Psicologia e Arquitetura- Em Busca Do Locus Interdisciplinar

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  • Estudos de PsicologiaISSN: [email protected] Federal do Rio Grande do NorteBrasil

    Elali Azambuja, GleicePsicologia e Arquitetura: em busca do locus interdisciplinar

    Estudos de Psicologia, vol. 2, nm. 2, julio-diciembre, 1997, pp. 349-362Universidade Federal do Rio Grande do Norte

    Natal, Brasil

    Disponvel em: http://www.redalyc.org/articulo.oa?id=26120209

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  • 349Dossi Psicologia AmbientalEstudos de Psicologia 1997, 2(2), 349-362

    Psicologia e Arquitetura: em buscado locus interdisciplinar

    Gleice Azambuja ElaliUniversidade Federal do Rio Grande do Norte

    Resumo:Partindo do reconhecimento da inevitvel interdisciplinari-dade no estudo da relao pessoa-ambiente, o artigo discutea Psicologia Ambiental enquanto locus privilegiado na inter-seo entre Psicologia e Arquitetura, com especial nfase pa-ra a interrelao ambiente construdo - comportamento hu-mano. Definindo a escolha dos mtodos de pesquisa comofator crucial a esta posio interdisciplinar, o texto aponta osprincipais mtodos atualmente utilizados, facilidades de apli-cao e vantagens/desvantagens dos mesmos, defendendo apropriedade do uso de multimtodos na realizao de traba-lhos na rea.

    Palavras Chave:PsicologiaAmbiental;RelaoComportamento -AmbienteConstrudo;AbordagemMultimtodos.

    Abstract:Psychology and Architecture: looking for the interdisciplinarylocus. Acknowledging interdisciplinarity as an inevitable con-dition for the study of person-environment relationship, thearticle discusses Environmental Psychology as locus ofintersection between Psychology and Architecture, converg-ing upon the interrelationship human behavior - built envi-ronment. Considering that the choice of research methods isan essential element to such an approach, the text defines themain methods and techniques used in this area, their appli-cation and advantages/disadvantages, emphasizing a multi-method strategy.

    Key-words:Environmental

    Psychology,Built

    EnvironmentEvaluation,

    Multi-methodapproach.

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    Embora tenha sido escrito h mais de 30 anos, o texto de EdwardHall aponta, desconcertantemente, uma rea de trabalho aindapouco explorada. Desconcertantemente, porque apesar da nos-sa capacidade para criar/modelar espaos e, sobretudo, embora a hu-manidade viva essencialmente em ambientes edificados (a maior parteda populao mundial habita em cidades), pouco tem sido construdono sentido de ampliar o conhecimento da interface entre ambiente ecomportamento humanos.

    De fato, apesar da evidente necessidade de nos tornarmos atentos inter-relao entre o homem e as extenses que cria para si, continu-amos a estudar isoladamente cada fator envolvido nesta complexaequao. Grande parte do problema diz respeito prpria indefiniosobre a rea, ou reas, de conhecimento a que pertence o estudo destarelao, com possveis vertentes em Psicologia, Sociologia, Antropo-logia, Arquitetura, Urbanismo, Geografia, entre outras. No entanto, aprincipal causa desta dificuldade parece relacionar-se relativa es-tagnao do conhecimento dentro de cada setor, fruto da intensa com-partimentalizao da cincia em busca da super-especializao: a Me-dicina dedica-se ao estudo das condies de sade do corpo; a Psico-logia analisa o comportamento humano; a Sociologia aborda a relaoentre os indivduos; a Arquitetura projeta os edifcios que os abrigam;o Urbanismo dedica-se planificao das cidades...

    O homem e suas extenses constituem um sistema

    inter-relacionado. um erro agir como se os homens fossem

    uma coisa e sua casa, suas cidades, sua tecnologia, ou sua

    lngua, fossem algo diferente. Devido inter-relao entre

    o homem e suas extenses conveniente prestarmos uma

    ateno bem maior ao tipo de extenses que criamos (...).

    Como as extenses so inanimadas, preciso aliment-las

    com feedback (pesquisa), para sabermos o que est

    acontecendo, em particular no caso das extenses

    modeladoras ou substitutivas do meio ambiente natural. (E.

