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A REPRESENTAÇÃO DA “IMAGEM DA CIDADE” DE LONDRINA PROJETADA
PELO JORNAL “FOLHA DE LONDRINA” NO ANO DE 1970
REPRESENTATION OF "THE IMAGE OF THE CITY" OF LONDRINA
PROJECTED BY "FOLHA DE LONDRINA" IN THE YEAR 1970.
Francielle Sandoval
Universidade Estadual de Londrina – Bolsista PROIC/Fundação Araucária 2010/2011
Resumo: A década de 1970 foi de extrema importância tanto nas esferas política e econômica,
quanto na social, cultural e nos planos urbanos nacionais e regionais. Em Londrina não foi
diferente. Essa comunicação, fruto da pesquisa referente à imagem produzida pelo jornal
Folha de Londrina acerca da cidade durante a década de 1970, tem como foco o ano de 1970,
mais especificamente seu primeiro semestre. A orientação teórica terá ênfase no trabalho de
Kevin Lynch. Sua perspectiva aponta marcos, eixo, nós, vias, cruzamentos na textura da
cidade, como orientadores dos usuários urbanos. Portanto, visamos observar até onde o jornal
acompanhou, nesse momento, as diretrizes urbanas definidas pela administração local.
Durante esse período, a cidade era governada pelo prefeito Dalton Paranaguá, eleito pela
legenda do Movimento Democrático Brasileiro – MDB – partido de oposição ao regime
militar vigente na época.
Palavras-chave: imagem urbana; Folha de Londrina; transformação urbana
Abstract: The 70’s was extremely important both in political and economic spheres, as in
social, cultural and in national and regional urban plans. In Londrina was no different. This
communication, the result of research on the image produced by the newspaper Folha de
Londrina about the city during the 1970s, has as focus the year 1970, more specifically it’s
first semester. The orientation will focus on theoretical work of Kevin Lynch. His outlook
points out milestones, axes, nodes, pathways, crossings in the texture of the city, as mentors
of urban users. Therefore, we aim to observe how far the newspaper followed up at that time
the urban guidelines defined by local administration. During this period, the city was
governed by Mayor Dalton Paranagua, elected by the legend of the Brazilian Democratic
Movement - MDB - in opposition to the military regime prevailing at the time.
Keywords: urban image, Folha de Londrina; urban transformation
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Introdução
Londrina tornou-se uma das principais cidades do norte do Paraná. Atualmente conta
com uma população de 506.645 mil habitantes, sendo a população urbana de 493.457 mil
habitantes, conforme apontam os primeiros resultados do censo de 2010, segundo o IBGE.
Fundada na década de 1930, ficou marcada pelas propagandas de folhetos da Companhia de
Terras do Norte do Paraná – CTNP -, bem como todo o norte do estado, como lugar de terras
férteis e do progresso1.
Este trabalho, porém, detém-se a outro período, não menos importante: a década de
1970, a qual contou com diversos fatores que a fazem ter notoriedade na história recente
brasileira e também londrinense. Com os militares no poder, foi o período que presenciou sua
fase mais arbitrária. À frente de Londrina estava o médico Dalton Paranaguá, eleito pelo
Movimento Democrático Brasileiro – MDB -, partido de oposição ao governo federal, a
Aliança Renovadora Nacional - ARENA.
A partir desse contexto, buscaremos, aqui, mostrar como se deram as transformações
urbanas em Londrina no início dessa década a partir do conteúdo que diz respeito à cidade
veiculado pelo jornal Folha de Londrina, pesquisado neste jornal durante os meses de janeiro,
fevereiro, março, abril, maio e junho de 1970. São reportagens e artigos referentes à pesquisa
por mim desenvolvida intitulada “A representação da ‘imagem da cidade’ de Londrina
produzida pelo jornal Folha de Londrina na década de 1970”.
1 José Miguel Arias Neto em O Eldorado: Representações da política em Londrina (1930-1975) trabalha com a relação entre a idéia de progresso e o discurso construído acerca de Londrina e do Norte do Paraná. Segundo o autor: “É inegável que as representações da cidade e região como Terra da Promissão e Eldorado eram estratégias propagandísticas. A primeira – elaborada pela Companhia de Terras do Norte do Paraná – buscava atrair compradores de Terras na nova área em abertura nos anos 1930. A segunda objetivava atrair “braços para a lavoura”, ou seja, visava à formação de um mercado de mão-de-obra barata para a cafeicultura em expansão. Se este é o aspecto mais evidente daquelas representações, é também o mais superficial. (p.201)”.
