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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ KHARINA TOMAZ DE LIMA PRORROGAÇÃO DO BENEFÍCIO DE PENSÃO POR MORTE ATÉ OS 24 ANOS PARA O DEPENDENTE UNIVERSITÁRIO CURITIBA 2014

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UNIVERSIDADE TUIUTI DO PARANÁ

KHARINA TOMAZ DE LIMA

PRORROGAÇÃO DO BENEFÍCIO DE PENSÃO POR MORTE ATÉ OS

24 ANOS PARA O DEPENDENTE UNIVERSITÁRIO

CURITIBA

2014

KHARINA TOMAZ DE LIMA

PRORROGAÇÃO DO BENEFÍCIO DE PENSÃO POR MORTE ATÉ OS

24 ANOS PARA O DEPENDENTE UNIVERSITÁRIO

Trabalho de Conclusão de Curso apresentado ao Curso

de Direito da Faculdade de Ciências Jurídicas da

Universidade Tuiuti do Paraná, como requisito para

obtenção do título de Bacharel em Direito.

Orientador: Prof. Oswaldo Pacheco Lacerda Neto.

CURITIBA

2014

TERMO DE APROVAÇÃO

KHARINA TOMAZ DE LIMA

PRORROGAÇÃO DO BENEFÍCIO DE PENSÃO POR MORTE ATÉ OS

24 ANOS PARA O DEPENDENTE UNIVERSITÁRIO

Esta monografia foi julgada e aprovada para obtenção do título de Bacharel no Curso de Direito da Faculdade de

Ciências Jurídicas da Universidade Tuiuti do Paraná.

Curitiba, _________ de _______________________ de 2013.

__________________________________________________

Bacharelado em Direito

Faculdade de Ciências Jurídicas - Universidade Tuiuti do Paraná.

Orientador: Prof. Oswaldo Pacheco Lacerda Neto

Universidade Tuiuti do Paraná

Professor

Universidade Tuiuti do Paraná

Professor

Universidade Tuiuti do Paraná

AGRADECIMENTOS

Agradeço à Deus, acima de tudo, por ter me permitido chegar até aqui. Ao meu

marido, amigo e companheiro Carlos Eduardo que durante todo o curso sempre esteve

ao meu lado, e com muita paciência e dedicação me ajudou nesta caminhada. A todos

os meus familiares que acreditaram e torceram por mim. E, por fim, ao meu

orientador, Professor Oswaldo que com dedicação e confiança me orientou na

realização deste trabalho.

“A letra da lei é sempre o ponto de partida do intérprete, mas nunca é o de chegada.”

(Celso Ribeiro Bastos).

RESUMO

Trata-se da (im) possibilidade de prorrogação do benefício de pensão por morte até os

24 anos para o dependente universitário. O estudo surgiu pela preocupação da

Constituição Federal de 1988 com o tema da Previdência Social e a grande divergência

existente acerca do marco temporal para cessação do benefício de pensão por morte

aos 21 anos de idade, mesmo para o dependente universitário. Pretende-se verificar e

compreender o entendimento majoritário acerca do tema da prorrogação do benefício

de pensão por morte até os 24 anos para o dependente universitário, bem como

analisar quais são as consequências geradas diante de tal posicionamento. Para tanto o

presente trabalho baseou-se em revisão bibliográfica, obras de autores pertinentes ao

tema, estudo da legislação aplicável (constitucional, civil e previdenciário), súmulas e

princípios, bem como entendimento jurisprudencial. Com a realização do trabalho foi

possível observar que há posicionamentos em ambos os sentidos, porém com

fundamentos completamente distintos, vez que alguns defendem tão somente o

Princípio da Legalidade, enquanto outros buscam a verdadeira efetividade do Princípio

da Dignidade da Pessoa Humana, por meio de uma interpretação aberta da nossa

Constituição.

Palavras-chave: Previdência Social. Pensão por morte. Constituição Federal.

SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .................................................................................................. 07

2 HISTÓRICO DA PROTEÇÃO SOCIAL ........................................................ 09

3 DIREITO DA SEGURIDADE SOCIAL .......................................................... 12

3.1 DA SAÚDE .......................................................................................................... 12

3.2 DA PREVIDÊNCIA SOCIAL ............................................................................. 13

3.3 DA ASSISTÊNCIA SOCIAL .............................................................................. 15

4 PRINCÍPIOS DA SEGURIDADE SOCIAL .................................................... 17

5 BENEFÍCIO DE PENSÃO POR MORTE ...................................................... 19

5.1 REQUISITOS À SUA CONCESSÃO ................................................................. 20

5.2 DEPENDENTES .................................................................................................. 21

5.3 TERMO INICIAL E TERMO FINAL DO BENEFÍCIO .................................... 22

6 PRORROGAÇÃO DO BENEFÍCIO DE PENSÃO POR MORTE .............. 24

6.1 CONTROVÉRSIA JURÍDICA ............................................................................ 24

6.2 DA AUTONOMIA DO DIREITO PREVIDENCIÁRIO .................................... 25

7 PELA POSSBILIDADE DE PRORROGAÇÃO ............................................. 29

7.1 PROJETO DE LEI Nº. 6812/2010 ....................................................................... 31

8 PELA IMPOSSIBILIDADE DE PRORROGAÇÃO ...................................... 33

9 DO CONFLITO ENTRE PRINCÍPIOS .......................................................... 36

9.1 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA ................................... 36

9.2 PRINCÍPIO DA LEGALIDADE ......................................................................... 37

10 DEMOCRATIZAÇÃO DA INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL ..... 39

11 CONCLUSÃO ..................................................................................................... 44

REFERÊNCIAS ........................................................................................................ 47

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1 INTRODUÇÃO

O presente trabalho irá abordar sobre o instituto da Seguridade Social,

entendido como um conjunto de ações do Poder Público e da Sociedade que visa

assegurar os direitos relativos à saúde, à assistência Social, e à Previdência Social.

A Constituição Federal de 1988 teve grande preocupação com o referido tema,

inclusive, dedicando um capítulo específico para a Seguridade Social1. Diante disso,

inicialmente, caberá a conceituação de cada componente da seguridade social, partindo

do gênero (seguridade social), para o estudo de suas espécies (saúde, assistência social

e previdência social), buscando ressaltar a principal diferença entre estes institutos,

qual seja a necessidade ou não de contribuição.

A partir disto, pretende-se aprofundar no estudo do instituto da Previdência

Social, mais especificamente, do benefício previdenciário de pensão por morte que é

disciplinado nos artigos 74 a 79 da Lei 8.213/91, com o principal objetivo de avaliar a

possibilidade, ou não, à prorrogação do benefício de pensão por morte, para os filhos

universitários até os 24 anos.

Os benefícios previdenciários são regidos pela Lei 8.213/91, sendo que esta lei

instituiu quais são as hipóteses de cessação do benefício de pensão por morte, e nos

termos desta Lei ressalvado os casos de filhos inválidos, aqueles que completarem 21

anos, terão seu benefício automaticamente cessado.

Ocorre que o referido tema tem causado grande divergência, vez que alguns

doutrinadores entendem ser possível a prorrogação do referido benefício, em defesa ao

direito à educação, previsto em nossa Constituição Federal (artigos 205 e seguintes),

bem como aplicação ao Princípio da Isonomia. Tanto é assim que existe um Projeto de

Lei nº 6812/2010, que visa alterar o inciso II do § 2º do art. 77 da Lei nº 8.213, para

estender o direito à pensão por morte aos filhos e dependentes até os 24 anos de idade,

quando estudantes.

Contudo, atualmente predomina o entendimento pela não prorrogação do

benefício de pensão por morte até 24 anos para o dependente universitário. Tal

1 Prevista no Título VIII, capítulo II da Constituição Federal. (BRASIL, 2013, p. única).

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entendimento baseia-se fundamentalmente no Princípio da Legalidade, e nesta

perspectiva é impossível a prorrogação até os 24 anos para o dependente universitário,

pois inexiste previsão legal que autorize esta prorrogação. Ainda, após a edição da

Súmula nº 37 da TNU2, a questão se tornou pacífica perante os Tribunais, que

passaram a aplicá-la de forma absoluta, impossibilitando definitivamente a

prorrogação do benefício de pensão por morte, ainda que para o dependente

universitário.

Sob a análise de posicionamentos favoráveis à possibilidade de prorrogação do

benefício, busca-se atentar ao fato de ser o direito previdenciário um ramo autônomo

do direito, devendo ser afastada a incidência de normas de outros ramos na solução da

controvérsia aqui apresentada, como por exemplo, analogia ao instituto da pensão

alimentícia.

Ainda assim, aprofundando-se ao tema do presente trabalho observa-se a

possibilidade de análise sob uma perspectiva constitucional, avaliando a evolução dos

conceitos de Constituição traçados por Lassale, Kelsen, Hesse e Häberle, bem como

sua aplicação e eficácia ao longo dos anos.

Neste ponto, importante o reconhecimento do tema da Previdência Social

como um direito expressamente garantido pela nossa Constituição Federal em seu

artigo 6º, e ainda, o dever de observância ao Princípio da Dignidade da Pessoa

Humana a fim de assegurar por meio da prorrogação do benefício de pensão por morte

uma vida digna, com garantia de meios à sua subsistência, bem como proteção ao

direito fundamental à educação, por meio de uma interpretação aberta da Constituição

adequando o nosso ordenamento jurídico a realidade social hoje apresentada, fazendo

prevalecer um dos fundamentos da nossa República que é a existência de um

verdadeiro Estado Democrático de Direito.

2 Súmula nº 37 TNU: A pensão por morte, devida ao filho até os 21 anos de idade, não se prorroga

pela pendência do curso universitário. (BRASIL, TNU, 2013, p. única).

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2 HISTÓRICO DA PROTEÇÃO SOCIAL

A proteção social encontra suas origens desde os tempos mais remotos. A

proteção social surgiu inicialmente baseada eminentemente na ideia de

assistencialismo. Portanto, a assistência pública foi a primeira etapa de proteção social,

tempo em que os indivíduos contavam apenas com a caridade das pessoas, em especial

a caridade da própria Igreja. Num segundo momento surgiu a ideia do mutualismo,

que consistia na contribuição de um grupo fechado de indivíduos buscando uma

proteção recíproca.

