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1 UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALI CENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPS CURSO DE DIREITO O TRABALHO DO APENADO COMO INSTRUMENTO DE RESGATE DA DIGNIDADE HUMANA ALINE VIEIRA SILVA Itajaí, junho de 2011

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UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALICENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPSCURSO DE DIREITO

O TRABALHO DO APENADO COMO INSTRUMENTO DE RESGATE DA DIGNIDADE HUMANA

ALINE VIEIRA SILVA

Itajaí, junho de 2011

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2UNIVERSIDADE DO VALE DO ITAJAÍ – UNIVALICENTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS E JURÍDICAS - CEJURPSCURSO DE DIREITO

O TRABALHO DO APENADO COMO INSTRUMENTO DE RESGATE DA DIGNIDADE HUMANA

Aline Vieira Silva

Monografia submetida à Universidade do Vale do Itajaí – UNIVALI, como requisito parcial à obtenção do grau de Bacharel

em Direito.

Orientador: Professor MSc. Osmar Dinis Facchini

Itajaí, junho de 2011

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AGRADECIMENTO

Agradeço a meus pais, por não medirem esforços para que eu pudesse obter essa conquista em minha vida.

À minha querida amiga de infância, Dani, e, desde já, parabenizo pela formatura.

Aos colegas que tive oportunidade de conhecer nesta Universidade, bem como as amizades solidificadas, em especial à minha amiga Lindiana, grande companheira de estudo.

Aos meus amigos do Fórum da Comarca de Navegantes, os quais eu tenho muito afeto e com os quais aprendi muito.

Ao Professor Osmar Dinis Facchini, pela inestimável dedicação e atenção com que conduziu a orientação deste trabalho.

Por fim, mas não menos importante, muito pelo contrário, ao meu namorado Thiago, grande incentivador de meus estudos, estando presente nesta etapa tão importante, por toda sua paciência, compreensão, carinho e dedicação, proporcionando-me confiança para alcançar meus objetivos.

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EPÍGRAFE

SENTENÇA DE VIDA

Sem dúvida, a vida traz no seu cerne espécie de sentença prolatada por Deus.

Os processualistas costumam dizer que a sentença é declaratória quando declara um direito. É constitutiva quando constitui um direito, e é condenatória quando impõe uma obrigação.

Na realidade, toda e qualquer sentença tem um desses conteúdos de maior evidência, subsistindo os demais em grau menor.

A sentença da vida não foge à regra: é declaratória por declarar que o indivíduo nasce para servir, é constitutiva por constituir o próprio direito à vida, e é condenatória por conter apenação divina: comerás o pão com o suor do teu rosto.

JOSÉ MARIA PINHEIRO MADEIRA

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TERMO DE ISENÇÃO DE RESPONSABILIDADE

Declaro, para todos os fins de direito, que assumo total responsabilidade pelo aporte

ideológico conferido ao presente trabalho, isentando a Universidade do Vale do

Itajaí, a coordenação do Curso de Direito, a Banca Examinadora e o Orientador de

toda e qualquer responsabilidade acerca do mesmo.

Itajaí, 9 de junho de 2011

Aline Vieira SilvaGraduanda

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PÁGINA DE APROVAÇÃO

A presente monografia de conclusão do Curso de Direito da Universidade do Vale do

Itajaí – UNIVALI, elaborada pela graduanda Aline Vieira Silva, sob o título O trabalho

carcerário como busca a dignidade humana, foi submetida em 9 de junho de 2011 à

banca examinadora composta pelos seguintes professores: Osmar Dinis Facchini

(Presidente), Pollyana Maria da Silva (Examinadora) e Guilherme Augusto Corrêa

Redher e aprovada com a nota _____________

Itajaí, 9 de junho de 2011

MSc. Osmar Dinis FacchiniOrientador e Presidente da Banca

Msc. Maria Claudia da Silva Antunes de SouzaCoordenação da Monografia

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ROL DE ABREVIATURAS E SIGLAS

a.C Antes de CristoOIT Organização Internacional do TrabalhoArt. ArtigoCEC Código de Execução CriminalCF Constituição FederalCLT Consolidação das Leis do TrabalhoCNPC Conselho Nacional de Política Criminal e PenitenciáriaCP Código PenalCPP Código de Processo PenalInc. IncisoLEP Lei de Execução Penaln. Númeron. NúmeroOIT Organização Internacional do TrabalhoONU Organização das Nações UnidasPIJ Penitenciária Industrial de JoinvilleSTJ Superior Tribunal de Justiça

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ROL DE CATEGORIAS

Rol de categorias que a autora considera estratégicas à

compreensão do seu trabalho, com seus respectivos conceitos operacionais.

Apenado

Indiciado condenado em processo penal e que cumpre regularmente a ação aflitiva

em estabelecimento penal.1

Dignidade humana

A dignidade da pessoa humana é um valor espiritual e moral inerente a pessoa, que

se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da

própria vida e que traz consigo a pretensão ao respeito por parte das demais

pessoas, constituindo-se em um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve

assegurar, de modo que apenas excepcionalmente possam ser feitas limitações ao

exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária

estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos.2

Execução Penal

É a atividade desenvolvida pelos órgãos judiciais para da atenção à sanção que se

realiza através de processo de igual nome, mediante meios executórios de

aplicações jurídicas e práticas neles contidas.3

Pena

Sanção penal de caráter aflitivo, imposta pelo Estado, em execução de sentença, ao

culpado pela prática de uma infração penal, consistente na restrição ou privação de

um bem jurídico, cuja finalidade é aplicar a retribuição punitiva ao delinquente,

promover a readaptação social e prevenir novas transgressões pela intimidação

1 SOIBERMAN, Leib. Dicionário geral de direito. vol. 2. São Paulo: J. bushatsky, 1973. p. 526.2 MORAES, Alexandre de. Constituição do Brasil Interpretada. 2ª ed. São Paulo: Atlas, 2003. p. 35.3 BENET, Sidnei Agostinho. Execução Penal. São Paulo: Saraiva. 1996. p. 43.

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9dirigida à sociedade.4

Reincidência

"A situação de quem pratica um fato criminoso após ter sido condenado por crime

anterior, em sentença transitada em julgado", lembrando sua natureza jurídica de

agravante genérica de caráter subjetivo ou pessoal”.5

Ressocialização

“Ato ou efeito de ressocializar, socializar-se novamente. Assistir o preso psicológica

e profissionalmente, para que possa voltar à sociedade como cidadão útil, após

cumprimento da pena”.6

Trabalho Prisional

Método utilizado pelos estabelecimentos prisionais, consistente na aplicação da

atividade física ou intelectual dos encarcerados como forma de qualificação

profissional para a reinserção destes à sociedade e remissão da pena.7

4 CAPEZ, FERNANDO. CURSO DE DIREITO PENAL PARTE GERAL. VOL. 1. 12ª ED. SÃO PAULO: SARAIVA, 2008. P. 358-359.5 CAPEZ, LOC. CIT. 6 XIMENES, Sérgio. MINIDICIONÁRIO EDIOURO DA LÍNGUA PORTUGUESA. 2 ed. São Paulo: Ediouro, 2000. P. 815.7 Composição original da pesquisadora.