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O jornal Folha de Londrina tem sua história contada por Marinósio Filho e Marinósio
Neto, no livro História da Imprensa de Londrina: do baú do jornalista (1991). Os autores
informam que o jornal foi fundado por João Milanez juntamente com o jornalista Correia
Neto, em 1947. Vale frisar que foi em janeiro de 1970 que o jornal passou a circular também
na capital paulista, ou seja, o discurso acerca do Paraná ultrapassou as fronteiras do Estado e
atingiu o maior pólo urbano brasileiro na época.
O guia teórico que está sendo utilizado para o desenvolvimento da pesquisa da qual
extraímos essa comunicação é Kevin Lynch, autor que aborda o discurso e a leitura da
imagem urbana. Para Lynch, na obra A imagem da cidade (1997)
A cidade não é apenas um objeto percebido (e talvez desfrutado) por milhões de pessoas de classes sociais e características extremamente diversas, mas também o produto de muitos construtores que, por razões próprias, nunca deixam de modificar sua estrutura”. (LYNCH, 1997, p.2)
Ora, uma vez que engenheiros e arquitetos são responsáveis pelo planejamento dos
componentes da imagem física da cidade, outros atores sociais também atuam como
construtores urbanos, no sentido de edificar e reforçar a sua leitura e discurso sobre a cidade e
dos processos que ocorrem a todo o momento. É preciso sempre levar em conta o lugar de
onde falam e a época na qual estão inseridos.
A questão do uso do jornal é abordada por Edilaine Custódio Ferreira no artigo
Imagens da cidade, imagens construídas: as contradições da modernidade (2009). Nele, a
autora teoriza sobre a metodologia adotada na análise do fotojornalismo e nos diz, citando
Essus e Grinberg, que
O jornal é um meio de comunicação social, portador de estratégias comunicativas e persuasivas que se manifestam através da articulação texto/imagem, de modo que as fotografias que acompanham as reportagens não são meramente ilustrativas, mas narrativas que clamam pela eficácia do conhecimento (ESSUS e GRINBERG apud FERREIRA, 1994, p.141).
O jornal Folha de Londrina, por se tratar de um veículo de comunicação de grande
destaque da época, foi adotado como objeto de análise para que se torne possível identificar a
leitura que o mesmo fez da cidade de Londrina nos primeiros meses de 1970 e os movimentos
urbanos que nela ocorriam.
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O início da década de 1970 conta com a continuação do fenômeno de urbanização que
ocorria em âmbito nacional desde os anos 1950. Rodrigo Cunha, em seu texto Novas
Metrópoles Enfrentam Velhos Problemas (2002), aponta a década de 1950 como sendo a
gênese de tal fenômeno, pois foi a industrialização que ocorrera após a era JK, a responsável
por promover um crescente processo de urbanização e conseqüente aumento das principais
cidades brasileiras.
Tal crescimento urbano acarretou problemas. Londrina, que não ficou isenta de tal
processo, carecia de infra-estrutura e políticas públicas para comportar as mudanças
decorrentes de seu crescimento. No que diz respeito em termos de expansão físico-territorial,
a geógrafa que estuda a cidade de Londrina, Tania Maria Fresca, no texto Mudanças recentes
na expansão físico-territorial de Londrina (2002), cita Linardi e nos diz que Londrina, no
período
[...] ganhava maior dimensão, cresciam os vazios urbanos, tornava-se mais acentuada a segregação urbana, maior parcela da população sujeitando-se a conquistar um lugar na periferia. Aquele “zoneamento” até certo ponto espontâneo – pois não era formalizado – esboçado no momento da ocupação inicial da cidade, agora se tornava mais vigoroso; era perceptível dentro da cidade a configuração de áreas “mais nobres”, localizadas em áreas privilegiadas, enquanto outras áreas definiam-se como populares [...] a área central ficava reservada para o comércio e os negócios, e algumas avenidas e ruas privilegiadas, como reduto da classe “A”. Vazios urbanos, especulações, segregação espacial, expansão da periferia, entre outros problemas [...] faziam parte do repertório dessa cidade [...]. (LINARDI apud FRESCA, p. 244)
Como pode ser lido, a cidade apresentava crescimento populacional na zona urbana,
porém junto com ele estava a dificuldade da população de baixo poder aquisitivo em
conseguir fixar moradia, estando assim sujeitados à buscar seu espaço nos lugares periféricos
da cidade, pois a área central foi destinada aos negócios e à população da classe “A”.
