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ConstitucionalProfessor Marcelo Novelino Camargo Sumrio

Marcelo Novelino

10/08/2010 Aulas 1 e 2 .......................................................................................................................... 3 Constitucionalismo ................................................................................................................................. 3 Princpios instrumentais ......................................................................................................................14 12/08/2010 Aula 3 ................................................................................................................................17 Princpios instrumentais (continuao) .............................................................................................17 Controle de Constitucionalidade teoria geral ................................................................................19 30/08/2010 Aula 4 ................................................................................................................................23 Controle de Constitucionalidade teoria geral (continuao) .......................................................23 1/09/2010 Aula 5 ................................................................................................................................30 Controle de constitucionalidade teoria geral (continuao) ........................................................30 14/09/2010 Aula 6 ................................................................................................................................37 Direitos Fundamentais .........................................................................................................................37 23/09/2010 Aula 7 ................................................................................................................................43 Direitos Fundamentais (continuao)................................................................................................43 11/10/2010 Aula 8 ................................................................................................................................51 Direitos Fundamentais (continuao)................................................................................................51 20/10/2010 Aula 9 ................................................................................................................................64 Classificao das normas constitucionais ..........................................................................................64 Direitos sociais ......................................................................................................................................70 03/11/2010 Aula 10 ..............................................................................................................................75 Direitos sociais (continuao) .............................................................................................................75 Poder constituinte.................................................................................................................................80 17/11/2010 Aula 11 .................................................................................................................................87 Poder constituinte (continuao) .......................................................................................................87 Normas constitucionais no tempo .....................................................................................................97 02/12/2010 Aula 12 ..............................................................................................................................99 Normas constitucionais no tempo (continuao) ............................................................................99 Controle de Constitucionalidade ..................................................................................................... 103 06/12/2010 Aula 13 ........................................................................................................................... 113 Intensivo I Pgina 1

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Controle de constitucionalidade ...................................................................................................... 113 03/01/2011 Aula 14 ........................................................................................................................... 130 Direitos da nacionalidade ................................................................................................................. 130 Direitos polticos ............................................................................................................................... 144 10/01/2011 Aula 15 ........................................................................................................................... 146 Direitos polticos (continuao) ...................................................................................................... 146 10/01/2011 Aula 16 ........................................................................................................................... 160 Direitos polticos (continuao) ...................................................................................................... 160 Concepes de constituio ............................................................................................................. 165 Mtodos de interpretao ................................................................................................................. 169

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Direito Constitucional 10/08/2010 Aulas 1 e 2

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ConstitucionalismoO constitucionalismo nada mais do que a histria das Constituies. Em sentido amplo, um termo que est ligado idia de Constituio. E todo Estado tem uma Constituio, ainda que no escrita porque todo Estado tem uma norma de organizao. Foi nesse sentido que o constitucionalismo sempre existiu. Mas a idia evoluiu e hoje, o constitucionalismo associado a, pelo menos uma das 3 idias seguintes: 1) Garantia de Direitos 2) Separao de Poderes 3) Princpios e Governo Limitado O constitucionalismo, geralmente, se contrape ao absolutismo. uma busca do homem poltico pela limitao do poder, uma busca contra o arbtrio do poder do Estado. Por isso, as idias do constitucionalismo podem ser contrapostas ao Absolutismo. Vamos estudar aqui vrias principais experincias constitucionais que ocorreram ao longo do tempo. Nem todos os autores trazem essa progresso histrica de forma completa. Aqui faremos a abordagem completa. Constitucionalismo Antigo Foi a primeira experincia Constitucional. Foram 4 as experincias ocorridas no constitucionalismo antigo, a dos hebreus, a da Grcia antiga, a de Roma e a da Inglaterra: a) A experincia ocorrida entre os Hebreus No caso dos hebreus, o constitucionalismo est ligado ao Estado teocrtico. O constitucionalismo est sempre ligado a uma das 3 idias supracitadas. Entre os hebreus, o governo era limitado atravs de dogmas consagrados na Bblia. Por isso, so considerados a primeira experincia constitucional da histria, de limitaes do governo, atravs de dogmas religiosos. b) A experincia ocorrida na Grcia antiga No caso da Grcia, ocorreu a mais avanada forma de governo de que j se teve notcia at hoje, a chamada democracia constitucional. As pessoas participavam diretamente das decises polticas do Estado (Cidade-Estado de Antenas). c) A experincia ocorrida em Roma Roma deve-se associar a idia de liberdade. Rudolf Von Ihering, um autor clssico do direito, disse que nenhum outro direito teve uma idia de liberdade to certa e com tanta dignidade quanto o direito romano. A idia de liberdade a principal caracterstica da experincia romana, que reviveu, um pouco, a experincia grega. d) A experincia ocorrida na Inglaterra A experincia inglesa , at hoje, muito importante (foi objeto de uma questo de prova do MP/MG). Na Inglaterra, uma experincia importantssima foi a chamada rules of law, que deve ser traduzida por governo das leis. Na Inglaterra, o governo das leis surgiu em substituio ao governo dos homens. Esta experincia constitucional inglesa contribuiu com duas idias fundamentais: 1) governo limitado e 2) igualdade dos cidados ingleses perante a lei. Essas so as duas idias principais do rule of law. Essas idias do 3

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constitucionalismo ingls surgiram na Idade Mdia. Na Inglaterra, no existe uma Constituio escrita, mas desde aquela poca j havia documentos de grande valor constitucional, como a Magna Carta de 1215, por exemplo, o Bill of Rights, o Petition of Rights. Essas foram as experincias ocorridas no constitucionalismo antigo. Constitucionalismo Clssico ou Liberal Foi a segunda experincia constitucional, com alguns marcos histricos importantes. O constitucionalismo clssico surgiu a partir do final do sculo XVIII. Um fator, ocorrido nessa poca, foi muito importante: as chamadas revolues liberais (revolues Francesa e Americana), feitas pela burguesia em busca de direitos libertrios. O que se buscava com essas revolues era a liberdade dos cidados em relao ao autoritarismo do estado. O principal valor aqui: liberdade. Com essas revolues ocorreu o surgimento das primeiras constituies escritas. At ento, todas as constituies eram consuetudinrias, baseadas nos costumes. H duas experincias importantssimas no constitucionalismo clssico: Revoluo Norte-americana Apesar de no ter ficado to conhecida como a Revoluo Francesa, teria a mesma importncia, seno importncia maior porque no foi to sangrenta. Surgiu, nesse cenrio, a primeira constituio escrita de que se tem notcia, a Declarao de Direitos do Bom Povo da Virgnia, o famoso Virginia Bill of Rights, de 1776. Logo depois dela, em 1787, a Constituio Americana surgiu e at hoje est em vigor. Representa o constitucionalismo clssico. Foi a segunda Constituio escrita que se tem notcia. As duas principais idias com as quais os americanos contriburam para o constitucionalismo so as seguintes: a) A idia de supremacia da Constituio No direito norte-americano, a supremacia da Constituio vem da idia de regra do jogo. Para os norte-americanos, a Constituio a norma suprema porque estabelece as regras do jogo. Quando se discute reforma poltica, se fala muito nisso. Como funciona essa idia? A Constituio que estabelece as competncias do Executivo, do Legislativo, e do Judicirio. ela quem vai dizer quem manda, como manda e at onde manda. Se a Constituio a responsvel por estabelecer as regras do jogo poltico, por uma questo lgica tem que estar acima dos jogadores. da que vem a idia de supremacia. b) A garantia jurisdicional Por que o Judicirio o principal encarregado de garantir a supremacia da Constituio? Por que no o legislativo, que uma casa democrtica, composta por representantes do povo, por que no o Executivo, com seus membros eleitos pelo povo? Por que justamente o Judicirio, aquele que tem menos legitimidade democrtica, que vai garantir a supremacia da Constituio? Ele o mais indicado porque o mais neutro politicamente. Por isso o mais indicado para garantir a supremacia constitucional. Democracia no s vontade da maioria, seno vira ditadura da maioria, mas inclui tambm a garantia de direitos. Se se deixar Legislativo e Executivo agirem livremente, eles vo sempre querer maximizar os interesses da maioria 4

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momentnea para se fortalecer. O Judicirio vai desempenhar o papel de contramajoritrio. ele que vai proteger o direito das minorias. Experincia Francesa Na Frana, surgiu a primeira constituio escrita da Europa, em 1791. Durou pouqussimo tempo. A experincia francesa contribuiu com duas idias principais: a) Garantia de direitos e b) Separao dos Poderes. A Declarao Universal dos Direitos do Homem e do Cidado de 1789 e serviu de prembulo para a Constituio Francesa de 1791. No art. 16, da Declarao, diz o seguinte: Toda sociedade na qual no h garantia de direitos ou separao de poderes no possui uma Constituio. Para ser considerada uma sociedade constitucional, ela tem que ter essas duas idias, que uma forma de limitao de poder. Sem essas duas idias, garantia de direitos e separao dos poderes, sem isso, no h que se falar em Constituio. Uma constituio que no consagre direitos e que no reparta direitos de forma limitada, no uma constituio verdadeira. Isso est na Declarao dos Direitos do Homem e que representa a idia principal do constitucionalismo clssico francs. Constitucionalismo Moderno a terceira fase do constitucionalismo. Enquanto o clssico o liberal, o moderno chamado de constitucionalismo social. O constitucionalismo moderno surgiu a partir do fim da I Grande Guerra. Qual foi o fator que levou ao surgimento de um novo constitucionalismo? Comeou-se a perceber um certo esgotamento da idia liberal (que protegia os direitos de liberdade, mas no os sociais). Por que os direitos sociais no eram atendidos surgiu um novo constitucionalismo. Impossibilidade do constitucionalismo liberal de atender as demandas sociais que abalavam o sculo XIX. A primeira gerao dos direitos fundamentais, surgiu no constitucionalismo clssico (dos EUA e Frana), e consagrou a liberdade. A segunda gerao dos direitos fundamentais, o social, o econmico, o cultural, consagrou a igualdade material. De nada valeria a liberdade, sem a igualdade substancial. A igualdade pressuposto para que a liberdade possa existir. Dentro do constitucionalismo moderno, h um autor italiano, Micareti de Lucia, que fala do constitucionalismo moderno dividido em 4 ciclos: 1 Ciclo: Constituies da democracia marxista ou socialista 2 Ciclo: Constituies da democracia racionalizada 3 Ciclo: Constituies da democracia social 4 Ciclo: Constituies de pases subdesenvolvidos

