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UNIVERSIDADE DE LISBOA FACULDADE DE PSICOLOGIA CARACTERIZAÇÃO DIMENSIONAL DA PERTURBAÇÃO ESTADO-LIMITE (BORDERLINE) DA PERSONALIDADE Sílvia do Carmo Bento Conde MESTRADO INTEGRADO EM PSICOLOGIA Secção de Psicologia Clínica e da Saúde / Núcleo de Psicologia Clínica Dinâmica 2017

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UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE PSICOLOGIA

CARACTERIZAÇÃO DIMENSIONAL DA PERTURBAÇÃO

ESTADO-LIMITE (BORDERLINE) DA PERSONALIDADE

Sílvia do Carmo Bento Conde

MESTRADO INTEGRADO EM PSICOLOGIA

Secção de Psicologia Clínica e da Saúde / Núcleo de Psicologia Clínica Dinâmica

2017

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UNIVERSIDADE DE LISBOA

FACULDADE DE PSICOLOGIA

CARACTERIZAÇÃO DIMENSIONAL DA PERTURBAÇÃO

ESTADO-LIMITE (BORDERLINE) DA PERSONALIDADE

Sílvia do Carmo Bento Conde

Dissertação orientada pelo Professor Doutor Bruno Ademar Paisana Gonçalves

MESTRADO INTEGRADO EM PSICOLOGIA

Secção de Psicologia Clínica e da Saúde / Núcleo de Psicologia Clínica Dinâmica

2017

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Dedicatória

Ao meu avô, que percebeu que a educação é uma das formas mais eficazes de luta.

À minha avó, que teria ter sido Professora e que agora é educadora dele.

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Agradecimentos

Começo por agradecer ao Professor Doutor Bruno Gonçalves, meu orientador de dissertação

e de estágio, e referência fundamental no meu caminho pela Psicologia. A ele devo um

agradecimento pelas horas em que me ouviu no seu gabinete, por me apoiar nas minhas escolhas

relativas a esta dissertação e por me ter “aturado” durante mais tempo do que o esperado.

Agradeço-lhe também os sábios conselhos e a leitura atenta dos capítulos deste trabalho. Do

Professor Bruno levo, acima de tudo, um exemplo de dedicação, humildade e humanismo.

Em segundo lugar, às Professoras Doutoras Joana Calado e Rute Pires, que mesmo não

sendo minhas orientadoras de dissertação, fizeram tudo o que estava ao seu alcance para me ajudar.

Gostaria também de expressar o meu profundo agradecimento aos muitos participantes deste

estudo, sem os quais o mesmo não seria possível e às Instituições responsáveis, em especial à

Comunidade Vida e Paz e à Comunidade Villa Ramadas, que facilitaram a recolha da amostra.

Aos meus colegas de curso, em particular, à Joice, à Sara, ao Diogo, ao João, à Sofia, à

Joana e ao Bruno (que me foi tirando dúvidas de estatística sem nunca se queixar). E também à

“minha” Ana.

À Orquestra Académica da Universidade de Lisboa, da qual fiz parte alguns anos e que me

permitia descontrair do stress académico. Aos maestros e aos colegas um bem-haja pela música,

pelos momentos de convívio agradável e pela troca de experiências (e especialmente de comida

internacional).

Aos amigos que fiz no Hospital de Santa Maria e, em especial, ao “meu” Miguel que

partilhou comigo o seu “verdinho” e me mostrou a importância de confiar. Também, à Dra. Maria

João Centeno que me convidou para fazer parte do Grupo Multifamiliar da Consulta Externa do

Hospital Santa Maria e por me ter ensinado a importância dos processos grupais na saúde mental,

além de ter sempre uma palavra de incentivo relativa à dissertação.

E também ao Departamento de Saúde Mental de Trieste, que apesar de nada ter a ver com o

âmbito desta dissertação, fez com que tenha ainda mais vontade de ser Psicóloga.

Aos meus amigos italianos, Pietro e Matteo, que me emprestaram o gabinete para trabalhar

na dissertação (e por me terem ensinado a falar italiano e a fazer pizzas e pastas). E aos meus

amigos chineses, Asiya e Aji, não só por me terem acolhido como por me terem deixado ser, pela

primeira vez, “tia” de uma bebé tão linda!

Ao meu psicoterapeuta, que me apoiou quando não sabia se deveria ou não deixar para este

ano a dissertação e por me ter ensinado a ser uma melhor pessoa e profissional.

Ao Zé, que além de ter sido meu colega de curso, me convidou para fazer Yoga numa altura

em que a doença do meu Avô me estava a afetar muito e que tem sempre uma palavra de ânimo.

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iii

Ao meu João que é sempre incansável a apoiar-me e que já sabe (quase) tanto sobre

Perturbação da Personalidade Borderline como eu. Ao João, por me ter mostrado que não é a

proximidade física mas a emocional que é a base do Amor. Ao meu “Momor”, por ser quem é.

Aos meus avós que ajudaram muito, emocional e financeiramente, ao longo do curso.

Agradeço aos meus avós o facto de me terem apoiado quando decidi mudar de curso e também

quando decidi ficar mais um ano a concluir o curso de Psicologia. Ainda, por me terem ajudado a ir

a Itália e a seguir os meus sonhos.

À minha tia pelo incansável apoio e por me ouvir sempre (talvez demais). Agradeço-lhe por

aceitar quem sou e por ter sido uma das primeiras pessoas a entender a minha “estranheza”. Ainda,

por me ter ido visitar a Itália e me ter permitido mostrar-lhe um outro lado da minha vida. Ao “tio”

Li, por me ter convencido a sair de casa todos os sábados enquanto estava em Portugal, a ir aos

“bailaricos” e por me ter ensinado a dançar Mazurkas. E ao Luaty, o gato deles, pelos dias em que

esteve comigo e não deixou trabalhar na dissertação, recordando-me do quão bom é cuidar de um

ser.

Por fim, um agradecimento especial à minha mãe, que sempre respeitou os meus tempos e

nunca me pressionou para fazer as coisas de acordo com o socialmente esperado. À minha mãe, que

mesmo “sozinha” me deu acesso a imensas experiências e me incentivou a seguir Psicologia,

mesmo quando muitas pessoas nos diziam que não valia a pena. A ela que me ajuda mesmo quando

não me compreende e por acreditar sempre que as coisas vão correr bem mesmo quando eu não

vejo isso; à minha mãe, por me Amar.

E também ao “Plano Divino”, que me aguenta quando o corpo físico, mental e emocional

começa a dar sintomas de cansaço e desesperança. É também na dimensão espiritual que me

recordo de que um trabalho (qualquer que ele seja) é apenas uma parte ínfima da minha

existência…

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RESUMO

A Perturbação Estado-Limite (Borderline) da Personalidade ou Perturbação de

Personalidade Borderline (PPB) é uma condição de saúde mental comum nos settings clínicos. O

seu diagnóstico é bastante controverso e as últimas linhas de investigação parecem apontar para a

conceptualização realizada pelo Grupo de Trabalho do DSM-5 para a Personalidade e Perturbações

da Personalidade, que propôs o Modelo Alternativo para as Perturbações de Personalidade (PP).

Um dos objetivos deste estudo é perceber as contribuições de traços específicos no que diz

respeito à operacionalização da PPB, além do estudo do instrumento derivado do Modelo

Alternativo para as PP (PID-5), em associação com outros instrumentos dimensionais (NEO-FFI).

Neste estudo participaram 205 indivíduos com perturbação psiquiátrica. Os participantes

completaram uma série de questionários que podem ser utilizados na caracterização dimensional da

personalidade dos quais são relevantes para esta investigação o NEO-FFI e o PID-5, além do

questionário sociodemográfico.

O estudo com as MANOVAs e as análises discriminantes destacou a dimensão

Neuroticismo (NEO-FFI) e os domínios Psicoticismo, Afetividade negativa e Desinibição (PID-5)

na caracterização da PPB. O teste de Qui-quadrado de Pearson e a análise do risco relativo revelam

que os doentes com PPB parecem apresentar maior prevalência de abuso sexual na infância do que

os restantes participantes.

Os resultados encontrados para os traços e domínios/dimensões parecem estar alinhados

com a literatura, apesar das diferenças encontradas. O surgimento do domínio Psicoticismo, que não

era esperado, poderá aumentar o poder discriminativo relativamente a esta perturbação, o que

poderá levar a ligeiras modificações na operacionalização da Secção III do DSM-5 no que diz

respeito à PPB.

Palavras-chave:

Perturbação de Personalidade Borderline, DSM-5, avaliação dimensional, traços de personalidade

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v

ABSTRACT

Borderline Personality Disorder (BPD) is a common mental health condition in clinical

settings. This diagnosis is very controversial and the last lines of research seem to point to the

conceptualization carried out by the DSM-5 Working Group on Personality and Personality

Disorders, which proposed the Alternative Model for Personality Disorders.

One of the objectives of this study is to understand the contributions of specific traits

regarding the operationalization of BPD, in addition to the study of the instrument derived from the

Alternative Model for Personality Disorders (PID-5), in association with other dimensional

instruments (NEO-FFI).

In this study participated 205 individuals with psychiatric disorder. The participants

completed a series of questionnaires that can be used in the dimensional characterization of the

personality, of which the NEO-FFI and the PID-5 are relevant for this investigation, in addition to

the sociodemographic questionnaire.

The study with the MANOVAs and the discriminant analysis revealed an emphasis on the

Neuroticism (NEO-FFI) dimension and on the Psychoticism, Negative Affectivity and Disinhibition

(PID-5) domains in the characterization of BPD. Pearson's Chi-square test and relative risk analysis

reveal that patients with BPD appear to have a higher prevalence of childhood sexual abuse than the

other participants.

The results found for the traits and domains/dimensions seem to be in line with the

literature, despite the differences found. The emergence of the Psychoticism domain, which was not

expected, could increase the discriminative power with respect to this disturbance, which can

possibly lead to slight modifications in the operationalization of Section III of DSM-5 with respect

to BPD.

Key words:

Borderline Personality Disorder, DSM-5, dimensional assessment, personality traits

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RIASSUNTO

Il Disturbo Borderline di Personalità (DBP) è una condizione comune di salute mentale nelle

impostazioni cliniche. Questa diagnosi è molto controversa e le ultime linee di ricerca sembrano

indicare la concettualizzazione svolta dal gruppo di lavoro DSM-5 sulle malattie della personalità e

della personalità che hanno proposto il modello alternativo per i disturbi della personalità.

Uno degli obiettivi di questo studio è quello di comprendere e contribuire allo studio di tratti

specifici relativi all'operazione di DBP, oltre allo studio dello strumento derivato dal Modello

Alternativo per i disturbi della personalità (PID-5), in associazione con altri strumenti dimensionali

(NEO-FFI).

In questo studio hanno partecipato 205 persone con disturbi psichiatrici. I partecipanti hanno

completato una serie di questionari che possono essere utilizzati nella caratterizzazione

dimensionale della personalità, di cui i NEO-FFI e il PID-5 sono rilevanti per questa indagine, oltre

al questionario sociodemografico.

Lo studio con gli MANOVA e l'analisi discriminante ha rivelato un'enfasi sulla dimensione

Stabilità emotiva (NEO-FFI) e sui domini Psicoticismo, Affetività negativa e Dininibizione (PID-5)

nella caratterizzazione del DBP. Il test di Chi-square di Pearson e l'analisi relativa del rischio

rivelano che i pazienti con DBP sembrano avere una prevalenza più alta di abusi sessuali di infanzia

rispetto agli altri partecipanti.

I risultati trovati per i tratti e i domini/dimensioni sembrano essere in linea con la letteratura,

nonostante le differenze riscontrate. L'emergere del dominio psicoticismo, che non era previsto,

potrebbe aumentare il potere discriminatorio rispetto a questo disturbo, che potrebbe eventualmente

portare a leggere modifiche nell'operativizzazione della Sezione III di DSM-5 rispetto al DBP.

Parole chiave:

Disturbo borderline di personalità, DSM-5, valutazione dimensionale, tratti di personalità

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Índice geral

Resumo................................................................................................................................................ iv

Abstract ................................................................................................................................................ v

Riassunto ............................................................................................................................................. vi

Introdução ............................................................................................................................................ 1

Enquadramento Teórico ....................................................................................................................... 4

1. O estudo das Perturbações de Personalidade: Breve perspetiva histórica ............................... 4

1.1. O Modelo Categorial ......................................................................................................... 5

1.2. O surgimento dos modelos dimensionais .......................................................................... 5

1.2.1. O Modelo dos Cinco Fatores ...................................................................................... 6

1.2.2. O FFM aplicado às PP ................................................................................................ 6

1.3. O surgimento de um modelo híbrido: o Modelo Alternativo do DSM-5 para as PP......... 7

2. A Perturbação de Personalidade Borderline ............................................................................ 9

2.1. Evolução do conceito ......................................................................................................... 9

2.2. Um diagnóstico controverso ............................................................................................ 10

2.3. Sintomas característicos ................................................................................................... 10

2.4. Borderline, que explicação? – Teorias, Modelos e Critérios Diagnósticos: um

(des)encontro de perspetivas ...................................................................................................... 12

2.4.1. A Perspetiva Psicodinâmica ..................................................................................... 12

2.4.2. A PPB no FFM ......................................................................................................... 14

2.4.3. A Perspetiva Categorial e mais além: as secções II e III do DSM-5 ........................ 14

2.5. Etiologia ........................................................................................................................... 16

2.5.1. Fatores Genéticos e Neurobiológicos ....................................................................... 16

2.5.2. Fatores Psicológicos ................................................................................................. 17

2.6. Comorbilidade ................................................................................................................. 18

2.7. Prevalência ....................................................................................................................... 18

2.8. Medição do constructo ..................................................................................................... 18

3. Problematização ..................................................................................................................... 20

Objetivos e Hipóteses......................................................................................................................... 21

1. Objetivos ................................................................................................................................ 21

2. Hipóteses ................................................................................................................................ 21

Método ............................................................................................................................................... 22

1. Participantes ........................................................................................................................... 22

2. Instrumentos e Medidas ......................................................................................................... 25

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2.1. Questionário Sociodemográfico ...................................................................................... 25

2.2. Inventário de Personalidade NEO-FFI ............................................................................ 25

2.3. Inventário da Personalidade para o DSM-5 – Adultos .................................................... 26

3. Procedimento ......................................................................................................................... 26

3.1. Procedimento de análise dos dados ................................................................................. 27

Resultados .......................................................................................................................................... 29

1. Estudo Metrológico ................................................................................................................ 29

1.1. NEO-FFI – Precisão ........................................................................................................ 29

1.2. PID-5 – Precisão .............................................................................................................. 29

2. MANOVAs e Análises Discriminantes ................................................................................. 32

2.1. Pressupostos da MANOVA e da Análise Discriminante: uma breve introdução ........... 32

2.2. MANOVA e Análise Discriminante para o NEO-FFI .................................................... 33

2.2.1. MANOVA para o NEO-FFI ..................................................................................... 33

2.2.2. Análise Discriminante para o NEO-FFI ................................................................... 33

2.3. MANOVAs e Análises Discriminantes para o PID-5 ..................................................... 34

2.3.1. MANOVA para o PID-5 – Domínios ...................................................................... 34

2.3.2. Análise Discriminante para o PID-5 – Domínios ..................................................... 35

2.3.3. MANOVA para o PID-5 – Facetas .......................................................................... 35

2.3.4. Análise Discriminante para o PID-5 – Facetas ........................................................ 36

2.4. Análise de Hipóteses ........................................................................................................ 37

3. Teste de Chi-Quadrado e Análise do Risco Relativo ............................................................. 39

3.1. Análise de Hipóteses ........................................................................................................ 40

Discussão dos Resultados .................................................................................................................. 41

1. Introdução .............................................................................................................................. 41

2. Discussão dos resultados obtidos com o NEO-FFI ................................................................ 41

3. Discussão dos resultados obtidos com o PID-5 ..................................................................... 42

3.1. Serão os algoritmos propostos pelo DSM-5 os mais adequados à descrição da PPB?.... 46

4. Discussão dos resultados para Prevalência do abuso sexual nos doentes com PPB .............. 47

5. Limitações e Sugestões Futuras ............................................................................................. 47

6. Implicações Clínicas .............................................................................................................. 48

Conclusões ......................................................................................................................................... 50

Referências Bibliográficas ................................................................................................................. 51

Anexos ............................................................................................................................................... 58

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ix

Índice de quadros

Quadro 1. Características-chave da PPB segundo o PDM-2. ........................................................... 13

Quadro 2. Critério A para o Diagnóstico de PPB na secção III do DSM-5. ..................................... 15

Quadro 3. Critérios Diagnósticos para a PPB na secção II e Critério B da secção III do DSM-5. . 15

Quadro 4. Características sociodemográficas da amostra (N=205). ................................................ 22

Quadro 5. Distribuição dos diagnósticos da amostra clínica. ........................................................... 23

Quadro 6. Caracterização da amostra PPB no que concerne às comorbilidades. ........................... 24

Quadro 7. Coeficientes de precisão e estatísticas descritivas das dimensões do NEO-FFI (N = 204).

............................................................................................................................................................ 29

Quadro 8. Coeficientes de precisão e medidas descritivas dos domínios do PID-5 (N = 205). ........ 30

Quadro 9. Coeficientes de precisão e medidas descritivas das facetas do PID-5 (N = 205). ........... 30

Quadro 10. Itens que fazem com que o alfa suba quando são retirados da escala. .......................... 31

Quadro 11. Médias e desvios-padrões dos resultados nas dimensões do NEO-FFI para os grupos

com PPB e com outras perturbações psiquiátricas (N = 204). ......................................................... 33

Quadro 12. Peso relativo de cada dimensão do NEO-FFI na função discriminante. ....................... 34

Quadro 13. Médias e desvios-padrões dos resultados nos domínios do PID-5 para os grupos com

PPB e com outras perturbações psiquiátricas (N = 205). ................................................................. 34

Quadro 14. Peso relativo de cada domínio do PID-5 na função discriminante. ............................... 35

Quadro 15. Médias e desvios-padrões dos resultados nas facetas do PID-5 para os grupos com

PPB e com outras perturbações psiquiátricas (N = 205). ................................................................. 35

Quadro 16. Peso relativo de cada faceta do PID-5 na função discriminante. .................................. 37

Quadro 17. Distribuição dos participantes quanto ao relato de abuso sexual e à presença de PPB

(N = 205). ........................................................................................................................................... 40

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x

Índice de anexos

Anexo I. Descrições das dimensões do FFM ..................................................................................... 59

Anexo II. Definições das facetas e domínios de acordo com o DSM-5 ............................................ 61

Anexo III. Formulário de Consentimento Informado ........................................................................ 66

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xi

Lista de abreviaturas

APA Associação Americana de Psicologia

BPDSI-IV Índice de Severidade para a Perturbação de Personalidade Borderline - IV

cPPST Trauma Complexo

DSM Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações Mentais

DSM-I 1ª Edição do DSM

DSM-II 2ª Edição do DSM

DSM-III 3ª Edição do DSM

DSM-IV 4ª Edição do DSM

DSM-IV-TR Revisão de texto da 4ª Edição do DSM

DSM-5 5ª Edição do DSM

FFM Modelo dos Cinco Factores (em inglês, Five Factor Model)

ICD Classificação Estatística Internacional de Doenças e Problemas

Relacionados com a Saúde

MANOVA Análise Multivariada de Variância

MCMI-II Inventário Clínico Multiaxial de Millon

MMPI-2 Inventário Multifásico de Personalidade de Minnesota - 2

NEO-FFI Inventário dos Cinco Factores de Personalidade (em inglês, NEO - Five

Factor Inventory)

NEO-PI-R Inventário de Personalidade Neo – Revisto

OPB Organização de Personalidade Borderline

PDM Manual de Diagnóstico Psicodinâmico

PDM-2 Manual de Diagnóstico Psicodinâmico (2ª edição)

PID-5 Inventário de Personalidade para o DSM-5

PP Perturbação de Personalidade

PPB Perturbação de Personalidade Borderline

PPST Perturbação de Pós-Stress Traumático

PSY-5 Modelo dos Cinco Factores para as PP

SCID-II Entrevista Clínica Estruturada para o DSM

SWAP-200 Shedler Westen Assessment Procedure 200

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xii

Não sei quem sou, que alma tenho.

