Parecer em indenização por erro médico

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7/29/2019 Parecer em indenização por erro médico http://slidepdf.com/reader/full/parecer-em-indenizacao-por-erro-medico 1/26 Parecer em indenização por erro médico Parecer ministerial em ação de indenização por danos morais por erro médico devido a imperícia e omissão de socorro por parte da equipe que atendeu a autora, causando-lhe longa e delicada internação e seqüelas irreparáveis em decorrência de apendicite mal tratada.  Elaborado por Amilton Plácido da Rosa, promotor de Justiça do Consumidor, da Habitação e Urbanismo, em exercício na Promotoria de Justiça do Meio Ambiente. Excelentíssimo Senhor Juiz de Direito da 8a Vara Cível Residual da Comarca de Campo Grande, MS: PARECER MINISTERIAL  AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS Autos: 97.0032696-9 Autora: Viviane Corrêa Leitão Réu: Hospital Infantil São Lucas Ltda. Objeto da ação: Indenização por danos morais Causa de pedir: Imperícia e omissão de socorro da equipe de plantão do réu que causaram internação longa, cirurgias delicadas e seqüelas irreparáveis à autora e enormes gastos econômicos a seus pais. Embasamento legal: Artigo 5o, inciso X, da CF c/c Artigos 159, 1.537 a 1.553 do Código Civil e Artigo 6o, inciso VI, do Código de Defesa do Consumidor. Valor da Indenização: A ser fixada por arbitramento, em liquidação de sentença I) Relatório: Trata-se de ação de reparação de danos morais que Viviane Corrêa Leitão, menor impúbere, move em face do Hospital Infantil São Lucas Ltda. Narra a peça inaugural que no início do ano de 1996 os

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Parecer em indenização por erro médico 

Parecer ministerial em ação de indenização por danos morais por erro médico devido a imperícia eomissão de socorro por parte da equipe que atendeu a autora, causando-lhe longa e delicadainternação e seqüelas irreparáveis em decorrência de apendicite mal tratada.

 Elaborado por Amilton Plácido da Rosa, promotor de Justiça do Consumidor, da Habitação eUrbanismo, em exercício na Promotoria de Justiça do Meio Ambiente.

Excelentíssimo Senhor Juiz de Direito da 8a Vara Cível Residual daComarca de Campo Grande, MS: 

PARECER MINISTERIAL

  AÇÃO DE REPARAÇÃO DE DANOS MORAIS

Autos: 97.0032696-9

Autora: Viviane Corrêa Leitão

Réu: Hospital Infantil São Lucas Ltda.

Objeto da ação: Indenização por danos morais

Causa de pedir: Imperícia e omissão de socorro da equipe de plantão do réu

que causaram internação longa, cirurgias delicadas eseqüelas irreparáveis à autora e enormes gastoseconômicos a seus pais.

Embasamentolegal:

Artigo 5o, inciso X, da CF c/c Artigos 159, 1.537 a 1.553 doCódigo Civil e Artigo 6o, inciso VI, do Código de Defesa doConsumidor.

Valor daIndenização:

A ser fixada por arbitramento, em liquidação de sentença

I) Relatório:

Trata-se de ação de reparação de danos morais que Viviane CorrêaLeitão, menor impúbere, move em face do Hospital Infantil São Lucas Ltda.

Narra a peça inaugural que no início do ano de 1996 os

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representantes legais da autora procuraram o réu, para que esta recebesseatendimento médico, já que estava acometida de febre alta, doresabdominais e forte diarréia.

Após terem feito o pagamento dos valores cobrados, dado que a

menor não pode receber os cuidados de que necessitava pelo convênioexistente entre aquele nosocômio e o Previsul, ela foi atendida por ummédico plantonista que diagnosticou " possível infeção intestinal ", semqualquer outra complicação que exigisse atendimento cirúrgico deemergência.

  Após alguns dias, com a mudança de seu quadro clínico para pior,os genitores da autora removeram-na para a Santa Casa, onde foidiagnosticado "apendicite supurada e peritonite generalizada", emvirtude do que a suplicante ficou internada por 60 dias, entre a vida e amorte, inclusive no Centro de Terapia Intensiva. Apesar dos cuidados

recebidos, a negligência e imperícia dos médicos da ré ocasionaram napostulante-vítima seqüelas irreversíveis, que lhe ocasionaram inclusiverestrições alimentares e que a acompanharão pelo resto da vida.

Em razão do ocorrido, requereu indenização por danos morais, cujovalor deverá ser arbitrado, em liquidação, pelo magistrado.

Fundamentou sua pretensão no artigo 5o, inciso X, da CF c/c artigos159(1), 1.537 a(2) 1.553 do Código Civil e artigo 6o, inciso VI, do Código deDefesa do Consumidor, e em entendimentos doutrinários e jurisprudenciais,que citou.

Requereu também as benesses da justiça gratuita e a condenação doréu nos ônus da sucumbências.

Posteriormente, à f. 14, requereu também a juntada dos documentosque se encontram às f. 15 a 349.

  Devidamente citado em 11 de dezembro de 1997, o réuapresentou sua contestação no dia 16/02/98, através da qual alegou,preliminarmente, a incapacidade processual da autora, que, segundoele, não se fez representar nos autos pelos seus genitores, bem como

alegou a ilegitimidade passiva, posto que não houve culpa do médico oudos médicos plantonistas, que não foram identificados e que não sãoempregados do réu.

Na mesma ocasião, denunciou à lide a Santa Casa de Campo Grandee o Hospital da Criança, além de ter requerido a aplicação à autora da penade litigância de má-fé.

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Quanto ao mérito, o réu afirmou:

1. não tem vínculo contratual com o Previsul desde 1995, motivopelo qual a autora foi atendida pelo convênio da Unimed, sendo que oquantum pago pelos pais da autora se refere ao pagamento de

apartamento não coberto pelo predito convênio;

2. a menor foi atendida, em 04/01/96, pelo Dr. Palhano e nãoapresentava sintomas "agudos de apendicite", mas ficou internadapara observação, posto que reclamava de dor;

3. no dia 8 de janeiro de 1996, a Dra Regina Maria Araújo Ajala,médica pediatra do réu, percebendo que era caso de apendicite aguda,operou a requerente, no que foi auxiliada pelo Dr. Carlos Yonamine, nãosendo, portanto, verdade que a menor foi levada à pressa para a SantaCasa, com o fim de lá ser operada de apendicite;

4. antes de ser transferida para o Centro de Terapia Intensiva naSanta Casa, onde ficou internada na UTI de 25 a 31 de janeiro de 1996, amenor autora foi operada por mais duas vezes no Hospital São Lucas, pormotivo de obstrução intestinal. Assim, se vê que a postulante foi submetidaa três cirurgia no Hospital São Lucas (documento de f. 370), onde recebeutodos os cuidados médicos necessários;

5. o pedido de reembolso feito ao Previsul (f. 19) contém informaçõesinautênticas, o que demonstra a má-fé da representante da autora. Querela reaver o dinheiro gasto com a internação em enfermaria de qualquer

modo. Primeiro tentou contra o Previsul e não conseguiu, agora se voltacontra o réu, com o mesmo intento.

6. as razões da negativa do reembolso pelo Previsul se encontram af. 232 (aquela autarquia não cobre gastos com internação emapartamento).

  Quanto ao direito, o réu afirma que o dever do médico é de meio enão de resultado e que a responsabilidade desse profissional depende dacomprovação de culpa e do nexo causal entre o dano sofrido e ação ouomissão culposa do facultativo, o que não ocorreu no caso em questão.

  Às f. 377/380, o réu impugnou o deferimento da Assistência Judiciária Gratuita, sob o argumento de que: a) inexiste nos autosafirmação feita pelos interessados de que eles não estão em condição depagar as custas do processo e os honorários advocatícios, sem prejuízopróprio e de sua família, apenas o patrono da autora fez tal assertiva napetição inicial, que não foi assinada pela autora ou pelos seusrepresentantes legais; b) a autora quer se ver livre apenas do pagamento

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das custas processuais e dos honorários do advogado da parte contrária,dado que se comprometeu a pagar honorários ao seu patrono (procuraçãode f. 15); c) se ela pode pagar os honorários do seu advogado, que é demaior valor, pode pagar as custas e os honorários do patrono do réu que éde valor bem menor; d) os genitores, comerciante e funcionária pública,

têm condição econômica de constituir advogado e de pagar honorários, nãonecessitando do benefício da gratuidade da justiça.

