Damásio - Direito Constitucional

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___________________________________________________________ ________ CURSO DO PROF. DAMÁSIO A DISTÂNCIA MÓDULO I DIREITO CONSTITUCIONAL Teoria Geral da Constituição

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CURSO DO PROF. DAMÁSIO A DISTÂNCIA

MÓDULO I

DIREITO CONSTITUCIONALTeoria Geral da Constituição

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DIREITO CONSTITUCIONAL

Teoria Geral da Constituição

Professor Ricardo Cunha Chimenti

1. INTRODUÇÃO

O Direito é um todo. Sua divisão ocorre somente para fins didáticos. O Direito Constitucional, de acordo com tal subdivisão, pertence ao ramo do Direito Público, uma vez que regula e interpreta normas fundamentais do Estado.

O Direito Constitucional é um ramo particularmente marcado por sua historicidade, pois se desenvolve em paralelo à evolução do Estado de Direito, abrangendo desde o liberal, de cunho negativo, ao atual, necessariamente intervencionista.

De acordo com o conceito de José Afonso da Silva, Direito Constitucional “é o ramo do direito público que expõe, interpreta e sistematiza os princípios e normas fundamentais do Estado”.

1.1. Constituição

Constituição é a organização jurídica fundamental do Estado.

As regras do texto constitucional, sem exceção, são revestidas de supralegalidade, ou seja, possuem eficácia superior às demais normas. Por isso se diz que a Constituição é norma positiva suprema (positiva, pois é escrita).

A estrutura do ordenamento jurídico é escalonada. Essa idéia remonta a Kelsen, sendo que todas as normas situadas abaixo da Constituição devem ser com ela compatíveis. A isso se dá o nome de relação de compatibilidade vertical (RCV).

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CF

Demais normas

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No ápice da pirâmide estão as normas constitucionais; logo, todas as demais normas do ordenamento jurídico devem buscar seu fundamento de validade no texto constitucional, sob pena de inconstitucionalidade.

Basta que a regra jurídica esteja na Constituição Federal para ela ser revestida de supralegalidade.

Na Constituição Federal de 1988, existem regras formalmente constitucionais (RFC) e regras materialmente constitucionais (RMC).

1.2. Regras Materialmente Constitucionais

Regras materialmente constitucionais são as regras que organizam o Estado. Somente são materialmente constitucionais as regras que se relacionam com o “Poder” e que tratam de matéria constitucional, independentemente de estarem ou não dispostas na Constituição, a exemplo da Lei Complementar n. 64/90, que traça as hipóteses de inelegibilidades para os cargos dos Poderes Executivo e Legislativo, e do Estatuto do Estrangeiro.

1.2.1. Exemplos de regras materialmente constitucionais

A forma de Estado (Federal), a forma de governo (República) e o regime de governo (Presidencialista) são definidos em regras jurídicas que organizam o Poder.

A Constituição Federal deve enunciar os direitos fundamentais dos indivíduos. Quando se enunciam esses direitos, automaticamente é definido um limite ao eventual exercício arbitrário do poder.

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Modo de Aquisição Modo de Exercício

PODER

Elementos Limitativos (enunciação dos direitos

fundamentais das pessoas. Sistema de Garantia das

Liberdades)

Elementos Orgânicosou Organizacionais (são as regras que organizam

o Poder)

Elementos Socioideológicos (princípios da ordem econômica e social)

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1.3. Regras Formalmente Constitucionais

Todas as regras dispostas no texto constitucional são formalmente constitucionais, no entanto, algumas delas podem ser também regras materialmente constitucionais. O fato de uma regra estar na Constituição imprime a ela o grau máximo na hierarquia jurídica, seja ela regra material, seja regra formal. O grau de rigidez também é o mesmo para toda norma constitucional, independentemente de ser ela material ou formal.

As regras formalmente constitucionais podem ser observadas nos seguintes exemplos: os artigos 182 (que trata da política de desenvolvimento urbano) e 242, § 2.º, ambos da Constituição Federal de 1988. Essas regras, sob o ponto de vista material, não são regras que tratam de matéria constitucional. No entanto, devido ao fato de estarem dispostas na Constituição, são regras formalmente constitucionais.

1.4. Concepções sobre as Constituições

1.4.1. Sentido sociológico

Para Ferdinand Lassalle, a Constituição é a “soma dos fatores reais do poder que regem nesse país”, sendo a Constituição escrita apenas uma “folha de papel”. Para Lassalle, Constituição legítima é a que representa o efetivo poder social.