Em 1601 surge na Inglaterra a Lei dos Pobres – Act Relief of the Poor, que

trouxe uma importante alteração no conceito de proteção social, pois a partir daí

passou-se a reconhecer a importância da intervenção estatal na vida daquelas pessoas

mais carentes que se encontravam em situação de vulnerabilidade, e com o passar do

tempo o direito a seguridade social apresentou-se como um direito subjetivo garantido

pelo Estado e pela sociedade. (SANTOS, 2012).

A partir da Revolução Industrial, ambos os sistemas demonstraram ser

insuficientes às necessidades dos cidadãos, e com isso, a fim de evitar uma revolta de

todos os trabalhadores, Bismark em 1883 iniciou uma série de mudanças, instituindo

diversos seguros sociais, inclusive o sistema de tríplice custeio: empregadores,

empregados e Estado. Já em 1917 o México preocupado com a proteção social inclui

em sua Carta Política de Estado o referido tema como sendo um direito social.

Posteriormente, encontramos a Constituição Alemã Weimar de 1919. Ainda, no

mesmo ano (1919) temos a instituição da Organização Internacional do Trabalho

(OIT), que tornou ainda mais clara a necessidade de criação de uma Previdência

Social.

Preocupado com a proteção social, e visando resolver a crise de 1929, o

presidente Roosevelt, buscou colocar em prática a política do New Deal, embasado na

filosofia do Welfare State (Estado do bem Estar-Social), e então, criou o Social

Securtity Act, em 1935, que mais tarde tornou-se o fundamento da própria Seguridade

Social no Brasil. Tal sistema impõe ao Estado Democrático de Direito o dever de

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assegurar a cada cidadão uma vida digna, colocando o bem-estar social acima de tudo,

independentemente de contribuição. (TSUTIYA, 2008).

Após a Segunda Guerra Mundial, houve fortes alterações no conceito da

proteção social, nascendo à preocupação em implantar este sistema de seguridade

social em todos os continentes. Então, foi neste momento que se iniciou uma busca de

implantação de um sistema de proteção social que alcançasse toda a sociedade, e não

apenas a classe trabalhadora. Foi com o Plano Beveridge3 apresentado em 1942

(Inglaterra) que nasceu a noção de sistema universal, abrangendo toda a população,

pois até então conforme Santos (2012, p.32): “Ficavam sem cobertura os trabalhadores

“por conta própria”, isto é, sem vínculo de emprego que constituíam a parcela da

massa pobre da população, justamente a que mais precisava de proteção do Estado”.

Sobre os dois sistemas até então existentes, beveridgeano (1942), e o

bismarckiano (1883) é importante ressaltar que ambos foram adotados em todo o

mundo, mas não podendo ignorar a diferença existente entre o fundamento de cada um

deles. Tsutiya (2008, p.7) explica que: “O beveridgeano é universal, protege todos os

cidadãos. Por outro lado, o modelo bismarckiano nada mais é do que um seguro social,

protegendo somente aqueles que contribuem para o sistema. Quem não tem

disponibilidade financeira fica excluído”.

No Brasil, somente a partir do século XX passou a se ter preocupação com a

Previdência Social, pois antes disso existia uma previsão constitucional sobre a

matéria, porém apenas em alguns diplomas isolados. Desta forma, nacionalmente,

reconhece-se como marco inicial da Previdência Social a publicação do Decreto

Legislativo n°. 4.682 de 24.01.1923 (Lei Eloy Chaves), que criou as Caixas de

Aposentadoria e Pensões nas empresas de estradas de ferro existentes, mediante

contribuições dos trabalhadores.

Ainda, a partir da Constituição Federal de 1988, o tema Seguridade Social

sofreu significativas alterações, criando-se um capítulo específico destinado a

3 O Plano Beveridge (1942) tinha por objetivo: (a) unificar os seguros sociais existentes; (b)

estabelecer o princípio da universalidade, para que a proteção se estendesse a todos os cidadãos e não

apenas aos trabalhadores; (c) igualdade de proteção; (d) tríplice forma de custeio, porém com

predominância do custeio estatal. O Plano Beveridge tinha cinco pilares: (a) necessidade; (b) doença;

(c) ignorância; (d) carência (desamparo); (e) desemprego. (MARTINS, 2010, p. 5).

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regulamentar o tema. Foi a partir da Carta Magna, que se oficializou a independência

do sistema da Seguridade Social, quando o artigo 201 da Constituição (BRASIL, 2013,

p. única) assim disciplinou: “A previdência social será organizada sob a forma de

regime geral, de caráter contributivo e de filiação obrigatória, observados critérios que

preservem o equilíbrio financeiro e atuarial.”

Neste momento, incluiu como dever do Estado não apenas atuação no campo

da Previdência Social, mas também o dever de atuar simultaneamente nas áreas de

saúde, assistência e previdência. Importante observar que o direito a Previdência

Social seguia a filosofia do modelo bismarckiano (seguro social), enquanto que os

direitos à saúde e assistência social são tidos como direito a seguridade social

propriamente dita, encontrando fundamento no modelo beveridgeano.

Após a promulgação da Constituição Federal, em 1991 foi criado o Instituto

Nacional do Seguro Social (INSS), que passou a ter as atribuições que antes eram do

INPS e IAPAS. Posteriormente, surgiram as Leis 8212/91 que trata do custeio da

seguridade social, e a Lei 8213/91 que disciplina os benefícios e serviços da

previdência. Ainda, no ano de 1993 foi criada a Lei 8.742/93 – Lei Orgânica da

Assistência Social - LOAS, esta sim com nítido caráter de Seguridade Social, pois

regulamenta a Assistência Social. E, por fim, em 15/12/98 foi promulgada no Brasil a

Emenda Constitucional nº. 20/98, que reformou várias normas da Previdência Social.

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3 DIREITO DA SEGURIDADE SOCIAL

A seguridade Social deve ser compreendida como um dos direitos sociais

garantidos pela nossa Constituição Federal, sendo esta composta pelo direito à saúde,

assistência social e pela previdência social.

Conforme regra estabelecida pelo artigo 6º, da Constituição Federal de 1988:

Art. 6. São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, a moradia, o

lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à

infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição.

(BRASIL, 2013, p. única).

Sobre o tema, Lenza aduz que:

Assim, os direitos sociais, direitos de segunda dimensão, apresentam-se

como prestações positivas a serem implementadas pelo Estado (Social de

Direito) e tendem a concretizar a perspectivas de uma isonomia substancial e

social na busca de melhores e adequadas condições de vida, estando, ainda,

consagrados como fundamentos da Republica Federativa do Brasil (art. 1.º,

IV, da CF/88). (2011, p. 974).

Ainda, segundo a convenção nº. 102 da Organização Internacional do

Trabalho (OIT), a Seguridade Social, pode ser entendida como meio de proteção da

sociedade mediante uma série de medidas públicas naqueles momentos em que

desaparece qualquer possibilidade de subsistência por parte do cidadão, seja em razão

de uma enfermidade, invalidez, velhice, etc.

A seguridade social compreende, nos termos do artigo 194 da Constituição

Federal um “conjunto integrado de ações de iniciativa dos Poderes Públicos e da

sociedade, destinados a assegurar os direitos relativos à saúde, à previdência e à

assistência social”. (BRASIL, 2013, p. única).

3.1 DA SAÚDE

A saúde em conformidade com o estabelecido no artigo 196 da Constituição

Federal é direito de todos e dever do Estado, que deve garantir meios de redução do

13

risco de doenças e outros agravos, mediante políticas sociais e econômicas o acesso

universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Santos conceitua o direito a saúde como:

Trata-se de direito subjetivo de todos quantos vivem no território nacional,

que tem o Estado (Poder Público) como sujeito passivo, eis que contempla

todos os que tiverem a sua saúde afetada, independente de filiação e de

contribuição para o financiamento da seguridade social. (2012, p. 89).

Assim, a saúde diferentemente do direito à previdência social, independe de

contribuição, seguindo a política pública de Assistência Social, observando-se como

característica fundamental o Princípio da Universalidade em sua participação. Isto

porque o direito a saúde implica em cobertura e atendimento para todos os cidadãos,

sem necessidade de que o indivíduo preencha qualquer requisito.

Desta forma, o direito a saúde não caracteriza uma contraprestação do Estado,

vez que inexiste necessidade de filiação ou até mesmo contribuição, cabendo ao

Estado o dever de intervir em qualquer situação que o indivíduo necessite deste

serviço, independentemente da capacidade contributiva do indivíduo, sendo como já

visto um direito social expressamente garantido pela nossa Constituição Federal, que

visa também assegurar a efetividade do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana,

princípio orientador de um Estado Democrático de Direito, também expressamente

previsto no artigo 1.º, III da CF/88.

3.2 DA PREVIDÊNCIA SOCIAL

A Previdência Social insere-se na ideia de seguro social (modelo

bismarckiano) que visa garantir meios de manutenção para o segurado e para sua

família, no momento em que ele não pode mais exercer nenhuma atividade laborativa,

seja por doença, invalidez, gravidez, prisão, morte ou velhice. É forma de garantir um

rendimento naquele momento de dificuldade, onde o trabalhador não possa por seu

próprio esforço garantir a manutenção sua e de sua família. Assim, a Previdência

Social oferece para aqueles que são segurados, por meio de diversas espécies de

benefícios, uma forma de proteção.

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Para Martinez, a previdência social:

pode ser concebida como a técnica de proteção propiciadora dos meios

indispensáveis à manutenção do individuo (e dos seus dependentes) –

quando este não pode obtê-los ou não é sociavelmente desejável auferi-los

pessoalmente mediante o trabalho. (2009, p. 16).

Assim, a previdência social se faz presente naqueles momentos de maior

dificuldade do indivíduo, em razão de incapacidade laborativa, idade avançada, ou até

mesmo a morte. Entretanto, tal sistema só tem efetividade mediante contribuição dos

segurados.

Para Castro e Lazzari, a Previdência Social tem suma importância, pois é tida

como um mecanismo capaz de estabelecer a justiça social por meio de uma

redistribuição de renda. Vejamos:

Assim, cabe à Previdência Social também a incumbência da redução das

desigualdades sociais e econômicas, mediante uma política de redistribuição

de renda, retirando maiores contribuições das camadas mais favorecidas e,

com isso, concedendo benefícios a populações de mais baixa renda. Por esta

razão, defende-se que a Previdência Social deva ser universal, ou seja,

abranger, num só regime, toda a população economicamente ativa, exigindo-

se de todos contribuições na mesma proporção e, em contrapartida, pagando-

se benefícios e prestando-se serviços de igual magnitude, de acordo com a

necessidade de cada um – conforme a noção de seletividade das prestações

previdenciárias. Tem-se aí uma das finalidades da Previdência Social, qual

seja, o alcance da Justiça Social. (2012, p. 55).