Ao longo da década de 1960 o problema continua e órgãos, tanto nacionais quanto
regionais, são criados a fim de encontrar soluções. A respeito disso, o arquiteto João Baptista
Bortolotti, no livro Planejar é preciso: memórias do planejamento urbano de Londrina
(2007), aponta que
O problema da habitação não acontecia somente em Londrina, mas em todo
o Brasil. O Governo Militar da época, criou o BNH – Banco Nacional da
Habitação e o SFH – Sistema Financeiro da Habitação, em que o sistema era
estruturado por agentes nos estados e municípios. No Estado do Paraná foi
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criada a COHAPAR – Companhia de Habitação do Paraná para atender a
questão habitacional no estado. A COHAB – Companhia de Habitação foi
criada na esfera local para atender os municípios que fossem interessados em
desenvolver políticas habitacionais e a construção de casas. A COHAB-LD
de Londrina foi criada pela Lei Municipal nº 1.008 de 26 de agosto de 1965,
de acordo com as diretrizes e normas da Lei Federal nº 4.380 de 21 de agosto
de 1964. (BORTOLOTTI, 2007, p.109)
Na década de 1960, Londrina contava com uma população de 134.821 mil habitantes,
sendo 77.382 mil (57, 40%) a população urbana e 57.439 mil (42, 60%) a rural. Na década
seguinte, passou para 215.576 mil habitantes, sendo 156.352 mil (72,53%) moradores da
cidade, contra 59.224 mil (27,47%) moradores do campo.²
Foi a partir de 1970 que houve a atuação, de fato, da COHAB-LD e a concretização da
grande “virada” na expansão urbana (FRESCA, p.246). Sobre a configuração do espaço que
estava se formando decorrente do expressivo aumento populacional, ainda Fresca, chama a
atenção para o crescimento em direção a zona norte e enfatiza que
Tal direcionamento não se deu em razão da falta de outras áreas para edificação ou implantação de conjuntos habitacionais e loteamentos, mas de estratégia específica do poder público local em localizar os conjuntos habitacionais naquela área, bastante distante do centro da cidade e com enormes áreas vazias entre os conjuntos e a então malha urbana (FRESCA, 2002, p.246)
É possível perceber, pelo menos nos referentes meses pesquisados, que o foco do
jornal Folha de Londrina não está voltado para o planejamento e nascimento de tais conjuntos
habitacionais, eles não parecem ser motivo de atenção da imprensa londrinense. Os artigos
por nós encontrados durante a pesquisa no referido jornal dizem respeito às construções na
área central e nobre de Londrina³, como é o caso do “Edifício Conjunto Residencial
Araguaia”, construído pela CEBEL S.A – Imobiliária e situado, de acordo com a notícia, no
“aristocrático Jardim Canadá, próximo a esquina da Avenida Perimetral com a rua
Paranaguá”.
________________
² Fonte: IBGE, 2006 apud MARTINS, 2007, p.80
³ Por área nobre compreende-se aquela localizada no centro da cidade, reservada aos negócios e onde há um intenso fluxo de pessoas
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A Folha noticia a inauguração, ocorrida às onze da manhã do dia 07 de março de 1970.
A matéria, datada de 08 de março de 1970, foi motivo de grande destaque, pois tomou toda a
página 14 da edição de domingo.
Figura 1 – Fonte: Folha de Londrina, 08/03/1970. Acervo: CDPH.
Figuras 2 e 3 – Fonte: Folha de Londrina, 08/03/1970. Acervo: CDPH
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Figuras 4 e 5 – Fonte: Folha de Londrina, 08/03/1970. Acervo: CDPH
Figura 6 – Fonte: Folha de Londrina, 08/03/1970. Acervo: CDPH
Dois pontos merecem atenção especial: o primeiro diz respeito à maneira com que a
notícia foi apresentada. Nota-se a predominância e destaque das figuras públicas da cidade
presentes no evento.