1.4.2. Sentido político

Carl Schmitt concebe a Constituição no sentido político, pois para ele Constituição é fruto da “decisão política fundamental” tomada em certo momento. Para Schmitt há diferença entre Constituição e lei constitucional; é conteúdo próprio da Constituição aquilo que diga respeito à forma de Estado, à forma de governo, aos órgãos do poder e à declaração dos direitos individuais. Outros assuntos, embora escritos na Constituição, tratam-se de lei constitucional (observe-se que essas idéias estão próximas as de Constituição material e formal).

1.4.3. Sentido jurídico

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A Constituição também pode ser vista apenas no sentido jurídico. Para Hans Kelsen, Constituição é considerada “norma pura”, puro “dever-ser”, sem qualquer pretensão à fundamentação sociológica, política ou filosófica. Ao defender essas idéias, Kelsen ressalta a diferença entre o Direito e as demais ciências, sejam naturais ou sociais. O cientista do Direito deve buscar soluções no próprio sistema normativo.

Kelsen concebe a palavra Constituição em dois sentidos:

lógico-jurídico: norma fundamental hipotética;

jurídico-positivo: conjunto de normas que regula a criação de outras normas; nesse sentido, Constituição é a norma positiva suprema.

2. CLASSIFICAÇÃO DAS CONSTITUIÇÕES

2.1. Quanto ao Conteúdo

Constituição material ou substancial: é o conjunto de regras materialmente constitucionais, que regula a estrutura do Estado, a organização de seus órgãos e os direitos fundamentais. Tais regras podem ou não estar na Constituição. Há, por exemplo, regras materialmente constitucionais disciplinadas em lei ordinária, como o já citado Estatuto do Estrangeiro.

Constituição formal: é o conjunto de regras jurídicas, inseridas no texto unitário da Constituição escrita, diga ou não respeito à matéria constitucional. Exemplo: o artigo 14, § 4.º, da Constituição Federal, que trata da inelegibilidade, é regra formal e materialmente constitucional porque delineia o modo de aquisição e exercício do poder. Mas os casos de inelegibilidade não são apenas os previstos nesse dispositivo; a Lei Complementar n. 64, de 18.5. 1990 disciplina outras hipóteses, em consonância com o prescrito no § 9.º do próprio artigo 14.

2.2. Quanto à Forma

Constituição não-escrita, costumeira ou consuetudinária: é a Constituição em que as normas não constam de um documento único e solene. Suas fontes são: os usos e costumes, os precedentes jurisprudenciais e os textos escritos esparsos (atos do Parlamento). Na Constituição costumeira, os textos escritos não são as únicas fontes

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constitucionais, mas sim apenas uma parte delas. Existem textos escritos nessas constituições; no entanto, a maioria das fontes constitucionais é de usos e costumes; os textos não são consolidados, podendo haver entre eles um período de até 400 anos. O melhor exemplo de Constituição não-escrita é a Constituição do Reino Unido.

Constituição escrita: é composta por um conjunto de regras codificadas e sistematizadas em um único documento.

2.3. Quanto à Extensão ou ao Modelo

Constituição sintética: é a Constituição concisa. A matéria constitucional vem predisposta de modo resumido1 (exemplo: a Constituição dos Estados Unidos da América, que tem 7 artigos e 26 emendas).

Constituição analítica: caracteriza-se por ser extensa, minuciosa. A Constituição brasileira é o melhor exemplo.

2.4. Quanto ao Modo de Elaboração

Constituição dogmática: reflete a aceitação de certos dogmas, ideais vigentes no momento de sua elaboração, reputados verdadeiros pela ciência política.

Constituição histórica: é a Constituição não-escrita, resultante de lenta formação histórica. Não reflete um trabalho materializado em um único momento.

2.5. Quanto à Ideologia

Eclética, pluralista, complexa ou compromissória: possui uma linha política indefinida, equilibrando diversos princípios ideológicos. Conforme entende Manoel Gonçalves Ferreira Filho, no fato de a Constituição Federal ser dogmática na sua acepção eclética consiste o caráter compósito de nosso dogmatismo (heterogêneo).

1 BULHOS, Uadi Lammêgo. Constituição Federal Anotada. 3.ª ed. São Paulo: Saraiva, 2001.p. 10.

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Ortodoxa ou simples : possui linha política bem definida, traduzindo apenas uma ideologia.

