ALIMENTOS Transgênicos no microscópio · alimentos transgênicos tende a crescer quando esse...

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TECNOLOGIA ALIMENTOS Transgênicos no microscópio Empresa domina técnica e monta laboratório para detecção de produtos geneticamente modificados ~ empresas exportadoras de soja para Europa, China e Japão são os principais cli- entes do primeiro labora- tório nacional privado capaz de fazer testes moleculares para detectar alimentos transgênicos. Trata- se da Tecam - Tecnologia Ambiental, uma empresa paulistana especializada em análises laboratoriais nas áreas de química e de biologia. Antes dela, pou- cos laboratórios estrangeiros e institui- ções públicas de pesquisa dominavam essa tecnologia. O laboratório de Bio- logia Molecular foi implementado com o apoio do Programa de Inovação Tec- nológica em Pequenas Empresas (PIPE) da FAPESP. Foram investidos, no total, cerca de R$ 350 mil na sua criação. A maior parte dos recursos foi usada na importação de equipamentos e de in- sumos laboratoriais. A procura por testes de detecção de alimentos transgênicos tende a crescer quando esse mercado for regulamenta- do no Brasil. Por enquanto, a demanda é limitada, já que a legislação em vigor não permite a comercialização de ali- mentos transgênicos. Quando eles fo- rem liberados, os testes ganharão im- portância porque o país é o segundo maior produtor de soja do mundo, ten- do exportado 15 milhões de toneladas do grão no ano passado. As nações eu- ropéias e asiáticas desejam diferenciar alimentos geneticamente modificados dos convencionais e, em breve, deverão exigir certificados que comprovem se as sementes e os produtos importados so- freram ou não modificações genéticas. O teste, portanto, servirá para certificar alimentos convencionais brasileiros destinados à exportação. "Sabemos que os carregamentos de soja brasileira que chegam à Europa já estão sendo testados", conta a bióloga Ia- nete Walter Moura, uma das diretoras da Tecam. "Por isso, as empresas nacionais preferem fazer testes aqui para conhe- cer a soja com a qual estão trabalhando, evitando assim surpresas futuras'; afir- ma. Isso acontece, apesar da proibição, porque existem fortes indícios de que uma parcela significativa da lavoura de soja da região Sul do país contenha or- ganismos geneticamente modificados (OGMs). A informação está presente num estudo elaborado recentemente pela Câmara dos Deputados. Também há in- dícios de que agricultores brasileiros estão comprando o grão da Argentina, país onde o plantio de soja transgênica está liberado. Sementes importadas - Para a direto- ra da Tecam, além da soja, outro mer- cado potencial para realização de testes é o do milho e de produtos derivados. Nos últimos anos, a região Nordeste do Brasil tem sido um grande impor- tador do produto. Só no ano passado, foram compradas 634 mil toneladas Empresas brasileiras preferem testar a soja antes de exportar

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• TECNOLOGIA

ALIMENTOS

Transgênicos no microscópioEmpresa domina técnica e montalaboratório para detecção deprodutos geneticamente modificados

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empresas exportadoras desoja para Europa, China eJapão são os principais cli-entes do primeiro labora-tório nacional privado

capaz de fazer testes moleculares paradetectar alimentos transgênicos. Trata-se da Tecam - Tecnologia Ambiental,uma empresa paulistana especializadaem análises laboratoriais nas áreas dequímica e de biologia. Antes dela, pou-cos laboratórios estrangeiros e institui-ções públicas de pesquisa dominavamessa tecnologia. O laboratório de Bio-logia Molecular foi implementado como apoio do Programa de Inovação Tec-nológica em Pequenas Empresas (PIPE)da FAPESP. Foram investidos, no total,cerca de R$ 350 mil na sua criação. Amaior parte dos recursos foi usada naimportação de equipamentos e de in-sumos laboratoriais.

A procura por testes de detecção dealimentos transgênicos tende a crescer

quando esse mercado for regulamenta-do no Brasil. Por enquanto, a demandaé limitada, já que a legislação em vigornão permite a comercialização de ali-mentos transgênicos. Quando eles fo-rem liberados, os testes ganharão im-portância porque o país é o segundomaior produtor de soja do mundo, ten-do exportado 15 milhões de toneladasdo grão no ano passado. As nações eu-ropéias e asiáticas desejam diferenciaralimentos geneticamente modificadosdos convencionais e, em breve, deverãoexigir certificados que comprovem se assementes e os produtos importados so-freram ou não modificações genéticas.O teste, portanto, servirá para certificaralimentos convencionais brasileirosdestinados à exportação.

"Sabemos que os carregamentos desoja brasileira que chegam à Europa jáestão sendo testados", conta a bióloga Ia-nete Walter Moura, uma das diretoras daTecam. "Por isso, as empresas nacionais

preferem fazer testes aqui para conhe-cer a soja com a qual estão trabalhando,evitando assim surpresas futuras'; afir-ma. Isso acontece, apesar da proibição,porque existem fortes indícios de queuma parcela significativa da lavoura desoja da região Sul do país contenha or-ganismos geneticamente modificados(OGMs). A informação está presentenum estudo elaborado recentemente pelaCâmara dos Deputados. Também há in-dícios de que agricultores brasileirosestão comprando o grão da Argentina,país onde o plantio de soja transgênicaestá liberado.

