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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO AMAPÁ Coordenação de Direito ALUNA: ROSIANE BENEDITA RODRIGUES FELICIDADE ORIENTADOR: MAURÍCIO CORRÊA A INEFICÁCIA DA GUARDA COMPARTILHADA NA EDUCAÇÃO DOS FILHOS MACAPÁ 2008 Monografia apresentada à Banca Examinadora do Centro de Ensino Superior do Amapá, como exigência parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito, sob a orientação do professor Maurício Corrêa.

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CENTRO DE ENSINO SUPERIOR DO AMAPÁ Coordenação de Direito

ALUNA: ROSIANE BENEDITA RODRIGUES FELICIDADE ORIENTADOR: MAURÍCIO CORRÊA

A INEFICÁCIA DA GUARDA COMPARTILHADA NA EDUCAÇÃO DOS FILHOS

MACAPÁ 2008

Monografia apresentada à Banca Examinadora do Centro de Ensino Superior do Amapá, como exigência parcial para obtenção do título de Bacharel em Direito, sob a orientação do professor Maurício Corrêa.

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Banca examinadora

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Dedicatória Ao meu pai e à minha mãe; aos meus filhos e amigos que me ajudaram nas horas mais difíceis quando mais precisei.

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Agradecimentos Agradeço primeiramente à Deus, Todo Poderoso, pela oportunidade de chegar até aqui. A meus filhos Ruan, Tainan e Natan, tesouros incomparáveis e exclusivamente meu, pelas compreensões nos momentos de ausência e tensões, próprios de quem trilha por essa estrada. A meus pais e irmãos pela força nos momentos de desânimo, ocasionados pelas dificuldades financeiras. Aos colegas de turma conquistados ao longo desta jornada, que muito contribuíram com suas opiniões, críticas, sugestões e materiais didáticos, a fim de possibilitar o enriquecimento deste estudo. Aos professores, que nos mostraram o horizonte que conduz ao porto seguro da sabedoria. Aos meus inimigos, pois não imaginavam, que enquanto torciam para aplaudir a minha queda, incentivavam-me a não retroceder em meio à inveja e desamor. Agradeço de coração a todos que, de alguma forma, direta ou indiretamente, contribuíram para que eu escrevesse com tinta ‘sucesso’ a estrada da minha vida.

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“De fato, esse mundo é incompreensível. Quando as crianças nascem elas são especiais, o centro do mundo, mas pouco a pouco muitos adultos as deixam na periferia de suas vidas. Os beijos e as carícias evaporam-se. Os pais trabalham para o futuro pos seus filhos, querem lhes dar o mundo, mas não têm tempo para dar a si mesmos. Eles precisam ter uma alma de criança para penetrar no mundo das crianças”. Augusto Cury (2002, p. 54)

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RESUMO A hora da separação de um casal é sempre um momento difícil, pior ainda quando se separam, disputando a guarda do filho. Desde a aprovação do divórcio no Brasil em 1977, a maioria das separações manteve a guarda das crianças com as mães. Mas nestes quase 30 anos, os homens passaram a reivindicar mais a convivência com os filhos, culminando com artigo no novo Código Civil, em 2003, determinando que pais e mães separados têm direitos iguais de ficar com a guarda dos filhos. Pensando no bem-estar, cresce o número de casais que fazem um acordo para que as crianças não fiquem nem com ele nem com ela, mas com os dois. É a chamada “guarda compartilhada”. O que antes era uma reivindicação, agora virou lei. Aprovada no dia 13 de agosto, a lei prevê a guarda compartilhada de filhos de casais divorciados, de uniões estáveis ou de relações eventuais. PALAVRAS-CHAVE: Guarda. Educação. Família. Psicologia. Menor.

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SUMÁRIO INTRODUÇÃO................................................................................... 07

CAPÍTULO I – PODER FAMILIAR....................................................... 09 1.1 HISTÓRICO................................................................................... 09 1.2 O PÁTRIO-PODER E O CÓDIGO DE 1916........................................... 14 1.3 O PODER FAMILIAR E O CÓDIGO CIVIL DE 2002................................ 16 1.4 SUSPENSÃO DO PODER FAMILIAR.................................................... 17 1.5 PERDA OU DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR.................................. 18 1.6 EXTINÇÃO DO PODER FAMILIAR...................................................... 19

CAPÍTULO II – GUARDA COMPARTILHADA........................................ 21 2.1 ORIGEM........................................................................................ 21 2.2 FAMÍLIA TRADICIONAL E A FAMÍLIA CONTEMPORÂNEA....................... 22 2.3 A GUARDA NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA........................................... 24 2.4 PRIORIDADE PARA ATRIBUIÇÃO DA GUARDA: o interesse do menor..... 27 2.5 MODELOS DE GUARDA.................................................................... 30

CAPÍTULO III – GUARDA COMPARTILHADA: aspectos psicológicos, jurídicos e pedagógicos....................................................................

33

3.1 GUARDA DOS FILHOS: aspectos psicológicos..................................... 33 3.2 O ABUSO DE DIREITO NO EXERCÍCIO DO PODER FAMILIAR................. 38 3.3 GUARDA COMPARTILHADA: uma nova dimensão na convivência familiar. O discurso do judiciário............................................................

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3.4 GUARDA COMPARTILHADA E A MEDIAÇÃO FAMILIAR.......................... 42 3.5 AMOSTRAGEM DO POSICIONAMENTO JUDICIAL................................. 44 3.6 EDUCAÇÃO DOS FILHOS: aspectos psicopedagógicos.......................... 47

CONSIDERAÇÕES FINAIS.................................................................. 51

REFERÊNCIAS................................................................................... 53

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INTRODUÇÃO

Inúmeras mudanças ocorreram ao longo do tempo no âmbito da

sociedade, conseqüentemente a instituição família e o Direito também foram

afetados por tais mudanças.

O êxodo rural, a Revolução Industrial, o crescente ingresso das mulheres

no mercado de trabalho, a revolução feminista, foram apenas alguns dos fatores

que desencadearam enormes alterações na sociedade e na família.

Dentre as mudanças, as que mais possuem relevância em relação ao

presente estudo dizem respeito à crescente igualdade entre homens e mulheres

e ao aumento da importância dispensada às crianças e adolescentes. A primeira

ensejou o princípio da isonomia entre homem e mulher constitucionalmente

garantido e a segunda o princípio do melhor interesse da criança contido nos

diplomas legais nacionais e internacionais referentes à criança e ao adolescente

(Estatuto da Criança e do Adolescente).

Estes princípios trouxeram a confirmação e a normatização de situações

que já estavam imbuídas na sociedade: isonomia entre os sexos e a preocupação

de se preservar e atender ao melhor interesse da criança.

Desde a aprovação do divórcio no Brasil em 1977, a maioria das

separações manteve a guarda das crianças com as mães. Mas com o ingresso

das mulheres no mercado de trabalho e estas se ocupando cada vez mais, tendo

pouco tempo para o lar, os homens passaram, gradualmente, a preencher a

lacuna deixada pelas trabalhadoras, exercendo as atividades do lar, incluindo nos

cuidados dos filhos. No divórcio, devido a essa aproximação, os pais (homens)

começaram a reivindicar mais a convivência com os filhos, isto é, que a guarda

não seja mais exclusivamente única, em que o cuidado do menor ficava a cargo

da mãe.

O que se pede nos tribunais é a guarda compartilhada. Ela compreende a

responsabilização conjunta e o exercício de direitos e deveres do pai e da mãe

que não vivam sob o mesmo teto, concernentes ao poder familiar dos filhos

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comuns. Desta forma, a guarda compartilhada nada mais é do que a

incumbência imposta a ambos os pais quanto aos direitos e deveres relativos os

filhos comuns. Isso engloba o dever de sustentar, proporcionar educação

adequada, alimentos, vestuário, e quando necessários forem, recursos médicos e

terapêuticos.

Mas mesmo com vários casos de sucesso da guarda compartilhada e com

o referencial teórico em que autores a defendem como sendo o melhor tipo de

guarda para os filhos, existem fatos em que este modelo de guarda não pode ser

considerado como o melhor para o filho, principalmente no que diz respeito à

educação.

Por ter sido recentemente homologada no dia 13 de agosto do corrente

ano, ainda é muito cedo para dizer se este modelo de guarda é o melhor para a

criança. Existe, porém, alguns casos em que ela não poderia ser aplicada,

entretanto, poucos são os realmente divulgados, visto que, a maioria do sistema

judiciário do país, ainda não possui um sistema eficiente e bem informatizado

que divulgue, a nível de pesquisa e a nível nacional, os casos julgados contra a

aplicação da guarda compartilhada, e claro, o por quê desta não servir para

àquela situação.

O referido trabalho está dividido em três capítulos. O primeiro fala do

Poder Familiar, seu histórico, o pátrio-poder e o código de 1916, sua relação com

o código de 2002, como pode ocorrer sua suspensão, extinção, perda ou

destituição. O segundo fala da guarda compartilhada, sua origem, a diferença da

família tradicional e a família contemporânea, sua relação da legislação

brasileira, a prioridade para a atribuição da guarda, enfocando o interesse do

menor e os modelos de guarda. O terceiro averigua os aspectos psicológicos,

jurídicos e pedagógicos da guarda compartilhada. Nos aspectos psicológicos, é

abordado qual influência psicológica a guarda causa na criança, o abuso do

direito no exercício do poder familiar. Aos olhos do judiciário, a dimensão da

guarda na convivência familiar, sua relação com a mediação familiar. É feito uma

amostragem do posicionamento judicial acerca da guarda compartilhada, assim

como os aspectos psicopedagógicos na educação dos filhos. Por fim, vêm as

considerações finais e as referências.

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CAPÍTULO I – PODER FAMILIAR

1.1 HISTÓRICO

A história da humanidade, assim como os estudos antropológicos sobre os

povos e culturas distantes de nós (espaço e tempo), esclarecem-nos o que é

família, como existiu e existe. Mostra-nos como foram e como são ainda hoje

variadas as formas sob as quais as famílias evoluem, se modificam, assim como

são diversas as concepções do significado social dos laços estabelecidos entre os

indivíduos de uma dada sociedade.

Se olharmos a linha do tempo no sentido inverso, percebe-se então, que

desde a pré-história, a família constituía um grupo no qual um líder exercia a

autoridade religiosa e civil. Já no final do Período Paleolítico, os povos se

organizavam em grupos, os quais eram matriarcais, isto é, liderados por

mulheres.

Chegando ao Período Neolítico, houve o desenvolvimento da agricultura

com a domesticação de animais e os grupos passaram a ser dirigidos por

homens, denominando-se patriarcais. Desse modo, os grupamentos humanos

destacam-se de diversas formas com diferentes finalidades.

Os povos, desde os primórdios da civilização, se reuniam em torno de algo

ou de alguém, constituindo uma família, ainda que fossem de forma

indisciplinada, pois o essencial era o agrupamento.

Percorrendo um pouco mais a linha da história, encontra-se um

interessante conceito na Roma Antiga sobre família. O termo família é derivado

do latim famulus, que significa escravo doméstico. Os antigos romanos referiam-

se à família como reunião de escravos, de criados que pertenciam a um só

indivíduo ou serviço público. (PRADO, 1985).

Nessa visão, a família romana não se importava com tipagem sanguínea, o

homem era considerando em Roma o chefe político, religioso e juiz, era pai da

família, que exercia o direito de vida e morte sobre todos os membros de seu

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grupo, impondo penalidade e tratando-os como coisas pertencentes ao seu

patrimônio.

Ribeiro (2002, p. 03) comenta que:

O Estado Romano praticamente não interferia no grupo familiar, sendo este de responsabilidade do pater que exercia uma jurisdição paralela a estatal, autorizada pelo próprio Direito Romano. O homem exercia seu domínio na família, assim como o imperador o fazia no vasto domínio Romano, existindo entre eles, o pater e o imperador, uma correlação, já que acreditava-se que a família era a representação dos estados.

A família em Roma era tida como unidade política, jurídica, econômica e

religiosa, sendo comandada pela figura masculina. Para tanto, as famílias

romanas eram consideradas, na visão contemporânea, um tanto tradicionais,

tendo o homem como o mentor e dominador de todo o contexto familiar.