Quando falo com sinceridade não sei com que sinceridade falo.

Sou variamente outro do que um eu que não sei se existe (se é esses outros)...

Sinto crenças que não tenho.

Enlevam-me ânsias que repudio.

A minha perpétua atenção sobre mim perpetuamente me ponta

traições de alma a um carácter que talvez eu não tenha,

nem ela julga que eu tenho.

Sinto-me múltiplo.

Sou como um quarto com inúmeros espelhos fantásticos

que torcem para reflexões falsas

uma única anterior realidade que não está em nenhuma e está em todas.

Como o panteísta se sente árvore (?) e até a flor,

eu sinto-me vários seres.

Sinto-me viver vidas alheias, em mim, incompletamente,

como se o meu ser participasse de todos os homens,

incompletamente de cada (?),

por uma suma de não-eus sintetizados num eu postiço.

Fernando Pessoa

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1

INTRODUÇÃO

Antes de mais, gostaríamos de salientar que o presente estudo se insere numa investigação

mais alargada que pretende estudar as relações entre a adaptação portuguesa do Inventário de

Personalidade para o DSM-5 (PID-5; Pires, R., Silva, D., Fagulha, T., & Gonçalves, B., 2014) e

outros instrumentos que caracterizam a personalidade em amostras clínicas.

A Perturbação Estado-Limite (Borderline) da Personalidade ou Perturbação de

Personalidade Borderline (nomenclatura adotada na presente dissertação; PPB) é uma condição de

saúde mental grave que afeta significativamente o funcionamento pessoal e interpessoal do

indivíduo Gunderson (2009).

Os critérios diagnósticos para a PPB têm sido tradicionalmente criticados por vários

motivos. Entre eles, a utilização de critérios politéticos, considerados por alguns como arbitrários

(são necessários apenas cinco dos nove critérios, o que gera uma grande possibilidade de

combinações) e que geram grande heterogeneidade clínica, a elevada comorbilidade com outras

perturbações mentais e a instabilidade temporal (Calvo, et al., 2016). Estas questões fizeram com

que alguns autores questionassem se a PPB deveria sequer ser considerada como um diagnóstico

(Gunderson, 2009).

Apesar de todas as críticas, esta perturbação de personalidade tem sido abordada por

diversos prismas. Desde as leituras psicodinâmicas, mais fenomenológicas e compreensivas, ao

modelo categorial que define critérios que se pretendem distintivos, aos modelos dimensionais, que

pretendem caracterizar a personalidade patológica através de traços, muitas têm sido as

contribuições para o estudo desta perturbação.

Esta controvérsia não escapou ao Manual de Diagnóstico e Estatística das Perturbações

Mentais, que inclui na sua última edição o Modelo Alternativo do DSM-5 para as Perturbações de

Personalidade, que forneceu uma nova forma de conceptualizar e a avaliar a PPB. Este modelo

define dois critérios, o Critério A (défices no funcionamento da personalidade) e o Critério B que

descreve traços de personalidade patológicos (American Psychiatric Association, 2014). Este

Modelo pode ser entendido como uma variante desadaptativa do Modelo dos Cinco Fatores (FFM).

O Critério B é medido através do PID-5, que foi um instrumento desenvolvido para a investigação e

uso clínico. Este instrumento foi desenvolvido com base numa série de modelos e medidas de traços

de personalidade desadaptativos.

O PID-5 tem demonstrado boas capacidades psicométricas e capacidade de diferenciar os

indivíduos com patologia (Calvo, et al., 2016). Apesar disso, este instrumento foi estudado em

poucas amostras de língua não inglesa, além de ter sido maioritariamente estudado com voluntários

saudáveis e amostras da população geral (Calvo, et al., 2016).

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2

No que diz respeito à PPB especificamente, há poucas investigações sobre se a abordagem

alternativa baseada em traços será útil na descrição da PPB. Hopwood, Thomas, Markon, Wright, e

Krueger (2012) encontraram numa amostra de estudantes que seis das sete características propostas

pela Seção III para a PPB se correlacionam moderadamente a fortemente com os critérios propostos

pela Seção II. Já Miller, Morse, Nolf, Stepp e Pilkonis (2012), fazendo recurso a uma amostra

comunitária, da qual metade estava a receber tratamento psiquiátrico, e utilizando traços do FFM da

personalidade para emular a proposta do DSM-5, mostraram que esses traços conseguem capturar

uma quantidade substancial de variância na PPB. Embora estes resultados se mostrem promissores

no que concerne à avaliação da PPB, são necessárias mais investigações em populações clínicas que

mostrem se os traços listados no DSM-5 contribuem para o constructo da PPB e se existem outros

traços conceptualmente relevantes que possam aumentar o poder descritivo deste Modelo.

O presente estudo insere-se nesta linha de investigação. Este estudo pretende fazer uma

caracterização da PPB à luz de modelos dimensionais (com recurso ao NEO-FFI e ao PID-5),

procedendo à análise dos traços e dimensões encontrados como preponderantes numa amostra

clínica da população portuguesa. Pretende-se também investigar se o PID-5 tem um bom poder

discriminativo no que concerne à PPB e de que forma. Este estudo investiga ainda a prevalência de

abuso sexual infantil (anterior aos 18 anos de idade) nos pacientes com PPB.

O presente estudo está organizado em diversos capítulos. O primeiro é o Enquadramento

Teórico, que se divide em duas grandes secções. A primeira secção pretende dar conta da evolução

histórica da investigação em Perturbações da Personalidade (PP), focando a controvérsia dos

modelos categoriais e das alternativas propostas por alguns autores, como o Modelo dos Cinco

Fatores (FFM) e o Modelo Alternativo para as PP do DSM-5. A segunda secção descreve e

caracteriza a PPB, tendo também em conta as controvérsias ao nível da investigação e

conceptualização desta PP.

Depois de introduzida a componente teórica, o segundo capítulo delimita os objetivos e

hipóteses, já apresentados anteriormente neste texto.

Prossegue-se com a apresentação do Método, no terceiro capítulo, onde se procede a uma

caracterização dos participantes, dos instrumentos e do procedimento estatístico adotado.

De seguida, no quarto capítulo, são apresentados os resultados, onde se dá conta dos estudo

metrológico dos instrumentos e dos resultados das MANOVAs e análises discriminantes, técnicas

escolhidas para verificar as hipóteses formuladas.

No quinto capítulo, apresenta-se a discussão dos resultados onde se comparam os resultados

obtidos com outros estudos e teorias prévias. Sempre que possível, tentou-se fazer uma ponte com

os construtos psicodinâmicos. Neste capítulo foram ainda endereçadas algumas considerações sobre

as limitações do estudo, sendo apontadas algumas implicações para a investigação e prática clínica.

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Em último, surge uma breve conclusão, que pretende sumariar os resultados obtidos com

esta investigação e relatar de que forma este estudo contribui para a discussão sobre o Modelo

Alternativo do DSM-5 para as PP no que concerne à PPB.

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CAPÍTULO 1

ENQUADRAMENTO TEÓRICO

1. O estudo das Perturbações de Personalidade: Breve perspetiva histórica

A história das Perturbações de Personalidade (PP) costuma remontar aos trabalhos de

Pritchard e Esquirol, que se interessaram por perturbações que se caracterizavam por

comportamentos e emoções peculiares mas em que não existiam sintomas de alucinações,

distorções sensoriais, falsas perceções ou perturbações do intelecto (Crocq, 2013). O período entre o

final do século XIX e o início do século XX foi marcado pelo aparecimento de diversos sistemas de

personalidade, quer normal, quer patológica. Um marco bastante importante foi a obra de Schneider

publicada em 1923 (Berrios, 1993). Neste ano, Schneider publicou uma taxonomia de

“personalidades psicopáticas”, que ele considerava serem entidades coexistentes com outras

perturbações mentais (Coolidge & Segal, 1998) e que faziam sofrer o indivíduo e os que o

rodeavam devido a traços de personalidade patológicos. Schneider considerava ainda que as

personalidades patológicas seriam constituições maioritariamente inatas mas que poderiam evoluir

como resultado de desenvolvimento pessoal ou de influências externas (Coolidge & Segal, 1998).

As PP têm sido definidas como padrões duradouros e persistentes de experiências internas e

comportamentos que prejudicam severamente a capacidade da pessoa de se adaptar adequadamente

a diversos contextos. As características centrais destas perturbações parecem ser o seu início

precoce (tipicamente na adolescência ou no início da idade adulta), estabilidade e cronicidade

(apesar dos sintomas poderem diminuir e variar em termos de severidade), ubiquidade (relacional,

ocupacional e em contextos educacionais, por exemplo) e danos intrapsíquicos ou interpessoais

(Hirschfeld, 1993). Estas perturbações costumam afetar negativamente os tratamentos: o avanço

terapêutico costuma ser mais lento, as taxas de incumprimento são maiores e a dificuldade em

estabelecer uma relação terapêutica é endémica. Adicionalmente, as PP são difíceis de diagnosticar.

Além disso, o facto dos critérios e da conceptualização das PP terem mudado ao longo dos últimos

50 anos faz com que o diagnóstico se torne ainda mais confuso (Coolidge & Segal, 1998).

Historicamente, as PP têm sido consideradas como separadas de outras formas de

perturbações mentais. Desde o surgimento do DSM-III e do eixo II que o campo tem reconhecido

que as PP são uma fonte de comorbilidade importante de outras perturbações mentais. Mas a área

ainda enfrenta problemas e o entendimento da natureza e origens das PP permanece pouco

articulado (Gunderson, 2009). Estes problemas são tanto conceptuais quanto empíricos. Têm sido

criados diversos modelos e teorias que pretendem explicar os diversos fenómenos da perturbação da

personalidade mas nenhum deles oferece uma explicação global e coerente, condições requeridas

para uma teoria satisfatória. A teoria e a nosografia estão de alguma forma pouco relacionadas, já

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que a nosografia, pelo menos na perspetiva do DSM-5, pretende ser ateórica e as conceptualizações

costumam seguir um paradigma ou uma escola específica (Gunderson, 2009; Coolidge & Segal,

1998). Para além dos trabalhos de Schneider, os autores psicanalíticos foram alguns dos primeiros a

tentar fazer uma conceptualização das PP, tendo influenciado tendo influenciado os sistemas

diagnósticos do início do século XX e, nomeadamente, os DSM-I e II (Coolidge & Segal, 1998).

1.1. O Modelo Categorial

No DSM-III e subsequentes as PP foram descritas como tipos discretos, agrupados em três

clusters e colocados num eixo separado (eixo II; Crocq, 2013).

A abordagem categorial estuda constelações de traços psicopatológicos, levando a cabo

investigação sobre a validade e fiabilidade dos diagnósticos correspondentes, tentando assim atingir

uma clara diferenciação entre as PP, por forma a manter a relevância clínica desta abordagem. Esta

tradição pretendeu ajudar os psiquiatras clínicos a familiarizar-se com algumas PP vistas com mais

frequência apesar da definição das mesmas ser, por vezes, algo arbitrária.

Na verdade, esta abordagem tem sido amplamente criticada. Por um lado, pelo elevado grau

de comorbilidade das PP e por outro pela arbitrariedade dos critérios relativos à inclusão ou

exclusão das perturbações do sistema do DSM (Kernberg, 1985). Alguns autores alegam ainda que

a perspetiva categorial não acompanha as principais orientações teóricas e os paradigmas

dominantes da psicologia, nomeadamente o psicanalítico, o comportamental e o humanista

(Widiger & Trull, 1993).

Diversas propostas para a mudança sobre a forma como as PP são classificadas e

diagnosticadas continuaram a ser feitas tendo surgido alguns métodos e modelos alternativos

(Widiger, Costa, Gore, & Crego, 2013).

1.2. O surgimento dos modelos dimensionais

Dentro destas propostas encontram-se os modelos dimensionais que pretendem estudar não

apenas as PP como também as relações das PP com a personalidade normal. O modelo dimensional

pretende encontrar características fundamentais que correspondam a descrições clínicas de PP

específicas, através de análises fatoriais de traços (Kernberg, 1985). Esta abordagem, que assume

uma continuidade entre o funcionamento normal e patológico, está cimentada nas dimensões

extraídas da análise estatística (Widiger & Trull, 2007).

Ao longo das últimas décadas vários autores, como Cattell e Eysenck, e equipas de

investigadores, como a de Costa e McCrae, adotaram este modelo para responder a questões sobre a

avaliação da personalidade e sobre a quantidade de traços que um indivíduo apresenta (Feist &

Feist, 2008). Actualmente, uma grande maioria dos investigadores têm concluído que são cinco o

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número de fatores que emergem das técnicas de análise fatorial (Feist & Feist, 2008) por mais que

existam outras propostas como a dos três fatores (Zuckerman, Kuhlman, Joircman, Teta, & Kraft,

1993) e a dos sete fatores (Aluja & Blanch, 2011).

1.2.1. O Modelo dos Cinco Fatores

O Modelo dos Cinco Fatores (em inglês, Five Factor Model, FFM) foi desenvolvido de uma

forma empírica, a partir de termos linguísticos para descrever traços, procurando-se assim trabalhar

com os traços, características, ou componentes da personalidade que falantes de uma língua

considerariam ser mais importantes na descrição de si próprio e dos outros (Goldberg, 1993).

Este modelo propõe que os traços de personalidade são bipolares e se organizam em cinco

dimensões: Neuroticismo, Extroversão, Abertura à Experiência, Amabilidade e Conscienciosidade.

O FFM afere ainda 30 facetas que juntas compõem as cinco dimensões listadas (seis facetas para

cada dimensão; Trull & Brown, 2013). McCrae e Costa (2003) avançaram um modelo específico

para explicar o desenvolvimento de traços de personalidade no contexto do FFM, que no entanto

não se apresenta como o único viável. De facto, é possível estabelecer correspondências próximas

entre constructos de orientação psicodinâmica e elementos da estrutura do FFM (Widiger, 2015).

O FFM acumulou considerável suporte empírico: estudos da genética do comportamento

dão suporte em relação à estrutura proposta (e até mesmo algum suporte genético molecular para o

Neuroticismo). As dimensões e facetas do FFM demonstraram ser úteis na previsão de um número

substancial de indicadores importantes para a vivência pessoal, como bem-estar subjetivo, aceitação

social, conflito entre relacionamentos, estado civil, sucesso académico, criminalidade, desemprego,

saúde física, saúde mental, satisfação no trabalho e mortalidade. Além disso, tem sido

extensivamente validado e replicado em diversas culturas (Widiger, Costa, Gore, & Crego, 2013).

O instrumento que costuma ser utilizado para operacionalizar e avaliar este modelo, o

Inventário de Personalidade Neo – Revisto (NEO-PI-R; Costa & McCrae, 1992), tem também

demonstrado boas propriedades psicométricas e é considerado um instrumento sólido para a

avaliação global da personalidade (Costa & McCrae, 2008).

1.2.2. O FFM aplicado às PP

Widiger et al. (2002) propuseram que as PP incluídas no DSM-IV-TR poderiam ser

entendidas como variantes desadaptativas e/ou extremas dos domínios e facetas do FFM. Um

grande número de investigações empíricas suporta esta proposta: O'Connor (2002) conduziu

análises factoriais com resultados previamente publicados em aproximadamente 75 estudos que

envolviam variáveis do FFM e 28 escalas de inventários de personalidade utilizados comummente.

Os resultados deste estudo sugerem que a estrutura factorial existente nestas escalas de muitos

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instrumentos poderiam ser replicados utilizando dados derivados exclusivamente das escalas que se

associam ao FFM.

Além disso, o NEO-PI-R, que pretende medir o funcionamento normal (ou geral) da

personalidade, tem sido bastante eficaz na aferição da maioria das PP, sendo tendencialmente

excepções as PP dependente, obsessiva-compulsiva, esquizotípica e histriónica (Miller, Bagdy,

Pilkonis, Reynolds, & Lynam, 2005). Esta eficácia dever-se-á ao facto do NEO-PI-R conseguir

aferir as variantes desadaptativas de elevado neuroticismo, baixa extroversão, baixa abertura à

experiência, elevado antagonismo, e baixa conscienciosidade (Widiger & Haigler, 2001), variantes

essas que correspondem aos polos do FFM primariamente envolvidos na maior parte das PP (mas

não em todas; Widiger & Lynam, 2001).

Uma vantagem potencial de uma classificação dimensional é que diferentes limiares podem

ser fornecidos para diferentes decisões sociais e clínicas, uma opção que poderia ser bastante útil

para vários serviços e agências de saúde pública. Até agora, no entanto, estas dimensões parecem

ter apresentado baixa validade para propósitos clínicos (Widiger & Trull, 2007).

1.3. O surgimento de um modelo híbrido: o Modelo Alternativo do DSM-5 para as PP

As limitações do modelo categorial como a elevada comorbilidade, falta de abrangência

adequada e dificuldade em distinguir o normal do patológico no que diz respeito às PP (Widiger &

Trull, 2007) fizeram com que o DSM-5 propusesse um modelo alternativo para as PP (Miller,

Morse, Nolf, Stepp, & Pilkonis, 2012). Na secção II mantiveram-se as PP incluídas no

DSM-IV-TR, cujos critérios são os mais comuns nos diagnósticos formais (American Psychiatric

Association, 2014). Na secção III surge o Modelo Alternativo do DSM-5 para as PP que pretende

colmatar alguns problemas como o excesso de comorbilidade, a heterogeneidade entre diagnósticos,

a instabilidade temporal das perturbações e a pobre validade convergente e discriminante entre as

PP (Anderson, Snider, Sellbom, Krueger, & Hopwood, 2014). Os dois modelos foram incluídos de

modo a preservar uma certa continuidade com a prática clínica corrente mas introduzindo ao mesmo

tempo uma perspetiva que pretende responder a diversas lacunas da abordagem atual às PP

(American Psychiatric Association, 2014).

