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RICARDO FARIAS GALASSI PROJECT FINANCE: CONCEITOS E APLICAÇÕES NO SETOR DE SANEAMENTO Trabalho de Formatura apresentado à Escola Politécnica da Universidade de São Paulo para obtenção do Diploma de Engenheiro de Produção São Paulo 2003

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RICARDO FARIAS GALASSI

PROJECT FINANCE: CONCEITOS E APLICAÇÕES NO

SETOR DE SANEAMENTO

Trabalho de Formatura apresentado à Escola Politécnica da Universidade de São Paulo para obtenção do Diploma de Engenheiro de Produção

São Paulo

2003

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RICARDO FARIAS GALASSI

PROJECT FINANCE: CONCEITOS E APLICAÇÕES NO

SETOR DE SANEAMENTO

Trabalho de Formatura apresentado à Escola Politécnica da Universidade de São Paulo para obtenção do Diploma de Engenheiro de Produção

Orientador:

Prof. Dr. Nilton Nunes Toledo

São Paulo

2003

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FICHA CATALOGRÁFICA

Galassi, Ricardo Farias

Project finance: Conceitos e Aplicação no Setor de Sanea- mento / R.F. Galassi. -- São Paulo, 2003.

p. 90

Trabalho de Formatura – Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. Departamento de Engenharia de Produção.

1.Project finance 2.Engenharia financeira I.Universidade de

São Paulo. Escola Politécnica. Departamento de Engenharia de Produção II.t.

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Aos meus pais, que sempre me deram todo o apoio

necessário nessa jornada. Que Deus os abençoe.

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AGRADECIMENTOS

Ao orientador Prof. Dr. Nilton Nunes Toledo, que soube cobrar nas horas de

calma e tranqüilizar nas horas de desespero.

Aos meus irmãos Juliano e Álvaro, pelo apoio e amizade verdadeira que

deram durante minha vida.

Aos colegas do Banco Itaú BBA, em especial o Roberto Dumas Damas, que

me deu orientação e apoio no trabalho.

Aos meus colegas da Engenharia de Produção, especialmente o Rodrigo

Santoro, a Micaela Muramoto, o Carlos Angrisano, o Cristiano Fontes, o Fernando

Bersaneti e o Gustavo Andres, pelo companheirismo e ajuda nos estudos e horas de

lazer.

Aos meus colegas da Escola Politécnica, com quem compartilhei os primeiros

anos do curso, em especial o Ivan Leão Fernandes, pelo apoio e motivação durante o

curso e pela amizade durante os últimos quase 20 anos.

À Alessandra Rubira e todos de sua família, que foram decisivos para minha

adaptação à cidade de São Paulo.

À minha tia Márcia, que foi praticamente uma mãe durante o primeiro ano do

curso.

Aos meus colegas de república durante todos estes anos, que me introduziram

no estilo de vida universitário e foram minha família no tempo em que estivemos

juntos.

Aos meus pais, pelo amor, dedicação e apoio psicológico, espiritual,

financeiro, social, logístico, sentimental e moral durante toda minha vida.

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RESUMO

Este Trabalho de Formatura apresenta conceitos de Project Finance e de avaliação

de projetos no panorama brasileiro, e propostas para a utilização deste método

(Project Finance) no setor de saneamento. Este setor vem enfrentando recentes

transformações na legislação regulatória que trouxeram a possibilidade de

desenvolvimento através do uso do Project Finance. Ao final, o trabalho apresenta

um estudo de caso de um projeto típico de saneamento, com as propostas para

utilização da estruturação desenvolvida no trabalho.

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ABSTRACT

This dissertation presents concepts of Project Finance and project evaluation in the

Brazilian environment, such as proposals for utilization of this method (Project

Finance) in the sanitation sector. This sector in Brazil has been suffering several

changes on its regulation laws, that made possible the development of the sector

beyond Project Finance utilization. Finishing the report there is a case study of a

typical project on sanitation sector, with proposals of utilization of the structure

described during the report.

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SUMÁRIO

CAPÍTULO 1 – INTRODUÇÃO............................................................................. 1

1.1 – O Banco....................................................................................................... 2

1.2 – A Área de Projetos ...................................................................................... 3

1.3 – O Estágio ..................................................................................................... 4

1.4 – Justificativa do Trabalho ............................................................................. 5

1.5 – Objetivos ..................................................................................................... 7

CAPÍTULO 2 – CONCEITO DE PROJECT FINANCE ........................................ 8

2.1 – Histórico de Project Finance ...................................................................... 9

2.2 – Lógica do Project Finance ........................................................................ 10

2.2.1 – Necessidade de Contratos................................................................... 11

2.2.2 – SPC: Companhia de Propósito Específico ......................................... 12

2.3 – Participantes do Project Finance .............................................................. 13

2.3.1 – Patrocinador ....................................................................................... 13

2.3.2 – Financiador ......................................................................................... 14

2.3.3 – Investidor............................................................................................ 15

2.3.4 – Empreiteiro ......................................................................................... 15

2.3.5 – Operador............................................................................................. 16

2.3.6 – Proprietário da Tecnologia ................................................................. 17

2.3.7 – Fornecedores ...................................................................................... 17

2.3.8 – Compradores ...................................................................................... 18

2.3.9 – Governo Anfitrião .............................................................................. 18

2.3.10 – A SPC............................................................................................... 19

CAPÍTULO 3 – ANÁLISE DE VIABILIDADE DO PROJETO.......................... 21

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3.1 – Viabilidade Técnica................................................................................... 22

3.2 – Viabilidade Econômico-Financeira ........................................................... 23

3.2.1 – Investimentos ..................................................................................... 24

3.2.2 – Contração de Dívidas ......................................................................... 25

3.2.3 – Receita Operacional ........................................................................... 25

3.2.4 – Custo de Construção........................................................................... 27

3.2.4 – Custos................................................................................................. 27

3.2.5 – Juros ................................................................................................... 28

3.2.6 – Dividendos ......................................................................................... 29

3.2.7 – Pagamento de Dívida ......................................................................... 29

3.2.8 – Impostos ............................................................................................. 29

3.3 – Riscos do Projeto....................................................................................... 30

3.3.1 – Risco Pré-Operacional........................................................................ 31

3.3.2 – Risco Tecnológico .............................................................................. 32

3.3.3 – Risco Econômico................................................................................ 33

3.3.4 – Risco Financeiro................................................................................. 33

3.3.5 – Risco Cambial .................................................................................... 34

3.3.6 – Risco Político ..................................................................................... 34

3.3.7 – Risco Ambiental................................................................................. 34

3.3.8 – Risco de Força Maior ......................................................................... 35

CAPÍTULO 4 – METODOLOGIAS PARA ANÁLISE FINANCEIRA .............. 36

4.1 – A metodologia CAPM (Capital Asset Pricing Model – Modelo para

Precificação de Ativos de Capital) ..................................................................... 37

4.1.1 – Fluxo de Caixa Incremental ............................................................... 39

4.1.2 – WACC – Weighed Average Capital Cost (Custo Médio Ponderado de

Capital) ........................................................................................................... 40

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4.1.3 – Exemplo do emprego do CAPM para um projeto genérico ............... 42

4.2 – Outras metodologias de análise financeira ................................................ 46

CAPÍTULO 5 – O SETOR DE SANEAMENTO NO BRASIL............................ 47

5.1 – Breve Histórico das Políticas de Saneamento no Brasil ........................... 48

5.1.1 – Década de 60 ...................................................................................... 49

5.1.2 – Década de 70 ...................................................................................... 49

5.1.3 – Década de 80 ...................................................................................... 50

5.1.4 – Década de 90 ...................................................................................... 50

5.2 – Diagnóstico da Situação Atual.................................................................. 52

5.3 – Proposta de Estruturação de Operação ...................................................... 57

5.4 – Identificação dos Riscos ............................................................................ 59

5.4.1 – Risco Político ..................................................................................... 59

5.4.2 – Risco de Descolamento Tarifário ....................................................... 60

5.4.3 – Risco de Redução do Fluxo de Caixa Líquido ................................... 60

5.4.4 – Risco Ambiental................................................................................. 61

5.4.5 – Risco de Construção........................................................................... 61

5.4.6 – Risco Operacional .............................................................................. 62

5.4.7 – Riscos Gerais ...................................................................................... 62

CAPÍTULO 6 – ESTUDO DE CASO: SANEAGO .............................................. 63

6.1 – Descrição da Companhia........................................................................... 64

6.2 – Apresentação do Projeto: Programa de Águas e Saneamento de Goiânia 64

6.3 – Análise do Setor de Saneamento em Goiânia ........................................... 65

6.4 – Objetivos do Projeto.................................................................................. 67

6.5 – Descrição do Programa ............................................................................. 67

6.6 – Impactos Ambientais e Sociais ................................................................. 70

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6.7 – Benefícios Gerados ................................................................................... 70

6.8 – Riscos ........................................................................................................ 71

6.9 – Custos e Financiamento ............................................................................ 72

6.9.1 – Custos..................................................................................................... 72

6.9.2 – Financiamento ........................................................................................ 74

6.10 – Análise de Viabilidade ............................................................................ 74

6.10.1 – Viabilidade Técnica.......................................................................... 74

6.10.2 – Viabilidade Ambiental ..................................................................... 75

6.10.3 – Viabilidade Institucional .................................................................. 76

6.10.4 – Viabilidade Econômico-Financeira .................................................. 77

6.10.5 – Análise de Sensibilidade .................................................................. 81

6.10.6 – Proposta de Estruturação Envolvendo CRI ...................................... 82

CAPÍTULO 7 – CONCLUSÕES........................................................................... 84

5.1 – Trabalho Ralizado ..................................................................................... 85

5.2 – Cumprimento dos Objetivos...................................................................... 85

5.3 – Oportunidades para Project Finance no Brasil ......................................... 86

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ................................................................... 87

Lista de Referências ........................................................................................... 88

Bibliografia Recomendada ................................................................................. 90

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LISTA DE FIGURAS

Fig. 1.1: Evolução da Composição Acionária do Banco Itaú logo após a associação

com o BBA................................................................................................................... 2

Fig. 2.1: Paralelo entre Project Finance e Financiamento Direto............................... 11

Fig. 3.1: Fluxos de Caixa do Projeto .......................................................................... 24

Fig. 3.2: Diagrama de Financiamento em Project Finance ........................................ 28

Fig. 4.1: Gráfico da Linha de Mercado de Títulos..................................................... 38

Fig. 4.2: Fluxo de Caixa Projeto Alfa ........................................................................ 38

Fig. 5.1: Quadro de Benefícios para o Governo Resultantes de Investimento em

Saneamento ................................................................................................................ 53

Fig. 5.2: Estrutura da operação de captação através de CRI...................................... 57

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LISTA DE TABELAS

Tabela 2.1: Volume de Project Finance fechados na América Latina 1997-2001 .... 10

Tabela 4.1: Fluxo de Caixa Projeto Alfa.................................................................... 43

Tabela 4.2: Estimativa do beta para o Projeto Alfa .................................................... 45

Tabela 5.1: Principais Programas Federais em Saneamento na Década de 1990 ...... 51

Tabela 6.1: Volume de água e esgoto faturado por categoria de uso de janeiro a

dezembro (valores em mil m3) ................................................................................... 64

Tabela 6.2: Características do Financiamento............................................................ 65

Tabela 6.3: Custos do Programa alocados por Categorias......................................... 72

Tabela 6.4: Fluxo de Caixa dos Investimentos .......................................................... 73

Tabela 6.5: Estimativa do Fluxo de Caixa do Projeto (antes de juros) ...................... 79

Tabela 6.6: Análise de Sensibilidade da TIR ............................................................. 81

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Capítulo 1 – Introdução 1

CAPÍTULO 1 – INTRODUÇÃO

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Capítulo 1 – Introdução 2

1.1 – O Banco

O trabalho foi realizado no Banco Itaú BBA, um banco privado especializado

no segmento Corporate (clientes institucionais de grande porte). A carteira de

clientes é composta pelas maiores empresas do Brasil, chegando a 1000 grandes

grupos econômicos. O banco fechou o primeiro semestre de 2003 com um total de

ativos da ordem de R$ 16,0 bilhões.

No final do ano de 2002, o Banco Itaú S.A. anunciou a compra do antigo

Banco BBA Creditanstalt S.A., levando à frente seu plano de segmentação do

mercado Corporate. Assim foi criado o Banco Itaú BBA S.A., que continua

administrativamente separado do Itaú, mas sob seu controle acionário (ver Fig. 1.1).

A estratégia do banco é “conhecer a fundo seus clientes, de modo a poder servi- los

de uma maneira completa e diferenciada” (extraído do site www.itaubba.com.br).

Fig. 1.1: Evolução da Composição Acionária do Banco Itaú logo após a associação com o BBA

Fonte: Itaú BBA

Atualmente, o banco oferece produtos e serviços de cash management,

financiamento de capital de giro, exportação e importação, certificados de depósito e

venda de fundos mútuos abertos, financiamento de projetos, derivativos de

tesouraria, underwriting de ações e títulos de dívida, assessoria em fusões e

aquisições e venda de administração de carteiras exclusivas.

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Capítulo 1 – Introdução 3

Tendo uma estrutura enxuta, com poucos níveis hierárquicos e uma

comunicação eficaz entre as diferentes áreas, o banco Itaú BBA pode oferecer maior

agilidade para seus clientes do que outros bancos com porte maior. Por ser

totalmente especializado em grandes empresas, todo o banco tem uma filosofia e

uma cultura moldadas para atender a esse nicho, que é tão concorrido no mercado

bancário. O número reduzido de clientes e o alto valor das operações permitem ainda

que o banco ofereça taxas mais competitivas que o mercado, pois cada operação

envolve menos trabalho de sistemas e de pessoal. Conhecendo melhor o cliente, é

possível ainda ter mais confiança, podendo estabelecer garantias nas operações que

satisfaçam a ambos os interesses e reduzindo, dessa forma, os spreads cobrados.

1.2 – A Área de Projetos

O papel da área de projetos é de analisar e controlar os financiamentos a

grandes projetos intermediados pelo banco. Por grandes projetos entendem-se

financiamentos que ultrapassam a casa dos R$ 2 milhões e que são fornecidos

unicamente para projetos específicos. Estas operações podem ou não ser de Project

Finance1. Na verdade, existem momentos em que é difícil distinguir um Project

Finance de um financiamento convencional, devido às características específicas de

cada operação.

Na maioria das vezes, o financiador direto é uma instituição de fomento

como, por exemplo, o BNDES (Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico e

Social), o BIRD (Banco Interamericano de Desenvolvimento), o BID (Banco

Mundial), entre outros, que são especializados em financiamentos de longo prazo e

contam com recursos governamentais. O Itaú BBA assume o risco de não pagamento

do cliente perante o financiador direto, recebendo por isso um spread (diferença

1 O termo Project Finance, traduzido literalmente, significa “financiamento de projetos”. Pela

ausência de um termo adequado em português, e pelo amplo uso e conhecimento do termo em inglês

no mercado, na literatura e no meio acadêmico, usar-se-á neste trabalho o termo “Project Finance”,

sempre em itálico, indicando que é um termo de língua estrangeira.

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Capítulo 1 – Introdução 4

entre a taxa tomada e a taxa emprestada, que constitui o lucro do banco na operação).

Se o cliente não pagar, o Itaú BBA assume essa dívida perante o financiador direto e

aciona as garantias para execução da dívida junto ao cliente.

Uma correta análise do projeto pode prever a capacidade de pagamento do

cliente e, conseqüentemente, se o banco vai ter lucro ou prejuízo na operação. O

acompanhamento do projeto durante sua vida útil é também importante para que as

previsões feitas sejam revistas. Como o financiamento a grandes projetos é parte

importante da carteira do banco, a área de projetos representa um setor estratégico.

Ela pode ser responsável tanto pelas operações mais rentáveis como pelos maiores

“micos” da instituição.

“A atuação da Área de Projetos tem apoiado o processo de investimento na

capacidade produtiva nacional. Este incremento tem se dado através de um estreito

relacionamento com o BNDES e com os principais bancos mundiais de fomento,

entre eles o IFC, EIB, FMO, DEG e Eximbank. Em 2001, a Área foi responsável

pela estruturação de 31 projetos envolvendo um total de US$ 503 milhões em

recursos para investimentos” (extraído do site do Itaú BBA – www.itaubba.com.br).

1.3 – O Estágio

Em novembro de 2002, após um intenso processo de seleção, começou o

estágio – na verdade um programa de trainees. O programa é divido em duas áreas:

Administrativa e Negócios. A primeira é relacionada às atividades da linha de frente,

como mesa de operações, clientes, avaliação de empresas. A segunda, onde foi

desenvolvido o estágio, é o que se chama no mercado bancário de back-office –

processamento e controle das operações do banco.

O programa tem duração de 1 ano, sendo que o estagiário, ou trainee, deve

passar por quatro áreas diferentes – uma a cada 3 meses. Ao final do programa,

dependendo do desempenho do estagiário e da disponibilidade de vagas, este tem

chances de ser efetivado no banco como analista.

O trabalho no estágio consiste basicamente em (1) executar algumas rotinas

mais simples da área, que ficam sob responsabilidade do estagiário e sob supervisão

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Capítulo 1 – Introdução 5

de um analista e (2) apoio aos analistas no desenvolvimento de algumas tarefas. O

Trabalho de Formatura foi desenvolvido paralelamente a essas funções, pois os

objetivos do trabalho não são os mesmos do programa e porque o período em que o

trabalho foi realizado ultrapassou o período em que se passou na área onde o mesmo

estaria sendo desenvolvido.

1.4 – Justificativa do Trabalho

Apesar de ser uma das formas mais importantes de engenharia financeira para

grandes empreendimentos, o tema Project Finance ainda é pouco discutido no Brasil.

O material específico sobre o tema no país se limita a alguns poucos livros, dentre os

quais se destaca o de Bonomi e Malvessi (2002) e algumas publicações recentes em

revistas especializadas.

O Brasil é um país em desenvolvimento ainda muito carente de infra-estrura.

Se quisermos que o país cresça com intensidade e de maneira sólida, precisamos ter o

aparato social e de infra-estrutura necessário, e o Project Finance pode ser uma

ferramenta eficaz nessa busca, como será visto ao longo do trabalho.

O modelo desenvolvimentista do Brasil é marcado historicamente por

investimento interno governamental atrelado a poupança externa, o que constituiu o

principal fator para o grave endividamento externo do país. Apenas recentemente os

investidores externos têm enxergado maiores oportunidades de investir diretamente

no país e o investimento direto tem sido maior. Uma das leis básicas da economia é

que, para ter crescimento, é preciso haver investimento. Se não quisermos aumentar a

dívida do país, esse investimento deve se dar na forma de poupança, seja ela interna

ou externa. Como, no caso do Brasil, a poupança interna é limitada devido às

necessidades da população, resta-nos captar investimentos através de poupança

externa.

