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Para uma nova cultura profissional: uma abordagem da complexidade na formação inicial de professores do 1º CEB Álvaro Leitão Escola Superior de Educação de Coimbra, Portugal Isabel Alarcão Universidade de Aveiro, Portugal Resumo Neste artigo, tendo como referências o emergente paradigma construtivista da complexidade (Morin, 1994, (s/d); Lerbet 1986, 2004; Le Moigne, 2002, 2003), o paradigma da complexificação e da epistemologia da escuta/controvérsia (Correia, 2001) e o experiencialismo crítico (Alarcão, 2001a), propomo-nos (re)discutir o referencial de competências profissionais a desenvolver na formação inicial de professores do 1º Ciclo do Ensino Básico capaz de fazer face aos novos e continuados desafios que a sociedade, caracterizada por um quadro crescente de complexas transformações, actualmente coloca (Delors, 1996; Ornuda & Naval 2000; Martins, 2005). Partindo de uma reconceptualização do conceito de competência profissional (Le Boterf, 1999; DeSeCo, 2002), defendemos um paradigma reflexivo de formação (Ferry, 1983; Schön, 1987; Zeichner, 1993, Perrenoud, 2002) ancorado no desenvolvimento de novas competências profissionais, que leve a ultrapassar a dicotomia positivista teoria-prática através da reconstrução da articulação entre conhecimento científico e acção profissional contextualizada (Alarcão, 2002, 2003; Sá-Chaves, 2002; Perrenoud, 2002), e a assunção da formação como um processo interactivo auto-regulador de sistemas adaptáveis e complexos em confronto: o sistema social, que solicita formação e o sistema pessoal, sujeito dessa formação (Lerbet, 2004). Palavras-chave Profissionalidade docente; Competência; Complexidade; Reflexão; Autonomia Revista Portuguesa de Educação, 2006, 19(2), pp. 51-84 © 2006, CIEd - Universidade do Minho

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  • Para uma nova cultura profissional: uma abordagem da complexidade na formao inicial de professores do 1 CEB

    lvaro LeitoEscola Superior de Educao de Coimbra, Portugal

    Isabel AlarcoUniversidade de Aveiro, Portugal

    ResumoNeste artigo, tendo como referncias o emergente paradigma construtivista dacomplexidade (Morin, 1994, (s/d); Lerbet 1986, 2004; Le Moigne, 2002, 2003),o paradigma da complexificao e da epistemologia da escuta/controvrsia(Correia, 2001) e o experiencialismo crtico (Alarco, 2001a), propomo-nos(re)discutir o referencial de competncias profissionais a desenvolver naformao inicial de professores do 1 Ciclo do Ensino Bsico capaz de fazerface aos novos e continuados desafios que a sociedade, caracterizada por umquadro crescente de complexas transformaes, actualmente coloca (Delors,1996; Ornuda & Naval 2000; Martins, 2005). Partindo de umareconceptualizao do conceito de competncia profissional (Le Boterf, 1999;DeSeCo, 2002), defendemos um paradigma reflexivo de formao (Ferry,1983; Schn, 1987; Zeichner, 1993, Perrenoud, 2002) ancorado nodesenvolvimento de novas competncias profissionais, que leve a ultrapassara dicotomia positivista teoria-prtica atravs da reconstruo da articulaoentre conhecimento cientfico e aco profissional contextualizada (Alarco,2002, 2003; S-Chaves, 2002; Perrenoud, 2002), e a assuno da formaocomo um processo interactivo auto-regulador de sistemas adaptveis ecomplexos em confronto: o sistema social, que solicita formao e o sistemapessoal, sujeito dessa formao (Lerbet, 2004).

    Palavras-chaveProfissionalidade docente; Competncia; Complexidade; Reflexo; Autonomia

    Revista Portuguesa de Educao, 2006, 19(2), pp. 51-84 2006, CIEd - Universidade do Minho

  • IntroduoO novo contexto da formao de professoresA actual sociedade da globalizao e da interdependncia, mas

    tambm do conhecimento e da inovao, no cessa de evoluir ao ritmo deimportantes transformaes que se manifestam ao nvel dos diversossectores e campos de aco em que se organiza, designadamente noscampos poltico, cultural e social, com repercusses no domnio da cincia eda produo de conhecimento cientfico. Face a estas mudanas da vidamoderna, necessrio que as instituies que compem a sociedadecompreendam esta nova realidade e aceitem os novos desafios que elacoloca. A instituio educativa em geral e, particularmente, a formao deeducadores e de professores, no deve ficar margem destas metamorfoses.

    No plano poltico, as sociedades contemporneas assistem transformao dos papis tradicionais do estado. Na rea da educao, aconstituio de novos poderes supranacionais com poderes de deciso emreas to sensveis como a harmonizao dos currculos1 por um lado e, poroutro, a tendncia descentralizadora consubstanciada na assuno de novospoderes e responsabilidades por parte das escolas e dos poderes locais,configura uma evoluo da viso clssica dos papis do estado relativizandoa sua importncia e funes. A ttulo de exemplo, recordemos o Decreto-Lein. 115-A/98, de 4 de Maio, e legislao complementar, que atribui escola eaos educadores/professores uma maior autonomia2 que se apoia no conceitode escola-comunidade educativa e no reconhecimento da autonomiaprofissional dos educadores/professores. Estes so mesmo chamados acolaborar activamente com outros membros da comunidade educativa3 naconstruo de vrios projectos de organizao e gesto pedaggica4, o querequer o alargamento e a redefinio das competncias profissionais denatureza mais tcnica tradicionalmente confinadas ao espao da sala de aula.Assim, a assuno dos novos papis e funes profissionais, bem como a suaarticulao com os conselhos municipais de educao, tem vindo adeterminar a reorganizao das relaes institucionais das escolas com atutela e a encontrar novas formas de interaco e de articulao, maisabertas, com a comunidade que serve.

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  • No plano cultural, a sociedade contempornea tem vindo a tomarconscincia da emergncia da heterogeneidade como um dos seus traoscaractersticos e da importncia que j assume no nosso quotidiano.Sobretudo a partir da integrao de Portugal no espao europeu, acomposio cultural da sociedade portuguesa tem vindo a mudar e, hoje,compreende j uma pluralidade de pessoas de nacionalidades e de culturasbem diversas e que constitui um mosaico de valores (polticos, religiosos) ede comportamentos que a escola deve acolher e integrar nos seus objectivose prticas de formao, no respeito da diversidade cultural de cada um dosalunos5. Esta diversidade de culturas exige dos educadores/professores edos restantes profissionais que trabalham na comunidade educativa umgrande esforo de compreenso e de aceitao das diferenas no como umobstculo mas como uma mais-valia na construo do sucesso educativo decada aluno e de uma sociedade mais livre, justa e humana. Como refere PiresAurlio, Professor da Universidade Nova de Lisboa,

    as sociedades () alteraram-se qualitativamente, perdendo a homogeneidadecultural que as caracterizava (). Nos dias que correm, essa homogeneidade() atravessada e desafiada pela pluralidade de origens de largos estratos dapopulao, pluralidade esta que o Estado, por uma parte, tem de acautelar attulo de preservao da legtima diversidade cultural, mas, por outra parte, temno mnimo de enquadrar, ou seja, de subordinar a um quadro de refernciascomuns ou valores partilhados, sem os quais se geram os conhecidos efeitosde ruptura e de excluso social (Aurlio, 2004, p. 45).

    No plano social, acentuam-se mudanas importantes nos valores,mentalidades e atitudes mais tradicionais. Se atentarmos, por exemplo, nastransformaes da estrutura familiar6, na violncia, alcoolismo ou nasdrogodependncias, constatamos que estas novas realidades sociais tmrepercusses na vida dos alunos, no seu sucesso escolar e nas relaes queos educadores/professores com eles estabelecem. O conceito de autoridadeque atravessa as relaes entre os alunos e os educadores/professores, e quetorna muitas vezes difcil a gesto pedaggica, tambm tem vindo a mudar. Auma lgica desimplicada do professor, pautada quer pelo tradicionalautoritarismo, quer pela permissividade, ganha cada vez mais terreno a ideia deuma autoridade democrtica assente numa relao que se constri e sedesenvolve ao longo do processo interactivo de ensino aprendizagem, o quepe em jogo, de uma forma complexa, a componente tica do trabalho docente.