Desta forma, observa-se que para o alcance da verdadeira Justiça Social é

necessário muito mais do que o reconhecimento do ser humano pelo seu próprio

trabalho, é preciso preocupação com todos os indivíduos, independentemente da sua

condição social, a fim de atender a todos nos momentos mais distintos da vida, em

especial àqueles onde não há possibilidade de subsistência por força própria.

Tsutiya (2008, p. 207), afirma a partir do que dispõe o artigo 201 da

Constituição Federal que “somente aqueles que contribuírem para o sistema terão

direito aos benefícios previstos. É a filosofia bismarckiana de seguro social, que exclui

aqueles que não possuem disponibilidade financeira para participar do sistema”.

O caráter contributivo pressupõe o pagamento de contribuições pelo segurado

destinado ao custeio do sistema. Assim, somente adquire a qualidade de segurado

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aquele que contribui. Ainda, a filiação é obrigatória a fim de que todos possam

mediante contribuição ter cobertura previdenciária. Portanto, somente é considerado

segurado da Previdência Social aquele que contribui para o sistema, diferentemente do

que ocorre com os direitos à Saúde e a Assistência Social, que independem de

contribuições, a Previdência Social só aplica-se aos contribuintes do Regime Geral da

Previdência Social (RGPS).

3.3 DA ASSISTÊNCIA SOCIAL

A assistência social por sua vez, nos termos do artigo 203 da Constituição

Federal, “será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à

seguridade Social”. (BRASIL, 2013, p. única).

A Lei 8.743, de 07 de dezembro de 1993 dispõe sobre a organização da

Assistência Social, prevendo-a como um direito de todo e qualquer cidadão, sem

necessidade de contribuição, de ter assegurado pelo próprio Estado mediante um

conjunto de ações de iniciativa pública e da sociedade o direito ao mínimo existencial,

garantindo à todos os cidadãos atendimento às suas necessidades mais básicas.

Portanto, a assistência social é destinada àquelas famílias mais carentes, como

forma de diminuir as desigualdades sociais, através da integração e inclusão destas

famílias à sociedade, visando alcançar a justiça social, por ações tomadas pelo poder

público aliado aos particulares.

Sobre o instituto da Assistência Social, Martinez, assim nos ensina:

A assistência social é técnica protetiva estatal associada à participação da

iniciativa privada, com prestações condicionadas aos recursos disponíveis

possibilitados por contribuições sociais ou tributos arrecadados pelos entes

políticos. Não custeada pelos meios próprios da previdência social –

destinados a benefícios – nem mesmo sob forma de isenção da exigibilidade

fiscal. (2009, p. 39).

A Constituição Federal em seu artigo 203 estabelece quais os objetivos da

Assistência Social, merecendo transcrição:

I – a proteção à família, à maternidade, à infância, à adolescência e à velhice;

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II – o amparo às crianças e adolescentes carentes;

III – a promoção da integração ao mercado de trabalho.

IV – a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a

promoção de sua integração à vida comunitária;

V – a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora

de deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover a

própria manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser

lei. (BRASIL, 2013, p. única).

Desta forma, a assistência social pode ser entendida como meio de garantir

acesso aos direitos sociais à todos os indivíduos, pelo menos aqueles tidos como

essenciais a dignidade da pessoa humana.

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4 PRINCÍPIOS DA SEGURIDADE SOCIAL

Os princípios da Seguridade Social estão intimamente ligados aos seus

próprios objetivos, pois visam dar efetividade aos três aspectos da seguridade social,

quais sejam: o direito à saúde, à previdência e assistência social.

Tais princípios estão disciplinados no parágrafo único do artigo 194 da

Constituição Federal, merecendo transcrição:

A seguridade social compreende um conjunto integrado de ações de

iniciativa dos Poderes Públicos e da sociedade, destinadas a assegurar os

direitos relativos à saúde, à previdência e à assistência social.

Parágrafo único. Compete ao Poder Público, nos termos da lei, organizar a

seguridade social, com base nos seguintes objetivos:

I - universalidade da cobertura e do atendimento;

II - uniformidade e equivalência dos benefícios e serviços às populações

urbanas e rurais;

III - seletividade e distributividade na prestação dos benefícios e serviços;

IV - irredutibilidade do valor dos benefícios;

V - eqüidade na forma de participação no custeio;

VI - diversidade da base de financiamento;

VII - caráter democrático e descentralizado da gestão administrativa, com a

participação da comunidade, em especial de trabalhadores, empresários e

aposentados.

VII - caráter democrático e descentralizado da administração, mediante

gestão quadripartite, com participação dos trabalhadores, dos empregadores,

dos aposentados e do Governo nos órgãos colegiados. (BRASIL, 2013, p.

única).

É a partir destes princípios que o sistema da seguridade social busca se tornar

efetivo na proteção dos cidadãos, buscando nestas características essenciais meios

capazes de garantir segurança e bem-estar para cada um dos participantes desta

relação. Este conjunto de princípios aplica-se a toda a Seguridade Social, porém

conforme nos ensina Tavares (2012, p. 2), “um princípio da seguridade social pode

incidir com mais ou menos força sobre as áreas específicas da saúde, da assistência

social e da previdência social”. Portanto, há que se reconhecer que alguns princípios

exercem maior influência do que outros a depender de qual aérea da seguridade está

disposto a proteger.

Ainda, conforme Castro e Lazzari (2012), além dos princípios aplicáveis à

Seguridade Social é necessário observar os Princípios atinentes à Previdência Social

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que estão expressamente previstos em nossa Constituição Federal, em seu artigo 201,

merecendo destaque os seguintes: Filiação Obrigatória; Caráter contributivo;

Equilíbrio financeiro e atuarial; Garantia do benefício mínimo; Preservação do valor

real dos benefícios; Indisponibilidade dos direitos dos beneficiários, dentre outros.

Quanto aos princípios da Previdência Social, cabe lembrar que também estão

elencados no artigo 3º da Lei 8.212 e no artigo 2º da Lei 8.213 de 24 de julho de 1991.

Tais princípios são praticamente os mesmos que orientam a Seguridade Social.

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5 BENEFÍCIO DE PENSÃO POR MORTE

O evento morte também se encontra no rol de situações em que a previdência

social pretende proteger o segurado, razão pela qual criou-se o benefício de pensão por

morte.

O benefício previdenciário da pensão por morte é assim previsto na Lei nº

8.213/1991, in verbis:

Art. 74. A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do

segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data:

I - do óbito, quando requerida até trinta dias depois deste;

II - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso

anterior;

III - da decisão judicial, no caso de morte presumida. [...] (BRASIL, 2013, p.

única).

O benefício de pensão por morte é definido por Ibrahim como:

A pensão por morte é benefício direcionado aos dependentes do segurado,

visando à manutenção da família, no caso da morte do responsável pelo seu

sustento. O tema é tratado na Lei nº 8213/91, arts. 74 a 79 e no RPS, arts.

105 a 115. Este benefício será devido ao conjunto de dependentes do

segurado que falecer, aposentado ou não. (2010. p. 693).

A pensão por morte é espécie de benefício pago aos dependentes do segurado

que falecer. Tal benefício tem como marco inicial a morte do segurado, sendo devido

este benefício apenas se o falecido for segurado da Previdência Social e possuir

qualidade de segurado na data do óbito.

O benefício de pensão por morte visa a manutenção da família, tendo em vista

a morte daquele que era tido como responsável pelo seu sustento. Assim, a concessão

do referido benefício se justifica na medida em que ao falecer, o sujeito deixa seus

familiares sem meios de gerar sua própria manutenção.

Portanto, o valor pago na concessão do referido benefício muitas vezes torna-

se a única fonte de renda da família, capaz de proporcionar aos dependentes deste

segurado que faleceu, o direito a uma vida digna, sem privações aos benefícios que

antes eram garantidos pelo próprio segurado através do seu trabalho.

20

5.1 REQUISITOS À SUA CONCESSÃO

Apresentam-se como requisitos para concessão do benefício de pensão por

morte: a) morte do segurado b) existência de dependentes c) qualidade de segurado do

de cujus, ao tempo do óbito.

O benefício da pensão por morte é decorrente da configuração de elementos

referentes a duas relações jurídicas distintas. Com efeito, para que se faça presente o

direito à percepção de pensão em decorrência de falecimento de uma pessoa, mister se

faz, primeiramente, que haja uma relação jurídica de vinculação entre tal pessoa, que é

o segurado de cujus, e o ente previdenciário responsável pelo suporte do benefício (no

caso, o INSS). Em segundo momento, indispensável também que esteja presente outra

relação jurídica, desta feita entre o(a) segurado(a) e o pretenso dependente ou

beneficiário, a caracterizar a relação de dependência. Configurados ambos os

requisitos, tem-se o direito subjetivo ao benefício previdenciário da pensão por morte.

Registre-se que a carência (IBRAHIM, 2010, p. 574), “número de

contribuições mensais mínimas que o segurado deve efetivar para ter direito ao

benefício” no caso do benefício de pensão por morte é dispensada conforme

disposição do artigo 26, inciso I, da Lei 8.213/91.

Ainda, para que efetivamente o trabalhador esteja protegido por tal regime, é

necessário que exista filiação com o Regime Geral da Previdência Social (RGPS), a

fim de estabelecer esta relação jurídica com a Previdência Social.

A filiação dos segurados ocorre de forma diferente para cada classe de

trabalhador, sendo para os trabalhadores celetistas automática, bastando o exercício da

atividade laborativa remunerada, enquanto que para outros é necessário realizar a

inscrição (ato formal) perante o INSS, como ocorre nos casos de trabalhador

contribuinte individual ou facultativo.

Desta forma, após a filiação perante o RGPS nasce uma relação jurídica entre

o trabalhador e o Estado, onde um se compromete a pagar as contribuições, e o outro a

fornecer quando necessário uma fonte de renda a fim de manter o contribuinte e sua

família.

21

5.2 DEPENDENTES

Conforme visto acima, a pensão por morte é o benefício a que têm direito os

dependentes do segurado. Conforme aduz Martinez:

Os dependentes não são contribuintes diretamente para o custeio da

previdência social. São assim designados por subordinarem-se

economicamente ao segurado, de forma mútua, parcial ou total. A legislação

os enumera, vedado o acréscimo pessoas ali não contempladas. A

dependência econômica e nitidamente econômico-financeira e sem natureza

moral. (2003, p.178).

