Emprego perdeu fôlego em setembro, preveem...

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Página 1 Boletim 628/14 – Ano VI – 15/10/2014 Emprego perdeu fôlego em setembro, preveem analistas Por Arícia Martins e Tainara Machado | De São Paulo O início do período de contratações temporárias deve ter dado algum alento à geração de vagas formais em setembro, avaliam economistas, mas foi insuficiente para tirar o mercado de trabalho da rota de desaceleração observada nos últimos meses. Segundo analistas, a indústria seguiu mostrando comportamento pior do que a média, mas outros setores, como o comércio e os serviços, também já começaram a ser afetados pela estagnação da atividade econômica. A estimativa média de 11 instituições financeiras e consultorias ouvidas pelo Valor Data aponta que 123,8 mil postos de trabalho formais foram abertos no mês passado. Se confirmado, esse resultado representará recuo de 41,3% em relação ao mesmo mês de 2013, quando 211 mil empregos com carteira assinada foram criados. As projeções para o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), que deve ser divulgado hoje pelo Ministério do Trabalho, vão de 68,8 mil até 173,4 mil novas vagas em setembro.

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Boletim 628/14 – Ano VI – 15/10/2014

Emprego perdeu fôlego em setembro, preveem analista s Por Arícia Martins e Tainara Machado | De São Paulo O início do período de contratações temporárias deve ter dado algum alento à geração de vagas formais em setembro, avaliam economistas, mas foi insuficiente para tirar o mercado de trabalho da rota de desaceleração observada nos últimos meses. Segundo analistas, a indústria seguiu mostrando comportamento pior do que a média, mas outros setores, como o comércio e os serviços, também já começaram a ser afetados pela estagnação da atividade econômica.

A estimativa média de 11 instituições financeiras e consultorias ouvidas pelo Valor Data aponta que 123,8 mil postos de trabalho formais foram abertos no mês passado. Se confirmado, esse resultado representará recuo de 41,3% em relação ao mesmo mês de 2013, quando 211 mil empregos com carteira assinada foram criados. As projeções para o Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), que deve ser divulgado hoje pelo Ministério do Trabalho, vão de 68,8 mil até 173,4 mil novas vagas em setembro.

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Rodrigo Leandro de Moura, pesquisador do Instituto Brasileiro de Economia da Fundação Getulio Vargas (Ibre-FGV), afirma que setembro é um mês sazonalmente aquecido para o mercado de trabalho formal, devido à abertura de vagas na indústria e nos serviços para atender a demanda extra das festas de fim de ano. Mesmo assim, diz ele, a expectativa do Ibre, de abertura de 149,5 mil empregos celetistas no período, pode ser vista como um dado ruim. "É um resultado em linha com o de setembro de 2012, quando 150,3 mil postos foram abertos", compara Moura. Naquele ano, ele lembra que o Produto Interno Bruto (PIB) cresceu apenas 1%. Portanto, se confirmada sua estimativa para o Caged do mês passado, o economista avalia que a tendência de desaquecimento do mercado de trabalho será reforçada, embora a taxa de desemprego nas seis principais regiões metropolitanas permaneça em patamar muito baixo, devido à redução da força de trabalho.

Nos cálculos de Moura, a indústria de transformação abriu 45 mil vagas com carteira no mês passado, 28,8% a menos do que o saldo registrado em setembro de 2013. Os serviços, segundo o pesquisador, ainda não devem mostrar piora tão expressiva, mas já não estão mais segurando a geração de empregos como nos últimos anos. O Ibre trabalha com a abertura de 109,8 mil postos neste segmento no mês. "A renda ainda sustenta um desempenho um pouco melhor do emprego neste setor, mas cada vez menos", disse.

Rafael Bacciotti, economista da Tendências Consultoria, também vê sinais de desaceleração neste ramo de atividade. Dados da Pesquisa Mensal de Serviços (PMS), do Instituto Brasileiro de Geografia e Estatística (IBGE), mostram queda do faturamento do setor, já descontada a inflação no período. O comércio também dá sinais de enfraquecimento, segundo Bacciotti, o que tende a reduzir o ritmo de criação de vagas com carteira assinada nestes dois setores nos próximos meses. "São segmentos que continuam empregando, mas menos do que no ano passado", diz.