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  • Face a este quadro crescente de complexas transformaes que seobserva na sociedade actual, a que se associa a necessidade de uminvestimento na qualificao geral da populao por razes de eficinciaeconmica e de igualdade social7, que novos desafios se podero lanar formao de professores? Ou seja, como conceber a formao deprofessores em geral e, em particular, de 1. Ciclo do Ensino Bsico (1.CEB)? Que competncias estruturantes devem desenvolver no processo deformao inicial e contnua (a nvel pessoal, profissional, social, humano einstitucional)8? Que relao entre estas competncias profissionais e osnovos saberes bsicos dos alunos? Estaro os professores a ser formadostendo em vista a massificao escolar e o desenvolvimento integral de todosos alunos? Como se adquirem e desenvolvem essas competncias?

    Um princpio de resposta a estas questes exige que se clarifique, emprimeiro lugar, o conceito de competncias pessoais e profissionais nocontexto das abordagens actuais sobre a formao de professores no quadrodas novas funes e atribuies susceptveis de definirem um "perfilprofissional" de professor (de 1. CEB) tendo em vista desenvolver umasociedade de maior humanidade9.

    1. Em torno do conceito de competncias (pessoais eprofissionais)

    Vrias so as definies e os sentidos do conceito de competncia.Sendo numerosas, as definies contm variadas dimenses, as quais, porvezes, subentendem perspectivas tericas diferentes. neste sentido, e nocontexto actual de um mundo em que a complexidade e a interdependnciacrescentes so caractersticas dominantes, que importa seleccionar asdefinies que melhor explicitam o sentido em que o conceito de competncia, neste trabalho, mobilizado. Uma dessas definies, que implica umaruptura com a abordagem behaviorista10, veiculada pelo projecto DeSeCo(2002)11 que entende por competncia a capacidade de responder sexigncias individuais ou sociais, ou de efectuar uma tarefa com sucesso,comportando dimenses cognitivas e no cognitivas. Este conceito decompetncia, ancorado numa perspectiva externa e funcional, deve ser,segundo o mesmo projecto, "complte par une conceptualisation descomptences selon laquelle celles-ci sont des structures mentales internes, en

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  • ce sens que ce sont des aptitudes, des capacits, ou des dispositionsinhrentes lindividu" (DeSeCo, 2002, p. 9). Ainda segundo o mesmodocumento, a aquisio e o desenvolvimento de cada uma das competnciasassentaria

    sur une combinaison daptitudes pratiques et cognitives, de connaissances (ycompris de savoir tacite), de motivation, dorientation de valeurs, dattitudes,dmotions et dautres lments sociaux et comportementaux qui, ensemble,peuvent tre mobiliss pour agir de faon efficace (id., ibid.).

    Esta definio, marcadamente transdisciplinar12, aproxima-se, noessencial, do pensamento complexo de Lerbet (1986, 1998, 2004), e deoutros tericos do emergente paradigma da complexidade, sobre aconstruo da compreenso de objectos complexos como o caso doconceito de competncia. Para Lerbet (1986), a construo do saber, emsentido lato, ocorre na interface entre o conhecimento (tat cognitif du mondedeux) e a informao (contenu objectif du monde trois)13. Apesar dereconhecer a estrutura14 piagetiana como um sistema de transformaes,faltava associar-lhe um novo objecto, um novo dispositivo explicativo para quefossem verdadeiros sistemas: "louverture, louverture de la structure unextrieur avec lequel elle constituerait un systme" (Lerbet, 1986, p. 155), oque implicaria a articulao das abordagens funcionalistas, ontolgicas15 ehistricas.

    esta abertura sistmica que concede um carcter funcional suarelao com o meio e que constitui mesmo a condio da sua prpriasobrevivncia (a sobrevivncia do organismo no reside no nosso corpo emsi mesmo mas nas relaes (aberturas) que o mesmo estabelece com omeio). Da que a unidade de sobrevivncia no seja constituda por um selemento "mais au moins par trois lments, un organisme, un environnementet un rapport plaant ensemble les deux" (id., ibid., p. 156), consubstanciadonum novo espao/sistema interfacial que recebe e trata a informao e oconhecimento (Figura 1).

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  • Figura 1 - O saber-interface como a incluso do terceiro includo

    Em oposio perspectiva dicotmica behaviorista estmulo-resposta(S-R) e lgica formal clssica baseada no princpio da no contradio, daidentidade e do terceiro excludo (Nicolescu, s/d), Lerbet prope-seultrapassar o modelo neo-positivista popperiano dos trs mundos procurandocompreender "ce qui se passe entre le monde deux et le monde trois".Partindo de uma abordagem sistmica, e do enfoque na abertura sistmica,faz emergir um novo espao, um "entre deux", um "interface" que, no sendoum espao materialmente visvel, aparece com uma grande importncia paraa compreenso das transformaes que se operam quando dois sistemasinteractuam.

    Trata-se, portanto, de uma ferramenta epistemolgica importante paraaceder ao estudo de objectos complexos. Mas como funciona esta ferramenta?Estamos perante uma questo pertinente, pois prende-se precisamente com omodo como este "entre deux" ou "terceiro includo" funciona, ou seja, como seconstri o saber-interface. Aceder a este conhecimento permitir-nos-iacompreender, e explicar melhor, objectos complexos.

    Na construo de conhecimento, que um processo complexo, osconstrutos cognitivos auto-referencial e hetero-referencial, articulados aos deinteraco e interface, surgem como dispositivos conceptuais com grandepoder explicativo sobre o modo de funcionamento cognitivo subjacente a esseprocesso construtivo. De facto, o processo cognitivo de construo deconhecimento pressupe a interdependncia entre o processo auto-referencial e hetero-referencial ambos dotados de caractersticas e defuncionalidades diversas. Enquanto o processo auto-referencial se inscreveno prprio sujeito, o processo hetero-referencial coloca-o na interdependnciacom o meio.

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    Mundo do is Interface Mundo trs

    Sistema deconhecimento

    (conhecimentosubjectivo do

    mundo psquico)

    Sistema que recebe etrata a informao e o

    conhecimento

    (saber-interface)

    Sistema que introduzinformao

    (informao objectivado mundo cultural

  • A construo de conhecimento resultaria assim de um jogo deinteraces complexas em que "le sujet impose son influence celui-ci parassimilation et il en subit linfluence par accommodation, le tout construire untat dquilibre progressif dadaptation" (Lerbet, 2004). Com efeito, a funoauto-referencial consubstanciaria caractersticas auto-organizativas, e porisso construtivas, mas tambm auto-dependentes, ou seja, o processo auto-referencial s funcionaria em interaco com o processo hetero-referencial,que lhe complementar e cuja principal funo ligar o sujeito ao meio. Odesenvolvimento cognitivo configurar-se-ia assim na interaco dinmicaentre estes dois processos autoregulados constitutivos da cognio.

    nesta modelizao do funcionamento cognitivo que ganha particularrelevo o conceito de interface ou terceiro includo o qual, ao permitircompreender as interaces entre os processos auto e hetero referenciais, seconfigura como um espao relativamente autnomo constitutivo dos prpriosprocessos de construo de conhecimento. Trata-se de um conhecimentoconcebido como "naction" (Varela, 1989), ou seja, de um conhecimento queno pr-definido, mas que se vai construindo (e desenvolvendo) nainteraco entre as duas formas de referenciao constitutivas da razo.

    Este referencial terico permite-nos compreender melhor o sentido doconceito de competncia proposto pelo projecto DeSeCo. Sendo umacompetncia definida em termos de solicitao exterior ao indivduo (processohetero-referencial), a sua aquisio e desenvolvimento s se concretiza nainteraco com processos auto-referenciais, ou seja, falar de competnciaspressupe ter em considerao a sua estrutura interna (conhecimentos,capacidades cognitivas, atitudes, emoes, valores e tica, motivao) e umcontexto educativo material, institucional e social (formal ou informal) com oqual o sujeito interage.

    Infere-se desta conceptualizao holstica que as competncias "semanifestent (ou sont observables) dans les actions quune personneentreprend dans une situation ou un contexte particulier (c.--d. le milieuenvironnant ainsi que lenvironnement socio-conomique et politique)"(DeSeCo, 2002, p. 9), e que integra, num todo coerente, "comme lmentsessentiels de la performance comptente, les demandes externes, lescaractristiques individuelles (y compris lthique et les valeurs) et le contexteet tablit des liens entre eux" (id., ibid.).

