A IMUNIDADE TRIBUTÁRIA - os requisitos ......Imunidades Tributárias: Limitações Constitucionais...
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A IMUNIDADE TRIBUTÁRIA - os requisitos infraconstitucionais para o
seu reconhecimento nas Instituições de Educação e de Assistência Social
José Hable
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Capítulo de livro publicado: HABLE, J. A IMUNIDADE TRIBUTÁRIA: os requisitos
infraconstitucionais para o seu reconhecimento nas Instituições de Educação e de Assistência Social. In:
José Eduardo Sabo Paes; Juliana Aparecida Magalhães. (Org.) Terceiro Setor e Tributação 8. 1ed. São
Paulo: Elevação, v. 8, pp. 247/265, 2016.
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Palavras-chave: Imunidade. Entidades Beneficentes de Educação e Assistência Social. Requisitos
Infraconstitucionais. Reconhecimento Administrativo
SUMÁRIO: Introdução – 1. A imunidade tributária e suas peculiaridades - 2. Os requisitos
infraconstitucionais e a imunidade - 3. O reconhecimento da imunidade tributária - 4. Os procedimentos
administrativos para a concessão da imunidade – Considerações finais - Referências.
INTRODUÇÃO
A superação da pobreza, da desigualdade e da exclusão social, no Brasil, são
desafios que extrapolam a capacidade do ente estatal, porquanto mesmo com toda
arrecadação tributária à sua disposição, o Estado sozinho tem muitas dificuldades para
atender aos objetivos fundamentais discriminados na Constituição Federal de 1988
(CF/88), entre os quais, o de “erradicar a pobreza e a marginalização e reduzir as
desigualdades sociais e regionais” (Art. 3º, III).
Por isso, torna-se imprescindível a atuação da iniciativa privada, que é
atraída para assim agir, entre outros, por um comando constitucional denominado
imunidade tributária, que tem o intuito de promover e incentivar atividades sociais,
entre elas, a educação e a assistência social.
Nesse estudo, pretende-se analisar as formas como os entes federativos
tratam, em suas normas infraconstitucionais internas, esse instrumento imunizante de
tributos, voltado principalmente ao atendimento dos requisitos constitucionais e
infraconstitucionais necessários à sua concessão e os procedimentos utilizados pela
Administração no reconhecimento da imunidade.
O trabalho tem como ponto de referência a legislação tributária do Distrito
Federal (DF), que após inúmeros debates e demandas administrativas e judiciais, sofreu
alterações significativas e marcantes nos procedimentos de reconhecimento do
beneplácito constitucional.
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1. A IMUNIDADE TRIBUTÁRIA E SUAS PECULIARIDADES
Imunidade tributária é um tema previsto na Carta Magna de 1988, no Título
VI, que trata das limitações do poder de tributar. Sendo uma exclusão ao poder de
tributar, a imunidade tributária é um privilégio constitucional, com a impossibilidade da
incidência tributária, ou seja, a não-incidência, por não existir disposição legal que
preveja a ocorrência do fato gerador do tributo.
1.1 Como fenômeno de natureza constitucional,1 sempre que o texto
constitucional estiver exonerando ou impedindo a imposição tributária, está-se a tratar
de imunidade,2 independente do termo utilizado, segundo entendimento já pacificado
pelo Supremo Tribunal Federal (STF).3
Por outro lado, a CF/88, ao utilizar, no art. 150, VI, “c”,4 a expressão
atendidos os requisitos da lei, reclamou por uma lei de natureza complementar, nos
termos do seu art. 146, II.5 Este é o entendimento do STF,6 pois esse art. 146 “determina
competir à lei complementar regular as limitações constitucionais ao poder de tributar.”
1.2 Via de regra, a imunidade tributária está prescrita em norma de eficácia
plena e aplicabilidade imediata,7 não estando a depender de leis ou decretos que a
regulamentem, e nem prescinde de qualquer procedimento para reconhecê-la.
Entretanto, quando se está a tratar da imunidade tributária das instituições
de educação e de assistência social, disposta na alínea “c”, do inciso VI, do art. 150 da
1 CARRAZZA, Roque Antônio. Curso de direito constitucional tributário. 22 ed. São Paulo: Malheiros,
2006, p. 682. 2 Na Carta Magna têm-se as expressões: “é vedado ...” (art. 150, VI); “são isentas ...” (art. 184, § 5º e art.
195, § 7º); “não incidirá ...” (art. 153, § 3º, III e § 4º, II, art. 155, § 2º, X), “Art. 195. (...) § 7º - São
isentas de contribuição para a seguridade social as entidades beneficentes de assistência social que
atendam às exigências estabelecidas em lei.” 3 BRASIL. STF. ROMS n° 22.192-9, Rel. Min. Celso de Mello, 1ª Turma, in DI de 19.12.96. Nesse
sentido, também o RE 168.110-DF, rel. Min. Moreira Alves, 04/04/2000, ao trata do art. 184, § 5º da
CF/88, que dispõe: “§ 5º - São isentas de impostos federais, estaduais e municipais as operações de
transferência de imóveis desapropriados para fins de reforma agrária.” Disponível em:
http://www.stf.jus.br. Acesso em: 20 jun. 2015. 4 BRASIL. CF/88. “Art. 150 (...) VI - instituir impostos sobre: (...) c) patrimônio, renda ou serviços dos
partidos políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de
educação e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os requisitos da lei;” (grifos não do
original) 5 Há doutrinadores que entendem ser lei ordinária. Nesse sentido, Oswaldo Othon e Carlos Valder do
Nascimento. Imunidade tributária, Caderno de Pesquisas Tributárias – nova série, n. 4. Coord. de Ives
Gandra, São Paulo: Centro de Extensão Universitária/Revista dos Tribunais, 1998, p. 348 e 736,
respectivamente. 6 BRASIL, STF, AI 740563 AgR / SP. Rel: Min. LUIZ FUX. Primeira Turma. Julgamento: 02/04/2013.