Bacciotti estima que o saldo líquido entre admissões e demissões deve ter sido de 125 mil em setembro. Embora seja um número melhor do que os 101 mil empregos criados em agosto, o economista comenta que, na série com ajuste sazonal calculada pela consultoria, a geração de vagas formais passaria de 22 mil para 13 mil no período.

A construção civil e a indústria vão continuar como destaque negativo, afirma Bacciotti. No setor manufatureiro, as demissões começaram em maio e devem continuar em setembro, na série com ajuste sazonal, diz. "O noticiário recente mostra que as montadoras até intensificaram a adoção de férias coletivas e layoff como meio de enfrentar o baixo dinamismo da atividade e, por isso, não vejo reversão dessa tendência", diz, mesmo com aumento da produção entre julho e agosto.

Para o economista, como a recuperação da atividade econômica é bastante modesta, o mais provável é que a perda de fôlego da geração formal de empregos se torne mais espalhada entre os vários setores da economia. Para o ano, o economista estima criação de 300 mil novos postos, contra 731 mil em 2013.

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No cenário do Ibre, outubro e novembro devem mostrar mais admissões do que demissões, em função das contratações temporárias, mas o mês de dezembro, que sazonalmente já é marcado por saldos negativos do Caged, pode ser ainda mais fraco em 2014, dependendo do resultado das eleições. Moura recorda que, em 2008, quando o país foi fortemente atingido pela crise internacional, o Caged contabilizou 655 mil cortes de vagas. "Esse número não deve ser superado agora, mas a semelhança com aquela época é o elevado nível de incertezas, que fez as empresas ajustarem suas expectativas para baixo", afirma o economista. Como já existe um consenso de que 2015 será um ano difícil para a economia, os empresários tendem a mostrar comportamento semelhante no fim deste ano, na avaliação de Moura, mas o ajuste pode ser maior caso o atual governo seja reeleito.

Demissões em SP fecham vagas que exigem maior qualificação, aponta Seade Por Camilla Veras Mota | De São Paulo A dinâmica pouco expressiva do mercado de trabalho em São Paulo neste ano vai além dos números modestos. Levantamento divulgado pela Fundação Sistema Estadual de Análise de Dados (Seade) mostra que a geração de vagas no Estado tem se concentrado em ocupações que exigem baixa escolaridade e que a onda mais severa de demissões incide sobre o emprego de maior qualificação.

De acordo com os registros do Cadastro Geral de Empregados e Desempregados (Caged), o estoque de emprego no Estado cresceu 0,5% no segundo trimestre sobre o primeiro e aumentou 0,7% no confronto com o mesmo período do ano passado. Boa parte dessa alta, aponta o estudo, foi puxada por contratações na agricultura, setor que aumentou em 12,3% o número de funcionários em relação aos três primeiros meses do ano, e nos serviços, especialmente os de transporte e comunicação (2%).

A indústria de transformação, por outro lado, colocou 10 ocupações na lista das 20 que mais demitiram nesse período. O setor perdeu 23,1 mil vagas com carteira assinada em relação ao primeiro trimestre e 63,9 mil na comparação com o segundo trimestre de 2013, amargando retração de 0,8% e de 2,2% no estoque de trabalhadores, respectivamente.

O subsetor que apresentou pior resultado foi o de metal-mecânica - diretamente ligado ao ramo automotivo, que passa por situação difícil no Estado. Nesse segmento houve redução de 2,7% no volume de postos de trabalho sobre o primeiro trimestre. Entre os tipos de ocupação com maior saldo positivo no período predominam aquelas com menor exigência de especialização e escolaridade. Influenciadas pelo avanço da cultura da laranja, as

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contratações de trabalhadores para o cultivo de árvores frutíferas responderam por 23,8 mil, do total de 60,5 mil postos criados no Estado de São Paulo entre abril e junho. Motorista de caminhão veio na segunda posição (9 mil), seguido por faxineiro (8,2 mil) e trabalhador da cultura de cana-de-açúcar (7,3 mil). O emprego de soldador, por sua vez, ocupa o topo da lista das 20 ocupações que mais demitiram no intervalo, com fechamento líquido de 4,3 mil vagas no segundo trimestre. Outras nove funções ligadas à indústria fazem parte do ranking dos campeões de cortes, entre elas operador de máquinas-ferramenta, de empilhadeira e montador de estruturas metálicas.