  Instado a falar sobre a contestação, a autora alegoubasicamente a intempestividade da contestação e requereu o julgamentoantecipado da lide, nos termos do artigo 330, inciso I, do Código deProcesso Civil, com reconhecimento dos efeitos da revelia.

É o que se reputou útil e necessário relatar.

II) Do Parecer propriamente dito:

A) Da Preliminar de intempestividade da contestação:

Há que se dizer, de pronto, que a contestação, em face doretardamento da juntada do mandado cumprido aos autos, que se deu em15/01/98 (f. 349-v), da suspensão do prazo pelo advento do recesso e dasférias forenses de dezembro/97 e janeiro/98 e pela ocorrência de umdomingo no dia 15/02/98, não foi apresentada a destempo, o queautoriza a análise de seu conteúdo.

Vencida a preliminar de intempestividade da contestação, cabe aanálise das preliminares levantadas pelo réu.

B) Da Preliminar de incapacidade processual:

Não há que se falar em incapacidade processual da autora, postoque ela se faz representar nos autos pelos seus genitores, como se vê peloinstrumento procuratório encontrado à f. 16.

C) Da Preliminar de ilegitimidade passiva:

A ilegitimidade passiva também inexiste, posto que o réu nãonegou que os facultativos que atenderam a autora, Dr. Fernando S. Higa,Dr. Palhano, Dra Regina Maria Araújo Ajala e o Dr. Carlos Yonamine,fossem empregados dela. Aliás, confirmou à f. 360, que o Dr. Palhano eramédico plantonista daquele nosocômio, sendo certo que ele se identificou àgenitora da autora como um dos sócios daquele hospital, fornecendo-lhe arelação de médicos daquele hospital (doc. anexo). Disse mais, disse que o

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atendimento se deu pelo convênio Unimed que o réu assinou.

Além do mais, é o hospital que deve comprovar que o médico queatendeu à autora não faz parte de seus corpo clínico. E essa obrigação oréu satisfez.

Nos tratamentos curativos em geral e cirurgia terapêutica - agindocom culpa (negligência, imprudência ou imperícia), tanto na feitura dodiagnóstico quando nos procedimentos tomados - o médico e/ou hospitalresponde pelos danos causados não só econômicos mas tambémmorais. É a decorrência do princípio geral instituído no Artigo 159 c/c. oArtigo 1.545, ambos o Código Civil.

Quanto à matéria os tribunais têm entendido:

  "Ilegitimidade de Parte - Passiva - Inocorrência - Indenização - Erro

médico - Hospital que presta serviços - Recurso parcialmente provido.Pendendo de produção de provas no sentido de apurar a culpa dos médicos que

atenderam o autor, aliado ao fato de o hospital ter o dever de vigilânciasobre os profissionais que prestam serviços em suas dependências, é ele

parte legítima para figurar no polo passivo da demanda." (Agravo de

Instrumento n. 268.247-1 - São Paulo - 7ª Câmara Civil - Relator: Rebouças

de Carvalho - 20.09.95 - V.U.)

  "Indenização - Responsabilidade civil - Ato ilícito - Negligência

médico-hospitalar - Erro médico - Cirurgia plástica paga através de carnet -Deformações nos seios e vagina - Verba devida - Responsabilidade solidária

caracterizada - Recurso não provido." (Relator: Cunha de Abreu - ApelaçãoCível 146.007-1 - São Paulo - 29.08.91)

A ausência ou não de culpa do médico plantonista é matéria demérito e não de defesa processual. Além do que deve–se deixar claro Issosem dizer que a responsabilidade subjetiva é só do profissional liberal. Ohospital, como fornecedor de serviço, tem responsabilidade objetiva(inteligência do artigo).

D) Da Denunciação à lide da Santa Casa e do Hospital da Criança:

  Em relação a denunciação à lide da Santa Casa de CampoGrande e do Hospital da Criança, deve-se dizer que não cabe, posto que

não estão presentes nenhuma das hipóteses previstas nos três incisos doartigo 70 do Código Civil.

Por outro lado, em momento algum, a autora alegou qualquerresponsabilidade dos litesdenunciandos, nem o fez o réu denunciante.

Além do que a figura da intervenção de terceiro é estranha ao Códigode Defesa do Consumidor, com a exceção prevista no seu inciso I do artigo

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101, que só admite o chamamento ao processo.

O código quer que o consumidor veja reconhecido seu direito deindenização prontamente, sem que haja discussão sobre culpa dofornecedor. Não seria justo que o fornecedor ajuizasse ação de

denunciação da lide para discutir culpa de outrem que deve indenizar-lheem regresso, retardando o procedimento indevidamente, por introdução defundamento novo na demanda. A denunciação da lide é expressamentevedada (art. 88), facultando-se ao fornecedor prosseguir contra o terceironos mesmos autos (parágrafo único do artigo 13 do CDC), nas condições emodos previstos na lei protetiva.

Nesse sentido caminham os tribunais do país:

  "DIREITO DO CONSUMIDOR – DENUNCIAÇÃO DA LIDE

  O instituto da denunciação da lide, por ser um complicador processual por excelência, é incompatível com o objetivo traçado pela Lei 8.078, de

1990, de fornecer proteção rápida e eficaz a toda pessoa física ou jurídicaque adquire ou utiliza produto ou serviço como destinatário final, e a mais

ninguém ( AI 197.382-1, 5.5.93, 7ª Código Civil TJSP, rel. Des. Souza Lima,in JTJ 148/205 -. In Dicionário Jurisprudencial, com referência doutrinárias

e de legislação, da Doutora Dagma Paulino dos Reis, 3a edição, RT, p. 573)"

Se o objetivo do réu é eximir-se da responsabilidade, comprovandoculpa exclusiva de terceiro, nos termos do artigo 14, § 3o, inciso II, doCodecon, não tem ele interesse de agir. Ademais, é mais fácil para elecomprovar a culpa de terceiro sem esse terceiro nos autos do que com a

presença dele e sob o princípio do contraditório.

E) Da Litigância de má-fé:

Efetivamente, as narrações dos fatos feitos na inicial apresentaramalgumas omissões, mas isso não tem o condão de levar a uma litigância demá-fé. Se alguma falha houve esta não pode ser imputado à autora e simao seu advogado. Os documentos fornecidos pela genitora da requerenteao advogado e que se encontram às f. 15 a 349 demonstram todo oocorrido e o direito líquido e certo da menor vítima, que de forma algumaestá agindo de má-fé.

As possíveis distorções ocorridas na inicial já foram corrigidas nostermos de declarações que seguem em anexo. O Ministério Públicoresolveu ouvir a genitora da menor reclamante para suprir possíveisdeficiências encontradas na peça inaugural e evitar que haja uma indevidacondenação por má-fé por parte da autora.

Pelas possíveis omissões encontradas na inicial, não se pode

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responsabilizar a autora. Seria ela duplamente prejudicada. Primeiramentepelo profissional da medicina e agora pelo profissional do direito.

F) Da Impugnação ao deferimento da justiça gratuita:

A assertiva de que inexiste nos autos afirmação feita pelosinteressados de que eles não estão em condição de pagar as custas doprocesso e os honorários advocatícios, sem prejuízo do sustento próprio ede sua família, não procede. O constante à f. 10 já é o suficiente para o juizanalisar o pedido, deferindo-o ou não.

Tal assertiva é valiosa ao ponto de, em sendo falsa, autorizar aresponsabilização criminal dos representantes legais da autora.

A cláusula fixando honorários advocatícios só prejudica o próprioadvogado da menor que não fará jus a tais verbas, por constituir tal avença

contrário a disposição ilegal. Esse é, inclusive, o entendimento inserto nadecisão citada pelo réu à f. 378 (processo 88, n.o 199, do TJ/MS).

Não basta o réu afirmar que o pai e a mãe da autora - por serem,respectivamente, comerciante e funcionária pública - têm condiçãoeconômica para constituir advogado e para pagar honorários. Para desfazera presunção legal de que a autora faz jus a Justiça gratuita é necessárioque se faça prova robusta em contrário.