DJe-077 DIVULG 24-04-2013 PUBLIC 25-04-2013. Disponível em: http://www.stf.jus.br. Acesso em:
01 jun. 2015. 7 CARRAZZA, R. A. Obra citada, p. 687.
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CF/88, exige-se uma efetiva comprovação do atendimento às exigências
infraconstitucionais, e assim a norma deixa de ser de eficácia plena e aplicabilidade
imediata, transformando-se em regra de eficácia contida e aplicabilidade
condicionada,8 ao atendimento de requisitos infraconstitucionais.
1.3 Há de se observar também que a CF/88, no seu art. 150, VI,9
expressamente estabelece que a limitação constitucional ao poder de tributar refere-se
tão somente à espécie de tributo denominada imposto, isto é, trata-se de um tributo não-
vinculado a uma atuação estatal, que não está atrelado a uma contraprestação.10 E,
ainda, que essa vedação constitucional de instituir impostos limita-se apenas ao
conteúdo econômico relacionado ao patrimônio, renda ou serviços das instituições de
educação e de assistência social.11
2. OS REQUISITOS INFRACONSTITUCIONAIS E A IMUNIDADE
Quando a CF/88 limita o poder de tributar do Estado a determinadas
entidades, essa desoneração não é concedida de forma aleatória e gratuita, porquanto
exige-se das entidades, interessadas pela imunidade, o cumprimento de diversos
requisitos previstos, ou na própria Lei Maior, ou em leis infraconstitucionais de
natureza complementar.
2.1 Como se está a tratar de entidades específicas, no caso, de educação e
assistência social, naturalmente que o primeiro requisito a ser observado é se ela está
constituída e em funcionamento como instituição de educação ou de assistência social
8 CARVALHO, Paulo de Barros. Curso de direito tributário. 17 ed. rev. São Paulo: Saraiva, 2005, p. 192. 9 BRASIL. CF/88. “Art. 150. Sem prejuízo de outras garantias asseguradas ao contribuinte, é vedado à
União, aos Estados, ao Distrito Federal e aos Municípios: (...) VI - instituir IMPOSTOS sobre: (...) c)
patrimônio, renda ou serviços (...), das instituições de educação e de assistência social, sem fins
lucrativos, atendidos os requisitos da lei; (grifos não do original) 10 BRASIL. CTN, “Art. 16. Imposto é o tributo cuja obrigação tem por fato gerador uma situação
independente de qualquer atividade estatal específica, relativa ao contribuinte.” 11 São considerados impostos sobre o patrimônio, o Imposto sobre Propriedade Territorial Rural – ITR
(CF/88, art. 153, VI), de competência da União; o Imposto sobre transmissão causa mortis e doação, de
quaisquer bens ou direitos – ITCD (CF/88, art. 155, I), e Imposto sobre propriedade de veículos
automotores - IPVA (CF/88, art. 155, III), ambos de competência dos Estados e Distrito Federal; e o
Imposto sobre propriedade predial e territorial urbana – IPTU (CF/88, art. 156, I) e Imposto sobre
transmissão "inter vivos", a qualquer título, por ato oneroso, de bens imóveis, por natureza ou acessão
física, e de direitos reais sobre imóveis, exceto os de garantia, bem como cessão de direitos a sua
aquisição - ITBI (CF/88, art. 156, II), de competência dos Municípios e Distrito Federal. O imposto sobre
a renda alcançado pela imunidade é o Imposto sobre renda e proventos de qualquer natureza – IR
(CF/88, art. 153, III), de competência da União. E por fim, sobre o serviço por elas prestado, a imunidade
refere-se ao Imposto sobre serviços de qualquer natureza, não compreendidos no art. 155, II, definidos
em lei complementar – ISS (CF/88, art. 156, III), de competência dos Municípios e Distrito Federal.
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perante os órgãos do Poder Público,12 e segundo as normas legais regentes,13 para que
seja assim considerada e possa como tal funcionar.14
2.2 Constituída e em funcionamento como instituição de educação ou de
assistência social, para almejar a imunidade é necessário também que a entidade seja
sem fins lucrativos, exigência essa estabelecida pela própria CF/88.15 Segundo a
doutrina, uma instituição é considerada sem lucrativos quando “não tenha por objetivo
distribuir os seus resultados, nem o de fazer retornar seu patrimônio às pessoas que a
instituíram,”16 ou seja, que não distribua lucros e não reverta seu patrimônio às pessoas
que a criou. Em verdade, todo e qualquer rendimento da entidade deve ser revertido
integralmente aos seus objetivos sociais, no fomento da própria atividade que
desempenha.17
2.3 Cumpridos esses dois requisitos, de ser reconhecida perante os órgãos
públicos como uma instituição de educação ou de assistência social, e classificada sem
fins lucrativos, é preciso ainda cumprir outro requisito disposto no próprio texto
constitucional, que é estar tanto o seu patrimônio, a renda e os serviços, relacionados
com suas finalidades essenciais, conforme estabelece o § 4º do art. 150, da CF/88.18
Em realidade, a entidade pode desenvolver diversas atividades, essenciais
ou não, porém somente serão agraciadas pela exclusão constitucional ao poder de
tributar quando vier a praticar aquelas atividades descritas como essenciais,
direcionadas ao interesse da sociedade.