Na lista constam ainda quatro funções da construção civil, que reduziu em 1,1% os quadros de funcionários - pedreiro (menos 1,3 mil), encanador (menos 1,2 mil), carpinteiro (menos 1 mil) e mestre de obras (menos 888). "Foi o crescimento da agropecuária e dos serviços que segurou a geração de emprego no Estado no segundo trimestre", afirma Alexandre Loloian, técnico da Seade. Para ele, esse cenário pode se repetir no segundo semestre, mas com um arranjo um pouco mais positivo, em especial por conta do desempenho da indústria. "As altas recentes na produção industrial podem não rebater de maneira forte no emprego, mas tendem a reduzir o saldo de demissões", avalia.

Na região metropolitana de São Paulo, que representa 52,9% do emprego do Estado - que contabiliza, por sua vez, 31,4% do estoque de vagas formais do país -, a geração de emprego no segundo trimestre foi ligeiramente pior do que a média, com variação de 0,1% em relação ao primeiro trimestre.

Saída da crise para indústria depende de câmbio e i novação Por Vanessa Jurgenfeld | De São Paulo Uma desvalorização do real poderia ajudar uma grande parte dos setores industriais brasileiros a reverter a crise enfrentada nos últimos anos. Porém, seria suficiente apenas como medida de curto prazo. Independentemente do nome a ser eleito à Presidência do país, estudiosos do setor industrial ouvidos pelo Valor acreditam que, no longo prazo, o Brasil precisará repensar também a política especificamente voltada ao setor industrial, tendo foco na melhora da competitividade, em grande medida, com avanços na modernização e inovação tecnológica.

Renato Garcia, professor do Instituto de Economia da Unicamp, afirma que, embora vários setores da indústria de transformação estejam com problemas, a valorização do real atinge principalmente aqueles cuja relação preço/salário é muito importante para a sua competitividade, estando mais sujeitos à concorrência com importados, como é o caso da produção de bens de consumo de massa, como têxtil e calçados.

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Garcia acredita que uma reversão da sobrevalorização pode mudar o cenário para alguns segmentos dentro de setores como esses. "Supondo que ocorra uma desvalorização do real ante o dólar, boa parte vai se recuperar. Isso deve ocorrer com a produção de itens mais commoditizados, que serão internalizados rapidamente", disse, citando como exemplo móveis, parte das cerâmicas, parte dos plásticos, sapatos e produtos têxteis mais básicos. São setores com tecnologia difusa, nos quais as dificuldades para se remontar fábricas - que possivelmente foram desativadas, em função da avalanche de produtos importados no mercado nacional - são menores.

A crise da indústria brasileira se refletiu nos últimos anos principalmente na produção de 10 setores, de acordo com a Pesquisa Industrial Anual (PIA), que apura o desempenho de 24 ramos industriais. Entre os setores mais afetados estão têxtil, madeira, papel e celulose, coque e derivados de petróleo, produtos químicos, farmacêuticos, metalurgia, metalurgia exceto máquinas, informática e outros equipamentos de transportes.

Nesses setores foi constatada, ainda que em graus diferentes, a redução da participação no Valor de Transformação Industrial (VTI) dentro do total de valor gerado pela indústria de transformação, quando comparados os dados de 2012 (os mais atuais disponíveis) com os de 2007 - um ano antes da eclosão da crise mundial.

O VTI é uma medida importante, porque é uma variável próxima ao conceito de valor adicionado que cada setor gerou dentro da indústria de transformação, contribuindo assim para o resultado do Produto Interno Bruto (PIB). Para alguns economistas, o indicador compõe a cesta de estatísticas que sinalizam uma desindustrialização em curso, com algumas interpretações entendendo que o fenômeno ocorre de maneira precoce, porque o Brasil teria começado a se desindustrializar com um nível de renda per capita muito inferior ao dos países desenvolvidos.