O modelo alternativo é um sistema híbrido, que inclui tanto a visão categorial quanto

dimensional, empregando critérios de prejuízo no funcionamento da personalidade e traços de

personalidade, assumindo um continuum entre a personalidade normal e patológica. A adoção deste

modelo pretende obter maior suporte empírico, maior utilidade clínica, um melhor entendimento

dos padrões de comorbilidade e maior utilidade na estruturação dos tratamentos (Calvo, et al.,

2016).

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Neste modelo são adotados diversos critérios para o diagnóstico de uma PP. O primeiro

critério (Critério A) considera o prejuízo em domínios do self (identidade ou auto-direccionamento)

e funcionamento interpessoal (empatia ou intimidade). A Escala do Nível de Funcionamento da

Personalidade utiliza cada um desses elementos para diferenciar cinco níveis de prejuízo, variando

de pouco ou nenhum prejuízo (i.e., saudável funcionamento adaptativo – Nível 0) até prejuízo

extremo (Nível 4; American Psychiatric Association, 2014). Este critério foi em grande parte

elaborado a partir de uma perspetiva psicodinâmica, nomeadamente no que concerne às supostas

características centrais de uma PP (Widiger, 2015).

O segundo critério (Critério B) descreve um modelo dimensional de traços de personalidade

desadaptativos. O modelo dimensional incluído no critério B é composto por cinco domínios, que

incluem Afetividade Negativa (vs. Estabilidade Emocional; AN), Desprendimento (vs. Extroversão;

DP), Antagonismo (vs. Agradabilidade; AG), Desinibição (vs. Conscienciosidade; DS) e

Psicoticismo (vs. Lucidez; PT), e 25 facetas que estão incluídas nestes domínios (American

Psychiatric Association, 2014). Cada domínio associa-se a uma combinação de facetas e algumas

facetas são simultaneamente representadas em diversos domínios (Calvo, et al., 2016). Estes cinco

domínios têm correspondência com variantes desadaptativas das cinco dimensões do FFM

(American Psychiatric Association, 2014). As dimensões e facetas estão apoiadas na literatura

empírica (Anderson, Snider, Sellbom, Krueger, & Hopwood, 2014). As PP específicas

correspondem a subgrupos das 25 facetas de traços e baseiam-se em revisões meta-analíticas e

dados empíricos sobre as relações dos traços com diagnósticos de PP contidas no DSM-IV-TR

(American Psychiatric Association, 2014). Além dos algoritmos estarem explicitados na secção III,

Krueger, Derrineger, Markon, Watson & Skodol (2012) fazem uma análise dos resultados obtidos

para cada PP e respetivas facetas. Dentro das PP que podem ser derivadas deste modelo encontram-

se as perturbações antissocial, evitante, estado-limite (borderline), narcísica, obsessiva-compulsiva

e esquizotípica.

Os défices no funcionamento da personalidade expressam-se também através dos critérios C

e D, relativos à invasibilidade e estabilidade dos traços, bem como dos critérios E, F e G, relativos a

explicações alternativas para a patologia da personalidade (American Psychiatric Association,

2014).

Este modelo tem-se mostrado válido no diagnóstico de PP e o instrumento que é utilizado

para operacionalizar o modelo dimensional de traços patológicos – o Inventário de Personalidade

para o DSM-5 (PID-5) – tem demonstrado propriedades psicométricas adequadas. Este instrumento

tem sido utilizado para a avaliação da componente dimensional das PP (Calvo, et al., 2016). Além

disso, tem também mostrado associações com outros modelos de Personalidade como o Modelo dos

Cinco Factores para as PP (PSY-5) e o FFM (Gore & Widiger, 2013).

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De uma forma breve, a investigação em personalidade e PP específicas ainda envolve

dilemas básicos. Há diversas formas de operacionalizar e medir as PP, com diversas escolas de

pensamento e autores empíricos, que se pretendem ateóricos, o que dificulta o consenso e a

utilização de uma linguagem partilhada pelos diversos profissionais que com estas pessoas lidam.

2. A Perturbação de Personalidade Borderline

2.1. Evolução do conceito

Sinto-me múltiplo.

Sou como um quarto com inúmeros espelhos fantásticos

que torcem para reflexões falsas

Recuperando o poema de Pessoa em epígrafe, podemos notar como algumas existências

parecem estar num limiar ténue entre a sanidade e a loucura, a construção da identidade e a difusão

do eu. Onde os “espelhos”, que tanto podem ser o eu como o outro, parecem não refletir uma

realidade integrada e com sentido. Num domínio menos poético, a história de pessoas com

problemas identitários, falta de regulação dos afetos, problemas relacionais e incapacidade de

manter um funcionamento adequado é também antiga.

Na verdade, o conceito de doente borderline já apareceu com Stern (1938; citado por

National Collaborating Centre for Mental Health [UK], 2009) que descreveu um grupo de pacientes

que não beneficiavam da Psicanálise e que não pareciam cair nas categorias de psicose ou de

neurose. Durante largos anos as conceptualizações sobre estes pacientes ficaram confinadas à

literatura Psicanalítica, não integrando as duas primeiras versões do DSM (Adams, Bernat, &

Luscher, 2002).

Apesar dos trabalhos psicanalíticos, este grupo de pacientes manteve-se à margem das

discussões psiquiátricas durante largos anos. O grupo começou a ser reconhecido nos anos 50, como

resultado de estudos feitos por Robert Knight (Gunderson, 2009). Historicamente, a Perturbação de

Personalidade Borderline (PPB) esteve situada dentro do espectro das psicoses, particularmente

associada à esquizofrenia. No DSM-II o termo borderline é quase sinónimo de esquizofrenia latente

ou de outros termos como esquizofrenia limítrofe ou borderline, esquizofrenia pré-psicótica,

pseudopsicótica ou reação esquizofrénica latente (Dalgalarrondo & Vilela, 1999).

Ainda assim, foi só com Kernberg (1967) que surgiu um verdadeiro interesse nesta

patologia. No entanto, apesar deste autor ter popularizado o conceito de “borderline”, ele usava o

termo para descrever um nível de organização patológica da personalidade mas não uma

perturbação de personalidade específica (Adams, Bernat, & Luscher, 2002). Kernberg descrevia a

Organização de Personalidade Borderline (OPB) como possuindo as seguintes características

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intrapsíquicas (Kernberg, 1967; citado por Skodol, et al., 2002):

difusão da identidade;

utilização de mecanismos de defesa primitivos (como a cisão [idealização e desidealização],

negação, projeção, ação e identificação projetiva);

teste da realidade intacto, mas vulnerável a falhas e alterações.

Mesmo com todos estes avanços, o diagnóstico de PPB só apareceu na terceira edição do

DSM, em 1980, tendo sido adaptado doze anos depois para a Classificação Estatística Internacional

de Doenças e Problemas Relacionados com a Saúde (ICD; Gunderson, 2009). A definição que

integrou o DSM-III partiu de uma revisão que identificou vários descritores em áreas como afetos

disfóricos, ações impulsivas, relações interpessoais, cognições quasi-psicóticas e dificuldades de

adaptação social, além de ter demonstrado que a perturbação podia ser medida e diferenciada de

outras perturbações psiquiátricas (Skodol, et al., 2002).

2.2. Um diagnóstico controverso

Desde a sua introdução no DSM-III, a PPB tem sido amplamente diagnosticada, sendo uma

das PP mais prevalentes. No entanto, a população borderline é notoriamente heterogénea, quer do

ponto de vista descritivo, quer teórico (Smits, et al., 2017). Talvez por isso a PPB tenha sido alvo de

críticas desde a sua introdução no DSM-III e continue a ser um diagnóstico controverso, com a

discussão a centrar-se na sobreposição de sintomas com outras perturbações, como a Perturbação de

Pós-Stress Traumático (PPST) ou outras referentes aos (antigos) eixos I e II. Alguns autores

sugerem que a PPB é, na verdade, uma variante da depressão, da perturbação bipolar ou de outra

perturbação de eixo I (Sperry, 2013). Há alguns autores que pretendem explicar a heterogeneidade

da PPB advogando que dentro da mesma existem subtipos: (1) PPB “puro”, sem elevações em

dimensões características de outras PP; (2) extrovertido/externalizante, com altos níveis de

características histriónicas, narcísicas e antissociais e (3) esquizotípico/paranóide, com

características esquizotípicas e paranóides marcadas (Smits, et al., 2017).

Alguns autores põem mesmo em causa a validade e fiabilidade da PPB como entidade

nosológica. No entanto, e apesar de terem sido introduzidos novos critérios nas versões posteriores

ao DSM-III, as diferenças mais significativas só foram incluídas na última versão do mesmo

(Skodol, et al., 2002).

2.3. Sintomas característicos

A PPB costuma iniciar-se na adolescência e eclode na fase de jovem adulto (Adams, Bernat,

& Luscher, 2002). O curso é menos estável do que o esperado para outras PP e algumas

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características parecem declinar com o tempo, sendo este processo aparentemente afectado pelo

temperamento (Leichsenring, Leibing, Kruse, New, & Leweke, 2011). A PPB tem sido considerada

como uma perturbação crónica e praticamente intratável mas dados mais recentes indicam uma alta

taxa de remissão (cerca de 45% nos dois anos seguintes à atribuição do diagnóstico e 85% nos 10

anos seguintes; Masson, Bernoussi, Mience, & Thomas, 2013). Contudo, o prognóstico continua

desencorajante o que ressalta a necessidade de investigação, não só sobre o curso, etiologia e

diagnóstico da perturbação, mas também sobre o seu tratamento (Bender et al., 2001).

A PPB pode ser vista como um contínuo desde o normal ao patológico, onde o estilo de

personalidade borderline corresponde ao normal e a PPB à patologia. Em termos comportamentais,

os doentes com PPB caracterizam-se por gestos suicidários e/ou auto-mutilantes e por serem

incitadores de conflitos interpessoais. As suas relações interpessoais caracterizam-se por uma

grande instabilidade, verificando-se transições bruscas entre estados de idealização e de apego e

estados de oposição e de desvalorização do outro. As suas relações são rápidas e intensas e, muitas

vezes, superficiais. São sensíveis à rejeição e experienciam medos de abandono (Sperry, 2013).

Segundo Millon & Davis (1996) as situações que costumam desencadear respostas

desadaptativas por parte destes doentes têm a ver com os seus esforços para evitar o abandono, real

ou imaginado.

Em termos cognitivos, os doentes com PPB costumam ter um padrão inflexível de

pensamento, onde rígidas abstrações levam facilmente a perceções idealizadas dos outros como

personificações do “completamente bom” ou “completamente mau” (Sperry, 2013). Adler (1985)

sugeriu que os doentes com PPB têm deficiências na memória evocativa, pelo que têm dificuldades

em evocar imagens e sentimentos que os podem estruturar e nutrir em tempos de “tempestade”.

A sua inflexibilidade e impulsividade refletem-se também nos seus mecanismos de defesa: o

doente borderline tem tendência à clivagem e consequente dificuldade em “sintetizar” qualidades

contraditórias e utiliza a identificação projetiva atribuindo ao outro os seus medos e sentimentos

negativos (Sperry, 2013).

Em termos afetivos, os pacientes com PPB costumam oscilar entre um humor normal ou

eutímico e um humor disfórico. Além disso, a raiva e a fúria intensas e inadequadas podem ser

facilmente desencadeadas. No outro extremo, estão os sentimentos crónicos de vazio ou tédio

(Sperry, 2013).

No que diz respeito ao estilo de vinculação, os doentes borderline costumam estar

associados ao estilo desorganizado. Este tipo de vinculação tende a desenvolver-se a partir de

experiências repetidas em que o cuidador parece assustado ou é assustador para a criança. Este

estilo parece associar-se à sintomatologia dissociativa, que aparece frequentemente em doentes

borderline (Lyddon & Sherry, 2001).

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2.4. Borderline, que explicação? – Teorias, Modelos e Critérios Diagnósticos: um

(des)encontro de perspetivas

2.4.1. A Perspetiva Psicodinâmica

Dentro da perspetiva psicodinâmica, nem sempre é claro se o termo borderline se refere a

uma PP ou a um nível de organização da personalidade. Por exemplo, na primeira edição do PDM,

o termo borderline referia-se a um nível de organização. No entanto, o conceito de uma perturbação

de personalidade do tipo borderline, definido pelos critérios do DSM, tornou-se de tal forma

universal que contemporaneamente se segue a proposta de Kernberg (1967) para a descriminação

entre organização da personalidade borderline e a PPB (Lingiardi & McWilliams, 2017). Nesta

secção utilizar-se-á o termo de forma intercambiável, à semelhança do que fazem muitos autores

psicodinâmicos.

Através da análise da literatura psicodinâmica é possível verificar que vários autores, como

Kernberg (1975), vinculam a etiologia das organizações borderline ao esquema de desenvolvimento

de Mahler e, em particular, à subfase da reaproximação da fase de separação-individuação. Uma

perturbação nesta fase levaria a uma deficiente estruturação da constância objetal. Kernberg (1975)

sugeriu que os pacientes borderline estariam a viver repetidamente este conflito, com consequente

dificuldade em estar sós e ansiedade constante em relação ao facto de que os outros os possam

abandonar. Ao tentar colmatar estes sentimentos de solidão e desamparo, o doente borderline fica

dependente do objeto externo e estabelece com o mesmo uma relação funcional. Esta perturbação

desenvolvimentista levaria também a uma dificuldade na capacidade de lidar com a ambivalência

afetiva do objeto (já que não há constância do mesmo), com consequente dificuldade na

diferenciação entre self e objeto (Maranga, 2002).

Um segundo componente deste problema desenvolvimentista é que a falha na constância do

objeto deixa o doente incapaz de integrar aspetos “bons” e “maus” dele próprio e dos outros. A

consequência é uma predominância das introjeções negativas, sendo as representações do self e do

objeto dissociadas em “completamente bom” e “completamente mau”, de modo a que as forças do

ódio e da destruição não consigam destruir sentimentos bons e amorosos (Gabbard, 2005). Deste

modo, tal como no caso dos doentes psicóticos, no doente borderline há um predomínio da

agressividade sobre o amor e uma predominância das forças destrutivas sobre o poder construtivo

(Maranga, 2002). Além disso, os episódios psicóticos são frequentes nos doentes borderline e

costumam associar-se a fantasias de abandono, destruição ou necessidade do objeto externo

(Gunderson & Kolb, 1978).

Alguns autores, como Adler (1985), apontam, além de uma falha na subfase da

reaproximação, um deficit ao nível relacional precoce (Gabbard, 2005). Para estes autores, cuidados

inconsistentes ou não confiáveis, com cuidadores com uma certa incapacidade para o exercício da

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função contentora, não permitiriam ao indivíduo construir uma dimensão simbólica e

representacional da vida mental. Nos borderlines há uma clara insuficiência na transformação dos

elementos que povoam o seu mundo interno em elementos verdadeiramente pensáveis. Tais

deficiências ao nível da mentalização poderão estar na base das passagens ao ato, tão frequentes

nestes doentes.

O doente borderline tem também uma insuficiente reserva narcísica o que o torna pouco

tolerante à frustração e torna o seu sistema defensivo predominantemente frágil e imaturo

(Maranga, 2002).

O borderline encontra-se também aquém da verdadeira depressão vivendo uma depressão

limite, depressão de desamparo ou depressão de abandono, caracterizada, essencialmente, por um

sentimento de falta, de vazio, de solidão, de desamparo e por uma angústia de separação (Matos,

1994).

O Manual de Diagnóstico Psicodinâmico (2ª edição, PDM-2; Lingiardi & McWilliams,

2015) faz uma síntese das características do doente borderline, de acordo com uma visão

psicodinâmica:

Quadro 1. Características-chave da PPB segundo o PDM-2.

Padrões de constituição-maturação influentes: dificuldades congénitas na regulação das

emoções, intensidade, agressão, capacidade de ser tranquilizado.

Preocupação/tensão central: coesão do self versus fragmentação; apego versus desespero de

abandono.

Emoções centrais: emoções geralmente intensas, particularmente a raiva, a vergonha e o medo.

Crença patológica característica sobre si: “Não sei quem sou; Vivo estados de self dissociados

sem um sentimento de continuidade.”

Crença patológica característica sobre os outros: “O outro é unidimensional e definido pelos

seus efeitos em mim, não por eu ter uma noção da sua complexidade psicológica individual.”

Defesas centrais: clivagem, projeção, negação, dissociação, passagem ao ato e outras defesas

primitivas.

Nota. Adaptado de PDM-2. Lingiardi, V., & McWilliams, N. (2017). Psychodynamic Diagnostic Manual, Second

Edition: PDM-2. New York: Guilford Publications.

Em termos de investigação, alguns autores desenvolveram instrumentos com uma base

dinâmica para avaliação da personalidade, nomeadamente o California Q-Sort e o Shedler-Westen

Assessment Procedure-200 (SWAP-200). Ambos têm demonstrado associações com o FFM, com

exceção de algumas escalas do SWAP-200 como a Dissociação, Conflito Edipiano e Conflito

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Sexual. No entanto, estas escalas incluem itens que não parecem estar associados de forma

significativa às PP (Widiger, 2015).

Os autores dinâmicos têm-se também pronunciado sobre o modelo proposto pelo DSM-5

para as PP. Alguns advogam que falta neste modelo uma perspetiva desenvolvimentista sobre a

personalidade patológica. Além disso, este modelo não permite uma identificação consistente dos

pontos fortes e das vulnerabilidades do indivíduo. Ainda assim, a ênfase colocada ao nível da

funcionalidade da personalidade está de acordo com a abordagem psicodinâmica ao diagnóstico.

Seria importante investigar o significado clínico da distinção entre níveis de funcionalidade

psicodinâmica no que diz respeito à PPB, bem como das restantes PP (Van Riel, et al., 2017).

2.4.2. A PPB no FFM

Diversos autores advogam que, apesar do FFM ter sido construído para avaliar a

personalidade normal, pode servir para caracterizar os doentes com PPB. A proposta de Lynam e

Widiger (2001), onde os autores sugeriram que a PPB poderia ser reconhecível por um padrão de

valores altos e baixos em determinados domínios e facetas, tem recebido bastante suporte empírico

(Trull & Brown, 2013). A estabilidade temporal do perfil FFM em doentes borderline também tem

sido verificada (Warner, et al., 2004).