Neoconstitucionalismo (ou constitucionalismo Contemporneo) Aqui trataremos das experincias ocorridas no mundo de hoje e o estudo, neste ponto, ser mais aprofundado. Como o constitucionalismo contemporneo atua. Para os que se formaram h mais de 5

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dez anos, tudo o que ser dito aqui, no era falado na faculdade porque recente na experincia brasileira. importante traar uma viso panormica e depois aprofundar alguns pontos que sero desenvolvidos ao longo do semestre. O constitucionalismo contemporneo vem sendo chamado por alguns autores de neoconstitucionalismo. No so todos que concordam com essa denominao porque dizem que no h nada de to novo que justifique esse novo nome. Dizem que o que se tem uma conjugao de experincias que sempre ocorreram. Mas outros autores, como Barroso, defendem o neoconstitucionalismo. Quando surgiu o constitucionalismo contemporneo? Qual a marca histrica desse incio? O moderno surge no fim da I Guerra Mundial. O contemporneo vai surgir no fim da II Grande Guerra. Por que comeou a se criar um novo constitucionalismo? Atrocidades foram cometidas durante a II Guerra, notadamente pelos nazistas e todas elas com base no ordenamento jurdico, na lei. Isso acabou colocando em cheque o positivismo jurdico. Comeou-se a perceber que o positivismo jurdico, ou seja, se est na lei direito, poderia justificar barbries. Ento, comeou-se a se falar em uma nova leitura moral do direito. O direito no apenas forma, no apenas norma jurdica, ele tem que ter um contedo moral para ser vlido como, por exemplo, sustentam, nos EUA: Ronald Dworkin e na Alemanha: Robert Alexy. E ai vem a surgindo uma nova idia de constitucionalismo no direito que Paulo Bonavides chama de ps-positivismo (ser tratado mais frente). Quais foram os fatores que contriburam para o surgimento deste novo constitucionalismo? Com o fim da II Grande Guerra, as constituies comearam a consagrar, expressamente, a dignidade da pessoa humana. E mais do que isso, alm disso, passou a ser considerada um valor constitucional supremo. A dignidade um atributo que todo ser humano tem. Se a dignidade valor supremo, isso significa que o Estado existe para o cidado e no o contrrio. O cidado um fim em si mesmo, no pode ser entendido como um meio para atingir o Estado. Todos os indivduos, brancos, negros, ndios, so dotados da mesma dignidade. Na Alemanha nazista, havia a legislao mais avanada do mundo sobre experincias humanas. E isso s poderia ser feito, se desse consentimento. O argumento usado para as experincias feitas com judeus e ciganos era o de que essas pessoas eram seres humanos inferiores. A lei se aplicava aos seres humanos da raa superior. Aos pertencentes raa inferior, no. Havia uma lei que no era aplicada a todos indistintamente. Hoje, isso inconcebvel. Os direitos fundamentais no podem ser tratados de forma diferenciada. A partir da dignidade da pessoa humana, como ncleo da constituio, aconteceu a chamada rematerializao constitucional. O professor est falando das causas de surgimento de um novo constitucionalismo. A partir da consagrao dignidade da pessoa humana como ncleo das constituies, houve uma rematerializao da Constituio, com opes polticas sendo consagradas com diretrizes, com direitos fundamentais. As constituies antigas, do constitucionalismo liberal e por isso so chamadas de clssicas, eram concisas (breve, sucinta ou sumria). Era um modelo tpico do constitucionalismo clssico. Depois, as constituies se tornaram extremamente prolixas. Essa rematerialiao um fenmeno no s do Brasil, mas de vrios pases. 6

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Como a dignidade da pessoa humana protegida nestas constituies? Atravs dos direitos fundamentais. Comeou-se a consagrar um extremo rol de direitos fundamentais exatamente para proteger a dignidade da pessoa humana. Os direitos listados no art. 5, da CF, visam proteo da dignidade da pessoa humana. No adianta nada estabelecer uma declarao de direitos como foi na poca da Revoluo Francesa, sem fora. As Constituies antigamente tinham um carter mais poltico e no eram vistas como um rgo vinculante. E a vem a terceira causa do surgimento desse novo constitucionalismo, que o reconhecimento da fora normativa da Constituio. A obra de Konrad Hess, escrita em 1959, um marco do direito constitucional, a concepo jurdica da Constituio passa ser definitiva. H, pois, trs causas: 1. Consagrao da dignidade da pessoa humana como valor supremo 2. Rematerializao das constituies, com rol extenso de direitos fundamentais. 3. Fora normativa da Constituio. A partir dessas causas, surgiram algumas conseqncias. Algumas teorias foram modificadas, razo pela qual se pode, sim, falar em um novo constitucionalismo: Teoria da Norma Teoria das Fontes do Direito Teoria da Interpretao Vamos ver aqui, um panorama. A partir deste conhecimento geral, desta viso do todo, durante o semestre vamos tratar de como a teoria da norma foi modificada, etc. Teoria da Norma Na Teoria da Norma, a primeira alterao substancial que ocorreu foi com relao aos princpios. Os princpios, na teoria clssica, no eram considerados normas. Essa doutrina fazia distino entre princpios e normas, como se fossem coisas distintas. Norma, obrigatria, vinculante. Principio era diretriz, conselho, apenas. Essa era a teoria clssica. Hoje no se concebe mais dessa forma. Hoje, o entendimento que a norma o gnero e dentro desse genro, norma jurdica, contm duas espcies, que so os princpios e as regras. O princpio hoje no visto como algo diferente das normas. Ele norma. espcie de norma. LICC, CLT e CPC os trs documentos falam a mesma coisa: o juiz tem que aplicar a norma, se no der, usa a analogia, depois, os costumes e, por ltimo, usa os princpios gerais do direito. Ento, ainda existe esse rano positivista no direito. Paulo Bonavides fala da evoluo e diz que os princpios gerais do direito nada mais so do que os princpios constitucionais. E os princpios constitucionais esto no alto na hierarquia. Os princpios gerais do direito, ento, deixaram o ltimo grau de normatividade e foram para o topo da hierarquia normativa. Hoje os princpios constitucionais esto no topo da hierarquia normativa. Esto to no topo que h at um certo exagero. Alguns dizem que hoje h mais princpios do que regras. Os princpios so importantes, mas do uma margem de subjetividade, de discricionariedade muito grande para o juiz. Com base em um princpio, o juiz decide da forma como bem entender. Diante de uma regra especfica e de uma regra, deve-se aplicar a regra especfica porque esta nada mais do que uma concretizao feita

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pelo legislador a partir do princpio geral. obvio que se pode afastar a norma no caso concreto, quando se crie uma grande injustia ou se a norma for inconstitucional. Em IED se costuma aprender que a aplicao da norma se d pela subsuno (premissa maior, que a deciso contida na norma e tem a premissa menor, que o caso concreto. Se ocorrer a hiptese prevista na norma, aplica-se a consequncia, o que resulta na subsuno). Essa subsuno, que ser estudada depois, hoje aplicada mais em relao s regras. As regras permitem essa aplicao subsuntiva. Se um servidor atinge 70 anos, automaticamente, a norma aplicada, independentemente de outras ponderaes. Os princpios de uma forma geral no se aplicam por subsuno, mas via ponderao. No se em como aplicar um princpio de forma automtica. preciso ponderar os vrios princpios envolvidos. Um exemplo clssico: (falha na transmisso). Teoria das Fontes do Direito Na poca do positivismo jurdico, o principal protagonista dentre os trs Poderes era o legislador, que fazia a lei. Alguns neoconstitucionalistas sustentam que o principal protagonista o juiz, no mais o legislador. O professor considera um exagero dizer isso. Montesquieu tem uma frase conhecida: todo aquele que detm poder e no encontra limite, tende a dele abusar. Quando se fala que o juiz o principal protagonista exagerado porque isso pode ferir o equilbrio dos Poderes, dar margem para o abuso. O excesso do neoconstitucionalismo uma forma de reao ao positivismo. A toda ao corresponde uma reao. A tendncia que a reao seja forte, para depois encontrar um ponto de equilbrio, ou seja, nem o positivismo, nem o neoconstitucionalismo exagerado. Quando se fala em protagonismo do Judicirio fala-se muito do ativismo judicial. Os prprios Ministros do Supremo tem tido uma postura bastante ativa. O prprio supremo tem hoje uma atuao mais ativa do que antes. Quando se tem um legislativo fraco, o Judicirio se fortalece e isso que vemos acontecer atualmente. Como o legislador no faz o que deveria fazer, o Judicirio cresce e faz as vezes do legislador. Por exemplo, no mandado de injuno, o Supremo sempre ou quase sempre adotou a corrente no-concretista, com a cincia do poder competente de sua omisso. Recentemente, com relao ao direito de greve, fez a norma, no s para quem impetrou, mas para todos os servidores. Mas por que fez isso? Porque o STF vinha cobrando h 20 anos e at hoje nada. Kelsen dizia o seguinte: quando o tribunal constitucional no controle abstrato declara uma lei inconstitucional, essa deciso tem efeito erga omnes, tem efeito geral e abstrato. Nesse caso, faz o mesmo que o legislador quando cria uma lei. Da, Kelsen falar em legislador negativo. Ele diz que quando o Judicirio declara uma lei inconstitucional com efeito erga omnes, geral e abstrato, atua como rgo do Judicirio, como legislador negativo. O STF sempre disse que pode atuar como legislador negativo, mas no como legislador positivo. Gilmar Mendes, recentemente declarou que essa distino coisa do passado. Hoje, o tribunal atua como legislador negativo e como legislador positivo, como aconteceu no mandato de injuno. No Brasil esse fenmeno mais recente, mas nos EUA mais antigo. Os americanos dizem que ns estamos submetidos Constituio, mas ela aquilo que os juzes dizem que ela . A judicializao das relaes polticas e sociais outra expresso muito utilizada para esse ativismo judicirio. O direito hoje est cada vez mais presentes em questes polticas e em questes cotidianas. Matrias em que antes o direito no intervinha, agora est intervindo. Um exemplo: 8