A figura 2, que na página do jornal situa-se no canto esquerdo superior da página, tem
como destaque o bispo D. Geraldo Fernandes4 e o prefeito Dalton Paranaguá na típica
_________________________________
4 Dom Geraldo tomou posse da Diocese e foi seu primeiro Arcebispo, em 1970, quando a Diocese foi elevada à Arquidiocese. Também lecionou Direito Romano na UEL e inaugurou a nova catedral no dia 16/12/1972. Fonte: Revista Arquidiocese 50 anos.
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cena de inaugurações em que o laço é cortado. Logo atrás, a partir da esquerda conforme a
legenda, os Srs. Celso Lundgren (diretor presidente da CEBEL S.A – Imobiliária), Elpidio
Rodrigues (diretor comercial da CEBEL), Canuto Leocádio (gerente do Banco Nacional de
MG), juiz Gabriel Freceiro de Miranda, João Milanez (diretor-presidente do jornal Folha de
Londrina) e Paulo Castelo (diretor da imobiliária Castelo Branco). Na figura 3 temos os Srs.
Willy Kolnylnendyk, Armando Guerra (diretor de móveis Cimo) e novamente Celso
Lundgren. Na imagem 4, mais uma vez o prefeito, agora com o Sr. Fernando Antunes Santos
(à esquerda) e Elpidio Gomes Rodrigues. Na quinta figura, os srs. Willy Kolnylnendyk,
Gabriel Salles Ferreira (autor do projeto do Conjunto), Sebastião da Silva Caneca
(representante do Banco da Bahia), Paulo Castelo Branco, Celso Lundgren e Armanildo
Guerra. Já na sexta e última imagem, o Sr. Celso Lundgren está discursando, junto com os
Srs. Elpidio Rodrigues (diretor secretário da CEBEL), bispo D. Geraldo Fernandes, Gabriel
Freceiro de Miranda, o prefeito Dalton Paranaguá, João Milanez e Paulo Castelo Branco5.
Nota-se a presença de figuras londrinenses, além de representantes de bancos de
outros estados. Vales frisar, também, que apenas a figura representativa da Igreja Católica
comparecera ao evento, ou seja, percebe-se aí uma relação entre o empresariado londrinense e
a Igreja Católica da cidade, uma vez que figuras de outras religiões não estão presentes (pelo
menos conforme indica a notícia) no evento.
O segundo ponto que destacamos trata-se do lide da notícia. Segundo Marinês
Lonardoni (1999), sob o suporte teórico de van Dijk, lide
é a categoria que se apresenta no primeiro parágrafo da notícia, salvo algumas exceções em que o lide vem logo abaixo da manchete, em negrito, em tipo bold, em corpo menor do que a manchete. O lide deve expressar as características maiores de um evento noticioso: QUEM, O QUÊ, COMO, QUANDO, ONDE, POR QUÊ E PARA QUÊ. É o relato do fato principal, o mais importante da notícia feito de forma resumida. (LONARDI, 1999, p.114)
O conteúdo do lide da notícia em questão enfatiza a importância da obra inaugurada e
sua magnitude e arrojo, que é caracterizada por um “fino acabamento, amplas instalações e
linhas arquitetônicas arrojadas e funcionais”, conforme aponta o lide que é possível ser lido
na figura 1.
___________________
5As pessoas cuja função não foi possível identificar agora, o serão feitas ao longo da pesquisa.
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O relato noticioso - que se trata da expansão do lide, ou seja, a notícia6 (Lonardoni,
p.115) - trata-se, no caso, de um texto curto deixado em segundo plano em que, na primeira
coluna, a boa localização da obra e a magnitude da construção são realçadas; na segunda e
terceira colunas há a descrição das pessoas presentes e seus respectivos cargos e, por fim, a
quarta coluna se ocupa das demais obras realizadas pela imobiliária responsável pelo
Conjunto Residencial Araguaia, a CEBEL-S.A, em Londrina e região.
No mesmo raciocínio seguem-se duas outras análises. A primeira é referente às
imagens da construção da Catedral, que está localizada na Rua Padre Eugênio Hereter, 33 –
centro. A catedral passou por três mudanças, sendo a terceira, iniciada em 1968, a responsável
por sua aparência atual e o foco das notícias a seguir.