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  • Porque se opera atravs da aco e na interaco com contextoseducativos diversos, a aquisio e o desenvolvimento de competncias noest confinada exclusivamente ao espao escolar controlado. Outrosambientes educativos, (a famlia, o contexto de trabalho, os mdia, asorganizaes culturais, religiosas ou outras) contribuem tambm ou soresponsveis pelo desenvolvimento de competncias. Neste sentido, aaquisio e o desenvolvimento de competncias acontece ao longo de toda avida das pessoas e depende do seu empenho pessoal e da existncia de umcontexto favorvel.

    No conjunto das competncias que os indivduos adquirem edesenvolvem ao longo das suas vidas, h umas que, em mltiplos domnios davida, e face viso comum do mundo que a sociedade adopta, so maisimportantes do que outras. So as competncias-chave16 que, ao contriburempara o sucesso individual e colectivo, todos os cidados devem adquirir edesenvolver. E isto porque, para fazer face a um mundo caracterizado pelacomplexidade e pela interdependncia, fundamental que as pessoas, emqualquer domnio da vida, desenvolvam um pensamento complexo, o qual exige"le developpement dun niveau de capacit mentale suprieur, un niveau appel"autocration" qui suppose une pense critique et une approche rflchie etholistique de la part de lindividu" (DeSeCo, 2002, p. 11).

    Desenvolver um nvel mental superior significa que as pessoas prennent du recul par rapport aux nombreuses attentes et exigences de leurenvironnement, pensent par eux-mmes, agissent sur la toile de fond dunmilieu complexe, interdpendant et conflictuel, prennent les commandes de cequils font en fonction de leurs propres sentiments, penses et valeurs, agissentplutt que de subir et sont les auteurs de leur propre vie, plutt que desinterprtes de scnarios crits par dautres (id., ibid., pp.11-12).

    Segundo o projecto DeSeCo (2002), tal desenvolvimento assentariaem trs categorias de competncias: agir de maneira autnoma, servir-se deferramentas17 de maneira interactiva e funcionar em grupos socialmenteheterogneos.

    1 categoria agir de maneira autnoma. Esta categoria compreende,fundamentalmente, as seguintes competncias-chave:

    a capacidade de defender e de afirmar os seus direitos, os seus interesses,as suas responsabilidades, os seus limites e necessidades;

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  • a capacidade de conceber e de realizar planos de vida e projectos pessoais; a capacidade de agir no conjunto da situao/contexto (DeSeCo, 2002, pp.

    14-15).

    2 categoria servir-se de ferramentas de maneira interactiva. Estacategoria compreende, fundamentalmente, as seguintes competncias-chave:

    a capacidade de utilizar a linguagem, os smbolos e os textos de maneirainteractiva;

    a capacidade de utilizar o conhecimento e a informao de maneirainteractiva;

    a capacidade de utilizar as (novas) tecnologias de maneira interactiva (id.,ibid., p. 14).

    3 categoria funcionar em grupos socialmente heterogneos. Estacategoria compreende, fundamentalmente, as seguintes competncias-chave:

    a capacidade de estabelecer boas relaes com os outros; a capacidade de cooperar; a capacidade de gerir e de resolver conflitos (id., ibid., pp. 14-15).

    Estas trs categorias de competncias-chave dizem respeito a todosos cidados e a sua apropriao por todos determinante em ordem construo de uma sociedade mais justa18 e de qualidade. Mas no casoparticular dos educadores/professores, para alm de outras mais especficas,elas devem merecer uma ateno particular na medida em que, sendoimportantes do ponto de vista do seu prprio desenvolvimento comocidados, tambm so responsveis por que estas competncias, numaperspectiva de educao ao longo da vida, sejam apropriadas pelos alunosque ajudam a educar.

    Face ao objecto de trabalho multidimensional e multi-intercontextualdos educadores/professores, que se opera em contextos e situaes deincerteza e indefinio, e tendo como referencial terico-epistemolgico aconceptualizao atrs explicitada, como conceber as competnciasprofissionais dos educadores/professores? E quais so as competncias quedevero adquirir e desenvolver em ordem construo de um projecto deformao orientado por um perfil profissional de desempenho consonantecom a redefinio do papel do professor como um profissional de ensino?

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  • Reagindo primeira questo, diremos que vrios autores e instituiestm, face avaliao negativa das escolas e do desempenho dosprofessores19, procurado reflectir e redefinir o conceito de competnciasprofissionais na formao dos educadores/professores. Enquanto referencialterico mais vasto, o conceito de competncias profissionais de Le Boterf(1999), uma vez mobilizado para o campo da formao deeducadores/professores, ajuda-nos a percepcionar melhor a resposta questo colocada. Para e referido autor a competncia profissional umprocesso intra e interpessoal de construo que contempla a combinaopertinente de um duplo equipamento de recursos:

    lquipement incorpor la personne (connaissances, savoir-faire, qualits,expriences, capacits cognitives, ressources motionnelles) et lquipementde son environnement (banques de donnes, rseaux dexpertise, rseauxdocumentaires) (Le Boterf, 1999, pp. 11-12).

    Trata-se de uma definio concordante com a apresentada no projectoDeSeCo (2002). Uma competncia profissional resultaria, segundo Le Boterf(1999), da mobilizao e de uma combinao de diversos recursos nocontexto de uma aco realizada numa situao real de trabalho. Mais do queo saber-fazer, ressalta desta concepo, o saber-agir com pertinnciarelativamente a uma situao especfica, que no se reduz a um mero saber-fazer, mas que revela a capacidade de tomar decises (saber o que fazer) emsituaes complexas, imprevistas e indeterminadas20. Traduz, por isso, apossibilidade de cada um poder tornar-se piloto dos seus percursos deprofissionalizao sem, contudo, deixar de levar em conta as exigncias daorganizao.

    Resulta desta abordagem combinatria que a competncia doprofissional consiste em saber combinar recursos provenientes do"equipamento" incorporado na pessoa (socializao primria) e do"equipamento" do seu meio (socializao secundria), no mbito darealizao de uma aco concreta que mobiliza estes recursos. , portanto,um processo de construo individual que, ao enfatizar a capacidade de sabergerir a complexidade em situaes profissionais21, e escapando visibilidadee no correspondendo a uma programao sequencial (Le Boterf, 1999;Lerbet, 1998, 2004), articula intrinsecamente competncia e autonomiaprofissional.

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  • Esta concepo de competncia profissional de resto uma tendnciaque se vem acentuando em vrios domnios da organizao social e, nestesentido, o campo da educao, quer a nvel da investigao em educao,quer a nvel da formao, pelo menos a nvel da retrica, tambm tem vindoa aproximar-se desta tendncia. o caso do socilogo suo PhilippePerrenoud, um dos autores que, na ltima dcada, mais tem reflectido sobreo conceito de competncia no campo da educao e que o define como "umsaber em uso" (Perrenoud, 1995, 2000, 2001b), ou como uma capacidade quemobiliza e utiliza saberes para "resolver problemas, construir estratgias,tomar decises, actuar no sentido mais vasto da expresso" (id., 2001b, p.13). Esta mesma ideia perpassa alguns dos trabalhos de investigadoresportugueses que sobre esta temtica tm sido publicados (Alarco, 1998;Roldo, 2003a). Roldo considera que

    ao falarmos de competncias referimo-nos ao saber que se traduz nacapacidade efectiva de utilizao e manejo intelectual, verbal ou prtico eno a contedos acumulados com os quais no sabemos nem agir no concreto,nem fazer qualquer operao mental ou resolver qualquer situao, nem pensarcom eles (Roldo, 2003a, p. 20).

    Este carcter integrador, mobilizador e de sentido (para que servem ascompetncias) do conceito de competncia aparece em Alarco & S-Chaves(1994) e em Alarco (2001b) associado formao em contexto deinvestigao, dimenso que tambm caracteriza o modelo centrado nainvestigao (Altet, 1994) e na anlise (Ferry, 1983).

    Tambm do ponto de vista institucional, sob a influncia (e a presso)dos resultados da investigao cientfica, se tem vindo a observar a tendnciacrescente dos sistemas modernos de formao de educadores/professoresadoptarem o conceito de competncias profissionais nas suas polticas deformao. A nvel internacional, entre outros, o exemplo do Qubec elucidativo. Para o Ministrio da Educao do Qubec a competnciaprofissional uma capacidade que

    se dploie en contexte professionnel rel, se situe sur un continuum qui va dusimple au complexe, se fonde sur un ensemble de ressources, sinscrit danslordre du savoir-mobiliser en contexte daction professionnelle, se manifestepar un savoir-agir russi, efficace, efficient, et rcurrent, est lie une pratiqueintentionnelle et constitue un projet, une finalit sans fin (Ministre delducation du Qubec, 2001, p. 192).