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judicializao da poltica. O STF tem decidido sobre limites e poderes da CPI. Esse controle feito pelo judicirio sobre CPI, que instrumento do Legislativo, uma judicializao da poltica. Fidelidade partidria tambm. Verticalizao outro exemplo de judicializao das relaes polticas. A judicializao das relaes sociais. O STF tem dado decises importantssimas: uso de clulas tronco-embrionrias, demarcao de reservas indgenas, casamento entre pessoas do mesmo sexo, aes afirmativas (quotas das universidades), at a questo se a espuma do chop faz parte do chop ou no. Ser que o Judicirio tem conhecimento tcnico suficiente em todas as matrias? Ser que justo algum que no estava na fila do transplante passar na frente de todos por conta de uma deciso de um juiz a seu favor? Ser que o juiz sabe mais do que o mdico que elaborou a lista? A questo dos tratados internacionais - O direito internacional vem ganhando importncia em todos os pases do mundo. Na Itlia, Luigi Ferraiolli (?) fez um estudo e concluiu que 80% da legislao italiana tem influncia direta do direito internacional. O STF decidiu recentemente (esse tema ser tratado mais na frente) sobre o Tratado Internacional de Direitos Humano. Na jurisprudncia do STF, at um ano atrs, tratado internacional, fosse ele de direitos humanos ou no, tinha status de lei ordinria. Em 2004, houve a Emenda Constitucional 45 e se ele fosse aprovado por 3/5 em 2 turnos teria status de emenda. No final do ano passado, a questo foi decidida de forma definitiva pelo Supremo. Eram dois posicionamentos: 1. Celso de Mello, dizendo que esses tratados tinham status constitucional. 2. Gilmar Mendes, dizendo que eles tinham status supralegal, abaixo da constituio, mas acima das leis. Hoje, o STF entende que o tratado internacional de direitos humanos tem tratado supralegal. Est acima das leis. A lei no pode contrariar um tratado internacional se for de direitos humanos. Alguns autores, como Luiz Flvio Gomes esto falando em controle de convencionalidade. O professor gosta mais da expresso controle de supralegalidade. Porque no todo tratado e conveno internacional que vai permitir esse controle, mas apenas os tratados internacionais de direitos humanos. O controle de supra-legalidade seria um controle feito em face desses tratados. Teoria da Interpretao Houve duas mudanas bsicas: 1) Com relao aos mtodos de interpretao vimos que as primeiras constituies escritas surgiram no final do sculo XVIII (Constituio francesa e norte-americana). Durante mais de 150 anos essas constituies eram interpretadas pelos mesmos mtodos desenvolvidos por Savigny para interpretar o direito privado (mtodo gramatical, lgico, histrico, sistemtico, teleolgico). No existiam mtodos especficos de interpretao da constituio. Esses mtodos s comearam a ser estudados a partir da II Grande Guerra. Com relao aos postulados ou princpios interpretativos Alm dos mtodos, vamos estudar tambm os princpios de interpretao, que so os postulados ou princpios interpretativos. Isso foi questo de prova da magistratura/SP, que pediu para diferenciar os princpios instrumentais dos princpios materiais (classificao de Luis Roberto Barroso). Os materiais e so consagrados no texto da Constituio. Outros no esto na Constituio. So aqueles aceitos pela doutrina e pela jurisprudncia, usados para interpretar a Constituio: princpio da interpretao conforme a Constituio, da 9

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unidade, da concordncia prtica, etc., e que sero estudados mais adiante. Sem esses postulados difcil resolver determinadas questes constitucionais. Barroso tem uma frase marcante e que demonstra a importncia do direito constitucional: toda interpretao jurdica uma interpretao constitucional. E por que isso? Quando se vai aplicar uma lei, qual a primeira coisa que se deve fazer? Examinar se ela compatvel com o seu fundamento de validade, que a Constituio. Ao fazer isso, entre a lei e a Constituio, essa anlise interpretar a constituio. Ao aplicar uma lei, necessariamente se tem que interpretar a Constituio. Trata-se da chamada aplicao indireta negativa ver se a lei compatvel ou no com a Constituio. Quando a lei aplicada, a Constituio aplicada apenas indiretamente. A outra hiptese quando se faz essa anlise e interpreta a lei conforme a Constituio. Exemplo? Se a lei tem dois sentidos possveis e s um deles compatvel com a Constituio, este o que dever ser aplicado. Essa a interpretao conforme. Quando se interpreta a lei conforme a constituio ocorre o que se chama na doutrina de filtragem constitucional. A filtragem constitucional nada mais do que passar a lei no filtro da Constituio para extrair dela o seu sentido mais correto. ver a lei luz da Constituio. por isso que se fala muito hoje em constitucionalizao do direito. Hoje, no se pode interpretar o direito civil seno luz dos valores constitucionais. A mesma coisa com relao ao direito administrativo, ao penal, etc. Essa uma aplicao finalstica da Constituio. Se aplica a lei, mas com o fim constitucionalmente protegido. possvel haver uma aplicao indireta negativa, como no primeiro caso, quando se faz o controle de constitucionalidade, possvel haver uma interpretao finalstica, quando se faz uma interpretao conforme a Constituio ou possvel ter ainda uma terceira hiptese, que a aplicao direta da Constituio. Hoje se fala da eficcia horizontal dos direitos fundamentais, admitindo-se que seja aplicado diretamente da Constituio. No a lei, em alguns casos, que regula. Por isso, L. R. Barroso diz que a interpretao jurdica tambm uma interpretao constitucional. At aqui, as anotaes eram de outra pessoa de um curso do Intensivo I do semestre passado. A partir daqui, minhas anotaes. Tambm chamado de Constitucionalismo contemporneo. o que estamos agora, que se iniciou meados do sculo passado. Hoje h uma teoria que tenta conciliar o direito natural e o positivismo, que se chama ps-positivismo. Hoje, se coloca os princpios e as regras como normas jurdicas. Direitos de terceira gerao (ou dimenso): associada a fraternidade ou solidariedade. A classificao que vamos utilizar aqui a do professor Paulo Bonavides. Ele lista quais so os direitos de terceira gerao (rol exemplificativo numerus apertus): direito ao progresso ou desenvolvimento; direito de autodeterminao dos povos; direito de comunicao; direito ao meio ambiente; direito de propriedade sobre o patrimnio comum da humanidade. At 2008, Paulo Bonavides colocava a paz como direito de 3 gerao. No entanto, ele reviu este posicionamento e passou a colocar a paz como direito fundamental no de 3 gerao, mas de 5 gerao um objetivo a ser buscado, mas que ainda no foi alcanado. Os direito de 3 gerao so direitos transindividuais (nem individuais como os de 1 gerao e nem coletivos, como os de 2 gerao).

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Direitos de quarta gerao: so introduzidos pela globalizao poltica. So direitos de 4 gerao: democracia, informao e pluralismo. Entre estes, merecem maior ateno os direitos de democracia e pluralismo (um dos valores mais importantes e fundamento da Repblica Federativa do Brasil). Democracia No vista hoje apenas em seu aspecto formal ou no sentido estrito. A democracia em seu aspecto formal est ligada premissa majoritria, que significa a vontade da maioria. Este o conceito mais tradicional de democracia. Mas para ser efetivada, a democracia deve ser precedida de alguns valores e direitos. Habermas, por exemplo, diz que, para que as pessoas possam exercer seus direitos de democracia com plenitude, devem ter outros direitos fundamentais, como o direito liberdade de reunio, de associao, de expresso do pensamento. Estes direitos individuais so pressupostos para o exerccio de direitos polticos. H hoje, ento, a democracia em sentido material ou amplo: no apenas a vontade da maioria, mas tambm a fruio de direitos bsicos por todos, inclusive pelas minorias. O poder legislativo e o poder executivo fazem valer estas premissas majoritrias. Mas o poder judicirio que, pelo fato de no ser eleito pelo povo, exerce o papel de garantir estes direitos individuais. Noberto Bobbio associa a democracia observncia das regras do jogo, quando ele diz que a maioria no tem como exercer sua vontade direitamente, sendo necessrio que escolha algum para represent-la. H que ter ento algumas regras que legitime a atuao dos representantes estas regras tm que ser observadas para conferir legitimidade aos representantes da maioria. Para que estas regras do jogo sejam observadas, necessria a observncia de direitos anteriores (regras do pr-jogo), que so os mesmos listados por Habermas. Esta preocupao com as minorias est muito presente com a definio que Dworkin d para democracia (definio totalmente diferente do conceito tradicional de democracia): ele utiliza o conceito de democracia constitucional, que consistiria no tratamento de todos com igual respeito e considerao comunidade de princpios, que s existe quando todos so tratados com igual respeito e considerao. Ele d o exemplo da Alemanha nazista, onde no havia uma comunidade de princpios, pois as minorias no se sentiam parte da comunidade. Pluralismo Ligado diretamente ao respeito diversidade e o direito das minorias. Este pluralismo pode ser extrado do art. 1, V, CF pluralismo poltico aqui a CF no fala apenas em pluralismo poltico-partidrio ou ideolgico, mas possui um conceito mais amplo, abrangendo o pluralismo religioso (respeito a diferentes crenas religiosas), artstico, cultural, de opes e de orientaes pessoais tudo isto est consagrada pelo pluralismo garantido pela CF. O pluralismo pode ser extrado ainda do prembulo da CF, que fala em uma sociedade pluralista: direitos sociais e individuais, a liberdade, a segurana, o bem-estar, o desenvolvimento, a igualdade e a justia, como valores supremos de uma sociedade fraterna, pluralista e sem preconceitos. Boaventura de Sousa Santos: Temos o direito de ser iguais quando a diferena nos inferioriza e temos o direito de ser diferentes quando a igualdade nos descaracteriza. Estado Democrtico de Direito. Novo paradigma, novo modelo de Estado. um Estado que vai buscar sintetizar as conquistas das experincias anteriores, e superar suas deficincias. H outras expresses para Estado Democrtico de Direito, como Estado Constitucional Democrtico (expresso utilizada pelo professor). No Brasil, Estado Democrtico de Direito ainda a expresso mais utilizada, mas a outra 11