O Project Finance, devido às suas características de maior transparência

sobre os gastos dos projetos, como será descrito no trabalho, constitui uma forma

eficaz para atrair capitais ao país em investimentos que, antigamente, eram

específicos do Estado. Isso inclui os setores de:

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Capítulo 1 – Introdução 6

• Eletricidade, que é o mais ativo atualmente em projetos de Project Finance;

• Telecomunicações, que passou por um processo de privatização e, hoje, é

controlado quase que totalmente pelo capital externo;

• Transportes, que está carente de investimentos;

• Saneamento, que, devido a regulamentações recentes, tem um forte potencial

de ser o mais novo grande gerador de Project Finance’s no Brasil.

O trabalho irá focar no setor de saneamento. Temos dois motivos principais

para essa escolha:

1. É um setor que tem um grande potencial de crescimento através do

Project Finance, devido a mudanças recentes na legislação que regula

o setor.

2. É um setor que ainda tem poucos exemplos de financiamento através

de Project Finance, carecendo de estudos científicos sobre o assunto.

Nos últimos anos, o setor de saneamento tem sofrido com a falta de

investimentos. Historicamente, as empresas de saneamento são governamentais,

sendo a maioria delas estadual. O capital externo no setor sempre foi muito baixo ou

inexistente. Recentes mudanças na legislação que regulamenta o setor oferecem

oportunidades para que investidores dos mais variados tipos (fundos de pensão,

seguradoras, investidores institucionais), tanto internos como externos, possam

investir em saneamento com segurança e de modo simples, através de operações que

envolvem Project Finance.

É esperado que, por conta dessas novas oportunidades, nos próximos anos o

setor de saneamento experimente um crescimento significativo, melhorando a

qualidade de vida da população, reduzindo problemas ligados à saúde, diminuindo a

poluição e melhorando a racionalidade na utilização dos nossos recursos hídricos.

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Capítulo 1 – Introdução 7

1.5 – Objetivos

O objetivo principal deste trabalho é servir de referência para estudiosos,

profissionais do mercado e pessoas em geral, interessados em conhecer e aplicar a

metodologia de Project Finance no setor de saneamento no Brasil. Este trabalho será

usado como referência na área de projetos do Itaú BBA para a estruturação de

projetos de saneamento.

Para atingir o objetivo, primeiramente serão detalhados conceitos

relacionados a Project Finance, sempre tentando adaptá- los à realidade brasileira.

Em seguida, será sugerido um modelo para análise financeira de projetos. Após, será

apresentado um estudo sobre o setor de saneamento no Brasil, contendo uma

proposta de estruturação de operação envolvendo Project Finance. Por fim, o

trabalho culminará com um estudo de caso real no setor de saneamento e uma

proposta de estrutura de financiamento para a mesma que envolva Project Finance e

a aplicação dos conceitos apresentados nos capítulos anteriores.

Um objetivo secundário do trabalho seria incitar a discussão do tema Project

Finance no meio acadêmico. Desse modo, poder-se-ia estimular o estudo e o

desenvolvimento da prática no Brasil, bem como preparar os futuros profissionais

para saber lidar com a modalidade e estarem familiarizados com as terminologias e

conceitos. Tal tema não tem merecido a devida discussão curso de graduação e

poderia ser mais bem aplicado aos estudantes.

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Capítulo 2 – Conceito de Project Finance 8

CAPÍTULO 2 – CONCEITO DE PROJECT

FINANCE

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Capítulo 2 – Conceito de Project Finance 9

2.1 – Histórico de Project Finance

Relatos de financiamento a projetos com vida finita datam de tempos muito

antigos. Em 1299, por exemplo, a coroa britânica negociou um empréstimo para

desenvolver as minas de prata da região de Devon2. O credor tinha o direito de

explorar e retirar da mina todo o minério que conseguisse durante 1 ano. Não havia

qualquer garantia quanto à qualidade nem à quantidade do minério.

O uso moderno do Project Finance teve início no financiamento de projetos

de recursos naturais de grande escala. Um dos mais notáveis foi o Trans Alaska

Pipeline System – TAPS (Sistema de Oleodutos Transalasca), desenvolvido na

década de 70. O projeto – uma joint venture (associação entre duas ou mais

empresas, criando uma empresa distinta) entre oito das maiores empresas petrolíferas

do mundo – consistia em construir um oleoduto de 1.300 km de extensão

atravessando o estado americano do Alasca, enfrentando as mais variadas condições

de relevo e clima. Hoje, os maiores empreendimentos do mundo têm recorrido ao

Project Finance como modo de estruturação financeira.

No Brasil, são poucos os empreendimentos que se baseiam no Project

Finance na sua forma pura, ou seja, baseado somente nos recebíveis do projeto e

com o compartilhamento claro dos riscos entre as partes. A maioria dos credores

ainda exige garantias complementares dos patrocinadores.

Somente nas últimas décadas, com o início do processo de privatização e a

forte atuação do BNDES é que houve um maior desenvolvimento desse tipo de

financiamento. Pode-se dizer que as primeiras operações de Project Finance no

Brasil foram a concessão da Via Dutra e da Ponte Rio-Niterói. Nos últimos anos,

devido às crises sucessivas na América Latina, o volume de Project Finance

fechados nesta região tem caído (ver tabela abaixo). Portanto, a retomada de

investimentos em Project Finance pode ser uma saída para o desenvolvimento desses

países.

2 Kesinger e Martin, 1988

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Capítulo 2 – Conceito de Project Finance 10

Tabela 2.1: Volume de Project Finance fechados na América Latina 1997-2001

Volume de financiamentos Project Finance fechados (1997-2001) na América Latina

Ano Volume (US$ mil) Número

1997 45.220,55 104

1998 53.280,81 90

1999 31.307,18 86

2000 27749,21 80

2001 20.306,43 49

Total 177.864,18 409

Fonte: Project Finance Magazine (Junho, 2002)

Na atualidade, o Project Finance tem sido empregado em larga escala no

Brasil no setor elétrico, mais especificamente na construção de usinas. Até por ser

uma atividade pouco desenvolvida e pela carência de infra-estrutura no país, ainda

existe um potencial muito grande de crescimento do Project Finance no Brasil, se

comparado ao que ocorre em outros países já desenvolvidos.

2.2 – Lógica do Project Finance

Segundo Finnerty3, Project Finance pode ser definido como “a captação de

recursos para financiar um projeto de investimento de capital economicamente

separável, no qual os provedores de recursos vêem o fluxo de caixa vindo do projeto

como fonte primária de recursos para atender ao serviço de seus empréstimos e

fornecer o retorno sobre o capital investido no projeto”.

3 Finnerty, John D. Project Finance – Engenharia Financeira Baseada em Ativos. 1999.

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Capítulo 2 – Conceito de Project Finance 11

Sendo assim, o Project Finance difere do financiamento direto convencional,

também chamado por alguns autores da área de Corporate Finance, pela

desvinculação jurídica total entre o projeto financiado e a empresa que o propõe.

Fig. 2.1: Paralelo entre Project Finance e Financiamento Direto

Fonte: elaboração própria

A literatura sobre Project Finance ainda está em formação. Não são muitas as

referências bibliográficas, especialmente no Brasil. Por não ser uma prática adotada

amplamente no país, não existem muitos estudos detalhados sobre o assunto. Com a

crescente expansão do uso do Project Finance pelo mercado, está nascendo uma

geração de especialistas no assunto e mais obras com certeza aparecerão.

2.2.1 – Necessidade de Contratos

Um ponto unânime quando se fala em PF diz respeito à necessidade de

contratos. A estrutura jurídica desses projetos é complexa. Os riscos do projeto

devem ser isolados e destinados às partes que mais se interessarem e que tiverem

mais condições de suportá- los. Tudo isso é feito através de arranjos contratuais.

EMPRESA Projeto

CREDOR

$

EMPRESA Projeto

CREDOR

$

Financiamento

Direto Convencional

Project Finance

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Capítulo 2 – Conceito de Project Finance 12

Todo esse aparato jurídico inerente ao projeto é um dos principais motivos

pelo qual o Project Finance é mais comumente empregado em grandes projetos. Para

um projeto de pequeno porte, os gastos com a preparação de toda a estrutura jurídica

são bem mais relevantes financeiramente, inviabilizando o uso do Project Finance

nesses casos. Tanto no Brasil como no exterior, têm sido quase inexistentes os

Project Finance em projetos inferiores a US$ 100 milhões4. Entretanto, como

observaram Chen, Kesinger e Martin (1989), o Project Finance tem se tornado o

método dominante no financiamento de projetos independentes de geração de

energia elétrica, projetos estes de médio porte.

2.2.2 – SPC: Companhia de Propósito Específico

Uma das características mais relevantes do Project Finance é que o projeto

toma a forma de uma entidade jurídica distinta. Em todo o mercado, bem como na

bibliografia, o termo mais utilizado para designar essa companhia é SPC (Special

Purpose Company), que em português significa Companhia de Propósito Específico5.

Uma SPC é uma empresa de propriedade dos patrocinadores do projeto, mas

juridicamente distinta. Ela é encarregada de desenvolver, construir, deter a

propriedade, operar e dar manutenção a um certo projeto em um determinado local

(Finnerty, 1999). Como o projeto geralmente tem vida finita, a SPC também tem.

Para os financiadores, a grande vantagem da SPC em relação ao

financiamento direto convencional é que a entidade-projeto distribui os fluxos de

caixa diretamente para os credores e investidores de capital do projeto. Numa

companhia tradicional, os fluxos de caixa podem ser reinvestidos em outros projetos

caso a gerência veja necessidade. A SPC proporciona um isolamento do projeto,

permitindo um melhor monitoramento dos fluxos de caixa do mesmo, tornando o

projeto mais atrativo aos investidores e credores.

4 Cláudio Augusto Bonomi; Oscar Malvessi. Project Finance no Brasil. 2002.

5 Durante o trabalho, o termo SPC será usado por ser de amplo uso no mercado.

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Capítulo 2 – Conceito de Project Finance 13

2.3 – Participantes do Project Finance

Neste item será feita uma explanação sobre os diferentes participantes do

Project Finance: suas perspectivas, riscos, expectativas, responsabilidades, direitos e

deveres no projeto. É importante estar familiarizado com as denominações que aqui

serão detalhadas, pois elas serão usadas no decorrer de todo o trabalho.

2.3.1 – Patrocinador

O patrocinador6 está no centro do projeto. Na maioria das vezes é ele que tem

a concepção do empreendimento, faz a análise de viabilidade e age como elemento

integrador entre as demais partes de um Project Finance. Generalizando, pode-se

dizer que ele é o “dono” do projeto e o maior interessado no seu sucesso.

Na maioria dos projetos, o papel do patrocinador não é exercido apenas por

um indivíduo ou organização. Existe, na verdade, uma parceria, que pode até mesmo

ser formada por outros participantes, como o construtor, por exemplo.

Uma das características mais importantes do patrocinador consiste no fato de

ser ele quem se compromete a fazer o investimento inicial no projeto. Como será

visto a seguir, antes de liberar as parcelas de empréstimo, os credores exigem que os

patrocinadores façam um investimento inicial, que servirá como garantia física para

os futuros desembolsos. Esse ponto demonstra o comprometimento que o

patrocinador deve ter com o projeto. Ao liderar uma grande quantidade de recursos

financeiros, humanos e naturais, o patrocinador está colocando em jogo não só os

recursos financeiros aplicados, mas também a imagem que ele tem junto ao mercado.

A vantagem para o patrocinador de utilizar o Project Finance é que ele pode

alcançar níveis de alavancagem7 que não conseguiria caso estivesse fazendo um

6 O termo em inglês para o patrocinador é developer, que é o termo mais usado no mercado e fornece

uma definição mais ampla. Apesar disso, durante este trabalho será usado o termo patrocinador, para

evitar o excesso de estrangeirismos.

7 Alavancagem, em finanças, significa pouco investimento de capital próprio e, conseqüentemente,

muitos recursos captados através de empréstimos. A alavancagem aumenta o risco e também o retorno

esperado.

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Capítulo 2 – Conceito de Project Finance 14

financiamento direto convencional. Além disso, ele pode dividir alguns riscos do

projeto com outros participantes, que se sintam mais confortáveis para tratar de tais

riscos.

2.3.2 – Financiador

Os financiadores, também chamados de emprestadores ou credores são as

entidades que fazem aportes de recursos no projeto através de dívida. Na maioria das

vezes eles são representados por bancos.

Um projeto normalmente tem um ou alguns poucos bancos que lideram a

captação de dívida, denominados Bancos Arranjadores. É comum que esses bancos

estruturem a captação através de títulos de dívida, que podem ou não ter direito de

regresso8. Esses títulos são pulverizados e oferecidos no mercado. Os compradores

desses títulos são chamados de subscritores. Quanto maior o risco do projeto, maior é

o prêmio a ser pago nos títulos.

Como normalmente os projetos em Project Finance têm alto grau de

alavancagem, a maior parte dos recursos do projeto são fornecidas pelos

financiadores. Seu objetivo é ter um rendimento dos títulos acima do mercado a um

risco baixo. Dessa forma, eles procuram isolar todos os riscos possíveis de não

pagamento. A maior parte das exigências contratuais são feitas pelos patrocinadores.

É do interesse dos mesmos que haja direito de regresso sobre os títulos de dívida e

que haja garantias por parte de cada participante que estes sejam penalizados no caso

de o projeto fracassar.

Os patrocinadores, por outro lado, não querem pagar altos valores de prêmio

nos títulos e procuram eliminar o direito de regresso. Isso constitui a disputa

principal em qualquer projeto, que é travada entre patrocinadores e financiadores

para definir as características do financiamento.

8 Quando um título só pode ser resgatado através do fluxo de caixa do projeto, diz-se que ele é sem

direito de regresso . Quando o patrocinador assume a dívida do projeto, diz-se que é com direito de

regresso . O mais comum é o patrocinador assumir a dívida somente em casos especiais. Neste caso, o

título é tido como tendo direito de regresso limitado .

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Capítulo 2 – Conceito de Project Finance 15

2.3.3 – Investidor

Os investidores participam de operações de Project Finance através do aporte

de capital. Por definição, o patrocinador sempre é um investidor, pois ele contribui

com capital próprio no projeto. Porém, podemos ter outros investidores, não

necessariamente ligados aos patrocinadores, interessados somente no desempenho

futuro do projeto.

O investidor compartilha muitos dos interesses com os financiadores. A

diferença básica consiste em que o primeiro tem uma parte no capital do projeto,

recebendo dividendos conforme os fluxos de caixa após pagamento de dívidas sejam

positivos, podendo esses valores variar muito conforme o desempenho do projeto. O

segundo recebe os juros acordados nos títulos de dívida, e tem uma maior segurança

quanto ao seu recebimento.

Via de regra, os investidores compartilham os mesmos riscos que o

patrocinador. Esses riscos podem variar dependendo dos arranjos contratuais. Pode

existir, por exemplo, um mesmo projeto onde alguns investidores são garantidores

dos títulos de dívida e outros não são, podendo aqueles ser recompensados por essa

exposição.

2.3.4 – Empreiteiro

O empreiteiro, também chamado de construtor, é o responsável pela

construção da obra física do projeto. Algumas vezes, isso inclui ainda as instalações

técnicas. Esse participante é representado por empresas de construção, empreiteiras,

fornecedores de máquinas, de matérias-primas ou, algumas vezes, por uma

associação entre alguns destes.

Normalmente, são exigidos do construtor um prazo fixo para o término da

obra, a entrega do projeto com um preço pré-estipulado ou muito bem previsível, e

uma garantia de operacionalidade do projeto.

Por outro lado, o construtor tem interesse de se proteger de riscos que estão

fora de seu alcance. Por exemplo, uma catástrofe natural, uma greve, ou a escassez

de recursos podem atrasar ou mesmo inviabilizar a entrega de um projeto. Sendo

assim, o construtor procura isolar-se desses riscos através de seguros e garantias

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Capítulo 2 – Conceito de Project Finance 16

contratuais com outros participantes. Ele pode, por exemplo, exigir que se façam

seguros contra acidentes naturais, ou fechar um contrato com o detentor da

tecnologia para que este se responsabilize por eventuais falhas.

Outra preocupação do construtor é quanto à saúde financeira do projeto. Ele

quer ter garantido o pagamento da obra mesmo que o desempenho operacional do

projeto seja um fracasso. Assim, ele procura fechar contratos com os investidores e

financiadores para que estes arquem com o cus to da obra no caso de o projeto

fracassar.

Muitas vezes, para harmonizar os interesses de ambos os lados, o

patrocinador se dispõe a pagar bônus ao construtor caso este entregue a obra antes do

prazo e com todas as especificações atendidas.

2.3.5 – Operador

O operador é responsável pela operação e manutenção do projeto quando do

início de suas atividades. Ele deve garantir uma administração responsável do

projeto, de modo que este gere fluxos de caixa positivos para os investidores.

O operador recebe pelo seu serviço o que se chama de preço de operação.

Esse preço é acordado entre o operador e os patrocinadores, podendo ser um preço

fixo ou proporcional a indicadores pré-estabelecidos. As principais fontes de tensões

entre o operador e as demais partes envolvidas no projeto são:

1. A previsibilidade do preço de operação. O operador não quer correr riscos

quanto ao preço da operação, seja ele fixo ou variável. Por outro lado, os outros

participantes desejam ter uma boa previsibilidade sobre o preço de operação, para

que a análise de viabilidade seja feita com mais precisão. O preço de operação

consiste em um custo bastante significativo para o projeto.

2. Administração coerente do projeto. Um projeto mal administrado não irá gerar

fluxos de caixa satisfatórios para os investidores ou para o pagamento das

dívidas. Por esse motivo os participantes do Project Finance querem se proteger

do risco de uma má administração. Geralmente isso é resolvido com o pagamento

ao operador de prêmios sobre resultados acima do esperado.

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Capítulo 2 – Conceito de Project Finance 17

2.3.6 – Proprietário da Tecnologia

Caso o projeto envolva tecnologias de uso não comum, ou que nunca tenham

sido utilizados na escala do projeto, entra em cena um participante indireto, mas de

grande importância: o proprietário da tecnologia. Ele é o responsável pelo emprego

de técnicas diferenciadas na construção ou operação do projeto.

O proprietário da tecnologia não é um participante direto do Project Finance,

pois geralmente está ligado ao projeto através do construtor ou dos patrocinadores. O

interesse destes é que: (1) haja uma garantia de funcionamento da tecnologia

empregada, caso esta nunca tenha sido utilizada na escala empregada no projeto; (2)

a tecnologia esteja disponível durante toda a vida útil do projeto; (3) haja limitações

quanto à disponibilização da tecnologia para os concorrentes.

Por sua vez, é do interesse do proprietário da tecnologia que: (1) seja

garantido o sigilo das informações; (2) o projeto seja bem-sucedido, para garantir o

seu pagamento e ajudando a divulgar a tecnologia, elevando o nome da empresa.

2.3.7 – Fornecedores

Os fornecedores dos insumos essenciais têm um papel muito importante em

um projeto, pois qualquer variação no preço desses insumos pode determinar a

viabilidade ou não do mesmo. Por isso, geralmente são feitos contratos para garantir

preço, qualidade e fornecimento dos insumos essenciais. Esses contratos são muitas

vezes exigidos pelos financiadores para realização dos empréstimos.