Na Grécia, a família também é considerada como algo fundamental como

para o processo evolutivo do indivíduo, desta feita, “a família era representada

pelo grupo ligado ao ancestral comum, aditando-se os cônjuges e enteados,

genros noras, cunhados, a ponto de alguns estudiosos à figura do ‘genro’, devido

tamanho abrangência [...]” (RIBEIRO, 2002, p. 03).

Entende-se que a família na, Grécia, era um tanto colossal, pois todos os

que se casavam com os envolvidos daquele ciclo familiar, passavam a pertencer

aquele grupo, que gradativamente, aumentava.

Como é sabido, a palavra Família no sentido popular, assim como nos

dicionários e, conforme Cegalla (2005, p. 411), significa: “grupo de pessoas

aparentadas que vivem sob o mesmo teto”.

Aparentemente sabemos o que é uma família, já que fazemos parte de

alguma. No entanto, para qualquer pessoa, não é fácil definir esta palavra, e

mais exatamente um conceito que consiga englobar de forma geral a situação

familiar.

Por isso, a maioria das pessoas quando aborda questões familiares, refere-

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se espontaneamente a uma realidade bem próxima, partindo do conhecimento

da própria família, realidade que crêem ser semelhantes para todos, e daí,

acabarem generalizando ao falar das famílias em abstrato.

Nos tempos medievais1, as pessoas começaram a estar ligadas por

vínculos matrimoniais, formando novas famílias. Dessas novas famílias faziam

também parte a descendência gerada que, assim, tinha duas famílias, a paterna

e a materna. Mas essa noção de família nuclear – pais e filhos coabitando – não

existia. Dias (1992, p. 57) ressalta que:

Quando a criança chegava a certa idade, era comum que passasse a viver em outra casa que não a de sua família. Assim, não havia uma função afetiva na família, pois esse não era o seu principal objetivo. A educação da criança ficava a cargo da comunidade em geral.

Com a Revolução Francesa2 surgiram os casamentos laicos3 no ocidente e,

a Revolução Industrial iniciada na Europa que só chegou no Brasil no século XIX,

tornaram-se freqüentes os movimentos migratórios para cidade maiores,

construídas em redor dos complexos industriais. Estas mudanças demográficas

originaram o estreitamento dos laços familiares, a família passou a ocupar um

novo lugar na sociedade. Segundo Dias (1992, p. 61), “Foi por esse período que

a família se transformou no tipo nuclear (pai, mãe e filhos), constituindo desse

modo, a família patriarcal – modelo recebido de padrões culturais portugueses”.

Percebemos que, se antes não havia trocas afetivas dentro da família, e

sim no grupo social mais amplo, a partir do século XIX, “a afeição desenvolvida

no interior da família nuclear passou a ser valorizada e mudou-se o enfoque. (...)

Os pais passaram a se interessar pelos estudos de seus filhos e a acompanhá-los

mais diretamente”. (DIAS, 1992, p. 58)

Portanto, podemos dizer que a família, instituição mais antiga de toda a

sociedade, hoje representa o primeiro espaço que promove a satisfação das

necessidades básicas da criança e simultaneamente o desenvolvimento da

personalidade e da socialização, pois “a família tem a responsabilidade de formar

1 Idade Média 2 1789 3 Que não pertencem a ordens religiosas

12

o caráter, de educar para os desafios da vida, de perpetuar os valores éticos e

orais. Os filhos se espelhando nos pais e os pais desenvolvendo a cumplicidade

com os filhos”. (CHALITA, 2001, p. 20)

A família tem tarefas e características próprias e importantes na formação

do sujeito. Segundo Chalita (2001, p. 21). “A família é uma instituição em que as

máscaras devem dar lugar à faces transparentes, sem disfarces”. O diálogo é

necessário para que a criança se sinta amada e, acima de tudo, respeitada.

A construção do conhecimento inicia-se na família, pois as relações

familiares são os primeiros vínculos com o saber. É na família mediadora entre o

indivíduo e a sociedade, que aprendemos a perceber o mundo e a nos situarmos

nele. Como nos lembra Reis (1984, p. 99), a família “é a formadora da nossa

primeira identidade social. Ela é o primeiro ‘nós’ a quem aprendemos a nos

referir”.

Neste sentido, a atual realidade familiar brasileira não varia muito de uma

camada social para outra, referente aos laços que aí são valorizados – amor

entre casal, compreensão e amizade entre pais e filhos –, ao comportamento

esperado entre seus membros – responsabilidade econômica do marido, infra-

estrutura doméstica e afetiva pela mulher, obediência às diretivas paternas –, e

à expectativa dos papéis sociais que deverão ser cumpridos por cada um.

A família, como toda instituição social, apresenta aspectos positivos,

enquanto núcleo afetivo, de apoio e solidariedade. Mas por outro lado, apresenta

aspectos negativos, como a imposição normativa através das leis, usos e

costumes, que implicam nas formas e finalidades rígidas.

Em épocas passadas, o poder familiar era de estrutura patriarcal que não

somente identificava o indivíduo pela origem paterna (patrilinear), mas ainda

dava ao homem o direito prioritário sobre o filho e um poder sobre a pessoa de

sua esposa. Além disso, tem-se a família matrilinear que identificava o indivíduo

por sua origem materna. Com o passar dos anos esse poder mudou para dever,

ou seja, a autoridade dos pais não desapareceu, nem passou a ser questionada

como tal, o que mudou foi a forma de exercer esse poder.

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Vale ressaltar que a sociedade capitalista provocou na família uma crise,

sem lhe conferir compensação alguma e ao mesmo tempo continua a cobrar

dela, sem desconto, a mesma missão de antes, tornando-se maior, mais pesada

e complexa. As mudanças na estrutura familiar estão fazendo com que haja uma

diminuição do número de filhos.

No Brasil, encontra-se muitas famílias nucleares4 em que o casal é unido

por laços legais ou não, seja na classe alta, média ou proletariado. Lembrando

também que encontra-se grande número de famílias chefiadas por mulheres, não

somente em virtude da ausência do marido – mães solteiras, separação, viuvez –

mas sabidamente, a mãe de família tem ido ao mercado de trabalho cada vez

mais e mais, não somente pela necessidade de sobrevivência, mas também em

busca de uma vida confortável. Como nos lembra Prado (1985, p. 77), “ao

contrário do que se imagina através de idealizações, as mulheres chefes de

família são comumente encontradas em pequenos povoados, nas regiões

subalternas e, embora em menor escala, representadas também em todas as

classes urbanas”.

Diante dessas mudanças, vem a idéia de que a família já seria algo do

passado. O que está em crise são os modelos de família e não a família. Os

modelos familiares sempre têm a ver com as formas com que um povo ou uma

sociedade se organiza para produzir ou reproduzir sua vida.

Atualmente, não é mais admissível a direção familiar ser exercida apenas

pelo pater. Baseando-se no princípio da igualdade jurídica entre os cônjuges e os

companheiros, e no princípio da consagração do poder familiar, disposto na

Constituição Brasileira de 1988, as decisões seriam tomadas em comunhão de

acordo comum pelos conviventes ou marido e mulher.

A consagração de tais princípios retrata uma outra forma de

conjugalidade, sedimentado não mais na família nuclear, mas entre outros

sujeitos autônomos, iguais em direito, justamente porque são diferentes.

4 Formadas de pai, mãe e filhos.

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Mesmo que o módulo familiar tenha mudado, é na família que cada um

encontra, na infância, na adolescência e na velhice, o ambiente mais adequado

para o crescimento corporal, afetivo, social e espiritual, isto é, é nesse ambiente

que está o desenvolvimento do ser humano no sentido pleno. Isso somente será

possível com a participação eqüitativa dos pais, preservando respeitosamente a

dignidade e a personalidade dos filhos.

O Código Civil de 2002 esclarece que o poder familiar passa a ser exercido

pelos genitores, ressaltando ainda que não há alteração do instituto em casa de

ruptura conjugal.

Diniz (1998, p. 24) elucida que,

[...] o pátrio poder pode ser definido como um conjunto de direitos e obrigações, quanto à pessoa e os bens do filho menor, não emancipado, exercido em igualdade de condições, para ambos os pais, para que possam desempenhar os encargos que a norma jurídica lhes impõe, tendo em vista o interesse e a proteção do filho.

Esclarecendo que o Código Civil de 2002 considera entidade familiar a

união estável, a família monoparental, ou seja, as famílias constituídas por

apenas um dos pais e seus descendentes, além daquelas constituídas pelo

matrimônio. Neste caso, o Estado como responsável por todos os indivíduos

dessa sociedade e com intuito protetivo, determina aos pais inumeráveis

responsabilidades quanto à pessoa dos seus filhos, enquanto for menor de idade,

em outras palavras, não emancipado.

1.2 O PÁTRIO-PODER E O CÓDIGO DE 1916

A instituição familiar durante décadas modelou a sociedade ocidental e

influenciar o resto do mundo e dentro dela tinha uma série de valores e idéias

que romperam com as idéias do período medieval, perpassando por diversas

correntes.

Sabe-se hoje, que a família tem sofrido profundas mudanças quanto à

natureza, função e a concepção. Deixando de ser um núcleo econômico e de

reprodução para toma-se um espaço de amor, companheirismo e afeto.

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A tradicional expressão "Pátrio Poder" foi cedendo espaços as novas

formas de denominação como: poder parental e poder de proteção.

Atualmente o entendimento que temos do pátrio poder é muito mais pátrio

dever, mas não só "pátrio". Visto que a Constituinte de 1988 art. 226, parágrafo

5°, iguala os direitos dos pais, do marido e da mulher.

Assim, o pátrio poder ou poder parental é um conjunto incindível de

poderes-deveres que deve ser exercido visando o desenvolvimento dos filhos.

Ressaltando que ambos os pais devem permanecer exercendo, igualitariamente

os direitos e deveres inerentes ao poder familiar, assegurando a continuidade do

benefício ao menor, mesmo depois de desconstituída a sociedade conjugal.

De acordo com Silva (2006), afeição romana do Pátrio Poder encontrou

guarida nas ordenações do Reino e assim foi translada para o Brasil pela Lei de

20 de outubro de 1823, ou seja, conferiu total poder e domínio do pater familias.

O homem era chefe da sociedade conjugal, o "cabeça do casal" enquanto a

mulher, relativamente incapaz, necessitava de seu amparo e de sua autorização

para a prática de atos da vida civil.

Dias (2007) relata que no Código Civil de 1916, o casamento não se

dissolvia. Caso ocorresse o desquite, os filhos menores ficavam·com o cônjuge

inocente. Ou seja, primeiramente identificava-se o cônjuge culpado para depois

definir a guarda, lembrando que após definido o cônjuge culpado, o mesmo seria

punido com a perda da guarda do menor. Na hipótese de serem ambos os pais

culpados, os filhos menores poderiam ficar com a mãe, caso isso não trouxesse

prejuízo de ordem moral a eles. Mas se a mãe fosse a única culpada em nenhum

momento ela poderia ficar com os filhos independente da idade.

O código civil de 1916 evidenciava uma família transpessoal, hierarquizada

e patriarcal, onde mantia-se à tradição e ao estado social, conservando a

indissolubilidade do matrimônio. O código não priorizava o direito da criança,

olvidando seu interesse em ter as melhores condições de desenvolvimento.

Esclarecendo que a nova Lei admitia abrandamento em prol dos filhos, sendo

facultado ao juiz tomar a melhor decisão. Devido as discriminações no Código

Civil de 1916, no qual produziu reflexos significativos no poder familiar, houve a

16

necessidade de uma nova reformulação do Código Civil brasileiro, deixando de

vingar a prioridade absoluta a criança e adolescente.

1.3 O PODER FAMILIAR E O CÓDIGO CIVIL DE 2002

Na Roma antiga o chefe de família tinha poder quase que absoluto sobre

seus membros, tanto de ordem, patrimonial como sobre suas vidas. O filho não

tinha patrimônio, tampouco direitos, mas com o tempo esses poderes foram se

restringindo. Conforme Grisard (2002), as famílias romanas eram baseadas na

submissão de seus membros ao Pater familias.