12 BRASIL. CF/88. “Art. 204. As ações governamentais na área da assistência social serão realizadas
com recursos do orçamento da seguridade social, previstos no art. 195, além de outras fontes, e
organizadas com base nas seguintes diretrizes: I - descentralização político-administrativa, cabendo a
coordenação e as NORMAS GERAIS à esfera federal e a coordenação e a execução dos respectivos
programas às esferas estadual e municipal, bem como a entidades beneficentes e de assistência social;”
(grifos não do original). E ainda: “Art. 209. O ensino é livre à iniciativa privada, atendidas as seguintes
condições: I - cumprimento das normas gerais da educação nacional; II - autorização e avaliação de
qualidade pelo Poder Público.” 13 Leis federais ordinárias nº 8.742/1993; nº 11/1995; nº 12.101/2009, nº 12.881/2013 e nº 13.019/14,
entre outras. 14 HABLE, José. A certificação das entidades beneficentes de assistência social e a imunidade tributária.
Terceiro Setor e Tributação. vol. 4. PAES, José Eduardo Sabo (Org), Brasília: Editora Forense, 2011, p.
105. 15 BASIL. CF/88. “Art. 150, VI, “c”: “ (...) das instituições de educação e de assistência social, sem fins
lucrativos”. 16 BARRETO, Aires e BARRETO, Paulo Ayres. Imunidades Tributárias: Limitações Constitucionais ao
Poder de Tributar. São Paulo, Dialética, 1999, p. 23. 17 HABLE, Jose. Imunidade Tributária das Entidades de Interesse Social – com ênfase na Remuneração
dos dirigentes. Terceiro Setor e Tributação. vol. 3. PAES, José Eduardo Sabo Paes (Coord.), HABLE,
Jose (Coord. Adj.). Brasília: Editora Fortium, 2009, p. 76. 18 BRASIL. CF/88. Art. 150. (...) § 4º - As vedações expressas no inciso VI, alíneas "b" e "c",
compreendem somente o patrimônio, a renda e os serviços, relacionados com as finalidades essenciais
das entidades nelas mencionadas. (Grifos não do original).
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Contudo, nesse ponto a concessão ou não da imunidade à entidade está a
depender da interpretação a ser dada à expressão “relacionados com as finalidades
essenciais das entidades”, podendo seu alcance ser ampliado ou diminuído.
2.4 Embora haja diversas correntes doutrinárias e jurisprudenciais, com
interpretações restritivas,19 moderadas,20 ou ampliativas, o STF, com um
posicionamento mais flexível, entende que a expressão deve ter uma interpretação
finalística, pautada na destinação que é dada à renda ou rendimento auferido no
desempenho da atividade determinada pela Constituição, e não pela análise de sua
procedência.21 Assim, segundo o STF, desde que o respectivo rendimento se reverta às
suas finalidades essenciais,22 a entidade é imune aos impostos sobre o patrimônio, renda
e serviços, mesmo que decorram da exploração de atividades econômicas não
relacionadas com a finalidade essencial da entidade imune.
Observam-se, no entanto, julgados menos flexíveis do STF, ao se afirmar
que “Imóveis locados e lotes não edificados ficam sujeitos ao Imposto Predial e
Territorial Urbano – IPTU”,23 ou ainda, “A mera titularidade do bem imóvel não fixa
presunção absoluta e irretorquível de que terreno baldio ou vago está sendo utilizado
para atender as finalidades constitucionalmente salvaguardadas pela imunidade
tributária.”,24 bem como, “2. O benefício não será aplicável, dentre outros motivos, se
19 GRECO, Marco Aurélio. Imunidade Tributária. In: Imunidades Tributárias. MARTINS, Ives Gandra da
Silva (Coord). São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 1998, p. 718. Doutrina: “Se uma renda veio de
uma atividade não relacionada com as finalidades essenciais da entidade, não haverá imunidade, ainda
que venha a ser aplicada segundo as exigências do CTN.” 20 PAES, José Eduardo Sabo. Fundações, associações e entidades de interesse social: aspectos jurídicos,
administrativos, contábeis, trabalhistas e tributários. Brasília: 8 ed. Rio de Janeiro: Forense, 2013, p. 832.
Afirma o autor: “Identifico a aplicação, nesse caso do princípio da razoabilidade; o que viria em boa hora
limitar este entendimento mais amplo.” 21 BRASIL. STF. RE nº 218.503-8/SP, publicado no DJ de 29/10/99 – ISS sobre o preço cobrado em
estacionamento de veículos. RE 243.807/SP, publicado no DJ 28/4/2000 - Imposto de Importação e IPI
na importação de “bolsas para coleta de sangue” a serem utilizadas na prestação de serviços específicos
da entidade, e RE nº 237.718, publicado no DJ de 6/9/2001 - IPTU no caso de aluguel de imóvel para
terceiros, entre outros. Disponível em: http://www.stf.gov.br. Acesso em: 06 jul. 2015. 22 Esse entendimento está sagrado na SÚMULA VINCULANTE 52: “Ainda quando alugado a terceiros,
permanece imune ao IPTU o imóvel pertencente a qualquer das entidades referidas pelo art. 150, VI, "c",
da Constituição Federal, desde que o valor dos aluguéis seja aplicado nas atividades para as quais tais
entidades foram constituídas.” (grifos não do original) 23 BRASIL. STF. AI 661713 AgR / SP. Rel. Min. DIAS TOFFOLI. Relator p/ Acórdão: Min. MARCO
AURÉLIO. Julgamento: 19/03/2013. Órgão Julgador: Primeira Turma. DJe-099 DIVULG 24-05-2013
PUBLIC 27-05-2013. Disponível em: http://www.stf.jus.br. Acesso em: 01 jul. 2015. 24 BRASIL. STF. AI 758316 AgR / PR. Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA. Julgamento: 25/09/2012.