O perfil prototípico proposto é o seguinte (Widiger & Lynam, 2001): resultados elevados na

Ansiedade, Hostilidade, Depressão, Auto-consciência, Impulsividade e Vulnerabilidade, do

domínio Neuroticismo; resultados elevados em Fantasia, do domínio Abertura à Experiência;

resultados baixos em Confiança, Retidão e Complacência, do domínio Amabilidade e resultados

baixos em Deliberação, do domínio Conscienciosidade. De uma forma geral, espera-se que os

doentes com PPB pontuem alto no Neuroticismo e Abertura à Experiência e baixo na Amabilidade

e Conscienciosidade. De todas as dimensões, a que estará mais associada à PPB será o

Neuroticismo, com resultados elevados.

2.4.3. A Perspetiva Categorial e mais além: as secções II e III do DSM-5

Os critérios diagnósticos para a PPB mantiveram-se inalterados na secção II do DSM-5

relativamente aos já adotados na versão anterior do Manual (consultar Quadro 3). Na secção III, a

PPB é conceptualizada da seguinte forma (American Psychiatric Association, 2014):

Critério A: Prejuízo moderado ou grave no funcionamento da personalidade, manifestado

por dificuldades características em duas ou mais das seguintes quatro áreas: (1) Identidade;

(2) Auto-direccionamento; (3) Empatia e (4) Intimidade.

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Quadro 2. Critério A para o Diagnóstico de PPB na secção III do DSM-5.

Identidade. Autoimagem marcadamente empobrecida, pobremente desenvolvida ou

instável, com frequência associada ao autocriticismo; sentimentos crónicos de vazio;

estados dissociativos sob stress.

Autodirecção. Instabilidade dos objetivos, aspirações, valores ou planos de carreira.

Empatia. Capacidade comprometida para reconhecer os sentimentos e necessidades dos

outros associada a hipersensibilidade interpessoal (isto é, propensão a sentir-se

menosprezado ou insultado); a perceção dos outros está seletivamente enviesada para

atributos negativos ou vulnerabilidades.

Intimidade. Relações próximas intensas, instáveis e conflituosas, marcadas por

desconfiança, dependência e preocupação ansiosa com abandono real ou imaginado;

relações próximas com frequência vistas em extremos de idealização e desvalorização e

alternância entre sobreenvolvimento e afastamento.

Nota. Adaptado de DSM-5. American Psychiatric Association. (2014). Manual de Diagnóstico e Estatística das

Perturbações Mentais (5ª ed.). Lisboa: Climepsi.

Critério B: Traços Preditores (consultar Quadro 3).

Quadro 3. Critérios Diagnósticos para a PPB na secção II e Critério B da secção III do DSM-5.

DSM-IV/DSM-5 (secção II) DSM-5 (secção III – Critério B)

Pelo menos cinco (ou mais) dos seguintes:

1. Esforços para evitar o abandono.

2. Relações interpessoais instáveis

(caracterizadas por alternância entre

extremos de idealização e desvalorização)

3. Perturbação da identidade.

4. Impulsividade pelo menos em 2 áreas

autolesivas (sem incluir comportamentos

suicidas ou automutilantes).

5. Comportamentos suicidários ou

automutilantes.

6. Instabilidade afectiva.

7. Sentimento crónicos de vazio.

8. Raiva intensa e inapropriada.

9. Ideação paranóide ou sintomas

Pelo menos 4 das seguintes, em que

pelo menos uma deve ser (5), (6) ou (7):

1. Labilidade emocional

2. Ansiedade

3. Insegurança de Separação

4. Depressividade

5. Impulsividade

6. Envolvimento em comportamentos

de risco

7. Hostilidade

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dissociativos.

Nota. Adaptado de DSM-5. American Psychiatric Association. (2014). Manual de Diagnóstico e Estatística das

Perturbações Mentais (5ª ed.). Lisboa: Climepsi.

No âmbito desta dissertação, considerar-se-ão os critérios propostos pelo DSM-5 para a

PPB, quer na secção II, quer na secção III, e também a proposta de Lynam e Widiger (2001) para

uma operacionalização do constructo relativamente consensual. No entanto, reconhecem-se as

significantes contribuições de outras visões e modelos.

Sumariamente, cada visão tem os seus méritos e os seus defeitos. De uma forma geral, as

diversas visões apresentadas parecem concordar ao nível sintomático. Já a explicação para os

sintomas é que não parece ser consensual. Tal não é de espantar, já que a PPB se parece encontrar

numa encruzilhada teórica, entre a Psiquiatria e as abordagens psicodinâmicas. Se a primeira

pretende, pelo menos na perspetiva do DSM, ser ateórica e encontrar uma forma de fazer um

diagnóstico diferencial, as segundas centram-se numa compreensão fenomenológica e

metapsicológica do indivíduo (Medina, 2014). Espera-se que este novo modelo de avaliação das

PP possa contribuir para uma linguagem mais partilhada e trazer algum consenso quanto aos

padrões de comorbilidade, fatores etiológicos e, acima de tudo, à estruturação do tratamento de

doentes com PPB. Pensa-se que a utilização complementar destas diversas perspetivas pode ser

útil e não mutuamente exclusiva.

2.5. Etiologia

Ao analisar os fatores etiológicos relacionados com a PPB, é importante notar não apenas a

predisposição biológica e os fatores psicológicos, como também as múltiplas formas em que estes

interagem para modelar o curso da perturbação (Adams, Bernat, & Luscher, 2002).

2.5.1. Fatores Genéticos e Neurobiológicos

De acordo com uma meta-análise levada a cabo por Amad, Ramoz, Thomas, Jardri e

Gorwood (2014), os estudos com famílias e gémeos suportam largamente o papel potencial da

vulnerabilidade genética como uma origem da PPB, com uma taxa de hereditariedade de

aproximadamente 40%. A maior parte dos componentes da perturbação (e.g. sensibilidade

interpessoal, desregulação dos afetos, impulsividade) encontra-se, não só nos pacientes, mas

também em diversas gerações das respetivas famílias (Masson, Bernoussi, Mience, & Thomas,

2013). Além disso, existem evidências para interações e correlações gene-ambiente.

Estudos de ressonância magnética funcional têm mostrado que nos pacientes com PPB o

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volume da amígdala é mais reduzido do que na população geral e que há uma inibição do córtex

pré-frontal aquando da realização de tarefas de exposição a expressões faciais, da reação a palavras

com significado emocional e da cooperação interpessoal. Também há evidência de volume

hipocampal reduzido em pacientes com PPB. Além disso, algumas investigações encontraram que

há uma resposta serotoninérgica reduzida, apesar de ainda não terem sido identificados genes

específicos (Leichsenring, Leibing, Kruse, New, & Leweke, 2011).

2.5.2. Fatores Psicológicos

Em termos etiológicos, a PPB é muitas vezes associada a traumas precoces. Algumas ideias

derivadas da Psicanálise têm recebido algum suporte empírico e o papel etiológico dos traumas

infantis tem-se tornado evidente. O abuso infantil e a negligência são extremamente comuns entre a

população com PPB: segundo Frías e Palma (2014), 40-71% foram abusados sexualmente e 25-71%

foram abusados fisicamente. Um outro estudo revelou que numa amostra de adultos em tratamento

psiquiátrico diagnosticados com PPB 81% reportam histórias de trauma interpessoal na infância,

incluindo abuso físico (71%), abuso sexual (68%) e testemunho de violência doméstica (62%).

Também foi referido que adultos com PPB têm maior probabilidade de reportar abuso emocional

infantil, negligência e maus cuidadores, quando comparados, quer com população não clínica, quer

com população clínica com outras patologias (Cloitre, Gavert, Weiss, Carlson, & Bryant, 2014). Há

ainda evidência de que os pacientes com PPB têm dificuldades em modular as emoções, o que se

parece associar a traumas precoces (Frías & Palma, 2014). Além disso, o trauma, na forma de abuso

sexual, está fortemente correlacionado com as automutilações nos pacientes borderline (Herman,

Perry, & Van der Kolk, 1989). A automutilação costuma ser frequentemente uma experiência em

que não há relato de dor, o que sugere que tem lugar num estado dissociativo. Esta combinação

entre trauma severo e o fenómeno dissociativo na PPB levou alguns investigadores a ligá-la com a

PPST (Cloitre, Gavert, Weiss, Carlson, & Bryant, 2014).

De facto, os sobreviventes de traumas infantis, especialmente de traumas estendidos no

tempo, parecem apresentar maior probabilidade de sofrer de PPST e trauma complexo (cPPST). O

cPPST apresenta muitas semelhanças com a PPB, nomeadamente ao nível da desregulação afetiva,

impulsividade, ideação suicida, sentimentos de vazio e outros problemas identitários, dificuldades

interpessoais crónicas, problemas de abandono, raiva e dissociação. Por estas razões, houve autores

que propuseram que a PPB constitui uma forma complexa e crónica de PPST, apesar desta proposta

ser controversa (Roth et al., 1997; Pearlman, 2001; Van der Kolk et al., 2005; citados por

MacIntosh, Godbout, & Dubash, 2015).

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2.6. Comorbilidade

Como já foi referido anteriormente, uma das maiores críticas levantadas ao diagnóstico da

PPB, e que levou alguns autores a duvidar da sua validade diagnóstica, foi a sua elevada

comorbilidade (MacIntosh, Godbout, & Dubash, 2015).

A PPB apresenta comorbilidade com perturbações do humor, abuso de substâncias,

perturbações do controlo dos impulsos, perturbações alimentares, disforia de género, défice de

atenção e PPST (Gunderson & Zanarini, 1987; van der Kolk, 1987; Herman, Perry, & van der Kolk,

1989; Widiger & Frances, 1989; citados por Adams, Bernat, & Luscher, 2002).

Além disso, a PPB coexiste frequentemente com outras PP, especialmente as do Grupo B.

Tal faz algum sentido, já que existem alguns elementos comuns subjacentes a este grupo, como o

comportamento dramático ou errático e a falta de controlo dos impulsos (Adams, Bernat, &

Luscher, 2002). Por exemplo, Widiger e Trull (1993) demonstraram que muitos indivíduos que

recebem o diagnóstico de PPB recebem também o diagnóstico de uma outra PP. Alguns

investigadores sugeriram que este problema poderia ser resolvido ao substituir o sistema categorial

por um sistema dimensional, já que num sistema categorial é relativamente fácil que as

perturbações se sobreponham (Widiger, 1993).

2.7. Prevalência

Dentro da população geral, Gunderson (2009) estima que 2-3% dos indivíduos tenham esta

perturbação; dentro da população psiquiátrica, a prevalência é de 25% nos doentes em regime de

internamento e 15% nos doentes em regime de ambulatório. Dentro da população clínica, 75% dos

pacientes diagnosticados com PPB são mulheres, apesar desta percentagem parecer ser menor em

amostras da população geral (Gunderson, 2009). Widiger (1998) afirma que há um enviesamento de

género no diagnóstico da PPB e que os clínicos tendem a aplicar um estilo enviesado no diagnóstico

da mesma, especialmente porque certas características da perturbação são estereotipicamente mais

atribuídas às mulheres. Esta influência do enviesamento sexual foi suportada por um estudo de

Becker e Lamb (1994; citados por Adams, Bernat, & Luscher, 2002).

2.8. Medição do constructo

A PPB tem sido avaliada de diversas formas, com os diversos instrumentos a terem também

na sua base uma visão própria.

Clinicamente, a forma mais comum de avaliar esta perturbação é através da entrevista não

estruturada (Western, 1997; citado por Adams, Bernat, & Luscher, 2002), apesar do modelo

preferível ser a entrevista semiestruturada ou estruturada. Existem diversas entrevistas

semiestruturadas e estruturadas para o diagnóstico categorial da PPB (Adams, Bernat, & Luscher,

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2002). Alguns clínicos preferem ainda utilizar instrumentos de triagem, já que a aplicação destas

entrevistas toma muito tempo. Alguns destes instrumentos, como o Inventário Clínico Multiaxial de

Millon (MCMI-II) e o Inventário Multifásico de Personalidade de Minnesota – 2 (MMPI-2) são

menos específicos mas têm demonstrado bom suporte empírico, podendo-se derivar dos mesmos

dimensões que parecem subjacentes à fenomenologia borderline: instabilidade afetiva, problemas

identitários, relações negativas e comportamentos autodestrutivos (Adams, Bernat, & Luscher,

2002).

Em termos da investigação, a maior parte dos estudos que consultámos utilizam os critérios

do DSM-IV (Winston, 2000) e instrumentos como a Entrevista Clínica Estruturada para o DSM

(SCID-II; Bandelow, et al., 2005; Cloitre, Gavert, Weiss, Carlson, & Bryant, 2014) ou o Índice de

Severidade para a Perturbação de Personalidade Borderline-IV (BPDSI-IV) (van Dijke, et al.,

2012). Estes instrumentos têm subjacente uma visão categorial.

Como já referido anteriormente, há também inúmeros estudos que utilizam instrumentos

dimensionais, como o NEO-PI-R, para a avaliação da PPB (O'Connor, 2002; Widiger, Trull,

Clarkin, Sanderson, & Costa Jr, 2002).

Alguns estudos mais recentes já incluem o PID-5 (Calvo, et al., 2016). A versão original tem

mostrado adequada consistência interna (α > .70) para a maior parte das facetas e a sua estrutura

fatorial tem sido replicada em diferentes amostras. Além disso, tem também demonstrado adequada

validade convergente com outras medidas e modelos de personalidade. No entanto, e apesar da

universalidade das propriedades do PID-5, este instrumento ainda só foi testado em poucas culturas

de língua não inglesa. Além disso, e apesar de ser um instrumento que pretende avaliar a

personalidade patológica, o instrumento tem sido maioritariamente estudado com voluntários

saudáveis, estudantes universitários e amostras de população geral (Calvo, et al., 2016). No que

concerne à avaliação da PPB, dentro daquilo que é o conhecimento da autora, apenas três tentaram

avaliar a PPB com o PID-5, um deles com uma amostra de estudantes universitários (Anderson &

Sellbom, 2015), outro com uma amostra clínica (Sellbom, Sansone, Songer, & Anderson, 2014) e

apenas um com pacientes diagnosticados com PPB (Calvo, et al., 2016). Os estudos que têm sido

realizados com o PID-5 mostram que há convergência com o algoritmo proposto, apesar dos

estudos realizados com amostras clínicas terem encontrado discrepâncias. Calvo et al. (2016) só

encontraram como potencialmente relevantes os domínios Desinibição e Afetividade Negativa e as

facetas Labilidade emocional, Impulsividade e (falta) de Afetividade restrita. Já Sellbom, Sansone,

Songer e Anderson (2014) encontraram que para além dos domínios propostos, o domínio

Psicoticismo também explicava uma grande parte da variância relativa à PPB, especialmente a

faceta Desregulação cognitiva e percetual.

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3. Problematização

Pelo exposto anteriormente, é fácil apercebermo-nos como o diagnóstico de PPB é, em si,

um desafio. Os doentes borderline são um grupo altamente heterogéneo, não só em termos de sinais

e sintomas, mas também em termos de capacidade de adaptação ao mundo externo e mesmo aos

programas terapêuticos. Pela sua instabilidade, os borderline são um desafio aos clínicos e aos

investigadores.

Mas a investigação que circunda esta PP também revela grande heterogeneidade, talvez

como espelho das características da própria perturbação.

Há linhas de investigação, especialmente as que se inserem numa visão categorial, que

buscam aprimorar os critérios diagnósticos e as formas de avaliação dos mesmos. Estes

investigadores pretendem encontrar formas de estabelecer um diagnóstico diferencial, definindo

com o maior rigor possível as fronteiras diagnósticas.

Outros autores, como os da escola psicodinâmica, centram-se mais no esquema de

funcionamento mental e interpessoal destes doentes, focando-se em variáveis como as relações

objetais, o sistema defensivo, a regulação emocional e as formas de estar e evoluir no processo

psicoterapêutico.

Há equipas que, fazendo recurso à análise fatorial, tentam encontrar traços e dimensões que

possam ser relevantes para a caracterização dos doentes com PPB.

Estas várias abordagens permitem olhar o doente borderline de vários prismas e, assim,

colocar hipóteses sobre os fatores etiológicos, apontar linhas de prevenção e também estratégias de

intervenção terapêutica mais consentâneas com as necessidades destes doentes.

A presente investigação pretende dar o seu contributo para estas problemáticas ao

caracterizar uma amostra de doentes com PPB da população portuguesa, através de uma perspetiva

dimensional. Desta forma, pretende-se entender que traços e dimensões são específicos deste grupo

e que os diferenciam de outros grupos clínicos. Para tal, utilizar-se-á o modelo alternativo de

avaliação da personalidade para a PPB, no intuito de a compreender melhor e também de seguir as

diretrizes propostas pela APA. A APA encoraja explicitamente a realização de investigações com

este modelo e com os instrumentos que dele derivam, no sentido de averiguar as potencialidades e

limitações do mesmo na avaliação da personalidade patológica.

Adicionalmente, esta investigação pretende aferir a prevalência do abuso sexual nestes

doentes quando comparados com outros doentes sem PPB, já que este fator é inúmeras vezes

apontado como um fator etiopatogénico importante no desenvolvimento da PPB.

Espera-se que esta caracterização possa ser útil para uma melhor compreensão da PPB, para

o delineamento de investigações futuras e para uma estruturação mais eficaz dos tratamentos com

estes doentes.

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CAPÍTULO 2

OBJETIVOS E HIPÓTESES

1. Objetivos

O objetivo central desta investigação é caracterizar a PPB à luz de modelos dimensionais,

procedendo à análise dos traços e dimensões encontrados como preponderantes numa amostra

clínica da população portuguesa. Pretende-se também perceber se o PID-5 consegue discriminar

entre os pacientes com PPB e pacientes com outras perturbações psiquiátricas e de que forma; e,

assim, contribuir para a validação do instrumento, bem como para a compreensão das suas

limitações e potencialidades enquanto instrumento de avaliação da personalidade patológica.

Investigar-se-á ainda a prevalência de abuso sexual infantil (anterior aos 18 anos de idade),

pretendendo-se com isto contribuir para o estudo da importância deste fator no desenvolvimento da

patologia, bem como replicar dados encontrados por diversos autores.

2. Hipóteses

De acordo com a revisão de literatura efetuada, foram definidas as seguintes hipóteses (H):

H1: O NEO-FFI discrimina os doentes com PPB dos doentes com outras perturbações psiquiátricas.

H2: Nos resultados do NEO-FFI, os doentes com PPB apresentam as dimensões Neuroticismo e

Abertura à Experiência mais elevadas e as dimensões Amabilidade e Conscienciosidade mais baixas

do que os participantes com outras perturbações psiquiátricas.

H3: A dimensão Neuroticismo é a mais relevante na caracterização dos doentes com PPB.

H4: O PID-5 discrimina os doentes com PPB de doentes com outras perturbações psiquiátricas.

H5: Os domínios Afetividade Negativa, Desinibição e Antagonismo são os mais relevantes da

caracterização dos doentes com PPB.

H6: O domínio Psicoticismo também é relevante na caracterização de doentes com PPB, apesar de

não estar previsto pelo algoritmo proposto.