Entender diferentemente é afrontar a lei e causar empecilhos aoexercício do direito constitucional da ação. Além do mais, a legislação

consumerista, ao tratar dos instrumentos para a execução da PolíticaNacional das Relações de Consumo, colocou como uma de suas molasmestras a manutenção da assistência jurídica, integral e gratuita, para oconsumidor carente.

Segundo informação do patrono da autora ao Ministério Público, queo contatou, os honorários advocatícios ficaram constando do instrumentoprocuratório porque, inadvertidamente, foi usada a procuração padrão doescritório, onde já está impressa a cláusula concernente àquela verba.

Mister se faz observar ainda, neste particular, que a forma como tais

honorários estão estipulados em contrato padrão ferem o disposto noArtigo 51, inciso X, do Codecon, dado que está a permitir que o causídicofornecedor do seus serviços profissionais fixe o preço que julgar cabível,posto que a tabela da OAB estabelece o limite mínimo para os honorários enão o máximo. Ofende, sem dúvida, tal cláusula o princípio da boa-féobjetiva e da harmonia que deve existir na relação de consumo, trazendo,por conseguinte, desvantagem exagerada ao consumidor e enriquecimento

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ilícito ao advogado.

G) Quanto ao mérito da causa:

A fim de se verificar se ocorreu ou não culpa dos facultativos que

atenderam a autora, expor-se-á em seguida alguns dados teóricos que se julga indispensáveis a análise da questão.

  1) Das obrigações assumidas pelos médicos nos tratamentoscurativos e nas cirurgias terapêuticas:

Certo é afirmar que, normalmente, a obrigação assumida pelomédico é de meio e não de resultado, o que leva a conclusão de que omédico se obriga, nos tratamentos curativos em geral e nas cirurgiasterapêuticas, a tratar do doente com zelo, diligência e carinho, utilizando osrecursos de sua profissão e arte. Isso porque a medicina não é uma ciência

exata.

Assim, o médico que age com culpa (negligência, imprudência ouimperícia), nos tratamentos curativos e nas cirurgias terapêuticas, tanto nacoleta de dados, quanto na feitura do diagnóstico e nos procedimentostomados, deve responder pelos danos causados, tanto econômicos quantomorais. É a decorrência do princípio geral instituído no Artigo 159 c/c oArtigo 1.545, ambos o Código Civil, este último com a seguinte redação:

  "Art. 1.545. Os médicos, cirurgiões, farmacêuticos, parteiras e

dentistas são obrigados a satisfazer o dano, sempre que da imprudência,

negligência, ou imperícia em atos profissionais, resultar morte,inabilitação de servir, ou ferimento".

Sendo certo que estas disposições não foram revogadas pelo Códigode Defesa do Consumidor, que, apesar de prevê que a responsabilidade emgeral pelos vícios do serviço é objetiva, dispõe, em seu Artigo 14, § 4º. quea responsabilidade pessoal dos profissionais liberais, aí incluído o médico,será apurada mediante a verificação de culpa.

  2) Da responsabilidade dos hospitais:

Há que se observar aqui que a responsabilidade subjetiva é domédico, como profissional liberal, e não do hospital, cujaresponsabilidade é objetiva.

  3) Dos Passos a serem seguidos pelo médico para tratamentodas doenças:

Os profissionais da medicina, para tratar o doente com zelo,

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diligência e carinho, utilizando-se de forma adequada dos recursos de suaprofissão, devem percorrer os seguintes passos:

  a) saber de antemão qual é a queixa principal do paciente, isto é,saber do doente porque ele o procurou;

  b) traçar a história clínica do doente, através da narração feitapelo próprio paciente;

  c) fazer exame físico (contato físico do médico com o paciente);

  d) solicitar exames complementares, que podem ser a)laboratorial (de sangue, fezes e urina); b) Raio X; c) ultra-sonografia(ecografia); e outros;

  f) levantar a hipótese diagnóstica (diagnóstico não definitivo);

  g) fazer o diagnóstico definitivo. Os tratamentos futuros terãocomo base esse diagnóstico, que, em sendo errado, comprometerá todo otratamento; e

  h) realizar a conduta ou procedimento correto para viabilizar acura ou até mesmo para buscar apenas a amenização da dor do doente,quando a cura não é possível. Esta conduta pode ser clínica (como. porexemplo, internação) ou cirúrgica (operação).

  4) Motivos dos erros médicos:

Os erros médicos são possíveis e ocorrem por vários motivos. Dentreesses motivos, pode-se citar os seguintes:

a) o fato de não ser a medicina uma ciência exata e estar emconstante evolução;

b) constante surgimento de doença novas;

c) desqualificação dos profissionais de medicina (ou por falta deinteresse pessoal ou em virtude da degeneração do ensino superior);

d) falta de paciência necessária de alguns profissionais da medicina,em seguir os passos necessários até chegar ao diagnóstico definitivo;

e) displicência e, até, descaso de alguns médicos, principalmente emrelação aos casos que julgam serem de pequena importância ou por setratar de doentes desfavorecidos de recursos materiais; e

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f) pura omissão, negligência, imprudência e/ou imperícia médica,chegando até as raias, em alguns casos, do dolo eventual.

  5) O que vem a ser apendicite, quais os cuidados que requere como diagnosticá-la:

Apendicite é a inflamação do apêndice, que é uma pequena saliênciado ceco, com a forma de dedo de luva, situada na primeira parte dointestino grosso.

O tratamento da apendicite (que é geralmente sua extirpação,conhecida como apendicectomia) deve ser feito de imediato, posto que suademora (de 24 a 48 horas) ocasionará fatalmente a perfuração do apêndicecom vazamento fecal para as cavidades abdominais, causando aperitonite(3) (infecção generalizada do abdome) "e/ou formação deabscesso(4) apendicular ." (Manual de Clínica Médica, de R.M. Macklis, M. E.

Mendelsohn & G. H. Mudge, Jr., Tradução de Maria de Fátima Azevedo e Jacob Israel Lemos, Ed. Medsi, 1985, p. 214).

A faixa de incidência da doença varia de literatura para literatura. Amaioria delas, porém, coloca a idade de 12 anos como uma idade degrande incidência dessa doença.

  Manifestações clínicas da apendicite. Quadro. "O quadroclássico inicia-se com desconforto epigástrico(5), anorexia (falta deapetite), vômitos e náuseas. Após algumas horas a dor se desvia para a FID(fossa ilíaca direita), às vezes localizando-se no ponto de McBurney (ver

ilustração em anexo). Entre os achados associados estão febre, leucocitosecom desvio para a esquerda, constipação e sinal do psoas e do obturador."(Manual de Clínica Médica, de R.M. Macklis, M. E. Mendelsohn & G. H.Mudge, Jr., Tradução de Maria de Fátima Azevedo e Jacob Israel Lemos, Ed.Medsi, 1985, p. 214).

Richard Stillman, no seu livro Cirurgia – diagnóstico e tratamento,traduzido por André Luiz Becker et alli – Porto Alegre: Artes Médicas, 1991,ao tratar de apendicite, na p. 604, assim dispõe:

  "Sintomas: Dor epigástrica, náuseas, vômitos, depois dor localizada.

  Sinais: Sensibilidade sobre o local do apêndice (que pode variar).

  Diagnóstico: usualmente baseado apenas nos achados clínicos;

radiografia de abdômen pode ser útil.

  Tratamento: apendicectomia."

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A literatura médica existente sobre o assunto é unânime em afirmarque há uma dificuldade muito grande para se diferenciar, principalmentenas crianças, a apendicite da gastroenterite(6). Além do que ela podecamuflar outros distúrbio abdominais, entre eles a pancreatite. Dessaforma o médico deverá lançar mão do diagnóstico diferencial,

fazendo-se as eliminações necessárias (processo de eliminação).

Jean H. Gilles, MD, FRCPC e outros, no livro Plantão (on call) –princípios e protocolos, traduzido por Gabriel Prolla e Ricardo Ossanay,Artes Médicas, Porto Alegre, 1991, demonstra que o diagnóstico dasdores abdominais requer maiores cuidados do profissional damedicina:

  "As causas de dor abdominal localizada são numerosas. Um sistema útil

para abordar o problema é o diagnóstico diferencial pela localização. A

figura 4-1 (em anexo) ilustra o diagnóstico diferencial pelo localização."