    61Para uma nova cultura profissional

  • este agir em contextos de aco profissional, pelo apelo que faz interaco entre recursos provenientes do sujeito e do meio, que potencia odesenvolvimento de novas formas de utilizar e/ou mobilizar competncias quej se possuem. Esta reestruturao amplificante de competncias jadquiridas, e que se manifesta na execuo da aco, induzida por prticasreflexivas (Schn, 1987, 1988; Alarco, 1996; Perrenoud, 2004), as quaisconduzem "o profissional a progredir no seu desenvolvimento e a construir asua forma pessoal de conhecer" (Alarco, 1996, p. 17). Trata-se de um saberagir que se inscreve numa prtica intencional, ou seja, que visa intervir, deforma eficaz, na resoluo de problemas (funo prtica) ou atingir finalidadesde utilidade social (funo scio-tica).

    No contexto institucional portugus, o conceito de competncia, naacepo que temos vindo a desenvolver, tambm foi adoptado como centralna definio das polticas de formao. O Ministrio da Educao portugusassume que o termo competncia

    integra conhecimentos, capacidades e atitudes e que pode ser entendida comosaber em aco ou em uso. Deste modo, no se trata de adicionar a umconjunto de conhecimentos um certo nmero de capacidades e atitudes, mas,sim, de promover o desenvolvimento integrado de capacidades e atitudes queviabilizam a utilizao dos conhecimentos em situaes diversas, maisfamiliares ou menos familiares ao aluno (Ministrio da Educao, 2001, p. 9).

    Nesta definio adopta-se uma noo ampla de competncia eressalta-se a aquisio de um conjunto de conhecimentos e processosfundamentais, que no devem ser reduzidos ao "conhecimento memorizadode termos, factos e procedimentos bsicos, desprovido de elementos decompreenso, interpretao e resoluo de problemas" (id., ibid.). Sublinha-se, igualmente, que a competncia no est ligada ao treino para, num dadomomento, produzir respostas ou executar tarefas previamente determinadasmas, ao contrrio,

    diz respeito ao processo de activar recursos (conhecimentos, capacidades,estratgias) em diversos tipos de situaes, nomeadamente situaesproblemticas. Por isso, no se pode falar de competncia sem lhe associar odesenvolvimento de algum grau de autonomia em relao ao uso do saber (id.,ibid.).

    Parece poder inferir-se desta definio uma preocupao com apessoa em formao e esta perspectiva, enquanto conceito central das

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  • polticas educativas de formao, constitui, tambm do nosso ponto de vista,uma inovao relativamente "forte tradio de produo de orientaesprogramticas baseadas em tpicos especficos e dispersas pelas disciplinase anos de escolaridade" (Abrantes, 2001, p. 3).

    A incidncia desta abordagem por competncias na formaoprofissional de educadores/professores conduz aceitao do professorcomo algum com capacidade de gerir situaes de aprendizagemcomplexas: o professor deve tornar-se num profissional capaz de reflectir e deresolver problemas emergentes nas suas prticas, de mobilizar e de conceberestratgias pedaggicas adequadas aos contextos em que trabalha (Paquay,Altet, Charlier & Perrenoud, 1998). A formao profissional de professorescentrada nas competncias seria tambm uma forma dos sistemas deformao darem resposta s exigncias da economia do saber e aos grandesdesafios do sculo XXI que fazer do sucesso escolar para todos, umarealidade (Barber, 2001).

    Uma segunda reflexo a fazer, e que se articula com o conceito decompetncia, prende-se com os novos papis e funes doseducadores/professores e das escolas. Segundo Esteves (2003),investigadora da Universidade de Lisboa, aos professores e s escolas sofeitas crescentes exigncias, muitas das quais contraditrias, o que temdificultado a construo de um perfil de competncias profissionais capaz deresponder demanda social. mesmo, segundo a mesma autora, "uma dasquestes crticas que alguns trabalhos de investigao assinalaram: a daausncia de perspectivas claras sobre o perfil de competncias profissionaisa desenvolver" (Esteves, 2003, p. 13).

    E, portanto, a identificao de referentes da qualidade do desempenhode um profissional, ou seja, a definio de um perfil de saberes e decompetncias definidores da especificidade da profisso docente, apareceaos olhos de Roldo como imprescindvel22 j que sobre "esse perfil seconstruiro () as especificidades de nvel de campo, de rea de saber, detipologias de aco que ho-de dar orientao ao trabalho formativo e produo de conhecimento das instituies formativas" (Roldo, 2003b, p.20).

    Parece pois que nos encontramos numa era nova, em que se exigeaos professores e s escolas que dem respostas a problemas sociais cada

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  • vez mais complexos e que, complementarmente, se repense o seu papel deinterveno pedaggica em contextos educativos caracterizadoscrescentemente pela complexidade e pela diversidade. Intervir nestescontextos exige reinventar a relao da formao com o conhecimento e,neste sentido, importa perspectivar a formao de educadores/professores apartir de outras propostas educativas.

    Os quatro pilares da educao para o sculo XXI ("aprender aconhecer", "aprender a fazer", "aprender a viver juntos" e "aprender a ser"),apresentados pelo relatrio Delors (1996) UNESCO, que consubstanciamdimenses importantes da formao integral da pessoa enquanto indivduo ecidado, constituem um conjunto de princpios que, uma vez aceites, podemcontribuir para ultrapassar as tradicionais vises puramente instrumentais daeducao. So dimenses que, se consideradas na formao deeducadores/professores, exigem

    redimensionar a formao cientfico-tecnolgica dos professores, revalorizandomais os instrumentos de inteligncia que lhes permitam aceder s informaese trabalhar com elas no sentido da pesquisa, da resoluo de problemas e dareflexo crtica (Gonalves, S.; 2001, p. 149).

    Esta nfase da formao de educadores/professores assente emnovos quadros conceptuais e epistemolgicos tem conduzido necessidadede se redefinir o papel do professor em torno do conceito deprofissionalizao23. Roldo (2000) e Campos (2002) defendem arecentrao do papel do professor no acto de ensinar, ou seja, definem oprofessor como um profissional de ensino, conferindo-lhe um maiorprotagonismo na gesto da escola e do currculo.

    De resto, o enfoque na construo da profissionalidade como um meiode ultrapassar a dicotomia teoria-prtica, gerir contextos de incerteza eproduzir conhecimento pedaggico e cientfico inovador tem vindo a constituirobjecto de reflexo por parte da investigao recente sobre a formao deeducadores/professores. A profissionalidade docente, exprimindo a ideia dodesenvolvimento e da construo contextualizada de competnciasnecessrias ao exerccio eficaz da profisso, que se manifestam, comoreferimos, na aco educativa, inseparvel da ideia de autonomiadocente24. Responder de forma profissional a questes como "o que fazer,como fazer e quando decidir o que fazer?" nos contextos educativos, implica

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  • a capacidade de mobilizao de respostas concretas que, na maioria doscasos, consubstanciam competncias construdas atravs da interaco entresaberes provenientes da investigao, certo, mas tambm da reflexo sobrea aco e da experincia e, por isso, dificilmente compaginveis com polticascentralizadoras de formao.

    neste sentido que muitos investigadores defendem que a construoda profissionalidade deve ser assumida pela formao inicial25 a qual"dever, em primeiro lugar, cultivar as perspectivas de um desenvolvimentoprofissional ao longo da vida e levar os formandos a adoptarem taisperspectivas como suas" (Esteves, 2003, p. 14). Em segundo lugar, aformao inicial deve incorporar dispositivos de formao integrandointeractivamente experincia e reflexo (Altet, 1994, 2000; Alarco, 1998,2000, 2001a, 2003; S-Chaves, 2002; Esteves, 2003; Perrenoud, 2000,2004). Saber analisar as prticas (Altet, 2000)26, trabalhar em equipa(Beckers, 2004), escrever sobre a prtica profissional (dirios, portfolios,narrativas) (Nvoa & Finger, 1988; S-Chaves, 2000, 2005a; Dominic, 2002;Almeida & Ambrsio, 2003; Vanhulle, 2004; Zeichner & Hutchinson, 2004),pensar a actividade didctica em termos de actividade ou em referncia actividade (Barbier & Durand, 2003), problematizar (Benoit, 2005), investigar(Alarco, 2001a; Estrela, 2003; Ponte, 2002; Esteves, 2002), utilizar as novastecnologias (Conselho Nacional de Educao, 1998) so, entre outros, papisque configuram uma nova profissionalidade docente que os novosprofessores devem aprender a desempenhar no mbito de uma nova culturade formao.