Inicialmente, cabe ressaltar que os dependentes são divididos em três grupos,

nos termos do artigo 16 da Lei 8.213/91:

São beneficiários do Regime Geral de Previdência Social, na condição

dependentes do segurado:

I – o cônjuge, a companheira, o companheiro e o filho, de qualquer

condição, menor de 21 (vinte e um) anos ou invalido;

II – os pais;

III – o irmão não emancipado, de qualquer condição, menor de 21 (vinte e

um) anos ou invalido;.

§ 4º A dependência econômica das pessoas indicadas no inciso I é presumida

e a das demais deve ser comprovada. (BRASIL, 2013, p. única).

Havendo dependentes de um grupo, os demais não têm direito ao benefício.

Cada classe de dependentes concorre em igualdade de condições, sendo devido para

cada um destes uma cota igual. Quanto a primeira classe a dependência econômica é

presumida, enquanto que para as demais será necessário provar esta dependência.

Para Vianna:

A presunção de dependência econômica, na primeira classe, é absoluta,

dispensando qualquer meio de prova. Não importa se o cônjuge, por

exemplo, dependia ou não economicamente do segurado. Essa presunção

não admite prova em contrário. Importante registrar que os casais

homossexuais integram a classe preferencial de dependentes, portanto, não

necessitam comprovar dependência econômica, como muitas vezes exige o

INSS. Em relação às demais classes, a dependência econômica deve ser

comprovada. (2012, p. 439).

22

Destaca-se também que a Ação Civil Pública nº 2000.71.00.009347-0,

reconheceu o direito ao companheiro ou a companheira do mesmo sexo de segurado

inscrito no Regime Geral da Previdência Social, como dependentes integrantes da

primeira classe na concessão dos benefícios de pensão por morte ou auxílio-reclusão, e

portanto, também neste caso haverá dependência presumida.

5.3 TERMO INICIAL E TERMO FINAL DO BENEFÍCIO

Quanto ao momento inicial do benefício de pensão por morte, cabe observar a

redação do artigo 74 da Lei nº 8213/91 que assim dispõe:

Art. 74. A pensão por morte será devida ao conjunto dos dependentes do

segurado que falecer, aposentado ou não, a contar da data:

I - do óbito, quando requerida até trinta dias depois deste;

II - do requerimento, quando requerida após o prazo previsto no inciso

anterior;

III - da decisão judicial, no caso de morte presumida. (BRASIL, 2013, p.

única).

Portanto, a primeira data a ser levada em consideração para efeito de início do

benefício, será a data do óbito. Com isso a data do início do recebimento do benefício

irá ser idêntica ao do falecimento do segurado. Caso o direito seja postulado após 30

(trinta) dias do óbito do segurado, a data do início do recebimento do benefício será

aquela em que o benefício foi requerido pelos dependentes. Em caso de morte

presumida, será aquela em que a decisão judicial assim determinar.

Já quanto ao momento em que ocorre a cessação do benefício de pensão por

morte é preciso observar o que dispõe o § 2º do artigo 77 da Lei 8.213/91:

Art. 77. A pensão por morte, havendo mais de um pensionista, será rateada

entre todos em parte iguais.

[...] § 2º A parte individual da pensão extingue-se:

I - pela morte do pensionista;

II - para o filho, a pessoa a ele equiparada ou o irmão, de ambos os sexos,

pela emancipação ou ao completar 21 (vinte e um) anos de idade, salvo se

for inválido ou com deficiência intelectual ou mental que o torne absoluta ou

relativamente incapaz, assim declarado judicialmente;

23

III - para o pensionista inválido pela cessação da invalidez e para o

pensionista com deficiência intelectual ou mental, pelo levantamento da

interdição. (BRASIL, 2013, p. única).

Assim, é possível perceber que a regra temporal é nítida quando diz que ao

completar 21 anos extingue-se o direito a pensão por morte, sem qualquer ressalva

quanto ao filho universitário.

24

6 PRORROGAÇÃO DO BENEFÍCIO DE PENSÃO POR MORTE

6.1 CONTROVÉRSIA JURÍDICA

Conforme visto acima, uma das causas de cessação do benefício de pensão por

morte é a questão da idade, sendo previsto que ao completar 21 anos ocorrerá a

cessação do benefício previdenciário.

Note-se que a única ressalva é feita ao filho inválido, que ainda que maior de

21 anos continuará percebendo o referido benefício, pois diante de sua incapacidade

presume-se permanente sua dependência econômica.

Assim, diante disso entende-se que o dependente ao completar 21 anos deixa

de ser dependente do segurado instituidor do benefício, o que vem sendo amplamente

discutido, por considerar tal previsão legal não condizente com a realidade social.

Cabe uma maior reflexão a respeito do tema, sendo necessário avaliar quais os

fundamentos utilizados na defesa da cessação do benefício, e também, aqueles que

acreditam pela possibilidade de extensão do benefício de pensão por morte para além

dos 21 anos, no caso de dependente universitário.

Registre-se que a alteração da maioridade civil4 em nosso País, não trouxe

qualquer influência para o Direito Previdenciário, que manteve o limite de 21 anos de

idade. Contudo, após esta alteração observa-se que a Lei Previdenciária ficou sem

qualquer critério para a manutenção da idade de 21 (vinte e um) anos. Ainda assim, no

direito civil, diferentemente do que ocorre com o direito previdenciário a pensão

alimentícia é mantida até os 24 anos, ou ainda, até a conclusão de ensino superior.

No que tange a possibilidade de prorrogação do benefício de pensão por morte

até 24 anos encontramos duas correntes, uma que defende o Princípio da Legalidade e

não admite a prorrogação do benefício, vez que inexiste previsão legal autorizando tal

prorrogação. E, ainda, aqueles que acreditam na possibilidade de prorrogação do

benefício previdenciário pautando-se em princípios constitucionais e sua aplicação não

apenas de forma isolada.

4 Artigo 5º, da Lei nº. 10. 406/02 (Código Civil).

25

6.2 DA AUTONOMIA DO DIREITO PREVIDENCIÁRIO

Antes de adentrar na análise específica do presente trabalho, sobre a (im)

possibilidade de prorrogação do benefício de pensão por morte até os 24 anos para o

dependente universitário, cumpre tecer algumas observações no tocante à possibilidade

ou não de aplicação de normas e princípios de outros ramos do direito a fim de

solucionar a controvérsia jurídica aqui existente.

Para tanto se faz necessário reconhecer que todo nosso ordenamento jurídico é

pautado em nossa Constituição Federal, norma que se reveste de superioridade, sendo

sua supremacia e superioridade inquestionáveis, razão pela qual nenhuma outra norma

pode ser incompatível com a Constituição do Estado, devendo sempre buscar a

coerência de todo nosso sistema jurídico.

Por tal razão a Constituição Federal é reconhecida como a Lei Fundamental e

Suprema do nosso Estado, tendo como objetivo principal a efetividade de um Estado

Democrático de Direito. No entanto, existem outras normas jurídicas, de cunho

infraconstitucional, que apesar de consideradas inferiores à Constituição, são de

extrema importância na realização de um estado mais justo.

É também este o sentido do direito previdenciário, ramo do direito público,

que tem como objeto de estudo a Seguridade Social, possuindo toda sua estrutura

assentada na Constituição, não devendo exceder os limites ali impostos, servindo

acima de tudo como instrumento para preservação da dignidade da pessoa humana,

bem como meio de redução das desigualdades sociais.

No entanto, em que pese a intima ligação existente entre o direito

previdenciário e a própria Constituição Federal, é preciso ressaltar a autonomia deste

ramo do direito, vez que se baseia em normas e princípios próprios. Assim, o que se

observa é que as relações provenientes deste ramo do direito exigem um tratamento

especial, pois caracterizam relações muito peculiares, específicas e complexas,

preocupadas com o liame entre o contribuinte e o Estado, e, portanto, conforme aduz

Castro e Lazzari (2012, p. 84): “há que se reconhecer seus princípios diferenciados dos

26

demais ramos do Direito, bem como a tipicidade das relações jurídicas a serem

normatizadas, únicas no aspectro da ordem jurídica.”

Neste mesmo sentido, veja-se o entendimento de Ibrahim:

A autonomia do Direito Previdenciário é consequência do conjunto de

princípios jurídicos próprios deste ramo, além do complexo de normas

aplicáveis a este segmento. Pode-se, ainda, encontrar conceitos jurídicos

exclusivos do Direito Previdenciário, como, por exemplo, o salário-de-

benefício ou o salário-de-contribuição, os quais sãos estranhos a outros

ramos do direito. (2010, p. 156).

Sobre o reconhecimento da autonomia do direito previdenciário atenta-se para

sua maneira de realização, pois os métodos deste ramo do direito distanciam-se dos

demais ramos da ciência jurídica, vez que diferentemente de outras relações, como por

exemplo, na seara do direito privado, aqui a relação jurídica se estabelece de forma

compulsória, sendo que o simples fato de o indivíduo realizar alguma atividade

laborativa já o enquadra como segurado, independentemente da sua manifestação de

vontade, igualmente ocorre com o ente previdenciário, que com a configuração desta

relação jurídica já tem todo um rol de atribuições pré-estabelecidas pela lei. (CASTRO

e LAZZARI, 2012).

Destaque-se que a autonomia ora verificada não significa a completa exclusão

dos demais ramos do direito, já que é necessário considerar a vinculação existente

entre todos os ramos do direito, que constantemente sofrem influências de outras áreas.

Tanto é assim, que sobre o tema de prorrogação do benefício de pensão por morte até

24 anos para o dependente universitário, observa-se grande incidência de normas do

direito civil. Grande parte dos juristas visam uma comparação do instituto da pensão

por morte ao da pensão alimentícia, sob fundamento de que há muita proximidade

entre ambas, pois apesar de tratar-se de institutos distintos, o que se busca em ambos

os institutos é a preservação econômica do dependente ou alimentando, a fim de

atender as necessidades essenciais.

É diante de tais fundamentos que muitos acreditam ser impossível realizar

tratamento distinto entre o filho que recebe o benefício previdenciário de pensão por

27

morte, apenas até 21 anos de idade, e aquele filho que recebe a pensão alimentícia, em

que prevalece entendimento de pagamento até os 24 anos de idade.

Tal entendimento, por aplicação de argumentos de outros ramos do direito,

foram também utilizados na fundamentação dos seguintes julgados:

APELAÇÃO. PREVIDÊNCIA PÚBLICA. AÇÃO ORDINÁRIA.