    Hall, 1966, pp. 166-167)

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    Paradoxalmente, embora seja bvia a complementaridade entreestes e outros campos de trabalho, envolvendo faces diferentes deuma mesma problemtica, as informaes geradas em cada grupo deestudos pouco se expande alm de seus prprios pares, dificultandoa formao de uma massa crtica interdisciplinar que alimente umprocesso investigativo mais amplo. Felizmente, o gradual surgimentode trabalhos interdisciplinares tem induzido mudanas paradigmticasno enfrentamento desta temtica, com nfase para a necessidade doreagrupamento das disciplinas e o surgimento de novas formas deatuao nas diferentes profisses.

    Uma questo de complementariedadeEm Psicologia e Arquitetura, duas das reas mais proximamente

    ligadas ao estudo da relao pessoa-ambiente, este quadro no diferente. Gradualmente a Psicologia ampliou sua rea de atuao doindivduo para o social e o ambiental, redefinindo e complementandoseu objeto de estudo de modo a abarcar as interaes ambiente-comportamento, e contribuindo para um conhecimento mais amploda realidade atravs de um enfoque ecolgica e humanamenteconsistente. Em Arquitetura, por sua vez, aos poucos observa-se odeslocamento da nfase na anlise de aspectos estticos/construtivos/funcionais do edifcio para a preocupao com a percepo/satisfaodos usurios e com as implicaes das intervenes em termos depaisagem, propiciando a elaborao de propostas mais centradas noindivduo e/ou no social e nas implicaes ecolgicas das interfernciasrealizadas.

    Tais constataes denotam uma gradativa aproximao e valoraoentre tais campos, em cujo espao de complementao o estudo doambiente impe-se enquanto locus extremamente privilegiado parainterao e gerao de conhecimento. Assim, embora muitas vezes aArquitetura seja encarada como profisso-cliente da Psicologia ( qualrecorreria para aprofundar a anlise de aspectos ligados percepoe comportamento ambientais), o rebatimento de tais estudos no imediato ou simples, de maneira que somente a parceria entre ambas,na realizao de trabalhos conjuntos que contemplem as suas especi-ficidades, pode vir a possibilitar a real ampliao dos conhecimentos.

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    Este esforo passa necessariamente pelo enfrentamento das dificul-dades no contato entre as reas, principalmente em funo das dife-renas de tempo e linguagem implcitos. Enquanto para os psic-logos, por exemplo, a preocupao reside no indivduo (ou grupo) enos processos de sua interao, cuja compreenso implica longo pe-rodo de envolvimento, os problemas que se apresentam aos arquitetosexigem respostas quase imediatas, em funo de prazos exguos criadospor exigncias prticas ou institucionais. Por outro lado, no que serefere s formas de comunicao utilizadas, enquanto arquitetos re-correm eminentemente linguagem grfica essencial ao processo pro-jetual, os psiclogos analisam aspectos subjetivos da vivncia indivi-dual, envolvendo sobretudo elementos verbais e a expresso corporal,dificilmente decodificveis pelos primeiros em termos de suas ativi-dades profissionais.

    Ora, uma vez que nem a Psicologia tradicional nem a Arquiteturaconsegue abarcar totalmente a relao pessoa-ambiente, torna-se ine-vitvel a procura de um espao comum entre ambas. Alimentada pelasduas reas, porm relativamente independente destas, a PsicologiaAmbiental habilita-se a ser este espao, constituindo-se locus onde asoma entre o conhecimento psicolgico e o arquitetnico pode ali-mentar a produo de um ambiente mais humanizado e ecologicamentecoerente. Enquanto campo nitidamente multidisciplinar, centrado noobjeto de estudo, e no numa rea especfica de conhecimento, a Psico-logia Ambiental pode desempenhar o papel de ponte que, enfati-zando e valorizando semelhanas e diferenas entre conhecimentosarquitetnicos e psicolgicos, possibilita as necessrias trocas, enri-quecendo a ambos atravs da soma de conceitos, experincias e m-todos de trabalho, alm de abrir-se contribuio de reas afins (comoGeografia, Sociologia e Antropologia, entre outras), o que amplia aabrangncia e a potencialidade dos estudos a serem realizados.