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expresso j vem sendo usada por alguns autores no Brasil. A utilizao desta nova expresso importante, pois Estado Democrtico de Direitos est ligado ideia de imprio da lei, e ns sabemos que, depois da 2 GM, este paradigma foi substitudo pela ideia de fora normativa da Constituio (e no mais imprio da lei). A superioridade hoje da Constituio e no da lei. Fala-se ento em Estado Constitucional Democrtico para reforar este novo paradigma de superioridade da Constituio. So a mesma coisa ento Estado Democrtico de Direito e Estado Constitucional Democrtico. Caractersticas principais. a. O ordenamento jurdico introduz mecanismos de participao do povo no governo do Estado. Ento a expresso Estado Democrtico traduz exatamente esta caracterstica, de participao indireta (elegendo representantes) e direta (por plebiscito consulta anterior medida , referendo consulta posterior medida , iniciativa popular de leis como no caso da ficha limpa e ao popular ao que qualquer do povo pode ajuizar). b. Preocupao no apenas com o aspecto formal, mas tambm com o carter substancial dos direitos fundamentais. Trazer os direitos para a sociedade e fazer com que eles cumpram sua funo social, com que sejam efetivados. H uma transformao da definio desses direitos (democracia, igualdade, entre outros, so direitos cujos conceitos vo evoluindo para atender s demandas sociais). c. A limitao do poder legislativo deixa de ser meramente formal e passa a ter tambm um aspecto material. Novamente, h uma preocupao com a substncia, com o contedo, e no apenas com a forma. Ex.: experincia europia at meados do sculo passado o legislador era limitado pela constituio para elaborar as leis, mas apenas no modo de formao das leis e no no seu contedo. Hoje, na Europa, nos EUA e no Brasil, h limites materiais formao de leis em face das Constituies. d. Jurisdio constitucional voltada a assegurar a supremacia da Constituio e a proteo efetiva dos direitos fundamentais. Jurisdio constitucional significa uma proteo da Constituio e dos direitos fundamentais pelo poder judicirio. Caractersticas do neoconstitucionalismo Normatividade da Constituio At meados do sculo passado, na Europa a Constituio era vista como um documento de carter meramente poltico, sobretudo na parte dos direitos fundamentais. Entendia-se que ela no vinculava o poder legislativo. Os Europeus diziam que, se o legislativo o rgo mximo de representao popular, claro que eles no violariam os direitos fundamentais. Mas percebeu-se que no era bem assim e que eles violavam sim os direitos fundamentais. Ento a Constituio passou a ser vista como um documento de carter jurdico (de carter obrigatrio). Konrad Hesse A Fora Normativa da Constituio em 1959, Konrad Hesse fez uma conferncia em uma universidade da Alemanha, a qual se tornou nesta obra clssica. Superioridade da Constituio.

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A ideia de supremacia do parlamento substituda pela ideia de supremacia da Constituio. Sem a supremacia da Constituio no tem como falar em neoconstitucionalismo. Para falar em neoconstitucionalismo, tem que ter uma superioridade da Constituio. Centralidade da Constituio (...) Trs aspectos importantes na constitucionalizao dos direitos: consagrao de outros ramos do direito na Constituio; filtragem constitucional (esta expresso diz o seguinte: se os ramos do direito tm os seus princpios bsicos na constituio, para interpretar as normas desses ramos de forma correta, esta interpretao tem que ser luz da Constituio o filtro constitucional uma interpretao de outros ramos do direito luz da constituio princpio da interpretao conforme a constituio); eficcia horizontal dos direitos fundamentais (antes no se aplicava os direitos fundamentais nas relaes privadas, mas hoje eles so aplicados diretamente s relaes entre particulares como os particulares esto no mesmo plano, fala-se em eficcia horizontal dos direitos fundamentais). Hoje questes como CPI, fidelidade partidria, etc., so todas resolvidas com base na Constituio, por isso se fala em centralidade da constituio. Rematerializao das Constituies Caractersticas do Estado Democrtico de Direito e das Constituies modernas ter um extenso rol de direitos fundamentais. As constituies so extremamente prolixas (analticas, regulamentar), ou seja, tratam amplamente de determinadas matrias, no se resumindo a princpios gerais. Alm de tratar de diversas matrias, as Constituies atuais tratam de programas de ao a serem desenvolvidos. O constitucionalismo dirigente hoje est sendo revisado, mas a CF Brasileira Constituio tipicamente dirigente. Maior abertura na interpretao e aplicao do direito No constitucionalismo contemporneo so criados vrios mtodos interpretativos e vrias teorias de interpretao da Constituio, que sero estudadas aqui. Hoje, a interpretao se tornou ponto central do direito. Subsuno: premissa maior (norma), premissa menor (fato) e concluso lgica (aplicao da norma ao fato) esta subsuno s possvel em se tratando de normas. impossvel aplicar princpios atravs da subsuno. Por isso, hoje se fala tambm em ponderao (Robert Alexy), atravs da qual so aplicados os princpios. A ponderao uma espcie de balanceamento dos princpios, em que se compara dois ou mais princpios para se chegar a um determinado resultado. Para se chegar a este resultado, a ponderao complementada pela teoria da argumentao (este tema ainda no cobrado em concurso, ento no ser estudada aqui). Fortalecimento do poder judicirio O judicirio sempre foi considerado o poder mais fraco, mas hoje est extremamente fortalecido. Hoje, por exemplo, o judicirio pode adentrar no mrito de atos administrativos e legislativos, por conta do princpio da proporcionalidade. H um autor chamado Luiz Pietro Sanchs que tem o seguinte entendimento sobre neoconstitucionalismo: Mais princpio do que regras, mais ponderao que subsuno, constelao plural de valores consagrados na constituio e onipotncia judicial. Constitucionalismo do futuro

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Jos Roberto Dromi fala no constitucionalismo do futuro, o qual buscar o equilbrio, as concepes dominantes entre o constitucionalismo moderno e os excessos praticados pelo constitucionalismo contemporneo. O constitucionalismo do futuro, segundo Dromi, ter sete valores fundamentais: 1. 2. 3. 4. Verdade (estabelecer somente promessas realizveis); Solidariedade (entre os povos); Consenso (consenso democrtico); Continuidade (as constituies do futuro no devero ter rupturas bruscas em suas normas, sem a quebra da continuidade do sistema); 5. Participao (maior participao do povo na vida poltica); 6. Integrao (Constituio como principal elemento de integrao da comunidade); 7. Universalizao (dos direitos fundamentais, que sero consagrados em todas as Constituies)

Princpios instrumentaisSo muito cobrados em prova de 1 etapa e os gabaritos utilizam as definies de Canotilho1. Magistratura/SP qual a diferena entre princpios instrumentais e materiais? Os princpios instrumentais so aqueles utilizados na interpretao dos princpios materiais. Os princpios materiais so aqueles que consagram valores materiais aplicados para a soluo de casos concretos. Ex.: Princpio da igualdade um princpio material. Princpio da proporcionalidade, por sua vez, um princpio instrumental. Norma, regras e princpios Segundo Robert Alexy Norma como gnero e princpio e regras como espcies do gnero norma. Conceitos criados por Alexy e adotados pela doutrina e jurisprudncia, referentes a: Regra Princpios Regras: so mandamentos de definio, ou seja, normas que determinam que algo seja cumprido na medida exata de suas prescries. Obedecem a lgica do tudo ou nada que significa que, quando se vai aplicar uma regra, ou se aplica ela toda ou no se aplica nada. Dworkin tambm utiliza esta expresso de tudo ou nada. Forma de aplicao para as regras segundo Alexy: so aplicadas atravs da subsuno. O que Alexy chama de regra era o que se chamava antigamente de norma.

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Canotilho menciona esses princpios, mas quem os elaborou foram os alemes Friedrich Mller e Konrad Hesse.

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Ex.: quando a CF diz que so estveis aps trs anos de efetivo exerccio os servidores pblicos, isto uma regra e no um princpio. Aposentadoria compulsria aos 70 anos tambm uma regra. Matar algum com pena de 12 a 20 anos tambm uma regra. Princpios: so mandamentos de otimizao, ou seja, normas que ordenam que algo seja cumprido na maior medida possvel de suas prescries, de acordo com as possibilidades fticas e jurdicas existentes. O princpio no tem um peso absoluto, mas um peso relativo, pois depende das circunstancias do caso concreto. Sem conhecer as circunstncias do caso concreto, no tem como saber que peso atribuir quele princpio. Enquanto as regras obedecem a lgica do tudo ou nada, os princpios obedecem a lgica do mais ou menos. O grau de aplicao do princpio varia de acordo com vrios aspectos do caso concreto. Enquanto as regras se aplicam pela subsuno, os princpios de aplicam atravs da ponderao. * Obs.: Julgamento do STF sobre anti-semitismo: Ministro Gilmar Mendes ponderou os princpios da dignidade (para os judeus) e o princpio da liberdade de expresso (da editora nazista) e concluiu que o princpio da dignidade, neste caso, tinha maior relevncia. J o Ministro Marco Aurlio, que fez a mesma ponderao concluiu que a liberdade de expresso do pensamento tem um peso maior do que a dignidade do povo judeu. Estas divergncias podem e vo ocorrer, pois isto no uma equao matemtica. Por isso a doutrina tem trabalhado no sentido de tornar estas ponderaes mais objetivas, mais racionais, a fim de que sejam reduzidas as divergncias. Segundo Humberto vila Humberto vila utiliza uma definio de regra diferente do Alexy. Segundo ele: Regras: so normas imediatamente descritivas de comportamentos devidos ou atributivas de poder. Princpios: na definio de Humberto vila, so normas que estabelecem determinados fins a serem buscados. Ele menciona, ainda, uma terceira categoria, que so os: Postulados normativos: os postulados normativos so meta-normas que estabelecem um dever de segundo grau consistente em estabelecer a estrutura de aplicao e prescrever modos de raciocnio e argumentao em relao a outras normas. O que ele chama de postulado normativo bem parecido com os princpios instrumentais vistos. Para resolver um caso concreto, aplica-se as normas de primeiro grau (princpios e regras) e, para interpretar e argumentar estas normas de primeiro grau, utiliza-se as normas de segundo grau, que so os postulados normativos. Princpios instrumentais Princpio da unidade A Constituio deve ser interpretada de forma a evitar contradies (antagonismos, antinomias) entre suas normas. A Constituio deve ser interpretada como um todo e no isoladamente, as normas devem ser interpretadas de forma sistemtica. Ex.: o direito de propriedade garantido, mas importante que a funo social da propriedade seja atendida. E mesmo que ela cumpra a sua funo social, a propriedade pode ser desapropriada por interesse social. Este um tipo de 15