    Alguns dos mais recentes modelos de formao de educadores e deprofessores assumem esta tendncia profissionalizante comportando vriasdimenses de formao. H um reconhecimento de que os professores nopodem exercer o seu papel com competncia e qualidade sem uma formaoadequada para leccionar os currculos de que esto incumbidos, sem umconjunto bsico de competncias profissionais orientadas para a sua prticaeducativa. Mas de que competncias se trata? Quais as dimenses deformao que contribuem para a construo da nova profissionalidadedocente?

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  • 2. Dimenses de formao que contribuem para aconstruo da nova profissionalidade docente

    Sobretudo ao longo das ltimas dcadas, uma perspectivaconstrutivista foi-se estruturando em torno da ideia de "que o conhecimento algo pessoal e que o significado construdo pela pessoa em funo daexperincia" (Arends, 1999, p. 4)27.

    Esta perspectiva exige um tipo de formao profissional que no seesgota nas competncias relativas a matrias escolares28. Hoje, exigidaaos professores "proficincia em vrios domnios (escolar, pedaggico, sociale cultural) e tambm que sejam profissionais com capacidades de reflexo ede resoluo de problemas" (id., ibid., p. 8). Para este autor, a competnciaeducativa consubstanciada atravs das seguintes quatro grandesdimenses:

    domnio de um conjunto de conhecimentos existente relativo ao ensino e aprendizagem, utilizando-o como guia da cincia e arte da prtica docente;

    domnio de um repertrio de prticas educativas (modelos, estratgias eprocedimentos), estando aptos a utiliz-las no ensino das crianas e notrabalho com adultos no contexto escolar;

    atitude e competncias para abordar todos os aspectos do seu trabalho deuma forma reflexiva, democrtica e orientada para a resoluo deproblemas;

    concepo de "aprender a ensinar" como um processo contnuo, sendodotados da atitude e competncias necessrias optimizao das suascapacidades docentes e das escolas onde trabalham (id., ibid., p. 10).

    Para alm de um slido conhecimento dos contedos e do modo de osmobilizar e reestruturar em termos pedaggicos, em funo dascaractersticas do aprendente e dos seus contextos, a profissionalidadedocente estabelece uma relao directa com o conhecimento do currculo epressupe a compreenso dos fins, objectivos e valores educacionais.

    A complexidade crescente das funes educativas pressupe acapacidade dos professores mobilizarem vrios repertrios no selimitando a um conjunto limitado de prticas que usam no exerccio dasdiversas funes (executivas, interactivas e organizacionais) e nodesempenho dos diferentes papis que lhe esto confiados.

    Estamos perante a dimenso da reflexo e resoluo de problemas,que implica tambm o conhecimento de si prprio e a possibilidade de cadaprofessor "identificar, conhecer e controlar conscientemente as mltiplas

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  • dimenses inerentes ao acto pedaggico" (Arends, 1999, p. 13), apontandopara uma competncia metacognitiva indutora de uma transformabilidade queapela constantemente (re)conceptualizao do acto pedaggico.

    A inconstncia e o dinamismo das situaes educativas fizeramemergir a convico de que aprendizagem e o desenvolvimento soprocessos complexos que se verificam ao longo de toda a carreira e"mediante a ateno prestada ao seu prprio processo de aprendizagem e aodesenvolvimento das suas caractersticas e competncias especficas" (id.,ibid., p. 19).

    Definir as dimenses da nova profissionalidade docente torna-se,como vimos, uma tarefa complexa. Contudo, acreditamos ser possvel, edesejvel, definir um perfil de professor que d respostas aos desafios que secolocam sociedade de hoje e que prepare para a sociedade de amanh.Perspectivar a formao de professores num quadro paradigmtico reflexivo, criar as condies para que tal acontea. Os modelos de formao queprivilegiem a reflexo como um processo que ocorre antes, durante e depoisda aco (Zeichner, 1993) e que enquadram o questionamento no cerne docrescimento pessoal e profissional parecem ser os mais indicados. Comorefere S-Chaves (1997b), o questionamento sobre as prticas e asconcepes que as legitimam constitui um factor de desequilbrio (Piaget,1975) das estruturas cognitivas,

    condio "sine qua non" para a construo de novos e continuados processosde reequilibrao que so o garante da regulao das continuidades nosincidentes de ruptura que o confronto com o novo sempre pressupe (S-Chaves, 1997b, p. 23).

    por isso que a nova profissionalidade se inscreve num paradigma deinacabamento, no sentido de que as competncias pessoais e profissionaisno so adquiridas a partir de um qualquer modelo pr-concebido, mas quese vo desenvolvendo (construindo) num contnuo e num espao deinterveno aberto e reflexivo.

    Dentro da mesma perspectiva, Schn (1988) define o profissional deensino como sendo algum que, face a um problema, o reformula e o v soboutras perspectivas, isto , que desenvolve a competncia (meta) reflexivaassente na e sobre a sua prpria aco. Trata-se de uma competncia que"em si mesma, criativa porque traz consigo o desenvolvimento de novas

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  • formas de utilizar competncias que j se possuem e traduz-se na aquisiode novos saberes" (Alarco, 1996, p. 16).

    Porque o processo de formao profissional de professores ,sobretudo, um processo de desenvolvimento que se opera a partir da suaactividade, da reflexo sobre a sua actividade realizada e da resoluo deproblemas que a mesma suscita num contexto de prticas enquadradas numacultura profissional bem definida, a dimenso investigativa assume umaimportncia central nesse percurso de desenvolvimento. Neste sentido,construir a profissionalidade docente no apenas estabelecer uma boarelao com os contedos de ensino, mas tambm ser capaz de seapropriar do processo investigativo como componente fundamental da suaformao e do seu desenvolvimento profissional.

    De modo que, falar do professor investigador, pressupe fazer umaruptura epistemolgica com modelos de formao em que aos professores sereserva o papel de consumidores dos resultados da investigao produzida,normalmente, em contextos estranhos aos seus locais de trabalho.Pressupe, tambm, abandonar um tipo de escola chamada a desempenharum papel principal de reproduo de uma estrutura social29.

    neste contexto, e como reaco, que novas formas de formao e dedesenvolvimento profissional tm surgido, designadamente as quereconhecem que a "formao no se constri por acumulao (de cursos,conhecimentos, ou de tcnicas), mas sim atravs de um trabalho dereflexividade crtica sobre as prticas e de (re)construo permanente de umaidentidade pessoal" (Nvoa, 1991, citado por Amiguinho, 1992, p. 45) e as queconvergem "na necessidade de uma autoformao participada em contextosreais e situaes de trabalho" (Amiguinho, 1992, p. 45).

    Dentro deste novo paradigma de formao, o professorno pode ser concebido como um simples tcnico que aplica rotinas pr-estabelecidas a problemas estandardizados, como melhor modo de orientarracionalmente a sua prtica. A interveno do professor, semelhana do queocorre com qualquer outra prtica social para Elliot, um autntico processo deinvestigao (Prez Gmez, 1990, citado por Amiguinho, 1992, p. 47).

    A integrao da investigao como estratgia formativa tem vindo aassumir um papel essencial na formao do futuro professor. Este, emcontacto com a investigao, poder compreender melhor

    a natureza, as problemticas, os mtodos e o valor da produo do

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  • conhecimento (...), permitindo-lhe desenvolver, ele prprio, uma atitudeinvestigativa, de abertura reflexo e ao permanente aprofundamento do seuprprio conhecimento (Alarco, Freitas, Ponte, Alarco & Tavares, 1997).

    Alm de ajudar o futuro professor a construir conhecimentosrelevantes do ponto de vista da prtica profissional "na medida em que obrigaa manusear conceitos, variveis e hipteses de uma maneira mais profundae mais exigente do que noutro tipo de trabalhos" (Ponte, 1999, p.16), a prticada investigao tambm importante porque "s compreendendo a suaprpria aprendizagem atravs da investigao (...) se pode compreenderesses processos nos prprios estudantes" (id., ibid.).