Recentemente, a expressão "pátrio poder" foi substituída pelo poder

familiar, onde o Código Civil de 2002 substitui o de 1916, evidentemente pela

decorrência da atual crise da família masculina patriarcal e a presença de novas

configurações familiares, além dos avanços tecnológicos e sociais.

Mesmo que o modelo de família patriarcal esteja em crise não significa um

indício de que a família irá desaparecer, mostra, apenas a sua transformação e a

sua adequação com o terceiro milênio. Ou seja, com todos esses processos as

pessoas ainda sentem vontade de formar família, independentemente da

orientação sexual.

O poder familiar é um complexo de direitos e deveres quanto à pessoa e

bens do filho, exercidos pelos pais na mais estreita colaboração, e em igualdade

de condições. Sendo assim, o poder familiar é um instituto que busca atender ao

interesse dos filhos menores de idade que estão sob a proteção dos pais ou

responsáveis, em face de suas condições peculiares de desenvolvimento.

O Novo Código Civil de 2002 trouxe uma outra visão, com a ampliação das

formas de constituição do ente familiar e a consagração do princípio da igualdade

de tratamento entre marido e mulher, assim como iguais são todos os filhos,

hoje respeitados em sua dignidade de pessoa humana, independente de sua

origem familiar.

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Retrata também que é considerado entidade familiar, a união estável, a

família monoparental, ou seja, as famílias constituídas por apenas um dos pais e

seus descendentes, além daquelas constituídas pelo matrimônio.

A finalidade do poder familiar reside ao máximo de proximidade entre pais

e filhos, ainda que estes pais estejam separados e haja conflitos familiares entre

si. Vale dizer que uma maior proximidade resulta em fortalecimento dos laços

afetivos e proporciona uma convivência saudável entre os integrantes dessa

relação.

O pagamento de pensão alimentícia, juntamente com a fiscalização dos

atos do guardião não são bastante para fazer vale o poder familiar.

1.4 SUSPENSÃO DO PODER FAMILIAR

O Estado fiscaliza o cumprimento dos deveres e obrigações dos pais

para com seus filhos, e se não for respeitado, pode acarretar na suspensão

do Poder Familiar. Por exemplo, a forma comportamental dos pais, como

abuso de autoridade, faltando com os deveres para com seus filhos, pode

ocasionar a suspensão do Poder Familiar. O Novo Código Civil de 2002

elucida estes exemplos:

Art. 1637. Se o pai, ou a mãe, abusar de sua autoridade, faltando aos deveres a eles inerentes ou arruinando os bens dos filhos, cabe ao juiz, requerendo algum parente, ou o Ministério Público, adotar a medida que lhe pareça pela segurança do menor e seus haveres, até suspendendo o poder familiar, quando convenha. Parágrafo único: Suspende-se igualmente o exercício do poder familiar ao pai ou à mãe condenados por sentença irrecorrível, em virtude de crime cuja pena exceda a dois anos de prisão. Art. 1638. Perderá por ato judicial o poder familiar o pai ou a mãe que: I - castigar imoderadamente o filho; II - deixar o filho em abandono; III - praticar atos contrários à moral e aos bons costumes; IV - incidir, reiteradamente, nas faltas previstas no artigo antecedente.

De acordo com o Estatuto da Criança e do Adolescente – ECA, se qualquer

um dos genitores quebrar o dever de sustento, não cumprir determinações

judiciais ou em relação à educação e à guarda dos filhos menores pode provocar

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a suspensão do Poder Familiar. Essa suspensão pode compreender todos os

filhos, alguns ou somente um. De acordo com a gravidade do caso é que a

decisão judicial será tomada.

Em conformação com Silva (2006, p. 33),

A suspensão do Poder Familiar pode atingir todos os poderes a ele inerentes ou apenas alguns deles a critério do Juiz, o qual se baseará na análise do que lhe for apresentado e comprovado. A gravidade do caso é que determinará a decisão judicial. A sentença poderá, inclusive, abranger todos os filhos, alguns ou somente um. Cessará a suspensão se ficar comprovada a regularização dos atos que geraram.

A suspensão e a destituição constituem sanções aplicadas aos genitores

pela infração dos deveres inerentes ao poder familiar, ainda que não sirvam

como pena ao pai faltoso. O intuito não é punitivo – visa muito mais preservar o

interesse dos filhos, afastando-os de influências nocivas. Em face das seqüelas

que a perda do poder familiar gera, deve somente ser decretada quando sua

mantença coloca em perigo a segurança ou a dignidade do filho.

Representa a suspensão do poder familiar medida menos grave, tanto que se sujeita a revisão. Superadas as causas que a provocaram, pode ser cancelada sempre que a convivência familiar atender ao interesse dos filhos. A suspensão é facultativa, podendo o juiz deixar de aplicá-la. Pode ser decretada com referência a um único filho e não a toda a prole, como pode abranger apenas algumas prerrogativas do poder familiar. Em caso de má gestão dos bens dos menores, possível é somente afastar o genitor da sua administração, permanecendo ele com os demais encargos inerentes ao poder familiar. (DIAS, 2007, p. 387)

1.5 PERDA OU DESTITUIÇÃO DO PODER FAMILIAR

Como atitude drástica, pode advir nos episódios em que gravíssimos

atos de violência aos deveres paternos restarem confirmados. Poderá

apreender apenas um dos progenitores passando os direitos e obrigações

do Poder Familiar, incondicional e unicamente, ao outro. Caso este não

tenha condições de ostentar a responsabilidade, o Juiz deverá indicar tutor

ao menor.

A perda ou suspensão do poder familiar de um ou ambos os pais não retira

do filho menor o direito de ser por eles alimentado. Entendimento em sentido

19

contrário premiaria quem faltou com seus deveres. Tampouco a colocação da

criança ou do adolescente em família substituta ou sob tutela afasta o encargo

alimentar dos genitores.

A perda do poder familiar não deve implicar a extinção no sentido de afastamento definitivo ou impossibilidade permanente. De qualquer forma, como o princípio da proteção integral dos interesses da criança deve ser, por imperativo constitucional, o norte, parece que a regra de se ter por extinto o poder familiar em toda e qualquer hipótese de perda não é a que melhor atende aos interesses do menor. (DIAS, 2007, p.389)

Se o responsável pela guarda da criança permitir ou obrigá-la a trabalhos

que não sejam adequados à sua idade, que de certa forma agrida sua formação

ou sua moralidade, este poderá ter o Poder Familiar destituído. Desta mesma

forma, o pai ou a mãe que aceita atos libidinosos de seus filhos ou os induzem à

prostituição ou à prática de atos criminosos, que além de ser privado do Poder

Familiar, poderá ser enquadrado em uma sanção penal.

1.6 EXTINÇÃO DO PODER FAMILIAR

Primeiramente, deve-se distinguir a doutrina perda e extinção do Poder

Familiar. Perda é uma sanção imposta por sentença judicial, enquanto a extinção

ocorre pela morte, emancipação ou extinção do sujeito passivo. Assim, há

impropriedade terminológica na lei que utiliza indistintamente as duas

expressões. A perda do Poder Familiar é sanção de maior alcance e corresponde

à infringência de um dever mais relevante, sendo medida imperativa, e não

facultativa. De acordo com o art. 1635 do Novo Código Civil (2002), extingue-se

o poder familiar: I - pela morte dos pais ou do filho; II - pela emancipação; III -

pela maioridade; IV - pela adoção do filho por terceiros; e V - em virtude de

decisão judicial.

A morte de ambos os pais impõe a nomeação de tutor ao menor. Caso só um dos pais venha a falecer, o encargo ficará com o sobrevivente se tiver condições de com ele arcar. A emancipação antecipa a maioridade e pode ocorrer: quando dada por quem detém o Pátrio Poder; na ocorrência do casamento do menor; em caso de emprego público; com a conquista de grau de ensino superior e por vir a possuir estabelecimento civil ou comercial com economia própria. (SILVA, 2006, p. 34)

20

Quando a maioridade de 21 anos é atingida, extingue a incapacidade

relacionada à menoridade, mas o Novo Código Civil (2002) habilita para a prática

de todos os seus direitos civis, a pessoa tendo 18 anos completos, de acordo

com o 5º artigo, inciso II. Neste mesmo artigo, o parágrafo único, diz que

cessará a incapacidade para os menores de idade, quando:

I - pela concessão dos pais, ou de um deles na falta do outro, mediante instrumento público, independentemente de homologação judicial, ou por sentença do juiz, ouvido o tutor, se o menor tiver 16 (dezesseis) anos completos; II - pelo casamento; III - pelo exercício de emprego público efetivo; IV - pela colação de grau em curso de ensino superior (foi suprimida a palavra científico, após grau); V - pelo estabelecimento civil ou comercial, ou pela existência de relação de emprego, desde que, em função deles, o menor com 16 (dezesseis) anos completos tenha economia própria.

A relação entre pais e filhos não é mais de poder, mas de autoridade,

devendo ser baseada no sentido de construir e preservar de modo saudável a

personalidade dos filhos, bem como sua dignidade, e que somente é possível

com a participação de todos equitativamente.

É necessário estabelecer e manter uma relação baseada no convívio, na

troca de experiências e responsabilidades em relação a alguém que não pediu

para vir ao mundo, e o que é pior que não merece estar em um campo de guerra

familiar.

21

CAPÍTULO II – GUARDA COMPARTILHADA

2.1 ORIGEM

A separação é sempre um momento complicado para toda a família e em

especial para as crianças. Porém, existe hoje uma forma para evitar que este

sofrimento seja maior para os filhos.

Entrou em vigor a Lei 11.698/08 que cria a guarda compartilhada dos

filhos de pais separados. A legislação sinaliza uma transformação nos critérios de

responsabilidades e deveres de pais e mães. A lei altera artigos do Código Civil e

prevê que os pais decidam juntos as atividades do dia-a-dia dos filhos, como

escola, cursos, passeios e prática religiosa.

A noção de guarda conjunta originou-se a partir das críticas que são feitas

ao sistema tradicional de guarda (guarda única); da extinção da desigualdade

entre homem e mulher e do desequilíbrio do exercício do poder familiar pelos ex-

cônjuges, como elucida Silva (2006, p. 67), “A noção de guarda conjunta ou

compartilhada surgiu na Common Law, no Direito Inglês na década de sessenta,

quando houve a primeira decisão sobre guarda compartilhada (joint custody)”.

Em muitos casos de separação ou divórcio, os procedimentos jurídicos ao

invés de ajudarem acabam reforçando a disputa existente entre as partes,

conseqüentemente faz gerar prejuízos de várias ordens para os genitores e

principalmente para os filhos. A guarda compartilhada surge como uma

possibilidade de unir os pais ou pelo menos não aumentar a desunião. Após a

separação mister é que as relações entre pais e filhos sejam mantidas e com

esse intuito surgiu o modelo de guarda compartilhada.

Diante do número cada vez maior de crianças filhas de pais separados ou

divorciados e da necessidade de reorganizar as relações entre pais e filhos

quando da desunião da família, desponta a guarda compartilhada, como um meio

de diminuir os traumas e os impactos negativos que a separação causa na

família. Por isso, este novo modelo vem ganhando espaço e despertando

interesse de pesquisadores de todas as áreas relacionadas.

22

Assim, a igualdade entre homem e mulher, o desequilíbrio do exercício do

poder familiar pelos ex-cônjuges e o princípio do melhor interesse da criança

fizeram com que surgisse uma maneira diferente de pensar a respeito da guarda.

2.2 FAMÍLIA TRADICIONAL E A FAMÍLIA CONTEMPORÂNEA

No modelo familiar antigo a guarda pertencia ao pai. É curioso constatar

que tal não era a prática até o final do século XIX: era atributo do pai deter a

guarda e o pátrio poder de seus filhos, e a mulher se submetia às suas

determinações.

Outrora todos os membros da família trabalhavam no campo e contribuíam

para o sustento. Com a Revolução Industrial foi alterado significativamente o

modo como as famílias conviviam, assim, os filhos deixam de ser considerados

fatores de produção e passam a ficar mais tempo sob os cuidados da mãe. O pai

teve que deixar o lar por certo período do dia para trabalhar nas fábricas, o que

influiu no seu afastamento do convívio com a prole. Esta mudança ocorrida na

sociedade também alterou o papel do pai dentro do lar, que passou a ser o de

provedor e a mãe era quem dava a atenção diária aos filhos.