A professora da PUC-SP Anita Kon concorda que uma desvalorização do real seria de grande relevância, mas destaca que não bastam mudanças em uma variável macroeconômica para reverter a crise do setor. "Os empresários precisam também de juros mais baixos e uma política industrial efetiva de longo prazo", disse.

A proposta de uma nova política industrial ganha corpo entre alguns economistas pela crítica que fazem da política industrial existente, basicamente o Plano Brasil Maior. "Nós não temos uma política industrial. Não adianta ter uma política que fique só no papel. Precisamos de uma política industrial de longo prazo que não seja para tampar buraco ou apagar fogo", afirma Anita. Garcia, por outro lado, reconhece méritos no Brasil Maior, mas aponta que há algumas falhas, como o fato de ter havido medidas mais compensatórias ao setor industrial do que indutoras de internalização de capacidades tecnológicas.

Além disso, a necessidade de uma política industrial de longo prazo é ressaltada pelo entendimento de que os problemas mais de fundo do setor industrial não são resolvidos apenas com mudanças macroeconômicas, como no câmbio. Entre essas questões, Garcia

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cita as baixas escalas de produção, baixos investimentos em pesquisa e desenvolvimento, incapacidade de as empresas brasileiras participarem mais das cadeias globais de valor, bem como pela incapacidade de o setor industrial incorporar capacitações sustentáveis no longo prazo. Como elementos de uma nova política industrial, Anita cita melhores condições no capital de giro, melhora da infraestrutura e medidas macroeconômicas e microeconômicas em sintonia. "Se é estabelecida uma certa taxa de juros (Selic), não se deve com isso pensar só no equilíbrio macro, mas que ela vai ter influências de diferentes tipos na indústria", diz.

Assim como Anita, Garcia defende uma política industrial de longo prazo que eleja setores prioritários. "Em alguns casos, o bonde passou e o perdemos, mas temos que tentar pensar daqui para frente", disse. Como casos em que o bonde já passou, ele citou o complexo de eletrônicos, como a fabricação de chips, que não foi internalizada pelo Brasil. Isso não significa que não há o que fazer, mas é preciso identificar setores".

Entre os dez setores que apresentaram queda na PIA estão alguns de alto conteúdo tecnológico, que seriam importantes para puxar o crescimento do país, colocando-o em uma melhor posição nas cadeias globais de produção, na avaliação de alguns economistas. Além disso, a lista demonstra que há uma certa heterogeneidade da crise: ela vai do têxtil à metalurgia e ao ramo de transportes.

Apesar de o câmbio ser apontado como importante ferramenta de saída da crise para parte do setor industrial, economistas afirmam que existe uma probabilidade baixa de o governo - seja quem for o nome eleito no segundo turno - mexer no câmbio, porque essa medida traria aumento de custos e poderia ter efeitos sobre a inflação. Atualmente, existe uma atuação do governo no câmbio para evitar uma desvalorização excessiva, pelo entendimento de que isso pode ter impacto sobre a inflação, por meio do encarecimento das importações. "É possível, portanto, que a mudança no câmbio não venha de medidas deliberadas do governo brasileiro. Está tudo mundo de olho no Fed [o banco central americano] nos Estados Unidos. Se há um aumento de juros lá, certamente vai haver mudanças no câmbio brasileiro", destaca o professor da Unicamp.

Em uma avaliação distinta de Anita e de Garcia, Sandra Rios, diretora do Centro de Estudos de Integração e Desenvolvimento, acha que o país não deveria temer o "desmonte" da produção vertical integrada que vem ocorrendo, o que alguns classificam como "perda de elos das cadeias produtivas" ou de desindustrialização. Ela entende que o país deve se especializar naquilo em que já tem maior competitividade. Por trás disso está a ideia de que o "desmonte" faz parte de um processo global natural, considerando a nova forma de atuação da indústria em cadeias produtivas globais, nas quais as grandes empresas escolhem onde e o que produzir em cada país, conforme seus interesses. Embora Sandra concorde que a sobreapreciação do real prejudica a indústria, ela considera que o país precisa buscar especializações, como a de produtor de matérias-primas, vista por ela como "inescapável para um país abundante em recursos naturais".