Segunda Turma. DJe-211 DIVULG 25-10-2012 PUBLIC 26-10-2012. Disponível em:
http://www.stf.jus.br. Acesso em: 01 jun. 2015.
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ficar constatado (i) desvio de finalidade ou (ii) risco à concorrência e à livre
iniciativa.”25
3. O RECONHECIMENTO DA IMUNIDADE TRIBUTÁRIA
A imunidade tributária das instituições de educação e de assistência social é
uma vedação constitucional subjetiva, isto é, “condicionada” ou “condicionável” ao
preenchimento de determinados requisitos infraconstitucionais. E dessa maneira, em
regra, ela não é reconhecida automaticamente pelos órgãos fazendários, exigindo-se o
cumprimento dos mencionados requisitos.
3.1 Conforme já colocado, a Lei Maior, no seu art. 146, II, confere
competência à lei complementar (LC) para regular as limitações constitucionais ao
poder de tributar. E no ordenamento jurídico brasileiro, é a Lei nº 5.172, de 1966,26
denominada de Código Tributário Nacional (CTN), que faz essa regulamentação, ao
apresentar no seu art. 14, em numerus clausus, todos os requisitos a serem observados.
3.2 O inciso I, do art. 14 do CTN,27 proíbe a distribuição de parcela de seu
patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título. Esse dispositivo, em outras palavras,
está a determinar que os excedentes da entidade devem ser aplicados na própria
instituição, não podendo ser distribuídos, a qualquer título, nem como lucros, nem como
dividendos aos seus fundadores, administradores ou mantenedores, confirmando, com
isso, a exigênca constitucional de que a entidade não pode ter fins lucrativos.
Uma das grandes discussões doutrinárias e jurisprudenciais, quanto a esse
item, está na interpretação a ser dada à remuneração dos dirigentes das entidades
imunes, se é ou não uma forma de distribuição de renda, a qualquer título, e assim estar
contida no requisito do inciso I do art. 14 do CTN, mormente quando legislações de
entes federados, tanto federal, estadual quanto municipal, assim se expressam, a
exemplo do que dispunham as leis ordinárias federais: Lei nº 9.532, de 1997, em seu art.
25 BRASIL. STF. RE 259976 AgR-ED/RS. Rel. Min. JOAQUIM BARBOSA. Julgamento: 19/10/2010.
Segunda Turma. DJe-217 DIVULG 11-11-2010 PUBLIC 12-11-2010. Disponível em:
http://www.stf.jus.br. Acesso em: 01 jun. 2015. 26 BRASIL. Lei nº 5.172, de 25/10/1966. CTN. Dispõe sobre o Sistema Tributário Nacional e institui
normas gerais de direito tributário aplicáveis à União, Estados e Municípios. Foi acolhida pela CF/88, em
seu art. 34, do Ato das Disposições Constitucionais Transitórias, como lei complementar em sentido
material. Disponível em: http://www.planalto.gov.br. Acesso em: 22 jul. 2015. 27 BRASIL. CTN. “Art. 14. O disposto na alínea c do inciso IV do artigo 9º é subordinado à observância
dos seguintes requisitos pelas entidades nele referidas: I – não distribuírem qualquer parcela de seu
patrimônio ou de suas rendas, a qualquer título; (...) Disponível em: http://www.planalto.gov.br. Acesso
em: 22 jul. 2015.
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12, § 2º, “a”,28 Lei nº 91, de 1935, art. 1º, “c”,29 e Lei nº 12.101, de 2009, art. 29, I,30 e
dispõe o Código Tributário do Município de Goiânia,31 entre tantas outras.
Cabe ressaltar que a Lei nº 13.151, de 28/07/2015, trouxe significativas
alterações, nas citadas leis (Lei nº 9.532, de 1997, Lei nº 91, de 1935 e Lei nº 12.101, de
2009), ao dispor que a vedação de remuneração dos dirigentes não se aplica às
associações assistenciais ou fundações, sem fins lucrativos, nesses termos:
“(...) exceto no caso de associações assistenciais ou fundações, sem fins
lucrativos, cujos dirigentes poderão ser remunerados, desde que atuem
efetivamente na gestão executiva, respeitados como limites máximos os
valores praticados pelo mercado na região correspondente à sua área de
atuação, devendo seu valor ser fixado pelo órgão de deliberação superior da
entidade, registrado em ata, com comunicação ao Ministério Público, no caso
das fundações;” (grifos não do original)
Diversos estudos doutrinários,32 por sua vez, demonstram que remunerar
dirigente ou administrador da entidade é muito diferente de distribuir rendas ou lucros,
pois remuneração não é distribuição e muito menos de patrimônio ou renda, pois
ninguém distribui salários, fruto de um trabalho se assim comprovado, a não ser que
tenha o intuito de forjar uma distribuição disfarçada de renda, que cabe à Administração
demonstrar e comprovar.