Os interesses das outras partes para com os fornecedores são: (1) garantir um

preço estável dos insumos, acompanhando o preço dos produtos; (2) garantir o

abastecimento durante toda a vida útil do projeto; (3) garantir a qualidade dos

insumos.

Os interesses dos fornecedores são: (1) garantir o correto pagamento das

obrigações devidas; (2) garantir que será pago o preço de mercado pelos seus

produtos.

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Capítulo 2 – Conceito de Project Finance 18

2.3.8 – Compradores

A relação compradores-projeto é similar à relação projeto-fornecedores. Os

compradores querem garantir preço estável para os produtos, geralmente atrelado a

algum índice. Por sua vez, as outras partes do projeto estão interessadas em garantir

o fornecimento a preços competitivos durante toda a vida do projeto.

2.3.9 – Governo Anfitrião

O governo anfitrião é o governo do país, estado ou cidade onde o projeto será

instalado. Na maioria das vezes é ele quem controla os preços e faz as concessões

para a operação do projeto. Além disso, ele pode dar incentivos, como terrenos e

obras de infra-estrutura para dar apoio ao projeto.

Sabe-se que geralmente os Project Finance são projetos de grande porte, que

causam impacto significativo na sociedade e no meio-ambiente. Assim, é inevitável a

atuação do Estado para garantir o uso racional dos recursos naturais e cuidar para que

os interesses da sociedade sejam atendidos.

Dessa forma, o governo anfitrião deve avaliar, financeiramente, quais os

benefícios que um projeto trará à sociedade. Esses benefícios incluem (1) as receitas

fiscais proporcionadas pelo pagamento de impostos do projeto; (2) os empregos

gerados direta e indiretamente pelo projeto; (3) o crescimento da economia no local

de implantação; (4) a disponibilização de recursos essenciais à economia (por

exemplo, energia elétrica, estradas, gasodutos).

Temos, então, que um Project Finance pode ser muito benéfico para o

Estado, especialmente um país em desenvolvimento, como é o caso do Brasil. O

governo, portanto, deve se esforçar ao máximo para atrair investimentos deste tipo

para o seu país. Para isso, ele deve oferecer incentivos à entidade-projeto. Mais

comumente, temos os seguintes benefícios sendo oferecidos:

• “Férias Tributárias”: isenta a entidade-projeto de certos impostos por um

prazo determinado;

• Terreno: o governo pode ceder o terreno onde será instalado o projeto ou

alugá-lo a preços baixos;

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Capítulo 2 – Conceito de Project Finance 19

• Garantias: podem ser oferecidas garantias quanto à disponibilidade de

matéria-prima ou outros insumos essenciais a preços competitivos;

• Infra-Estrutura: o governo pode oferecer, por exemplo, a construção de uma

estrada que interligue o local do projeto ao resto do país.

• Subsídios em dinheiro.

• Suporte creditício para partes do financiamento.

• Garantia quanto a disponibilidade de moeda forte por um período de tempo

especificado, para que o projeto possa remeter lucros para o exterior e para os

pagamentos do serviço da dívida.

Em um país em desenvolvimento os recursos são escassos. Além disso, é

difícil avaliar monetariamente benefícios sociais, como a geração de empregos.

Dessa forma, existe muita dificuldade para o governo chegar a um consenso sobre o

que oferecer de benefícios ao projeto de modo que o país seja escolhido para a

implantação e que prejudique ao mínimo suas receitas9.

2.3.10 – A SPC

A SPC (Companhia de Propósito Específico) é, como foi explicado neste

capítulo, a detentora da propriedade dos ativos do projeto. Juridicamente, ela é o

projeto. Muitas vezes confunde-se a dissociação entre o patrocinador e a SPC, mas

esta é juridicamente distinta daquele e, a não ser que haja contratos especificando

isto, o patrocinador não tem responsabilidade sobre a rentabilidade e o serviço da

dívida da SPC.

Todos os contratos, empréstimos, garantias e acordos devem ser feitos

diretamente em nome da SPC. Ela é a responsável pelo cumprimento dos contratos.

Sendo assim, se o conceito de Project Finance for seguido rigorosamente, não

9 Muita da discussão política do Brasil atualmente está voltada para este tema. O ajuste das tarifas de

telefones, a guerra fiscal nos estados, garantias para concessão de rodovias, etc. são bons exemplos de

temas atuais relacionados.

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Capítulo 2 – Conceito de Project Finance 20

podem existir garantias por parte do patrocinador ou de qualquer outro investidor de

capital nos contratos da SPC. A única garantia devem ser os contratos de compra e

venda da produção, ou seja, o fluxo de caixa futuro do empreendimento. Caso o

projeto venha a ser um fracasso, os detentores da garantia podem, em poder desses

contratos, tomar para si o controle da SPC, ou negociar os contratos com

concorrentes.

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Capítulo 3 – Análise da Viabilidade do Projeto 21

CAPÍTULO 3 – ANÁLISE DE VIABILIDADE DO

PROJETO

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Capítulo 3 – Análise da Viabilidade do Projeto 22

A análise de viabilidade consiste em ponderar os riscos relacionados ao

projeto e as expectativas de retorno, em vários cenários, de modo que se possa, a

partir de critérios pré-estabelecidos, inferir um diagnóstico de possibilidade ou não

da realização do projeto.

Cada um que analisa o projeto pode adotar cenários, previsões, expectativas

ou critérios diferentes. Por isso, o grau de viabilidade varia de análise para análise.

Todos os participantes do Project Finance, de uma forma ou de outra, fazem alguma

análise de viabilidade do projeto, pois todos estão interessados no seu sucesso. A

seguir, será explicado como é feita a análise de viabilidade de um projeto e quais são

os riscos inerentes a ele, sempre com foco para o panorama brasileiro.

3.1 – Viabilidade Técnica

Quando se fala em viabilidade de um projeto, pensa-se logo em viabilidade

financeira. Porém, mais importante que isso é saber se o projeto é factível

tecnicamente, ou seja, se a tecnologia é confiável, se não existem entraves legais, se

não haverá complicações ambientais, etc.

Caso a tecnologia empregada seja nova ou não comprovada, devem-se

construir instalações para testes e para otimização do processo. Mesmo que a

tecnologia não seja nova, pode ser que ela nunca tenha sido usada na escala que se

está pretendendo. A não observação desse detalhe já custou muito caro a alguns

projetos. Além disso, devem ser previstas no projeto possíveis alterações para

ampliação da capacidade e para possíveis contingências.

O projeto pode ainda ser influenciado por fatores ambientais diversos dos que

enfrentados por projetos similares, alterando a análise da viabilidade técnica. Por

exemplo, uma barragem construída sobre terreno argiloso em um rio tem o projeto de

fundações bem diferente de uma construída em terreno rochoso. Essa diferença

ambiental pode ser decisiva para determinar a viabilidade técnica de um projeto.

Geralmente os participantes do Project Finance, especialmente os

patrocinadores e os financiadores, solicitam a ajuda de empresas especializadas para

ajudar na avaliação da viabilidade técnica do projeto. Muitas vezes são contratadas

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Capítulo 3 – Análise da Viabilidade do Projeto 23

mais de uma empresa, para que se possam analisar diferentes diagnósticos quanto ao

custo e ao prazo da obra, e se as instalações, quando prontas, poderão operar

conforme o planejado.

Podemos estabelecer alguns critérios para saber se o projeto é viável

tecnicamente. Ele será viável se:

• Puder ser construído utilizando métodos conhecidos e dominados pelo

construtor.

• Depois de terminado, tiver condições de operar de acordo com o previsto no

projeto, na escala prevista e utilizando os recursos previstos.

• Estiver de acordo com as normas e regulamentos técnicos locais.

• Estiver de acordo com as normas ambientais locais.

Esses critérios são gerais, citados apenas para ilustrar o mínimo necessário

para a viabilidade técnica. Pode ocorrer de algum dos participantes exigir critérios

mais rígidos, como utilizar normas internacionais, ter 100% de confiabilidade, etc.

3.2 – Viabilidade Econômico-Financeira

Se a viabilidade técnica é um pré-requisito para o projeto ter sucesso, é a

viabilidade econômico-financeira que vai dizer se o projeto será ou não realizado.

Viabilidade econômica, em síntese, consiste em saber se o valor presente líquido

esperado do projeto é positivo. A viabilidade financeira consiste em saber se, dados

os recursos de capital disponíveis e seus respectivos custos, o projeto pode ser

realizado utilizando tais recursos. O termo viabilidade econômico-financeira junta

esses dois conceitos em um só, ou seja, significa saber se o fluxo de caixa do projeto

é atrativo, dados os custos de financiamento e as alternativas de investimento.

Os critérios para se determinar a viabilidade econômico-financeira dependem

do modelo que se está utilizando para a análise. Os indicadores mais usados são valor

atual líquido, valor futuro, beneficio uniforme equivalente, taxa interna de retorno,

relação beneficio/custo e tempo de retorno do investimento (Fadigas, 2001). Este

último está caindo em desuso, por não ser um critério cientificamente aceito e por

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Capítulo 3 – Análise da Viabilidade do Projeto 24

desprezar boa parte do fluxo de caixa. Neste trabalho será estudado o modelo CAPM

(Capital Asset Pricing Model), que tem como principal indicador o WACC. O

modelo CAPM será explicado em detalhe no próximo capítulo.

Todos os fatores que possam afetar os fluxos de caixa do projeto devem ser

levados em conta na análise, tanto no curto como no longo prazo. Para isso, é

necessário fazer previsões. O quanto essas previsões ficam próximas da realidade é

um dos fatores-chave para o sucesso de um projeto. A seguir será explicado em

detalhe como são avaliadas algumas das variáveis importantes no fluxo de caixa de

um projeto.

Fig. 3.1: Fluxos de Caixa do Projeto

Fonte: elaboração própria

3.2.1 – Investimentos

Os investimentos são aportes de caixa fornecidos pelos investidores, que

esperam o retorno na forma de lucros e distribuição de dividendos. Antes do início da

sua operação, o projeto depende dos investimentos como principal e, às vezes, única

fonte de recursos. Mesmo depois de iniciada a operação, os investidores podem estar

interessados em ampliações, melhorias, reformas, ou pode ser exigido um aporte de

capital para solucionar problemas financeiros.

A avaliação do total de investimentos necessitado está atrelada

principalmente ao custo da obra. Portanto, é vital que se tenha uma boa avaliação

PROJETO

Entradas de caixa

- Investimentos

- Contração de

Dívida

- Receitas Operacionais

$

Saídas de caixa

- Custo de Construção

- Custos

- Despesas não-operacionais

- Juros

- Dividendos

- Pagamento de Dívida

- Impostos

$

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Capítulo 3 – Análise da Viabilidade do Projeto 25

desse custo. Além disso, o investimento também serve para fazer os estoques iniciais,

e arcar com possíveis custos operacionais no início da operação.

3.2.2 – Contração de Dívidas

As dívidas são obrigações contraídas com os financiadores. Estes liberam

recursos monetários ao projeto, que assume uma obrigação de pagamento desses

recursos corrigidos por uma taxa de juros, que pode ser fixa ou variável. Do ponto de

vista do financiamento, o projeto pode ser dividido em três fases: o período de

desembolsos, o período de carência e o período de pagamento.

Recursos de dívida apresentam menor risco para o financiador do que os

recursos aplicados na forma de investimento. Pela legislação atual brasileira, os

donos da empresa são os últimos a terem direitos sobre uma eventual massa falida.

Além disso, os investidores não têm qualquer garantia sobre os dividendos a serem

distribuídos. Estes podem tanto ser nulos quanto superar de longe as expectativas. Já

as dívidas geralmente são atreladas a indicadores estáveis da economia e são

garantidas contratualmente.

Quanto maior o grau de alavancagem10, maior é o retorno para o investidor,

portanto este prefere níveis mais altos de alavancagem. Os financiadores, por sua

vez, preferem emprestar recursos a um projeto com nível de alavancagem baixo, pois

é mais seguro para eles. A partir dessas duas forças se tem um equilíbrio do grau de

alavancagem. Esse número, em Project Finances realizados no Brasil, está em torno

de 60% a 80%. Trata-se de um nível alto de alavancagem, que dificilmente seria

conseguido por uma empresa em um financiamento normal. A possibilidade de

alcançar um nível de alavancagem tão alto é um dos fatores que incentivam as

empresas a usar o Project Finance para financiamento de grandes projetos.

3.2.3 – Receita Operacional

A receita operacional é um dos principais itens a serem avaliados na análise

de viabilidade econômica. Ela é a responsável pelo pagamento dos custos, juros

10 Grau de Alavancagem: razão entre o total da dív ida e o capital próprio de uma empresa.

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Capítulo 3 – Análise da Viabilidade do Projeto 26

financeiros, dividendos, amortizações, impostos, etc. Uma avaliação errada da receita

pode levar a sérias diferenças entre o retorno esperado e o retorno real, sendo o

principal motivo do fracasso de muitos projetos.

Para fazer a previsão da receita operacional, deve-se levar em conta: (1) a

demanda da produção e; (2) o preço do(s) produto(s) produzido(s). A receita será o

produto desses dois fatores. Para fazer essa avaliação geralmente é contratada uma

empresa externa especializada. Segundo Finnerty (1999), a análise de marketing

deve incluir:

• Análise dos produtos concorrentes e seus respectivos custos de produção.

• Análise do ciclo de vida esperado do produto, volume de vendas e preço

projetado.

• Análise do impacto potencial da obsolescência tecnológica do produto e do

processo de produção.

• Análise do impacto das decisões de órgãos reguladores sobre preços e

quantidade produzida11.

Como grande parte das variáveis que influem no sucesso econômico do

projeto são variáveis exógenas, ou seja, não controláveis, podemos atribuir ao acaso

o sucesso ou não de algumas previsões, especialmente se relacionadas a crescimento

econômico, preços de commodities, desastres naturais, etc. Enfim, uma infinidade de

acontecimentos aleatórios podem influenciar o desempenho do projeto. O que se faz

para avaliar essas variações é traçar cenários diferentes envolvendo as variáveis mais

importantes e atribuir probabilidades para que aquele cenário venha a se desenvolver.

Geralmente faz-se uma previsão para cada um desses três cenários: otimista, realista

11 No Brasil a legislação não oferece muitas proteções quanto a regulamentação governamental. Um

caso recente é o impasse no governo sobre o indexador das tarifas de telecomunicações depois das

privatizações. O acertado em contrato foi o IGP-DI, que excepcionalmente no período após as

privatizações teve um aumento significativo, o que geraria um aumento muito grande das tarifas para

os consumidores. Houve uma briga judicial para adotar o IPC-A, mas o caso ainda está sem definição.

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Capítulo 3 – Análise da Viabilidade do Projeto 27

e pessimista. Dessa forma, fazendo-se uma ponderação entre as probabilidades e o

retorno esperado em cada um dos cenários, pode-se ter um retorno médio esperado

para o projeto levando-se em conta os diferentes cenários.

Para garantir a demanda e o preço, muitas vezes são feitos contratos de

garantia de compra e venda de produtos entre a entidade-projeto e algum(s)

possível(is) compradores da produção. A vantagem para o comprador é poder

garantir seu abastecimento de itens vitais, como energia, por exemplo, a um preço

fixo. Para a entidade-projeto a vantagem é livrar-se do risco de mercado e da

variação aleatória de preços. Às vezes tais contratos podem surgir de um acordo

entre o projeto e o próprio patrocinador, que pode entrar como garantidor da compra

da produção. Algumas instituições financeiras têm como pré-requisito para o

financiamento de projetos a existência de contratos de compra e venda.

3.2.4 – Custo de Construção

O custo de construção representa uma das principais variáveis na análise

econômico-financeira. A sua previsibilidade é ainda ruim no Brasil, devido à

constante mudança de preços e à falta de métodos avançados de previsão.

Podem surgir complicações durante a construção, aumento no preço dos

materiais, problemas quanto à tecnologia utilizada, etc. Ultimamente, para controlar

essa incerteza, tem sido comum em Project Finance um acordo contratual entre o

construtor e os patrocinadores para entregar o projeto operacionalmente funcional a

um preço fixo pré-determinado e dentro do prazo, podendo o construtor pagar multas

caso entregue a obra fora do prazo, e podendo o mesmo ser premiado no caso de

entrega antecipada.

3.2.4 – Custos

Os custos da produção são importantes porque afetarão diretamente o preço

do produto. As projeções de custos operacionais só podem ser feitas depois de o

projeto das instalações estar pronto. Devem ser levadas em consideração variáveis

como matérias-primas, mão-de-obra, manutenção de equipamento e pagamento de

royalties, além dos custos de capital.

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Capítulo 3 – Análise da Viabilidade do Projeto 28

Primeiramente, essas variáve is devem ser dividas em componentes de custos

variáveis e fixos. Cada um desses componentes deve ser analisado separadamente e,

a partir daí, deve ser feita uma estimativa para os mesmos. Além disso, os custos

devem ser reajustados de acordo com as taxas de inflação previstas ao longo do

período e de acordo com a variação eventual de preços dos insumos.

3.2.5 – Juros

Segundo Finnerty (1999), os juros representam uma despesa financeira que

deve ser arcada ao longo da vida útil do projeto. Devido ao fato de os Project

Finance terem alto grau de alavancagem, essa despesa se torna especialmente

importante.

As taxas de juros são negociadas com os financiadores. No Brasil, esse papel

é, na maioria das vezes, assumido por órgãos de fomento, que agem por intermédio

de um banco comercial, chamado banco intermediador. As taxas de juros cobradas

por órgãos de fomento são mais baixas que o custo de capital médio do mercado. O

banco intermediador, por sua vez, assume o risco de não pagamento da dívida

perante o financiador direto e espera receber para isso um adicional pela sua

exposição, chamado spread. O valor desse spread varia conforme os riscos

envolvido no projeto e a qualidade das garantias recebidas. Também pode haver

acúmulo de dívida por meio de títulos de dívida privada, emitidos em nome da SPC.

Fig. 3.2: Diagrama de Financiamento em Project Finance

Fonte: elaboração própria

Órgão de Fomento (IFC, BNDES, BID)

Banco Intermediador

Projeto

$ $ +

Spread

Risco Risco

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Capítulo 3 – Análise da Viabilidade do Projeto 29

A previsibilidade dos juros depende dos termos acertados com os

financiadores. Geralmente financiamentos de longo prazo não são feitos com juros

pré-fixados. No Brasil, o usual é acertar uma taxa de juros que pode sofrer uma

correção a cada período de tempo – por exemplo, um ano – de acordo com

determinado índice (IGPM, IPCA, CDI, SELIC, PTAX, etc.).

3.2.6 – Dividendos

“Dividendos são a remuneração do capital dos acionistas de uma empresa”

(Gittman L. J., 1997). Os dividendos são o que os investidores – em especial os

patrocinadores – visam receber quando investem no projeto. Os dividendos resultam

de uma sobra de caixa após o pagamento de todos os custos e despesas devidos pela

empresa. Portanto, a previsibilidade dessa variável passa pela previsão de todas as

outras. O montante de dividendos pagos ao longo do tempo e o investimento de

capital irão compor o fluxo de caixa do investidor. É esse fluxo que, no final, irá

dizer se o projeto é ou não viável para o investidor.