    Enquanto disciplina em construo, a Psicologia Ambiental temcomo um de seus principais objetos de estudo a avaliao do ambienteconstrudo durante o processo de sua ocupao, o que tem contribuidodecisivamente para a divulgao da rea (Bechtel, 1996; Stokols, 1996;entre outros), apontando para a construo de um corpo terico-metodolgico slido e a formao de bancos de dados enquanto fontes

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    de informao essenciais ao avano da rea. A crescente importnciado trabalho avaliativo enquanto subsdio a novos projetos, ou face aprogramas de reforma/manuteno do espao construdo (Ornstein1992, 1997), representa a conscientizao de que pouco contribuiremossocialmente se continuarmos a enfrentar cada problema de modo iso-lado, esquecendo que o principal objetivo da edificao (ou conjuntoedificado) deve ser garantir a qualidade de vida da populao. Sobesta tica, o edifcio deixa de ser encarado apenas a partir das suascaractersticas fsicas (construtivas) e passa a ser avaliado/discutidoenquanto espao vivencial, sujeito ocupao, leitura, reinterpre-tao e/ou modificao pelos usurios, ou seja, ao estudo de aspectosconstrutivos e funcionais do espao construdo acrescenta-se a anisecomportamental e social essencial sua compreenso. Esse processoimplica, necessariamente, a anlise do uso - enquanto fator que possi-bilita a transformao de espaos em lugares- e a valorizao do pontode vista do usurio, destinatrio final do espao construdo, e portantoimprescindvel compreenso da realidade.

    Tal tendncia, valorizando especialmente os aspectos perceptuaisda relao pessoa-ambiente, plenamente justificada quando se con-sidera que o contato direto e cotidiano de um usurio com um objetotransforma esse indivduo em um crtico severo e abalizado daqueleproduto. De fato, embora o confronto entre pareceres tcnicos e opi-nies leigas possa parecer difcil, estes podem complementar-seeficazmente, como demonstram os Cdigos de Direito do Consumidor,em cujos textos encontra-se implcito o processo de realimentao dociclo produtivo de qualquer objeto. Certamente as pessoas comunspouco conhecem sobre a fabricao de brinquedos, por exemplo. Noentanto, aps algum uso as crianas so capazes de dizer/demonstrarse um determinado produto adequado ou no s suas brincadeiras;os pais compreendem seu potencial de uso ou sua periculosidade; osprofessores julgam aspectos pedaggicos de sua adoo em sala deaula; os psiclogos os consideram eficazes ou no no processo tera-putico com pacientes de determinada faixa etria etc. Assim, emboranenhum desses usurios possa ser considerado especialista nafabricao de brinquedos, a funo uso os habilita a realizar tal anlise,sendo suas percepes individuais elementos determinantes na

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    avaliao do objeto, o que define cada um desses extratos da populaocomo uma fonte potencial de crticas ao produto, propiciando suaalterao para melhor adequao ao pblico-alvo (os prpriosusurios). Apesar desta prtica ser comum ao setor industrial, ainda (desconcertantemente) embrionria no mbito da construo dosedifcios que nos abrigam durante toda a vida.

    Em face desta argumentao, percepo passa a ser uma palavra-chave para a realizao de trabalhos que envolvam a avaliao doedifcio durante o processo de sua utilizao, sendo identificada porMonzglio (1990) como ...fator de relevncia para anlise doambiente em fruio, indicando e dimensionando seus aspectosqualitativos, de categorias tipolgicas, incidncia e relaes, alertandosobre as demandas e anseios de melhoria, tendo em vista a evoluo,atualizao e as projees futuras (...), avaliao que procede segundoseu alcance de conhecimento para uso tambm de seu alcance no sabere na cultura prpria. (p. 33).

    Quando averiguada a partir do ponto de vista da PsicologiaAmbiental a percepo do ambiente construdo pelos usurios permitea discusso das potencialidades do ambiente enquanto base-fsica,que propicia ou inibe a emisso dos comportamentos. Tal estudo, comforte embasamento no modelo terico da Psicologia Ecolgica deBarker (Barker, 1968) possibilita a identificao, descrio e anlisedas caractersticas ambientais e comportamentais do local estudado,com destaque para o conceito de behavior setting que inter-relacionadiretamente os dois fatores, constituindo importante fonte deinformao para atuao no local (Pinheiro, 1986).

    De fato, na complementao entre os mtodos utilizados e osenfoques dados anlise (em busca da consolidao do arsenal detcnicas e procedimentos relativos ao estudo e avaliao do ambienteconstrudo) que a interao entre arquitetos e psiclogos podecontribuir efetivamente para a evoluo do conhecimento relativo srelaes pessoa-ambiente, sobretudo no que diz respeito abordagemdos problemas a partir do confronto entre os pontos de vista dosdiferentes agentes envolvidos na produo e apreenso do espao.Portanto, considerando a definio da tarefa a partir desta interaoentre disciplinas (o que, alm do embasamento multidisciplinar,

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    pressupe a busca de respostas que tenham rebatimento nas diferentesreas envolvidas), a escolha do mtodo de pesquisa constitui-se etapafundamental para a abordagem das questes relevantes para cadaestudo.

