dacela" naquela primeira noite de crcere.

    So os escopos "ressocializantes" do sistema prisional, cuja moral pragmaticamente estabelecida pelo descaso das autoridades estatais,centra-se no aforismo de que "afrontou a Lei tem que pagar!", ainda que essa afronta se cristalize numa parca desobedincia a uma tbia figuracontravencional, e ainda que seja primrio o ofensor da Lei, dever conviver com a barbrie vicejada por aqueles que esto h mais tempo emais visceralmente mergulhados no perverso sistema punitivo.

    Assim, mal apagaram-se as luzes do crcere, o autor foi subjugado pelos condminos daquelas pestilncias, foi espancado,amarrado, prenderam um cinto em seu pescoo, e encostaram uma navalha em sua garganta, amordaaram sua boca e o submeterama uma srie de coitos anais, a felaes e a inefvel sorte de misrias que se estendeu, ininterrupta, pelo resto da noite daquele infaustodia onde a Lei dos "homens livres" foi aplicada.

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    so colocados juntos com outros condenados por graves delitos, o que constitui, como se ver mais adiante, uma aberta violao dasnormas internacionais, e acarreta graves prejuzos para certas categorias de presos". ( mesma obra, pg. 62).

    Tanta desgraa no sufocou a acanhada concluso estampada pelos vedores internacionais em meio ao dito documento de que " aspenitencirias brasileiras no estavam cumprindo bem sua funo ressocializante".

    Exatamente nesse ambiente cronicamente enfermio que o autor, s por ter violado uma insignificante figura contravencional, foidespejado em meio a outros detentos, abandonados nos subterrneos do sistema prisional.

    Como visto, ali violaram sua honra e ceifaram sua dignidade como adorno ao castigo que lhe foi imposto, sem maiores conjeturas,pelos rgos repressivos do Estado.

    Por ser simplesmente mais um "Joo" encadeado no patbulo, os rgos persecutrios estatais no se preocuparam em tentar antever asabsurdas consequncias da severa coima.

    Sequer cumpriram a lei no que tange a execuo da pena que foi tributada ao demandante. Para que? Era mais um "Joo"!

    Aqui, a primeira falta do Estado a patentear sua imensa responsabilidade pelo sucedido.

    Mesmo poca em que os fatos se consumaram, a Lei determinava que se tentasse exaurir o procedimento executivo comum, compossibilidade de penhora dos bens do devedor, antes de converter-se a pena de multa em deteno. Bastava aos rgos repressores analisaremo 1 do art. 164 da Lei de Execues Penais antes de relegar o autor sua triste sina.

    Mas era mais um "Joo" a ser despejado no ftido patbulo...

    De to insueta e atentadora aos objetivos conclamados pela prpria Lei de Execues Penais, o instituto da converso da multa emdeteno foi extinto alguns anos aps a ocorrncia do evento que aqui se tenta revivescer.

    Hoje, a pena pecuniria no mais sujeita o condenado reverso da privao de sua liberdade. Ela se converte em ttulo da dvidapblica para ensejar oportuna execuo, por quantia certa, em face do devedor.

    Mais um dado a denotar o erro e a inconsequncia dos rgos repressrios do Estado.

    Mais h erros outros, mais graves.

    Se nossos neoliberais governantes, que nada atentam para a valorizao da pessoa humana, se preocupassem menos em vilipendiar aConstituio, em alter-la e retalh-la em funo dos exclusivos interesses dos Fundos Monetrios Internacionais da vida e, ao invs,cumprissem seus mandamentos, talvez vivssemos em um pas livre, justo e solidrio, ( art. 3,I, C.F.), onde fosse efetivamente garantido odesenvolvimento nacional ( inc. II, mesmo artigo), onde a misria j tivesse sido pelo menos amenizada ( inc. III) e onde existisse a real esincera promoo do bem de todos, sem qualquer espcie de discriminao ( inc. IV) para, enfim, jamais ocorrer a qualquer de seus habitantesa bizarra pungncia que recaiu sobre o autor.

    Como vimos, o demandante foi punido de maneira cruel num pas onde penas cruis so constitucionalmente proibidas ( art.5, XLVII, "e", C.F.).