Assim, a figura materna torna-se indispensável, os filhos passam a ser

vistos como os que sofrerão danos irreparáveis se separados da mãe,

principalmente durante a primeira infância. Esse pensamento deu à mãe a

preferência da atribuição da guarda. Essa preferência legal pela guarda materna

permaneceu até a década de 60, sendo o pai o provedor e sem nenhum papel

direto na educação dos filhos.

No passado, as relações intrafamiliares não eram tão complexas como são

hoje em dia, por isso as decisões eram mais facilmente tomadas pelos juízes e

mais facilmente aceitas pelas partes. As desigualdades entre homem e mulher

eram naturalizadas e legitimadas culturalmente.

A evolução social, a quebra de tradições e as decisões nos processos de

família ao longo do tempo demonstram que a instituição família sofreu mudanças

23

no decorrer da história da humanidade, é mutável, ou seja, a família muda

conforme se alteram as estruturas da história através do tempo.

Na década de setenta houve a revolução feminista e o ingresso cada vez

maior das mulheres no mercado de trabalho, nova alteração ocorreu no seio

familiar, pois a mãe passou também a assumir o papel de provedora do lar. A

mulher foi sobrecarregada com os afazeres domésticos, o cuidado com os filhos e

o trabalho fora do lar. Com isso, a figura do pai voltou a ter importância, pois as

responsabilidades e os cuidados com os filhos foram divididas entre pai e mãe. O

pai se tornou muito mais consciente do seu papel no desenvolvimento da prole.

As grandes mudanças ocorridas no mundo culturalmente, ambientalmente

e tecnologicamente, foram advindas da urbanização, revolução industrial,

entrada das mulheres no mercado de trabalho, controle da fertilidade pela

contracepção nos anos 60 etc. Provocaram o desaparecimento de muitas

diferenças que existiam entre os povos, assim, novas formas de pensar, viver

são adotadas e não é diferente na família. Essa instituição também sofreu e sofre

continuamente as conseqüências das mudanças.

Com isso, a família é obrigada a trilhar novos e revolucionários caminhos,

projetados pelas mudanças ocorridas. O aspecto unilateral da família já não é

mais aceito sem contestações, pois a família, por sua vez, não pode ser

concebida sob um aspecto unilateral. Toda criança foi trazida ao mundo pela

atuação de um pai e uma mãe, de modo que a visualização da família é

composta da união dos dois pólos.

Há uma necessidade de redefinição dos papéis na família, a tendência de

se atribuir a guarda invariavelmente à mãe vem sofrendo a oposição de pais,

enquanto aquelas vêm desistindo de assumir exclusivamente mais este encargo,

devido às dificuldades de sobrevivência.

Até pouco tempo era dever social da mulher cuidar dos filhos e do homem

levar para casa o sustento de toda a família. Numa eventual separação dos

cônjuges, a guarda da criança ficava com a mãe e cabia ao pai cumprir o regime

de visitas determinada por ela ou por ordem judicial.

24

Hoje, o mundo moderno colocou a figura feminina no mercado de trabalho

e aproximou os homens do ambiente familiar. Eles querem dividir as despesas e

o convívio com os filhos. E os pesquisadores mostram que, em caso de

separação do casal, a guarda compartilhada pode ser a melhor solução para as

crianças.

Com a isonomia entre homem e mulher, cada vez mais, o casal moderno é

levado a dividir as responsabilidades na criação e educação da prole. Fato é que

a figura da mãe dona de casa e do pai como único provedor não mais subsistem

na atual sociedade.

Para Santos (2005, p. 97), o entendimento da família atual é,

Afetiva, democrática, indelevelmente destinada à preservação e ampliação da dignidade humana, em sua integralidade – essa é a nova família. Cônjuges e prole solidificando laços sentimentais e de amizade que jamais poderiam ser desfeitos, mesmo em se acatando a desvinculação formal entre os primeiros.

A família clássica é aquela estruturada na hierarquia vertical, na rígida

divisão de tarefas e focada no casamento como fundamento para a procriação,

ou seja, trata-se de uma família baseada no passado e a família nuclear, que se

restringe ao casal e aos descendentes menores, em que é suprimida a hierarquia

e a divisão de papéis, ganhando na qualidade do afeto. Tem-se aqui uma família

norteada para o futuro.

Diante disso, verifica-se que a família contemporânea é nuclear,

democrática e cada vez mais há igualdade e afetividade entre seus membros,

com isso, nota-se a necessidade de adotar-se um modelo de guarda que se

coadune com a atual realidade em que se vive.

2.3 A GUARDA NA LEGISLAÇÃO BRASILEIRA

A guarda de filhos, no direito brasileiro, está regulamentada na Lei

6.515/77 (Lei do Divórcio). Difere da guarda prevista na Lei 8.069/90 (Estatuto

da Criança e do Adolescente), referente a menores em situação irregular

(abandonados ou infratores). Assim dispõe a Lei do Divórcio sobre a guarda de

25

filhos, conforme Silva (2006, p. 47), “Art. 9º. No caso de dissolução da

sociedade conjugal pela separação judicial consensual (art. 4º), observar-se-á o

que os cônjuges acordarem sobre a guarda dos filhos”.

Este artigo relega a fixação da guarda dos filhos ao entendimento dos pais,

em ações de separação judicial por mútuo consentimento. Pode ocorrer em

separação judicial litigiosa, quando a questão da guarda for incontroversa.

Art. 10. Na separação judicial fundada no 'caput' do art. 5º, os filhos menores ficarão com o cônjuge que a ela não houver dado causa. §1º. Se pela separação judicial forem responsáveis ambos os cônjuges, os filhos menores ficarão em poder da mãe, salvo se o juiz verificar que de tal solução possa advir prejuízo de ordem moral para eles. §2º. Verificado que não devem os filhos permanecer em poder da mãe nem do pai, deferirá o juiz a sua guarda a pessoa notoriamente idônea da família de qualquer dos cônjuges. (SILVA, 2006, p. 47-48)

Nos casos de separação judicial litigiosa, intentada com base em atitude

culposa de uma das partes, a guarda deverá ser atribuída ao cônjuge que não

deu causa à separação, ou seja, que não praticou os atos ofensivos aos deveres

do casamento (CC, art. 231). Muito embora a jurisprudência venha suavizando a

aplicação deste artigo, em detrimento dos interesses dos menores, o dispositivo

não é letra morta e, portanto, exige atenção na instrução do processo para

determinar-se a culpa pela separação.

Se ambos os cônjuges forem considerados culpados pela separação, a

guarda deve ser atribuída à mãe. Esta determinação legal, de cunho sociológico,

respalda a presunção (relativa) referente aos atributos maternos e seus reflexos

benéficos na criação dos filhos. Trata-se, ademais, de uma garantia, uma

segurança a mais à mulher para a propositura da ação de separação, fazendo

cessar situações domésticas atentatórias a sua dignidade e segurança.

Por analogia, o mesmo entendimento deve ser aplicado no caso de

separação judicial sem culpa (ação deflagrada com base no falecimento da

sociedade conjugal sem que ocorra ofensa aos deveres do casamento por um dos

cônjuges).

O parágrafo primeiro deste artigo prevê uma exceção ao deferimento da

26

guarda à mãe, em caso de separação judicial por culpa recíproca ("...salvo se o

juiz verificar que de tal solução possa advir prejuízo de ordem moral para eles").

A subjetividade do dispositivo pende para a mãe, de forma que somente em

casos excepcionais (abandono; falha grave nos cuidados com a saúde da criança;

etc.) a guarda lhe deve ser negada.

A legislação pátria já dá a base legal para estimular a guarda

compartilhada, com uma legislação moderna e avançada, que ainda contrasta

com o enraizado preconceito machista, secularmente transmitido, de que o

cuidado dos filhos, deve ser tarefa da mãe, cabendo ao pai, a responsabilidade

de prover seus alimentos. A isto, Silva (2006, p. 46) reforça o comentário

dizendo que “[...] a Lei nº 5.582/70 determinou que o filho natural, quando

reconhecido pelo pai e pela mãe, ficasse sob a guarda da mãe, não mais do pai,

a não ser que fosse prejudicial ao menor [...]”.

O legislador, por outro lado, vem introduzindo paulatinamente no

ordenamento jurídico, vários normativos que por certo, acabarão por consolidar

a guarda compartilhada, como um instrumento legal hábil para a melhoria da

qualidade do relacionamento entre pais separados e seus filhos. Segundo

BONATO; MAIA (org. 2005, p. 20)

É importante a criança conviver com ambos os pais, para que construa uma relação e forme por si uma imagem de cada um dos seus pais. Esta convivência está relacionada ao tempo em que estão juntos pai e filhos ou mãe e filhos, que no contexto atual, tende a ser em pouca quantidade, mas que se pretende ter boa qualidade na convivência. [...]. A convivência com pai e mãe estreitam os vínculos e é importante que estes ultrapassem as brigas e desentendimentos dos adultos, e que sobrevivam à separação do casal.

O marco decisivo para a implantação da guarda provisória, encontra-se na

Constituição Federal de 1988, que trouxe em seu artigo 226, § 3º e 4º, o

reconhecimento da união estável entre homem e mulher como entidade familiar;

o § 5º, do mesmo artigo, trouxe grande contribuição, ao regulamentar que os

direitos e deveres referentes à sociedade conjugal serão exercidos igualmente

pelo homem e pela mulher. O artigo 229, da Carta Magna, atribui aos pais "o

dever de assistir, criar e educar os filhos menores".

27

Posteriormente, o Estatuto da Criança e do Adolescente, conhecido como

ECA, Lei nº 8069/90, de forma objetiva, atribui em seu artigo 4º, como dever da

família, ao lado da comunidade, da sociedade em geral e do Poder Público,

assegurar, com absoluta prioridade, a efetivação dos direitos referentes à vida, à

saúde, à alimentação, à educação, ao esporte, ao lazer, à profissionalização, à

cultura, à dignidade, ao respeito, à liberdade, e à convivência familiar e

comunitária.

Tal dispositivo contido no ECA, na verdade, deu efetividade ao artigo 227,

da Constituição Federal, que consolida como dever da família, da sociedade e do

Estado assegurar à criança e ao adolescente, com absoluta prioridade, todos os

direitos fundamentais, dentre os quais, o direito à convivência familiar.

O ECA, no artigo 5º, proíbe em relação às crianças e adolescentes,

qualquer modalidade de discriminação, negligência, exploração e violência,

determinando a punição dos responsáveis por qualquer atentado aos direitos

fundamentais. Nos artigos subseqüentes, trata das disposições que devem ser

observadas e garantidos às crianças e adolescentes, para a garantia dos direitos

fundamentais assegurados no artigo 4º, já referido.

Mais recentemente, o Código Civil, Lei nº 10.406/2002, estabeleceu o

Poder Familiar, em substituição ao Pátrio Poder, adaptando a legislação

infraconstitucional, aos princípios constitucionais da Carta de 1988, disciplinando

o exercício do poder familiar pelo pai e pela mãe, sempre atento ao interesse do

menor, em conformidade com o Estatuto da Criança e do Adolescente, sendo que

a disciplina do exercício do poder familiar se encontra inserta no artigo 1634 do

Estatuto Civil.

2.4 PRIORIDADE PARA ATRIBUIÇÃO DA GUARDA: o interesse do menor

Não é a conveniência dos pais que deve orientar a definição da guarda, e

sim o interesse do menor. A denominada guarda compartilhada não consiste em

transformar o filho em objeto à disposição de cada genitor por certo tempo,

devendo ser uma forma harmônica ajustada pelos pais, que permita a ele (filho)

desfrutar tanto da companhia paterna como da materna, num regime de

28

visitação bastante amplo e flexível, mas sem perder seus referenciais de

moradia. Não traz ela (guarda compartilhada) maior prejuízo para os filhos do

que a própria separação dos pais. É imprescindível que exista entre eles (pais)

uma relação marcada pela harmonia e pelo respeito, na qual não existam

disputas nem conflitos.