(página 41).

No mesmo sentido, dispõe o já citado Manual de Clínica Médica deR.M. Macklis:

  "IV Diagnóstico Diferencial. O principal diagnóstico diferencial é a

apendicite versus gastroenterite." (página 214).

  No caso de dúvida, deve o médico optar pela imediataintervenção cirúrgica, fazendo a apendicectomia, posto que o retardopoderá trazer complicações letais. Tal operação não trará dano algum aopaciente, mesma na hipótese de não se estar diante de uma apendicite

aguda, posto que, neste caso, o profissional poderá extirpar o apêndice,realizando uma cirurgia profilática. Essa extração prematura não traránenhum prejuízo para o paciente, já que a medicina ainda não descobriuutilidade alguma para essa saliência. O que não pode ocorrer é retardaruma operação de apendicite, colocando o enfermo em situação de altorisco de vida.

No "Manual Merck de Medicina – Diagnósticos e Tratamento, em sua15a edição, Editora Roca, p. 842, vê-se confirmada a assertiva acima:

  "Diagnóstico e Diagnóstico Diferencial

  (....). O índice de 20 a 30% de apêndices normais removidos mostra quea preocupação que demanda da certeza absoluta do diagnóstico, pode levar a

retardo na operação e a um índice inaceitável de perfurações.

  (....).

  Contudo, o clínico sensato pensará em apendicite em qualquer paciente

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com início súbito de dor.

  (....).

  Prognóstico

  Com cirurgia precoce, a letalidade é baixa, o paciente tem alta em 4 a

5 dias e a convalescença geralmente é rápida e completa. Com complicações, o

prognóstico é mais sério; em se desenvolvendo o abscesso apendicular, aresolução final pode levar muitas semanas."

  6) Evolução da apendicite para a peritonite e criação deabscesso e sintomas da peritonite:

Diz a literatura médica que um quadro de apendicite quandoagravado causará a perfuração do apêndice, fazendo com que as fezes dopaciente sejam depositadas na cavidade abdominal o que poderá ocasionar

a peritonite e/ou abscesso apendicular (Manual de Clínica Médica, de R.M.Macklis, M. E. Mendelsohn & G. H. Mudge, Jr., Tradução de Maria de FátimaAzevedo e Jacob Israel Lemos, Ed. Medsi, 1985, p. 214).

Nota-se, no caso concreto, a tipificação da situação descrita peladoutrina médica, de forma agravada, posto que foi diagnosticado na menorperitonite e abscesso.

Segundo o Manual Merck de Medicina – Diagnósticos e Tratamento,em sua 15a edição, Editora Roca, p. 843, o início da peritonite

"é marcado por dor abdominal intensa, localizada ou difusa. Nospacientes tratados com esteróides, a dor e a sensibilidade podem ser

mascaradas. Nos estágios iniciais, como desenvolve-se íleo paralítico, estápresente distensão abdominal moderada, geralmente com náuseas e vômitos e,

ocasionalmente, com diarréia. Estão presente hipersensibilidade dolorosa doabdome, descompressão brusca e espumo muscular acentuado; a descompressão

brusca pode ocorrer sem a hipersensibilidade à palpação direta. Mais tarde,

o abdome fica sem ruídos à ausculta. O exame retal revela sensibilidade

pélvica e pode mostrar um abscesso pélvico. As radiografias simples doabdome podem mostrar preenchimento gasoso difuso de delgado e colo e

ausência de alças bem-definidas. A tomografia e a ultra-sonografia são úteisna detecção de abscessos intra-abdominais.

  Febre, taquicardia, calafrios, taquipnéia e leucocitose são sinais desepse; respiração rápida e superficial sugere irritação diafragmática com

imobilização. Soluços e dor no ombro indicam envolvimento diafragmático. O

vômito, inicialmente de origem reflexa, geralmente persiste, indicando íleo.

Os olhos ficam encovados e a boca seca; o colapso circulatório pode serfatal; finalmente, o abdome está tenso e distendido e aparece o "fácies

hipocrático" tipicamente contraído".

Quando a menor compareceu no hospital do réu, pediu

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insistentemente que o médico passasse um remédio para dor e esteinsensível a situação da criança não lhe deu a mínima, passando apenasdigesan. Era a menor a própria descrição do sintoma de peritonite, emcarne e osso, diante do médico.

Todos os exames físicos e complementares sugeridos para o casonão foram feitos.

  7) Sintomas da gastroenterite e os exames necessários paradiagnosticá-la:

É uma inflamação simultânea do estômago e do intestino causadapor vírus, parasitas, bactérias ou intoxicação.

Ensina a literatura médica que

"O caráter e gravidade dos sintomas depende da natureza e dose doirritante , a duração da ação, a resistência do paciente e a extensão doenvolvimento GI. O início é freqüentemente súbito e, às vezes, dramático,

com anorexia, náusea ou vômito; borborigmo, espasmos abdominais e diarréia,com ou sem sangue e muco. Pode ocorrer mal-estar, dores musculares e

prostração.

  O vômito e diarréia persistentes levam a desidratação grave choque,

com colapso vascular e insuficiência renal oligúrica. Se o vômito causarperda excessiva de líquidos, ocorre alcalose metabólica com hipocloremia; se

a diarréia for mais intensa, é mais provável haver acidose. A hipocloremiapode resultar tanto do vômito quanto da diarréia excessivos. Pode ocorrer

hiponatremia, particularmente se líquidos não-eletrólicos forem usados na

reposição. A desidratação grave e o desequilíbrio ácido-básico podemproduzir cefaléia e sintomas de irritabilidade nervosa e muscular.

O abdome pode estar distendido e flácido; nos casos graves, pode estar

presente defesa. As alças intestinais distendidas por gás podem ser vistas e

 palpadas. O borborigmo(7) é auscultado mesmo sem diarréia ( importante

característica diferencial do íleo paralítico). A PA pode estar reduzida, opulso rápido e a temperatura elevada. Podem estar presentes os sinais de

depressão do líquido extracelular". (Manual Merck de Medicina – Diagnósticose Tratamento, em sua 15a edição, Editora Roca, p. 866).

Para o diagnóstico da gastroenterite a predita obra ensina que

"o exame e a cultura das fezes estão indicados, exceto se os sintomas

cederem em 48h". E vai além ao dizer que " estes e outros diagnósticos

diferenciais podem exigir cultura de alimentos, vômito, fezes urina esangue: testes de aglutinação específicos (positivos após cerca de 1 semana)

podem também ser úteis".

Embora haja grande dificuldade para se diferenciar a peritonite dagastroenterite, o simples exame físico poderia ajudar no diagnóstico

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diferencial, posto que na gastroenterite o abdome estará distendido eflácido, ao contrário da peritonite, que ele estará rígido. Mais ainda, nagastroenterite o abdome faz barulho característico, semelhante ao que fazquando se sopra com um tubo dentro de um copo d´água. Uma simplesauscultação(8) dessa região ajudaria o médico a fazer o diagnóstico exato.

A peritonite também poderia ser facilmente reconhecida com a simplespalpação por sobre a região do apêndice, posto que a paciente nãoagüentaria de dor e "urraria".

Mesmo no caso de firme convicção de que se tratava degastroenterite, o fato de o sintoma ter persistido por mais de 48 horas, ofacultativo já estava obrigado a solicitar o exame de fezes, o que não fez.

  8) Sintomas da pancreatite e os exames necessários paradiagnosticá-lo:

Segundo o Manual de Clínica Médica, de R.M. Macklis, M. E.Mendelsohn & G. H. Mudge, Jr., Tradução de Maria de Fátima Azevedo e Jacob Israel Lemos, Ed. Medsi, 1985, p. 215, "pancreatite é uma inflamaçãoaguda ou crônica do pâncreas. Ainda segundo a predita obra literária, apancreatite aguda deve ser diferenciada das outras causas deinflamação abdominal: coletitíase, cálculos no ducto comum, obstrução ouperfuração intestinal, gravidez ectópica, doença inflamatória pélvica, úlcerapéptica. Já a pancreatite crônica deve ser diferenciada das síndromes demá absorção, divertículos, carcinoma pancreático.

Embora a literatura médica sobre o assunto obrigue o médico a

diferenciar a pancreatite das outras inflamações abdominais, o médico doréu não procurou tomar mínimas iniciativa para que isso ocorresse.