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SUMÁRIO

RESUMO ............................................................................................... XIINTRODUÇÃO ...................................................................................... 12CAPÍTULO 1 …..................................................................................... 15EVOLUÇÃO DA PENA COMO FORMA DE CONTROLE SOCIAL .... 15

1.1 A EVOLUÇÃO DA PENA: DA ANTIGUIDADE À ERA ILUMINISTA …............ 15

1.1.1 A PENA NA ANTIGUIDADE …................................................................................ 15

1.1.2 A PENA NA IDADE MÉDIA …................................................................................ 20

1.1.3 O PERÍODO HUMANITÁRIO E O SURGIMENTO DA PENA DE PRISÃO …........................ 22

1.2 OS SISTEMAS PRISIONAIS: EVOLUÇÃO E APERFEIÇOAMENTO ….......... 25

1.2.1 SISTEMA FILADÉLFICO …........................................................................................ 26

1.2.2 SISTEMA AUBURNIANO …....................................................................................... 28

1.2.3 SISTEMA IRLANDÊS OU PROGRESSIVO ….................................................................... 29

CAPÍTULO 2 …..................................................................................... 32A PENA DE PRISÃO …........................................................................ 32

2.1. CONCEITO DE PENA …................................................................................... 32

2.2 CARACTERÍSTICAS DA PENA ….................................................................... 33

2.3 FINALIDADE DA PENA …................................................................................. 34

2.3.1 TEORIAS ABSOLUTAS …......................................................................................... 34

2.3.2 TEORIAS RELATIVAS ….......................................................................................... 36

2.3.3 TEORIAS MISTAS …............................................................................................... 37

2.4 ESPÉCIES DE PENA NO DIREITO BRASILEIRO …........................................ 38

2.4.1 AS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE …................................................................... 39

2.4.2 AS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITO …...................................................................... 41

2.4.2.1 PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA ….............................................................................................. 42

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112.4.2.2 PERDA DE BENS E VALORES …........................................................................................ 42

2.4.2.3 PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE OU ENTIDADES PÚBLICAS …..................................... 43

2.4.2.4 INTERDIÇÃO TEMPORÁRIA DE DIREITOS …............................................................................ 44

2.4.2.5 LIMITAÇÃO DE FIM DE SEMANA …..................................................................................... 44

2.5 REGIMES PRISIONAIS ….................................................................................. 45

2.5.1 REGIME FECHADO …............................................................................................. 46

2.5.2 REGIME SEMI-ABERTO …....................................................................................... 47

2.5.3 REGIME ABERTO …............................................................................................... 48

2.5.4 REGIME DISCIPLINAR DIFERENCIADO …...................................................................... 49

CAPÍTULO 3 …..................................................................................... 51

3.1 O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA …............................... 51

3.1.1 CONCEITO …........................................................................................................ 51

3.1.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA …........................................................................................ 53

3.1.3 A POSITIVAÇÃO E A VALORIZAÇÃO DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA …..... 56

3.1.4 DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA NA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA ….......... 59

3.1.5 O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E O SISTEMA PENITENCIÁRIO ….............. 62

CAPÍTULO 4 …..................................................................................... 68

4.1 O TRABALHO CARCERÁRIO …....................................................................... 68

4.1.1 TRABALHO INTERNO …........................................................................................... 73

4.1.2 TRABALHO EXTERNO ….......................................................................................... 76

4.2 REMIÇÃO …....................................................................................................... 79

4.3 O TRABALHO DO APENADO COMO INSTRUMENTO DE RESGATE DA DIGNIDADE HUMANA …......................................................................................... 81

4.4 EXEMPLO DE TRABALHO CARCERÁRIO COMO INSTRUMENTO DE RESGATE DA DIGNIDADE HUMANA …................................................................ 87

CONSIDERAÇÕES FINAIS ….............................................................. 91

REFERÊNCIA DAS FONTES CITADAS ….......................................... 96

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INTRODUÇÃO

A presente Monografia tem como objeto o trabalho prisional,

instrumento pelo qual se busca resgatar a dignidade humana daqueles que

incidiram no crime e pagam por seus atos, a fim de que possam ser ressocializados.

O objetivo institucional é compor uma monografia para

obtenção do grau de bacharel em direito pela Universidade do Vale do Itajaí –

UNIVALI.

Seu objetivo geral é explanar questões pertinentes à origem

dos crimes e das penas, a evolução das formas de controle penais, o atual sistema

penal, o trabalho prisional e o princípio da dignidade da pessoa humana no que

tange ao sistema penitenciário, mormente à ressocialização por meio do

aprendizado de uma profissão e realização de trabalhos na prisão.

Para tanto, inicia–se o primeiro Capítulo tratando do crime,

fator inerente à sociedade humana, fato que advém desde os primórdios da

civilização, juntamente com a repressão a tais atos, quase que sempre a cargo do

Estado, órgão administrador da sociedade e guardião da paz e do bem comum

acima das liberdades individuais consideradas ilícitas.

No segundo Capítulo, trata-se da pena de prisão, o modo mais

eficaz encontrado do decorrer dos tempos para conter as ações humanas

consideradas contrárias à ordem social e a convivência pacífica entre os seres

humanos. Este capítulo faz um panorama desde o início da pena de prisão, em

substituição às penas cruéis na Era pós-Idade Média, até o atual sistema de

privação de liberdade adotado no Brasil do século XXI.

No terceiro Capítulo, tratando especificamente do princípio da

dignidade da pessoa humana, são destacadas suas origens, peculiaridades e a

positivação a partir do século XX, passando-se à abordagem do princípio da

dignidade da pessoa humana no que tange ao sistema penitenciário.

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13No quarto Capítulo, faz-se a análise do instituto do trabalho

prisional, meio pelo qual se faz com que os apenados tenham uma ocupação diária

e ganhem oportunidade de aprendizado de profissões, favorecendo assim os

resgate de sua dignidade, demonstrada pela ressocialização derivada do labor

prisional.

No mesmo capítulo, ressalta-se um exemplo de busca pela

dignidade dos presos, a Penitenciária Industrial Jucemar Cesconetto, estabelecida

em Joinville/SC, a qual tem como valor principal o trabalho prisional, demonstrando

assim a realidade prática em que se insere a presente investigação.

O presente Relatório de Pesquisa se encerra com as

Considerações Finais, nas quais são apresentados pontos conclusivos destacados,

seguidos da estimulação à continuidade dos estudos e das reflexões sobre o

trabalho prisional como instrumento de resgate da dignidade da pessoa humana.

Para a presente monografia foi levantada a seguinte questão:

No atual sistema carcerário, o trabalho constitui um

instrumento de resgate a dignidade humana e, consequentemente, constitui um

método eficaz para reinserção social?

Nessa senda, foi levantada a seguinte hipótese de que o

trabalho do preso contribui para a reinserção social e consequentemente, constitui

imensurável instrumento com função de resgate da dignidade humana sepultada nas

entranhas do sistema carcerário brasileiro, uma vez que ensina uma profissão ao

apenado, que valorizado e dignificado, retorna a sociedade com menos chances de

reincidência.

Têm-se como variável que o trabalho do preso serve apenas

para a disciplina e para a remição da pena, sendo mero instrumento de controle

interno da prisão, não constituindo formação ao apenado, nem tendo o condão de

alçá-lo ao resgate de sua dignidade humana.

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14Quanto à Metodologia empregada, registra-se que, na Fase de

Investigação foi utilizado o Método Indutivo, na Fase de Tratamento de Dados o

Método Cartesiano, e, o Relatório dos Resultados expresso na presente Monografia

é composto na base lógica Indutiva. Nas diversas fases da Pesquisa, foram

acionadas as Técnicas do Referente, da Categoria, do Conceito Operacional e da

Pesquisa.

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CAPÍTULO 1

EVOLUÇÃO DA PENA COMO FORMA DE CONTROLE SOCIAL

1.1 A EVOLUÇÃO DA PENA: DA ANTIGUIDADE À ERA ILUMINISTA

Os problemas que afligem a sociedade há muito são

discutidos, seja por filósofos, pensadores do direito e autoridades, seja por qualquer

do povo em uma conversa de esquina.

O filósofo Thomas Hobbes em sua obra “Leviatã” diz que o

homem é o lobo do homem – “Homo honminis lupus”. –, teoria pela qual afirma que

o homem nasce mal, e incumbe à sociedade o dever de educá-lo. Em que pese os

entendimentos de Hobbes, Jean Jacques Rousseau entendia de modo contrário,

dizendo que “o homem nasce bom e a sociedade é que o torna mal”. Seja pela

natureza ou pela formação, é certo que muitos homens corrompem os princípios de

ética e moral da sociedade, cometendo atos considerados como crimes.