Estas imagens jornalísticas nos permitem recorrer à perspectiva de análise urbana
apontada por Kevin Lynch, quando estuda as espacialidades urbanas e classifica o conteúdo
das imagens das cidades, formuladas por seus usuários, em cinco tipos de elementos – vias,
limites, bairros, pontos nodais e marcos. Chamamos a atenção para esse ponto dos escritos de
Lynch, para tentar, nesse estudo preliminar, abordar as relações que a análise desse estudioso
permite sobre a representação da cidade de Londrina por meio das imagens produzidas pelo
jornal Folha de Londrina no inicio da década de 1970, que a nosso ver, contribuiu para que se
construísse uma idéia, ou uma imagem sobre a cidade, ou seja, uma representação sobre a
cidade.
A catedral de Londrina se insere, em nosso entendimento, no conceito de marco
urbano. Pelo autor
Em geral, são um objeto físico definido de maneira muito simples: edifício, sinal, loja ou montanha. Seu uso implica a escolha de um elemento a partir de um conjunto de possibilidades [...] São geralmente usados como indicadores de identidade, ou até de estrutura, e parecem tornar-se mais confiáveis à medida que um trajeto vai ficando cada vez mais conhecido. (LYNCH, 1997, p.53)
E um pouco mais adiante
_____________________________
6 As notícias e reportagens veiculadas no jornal Folha de Londrina nessa época não contam com a assinatura do repórter responsável. Quem fica a cargo, no entanto, é o diretor-proprietário, no caso João Milanez
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Uma vez que o uso de marcos implica a escolha de um elemento dentre um conjunto de possibilidades, a principal característica física dessa classe é a singularidade, algum aspecto que seja único ou memorável no contexto [...] O contraste entre figura e plano de fundo parece ser o fator principal. (LYNCH, 1997, p.88)
Seguindo esse raciocínio, podemos notar como o jornal contribui para formar a idéia
de marco para a Catedral Metropolitana que, se tratando de um edifício situado no centro da
cidade, local de intenso fluxo de indivíduos, foi e continua sendo ao longo do tempo um
importante ponto de referência para os habitantes.
A primeira notícia que consta sobre a obra, a partir do recorte temporal utilizado nessa
pesquisa, data de 29 de janeiro de 1970, com a manchete “A catedral de Londrina já tem
preço”. A partir daí, as notícias que seguem a respeito desse fato dizem respeito aos méritos
obtidos pela Comissão Pró Conclusão da Catedral, que tinha como presidente o juiz Gabriel
Frecceiro de Miranda. De acordo com a notícia, o objetivo da comissão era angariar fundos
para o pagamento das dívidas decorrentes da construção da Catedral, apelando para a elite
empresarial londrinense.
As três imagens apresentadas, na sequência, confirmam esse entrelaçado das relações
locais em torno da formação do marco Catedral, como pode ser conferido nas notícias:
Figura 7 – Fonte: Folha de Londrina, 03/03/1970. Acervo: CDPH.
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Figura 8 – Fonte: Folha de Londrina, 04/03/1970. Acervo: CDPH
Figura 9 – Fonte: Folha de Londrina, 10/03/1970. Acervo: CDPH
Nota-se, a partir das imagens acima, que as fotografias são exibidas com a mesma
estrutura (não só as exibidas no exemplo, como as demais recolhidas no jornal): tem-se o
presidente da comissão, que não por acaso, era o juiz Gabriel Frecceiro de Miranda junto com
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o diretor de divulgação, João Milanez – também diretor-proprietário do jornal Folha de
Londrina. Nas três imagens, os membros da comissão aparecem recolhendo o cheque das
mãos do doador. A expressão de satisfação, tanto do doador quanto dos beneficiados, também
é comum nas imagens7. Vale lembrar que essas duas figuras – o juiz Gabriel Freceiro e João
Milanez – estavam presentes na inauguração do Edifício Conjunto Residencial Araguaia
(fig.1).
É importante ressaltar que além de levar em consideração o contexto histórico e a
posição do fotógrafo do jornal ao tirar a fotografia procurando apontar o ângulo destacado,
deve-se ater também para a imagem que o fotografado quer passar de si e do momento em
questão. Nesse caso, nos levar a crer que o empresariado estava diretamente ligado com as
obras da cidade, até mesmo as de caráter religioso. Tal afirmação é possível ser feita a partir
do próprio conteúdo do texto das notícias. Conforme o texto da figura 7, carnês foram
distribuídos para os empresários para que, através destes, fizessem suas doações. Já os textos
das figuras 8 e 9 fazem menção ao apoio do empresariado londrinense e ao sucesso da
campanha, em passagens como: “Continua a ter a mais ampla receptividade entre os
empresários londrinenses a campanha que vem sendo desenvolvida em prol da construção da
Catedral” (figura 8) e “Se depender dos homens de empresas londrinenses não vai haver
grandes problemas para a construção da Catedral” (figura 9), ambas como primeira frase
das respectivas notícias.