  9) Da culpa dos médicos plantonistas e dos seus errosgrosseiros:

Conforme se conclui pela leitura das declarações prestadas pelaSenhora Vicentina Aparecida Corrêa Leitão (termo em anexo), os médicoplantonistas do Hospital Infantil São Lucas - primeiramente o Dr. Higa e,posteriormente, o Dr. José Antônio Palhano, tiveram oportunidades ímparespara fazer um diagnóstico correto da doença da autora, de modo a evitar

todos os transtornos e perigos pelos quais ela passou, mas não souberamaproveitar tais oportunidades. Lendo a literatura médica sobre o assunto eo relato feito pela mãe da menor autora, tem-se a nítida impressão de queos médicos do réu haviam combinado para fazer de tudo para que a vítimareclamante não tivesse o tratamento correto e morresse. Não é possívelque, com a clareza dos sintomas e com a forte recomendação médica deque em caso de dúvida deve-se optar pela ocorrência de apendicite e fazerde imediato a cirurgia, um médico com 16 anos de profissão possa cometer

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um erro crasso desse sem estar agindo, pelo menos, com dolo eventual.

Embora o primeiro médico que atendeu a menor soubesse de suaqueixa principal, ele sequer ouviu a narração da paciente para saber oque ela havia ingerido nos momentos antecedentes ao surgimento das

dores, para saber com certeza que se tratava de intoxicação alimentar.

A mãe da menor foi firme em suas declarações quando afirmou:

  "Inquirida, declarou: Que no dia 03 de janeiro de l996, por volta das

09 horas a menor Viviane Correia Leitão apresentou os primeiros sintomas,quais sejam: febre, diarréia, vômito e dor abdominal e às 11 horas a

declarante a levou ao Hospital São Lucas, sendo atendida pelo médico deplantão, Dr. Higa. O médico, sem realizar qualquer exame, disse que o quadro

apresentado poderia ser conseqüência de algum alimento ingerido, então

receitou digesan e soro caseiro e nesse momento a menor solicitou ao médico

que receitasse um remédio para amenizar a dor que estava sentindo, ao que oDr. Higa respondeu que não iria receitar nenhum medicamento para dor, porque

primeiro a paciente necessitava expelir tudo o que lhe estivesse fazendomal. Disse que a paciente poderia retornar para sua casa e recomendou

repouso. Contudo, mesmo tomando a medicação sugerida os sintomas nãodesapareceram."

A displicência do facultativo foi tamanha que, apesar da dúvida deque foi acometido ("poderia ser"), não fez os exames físicos imprescindíveisnem requisitou os exames complementares necessários, tais como examede sangue, fezes, urina, raio x, etc.

Com o diagnóstico feito, sem qualquer coleta de dados, demonstrou

ser o médico precipitado, negligente e imperito. O seu erro foi grosseiro,bem como criminoso foi o procedimento que adotou.

Foi leviano o clínico. deixou-se enganar pela diarréia(8), posto que,segundo a literatura médica existente, é um sintoma raro nos casos deapendicite. A oitiva atenta da história clínica da paciente e o exame físicotirariam qualquer dúvida, porventura existente. Mas se persistisse ainsegurança deveria ele ter feito os exames laboratoriais necessários. Semesmo assim a dúvida continuasse, a prescrição correta e imediata seria aapendicectomia, como já demonstrado acima.

Confundiu o médico plantonista dor na barriga com dor de barriga,posto que não ouviu com a paciência e a atenção devida a história clínica.O exame físico seria outro auxiliar inestimável, posto que o simples fato defazer a menor subir a mesa para exame já daria ao clínico o matériasuficiente para o diagnóstico correto (a criança jamais iniciaria a subida àmesa com a pena direita, por instinto de defesa do local dolorido), sem, noentanto, desprezar a palpação correta, feita na forma descrita à f. 225/226do livro Manual de Exame Clínico, de Fernando Bevilacqua e outros, Editora

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Cultura Médica Ltda., 10a edição, RJ (cópia em anexo).

O Dr. José Antônio Palhano, não agiu com menor negligência,imperícia, desídia e descaso que seu antecessor. O quadro descrito pelapróprio mãe, que dizia que a filha repuxava a perna direita e negava-se a

esticá-la era um indicador certo da evolução do quadro de apendicite paraperitonite.

Mesmo depois da genitora da autora ter sugerido que poderia serapendicite, o referido facultativo continuava em seu erro, apesar de estarcontrariando todas as recomendações da medicina alopática para o casoque se lhe apresentava.

A narração da Senhora Vicentina Aparecida Corrêa Leitão forneceuelementos necessários para qualquer leigo fazer o diagnóstico correto. ODr. Palhano, no entanto, não deve sequer ter olhado para a menor, posto

que seu quadro clínico indicava o mal do qual ela estava acometida.

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Parecer em indenização por erro médico 

Página 2 de 2

Para notar os absurdos cometidos por este clínico, basta ler atranscrição das declarações que a genitora da autora fez sobre o caso naPromotoria de Justiça dos Direitos Constitucionais do Cidadão e das Vítimasde Infrações Penais:

  "Que a declarante, naquele mesmo dia, por volta das 22 horas percebeu

que sua filha apresentava um quadro pior do que pela manhã, com febre alta,

vômito e dor localizada à direita do ventre, abaixo do umbigo; bem como dor

na perna direita. Momento em que a declarante decidiu levar Viviane CorreiaLeitão novamente ao Hospital São Lucas. Lá chegando a menor foi atendida

pelo Dr. José Antônio Palhano, que de pronto se identificou como um dos

sócios do hospital . A declarante disse ao médico que desconfiava que o caso

 poderia ser apendicite, porém o Dr. Palhano refutou tal declaração dizendo

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que Viviane Correia Leitão estava com uma forte intoxicação alimentar e que

seus dezesseis anos de profissão o capacitavam para tal diagnóstico. Que a

declarante solicitou ao médico a realização dos exames necessários, todavia

o Dr.. Palhano disse que não era necessárioe que o tratamento era clínico enão cirúrgico, assegurando à declarante que se fosse caso de cirurgia ele

encaminharia a paciente para tal atendimento, já que o hospital estavapreparado para tal situação. A menor ficou internado no Hospital São Lucas

até o dia 06.01.96. Durante tal período a paciente recusava todo tipo de

alimento que lhe era oferecido, pois tinha desconforto gástrico e não

suportava cheiro de alimento. Que a menor também não conseguia tomar banho,porque não suportava o cheiro do sabonete. Recebendo alta médica por se

encontrar "melhorada" (f.39 dos autos do processo). Que quando retornou parasua casa, por volta das 11 horas, a menor voltou a apresentar febre alta e

vômito, com o agravante de sentir fortes dores no abdômen, assim como

distensão e rigidez deste, falta de apetite e ainda não suportava o cheiro

de alimentos que começava a passar mal. No domingo (07.01.96) a declarantetelefonou para o Dr. Palhano informando sobre o estado de saúde da sua

filha. Como resposta o Dr. Palhano lhe informou que os sintomas apresentadospela menor estavam em conformidade com a forte intoxicação que ele havia

diagnosticado. Que o Dr. Palhano afirmou que não era para forçarem a menor a

se alimentar. Que a declarante chamou sua mãe para que então preparasse umaalimentação diferente para a menor, porém mesmo assim Viviane não se

alimentava. Que a mãe da declarante também achava que o caso se tratava de

apendicite. Que toda a família da declarante se reuniu em sua casa e todos

concordaram com a possibilidade de ser apendiciteo problema que Viviane

tinha. Que a menor não apresentou qualquer melhora, motivo pelo qual adeclarante levou-a na segunda-feira (08.01.96), por volta das 07 horas,

novamente, ao Hospital São Lucas. Lá chegando a menor foi atendida pelo Dr.