O Direito da Família contemporâneo tem alguns princípios fundamentais e

norteadores que o regem como, afeto, igualdade e alteralidade, pluralidade de

famílias, melhor interesse da criança/adolescente, autonomia de vontade e

intervenção estatal mínima.

Compartilhar a educação dos filhos seria o ideal. Pais presentes,

participativos. Porém, essa premissa não é a realidade das Varas de Família. Nas

relações judiciais, às vezes, o elo determinante da família, o amor, o afeto, o

respeito, perdem espaço para conflitos, desentendimentos. E os filhos se

encontram no meio da história da degradação pessoal dos pais. .Poupar os filhos,

como o casal é tarefa preciosa do juiz e advogado, auxiliados por estudiosos da

psicologia da psicanálise. Enfim, o caminho é sinuoso, porém repleto de vitórias

se assim for dirimido.

“É nesse sentido que a prioridade conferida ao interesse do menor emerge

como o ponto central, a questão maior, que deve ser analisada pelo juiz na

disputa entre os pais pela guarda do filho”, enfatiza Silva (2006, p. 51)

Importa também considerar, que família e parentesco são categorias

distintas. O cônjuge pertence à família, e não é parente do outro cônjuge.

Enquanto perdura à relação conjugal, marido e mulher são consortes, que

compartilham uma comunhão de vida. Dissolvida à sociedade conjugal, não

existirá liame jurídico entre os ex-cônjuges. Já os filhos, continuam fazendo

parte daquela relação finalizada, e precisam conviver com àqueles que um dia

formaram um casal. Portanto a separação é da família conjugal e não da família

parental.

Surge, porém um dilema. Com quem ficará o filho ou filhos? Convivendo

com ambos? O melhor caminho? Mas a experiência mostra que isso só ocorre, se

29

os pais saíram da separação/divórcio, sem mágoas, ressentimentos,

amadurecidos. E no caso de conflitos, determinar que a guarda seja concedida

apenas a um (obedecendo ao melhor interesse do menor), e ao outro, o direito

de visitas. Que situação frustrante, tanto para as partes, como para o julgador.

Porém como nas relações de "estado", as situações são momentâneas,

posteriormente aquela situação poderá ser mudada, em qualquer tempo, pois a

vida segue seu curso.

Segundo Leite (1997, p. 195 apud SILVA, 2006, p. 54),

O interesse do menor serve, primeiramente, de critério de controle, isto é, de instrumento que permite vigiar o exercício da autoridade parental sem questionar a existência dos direitos dos pais. Assim, na família unida, o interesse presumido da criança é de ser educado por seus dois pais; mas se um deles abusa ou usa indevidamente suas prerrogativas, o mesmo critério permitirá lhe retirar, ou controlar mais de perto, o exercício daquele direito. O interesse do menor é utilizado, de outro lado, como critério de solução, no sentido de que, em caso de divórcio, por exemplo, a atribuição da autoridade parental e do exercício de suas prerrogativas pelos pais depende da apreciação feita pelo juiz do interesse do menor.

Também é importante observar, que nem sempre filhos de pais separados

são infelizes. O tom para uma vida serena dos filhos, será dado na infância. E,

justamente na infância, que se sedimenta, a pessoalidade, à história pessoal de

cada indivíduo, à construção de seus valores morais, éticos, e a maneira de

enfrentar as vicissitudes da vida. Esse momento é importante.

Sob outra óptica, também os filhos de pais casados, que vivem em

situações de eterno conflito, traduzem problemas para a criação dos filhos. A

história é repleta de acontecimentos nefastos, quando o casamento era

indissolúvel, e a única forma de constituir família. Não havia como sair de uma

relação de desamor. É prefirível o Estado Laico, Securalizado, com várias formas

de constituir família, que prioriza a dignidade da pessoa humana, e tem no afeto,

Princípio do Direito de Família.

Segundo Silva (2006, p. 59), não se deve fazer a pergunta: “com quem

você quer ficar?”, aos filhos, pois eles sabem que

30

escolhendo um, o outro ficará magoado e, na verdade, o de que eles gostariam é que sua família permanecesse unida. Desse modo, não se pode submeter uma criança a esse questionamento, sem maiores considerações a respeito das fantasias relativas à lealdade, medos, traições, vinganças, só para citar algumas das que habitam o mundo inconsciente infantil e que pode ser manipulado pelo genitor que possui maior ascendência ou domínio psicológico sobre ela.

Neste contexto, o juiz tem o dever de avaliar, em caso de preferência por

um dos pais, sendo explanada pela criança, se a preferência feita está em

consenso com a melhor solução aplicável ao acontecimento. Dependendo da

situação, a criança pode escolher àquele que é menos exigente, podendo causar

sérios resultados, a longo prazo.

2.5 MODELOS DE GUARDA

O modelo de guarda tradicional no Brasil é o da guarda única, com a

atribuição da guarda a quem tenha mais possibilidade de resguardar o melhor

interesse da criança. A idéia de que a guarda prevalece com a mãe, muito

embora difundida no Brasil, não é e não pode mais ser aceita, dada a concepção

de igualdade entre os genitores e, principalmente, o melhor interesse da criança,

podendo a guarda inclusive ser deferida a terceiro (não genitor).

A modalidade de guarda única: é a modalidade de guarda mais comum e

que impera com maior ênfase no ordenamento jurídico nacional, na qual é dado

à mãe a preferência de deter a guarda e ao pai o direito de visitas quinzenais.

Nos casos de guarda única, a titularidade do poder familiar continua com o

pai e a mãe, porém, a guarda é atribuída isoladamente ou exclusivamente a

somente um dos genitores.

Neste modelo o genitor guardião irá administrar os interesses e bens do

filho, este terá uma residência fixa que será a residência do guardião. O genitor

não-guardião terá o direito de visitar (com horários rígidos e limitados, em regra)

e ter o filho em sua companhia, bem como fiscalizar sua manutenção podendo

invocar o Poder Judiciário para fazer valer suas opiniões, se forem divergentes

das do genitor guardião.

31

Existe também a guarda uniparental, que de acordo com Dias (2007, p.

394), é “quando um filho é reconhecido somente por um dos pais – geralmente a

mãe –, é claro que fica sob a guarda de quem o reconheceu (CC 1.612)” Neste

caso, irá se constituir uma família monoparental. Entretanto, se a genitora for

casada, o filho não poderá morar no lar matrimonial se não houver a

aquiescência do consorte. A guarda unilateral acaba gerando uma hierarquia

entre os pais – guardião e visitante. Na guarda conjunta não há um genitor com

poder maior, já que equilibrados pelo adequado exercício das funções do sistema

familiar.

Com isso, verifica-se que na guarda compartilhada o genitor que não tem

a guarda física não se limitará a supervisionar a educação e criação dos filhos,

pelo contrário, ambos os pais participarão efetivamente da vida da prole, como

detentores de poder e autoridade iguais para tomar decisões diretamente

referentes aos filhos.

A guarda conjunta permite aos pais uma divisão mais eqüitativa do tempo

de convívio com os filhos e das responsabilidades, ou seja, ambos continuam a

agir como pais, o que não aconteceria, em regra, se a guarda fosse única,

cabendo ao outro somente o direito de visitas, fiscalização e pagamento de

alimentos.

Em contrapartida, a guarda conjunta, por ser um instituto relativamente

novo, sem grande efetividade no Brasil, traz consigo inúmeras dificuldades,

principalmente quanto à sua compreensão, benefícios e aplicabilidade, sendo

muitas vezes confundida com a alternada.

A confusão em relação aos conceitos de guarda alternada e compartilhada

vêm prejudicando a aceitação e a aplicação desta. Por conseguinte, deve-se

deixar bem claro o conceito de guarda alternada e as diferenças básicas entre os

dois modelos de guarda, para que dessa forma, a confusão que muitos

operadores do Direito, bem como a sociedade faz em relação aos dois modelos

seja esclarecida e banida.

Na guarda alternada ocorre a atribuição da guarda física e jurídica a cada

32

um dos genitores, alternadamente. Este modelo consiste em que por períodos de

tempo previamente estabelecidos, normalmente de forma igual entre ambos os

pais, o genitor guardião, enquanto permanecer com o filho, terá de forma

exclusiva a totalidade dos poderes e deveres que integram o poder familiar.

Enquanto um dos pais exerce a guarda, ao outro cabe o direito de visita.

Depois do término do período convencionado, trocam-se os papéis, sendo que

esta troca de guardião não depende de medida judicial. Assim, ao final de cada

período o menor deixa a casa do genitor que estava exercendo a guarda e passa

para o genitor que até então estava exercendo somente o direito de visita e

assim sucessivamente.

Muitas pessoas e até mesmo juízes, advogados e promotores de justiça

confundem a guarda compartilhada com a alternada e devido a esta confusão de

conceitos acabam por criticar o modelo de guarda compartilhada, apenas por não

saberem as diferenças básicas entre ambos.

A guarda alternada pressupõe uma divisão estrita igual das horas que a

criança passará com cada genitor, diferentemente da guarda conjunta em que

não há divisão rígida de tempo. Na primeira, há alternância de lares, bem como

a alternância da guarda dos filhos, já a segunda não implica necessariamente a

alternância de domicílios e a guarda não se altera, ao contrário é compartilhada.

33

CAPÍTULO III – GUARDA COMPARTILHADA: aspectos psicológicos,

jurídicos e pedagógicos

3.1 GUARDA DOS FILHOS: aspectos psicológicos

Investir num único casamento deixou de ser uma meta na vida moderna.

Quando os conflitos passam a ocupar espaço no convívio conjugal, surge o

questionamento: deve-se tentar salvar a união ou tentar a vida sem a

companhia do cônjuge? A opção pela separação é freqüente; porém, a decisão é

difícil. Quando há consenso entre os membros de que a separação é o único

caminho, a reorganização da família é mais tranqüila. No entanto, raramente é

mútua esta decisão. Geralmente, um dos cônjuges tem a iniciativa,

demonstrando mais pressa na dissolução da união conjugal. O processo de

separação é vivenciado como uma situação dolorosa e estressante, já que

provoca nos cônjuges sentimentos de fracasso, impotência e perda.

Nos processos de separação judicial é bastante comum que as emoções

humanas sejam exibidas de forma intensa, tornando-o doloroso, tanto para o

casal quanto para os filhos. Os conflitos podem apresentar-se ainda mais

acirrados quando há disputa por interesses, como, por exemplo, em processos

que envolvam a disputa pela guarda de filhos. Muitas vezes as partes estão

vivendo os mesmos sentimentos. Medo, hostilidade, ódio, vingança, depressão e

ansiedade, fazem parte do elenco das emoções experimentadas por pessoas que

enfrentam a separação.

O processo de separação conjugal, principalmente quando o casal tem

filhos, implica numa série de adaptações e dificuldades em relação aos aspectos

sociais, afetivos, relacionais, psicológicos e financeiros. Tanto o casal quanto os

filhos necessitam de ajuda profissional, nestas ocasiões, para saber lidar com as

questões decorrentes de uma ruptura conjugal. Neste sentido, um auxílio

profissional adequado contribui para amenizar os sofrimentos e facilitar a

resolução dos conflitos de forma satisfatória. Silva (2005, p. 14) acrescenta que,

É crescente o número de pais separados e filhos que chegam ao consultório, quer para orientações ou para tratamento, quer por determinação judicial, para se submeterem a uma perícia psicológica.

34

Nos primeiros casos, normalmente os filhos estão apresentando alguns sintomas, que equivocadamente, são atribuídos à separação do casal. Equivocadamente, porque aqueles sintomas não guardam relação com a separação, mas sim, com a falta que faz o progenitor ausente, [...].

Isto tem como conseqüência, o natural distanciamento entre pais e filhos,

já que na grande maioria dos casos, estes ficam sob a guarda e responsabilidade

da mãe. A rotineira fixação de visitas pré-estabelecidas, em dias e condições

pactuadas entre os separandos, se mostra muitas vezes insuficiente para atender

a expectativa dos filhos, notadamente quando na tenra idade.

Certamente, a grande maioria não consegue assimilar e entender a nova

situação criada, pois de um dia para o outro, se vêm distanciados do convívio do

pai, antes sempre ou quase sempre presente, e agora um mero visitante

ocasional.