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Sobre setores intensivos em mão de obra, como é o caso de têxtil e calçados, por exemplo, Sandra considera que, antes da emergência da China no mercado internacional, trazendo todos os países da região com ela, o país podia até ter "alguma vantagem comparativa nisso", mas esse não é o caso do Brasil de hoje. "De um lado, o Brasil concorre agora com países que são de fato abundantes em mão de obra e, de outro lado, temos um aumento da ocupação da mão de obra e um encarecimento do custo do trabalho que não nos permite mais competir nesse nicho [de mão de obra intensiva] de preço", diz Sandra.

De acordo com ela, o Brasil tenta resistir à tendência global de redução da produção integrada verticalmente. "A ênfase em políticas que buscam contrarrestar essa tendência acabam por prejudicar a competitividade", afirma. "Quando há uma política para manter a produção local de todas as partes, peças, componentes, insumos e bens de capital, é inevitável um encarecimento da produção que vai se fazer sentir de forma mais intensa nos elos da cadeia que estão mais na ponta", diz.

Para Sandra, a solução não passa por uma política industrial que eleja setores prioritários ou evite a perda de alguns segmentos. "Pode até ter fábrica têxtil para produtos mais sofisticados, com um corte especial, ou naquela que haja alguma vantagem de produzir localmente, como moda praia, com um tipo de desenho que ainda valha a pena produzir aqui por conta da proximidade com o local do produto. Mas é difícil imaginar que o país vai ser competitivo em camiseta de malha sintética ou em produção de sapatos de borracha."

Setores pretendem reativar coalizão para competitiv idade Por Ivo Ribeiro e Olivia Alonso | De São Paulo Representantes de entidades de 21 setores da indústria de transformação já preparam as bases para recriar e reorganizar o que chamam de Coalizão Pro-Competitividade, lançada em meados do primeiro semestre para estabelecer um canal de diálogo com o governo federal, em uma busca de uma política mais efetiva para esse setor.

O principal objetivo desse grupo era mostrar, em um encontro com a presidente Dilma Rousseff, o nível crítico de dificuldades desse segmento, que tem um peso expressivo na economia do país. Não obteve sucesso, pois não conseguiu ser recebido pela presidentes. Teve apenas uma agenda com o ministro da Fazenda, Guido Mantega, um "pit stop" para tentar chegar ao Planalto.

O ministro foi afável e ouviu as reivindicações, mas dali nada avançou.

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À frente dessa coalizão, encabeçada pela Abimaq, da indústria nacional de máquinas e equipamentos, estão entidades de peso. A siderurgia (Instituto Aço Brasil), química e petroquímica (Abiquim), alimentos (Abia), produtos eletroeletrônicos (Abinee), calçados (Abicalçados), bens de capital (Abdib), autopeças (Abipeças) e petróleo (Onip), entre outros. A Anfavea, das montadoras, evitou compor o bloco, pois tem negociado diretamente com o governo.

Em conjunto, o grupo representa 51% da receita líquida de toda a indústria da transformação brasileira, 57% do pessoal empregado e tem faturamento de cerca de R$ 700 bilhões, informa o presidente da Abimaq, Carlos Pastoriza. Para ele, "o país vive um processo de desindustrialização cavalar, o qual passa despercebido, pois as empresas não estão fechando as portas, mas, sim, transformando-se em importadoras".

Marco Polo de Melo Lopes, presidente-executivo do Instituto Aço Brasil, que trabalha em conjunto com Pastoriza nesse movimento, enfatiza que são necessárias medidas emergenciais. "Que pelo menos nos permita reverter a balança negativa desse segmento industrial."

O grupo vai aguardar passar o calor da campanha política, que acaba dia 26, para se reunir e sistematizar um documento com todos os pontos indicados pelas lideranças. Esse documento será levado ao candidato reeleito como um programa que considera primordial para assegurar competitividade à indústria no curto prazo. Passada a eleição, acredita-se que o grupo terá chance de obter um diálogo, o que não teve até agora.