H7: De acordo com algoritmo proposto pelo Modelo Alternativo do DSM-5 para as PP, espera-se

que as facetas Labilidade Emocional, Ansiedade e Insegurança de Separação, Depressividade,

Impulsividade, Envolvimento em Comportamentos de risco e Hostilidade estejam mais elevadas

nos doentes com PPB do que nos doentes com outras perturbações psiquiátricas.

H8: As facetas Impulsividade, Comportamentos de Risco e Hostilidade são as mais relevantes na

caracterização dos doentes com PPB.

H9: Os doentes com PPB apresentam maior incidência de abuso sexual do que os doentes sem PPB.

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CAPÍTULO 3

MÉTODO

1. Participantes

Este é um estudo transversal que conta com a participação de 205 indivíduos. Os

participantes são pacientes seguidos em Psiquiatria (Grupos Terapêuticos e Internamento parcial) e

em Comunidades Terapêuticas, muitas das quais especializadas no tratamento de adictos. Os

pacientes foram diagnosticados pelo seu clínico de referência, tendo-se solicitado ao mesmo que

fizesse o diagnóstico de acordo com os critérios do DSM-5.

Na sua maioria os participantes são do sexo masculino (72.1%), com um nível de instrução

equivalente ao 12º ano (28.8%), desempregados (65.9%) do ponto de vista laboral, com uma

situação económica nada satisfatória (37.1%) e solteiros (55.1%). A amostra apresenta idades

compreendidas entre os 18 e os 68 anos (M = 43.55, DP = 11.43). O Quadro 4 apresenta as

características sociodemográficas da amostra.

Quadro 4. Características sociodemográficas da amostra (N=205).

Ausentes M DP Mínimo Máximo

Idade (anos) 7 43.55 11.43 18 68

Frequência Percentagem

Sexo 1 Masculino 147 72.1 %

Feminino 57 27.9 %

Nível de

Instrução

1 < 4º ano 26 12.7 %

4º ano 9 4.4 %

6º ano 31 15.1 %

9º ano 45 22.0 %

12º ano 59 28.8 %

Licenciatura ou mais 34 16.6 %

Estatuto

Laboral

4 Empregado 43 21.0 %

Desempregado 135 65.9 %

Reformado 13 6.3 %

Estudante 9 4.4. %

Situação

Económica

1 Muito satisfatória 11 5.4 %

Satisfatória 48 23.4 %

Pouco satisfatória 69 33.7 %

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Nada satisfatória 76 37.1 %

Estado Civil 1 Solteiro 113 55.1 %

Casado ou a viver como tal 25 12.2 %

Viúvo 5 2.4 %

Divorciado ou separado 60 29.3 %

Agregado

Familiar

(vive com...)

5 Só 75 36.6 %

Com o cônjuge 23 11.2 %

Com o cônjuge e terceiros 14 6.8 %

Com terceiros 19 9.3 %

Com os pais 43 21.0 %

Outro 26 12.7 %

Filhos 3 Não 95 46.3 %

Sim 107 52.2 %

Quanto à distribuição de diagnósticos, os mesmos foram reorganizados, criando-se uma

nova variável. Alguns participantes apresentavam comorbilidade. No entanto, por forma a manter

alguma relevância estatística e uma certa compreensibilidade, procedeu-se a esta reorganização dos

dados tendo em conta o diagnóstico principal atribuído pelo clínico. O Quadro 5 apresenta a

distribuição dos diagnósticos na amostra, depois de reorganizada.

Quadro 5. Distribuição dos diagnósticos da amostra clínica.

Diagnóstico Frequência Percentagem

Abuso de Substâncias 74 36.1 %

PPB 54 26.3 %

Perturbação Depressiva 34 16.6 %

Outras PP 20 9.8 %

Perturbação Bipolar 13 6.3 %

Perturbação de Ansiedade 6 2.9 %

Esquizofrenia 3 1.5 %

Jogo Patológico 1 0.5 %

Total 205 100.0 %

De forma a comparar entre os doentes com e sem PPB, criaram-se dois subgrupos com base

no diagnóstico atribuído pelos clínicos. Sendo assim, os participantes foram divididos nos seguintes

subgrupos: (1) grupo de pacientes com PPB e (2) grupo de pacientes com outras perturbações

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psiquiátricas (que não a PPB).

Dentro do grupo dos doentes com PPB, alguns dos doentes apresentavam comorbilidade

com outras perturbações, especialmente Abuso de substâncias (42.6%). No presente estudo

agrupar-se-ão os pacientes puros e com comorbilidade. Por um lado, é difícil garantir que os

doentes que foram exclusivamente diagnosticados pelos clínicos com PPB tenham apenas este

diagnóstico. Isto porque a maior parte das recolhas foram realizadas em Centros ou Comunidades

especializadas no tratamento de adictos e é pouco provável que muitos dos doentes PPB que surgem

como puros não apresentem também perturbação de Abuso de substâncias. Por outro lado, o Abuso

de substâncias pode ser visto como um comportamento de risco que é muito típico nos borderline.

Adicionalmente, porque, ao recorrer a MANOVAs com os instrumentos utilizados e separando os

dois grupos (puros e com comorbilidade) não se encontraram diferenças estatisticamente

significativas. Para o NEO-FFI, entre borderlines puros e borderlines com comorbilidade,

obteve-se: Traço de Pillai = .06, F(5,48) = 0.60, p = .70, i.e., não significativo. Para o PID-5, (ao

nível das facetas), entre borderlines puros e borderlines com comorbilidade, obteve-se: Traço de

Pillai = .53, F(25,28) = 1.24, p = .29, i.e., não significativo. Note-se que estas análises foram

realizadas tendo em conta os diagnósticos fornecidos pelos clínicos, devendo-se ainda considerar as

ressalvas apontadas anteriormente. No Quadro 6 apresenta-se a caracterização do grupo dos doentes

com PPB no que concerne às comorbilidades.

Quadro 6. Caracterização da amostra PPB

no que concerne às comorbilidades.

Diagnóstico Frequência Percentagem

Puros 27 50.0 %

Abuso de Substâncias 23 42.6 %

Perturbação Depressiva 2 3.7 %

Bulimia 1 1.9 %

Perturbação Ansiedade 1 1.9 %

Total 54 100.0 %

Não se encontraram diferenças estatisticamente significativas entre os dois grupos no que

concerne ao sexo, χ2(1) = 1.91, p = .17. Também não se encontraram diferenças estatisticamente

significativas entre os grupos no que concerne ao autorrelato de doença, χ2(1) = 0.09, p = .76;

estado de saúde, t(203) = 0.33, p = .74; nível de ensino, t(202) = 0.51, p = .61.; situação económica,

t(84) = 0.39, p = .70; grau e qualidade de contacto com familiares, t(202) = .30, p = .76, e t(200)

= .08, p = .94, respetivamente; e grau e qualidade de contacto com amigos, t(199) = 0.91, p = .36, e

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t(198) = .79, p = .43, respetivamente.

Encontraram-se diferenças nas idades (medidas em anos) de pacientes borderline (M = 45.0,

DP = 0.9) e não borderline (M = 39.8, DP = 1.6), sendo que os primeiros se apresentam, em média,

mais jovens. Esta diferença de 5.2 anos, BCa 95% CI [1.5,8.6], é estatisticamente significativa,

t(196) = 2.90, p < .01, d = 0.46.

2. Instrumentos e Medidas

Todos os pacientes foram avaliados com um protocolo que incluía diversos questionários

(como já referido anteriormente, o presente trabalho insere-se numa investigação mais alargada) e

pelos clínicos assistentes, que os diagnosticaram de acordo com os critérios do DSM-5. Dos

questionários aplicados são relevantes para esta investigação o Inventário de Personalidade

NEO-FFI (Magalhães et al., 2014; Pedroso-Lima et al., 2014) e o Inventário de Personalidade do

DSM-5 (PID-5; Krueger, Derringer, Markon, Watson & Skodol, 2012), bem como o questionário

sociodemográfico.

2.1. Questionário Sociodemográfico

O questionário supracitado conta com 16 questões (algumas delas com alíneas), cujo

objetivo é recolher um conjunto de dados sociodemográficos (entre os quais género, idade, nível de

ensino e situação profissional, religião, agregado familiar e estado civil, contacto com familiares e

amigos e traumas). Estas questões servem para fazer uma descrição genérica da amostra e, no caso

do presente estudo, comparar os grupos. Houve questões deste questionário (as relativas aos

traumas) que foram recodificadas para aferir o relato de abuso sexual na infância e/ou adolescência

(aqui considera-se como critério idade inferior aos 18 anos).

2.2. Inventário de Personalidade NEO-FFI

Neste estudo utilizou-se a Versão Portuguesa do NEO-FFI (Magalhães et al., 2014;

Pedroso-Lima et al., 2014), uma versão reduzida do NEO-PI-R (Pedroso-Lima, 1997;

Pedroso-Lima & Simões, 2000) e construída a partir do mesmo. Este instrumento, de auto-relato,

deriva do modelo FFM, compreendendo cinco dimensões: Neuroticismo, Extroversão, Abertura à

Experiência, Amabilidade e Conscienciosidade. A descrição das dimensões do FFM encontra-se no

Anexo I. O NEO-FFI é constituído por 60 itens (12 itens por cada dimensão) aos quais os

indivíduos respondem de acordo com uma escala de Likert de cinco pontos, de 0 (discordo

fortemente) a 4 (concordo fortemente).

Magalhães et al. (2014) encontraram valores de consistência interna adequados. No presente

estudo, encontraram-se coeficientes alfa apropriados para todas as Dimensões, com exceção da

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Amabilidade (α = .54).

2.3. Inventário da Personalidade para o DSM-5 – Adultos

O Inventário de Personalidade para o DSM-5 – Adultos (Pires, Silva, Fagulha & Gonçalves,

2014), versão portuguesa do The Personality Inventory for DSM-5 – Adults (Krueger, Derringer,

Markon, Watson & Skodol, 2012) é um inventário de autorrelato para adultos com 220 itens,

derivado da nova conceptualização das Perturbações de Personalidade proposta na secção III do

DSM-5. É um inventário para adultos (idade superior a 18 anos) e é avaliado numa escala de Likert

de 4 pontos que varia entre 0 (muito falso ou frequentemente falso) a 3 (muito verdadeiro ou

frequentemente verdadeiro). Este Inventário inclui 25 facetas de primeira ordem, sendo cada uma

constituída por entre 4 a 14 itens. Estas facetas podem ser agrupadas em 5 domínios de segunda

ordem (pela combinação de 3 das 25 facetas para cada domínio): Afetividade Negativa (Labilidade

emocional, Ansiedade, Insegurança de Separação), Desprendimento (Anedonia, Afastamento,

Evitamento da intimidade), Antagonismo (Manipulação, Falsidade, Grandiosidade), Desinibição

(Irresponsabilidade, Impulsividade, Distratibilidade) e Psicoticismo (Crenças e experiências

incomuns, Excentricidade, Desregulação cognitiva e percetual). A descrição dos domínios e facetas

do PID-5 encontra-se no Anexo II.

Na versão original as facetas foram avaliadas por vários itens e os domínios foram

calculados pelos itens relativos às facetas que os representam (Krueger et al., 2012), tendo-se obtido

um α = .86 na amostra clínica. No presente estudo, a consistência interna total (Alfa de Cronbach)

foi muito boa (α = .98). No que concerne às escalas, a consistência foi maioritariamente boa ou

razoável.

3. Procedimento

Na presente investigação participaram utentes de instituições de saúde mental com 18 ou

mais anos. Foram condições de exclusão para o presente estudo a existência de um diagnóstico de

psicose (não apenas a ocorrência de sintomas psicóticos) ou de demência. Cada participante

respondeu a um conjunto de questionários que, em conjunto, integravam um protocolo. As

aplicações dos protocolos foram maioritariamente realizadas em pequenos grupos e

excecionalmente, de forma individual, em casos de dificuldades de leitura. A participação no estudo

foi informada e consentida, tendo os sujeitos lido e assinado um consentimento (ver Anexo III).

Cada sujeito recebeu em mão um conjunto de questionários pela parte do investigador, que

devolveu devidamente preenchido ao investigador. A aplicação do protocolo foi realizada de uma

forma faseada, ao longo do mesmo dia, para que os participantes pudessem descansar. Foi atribuído

um número de ordem a cada participante por forma a garantir o anonimato e não foi recolhida

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nenhuma informação que permita a identificação do participante. A recolha da amostra clínica foi

realizada nos termos dos protocolos de colaboração com as instituições de saúde mental e decorreu

entre fevereiro de 2016 e junho de 2017.

Após a recolha, os dados foram introduzidos numa base de dados. Procederam-se às

necessárias inversões dos itens, quer do NEO-FFI quer do PID-5. Os dados foram devidamente

cotados e posteriormente analisados através da utilização do software estatístico IBM SPSS

Statistics 24. Excluíram-se da análise estatística doentes com PPB com comorbilidade de

Perturbação Bipolar, por se considerar que a possibilidade de uma fase maníaca poderia alterar aos

resultados, à semelhança de outros autores como Calvo et al. (2016).

O estudo foi aprovado pela Comissão Especializada de Deontologia do Conselho Científico

da Faculdade de Psicologia da Universidade de Lisboa.

3.1. Procedimento de análise dos dados

Para contrastar a distribuição demográfica entre o grupo PPB e o grupo com outras

perturbações psiquiátricas, foram feitas análises bivariadas (teste de chi-quadrado de Pearson e o

teste t-student bilateral).

No que concerne aos instrumentos escolhidos, realizou-se em primeiro lugar um estudo das

propriedades psicométricas, recorrendo-se ao estudo da precisão através da análise dos resultados

dos coeficientes Alfa de Cronbach. No sentido de conhecer o poder discriminativo de cada item

considerou-se o estudo das correlações item-total corrigidas e a análise do coeficiente Alfa com

exclusão sucessiva de cada item.

Para uma escolha das técnicas estatísticas a utilizar para o teste de hipóteses, recorreu-se ao

estudo da normalidade das distribuições das variáveis, tendo-se considerado o teste de

Kolmogorov-Smirnov e as representações gráficas Q-Q plots. Apesar de algumas variáveis terem

demonstrado uma distribuição diferente da normal, aplicar-se-á o teorema do limite central. O

Teorema do Limite Central diz-nos que à medida que as amostras se tornam grandes (normalmente

considera-se o valor de N superior a 30), a distribuição amostral tem uma distribuição normal com

uma média igual à que tende para a média da população (Field, 2013). Por esta razão, considera-se

adequada a utilização de estatísticas paramétricas.

Dado que se pretende aferir se é possível discriminar o grupo com PPB da restante amostra

clínica com base em múltiplas variáveis dependentes (facetas/dimensões do instrumento, PID-5 ou

NEO-FFI), procedeu-se à execução de uma MANOVA para cada instrumento. De forma a

averiguar o peso relativo das facetas/dimensões na discriminação, realizou-se uma análise

discriminante após cada MANOVA.

Por forma a testar a existência de uma relação entre a presença de PPB e o relato de abuso

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sexual anterior aos 18 anos, duas variáveis categoriais e binárias, foi efetuado um teste de

chi-quadrado de Pearson. O teste de chi-quadrado de Pearson permite averiguar a confiança com

que se pode rejeitar a hipótese nula de independência das variáveis categoriais.

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CAPÍTULO 4

RESULTADOS

1. Estudo Metrológico

1.1. NEO-FFI – Precisão

No Quadro 7 apresentam-se os resultados do estudo da consistência interna para o NEO-FFI,

através da análise dos coeficientes de Alfa de Cronbach e as estatísticas descritivas relativas às

dimensões.

Quadro 7. Coeficientes de precisão e estatísticas descritivas das dimensões do NEO-FFI (N = 204).

Dimensão Itens

Α

M DP Mín. Máx.

Magalhães

et al. (2014)

Presente

estudo

Neuroticismo 12 .81 .80 28.66 7.81 8 48

Extroversão 12 .75 .72 26.73 6.64 7 45

Abertura à Experiência 12 .71 .65 27.14 6.33 11 44

Amabilidade 12 .72 .54 27.96 5.60 10 42

Conscienciosidade 12 .81 .82 30.07 7.21 9 47

Magalhães, et al. (2014) encontraram valores de consistência interna adequados:

Neuroticismo (α =.81), Extroversão (α = .75), Abertura à Experiência (α = .71), Amabilidade (α

= .72) e Conscienciosidade (α = .81). No presente estudo, encontraram-se coeficientes alfa

apropriados: Conscienciosidade (α = .82), Neuroticismo (α = .80), Extroversão (α = .72) e Abertura

à Experiência (α = .65), com exceção da Amabilidade (α = .54). É de ressalvar que os estudos

podem não ser perfeitamente comparáveis, já que o estudo de Magalhães et al. (2014) utilizou uma

amostra da população geral com 1237 participantes, com idades compreendidas entre os 18 e os 92

anos (M=42.95; DP=22.77), dos quais 68.4% eram do sexo feminino e 31.6% eram do sexo

masculino. Já a amostra do presente estudo conta com sujeitos com perturbação psiquiátrica, com

idades compreendidas entre os 18 e os 68 anos, dos quais 72.1% são do sexo masculino.

1.2. PID-5 – Precisão

No Quadro 8 apresentam-se os coeficientes de precisão e as medidas descritivas para o

PID-5.

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Quadro 8. Coeficientes de precisão e medidas descritivas dos domínios do PID-5 (N = 205).

Domínio Itens

Α

M DP Mín. Máx.

Krueger et

al. (2012)

Presente

estudo

Afetividade Negativa 53 .93 .87 1.62 0.52

0 3

0 2.79

Desprendimento 45 .96 .88 1.10 0.51 0.07 2.59

Antagonismo 43 .95 .90 1.03 0.57 0.00 2.62

Desinibição 46 .84 .90 1.31 0.54 0.05 2.52

Psicoticismo 33 .96 .94 1.07 0.60 0.00 2.66

O Quadro 9 apresenta os coeficientes de precisão e medidas descritivas das facetas do

PID-5.

Quadro 9. Coeficientes de precisão e medidas descritivas das facetas do PID-5 (N = 205).

Faceta Itens

α

M

DP

Mín.

Máx.