RESTABELECIMENTO DE PAGAMENTO DE PENSÃO. FILHO

ESTUDANTE UNIVERSITÁRIO. POSSIBILIDADE. I - A Lei Municipal

não prevê a extensão do benefício previdenciário ao filho não-inválido até os

vinte e quatro anos, enquanto estudante de ensino superior. Todavia, referida

extensão, em certa medida, vem prevista em diversas ordens legais; a

começar pela Lei 8.112/80 (do regime jurídico dos servidores públicos civis

da União), que no artigo 197 considera como dependente econômico do

servidor, para fins de percepção de salário família, o filho maior até vinte e

quatro anos, desde que estudante; também o art. 35, parágrafo 1º da Lei

9.250, que trata do Imposto de Renda Pessoa Física; no plano estadual, o

art. 9º, parágrafo 3º da Lei 7.672/82. II - A educação é direito de todos e

dever tanto do Estado quanto da família (CF- art. 205); para além disso, a

Carta Política eleva a educação ao nível dos direitos fundamentais, quando a

concebe como direito social (art. 6º), imbricado no princípio da dignidade da

pessoa humana. Portanto, se dever do Estado, a este cumpre prestações

estatais; se da família, por igual cumpre prover. E como a pensão

previdenciária tem por finalidade suprir a falta do provedor, não é demasia,

ao contrário, é da lógica que o sistema acuda o dependente até completar

vinte e quatro anos, em ordem de concluir sua formação universitária.

Afinal, a contribuição previdenciária tem esse propósito, dentre outros.Apelo

desprovido. Unânime. (TJRS – Apelação Civ. nº. 70035852730 – Des. Rel.

Genaro José Baroni Borges. Publicado em 07/06/2010).

CONSTITUCIONAL. ADMINISTRATIVO. PENSÃO ESTATUTÁRIA.

CANCELAMENTO. FILHA MAIOR ESTUDANTE UNIVERSITÁRIA.

PRORROGAÇÃO ATÉ 24 ANOS. CABIMENTO. 1. [...].

2. Uma vez que o fundamento do benefício securitário, pensão, é a garantia

da continuidade do provimento dos dependentes do segurado/funcionário

após o evento de sua morte, a tal desiderato deve ser dado o mais amplo

sentido, propiciando o amparo de relevantes valores a que faz alusão a Carta

Federal de 1988, dentre eles a educação (art. 205). 3. A pretensão ao

recebimento de pensão estatutária, até que a autora complete 24 anos, de

forma que possa concluir seu estudo universitário, mostra-se plenamente

compatível com o espírito da atual Constituição Federal, não havendo,

portanto, afronta a qualquer dos princípios incutidos pelo seu art. 37, apesar

de o art. 217 da Lei 8.112/90 não possuir previsão para tanto. 4. A própria

Lei 8.112/90, em seu art. 197, considera como dependente econômico do

servidor, para fins de percepção de salário-família, o filho maior, até 24

anos, desde que seja estudante. A caracterização, como dependente, do filho

estudante até os 24 anos, também aparece no parágrafo 1º do art. 35 da Lei

9.250/95, legislação que versa sobre o imposto de renda. 5. Da mesma

forma, se a Medida Provisória nº 2.215-10/2001, legislação direcionada para

os militares, prevê o pensionamento dos filhos maiores estudantes

universitários até os 24 anos, por analogia, não deveria se opor a

28

Administração em estender a pensão da autora pelo simples fato de que seu

benefício está subordinado a regime jurídico distinto, em nítida afronta ao

princípio constitucional da isonomia. 6. (...) (TRF2, AC 2005.02.01.010920-

6, Relatora Juíza Federal MARIA ALICE PAIM LYARD, OITAVA

TURMA ESP., julgado em 21/11/2006, publicado em 28/11/2006).

Tais decisões encontram respaldo no Princípio da Isonomia, aplicando outros

diplomas legais, como no caso a Lei n.º 9295/95, que em seu §1º do artigo 35, permite

a dedução do imposto de renda para dependente estudante até o limite de 24 anos, e

ainda, a Lei nº 3.765/60, que disciplina as pensões militares, possibilitando em seu

artigo 7º, inciso I, alínea d, a manutenção do benefício até vinte e quatro anos de idade

para os dependentes, se estudantes universitários.

Ora, é plenamente aceitável que o direito previdenciário sofra influência de

outros ramos do direito, afinal, trata-se de um ordenamento jurídico harmônico.

Todavia, deve ser preservada sua autonomia, reconhecendo-se a relevância de suas

relações, de suas normas e princípios singulares, que foram criados com objetivo

próprio, sendo que somente o reconhecimento desta autonomia do direito

previdenciário é capaz de satisfazer eventuais conflitos.

Veja-se o direito civil busca estudar as relações entre particulares, onde há

prevalência do Princípio da autonomia da vontade e o direito previdenciário por sua

vez estuda a relação derivada da lei, compulsória existente entre o contribuinte e o ente

arrecadador.

Desta forma, o que se procura é apenas o reconhecimento do direito

previdenciário como ramo autônomo do direito, sendo que isto não implica no seu

completo isolamento, já que o direito é tido como uma ciência una, com normas

jurídicas que se relacionam, apenas busca afastar a ideia de que os conceitos de um

ramo jurídico diverso prevaleçam sobre o ramo do direito previdenciário.

Por fim, é possível afirmar que havendo conflito de interesses, é indispensável

uma ponderação, e neste momento em que pese todo o ordenamento jurídico existente,

a Constituição Federal mostra-se como a melhor saída possível, pois é dela que emana

todos os fundamentos e objetivos do Estado Democrático de Direito, e, portanto, é a

norma capaz de acima de tudo atingir os ideais de igualdade e justiça social,

fundamentos também do próprio direito previdenciário.

29

7 PELA POSSIBILIDADE DE PRORROGAÇÃO

Há quem defenda pela possibilidade de flexibilização da regra estabelecida

pelo § 2º, do artigo 77, inciso II, da Lei 8.213/91, que determina a cessação do

benefício de pensão por morte para o filho que completar 21 anos de idade.

Assim dispõe o mencionado dispositivo legal:

Art. 77. [...] § 2º A parte individual da pensão extingue-se:

[...]

II - para o filho, a pessoa a ele equiparada ou o irmão, de ambos os sexos,

pela emancipação ou ao completar 21 (vinte e um) anos de idade, salvo se

for inválido; [...] (BRASIL, 2013, p. única).

Comentando esse artigo, Martinez explica que até o ano de 2009 a questão da

extensão da maioridade até 24 anos ou 25 anos para os estudantes universitários estava

em aberto. Todavia, para o autor “Tecnicamente, seria distinguir pessoas já

socialmente distinguidas (aquela minoria que chega às faculdades).” (2009, p.146).

Contudo, defendendo a natureza assistencial do benefício de pensão por

morte, encontramos o seguinte julgado do Tribunal Regional Federal da 3ª Região, que

no ano de 2010 possibilitou a manutenção do benefício até 24 anos em decorrência dos

estudos universitários, leia-se:

PENSÃO POR MORTE - DEPENDÊNCIA ECONÔMICA - REVISÃO –

DEFERIMENTO - Previdenciário - Pensão por morte - Filho maior de 21

anos - Estudante de curso técnico ou superior - Dependência econômica -

Manutenção do benefício. É de ser mantido o pagamento de pensão por

morte ao filho maior de 21 anos de idade até a conclusão do curso técnico ou

superior que esteja freqüentando ou até completar 24 anos, considerando a

proteção social a que se destina o benefício em questão. Apelação da

impetrante provida. (TRF-3ª Região - 10ª T.; ACi nº 0000985-

08.2009.4.03.6119; Mogi das Cruzes-SP; Rel. Des. Federal Diva Malerbi; j.

22/6/2010; v.u.).

Ainda, no mesmo sentido, vejam-se:

PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO DE INSTRUMENTO. PENSÃO POR

MORTE. DEPENDENTE MAIOR DE 21 ANOS. ESTUDANTE

UNIVERSITÁRIO. PRORROGAÇÃO DO BENEFÍCIO ATÉ OS 24 ANOS

DE IDADE. 1. É cabível a prorrogação do benefício previdenciário de

pensão por morte até que o dependente complete 24 anos de idade, na

30

hipótese de ser estudante de curso universitário. Precedente. (TRF da 4ª

Região. AGA 149033/SC. Rel. Des. Federal Nylson Paim de Abreu. DJU

22.10.2003, p. 592).

CONSTITUCIONAL E ADMINISTRATIVO. PENSÃO. ESTUDANTE

UNIVERSITÁRIA. MAIORIDADE. DIREITO. 1.Tendo como norte o

direito à educação, dever do Estado e da família, deve ser resguardado o

direito à percepção de pensão, ainda que o seu beneficiário tenha atingido a

maioridade, até que o mesmo complete a idade de 24 (vinte e quatro) anos,

no intuito de possibilitar o custeio dos seus estudos universitários. 2.

Precedentes do Eg. STJ.(TRF da 5ª Região. AC 282794/CE. Rel. Des.

Federal Luiz Alberto Gurgel de Faria. DJ 10.04.2003, p. 553).

PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. MANUTENÇÃO DO

BENEFÍCIO EM FAVOR DE ESTUDANTE UNIVERSITÁRIO,

DESPROVIDO DE OUTRA FONTE DE RENDA. HIPOSSUFICIÊNCIA

ECONÔMICO-FINANCEIRA QUE CARACTERIZA A DEPENDÊNCIA.

GARANTIA AO DIREITO CONSTITUCIONAL À EDUCAÇÃO.