Para o executivo da siderurgia, independentemente de qual seja o nome vencedor na eleição, existe uma prioridade absoluta, que é reconhecer o problema crítico da indústria de transformação no Brasil. O objetivo da coalizão, acrescenta Pastoriza, é alertar as autoridades sobre medidas que defendam a toda a indústria, de forma horizontal. "Seremos um movimento apolítico e pragmático", diz.

Segundo eles, a indústria saiu de um superávit de US$ 120 bilhões, acumulado de 2002 a 2007, para um déficit na balança comercial de US$ 130 bilhões, de 2008 a 2013. "É uma inversão brutal, que queríamos apresentar ao governo. Mas o que se verifica é que há uma negação em reconhecer tal situação", afirmou Lopes.

O problema tende a se tornar mais crítico, aponta Pastoriza. "Há dez anos, tínhamos um superávit anual de US$ 40 bilhões. Estamos caminhando para um déficit de US$ 110 bilhões. É uma variação de US$ 150 bilhões que o país importa e deixa de exportar".

Dentre uma longa lista de prioridades, o executivo do Aço Brasil disse ao Valor que cinco pontos são cruciais, e requerem medidas emergenciais, para estancar a perda de competitividade sistêmica da indústria de transformação no curto prazo.

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Primeiro, ajustar o câmbio a um patamar real. Aos níveis de R$ 2,30 a R$ 2,40, considera-se que há uma desvantagem ainda alta, pois a desvalorização chega a 22% frente ao dólar. "Os países com quem competimos desvalorizam suas moedas artificialmente", afirma Lopes.

Rússia e China, por exemplo, têm uma desvalorização de 47% e 43% ante a moeda americana, diz. "Assim, fica difícil competir."

A consequência é que isso levou a uma perda de capacidade tanto para competir com bens importados quanto na exportação de produtos fabricados aqui. "O governo tem de deixar claro se quer ou não ter uma base industrial forte no país", afirma.

A cumulatividade dos impostos é outro ponto crítico, apontado pela coalizão, que indica a cobrança de impostos sobre os investimentos como mais um fator de perda de competitividade. "O Brasil é um dos poucos países no mundo onde ainda se tributa investimentos", diz o dirigente do Aço Brasil.

Colocar os juros em padrões internacionais é outro pleito. A avaliação é que o sistema brasileiro é perverso e prejudica as indústrias. No Brasil, afirma, o juro real vai de 12%, 14% a 15% ou mais, enquanto lá fora chega até a ser negativo.

Por fim, entre as medidas emergenciais, um tema é considerado de vital importância, não só pela indústria, mas por toda a atividade econômica: a modernização e ampliação da infraestrutura logística. Expressivos ganhos de competitividade são esperados de ações e investimentos para rodovias, ferrovias, portos e outros serviços ligados a esse setor.

Lopes observa que a indústria de transformação no país, em razão da perda de competitividade, viu emagrecer sua participação no PIB, ano a ano, em pouco mais de duas décadas. Caiu de 25% para 13% ou menos que isso e que esse processo se acelerou de alguns anos para cá de forma abrupta.

O resultado, observa Lopes, é o aumento da primarização da pauta de exportação do país. "Há uma perda evidente na exportação de produtos com maior valor agregado, os manufaturados, e o aumento da fatia de grãos, minérios e outros bens sem ou de baixa agregação de valor."

Pastoriza, da Abimaq, afirma que a indústria da transformação tem uma situação pior do que a de outros setores da economia, principalmente por ter impostos em cascata e grande concorrência dos importados. "Os setores extrativo e de construção civil, por exemplo, têm defesas naturais. Trabalham com produtos não importáveis, ou não têm incidência de impostos em cascata como temos. "

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Destaques

Risco de vida

O Tribunal Superior do Trabalho (TST) aceitou recurso da Companhia Paulista de Trens

Metropolitanos (CPTM) e negou a cláusula de dissídio coletivo que instituía o pagamento

de adicional de risco de vida de 15% sobre o salário nominal aos bilheteiros, agentes

operacional I e II, encarregados de estação e chefes gerais de estação da CPTM. Para a

ministra Maria de Assis Calsing, relatora do caso na Seção Especializada em Dissídios