Krueger et

al. (2012)

Presente

estudo

Anedonia 8 .88 .75 1.29 0.63 0.00 3.00

Ansiedade 9 .91 .78 1.79 0.59 0.25 3.00

Procura de atenção 8 .89 .86 1.31 0.74 0.00 2.88

Insensibilidade 14 .91 .81 0.78 0.50 0.00 2.43

Falsidade 10 .85 .82 0.92 0.57 0.00 2.40

Depressividade 14 .95 .89 1.12 0.64 0.07 3.00

Distratibilidade 9 .91 .82 1.38 0.62 0.00 2.67

Excentricidade 13 .96 .91 1.13 0.69 0.00 3.00

Labilidade emocional 7 .89 .81 1.58 0.68 0.00 3.00

Grandiosidade 6 .72 .74 1.03 0.64 0.00 2.67

Hostilidade 10 .89 .83 1.30 0.64 0.00 2.90

Impulsividade 6 .77 .82 1.52 0.70 0.00 3.00

Evitamento da intimidade 6 .84 .79 0.85 0.72 0.00 3.00

Irresponsabilidade 7 .81 .74 1.04 0.60 0.00 2.71

Manipulação 5 .81 .77 1.14 0.72 0.00 3.00

Desregulação cognitiva e 12 .86 .86 1.05 0.64 0.00 2.73

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percetual

Perseveração 9 .88 .77 1.30 0.57 0.00 2.78

Afetividade restrita 7 .73 .71 1.22 0.60 0.00 2.71

Perfeccionismo Rígido 10 .90 .84 1.41 0.63 0.10 3.00

Envolvimento em

comportamentos de risco

14 .85 .83 1.49 0.54 0.29 2.86

Insegurança de Separação 7 .85 .73 1.49 0.65 0.00 3.00

Submissão 4 .78 .56 1.12 0.62 0.00 3.00

Suspeição 7 .73 .54 1.56 0.49 0.29 2.86

Crenças e experiências

incomuns

8 .83 .78 1.02 0.65 0.00 2.88

Afastamento 10 .93 .85 1.15 0.63 0.00 3.00

O Quadro 10 mostra os valores de α se alguns itens forem retirados e a correlação do item

total corrigida. Preferiu-se apresentar a análise ao nível da faceta, por se considerar que a análise

seria mais específica (já que as facetas são de primeira ordem e os domínios de segunda). Além

disso, há facetas que pertencem a domínios diferentes.

Quadro 10. Itens que fazem com que o alfa suba quando são retirados da escala.

Faceta Item

α se o item for

retirado

Correlação do item

total corrigida

Anedonia (DD) 155R .76 .24

Depressividade (DD; AN) 86 .90 .29

Ansiedade (AN) 96R .82 .59

Afetividade restrita (AN) 45 .72 .25

Suspeição (AN) 117 .62 .29

Insensibilidade (AG) 90R .83 .07

Falsidade (AG) 142R .83 .13

Impulsividade (AG) 58R .82 .32

Nota. DD = Desprendimento; AN = Afetividade negativa, AG = Antagonismo.

Na versão original obteve-se para a consistência interna um valor α = .86. O estudo original

(Krueger, Derringer, Markon, Watson, & Skodol, 2012) utilizou uma amostra comunitária de

participantes que já tinham procurado tratamento para problemas psicológicos ou perturbações

psiquiátricas. A amostra representativa da população (uma correção feita pelos autores) contou com

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264 participantes, dos quais 40.9% eram do sexo masculino e 49.1% eram do sexo feminino. A

amostra original não pode ser considerada como uma amostra clínica por não ter sido recolhida em

centros de tratamento especializados, pelo que se deve ter cautela nas comparações. No presente

estudo, a consistência interna total foi muito boa com um α = .98. As facetas obtiveram coeficientes

alfa entre α = .91 (Excentricidade) e α = .54 (Suspeição). No geral, as facetas apresentaram

coeficientes alfa bons ou razoáveis com exceção das facetas Submissão e Suspeição que

apresentaram uma consistência interna mais baixa (α = .56 e α = .54, respetivamente).

Ainda que os valores de alfa sejam adequados, nem todos os itens parecem contribuir para a

precisão das escalas, ou seja, quando esses itens são retirados da escala o valor de alfa não diminui.

Dá-se especial atenção aos itens 96R (Ansiedade) e 117 (Suspeição), que fazem subir o alfa das

escalas em .04 e .08, respetivamente. No presente estudo os itens não foram retirados, mas

sugere-se a replicação destes resultados, dado que o instrumento está em fase de validação para a

população portuguesa.

2. MANOVAs e Análises Discriminantes

2.1. Pressupostos da MANOVA e da Análise Discriminante: uma breve introdução

A Análise Multivariada de Variância (MANOVA) e a Análise Discriminante são técnicas

estatísticas multivariadas que incluem alguns pressupostos, alguns dos quais semelhantes (Pestana

& Gageiro, 2014):

As observações são independentes;

Cada grupo é uma amostra aleatória de uma população normal. Ambos os testes são

relativamente robustos às violações da normalidade, especialmente quando os grupos têm

dimensões elevadas (teorema do limite central);

As matrizes de variâncias e covariâncias são iguais entre os grupos, i.e., os grupos têm

variabilidade semelhante. A verificação deste pressuposto faz-se através do teste M de Box,

que quando não significativo indica que se pode assumir a homogeneidade de variâncias.

Para este teste considera-se p = .01 como o limiar de significância;

Inexistência de elevada multicolinearidade (pressuposto específico da Análise

Discriminante). O IBM-SPSS resolve a multicolinearidade excluindo automaticamente do

modelo as variáveis cuja tolerância seja insuficiente.

Dado que para a amostra do presente estudo foi possível preencher os pressupostos destas

técnicas estatísticas, considerou-se que seriam adequadas para estudar as hipóteses H1, H2, H3, H4,

H5, H6, H7 e H8.

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2.2. MANOVA e Análise Discriminante para o NEO-FFI

2.2.1. MANOVA para o NEO-FFI

Uma MANOVA foi conduzida para testar a hipótese de que haveria diferenças nas médias

entre os doentes com e sem PPB no que diz respeito aos resultados nas dimensões do NEO-FFI.

Ao valor do teste M de Box = 9.66 associa-se o valor p = .86, que pode ser interpretado

como não significativo (p > .01) com base nas indicações de Pestana & Gageiro (2014). Desta

forma, as matrizes de covariância entre os grupos assumem-se como semelhantes para os propósitos

da MANOVA.

No Quadro 11, apresentam-se as médias e respetivos desvios-padrões das dimensões do

NEO-FFI para cada um dos grupos.

Quadro 11. Médias e desvios-padrões dos resultados nas dimensões do NEO-FFI

para os grupos com PPB e com outras perturbações psiquiátricas (N = 204).

Dimensão

Grupo com PPB (N = 54)

Grupo com outras perturbações

psiquiátricas (N = 150)

M DP M DP

Neuroticismo 30.85 7.49 27.87 7.79

Extroversão 28.13 6.20 26.22 6.74

Abertura à Experiência 27.63 5.91 26.96 6.48

Amabilidade 27.06 5.46 28.28 5.49

Conscienciosidade 30.78 6.68 29.81 7.39

Foi possível diferenciar os doentes com e sem PPB, obtendo-se: Traço de Pillai = 0.08,

F(5,198) = 3.24, p = .008. Existe uma diferença estatisticamente significativa (p < .05) entre as

médias.

2.2.2. Análise Discriminante para o NEO-FFI

A MANOVA foi seguida por uma análise discriminante, que revelou uma função

discriminante com um coeficiente de correlação canónica R = .28.

Os pesos das diferentes dimensões, denotados por r, encontram-se resumidos no Quadro 12.

O valor de r pode ser interpretado como um coeficiente r de Pearson. Valores acima de .9 indicam

uma correlação muito forte, valores entre .7 e .9 indicam uma correlação forte; valores entre .5 e .7

indicam uma correlação moderada; valores entre .3 e .5 indicam uma correlação fraca e valores

abaixo de .3 indicam uma correlação inadmissível.

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Quadro 12. Peso relativo de cada dimensão

do NEO-FFI na função discriminante.

Dimensão Peso, r

Neuroticismo .60

Extroversão .45

Amabilidade - .35

Conscienciosidade .21

Abertura à Experiência .16

2.3. MANOVAs e Análises Discriminantes para o PID-5

2.3.1. MANOVA para o PID-5 – Domínios

Foi também conduzida uma MANOVA para testar a hipótese de que haveria diferenças nas

médias entre os doentes com e sem PPB no que concerne aos resultados nos domínios e facetas do

PID-5.

Quanto aos domínios, encontrou-se um valor M de Box = 15.40, ao que se associa um valor

p = .46, que pode ser interpretado como não significativo (p > .01), pelo que se assume a

semelhança no que diz respeito às matrizes de covariância dos grupos.

No Quadro 13 apresentam-se as médias e respetivos desvios-padrões dos resultados nos

Domínios do PID-5 para os dois grupos.

Quadro 13. Médias e desvios-padrões dos resultados nos domínios do PID-5

para os grupos com PPB e com outras perturbações psiquiátricas (N = 205).

Domínio

Grupo com PPB (N = 54)

Grupo com outras perturbações

psiquiátricas (N = 151)

M DP M DP

Afetividade Negativa 1.77 0.56 1.57 0.49

Desligamento 1.05 0.47 1.12 0.52

Antagonismo 1.10 0.53 1.01 0.58

Desinibição 1.44 0.52 1.27 0.55

Psicoticismo 1.27 0.67 1.00 0.56

Foi possível diferenciar os doentes com e sem PPB, obtendo-se: Traço de Pillai = 0.099,

F(5,199) = 4.35, p = .001. Existe uma diferença estatisticamente significativa (p < .05) entre as

médias.

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35

2.3.2. Análise Discriminante para o PID-5 – Domínios

A MANOVA foi seguida por uma análise discriminante para os domínios, que revelou uma

função discriminante com um coeficiente de correlação canónica R = .31. Os pesos dos diferentes

domínios encontram-se no Quadro 14.

Quadro 14. Peso relativo de cada domínio

do PID-5 na função discriminante.

Domínio Peso, r

Psicoticismo .61

Afetividade Negativa .53

Desinibição .42

Antagonismo .21

Desligamento - .19

2.3.3. MANOVA para o PID-5 – Facetas

Quanto às facetas, encontrou-se um valor M de Box = 458.91, ao que se associa um valor

p = .032, que pode ser interpretado como não significativo (p > .01), pelo que se assume a

semelhança no que diz respeito às matrizes de covariância dos grupos.

No Quadro 15 apresentam-se as médias e respetivos desvios-padrões dos resultados nos

Domínios do PID-5 para os dois grupos.

Quadro 15. Médias e desvios-padrões dos resultados nas facetas do PID-5

para os grupos com PPB e com outras perturbações psiquiátricas (N = 205).

Facetas

Grupo com PPB (N = 54)

Grupo com outras perturbações

psiquiátricas (N = 151)

M DP M DP

Anedonia 1.25 0.56 1.31 0.59

Ansiedade 1.97 0.59 1.73 0.57

Procura de Atenção 1.53 0.76 1.23 0.71

Insensibilidade 0.77 0.48 0.78 0.51

Falsidade 0.98 0.57 0.89 0.57

Depressividade 1.23 0.62 1.08 0.64

Distratibilidade 1.51 0.63 1.33 0.61

Excentricidade 1.32 0.78 1.06 0.65

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Labilidade emocional 1.76 0.73 1.51 0.65

Grandiosidade 1.11 0.66 1.00 0.63

Hostilidade 1.48 0.65 1.24 0.63

Impulsividade 1.77 0.72 1.43 0.67

Evitamento da

Intimidade 0.77 0.71 0.88 0.72

Irresponsabilidade 1.04 0.55 1.04 0.62

Manipulação 1.20 0.64 1.12 0.75

Desregulação cognitiva

e percetual 1.24 0.69 0.99 0.61

Perseveração 1.43 0.62 1.26 0.55

Afetividade Limitada 1.14 0.65 1.24 0.58

Perfeccionismo Rígido 1.45 0.63 1.40 0.63

Comportamentos de

Risco 1.72 0.52 1.41 0.53

Ansiedade de Separação 1.57 0.72 1.46 0.63

Submissão 1.24 0.63 1.08 0.61

Suspeição 1.64 0.50 1.52 0.48

Crenças e Experiências

Invulgares 1.24 0.73 0.95 0.60

Afastamento 1.12 0.60 1.17 0.64

Foi possível diferenciar os doentes com e sem PPB, obtendo-se: Traço de Pillai = 0.20,

F(25,179) = 1.74, p = .02. Existe uma diferença estatisticamente significativa (p < .05) entre as

médias.

2.3.4. Análise Discriminante para o PID-5 – Facetas

A MANOVA foi seguida por uma análise discriminante para as facetas, que revelou uma

função discriminante com um coeficiente de correlação canónica R = .44. Os pesos das diferentes

facetas encontram-se no Quadro 16.

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Quadro 16. Peso relativo de cada faceta do PID-5 na função discriminante.

Faceta Peso, r

Envolvimento em comportamentos de risco (DS) .52

Impulsividade (DS) .44

Crenças e experiências incomuns (PT) .41

Ansiedade (AN) .38

Procura de atenção (AG) .37

Desregulação cognitiva e percetual (PT) .36

Excentricidade (PT) .35

Hostilidade (AN; AG) .33

Labilidade emocional (AN) .33

Perseveração (AN) .26

Distratibilidade (DS) .26

Submissão (AN) .24

Suspeição (AN) .23

Depressividade (AN; DD) .21

Insegurança de Separação (AN) .16

Afetividade restrita (AN) - .16

Grandiosidade (AG) .15

Falsidade (AG) .14

Evitamento da intimidade (DD) - .14

Manipulação (AG) .09

Anedonia (DD) - .08

Perfeccionismo rígido (DS) .08

Afastamento (DD) - .07

Insensibilidade (AG) - .01

Irresponsabilidade (DS) - .01

Nota. AN= Afetividade negativa, DD = Desprendimento, AG = Antagonismo,

DS= Desinibição, PT = Psicoticismo

2.4. Análise de Hipóteses

Hipótese 1)

A MANOVA apresentada na secção 2.2.1. sugere que há diferenças entre os grupos

(borderline e não borderline) no que diz respeito às respostas ao NEO-FFI (p < .01). Estes dados

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corroboram a H1 de que o NEO-FFI consegue discriminar os doentes com PPB de doentes com

outras perturbações psiquiátricas.

Hipótese 2)

A Análise Discriminante apresentada em 2.2.2. mostra um valor de r = .60 para o

Neuroticismo (correlação moderada e positiva), r =.45 para a Extroversão (correlação fraca e

positiva) e r = - .35 para a Amabilidade (correlação fraca e negativa). Estes dados sugerem que os

doentes com PPB apresentam as dimensões Neuroticismo e Extroversão mais elevados do que os

doentes com outras perturbações e que apresentam a dimensão Amabilidade mais baixa do que os

outros participantes. É denotar que os valores de r não são muito elevados, pelo que se deve ter

cautela nesta interpretação. Os resultados são apenas parcialmente consistentes com a H2, na

medida em que se esperava uma elevação das dimensões Neuroticismo e Abertura à Experiência e

resultados mais baixos para as dimensões Amabilidade e Conscienciosidade. Verifica-se que a

dimensão Neuroticismo está mais elevada e que a dimensão Amabilidade tem um valor negativo, tal

como o esperado. Os resultados encontrados para a dimensão Extroversão são inconsistentes com a

hipótese colocada.

Hipótese 3)

A Dimensão Neuroticismo apresenta um r = .60, uma correlação positiva e moderada. Este é

o valor r mais elevado que surge na análise discriminante, o que vai de encontro à H3, de que o

Neuroticismo seria a dimensão mais relevante na caracterização dos doentes com PPB.

Hipótese 4)

Os resultados das MANOVAs para os domínios e para as facetas do PID-5, apresentados nas

secções 2.3.1 e 2.3.3. sugerem que existe uma diferença entre as médias dos dois grupos (p < .05).

Este resultado sugere que o PID-5 consegue discriminar os doentes com PPB dos restantes

participantes.

Hipótese 5)

Os resultados apresentados no Quadro 14 para a análise discriminante relativamente aos

domínios do PID-5, mostram que o Psicoticismo apresenta um r =.61 (correlação moderada e

positiva), a Afetividade Negativa apresenta um r=.53 (correlação moderada e positiva) e

Desinibição apresenta um r=.42 (correlação fraca e positiva). Os resultados são apenas

parcialmente consistentes com a hipótese de que os domínios mais relevantes na PPB seriam a

Afetividade Negativa, Desinibição e Antagonismo, já que apenas se sobrepõem os domínios

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Afetividade Negativa e Desinibição e que o Domínio Psicoticismo também surge como

potencialmente relevante.

Hipótese 6)

O Domínio Psicoticismo apresenta um valor de r = .61, o que sugere uma correlação

moderada e positiva, sendo o valor mais alto da análise discriminante no que concerne aos

domínios. Tal corrobora a hipótese de que o Psicoticismo também é relevante na descrição dos

doentes com PPB.

Hipótese 7)

Os resultados da análise discriminante para as facetas do PID-5 são apenas parcialmente

consistentes com o algoritmo proposto pelo Modelo Alternativo do DSM-5 para as PP no que diz

respeito à PPB. Segundo a análise, as facetas que melhor discriminam os PPB são (por ordem

decrescente de correlação): Envolvimento em comportamentos de risco, Impulsividade, Crenças e

experiências incomuns, Ansiedade, Procura de atenção, Desregulação cognitiva e percetual,

Excentricidade, Hostilidade e Labilidade Emocional. Os valores de r sugerem uma correlação

moderada e positiva para o Envolvimento em comportamentos de Risco e fraca e positiva para as

restantes facetas apresentadas anteriormente. O algoritmo do DSM-5 propunha as facetas

Labilidade Emocional, Ansiedade, Insegurança de Separação, Depressividade, Hostilidade,

Envolvimento em comportamentos de risco e Impulsividade. Assim, coincidem as facetas

Envolvimento em comportamentos de risco, Impulsividade, Ansiedade, Hostilidade e Labilidade

Emocional. Não surgiram na análise as facetas Insegurança de Separação e Depressividade. As

facetas Crenças e experiências incomuns, Procura de Atenção, Desregulação cognitiva e percetual e

Excentricidade não eram esperadas pelo algoritmo proposto.

Hipótese 8)

Os dados encontrados são parcialmente consistentes com a hipótese proposta. A faceta que

surgiu mais relacionada com a PPB foi o Envolvimento em comportamentos de risco. Depois,

surgiu a faceta Impulsividade. A faceta Hostilidade também surgiu como relevante, apesar de outras

parecerem mais preponderantes.

3. Teste de Chi-Quadrado e Análise do Risco Relativo

Realizou-se um teste de chi-quadrado de Pearson, que se considerou adequado para testar a

hipótese de que os doentes com PPB apresentam uma maior incidência de abuso sexual do que os

doentes sem PPB. Verificou-se uma associação significativa (p < .05) entre a presença de PPB e o

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relato de abuso sexual anterior aos 18 anos, χ2 = 6.72, p = .016. Considerou-se a correção ao valor p

dada pelo Teste Exato de Fischer, uma vez que não se verificaram todas as condições de

aplicabilidade do teste de chi-quadrado. Reporta-se a tabela de contingência relevante no Quadro

17.

Quadro 17. Distribuição dos participantes quanto ao relato

de abuso sexual e à presença de PPB (N = 205).