Parece difícil para os filhos menores, entenderem a nova situação criada,

especialmente quando não existe um diálogo franco, aberto, sem subterfúgios,

entre pais e filhos, afinal, a interrupção da convivência entre os pais, não

significa que ambos, pai e mãe, deixem de amar e de querer bem, seus filhos.

O reflexo da separação, na maioria das vezes, se faz sentir no cotidiano

dos filhos, que passam a se sentir desamparados, abandonados, esquecidos, de

maneira especial pelo pai, quando é este que deixa o lar. Tal insatisfação acaba

resultando em rebeldia, baixo rendimento escolar, dificuldade no relacionamento

com outras crianças, descontrole emocional, dentre outras atitudes negativas,

que acabam por afetar grande parte das crianças e adolescentes. Silva (2005, p.

15) ressalta que em relação a estes problemas, eles podem ser facilmente

observáveis,

No âmbito do consultório, quando da avaliação ou do atendimento a crianças filhas de pais separados, nota-se a presença de sintomas que tiveram origem na separação dos pais. Na sua grande maioria, os sintomas apresentados são: dificuldades cognitivas, ansiedade, agressividade e depressão. No entanto, verifica-se que esses sintomas têm relação com a falta que faz um dos pais e não com o distrato do casamento. Nas fantasias dessas crianças, o progenitor ausente abandonou-as. Também observa-se que o afastamento das crianças de um dos pais, decorre das desavenças conjugais e do conseqüente

35

estabelecimento da guarda que não atende às necessidades dos envolvidos.

É certo que o modelo convencional de guarda e visita estabelecido pelos

pais, quando da separação ou divórcio, não atende muitas vezes, de forma

satisfatória o interesse dos filhos menores, pois estes são surpreendidos com a

separação repentina, e não estão preparados para viver a nova situação que

acabou de se criada. No início da separação, quando a mãe geralmente assume o

encargo da guarda, com todas as suas conseqüências, também desgastada

emocionalmente, e dentro de uma nova realidade econômica, via de regra, difícil

de ser superada.

Num primeiro momento, a mãe passa a ver a guarda como um ônus,

porque em razão da nova situação e necessidades, sente a imediata necessidade

de tentar se inserir no mercado de trabalho, quando não trabalhava, ou ainda,

de ascender à melhor posição, quando já trabalha, com o intuito de aumentar

sua renda, para enfrentar as dificuldades que de pronto, começam a aparecer.

Mas o modelo de família mudou com o passar dos tempos. Antes, a guarda

dos filhos era exclusividade da mãe, por esta estar sempre presente em casa, de

educar, dar afeto, conselhos sermões e, ao pai sua missão era somente dar o

sustento da casa. Mas “os arranjos familiares mudam no decorrer da história e

em cada cultura. [...] A distinção entre os papéis de pai e mãe tornou-se menos

clara na medida em que ambos contribuem para o sustento da família e dividem

os cuidados com os filhos”. (SILVA, 2005, p. 16)

Entretanto, o judiciário entende de outra forma, podendo trazer danos

psicológicos à criança.

Quando se trata da separação destes pais e da estipulação da guarda sobre os filhos menores, parece que, tanto o Judiciário quanto os pais, ainda tomam como referência aquele modelo de família, no qual é apanágio do pai o pagamento da pensão alimentícia (sustento da família) e da mãe, o cuidado dos filhos (guarda exclusiva). Basear-se nesse modelo de família pode trazer conseqüências indesejáveis para a criança, já que não corresponde à família de pais e mães que procuram obter ou compartilhar a guarda dos filhos, onde há divisão econômica (mulheres trabalhando fora e contribuindo para o sustento do lar) e de divisão nos cuidados com os filhos (homens que dividem com elas os cuidados com os filhos). Neste sentido, penso que a guarda exclusiva

36

está associada à organização de família na qual cabia à mãe o cuidado dos filhos e ao pai o sustento (pensão alimentícia). (SILVA, 2005, p. 16-17)

E continua, relatando que

Infelizmente tem-se ainda, um discurso reproduzido socialmente que está internalizado, cristalizado na cultura, de que a mãe está naturalmente melhor preparada para ser a cuidadora do filho, como se já pré-determinado biologicamente. Discurso este, equivocado, que necessita ser quebrado, para que possa haver a igualdade de direitos tão preconizada nos dias de hoje. O amor materno é um mito (Badinter, 1985) no sentido que não vem pré-determinado, mas sim, que é construído nas relações estabelecidas como qualquer outro amor, e a sua intensidade vai depender de cada relação e de cada pessoa. Assim, o amor materno não é superior ao amor paterno, nem melhor nem pior, e nem todas as mulheres e nem todos os homens os sentem, e quando os sentem é de uma forma singular – marcados pelas suas histórias e relações. (SILVA, 2005, p. 17)

As funções de pais e mães já não são tão rigorosas e deliberadas, e é

nesta conjuntura que surgem o que se chama hoje de nova paternidade. São

homens que representam os pais que de forma cada vez mais significativa, vêm

querendo ocupar um outro lugar junto aos filhos, que não apenas o de provedor.

(SILVA, 2005)

As desvantagens da guarda compartilhada se centram na impossibilidade

de arranjos quando há conflito continuado entre os pais; na exploração da

mulher se a guarda compartilhada é usada como um meio para negociar

menores valores de pensão alimentícia; e na inviabilidade da guarda conjunta

para famílias de classes econômicas mais baixas.

Pais em conflito constante, não cooperativos, sem diálogo, insatisfeitos,

que agem em paralelo e sabotam um ao outro contaminam o tipo de educação

que proporcionam a seus filhos e, nesses casos, os arranjos de guarda

compartilhada podem ser muito lesivos aos mesmos. Para essas famílias,

destroçadas, deve-se optar pela guarda única e deferi-la ao genitor menos

contestador e mais disposto a dar ao outro o direito amplo de visitas.

Para que o exercício da guarda compartilhada possa funcionar, importa

que os pais revelem capacidade de cooperação e de educar, em conjunto, o filho

37

menor, esquecendo todos os conflitos interpessoais, já que somente é possível o

exercício desse modelo quando existe, entre os genitores, uma relação marcada

pela harmonia e pelo respeito, sem disputa e nem conflito. Esta contra-indicação

tem relevância nos casos em que a guarda compartilhada é decidida

judicialmente sem que ela aconteça na forma de um acordo espontâneo entre os

separandos.

Mesmo em sendo litigiosa a separação ou o divórcio, poderá não haver

divergências acerca da guarda dos menores, o que já autoriza a conceder a

guarda compartilhada. Ao revés, a proximidade, e o comum interesse em

resguardar o bem estar e saúde emocional de sua prole, poderá unir os pais, ou,

ao menos, não aumentar as diferenças e desavenças porventura ainda

existentes. Ou seja, em casos de desavenças crônicas entre os pais, os

benefícios decorrentes do compartilhamento não superariam os prejuízos aos

infantes, quer de ordem psicológica, quer de ordem moral.

Assim vejo que se os pais estão em litígio, os problemas de obstrução de contato com o progenitor que não detém a guarda podem ficar explícitos para a criança, pois a própria palavra “visita” já é por si só restritiva, e o progenitor que detêm a guarda já será legalmente considerado “mais importante”, já que é ele que tomará as decisões na vida da criança, tendo isso um peso simbólico considerável. Esta situação poderá induzir a criança ao afastamento do outro. Logo, mesmo em litígio, a guarda compartilhada – em termos psicológicos, é a melhor solução para os filhos. Os filhos precisam conhecer individualmente cada um dos progenitores, independente da idéia que um progenitor faça do outro, ou seja, que a criança forme sua própria verdade na relação com seus pais. Os problemas que os litígios causariam, não se modificariam com o tipo de guarda. E, para que a criança conheça intimamente seus pais, não bastam algumas horas de visita, mas sim um contato íntimo, como passar a noite, ser levada aos compromissos, fazer as tarefas de aulas etc. (SILVA,2005, p. 20-21)

3.2 O ABUSO DE DIREITO NO EXERCÍCIO DO PODER FAMILIAR

A autoridade dos pais sobre os filhos decorre da própria natureza humana,

isso porque o homem é uma das raras espécies do reino animal que nasce com a

mínima, ou sem nenhuma condição de sobrevivência, demandando cuidados

especiais durante muitos anos.

O poder familiar teve início no Direito Romano, isto porque, o Varão, o úni-

38

co a exercer este poder tinha autoridade sobre seus filhos e, também, sobre sua

mulher. Este poder não era puramente doméstico, pois o pai poderia deixar viver

ou morrer seu próprio filho, recebendo-o no momento de seu nascimento ou

deixando-o a própria sorte, abandonado fora de casa, esperando que alguém lhe

acolhesse ou não.

O poder do pai sobre seus filhos e mulher somente terminava com sua

morte. Mesmo casados os filhos ainda permaneciam sobre o poder do pai,

demonstrando a amplitude desse poder entre os romanos.

Já entre os povos germânicos, devido ao cristianismo, os filhos e esposas

eram tratados de forma mais branda, ou seja, os pais acreditavam que deviam

cuidar e educar seus filhos, mas que na medida em que adquirissem capacidade

deveriam ser libertados dessa subordinação.

A tradição romana, mantida nos países de direito escrito, consagrava a predominância do pai em detrimento do filho e lhe atribuía um poder perpétuo sobre seus descendentes. O munt germânico concebia o pátrio poder como um direito e um dever dos pais orientados à proteção dos filhos (é o gérmen da doutrina da proteção integral, partilhada pela Lei 8.069/90) como parte de uma proteção mais geral projetada para todo o grupo familiar, em evidente reação à tradição romana: seu exercício era temporário, suas funções eram também atribuídas à mãe e não impedia que os filhos possuíssem bens. (GRISARD, 2002, p. 32)

Após a civilização romana e germânica o instituto do poder familiar sofreu

consideráveis modificações com o passar dos tempos, mas o legislador optou por

um modelo próximo ao germânico fixando mais deveres aos pais.

Em 1902, o projeto elaborado por Clóvis Beviláqua foi aprovado na

Câmara dos Deputados, porém, enviado ao Senado sofreu inúmeras alterações e

aguardou por longos catorze anos, até ser convertido na Lei 3.071, de 1º de

janeiro de 1916.

Posteriormente, transformações e movimentos sociais instituíram a idéia

de igualdade entre os cônjuges, direcionando o exercício do ‘pátrio poder’ a

ambos os pais, mas consagrado definitivamente na Constituição Federal de 1988.

39

Mais recentemente, a Lei 10.406/2002 substituiu o Pátrio Poder pelo Poder

Familiar, reafirmando os princípios constitucionais impostos pela Magna Carta de

1988 e aliado ao Estatuto da Criança e do Adolescente disciplina o exercício do

poder familiar por ambos os cônjuges sempre visando o bem estar e interesse do

menor.

Em suma, o legislador acompanhou as mudanças socioculturais

vislumbrando a proteção de bens de cunho extra patrimonial, valorizando o afeto

e a proteção dos entes familiares punindo os abusos do exercício desse

poder/dever perante os filhos menores.

Aquele que impede o outro genitor de ver os filhos, frustra os filhos do

contato e da convivência com o pai ou a mãe ou deixa de dar carinho e afeto aos

mesmos viola os direitos do menor. Assim disciplina o artigo 227 da Constituição

Federal de 1988 e artigo 19 e seguintes do Estatuto da Criança e do Adolescente.

(SIMÃO, 2005).

O mau exercício desse poder é considerado pela doutrina como um

verdadeiro abuso de direito. Violam princípios constitucionais como o da

dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável.

Cabe aos operadores do direito resguardar tais princípios cobrando a

reparação daqueles que os violar. Há casos em que se configura o abuso quando

qualquer dos pais deixa de dar afeto aos filhos e os Tribunais já têm entendido

neste sentido que a extinção do poder familiar pode ocorrer quando: o pai é

extremamente agressivo; ocorre abandono moral e material dos filhos; há

diligências do Conselho Tutelar e demais órgãos comunitários de assistência

social; medida determinada com vistas nos superiores interesses das crianças;

há ausência dos laços de afeição; há expectativa de colocação em lar substituto

(adoção) e; há apelação improvida.