3.2.7 – Pagamento de Dívida

Além dos juros das dívidas, é preciso prever no fluxo de caixa o pagamento

das parcelas de principal (amortização). O prazo e a extensão do período de

pagamento depende do que foi acertado com os financiadores. Geralmente existe um

prazo de carência, que deve englobar todo o período de construção (quando for feito

financiamento nesse período) e, terminado esse prazo, um prazo razoavelmente

longo (algo como 5 a 10 anos) para o pagamento, geralmente em parcelas anuais ou

semestrais. Esses pagamentos influenciam pesadamente o fluxo de caixa, mas são de

fácil previsibilidade, bastando saber quais as possibilidades de negociação com os

credores.

3.2.8 – Impostos

A maioria dos impostos pode ser enquadrada nos custos e nas despesas. No

entanto, cabe um comentário à parte sobre esses desembolsos especiais, pois existe

um forte impacto social em projetos de grande porte, e o governo anfitrião pode

oferecer benefícios fiscais. Esses benefícios são importantes ao se fazer a previsão

dos fluxos de caixa do projeto e podem ser determinantes para a sua viabilidade.

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Capítulo 3 – Análise da Viabilidade do Projeto 30

No Brasil, esses benefícios geralmente compreendem isenção parcial ou total

de alguns impostos, geralmente de competência estadual e municipal (ICMS, IPTU,

ISS) por um determinado período de tempo.

3.3 – Riscos do Projeto

Qualquer investimento apresenta certo nível de risco, sendo que, segundo a

teoria econômica, quanto maior for esse risco, maior é o retorno esperado de quem o

assume. Quando se fala em riscos de um projeto, podemos traçar três possíveis

posicionamentos em relação a ele:

• Assumir o risco, o que acarreta em uma expectativa maior de retorno por

quem o assume.

• Modificar o projeto, para que o risco desapareça ou se torne insignificante.

Esse posicionamento geralmente acarreta em despesas ou custos maiores

para o projeto.

• Transferir o risco para quem estiver disposto a corrê-lo. Estão inclusos neste

item os seguros, os instrumentos financeiros de mitigação de riscos (swaps,

derivativos), os contratos de compromisso de compra e venda, etc. Este

posicionamento também acarreta em despesas e custos para o projeto.

É importante frisar que sempre que existe determinado tipo de risco, o mesmo

acarreta em saídas de caixa para o projeto, seja para recompensar a exposição dos

investidores, ou como despesas e custos para mitigação ou controle desse risco. A

melhor e mais barata maneira de eliminar um risco é fazer com que ele não exista

desde o princípio, e isto só é conseguido com um bom trabalho de projeto.

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Capítulo 3 – Análise da Viabilidade do Projeto 31

A mensuração dos riscos pode ser feita de várias formas. As mais usuais são a

classificação por uma agência de rating12 ou a utilização da fórmula de Fischer. Essa

fórmula consiste em somar as probabilidades de que cada tipo diferente de risco

venha a se revelar, podendo ser expressa da seguinte maneira:

1 + T risco = (1 + T riscoA) (1 + T riscoB) (1 + T riscoC) (...)

Podemos ainda, segundo Bonomi e Malvessi (2002), classificar os riscos

quanto à capacidade de mitigá- los, sendo divididos em:

• Riscos com coberturas contratuais : são os riscos que podem ser

amenizados por meio de contratos, por exemplo, contratos de garantia de

compra e venda.

• Riscos seguráveis: podem ser mitigados por meio de apólice de seguro.

Podem incluir seguros contra acidentes, Performance Bonds, seguros de

lucros cessantes, etc.

• Risco com cobertura por derivativos : podem ser controlados através de

instrumentos financeiros chamados derivativos. São os contratos futuros, as

opções e os swaps.

A seguir serão detalhados os diferentes riscos que incorrem sobre um Project

Finance e o quais são os instrumentos que são geralmente utilizados para contorná-

los ou mitigá-los.

3.3.1 – Risco Pré-Operacional

Dos riscos pré-operacionais, o mais relevante é o risco de construção. Os

credores do projeto têm uma grande preocupação quanto a esse risco, pois na fase de

construção, o empreendimento é a única garantia que eles têm. Se, durante essa fase,

12 Agências de rating são instituições especializadas em avaliar riscos de títulos, empresas ou países,

pontuando-os por meio de notas, como AAA, AB-, etc. Ex: Standard& Poor’s, Moody’s, Duff and

Phelps, Fitch-IBCA e outros.

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Capítulo 3 – Análise da Viabilidade do Projeto 32

o projeto se mostrar inviável por algum motivo, os credores não terão nada senão um

“esqueleto” para reclamar a posse13. Por esse motivo, no Brasil não se costuma fazer

Project Finance nessa fase projeto. Quando as instituições financeiras o fazem,

exigem garantias para o serviço da dívida durante esse período. Conforme o projeto

entra na fase operacional e as previsões mostrarem-se corretas, fica mais fácil obter o

financiamento.

O não término da construção do empreendimento pode resultar de fatores

como:

• Aumento significativo do custo de construção, provocado por inflação,

escassez de matéria-prima ou erro de avaliação;

• Atraso no cronograma;

• Queda no preço da produção do projeto;

• Aumento significativo nos preços de algum insumo importante;

• Problemas ambientais;

• Problemas técnicos.

3.3.2 – Risco Tecnológico

O risco tecnológico existe quando a tecnologia empregada no projeto nunca

foi usada amplamente na escala em que se deseja implantar, ou quando existe uma

alta probabilidade de surgir uma tecnologia inovadora que leve à obsolescência a

tecnologia empregada14.

Geralmente os credores não estão dispostos a correr riscos dessa natureza. Por

isso, nesses casos, o projeto só irá adiante se houver garantias quanto à tecnologia

por parte dos fabricantes da mesma ou dos patrocinadores.

13 Isso é válido para um Project Finance clássico, onde a SPC é a única garantia que os credores têm.

Na maioria das vezes, são exigidas garantias dos patrocinadores e dos construtores para mitigar o risco

de construção.

14 Isso geralmente acontece em setores onde a tecnologia está no estado-da-arte e tem rápida evolução,

como o setor de telecomunicações, por exemplo.

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Capítulo 3 – Análise da Viabilidade do Projeto 33

3.3.3 – Risco Econômico

“O risco econômico é a possibilidade de, depois de concluído e operacional, o

projeto venha a não trazer o retorno esperado” (Finnerty, 1999). Isso pode ocorrer

por um aumento no preço de um insumo básico, diminuição no preço do produto

produzido ou ineficiência operacional.

Para amenizar esses riscos, os financiadores geralmente exigem a contratação

de um operador competente para gerir o projeto e o hedging (proteção) com contratos

a termo e futuros. Os contratos a termo e futuros consistem em um contrato que

obriga o vendedor do mesmo a entregar ao comprador uma quantidade específica de

um produto, em uma data específica, a um preço estipulado na abertura do contrato.

Tanto o comprador como o vendedor se protegem, dessa forma, quanto a eventuais

variações de preços do produto.

3.3.4 – Risco Financeiro

O risco financeiro existe quando parte significativa da dívida é a taxas

flutuantes. Uma crise econômica, por exemplo, pode elevar as taxas de juros a níveis

que inviabilizem o seu pagamento. No Brasil, as taxas de juros sofrem uma variação

muito grande. Por isso, os financiadores procuram não fazer contratos a taxas pré-

fixadas. Para se proteger, a entidade-projeto pode lançar mão de alguns instrumentos

financeiros, como:

• Contrato Futuro de Juros: esses contratos pagam, no seu vencimento, a

diferença entre a taxa de juros contratada (pré-fixada) e a taxa de juros real.

Dessa forma, pode-se transformar uma taxa variável em taxa fixa.

• Swaps: contratos de swap são uma troca de taxas. As duas partes se

comprometem a pagar, uma à outra, a variação de determinado índice. Podem

ser feitos swaps entre os mais diferentes índices (CDI x PRE, PTAX x CDI,

Dólar x Preço da Abobrinha, etc). A diferença entre os índices reflete as

expectativas do mercado quanto à variação relativa dos mesmos.

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Capítulo 3 – Análise da Viabilidade do Projeto 34

3.3.5 – Risco Cambial

Segundo Finnerty (1999), o risco cambial existe quando parte significativa

das receitas, dos custos ou da dívida estiver atrelada a uma moeda estrangeira. A

falta de previsibilidade do cenário macroeconômico impossibilita uma previsão

precisa da variação da cotação de moedas estrangeiras. Os instrumentos para

mitigação desses riscos são os mesmos adotados para o Risco Financeiro.

No Brasil, devido a experiências recentes de variação brusca nas taxas

cambiais, os investidores estão especialmente sensíveis a esse tipo de risco. Portanto,

é grande a preocupação de fazer uma proteção total do projeto quanto ao risco

cambial.

3.3.6 – Risco Político

O risco político consiste na possibilidade de o governo local vir a interferir no

andamento do projeto, embargando obras, aumentando preços administrados e

cancelando contratos. No Brasil, essas decisões podem partir tanto do governo

federal, estadual ou municipal. Algumas vezes, essas decisões terminam por

inviabilizar completamente o projeto, gerando prejuízo para todas as partes

envolvidas.

No Brasil é comum o governo interferir em projetos de grande porte, pois

estes têm um impacto grande na sociedade. Recentemente, em 2003, o reajuste das

tarifas de telecomunicações foi barrado na justiça porque o índice previsto em

contrato havia sofrido uma variação muito grande. Em 2002, o governo do Estado do

Paraná vetou o aumento das tarifas de pedágio previstas no contrato de concessão,

gerando uma grave crise política. Ainda está em discussão a questão de até onde

pode ir o poder do Estado em interferir em contratos firmados, em nome para o

“bem-estar social”.

3.3.7 – Risco Ambiental

Antes da década de 80, pouco se pensava no meio-ambiente quando da

realização de grandes projetos. Nos últimos anos, principalmente após a conferência

ECO-92, os países vêm tornando suas legislações ambientais cada vez mais rígidas, a

atuação de grupos ambientalistas tem aumentado sua importância e a população tem

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Capítulo 3 – Análise da Viabilidade do Projeto 35

adquirido o que se chama de consciência ecológica. Dessa forma, ao se analisar um

projeto, deve-se levar em consideração sempre se o mesmo não esbarrará em

barreiras ambientais, sob o risco de ser totalmente inviabilizado.

Discordâncias do projeto com relação a normas ambientais são severamente

punidas pelos órgãos responsáveis, e geram um mal-estar social gigantesco. É

preciso estar 100% certo de que o projeto está de acordo com as normas vigentes.

3.3.8 – Risco de Força Maior

Esses riscos compreendem eventos não previsíveis que podem comprometer o

andamento do projeto ou até mesmo inviabilizar sua continuidade. Compreendem,

por exemplo, um acidente de grandes proporções, uma grave falha técnica, uma

greve, um terremoto, um incêndio, etc. Certos eventos podem ser cobertos por

apólices de seguro, como incêndios. Nesses casos, os credores costumam exigir parte

do prêmio do seguro como garantia do pagamento da dívida. Mesmo que não haja

apólice, os credores exigem dos patrocinadores garantias quanto a eventuais

desastres que possam inviabilizar o pagamento da dívida.

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Capítulo 4 – Metodologias para Análise Financeira 36

CAPÍTULO 4 – METODOLOGIAS PARA

ANÁLISE FINANCEIRA

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Capítulo 4 – Metodologias para Análise Financeira 37

4.1 – A metodologia CAPM (Capital Asset Pricing Model – Modelo

para Precificação de Ativos de Capital)

A grande maioria dos projetos apresenta riscos inerentes à sua própria

existência. Tais riscos não se refletem apenas no próprio projeto, mas na

rentabilidade da empresa (ou carteira) a que pertence como um todo. As medidas

desses riscos eram dadas, até então, pelo desvio-padrão da rentabilidade do projeto e

pelas covariâncias entre este e os demais ativos pertencentes à mesma carteira. Tal

análise envolve a estimativa das correlações entre todos os ativos que compõem uma

carteira e, apesar da veracidade de seus resultados, torna-se inviável para um número

muito grande de ativos. Uma forma alternativa de mensurar o impacto de um projeto

na rentabilidade de uma empresa é relacioná-lo à totalidade do portfólio, eliminando

o cálculo das covariâncias entre todos os ativos. Essa é a proposta do CAPM.

O CAPM começou a ser utilizado em meados da década de 60 no mercado,

baseado na teoria das carteiras de Markovitz (1952), que diz que o risco

idiossincrático pode ser eliminado quando se trabalha com carteiras bem

diversificadas. Desde então, o modelo fo i estudado e melhorado, destacando-se os

trabalhos de Roll (1977), que atestou a impossibilidade de se observar a verdadeira e

plena carteira de mercado; Harrington (1983), que frisou a dificuldade em se testar

empiricamente o CAPM; Copeland e Weston (1988), que descreveram as hipóteses

sobre as quais o CAPM se fundamenta; e, especialmente, Ross (1976, 1977), que fez

uma análise minuciosa do CAPM e desenvolveu, a partir dele, o APT (Asset Pricing

Tool).

O raciocínio base do CAPM é o de que um título com elevado desvio-padrão

não tem, necessariamente, um forte impacto sobre o desvio-padrão dos retornos de

uma carteira ampla, e vice-versa. Isso realmente verifica-se porque, na composição

de uma carteira, “ações individuais com riscos podem ser combinadas de maneira a

fazer com que um conjunto de títulos tenha sempre menos risco que qualquer um dos

componentes isoladamente” (Markowitz, 1952). Assim, devido à diversificação de

uma carteira é possível a eliminação parcial de riscos uma vez que os retornos dos

títulos individuais não estão perfeitamente correlacionados uns com os outros. Em

um Project Finance, isso pode ser verificado, por exemplo, quando tanto os custos

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Capítulo 4 – Metodologias para Análise Financeira 38

de matéria-prima quanto as receitas são atreladas a uma moeda estrangeira. Se

analisados isoladamente, cada um desses componentes apresenta um risco cambial

alto. Porém, quando analisados em conjunto, esse risco praticamente desaparece.

O CAPM relaciona um ativo com a carteira a que pertence através da linha de

mercado de títulos, que pode ser escrita matematicamente por:

( )fMf RRRR −⋅+= β (1)

Onde: R = retorno esperado da carteira.

Rf = taxa livre de risco.

RM = taxa esperada com risco de mercado.

RM - Rf = prêmio pelo risco de mercado.

Fig. 4.1: Gráfico da Linha de Mercado de Títulos

Em termos estatísticos, ß informa a tendência de uma ação individual variar

em conjunto com o mercado. Como ß é a medida apropriada de risco, os títulos com

betas elevados devem ter um retorno esperado superior ao de títulos com betas

reduzidos. Se o ativo possuir ß igual a um, seu retorno esperado será igual ao do

mercado (o beta médio de todos os títulos, quando ponderados pela proporção do

valor de mercado de cada título em relação ao da carteira de mercado, é igual a um: S

xi . ßi = 1). Se ß for inferior ou superior a um, as rentabilidades deverão ser menores

e maiores, respectivamente. Tais ganho ou perda de rentabilidade estão relacionados

R

Rf

RM - Rf

ß

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Capítulo 4 – Metodologias para Análise Financeira 39

ao prêmio pelo risco de mercado, que é, então, a própria inclinação da reta descrita

acima que define a linha de mercado de títulos.

Conceitualmente, beta diz qual é a contribuição do risco de um ativo à

variabilidade da carteira, e pode ser definido, segundo Ross, como a covariância do

retorno de um título individual com o da carteira que representa o mercado, dividida

pela variância do retorno dessa carteira:

( )2

cov

M

Mii

RRσ

β−

= (2)

Geralmente, quando o projeto apresenta grau de alavancagem e riscos

operacionais semelhantes ao do patrocinador, utiliza-se como estimativa para o ß do

projeto o ß do patrocinador. Caso a alavancagem ou os riscos operacionais difiram

dos do patrocinador, pode-se estimar o ß do projeto através de uma amostra de ß’s de

empresas operacionalmente parecidas com o projeto. No entanto, mesmo que sejam

parecidas operacionalmente, o risco financeiro atrelado a cada uma dessas diferentes

empresas influi bastante no seu beta. Portanto, para eliminar a influência do risco

financeiro, deve-se o usar o ß não-alavancado, que é dado por:

ß U = (1 – ?) ßL (3)

Onde: ßU = beta não-alavancado

? = grau de alavancagem financeira

ßL = beta alavancado

Através da média simples de uma boa amostra de betas não-alavancados,

pode-se ter uma estimativa razoável do beta não-alavancado do projeto. Possuindo-se

o grau de alavancagem do projeto, podemos chegar a uma estimativa para o beta

alavancado do projeto, que será usado para estimar seu custo de capital.

4.1.1 – Fluxo de Caixa Incremental

Quando as empresas vão analisar a viabilidade de um projeto, elas estão

interessadas nos fluxos de caixa incrementais, ou seja, na diferença entre os fluxos de

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Capítulo 4 – Metodologias para Análise Financeira 40

caixa da empresa com e sem o projeto. Para tanto, as empresas calculam os fluxos de

caixa de um projeto sob a hipótese de que o projeto é financiado somente com

recursos próprios. Quaisquer ajustes pelo financiamento de terceiros são feitos na

taxa de desconto e não no fluxo de caixa.

Os fluxos de caixa incrementais de um projeto recaem em quatro categorias

básicas:

• Desembolso de investimento inicial líquido: compreende as despesas de

caixa, mudanças no capital de giro líquido, fluxo de caixa líquido proveniente

da venda de equipamento velho e créditos fiscais por investimentos.

• Fluxo de caixa operacional líquido: pode ser expresso como a receita líquida

depois dos impostos, mais depreciação. É o principal componente de um

projeto, pois é sua principal fonte de fluxos positivos.

• Fluxos de caixa não operacionais: são necessários para dar suporte ao

investimento inicial, tais como uma grande reforma. Devem ser

contabilizados após os impostos.

• Valor residual líquido: ao término da vida útil do projeto, o mesmo pode ser

vendido, gerando uma receita. Pode ser que o valor residual seja negativo,

como no caso de necessidade de demolição e limpeza do local onde estava

instalado.

4.1.2 – WACC – Weighed Average Capital Cost (Custo Médio

Ponderado de Capital)

Já temos meios de calcular os fluxos de caixa, o beta e o custo de capital.

Agora, o problema é saber qual taxa de desconto utilizar para um projeto com risco.

Essa taxa pode ser calculada a partir do CAPM. Quando uma empresa usa tanto

capital de terceiros (financiamento) quanto capital próprio, a taxa de desconto a ser

utilizada é o custo global de capital do projeto, ou seja, a média ponderada entre o

custo de capital de terceiros e o custo de capital próprio, chamado de WACC:

( ) ed kED

Ekt

EDD

WACC ⋅+

+⋅−⋅+

= 1 (4)

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Capítulo 4 – Metodologias para Análise Financeira 41

onde: E: capital próprio

D: capital de terceiros

kd: retorno sobre a dívida, exigido pelo credor

ke: retorno sobre participação acionária, exigido pelo investidor

t : alíquota do imposto de renda

Cabe aqui uma explicação a respeito do que consiste o capital próprio e o

capital de terceiros. Essas proporções dizem respeito não ao capital investido, como é

de se esperar, mas à proporção que cada uma dessas partes tem sobre o Valor

Presente (VP) do projeto. Suponha que um projeto tenha um custo inicial de $8.000 e

um VPL (Valor Presente Líquido) de $2.000. Seu VP será, então de $10.000.