    Uma outra dimenso que tem vindo a ser cada vez mais umapreocupao dos autores atentos aos desafios que a sociedade de hoje noscoloca a componente social e tica da formao. Trata-se de uma dimensoque se insere no novo conceito de educao apresentado pelo relatrioDelors UNESCO em 1996, e que se refere a dois dos quatro eixosfundamentais para o desenvolvimento da pessoa que a sociedadecontempornea exige: aprender a viver juntos/aprender a viver com os outrose aprender a ser. So duas vertentes do desenvolvimento que qualquerprojecto de formao de educadores/professores deve incluir e que devemconstituir oportunidades de reflexo "sobre as bases axiolgicas presentesem toda a actuao do docente" (Gonalves, S.; 2001, p. 149). Segundo amesma autora, esta dimenso assume hoje uma importncia acrescida faceaos novos papis atribudos escola e aos professores. De facto, os novospapis

    passam pela construo de uma sociedade de todos e para todos, o que nopode ser conseguido se apenas agirmos sobre o desenvolvimento dascompetncias cognitivas, estticas, afectivas ou motoras dos alunos; igualmente importante promover a formao para a cidadania activa,responsvel, participante e respeitadora da diversidade (id., ibid., p. 149).

    Considerar que o desenvolvimento profissional uma tarefa que sedesenvolve ao longo da vida outra dimenso que importa integrar nosprojectos de formao de educadores e de professores. A ideia deaprendizagem ao longo da vida, orientada para adultos e para a formaoprofissional30, no corresponde, hoje, s necessidades da sociedade daaprendizagem caracterizada por um pensamento educativo convergente com

    69Para uma nova cultura profissional

  • objectivos de desenvolvimento humano sustentado (Ambrsio, 2003, 2004).Defende-se um novo paradigma educativo centrado na valorizao humana ena pessoa como sujeito da sua prpria educao, capaz de lidar comcontextos caracterizados pelas mudanas aceleradas, pela globalizao, pelainterdependncia e circulao de ideias e pela deslocalizao dos centrostradicionais do poder. Neste novo paradigma, os sistemas de formao deprofessores, em consonncia com resultados de vrios estudos, deverodesenvolver

    estratgias de formao por percursos pessoais, auto-reguladoras de situaescomplexas e diversas de formao, centradas no sujeito, na sua experincia,nas suas capacidades de criao e gesto dos seus saberes e envolvidas emdinmicas sociais de mudana (Ambrsio, 2004, p. 252).

    Trata-se, numa perspectiva antropocntrica da Educao, de umaformao no prescritiva e que no se limita apenas a socializar e a instruir,mas a levar a pessoa a assumir-se como sujeito da sua prpria formao aolongo da vida atravs de formao integrada e ancorada numa reflexibilidadesobre as prticas, num contnuo processo de auto-avaliao. Esta nova visoda educao tem-nos conduzido "descoberta da escola" (Canrio, 2004)enquanto organizao capaz de aprender com a experincia e onde formaode professores, concretizao contextualizada de currculo, gesto dasescolas so dimenses que tm de ser equacionadas de forma integrada eholstica (Alarco, 2001a, 2001b). A autonomia das escolas31, condio quesubjaz a esta perspectiva, acentua a necessidade de profissionalizar a acoeducativa implicando, este facto, a alterao das funes e dos papistradicionais dos professores, do processo de ensino-aprendizagem, bemcomo da natureza das competncias necessrias para ensinar.

    Integrar o novo conceito de educao tambm adoptar umaperspectiva plurilingue e pluricultural na formao de professores que, deresto, uma prtica que se vem desenvolvendo nos pases mais avanadosem matria de educao e de formao de professores. O alargamento daUnio Europeia a pases lingustica e culturalmente diferentes e a mobilidadecrescente de trabalhadores e de quadros no espao europeu tm favorecidoa emergncia de um mundo novo marcado pela diversidade e pela inter-multiculturalidade, matriz de referncia cada vez mais forte na vida dascrianas. Por outro lado, diversas investigaes tm revelado impactos

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  • importantes da aprendizagem de lnguas no maternas no desenvolvimentoglobal das crianas e no sucesso educativo (Fris, 1990; Frias, 1992;Gonalves, I.; 2004).

    Esta nova realidade tem conduzido adopo de polticas educativasfavorecedoras do ensino de lnguas estrangeiras desde os primeiros anos deescolaridade em diferentes pases.

    Relativamente realidade portuguesa, a formao plurilingue epluricultural dos professores do 1. CEB uma lacuna ainda no totalmentecolmatada nas instituies de formao. At ao presente ano lectivo, o ensinoprecoce de lnguas estrangeiras no fazia parte dos currculos do 1. CEB,situao que, segundo o actual Governo, est a mudar a partir deste ano. Aser concretizada, esta medida dever levar as instituies de formao areorganizarem os seus planos de formao no sentido de que os professoresque formam desenvolvam as competncias profissionais que as novasprticas de ensino-aprendizagem exigem.

    Tudo o que referimos sobre competncias e dimenses profissionaisque caracterizam o desenvolvimento pessoal e profissional de educadores ede professores em geral aplica-se, integralmente, formao de professoresdo 1. CEB. Este entendimento tambm tem vindo a assumir uma importnciacrescente na definio das polticas oficiais de formao de professores. Maisdo que nunca, hoje, questiona-se a sua formao e os parmetros da suacertificao a vrios nveis e domnios. Por um lado, a emergncia de maisamplas e complexas funes e novas reas de responsabilidades que lhesso atribudas32, as quais exigem um considervel desenvolvimentoprofissional, tem conduzido, em alguns pases, as autoridades educativas, asorganizaes de professores ou as instituies de formao de professores,a consensualizarem a definio de perfis profissionais e competnciasnucleares que reflictam uma profisso cada vez mais exigente33. Por outro, eno mbito das polticas de formao preconizadas pelo chamado Processo deBolonha, temos vindo, no espao europeu, a assistir a um debate alargadoque visa aprofundar a discusso no s em torno da estrutura, organizao edurao dos cursos de formao como tambm sobre os perfis ecompetncias profissionais dos professores.

    Neste sentido, tem vindo a consolidar-se a ideia de que os professoresdo 1. CEB so profissionais com responsabilidade pela educao de

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  • crianas, cuja docncia marcada por um saber profissional resultante damobilizao, produo e utilizao de diversos saberes (cientficos,pedaggico-didcticos, organizacionais, tcnico-prticos e scio-crticos),organizados e integrados adequadamente em funo da aco concreta adesenvolver em cada situao de prtica profissional. A formao doprofessor envolve tambm uma vertente cultural, pessoal, social e tica.Finalmente, o professor precisa de possuir um conjunto de capacidades eatitudes de anlise crtico-reflexiva, investigao e inovao pedaggicas,tornando-se indispensvel uma componente de formao ecologicamentesituada com carcter fortemente prtico que potencie o seu desenvolvimentoprofissional ao longo da vida.

    ConclusoVimos que as prticas pedaggicas susceptveis de favorecer o

    sucesso educativo de todos os alunos esto intrinsecamente ligadas a umaformao inicial que assuma a profissionalizao estruturada em termos dedesenvolvimento de competncias profissionais. Estas devem constituir-secomo metas susceptveis de proporcionarem aos futuros educadores eprofessores um desenvolvimento social e humano capaz de os mobilizar, pelasua aco educativa, a contribuir para uma sociedade de maior humanidadee justia. Um esforo nesse sentido foi encetado pelo ex-INAFOP ao legislarsobre os padres de qualidade da formao inicial de professores e ao definiros perfis de desempenho profissional do educador de infncia e do professordo 1. CEB. Consideramos que, face reflexo feita ao longo deste artigo,essas grandes linhas da poltica de formao de professores, agoraretomadas a propsito do chamado Processo de Bolonha, podem constituirum perfil desejvel para a formao dos professores do 1. CEB. Contudo, umproblema persiste. No incide tanto sobre quais as competncias desejveisque os futuros professores devem adquirir e desenvolver, mas sobre o modocomo essas competncias so "transferidas" para o terreno da formao. esta uma rea de conhecimento sobre a qual pouco sabemos e que continuaa interpelar as instncias de investigao e de formao.

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  • Notas1 Refira-se a este propsito o impacto da Declarao de Bolonha e de estudos

    levados a cabo por organizaes internacionais como por exemplo a CE, a OCDEou a UNESCO.

    2 Vrios autores convergem na ideia de que a autonomia o direito de os indivduosou das organizaes darem, a si mesmos, as suas prprias regras e as suasprprias linhas de aco, mais do que obedecer a regras ou directivas fixadas poroutra entidade. Contudo, a autonomia no constitui uma finalidade em si mesma eo seu exerccio deve ser regulado pela tica da responsabilidade, ou, como refereJos Barata-Moura, "No se autnomo por ser autnomo; -se autnomo paramais adequadamente cumprir prestando contas uma misso social especfica"(Barata-Moura, 2004, p. 74).