    Foi ele despejado no seio de um amontoado humano, circunscrito quatro paredes imundas e sobrecarregadas derecrudescncias, para se ver escoimado por uma parca e inofensiva infrao normativa num pas onde as penas deveriam sercumpridas em estabelecimentos distintos, sempre observadas a natureza do delito, a idade e o sexo do apenado ( art. 5, XLVIII,C.F.).

    Foi violentado em sua honra e intimidade, vilipendiado no conveniente abandono do crcere, num pas onde se entorna apromessa constitucional de respeito integridade fsica e moral do preso ( art. 5, XLIX, C.F.).

    Foi, enfim, conduzido aos rigores da cela, da mesma forma como almocreves alojam o gado no redil, num pas que ostenta,dentre seus princpios fundamentais, a prevalncia dos Direitos Humanos ( art. 4, II, da C.F.).

    Note-se que como condenado, cativo da Justia, portanto, detinha o autor o direito de ser penalizado "em condies para aharmnica integrao social". ( art.1 da LEP) e ver assegurados "todos os direitos no atingidos pela sentena ou pela lei". ( art. 3do mesmo diploma normativo).

    Ainda segundo a LEP o autor, como cativo da Justia, deveria ser alojado em cela individual, com dormitrio, aparelhosanitrio e lavatrio, em ambiente com requisitos bsicos de salubridade pela concorrncia de fatores de areao, insolao econdicionamento trmico adequado existncia humana e rea mnima de 06 metros quadrados. ( art. 88).

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    Jamais poderia ter sido depositado, como o foi, em cadeia pblica ( art. 102, LEP), que so destinadas to s no esprito danorma para os presos provisrios.

    Essa extensa relao da sistemtica afronta estatal a princpios bsicos titularizados pelos condenados do sistema prisional, deixatransparecer bem a abismal dimenso da responsabilidade do Estado pelos nefastos sucedimentos dos quais o autor foi vtima, cuja culpa emalefcios, foi magistralmente delineada porRUI CARLOS MACHADO ALVIM, em estudo intitulado "A PENA PRIVATIVA DELIBERDADE E A CADEIA: UM CASO DE INCOMPATIBILIDADE DE GNEROS", "in" Revista PGE/SP, pg.229 e seguintes,que assim se expressou sobre o tema em questo:

    "A persistncia em que a pena celular continue a efetivar-se nas cadeias pblicas e nos crceres distritais mostra-se tambmde segurana fictcia, medida que a degradao mxima, material e moral, das condies ali existentes, longe de reinstalar o egressona bitola do convvio social resultado que decorreria da seriedade do programa penitencirio ou, quando menos, de uma vidaintramuros minimamente decente provoca-lhe uma mudana negativa, convertendo-se de criminoso em besta incontrolvel:ningum suporta inclume tanta desgraa.

    (...) O descaso, por parte do Estado, a tantos dispositivos legais e constitucionais e sua indiferena condio carcerria dossentenciados que se apinham nas cadeias pblicas e nos crceres distritais no poderia ficar social, poltica, humanitria emoralmente intangvel: com sistemtica e aterradora regularidade retumbam daqueles lugares horrores inominveis: o sorteio depresos, eleitos para morrer, numa forma desesperada de pressionar as autoridades soluo, como houve em 85, no depsito depresos da Lagoinha, em Belo Horizonte, e como aconteceu em abril de 90, na Cadeia Pblica de Santo Andr, um macabro ritual que,de uma hora para outra, ameaa repetir-se; o homicdio coletivo praticado por policiais nas dependncias do 42 Distrito Policial deSo Paulo, no ltimo carnaval: os apelos, em quase todas as cadeias, dos atingidos pela tuberculose, pela aids, pela hepatite, e de seuscompanheiros de cela, aqueles, por socorro e tratamento, estes, pelo isolamento daqueles...

    Ser preciso mais?"

    Infelizmente, para o autor, foi!