A discussão também se estende quanto à validade e eficácia dessas leis de
rito ordinário, que tratam de matéria sob exigência complementar, por ordem
28 BRASIL. Lei nº 9.532, de 1997. “Art. 12. (...) § 2º Para o gozo da imunidade, as instituições a que se
refere este artigo, estão obrigadas a atender aos seguintes requisitos: (...) a) não remunerar, por qualquer
forma, seus dirigentes pelos serviços prestados; (grifos não do original). A mencionada Lei está sendo
questionada, quanto à sua constitucionalidade, pela Ação Direta de Inconstitucionalidade nº 1.802-3/DF,
sob a alegação, entre outras, de ofender à reserva de lei complementar. 29 BRASIL. Lei nº 91, de 1935. “Art 1º As sociedades civis, as associações e as fundações constituídas
no paiz com o fim exclusivo de servir desinteressadamente á collectividade podem ser declaradas de
utilidade publica, provados os seguintes requisitos:.(...) c) que os cargos de sua diretoria, conselhos
fiscais, deliberativos ou consultivos não são remunerados. (Redação dada pela Lei nº 6.639, de
8.5.1979)” (grifos não do original) 30 BRASIL. Lei nº 12.101, de 2009, “Art. 29. A entidade beneficente certificada na forma do Capítulo II
fará jus à isenção do pagamento das contribuições de que tratam os arts. 22 e 23 da Lei nº 8.212, de 24 de
julho de 1991, desde que atenda, cumulativamente, aos seguintes requisitos: I - não percebam seus
diretores, conselheiros, sócios, instituidores ou benfeitores, remuneração, vantagens ou benefícios, direta
ou indiretamente, por qualquer forma ou título, em razão das competências, funções ou atividades que
lhes sejam atribuídas pelos respectivos atos constitutivos;” (grifos não do original) 31 GOIANIA. Lei n°. 5.040, de 1975. Art. 8º. Para efeito do disposto no art. 150, VI, “c”, da Constituição
Federal e no art. 7º., III, desta Lei, considera-se imune a instituição de educação e de assistência social
(...) e que atendam aos seguintes requisitos: (Art. 8º., com redação da Lei Complementar n°. 128, de
01/12/2003) I. Não remunerar, por qualquer forma, seus dirigentes pelos serviços prestados; (Inciso I,
com redação da Lei Complementar n°. 128, de 01/12/2003) (grifos não do original) 32 CARRAZZA, R. A. Obra citada, p. 734.
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constitucional.33 Porquanto, qualquer requisito ou condição dispostos em norma legal
para a fruição da imunidade tributária somente podem ser exigidos do interessado se
estiverem em norma de cunho complementar, devendo ser rechaçadas pelo Poder
Judiciário por estarem eivadas de inconstitucionalidade formal (pela falta de lei
complementar competente) e material (por requisitos não contemplados na Constituição
Federal).34
3.3 Pelo inciso II, do art. 14, do CTN,35 para que a entidade possa ser imune
à tributação de impostos, sobre o seu patrimômio, renda ou serviços, deve ela aplicar
integralmente, no País, os seus recursos na manutenção de seus objetivos institucionais.
O alcance desse inciso II também está na forma de sua interpretação, se
mais restritiva ou ampliativa. E nesse sentido, prevaleceu também a interpretação
finalística, mais flexível, em que se defende que desde que as aplicações, investimentos,
ou outros aplicativos realizados no exterior, retornem ao atendimento das finalidades
essenciais das pessoas jurídicas não está prejudicada a fruição da imunidade.36 E assim,
o STF37 pacificou a questão em debate, ao ementar, entre outros, que “1. A imunidade
tributária prevista no art. 150, VI, “c”, da CF alcança todos os bens das entidades
assistenciais de que cuida o referido dispositivo constitucional, além de suas
aplicações financeiras.” (grifos não do original).
3.4 E por fim, tem-se o inciso III, do art. 14, do CTN,38 que trata da
manutenção da escrituração das receitas e despesas em livros revestidos de formalidades
capazes de assegurar sua exatidão. Está-se assim a exigir da entidade que mantenha os
seus livros de escrituração contábil em perfeita ordem e clareza, pois é por meio deles
33 HABLE, Jose. A Certificação das Entidades Beneficentes de Assistência Social e a Imunidade
Tributária. Terceiro Setor e Tributação. vol. 4. PAES, José Eduardo Sabo (Coord.). Brasília: Editora
Forense, 2011, p. 113. 34 HABLE, Jose. Procedimentos Administrativos Para o Reconhecimento da Imunidade Tributária:
Necessidade de Requerimento prévio do Interessado e do Ato Declaratório do Poder Público. Terceiro
Setor e Tributação. vol. 5. PAES, José Eduardo Sabo (Coord.) Rio de Janeiro: Editora Forense, 2012, p.
92. 35 BRASIL. CTN. “Art. 14. O disposto na alínea c do inciso IV do artigo 9º é subordinado à observância
dos seguintes requisitos pelas entidades nele referidas: (...); II - aplicarem integralmente, no País, os seus
recursos na manutenção dos seus objetivos institucionais; 36 HABLE, José. A imunidade tributária das instituições de educação, a aplicação integral, no País, de
seus recursos na manutenção de suas finalidades essenciais. Terceiro Setor e Tributação. vol. 2. PAES,
José Eduardo Sabo (Org.), Brasília: Fortium, 2008, p. 95. 37 BRASIL. STF. AI 749009 AgR / SP. Rel. Min. LUIZ FUX. Julgamento: 13/03/2012. Primeira Turma.
DJe-064 Divulg. 28-03-2012 - Public 29-03-2012. Disponível em: http://www.stf.gov.br. Acesso em: 22
maio 2014. 38 BRASIL. CTN. “Art. 14. O disposto na alínea c do inciso IV do artigo 9º é subordinado à observância
dos seguintes requisitos pelas entidades nele referidas: (...) III - manterem escrituração de suas receitas e
despesas em livros revestidos de formalidades capazes de assegurar sua exatidão.”
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que são fornecidos os dados para gerar as demonstrações financeiras e os balanços
patrimoniais da pessoa jurídica, assim como informações à Administração tributária.39 É
desse modo que o Fisco terá condições de analisar o cumprimento dos requisitos
necessários à fruição do beneplácito constitucional, evitando com isso fraudes na
manipulação de informações contábeis, a fim de mascarar a distribuição de lucros ou do
patrimônio, entre outros.