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interpertao da constituio em conjunto, sistemtica. Este princpio afasta uma tese defendida pelo autor alemo Otto Bachof2 trata da possibilidade de hierarquia entre normas da Constituio (tese da hierarquia de Krger). Segundo Krger, em uma Constituio originria (sem suas emendas) existem normas superior e inferiores. As normas inferiores podem declaradas inconstitucionais quando incompatveis com as normas superiores. Esta tese apenas para as normas originrias da Constituio (no se referindo a emendas, pois pacfico que as emendas podem ser objeto de controle de constitucionalidade). No Brasil, alguns tentaram utilizar esta tese, como o Partido Social Cristo PSC que ajuizou a ADI 4.097, pedindo que fosse declarado inconstitucional o art. 14, 4, CF, que diz que os analfabetos so inelegveis, norma esta que seria incompatvel com o princpio da igualdade, do sufrgio universal e da no discriminao. A questo foi decidida monocraticamente por Cesar Peluso, que entendeu no ser possvel fazer este controle de constitucionalidade por no haver hierarquia entre as normas constitucionais originrias. O princpio da unidade, ento, afasta a tese de hierarquia entre normas da constituio (questo da Magistratura de MG). Princpio da efeito integrador Muito parecido com o princpio da unidade. Segundo este princpio, nas resolues de problemas jurdico-constitucionais, deve ser dada primazia aos critrios que favoream a integrao poltica e social, produzindo um efeito criador e conservador da unidade. Este princpio uma especificao do princpio da unidade: ele diz que, se a CF o mais importante elemento do processo de integrao da humanidade, na hora de interpret-la preciso optar pelas solues que faam uma integrao poltica e social, sempre buscando a unidade. Princpio da concordncia prtica ou harmonizao O princpio da unidade utilizado quando h um conflito de normas abstratamente (garantia do direito propriedade e funo social da propriedade). Agora, quando h um conflito no em abstrato, mas diante de um caso concreto (coliso), utiliza-se a concordncia prtica (ex.: privacidade e liberdade de informao abstratamente no colidem, mas podem colidir em um caso concreto, quando ento deve-se utilizar no o princpio da unidade, mas da concordncia prtica). Ento, segundo o princpio da concordncia prtica, cabe ao interprete coordenar e combinar os bens jurdicos em conflito realizando uma reduo proporcional do mbito de aplicao de cada um deles. Para fazer esta concordncia prtica, deve-se reduzir proporcionalmente o mbito de aplicao de cada um deles, quando possvel. Ex.: princesa de Mnaco entrou na justia pedindo que no fossem mais publicadas fotos suas a questo chegou na Corte Europia de Direitos Humanos, que entendeu que determinadas fotos poderiam ser publicadas e outras no, dependendo do lugar onde foram tiradas (local aberto ao pblico que desse ou no expectativa de privacidade) a CEDH fez ento uma aplicao coordenada e combinada dos princpios. Princpio da relatividade ou convivncia das liberdades pblicas No existem princpios absolutos, pois todos encontram limites em outros princpios tambm consagrados na Constituio. Existe no STF hoje a ADPF 54 aborto dignidade do feto v.

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Normas Constitucionais Inconstitucionais?

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dignidade da mulher. Dos dois lados est o princpio da dignidade da pessoa humana. Se considerar que o princpio absoluto, no tem como resolver esta questo. Obs.: no confundir regra com princpio absoluto. Proibio de tortura e de trabalho escravo so regras e no princpios e, por isso, ou so aplicados totalmente ou no so. Princpio da fora normativa Este princpio apenas faz um apelo ao intrprete, para que ele utilize esta finalidade. Diz o princpio que na interpretao da constituio deve ser dada preferncia s solues densificadoras de suas normas que as tornem mais eficazes e permanentes. Ento o princpio diz que, quando formos interpretar a constituio, deve-se buscar a interpretao que permita o cumprimento da finalidade da norma. Na jurisprudncia do STF encontra-se este princpio para afastar interpretaes divergentes da CF (ex.: relativizao da coisa julgada quando o STF relativiza a coisa julgada ele utiliza o princpio da fora normativa).

12/08/2010 Aula 3

Princpios instrumentais (continuao)Princpio da mxima efetividade Invocado no mbito dos direitos fundamentais, impe lhe seja conferido o sentido que lhes d a maior efetividade possvel. Para alguns autores, este princpio pode ser inferido do art. 5, 1, da CF (conforme professor Ingo Sarlet) Princpio da justeza ou conformidade funcional Justeza aqui est no sentido de ajuste e no no sentido de justia. Este princpio impe aos rgos encarregados da interpretao constitucional cuidados para no chegar ao resultado que subverta ou perturbe o esquema organizatrio funcional estabelecido pela Constituio. Principal destinatrio deste princpio no Brasil o STF. Conformidade funcional cada Poder (executivo, legislativo e judicirio o ltimo, principalmente) deve agir conforme as funes que lhe foram atribudas. Ex.: art. 52, X, CF dispositivo que fala do papel do Senado (ser melhor explicado mais adiante). Princpio da proporcionalidade No Brasil, este princpio tambm costuma ser chamado de princpio da razoabilidade. A grande maioria da doutrina no difere estes dois princpios, considerando-os idnticos. H, entretanto, um autor Humberto vila que diferencia estes princpios no livro Teoria dos Princpios. O STF no diferencia o uso dos dois termos e em concurso tambm devemos consider-los idnticos. Vrios dispositivos da CF falam em proporcionalidade e em razoabilidade. Os termos proporcional e razovel so encontrados vrios vezes na CF. Mas o princpio da proporcionalidade no est consagrado, expresso, na CF/88. Trata-se, portanto, de um princpio implcito de nosso sistema. Se um princpio implcito, de onde que ele pode ser extrado,

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ou seja, onde ele est consagrado implicitamente? Trs teorias: uma do STF (mais utilizada) e outras duas. 1 teoria (entendimento menos utilizado) princpio da proporcionalidade estaria implcito no sistema de direitos fundamentais. Se os direitos fundamentais foram criados para limitar o abuso estatal, entende-se que estes direitos dizem ao Estado que seus atos s sero legtimos se forem atos proporcionais. Qualquer medida estatal que no for proporcional ser violadora de direitos fundamentais. 2 teoria (entendimento utilizado na Alemanha) o princpio da proporcionalidade seria deduzido do princpio do Estado de Direito. Este entendimento adotado desde o sculo XVIII (Rechtsstaat Estado de Direito). Trazendo este entendimento para o Brasil, dirse-ia que o princpio da proporcionalidade extrado do art. 1 da CF. 3 teoria (adotada pelo STF e majoritria) o princpio da proporcionalidade pode ser deduzido da clusula do Devido Processo Legal, em seu carter substantivo (art. 5, LIV, CF Ningum ser privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal). Este entendimento era o utilizado pela doutrina norte-americana e nos pases anglosaxnicos em geral. Este princpio for concretizado pela doutrina, que fala nas mximas parciais. Estas mximas parciais tm um carter de regra (na viso de Alexy). Na teoria de Alexy, a proporcionalidade no considerada princpio, pois proporcionalidade no objeto de ponderao. Na viso de Alexy a proporcionalidade um critrio aferidor da legitimidade de determinados atos praticados pelos poderes pblicos. Aqui, no se pondera o princpio da proporcionalidade com os outros princpios, mas se otimiza a proporcionalidade como um critrio aferidor. Por isso que, na viso de Alexy, a proporcionalidade uma mxima e no um princpio. Mxima o mesmo que postulado normativo (visto j em aula). Ou seja, utiliza-se a proporcionalidade para interpretao e aplicao de outras normas do ordenamento jurdico. Mximas parciais decorrentes da mxima da proporcionalidade (subdivises deste princpio) a) adequao significa uma relao entre meio e fim, ou seja, para que o ato seja proporcional, o meio utilizado pelo poder pblico tem que ser uma medida apta, idnea, a atingir o fim almejado. No entanto, este no o nico critrio a ser utilizado, pois no suficiente para tornar a medida proporcional. b) necessidade ou exigibilidade ou menor ingerncia possvel para atingir determinado fim, pode haver diversos meios aptos para isso. Ex.: para impedir a violncia nos estdios de futebol, pode-se simplesmente impedir a ida das torcidas aos estdios. Esta medida apta, mas no necessria. Ento est mxima significa que dentre os vrios meios existentes deve-se optar por aquele que seja o menos gravoso possvel. O judicirio pode avaliar a proporcionalidade de atos dos outros poderes, mas no pode entrar no mrito.

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c) proporcionalidade em sentido estrito esta proporcionalidade em sentido estrito o que, segundo Alexy, corresponde ponderao. A proporcionalidade em sentido estrito uma relao entre o custo da medida tomada e os benefcios trazidos por ela. Se a medida trouxer mais benefcios do que custos, ela ser uma medida proporcional. Se ela trouxer mais custo do que benefcios, a medida no ser proporcional. Concluindo, ento, para que a proporcionalidade seja atendida, o ato tem que ser adequado, exigvel ou necessrio (menos gravoso possvel), devendo o benefcio da medida ser menor do que o custo. Para o Alexy, essas trs regras so inferidas do carter lgico dos princpios. Segundo Alexy, a adequao e a necessidade decorrem do fato dos princpios serem mandamentos de otimizao em relao s possibilidade fticas; e a proporcionalidade em sentido estrito, em relao s possibilidades jurdicas. Parte da doutrina faz uma distino entre duas expresses: proibio de excesso e proibio de insuficincia. Proibio de excesso: tem por finalidade evitar cargas coativas excessivas na esfera jurdica dos particulares (evitar medidas excessivas que possam violar direitos individuais). A proibio de excesso est diretamente ligada necessidade (segunda regra, mxima, da proporcionalidade). Proibio de insuficincia: impe aos poderes pblicos sejam tomadas medidas adequadas e suficientes para tutelar os direitos fundamentais. Ex.: para proteger o direito a vida, proibir o aborto uma medida adequada e suficiente para a proteo da vida? (...)