    Em que pesem as contnuas advertncias feitas muito antes pelo nobre jurista, e por outros, que h muito vm se debatendo nessainglria luta pela dignidade da pessoa humana nesta ptria, o Estado no se sensibilizou com nada. Nem com as roletas russas a detonar vidase vagas no sistema prisional, nem com o caos em que vivem l seus cativos, nem mesmo com a periculosidade das azmolas em que setransformaram os homens despejados e esquecidos na cela 04 no fatdico dia em que o autor ali adentrou para remir sua "culpa".

    Advertncias ignoradas pelos feudatrios do neoliberalismo. Advertncias inauditas; tal qual os brados que ROBERTO LYRA, desdea dcada de 30, entoava no seio de seu "Projeto de Cdigo Penitencirio":

    "Bandidos? O Estado deve imit-los? Se continuar a faz-lo, quem sofrer os efeitos? O prprio Estado que os causou. Antesdo castigo, o abandono. Depois, o abandono.

    (...) Alis, as durezas, de que os caturras fazem questo para os outros, constituiriam matria para o Cdigo Penal. Quequerem mais? Matar, retalhar o cadver, exibir os pedaos na esquina, amaldioar o sangue? A justia s ter tranquilidade esegurana para punir quando a execuo das penas que ela aplica no for mais criminosa do que o crime".

    A HONRA:

    A partir de uma incipiente posio ossificada e conservadora, onde se relutava em aceitar-se a viabilidade do pleito de reparao pordanos morais, a jurisprudncia ptria, com suporte em sucessivas interpretaes sistemticas do ordenamento jurdico, veiculadas por notrios

    doutrinadores, evoluiu seu renitente posicionamento para hodiernamente sedimentar o entendimento que acena para a plena reparabilidadedos prejuzos emergentes dos danos imateriais, independentemente da existncia de reflexos patrimoniais do evento.

    Com efeito, tendo-se como premissa os objetivos reparatrios ou simplesmente penalizantes de tal modalidade de indenizao, averdade que essa assertiva tem sido sucessivamente esposada por vrios arestos oriundos dos mais graduados Tribunais do pas, como, porexemplo, o emitido pela 3 Turma do STJ no julgamento do Rec. Esp. n 7.072, onde ficou assentada pelo Min. CLAUDIO SANTOS em suavencedora declarao de votos, a orientao, abaixo transcrita, que sintetiza bem a evoluo pretoriana sobre a matria:

    "A idia de que o dano simplesmente moral no indenizvel pertence ao passado.

    Na verdade, aps muita discusso e resistncia, acabou impondo-se o princpio da reparabilidade do dano moral.

    Quer por ter a indenizao a dupla funo reparatria e penalizante, quer por no se encontrar nenhuma restrio na

    legislao privada vigente em nosso pas. Ao contrrio, nos dias atuais, destacveis so os comandos constitucionais quanto ao agravoatravs dos meios de comunicao e violao da intimidade, respectivamente estabelecidos nos incisos V e X, do Art. 5 daConstituio da Repblica.

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    Frente essas dificuldades, doutrina e jurisprudncia criaram frmulas prticas, extradas de casos semelhantes, e que servem comodiretrizes ao juiz no momento do arbitramento do "quantum" indenizatrio.

    CARLOS ALBERTO BITTAR, dentre outros, nos d a idia da natureza desses critrios ao enunciar que: "para auxiliar o trabalho dosmagistrados, certos parmetros e certos critrios tm sido ideados e, mesmo, sufragados em decises judiciais e em textos de Lei. (...).Referem-se eles reparao, ao correspondente modo e ao alcance da indenizao, tanto quando pecuniria, como quando pessoal a frmulaadotada na deciso judicial. (...). Descrevem-se, ento, como parmetros, certas linhas diretivas, retidas na anlise ftica, tais como ocomportamento das partes, as correspondentes posies econmicas, a intensidade do dano e fatores outros que, apontados na doutrina,encontram guarida em certas codificaes, como a portuguesa".

    Diante dessas premissas, arremata apontado civilista: "em consonncia com essas diretrizes, a indenizao por danos morais devetraduzir-se em montante que represente advertncia ao lesante e sociedade de que se no aceita o comportamento assumido, ou o eventolesivo advindo..."