Palhano. Sem solicitar qualquer exame médico, o Dr. Palhano disse que

Viviane Correia Leitão apresentava um quadro de pancreatite e quis internara paciente, entretanto a declarante não permitiu a internação sem a

realização do exame de sangue. Que o Dr. Palhano então requisitou arealização de exame de sangue na menor. Que o resultado do exame ficou

pronto por volta das 16 horas, porém a declarante não conseguiu localizar o

Dr. Palhano para que este pudesse interpretar o resultado obtido. Em ato

continuo a declarante se dirigiu até o Hospital São Lucas para que qualquer

médico pudesse lhe dizer o resultado do exame, até porque sua filha quase

não conseguia andar. Que foi atendida pela Dr. Lídia, que estava de plantão.Que a Dra. Lídia ao ler o resultado do exame e fazer exame físico, naquele

 mesmo dia 08.01.98, disse que era possível para perceber que há mais ou 

 menos cinco dias a apendicite tinha estourado . Que então a Dra. Lídia, após

pedir a permissão da mãe, chamou com urgência a Dr. Maria Regina Ajala paradar início a cirurgia de apêndice na menor. Ao terminar a cirurgia, a Dra.

Maria Regina confirmou o que a Dra. Lídia havia dito, ou seja, que a

apêndice da paciente havia estourado há mais ou menos cinco dias, o que

ficou constando do na guia de solicitação (f. 53 dos autos)."

Sem ouvir a história clínica, sem fazer os exames físicos necessários,sem requisitar qualquer exame complementar, insistiu que era caso deintoxicação alimentar, tendo descrito à f. 40 que a menor estava acometidade gastroenterite e desidratação, quando ela já estava com apendicitesupurada, lançando pus e fezes por toda a cavidade abdominal.

Deixou-se, levianamente, se enganar também pela diarréia(9) de

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que era acometida a menor. Desprezou todos os outros sintomas e todos osensinamentos acadêmicos recebidos nos bancos da faculdade de medicina.

A atitude deste médico foi mais que negligente, foi criminosa. Seudiagnóstico e a conduta que teve foram reflexo de sua atitude

irresponsável inicial.

Cometeu ele erro grosseiro. No momento que percebeu que nãotinha mais como enganar a mãe com sua cretina irresponsabilidade,desapareceu. Teve oportunidade de corrigir os erros iniciais, mas não o fez.Acovardou-se. Valendo-se de sua experiência profissional, percebeu que ocaso estava já perdido e não poderia ele se comprometer nessa altura dosacontecimentos. Tentou jogar o homicídio para outro, mas graça a umaprovidência divina, este não ocorreu.

Há de se concluir que os erros grosseiros desses dois profissionais

que atenderam a autora foram os responsáveis direto por todos asconseqüências advidas à menor vítima. Sendo eles, um empregado do réue outro o seu sócio (doc anexo), inevitável é a responsabilização do réu.

  9) Do erro cometido pelas médicas que fizeram aapendicectomia:

Em caso de peritonite, que é uma inflamação generalizada dosintestinos, causados pelas fezes e pus que vazaram através da apêndice, oprocedimento que deve ser feito, após a extração da apêndice, éfazer uma limpeza cuidadosa de toda a cavidade abdominal, com

muito soro e antibiótico, isto com a finalidade de retirar toda matériafecal e pus, combater os germes lá existente (bactérias gran -) e mesmopara fazer uma assepsia completa até no local não afetado diretamente. Aomissão na feitura desse procedimento leva a criação deabscessos, inflamação e infecção generalizadas, com destruiçãodos órgãos localizados no abdômen e, por conseqüência, a mortesó paciente, salvo se o procedimento correto for tomado em curto espaçode tempo e com eficácia.

A Dr. Regina M. Araújo Ajala fez um laudo médico correto ("Criançaapresentando quadro de dor abdominal, localizada no FID + vômito

+ febre há 5 dias. (ilegível) finais de irritação peritonial localizadano FID", f. 53), fez um diagnóstico quase completo, pois omitiu aperitonite, que está relatada no relatório de f. 370, item 1 ("apendicite",f. 53) e prescreveu o procedimento parcialmente correto, posto que nãoprescreveu a necessidade de se fazer a limpeza cuidadosa e completa detoda cavidade abdominal, após a extirpação da apêndice("apendicectomia, f. 53").

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Embora na descrição da operação, que se encontra à f. 54-v, setenha afirmado que foi feita a limpeza da cavidade (sem mencionar qualcavidade), é certo afirmar que esta limpeza não foi feita ou foi feita deforma completamente inadequada ou a operação foi tão mal feita quecontinuou vazando fezes do intestino grosso para a cavidade abdominal da

criança através de algum orifício resultante da operação. O mais provável éque esta limpeza não tenha sido feita, isto porque: a) não foi pedido àgenitora da menor naquela oportunidade o fornecimento de soro e deantibiótico para tanto, apesar de a quantidade que deveria ser usada nãopoderia ser jamais inferior a 5 litros de soros; b) não seria admissível queuma profissional da medicina pudesse, após extirpar a apêndice, deixar defechar o orifício criado, para que por ali continuasse vazando fezes para oorganismo da menor autora; c) se a limpeza tivesse sido feita, as outrastrês operações teriam sido desnecessárias (a 2a cirurgia para resolver 

 problema de obstrução intestinal, quando foi retirado 40 cm deintestino da menor, por estar necrosado; a 3a, para resolver 

 problema de abdome agudo(10) e obstrução intestinal, com adrenagem de hematoma infectado; e a 4a, quando efetivamentefoi feita a lavagem que deveria ter sido feita por ocasião da

 primeira operação).

As declarações da mãe da autora, que se encontram em anexo aeste parecer, confirmam as conclusões tiradas acima:

  "Que após a realização do exame Viviane piorava cada vez mais. Que a

declarante entrou em desespero, chorando muito, até que em um determinado

momento deparou com a Dra. Regina nos corredores do hospital. Que a Dra.

Regina olhou para a declarante com descaso e disse: ‘vou dar alta paraViviane e internar a mãe dela’. Aumentando ainda mais o sofrimento edesespero da declarante. Que após a realização do Raio-X a Dra. Regina disseque se a menor não melhorasse com a medicação prescrita seria submetida a

uma intervenção cirúrgica na manhã do dia seguinte (17.01.96), em virtude de

que com o estouro da apendicite se criou um líquido infeccioso no intestino

(abcesso). Que a cirurgia para retirar tal abscesso e as aderências das

alças intestinais devido aos abcessos, foi realizada no dia 17.01.96. Que

após a segunda intervenção cirúrgica a menor não apresentou melhora,permanecendo internada.

  (....).

  Que por volta das 18 horas, naquele mesmo dia, a menor começou avomitar e ter febre, momento em que as enfermeiras se mobilizaram paramedicar a paciente, porém a declarante não permitiu tal procedimento e

entrou em contato com o Dr. Abdul K. Y. Omais para que ele fosse até oHospital São Lucas olhar a paciente, já que a declarante não tinha mais

confiança no hospital e nos médicos. Que o Dr. Abdul reafirmou à declarante

que antes era preciso uma permissão do Dr. Carlos Augusto Yonamine e da

Direção do Hospital São Lucas. Que a declarante solicitou tal permissão,sendo-lhe concedida. Que no mesmo dia o Dr. Abdul foi até o Hospital São

Lucas e informou à declarante sobre a gravidade do estado clínico da

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 paciente, dizendo que somente pegaria o caso se a menor fosse transferida

 para o CTI da Santa Casa e também fosse providenciado sangue para a terceira

cirurgia. Que a intervenção cirúrgica começou a zero hora do dia 25.01 e

terminou às 05 horas do mesmo dia. Que após a cirurgia o Dr. Carlos AugustoYonamine informou à declarante que havia realizado uma jejunostomia (para

separar o intestino grosso do jejuno) na paciente e que havia extirpado mais

ou menos quarenta centímetros do intestino, na parte entre o delgado e o

jejuno, com o objetivo de proteger o intestino grosso que se encontrava

 bastante afetado. Que a declarante ao receber a notícia do médico desmaiou e

foi socorrida pelo sua irmã, irmão e cunhado. Que a declarante após retomarconsciência do desmaio não tinha forças para ver sua filha, necessitando de

apoio constante da sua família. No mesmo dia (25.01.96), por volta das 10horas a menor foi removida para o CTI da Santa Casa, permanecendo neste

centro de terapia até o dia 31.01, sendo removida, então, para um

apartamento daquele mesmo hospital, onde permaneceu até o dia 07.02, quando

recebeu alta. Que a paciente antes de receber alta apresentava um perigosoquadro febril, porém os médicos não conseguiam descobrir a causa, e como

último recurso deram alta a paciente que de imediato obteve melhoras."