    Uma questo de mtodoDe modo abrangente, os mtodos de pesquisa podem ser subdivi-

    didos em qualitativos e quantitativos, e durante muito tempo discutiu-se vantagens e desvantagens de ambos no processo de pesquisa, sendoos primeiros prioritariamente associados validao das informaese os segundos mais relacionados definio de sua confiabilidade,possibilitando generalizaes (Reis & Lay, 1995). Gradativamente,no entanto, tal discusso tem dado lugar utilizao de multimtodos(Sommer & Sommer, 1980), isto , a adoo simultnea de diferentesfontes e tcnicas para coleta de dados, prtica que colabora para oenriquecimento da avaliao, aumentando significativamente o lequedos elementos envolvidos no processo analtico. De modo geral, estestrabalhos justificam que os dados provenientes de uma nica fonteso passveis de dvida, uma vez que a aplicao isolada de um mtodoou tcnica pode gerar lacunas no conhecimento obtido, apontandopara resultados que contemplam apenas uma faceta da realidade. Sobeste ponto de vista torna-se aconselhvel que, para evitar vises me-todolgicos, os desvios surgidos a partir de um tipo de coleta de da-dos sejam contrabalanados por informaes originadas em outrasformas de pesquisa, minimizando as distores no resultado final dotrabalho (Bechtel, Marans & Michelson, 1987; Marans &Spreckelmeyer, l987). Nestes termos, se a adoo de multimtodos valorizada dentro de uma mesma rea, seu efeito pode ser ampliadocaso os mtodos e tcnicas escolhidos possam contemplar visesdiferentes de uma mesma realidade, como as provenientes de diferentescampos de conhecimento (no caso, Psicologia e Arquitetura), o quetornaria o leque de informaes ainda mais promissor.

    Nos trabalhos de avaliao do ambiente edificado os principaismtodos atualmente utilizados para a coleta de informaes soobservaes, entrevistas, questionrios e medies (levantamentosfsicos), os dois primeiros associando-se especialmente a aspectos qua-

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    litativos, enquanto os segundos mais relacionados a definies quan-titativas. Para efeito didtico alguns destes mtodos e tcnicas serodescritos sucintamente, no visando a sua definio precisa mas, prin-cipalmente, buscando ilustrar diferenas entre estes e vantagens/des-vantagens no seu uso.

    No que se refere ao mtodo de observao, entre as principaistcnicas podem-se citar a anlise de traos de comportamento e omapeamento comportamental. A anlise de traos de comportamento(Sommer & Sommer, 1980) consiste na busca de evidncias fsicasdo comportamento dos usurios (desgaste de materiais, lixo, grafitagemetc). Pela facilidade e rapidez na apreenso de dados, a tcnica mostra-se bastante eficiente em termos qualitativos, apesar de no permitiruma leitura quantitativa imediata das informaes, e exigir treinamentodos pesquisadores participantes para o reconhecimento das evidnciasambientais do efetivo uso no local. J o mapeamento comportamental(Ittelson, Proshansky, Rivlin & Winkel, 1974; Sommer & Sommer,1980) relaciona diretamente ambiente e comportamento em funodo tempo. Suas principais modalidades dizem respeito ao foco deateno do observador, podendo definir-se como centradas-no-lugarou centradas-na-pessoa. Sistematizando informaes normalmenteapreendidas de modo intuitivo, o mapeamento possibilita a utilizaode dados concretos (e portanto menos contestveis e mais condizentescom a realidade), embora implique a demanda de um tempo conside-rvel, intenso treinamento da equipe, e um considervel trabalho naorganizao dos dados para anlise, fatores que dificultam a suarealizao. Sua principal vantagem diz respeito prpria linguagemdos mapas, facilmente decodificvel por leigos e por profissionaisligados ao design, facilitando o intercmbio de dados provenientesdas cincias sociais e elementos eminentemente fsicos da rea, funda-mental queles que buscam atuar diretamente na anlise e reestrutura-o do espao.