    3 Os educadores/professores participam nos conselhos pedaggicos e nos conselhosde docentes dos Agrupamentos/Escolas a que pertencem com poderes de definiode polticas educativas e de deciso em vrias matrias de gesto pedaggica.

    4 Entre outros destacamos o Projecto Pedaggico (PE), o Projecto Curricular deEscola/Agrupamento de escolas (PCE/A) e o Projecto Curricular de Turma (PCT).

    5 A este respeito, a Constituio da Repblica Portuguesa determina que "O Estadopromove a democratizao da educao e as demais condies para que aeducao, realizada atravs da escola e de outros meios formativos, contribua paraa igualdade de oportunidades, a superao das desigualdades econmicas, sociaise culturais, o desenvolvimento da personalidade e do esprito de tolerncia, decompreenso mtua, de solidariedade e responsabilidade, para o progresso sociale para a participao democrtica na vida colectiva" (Artigo 73, Captulo III).

    6 A famlia, sobretudo nos pases ocidentais, enquanto primeira e principal estruturarelacional na formao da personalidade das crianas e dos jovens est a sofrergrandes transformaes. J no segue o modelo tradicional constitudo pelo pai,me e filhos nascidos no seio do matrimnio e apresenta uma estrutura maisflexvel e complexa.

    7 Segundo a OCDE, "Globalisation and modernisation are creating an increasinglydiverse and interconnected world. To make sense of and function well in this world,individuals need for example to master changing technologies and to make sense oflarge amounts of available information. They also face collective challenges associeties such as balancing economic growth with environmental sustainability,and prosperity with social equity. In these contexts, the competencies thatindividuals need to meet their goals have become more complex, requiring morethan the mastery of certain narrowly defined skills" (https://www.pisa.oecd.org/dataoecd/47/61/35070367.pdf). Ver a este propsito tambm o stio:www.oecd.org/edu/statistic/deseco.

    8 Um esforo de definio de referenciais de competncias profissionais relativas profisso docente tem sido feito por vrias instncias com responsabilidades naformao de educadores/professores. o caso dos perfis de competncias e deconhecimentos referentes profisso de educador/professor consagrados naDeliberao n 1488/2000 de 15 de Dezembro, no Decreto-Lei n 240/2001, de 30de Agosto (Perfil geral de desempenho profissional do educador de infncia e dos

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  • professores do Ensino Bsico e Secundrio), no Decreto-Lei n 241/2001, de 30 deAgosto (Perfil especfico de desempenho profissional do educador de infncia e doprofessor do 1 ciclo), instrumentos legais elaborados pelo ex-INAFOP (que estevena origem da reformulao de vrios planos de formao de educadores e deprofessores em Portugal), e nos documentos elaborados pelo CCISP e peloMinistrio da Educao no mbito da Declarao de Bolonha.

    9 Uma sociedade mais humanizada, segundo as convenes e acordosinternacionais (Declarao Universal dos Direitos do Homem, Declarao do Rio,Declarao de Quioto) relativos aos direitos da pessoa e ao desenvolvimentoeconmico, ecolgico e social durvel, dever desenvolver-se na assuno e norespeito dos direitos da pessoa, dos sistemas dos valores democrticos e de umapoltica de desenvolvimento durvel. Concretizar estes princpios pressupe adefinio de polticas corajosas quer escala individual (o que exige um novoentendimento sobre o conceito de competncia individual) quer escala dasociedade (o que exige a definio de novas polticas econmicas e sociaisrelativas produo e distribuio de bens e servios).

    10 A escola do sculo XX foi estruturada em torno de uma perspectiva cientfica queconsiderava o "conhecimento como sendo constitudo por verdades a que os sereshumanos tm acesso" (Tobin, 1992, citado por Arends, 1999, p. 4). Dentro destaconcepo positivista, os professores adquiriam um conjunto de conhecimentos e oseu papel consistia em transmitir esse conhecimento (factos, conceitos, princpios)aos alunos.

    11 O projecto DeSeCo, que se desenvolve no quadro da OCDE, visa fornecer umabase terica e conceptual para a definio e a seleco de competncias chavesnuma perspectiva de formao permanente e para a avaliao dessascompetncias.

    12 A transdisciplinaridade privilegia no tanto a criao de novos espaos de naturezainterdisciplinar, mas diz respeito quilo que est, ao mesmo tempo, "entre" asdisciplinas, "atravs" das diferentes disciplinas e "alm" de qualquer disciplina.Trata-se de uma abordagem que prope a construo de pontes entre aobjectividade e a subjectividade, entre a cincia e a conscincia, na compreensodo ser que aprende e no significado dessa aprendizagem para a sua humanizao(Caraa, 2005).

    13 A partir da epistemologia popperiana dos trs mundos Mundo 1 (fsico), Mundo 2(conhecimento subjectivo) e Mundo 3 (conhecimento objectivo)) (Popper, 1989) e,entre outros, dos contributos tericos de Stphane Lupasco (as trs matrias) e deFrancisco Varela (autonomia), Lerbet faz emergir uma nova abordagem no-positivista, sistmica e cognitivista, para descrever o funcionamento pessoal naconstruo de conhecimento (systme-personne). Esta renovao terica procuraexplicitar, por modelizao, o que se passa entre o Mundo 2 e o Mundo 3 daproposio popperiana.

    14 Para Lerbet, o conceito de estrutura, tal como o herdara do pensamento piagetiano,impede de se conhecer o que se passa entre o conhecimento (tat cognitif dumonde deux) e a informao (contenu objectif du monde trois), ou seja, aconstruo do saber que ocorreria, na sua opinio, precisamente na interfacedestes dois mundos (saber-interface).

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  • 15 Ontolgica no sentido de que a abertura no um acidente mas a condioessencial de sobrevivncia dos sistemas.

    16 O projecto DeSeCo desenvolve ainda o conceito de competncia-chave: "lescomptences permettant aux individus de participer efficacement dans de multiplescontextes ou domaines sociaux et qui contribuent la russite globale de leur vie etau bon fonctionnement de la socit" (DeSeCo, 2002, p. 10). Estas competnciasso, segundo o mesmo projecto, definidas e seleccionadas em funo de uma visocomum do mundo que a sociedade adopta em cada momento do seu evoluir, "parce que les personnes, les groupes et les institutions faisant partie de ces socitsconsidrent comme important" (id., ibid., p. 10) e ainda pelos princpiosfundamentais dos direitos humanos, dos valores democrticos e de objectivosassociados ao desenvolvimento durvel.

    17 O termo ferramenta aqui usado no seu sentido mais amplo. Ele engloba "lesinstruments servant rpondre de nombreuses demandes importantes de la viequotidienne et professionnelle dans la socit moderne, y compris le langage,linformation et les connaissances (entre autres le contenu des programmesscolaires traditionnels) ainsi que des entits physiques (comme les ordinateurs etles machines)" (DeSeCo, 2002, p. 13).

    18 Segundo Martins (2005), 15% da populao mundial controla 84,7% de toda ariqueza produzida a nvel planetrio. Este e outros indicadores de desequilbrios(desigualdade de oportunidades, pobreza, desequilbrios ecolgicos,insegurana), sendo geradores de desigualdades e injustias, desafiam empermanncia a paz mundial.

    19 Um estudo de anlise comparada das reformas na formao de professoresrealizadas nos ltimos anos, evidenciou que "na Europa como na Amrica e umpouco por toda a parte, severo o diagnstico sobre a escola, acusada de umdesempenho medocre em funo das importantes somas investidas. A formaode professores tem sido especialmente apontada por no ter sabido produzirprofissionais competentes que tivessem podido inverter ou mitigar a situao,melhorando o desempenho dos alunos" (Tardif, Lessard & Gauthier, 1998, citadospor Formosinho & Niza, 2002, p. 11).

    20 Para Le Boterf (1999), o profissional competente aquele que, face aosimprevistos, complexidade das situaes, sabe "prendre de initiatives et desdcisions, ngocier et arbitrer, faire des choix, prendre des risques, reagir desalas, des pannes ou de avaries, innover au quotidien et prendre desresponsabilits. Le savoir agir ne consiste pas seulement savoir traiter un incident,mais galement savoir lanticiper" (p. 44).