Suponha que os patrocinadores estejam investindo no projeto $4.000. Na verdade,

eles estarão recebendo $6.000, pois eles recebem todo o VPL. Sendo assim, podemos

dizer que o projeto é 40% financiado com capital de terceiros e 60% financiado por

capital próprio, mesmo que as proporções do custo inicial investido sejam de 50%-

50%. As proporções do custo inicial não são relevantes porque desconsideram o VPL

do projeto (Finnerty, 1995).

Ainda, a taxa de desconto de um projeto deve ser o retorno esperado de um

ativo financeiro de mesmo risco. Então, para o cálculo do custo de capital global do

projeto, deve-se estimar o custo de capital próprio, que pode ser calculado usando-se

a linha de mercado de títulos:

( )fMfe RRRk −⋅+= β (5)

As características da empresa são fatores determinantes do beta. Dentre elas

pode-se citar a natureza cíclica das receitas, a alavancagem operacional e a

alavancagem financeira. O comportamento cíclico das receitas de uma empresa, ou

seja, as flutuações da mesma em decorrência das flutuações do mercado, é um fator

determinante importante do beta dessa empresa. A alavancagem operacional, que diz

respeito aos custos fixos de produção de uma empresa, também compõe o risco

operacional que depende tanto da sensibilidade das receitas ao ciclo econômico

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Capítulo 4 – Metodologias para Análise Financeira 42

quanto da alavancagem operacional. Esta análise é importante porque se não for

possível estimar o beta de um projeto de outra maneira, poder-se-á examinar as

receitas e a alavancagem operacional do mesmo.

O beta de capital próprio mede o risco do capital investido em um projeto,

que é o beta que realmente iremos usar na análise, enquanto o beta dos ativos mede o

risco da totalidade dos ativos, como se estivessem 100% financiados com capital

próprio. A alavancagem financeira indica em que medida uma empresa (ou projeto)

utiliza capital de terceiros. E, neste aspecto, o beta de capital próprio deve ser sempre

maior que o beta dos ativos:

+⋅=

própriocapitaldívidas

ativosprópriocapital _1_ ββ (6)

Assim, a expressão acima ilustra que quanto maior for a alavancagem

financeira de uma empresa ou projeto, maiores serão os riscos, e, portanto, maior

deve ser a taxa de desconto. O beta dos ativos é, por isso, chamado de beta

alavancado.

Se o beta de um projeto diferir do beta da empresa, o projeto deverá ser

avaliado a uma taxa compatível com seu próprio beta. Nestes casos, o beta de um

projeto novo deve ser sempre superior ao beta das empresas existentes no mesmo

setor, porque a própria novidade do projeto tende a aumentar sua sensibilidade às

flutuações da economia.

4.1.3 – Exemplo do emprego do CAPM para um projeto genérico

Antes de ingressar em um estudo de caso mais complexo, é importante fixar

os conceitos descritos neste capítulo. Desse modo, foi elaborado um exemplo simples

e didático de utilização da metodologia CAPM em um projeto genérico.

O Projeto Alfa é um projeto de uma usina termoelétrica a ser instalada no

interior do Estado de São Paulo, com vida útil esperada de 15 anos. O patrocinador

do empreendimento é a Energia S/A, uma empresa conceituada no setor elétrico,

com várias usinas em operação. A obra tem duração de 2 anos e um custo estimado

de R$ 1.500.000,00, sendo R$ 1.000.000,00 no primeiro ano da obra e R$

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Capítulo 4 – Metodologias para Análise Financeira 43

500.000,00 no segundo. A Energia S/A conseguiu um financiamento de R$

1.000.000,00 para o projeto, ao custo de 27% ao ano. A taxa livre de risco é de 20%

ao ano e a alíquota do imposto de renda é de 25%. Desejamos saber se o projeto é

viável ou não através da metodologia CAPM.

Após longo estudo e análise, o patrocinador, em conjunto com construtores,

clientes, fornecedores, governo, etc, chegaram ao seguinte fluxo de caixa líquido

esperado para o projeto (antes do pagamento de juros e após imposto de renda):

Fluxo de caixa Ano Valor

1 (1.000.000,00) 2 (500.000,00) 3 200.000,00 4 500.000,00 5 750.000,00 6 750.000,00 7 750.000,00 8 750.000,00 9 750.000,00

10 750.000,00 11 750.000,00 12 750.000,00 13 750.000,00 14 750.000,00 15 1.000.000,00

Tabela 4.1: Fluxo de Caixa Projeto Alfa

A taxa interna de retorno para o fluxo acima é de 30,72%. O projeto será

viável, portanto, se o WACC for maior que 30,72%. Para calcular o WACC,

precisamos antes, segundo a eq. (4), calcular o grau de alavancagem e o retorno

esperado do acionista.

Grau de Alavancagem

Para se calcular o grau de alavancagem é preciso ter as proporções do capital

que é próprio e o que é de terceiros (financiado). É importante lembrar que, no

cálculo do grau de alavancagem, o conceito de capital próprio e de terceiros diz

respeito à parcela do Valor Presente (VP) do projeto correspondente, e não do

montante investido. Dessa forma, precisamos estimar o Valor Presente do Projeto

(1.000)

(500)

200

500750 750 750 750 750 750 750 750 750 750

1.000

1 2 3 4 5 6 7 8 9 10 11 12 13 14 15

Fig. 4.2: Fluxo de Caixa Projeto Alfa

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Capítulo 4 – Metodologias para Análise Financeira 44

Alfa para ter um cálculo do grau de alavancagem. Para estimar o Valor Presente

Líquido (VPL) do projeto, utilizaremos a taxa livre de risco, imaginando que seria

uma aplicação financeira comum. Assim, teremos:

VPL(Projeto Alfa; 20% a.a.) = R$ 757.591,65

VP (Proj. Alfa; 20% a.a.) = VPL + Investimentos = R$ 2.174.258,32

Tendo o Valor Presente do projeto e o total de capital de terceiros utilizado

que foi dado (D = R$ 1.000.000,00), temos que o total de capital próprio é:

E = VP – D = R$ 2.174.258,32 – R$ 1.000.000,00 = R$ 1.174.258,32

Assim, temos o grau de alavancagem financeira (?):

? = D / (D + E) = 1.000.000,00 / (1.000.000,00 + 1.174.258,32) = 46,0 %

Retorno Esperado do Investidor

Já temos o custo do capital de terceiros (chamado kd na eq. (4)), que é de 27%

ao ano. Já o custo do capital próprio (ke) é mais complexo, pois envolve a

expectativa de retorno dos investidores, relacionada ao risco que estão correndo ao

investir no projeto. Esse custo é chamado Retorno Esperado do Investidor e é

calculado, segundo o CAPM, através da linha de mercado de títulos. Segundo a eq.

(1), para obter o valor de R necessitamos da taxa livre de risco, do beta do projeto e

do prêmio pelo risco de mercado. A taxa livre de risco nos foi fornecida e é de 20%

a.a. Após uma análise estatística de dados históricos de mercado, chegou-se a um

valor para o prêmio pelo risco de mercado de 2,5% a.a.

Já o cálculo do beta não é trivial. Pelo fato de a maioria das usinas da Energia

S/A serem de fonte hidrelétrica, não podemos estimar o beta do Projeto Alfa através

do beta da Energia S/A. O que se deve fazer no caso é uma pesquisa com um número

razoável de empresas que se assemelham operacionalmente com o Projeto Alfa e

calcular seu beta não-alavancado. A seguir seguem os resultados de uma pesquisa

feita pelo estagiário da Energia S/A utilizando a eq. (3):

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Capítulo 4 – Metodologias para Análise Financeira 45

Tabela 4.2: Estimativa do beta para o Projeto Alfa

Empresa Beta alavancado

[A] Grau de Alavancagem

[B] Beta não-alavancado

[A/(1-B)] Usina Mercúrio 6,69 65% 2,34 Usina Vênus 5,70 50% 2,85 Usina Marte 4,16 42% 2,41 Usina Júpiter 4,39 54% 2,02 Usina Saturno 7,82 62% 2,97 Usina Urano 6,50 58% 2,73 Usina Netuno 8,48 75% 2,12 Usina Plutão 2,91 34% 1,92 Beta médio = 2,42

Com uma estimativa para o beta não-alavancado do Projeto Alfa, basta

realizar o cálculo inverso para obter a estimativa do beta alavancado:

ßL = ßU / (1 – ?) = 1,035 / (1 – 0,46) = 1,92

Com o beta em mãos, podemos agora calcular o custo de capital próprio (ke),

ou retorno esperado pelo investidor, através da linha de mercado de títulos:

ke = Rf + ß . (RM – Rf) = 0,20 + 2,42 . (0,025) = 31,2%

Temos, agora, todas as variáveis necessárias para se calcular o WACC

segundo a eq. (4), ficando:

WACC = ? . (1 – t) . kd + (1 – ?) . ke

WACC = 0.46 . (1 – 0,25) . 0,27 + (1 – 0,46) . 0,312

WACC = 26,2%

Este é o custo médio ponderado do capital para o Projeto Alfa. Como a TIR

do fluxo de caixa projetado é de 30,72%, o projeto é viável, ainda com uma boa

margem (4,6%) de lucro adicional para os investidores, ou para controle de riscos

não previstos.

Vale ressaltar aqui a diferença entre o modelo de análise CAPM e outros

modelos. Quando se utiliza o CAPM, está-se analisando o valor adicionado pelo

projeto para seus acionistas, e não somente o fluxo de caixa. Em uma análise

tradicional, pegaria-se a TIR do fluxo de caixa do projeto após o pagamento de juros

e o compararia com a taxa de mercado. Se fosse maior, o projeto seria viável. No

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Capítulo 4 – Metodologias para Análise Financeira 46

entanto, tal análise superficial não leva em conta os riscos inerentes ao projeto e a

expectativa de ganho dos investidores sobre esse risco. Através do CAPM, pode-se

ter uma indicação muito boa do valor gerado aos acionistas do empreendimento,

podendo estabelecer como objetivo principal a maximização do retorno sobre o

WACC.

4.2 – Outras metodologias de análise financeira

Apesar de ser o mais utilizado, o CAPM não é a única metodologia existente

para análise financeira de projetos. O APT (Arbitrage Pricing Theory), por exemplo,

tem a mesma base teórica, porém relaciona o ativo em questão não apenas com um

único parâmetro, como faz o CAPM em relação ao mercado, mas com tantos outros

parâmetros em que se possa estabelecer uma correlação com o ativo, por exemplo

inflação, taxa de juros etc... Ao final, ter-se-á não apenas uma equação a resolver,

mas um sistema de n equações e n variáveis, às quais se queira relacionar ao ativo em

questão. Quem primeiro descreveu esse modelo foi Ross (1976, 1977).

Bonomi e Mavessi (2002) sugerem como melhor indicador de performance

para um Project Finance o modelo VEC (Valor Econômico Criado), ressaltando suas

vantagens em relação aos métodos tradicionais de análise. Esse modelo, no entanto,

nada mais é do que o CAPM com uma nova folha de rosto.

Cada indivíduo que analisa um projeto tem o direito de utilizar o método que

achar mais apropriado, seja ele científico ou empírico. Segundo Fadigas (2001), esse

processo deve passar pela criação de um modelo, que é a simplificação do mundo

real, e procurar descrever esse modelo da forma mais simples possível. O CAPM

surge como um modelo bastante adequado para analisar ativos de qualquer natureza,

e isso aplica-se a Project Finance. Sua grande abrangência e relativa simplicidade o

qualificam como instrumento eficaz na análise de projetos.

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Capítulo 5 – O Setor de Saneamento no Brasil 47

CAPÍTULO 5 – O SETOR DE SANEAMENTO NO

BRASIL

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Capítulo 5 – O Setor de Saneamento no Brasil 48

“(...) não há um modelo único, uma ‘receita de bolo’ para a implementação de

um Project Finance. À medida que conhecemos maior número de casos, mais

alternativas de solução apresentam-se” (Alcides Lopes Tápias, 2002).

O trecho acima justifica por si só a importância de se realizar estudos de caso

no estudo de Project Finance. Modelos teóricos são necessários, mas não suficientes.

É preciso ver na prática os fatores que levaram projetos ao sucesso ou ao fracasso, de

modo a tentar interpretar esses fatores.

Neste sentido, é importante que haja estudos de caso os mais variados

possíveis. Também em nome da variabilidade dos casos é que o setor do caso

escolhido foi o de saneamento básico. Como já foi dito anteriormente, a grande parte

dos Project Finance no Brasil têm sido relacionados ao setor elétrico. Por esse

motivo, a maior parte dos estudos de caso disponíveis na literatura dizem respeito a

projetos nesse setor. Muito pouco se tem disponível na literatura sobre Project

Finance no setor de saneamento básico. Como será explicado adiante, as atividades

de Project Finance neste setor têm grande possibilidade de um virtuoso crescimento

nos próximos anos, devido a vários motivos, e o estudo de projetos relacionados vem

a contribuir para que este crescimento seja bem-sucedido.

5.1 – Breve Histórico das Políticas de Saneamento no Brasil

A indústria de saneamento tem como característica marcante a presença de

custos fixos elevados em capital altamente específico. Isso, associado à característica

de monopólio natural dos projetos de saneamento, consiste em um baixo incentivo ao

investimento. Esse é o grande motivo de o setor ser organizado em boa parte do

mundo sob o formato de gestão pública e local. No mundo atual, somente França e

Inglaterra têm um sistema sanitário eficiente baseado predominantemente na

iniciativa privada, sendo ambos paradigmas de duas formas distintas de operação e

regulação dos sistemas, que são conhecidas como “modelo inglês” e “modelo

francês”.

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Capítulo 5 – O Setor de Saneamento no Brasil 49

O modelo inglês15 nasceu da privatização das autoridades de bacia, que eram

empresas responsáveis pelo planejamento e controle de todos os usos da água no

âmbito das respectivas bacias. O modelo francês começou no final dos anos 1920,

ganhando maior expressão a partir dos anos 1950. Esse modelo é baseado em

concessões e arrendamentos. Nos anos 1990, 75% do abastecimento de água da

França foi produzido sob responsabilidade privada e o país conta com as 5 maiores

empresas do mundo no setor de saneamento.

No Brasil, o setor de saneamento tem passado por várias mudanças nas

últimas décadas. Abaixo segue um detalhamento de como o setor vem se

desenvolvendo e quais as mudanças mais significativas que ocorreram nas diferentes

fases, desde os anos 60.

5.1.1 – Década de 60

Em 1961, a Carta de Punta del Este estabelece as diretrizes de 70% de

atendimento da população urbana com serviços de água e esgoto e 50% da população

rural (Juliano, 1976).

Houve a criação do BNH – Banco Nacional da Habitação e, pouco mais tarde,

do SFS – Sistema Financeiro do Saneamento, que passou a centralizar recursos e

coordenar ações no setor. Eles tinham a função de viabilizar recursos aos municípios,

em conjunto com os governos estaduais, para investimento em saneamento. Os

serviços deviam ser organizados na forma de autarquia ou de sociedade de economia

mista.

5.1.2 – Década de 70

Houve a criação do PLANASA – Plano Nacional de Sanemento, que tinha

como objetivo ampliar o atendimento da população urbana para 80% com serviços

de água e 50% com serviços de esgoto até 1980. Foram criadas Companhias

Estaduais de Saneamento Básico (CESBs), organizadas sob a forma de Sociedade

Anônima. Estas deveriam obter as concessões diretamente das autoridades

15 Para maiores informações sobre o modelo inglês, ver Vickers e Yarrow (1988)

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Capítulo 5 – O Setor de Saneamento no Brasil 50

municipais. O esquema de financiamento era baseado em dois instrumentos,

responsáveis cada um por metade dos recursos: o Finasa, que consistia em recursos

do BNH; e o FAE, que era um fundo constituído por cada governo estadual com seus

próprios recursos. O Planasa foi eficiente no objetivo de construir sistemas de

saneamento e ampliar o atendimento, mas o pouco enfoque na operação fez com que

as companhias se tornassem ineficientes e gerassem grandes quantidades de perdas

de água.

5.1.3 – Década de 80

No início da década os objetivos do Planasa estavam quase que totalmente

atendidos. No entanto, o fim das carências dos financiamentos obtidos nos anos

anteriores, a elevada taxa de inflação, o uso político das companhias e os problemas

macroeconômicos contribuíram para a crise financeira das companhias. Em 1986 o

BNH foi extinto, sendo que suas atribuições passaram à Caixa Econômica Federal,

agora com recursos muito mais limitados. Pode-se destacar ainda o dispositivo na

Constituição de 1988 que definiu de forma ambígua que os municípios seriam

responsáveis pelos serviços de interesse local.

5.1.4 – Década de 90

Após o colapso do Planasa, as iniciativas governamentais revelaram-se

pontuais e desarticuladas, enquanto a Política Nacional de Saneamento permaneceu

por toda a década sem regulamentação. A Lei das Concessões (Lei nº 8.987, de 13 de

fevereiro de 1995) forneceu uma base legal para a concessão de serviços públicos a

entidades privadas. No entanto, tentativas de regulamentação específica para o setor

de saneamento foram infrutíferas. Isso contribuiu para que as feições do setor

continuassem as mesmas conferidas pelo Planasa.

Apesar do pouco avanço dos termos legais, houve um avanço no que diz

respeito à ampliação de cobertura e modernização do sistema. Isso pode ser atribuído

aos programas federais isolados que incentivaram a ampliação do setor em âmbito

regional e social. Os recursos para esses programas vieram da arrecadação do Estado,

do FGTS e das instituições de fomento, principalmente o Banco Mundial (Bird) e o

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Capítulo 5 – O Setor de Saneamento no Brasil 51

Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID). Na Tabela 5.1 podemos ver os

principais programas desenvolvidos pelo governo na década e suas características.

Tabela 5.1: Principais Programas Federais em Saneamento na Década de 1990

Programa Período Financiamento Beneficiário/Desdobramentos

Pronurb 1990/1994 FGTS e contrapartida

População urbana em geral, com prioridade à baixa renda

Pró-Saneamento

1995- FGTS e contrapartida

Preponderantemente áreas com famílias com renda de até 12 s.m.

Pass 1996- OGU e contrapartida, BID e Bird

População de baixa renda em municípios com maior concentração de pobreza

Prosege 1992/1999 BID e contrapartida

População de baixa renda, privilegiando comunidades com renda de até 7 s.m.