4. OS PROCEDIMENTOS ADMINISTRATIVOS PARA A CONCESSÃO DA
IMUNIDADE
Como já explicitado, em regra, a imunidade não é reconhecida
automaticamente pelos órgãos fazendários, e, no mais das vezes, além do cumprimento
dos requisitos dispostos no art. 14 do CTN, exigem-se mais alguns procedimentos
administrativos prescritos nas legislações regentes internas de cada ente da federação,
para só então, após uma análise da Administração, poder ser concedida ou não a
imunidade, por meio de um ato administrativo. Relevante enfatizar, nesse instante, que a
vigência da lei tributária no espaço, como regra, observa o princípio da territorialidade,
ou seja, a lei vige no território da pessoa jurídica de direito público que a editou. E
assim, em regra, se o ente da federação tiver legislação própria que trata
especificamente de imunidade, esta deve ser aplicada em seu território. A
extraterritorialidade é uma exceção.
4.1 É muito comum, nesse caminhar, estarem previstos nas legislações dos
entes federados40 a exigência do interessado pelo benefício de um prévio requerimento,
39 Sabe-se que os beneficiados pela imunidade são obrigados a cumprir as obrigações acessórias, que são
obrigações de fazer, no interesse da arrecadação ou da fiscalização dos tributos, como a emissão de
notas fiscais, escrituração dos livros fiscais, etc., porquanto a imunidade alcança apenas a obrigação
principal, que tem por objeto o pagamento do tributo (CTN, art. 194, e parágrafo único). 40 Entre outros, dispõe a legislação do Município de Fortaleza, “Art. 334 - É vedado ao Município
instituir impostos sobre (Art. 150, Constituição Federal): (...) III - patrimônio e os serviços dos partidos
políticos, inclusive suas fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação
e de assistência social, sem fins lucrativos, atendidos os seguintes requisitos (Art. 14 da Lei Federal nº
5.172, de 25.10.66 - Código Tributário Nacional): (...) Art. 337 - A isenção, quando não concedida em
caráter geral, ou a imunidade tributária constitucional, na hipótese do inciso III do Art. 334, será
efetivada, em cada caso, por despacho da Autoridade Administrativa, em requerimento no qual o
interessado faça prova do preenchimento das condições e do cumprimento dos requisitos previstos em lei
para sua concessão (Art. 35 da Lei nº 4.144/72). (grifamos). Disponível em:
http://www.sefin.fortaleza.ce.gov.br/legislacao/gerados/cons_procfiscal_benefiscais.asp. acesso em 13
jul. 2015. No mesmo sentido, a Lei n°. 5.040, de 1975, que dispõe sobre o Código Tributário do
Município de Goiânia, que estabelece: “Art. 7º. Por força de disposições constitucionais, são imunes aos
impostos municipais: (...) III. O patrimônio, a renda ou os serviços dos partidos políticos, inclusive suas
fundações, das entidades sindicais dos trabalhadores, das instituições de educação e de assistência social,
10
além de seu reconhecimento dar-se por meio de ato declaratório, a exemplo do que
dispõe, a Lei do DF nº 4.567/2011:41
Art. 64. O reconhecimento de benefícios fiscais de caráter não geral
dependerá de requerimento formulado pelo interessado ou por seu
representante, no qual se comprovem os requisitos legais exigidos.
§ 1º Os benefícios fiscais poderão ser reconhecidos a partir de dados
cadastrais fornecidos por órgãos da administração pública direta ou indireta.
(...)
Art. 67. O reconhecimento de benefícios fiscais de caráter não geral se dará
por Ato Declaratório ou por Despacho de Reconhecimento, na forma da
legislação. (grifos não do original)
Por esses dispositivos, verifica-se que o reconhecimento de benefícios
fiscais de caráter não geral está a depender de requerimento formulado pelo
interessado, sem o qual não lhe será concedido, podendo, no entanto, haver a
possibilidade de ser reconhecido a partir de dados cadastrais fornecidos por órgão
público. E ainda que o seu reconhecimento dar-se-á por Ato Declaratório ou por
Despacho de Reconhecimento.
4.2 Tem-se por benefício de caráter não geral, a exemplo da isenção
especial, aquele que é concedido, em cada caso, por despacho da autoridade
administrativa, com base em requerimento no qual o interessado faz prova do
preenchimento das condições e do cumprimento dos requisitos previstos em lei.42 Em
realidade, esses procedimentos (requerimento, preenchimento e cumprimento de
requisitos) são necessários ao deferimento do benefício e não ao seu reconhecimento
que é dado pela lei.43
Em sendo assim, na concessão de benefício de caráter não geral, torna-se
necessário que o interessado apresente requerimento, por meio do qual vai demonstrar o
seu interesse e o preenchimento e cumprimento dos requisitos descritos em lei, para que
possa então desfrutar do benefício.
4.3 O questionamento que se faz, nesse momento, é se a imunidade
tributária das Instituições de Educação e de Assistência Social, estabelecida no art. 150,
sem fins lucrativos, atendidos os requisitos do art. 8º. (...) § 8º. As instituições previstas no inciso III,
deverão requerer na Secretaria Municipal de Finanças, a Declaração de Reconhecimento de Imunidade
Tributária. 41 DISTRITO FEDERAL. Lei n° 4.567, de 09 de maio de 2011. Dispõe sobre o processo administrativo
fiscal, contencioso e voluntário, no âmbito do Distrito Federal e dá outras providências. Disponível em:
http://www.fazenda.df.gov.br. Acesso em: 20 jul. 2015. 42 É o que dispõe o CTN, "Art. 179. A isenção, quando não concedida em caráter geral, é efetivada, em
cada caso, por despacho da autoridade administrativa, em requerimento com o qual o interessado faça
prova do preenchimento das condições e do cumprimento dos requisitos previstos em lei ou contrato para
sua concessão." 43 BORGES, José Souto Maior. Isenções Tributárias. São Paulo: Sugestões literárias, 1998, p. 156/157.