Neste sentido, “para conter a maldade do homem, surge o

Direito Penal, conjunto de normas jurídicas, mediante as quais o Estado coíbe

(proíbe), pela via do jus puniendi, determinadas ações ou omissões, sob ameaça de

característica sanção penal”.8

1.1.1 A Pena na Antiguidade

Segundo a doutrina de Rogério Greco9, “a primeira pena a ser

aplicada na história da humanidade ocorreu ainda no paraíso, quando, após ser

induzida pela serpente, Eva, além de comer o fruto proibido, fez com que Adão o

comesse, razão pela qual, além de serem aplicadas outras sanções, foram expulsos

do paraíso”.

8 FRAGOSO, Heleno Cláudio apud. FALCONI, Romeu. Lineamentos de Direito Penal. 3ª ed. São Paulo: Ícone, 2002. p. 24.9 GRECO, Vicente. Curso de direito penal, parte geral. 12 ed. Rio de Janeiro: Impetus, 2010. Vol. I, p. 463.

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16Depois da primeira condenação aplicada por Deus, o homem,

a partir do momento que começou a viver em comunidade, também adotou o

sistema de aplicação de penas toda vez que as regras da sociedade na qual estava

inserido eram violadas10.

Assim, várias legislações surgiram, ao longo da existência da

raça humana, com a finalidade de esclarecer as penalidades cominadas a cada

infração por elas previstas. Contudo, historiadores estão de acordo, que a origem da

pena é remotíssima, perdendo-se na noite dos tempos, sendo tão antiga quanto a

humanidade, considerando-se de todos os grupos de homens, mesmo os mais

informais, seguiam certas normas no que tange à convivência entre os seus

membros.11

A pena, em sua origem remota, nada mais significava senão a

vingança, revide à agressão sofrida, desproporcionada com a ofensa e aplicada sem

preocupação de justiça.

A pena, portanto, se originou e evoluiu juntamente com a

própria civilização, como assevera o entendimento de Odete Maria de Oliveira:

“[...] a pena é uma instituição muito antiga, cujo surgimento se registra nos primórdios da civilização, já que cada povo em todo o período histórico teve seu entendimento penal inicialmente, como manifestação de simples reação do homem primitivo para conservação de sua espécie, sua moral e sua integridade; após, como um meio de retribuição e de intimidação, através das formas mais cruéis e sofisticadas de punição, até nossos dias, quando pretende-se afirmar com uma função terapêutica e recuperadora.”12

Segundo Manoel Pedro Pimentel:

a pena tinha originalmente um caráter sacral. Não podendo explicar os acontecimentos que fugiam ao cotidiano (chuva, raio, trovão), os homens primitivos passavam a atribuí-los a seres sobrenaturais, que

10 GRECO, loc. cit.11 PIMENTEL, Manoel Pedro. O crime e a pena na atualidade. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1983. p. 117.12 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social. Florianópolis: Editora da UFSC, 1984. p.

29.

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17habitavam as florestas, ou se encontrariam nas pedras, rios ou animais, maléficos ou propícios de acordo com as circunstâncias, eram os totens, e a violação a estes ou o descumprimento as obrigações devidas a eles acarretariam graves castigos.13

Na mesma época seguiram as proibições conhecidas como

Tabu, sendo que as violações às regras totêmicas ou a desobediência ao Tabu,

acarretariam aos infratores os castigos ditados no culto, e era de caráter coletivo.

Nesse sentido, doutrina Cezar Roberto Bitencourt:

Nas sociedades primitivas, os fenômenos naturais maléficos eram recebidos como manifestações divinas (“totens”) revolutas com a pratica de atos que exigiam reparação. Nessa fase, punia-se o infrator para desagravar a divindade.14

A responsabilidade coletiva representava-se na cólera dos

parentes, na vingança de sangue, que Von Liszt considerava “precursora da pena e

a primeira manifestação de cultura jurídica”.15

Todos os membros do grupo participavam de tais castigos, isto

porque para Pimentel a pena tinha “uma função reparatória, dado o caráter religioso

da ofensa e se destinava a aplacar a ira da divindade ofendida ou recompor o

equilíbrio rompido com a violação do tabu”.16

Seguindo a mesma linha de raciocínio, Osealdo Henrique Duek

Marques,17 diz que:

o homem era muito ligado à sua comunidade, pois fora dela sentia-se desprotegido dos perigos imaginários. Essa ligação refletia-se na organização jurídica primitiva, baseada no chamado vínculo de sangue, representado pela recíproca tutela daqueles que possuíam uma descendência comum. Dele se originava a chamada vingança de sangue, definida por Erich Fromm como ‘um dever sagrado que

13 PIMENTEL, op. cit., p. 118.14 BITERCOURT. Cezar Roberto. Tratado de direito penal: parte geral. 8 ed. São Paulo: Saraiva , 2003. p. 21.15 PEREIRA. Hilton Luiz. A pena e respectivos limites. RT 412/13.16 LEAL, João José. Direito Penal geral. 3 ed. Florianópolis: OAB/SC Editora, 2004. p. 64.17 MARQUES, Oswaldo Henrique Duek. Fundamentos da pena. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2000. p. 02.

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18recai num membro de determinada família, de um clã ou de uma tribo, que tem de matar um membro de uma unidade correspondente, se um de seus companheiros tiver sido morto’.18

Devido à diversidade das tribos deu-se origem a duas

espécies de penas: a perda da paz e a vingança de sangue.

Aplicado ao membro do grupo praticante de ato considerado

atentatório contra a coletividade, “a perda da paz sempre implicava na exclusão da

proteção totêmica, expulsando o infrator do grupo, sem armas e sem alimentos.

Equivalia a uma condenação à morte, porque, desamparado, ficava o infrator à

mercê dos inimigos e feras, exposto aos riscos e às intempéries”.19

Em suma a perda da paz consistia a inimizade de todos em

relação ao infrator, que eliminado da proteção da comunidade, ficava sujeito a

perseguições de outros grupos, não podendo ser ajudado por qualquer indivíduo.

A vingança de sangue consistia na cobrança do sangue pela

falta cometida. A punição era concretizada contra o infrator e sua raça, seguindo às

regras da Lei do Talião, era o conhecido “olho por olho, dente por dente”.

Nesse sentido, cita-se José da Silva Moreira20:

Se um individuo destruiu o olho de outro individuo, destruirá o seu olho. Se quebrou o osso de outro, quebrarão o seu osso. Se arrancou o dente do outro, arrancarão o seu dente. Ou, ainda: ‘Luta do homem contra o homem, entregue pela comunidade à vingança do ofendido, ou da família da vítima’.

A Lei do Talião constitui uma prática comum entre os povos

antigos. Esta lei se encontra claramente em alguns trechos do Código de

Hammurabi, que leva o nome do Rei da Babilônia, o qual foi o responsável pelo

aparecimento desta importante obra jurídica.

18 FROMM, Erich. Anatomia de destrutividade humana. Trad. Marco Aurélio de Moura Matos. Rio de Janeiro: Zahar, 1975. p. 366. Apud MARQUES, Oswaldo Henrique Duek. Fundamentos da pena. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2000. p. 3.19 PIMENTEL, op. cit., p. 120.20 MOREIRA, José da Silva. A execução penal nas cadeias públicas catarinenses. Dissertação de Mestrado em Direito. Florianópolis: Universidade Federal de Santa Catarina, 1993. p. 14.

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19Cumpre salientar ainda, que podemos encontrar a referida lei

em trechos da Bíblia. Destaca-se o mais conhecido: “Mas se houver dano, urge dar

a vida por vida, olho por olho, dente por dente, mão por mão, pé por pé, queimadura

por queimadura, ferida por ferida, golpe por golpe (Êxodo, 21, 23)”.

Encontramos ainda, na Lei das XII Tábuas, “[...] se alguém

fere a outrem, que sofra a pena de talião, salvo se houver acordo” (Tábua VII, 11).

A vingança divina, Segundo Falconi21, surgiu no direito penal

com a conotação de “divindade”. A punição se aplicava em nome desta. A pena

tinha o escopo de purificação da alma do criminoso, através do que ele poderia

reencontrar a bem-aventurança.