    ..."Consubstancia-se, portanto, em importncia compatvel com o vulto dos interesses em conflito, refletindo-se de modoexpressivo, no patrimnio do lesante, a fim de que sinta, efetivamente, a resposta da ordem jurdica aos efeitos do resultado lesivoproduzido. Deve, pois, ser quantia economicamente significativa, em razo das potencialidades do patrimnio do lesante".

    ( "Reparao Civil por Danos Morais", RT, 1993, pgs. 215/220).

    Em face desses parmetros, poderamos apontar vrios exemplos de arbitramento judicial em indenizaes por danos morais, cujacaracterstica predominante a sensvel variao de critrios para a fixao dos valores de acordo com a condio social da vtima. Se pobre,

    os valores so menores dos que aqueles apurados quando o lesado provm de classe social mais elevada.

    Essa oscilao tem motivado muitas crticas ao comportamento do Judicirio quando chamado a atuar em tais questes. Crticas comoa emitida porGALENO LACERDA em monografia intitulada "INDENIZAO DO DANO MORAL", publicada na RT 728/ 94.

    O processualista gacho, nesse estudo, aps pontificar que o objetivo da indenizao do dano moral proporcionar vtima um"status" material diferenciado de conforto, minimizando a dor atravs de um equivalente pecunirio que contrabalance o sofrimento, salientaque a elaborao terica acerca da questo no tem impedido que os valores das indenizaes estejam sendo arbitrados sem qualquer relaouns com outros, produzindo a impresso de uma incmoda falta de norte a respeito do tema.

    Assim, relata alguns leading cases, como, por exemplo, "o do Desembargador gacho que recebeu 1.000 salrios mnimosporque figurou indevidamente numa lista de aponte para protesto publicada em jornal (...) e outras situaes, como a do jovem de 18anos preso por dois meses por engano, que mereceu apenas 10 salrios mnimos pelo injusto sofrimento. ( deciso da 1 Vara de SantaMaria - Zero Hora, 19.03.1993, p. 63)". ( op. cit., p. 94/95).

    Todavia, para imprimir a necessria coeso e justia no momento da estipulao judicial do "quantum" reparatrio, o apontado juristasugere uma diretriz que, por ser a mais condizente com os objetivos reparatrios e penalizantes do pleito, fica aqui adotada.

    Com efeito, preleciona GALENO LACERDA que o direito civil ptrio contm um sistema de quantificao do dano, onde se inclu odano moral.

    Destarte, obrigatoriamente teremos "de concluir que o arbitramento previsto no referido art. 1.553 C.C., para casos omissos, haver deter os patamares valorativos dos casos expressos na lei como referencial necessrio, at porque o direito no pode ser visto como um universode compartimentos estanques, incomunicveis entre s.

    Importa, pois, expressar em valores o paradigma indenizatrio do Cdigo Civil para o caso de exclusivo dano moral, previsto no art.1.547, que reza: "A indenizao por injria ou calnia consistir na reparao do dano que delas resulte ao ofendido. Pargrafo nico: Se esteno puder provar prejuzo material, pagar-lhe- o ofensor o dobro da multa no grau mximo da pena criminal respectiva".

    A norma remete ao direito penal, onde o tema da quantificao, por bvio, preocupou muito antes - e muito mais - os juristas. Asltimas reformas do Cdigo Penal, especialmente a da Lei 7.209/84, trouxeram considervel avano relativamente a este ponto, daquantificao, ajustando o valor da multa capacidade econmica do ru.

    Para tanto, a busca do "quantum" passou a ser uma operao genrica ( da a previso dela na parte geral do CP), superando a previsoparticularizada de valores para cada um dos tipos penais tradicionalmente utilizada no direito criminal brasileiro.

    Ento, o mximo da pena de multa que, em tese, poder-se-, no sistema atual do CP, atribuir a qualquer delito, inclusive calnia ouinjria, paradigma da lei civil ( art. 1.547) de 5.400 salrios mnimos, valor que se obtm seguindo o roteiro legal, seno vejamos:

    O art. 49 do CP diz que a multa mxima corresponder a 360 dias-multa. E o valor mximo do dia-multa, diz o 1, daquele artigo, cinco salrios mnimos. Ento, 360 X 5 = 1.800 salrios mnimos.