2.6. Quanto à Origem ou ao Processo de Positivação

Constituição promulgada, democrática ou popular (votada ou convencional): tem um processo de positivação proveniente de acordo ou votação. É delineada por representantes eleitos pelo povo para exercer o Poder Constituinte (exemplo: a Constituição de 1988).

Constituição outorgada: é imposta por um grupo ou por uma pessoa, sem um processo regular de escolha dos constituintes, ou seja, sem a participação popular (exemplo: a Constituição brasileira de 1937).

Observação: há uma tendência na doutrina de se restringir o uso da expressão Carta Constitucional somente para a Constituição outorgada (exemplo: a Carta de 1969) e Constituição apenas para os textos provenientes de convenção (exemplo: a Constituição de 1988).

Constituição Cesarista ou Bonapartista: assim chamada pela doutrina, nada mais é do que uma Constituição outorgada que passa por uma encenação de um processo de consulta ao eleitorado, para revesti-la de aparente legitimidade.

Constituição “dualista” ou “pactuada”: citada pela doutrina, essa Constituição caracteriza-se por ser fruto de um acordo entre o soberano e a representação nacional.

2.7. Quanto à Estabilidade, à Mutabilidade ou à Alterabilidade

Constituição rígida: para ser modificada necessita de um processo especial, mais complexo do que o exigido para alteração da legislação infraconstitucional. A Constituição Federal do Brasil é um exemplo.

Constituição flexível ou não-rígida: pode ser modificada por procedimento comum, o mesmo utilizado para as leis ordinárias.

Constituição semi-rígida: contém uma parte rígida e outra flexível. Exemplo: a Constituição do Império de 1824, que previa, em seu artigo 178, a modificação das regras materialmente constitucionais por procedimento especial e a modificação das regras formalmente constitucionais por procedimento comum.

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2.8. Quanto à Função

Esta classificação, apresentada por José Joaquim Gomes Canotilho, não apresenta categorias que sejam logicamente excludentes, ou seja, a Constituição poderá receber mais de uma destas classificações:

Constituição garantia, quadro ou negativa: é a clássica, enunciando os direitos das pessoas, limitando o exercício abusivo do poder e dando uma garantia aos indivíduos. Originou-se a partir da reação popular ao absolutismo monárquico. É denominada quadro porque há um quadro de direitos definidos e negativa porque se limita a declarar os direitos e, por conseguinte, o que não pode ser feito.

Constituição balanço: é um reflexo da realidade. É a “Constituição do ser”. Um exemplo é a Constituição da extinta URSS, de 1917.

Constituição dirigente: não se limita a organizar o poder, mas também preordena a sua forma de atuação por meio de “programas” vinculantes. É a “Constituição do dever-ser”. A nossa Constituição Federal inspirou-se no modelo da Constituição portuguesa.

Observações:

1. Programas constitucionais: devem ser desenvolvidos por quem se encontre no exercício do poder.

2. Direção política permanente: é imposta pelas normas constitucionais.

3. Direção política contingente: imposta pelos partidos políticos que se encontram no governo.

3. HISTÓRICO DAS CONSTITUIÇÕES BRASILEIRAS

1824: positivada por outorga. Constituição do Império do Brasil. Havia um quarto poder: o Poder Moderador.

1891: positivada por promulgação. Primeira Constituição da República.

1934: positivada por promulgação.

1937: positivada por outorga (Getúlio Vargas). Apelidada de Constituição “Polaca”.

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1946: positivada por promulgação. Restabeleceu o Estado Democrático.

1967: positivada por outorga. (há quem sustente ter sido positivada por convenção, pois o texto elaborado pelo Governo Militar foi submetido ao referendo do Congresso Nacional antes de entrar em vigor).

1988: positivada por promulgação (Constituição Cidadã).

Observação: em 1969 foram efetivadas várias alterações por meio da Emenda Constitucional n. 1/69, que para alguns autores caracteriza uma Constituição outorgada.

4. CLASSIFICAÇÃO DA CONSTITUIÇÃO FEDERAL DE 1988

A Constituição Federal de 1988 possui a seguinte classificação:

quanto ao conteúdo: formal;

quanto à forma: escrita;

quanto à extensão: analítica;

quanto ao modo de elaboração: dogmática;

quanto à ideologia: eclética;

quanto à origem: promulgada;

quanto à estabilidade: rígida;

quanto à função: garantia e dirigente.

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