Controle de Constitucionalidade teoria geralSupremacia da Constituio Existem dois sentidos em que esta palavra pode ser utilizada: Supremacia material Supremacia formal A supremacia material decorre do fato de a Constituio estabelecer os fundamentos do Estado (estrutura do Estado), atribuir competncias aos poderes pblicos (organizao dos poderes) e assegurar direitos fundamentais. Essas trs matrias, que so chamadas matrias constitucionais (ou normas materialmente constitucionais) levam a doutrina a falar que a Constituio tem uma supremacia de contedo em relao aos demais atos normativos. Toda Constituio possui supremacia material, no importa se a Constituio rgida ou flexvel. No existe constituio que no tenha supremacia material. J a supremacia formal est ligada forma, ao procedimento. Para que uma constituio possa ter supremacia formal em relao s leis, a Constituio tem que ser, necessariamente, rgida (a rigidez constitucional caracterizada pelo processo mais solene de elaborao constitucional). exatamente da supremacia formal que decorre o controle de constitucionalidade (o controle de constitucionalidade serve para assegurar a supremacia formal da Constituio). * Ento: Supremacia material toda constituio tem, independente de ser rgida ou flexvel Supremacia formal (em relao s leis) apenas as constituies rgidas tem 19

Direito Constitucional Hierarquia das normas Lei complementar x lei ordinria

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Existe hierarquia entre uma lei complementar e uma lei ordinria? Antigamente, STJ e STF divergiam neste entendimento. Hoje, no entanto, eles tm o mesmo entendimento (STJ alterou seu entendimento para se adaptar ao entendimento do STF). O entendimento atual de que no existe hierarquia entre leis complementares e ordinrias, pois ambas retiram seu fundamento de validade da Constituio. As matrias reservadas para cada uma delas so distintas: a matria de lei complementar uma matria reservada pela Constituio; a matria de lei ordinria matria residual. Em nenhuma hiptese, as matrias reservadas a lei complementar podero ser tratadas por outros atos normativos (lei ordinria, medida provisria, lei delegada). A lei ordinria e qualquer ato normativo que no lei complementar no podem tratar de matria reservada a lei complementar. Se uma lei ordinria tratar de matria reservada a lei complementar ela ser inconstitucional (e no meramente ilegal). Ser que uma lei complementar pode tratar de uma matria que no seja matria reservada a ela? Se uma lei complementar tratar de matria de lei ordinria (matria residual) ela no dever ser invalidada por uma questo de economia legislativa (e no por ser ela superior lei ordinria). No entanto, apesar de esta lei ser formalmente complementar, materialmente ela ser ordinria. Ento a primeira diferena entre elas que a LC trata de matria reservada. A segunda diferena entre elas uma diferena formal que a LC votada por maioria absoluta, ou seja, mais de 50% dos membros daquela casa (art. 69, CF) e, a lei ordinria, por maioria relativa, ou seja, mais de 50% dos presentes na votao (art. 47, CF). Percebe-se, ento, que o qurum da lei ordinria ser sempre atendido na lei complementar. Ex.: 530 deputados para a LC ser aprovada, sero necessrios, pelo menos, 257 votos. Se na sesso de votao esto presentes apenas 300 deputados, para aprovar a LO, sero necessrios 151 votos. Se a LO aprovada como LC, o qurum foi atendido. * Obs.: porque o CN trataria de LC se caso de LO? Pois algumas matrias geram dvida. Neste caso, a LO teria forma de LC apenas, mas seria materialmente ordinria. Quando uma lei formalmente complementar, mas materialmente ordinria, ela pode ser revogada por uma lei ordinria. Ento se, em uma questo de prova, cair a seguinte pergunta: Lei ordinria pode revogar Lei complementar? Sim, desde que a LC seja materialmente ordinria. Lei federal, estadual ou municipal Rol de matrias da competncia da Unio est no art. 22, CF; matria de competncia dos Estados residual, conforme art. 25, 1, CF; rol de matria de competncia dos Municpios est no art. 30, CF. Ento no h qualquer hierarquia entre essas leis, pois elas tm o mesmo fundamento de validade, que a Constituio. Se no existe hierarquia, no possvel falar que uma lei federal prevalece sobre uma lei estadual ou municipal ou que uma lei estadual prevalece sobre uma lei municipal. Se houver um conflito entre essas leis, como resolver este conflito? Neste caso, tem que recorrer Constituio, para analisar qual dos entes federativos invadiu a competncia do outro. Se um ente legislar invadindo a competncia de outro ente, a lei ser inconstitucional. Qual o tribunal competente para julgar em ltima instncia um conflito entre lei federal e lei municipal? Antes da reforma do judicirio, a competncia era do STJ, atravs de recurso especial. Como o STJ guardio 20

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da lei federal, dava-se a impresso de que a lei federal era superior lei municipal. Mas a EC 45 corrigiu esta questo, acrescentando a alnea d do art. 102, III, CF. Hoje o STF quem analisa em ltima instncia o conflito. Normas gerais e normas especficas O contedo de uma norma especfica no pode contrariar as diretrizes da norma geral. Por isso, em razo da subordinao de contedo, vai existir uma hierarquia da norma geral em relao norma especial. Ex.: CTN (norma geral de tributrio e status de lei complementar) e outras leis especiais de direito tributrio, que tm que respeitar as diretrizes definidas no CTN. Outro ex.: licitaes e contratos matria sobre a qual a Unio deve estabelecer norma geral. Aps a norma geral feita pela Unio, as demais leis especiais sobre esta matria (a serem editadas por estados e municpios) devem respeitar a norma geral. Importante reparar aqui que a hierarquia se d pela caracterizao de norma geral ou especial e no por ser lei federal, estadual ou municipal. Tratados internacionais Noo histrica Primeiro marco temporal advento da CF/88 quando do advento da CF/88, o STF entendia que todo e qualquer tratado internacional tinha status de lei ordinria. Alguns autores internacionalistas (como Flvia Piovesan, Celso Lafer, Cansado Trindade, dentre outros) comearam a sustentar que nem todos os tratados internacionais tinham o status de lei ordinria. Os tratados internacionais de direitos humanos teriam status de norma constitucional, nos termos do art. 5, 2, CF. Estaria aqui consagrada uma concepo material dos direitos fundamentais. Segundo marco temporal a Emenda 45/2004 (reforma do judicirio) introduziu o 3 no art. 5 da CF, o qual diz que se o tratado internacional for de direitos humanos (requisito material) e for aprovado por 3/5 em 2 turnos de votao (requisito formal) (mesma forma prevista para as emendas constitucionais) ter status de emenda constitucional. Terceiro marco temporal o RE 466.343/SP Aps a EC 45, o STF reviu este posicionamento. Neste RE, prevaleceu o entendimento do Ministro Gilmar Mendes, quando ento os tratados internacionais passaram a ter uma tripla hierarquia: a) Os tratados internacionais de direito humanos e aprovados por 3/5 em 2 turnos possuem status de emenda constitucional (esto, ento, no topo da hierarquia, junto com a CF)3; b) Se o tratado internacional for de direitos humanos, mas no for aprovado no qurum de 3/5 em 2 turnos (caso dos tratados anteriores EC 45/04), no ter status de lei ordinria, mas um status supralegal, ou seja, estar hierarquicamente acima da lei, mas abaixo da Constituio;

H um tratado que foi aprovado desta forma: Conveno Internacional sobre os Direitos dos Portadores de Deficincia, incorporado ao direito brasileiro pelo Decreto 6.949/09.3

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c) Os demais tratados tero status de lei ordinria. Argumentos do Ministro Gilmar Mendes na votao deste RE: no art. 5, LXVII, CF, a Constituio trata de priso civil por dvida (possvel, conforme a CF, por inadimplemento de penso alimentcia e depositrio infiel). O Decreto-lei 911/69 regulamentava a priso do depositrio infiel, pois a CF por si s no suficiente para efetivar esta previso. O Pacto de So Jos da Costa Rica fala que no haver priso civil por dvida a no ser no caso de inadimplemento de penso alimentcia. No caso, o PSJCR entrou abaixo da constituio, mas acima do Decreto-lei 911/69, por ter status supralegal. Como o decreto-lei est abaixo do PSJCR, o depositrio infiel no pode mais ser preso, pois contrariaria o Pacto. como se o Pacto criasse um bloqueio, impedindo a regulamentao da CF neste aspecto (entende-se que no h a ofensa CF, pois o Pacto est ampliando o direito fundamental liberdade e no restringindo-o). * Smula vinculante 25 ilcita a priso civil do depositrio infiel, qualquer que seja a modalidade de depsito. Parmetro (ou norma de referncia) para o controle de constitucionalidade. Uma coisa o parmetro constitucional utilizado para realizar o controle. O parmetro a norma da CF. Outra coisa completamente diferente o objeto do controle, ou seja, o ato a ser submetido ao ato de controle de constitucionalidade. No Brasil, o parmetro para o controle so as normas formalmente constitucionais. A CF dividida em trs partes: Prembulo Normas permanentes (art. 1 a 250) ADCT (arts. 1 a 97) Dessas trs partes, no serve como parmetro apenas o prembulo da CF. No entanto, o prembulo uma diretriz hermenutica, ou seja, importante para a interpretao da CF. Este entendimento no unnime na doutrina. Importante: so considerados formalmente constitucionais tanto os princpios expressos no texto da CF como os princpios implcitos. Alm da CF, aps a EC 45 tambm parmetro para controle de constitucionalidade os tratados internacionais de direito humanos aprovados por 3/5 em 2 turnos, conforme previso do art. 5, 3, CF. Obs.: Existe uma recomendao interna no CN no sentido de que todos os tratados internacionais a serem votados no Brasil sejam submetidos ao qurum das emendas. Resumindo, os parmetros so: CF (sem prembulo e com princpios expressos e implcitos) ADCT Tratados internacionais que atendam o art. 5, 3, CF Bloco de constitucionalidade (Min. Celso de Mello) H duas decises no STF em que o Ministro Celso de Mello utiliza esta expresso:

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Direito Constitucional ADI 5.014/PI ADI 595/ES

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Esta expresso criao do autor francs Luis Favoreu e foi criada para designar normas que tenham valor constitucional. Na Frana, fazem parte deste bloco de constitucionalidade a Constituio Francesa (de 1958), o prembulo da Constituio Francesa anterior (de 1946), a Declarao Universal dos Direitos do Homem e do Cidado (da Revoluo Francesa, de 1789), princpios consagrados pelo Conselho Constitucional (rgo de cpula da Frana, encarregado de cuidar da CF no rgo do poder judicirio) e outras normas de valor constitucional. Esta expresso surge na Frana e comea a ser difundida por vrios pases. O problema que no existe um consenso sobre o que estaria abrangido por este bloco de constitucionalidade (ressalva feita inclusive pelo Ministro Celso de Mello em seus votos). Bloco de constitucionalidade possui um sentido estrito e um sentido amplo: Sentido estrito: abrange apenas as normas formalmente constitucionais (normas expressas e princpios implcitos). Canotilho, quando fala em bloco de constitucionalidade, utiliza esta expresso no sentido estrito, como sinnimo de parmetro ou norma de referncia. Sentido amplo: abrange tambm normas vocacionadas a desenvolver a eficcia dos princpios consagrados na CF. Ex.: A CF consagra determinados direitos sociais, que, para terem efetividade, precisam de uma lei, a qual ir desenvolver o contedo desses direitos. Por exemplo, a CF consagra o direito a moradia como direito social. No entanto, este direito precisa ser regulamentado para ser efetivado pelos servios pblicos. Por este motivo, esta lei faria parte do bloco de constitucionalidade. Na maior parte das vezes, bloco de constitucionalidade utilizado no sentido estrito, ou seja, como sinnimo de parmetro para controle de constitucionalidade.