    Mas o art. 60, 1 do mesmo CP salienta que "a multa pode ser aumentada at o triplo, se o juiz considerar que, em virtude dasituao econmica do ru, ineficaz, embora aplicada no mximo".

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    Ento, a multa mxima do Cdigo Penal para qualquer delito, inclusive injria e a calnia, repita-se, de 5.400 salrios mnimos.

    E como o art. 1.547, pargrafo nico, do Cdigo Civil, prev o dobro da pena pecuniria criminal, chega-se a um total mximo, nocvel, de 10.800 salrios mnimos.

    Vale dizer, em se tratando de um ru muito rico, que cometa o delito de calnia ou injria contra algum, poder-se- chegar,mediante simples aplicao do roteiro da lei, a uma indenizao pelo dano moral de at 10.800 salrios mnimos". ( op. cit., pgs.95/96, grifei).

    Esses critrios, que pela justia que lhes inspira, seguem, aqui, adotados, foram delineados, como se percebe, no teor do art. 1.547 doCdigo Civil, alusivo ao delito de injria ou calnia.

    Ficou, de outra parte evidente nos autos, que a penitncia excessiva e injustificada sofrida pelo autor quando do evento j noticiado,extrapolou, em muito, os limites dos delitos contra a honra, de forma a resplandecer, a primeira vista, que tais critrios, ante ao contedo doart. 1.547, no teriam aplicao sobre este caso.

    Todavia, o art. 1.550 do mesmo cdigo preciso ao ordenar que "A indenizao por ofensa liberdade pessoal consistir nopagamento das perdas e danos que sobrevierem ao ofendido, e no de uma soma calculada nos termos do pargrafo nico do art.1.547".

    Infere-se, portanto, que embora taxado de vetusto, o nosso cdigo civil consegue, ainda, concentrar soluo precisa para a plenasolvncia do caso em epgrafe.

    Pois bem! Levando-se em considerao os critrios supra estabelecidos, e jamais olvidando da gravidade das ofensas moraisimpingidas ao autor por atos incompreensivelmente brutais perpetrados quando a merc e responsabilidade do Estado, que deveria dar oexemplo, como frisado, de respeito aos direitos humanos; considerando-se, ainda, objetivo maior deste pleito, que o de evitar que novasbarbries se repitam, fica aqui vindicado, como sendo suficiente e adequado reparao das pungentes dores experimentadas pelo autor, aquantia equivalente a 10.800 salrios mnimos, valor que adere bem no s a situao econmica e reincidente da r como, tambm, ateratolgica gravidade dos atos consumados por seus agentes.

    O PEDIDO:

    ISTO POSTO, requer a citao da r, via precatria e junto ao endereo referido no prembulo, para, querendo, oferecerresposta, sob pena de revelia, devendo, a final, ser JULGADO PROCEDENTE O PEDIDO para conden-la a pagar ao autor

    indenizao por danos morais no valor de 10.800 salrios mnimos, equivalentes, hoje, quantia de R$ 1.404.000,00 ( Hum milho,quatrocentos e quatro mil reais).

    Requer, outrossim, os benefcios da assistncia jurdica, por ser pessoa pobre na acepo jurdica do termo.

    Protesta provar o alegado por todos os meios de prova em direito admitidos, notadamente com os documentos que instruem a presente,que atestam de maneira ampla a patente responsabilidade da r, e todos os necessrios ao deslinde da questo.

    Com amparo no art. 128, I da Lei Complementar Federal n. 80/94 c.c. art. 5, 5, da Lei n. 1.060/50, requer que este DefensorPblico ou quem faa s suas vezes, seja pessoalmente intimado de todos os atos praticados no feito, contando-se-lhe em dobro os respectivosprazos.

    D-se causa o valor de R$ 1.404.000,00 ( Hum milho, quatrocentos e quatro mil reais).

    Taubat, Janeiro de 1999.

    WAGNER GIRON DE LA TORREProcurador do EstadoDefensor Pblico

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