    Tambm os mapas cognitivos ou mentais (Lynch, 1970; Cullen,1974, entre outros) do especial nfase linguagem grfica, diferindoda tcnica anterior no que se refere ao tipo de ao do respondenteque, desta feita, assume papel mais ativo, sendo levado a desenhar/

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    diagramar/descrever ambientes, lugares, percursos etc. Sua produo,posteriormente analisada pelos pesquisadores, permite a identificaoe classificao dos elementos que, segundo a percepo dos respon-dentes, compem o ambiente estudado. Embora possibilite uma coletade dados de grande riqueza informacional, a realizao destes trabalhosapresenta alguma dificuldade, sobretudo no que se refere inibiodos indivduos frente s tarefas (muitas pessoas sentem-se intimidadasquando solicitadas a se comunicar graficamente) e a decodificaodos dados obtidos.

    Saliente-se, ainda, a obteno e anlise de imagens (atravs douso de fotografias, filmes ou similares), tcnica que pode estar associ-ada a outros mtodos (como observao e levantamentos) ou ser con-siderada isoladamente. Corroborando o conhecimento popular de que... uma imagem fala mais que mil palavras, as imagens mostram-seessenciais perfeita compreenso do espao, considerando o papelfundamental das referncias visuais para a percepo e interpretaodo ambiente fsico (Sanoff, 1991). No entanto, a produo de imagensest intimamente relacionada com a sensibilidade, os recursos tcnicose as oportunidades do fotgrafo/cineasta/etc, encontrando como difi-culdade adicional necessitar que os indivduos a serem documentadosaprovem/autorizem a sua realizao. Por outro lado, alm de simplesdocumentao visual, tal abordagem pode ser associada coleta deinformao junto ao usurio, demonstrando ser um excelente eliciadorde contedos dificilmente manifestos atravs de outras formas de coleta(Collier, 1975; Milgran, 1970). O uso de imagens utilizadas comoestmulo anlise crtica de um ambiente pelos seus usurios mostra-se fundamental apreenso e discusso do espao, permitindo, inclu-sive, o afloramento de elementos de anlise no previstos inicialmentena pesquisa.

    Quanto ao mtodo de entrevistas verifica-se que, nas formaslivre ou semi-estruturada, esta permite o surgimento de dadosqualitativamente importantes, essenciais ao desenvolvimento dequalquer pesquisa. Por outro lado, as entrevistas estruturadas (nasquais as questes so fixas e direcionadas) possibilitam grandeaprofundamento de informaes especficas e considervel reduo

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    no tempo de realizao, alm de diminuir a disperso das informaesobtidas. A adequada dosagem entre estas formas de coleta(estruturando o processo sem, no entanto, evitar o surgimento deinterferncias espontneas do entrevistado), alm de ampliar ocontedo da avaliao e aprimorar o processo, permite o afloramentode elementos antes no cogitados pelo pesquisador. Para a utilizaodo mtodo de entrevistas imprescindvel treino anterior da equipe edefinio precisa dos objetivos e forma de abordagem dosentrevistados, a fim de serem mantidas condies de confrontao ecomplementao entre os depoimentos obtidos, bem como de sedeixarem abertos caminhos para possveis retornos.

    O questionrio, bastante conhecido pela populao em geral,mostra-se um mtodo rpida e facilmente compreendido pelorespondente, sobretudo quando so aplicadas questes fechadas,redigidas utilizando vocabulrio acessvel, o mais prximo possvelda linguagem coloquial. A tabulao e interpretao das informaesmostra-se direta e eficiente, gerando dados essenciais para a realizaoda anlise. Apesar disso a confeco do instrumento geralmente trabalhosa e lenta, exigindo uma fase de pr-testagem, e para suaaplicao tornam-se necessrios tempo e disposio do morador, oque difcil de estimar antecipadamente.

    A livre associao de atributos (Moles, 1970; Ekambi-Schimidt,1974), por sua vez, constitui-se numa tcnica derivada do questionrioou da entrevista (dependendo da forma de aplicao), que exige aparticipao intensa, porm discreta, do mediador e a busca/capturade associaes espontneas entre o objeto estudado e suas qualidades.Tambm neste caso verifica-se a vantagem de fcil visualizao deelementos ligados percepo ambiental, sendo que a conceituao edefinio grfica das chamadas distncias psicolgicas (aliando qua-lidades a objetos concretos) utiliza uma linguagem no-verbal facil-mente decodificvel, consolidando-se como uma maneira de facilitaro acesso de profissionais ligados ao design s informaes de cartersubjetivo.