30/08/2010 Aula 4

Controle de Constitucionalidade teoria geral (continuao)Formas de inconstitucionalidade Quanto conduta Por ao (conduta comissiva) Por omisso (conduta omissiva) A preocupao aqui com o objeto de controle. No caso da ao, o poder pblico pratica uma conduta de forma contrria CF. Forma de controle das condutas comissivas: ADI, ADC e ADPF todas formas de controle abstrato.

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No caso da omisso, o poder pblico deixa de praticar uma conduta exigida pela CF. H uma norma diretamente dirigida aos poderes pblicos, que tm que realizar o que est na norma, mas no o fazem. Espcies de norma jurdica que tem o comando diretamente dirigido aos poderes pblicos: norma constitucional de eficcia limitada (no aplicvel por si s, necessitando de uma ao do poder pblico para implement-la). Instrumentos de controle no caso de omisso: ADO (ao direta de inconstitucionalidade por omisso controle abstrato) e MI (mandado de injuno controle difuso concreto). Expresso utilizada pelo Min. Celso de Mello: eroso constitucional (usada na ADI 1484/DF) est ligada omisso constitucional e consiste no perigoso processo de desvalorizao funcional da CF. Esta expresso foi criada por Karl Loewenstein. Se h uma norma da CF que necessita do ato do poder pblico para ligar a norma ao caso concreto, para que a norma tenha efetividade, na medida em que o poder pblico deixa de tomar a medida necessria, a norma perde sua utilidade, no pode ser utilizada. Ex.: se o poder pblico no regulamenta o direito de greve, garantido pela CF, este direito perde a fora, no respeitado; tambm a dignidade fsica dos presos um direito ineficaz se o poder pblico no implementar o respeito a este direito. Quanto norma constitucional ofendida Formal Material A preocupao aqui com o parmetro que foi violado (e no quanto ao objeto). Na inconstitucionalidade formal a norma ofendida estabelece uma competncia, uma formalidade ou um procedimento. H violao a um dispositivo da CF que determina um processo que deve ser seguido pelo poder pblico. A inconstitucionalidade formal pode ser: Subjetiva Objetiva A subjetiva relaciona-se com o sujeito que praticou o ato, com a competncia. Ex.: art. 61, 1, CF (competncia exclusiva do PR para iniciativa de lei). * Questo bastante cobrada em concurso pblico: se um deputado faz um projeto de lei de matria de iniciativa exclusiva do PR, a sano do PR supre o vcio de iniciativa? Aps a CF/88, o STF mudou seu entendimento a respeito desta questo. Antes da CF/88, o entendimento do STF estava sumulado na Smula 5/STF, segundo a qual a sano supria o vcio de iniciativa. Mas esta smula no mais aplicada pelo STF (apesar de no ter sido formalmente cancelada). O entendimento atual do STF de que o vcio de iniciativa insanvel (no adianta o PR sancionar depois o projeto de lei). A inconstitucionalidade formal objetiva est ligada, por exemplo, ao qurum de formao, aos turnos de votao, etc.. Exemplo comum: projeto de LC discutido e votado na CD. Para ele ser aprovado, o quorum necessrio de maioria absoluta. No SF, modifica-se o texto, alegando que no alterou a substncia, mandando direto pro PR, sem mandar antes pra CD. Ser um vcio formal objetivo o no retorno do projeto para o CD se tiver havido alterao na substncia.

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J na inconstitucionalidade material, h violao de norma que estabelece direito e deveres (e no um procedimento, uma formalidade). A inobservncia com relao a certos contedos consagrados pela CF, que no foram observados pelo legislador. At meados do sculo passado, na Europa era feito somente controle de inconstitucionalidade formal e no material. A partir da 2 GM, com o surgimento do neoconstitucionalismo, que o controle de contedo passou a ser feito na Europa. Ex.: STF diz no HC 82.959 que a vedao da progresso de regime viola o princpio da individualizao a pena. Este princpio estabelece um direito fundamental, sendo sua violao uma inconstitucionalidade de contedo, material. At o sculo passado nunca que o poder judicirio poderia derrubar uma lei falando que ela violava uma norma material. Quanto extenso da inconstitucionalidade Total Parcial Quando se fala em inconstitucionalidade total, significa que toda a lei foi declarada inconstitucional. Esta expresso pode ser utilizada tambm para se referir no inconstitucionalidade da lei como um todo, mas de um dispositivo. Pode-se, ento, referir-se ao dispositivo da lei como sendo de inconstitucionalidade total ou parcial. O STF, por exemplo, pode declarar uma lei totalmente inconstitucional. A inconstitucionalidade total pode ser de toda a lei ou de todo o dispositivo. J na inconstitucionalidade parcial, apenas uma parte da lei ou uma parte de um dispositivo considerada incompatvel com a CF. O STF pode dizer que apenas uma palavra inconstitucional, ou que apenas uma expresso inconstitucional? Ou tem que falar que todo o artigo, ou todo o pargrafo, ou todo o inciso, ou toda a alnea inconstitucional? A inconstitucionalidade parcial diferente da hiptese de veto parcial. Art. 66, 2, CF veto parcial abrange apenas o texto integral de artigo, pargrafo, inciso ou alnea. Isso com relao ao veto! No caso da declarao de inconstitucionalidade, diferente o tribunal pode declarar apenas uma palavra ou uma expresso como sendo inconstitucional. Ex.: nos termos do art. 125, 2, CF, os TJs tm competncia para julgar ADI que tenha como objeto lei ou ato normativo das esferas estadual ou municipal, tendo como parmetro a constituio estadual. Imaginemos que uma CE consagra em seu dispositivo que o TJ pode processar e julgar ADI de lei ou ato normativo federal, estadual ou municipal, em face da CE. Se a CE disser isso, o STF pode falar que a previso de lei ou ato normativo federal incompatvel com a CF, declarando somente a palavra federal como inconstitucional. As CE de SP e de MG previram que o TJ poderia julgar ADI em face de CE ou da CF. O STF considerou a parte que fala CF inconstitucional. Quanto ao momento da inconstitucionalidade Originria Superveniente Classificao simples, mas muito importante. A inconstitucionalidade originria ocorre quando o objeto posterior ao parmetro. Ex.: uma lei de 1990 que traz norma contrria CF/88 possui constitucionalidade originria.

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J a inconstitucionalidade superveniente ocorre quando o parmetro posterior ao objeto. Ex.: uma lei de 1993 nasce compatvel com a CF/88, nasce constitucional, mas advm uma EC que torna esta lei inconstitucional neste caso, como o parmetro posterior ao objeto (o parmetro a EC), a inconstitucionalidade da lei no originria, mas superveniente. No Brasil, se adota a teoria da inconstitucionalidade superveniente? No! Aqui no se fala em inconstitucionalidade superveniente. Esta hiptese, aqui, conhecida como no recepo. Antes o STF falava em revogao, mas ele corrigiu nas decises mais recentes. Caso em que a lei ou ato normativo no e recepcionado com o novo parmetro. Existem pases que adotam a inconstitucionalidade superveniente, como Portugal (art. 282, CF Portuguesa). No Brasil no utilizamos esta expresso, pois aqui, neste aspecto, adotamos a teoria do Hans Kelsen, segundo a qual inconstitucionalidade uma violao da CF pelo poder pblico. No caso de o ato se tornar pblico posteriormente, no se pode falar que o poder pblico violou a CF, pois, h poca, seu ato foi constitucional. Ento, neste caso, com o novo parmetro, no h uma conduta do poder pblico violadora da CF, mas uma mudana da CF que no recepciona aquele ato. Esta classificao importante, pois dependendo de ser caso de inconstitucionalidade originria ou de no recepo, a ao cabvel ser uma ou outra. No caso de no recepo, cabvel apenas ADPF. Quanto ao prisma de apurao Antecedente/direta Indireta No caso da inconstitucionalidade indireta, ela pode ser ainda: Consequente Reflexa/oblqua

O fundamento de validade direto da lei a CF. J o fundamento de validade direito do decreto a lei e no a CF. O decreto tambm esta ligado CF, mas de forma indireta. Ento a lei o fundamento de validade direito do decreto e a CF o fundamento de validade indireto do decreto e o fundamento de validade direto da lei. A inconstitucionalidade direta ou antecedente, ento, ocorre quando o ato violador est ligado diretamente CF. J a inconstitucionalidade indireta ocorre nos casos em que entre o ato violador e a norma constitucional violada existe um ato interposto. A inconstitucionalidade indireta pode ser consequente ou reflexa. Consideremos uma lei inconstitucional. O PR edita um decreto de acordo com esta lei. O decreto ser inconstitucional, mas por consequncia da inconstitucionalidade da lei.

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Este decreto ento ter uma inconstitucionalidade consequente. Consideremos agora uma lei constitucional. O PR, para regulamentar esta lei, edita decreto que exorbita os limites da lei. Na parte que exorbita a limitao legal, o decreto ser diretamente ilegal, por contrariar a lei. Se este decreto ilegal, ele ser, tambm, reflexamente inconstitucional (inconstitucionalidade oblqua), pois, ao violar a lei, ele viola o art. 84, IV, CF, que fala que cabe ao chefe do executivo expedir decretos e regulamento para a fiel execuo da lei. Se ele no se atm fiel execuo da lei, significa que ele violou a lei e, reflexamente, a CF. Esta distino importante, pois define se o decreto poder ou no ser objeto de ADI. No primeiro caso, se a lei pode ser objeto de ADI, o decreto, sendo inconstitucional consequente, tambm poder ser objeto de ADI. Agora, no segundo caso, em que o decreto apenas reflexamente inconstitucional, no cabe ADI. Mais uma questo: um decreto pode violar diretamente uma CF? Sim, se no houver uma lei interposta entre o decreto e a CF, ou seja, se o decreto regular diretamente a CF. E no caso da portaria? Tambm poderia, se a portaria regular diretamente um dispositivo da CF, no havendo lei ou decreto interposto entre eles. Ento o que ns temos que fazer no analisar apenas o nome do ato, mas a relao dele com a CF. Formas de controle de constitucionalidade Quanto competncia Difuso Concentrado O controle difuso o que pode ser exercido por qualquer rgo do poder judicirio. um controle aberto a todo o poder judicirio no existe exceo ou ressalva (pode ser estadual, eleitoral, militar, federal, etc., todos dentro de suas respectivas competncias). O controle difuso conhecido como sistema norte americano de controle, pois ele surgiu nos EUA, em 1803, no julgamento do caso Marbury v. Madison pelo juiz Marshall. No Brasil, o controle difuso foi introduzido pela CF/1891, nossa primeira constituio republicana (no existia controle de constitucionalidade na CF/1824, quando existia a supremacia do parlamento e no da CF). O controle concentrado o que s pode ser exercido por um determinado rgo do poder judicirio. Ou seja, a competncia se concentra em apenas um tribunal. No caso do Brasil, dependendo do parmetro, a concentrao ser no STF ou nos TJs. Se o parmetro for a CF/88, a competncia se concentra no STF; se o parmetro for uma CE, a competncia se concentra no TJ daquele estado. O controle concentrado surgiu na ustria em 1920. Nessa poca, comeam a surgir na Europa tribunais especializados para fazer o controle de constitucionalidade (Tribunal Constitucional Alemo; Corte Constitucional Portuguesa, etc.). Quem inventou o controle concentrado foi Hans Kelsen, ao colaborar para a criao da constituio austraca. No Brasil, esse sistema foi introduzido no ordenamento jurdico pela EC 16/65 (CF/1946 era a que estava em vigor). Quanto finalidade deste controle