11
VI, “c”, da CF/88, considerada como “condicionada”, é um benefício de caráter geral ou
não geral?
Já defendemos alhures que “a imunidade é um privilégio de caráter
genérico, por ser concedido a todos que se encontrem numa situação descrita na
CF/88.”44 E, “mesmo sendo necessário o cumprimento de requisitos legais, nos termos
do art. 150, VI, “c”, da CF/88, a imunidade tributária é um benefício fiscal de caráter
geral, o que dispensa, por si só, a exigência de requerimento prévio”.45
Contudo, nos termos da Lei distrital nº 4.567/11, por estar essa imunidade
tributária condicionada ao cumprimento de requisitos legais, foi ela considerada pela
norma legal como um benefício de caráter não geral, disciplina nos seus arts. 64 a 70,
quando trata no seu CAPÍTULO II DO PROCESSO DE RECONHECIMENTO DE
BENEFÍCIO FISCAL DE CARÁTER NÃO GERAL.
4.4 Defendemos também que a exigência de prévio requerimento e de ato
declaratório, por si só, não podem ser motivos para a suspensão do beneplácito da
imunidade tributária, mormente porque “não há contemplação desse requisito em norma
complementar, para que possa ser exigido para a sua concessão.”46 Pois, toda norma que
dispuser sobre requisitos para o gozo de imunidade tributária, e não tiver natureza
complementar, terá sua validade e eficácia duvidosas, por flagrante vício de
inconstitucionalidade, conforme já exposto no item 4.2.
4.5 Importante, no entanto, afirmar que, não obstante esse entendimento
sobre vícios de inconstitucionalidade, enquanto estiver a lei no mundo jurídico, é ela
válida e deve ser observada por todos a quem alcance, não podendo órgão da
administração tributária deixar de aplicá-la, sob a alegação desses defeitos.
Desse modo, se a legislação tributária vier a exigir prévio requerimento
formulado pelo interessado para o reconhecimento de benefícios fiscais de caráter não
geral, torna-se imprescindível essa manifestação prévia do interessado, para requer o
benefício.
É o típico caso, por exemplo, de uma instituição de assistência social ter seu
benefício de imunidade suspenso ou cassado pelo descumprimento de um dos requisitos
44 HABLE, Jose. Procedimentos Administrativos Para o Reconhecimento da Imunidade Tributária:
Necessidade de Requerimento prévio do Interessado e do Ato Declaratório do Poder Público.
Terceiro Setor e Tributação. vol. 5. PAES, José Eduardo Sabo. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2012, p.
92. 45 HABLE. Jose. Instituições de Educação e de Assistência Social – Imunidade Tributária - aspectos
relevantes e polêmicos. Terceiro Setor e Tributação. vol. 6. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2013, p.
235. 46 Idem. p. 236.
12
dispostos no art. 14 do CTN. E assim, enquanto a entidade não vier perante a
Administração tributária requer novamente a sua imunidade, demonstrando que saneou
a infração cometida, o benefício permanecerá suspenso, por que assim dispõe
expressamente a legislação.47
Muito comum é a entidade, que teve seu benefício cassado ou suspenso,
permanecer inerte, e em silêncio por anos, e quando autuada pelo Fisco, cobrando o
imposto devido, alegar que era obrigação do Fisco alertá-la e efetuar, em cada exercício,
novamente a cassação ou suspensão da imunidade.
Nesse caminhar, cassado o beneplácito fiscal, cabe tão somente ao
interessado requerê-lo novamente, demonstrando que corrigiu as falhas apontadas pelo
Fisco, quando da suspensão ou cassação, e que cumpre novamente os requisitos legais
para sua fruição.
Nos termos da legislação tributária do DF, por exemplo, permanece a
cassação do benefício até que o interessado manifeste interesse, por meio de
requerimento próprio, para a concessão do benefício,48 com o objetivo claro de que já
estaria apta a ter novamente o benefício, em que demonstra sua regularidade.
4.6 No DF, entretanto, no ano de 2014 houve alterações significativas na sua
legislação. O Decreto nº 36.000, de 12/11/2014, acrescentou ao Decreto nº 33.269, de
2011, novas regras, nesses termos:
“Art. 92. (...)
§ 2º A suspensão da imunidade aplicar-se-á em relação a todos os anos-
calendários em que for constatada a irregularidade que lhe deu causa,
sendo restabelecida no exercício seguinte, desde que preenchidas as
condições previstas no artigo 14 do Código Tributário Nacional.
§ 3º Constatado que a instituição beneficiária de imunidade de tributos não
está observando os requisitos legais para o seu gozo, a autoridade fiscal
competente expedirá notificação fiscal, na qual relatará os fatos que
autorizam a suspensão do benefício, indicando inclusive a data da ocorrência
da infração apurada.
§ 4º Não se considera descumprimento de condição para a fruição de
imunidade a ausência de requerimento prévio do interessado e de Ato
Declaratório.” (grifos não do original)
47 DISTRITO FEDERAL. Lei n° 4.567/11. “Art. 64. O reconhecimento de benefícios fiscais de caráter
não geral dependerá de requerimento formulado pelo interessado ou por seu representante, no qual se
comprovem os requisitos legais exigidos. (...) “Art. 67. O reconhecimento de benefícios fiscais de caráter
não geral se dará por Ato Declaratório ou por Despacho de Reconhecimento, na forma da legislação.”