Abuso sexual

Não Sim

PPB Não 146 5

Sim 47 7

O risco relativo compara a probabilidade de ocorrência de um resultado de interesse de uma

variável (neste caso relato de abuso sexual anterior aos 18 anos) entre duas categorias de uma

variável (presença ou ausência de PPB). Com base num risco relativo RR = 2.4, é sugerido que

indivíduos (com patologia) que reportam abuso sexual abaixo dos 18 anos possuam 2.4 mais

chances de desenvolver PPB quando comparados com aqueles que não reportam.

3.1. Análise de Hipóteses

Hipótese 9)

Os dados encontrados são consistentes com a H9, i.e., os doentes com PPB parecem

apresentar maior prevalência de abuso sexual do que os doentes sem PPB.

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CAPÍTULO 5

DISCUSSÃO DOS RESULTADOS

1. Introdução

O estudo pretendia caracterizar a PPB à luz de modelos dimensionais, contribuir para a

validação do PID-5 e investigar a prevalência de abuso sexual infantil (anterior aos 18 anos de

idade) nos doentes com PPB.

No que diz respeito às características sociodemográficas, encontraram-se diferenças entre os

grupos no que concerne às idades, sugerindo-se que os doentes com PPB são, em média, mais

jovens. Neste estudo não se verificou uma maior prevalência de PPB nos participantes do sexo

feminino (relembramos aqui como alguns autores apontavam um enviesamento de género) quando

comparados aos participantes do sexo masculino.

No que concerne ao estudo do PID-5, as suas propriedades psicométricas ao nível da

consistência interna são preservadas numa língua não inglesa, à semelhança de outros estudos com

amostras de populações espanhola (Calvo, et al., 2016), francesa (Roskam, et al., 2015), italiana

(Fossati, Krueger, Markon, Borroni, & Maffei, 2013) e holandesa (Bastiaens, et al., 2015).

No que toca especificamente à PPB, e dentro do nosso conhecimento, este é o primeiro

estudo português a comparar dois grupos de pacientes explorando especificamente as propriedades

do PID-5 para pacientes com PPB.

2. Discussão dos resultados obtidos com o NEO-FFI

Os resultados da MANOVA para o NEO-FFI sugerem que é possível discriminar os doentes

com PPB dos doentes sem PPB fazendo recurso a este instrumento. Estes resultados estão, em

parte, de acordo com a literatura, que propõe que este instrumento também pode ser utilizado na

caracterização de doentes com perturbações de personalidade, sugerindo que existe um contínuo

entre a personalidade normal e patológica. Adicionalmente, os resultados sugerem que a PPB pode

ser vista como uma variante desadaptativa incluída dentro do Modelo dos Cinco Fatores.

Especificamente, a análise discriminante encontrou que os doentes com PPB pontuam mais

alto nas dimensões Neuroticismo e Extroversão e mais baixo na dimensão Amabilidade com

especial destaque para a dimensão Neuroticismo. O Neuroticismo compreende estados como a

ansiedade, hostilidade, depressão e impulsividade (Costa & McCrae, 1992). Estes resultados

sugerem que os doentes com PPB se caracterizam por uma elevada instabilidade emocional, com

tendência para expressar emoções negativas, como a raiva. Este resultado pode associar-se à

elevação na dimensão Afetividade Negativa (vs. Estabilidade Emocional) e nas facetas como a

Impulsividade, Ansiedade, Hostilidade e Labilidade Emocional do PID-5.

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Os valores elevados de extroversão não eram esperados no algoritmo proposto (Widiger &

Lynam, 2001). No entanto, um estudo de Samuel e Widiger (2004) encontrou que os doentes com

PPB revelam elevação na Procura de Excitação, da dimensão Extroversão. A dimensão Extroversão

caracteriza-se pela tendência para procurar estimulação e companhia dos outros, além de uma

tendência para a ação. Desta forma, e olhando para a tendência dos PPB de procurar a atenção dos

outros e da sua tendência à ação, descritas em diversas vinhetas clínicas e mesmo nas diversas

abordagens teóricas e empíricas, não é de estranhar que estes doentes pontuem mais alto do que os

outros nesta dimensão. Além disso, este resultado pode também associar-se à elevação no domínio

Desinibição do PID-5, que descreve uma orientação para a ação e à elevação na faceta Procura de

Atenção.

Os resultados negativos para a Amabilidade eram esperados pelo algoritmo proposto por

(Widiger & Lynam, 2001). A dimensão Amabilidade, no seu polo negativo, descreve indivíduos

que põem o seu interesse acima das necessidades dos outros, bem como do seu bem-estar e

dificuldade em confiar, em mostrar complacência ou ter comportamentos altruístas ou sensíveis

(Costa & McCrae, 1992).

Era também esperado que houvesse uma elevação na dimensão Abertura à Experiência

(Fantasia) e resultados mais baixos na dimensão Conscienciosidade (Deliberação). No entanto, no

perfil prototípico apenas uma faceta era tida em conta para cada dimensão, ao contrário das

dimensões Neuroticismo e Amabilidade. Deve ressalvar-se que o perfil prototípico proposto pelo

Modelo dos Cinco Fatores é feito preferencialmente ao nível das facetas. Como o instrumento

utilizado é uma versão reduzida do NEO-PI-R, só se teve acesso aos resultados para cada dimensão

e o instrumento poderá não conseguir captar com especificidade a proposta do Modelo, algo

tendencialmente mais fácil para as dimensões descritas por um maior número de facetas.

3. Discussão dos resultados obtidos com o PID-5

Para o PID-5, os resultados das MANOVAS para os domínios e facetas, sugerem que, em

geral, os mesmos podem diferenciar adequadamente entre pacientes com PPB e pacientes sem PPB.

Se olharmos para os coeficientes de determinação obtidos para cada instrumento no que

respeita às funções discriminantes, obtiveram-se coeficientes R2 = .08 (R = .28) para o NEO-FFI e

R2 = .19 (R = .44) e R

2 = .10 (R = .31) para o PID-5, para as suas facetas e domínios,

respetivamente. Por mais que os dois instrumentos consigam distinguir os grupos com e sem PPB, a

correlação para o NEO-FFI pode ser considerada inadmissível. Já para o PID-5 as correlações são

fracas, sendo que as facetas apresentam um valor mais alto. Estes resultados sugerem que o PID-5

discrimina melhor os doentes com PPB do que o NEO-FFI e que o faz melhor ao nível das facetas.

Este resultado sustenta a ideia de que o PID-5 é um instrumento capaz de distinguir perturbações de

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personalidade e que pode ser utilizado na avaliação e eventual diagnóstico das mesmas.

Os resultados que surgiram na análise discriminante para os domínios não eram esperados.

Esperava-se que os domínios mais relevantes fossem a Afetividade Negativa, a Desinibição e o

Antagonismo. No entanto surgiram os domínios Psicoticismo, Afetividade Negativa e Desinibição.

O Psicoticismo descreve um conjunto de comportamentos ou cognições estranhas e incomuns. A

elevação no Psicoticismo para a PPB já tinha sido apontada por Sellbom, Sansone, Songer e

Anderson (2014). Mais adiante, encontram-se algumas sugestões para explicar este fenómeno. A

elevação na Afetividade Negativa, que reporta experiências frequentes e intensas de emoções

negativas, pode também associar-se ao domínio Neuroticismo e é consistente com a ideia de que os

doentes com PPB tendem a sentir emoções negativas como a raiva. Já a dimensão Desinibição, que

traduz comportamentos impulsivos e conduzidos por estímulos externos atuais, pode associar-se à

impulsividade característica dos PPB mas também à Extroversão.

Em termos do peso de cada faceta na descrição da PPB dados pela análise discriminante, os

resultados são só parcialmente consistentes com o algoritmo proposto. Encontrou-se que as facetas

mais explicativas para a PPB seriam o Envolvimento em comportamentos de Risco, Impulsividade,

Crenças e experiências incomuns, Ansiedade, Procura de atenção, Desregulação cognitiva e

percetual, Hostilidade e Labilidade emocional. As facetas Envolvimento em comportamentos de

risco e Impulsividade são traços que têm de estar presentes para o diagnóstico da PPB de acordo

com a secção III do DSM-5, para além da Hostilidade, e surgiram como relevantes nesta análise.

Estes resultados suportam que a proposta de um algoritmo de classificação para a PPB é relevante e

potencialmente útil na avaliação clínica. No entanto, apenas as facetas Labilidade emocional,

Ansiedade, Hostilidade, Envolvimento em Comportamentos de Risco e Impulsividade se

sobrepõem ao algoritmo proposto, não tendo surgido a Insegurança de Separação e a

Depressividade.

O facto das facetas Insegurança de Separação e Depressividade (do domínio Afetividade

Negativa) não terem surgido parece ir de encontro a algumas críticas propostas a este modelo. Bach,

Sellbom, e Simonsen (2016) sugeriram que teria sido utilizado um excesso de facetas pertencentes

ao domínio Afetividade Negativa para descrever a PPB. A Depressividade, tal como descrita no

DSM-5, refere-se a sentimentos de desesperança com dificuldade em recuperar de um humor

negativo, pessimismo sobre o futuro e vergonha e/ou culpa invasiva, associados a sentimentos de

menos valia e pensamentos e ideação suicida. O facto da Depressividade não ter surgido como

relevante pode confirmar a ideia de Coimbra de Matos (1994), de que o paciente borderline está

aquém da verdadeira depressão no sentido em que o seu humor negativo está mais associado a um

sentimento de desamparo, vazio e solidão do que propriamente à culpa, vergonha ou sentimentos de

menos valia.

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O resultado para a Insegurança de Separação é particularmente relevante, uma vez que o

medo de ficar só parece ser uma característica distintiva dos doentes com PPB. É difícil explicar a

razão deste resultado. Em primeiro lugar, há que considerar que o PID-5 é um instrumento de

autorrelato e que os doentes com PPB tendem a rejeitar a necessidade do outro (Celani, 2010), pelo

que poderão não a reportar. Ainda, chama-se à atenção para o item 64. Na sua versão inglesa o item

diz “I can’t stand being left alone, even for a few hours”. Na versão portuguesa o item foi traduzido

para “Não suporto ficar só, mesmo por poucas horas”. Pensa-se que o item original pretendia captar

algo mais extenso do que apenas ficar só mas também ficar só por ação do objeto que escolhe

deixar o indivíduo (to leave alone). Estas considerações são apenas uma reflexão. Ainda assim, a

escala Insegurança de Separação revela boa consistência interna.

As facetas Crenças e experiências incomuns, Procura de atenção, Desregulação cognitiva e

percetual e Excentricidade, do domínio Psicoticismo, não eram esperadas pelo algoritmo proposto.

Pensamos ser possível avançar algumas explicações sobre os resultados encontrados.

A faceta Crenças e experiências incomuns, pertencente ao domínio Psicoticismo, refere-se à

crença de que se tem capacidades e experiências incomuns. Segundo Schroeder, Fisher, & Schäfer

(2012), entre 20% e 50% dos pacientes diagnosticados com PPB reportam sintomas psicóticos. As

alucinações podem ser muito semelhantes às existentes em pacientes com perturbações psicóticas

em termos fenomenológicos, impacto emocional e persistência no tempo. Este facto pode ser

explicado pela existência de comorbilidade com perturbações psicóticas (Schafer & Fisher, 2011).

Outros autores encontraram também que o abuso físico e sexual na infância prediz

significativamente a presença de alucinações visuais e auditivas na adultez (Shevlin, Murphy, &

Read, 2011). Como se mostrou nos resultados, os doentes com PPB da presente amostra possuem

2.4 mais chances de ter sofrido abuso sexual na infância do que os restantes doentes. Desta forma,

podemos supor uma relação entre a existência de sintomas psicóticos e a presença de um trauma

infantil, nomeadamente o abuso sexual, apesar desta relação só indiretamente poder explicar a

eventual presença de sintomas psicóticos nestes sujeitos. Os sobreviventes de traumas infantis,

especialmente de traumas estendidos no tempo, parecem apresentar maior probabilidade de sofrer

de PTSD e trauma complexo e de demonstrar episódios dissociativos (MacIntosh, Godbout, &

Dubash, 2015).

A possibilidade de existência de sintomas dissociativos nos doentes com PPB leva-nos

também à elevação na Desregulação cognitiva e percetual, que diz respeito ao processo de

pensamento e experiências estranhas ou incomuns, como despersonalização, desrealização e

experiências dissociativas. As experiências dissociativas aparecem representadas, quer na secção II

do DSM-5 quer no critério A da secção III. No entanto, não há nenhuma faceta que lhe corresponda

no algoritmo proposto. Sellbom, Sansone, Songer e Anderson (2014) sugeriram que a faceta

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Desregulação cognitiva e percetual fosse incluída no perfil prototípico, não só pelos resultados que

encontrou, como também pela extensa literatura que sugere que a dissociação é uma característica

importante nesta perturbação (Sellbom, Sansone, Songer, & Anderson, 2014). Além disso, como já

referido, o trauma, especialmente na forma de abuso sexual, está fortemente correlacionado com

comportamentos de automutilação (Herman, Perry, & Van der Kolk, 1989) que costumam ter lugar

em estados dissociativos (Cloitre, Gavert, Weiss, Carlson, & Bryant, 2014).

A faceta Excentricidade diz respeito a comportamentos, aparência e discurso incomuns, que

se podem associar em certa medida às facetas anteriores. Pode pensar-se que o doente PPB, por

dificuldade no autorrelato, exacerbe algumas características. Pode pensar-se ainda que o doente

borderline exibe um comportamento bizarro, eventualmente na tentativa de procura de atenção.

É claro que o Psicoticismo pode estar também associado ao abuso de substâncias, algo a não

descartar, especialmente tendo em conta que grande parte da amostra clínica foi recolhida em

comunidades e centros especializados em perturbações de consumos de substâncias. Um estudo

conduzido com uma amostra portuguesa de doentes internados numa Unidade de Internamento

(Carreiro & Borrego, 2007) com diagnósticos de psicose e consumo de substâncias tóxicas, revela

uma percentagem elevada de doentes com patologia psicótica com história de consumos (42%).

Este estudo encontrou que dentro dos doentes com esquizofrenia, 40% relatam consumos de

substâncias, havendo uma predominância de consumo de canabinóides, seguida por consumo de

álcool. Desta forma, pode pensar-se que alguns sintomas psicóticos possam surgir em consequência

do consumo de substâncias tóxicas (Carreiro & Borrego, 2007).

No que concerne à faceta Procura de atenção, a mesma diz respeito ao envolvimento em

comportamentos desenhados para atrair as atenções dos outros e tornar-se o foco de atenção e

admiração dos outros. Esta característica é relativamente saliente nestes doentes, considerando que

uma das suas tensões centrais é o apego versus desespero de abandono (PDM-2), que os leva a

procurar objetos que possam satisfazer as suas necessidades e que os façam sentir amados e

admirados.

De uma forma geral, pode-se dizer que os resultados da análise discriminante sugerem que

os doentes com PPB se caracterizam, em termos comportamentais, pelo envolvimento em

atividades perigosas, arriscadas e potencialmente autolesivas e por ações marcadas pela

impulsividade, agindo de acordo com os impulsos do momento em resposta a estímulos diretos e

imediatos. Estes comportamentos poderão relacionar-se com dificuldades ao nível da mentalização.

Em termos cognitivos, parecem caracterizar-se por pensamentos e crenças estranhas e incomuns,

com a possibilidade de vivência de sintomas psicóticos e em termos afetivos por instabilidade nas

experiências emocionais, sentimentos de nervosismo, tensão e também raiva e irritabilidade.

A caracterização anteriormente apresentada baseia-se nas elevações das facetas e respetivas

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descrições, de acordo com o DSM-5. No entanto, deve ressalvar-se que muito do que foi dito não

foi medido de forma direta, pelo que há que ter cautela com as interpretações anteriormente

apresentadas. Há ainda que ter em consideração que os r apresentados são relativamente baixos, o

que não nos dá total confiança na análise.

3.1. Serão os algoritmos propostos pelo DSM-5 os mais adequados à descrição da PPB?

A falta de concordância total entre os algoritmos propostos para a PPB e os resultados

encontrados, especialmente no que diz respeito ao do DSM-5, pode fazer-nos questionar sobre o

real número de domínios e facetas necessários ao diagnóstico da PPB e sobre a possível existência

de dimensões e facetas chave que determinem um perfil clínico relevante. Ainda não existem

muitos estudos que envolvam a avaliação da PPB com o PID-5 em amostras clínicas mas os que

existem (Calvo et al., 2016; Sellbom, Sansone, Songer, & Anderson, 2014) também parecem

sugerir que a concordância entre o algoritmo proposto e e os resultados encontrados não é total. São

necessários mais estudos sendo provável que o algoritmo tenha de ser atualizado, à luz dos

resultados encontrados por diversos autores, onde este trabalho se inclui.

Considera-se importante ressalvar que o presente estudo parece oferecer suporte ao

algoritmo proposto pelo DSM-5, com concordância em 5 das 7 facetas propostas. O facto de terem

surgido na análise discriminante 9 facetas potencialmente explicativas e diferenciadoras da PPB,

um número não muito maior que as 7 propostas, também sugere que a sugestão de delinear um

perfil com base em traços faz sentido e é relevante clinicamente. Adicionalmente, o PID-5 tem

revelado boas propriedades psicométricas em diversas amostras de populações diferentes e parece

apto à diferenciação e descrição dimensional da personalidade patológica.

Parece que estamos longe de chegar a um consenso quanto às características distintivas da

PPB, por mais que algumas das facetas pareçam descrever razoavelmente bem o comportamento

destes doentes. Neste estudo, a dimensão Psicoticismo surgiu como particularmente importante, o

que vai de encontro a algumas correntes e autores, como alguns autores psicodinâmicos (Gunderson

& Kolb, 1978). Aliás, este dado faz-nos remontar à origem do termo borderline, que se referia a um

grupo de doentes na charneira entre a psicose e a neurose.

Mas esta questão não é apenas sobre quais as facetas a incluir e a retirar do Modelo

Alternativo. A esta discussão junta-se uma muito mais vasta: diversas escolas de pensamento e

métodos de investigação pretendem dar conta deste diagnóstico, tão controverso quanto

multifacetado. É difícil dizer qual a melhor abordagem para pensar a PPB.

Talvez a abordagem dimensional possa ser um compromisso entre certas correntes teóricas e

o modelo puramente categorial. Este modelo pode contribuir para melhores descrições, um melhor

entendimento dos padrões de variabilidade (eventuais subtipos da PPB) e comorbilidade e ainda

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para a estruturação dos tratamentos. Encontraram-se alguns estudos (Widiger, 2015) que reportam

que os clínicos não costumam estruturar os tratamentos a pensar na PPB como um todo, mas tendo

em consideração traços mais específicos da personalidade, pelo que uma avaliação dimensional

poderá ser importante. Ainda assim, é preciso investigar se a abordagem dimensional consegue

captar e refletir a realidade da PPB e se tem relevância clínica. Por exemplo, seria interessante

perceber se algumas facetas são mais preditivas em termos de curso e prognóstico e quais as que

costumam estar associadas a uma maior ou menor adesão ao plano terapêutico. Ainda, seria

relevante se fosse possível determinar o tipo de psicoterapia mais adequada, tendo em conta a

constelação de facetas.