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Concreto (incidental / por via de defesa / por via de exceo no so expresses sinnimas, mas designam o mesmo fenmeno) Abstrato (por via de ao / principal) A finalidade principal do controle concreto assegurar direitos subjetivos e no assegurar a supremacia da CF. Neste caso, fala-se que no controle concreto a pretenso deduzida em juzo atravs de um processo constitucional subjetivo. O controle chamado concreto, pois surge a partir de uma violao concreta de um determinado direito. Ex.: governo cria lei instituindo novo imposto que fere a CF um contribuinte, diante da leso a seu direito subjetivo, pode ir ao judicirio (juiz de 1 grau) falando que no quer pagar o tributo, pois ele inconstitucional. O judicirio ento ter que, incidentalmente, afastar a aplicao daquela lei. Ento a inconstitucionalidade no objeto principal da ao, mas uma questo incidental, sendo a questo principal assegurar o direto subjetivo. Como a inconstitucionalidade no objeto principal da ao, mas apenas uma questo incidental, que analisada na fundamentao (e no no dispositivo), o juiz pode reconhec-la de ofcio. No dispositivo da deciso, o juiz declarar a lei inconstitucional? No, pois isto no foi pedido. O juiz apenas dir que julga procedente o pedido para que o autor no pague o tributo. Se no controle concreto o objeto principal a proteo de direitos subjetivos e a supremacia da constituio algo secundrio, acessrio, no controle abstrato, essa ordem se inverte: o que passa a ser a finalidade principal a ordem constitucional objetiva (ou supremacia da CF). obvio, entretanto, que, ao proteger a supremacia da CF, se protege indiretamente os direitos subjetivos. Ento a classificao da finalidade no fala da finalidade exclusiva, mas a finalidade principal. No caso do controle abstrato, a pretenso deduzida em juzo atravs de um processo constitucional objetivo. Chama-se controle abstrato, pois, neste caso, o controle exercido independentemente do caso concreto. A inconstitucionalidade questionada em tese, em abstrato. Ex.: ADI 3510, ADPF 54. Neste caso, ento, o objeto principal da ao a declarao da inconstitucionalidade. A inconstitucionalidade no mais questo incidental, mas o objeto principal da ao. Por ser a questo principal, o STF pode declarar de ofcio uma lei inconstitucional, no controle abstrato? Neste caso, vale o princpio da inrcia do juiz, ou seja, ele no pode realizar controle de ofcio, devendo ser provocado. Outra diferena: a inconstitucionalidade analisada no dispositivo da deciso e no somente na fundamentao. O controle de constitucionalidade concreto segue as regras de direito processual civil. Agora, quando se fala em controle abstrato, entra-se no mbito constitucional e nem todas as regras do processo civil aplicam-se neste tipo de controle. Por isso que aqui analisaremos mais o controle abstrato, pois o controle concreto ser visto em processo civil. No Brasil, podemos afirmar que todo controle difuso tambm concreto, ou seja, s existe controle difuso quando houver uma violao concreta a direito. O controle concentrado, por sua vez, no precisa ser abstrato necessariamente ele pode ser tanto um controle concreto quanto abstrato. Ex.: ao de controle concentrado que surge a partir de um caso concreto: ADI interventiva (ou representao interventiva) um controle concentrado (apenas o STF tem competncia para processar e julgar esta ao, pois foi violado um princpio constitucional sensvel) e concreto (pois surgiu a partir de um caso concreto). O mais comum, entretanto, o controle concentrado abstrato, para o qual existem as seguintes aes: ADI, ADC, ADPF, ADO. Quanto ao momento 28

Direito Constitucional Preventivo Repressivo

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Analisa-se o momento em que o controle exercido e no quanto ao momento em que a inconstitucionalidade se d. O preventivo evita a inconstitucionalidade (antes do projeto de lei se transformar em lei); o repressivo repara a inconstitucionalidade que j ocorreu. No Brasil, o controle preventivo pode ser realizado: Pelo legislativo Pelo executivo Pelo judicirio (excepcionalmente) Poder legislativo realiza atravs da CCJ (Comisso de Constituio e Justia), que um rgo especializado para verificar se o projeto de lei compatvel ou no com a CF. O papel do CCJ muito importante esta comisso vetou um anti-projeto que permitia o aborto nos trs primeiros meses de vida. Com parecer contrrio da CCJ, o processo pode ser votado, mas apenas se for interposto recurso. Poder executivo aps votado, o projeto de lei vai para o executivo, que pode se utilizar do veto jurdico caso o projeto ofenda a CF. * OBs.: Veto jurdico Art. 66, 1, primeira parte, CF chama-se jurdico, pois o PR faz uma analise jurdica do projeto de lei. Se ele vetar por entender que o projeto de lei contrrio ao interesse pblico, esta anlise no jurdica, mas poltica o veto, ento, poltico. O executivo e o legislativo fazem este controle para todo projeto de lei. J o poder judicirio somente faz este controle excepcionalmente, em apenas uma nica hiptese: no caso de mandado de segurana impetrado por parlamentar por inobservncia do devido processo legislativo constitucional. Quem pode alegar violao ao devido processo legislativo apenas quem participa dele e, por isso, apenas o parlamentar tem legitimidade para impetrar este MS. Inclusive, tem que ser o parlamentar da respectiva casa na qual o projeto esteja tramitando. O parlamentar tem o direito lquido e certo observncia deste processo legislativo e, por isso, ele tem legitimidade para impetrar MS neste caso. * Obs.: No qualquer processo legislativo, mas o processo legislativo constitucional, ou seja, tem que haver violao a regra constitucional (no cabe, por exemplo, por inobservncia a norma do regimento interno). Ex.: hiptese mais comum violao ao art. 60, 4, CF este artigo fala das clusulas ptreas, falando que no ser objeto de deliberao a proposta de EC tendente a abolir as clausulas ptreas. Se houver uma proposta de emenda, este dispositivo violado, ainda antes de a proposta ser votada. Neste caso, ento, o parlamentar pode impetrar MS no STF contra esta proposta de emenda. O controle repressivo, por sua vez, exercido: Pelo judicirio 29

Direito Constitucional Pelo legislativo (excepcionalmente) Pelo executivo (excepcionalmente)

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O controle repressivo exercido pelo judicirio, no controle difuso ou concentrado. Este controle repressivo tambm pode ser exercido pelo legislativo e pelo executivo, mas apenas excepcionalmente. Em trs situaes o legislador pode exercer um controle repressivo: Art. 49, V, CF Art. 62, CF Smula 347/STF Art. 49, V leis delegadas e decretos de regulamentos. Em regra, as atribuies so indelegveis, mas existe uma exceo, que o caso da lei delegada: o PR pode ir ao parlamento e pedir uma delegao. O PR ento solicita a delegao ao CN, o CN faz uma Resoluo delegando a competncia ao PR e, nesta resoluo, o CN estabelece quais so os limites da delegao. Se o PR tratar esta lei delegada assunto que no estava inserido no limite da Resoluo, ele ter exorbitado os limites da delegao. Neste caso, o CN pode, atravs de um decreto legislativo, sustar a parte que exorbitou os limites da delegao. Se o PR, ao regulamentar uma lei atravs de decreto, trata de assunto que no est na lei, ele exorbita os limites da regulamentao legal, podendo, neste caso, o CN sustar a parte que exorbita, atravs tambm de um decreto legislativo. Art. 62, CF se o PR edita uma medida provisria inconstitucional, o CN pode rejeit-la. Smula 347/STF TC, no exerccio de suas atribuies, pode apreciar a constitucionalidade das leis e de atos do Poder Pblico controle exercido por um rgo auxiliar do poder legislativo, que o Tribunal de Contas (por ser ele rgo auxiliar do legislativo, considera-se que este controle feito pelo legislativo). Controle feito pelo poder executivo: o chefe do executivo pode negar cumprimento a uma lei que entenda ser inconstitucional. Para negar o cumprimento, o chefe do executivo tem que motivar seu ato e public-lo. O chefe do executivo pode negar cumprimento at que haja uma deciso do STF com efeito vinculativo. Enquanto o STF no diz com efeito vinculante que determinado ato constitucional, o chefe do executivo pode negar cumprimento. Alguns doutrinadores sustentam que, aps a CF/88, o chefe do executivo no poderia mais negar cumprimento a uma lei, j que governador e presidente passaram a ser legitimados para propor ADI no STF (conforme o art. 103, CF). Apesar disso, esse entendimento minoritrio e no o que vem sendo adotado pelo STF ou STJ ambos tm decises admitindo essa possibilidade.

1/09/2010 Aula 5

Controle de constitucionalidade teoria geral (continuao)Formas de declarao de inconstitucionalidade Efeitos quanto ao aspecto objetivo 30

Direito Constitucional Controle difuso e concreto

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No controle difuso e concreto, a inconstitucionalidade no o pedido, mas apenas a causa de pedir. Assim, a inconstitucionalidade analisada somente na fundamentao e o dispositivo limita-se apenas a julgar o pedido referente ao direito subjetivo procedente ou improcedente. Ento os efeitos da deciso proferida pelo STF neste controle no so, em regra, erga omnes, mas apenas inter partes, ou seja, valer somente para as partes envolvidas no processo. Tendncia de abstrativizao do controle difuso: a tendncia de estender os efeitos do controle abstrato ao controle concreto. N