Funasa-SB - OGU e contrapartida

Apoio técnico e financeiro no desenvolvimento de ações com base em critérios epidemiológicos e sociais

PMSS I 1992/2000 Bird e contrapartida

Estudos e assistência técnica aos estados e municípios em âmbito nacional; investimentos em modernização empresarial e aumento de cobertura dirigidos a Casan, Embasa e Sanesul

PMSS II 1998/2004 Bird e contrapartida

Passa a financiar companhias do Norte, Nordeste e Centro-Oeste e estudos de desenvolvimento institucional

PNCDA 1997- OGU e contrapartida

Uso racional de água em prestadores de serviço de saneamento, fornecedores e segmentos de usuários

FCP/SAN 1998- FGTS, BNDES e contrapartida

Concessionários privados em empreendimentos de ampliação de cobertura em áreas com renda de até 12 s.m.

Propar 1998 BNDES Estados, municípios e concessionários contratando consultoria para viabilização de parceria público-privada

Prosab 1996- Finep, CNPq, Capes

Desenvolvimento de pesquisa em tecnologia de saneamento ambiental

Fonte: Turolla, Frederico A. (2002)

A Política Nacional de Saneamento que foi mantida durante a gestão

Fernando Henrique Cardoso (1995/2002) teve como premissa que a universalização

dos serviços seria atingida no ano de 2010. A política não chegou a ser

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Capítulo 5 – O Setor de Saneamento no Brasil 52

institucionalizada na forma de lei, o que prejudicou severamente a sua

implementação. Os programas implantados podem ser divididos entre aqueles que

incentivaram a ampliação da cobertura, com ênfase nas áreas de menor viabilidade

econômica, e os programas voltados para a modernização do setor. Pode-se dizer que

a atuação mais importante do governo federal foi no sentido de um aperfeiçoamento

institucional dos programas existentes. Destaca-se o sucesso do programa FCP/SAN,

que introduziu no sistema a concorrência da iniciativa privada por recursos do FGTS,

o que estimulou a eficiência das companhias.

5.2 – Diagnóstico da Situação Atual

Como podemos ver acima, o setor de saneamento básico sempre foi marcado

no Brasil pelo investimento isolado estatal, com pouca ou nenhuma atuação da

iniciativa privada. Recentemente, com a privatização de muitas das empresas

estaduais de saneamento, houve uma melhoria nas regras de concessões, criando a

possibilidade de inserir a iniciativa privada no controle e no investimento em

saneamento. A última década foi marcada por entraves legais que dificultavam o

investimento direto das empresas de saneamento e limitava o poder do governo em

oferecer incentivos para esses investimentos.

Segundo a SEDU/PR (atual Ministério das Cidades), a cobertura do déficit do

setor de saneamento no Brasil exigirá a destinação de R$ 4,4 bilhões anuais até 2013.

A atual participação da iniciativa privada no setor é de somente 5%. Portanto, é

possível concluir que precisamos aumentar muito o investimento atual em

saneamento, e esse aumento pode ser bancado em sua maior parte pela iniciativa

privada. Além disso, o setor é estratégico para o Governo, pois gera inúmeros

benefícios sociais (veja quadro abaixo).

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Capítulo 5 – O Setor de Saneamento no Brasil 53

Fig. 5.1: Quadro de Benefícios para o Governo Resultantes de Investimento em Saneamento

Fonte: SEDU/PR, atual Ministério das Cidades

Um dos maiores entraves legislativos pertinentes ao saneamento diz respeito

à questão da titularidade. A constituição de 1988 afirma que é dever do município

oferecer os serviços que atendem à população daquele e somente daquele município.

Prevê ainda que uma “Lei Complementar fixará normas para a cooperação entre a

União e os Estados, o Distrito Federal e os Municípios, tendo em vista o equilíbrio

do desenvolvimento e do bem-estar em âmbito nacional” (par. único, art. 23).

Tal legislação ainda está em discussão no Congresso Nacional. O Projeto de

Lei n°- 4.147, apresentado pelo Executivo em 2001, reafirma que o município é o

titular dos serviços que se destinam exclusivamente ao atendimento de um

município. Porém, se pelo menos uma das atividades, infra-estruturas ou instalações

operacionais atendem a mais de um município, a sua titularidade cabe ao respectivo

estado. Cria-se, portanto, um impasse entre prefeitos e governadores. Estes, ainda,

com um adicional que é a eventual perda de valor econômico das concessões das

companhias estaduais.

- 4,4 milhões de habitantes atendidos

- 1,2 milhões de famílias beneficiadas

- 173 mil empregos gerados

Contrapartida direta no orçamento do setor de saúde, em função da redução das doenças de veiculação hídrica

Preservação do Meio-Ambiente

Para cada R$ 1 bilhão investidos em Saneamento:

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Capítulo 5 – O Setor de Saneamento no Brasil 54

A opção de basear a operação dos sistemas de saneamento com base nas

bacias hidrográficas, seguindo o exemplo inglês, parece tentadora à primeira vista,

pois existem ganhos de escala elevados no que diz respeito a sistemas de

saneamento. No entanto, tal saída não é viável no Brasil, pois envolve questões de

coordenação administrativa que apresentam custo de transação elevado.

Independentemente da titularidade que for estabelecida por lei, deve haver um

órgão responsável por fiscalizar e estabelecer as políticas pertinentes ao setor de

saneamento. Essa não é uma questão simples. A política tarifária, por exemplo, uma

das mais importantes para o sucesso de um projeto no setor, deve ser executada pelo

poder concedente local, de modo a preservar o modelo de regulação econômica. Já a

regulação técnica tem despertado discussões sobre quem deve o seu executor. Muitos

defendem que os aspectos técnicos extrapolam os limites físicos do município em

que estão localizados, afetando muitos outros ao seu redor.

Uma possível saída para o impasse é atribuir a função de regulação técnica à

Agência Nacional de Águas (ANA), passando as atribuições de supervisão dos

padrões de qualidade para o Ministério da Saúde, por meio da Fundação Nacional de

Saúde (Funasa). No Reino Unido, por exemplo, a função de regulação técnica é

separada da de regulação econômica, e eles têm tido um grande sucesso. Esse

modelo permite, além de tudo, uma integração entre as ações de saneamento, saúde e

meio-ambiente.

As mudanças que estão ocorrendo no setor também apontam para uma outra

necessidade: a defesa da concorrência e a proteção ao consumidor. É importante que

não haja monopólios de empresas privadas, para que a qualidade do serviço não seja

prejudicada. Para que isso não ocorra, o próprio Projeto de Lei 4.147/2001 propõe

que sejam estabelecidos limites de concentração nos mercados de prestação de

serviços. Quanto à proteção ao consumidor, é importante que se garanta a

participação de conselhos de usuários nas instâncias decisórias e, também, que sejam

regulados os prazos para interrupção nos serviços.

Finalmente, é preciso discutir as formas que as empresas privadas terão para

financiar os projetos. Muito se fala em escassez de recursos, mas, no ano de 2002,

somente R$ 1 bilhão de um total de R$ 4,6 bilhões em recursos do FGTS foram

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Capítulo 5 – O Setor de Saneamento no Brasil 55

aplicados em saneamento. Na realidade, a escassez de recursos para o setor resulta

dos seguintes fatores:

• Desenquadramento de estados e municípios na Lei de Responsabilidade

Fiscal, que limita o poder do Estado em investir na área.

• O baixo rating das Prestadoras de Serviços de Saneamento Básico (PSSB)

nas agências de classificação.

O desafio, portanto, é gerar a opção de acesso aos recursos do FGTS e de

investidores institucionais, atendendo às seguintes premissas:

• Desafetação do equilíbrio fiscal do estado ou município em função das

operações de crédito.

• Mitigação do risco relacionado às PSSB.

Nesse sentido, o Project Finance cai como uma luva para as necessidades do

setor. O modelo permite uma desvinculação do risco do projeto ao risco da PSSB16.

Isso é essencial, pois a situação financeira da maioria das PSSB está precária,

limitando o acesso destas aos recursos disponíveis normalmente. Temos também,

acompanhando esses fatores, algumas motivações legais para o surgimento do

Project Finance como modelo de engenharia financeira adequado para o setor. São

elas:

• Lei Federal n° 9.514, de 20/11/1997: cria o SFI – Sistema de Financiamento

Imobiliário, que tem por finalidade “promover o financiamento imobiliário

em geral, segundo condições compatíveis com as da formação dos fundos

respectivos”. A Lei também define quais entidades irão operar no SFI. Entre

elas, podemos destacar as Companhias Securitizadoras, que têm a função de

aquisição e securitização dos créditos e a emissão e colocação no mercado

16 PSSB – Prestadora de Serviços de Saneamento Básico

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Capítulo 5 – O Setor de Saneamento no Brasil 56

financeiro, de Certificados de Recebíveis Imobiliários (CRI). Cria também a

alienação fiduciária para imóveis.

• Instrução CVM n° 284/1998: essa instrução vem complementar a Lei 9.514,

com as regras de regulação do registro e distribuição dos CRI.

• Resolução BACEN n° 2.829/2001: nos seus artigos 10 e 11, essa resolução

enquadra os CRI como títulos de renda fixa, sujeitos a rating, classificados na

carteira de baixo risco, sob a ótica da SPC.

• Resolução do CCFGTS 17 n° 395 de 24 de junho de 2002: “autoriza a

aplicação de recursos em operações de saneamento mediante a aquisição de

Certificados de Recebíveis Imobiliários – CRI”.

• Instrução Normativa n° 4 da SEDU/PR 18 de 25 de julho de 2002:

“estabelece as diretrizes gerais para a aplicação de recursos em operações de

saneamento mediante a aquisição de Certificados de Recebíveis Imobiliários

– CRI”.

• Carta Circular da CEF19 n° 266 de 18 de outubro de 2002: “define os

procedimentos para a aplicação dos recursos destinados à aquisição de CRI,

relativos a sistemas de saneamento básico”, lastreados em operações nas

modalidades de água e esgoto sanitário.

Cabe ao Poder Legislativo autorizar a PSSB a constituir a Companhia de

Propósito Específico e firmar o compromisso de venda e compra do sistema e,

também a autorizar para o município, como Poder Concedente, anuir nos

instrumentos da operação. Neste caso, a autorização deve partir do Legislativo

Estadual e Municipal.

17 CCFGTS – Conselho Curador do FGTS

18 SEDU/PR – Secretaria Especial de Desenvolvimento Urbano da Presidência da República, atual

Ministério das Cidades, gestor da aplicação dos recursos do FGTS.

19 CEF – Caixa Econômica Federal, agente operador dos recursos do FGTS.

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Capítulo 5 – O Setor de Saneamento no Brasil 57

5.3 – Proposta de Estruturação de Operação

Temos, agora, características favoráveis e meios legais que incent ivam o uso

de Project Finance para estruturar o financiamento de projetos no setor de

saneamento. Mas é necessário, ainda, um modelo que possa servir de base para as

operações, levando em conta as características específicas do setor. O modelo a ser

apresentado a seguir é uma referência na área e já funcionou com sucesso em alguns

empreendimentos.

Fig. 5.2: Estrutura da operação de captação através de CRI

Fonte: Adaptado de Capsi Consultoria Empresarial (Setembro/2003)

B

Sistemas de Saneamento

SPC 100% PSSB

PSSB

Recebíveis

(Tarifas)

Gestão Operacional

Gestão Comercial

Companhia Securitizadora

CRI

FGTS

BNDES

INV. INSTITUC.

Créditos contra a SPC

Propriedade dos Sistemas

Agente Fiduciário

1 C

A

2

3

4 7

5

6 8

1- Compromisso de Compra e Venda dos sistemas

2- Cessão de Créditos

3- Alienação Fiduciária

4- Caução dos Recebíveis

5- Emissão e subscrição dos CRIs

6- Integralização dos CRIs

7- Repasse mensal da cobrança

8- Amortização dos CRIs

A- Constituição da SPC (S/A)

B- Golden Share para Agente Fiduciário

C- Caução das ações da SPC

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Capítulo 5 – O Setor de Saneamento no Brasil 58

O processo tem início com a criação da SPC (Companhia de Propósito

Específico), que, em geral, e 100% de propriedade da PSSB. A SPC é necessária

porque segrega os riscos dos novos sistemas a serem implantados do risco geral da

PSSB. O agente fiduciário20 detém a propriedade de ações golden share21, que lhe

asseguram direito de veto na nova companhia. Algumas vezes, o agente fiduciário

exige um caução das ações da SPC como garantia adicional.

Um papel muito importante no processo é exercido pela Companhia

Securitizadora. Ela faz a securitização, ou seja, a conversão dos ativos e de

empréstimos bancários em títulos (securities, em inglês) para vendê- los a

investidores. No caso, são securitizados os créditos que a PSSB tem contra a SPC. A

companhia securitizadora recebe ainda a cessão dos recebíveis dos novos sistemas da

SPC e também dos recebíveis imobiliários da PSSB, que nada mais são que os títulos

que dão a propriedade dos sistemas a serem construídos. Isso é importante para

desvincular totalmente os ativos da SPC dos da PSSB.

Com lastro nos créditos cedidos, a securitizadora emite os Certificados de

Recebíveis Imobiliários, que são postos à venda para os investidores interessados.

Estes investidores podem ser, além do próprio FGTS, entidades como fundos de

pensão, BNDES, BIRD, BID e investidores locais que se beneficiariam com os

sistemas. Eles são atraídos pela facilidade de investimento e pelo baixo risco

envolvido. Os CRIs são classificados pelo Banco Central como títulos de renda fixa

de baixo risco, sujeitos a rating, o qual é definido por uma empresa especializada.

Quanto maior for o risco, maior será o retorno que o título deve oferecer, seguindo a

20 Agente Fiduciário: criado pela lei nº 6.404/76 (Lei das S/A), é qualquer empresa credenciada pelo

Banco Central para, entre outras funções, promover a execução extrajudicial de empréstimos

hipotecários vinculados ao SFH.

21 Ações golden share (em português, ações douradas) são ações de classe especial, cujos proprietários

possuem direitos exclusivos estabelecidos no estatuto da empresa. Existem diversas formas de golden

share mas, basicamente, dão ao detentor poder de voto suficiente para manter o controle da

companhia.

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Capítulo 5 – O Setor de Saneamento no Brasil 59

lógica do CAPM (Capital Asset Pricing Model, explicado no Capítulo 4). A emissão

dos títulos passa ainda pela aprovação da Comissão de Valores Mobiliários (CVM) e

os títulos devem ser registrados na Central de Liquidação e Custódia (CETIP) antes

de serem oferecidos ao mercado.

A Companhia Securitizadora pode ainda exigir que a gestão comercial dos

sistemas seja feita por uma empresa terceirizada, separando, desta forma, a gestão

comercial da gestão operacional do sistema.

Temos, portanto, um modelo de financiamento para o setor de saneamento

baseado em capital privado e com o uso de Project Finance. Tal modelo somente

passou a ser viável legalmente em meados de 2002, com a devida regulamentação

por parte dos órgãos controladores. Por isso, não existem ainda projetos finalizados e

operacionais que utilizaram tal modelo.No entanto, essa operação foi muito estudada

por profissionais da área, e tem grande potencial para surgir como uma ferramenta de

amplo uso para o desenvolvimento nacional.

5.4 – Identificação dos Riscos

Operações em saneamento básico possuem riscos específicos. É preciso

conhecê- los bem para poder lidar com os mesmos da melhor forma. Conhecer as

ações mitigatórias e de controle de risco já desenvolvidas é também uma prática útil

para que novos projetos comecem a lidar com elas desde o início, prevendo os riscos

e procurando eliminá- los já na fase de projeto. O conhecimento das práticas

geralmente utilizadas para controle de risco também são úteis para se tentar encontrar

soluções inovadoras.

5.4.1 – Risco Político

Esse risco é particularmente importante porque estamos lidando com um setor

de interesse público e social. A maioria das empresas do setor é pública, ficando

ainda mais susceptíveis a mudanças de governo e de políticas governamentais.

Ações de controle:

• Autorizações legislativas estadual e municipal.

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Capítulo 5 – O Setor de Saneamento no Brasil 60

• Anuência do Poder Concedente.

• Quando a PSSB é empresa pública, a SPE é empresa pública.

5.4.2 – Risco de Descolamento Tarifário

O descolamento tarifário diz respeito ao preço da tarifa cobrada pelos

serviços de água e esgoto, e que são a principal fonte de receitas do projeto. Um

desvio muito grande da previsão pode comprometer a viabilidade de um projeto.

Ações de controle:

• Análise da série histórica da política tarifária da PSSB (mínimo de 8 anos – 2

governos).

• Utilizar para definição das garantias complementar e colateral a pior situação

de descolamento apurado no período de análise.

5.4.3 – Risco de Redução do Fluxo de Caixa Líquido

Este risco é referente aos desvios da previsão para o fluxo de caixa líquido

que não são referentes ao preço da tarifa. Podem ser advindos de erros na previsão de

aumento da demanda ou uma superestimação do mercado.

Ações de controle:

• Gestão comercial terceirizada (quando necessário).

• Substituição programada de hidrômetros.

• Ligações intra-prediais contempladas pelo projeto.

• Combate a perdas do sistema (físicas e de faturamento).

• Garantias Complementar e Colateral.

• Adoção de premissas conservadoras no modelo de crescimento populacional.

• Carteira pulverizada.

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Capítulo 5 – O Setor de Saneamento no Brasil 61

5.4.4 – Risco Ambiental

Infra-estrutura de saneamento básico afeta muito o meio-ambiente. Na

maioria das vezes, projetos de saneamento ajudam a melhorar as condições

ambientais. Porém, eles ao mesmo tempo geram problemas como depósito de

resíduos, escoamento dos produtos, etc. Problemas ambientais podem impedir a

continuidade até de grandes projetos, pois é um problema atualmente muito

valorizado pela sociedade, e a tendência é que essa preocupação aumente ainda mais.

Ações de controle:

• A emissão dos CRI depende da existência das Licenças Ambientais.

• A contrapartida ambiental será bancada pelo projeto.

• Projetos de saneamento tendem a ser encarados positivamente pelas entidades

ligadas ao meio-ambiente.

5.4.5 – Risco de Construção

Os riscos de construção são parecidos com os de qualquer grande projeto,

explicados no Capítulo 3. Ainda assim, algumas ações mitigatórias específicas

podem ser ligadas a projetos de saneamento no Brasil.

Ações de controle:

• Regime de contratação por empreitada global (turn key).

• Seguro performance da conclusão da obra, bancada pelo projeto.

• Gerenciador (contratado pela Securitizadora) para aferição quantitativa e

qualitativa da evolução da obra.

• Processo licitatório (uso de tecnologias consagradas, sistema de medição,

projetos, garantias contratuais).

• Seguro de lucros cessantes, responsabilidade civil e danos patrimoniais.

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Capítulo 5 – O Setor de Saneamento no Brasil 62

5.4.6 – Risco Operacional

O risco operacional diz respeito a eventuais problemas administrativos que

ponham em risco a saúde financeira do projeto. Mais uma vez, desvios em relação às

previsões feitas no projeto são o grande fator gerador de riscos.

Ações de controle:

• Base de dados históricos contempla diversas localidades, soluções e

características, proporcionando confiabilidade na projeção dos custos

operacionais.

• O projeto também permite detalhar com qualidade o custo operacional dos

novos sistemas.