LEGISLAÇÃO DO IMPOSTO DE RENDA QUE CONSIDERA O FILHO

MAIOR DE ATÉ 24 ANOS, ENQUANTO ESTUDANTE

UNIVERSITÁRIO, DEPENDENTE DO SEGURADO. DEFERIMENTO

DO PLEITO DE ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA

JURISDICIONAL REQÜESTADA. 1. Uma vez evidenciado que o

recorrente dependia economicamente da segurada falecida para manter-se,

por ser estudante universitário com idade inferior a 24 anos, torna-se

imperioso prolongar a percepção da pensão por morte até o implemento da

idade limite ou o término dos estudos. Precedente jurisprudencial desta

Turma Recursal (Recurso Inominado nº 2005.33.00.702427-8, relator o Juiz

Federal Wilson Alves de Souza, maioria, julg. 05.08.2005). 2. Prevalência

da garantia constitucional do Direito à Educação, como norma de eficácia

plena, a exigir a contrapartida do Estado na manutenção do direito público

subjetivo do estudante universitário, quando ausente a mãe que o mantinha

como dependente (CF, art.205). Aplicação analógica do artigo 35, §1º da Lei

nº 9.250/95. 3. Antecipação dos efeitos da tutela jurisdicional, de ofício,

limitada ao cumprimento da obrigação de fazer. Reserva das prestações

vencidas para a fase ulterior de execução do julgado. 4. Recurso a que se

nega provimento. Sentença mantida. (Turma Recursal do Juizado Especial

Federal Cível da Seção Judiciária do Estado da Bahia. Recurso Inominado

2005.33.00.768014-7/BA. Rel. Carlos D’ Avila Teixeira. Publicado em

23.06.2006).

Sobre o assunto, Castro e Lazzari, entendem ser cabível a prorrogação do

benefício previdenciário de pensão por morte até os 24 anos para o dependente

estudante universitário, aplicando por analogia o disposto no art. 35, § 1°, da Lei nº.

9.250/95. (2012, p. 686)

O benefício de pensão por morte visa garantir meios de sobrevivência para

aquele que dependia economicamente do segurado instituidor. Esta dependência

econômica traduz a necessidade de um sustento material que decorre da

31

impossibilidade de provisão pessoal, visando a garantia de uma vida digna, inclusive

atendendo às necessidades de educação.

Portanto, observa-se que há quem acredita na possibilidade de extensão do

benefício de pensão por morte, sob o fundamento de que o entendimento contrário à

extensão do benefício está em desacordo a nossa ordem constitucional, pois ofende

valores constitucionais, como o direito à educação, dignidade da pessoa humana e a

isonomia.

7.1 PROJETO DE LEI Nº 6812/2010

Corroborando o entendimento pela prorrogação do benefício de pensão por

morte, encontramos o Projeto de Lei nº. 6812/2010, que reconhecendo a relevância do

tema, propõe alteração do inciso II do § 2º do art. 77 da Lei nº 8.213, de 24 de julho de

1991, possibilitando a prorrogação do benefício de pensão por morte aos filhos e

dependentes até os 24 anos, quando universitários. Assim, caso aprovado o projeto de

Lei, o inciso II do § 2º passaria a ter a seguinte redação:

Art.77 [..]

§2º [...]

II- Para o filho, a pessoa a ele equiparada ou o irmão, de ambos os sexos,

pela emancipação, ao completar 21 (vinte e um) anos de idade, ou ao

completar 24 (vinte e quatro) anos de idade, se cursando ensino superior ou

ensino técnico de nível médio, salvo se for inválido. (BRASIL, 2013, p.

única).

O autor do projeto, Senador Federal Expedido Júnior afirma que:

A proposição garante aos jovens de até 24 anos, que perdem seus pais ou

mães precocemente, a oportunidade de concluir sua formação profissional e,

como consequência, esses jovens serão mais bem preparados para assegurar

o seu próprio sustento. ( Projeto de Lei 6812/2010, p. única).

Ainda, o relator, Deputado Jhonatan de Jesus entendeu ser oportuna a

discussão apresentada pelo Projeto de Lei, destacando-se em seu voto o seguinte:

32

Esses jovens, muitas vezes estimulados pelos próprios pais, não ingressam

no mercado de trabalho para se dedicarem integralmente aos estudos e

conseguirem um futuro melhor. No entanto, com o falecimento de seus pais,

são muitas vezes obrigados a deixar os estudos, já que esses são os que

financiavam tanto a mensalidade escolar quanto as despesas com as

necessidades básicas de alimentação, vestuário e transporte do filho

estudante.

[...]

Essa proposta promove, de um lado, justiça a esses jovens que, não bastasse

o sofrimento de perder seus pais, são forçados a deixar os estudos para

assegurar sua sobrevivência; de outra parte, propicia o desenvolvimento do

país, pois incentiva a elevação da taxa de escolaridade e a inserção de

profissionais mais qualificados no mercado de trabalho. Em resumo, traz

benefícios não somente para os jovens entre 21 e 24 anos, mas para a

sociedade como um todo. (Projeto de Lei 6812/2010, p. única).

Em que pese os argumentos expostos acima, em 11/07/2013 a Comissão de

Finanças e Tributação votou pela incompatibilidade e inadequação financeira e

orçamentária do referido projeto.

Portanto, na análise sobre a (im) possibilidade de prorrogação da pensão por

morte até 24 anos para o dependente universitário também se considera por parte do

poder público a capacidade financeira do Estado.

De qualquer forma, o próprio Legislativo já demonstrou preocupação com o

tema aqui tratado buscando alterar esta visão majoritária de não prorrogar o benefício

de pensão por morte até os 24 anos para o dependente universitário por ausência de

previsão legal.

33

8 PELA IMPOSSIBILIDADE DE PRORROGAÇÃO

A corrente que defende pela impossibilidade de prorrogação do benefício de

pensão por morte, baseia-se, principalmente, no princípio da legalidade, defendendo

que não é possível prorrogar o benefício em nenhuma hipótese não prevista em lei.

Ainda, o entendimento por não aplicação de normas de outros ramos do

direito, para solução da controvérsia jurídica existente, também é corroborado por

Tavares quando assim dispõe:

Posiciono-me no sentido de que deva ser mantida a dependência econômica

para fim de fruição de pensão no RGPS até que o filho complete 21 anos,

independente de ser estudante, pois não se deve aplicar analogia com a

legislação de imposto de renda se não há lacuna a ser suprimida na

legislação e se os dispositivos normativos integram sistemas diferentes (um,

previdenciário; o outro tributário). Também não vislumbro possibilidade de

aplicação de regra editada para outro sistema previdenciário, de cunho mais

restrito, uma vez que o regime básico é o RGPS e não os demais sistemas

próprios, conforme reconhece a própria Constituição, no art. 40, § 12. (2010,

p. 88).

A opinião contrária à prorrogação do benefício é predominante tanto na

doutrina quanto na jurisprudência. Vejamos:

ADMINISTRATIVO E PROCESSUAL CIVIL. AGRAVO REGIMENTAL

NO AGRAVO EM RECURSO ESPECIAL. PENSÃO POR MORTE.

FILHO NÃO-INVÁLIDO. ESTUDANTE UNIVERSITÁRIO.

IMPOSSIBILIDADE DA PRORROGAÇÃO DO BENEFÍCIO ATÉ OS 24

ANOS DE IDADE. FALTA DE PREVISÃO LEGAL. AGRAVO

REGIMENTAL DESPROVIDO.

1. A jurisprudência do STJ já firmou o entendimento de que a pensão por

morte é devida ao filho menor de 21 anos ou inválido, não sendo possível,

em face da ausência de previsão legal, a prorrogação do recebimento desse

benefício até os 24 anos, ainda que o beneficiário seja estudante

universitário. 2. Agravo Regimental desprovido. (AgRg no AREsp

68.457/DF, Rel. Ministro NAPOLEÃO NUNES MAIA FILHO, PRIMEIRA

TURMA, julgado em 13/08/2013, DJe 22/08/2013).

ADMINISTRATIVO. RECURSO ESPECIAL. PENSÃO POR MORTE.

ESTUDANTE UNIVERSITÁRIO. PRORROGAÇÃO DO BENEFÍCIO

ATÉ 24 ANOS DE IDADE. IMPOSSIBILIDADE. FALTA DE PREVISÃO

LEGAL. PRECEDENTES DO STJ.

1. O STJ entende que, havendo lei que estabelece que a pensão por morte é

devida ao filho inválido ou até que complete 21 (vinte e um) anos de idade,

impossível estendê-la até aos 24 (vinte e quatro) anos de idade quando o

34

beneficiário for estudante universitário, tendo em vista a inexistência de

previsão legal. 2. Recurso especial provido. (REsp 1347272/MS, Rel.

Ministro HERMAN BENJAMIN, SEGUNDA TURMA, julgado em

18/10/2012, DJe 05/11/2012).

PREVIDENCIÁRIO. AGRAVO REGIMENTAL EM RECURSO

ESPECIAL. PENSÃO POR MORTE. FILHO NÃO-INVÁLIDO.

CESSAÇÃO DO BENEFÍCIO AOS 21 ANOS DE IDADE.

PRORROGAÇÃO ATÉ OS 24 ANOS POR SER ESTUDANTE

UNIVERSITÁRIO. AUSÊNCIA DE PREVISÃO NA LEI 8.213/91.

IMPOSSIBILIDADE. PRECEDENTES DO STJ. 1. A jurisprudência do STJ

já firmou o entendimento de que a pensão por morte é devida ao filho menor

de 21 anos ou inválido, não sendo possível, em face da ausência de previsão

legal, a prorrogação do recebimento desse benefício até os 24 anos, ainda

que o beneficiário seja estudante universitário. 2. Agravo Regimental

desprovido. (AgRg no REsp 1069360 / SE, Quinta Turma, Rel. Min.

Napoleão Nunes Maia Filho, DJe 01/12/2008).

RECURSO ESPECIAL. PREVIDENCIÁRIO. PENSÃO POR MORTE. LEI

Nº 8.213/91. IDADE LIMITE. 21 ANOS. ESTUDANTE. CURSO

UNIVERSITÁRIO.

A pensão pela morte do pai será devida até o limite de vinte e um anos de

idade, salvo se inválido, não se podendo estender até os 24 anos para os

estudantes universitários, pois não há amparo legal para tanto. Recurso

provido." (REsp 639.487/RS, Rel. Min. JOSÉ ARNALDO DA FONSECA,

sessão de julgamento do dia 11/10/2005.)

Ademais, corroborando este posicionamento pela não prorrogação do

benefício previdenciário, está a Súmula nº 37 da Turma Nacional de Uniformização,

que no ano de 2007 firmou entendimento de que o benefício de pensão por morte

devida ao filho até os 21 anos não se prorroga, ainda que pendente de conclusão de

curso universitário.

Santos (2012), também afirma não ser possível a prorrogação da dependência

econômica do filho até 24 anos, ainda que somente nesta idade o filho conclua seus

estudos universitários, pois entende que a relação previdenciária é diversa daquela de

direito de família aplicável a pensão alimentícia. E, sendo assim, a dependência

econômica cessa ao filho com 21 anos de idade, deixando de ser dependente, ainda que

o filho continue seus estudos.5

5 REsp 729.565/CE, Rel. Ministra LAURITA VAZ, QUINTA TURMA, julgado em 06/12/2005, DJ

01/02/2006.