    Enquanto mtodo de pesquisa as medies das condies fsicasdo ambiente podem envolver inmeras tcnicas, assumindo a forma

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    de medida de dimenses, temperatura, rudo e congneres; vistoriastcnicas ligadas a materiais e processos construtivos; descrio emensurao de fluxos internos ou externos aos prdios (de pessoas,materiais, veculos etc); levantamento de mobilirio e reformas, entreoutros. As medies introduzem grande nmero de fatores fsicos naequao at agora apresentada, dados que podem ser cruzados com apercepo/satisfao dos usurios, possibilitando desde o estudo echecagem de parmetros e normas construtivas at a discusso depadres comportamentais face s caractersticas de um ambiente.Embora de incio tais levantamentos possam parecer interessar maisespecificamente aos profissionais ligados construo civil (arquitetos,engenheiros, e outros especialistas em sua verificao), tornam-se es-senciais ao completo conhecimento da realidade, podendo explicarmuitos aspectos do comportamento humano, sobretudo a partir dabusca da correlao entre os dados obtidos e informaes geradas poroutros meios.

    Resumindo, se isolados os mtodos e tcnicas anteriormentecitados mostram-se capazes de gerar resultados de grande interesse esignificado para a discusso da relao pessoa-ambiente, enorme omanancial de informaes gerado pelo cruzamento das informaesobtidas atravs de vrios deles, o que justifica plenamente uma maioraproximao cada vez maior entre as reas de conhecimento que osgeraram e alimentam.

    Concluso: uma questo de continuidade Que parmetros deveriam estar envolvidos na definio

    de reas mnimas para uma habitao humana eecologicamente adequada?

    Como as condies de conforto no ambiente construdo(temperatura, rudo, iluminao etc.) alteram o comporta-mento humano?

    Como o espao influencia o comportamento de multides?Existem espaos que se adequem melhor que outros aco-mod-las?

    De que maneira a vida em cidades afeta o comportamentohumano?

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    Quais as conseqncias da superdensidade? Comotrabalhar isso em face da resoluo de problemas urbanos?

    Como um sem-teto estabelece sua territorialidade eorganiza seu espao vivencial? Qual a forma de rebatertais informaes no projeto de um local que o abrigue?

    Ambientes extremos (como bases espaciais, estaes po-lares, desertos, ilhas isoladas) alteram as condies de con-vvio entre as pessoas? Como este conhecimento pode au-xiliar a repensar / reestruturar tais espaos?

    Que informaes so necessrias para o projeto de umasimples residncia, fsica e psicolgicamente adequada famlia que vai habit-la? Como coletar tais dados demodo a apreender os aspectos vivenciais da relao entreseus membros? Existe um desenho que reinterprete taisinformaes, respondendo s necessidades das pessoas en-volvidas?

    Questes como estas, tpicas de trabalhos em Psicologia Ambi-ental, so extremamente complexas, apontando tarefas em cuja realiza-o o cruzamento metodolgico essencial, e que necessariamentedevem ser abordadas de modo interdisciplinar. Assim, o estudo docomportamento humano no ambiente construdo, embora objeto destarea de conhecimento, envolve em sua discusso no apenas aspectosligados Psicologia e Arquitetura, mas exige a participao ativa devrias outras disciplinas interessadas em pensar a qualidade de vidahumana a partir da percepo e das vivncias dos diferentes agentesenvolvidos em cada problemtica.

    No processo de apropriar-se da realidade para a gerao de co-nhecimento, no entanto, fundamental que o pesquisador conscientize-se do fato de estar, alm de buscando informaes, tambm partici-pando de um processo de troca, e interferindo, em maior ou menorescala, na estabilidade (real ou imaginria, duradoura ou efmera)existente. Insere-se, finalmente, mais um elemento nesta equao (em-bora isto no signifique relegar tal fator a ltimo plano): a responsabi-lidade social daqueles que se dispem a trabalhar a relao pessoa-ambiente. Tal tarefa se impe uma vez que, possibilitando o agua-

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    mento do senso crtico do usurio com relao ao local onde vive e qualidade de vida almejada/obtida, estamos participando ativamentedo processo de modificao dessa mesma realidade. Este mais umassunto a ser discutido... interdisciplinarmente.

    Referncias

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    Gleice Azambuja Elali Ar-quiteta, Psicloga, Mestre em Es-truturas Espaciais Urbanas (FAU-USP), e Doutoranda na FAU-USP.Professora do Curso de Arquitetu-ra da UFRN e integrante da Basede Pesquisa Grupo de EstudosPessoa-Ambiente/ GEPA. Cor-respondncia: Av. Getlio Vargas,782, ap. 1101 - Petrpolis, Natal,RN (59.010-360). Tel/fax: (084)202.4270 - 202.4433. E-mail:[email protected]

    Sobre o autor