• Processo licitatório (condições de recebimento e pré-operação).

• Golden Share pode ser empregada para troca do operador (devido à

ineficiência).

5.4.7 – Riscos Gerais

São riscos não contemplados nos itens anteriores, mas que são de grande

importância no projeto.

Ações de controle:

• Poder de veto a decisões que comprometam o interesse dos investidores:

golden share para o Agente Fiduciário.

• Regime Fiduciário: aparta o patrimônio da SPE do patrimônio da

Securitizadora.

• Caução dos recebíveis de saneamento.

• Gestão comercial terceirizada, conferindo qualidade aos recebíveis.

• Consumo concentrado na tarifa mínima e em economias residenciais.

• Não há necessidade de contrapartida da PSSB.

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Capítulo 6 – Estudo de Caso: SANEAGO 63

CAPÍTULO 6 – ESTUDO DE CASO: SANEAGO

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Capítulo 6 – Estudo de Caso: SANEAGO 64

6.1 – Descrição da Companhia

A Saneamento de Goiás S/A – SANEAGO é uma concessionária de serviços

públicos de saneamento básico, responsável pelo abastecimento de água tratada e

coleta e tratamento de esgoto sanitário no Estado de Goiás. Atua em 222 dos 246

municípios do estado e atende cerca de 3,9 milhões de habitantes, correspondente a

84% da população com água tratada e 35% da população total do Estado com coleta

de esgoto sanitário (dados fornecidos pela empresa). Na Tabela 6.1 podemos ver a

evolução do volume de água e esgoto fornecidos pela companhia nos anos de 2001 e

2002.

Tabela 6.1: Volume de água e esgoto faturado por categoria de uso de janeiro a dezembro (valores em mil m3)

Fonte: SANEAGO

A empresa é uma companhia de capital aberto. Seu objetivo maior é a

universalização dos serviços prestados à população. A maior parte dos investimentos

é feita ainda com capital próprio, o que, segundo a própria companhia, é um dos

fatores que limitam um crescimento mais acelerado. A universalização dos serviços

só conseguirá ser atingida em um prazo razoável se houver um crescimento

significativo dos serviços oferecidos. Segundo o último relatório da administração, a

estratégia financeira da companhia para os próximos anos é de aumentar a

alavancagem.

6.2 – Apresentação do Projeto: Programa de Águas e Saneamento

de Goiânia

A empresa financiada é a Empresa de Saneamento de Goiás S/A

(SANEAGO), que também faz o papel de executora do projeto. O projeto é

financiado pelo Banco Interamericano de Desenvolvimento (BIRD), com garantias

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Capítulo 6 – Estudo de Caso: SANEAGO 65

da República Federativa do Brasil para serviços de dívida, e do Estado de Goiás para

qualquer outra obrigação assumida pela financiada. O BIRD financiará US$ 47,6

milhões e a SANEAGO investirá em capital próprio outros US$ 47,6 milhões,

perfazendo um total de US$ 95,2 milhões para o projeto. Abaixo, na Tabela 6.2,

podemos ver outras características do financiamento.

Tabela 6.2: Características do Financiamento

Período de Amortização 25 anos

Período de Carência 5 anos

Período Máximo de Desembolso 5 anos

Período Mínimo de Desembolso 3 anos

Taxa de Juros Variável

Inspeção e Supervisão 1,00%

Taxa de Crédito 0,75%

Moeda Dólares dos Estados Unidos

Fonte: BIRD

6.3 – Análise do Setor de Saneamento em Goiânia

O estado de Goiás está localizado na região Centro-Oeste do Brasil. Com uma

área de 340.000 km², ele é responsável por 25% do total da superfície da região, e

4% do Brasil. O estado tem uma população de mais de 4 milhões de habitantes, o que

faz dele o estado mais populoso da região. A capital Goiânia compreende uma área

urbana de seis municípios e uma população de mais de 1,2 milhão de habitantes.

Goiânia presenciou um rápido crescimento urbano nas últimas três décadas,

devido principalmente à construção de Brasília, à pouca capacidade das áreas rurais

de absorver a crescente população e ao processo de crescimento generalizado do

Brasil. Entre 1960 e 1970, Goiânia cresceu a uma taxa média anual de 10%,

diminuindo para aproximadamente 7% na década seguinte. Hoje, o crescimento

anual médio de Goiânia está em torno de 3%, taxa compartilhada por muitas outras

cidades no estado de Goiás.

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Capítulo 6 – Estudo de Caso: SANEAGO 66

De acordo com o estudo “Demanda, Abastecimento e Necessidades de

Serviços Sanitários”, preparada pela Secretaria de Desenvolvimento Urbano (SEDU)

em 1999, aproximadamente 84% dos lares na região de Goiânia tinham água tratada,

contra 85% de média nacional, e 34% dos lares tinham conexões de esgoto, contra

42% em nível nacional.

Apesar do relativo alto nível de cobertura de serviços de água, Goiânia tem

problemas no que diz respeito ao abastecimento. Como resultado do rápido

crescimento, o abastecimento de água não é mais suficiente para atender a demanda

atual e, principalmente, a futura. As duas principais fontes de abastecimento da

cidade – os rios Meia Ponte e João Leite – são fontes superficiais e incapazes de

servir os 130.000 habitantes que não estão conectados ao sistema. O período de seca

na região dura pelo menos seis meses, o que torna as fontes de abastecimento muito

vulneráveis, devido à ausência de reservatórios. Isso cria sérios problemas no

abastecimento, principalmente para os moradores da Zona Sul da cidade, que têm de

enfrentar racionamentos nas épocas mais críticas. O rio João Leite, que corre por

dentro de uma área densamente povoada, apresenta níveis altos de poluição. Esses

problemas são agravados pela ausência de reservas estratégicas e de conexões entre

os dois rios, tornando difícil distribuir a água durante os meses de estiagem.

Os níveis de tratamento de esgoto de Goiânia são muito baixos. Apesar de

78% dos lares estarem conectados ao sistema de coleta, somente 7% do esgoto é

tratado. Mais de 90% do esgoto da cidade é jogado sem nenhum tipo de tratamento

diretamente em um dos mais importantes rios do estado: o rio Meia Ponte. Uma

avaliação preliminar da qualidade da água a jusante dos pontos de descarga indica

que o rio tem uma faixa de aproximadamente 60 km com níveis baixíssimos de

oxigênio dissolvido e, portanto, pouca ou nenhuma capacidade de manter vida

aquática ou prover condições para agricultura.

Para identificar soluções técnicas para esses problemas, foram formulados

planos para tratamento de esgoto e distribuição de água durante o ano de 1999. Os

planos, que previam investimentos da ordem de US$ 500 milhões, foram analisados

e discutidos com grupos da comunidade e de agências do governo, e formam a base

do programa proposto abaixo. Com financiamento do governo estadual e federal, o

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Capítulo 6 – Estudo de Caso: SANEAGO 67

plano mestre para tratamento do esgoto foi iniciado com a construção de coletores e

interceptadores ao longo do rio Meia Ponte e a estação de tratamento de esgoto do rio

João Leite, com capacidade para 2.500 litros/segundo. É esperado que essas medidas

recuperem parte do dano ambiental do rio Meia Ponte.

6.4 – Objetivos do Projeto

O objetivo geral é melhorar as condições sanitárias gerais dos residentes de

Goiânia e áreas urbanas contíguas através da ampliação do abastecimento de água e

esgoto. Os objetivos específicos são:

• Melhorar a continuidade e confiabilidade do abastecimento de água potável

em Goiânia e áreas urbanas contíguas;

• Melhorar a qualidade da água dos rios que passam por Goiânia;

• Tornar o serviço mais eficiente.

Dentro do objetivo de garantir a continuidade e confiabilidade do

abastecimento de água, o programa visa alcançar um serviço contínuo 24 horas por

dia, 365 dias por ano, para 90% da população atendida ao final de 2007. Dentro do

objetivo de melhorar a qualidade da água dos rios, o programa visa alcançar um nível

de Demanda Biológica por Oxigênio (BOD) de 20 mg/l e um nível de Oxigênio

Dissolvido (DO) de 6 mg/l ao final de 2007. Por fim, dentro do objetivo de tornar o

serviço mais eficiente, o programa visa reduzir a porcentagem de reclamações de

usuários para 2% até o fim de 2007.

6.5 – Descrição do Programa

• Melhoria no Sistema de Água Potável (US$ 58,6 milhões): a continuidade

e confiabilidade do abastecimento de água será garantido por obras cujo teor

são de impulsionar a capacidade de produção e regular as fontes de

abastecimento, transportar a água adicional produzida para o sistema de

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Capítulo 6 – Estudo de Caso: SANEAGO 68

distribuição e implementar melhorias operacionais que permitam ao sistema

suportar o volume adicional de água. Este componente inclui ainda medidas

para mitigar os impactos ambientais associados. Existem ainda mais dois

subcomponentes:

o Aprimoramento da confiabilidade do sistema (US$ 42,8 milhões):

uma barragem de fechamento e de controle de enchentes de 451m de

largura será construída no rio João Leite, juntamente com um novo

coletor de água e um novo sistema de tubulação de 11.827 metros e

1.727 mm de diâmetro, para transportar o volume adicional de água

para a estação de tratamento Jaime Câmara.

o Aprimoramento na continuidade do serviço (US$ 15,8 milhões): a

planta, as estações de bombeamento, e as caixas d’água para água

tratada serão melhoradas, e regiões críticas da rede de distribuição da

cidade serão reformadas ou substituídas para permitir aos sistemas

suportar o volume adicional de água proporcionado pela construção

da barragem.

• Melhoria na qualidade da água do rio (US$ 16,3 milhões): os serviços de

coleta de esgoto e tratamento de água na cidade serão expandidos por: (i)

construção de redes de esgoto e tubulações na bacia do rio Caveirinha; (ii)

construção de redes de esgoto, tubulações e uma estação de tratamento com

capacidade de 115 litros/segundo na bacia do rio São Domingos; (iii)

construção de redes de esgoto, tubulações e uma estação de tratamento com

capacidade de 8 litros/segundo na área de Terezópolis. O programa visa

construir um total de 268 km de redes de coleta de esgoto; 21 km de

tubulações interceptadoras medindo entre 150 mm e 800 mm; 18.500 ligações

residenciais e intraresidenciais; além das duas estações de tratamento

mencionadas acima.

• Melhorar a eficiência do sistema de distribuição (US$ 6,4 milhões): sob

esta componente, será fornecido suporte para melhorar a eficiência do serviço

de distribuição através da implantação de um novo modelo de gestão para a

companhia, com ênfase na modernização dos sistemas e métodos atualmente

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Capítulo 6 – Estudo de Caso: SANEAGO 69

utilizados nas áreas operacional, comercial, financeira e administrativa. Para

isso, uma empresa de consultoria será contratada para apresentar uma

proposta contendo os padrões técnicos e administrativos para o novo modelo

de gestão, contendo, pelo menos, o seguinte:

o Meios para fazer a SANEAGO permanentemente competitiva, ao

mesmo tempo incorporando um conceito de preservação e

conservação dos mananciais hidrográficos;

o Cooperação entre a Agência Goiana de Regulação, Controle e

Fiscalização dos Serviços Públicos (AGR) e a SANEAGO no que diz

respeito a avaliação e vigilância dos indicadores de serviço;

o Identificação de novos parceiros em investimentos e serviços de

distribuição.

Com os recursos do programa, a SANEAGO irá contratar um operador

especializado para implementar o modelo de gestão de acordo com o

especificado pela empresa de consultoria e em conformidade com as

diretrizes legais do setor de saneamento no momento da assinatura do

contrato. Este componente pode financiar a parte fixa dos pagamentos para o

operador, a aquisição dos computadores e as licenças dos programas que

serão usados no sistema de gestão. Este componente também financiará

atividades que aprimorem as operações, incluindo medição em domicílio,

equipamentos para localizar vazamentos, automatização do sistema de

distribuição, setorização das áreas e distritos, e a reabilitação de redes e

equipamentos eletromecânicos.

Os trabalhos relacionados a estes componentes foram divididos em partes,

cujo desembolso dependerá de uma série de condições serem conferidas durante a

execução de cada parte.

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Capítulo 6 – Estudo de Caso: SANEAGO 70

6.6 – Impactos Ambientais e Sociais

O projeto ajudará a melhorar as condições de vida dos habitantes de Goiânia e

cidades próximas. As obras já estão definidas e suas localidades escolhidas, foram

feitas medidas para mitigar os riscos ambientais e sociais, e seus custos estão

incluídos no programa. As permissões já foram requisitadas, de acordo com a

legislação vigente. A gestão ambiental do programa tem a estratégia de prevenir,

reduzir, eliminar e compensar, do modo que for necessário, qualquer impacto

negativo, e também de otimizar os impactos positivos.

As avaliações de impacto ambiental foram amplamente discutidas com as

comunidades afetadas, em reuniões públicas, e foram disponibilizadas ao público em

geral.

6.7 – Benefícios Gerados

O principal benefício proporcionado pelo programa será a melhoria do

sistema de saneamento básico e distribuição de água na cidade de Goiânia e cidades

anexas. Para os residentes das cidades, isto significa:

• Maior continuidade do abastecimento de água potável, graças à nova

barragem que será construída no rio João Leite.

• Melhor cobertura do sistema de esgoto, devido à expansão do sistema.

• Melhor direcionamento dos resíduos de esgoto, graças às estações de

tratamento de São Domingos e Terezópolis.

Ainda, a melhoria operacional e a participação do setor privado no serviço de

abastecimento assegurará que níveis maiores de qualidade sejam mantidos e

melhorados progressivamente ao longo do tempo, posicionando a SANEAGO em

condições de trabalhar em outros projetos no futuro. O derradeiro impacto desses

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Capítulo 6 – Estudo de Caso: SANEAGO 71

benefícios será a diminuição do número de doenças relacionadas às condições

sanitárias.

6.8 – Riscos

O projeto envolve os mesmos riscos já citados neste trabalho, tanto no

Capítulo 3 como no Capítulo 5. No entanto, como cada projeto tem suas

peculiaridades, cabe ressaltar aqui alguns riscos específicos do projeto em questão,

para que sejam analisados com mais detalhe.

O programa propõe a divisão dos riscos em dois grupos:

• Em termos de qualidade do serviço e seu impacto na população, os benefícios

proporcionados pelo projeto podem ser anulados por: má gestão dos recursos

hídricos pelo governo estadual; desperdício descontrolado das fontes de

abastecimento; ou falta de fiscalização das agências regulatórias.

• A eficiência do serviço pode não melhorar se não for possível encontrar um

operador para gerenciar a companhia.

Para controlar o primeiro risco, está sendo feito um trabalho no sentido de

lançar e, ao mesmo tempo, fortalecer a utilidade da agência regulatória do estado

através de cooperação técnica para desenvolver a estrutura regulatória do setor de

saneamento no estado de Goiás.

Com relação ao segundo risco, documentos de proposta estão sendo

encaminhados, em paralelo com a preparação do programa. A participação da

iniciativa privada tem total apoio da diretoria da SANEAGO, e os documentos de

proposta estão sendo elaborados com atenção especial para definir as

responsabilidades do operador e especificar as características do serviço, com o

objetivo de minimizar o risco percebido dos parceiros potenciais, encorajando uma

melhor resposta às propostas.

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Capítulo 6 – Estudo de Caso: SANEAGO 72

6.9 – Custos e Financiamento

6.9.1 – Custos

O custo total do programa é estimado em US$ 95,2 milhões, dividido como

mostrado na Tabela 6.3.

Tabela 6.3: Custos do Programa alocados por Categorias

Categoria IDB Local Total %Engenharia e Administração 650 2.600 3.250 3,4%

Estudos e Projetos - 300 300 0,3%Unidade de Execução 650 400 1.050 1,1%Supervisão das Obras - 1.900 1.900 2,0%

Custos Diretos 42.794 38.500 81.294 85,4%Melhoria no abastecimento de água 29.670 28.920 58.590 61,5%

Aumento da confiabilidade 21.770 21.020 42.790 44,9%Produção 15.000 14.250 29.250 30,7%Transporte 6.770 6.770 13.540 14,2%Melhorias no tratamento e distribuição 7.900 7.900 15.800 16,6%

Melhoria na qualidade da água dos rios 8.150 8.150 16.300 17,1%Sistema Caveirinha 4.200 4.200 8.400 8,8%Sistema São Domingos 3.450 3.450 6.900 7,2%Sistema Terezópolis 500 500 1.000 1,1%

Melhoria na eficiência 4.974 1.430 6.404 6,7%Serviços de consultoria - 200 200 0,2%Contrato de gestão 2.250 250 2.500 2,6%Melhorias operacionais 2.724 980 3.704 3,9%

Custos associados 1.680 5.500 7.180 7,5%Terra - 4.000 4.000 4,2%Mitigação dos riscos ambientais e sociais 1.490 1.490 2.980 3,1%Auditoria 190 10 200 0,2%

Não-alocados 2.000 1.000 3.000 3,2%Contingências 2.000 1.000 3.000 3,2%

Custos Financeiros 476 - 476 0,5%Supervisão e inspeção 476 - 476 0,5%

Total 47.600 47.600 95.200 100,0%% 50,0% 50,0% 100,0%

Custos do Programa (US$ mil)

Fonte: BIRD

Abaixo segue uma explicação breve sobre o que está incluído em cada um

dos custos.

• Estudos e Projetos : compreende os estudos, avaliações e projetos feitos

durante o programa.

• Unidade de Execução: compreende a unidade da SANEAGO que executará

e/ou supervisionará o programa deurante os cinco anos de execução.

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Capítulo 6 – Estudo de Caso: SANEAGO 73

• Supervisão das obras : os custos alocados aqui cobrem a contratação de

empresas de consultoria para supervisionar as empresas contratadas para

fazer as obras, incluindo a supervisão ambiental do programa.

• Melhoria no abastecimento de água : inclui a mão-de-obra, materiais e

equipamentos para obtenção, transporte, instalação e testes dos tubos e

equipamentos eletromecânicos, bem como as obras de engenharia civil para

captação e tratamento da água, como já foi descrito neste capítulo.

• Melhoria na qualidade da água dos rios: inclui a mão-de-obra, materiais,

equipamentos e obras de engenharia referentes à expansão do sistema de

coleta e tratamento de esgoto.

• Melhoria na eficiência: inclui a condução dos estudos e serviços de

consultoria para contratar o operador, bem como os pagamentos fixos ao

operador durante o período de execução.

• Custos associados: inclui a aquisição dos terrenos onde vão ser executadas as

obras, as medidas mitigatórias para amenizar os riscos ambientais e sociais, e

arcar com os custos da empresa de auditoria.

• Custos não alocados: são custos de provisão para possíveis problemas

operacionais que, caso não estivessem provisionados, poderiam inviabilizar a

continuidade do projeto.

• Custos Financeiros: esta categoria diz respeito aos custos de inspeção e

supervisão pelo BIRD, exigidos por este para o financiamento do projeto.