Existem, ainda, casos em que as visitas ao menor são determinadas pela

justiça e o genitor deixa de dar cumprimento à decisão judicial. Nestes casos os

magistrados têm tomado todas as providências necessárias para o devido

cumprimento da ordem judicial que visa manter adequadamente a guarda e

40

companhia dos filhos com seus pais, inclusive a aplicação de multa e

acompanhamento psicológico. Saliente-se que o artigo 249 do Estatuto da

Criança e do Adolescente já previa a cominação de multa para os casos de não

cumprimento da ordem judicial, conforme segue:

Art.249. Descumprir, dolosa ou culposamente, os deveres inerentes ao pátrio poder ou decorrente de tutela ou guarda, bem assim determinação de autoridade judiciária ou Conselho Tutelar: Pena – multa de três a vinte salários de referência, aplicando-se o dobro em caso de reincidência. (ECA, 1990 apud SIMÃO, 2005, p. 47)

Nenhum dos genitores pode subtrair o filho do convívio familiar ou do

contato com o outro genitor. Aquele que comete tal abuso, além de ser punido,

conforme providência jurisdicional acima mencionada podem ser encaminhados

para tratamento psicológico conforme artigo 129, inciso III do Estatuto da

criança e do adolescente. Isto porque o poder familiar é um dever que os pais

têm com os filhos e a sociedade, e principalmente de exercê-lo com

compromisso.

O Estado não tem o poder de fazer com que os filhos sejam amados por

seus genitores, de impedir os prejuízos causados pelo mau uso do poder familiar,

mas é obrigação, sim, do Estado inovar para tentar, no mínimo, diminuir os

impactos dos abusos morais que o abandono afetivo pode causar à formação do

menor. Ainda, é obrigação do estado promover programas de assistência integral

à saúde da criança e do adolescente e “fazer valer” a punição contra aqueles que

cometem abuso, violência e exploração da criança e do adolescente.

3.3 GUARDA COMPARTILHADA: uma nova dimensão na convivência familiar. O

discurso do judiciário

Diante do número cada vez maior de crianças filhas de pais separados ou

divorciados e da necessidade de reorganizar as relações entre pais e filhos

quando da desunião da família, desponta a guarda compartilhada, como um meio

de diminuir os traumas e os impactos negativos que a separação causa na

família. A igualdade entre homem e mulher, o desequilíbrio do exercício do poder

familiar pelos ex-cônjuges e o princípio do melhor interesse da criança fizeram

com que surgisse uma maneira diferente de pensar a respeito da guarda.

41

Apesar de ter sido sancionada recentemente, atualmente a guarda

compartilhada ainda é um modelo praticamente desconhecido pelas partes,

advogados e até por juízes, há pouca abordagem do tema doutrinária e

jurisprudencialmente, além de escassos estudos específicos. Ao contrário do que

ocorre em alguns países estrangeiros.

A importância da guarda conjunta encontra-se no fato de que o genitor

não-guardião, não se limita a supervisionar a educação e criação dos filhos,

como na guarda única; ao contrário, ambos os pais participam efetivamente da

vida dos filhos. São detentores equivalentes do poder familiar e decidem

conjuntamente nas tomadas de decisões concernentes aos filhos, em qualquer

tipo de assunto a respeito da vida destes.

A guarda compartilhada, ou conjunta, é um dos meios de exercício da autoridade parental, que os pais desejam continuar exercendo em comum quando fragmentada a família. De outro modo, é um chamamento dos pais que vivem separados para exercerem conjuntamente a autoridade parental, como faziam na constância da união conjugal (GRISARD, 2002, p. 115).

Mesmo assim, a guarda conjunta não tem uma definição precisa. Ela pode

cobrir um arranjo onde um dos genitores fica com as crianças durante o período

escolar e outro durante as férias, com direito a livre visitação; até arranjos mais

tradicionais, onde o tempo despendido com a prole é menos dividido, e o genitor

que não detém a custódia tem participação em decisões chave relacionadas à

saúde e educação dos menores.

Isto quer dizer que não importa mais tanto quem é que vai morar com a

criança, o destaque vai para os filhos, e aquilo que é melhor para eles: ter

ambos os pais interessados em seu bem-estar, sua educação, sua saúde, e seu

desenvolvimento como um todo. O relevante não é tanto com quem o menor irá

residir, mas sim que ele fique a maior parte do tempo com ambos os genitores.

As tarefas dos pais relativas ao menor após a separação não são exclusivas, ao

contrário, são compartilhadas.

A guarda compartilhada apresenta um aspecto material ou físico e outro

jurídico. O aspecto material ou físico implica ao genitor ter a prole consigo. Já o

42

aspecto jurídico é comum aos genitores, refere-se ao exercício simultâneo de

todos os poderes-deveres inerentes ao poder familiar.

A guarda jurídica é atribuída a ambos os pais e exercida de forma

igualitária envolvendo as decisões importantes que os dois devem tomar

conjuntamente em relação aos filhos, já a física refere-se à um arranjo para que

ambos os pais possam estar o maior tempo possível com seus filhos,

corresponde aos acordos de visita e acesso.

Assim, na guarda compartilhada, a criança terá uma residência fixa (na

casa da mãe ou do pai), por isso, a guarda física estará, em regra, com apenas

um dos genitores em determinado momento. Já a guarda jurídica neste modelo

terá como titular ambos os genitores, mas será imediatamente exercida pelo

genitor que estiver com o menor no momento (guarda física). Há, portanto, o

compartilhamento jurídico e consequentemente o físico também, à medida que a

visitação será mais ampla neste modelo.

Existem vários dispositivos do direito que evidenciam a possibilidade da

utilização da guarda compartilhada. O primeiro fundamento legal para a

aplicação da guarda compartilhada no direito brasileiro são os artigos 5º, inciso

I, da CF/88 que dispõe sobre a igualdade entre homem e mulher, o artigo 226, §

5º que trata da igualdade parental, bem como o § 7º e o artigo 229.

No Estatuto da Criança e do Adolescente (ECA) também pode-se encontrar

dispositivos que fundamentam a guarda conjunta: 1º, 3º, 4º, 6º, 7º, 16, inciso

V, 19, 21 e 33 a 35. O modelo compartilhado, cujo objetivo é o convívio

constante dos genitores com a prole após a separação, encontra no ECA

fundamentos legais para sua aplicação no Brasil, tendo em vista que prima pela

criação no seio familiar

3.4 GUARDA COMPARTILHADA E A MEDIAÇÃO FAMILIAR

No âmbito do Direito de Família, pode ser definido como uma forma de

resolução de conflitos, na qual os interessados solicitam ou aceitam a

intervenção confidencial de uma terceira pessoa, imparcial e qualificada,

43

permitindo aos conflitantes tomar decisões por si mesmos e encontrar uma

solução duradoura e mutuamente aceitável, que contribuirá para a reorganização

da vida pessoal e familiar.

Neste caso, mediação se constitui, de acordo com Diniz (1998, p. 235),

No acompanhamento dos pais, separados ou divorciados, através da gestão de seus conflitos, para a tomada de uma eficaz, ponderada e rápida decisão que venha a trazer, nos limites de sua responsabilidade, uma solução satisfatória ao interesse da criança, no que atina ao direito de guarda ou de visita, à pensão alimentícia etc.

A mediação familiar constitui-se num instrumento de grande importância

nos processos de separação judicial e divórcio, uma vez que soluciona todas as

questões pessoais e patrimoniais surgidas da ruptura no relacionamento entre os

cônjuges ou companheiros, bem como os eventuais conflitos acerca da guarda e

do direito de visita aos filhos.

Quando um casamento é firmado em cartório de registro civil, fica ali

arquivado até a sua dissolução. Entretanto, como em todos os ‘relacionamentos’

também no casamento existe um contrato subjacente, não previsto nos

contratos formais mais que permeiam as relações: são as ‘expectativas

implícitas’, ou seja, cada parceiro espera do outro algo mais do que o formal:

quer ser amado, respeitado, reconhecido, entendido, cuidado, quer estabilidade,

segurança, prazer, fidelidade, etc. Não sendo atendida uma ou mais destas

expectativas (ou o que se poderia dizer ‘necessidades básicas de um casamento’)

significa para o outro uma quebra de contrato e por via de conseqüência uma

quebra de confiança.

No início do relacionamento estes aspectos são aceitos e até considerados

positivos, entretanto, com o passar do tempo às pessoas antes ‘amorosas’

passam a ser indiferente ou a agirem agressivamente, o que torna a relação

cada vez mais desconfortável levando-os, muitas vezes, à separação de fato.

Quando o ‘conflito’ é manifestado e o litígio é instalado geralmente acontece o

desequilíbrio emocional e a conseqüente busca do reequilíbrio.

Mas num processo de separação ou divórcio de um casal com filhos estes

44

também passam por todo este processo emocional. Afinal, é um momento de

perda e de dor para toda família. Há toda uma mudança de vida, a qual terão

que se adaptar. É muito importante que os pais tenham um bom relacionamento,

pois continuarão mantendo seus papéis. Bem como também terão seus direitos e

deveres para com os filhos, e, se assim for, todos se sentirão mais seguros com

relação ao futuro.

Quando a dissolução da entidade familiar acontece de fato, questões

relativas a exercício do direito de visita, pensão e partilha, quando não

solucionadas de maneira amigável pelas partes, são submetidas ao Poder

Judiciário, e demandam soluções rápidas e eqüânimes, sob pena de acarretar

maiores prejuízos aos litigantes.

Para Nazareth (2005), a guarda compartilhada não pode ser interpretada

como uma visitação livre, pois para ela compartilhar é muito mais do que isso, é

“colocar os pais e colocarem-se como pais em uma postura totalmente diferente.

É assumir responsabilidades. É comprometer-se em proporcionar melhores

condições possíveis ao adequado desenvolvimento bio-psicossocial dos filhos”.

(NAZARETH, 2005, p. 94).

A autora defende a mediação familiar, dizendo que,

[...] nem sempre a visitação livre é o melhor para a criança. Daí a necessidade da Mediação feita ou assessorada por mediador profissional da Psicologia que conheça o desenvolvimento infantil e o funcionamento familiar, e que, junto com os pais, confeccionará o melhor arranjo levando em consideração os mais diversos elementos (NAZARETH, 2005, p. 94).

3.5 AMOSTRAGEM DO POSICIONAMENTO JUDICIAL

Silva (2006) fez uma amostragem do posicionamento dos magistrados

acerca da guarda compartilhada. Ainda assim, ele avisa que apesar dos

resultados obtidos na análise das respostas, esta amostragem não pode alcançar

o nível de pesquisa científica. Neste caso, foram feitos três questionamentos

sobre a guarda compartilhada.

45

As respostas foram as mais variáveis possíveis, mas que deram uma visão

geral do pensamento dos juízes sobre a guarda compartilhada e a mediação

familiar. O primeiro questionamento se refere se a guarda compartilhada tem

sido aplicada nos processos conduzidos por eles.

Silva (2006) mostrou que a grande maioria respondeu que nunca ou

raramente houve a aplicação da guarda, pois o casal estabelecem um comum

acordo sobre com quem vai ficara a guarda dos filhos e o respectivo direito às

visitas. Mas no caso, em que há litígio, a guarda é fixada em favor daquele que

detém melhores condições para exercê-la, se baseando no estudo social e

psicológico das partes. Alguns disseram a aplicaram a partir do consenso dos

guardiões.

O segundo questionamento fala se as partes envolvidas no litígio chegam

a sugerir a guarda o sequer possuem conhecimento sobre ela. Quase a maioria

falou que nunca houve sugestão pelas partes, pois havia desconhecimento por

parte do casal e por parte dos advogados. (SILVA, 2006)

A guarda compartilhada ainda é um modelo praticamente desconhecido

pelas partes, advogados e até por juízes, há pouca abordagem do tema

doutrinária e jurisprudencialmente, além de escassos estudos específicos. Ao

contrário do que ocorre em alguns países estrangeiros.