35

Desta forma, observa-se prevalece perante os Tribunais o entendimento pela não

possibilidade de prorrogação do benefício de pensão por morte até os 24 anos para o

dependente universitário.

36

9 DO CONFLITO ENTRE PRINCÍPIOS

9.1 PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Cabe aqui uma reflexão sobre quais os princípios aplicados na discussão

apresentada pela (im) possibilidade de prorrogação do benefício de pensão por morte

até 24 anos para o dependente universitário.

Sobre princípios, Bastos (2002) aduz que:

Princípio é, por definição, o mandamento nuclear de um sistema, ou se se

preferir, o verdadeiro alicerce dele. Trata-se de disposição fundamental que

se irradia sobre diferentes normas compondo-lhes o espírito e servindo de

critério para sua exata compreensão e inteligência (2002, p. 80).

Em nosso ordenamento jurídico toda e qualquer norma deve buscar a

concretização do Princípio da Dignidade da Pessoa Humana. Além disso, a

previdência social é meio apto à redução das desigualdades sociais, e, portanto, torna-

se instrumento de efetividade de tal princípio, pois assegura meios indispensáveis à

sobrevivência do ser humano.

Ainda, na constância de um Estado Democrático de Direito impossível que o

Estado distancie-se deste fundamento (art. 1, III da Constituição Federal), devendo

buscar efetividade a este direito fundamental, por meio de mecanismos de proteção.

Tavares (2010), busca incluir neste conceito de dignidade da pessoa humana, a

previdência enquanto direito fundamental, considerando os próprios princípios que

regem a Previdência Social, como universalidade, uniformidade e solidariedade, bem

como o atendimento de certos eventos, como morte, idade avançada, incapacidade e

desemprego involuntário.

Nas palavras do próprio autor, se o Estado conseguir garantir estes

pressupostos :

a previdência torna-se um forte instrumento de concretização do fundamento

constitucional da dignidade humana e dos objetivos de erradicação da

pobreza e de redução de desigualdades sociais, possibilitando o acesso às

oportunidades e garantindo cidadania. (2010, p. 32).

37

Desta forma, os direitos sociais estão intimamente ligados a dignidade da

pessoa humana, pois são essenciais para a concretização de uma vida digna. Assim,

nas palavras de Tavares :

Com isso, está-se afirmar que existem direitos sociais fundamentais,

intimamente vinculados ao da dignidade, porquanto não pode haver

liberdade e dignidade na miséria e na ignorância, e outros direitos sociais,

não dotados de fundamentalidade que devem ser providos pelo Estado na

medida do possível. (2010, p. 31 e 32).

Sendo assim, os direitos sociais também possuem como alicerce o Princípio da

Dignidade da Pessoa Humana, razão pela qual devem ser respeitados, buscando

sempre sua proteção, pois conforme preceitua Ferrari: “constituem exigência e

concretização da dignidade da pessoa humana, na medida em que objetivam a proteção

da pessoa contra necessidades de ordem material e garantia de uma existência digna.”

(2011, p. 571).

9.2 PRINCÍPIO DA LEGALIDADE

Sobre o Princípio da Legalidade, Ferrari assim nos ensina:

Quando se diz que o Estado Democrático de Direito é aquele submetido à

Constituição e à lei, aquele que se sujeita ao império da lei, isso significa que

está fundado na legalidade democrática, que toda a sua atividade está sujeita

à vontade geral, expressa por um órgão de representação popular, agindo de

acordo com o processo legislativo estabelecido na Constituição, e em

observância a regras que distribuem competência entre os órgãos que

exercem o poder no Estado. (2011, p. 581)

Tal princípio vem estabelecido no artigo 5º, inciso II da Constituição Federal6,

sendo instrumento do nosso Estado Democrático de Direito, e nas palavras de Mello

(2002, p. 83 apud FERRARI, 2011, p. 581), é o “antídoto natural do poder

monocrático ou oligárquico, pois tem como raiz a ideia de soberania popular, de

exaltação da cidadania.”

6 Art. 5º, II, CF: “Ninguém será obrigado a fazer ou deixar de fazer alguma coisa senão em virtude de

lei.”

38

Bastos (2002), afirma que os princípios possuem grande relevância em nosso

ordenamento, pois são eles utilizados como parâmetro para interpretação das normas,

sua observância e aplicação é o único meio capaz de propiciar a real vontade das

normas. Ainda, segundo o autor “A letra da lei é sempre o ponto de partida do

intérprete, mas nunca é o de chegada.” (2002, p. 80).

Ambos os princípios aqui estudados são extremamente importantes e

necessários. Contudo, mesmo na aplicação do Princípio da Legalidade que é

fundamento contrário à possibilidade de prorrogação do benefício previdenciário de

pensão por morte, vê-se que há necessidade de preocupação com a forma de expressão

da vontade da sociedade. Resta saber se a lei de fato vem cumprimento com o seu

papel.

39

10 DEMOCRATIZAÇÃO DA INTERPRETAÇÃO CONSTITUCIONAL

Ao longo da história foram apresentados diversos conceitos e significados

sobre o que seria a Constituição. Veja-se a atual Constituição Federal Brasileira está

em vigência há mais de 25 anos, o que acaba por indicar uma possível

desconformidade com a atual sociedade e seus reais anseios.

Silva (2009) assim preceitua:

A estabilidade das constituições não deve ser absoluta, não pode significar

imutabilidade. Não há constituição imutável diante da realidade social

cambiante, pois não é ela apenas um instrumento de ordem, mas deverá sê-

lo,também, de progresso social. Deve-se buscar sempre o bem-estar social.

(2009, p. 42).

Cabe aqui também o ensinamento de Heale:

O legislador, por conseguinte, é o primeiro a reconhecer que o sistema das

leis não é suscetível de cobrir todo o campo da experiência humana, restando

sempre grande número de situações imprevistas, algo que era impossível ser

vislumbrado sequer pelo legislador no momento da feitura da lei. (1977, p.

300).

Diante disso, as diversas correntes de análise dos conceitos sobre a

constituição serão analisadas, em especial na visão de Ferdinand Lassale, Hans Kelsen,

Konrad Hesse e finalmente em Peter Haberle.

Lassalle, marxista alemão em suas análises sobre o Ordenamento Jurídico em

especial sobre a força normativa da constituição e sua eficácia diante do que ele

entendia ser o verdadeiro poder. Conforme trouxe Hesse em seu livro:

[...] questões constitucionais não são questões jurídicas, mas sim questões

políticas. É que a Constituição de um país expressa as relações de poder nele

dominantes: o poder militar, representado pelas Forças Armadas, o poder

social, representado pelos latifundiários, o poder econômico, representado

pela grande indústria e pelo grande capital, e, finalmente, ainda que não se

equipare ao significado dos demais, o poder intelectual, representado pela

consciência e pela cultura gerais. As relações fáticas resultantes da

conjugação desses fatores constituem a força ativa determinante das leis e

das instituições da sociedade, fazendo com que estas expressem, tão

somente, a correlação de forças que resulta dos fatores reais de poder; esses

fatores reais do poder formam a constituição real do país. Esse documento

40

chamado constituição- a Constituição jurídica- não passa nas palavras

LASSALLE, de um pedaço de papel( ein Stück Papier). Sua capacidade de

regular e motivar está limitada à sua compatibilidade com a Constituição

real. (1991, p. 9).

Neste sentido, para Lassalle se a Constituição não expressar a vontade dos

fatores reais de poder, ela não terá eficácia.

O entendimento de Lassalle é que colhido os fatores reais de poder, e

registrado em um pedaço de papel, a partir desse momento, incorporados a um papel,

já não são simples fatores reais do poder, mas que se erigiram em direito e instituições

jurídicas, e quem atentar contra eles atentará contra a lei e será castigado.

A verdadeira essência da Constituição, segundo o Autor, é que é uma lei

fundamental e que tanto deve apresentar as seguintes características: (1) ser uma lei

básica, porém mais sagrada e firme do que as leis comuns; (2) constituir o verdadeiro

fundamento das outras leis, devendo atuar e irradiar-se através das leis comuns dela

originada e; (3) existir porque necessariamente deve existir, e ter força de eficácia para

que seu conteúdo seja assim. (LASSALE, 2001, p. 09-10).

Assim, se a Constituição não estivesse em conformidade com os fatos não

tinha qualquer valor. Desta forma, aproxima-se da realidade fática, mas distancia-se

muito da valorização normativa como forma de evolução constitucional.

Kelsen por seu turno descreve que:

A eficácia do Direito pertence ao domínio da realidade e é muitas vezes

chamada de poder do Direito. Se substituirmos poder por eficácia, então o

problema de validade e eficácia é transformado no problema mais comum de

“direito e força”. E, então, a solução aqui apresentada é meramente o

enunciado preciso da velha verdade de que, apesar de o Direito não poder

existir sem poder, ainda assim Direito objetivo e poder, direito e força, não

são a mesma coisa. O Direito é, segundo a teoria aqui desenvolvida, uma

ordem ou organização específica de poder. (1995, p. 125).

E analisando o conceito de Constituição define que:

A constituição do Estado, geralmente caracterizada como sua “lei

fundamental”, é a base da ordem jurídica nacional. É bem verdade que o

conceito de constituição, tal como compreendido na teoria do Direito, não é

exatamente igual ao conceito correspondente na teoria política. O primeiro é

o que chamamos antes de constituição no sentido material do termo,

abrangendo as normas que regulamentam o processo de legislação. Tal como

41

usado na teoria política, faz-se com que o conceito também compreenda as

normas que regulamentam a criação e a competência dos órgãos executivos e

judiciários mais altos. (1995, p. 253).

E finalmente Kelsen expõe que:

A constituição no sentido formal é certo documento solene, um conjunto de

normas jurídicas que pode ser modificado apenas com a observância de

prescrições especiais cujo propósito é tornar mais difícil a modificação

dessas normas. A constituição no sentido material consiste nas regras que

regulam a criação das normas jurídicas gerais, em particular a criação de

estatutos. (1995, p. 130).