Acerca da vingança divina, colaciona-se o ensinamento de

Garcez22:

Caso a violação fosse praticada por elemento estranho à tribo, a reação era a da ‘vingança de sangue’, considerada como obrigação religiosa e sagrada, ‘verdadeira guerra movida pelo grupo ofendido àquele a que pertencia o ofensor, culminando, não raro, com a eliminação completa de um dos grupos’

Destaca-se, ainda:

A vingança divina era exercida com redobrada crueldade, eis que o castigo tinha que estar à altura da grandeza de Deus ofendido e seu propósito era purificar a alma do ofensor, preparando-o para a bem aventurança eterna.23

A vingança divina deve-se à influência decisiva da religião nas

vidas dos antigos. “O castigo, ou oferenda, por delegação divina era aplicado pelos

sacerdotes que infligiam penas severas, cruéis e desumanas, visando

especialmente à intimidação”. 24

21 FALCONI, Romeu. Lineamentos de direito penal. 3ª ed. São Paulo: Ícone, 2002. p. 34.22 GARCEZ, Walter de Abreu. Curso básico de direito penal: parte geral. São Paulo: José Bushatsky, 1972. p. 66.23 FERNANDES, Newton e FERNANDES, Valter. Criminologia Integrada. 2ª ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2002. p. 651.24 MIRABETE, Julio Fabbrini. Manual de direito penal: parte geral. São Paulo: Altas, 1999. p.36.

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20É valido observar que Platão e Aristóteles, que viveram na

época da “vingança divina”, tinham posições contrárias. Para Platão “a pena deveria

ter sentido de correção”, enquanto Aristóteles pensava que o mal e o crime eram

“produto de querer livre e racional do homem” e a pena era “a retribuição desse

mal”.25

1.1.2 A Pena na Idade Média

Na Idade Média atingiu-se a fase da vingança pública,

garantindo maior estabilidade ao Estado, e principalmente, visou-se à segurança do

príncipe e soberanos.

O entendimento da época era que, quanto maior e mais cruel

fosse a pena, melhor e mais eficiente seria a emenda do criminoso. Como a sanção

era sempre a pena capital ou o desterro, chega-se à conclusão de que, na realidade,

a pena tinha conotação de prevenção geral.26

Segundo descreve Moreira27, “a punição se fazia em

cerimônias que impressionavam o povo, com intuito de difundir o terror e o poder

dos governantes”.

Nessa fase prevalecia o arbítrio do julgador, não havendo

maior preocupação com a culpa ou o ânimo subjetivo do infrator. Imperava a

desigualdade de classes diante da decisão punitiva. A pena de morte se destacava

por requintes de exarcebada desumanidade: cozimento, esquartejamento, fogueira,

roda, empalamento, sepultamento com vida, etc 28.

Nesse contexto, destaca-se Sirvinskas29:

Na Idade Média à semelhança do período da Antiguidade, vigoravam também as penas cruéis e degradantes. Os delinqüentes ficavam confinados e esquecidos em calabouços úmidos e subterrâneos, aguardando praticamente a morte. Além do confinamento,

25 MOREIRA, loc. cit.26 FALCONI, loc. cit.27 MOREIRA, op. cit., p. 19.28 FERNANDES, op. cit., p. 87.29 SIRVINSKAS, Luiz Paulo. Introdução ao estudo de direito penal. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 25.

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21aplicavam-se as penas públicas de amputação dos braços, pernas, extirpação de olhos, queima da carne com fogo, e a morte.

Cita-se, ainda, Cristiano Álvares Valadares do Lago30:

“Nesse período notabilizou-se pelo denominado direito ordálico (juízos de Deus), cujas sentenças tinham inspiração divina e eram invocadas diretamente pelo julgador ou pelo próprio imputado. O processo de julgamento ocorria por meio da prova da água, do fogo, da balança, do veneno, do ferro quente, do anel quente e da sorte, que, se favorável ao imputado, era este considerado inocente, se lhe fosse desfavorável, consubstanciava na sua culpabilidade.

Acerca das torturas praticadas em nome de Deus, manifesta-

se Beccaria31:

Tal meio infame de chegar à verdade é um monumento da barbárie legislação de nossos avós, que honravam como título de ‘julgamento de Deus’ as provas de fogo, aquelas águas ferventes e a sorte oscilante nos combates. Como se os elos dessa corrente eterna, a origem da qual reside no seio da Divindade, pudessem ser desunidos ou partir-se a cada momento, ao sabor dos caprichos e das frívolas instituições humanas!

Destaca-se ainda, Foucault 32:

Na execução de pena mais regular no respeito mais exatos das normas jurídicas, reinam as forças ativas da vindita. A punição tem, então, uma função jurídica política. É um cerimonial para reconstituir a soberania lesada por um instante. Ele a restaura manifestando-a em todo o seu brilho. A execução pública, por rápida e cotidiana que seja, se insere em toda a série dos grandes rituais do poder restaurado (coroação, entrada do numa conquista, submissão dos súditos revoltados). Por cima do crime que desprezou o soberano, ela exibe aos olhos de todos uma força invencível. Sua finalidade é menos de estabelecer um equilíbrio que de fazer funcionar, até um extremo, a dissimetria entre os súditos, que ousaram violar a lei e o soberano todo poderoso, que fez valer a força.”

30 Apud. SIRVINSKAS, loc. cit.31 BECCARIA, Cesare. Dos delitos e das penas. São Paulo: Editora Rideel, 2003. p. 19.32 FOUCAULT, Michel. Vigiar e punir: nascimento prisão. Petrópolis: Vozes, 1997, p. 42.

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22Verifica-se que a pena nesse período era uma sanção imposta

em nome do Estado, representando os interesses da comunidade. Foi um período

marcado, também, pelas penas cruéis, no entanto, tal período evoluiu para o

Período Humanitário, o qual veio combater a repressão penal regida pela crueldade.

1.1.3 O Período Humanitário e o Surgimento da Pena de Prisão

O iluminismo abriu, pela primeira vez na história das ciências

políticas e sociais, um grande e vigoroso debate sobre a pena de morte, largamente

utilizada pelas legislações penais da época. O pensamento racionalista do Direito

Penal formou grandes discussões a respeito da natureza e dos fins da pena que

deveria ser “restrita”, conforme o artigo 8º da Declaração dos Direitos dos Homens e

do Cidadão, aprovada pela Assembléia Nacional Francesa em 26.8.1789.33

As leis em vigor no século XVIII inspiravam-se em idéias e

procedimentos de excessiva crueldade, prodigalizando os castigos corporais e a

pena capital. O direito era um instrumento gerador de privilégios, o que permitia aos

juízes, dentro do mais desmedido arbítrio, julgar os homens de acordo com a sua

condição social.34

É na segunda metade do século XVIII quando começaram a

remover-se as velhas concepções arbitrárias: os filósofos, moralistas e juristas

dedicam suas obras a censurar abertamente a legislação vigente, defendendo as

liberdades do indivíduo e enaltecendo os princípios da dignidade do homem.35

As correntes iluministas e humanitárias, representadas por

obras como “O espírito das leis” de Montesquieu e “Contrato Social” de Rosseau,

além de manifestações de Diderot, D’ Holbach, Bentham, Emanuel Kant, Voltarie

entre outros, foram fiéis exemplares dessas ideias ao realizarem severas críticas dos

excessos imperantes na legislação penal da época.

33 DOTTI, René Ariel. Curso de direito penal: parte geral. 2 ed. Rio de Janeiro: Editora Forense, 2005. p. 143.34 BITENCOURT, op. cit., p. 31.35 GARRIDO GUZMANN. Compendio de ciência penitenciaria. Universidad de Valencia, 1976. p. 27.

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23Neste período, destaca-se ainda, Cesare Beccaria, com umas

das obras mais importantes, se não a mais importante, “Dos delitos e das penas”,

fazendo um verdadeiro protesto contra a violência no ato de punir, alertando sobre o

extremo barbarismo e reclama da proteção à dignidade humana36.