A pouca divulgação e o pouco estudo no mundo jurídico a respeito da

guarda compartilhada, faz com que em alguns casos em que seria adequada ao

atendimento dos interesses dos menores, seja descartada por magistrados sem

justificativas fundadas ou então nem seja levantada a possibilidade deste novo

modelo pelas partes.

É necessário uma maior divulgação deste modelo de guarda, tem que

haver campanhas para divulgação de como funciona a guarda conjunta e as

vantagens de sua aplicação. Certamente, haveria grande contribuição de

projetos de alunos de faculdade de Direito para levar informação aos mais

variados setores da população, principalmente os mais carentes.

46

Muitas pessoas confundem guarda compartilhada e guarda alternada,

optando pela guarda única. (SILVA, 2006) A terceira questão se refere se às

vantagens e desvantagens da aplicação da guarda ao ver deles.

Quase todos, alegaram praticamente existir só vantagens na guarda, mas

alertaram para que ela pudesse ser eficiente, deveria depender de algumas

situações como: “os pais devem demonstrar condições psicológicas e sem

litigiosidade, para a manutenção do diálogo entre si; as residências dos genitores

devem estar próximas para não haver dificuldade no transporte dos filhos às

escolas”. (SILVA, 2006, p. 183)

Apesar de parecer a melhor forma de criação dos filhos após a separação

do casal, a guarda compartilhada encontra óbices em sua aplicação prática. O

primeiro e mais significativo limite está na própria disposição dos pais em

concordar com esse tipo de guarda.

Quando se está diante de pais cooperativos não se vê nenhum problema

em estabelecer a guarda compartilhada. Por outro lado, se os pais permanecem

em conflito, incapazes de dialogar, utilizando os filhos inclusive para atacar o ex-

cônjuge, dificilmente chega-se a um entendimento amigável quanto à guarda dos

filhos.

Outro problema, este de ordem material, é a questão da moradia. Para

que a guarda compartilhada seja operacionalizada, se faz necessário que os

genitores residam próximos um do outro, por exemplo, na mesma rua, no

mesmo edifício, ou mesmo dentro de um condomínio. Trata-se da única hipótese

em que se pode vislumbrar a denominada guarda compartilhada, ou seja, aquela

em virtude da qual as crianças possam estar simultaneamente na companhia de

ambos os genitores.

Mas houve bastantes respostas com vantagens como a manutenção da

convivência dos filhos com seus dois genitores. Sendo que esse contato seria

benéfico, pois semelhante ao que possuiriam se os pais continuassem vivendo

juntos. A isto, Dias (2007, p. 400) afirma que

47

a convivência física e imediata dos filhos com os genitores, mesmo quando cessada a convivência de ambos, garante, de forma efetiva, a co-responsabilidade parental, assegurando a permanência de vínculos mais estritos com os genitores, e a ampla participação destes na formação e educação do filho, que a simples visitação não dá espaço

3.6 EDUCAÇÃO DOS FILHOS: aspectos psicopedagógicos

Muitos pais pensam que a porcentagem maior da educação está com as

escolas. Ledo engano. A escola representa um complemento, um

direcionamento, um viés, na complementação da educação familiar. Por mais

que os educadores desempenhem papel primordial na orientação da criança, não

exime os pais da responsabilidade maior na educação de seus pimpolhos. Uma

idade ideal para os pais brindarem seus filhos com excelente educação vai dos

zeros aos sete anos de idade. Dos sete aos 14 a situação complica um pouco.

Depois dos 15 a educação fica meio tenebrosa, hostiliza os responsáveis

pela formação, criação moral, e emocional da garotada. A coletividade surge

quando a criança se ausenta do lar, forma turma, classes, e o somatório disto

tudo é a escola. A educação visa à formação da auto-estima, da personalidade e

do caráter, aliados a personalidade, que está nas diretrizes, nos azimutes

traçados pelos pais. O desvio de conduta deve ser estudado com carinho.

Nessas nuanças a experiência educacional deve ser de suma importância,

útil, principalmente quando a família começa a perder as rédeas na condução da

educação dos filhos. É muito natural ouvir queixa dos filhos sobre determinado

educador (a), deixando nos pais ou responsáveis, uma sensação falsa de

‘injustiça’ contra seu filho. Antes de tudo, a diretoria da escola deve ser

procurada de imediato. Outros acontecimentos do mesmo “Modus operandi”

devem se do conhecimento do pai ou da mãe.

A auto-estima é a principal e mais importante base para se encontrar um

bom lugar no globo terrestre. E, conseqüente à felicidade recíproca. A criança

precisa sentir-se amada e não idolatrada. O amor tem que partir de dentro para

fora e tornar a criança segura e obediente, à medida que ela cresce, a auto-

estima melhora. A harmonia do lar é primordial para ser ter um filho bem

educado. Deve-se procurar calma, pois o desespero é comparável a certo tipo de

48

alucinação, estabelecendo as maiores dificuldades para aqueles que o hospedam

na própria alma. Se a criança desvirtuou o caminho traçado não deve se

desesperar, deve-se manter a calma, mesmo que seja aparente.

Mas apesar de tudo isso, a separação conjugal pode fazer com que tanto a

criança quanto o adolescente tenham comportamentos antagônicos aos que

possuíam antes. E a educação é profundamente afetada, em todos os sentidos.

A idéia de famílias multinucleares nas quais os filhos de pais separados

desfrutem de dois lares em perfeita harmonia é o ideal de convivência adulta e

de estímulo à manutenção dos vínculos afetivos indispensáveis ao sadio

desenvolvimento dos menores; pois os efeitos patrimoniais dos alimentos e da

sucessão assegurados pela lei valem muito pouco quando o afeto é

desestimulado pela instabilidade emocional dos pais.

No plano real, embora a guarda compartilhada já esteja consolidada no no

sistema jurídico, é freqüente que o afastamento dos pais estabeleça verdadeira

disputa, ou injustificável desinteresse no acompanhamento da educação dos

menores, em condutas que acabam aportando aos tribunais, quase sempre para

alimentar o desajuste dos responsáveis e raramente com o propósito de

contribuir à formação dos filhos.

As instituições de ensino acabam por se envolver naquele complexo

ambiente formado pelos pais, pois além da relação contratual com aquele que

ajusta a matrícula do menor, têm com freqüência o encargo pela entrega do

menor na saída da escola e a inevitável recepção dos pais nos encontros

pedagógicos e em outras atividades da agenda escolar. Não raras vezes elas são

alvo de ofícios e de mandados judiciais, como terceiros ou réus, porque a

Constituição Federal, o Estatuto da Criança e do Adolescente, e a Lei de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional, sobrepõem-se àquela contratação

estabelecendo verdadeira co-responsabilidade na educação do menor.

O Estatuto da Criança e do Adolescente dispõe que é encargo da família,

da comunidade, da sociedade e do poder público em geral assegurar, com

absoluta prioridade, entre outros, a efetivação dos direitos referentes à vida,

49

saúde, alimentação, educação, ao esporte e lazer, e à convivência familiar e

comunitária; e que o poder de família em relação ao filho será exercido pelo pai

e pela mãe em igualdade de condições, assegurado a qualquer deles o direito de,

em caso de discordância, invocar a autoridade judiciária para solucionar a

divergência.

Aquele mesmo diploma estabelece que os responsáveis pelo menor têm o

direito de conhecer o processo pedagógico e participar da definição das

propostas educacionais, e a obrigação de matricular os infantes e acompanhar

sua freqüência e aproveitamento escolar; e esta previsão coloca as instituições

de ensino, muitas vezes, no meio dos freqüentes desajustes entre os

responsáveis pelo menor, em complexa relação de autoridade; e a Lei de

Diretrizes e Bases da Educação Nacional que os estabelecimentos educacionais,

respeitadas as normas comuns e as do seu sistema de ensino, terão a

incumbência de articular-se com as famílias e de informar responsáveis sobre a

freqüência e o rendimento dos alunos, bem como sobre a execução de sua

proposta pedagógica.

Portanto, enquanto não houver destituição da respectiva quota do poder

familiar assegurada a cada um dos pais, esteja o menor sob a guarda

compartilhada ou não, é direito e dever de cada um deles, e dever da instituição

de ensino – que no ato de matrícula pode colher os dados das famílias –

cientificar aos responsáveis sobre o rendimento escolar do menor. E, quando

insatisfatório o seu rendimento, impor ciência aos responsáveis omissos, ainda

que pela via dos Conselhos Tutelares.

A guarda compartilhada, às vezes faz com que o ex-parceiro se intrometa

na vida da guardiã, inclusive na vida íntima, fazendo com haja conflitos violentos

no que diz respeito ao menor. A guarda, equivocadamente, é entendida como se

o casal tivesse voltado a conviver, dando respaldo da outra parte de exigir

satisfações da vida pessoal, deixando com que esta instituição seja inviável a sua

continuação. Por vezes, isto acontece do lado oposto. Quando o genitor tem a

guarda, a ex-esposa se sente no direito de interferir na vida pessoal da outra

parte. A distância onde as pessoas moram atrapalha também na adoção da

guarda. Se uma morar em uma cidade mais distante fica difícil adotar a

50

instituição, pois a criança terá que se matricular em dois colégios diferentes,

podendo prejudicar e muito, o rendimento escolar, deixando-a mais agressiva,

mais destrutiva, ansiosa, nervosa e, até mesmo histérica. Por fim, a criança pode

começar a apresentar um quadro de depressão.

Por derradeiro, o encargo que aquelas leis atribuem aos responsáveis e às

instituições, mesmo às que exercem a atividade de ensino por delegação pública,

tem por pressuposto que a educação dos menores atende aos direitos humanos

proclamado nas convenções internacionais; e ao preceito da Constituição do

Brasil de que a educação é direito de todos e dever do Estado e da família,

devendo ser implementada com a colaboração da sociedade visando ao pleno

desenvolvimento da pessoa e ao seu preparo para o exercício da cidadania.

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CONSIDERAÇÕES FINAIS

Hoje em dia, a separação e o divórcio são acontecimentos freqüentes da

vida ocidental. O lugar da família na sociedade sofreu transformações ligadas à

industrialização, à evolução dos costumes e ao desenvolvimento do trabalho

feminino. Essa evolução gerou profundas mudanças no papel do homem e da

mulher e, conseqüentemente, no relacionamento do casal.

Esse novo contexto social suscitou mudanças concernentes à fecundidade,

à queda de popularidade do casamento, ao aumento da instabilidade conjugal, à

monoparentalidade e à recomposição familiar. Dessa forma, percebe-se que,

legais ou não, as uniões tornaram-se mais instáveis. Divórcios e separações são

cada vez mais numerosos e as uniões duram cada vez menos.

A guarda compartilhada pode parecer um avanço nas relações de família,

sendo a mais importante fonte protetiva dos interesses da criança, cujos pais se

encontram separados conjugalmente, permitindo que os filhos vivam e convivam

em estreita relação com pai e mãe. Havendo co-participação em igualdade de

direitos e deveres. Sendo uma relação de aproximação materna e paterna,

visando o bem-estar dos filhos.

São benefícios grandiosos que a nova proposta traz às relações familiares,

não sobre carregando nenhum dos genitores, passando assim, a dividir

responsabilidades sobre os filhos. Todas as deliberações sobre a rotina das

crianças, como escola, viagens, atividades físicas, passam a ser tomadas em

conjunto. Este novo sistema contraria o regime unilateral, onde apenas aquele

que detém a guarda, tem o poder de tomar essas decisões.

Entretanto, a guarda compartilhada só é possível quando os progenitores

residem na mesma cidade, quando possuem uma relação de respeito e

cordialidade e estão emocionalmente maduros e resolvidos na questão da

separação conjugal.

Haveremos de convir que, se não houver consenso, um fino trato, um

respeito às relações humanas entre casal de separados, não importando a

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modalidade de opção de guarda familiar, seria uma utopia falar-se de aplicação

do presente instituto, dado ao cerne que se dispõe: o melhor bem-estar do

menor.

Sendo assim, se os separandos não conseguem administrar a situação de

conflito conjugal, sem atingir a relação filiar, quando não há diálogo, quando não

conseguem abolir os filhos do conflito, o sistema da guarda compartilhada

tenderá ao fracasso e não terá possibilidade de ser aplicada com sucesso.

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