Coletivos (SDC), embora a reivindicação fosse "legítima e justificável", era indevida a

concessão do adicional de risco mediante sentença normativa. Em seu voto, a relatora

salientou que esse direito tem origem "apenas na lei e na vontade das partes". Nesse

sentido, explicou que "somente pela via negocial se poderia alcançar a concessão do

adicional de risco ou pela existência de norma preexistente, cuja origem funda-se

igualmente no acordo de vontades", expresso em instrumento coletivo imediatamente

anterior ao dissídio. No caso, no entanto, ressaltou a ministra, "o acordo coletivo anterior

não contemplou tal ajuste". Depois de celebrado acordo entre sindicatos profissionais e a

CPTM, remanesceu esse ponto de discórdia, que levou o Sindicato dos Trabalhadores em

Empresas Ferroviárias da Zona Sorocabana a interpor dissídio coletivo para obter o

deferimento dessa cláusula.

(Fonte: Valor Econômico dia 15-10-2014).

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Mão de obra nos portos pode parar no Supremo Operadores portuários estudam ação de inconstitucio nalidade contra a impossibilidade de contratação direta dos empregados LU AIKO OTTA / BRASÍLIA - O ESTADO DE S.PAULO A Comissão Portos, entidade que representa empresas operadoras e usuárias dos terminais portuários, avalia mover uma ação direta de inconstitucionalidade contra o novo marco legal do setor, aprovado em 2013, por ferir o preceito do acesso universal ao trabalho. A nova Lei dos Portos determina que todas as contratações de empregados sejam feitas por intermédio dos Órgãos Gestores de Mão de Obra (Ogmos), uma instância que recruta e aloca trabalhadores. Até então, os terminais davam preferência aos cadastrados nesses órgãos, mas também podiam recrutar no mercado. Mauro Salgado, presidente da Federação Nacional dos Operadores Portuários (Fenop), enxerga um potencial aumento de custo dos trabalhadores. Ele explica que, podendo contratar diretamente e mantendo um quadro estável, o terminal treina seus trabalhadores e ganha produtividade, o que significa menor preço. Essa garantia, avalia, não existe se há uma intermediação e o uso de trabalhadores avulsos. "A contratação com carteira assinada é uma evolução natural e desejável", afirma Salgado. "É a desprecarização do trabalho." Outro problema é que deve aumentar a base de trabalhadores cadastrados nos Ogmos, diz a Fenop. E esses organismos garantem uma renda mínima aos integrantes de sua base. "Esse é um custo adicional que teremos de carregar", diz Salgado. Questionada, a Secretaria de Portos não se manifestou. Dentro do governo, a avaliação é que esse debate só deverá avançar a partir de 2015, já sob o novo governo. As estimativas da Comissão Portos indicam que, em três anos, o contingente de trabalhadores contratados por intermédio dos Ogmos esteja em 31 mil, o mesmo nível de 1999. Atualmente, são 23 mil. "O problema é que os Ogmos às vezes montam equipes superdimensionadas, que o operador não acha necessário", explica o presidente executivo da Associação Nacional dos Usuários do Transporte de Carga (Anut), Luis Henrique Teixeira Baldez. "Isso pode aumentar o custo." Por enquanto, porém, não houve impacto significativo nas tarifas, segundo ele. Equilíbrio. "Os operadores querem contratar livremente, e com isso não vamos concordar", diz o presidente da Federação Nacional dos Portuários (FNP), Eduardo Guterra. Ele avalia que a nova lei criou uma situação de equilíbrio entre empresas e trabalhadores. O principal avanço, segundo o sindicalista, é um programa de treinamento da mão de obra portuária que já está em andamento. O sindicalista rebateu a afirmação de que o trabalhador portuário avulso tenha uma situação precária em comparação àquele com carteira assinada. "Ele paga Imposto de Renda, INSS, tudo", disse. "É como se o Ogmo tivesse assinado a carteira dele." O superdimensionamento de equipes tampouco existe, segundo Guterra.

(Fonte: Estado de São Paulo dia 15-10-2014).

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