Destaca-se seu manifesto:

As penas que vão além da necessidade de manter o depósito da salvação pública são injustas por sua natureza; e tanto mais justas serão quão mais sagradas e inviolável for a segurança e maior a liberdade que o soberano propiciar aos súditos.37

Beccaria sustenta que as penas devem ser moderadas, com

finalidade de impedir que o autor do crime continue a delinqüir, para tanto, deve

revestir-se de severidade, porém sem exorbitância. Investe contra a pena capital,

baseado no contrato social. Isso porque o homem, ao ceder uma parcela mínima de

sua liberdade para possibilitar a vida em comum, não se privou de todos os seus

direitos, nem irá conferir a outrem o direito de matá-lo. Acrescenta que uma pena de

prisão duradoura intimida mais que uma execução isolada. Ademais, a pena de

morte é irreparável38.

Ocupa-se da proporcionalidade entre as penas e os delitos,

entendendo que os crimes mais graves são os que visam à destruição da sociedade.

Nesse sentido, Beccaria leciona que “bastará, pois, que o

legislador sábio estabeleça divisões principais na distribuição das penalidades

proporcionais aos crimes e, especialmente, não aplique os menores castigos aos

maiores delitos”.39 Ditava, ainda, que as leis devem ser claras, uma vez que o ensino

colaborará com a diminuição dos crimes, fazendo-se necessário a educação para a

diminuição dos vícios.

Para Costa Jr., “a pena deve ser prontamente imposta, para

que se evidencie o nexo entre o crime, como causa, e a pena, como conseqüência.

36 MOREIRA, op. cit., p. 22.37 BECCARIA, loc. cit.38 COSTA JR, Paulo José. Curso de direito penal. 10 ed. São Paulo: Saraiva, 2009. p. 16.39 BECCARIA, op. cit., p. 87.

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24Deve ser ainda necessária, pois só assim se justifica infligir a alguém um

sofrimento”.40

Howard motivou sua preocupação pelos problemas do sistema

penitenciário. Foi este quem inspirou uma “corrente penitenciarista preocupada em

construir estabelecimentos apropriados para o cumprimento da pena privativa de

liberdade”.41

Cabe destacar que Howard teve uma especial importância no

longo processo de humanização e racionalização das penas, uma vez que propunha

a conveniência da fiscalização por magistrado na vida carcerária, sua luta era para

alcançar a humanização das prisões e a reforma do delinqüente.42

Benthan apud Bitencourt ressalta a pena com “finalidade de

conceber o benefício por meio da motivação da dor e do prazer, com o objetivo

principal de prevenção, dessa forma visando à reabilitação do delinqüente”.43

Considerava Bentran que o fim principal da pena era prevenir

delitos semelhantes: “o negócio passado não é mais problema, mas o futuro é o

infinito: o delito passado não afeta mais que a um indivíduo, mas os delitos futuros

podem afetar a todos.”44

Suas ideias sobre o objeto reabilitador da pena privativa de

liberdade devem entender-se em um contexto retributivo, e com preeminência de

prevenção geral. Considerava que a pena era um mal que não devia exceder o dano

produzido pelo delito.45

Foucault, também acreditava na necessidade de punir de outro

modo, eliminando “essa confrontação física entre o soberano e o condenado; esse

40 COSTA JR, op. cit., p. 17.41 NEUMAN, Elias. Evolución de la peña privativa de liberdad y régimenes carcelarios. Buenos Aires: Pannedille, 1971 p. 71.42 BITENCOURT, op. cit., p. 35-36.43 BITERCOURT, op. cit., p. 45-47.44 BITENCOURT, op. cit., p. 47. 45 BITENCOURT, loc. cit.

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25conflito frontal entre a vingança do príncipe e a ira contida no povo, por intermédio

do castigado e do carrasco.”46

Conforme esclarece Nuvolone, “o movimento da reforma

voltou-se principalmente para o processo criminal e a execução da pena,

destacando o caráter de expiação e intimidação desta última”. Desse modo, desde o

final do século XVIII, as preocupações sociais também diziam respeito à

consagração do processo acusatório em substituição ao sistema inquisitório, ao

estabelecimento de uma concepção essencialmente jurídica da justiça penal, à

concessão de tratamento digno aos delinqüentes (com a abolição da tortura durante

e depois do processo) e ao incremento do fim estatal da pena.47

Acerca do período humanitário, Foucault destaca que o

protesto contra os suplícios é encontrado em toda a segunda metade do século

XVIII:

Entre filósofos e teóricos do direito; entre juristas, magistrados, parlamentares; nos chaiers de doléances e entre os legisladores das assembléias. É preciso punir de outro modo: eliminar essa confrontação física entre o soberano e o condenado; esse conflito frontal ente a vingança do príncipe e a cólera contida do povo, por intermédio do supliciado e do carrasco. O suplício tornou-se rapidamente intolerável.48

Desta feita, mesmo que com alguns retrocessos, o Direito

Penal tende cada vez mais a repudiar a cominação de penas que atinjam a

dignidade da pessoa humana.

1.2 OS SISTEMAS PRISIONAIS: EVOLUÇÃO E APERFEIÇOAMENTO

Pode-se dizer que a pena de prisão, ou seja, a privação da

liberdade como pena principal, foi um avanço na triste história das penas. Segundo

Manoel Pedro Pimentel, “a pena de prisão “teve suas origens nos Mosteiros da

Idade Média, como punição imposta aos monges ou clérigos faltosos, fazendo com

46 FOUCAULT, op cit., p. 63.47 FERNANDES, op. cit., p. 652-653.48 FOCAULT, op. cit., p. 67.

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26que se recolhessem às suas celas para se dedicarem ao silêncio, à meditação e se

arrependerem a falta cometida, reconciliando-se assim com Deus”.49

Os sistemas penitenciários, a seu turno, encontraram suas

origens no século XVIII e tiveram, conforme preleciona Cezar Roberto Bitencourt50:

além dos antecedentes inspirados em concepções mais ou menos religiosas, um antecedente importantíssimo nos estabelecimentos de Amsterdam, nos Bridwells ingleses, e em outras experiências similares realizadas na Alemanha e na suíça. Estes estabelecimentos não são apenas um antecedente importante dos primeiros sistemas penitenciários, como também marcam o nascimento da pena privativa de liberdade, superando a utilização da prisão como simples meio de custódia.

No decorrer da história destacam-se o sistema filadélfico

(também chamado de pensilvânico ou celular), o sistema auburniano, o sistema

progressivo e o sistema irlandês.

1.2.1 Sistema Filadélfico

Também conhecido por Sistema de Pensilvânia, surge em

1775, na cidade da Filadélfia, nos Estados Unidos da América, e consistia no

isolamento completo do condenado, durante o dia e durante a noite. Por isso,

também era chamado de solitary system.51

Mirabete52 leciona que “o isolamento celular absoluto consistia

em passeio isolado do sentenciado em um pátio celular, sem trabalho ou visitas,

incentivando-se a leitura da Bíblia”.

No mesmo sentido, cita-se Moura Teles53:

Para a execução, criou-se à célula individual, da qual o condenado não saía, com o objetivo de que pela solidão pudesse meditar e alcançar o arrependimento, por meio da leitura unicamente da Bíblia

49 PIMENTEL, op cit., p. 132.50 BITENCOURT, op. cit., p. 91.51 TELES, Ney Moura. Direito Penal: parte geral. São Paulo: Atlas, 2004. p. 330. 52 MIRABETE, op. cit., p. 249.53 TELES, loc. cit.

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27e de outros livros religiosos. Eram proibidos de quaisquer visitas e qualquer contado do condenado com quem quer que seja, inclusive com outros presos, até mesmo por correspondência, só podendo avistar-se com o religioso.

Complementa Leal54:

A assistência moral, religiosa e médica era recebida pelo presidiário na própria cela. Também o trabalho, de natureza artesanal, ali deveria ser realizado. Imbuído da idéia cristã de purificação espiritual através da penitência, da meditação e do isolamento do ‘meio social pernicioso’, o sistema pensilviano objetivava recuperar o infrator, mediante um regime de absoluta reclusão silenciosa.