    21 Saber gerir a complexidade significa, para alm de saber agir com pertinncia,"savoir mobiliser des savoirs et connaissances dans un contexte professionnel;savoir intgrer ou combiner des savoirs multiples et htrognes; savoir transposer;savoir apprendre et apprendre apprendre; savoir sengager" (Boterf, 1999, p. 44). este "saber gerir a complexidade" que determina a qualidade das competncias,a qual "dpendra en partie de la qualit du couplage entre les ressourcesincorpores mobilises et les ressources de lenvironnement utilises" (id., ibid., p.149).

    75Para uma nova cultura profissional

  • 22 Outros investigadores partilham desta ideia. o caso de Ins Sim-Sim cujosprincipais trabalhos procuram dar um contributo para a estruturao do referencialde competncias a desenvolver no mbito do ensino da Lngua Portuguesa no 1.CEB. A este propsito consultar a obra: Sim-Sim (2001).

    23 O conceito de profissionalizao, enquanto processo de construo daprofissionalidade e da identidade scio-profissional docente, reenvia para dois tiposde processos que se articulam entre si de forma complementar (Lang, 1999). Um,interno, que se aproxima do conceito de profissionalidade, e, outro, social e externo,que se aproxima do conceito de profissionalismo. Se a profissionalidade docenteexprime a ideia da construo de competncias necessrias ao exerccio daprofisso docente, o profissionalismo remete para o reconhecimento social sobre aqualidade do desempenho profissional que, como sublinham Chapoulie (1973),Lang (1999), Correia (2001), entre outros, determinado pela ideologia dominante.Estes "deux processus, interne et externe, sont irrductibles mais articuls lun parrapport lautre" (Ministre de lducation du Qubec, 2001, p. 25).

    24 A autonomia , nesta assero, indissocivel das competncias profissionais doprofessor, e manifesta-se a vrios nveis da aco docente: mtodos de trabalho,auto-organizao pedaggica, auto-controlo da formao, produo de prescriesem matrias de programas, metodologias, materiais curriculares, procedimentos deavaliao, etc.

    25 Perrenoud (2000, 2002) defende que o "saber agir" em situaes complexas no seensina nem se desenvolve automaticamente mas que pode ser desenvolvido naformao inicial atravs de uma prtica de formao reflexiva e de uma relaoconstante entre teoria e prtica.

    26 Segundo Marguerite Altet, a anlise das prticas pedaggicas tem como objectivodesenvolver uma prtica reflexiva que vai permitir mudar as representaes econstruir a identidade profissional (Altet, 2000).

    27 Sobre as dimenses do conhecimento profissional do professor, veja-se S-Chaves& Alarco (2000).

    28 Poutois & Desmet (1999) sublinham a importncia de formar os futuros professoresem torno das dimenses cognitiva, afectiva, social e ideolgica. Este entendimento subscrito e integrado por Rodrigues-Lopes (2004) que elege as competnciascientficas, didctico-pedaggicas, clnico-relacionais e institucionais, como centraisna formao de professores do nosso tempo.

    29 Segundo esta perspectiva, a formao de professores concebe-sefundamentalmente como um processo de aquisio de saberes e saberes-fazer quese devem transmitir aos alunos e de apropriao de tcnicas necessrias suatransmisso eficaz. Trata-se de uma formao de carcter cientfico e de carcterdisciplinar, "centrada no ensino, que s muito remotamente tem em conta aaprendizagem" (Correia, 1989, p. 90).

    30 Esta formao visava o desenvolvimento profissional, numa perspectiva taylorista,ou seja, apenas a melhoria das qualificaes em ordem a um aumento daprodutividade.

    31 O conceito de autonomia que aqui veiculado segue de perto o de Canrio: "acapacidade que essas organizaes tm (escolas), com os seus profissionais e

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  • com os seus pblicos, de construir projectos, de os contextualizar, de os rever, deos analisar de uma maneira sistemtica, de os aprender com a experincia" (2004,p. 297).

    32 Segundo a OCDE (2004), alguns exemplos das novas reas da responsabilidadedo professor so: acompanhamento e aconselhamento individual dos alunos;ensino em turmas multiculturais; desenvolvimento de competncias cvicas esociais; integrao de alunos com necessidades educativas especiais;aconselhamento profissional aos pais; trabalho e planeamento em equipa;participao na comunidade educativa (na escola ou em rede de professores);avaliao e planificao do desenvolvimento sistemtico; gesto e lideranapartilhada.

    33 Entre outros, referimos o caso do Qubec que, procurando responder questo "dequelles comptences les jeunes et les enseignants ont-ils besoin pour agirefficacement dans le monde de demain et sadapter une socit en rapide etprofonde mutation?" conduziu os responsveis pela formao de professores aadoptarem a abordagem por competncias em torno de quatro dimenses(intelectual, metodolgica, pessoal e social e comunicacional) as quais seconsubstanciam em doze competncias profissionais que os alunos em formaodevem adquirir e desenvolver de forma interdependente e interactiva (Ministre del ducation du Qubec, 2001).

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  • TOWARDS A NEW PROFESSIONAL CULTURE: APPROACHING COMPLEXITY ININITIAL PRIMARY SCHOOL TEACHERS TRAINING

    AbstractThis article explores the emergent constructivist paradigm of complexity(Morin, 1994, s/d; Lerbet 1986, 2004; Le Moigne, 2002, 2003), theepistemology of the listening/controversial (Correia, 2001) and the criticalexperientialism (Alarco, 2001a) as referential of professional competences tobe developed in initial primary teacher education capable to face the new andcontinued challenges that occur in the present society, characterized byincreasing complex transformations (Delors, 1996; Ornuda & Naval 2000;Martins, 2005). Taking the concept of professional competence (Le Boterf,1999; DeSeCo, 2002) as a key idea, a reflective paradigm of education (Ferry,1983; Schn, 1987; Zeichner, 1993, Perrenoud, 2004) is argued for. Thisparadigm surpasses the theory-practice positivist dichotomy through thearticulation of scientific-based disciplinary knowledge and contextualisedprofessional activity (Alarco, 2002, 2003; S-Chaves, 2002; Perrenoud,2002). It takes education as a self-regulating interactive process of complex,adaptable systems in confrontation: the social system that requires educationand the personal system, the subject in the process of education (Lerbet,2004).

    KeywordsTeaching professionalism; Competence; Complexity; Reflection; Autonomy

    83Para uma nova cultura profissional

  • POUR UNE NOUVELLE CULTURE PROFESSIONNELLE: UNE APPROCHE DE LACOMPLEXIT DANS LA FORMATION INITIALE DES INSTITUTEURS

    RsumDans cet article, ayant comme rfrences le paradigme mergentconstructiviste de la complexit (Morin, 1994, s/d; Lerbet 1986, 2004; LeMoigne, 2002, 2003), le paradigme de la complexification et de lpistmologiede lcoute/controverse (Correia, 2001) et lexprientialisme critique (Alarco,2001a), nous nous proposons de (re)discuter le rfrentiel de comptencesprofessionnelles dvelopper dans la formation initiale des instituteurs,capable de faire face aux nouveaux et continuels dfis que la socit,caractrise par un cadre croissant de transformations complexes,actuellement vhicule (Delors, 1996; Ornuda & Naval 2000; Martins, 2005). Enpartant dune reconceptualisation du concept de comptence professionnelle(Le Boterf, 1999; DeSeCo, 2002), nous prnons un paradigme rflexif deformation (Ferry, 1983; Schn, 1987; Zeichner, 1993, Perrenoud, 2004), ancrdans le dveloppement de nouvelles comptences professionnelles, quiamne surmonter la dichotomie positiviste thorie-pratique par le biais de lareconstruction de larticulation entre connaissance scientifique et actionprofessionnelle contextualise (Alarco, 2002, 2003; S-Chaves, 2002;Perrenoud, 2002), et lassomption de la formation comme un processusinteractif auto-rgulateur de systmes adaptables et complexes enconfrontation: le systme social, qui rclame la formation et le systmepersonnel, sujet de cette formation (Lerbet, 2004).

    Mots-clProfessionnalit des instituteurs; Comptence; Complexit; Rflexion;Autonomie

    Recebido em Dezembro/2005Aceite para publicao em Maio/2006

    84 lvaro Leito & Isabel Alarco

    Toda a correspondncia relativa a este artigo deve ser enviada para: lvaro Leito, Escola Superiorde Educao de Coimbra, Praa Heris do Ultramar, Solum, 3030-329 Coimbra, Portugal. Telefs.:934256734 e 239440367; e-mail: [email protected]