Mister se faz deixar claro que as duas primeiras operações, ondeocorreram os equívocos médicos acima relatados, foram realizadas pelosmédico do Hospital Infantil São Lucas. Já a terceira e quarta cirurgias, queforam realizadas para corrigir os erros cometidos anteriormente e para serealizar a limpeza adequada, foram feitas, a terceira, com auxílio demédicos do Hospital da Criança, embora ainda realizada no hospital do réue a quarta foi realizada no Hospital da Criança. A descrição dosprocedimentos realizados na quarta operação se encontram à f. 107-v,cabendo salientar que nestas duas oportunidades foi solicitado da mãe daViviane grande quantidade de soro fisiológico e antibiótico, com o fim de seproceder a lavagem adequada da cavidade abdominal.

A declaração da Senhora Vicentina demonstra muito bem ondeexistiu os descuidos médicos e das próprias enfermeiras que cuidaram deViviane:

  "Que a declarante não tem nada do que reclamar da equipe médica que

realizou a terceira e quarta cirurgia na sua filha, bem como da Santa Casa eHospital da Criança, porém no que diz respeito ao serviço de enfermagem do

Hospital São Lucas a declarante diz que todas as enfermeiras tratavam a suafilha e ela própria de maneira rude. Que a menor tinha medo das enfermeiras,

já que elas a tratavam com grosseria. Que durante os períodos noturnosquando a paciente passava mal a declarante não encontrava enfermeiras para

socorrer sua filha e era necessário procurar por todo o hospital e que a

declarante inúmeras vezes encontrava-as dormindo nos leitos vazios daquelehospital. Que no dia 24.01.96, por volta das 15 horas uma enfermeira deplantão levou uma medicação para a menor tomar e como a paciente estava com

muito desconforto gástrico não conseguiu ingeri-la. Que então a declarantecomunicou à enfermeira que sua filha não conseguiu ingerir a medicação que

ela havia deixado. Oportunidade em que a enfermeira respondeu que a Viviane

era uma menina muito dengosa. Que neste momento a declarante começou a

chorar, já que se encontrava muito debilitada emocionalmente por tudo o queestava acontecendo. Que a declarante disse à enfermeira que sua filha estava

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com febre e muito mal. Que mais ou menos duas horas após esse acontecimento

a menor piorou e a declarante foi chamar o Dr. Abdul. Que então o Dr. Abdulconvocou a equipe médica do Hospital da Criança para realizar a terceira

cirurgia na paciente, que se encontrava internada no Hospital São Lucas. Quea declarante não reclamou do atendimento prestado pelas enfermeiras no

Hospital São Lucas, à época dos fatos temendo uma represália em forma demedicação para sua filha."

Os sofrimentos pelos quais passaram tanto a menor quanto seus paise irmãos, os quais estão claramente descritos no já mencionado termo dedeclarações, se deveu, primeiramente, aos péssimos trabalhosdesenvolvidos pelos dois primeiros médicos que atenderam a autora vítimae, posteriormente, em face de duas operações mal feitas, posto que se alavagem das cavidades abdominais tivesse sido realizada em qualquer umadas duas primeiras operações, não teria havido a necessidade de qualqueruma das operações subseqüentes e a menor jamais passaria por tantostranstorno, risco de vida, UTI e por conseqüências gravíssimas que deverão

ser por ela suportada, quiçá, pelo resto de sua vida.  10) Dos danos morais e do seu valor:

No que tange à indenização por danos morais, há de se afirmar nestaaltura a sua dúplice natureza, como bem vêm entendendo a doutrina e jurisprudência. Com efeito, não se pode deixar o agente dos danos impunesnem sem as compensações devida a vítima em face de tão aviltantecomportamento, que lhe causou dor, humilhação e prejuízo a sua saúdefísica, moral e psíquica, como está evidenciado nos documentos que se faz juntar, principalmente no termo de depoimento prestado pela genitora da

autora.A simples comprovação da ofensa feita à vítima e à sua família já

 justifica a pretensão da autora.

Vale, nesse passo, citar a jurisprudência:

  "Hoje em dia, a boa doutrina inclina-se no sentido de conferir àindenização do dano moral caráter dúplice, tanto punitivo do agente, quanto

compensatório, em relação à vítima (cf. Caio Mário da Silva Pereira,"Responsabilidade Civil", Ed. Forense,1989, p. 67). Assim, a vítima de lesão

a direitos de natureza não patrimonial (CR, art. 5º, incs. V e X) deve

receber uma soma que lhe compense a dor e a humilhação sofridas, e arbitradasegundo as circunstâncias. Não deve ser fonte de enriquecimento, nem serinexpressiva" (TJSP - 7ª C. - Ap. - Rel. Campos Mello - j. 30.10.91 -

RJTJESP 137/186-187).

  "O dano simplesmente moral, sem repercussão no patrimônio não há como

ser provado. Ele existe tão-somente pela ofensa, e dela é presumido, sendo obastante para justificar a indenização"(TJPR - 4ª C. - Ap. - Rel. Wilson

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Reback - j. 12.12.90 - RT 681/163).

Em relação ao "quantum" da indenização pelos danos morais, vale apena dizer que não representa um ressarcimento, no sentido rigoroso dotermo, e, sim, uma compensação ou satisfação simbólica. Para se

estabelecer o "quantum" na indenização por danos morais, deve-seconsiderar a situação pessoal do ofendido e as posses do ofensor. Portanto,estipulando uma quantia que não resulte em enriquecimento ilícito, nemque seja inexpressiva. Sendo esta a análise do ilustre doutrinador CaioMário da Silva Pereira:

  "A vítima de uma lesão a algum daqueles direitos sem cunho patrimonialefetivo, mas ofendida em um bem jurídico que em certos casos pode ser mesmo

mais valioso do que os integrantes de seu patrimônio, deve receber uma somaque lhe compense a dor ou o sofrimento, a ser arbitrada pelo juiz, atendendo

às circunstâncias de cada caso, e tendo em vista as posses do ofensor e a

situação pessoal do ofendido. Nem tão grande que se converta em fonte de

enriquecimento, nem tão pequena que se torne inexpressiva."(ResponsabilidadeCivil cit., n.49, p.67)

O Ministério Público, em se tratando de danos morais resultante deacidente de trabalho, tem requerido, nas ações propostas pela Promotoriade Justiça do Acidentado do Trabalho e Vítimas de Infrações Penais, acondenação em 150 salários mínimos, o que equivaleria, mais ou menos,R$ 19.500,00.

Em 1995, em uma dessas ações, o Poder Judiciário, aplicando oprincípio da razoabilidade, condenou o Estado de Mato Grosso do Sul aopagamento, por danos morais, de R$ 15.000,00, o que constitui,logicamente, apenas um ponto de referência para esse magistrado.

  11) Sobre a contestação do réu:

Embora já se tenha dito tudo ou quase tudo que de essencial existe arespeito da causa, é mister fazer algumas considerações sobre acontestação do Hospital São Lucas, rebatendo-a de forma articulada, naordem que foi exposta pelo requerido.

1) O fato de o réu ter ou não vínculo contratual com o Previsul em

nada altera a realidade dos fatos nem lhe isenta de suas responsabilidades,pois a ação versa sobre danos morais e não trata de ressarcimento.

2) Diz o réu que a menor foi atendida, em 04/01/96, pelo Dr.Palhano e não apresentava sintomas "agudos de apendicite", masficou internada para observação, posto que reclamava de dor . Esqueceu-seele, por conveniência, de citar que na parte da manhã do dia 03/01/96, aautora havia sido atendida pelo Dr. Higa (receita em anexo), que, como o

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seu antecessor, foi negligente e imperito em sua arte, posto que não estefacultativo não se conduziu com toda a diligência na aplicação dosconhecimentos científicos, para alcançar, o quanto possível, a cura daenferma submetida a seus cuidados.