A primeira prisão norte-americana foi construída pelos quacres

em Walnut Street Jail, em 177655. O início mais definido do sistema filadélfico

começa sob a influência das sociedades integradas por quacres e os mais

respeitáveis cidadãos da Filadélfia, e tinha como objetivo reformar as prisões. Entre

as pessoas que mais influenciaram pode citar-se Benjamin Franklin e Willian

Bradfort 56.

Benjamin Franklin difundiu as idéias de Howard,

especialmente no que se refere ao isolamento do preso, que será uma das

características fundamentais do sistema celular pensilvânico57.

No ponto de vista ideológico de Melosi e Pavarini, o sistema

celular é interpretado como “uma estrutura ideal que satisfaz as exigências de

qualquer instituição que requeira a presença de pessoas sob uma vigilância única”.58

Já não se trataria de um sistema penitenciário criado para melhorar as prisões e

conseguir a recuperação do delinqüente, mas de um eficiente instrumento de

dominação servindo, por sua vez, como modelo para outro tipo de relações sociais.

54 LEAL, op. cit., p. 392-393.55 GARRIDO GUZMAN. Compendio de ciência penitenciaria. Universidad de Valencia, 1976. p. 81.56 PONT, Marco Del. Pernología y sistema carcelario. Buenos Aires, Depalma, 1974. v.1. p. 61.57 PONT, op. cit., p. 60.58 MELOSSI, Dario e PAVARI, Massimo. Cárcel y fábrica – los Orígenes del sistema penitenciário. Siglos XVI-XIX, 2ª ed. México, 1985. p. 169.

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28Em verdade, esse sistema visava à organização do caos

existente nos estabelecimentos prisionais da época. Consistia em uma tentativa de

sistematização da execução da pena privativa de liberdade, com vistas à superação

de inúmeros problemas (promiscuidade, fuga, rebeliões, higiene deficitária, entre

outros).59

O sistema celular sofreu inúmeras críticas devido ao seu

fracasso, uma vez que era extremamente severo e, conseqüentemente, levava o

apenado à loucura e ao suicídio. Notou-se ainda, que o sistema não alcançava a sua

finalidade ressocializadora, desta feita, impossibilitava a readaptação do apenado,

em face do completo isolamento.

1.2.2 Sistema Auburniano

Devido ao fracasso do sistema filadelfico, surgiu em 1818 a

Penitenciária de Auburn, no Estado de Nova York, Estados Unidos da América, e,

conseqüentemente, o sistema auburniano, que consistia em manter o condenado

isolado durante a noite, em célula individual e durante o dia trabalhando com os

demais presos, proibida a comunicação, sob pena de castigos corporais60.

Nota-se, na verdade, que este sistema é a evolução do

sistema da Filadélfia. Nesse respeito, cita-se Leal61:

O sistema Auburniano era semelhante ao anterior, com a única diferença de permitir o trabalho em conjunto dos presidiários, durante o dia, mas sempre em silêncio. À noite deveria ser observado o isolamento celular.

Segundo Pimentel, o ponto vulnerável do sistema diz respeito

ao silêncio absoluto que era imposto aos condenados, razão pela qual ficou

conhecido como silent system. Aponta ainda, as falhas desse sistema:

O ponto vulnerável desse sistema era a regra desumana do silêncio absoluto. Teria origem nessa regra o costume dos presos se

59 PRADO, Luis Régis. Curso de direito penal brasileiro. Vol. 1. 6 ed. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2006, p. 543.60 TELES, op. cit., p. 331.61 LEAL, op. cit., p. 393.

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29comunicarem com as mãos, formando uma espécie de alfabeto, prática que até hoje se observa nas prisões de segurança máxima, onde a disciplina é mais rígida. Usavam, como até hoje usam, o processo de fazer sinais com batidas nas paredes ou nos canos d’água ou, ainda, moderadamente, esvaziando a bacia dos sanitários e falando no que se chamam de boca do boi. Falhava também o sistema pela proibição de visitas, mesmo dos familiares, com a abolição do lazer e dos exercícios físicos, bem como a notória indiferença quanto à instrução e ao aprendizado ministrado aos presos.62

Nessa seara, leciona Foucault63:

O sistema auburniano manipula o condenado, com a desculpa de que eles teriam de volta a sociabilidade, uma vez que mantém contato com os demais companheiros, em horários de refeição, de exercícios, mas não pode falar. Ele está em contato com os outros, mas não exprime suas vontades, não coloca para os outros seus sentimentos.

Oliveira64 constatou que esse sistema piorou o homem,

fazendo com que ele fosse destruindo-se pouco a pouco diante dessa mudança

através do silêncio e do trabalho. Nota-se que este sistema pouco difere do anterior,

razão pela qual, outras alternativas foram surgindo, e conseqüentemente, restou

este banido.

1.2.3 Sistema Irlandês ou Progressivo

O sistema Progressivo (inglês ou irlandês) surgiu na Inglaterra,

no século XIX, atribuindo-se sua origem a um capitão da Marinha Real, Alexander

Maconochie 65.

Nele, levava-se em conta o comportamento e o

aproveitamento do preso, demonstrados pela boa conduta e pelo trabalho,

estabelecendo três períodos ou estágios no cumprimento da pena.

62 PIMENTEL, op. cit., p. 137.63 FOUCAULT, op. cit., p. 200.64 OLIVEIRA, op. cit., p. 42.65 MIRABETE, op. cit., p. 250.

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30O primeiro deles, período de prova, constava no isolamento

celular absoluto; o outro se iniciava com a permissão do trabalho em comum, em

silêncio, passando-se a outros benefícios; e o último permitia o livramento

condicional. Todavia, esse sistema foi aperfeiçoado na Irlanda, por Walter Crofton, o

qual introduziu mais uma fase para o trabalho do preso.66

A respeito do referido sistema, que invocou o período de

provas, o trabalho em comum, e por fim, a liberdade condicional, assevera Cezar

Roberto Bitencourt67.

Já por esse sistema, a condenação é dividida em quatro períodos: o primeiro é o recolhimento celular contínuo; o segundo é o isolamento noturno, com trabalho e ensino durante o dia; o terceiro é a semiliberdade, em que o condenado trabalha fora do presídio e recolhe-se à noite; e o quarto é o livramento condicional.68

Na mesma seara, destaca-se a lição de Lyra69:

O sistema irlandês de Walter Crofton (1857) concilia os anteriores, baseando-se no rigor da segregação absoluta no primeiro período, e a progressiva emancipação, segundo os resultados da emenda. Nessa conformidade, galgam-se os demais períodos – o segundo, com a segregação celular noturna e vida em comum durante o dia, porém, com a obrigação do silêncio; o terceiro, o de prisão comum para demonstrar praticamente os resultados das provações anteriores, isto é, a esperada regeneração e aptidão para a liberdade; por fim, chega-se ao período do livramento condicional.

Leal70 dispõe sobre a importância do referido sistema pela

concessão de liberdade condicional, que era avaliado pelo bom comportamento e

trabalho satisfatório do apenado e dispunha de um processo em forma de estágios,

o qual poderia reduzir sua sentença condenatória. Desta feita, o livramento

condicional foi um incentivo ao condenado.

66 MIRABETE, loc. cit.67 BITERCOURT, Cezar Roberto. Falência da pena de prisão: causas e alternativas. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1993. p. 84-85.68 PINHO, Rodrigo Cesar Rebello. Apreciação crítica do anteprojeto de lei, modificativa da parte geral do código penal de 1940 no tocante às penas privativas de liberdade. Justitia 117.69 LYRA, Roberto. Comentários ao código penal. Vol. II. Rio de Janeiro: Forense, 1942. p. 140.70 LEAL, op. cit., p. 394.