Sementes importadas - Para a direto-ra da Tecam, além da soja, outro mer-cado potencial para realização de testesé o do milho e de produtos derivados.Nos últimos anos, a região Nordestedo Brasil tem sido um grande impor-tador do produto. Só no ano passado,foram compradas 634 mil toneladas

Empresas brasileiraspreferem testar a sojaantes de exportar

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de milho, mais da metade da Argenti-na e dos Estados Unidos, países ondenão há restrições ao plantio de semen-tes transgênicas. A única forma de ga-rantir que o milho importado peloBrasil não seja geneticamente modi-ficado é realizando testes molecularesnesses grãos.

A análise para detecção de alimen-tos transgênicos é feita por meio daidentificação do novo gene que foi in-troduzido na planta. A procura por esseelemento, que diferencia a planta gene-ticamente modificada de sua correspon-dente convencional, é realizada com atécnica chamada reação em cadeia depolimerase, ou simplesmente PCR, do in-glês Polymerase Chain Reaction. Devidoà alta sensibilidade da técnica, os resul-tados ~são bastante precisos. "Existemoutras técnicas para detecção de trans-gênicos, que analisam a proteína, masesta, que faz a leitura do material ge-nético (DNA), é a mais eficaz de todas",afirma Janete. "A PCR torna visível onovo gene ou a nova seqüência de DNAque procuramos identificar, produzin-do bilhões de cópias desse organismoque foi introduzido na planta", diz afarmacêutica Daniela Contri, da Tecam.O resultado do exame demora de qua-tro a cinco dias para ficar pronto.

Para fazer o teste de detecção de ali-mentos transgênicos, a Tecam precisoude um certificado de biossegurança emi-tido pela Comissão Técnica Nacionalde Biossegurança (CTNBio), do Minis-tério da Ciência e Tecnologia (MCT).Esse documento, uma espécie de alvará,é obrigatório para todas as empresas e

o PROJETO

Implantação da Técnicade PCR paraDetecção de AlimentosGeneticamente Modificados

MOOALIOAOEPrograma de Inovação Tecnológicaem Pequenas Empresas (PIPE)

COORDENADORAJANETE WALTER MOURA - Tecam

INVESTIMENTOR$ 73.100,00 e US$ 105.000,00

instituições que trabalham com OGMs.Isso não significa, no entanto, que osresultados dos exames devam ser co-municados à CTNBio. "Nosso trabalhoé confidencial e só diz respeito à Tecame aos nossos clientes': afirma Ianete.

O próximo passo da empresa é apa-relhar-se para realizar testes que possamquantificar o porcentual de OGMs en-contrado nas amostras, já que a PCR éoriginalmente uma técnica qualitativae permite apenas informar se o produtoé ou não transgênico, sem especificar aquantidade de OGMs presente nele.Essa quantificação é importante por-que alguns países estão estabelecendolimites para definir se um produto deveou não ser rotulado como genetica-mente modificado.

Na Europa, por exemplo, esse limi-ar é de 1%. Isso significa que se a amos-tra tiver mais de 1% de material deOGMs ela é considerada transgênica.

No Japão, esse índice sobe para 5%."Normalmente, limites relacionados aalimentos estão ligados à questão da saú-de, mas, no caso dos transgênicos, o li-miar é arbitrário, uma vez que aindanão há estudos relacionando o consu-mo de OGMs com riscos à saúde hu-mana", diz a diretora da Tecam.

Para fazer os testes de quantificação,a empresa planeja adquirir um apa-relho importado, capaz de realizar aPCR em tempo real, que custa entreUS$ 50 mil e US$ 100 mil, dependendodo seu grau de sofisticação.

Testes toxicológicos - O Laboratóriode Biologia Molecular é um novo passona capacidade de inovação da Tecam,que começou a funcionar em 1992, re-alizando testes toxicológicos para omercado de defensivos agrícolas. Em se-guida, passou a fazer ensaios em efluen-tes industriais e testes de potabilidadede água. Em 1996, a empresa entrou nomercado de alimentos, oferecendo aná-lises microbiológicas, físico-químicas emicroscópicas. Hoje, conta com 40 fun-cionários, sendo que 60% deles têm ní-vel superior, índice que atesta a vocaçãotecnológica da empresa.

O estabelecimento do laboratório ea padronização da metodologia con-taram com a colaboração do pesquisa-dor José Eduardo Levi, do Laboratóriode Virologia do Instituto de MedicinaTropical da Universidade de São Paulo(USP). Um bom começo que deve im-pulsionar a empresa a trilhar com maispreparo o ainda polêmico caminhodos transgênicos. •

Análise com técnicaPCR detecta se há um

novo gene no milho