Outro ponto a ser frisado e novamente comentado é que o diretor de divulgação da
Comissão, Sr. João Milanez, sempre está presente nas fotos e é também o dono do jornal
Folha de Londrina, veículo onde tais notícias estão sendo expostas. Como podemos ver, a
Catedral de Londrina, mesmo sendo um templo religioso e marco natural na cidade, teve sua
condição reforçada pelo jornal na representação do lugar que ocupa hoje na espacialidade
urbana, desde o início da década de 1970.
___________________________
7Sobre isso, vale apontar o que Richard Gonçalvez André (2000) pontua que “Além do fotógrafo e seus condicionamentos, deve-se ter em mente que, em certos casos, o resultado final da fotografia é uma operação influenciada, também, pelo fotografado. Este, tal como o operador, não permanece passivo diante das lentes, mas fabrica uma segunda imagem de si, uma auto-representação que não pertence à natureza, mas à cultura. (p.158)
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A terceira notícia a ser tratada é referente às negociações da construção da Universidade
Estadual de Londrina.
Figura 10 – Fonte: Folha de Londrina, 11/03/1970. Acervo: CDPH.
Aqui também percebemos que a imagem publicada quando se trata de mais uma obra
na cidade é a de homens – no caso uma comissão, conforme a legenda – supostamente
negociando e discutindo sobre o assunto. Suas expressões e posturas nos passam a idéia da
seriedade e importância dos mesmos e do assunto tratado. Aqui, porém, não se tratam de
empresários – como nas notícias da catedral -, mas sim de professores que compõem a
comissão criada justamente pela construção da universidade.
É importante ressaltar e relembrar o período no qual tais eventos que foram relatados
estão inseridos. Temos, no início dos anos 70, o período mais ferrenho da Ditadura Militar –
no sentido de repressão política e opiniões contraditórias, com Garrastazu Médici (1969-
1973) na presidência – e também o do chamado “milagre econômico”, período em que a
economia brasileira, através de medidas iniciadas no governo anterior, o de Castelo Branco
(1964-1968), atingira níveis notáveis de crescimento para o Brasil, conforme aponta Thomas
Skidmore no livro Brasil: de Castelo a Tancredo (1988). Já Londrina era governada pelo
prefeito Dalton Fonseca Paranaguá, eleito pela legenda do Movimento Democrático
Brasileiro – MDB, o partido de oposição ao governo.
É possível pensar na relação entre a política nacional no início de 1970, os fenômenos
urbanos que ocorriam em Londrina no mesmo período e as notícias veiculadas pelo jornal
Folha de Londrina no que diz respeito à esfera urbana. Uma vez que um dos objetivos do
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governo era justamente usar o milagre econômico e o processo de urbanização pelo qual as
cidades brasileiras estavam passando como objeto de propaganda, é possível perceber que o
que era exibido abordava apenas os aspectos positivos, deixando às margens os problemas
acarretados com isso, como o contraste econômico-social provocado pelo “milagre
econômico” e a falta de estrutura das cidades brasileiras quando deparadas com o grande
contingente populacional e mudanças urbanas realizadas.
Diante do exposto e com o cruzamento do conteúdo obtido através do jornal Folha de
Londrina, o que é possível perceber é que o jornal também seguiu a linha propagandística da
cidade de Londrina. Isso não quer dizer que os gestores da cidade na época, nem que o jornal
Folha de Londrina compactuavam com o regime militar; porém o que foi percebido com a
análise feita até então é que, da mesma maneira com que Londrina acompanhou os fenômenos
de urbanização que ocorriam no Brasil, também estava sendo feita uma cobertura que
destacava os pontos positivos da urbanização da cidade e de construções que consideramos
aqui como marcos da cidade, segundo a perspectiva de Kevin Lynch, mas enfatizavam a
participação dos recursos oriundos do governo federal. Os problemas referentes à estrutura –
ou a falta de – urbana e os enfrentados pela baixa camada da população não tinham destaque,
nem tomavam páginas inteiras das edições.
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FONTE
Jornal Folha de Londrina: edições dos dias 03, 04, 05, 08 e 11 de março de 1970.
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