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31Com base no sistema progressivo, foram criados nos EUA os

reformatórios, que inicialmente eram utilizados como instituições de reeducação de

adolescentes e jovens adultos infratores. Em síntese, os reformatórios repousam na

indeterminação da sentença e na vigilância após o cumprimento da pena, com vistas

à correção, educação e readaptação social do condenado.71

Denota-se que o sistema progressivo constituiu um

significativo avanço e foi adotado por todos os povos civilizados do mundo, inclusive

o Brasil, com adaptações e particularidades das mais diversas, todas elas no sentido

do abrandamento da execução da pena.

71 PRADO, op. cit., p. 544.

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32

CAPÍTULO 2

A PENA DE PRISÃO

2.1 CONCEITO DE PENA

Ao analisar a pena, Delmanto72 a conceitua como a “imposição

da perda ou diminuição de um bem jurídico, prevista em lei e aplicada, pelo órgão

judiciário, a quem praticou ilícito penal”.

Por sua vez, Dotti enuncia a pena como “sanção imposta pelo

Estado e consistente na perda ou restrição de bens jurídicos do autor da infração,

em retribuição à sua conduta e para prevenir novos ilícitos”.73

Damásio de Jesus74 a define como “sanção aflitiva imposta

pelo Estado, mediante ação penal, ao autor de uma infração (penal), como

retribuição de seu ato ilícito, consistente na diminuição de um bem jurídico, e a fim

de evitar novos delitos”.

De modo mais completo, cita-se Fernando Capez:

[...] sanção penal de caráter aflitivo, imposta pelo Estado, em execução de sentença, ao culpado pela prática de uma infração penal, consistente na restrição ou privação de um bem jurídico, cuja finalidade é aplicar a retribuição punitiva ao delinquente, promover a readaptação social e prevenir novas transgressões pela intimidação dirigida à sociedade.75

Juridicamente, a pena é “uma sanção penal do Estado,

valendo-se do devido processo legal, cuja finalidade e a repressão ao crime

perpetrado e a prevenção a novos delitos, objetivando reeducar o delinquente, retirá-72 DELMANTO, Celso. Código Penal Comentado. 5ª ed. atualizada e ampliada. Rio de Janeiro: Renovar,2000. p. 64.73 DOTTI, op. cit., p. 443.74 JESUS, Damásio E. de. Direito Penal. 1. 14 ed. São Paulo: Saraiva, 2001, p. 2475 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal Parte Geral. 12ª ed. Vol. 1. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 358/359.

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33lo do convívio social enquanto for necessário, bem como reafirmar valores

protegidos pelo Direito Penal e intimidar a sociedade para que o crime seja

evitado”.76

2.2 CARACTERISTICAS DA PENA

Nota-se que a pena constitui-se no âmbito penal, na maioria

das vezes na restrição à liberdade individual, isso porque pode, também, constituir-

se na perda patrimonial, quando a sanção imposta se constitui na pena de multa.

A consagração dos Direitos Humanos, através de sua

incorporação ao Direito Positivo de todos os povos cultos, após a Revolução

Francesa, firmou definitivamente os caracteres essenciais da pena.77

O primeiro caractere da pena é que ela é personalíssima,

dessa forma atinge somente o autor do crime. Mirabete78 leciona que “a

característica da personalidade refere-se à impossibilidade de estender-se a

terceiros a imposição da pena”. Por isso, determina-se que “nenhuma pena passará

da pessoa do condenado” (art. 5º, XLV, primeira parte, da CF).

A segunda característica diz respeito à proporcionalidade da

pena, Noronha79 explica que “por mais desprezível que seja o criminoso, a aplicação

da pena tem que ser proporcional ao delito praticado, ante o princípio da dignidade

da pessoa humana, ou seja, cada crime deve ser prevenido com medidas

proporcionais ao mal causado”.

Outra característica é o princípio da legalidade, que consiste

na existência prévia de lei para imposição da pena, previsto no artigo 1º, do Código

Penal [...] “não há crime sem lei anterior que o defina. Não há pena sem prévia

cominação legal”.

76 NUCCI, Guilherme de Souza. Manual de Direito Penal. 3º ed. São Paulo: Editora dos Tribunais, 2007. p. 378.77 ROSA, Antonio José Miguel Feu. Direito penal parte geral. São Paulo: Editora dos Tribunais, 1996 p. 421.78 MIRABETE. op. cit., p. 246. 79 NORONHA, E. Magalhães. Direito penal. 34 ed. São Paulo: Saraiva, 1999 p. 227.

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34Rosa80, disciplina que a sanção penal só tem valor quando

“decorrente de uma sentença proferida pelo juiz competente, através de um

processo regular e obedecidas às formalidades legais”. Por fim, a pena deve ser

inderrogável, ou seja, ao delito praticado, a imposição deve ser certa e a pena

cumprida.

Beccaria81 explica que “não é o rigor do suplício que previne os

crimes com mais segurança, mas a certeza do castigo, o zelo vigilante do

magistrado”. Nessa ótica, um castigo moderado, mas inevitável, causará sempre

uma impressão mais forte do que o vago temor de um suplício terrível, em relação

ao qual se apresenta alguma esperança de impunidade”.

2.3 FINALIDADE DA PENA

Para que o direito penal revista-se de utilidade para a

sociedade, a pena deve ter algumas finalidades e estas são discutidas e explicadas

por várias teorias, entre elas, se destacam as teorias absolutas, relativas e mistas.

2.3.1 TEORIAS ABSOLUTAS

A teoria absoluta ou da retribuição sustenta que a pena encontra

em si mesma a sua justificação, sem que possa ser considerada um meio para fins

ulteriores. Tais teorias são sustentadas por Kant e Hegel.

Capez82 explica que, “a finalidade da pena é punir o autor de

uma infração penal, ou seja, a pena é a retribuição do mal injusto, praticado pelo

criminoso, pelo mal justo previsto no ordenamento jurídico (punitur quia peccatum

est.)”.

80 ROSA, Antonio José Miguel Feu. Direito penal parte geral. São Paulo: Editora dos Tribunais, 1996 p. 421.81 BECCARIA, Cesare. Dos Delitos e das Penas. 13. ed., Rio de Janeiro:Ediouro, 1999. p. 80.82 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal Parte Geral. 12ª ed. Vol. 1. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 357.

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35 Nesse norte, cabe destacar o ensinamento de Costa Junior83:

Enquanto perante a retribuição moral a pena é uma exigência ética profunda da consciência humana de que o bem seja recompensado com o bem e o mal com o mal – conforme retribuição jurídica - (...) Se o delito configura uma rebelião do indivíduo contra o império da lei, exige uma reparação que venha reafirmar a autoridade da lei através da pena.

Explica, ainda, que “a pena, em sua função retributiva, não

deixa de espelhar certo sentimento de vingança. Isso por realizar ela, com relação à

vítima, à família e ao público revoltado com o crime”. Desse modo, a sanção acalma

o ressentimento da agressão sofrida, aplaca os sentimentos de ódio e indignação

que se apossam dos indivíduos atingidos e do público em geral, eliminando o desejo

de vingança e represálias.

Segundo Bitencourt84, a teoria retributiva tinha a finalidade de

proteger o capital da burguesia do Estado absolutista:

O Estado, tendo como objeto político a teoria do contrato social, reduz sua atividade em matéria jurídico-penal à obrigação de evitar a luta entre os indivíduos agrupados pela idéia do consenso social. O indivíduo que contrariava esse contrato social era qualificado como traidor, uma vez que com sua atividade não cumpria o compromisso de conservar a organização social, produto da liberdade natural e originária. Passava a não ser considerado mais como parte desse conglomerado social e sim como um rebelde cuja culpa podia ser retribuída com uma pena.

Diz Leal85 que “a pena assume um caráter moral do valor

absoluto, sendo vista como uma inalienável exigência de justiça, baseada na idéia

de que ela é o mal justo que se antepõe ao mal injusto que é o crime”.