3) Nada autoriza o réu a afirmar que a menor não apresentavasintomas de apendicite aguda. O Dr. José Palhano nem sequer fez o examefísico necessário na criança. Além do mais, foi a própria médica do réu, aDra Regina Maria Araújo Ajala, que, no 8 de janeiro de 1996, após tertomado conhecimento do exame de sangue feito na criança e,posteriormente, realizado a intervenção cirúrgica na mesma, disse que aapendicite havia estourado há cinco dias. Fazendo-se as contas chega-sefolgadamente no dia 03/01/96, quando, pela noite (às 11h 45m), a vítimafoi atendida pelo referido facultativo, que também não prestou à autora oscuidados conscencioso a que estava devido, tanto é que desleixou decolocar em prática conhecimentos científicos basilares, de conhecimento

de qualquer acadêmico de medicina.

4) Efetivamente, no dia 8 de janeiro de 1996, a Dra Regina MariaAraújo Ajala, médica pediatra do réu, após analisar o exame de sanguefeito a pedido da mãe da autora, já que o Dr. Palhano se negavaterminantemente a fazer qualquer exame, quer físico quer laboratorial,chegou a conclusão de que se estava diante não de uma apendiciteaguda, simples, mas de uma apendicite supurada, conforme atesta odocumento de f. 370, firmado pelo Dr. Carlos Yonamine, médico que,segundo o réu, auxiliou a Dra Regina na cirurgia.

5) Diz o réu que não é verdade que a menor foi levada à pressa paraa Santa Casa, com o fim de lá ser operada de apendicite. Efetivamente, amenor não foi levada às pressas à Santa Casa para ser operada, mas foilevada, às pressas, a pedido da mãe, após a terceira cirurgia, para nãomorrer no Hospital São Lucas, onde os médicos só cometeram errosgrosseiros contra a indefesa vítima.

6) O fato de a autora ter sido operada por mais duas vezes noHospital São Lucas, por motivo de obstrução intestinal, antes de ser levadapara a UTI da Santa Casa, onde ficou de 25 a 31 de janeiro de 1996, nãosignifica que só por este motivo ela tenha recebido todos os cuidados

médicos necessários no hospital do réu.

7) O fato de o pedido de reembolso feito ao Previsul (f. 19) conter ounão informações inautênticas, nada tem a ver com a presente demanda enão demonstra, de forma alguma, que a representante da autora estáagindo, nesta ação, com má-fé. A questão com o Previsul já está posta em juízo (documento em anexo) e caberá tão somente ao juiz que estápresidindo os autos decidir sobre todos os pontos controvertido referente

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ao caso.

8) A afirmação de que a autora "quer de qualquer modo reaver odinheiro gasto com sua internação em enfermaria" não procede, posto quecom a presente ação ela não visa receber o quantum despendido com os

referidos gasto, mas busca a indenização pelos danos morais que sofreu evem sofrendo. Em relação aos gastos feitos, os pais da autora ingressou,como já dito, ingressaram com a ação competente em face do Previsul.

9) O réu não deve estar preocupado em fazer, no presente feito, adefesa do Previsul, poste que, além de não ter procuração para tal, adefesa da predita autarquia estadual deverá ser feita em sede própria.

  Inquestionável, deve-se dizer, em relação ao mérito da causa, queo dever do médico é de meio e não de resultado e que a responsabilidadedesse profissional depende da comprovação de culpa e do nexo causal

entre o dano sofrido e ação ou omissão culposa do facultativo. O que não écorreto afirmar é que tais pressupostos não foram demonstrados nos autos.

Indubitavelmente, ficou comprovado que os médicos que atenderama menor autora não agiu de forma a proporcionar-lhe todos os meiosnecessários para que ela recuperasse sua saúde. Pelo contrário, causaram-lhe prejuízos maiores, que quase a levaram a óbito, tudo por agirem comnegligência e imperícia e por cometerem erros grosseiros nos diagnósticosfeito e nos procedimentos adotados.

Ora, nessas condições, claro ficou que a autora entrou com um

quadro clínico grave e evoluiu para um quadro gravíssimo emconseqüência da não feitura dos exames necessários, que detectaria, semdúvida, a apendicite em seu início e com uma simples e pronta intervençãocirúrgica tudo estaria resolvido. Nesse parâmetro fica delineada anegligência do profissional que a atendeu naquele nosocômio.

A obrigação de meio do médico não o autoriza a complicar, com suanegligência e imperícia, a situação clínica da paciente, de grave paragravíssima, aliás é essa obrigação que exige que ele tome todas asmedidas para, pelo menos, minorar do sofrimento do seu cliente. O simplesfato de os médicos do réu não terem feito e exigido os exames necessários

 já demonstra, por si só, o não cumprimento do seu dever.

Não fosse o atendimento precário inicial, a menor não passaria portodas as complicações e operações que passou, tendo como saldo negativoseqüelas graves que a acompanharão pelo resto da vida e que estãocomprovadas nos documentos juntados aos autos, além de grandessofrimentos causados a seus pais.

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O nexo causal entre o dano sofrido e ação ou omissão culposa dofacultativo é inquestionável pelo fato de que se os médicos tivessemrealizados todos os exames necessários, o quadro não se complicaria paraonde se complicou e uma simples operação de apendicite teria resolvido oproblema.

Os prejuízos morais, psicológicos e econômicos causados tanto aautora quanto aos seus genitores e irmãos foram enormes, que dinheiroalgum pode pagar, mas a condenação poderá minorar os desgastessofridos.

A responsabilidade dos profissionais da medicina está mais quecomprovada. A responsabilidade da empresa ré independe de culpa. Suaresponsabilidade é objetiva, bastando tão somente a existência do nexo decausalidade, já comprovado.

Diante do exposto, o Ministério Público opina pela não acolhida daspreliminares argüidas pelas partes, bem como é pela procedência total daação, com a condenação do réu pelos danos morais causados a autora,aplicando-se o princípio da razoabilidade na fixação do valor daindenização.

Por oportuno, o órgão ministerial requer a juntada dos documentosque seguem em anexo, para a instrução da causa, nos termos do artigo 83,II, do Código de Processo Civil.

Caso V. Ex.a optar por designar audiência de instrução e julgamento,

o Ministério Público requer, também nos termos do mesmo artigo acimacitado, a oitiva da mãe da menor, Senhora Vicentina Aparecida CorrêaLeitão (com endereço nos autos), do Dr. Carlos Augusto S. Yonamine(Hospital São Lucas), do Dr. Abidu Carim Y. Omais (Hospital da Criança) edo Senhor Raimundo Holanda Campelo, Rua Estevão Casal de Caminha,204, Vilas Boas, Campo Grande, MS.

 Termos em quepede deferimento.

Campo Grande, 25 de novembro de 1998.

Amilton Plácido da RosaPromotor de Justiça

NOTAS

1. "Art. 159. Aquele que, por ação ou omissão voluntária, negligência, ou imprudência,

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violar direito, ou causar prejuízo a outrem, fica obrigado a reparar o dano.

A verificação da culpa e a avaliação da responsabilidade regulam-se pelo disposto neste

Código, arts. 1.518 a 1.532 e 1.537 a 1.553."2. "Art. 1.545. Os médicos, cirurgiões, farmacêuticos, parteiras e dentistas são obrigados

a satisfazer o dano, sempre que da imprudência, negligência, ou imperícia em atos

 profissionais, resultar morte, inabilitação de servir, ou ferimento."

3. Inflamação do peritônio, que é uma membrana serosa que reveste internamente ascavidades abdominal e pélvica (peritônio parietal) e órgãos nelas contidos (peritônio

visceral).

4. Abscesso - pus acumulado numa cavidade formada em meio dos tecidos orgânicos, oumesmo num órgão cavitário, em conseqüência de processo inflamatório; apostema.

5. Epigástrico, relativo ao epigástrio, que a parte superior do abdome, entre os dois

hipocôndrios.6. Gastrenterite (ou gastroenterite) é a inflamação simultânea do estômago e dos

intestinos.

7. "borborigmo. 1. Ruído de maior ou menor intensidade produzido, no abdome, pelo

deslocamento de gases em meio de líquidos do tubo gastrintestinal".

8. "Auscultar. Aplicar o ouvido a (o tórax, o abdome, etc.) para conhecer os ruídos que se produzem dentro do organismo."

9. "Poucos pacientes têm diarréia, mas este sinal é mais provável na enterite regional ouvirótica" (Manual Merck de Medicina – Diagnósticos e Tratamento, em sua 15 a edição,

Editora Roca, p. 841)

10. "Abdome agudo. Patol. Distúrbio abdominal que exige cirurgia de urgência."