Além disso, este modelo já sofreu algumas críticas, como o facto de não entrar em linha de

conta com aspetos desenvolvimentistas (Van Riel, et al., 2017). O facto do abuso sexual infantil

parecer ter alguma associação com o desenvolvimento da PPB reforça a importância de adotar uma

perspetiva desenvolvimentista na avaliação da PPB.

4. Discussão dos resultados para Prevalência do abuso sexual nos doentes com PPB

Este estudo revelou ainda que a incidência de abuso sexual anterior aos 18 anos nos doentes

com PPB parece ser maior do que nos doentes com outras perturbações psiquiátricas. Este dado vai

ao encontro de diversas investigações anteriormente realizadas (Frías & Palma, 2014). Sugere-se

ainda que os sintomas psicóticos vivenciados por alguns doentes com PPB se podem relacionar com

vivências traumáticas na forma de abuso sexual. Estes resultados levantam ainda a questão da

importância da vivência traumática na estruturação da PPB.

5. Limitações e Sugestões Futuras

O presente estudo apresenta diversas limitações, não só ao nível da amostra, mas também

em termos metodológicos.

Em primeiro lugar, utilizaram-se apenas instrumentos de autorrelato e já foi referido

anteriormente como isto pode influenciar os resultados, especialmente no que diz respeito ao

pacientes borderline. Assim, sugerem-se outras modalidades de avaliação como as entrevistas.

Segundo Sellbom et al. (2014) a aplicação de um questionário de autorrelato, combinado com uma

entrevista semiestruturada pode contribuir para uma formulação de caso diagnóstico mais precisa,

confiável e abrangente. Sugere-se ainda o preenchimento dos questionários por parte dos clínicos

que tratam os doentes e também formas alternativas de operacionalizar o constructo borderline com

o PID-5.

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Sugere-se ainda que se realizem estudos longitudinais, uma vez que, por definição, os traços

de personalidade são relativamente consistentes no tempo. Seria importante perceber, especialmente

para o caso do PID-5, se este instrumento consegue dar conta dessa continuidade temporal.

Adicionalmente, os critérios diagnósticos foram atribuídos por clínicos diferentes,

provenientes de diferentes áreas (Psicologia, Psiquiatria) e por mais que se tenha pedido que os

diagnósticos fossem realizados de acordo com os critérios do DSM-5, não foi possível controlar

este facto.

No que concerne à amostra, dentro do subgrupo dos doentes com PPB existe muita

comorbilidade com perturbações do consumo de substâncias. Por mais que a análise tenha

conseguido distinguir os doentes com PPB dos doentes sem PPB, em que muitos também

apresentavam abuso de substâncias, considera-se relevante replicar estes resultados com uma

amostra em que os doentes com PPB sejam preferencialmente “puros”.

Uma outra limitação deste estudo foi o facto de comparar doentes com PPB com outros

doentes com perturbações psiquiátricas e não com doentes com outras PP. Pensamos que uma

análise que contrastasse grupos de PPB com doentes com outras PP seria mais discriminativo e

informativo.

Além disso, este estudo cingiu-se à avaliação do Critério B da secção III do DSM-5. O

Critério A, que inclui critérios relativos ao grau de disfuncionalidade (défice) no domínio pessoal e

interpessoal. Algumas das características da PPB que poderiam ser captadas nestes critérios não

foram avaliadas, pelo que se sugerem estudos futuros que incluam também este critério.

É ainda de salientar que se utilizou uma versão reduzida do NEO-PI-R (o NEO-FFI),

sugerindo-se portanto que, em investigações futuras, se utilize o NEO-PI-R, já que o mesmo dá

acesso aos resultados das facetas. Sugere-se ainda que se façam estudos de associação entre as

facetas do NEO-PI-R e do PID-5 para grupos com PPB.

6. Implicações Clínicas

Considera-se que os instrumentos utilizados, NEO-FFI e PID-5, poderão ser úteis na

avaliação da personalidade patológica, com especial destaque para o último. O PID-5, além de

poder ser eventualmente utilizado para o diagnóstico, dá uma caracterização da personalidade que

poderá ser relevante na estruturação do tratamento.

O presente estudo sugere que, para além de uma componente impulsiva marcada,

instabilidade emocional e afetos negativos, os doentes com PPB apresentam também uma forma de

pensamento um pouco bizarra, com eventuais sintomas psicóticos. Pensa-se que, na prática clínica,

esta característica deverá ser avaliada e tida em conta, uma vez que poderá dificultar o processo

terapêutico (Altamura & Goikolea, 2008).

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Considera-se ainda importante que, tendo em conta os resultados da presente investigação, o

clínico investigue sobre a possibilidade de vivências traumáticas na infância e, em particular, do

abuso sexual infantil.

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CONCLUSÕES

O presente estudo suporta a existência da PPB como uma entidade nosológica capaz de se

diferenciar de outras perturbações mentais.

Muito embora os resultados encontrados sejam apenas parcialmente consistentes com as

propostas dimensionais para a conceptualização da PPB, sugere-se que os domínios/dimensões e

facetas propostas são relevantes na caracterização da PPB, sendo que os resultados suportam

também a ideia de que conjuntos de traços são uma forma alternativa de caracterizar esta

perturbação. Ou seja, estudo parece fornecer suporte para a validade de construção de um perfil de

traços para a PPB, assim como sugerido na Seção III do DSM-5. Os resultados encontrados também

parecem associar-se aos sintomas tradicionais da PPB. Encontrou-se também que o domínio

Psicoticismo poderá também ser relevante para a caracterização desta perturbação, o que é

consonante com outros estudos (Sellbom, Sansone, Songer, & Anderson, 2014).

A elevação no Domínio Psicoticismo sugere ainda que poderá ser necessário proceder a

algumas modificações na operacionalização da Secção III do DSM-5 no que diz respeito à PPB.

Ainda assim, são necessárias mais investigações dentro desta linha que poderão responder à questão

de quais os traços mais relevantes na caracterização desta PP.

De uma forma mais genérica, mais investigações poderão ainda responder a uma questão

mais central, que é a de perceber se reinventar as categorias problemáticas do DSM-IV/ Secção II

do DSM-5 utilizando traços é realmente a estratégia ideal.

Este estudo encontrou ainda que os doentes com PPB parecem apresentar uma maior

prevalência de abuso sexual na infância do que os doentes com outras perturbações, o que vai de

encontro à literatura (Bandelow, et al., 2005) e que pode voltar a acender o debate sobre a

importância do papel do trauma nesta perturbação.

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ANEXOS

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Anexo I. Descrições das dimensões do FFM

Dimensões Descrição

Neuroticismo O Neuroticismo refere-se ao ajuste emocional e instabilidade ao

nível crónico. Elevado Neuroticismo identifica indivíduos que

são propensos a angústia psicológica. Elevado Neuroticismo

inclui afetos negativos, como a hostilidade, a depressão, a

ansiedade e a volatilidade. Mas o Neuroticismo inclui também,

em geral, a vulnerabilidade ao stress, autoconsciência e desejo

excessivo, impulsos e dificuldade em tolerar a frustração

causada por não agir sobre impulso.

Extroversão A Extroversão refere-se à quantidade e intensidade de interações

preferenciais, nível de atividade, necessidade de estimulação e

capacidade de experimentar alegria/felicidade. As pessoas que

pontuam alto em Extroversão tendem a ser sociáveis, ativas,

falantes, orientadas para pessoas, otimistas, divertidas e

carinhosas, enquanto que as pessoas com baixa Extroversão

tendem a ser reservadas (mas não necessariamente hostis),

sóbrias, distantes, independentes e tranquilas. Os introvertidos

não são pessoas infelizes ou pessimistas, mas não experimentam

os espíritos exuberantes que caracterizam os extrovertidos.

Abertura à Experiência A Abertura à Experiência é menos bem estudada do que o

Neuroticismo ou a Extroversão e, de facto, muitas vezes é

interpretada de forma diferente, como sugere o rótulo

alternativo “Intelecto”. No entanto, a Abertura à Experiência

difere da capacidade e da inteligência e envolve a busca e

apreciação activa das experiências por sua própria conta. Os

indivíduos abertos são curiosos, imaginativos e dispostos a

diversão, ideias e valores não convencionais. Eles

experimentam toda a gama de emoções de forma mais vívida do

que indivíduos fechados. Em contraste, indivíduos fechados

(aqueles que apresentam resultados baixos em Abertura à

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Experiência) tendem a ser convencionais nas suas crenças e

atitudes, conservadores nos seus gostos e dogmáticos e rígidos

nas suas crenças; costumam ter um comportamento rígido e são

emocionalmente insensíveis.

Amabilidade A Amabilidade, tal como a Extroversão, é uma dimensão

interpessoal e refere-se aos tipos de interacções que uma pessoa

prefere ao longo de um continuum, da compaixão ao

antagonismo. As pessoas que pontuam alto em Amabilidade

tendem a ser amorosas, de bom humor, confiantes, úteis,

indulgentes e altruístas. Com vontade de ajudar os outros, eles

tendem a ser receptivos e empáticos e acreditam que a maioria

das outras pessoas quer e se comportará da mesma maneira.

Aqueles que pontuam baixo na Amabilidade (também

designados por “Antagonistas”) tendem a ser cínicos, grosseiros

ou mesmo abrasivos, costumam suspeitar das intenções dos

outros, tendem a não cooperar e são irritáveis, podendo ser

manipuladores, vingativos e implacáveis.

Conscienciosidade A Conscienciosidade avalia o grau de organização, persistência,

controle e motivação no comportamento dirigido para objetivos.

As pessoas conscienciosas (que pontuam alto em

Conscienciosidade) tendem a ser organizadas, confiáveis,

trabalhadoras, autodirigidas, escrupulosas, ambiciosas e

perseverantes, enquanto que aqueles que pontuam baixo neste

domínio tendem a ser sem objetivos, não confiáveis,

preguiçosos, negligentes e hedonistas.

Nota. Adaptado de Widiger, T., & Costa, P. (2013). Personality Disorders and the Five-Factor Model of Personality:

Rationale for the Third Edition In Widiger, T., & Costa, P. (Eds.), Personality Disorders and the Five-Factor Model

of Personality (pp. 3-11). American Psychological Association.

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Anexo II. Definições das facetas e domínios de acordo com o DSM-5

Domínios (vs. polos opostos)

e facetas Definição

Afetividade negativa

(vs. Estabilidade emocional)

Experiência frequente e intensa de um largo espectro de

emoções negativas (e.g., ansiedade, depressão, raiva) e

manifestações comportamentais e interpessoais associadas.

Labilidade emocional Instabilidade de experiências emocionais e do humor;

emoções facilmente despertáveis, intensas e/ou

desproporcionais relativamente às situações.

Ansiedade Sentimentos de nervosismo, tensão ou pânico em relação a

várias situações; preocupação frequente sobre os efeitos

negativos de experiências passadas desagradáveis e eventos

negativos futuros; sentir-se com medo e apreensivo perante a

incerteza, por vezes, esperando que aconteça o pior.

Insegurança de separação Medo de ficar só devido a separação e/ou rejeição por outras

pessoas significativas baseado na falta de confiança na sua

capacidade de cuidar de si próprio, física e emocionalmente.

Submissão Adaptação do comportamento aos interesses e desejos efetivos

ou percebidos de outro, mesmo quando isso é contrário aos

próprios interesses, necessidades ou desejos.

Hostilidade Sentimentos de raiva ou irritabilidade frequentes, por vezes

em resposta a pequenos desrespeitos ou insultos, havendo a

adoção de um comportamento maldoso, desagradável ou

vingativo.

Perseveração Persistência em tarefas ou formas particulares de fazer as

coisas, mesmo após o comportamento ter deixado de ser

funcional e eficaz; manutenção do mesmo comportamento,

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apesar de falhanços repetidos ou de haver razões suficientes

para parar.

Desprendimento

(vs. Extroversão)

Evitamento de experiências socioemocionais, incluindo o

afastamento de interações interpessoais (de relações

superficiais a relações íntimas e de amizade), com experiência

e expressão afetiva restrita, sendo limitada sobretudo a

capacidade hedónica.

Afastamento Preferência por estar sozinho em vez de estar com os outros;

reticência em situações ou atividades sociais, com ausência de

iniciação de contacto ou evitamento deste.

Evitamento da intimidade Evitamento de relações interpessoais próximas ou românticas

e de relações sexuais íntimas.

Anedonia Falta de satisfação, envolvimento ou energia relativamente a

experiências da vida, ou seja, deficiência na capacidade de

sentir prazer e de ter interesse nas coisas.

Depressividade Sentimentos de estar em baixo, de se sentir miserável e/ou

desesperançado, havendo dificuldade em recuperar desses

humores; pessimismo sobre o futuro; vergonha invasiva e/ou

culpa; sentimentos de menos-valia do próprio, podendo haver

pensamentos de suicídio e ideação suicida.

Suspeição Expectativa de – e sensibilidade a – sinais de má-intenção ou

maldade interpessoal, podendo haver sentimentos de ser

maltratado, usado e /ou perseguido pelos outros; dúvidas

sobre a lealdade e fidelidade dos outros.

Afetividade restrita Experiência e expressão emocional constrangidas face a

situações que despertam emoções, podendo haver indiferença

ou desinteresse nas mesmas.

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Antagonismo

(vs. Agradabilidade)

Comportamentos que põem o indivíduo em desacordo com os

outros, incluindo um sentido exagerado de autoimportância e

uma expectativa concomitante de tratamento especial, além de

uma antipatia insensível para com os outros que abrange tanto

uma falta de consciência das necessidades e dos sentimentos

dos outros como uma prontidão em os usar ao seu serviço.

Manipulação Uso de subterfúgios, incluindo o charme, a sedução, a

loquacidade ou a bajulação, para influenciar ou controlar os

outros, com fim a atingir os próprios objetivos.

Falsidade Representação errónea do próprio, através da desonestidade e

do engano e/ou do embelezamento e fabricação ao relatar

eventos.

Grandiosidade Acreditar que se é superior a outros e que se merece um

tratamento especial (sentimentos de superioridade), associado

a um egocentrismo e a uma condescendência face aos outros.

Procura de atenção Envolvimento em comportamentos com o objetivo de atrair a

atenção dos outros, de modo a ser o foco e a obter admiração.

Insensibilidade Ausência de preocupação com os sentimentos e problemas

dos outros e/ou ausência de culpa ou remorso sobre os efeitos

negativos ou prejudiciais das suas ações nos outros.

Desinibição

(vs. Conscienciosidade)

Orientação para a gratificação imediata, havendo um

comportamento impulsivo conduzido por pensamentos,

sentimentos e estímulos externos atuais, sem ter em

consideração as consequências futuras.

Irresponsabilidade Desconsideração e incapacidade de honrar compromissos ou

obrigações; falta de respeito e ausência de seguimento de

acordos e promessas; falta de cuidado com a propriedade dos

outros.

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Impulsividade Agir de acordo com o impulso do momento em resposta a

estímulos imediatos, com dificuldade em criar e seguir um

plano prévio ou consideração dos resultados, havendo um

sentido de urgência e comportamento autoagressivo sob mal-

estar emocional.

Distratibilidade Dificuldade em concentrar-se e focar-se em tarefas, sendo a

atenção facilmente desviada por estímulos externos, bem

como em manter comportamentos focados em objetivos,

incluindo o planeamento e a realização de tarefas.

Envolvimento em

comportamentos de risco

Envolvimento em atividades perigosas, arriscadas e

potencialmente autolesivas, sem necessidade e sem

consideração pelas consequências; ausência de preocupação

com as próprias limitações e negação do real perigo;

perseguição imprudente de objetivos independentemente do

nível de risco envolvido.

Perfecionismo rígido Insistência rígida em que tudo decorra sem falhas, perfeito e

sem erros, incluindo o desempenho próprio e dos outros,

podendo haver o sacrifício da pontualidade para garantir a

perfeição em cada detalhe; crença de que há apenas uma

forma correta de fazer as coisas, com dificuldade em mudar de

ideias e/ou ponto de vista; preocupação exagerada com

detalhes, organização e ordem.

Psicoticismo (vs. Lucidez) Exibição de um amplo espectro de comportamentos ou de

cognições estranhas, excêntricas e incomuns, culturalmente

incongruentes, incluindo processos (por exemplo, perceção,

dissociação) e conteúdos (por exemplo, crenças).

Crenças e experiências

incomuns

Crença de que se tem capacidades incomuns, como leitura da

mente, telecinesia, fusão pensamento-ação, experiências de

realidade incomuns (alucinações).

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Excentricidade Cognições, comportamentos, aparência e/ou discurso

estranhos, incomuns, bizarros e/ou inapropriados.

Desregulação cognitiva e

percetual

Processo do pensamento e experiências estranhas ou

incomuns, incluindo despersonalização, desrealização e

experiências dissociativas, mistas sono-vigília e de controlo

do pensamento.

Nota. Adaptado de DSM-5. American Psychiatric Association. (2014). Manual de Diagnóstico e Estatística das

Perturbações Mentais (5ª ed.). Lisboa: Climepsi.

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Anexo III. Formulário de Consentimento Informado

Consentimento Informado

(exemplar para o participante)

O meu nome é Sílvia do Carmo Bento Conde e estou a realizar uma investigação em

Psicologia Clínica, na Faculdade de Psicologia da Universidade de Lisboa, sob orientação do

Professor Doutor Bruno Ademar Paisana Gonçalves.

As temáticas abordadas relacionam-se com a Personalidade e Psicopatologia.

Solicita-se, deste modo, a sua participação através da resposta a (5) cinco questionários,

onde não existem respostas corretas ou incorretas. O importante é que elas reflitam a sua

experiência. Solicita-se igualmente a sua autorização para obter informação junto do seu médico

assistente sobre o seu diagnóstico clínico.

A resposta aos questionários deverá demorar cerca de 90 minutos e poderá ser realizada em

mais do que uma sessão. Pode sempre desistir, caso seja a sua vontade.

Os dados recolhidos serão tratados e apresentados com total confidencialidade e destruídos

no final da investigação. Se assim o desejar, após o término da investigação, poderá ser-lhe

fornecida uma breve informação sobre os resultados da mesma, através do número de telefone 964

236 837 ou e-mail: [email protected].

Ao assinar este consentimento, declara ter 18 ou mais anos de idade, que tomou

conhecimento das indicações dadas anteriormente e que aceita colaborar livre e voluntariamente

nesta investigação.

Muito Obrigada pela sua colaboração.

__________ de___________________ de 2016

Faculdade de Psicologia - Universidade de Lisboa

Alameda da Universidade

1649-013 Lisboa

......................................................

(assinatura do participante)