(grifamos) 48 E o órgão julgador administrativo, quando da análise, deve-se restringir ao que dispõe a norma legal.
Lei distrital nº 4.567/11: “Art. 43. (...) § 2º A autoridade julgadora formulará o julgamento do processo
plenamente vinculado à legislação tributária, restringindo-se à matéria impugnada.” (...) “Art. 64. O
reconhecimento de benefícios fiscais de caráter não geral dependerá de requerimento formulado pelo
interessado ou por seu representante, no qual se comprovem os requisitos legais exigidos.” (grifos não do
original)
13
Por esses dispositivos normativos regulamentares tem-se:
a) deixou-se de utilizar o termo cassação e passou a ser usado suspensão da
imunidade (§ 2º), estando em conformidade com o que já dispunha o CTN, art. 14, §
1º;49
b) a suspensão aplica-se apenas aos anos-calendários em que for constatada
a irregularidade (§ 2º);
c) o benefício será restabelecido no exercício seguinte, porém desde que
preenchidas as condições estabelecidas no art. 14 do CTN. Ou seja, não é automático,
cabendo definir a quem caberá provocar o seu restabelecimento: ao Fisco ou ao
interessado. Mais coerente, ao Interessado pleitear e ao Fisco analisar o cumprimento
dos requisitos legais para o seu gozo, e se não cumpridos, notificá-lo do fato (§ 3º); e,
e) a ausência de requerimento prévio do interessado e de Ato Declaratório
não é descumprimento de condição para a fruição de imunidade (§ 4º), conforme já
defendemos, por não se tratar de requisito disposto no art. 14 do CTN. Ou seja, o fato,
por si só, de não ter requerido ou não possuir o ato declarado, não enseja a suspensão do
benefício, exigindo da Administração uma análise do cumprimento dos requisitos do
art. 14 do CTN.
CONSIDERAÇÕES FINAIS
A imunidade tributária, como limitação ao poder de tributar, é um fenômeno
constitucional, e assim todos os casos de imunidade tributária estão expressamente
dispostos na CF/88. Nesse sentido, conclui-se:
1. A natureza jurídica da norma que trata sobre imunidade tributária, nos
termos do art. 146, II, da CF/88, reclama lei complementar, a exemplo do CTN, que
disciplina, nos termos do seu art. 14, todos os requisitos infraconstitucionais a serem
observados.
2. Qualquer condição ou exigência disposta em norma legal para a fruição
da imunidade tributária somente pode ser exigida se estiver em norma de cunho
complementar. E nesse entendimento, toda norma que contenha requisitos não previstos
49 A Lei distrital nº 4.567/11 permanece com a expressão cassação: “Art. 68. O benefício fiscal será
cassado sempre que se verificar o descumprimento das condições para a sua fruição.”
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em lei de natureza complementar tem sua validade e eficácia duvidosas, por ofensa a
dispositivo constitucional.
3. Quanto à eficácia da norma imunizante, das instituições de educação e de
assistência social, rege-se com eficácia contida e aplicabilidade condicionada,
porquanto exige-se uma efetiva comprovação do cumprimento a determinadas
condições infraconstitucionais, conforme reza a própria CF/88, no art. 150, VI, “c”.
4. Para que as entidades de educação e assistência social possam ser
beneficiárias da imunidade tributária, necessário que atendam diversas exigências
previstas na própria Carta Magna ou em lei infraconstitucional de natureza
complementar, entre elas: a) ser instituição de educação ou assistência social; b) ser
entidade sem fins lucrativos; c) a imunidade limita-se à espécie de tributo denominada
imposto e que recai sobre seu patrimônio, renda ou serviços que estejam relacionados
com as finalidades essenciais da entidade; e d) desde que atendidos os requisitos
infraconstitucionais dispostos no art. 14 do CTN.
5. A imunidade não é reconhecida automaticamente pelos órgãos
fazendários e, além do cumprimento dos requisitos dispostos no art. 14 do CTN,
exigem-se outros procedimentos administrativos prescritos nas legislações regentes
internas de cada ente da federação, como o prévio requerimento, além de seu
reconhecimento dar-se por meio de ato declaratório.
6. A exigência de prévio requerimento e de ato declaratório, por si só, não
podem ser motivos para a suspensão do beneplácito da imunidade tributária, mormente
porque não há contemplação desse requisito em norma complementar, para que possa
ser exigido para a sua concessão.
7. Embora a alegação de vícios de inconstitucionalidade, enquanto estiver a
lei no mundo jurídico, é ela válida e deve ser observada por todos a quem alcance, não
podendo órgão da administração tributária deixar de aplicá-la, sob a alegação desses
defeitos.
8. Se o ente da federação tiver legislação própria que trata especificamente
de a matéria imunidade, relacionada ao atendimento de requisitos, esta deve ser aplicada
em seu território.
9. No DF, no ano de 2014, houve alterações significativas na sua legislação
tributária, nesses termos: (a) alterou-se o termo cassação para suspensão da imunidade,
devendo ser aplicada apenas aos anos-calendários em que for constatada a
irregularidade; (b) o benefício será restabelecido no exercício seguinte, porém desde que
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preenchidas as condições estabelecidas no art. 14 do CTN; e, (c) a ausência de
requerimento prévio do interessado e de Ato Declaratório não é descumprimento de
condição para a fruição de imunidade, entres outras.
REFERÊNCIAS
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