O cronograma previsto para os investimentos mencionados é o seguinte:

Tabela 6.4: Fluxo de Caixa dos Investimentos

Ano Valor (US$ mi) % 1 14,4 15 2 29,4 31 3 26,6 28 4 14,2 15 5 10,6 11

TOTAL 95,2 100

Fonte: SANEAGO

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Capítulo 6 – Estudo de Caso: SANEAGO 74

6.9.2 – Financiamento

O financiamento será por conta do Banco Interamericano de

Desenvolvimento (BIRD), de acordo com sua matriz de financiamentos para o

Brasil, que é de 50% do custo total da obra. Os outros 50% serão financiados com

recursos da própria SANEAGO, podendo ter ajuda do Governo do Estado de Goiás.

As condições do BIRD para o financiamento são as seguintes:

• taxa de juros variável;

• taxa de crédito de 0,75% do montante não desembolsado;

• taxa de supervisão e inspeção de 1% do total do empréstimo;

• período de desembolso de 5 anos;

• período de carência de 5 anos;

• período de amortização de 25 anos.

6.10 – Análise de Viabilidade

6.10.1 – Viabilidade Técnica

As obras a serem financiadas, com exceção da barragem, não apresentam

muitas dificuldades técnicas. As tecnologias são amplamente usadas em todo tipo de

serviços de água e saneamento e de amplo conhecimento da SANEAGO.

A barragem foi dimensionada com base em estudos hidrológicos que

fornecem bastante segurança a incidência anormal de chuvas (tolera cheias

decamilenares) e usará concreto compactado na sua construção, o que traz vantagens

econômicas e operacionais. Esta tecnologia também protege a estrutura de uma

eventual cheia que possa ocorrer durante a construção. A construção foi também

elaborada para que não se dê durante a estação de chuvas. A área onde está sendo

construída é em uma área livre de abalos sísmicos, e foram feitos estudos geológicos,

que serão continuados durante toda a construção, para aumentar a segurança. Além

disso, a obra está sendo feita em parceria com uma empresa especializada, e o BIRD

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Capítulo 6 – Estudo de Caso: SANEAGO 75

contratou uma empresa de consultoria especializada em barragens que aprovou o

projeto.

As outras obras do projeto têm bons estudos de engenharia e custos

aceitáveis, sendo elaborados de acordo com os princípios e normas de engenharia

geralmente aceitos. Os projetos foram escolhidos levando em conta os que tinham

menor custo, eram viáveis tecnicamente e já tinham sido testados amplamente no

país.

O cronograma de execução reflete realisticamente o tempo necessário para as

obras. Ele foi preparado levando-se em conta fatores específicos de cada obra, os

períodos de licitação e pré-qualificação e a experiência da SANEAGO em projetos

similares.

6.10.2 – Viabilidade Ambiental

As obras do projeto estão de acordo com as leis de zoneamento da região

metropolitana de Goiânia. Os fatores técnicos, econômicos, sociais e ambientais

foram levados em conta na aprovação dos projetos. Além disso, o programa irá

melhorar a saúde e a qualidade de vida dos habitantes das áreas incidentes.

As obras de construção já estão localizadas e definidas, e os estudos de

impacto ambiental estão completos e já foram apresentados à comunidade. O

Relatório de Impacto ao Meio-Ambiente (RIMA) foi apresentado a consulta pública

em agosto de 1996. As comunidades de Goiânia e municípios afetados foram

informados sobre o projeto e, de acordo com as informações disponíveis, todos os

teres da sociedade, incluindo as ONGs, aprovam as obras do programa. As

permissões serão liberadas ao longo das várias fases das obras, e a apresentação da

permissão será condição para a aprovação de propostas.A proposta de usar o lago

exclusivamente como fonte de água potável provocou mudanças no projeto da

barragem, reduzindo a área a ser alagada e, portanto, os impactos subseqüentes.

A construção das obras contidas nos programas gerarão alguns impactos

negativos temporários, devido às mudanças no ambiente físico causadas pelas

atividades esse processo. A construção e operação da barragem e do reservatório

podem ter os seguintes impactos negativos:

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Capítulo 6 – Estudo de Caso: SANEAGO 76

• Piora na qualidade da água em caso de eutrofização22;

• Expropriação e realojamento de famílias;

• Perda de recursos vegetais e animais.

Para prevenir a contaminação do reservatório de futuras descargas ilegais,

será feito um plano para uso da terra ao redor do lago. O financiamento sairá dos

recursos do próprio programa e conta com a colaboração de entidades locais de

preservação. Posteriormente, os resíduos orgânicos provenientes da estação de

tratamento São Domingos serão desidratados e usados como adubo nas lavouras.

6.10.3 – Viabilidade Institucional

As obras a serem implementadas não diferem muito – exceto pela barragem –

de outras obras já realizadas pela SANEAGO. Quanto à barragem, conforme já foi

explicado anteriormente, a SANEAGO irá contar com a ajuda de uma empresa

especializada na supervisão desse tipo de trabalho. Além disso, a obra será realizada

por uma empresa terceirizada, evitando que os quadros da SANEAGO sejam

inflados para a execução da obra, aumentando o custo fixo.

Com relação à capacidade de operação dos sistemas, a SANEAGO vem

operando satisfatoriamente e dando correta manutenção aos sistemas atuais,

conforme mostrado pelos indicadores da empresa. Sendo assim, a SANEAGO

aparenta ter capacidade suficiente para operar e manter os sistemas previstos no

programa.

Quanto à empresa de gestão terceirizada, é preciso que se assegure que ela

tenha condições de gerir o sistema nos moldes do contrato. A parceria com o setor

privado contribuirá para:

• Definir e separar as funções de gestão e regulação do serviço.

22 Eutrofização: processo de aumento da quantidade de biomassa de algas e macrófitas aquáticas em

um lago, provocando decréscimo nas concentrações de oxigênio dissolvido, formação de gás

sulfídrico e mortandade dos peixes.

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Capítulo 6 – Estudo de Caso: SANEAGO 77

• Consolidar as reformas lançadas em 1998.

• Evitar mudanças na gestão durante o período político subseqüente.

• Modernizar os sistemas de gestão e tornar o programa de investimentos mais

eficiente.

Para aumentar as chances de sucesso na inclusão de um operador privado

para gerenciar todo o sistema, é preciso que os seguintes passos sejam tomados:

i) Conselhos de uma empresa especializada, que prepare os documentos de

proposta e acompanhe o processo com a SANEAGO até o fim.

ii) Identificação dos aspectos mais sensíveis que devem constar nos

documentos de proposta.

iii) Plano para pagamento do operador, que deve incluir um componente fixo,

para atender aos custos, e um variável, que deve servir de incentivo para

melhorias na gestão.

6.10.4 – Viabilidade Econômico-Financeira

Tendo-se comprovado a viabilidade técnica, ambiental e institucional do

projeto, resta-nos saber se o mesmo é viável econômica e financeiramente. Para isso,

será feita uma projeção dos fluxos caixa do projeto e um estudo baseado no CAPM

para determinar a viabilidade financeira.

Para a projeção do fluxo de caixa, as seguintes premissas foram adotadas,

considerando sugestões da SANEAGO e da experiência do banco em projetos:

• O consumo per capita de água permanecerá no mesmo nível que o atual

(aproximadamente 12 m3/mês para usuários residenciais e 17 m3/mês para

usuários não-residenciais) e aumentará gradualmente para 15 m3/mês para

usuários residenciais e 19 m3/mês para usuários não residenciais no décimo

ano. Esse aumento se deve à maior disponibilidade de água e melhor

qualidade de vida.

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Capítulo 6 – Estudo de Caso: SANEAGO 78

• As taxas, em termos reais, permanecerão nos níveis atuais.

• Perdas físicas irão diminuir, como parte do programa.

• O projeto será uma SPC (Companhia de Propósito Específico) que cobrará

diretamente da SANEAGO pelo uso da infra-estrutura disponibilizada, a uma

taxa fixa por m3.

• As projeções serão feitas para os próximos 30 anos, por aconselhamento do

BIRD.

• Os custos operacionais se manterão em 45% da receita operacional, baseado

nos dados históricos da SANEAGO e de empresas do setor.

• As despesas administrativas serão de 15% da receita operacional, baseado nos

dados históricos da SANEAGO e de empresas do setor.

• A carga de impostos é de 40% sobre o resultado bruto.

• A população da cidade crescerá a uma taxa de 3% a.a. nos 10 primeiros anos

e 1% a.a. nos anos seguintes.

Com base nessas premissas, foi feita a projeção do fluxo de caixa do projeto,

conforme mostrado na Tabela 6.5, chegando-se a uma TIR (Taxa Interna de Retorno)

de 24,10% a.a. Essa taxa significa que, caso o projeto fosse financiado 100% por

capital próprio, ele daria um retorno de 24,10% a.a. aos investidores.

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Capítulo 6 – Estudo de Caso: SANEAGO 79

Tabela 6.5: Estimativa do Fluxo de Caixa do Projeto (antes de juros)

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Capítulo 6 – Estudo de Caso: SANEAGO 80

Como visto no Capítulo 4, o critério do CAPM para que o projeto seja viável

financeiramente é de que a TIR desse fluxo seja maior ou igual ao WACC (Custo

Médio Ponderado do Capital). Para se calcular o WACC do projeto, consideramos o

seguinte:

• As projeções foram feitas em reais, assumindo uma taxa de inflação de 6,5%

a.a. no Brasil e 2,5% a.a. nos Estados Unidos, sendo que a variação na taxa de

câmbio seria dada por essa diferença23.

• O beta não-alavancado da SPC é o mesmo da SANEAGO, devido à grande

similaridade das atividades.

• A taxa do empréstimo não irá variar no período analisado, e será igual a 11%

mais variação cambial, considerando todas as taxas de crédito, de supervisão,

etc.

• A taxa cambial em 2003 é de 2,90 R$/US$.

• A taxa de juros real (descontada a inflação) livre de risco é de 10% a.a.

• O prêmio pelo risco de mercado é de 2% a.a.

Sendo assim, para a variável kd (custo da dívida) temos o seguinte:

kd = [(1+TXempr) . (1+VAR.CAMB)] – 1 = [(1+11%) . (1+3,9%)] – 1 = 15,3 % a.a.

Para chegar ao valor do beta, usaremos o beta não-alavancado da SANEAGO,

cujo beta alavancado é próximo de 1,12. Como o grau de alavancagem da

SANEAGO em 2002 era de 13%, segundo o balanço da empresa, podemos estimar o

beta da nova SPC:

23 Lembrando que, segundo Gitman, a inflação não deve ser levada em conta diretamente na análise

econômica de fluxos de caixa. Essa consideração nas taxas de inflação dos dois países é unicamente

para prever a variação cambial e embutir a mesma no custo do financiamento.

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Capítulo 6 – Estudo de Caso: SANEAGO 81

ßSPC = (?SPC / ?SANEAGO) . ßSANEAGO = (0,50 / 0,13) . 1,12 = 4,31

Desse modo, podemos calcular o custo de capital (ke) da SPC, que é de:

ke = Rf + ßSPC . (RM – Rf) = 10% + 4,31 . (2%) = 18,62 % a.a.

Com isso, podemos, finalmente, calcular o WACC, que será de:

WACC = ke . (1 – ?SPC) + kd . ?SPC . (1 – t) = 18,62% . (1 – 0,5) + 15,3% . 0,5 . (1 –

25%) = 15,05 % a.a.

Dessa forma, chegamos a um WACC de 15,05% a.a. Como o valor da TIR do

fluxo de caixa antes do pagamento de juros (24,10%) é maior que o WACC,

podemos concluir, baseados nas premissas descritas anteriormente, que o projeto é

viável financeiramente.

6.10.5 – Análise de Sensibilidade

É necessário, além do cenário médio previsto anteriormente, estimar os

retornos caso algumas variáveis não se comportem como o esperado. Na tabela

abaixo, podemos ter uma visão de como se comportaria a Taxa Interna de Retorno no

caso de variação de algumas premissas usadas na análise.

Tabela 6.6: Análise de Sensibilidade da TIR

Variação TIR

Crescimento da população de 1% a.a. desde o primeiro ano 21,71%

Manutenção do consumo per capita em 14 m3/mês durante todo o período

22,67%

Diminuição do preço para R$ 0,50 /m3 16,59%

Aumento nos custos operacionais para 55% da receita 17,45%

Como se pode ver, mesmo com variações intensas em algumas variáveis

importantes da análise de mercado, a TIR continua maior que o WACC (15,05%

a.a.), comprovando assim a viabilidade do projeto, mesmo em situações adversas.

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Capítulo 6 – Estudo de Caso: SANEAGO 82

6.10.6 – Proposta de Estruturação Envolvendo CRI

Nesta seção será feita uma proposta de estruturação para a operação de

financiamento baseada em emissão de CRI’s, nos moldes do que foi explicado no

Capítulo 5. Esse tipo de estrutura traria algumas vantagens, como a possibilidade de

se trabalhar com várias fontes de financiamento, como o FGTS, fundos, etc.

Primeiramente, deve haver a constituição da SPC. Esta seria uma empresa

distinta da SANEAGO, mas sob seu controle acionário. A empresa teria a opção de

utilizar um agente fiduciário para fazer o caução das ações da SPC. Isso faria

aumentar a segurança dos títulos do projeto. O papel do agente fiduciário é de

garantir o controle da empresa caso esta venha a apresentar dificuldades para o

pagamento das dívidas assumidas.

A SANEAGO e a SPC devem travar um contrato de compra e venda dos

serviços. Basicamente, este contrato deve ria indicar que a SANEAGO irá pagar o

preço estipulado pelo metro cúbico de água disponibilizada pelos sistemas da SPC,

durante um determinado período. Podem, ainda, haver cláusulas estipulando

exclusividade na parceria e saídas para garantir que se pagará sempre um preço

próximo ao de mercado.

Deve-se, em seguida, encontrar uma companhia securitizadora interessada em

fazer a securitização dos ativos da SPC. A securitização consiste em transformar os

ativos da empresa em títulos – no caso, os CRI’s. No caso, o que seria securitizado

são os créditos que a SPC tem contra a SANEAGO por conta do contrato de compra

e venda. Tais créditos seriam garantidos pelos ativos já construídos e em construção

em propriedade da SPC (os dutos, barragem, galerias, estações de tratamento, etc).

Esses ativos estariam alienados à companhia securitizadora. Em caso de

impossibilidade da SPC em servir as dívidas, a securitizadora tomaria posse desses

ativos para execução.

Por fim, ocorreria a emissão dos CRI’s e colocação dos mesmos no mercado.

Neste caso específico, haveria somente um comprador para os títulos, que seria o

BIRD. Os títulos teriam as mesmas características das acordadas no financiamento

com o banco. Por restrição na regulação desta operação específica, o BIRD não

permite que haja outra fonte de financiamento direto. Caso não houvesse tal

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Capítulo 6 – Estudo de Caso: SANEAGO 83

restrição, as CRI’s, devidamente registradas na CETIP, poderiam ser compradas por

qualquer investidor com acesso ao sistema, tais como instituições financeiras e

fundos.

Conforme o projeto for apresentando resultados positivos e os vencimentos

dos títulos forem chegando, haverá a amortização e pagamento dos títulos, com os

recursos advindos da venda dos serviços para a SANEAGO. Caso o projeto apresente

dificuldades em gerar fluxos de caixa para servir ao pagamento das CRI’s, existem

mecanismos que permitem aos credores tomar o controle da SPC e, em casos

extremos, realizar a liquidação dos ativos da empresa para o pagamento. Essa

segurança é que torna possível o enquadramento dos CRI’s como títulos de baixo

risco.

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Capítulo 7 – Conclusões 84

CAPÍTULO 7 – CONCLUSÕES

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Capítulo 7 – Conclusões 85

5.1 – Trabalho Ralizado

A apresentação dos conceitos fundamentais de Project Finance foi feita no

Capítulo 2, onde foram apresentados também os participantes típicos em um Project

Finance e suas perspectivas e expectativas no projeto.

O Capítulo 3 foi dedicado à análise de viabilidade do projeto. Esse ponto

merece destaque especial, pois é o que realmente interessa quando analisamos um

projeto. Neste capítulo foram ainda explicados os riscos inerentes a um Project

Finance e as formas de lidar com estes riscos (mitigar, assumir ou modificar o

projeto).

Algumas metodologias para análise financeira foram apresentadas no

Capítulo 4, com destaque para a metodolgia CAPM (Modelo para Precificação de

Ativos de Capital). Essa é a metodologia mais usada atualmente no mercado para

precificar ativos de capital, pois apresenta resultados próximos da realidade e é

suficientemente simples.

Entrando mais a fundo no setor de saneamento, foi feito, no Capítulo 5, um

estudo desse setor no Brasil. Foi levantado um histórico das políticas de saneamento

no país, feito um diagnóstico da situação atual e levantada uma proposta de

estruturação que explorasse as novas oportunidades surgidas para o setor.

Finalizando o trabalho, foi feito um estudo de caso de um projeto real para

aplicar na prática os conceitos desenvolvidos durante o trabalho. Foram feitas a

apresentação do projeto, as análises de viabilidade e uma proposta de estruturação

baseada na descrita no Capítulo 5.

5.2 – Cumprimento dos Objetivos

Os objetivos traçados no Capítulo 1 do trabalho foram alcançados com

sucesso. O trabalho teve a aprovação da área de projetos do Itaú BBA, constituindo-

se em uma boa referência para a aplicação de Project Finance em projetos de

saneamento. A contribuição dada foi grande, pois a bibliografia existente era muito

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Capítulo 7 – Conclusões 86

pulverizada e redundante. Este trabalho veio consolidar as informações mais

importantes em torno do tema e propor soluções criativas, com aplicação prática.

Espera-se, ainda, que este trabalho sirva como um catalisador para novas

discussões acerca de Project Finance. Alguns temas polêmicos foram levantados, e

sempre existe margem para argumentação sobre o assunto. É preciso também

levantar a necessidade de uma maior aplicação do tema nos cursos de Engenharia

Financeira da Escola Politécnica, e este trabalho vem confirmar essa necessidade.

5.3 – Oportunidades para Project Finance no Brasil

Como dito durante todo o trabalho, o Project Finance tem um grande

potencial para se tornar um propulsor do desenvolvimento no Brasil. Ainda pouco

explorada no país, essa modalidade de financiamento apresenta atrativos que podem

abrir enormemente o leque de potenciais investidores para projetos de infra-estrutura.

Mais especificamente no setor de saneamento, as oportunidades surgidas a

partir das novas legislações fazem abrir o outrora turvo horizonte das companhias de

saneamento brasileiras. O Project Finance constitui-se em uma grande ferramenta

para a ampliação dos serviços de saneamento no país, para que consigamos a tão

sonhada universalização desses serviços em um futuro próximo.

Como essas oportunidades para o saneamento começaram a ser estudadas há

pouco tempo, ainda existe muito espaço para novas propostas. A estrutura levantada

neste trabalho é eficiente e já funcionou em alguns projetos, mas pode ser

aprimorada. Espera-se que este trabalho seja fonte inspiradora para novas discussões

sobre o assunto, contribuindo para o desenvolvimento do setor de saneamento, a

melhora da qualidade de vida da população e o progresso do Brasil como um todo.

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Referências Bibliográficas 87

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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