Bobbio entende que nas definições de Lassale e Kelsen, sendo o primeiro por

conceito político e o segundo por conceito jurídico, existem conexões estreitas:

[...] se por “Direito” entendermos o Direito em sentido objetivo, isto é, um

conjunto de normas vinculadoras, que passam a vigorar recorrendo em

última instância à coação, quanto se entendermos o Direito em sentido

subjetivo, pelo menos numa de suas inúmeras acepções. Em relação ao

direito objetivo, o poder, entendido, segundo a definição mais comum, que

remonta a Bertrand Russel, como “produção de efeitos desejados”, intervém

tanto no momento da criação, quanto no de aplicação das normas. Na teoria

do direito subjetivo, os juristas em geral chamam de “poder” uma forma

específica de situação subjetiva ativa que consiste na capacidade, atribuída a

certos sujeitos pelo ordenamento, de produzir efeitos jurídicos. A unificação

dos dois conceitos, ou melhor, dos dois usos de poder na linguagem jurídica

ocorreu graças a Kelsen que, inserindo o direito subjetivo em sentido técnico

e específico, na teoria das fontes do direito, cancelou qualquer diferença

entre o poder do qual sempre se falou no direito público e o poder do qual se

fala no direito privado. (2008, p. 194-195).

Hesse entende que a Constituição real e a constituição jurídica “estão em uma

relação de coordenação”, como bem observou Bobbio, onde elas se harmonizam, sem

contudo haver interdependência entre elas. (HESSE, 1991, p. 15)

Para Hesse a constituição jurídica tem como pretensão de existência a

realidade do Estado:

Mas, a força normativa da Constituição não reside, tão somente, na

adaptação inteligente a uma dada realidade. A Constituição jurídica logra

converter-se, ela mesma, em força ativa, que se assenta na natureza singular

do presente (individuelle Beschaffenheit der Gegenwart). Embora a

Constituição não possa, por si só, realizar nada, ela pode impor tarefas. A

Constituição transforma-se em força ativa se essas tarefas forem

efetivamente realizadas, se existir a disposição de orientar a própria conduta

42

segundo a ordem nela estabelecida, se, a despeito de todos os

questionamentos e reservas provenientes dos juízos de conveniência, se

puder identificar a vontade de concretizar essa ordem. (1991, p.19).

Häberle pretende que a interpretação constitucional não se dê apenas por um

grupo ou órgão específico, mas que esta seja feita de forma mais ampla possível, tanto

quanto mais pluralista for esta sociedade.

Aduz que a interpretação da constituição só pode ser pensada tendo em vista a

esfera pública e a realidade constitucional, de modo que não é mais possível

desconsiderar o cidadão, os partidos políticos, a organização da sociedade como

interpretes da Constituição.

A forma aberta de interpretação da Constituição traz ainda em Peixinho,

Guerra e Nascimento Filho uma explanação que fecha o pensamento de Häberle:

Essa compreensão da constituição como resultado de uma determinada

forma de organização em torno de atividades de cooperação, na conformação

de uma situação política real, implica na incorporação de uma visão dialética

quanto aos processos sociais. [...] (2006, p. 29)

Segundo Heller (1968, p. 296 apud Peixinho, Guerra, Nascimento Filho, 2006,

p. 29) “A Constituição do Estado não é, por isso, em primeiro lugar, processo mas

produto, não atividade, mas forma de atividade; é uma forma aberta através da qual

passa a vida, vida em forma e forma nascida em vida.”

Häberle aduz que:

Se se quiser, tem-se aqui uma democratização da interpretação

constitucional. Isso significa que a teoria da interpretação deve ser garantida

sob a influência da teoria democrática. Portanto, é impensável uma

interpretação da Constituição sem o cidadão ativo e sem as potências pública

mencionadas. Todo aquele que vive no contexto regulado por uma norma e

que vive com este contexto é, indireta ou, até mesmo diretamente, um

interprete desta norma. O destinatário da norma é participante ativo muito

mais ativo que se pode supor tradicionalmente do processo hermenêutico.

Como não são apenas os interpretes jurídicos Constituição que vivem a

norma, não detém eles o monopólio da interpretação da Constituição. (1997,

p.14 e 15).

No caso o Conselho Nacional de Justiça é um exemplo claro da aplicação da

extensão da interpretação da Constituição por outros intérpretes.

43

O que se vislumbra é que somente os Tribunais, de acordo com sua

competência, davam interpretação a Constituição.

Com o CNJ, apesar de composto de cidadãos e órgãos ligados a análise

jurídica de cada tema, houve uma ampliação para a sociedade civil, como exemplo a

composição com advogados, cidadãos e ministério público, com mandado eletivo.

Ainda em sede de análise constitucional, tem-se o Conselho Nacional de

Educação, que apesar de ser ligado ao Poder Executivo (MEC), tem a função de buscar

democraticamente “alternativas e mecanismos institucionais que possibilitem, no

âmbito de sua esfera de competência, assegurar a participação da sociedade no

desenvolvimento, aprimoramento e consolidação da educação nacional de qualidade.”

Para Häberle:

Democracia desenvolve-se mediante a controvérsia sobre alternativas, sobre

possibilidades e sobre necessidades da realidade e também o “concerto”

científico sobre questões constitucionais, nas quais não pode haver

interrupção e nas quais não existe e nem deve existir dirigente. (1997, p. 36-

37).

O que se tem então é que na visão deste Autor, o Estado Democrático exige

que todos os sujeitos sociais tenham interferência na interpretação da Constituição.

44

11 CONCLUSÃO

Apresentam-se duas correntes distintas quanto ao tema da (im) possibilidade

de prorrogação do benefício de pensão por morte até 24 anos para o dependente

universitário, sendo que uma delas encontra embasamento do princípio da legalidade,

e outra defende a possibilidade de prorrogação aplicando normas e princípios

constitucionais.

A visão extremamente legalista quanto ao tema, entende ser aplicável tão

somente a Lei 8.213/91, que é a lei que regula e disciplina os benefícios da previdência

social, a qual prevê expressamente o cancelamento do benefício aos 21 (vinte e um)

anos, enquanto que a corrente defensora da prorrogação até 24 anos para o dependente

universitário visa aplicação de normas de outros ramos do direito, que não o direito

previdenciário, bem como normas de ordem constitucional.

Cabe ressaltar a ofensa ao direito à educação, que é tido em nosso Estado

como direito fundamental, expressamente previsto em nossa Constituição Federal

(artigo 205).

Assim, apesar da Constituição brasileira ser rígida (na sua modificação poderá

ser semi rígida, haja vista a possibilidade de emendas em determinados assuntos), vem

ocorrendo uma abertura de interpretação por demais participantes sociais.

No tocante ao tema, tem-se que, como quer Kelsen, existe uma antinomínia

legal.

Quando a Lei de regência de benefício (Lei 8.213/91, artigo 77, §2º), limita a

idade de 21(vinte e um) anos para o dependente capaz, pode ter se utilizado do Código

Civil de 1916 como base de extinção de incapacidade civil. No entanto, com a

edição do Código Civil de 2002, houve a eleição de nova idade para tal extinção que

foi a de 18 (dezoito) anos. Logo, não existe sequer um critério para a manutenção da

idade de 21 (vinte e um) anos.

Se a base real e fática, como quer Lassalle, é a maioridade civil, o benefício

deveria ser reduzido para 18 (dezoito) anos, e não ser mantido para os 21(vinte e um)

anos.

45

Para que esta antinomínia não seja mantida dentro do sistema legal, que no

entendimento kelseniano é a base da estrutura de Poder do Direito, algum critério deve

ser utilizado para esta finalidade.

Como paradigma existe a Lei que regulamenta o benefício para os filhos de

militares, Lei 3.765/60, que em seu artigo 7º, inciso I, alínea d, garante o

pensionamento até a idade de 24(vinte e quatro) anos, quando se trata de dependente

universitário.

Sendo assim, utilizando-se do Princípio Constitucional da isonomia, previsto

no caput 5º onde rege que todos são iguais perante a Lei, não poderá haver uma

diferenciação entre o beneficiado civil e o militar, no que tange a idade atingida pelos

benefícios.

Que se especifique que a máxima de tratar desiguais os desiguais é uma forma

de se garantir a igualdade perante a lei. Para Kelsen (1962, p.190 apud Mello, 2011, p.

11), “A igualdade dos sujeitos na ordenação jurídica garantida pela Constituição, não

significa que estes devam ser tratados de maneira idêntica nas normas e em particular

nas lei expedidas com base na Constituição.”

Seguindo esta linha de raciocínio, poderíamos afirmar que de alguma forma, o

servidor militar contribuiu para o custeio da previdência de forma diferenciada, o que

garantiria a seus beneficiários um melhor pensionamento a seus dependentes.

Então, outro critério para a prorrogação do benefício de pensão por morte de

21 (vinte e um) anos para os 24 (vinte e quatro) anos deve ser buscado

constitucionalmente.

Note-se que o Legislativo através da proposta de emenda aditiva do Deputado

Federal Izalci, na da Medida Provisória 529 de 2011, o faz com o fundamento no

direito constitucional social da educação, previstos no artigo 6º e no artigo 205. Aquele

legislador elegeu este direito constitucional como esteio para excluir da tributação os

valores aplicados na educação,ensino e formação profissional dos empregados e seus

dependentes. A proposta visa a redução de receita do Estado.

46

Como a educação, ensino e formação profissional podem ser usados como

exclusão de receita, em nada obstaculiza que o aumento de despesas possam também

ser usados para esta mesma finalidade.

Encontrado que o direito à educação, ensino e formação profissional podem e

devem ser causa de incentivo a manutenção do benefício previdenciário até os 24 anos,

pois previstos na Constituição Federal. Outra garantia que se deve buscar como

fundamento para a manutenção do benefício é o disposto no art.1º, III, que é a

dignidade da pessoa humana.

O Supremo Tribunal Federal, em decisão recente, deu interpretação a norma

legal, diferentemente do que esta nela esta escrita, ampliando a visão constitucional

como prevê Haberle.

Foi o famoso caso de interrupção de gravidez em fetos anencéfalos, quando a

Suprema Corte Constitucional, impôs uma decisão contrária a que existia.

Entendeu que a dignidade da pessoa humana é valor inalienável, mesmo diante

de norma escrita.7

O precedente supra mencionado permite que se possa da mesma forma,

unindo-se os 1º, III, art.6º e 205 da Constituição Federal, fundamentar o aumento da

idade de dependente de 21 para 24 anos, cobrindo-se desta forma a antinomínia legal

hoje existente.

7ADPF 54, Relator(a): Min. MARCO AURÉLIO, Tribunal Pleno, julgado em 12/04/2012,

ACÓRDÃO ELETRÔNICO DJe-080 DIVULG 29-04-2013 PUBLIC 30-04-2013.

47

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