Cabe ressaltar que, para Teles86, as teorias retributivas são

inadmissíveis, isso porque, não apresentam os pressupostos da pena, desse modo,

83 COSTA JUNIOR, Paulo José. Curso de Direito Penal. 10 ed. São Paulo: Saraiva, 2009 p. 142.84 Bitencourt. Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte geral. V. 1. 8ed. São Paulo: Saraiva, 2003 p. 67/68.85 LEAL. João José. Direito penal geral. 3 ed. Florianópolis: OAB/SC Editora, 2004 p. 381.86 TELES. Ney Moura. Direito Penal parte geral. São Paulo: Atlas, 2004 p. 321.

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36nas palavras do auto, “não limitam o poder estatal de punir, deixando o legislador

livre para incriminar qualquer comportamento, qualquer conduta humana, qualquer

fato, e cominar quaisquer espécies de pena em quaisquer quantidades”.

2.3.2 TEORIAS RELATIVAS

Por outro lado, as teorias relativas buscam apresentar a pena

com a finalidade de natureza política e de utilidade para os homens e a sociedade. A

punição imposta ao agente do crime destina-se a prevenir a ocorrência de novos

crimes.87 A referida teoria, também chamada de preventiva, subdivide-se em teoria

preventiva geral e teoria preventiva especial.

A prevenção é especial porque a pena objetiva a readaptação

e a segregação do criminoso como meios de impedi-lo de voltar à delinqüir.88

Segundo Teles89, uma das teorias da prevenção especial diz

que “o agente do crime ficará para sempre ou por tempo determinado, inofensivo e,

experimentando a pena, terá conhecido as conseqüências do crime”. Outras teorias,

explica Teles, defendem “a necessidade do individuo ser “melhorado”, mediante sua

educação, sua correção, sua ressocialização, ou recuperação, para poder retornar

ao livre convívio da sociedade”.

A teoria da prevenção geral é apresentada pela intimidação

dirigida ao ambiente social, ou seja, as pessoas não delinquem porque tem medo de

receber a sanção penal. A finalidade da pena, para essas teorias é a de evitar a

delinqüência do homem, nesse norte, cita-se o manifesto de Teles:

Essas teorias compreendem a pena como instrumento de intimidação geral dos indivíduos, que diante da ameaça abstrata e concreta da imposição da pena, ficariam motivados a não transgredir a norma penal. Entre elas, a teoria da intimidação defendia a necessidade de dar a maior publicidade às execuções da penas, para que todos tomassem conhecimento do sofrimento dos condenados. Uma teoria, chamada do constrangimento psicológico,

87 TELES, op. cit., p. 322.88 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal Parte Geral. 12ª ed. Vol. 1. São Paulo: Saraiva, 2008. p. 358. 89 TELES, op. cit., p. 323.

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37procura demonstrar o poder moral da pena. A teoria da defesa mostra a necessidade da aplicação da pena pelo Estado porque o crime coloca em perigo as condições de sua própria existência, e a punição do agente do crime será o exemplo dado aos homens, para evitar os perigos futuros.

Dessa forma, a pena tem como objetivo a coação moral, para

que as pessoas não venham a cometer crimes, ou aqueles que já cometeram, sejam

ressocializados e não venham a delinqüir novamente. Todavia, Claus Roxin crítica a

teoria acima citada, aduzindo que nada se justifica à punição de um homem com a

finalidade de intimidar os outros, sendo, por isso, injusto punir alguém, para que o

outro não cometa um crime.90

2.3.3 TEORIAS MISTAS

A teoria mista dispõe que a pena tem dupla função de “punir o

criminoso e prevenir a prática do crime, pela reeducação e pela intimidação coletiva

(punitur quia peccatum este t ne peccatum)”.91Esta teoria mista procura agregar os

fundamentos mais importantes das teorias absolutas e relativas.

Nesse sentido, destaca-se o ensinamento de Barros92:

Na teoria mista ou unitária a pena tem caráter retributivo preventivo. Retributivo porque consiste numa expiação do crime, imposto até mesmo aos delinqüentes que não necessitam de nenhuma ressocialização. Preventivo porque acompanhada de uma finalidade prática, qual seja, a recuperação do criminoso, funcionando ainda como fator de intimidação geral.

Francisco Bissoli Filho 93 preleciona:

As teorias mistas compreendem o duplo aspecto da pena, ou seja, o retribucionista e utilitarista. A pena, assim, poderá ser um instrumento de retribuição do delito já perpetrado, como também de prevenção daqueles que estão por vir.

90 ROXIN, Claus. Problemas fundamentais do direito penal. Lisboa: Veja, 1986 p. 24. 91 CAPEZ, op. cit., p. 358.92 BARROS, Francisco Dirceu. Direito Penal: parte geral. Rio de Janeiro: Impetus, 2003 p. 42.93 BISSOLI FILHO. Francisco. Estigmas da criminalização: dos antecedentes à reincidência criminal. Florianópolis: Obra Jurídica Editora, 1998 p. 146.

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38A teoria, ora descrita, é a mais utilizada na atualidade,

inclusive no direito penal pátrio, isso porque, com o advento da reforma 1984, a

pena passou a apresentar natureza mista. Nesse norte, destaca-se Nucci94:

Conforme o atual sistema normativo brasileiro, a pena não deixa de possuir as características expostas: é castigo + intimidação ou reafirmação do Direito Penal + recolhimento do agente infrator e ressocialização. O art. 59 do Código Penal menciona que o juiz deve fixar a pena de modo a ser necessária e suficiente para reprovação e prevenção do crime. Além disso, não é demais citar o disposto no art. 121, § 5º, do Código Penal, salientando que é possível ao juiz aplicar o perdão judicial, quando as conseqüências da infração atingirem o próprio agente de maneira tão grave que a sanção penal se torne desnecessária, evidenciando o caráter punitivo da pena. Sob outro prisma, asseverando o caráter reeducativo da pena, a Lei de Execução Penal preceitua que “a assistência ao preso e ao internado é dever do Estado, objetivando prevenir o crime e orientar o retorno à convivência em sociedade (art. 10, com grifo nosso). Ademais, o art. 22, da mesma Lei, dispõe que “assistência social tem por finalidade amparar o preso e o internado e prepará-lo para o retorno à liberdade. Merece destaque, também, o disposto no art. 5º e 6 da Convenção Americana sobre Direitos Humanos: ‘as penas privativas de liberdade devem ter por finalidade essencial a reforma e a readaptação social dos internados’. Impossível, então, desconsiderar o tríplice aspecto da sanção penal.

Beccaria explica que “os castigos tem por finalidade única

obstar o culpado de tornar-se futuramente prejudicial à sociedade e afastar os seus

patrícios do caminho do crime”.95

2.4 ESPÉCIES DE PENA NO DIREITO BRASILEIRO

Consoante o atual Código Penal, em seu artigo 32, às penas

são aplicadas três modalidades, quais sejam, penas privativas de liberdade, penas

restritivas e direito e pena de multa. Contudo, a Constituição Federal de 1988, no

artigo 5º, XLVI, enumerou as penas em: privação ou restrição de liberdade, perda de

bens, multa, prestação social alternativa e suspensão ou interdição de direitos,

94 NUCCI, op. cit., p. 370/371.95 BECCARIA, op. cit., p. 58.

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39todavia, vedou a pena de morte, exceto em caso de guerra declarada, bem como as

penas de caráter perpétuo, de trabalhos forçados, de banimento e de natureza cruel,

nos termos do artigo 5º, XLVII da Carta Magna.

2.4.1 AS PENAS PRIVATIVAS DE LIBERDADE

As penas privativas de liberdade são aquelas que retiram do

condenado de forma mais rígida, o direito à liberdade. Sobre o assunto, Noronha96

preleciona que “a pena restringe, com maior ou menor intensidade, a liberdade do

condenado, consistente em permanecer em algum estabelecimento prisional, por um

determinado tempo, tudo conforme o regime imposto”.

No mesmo vértice, Dower97 ensina que “as penas privativas de

liberdade são aquelas que retiram do condenado o direito à liberdade para que fique

isolado da sociedade”.

As penas restritivas de liberdade encontram-se legalmente

amparadas nos artigos 3398 e 4299, ambos do Código Penal, e são divididas em três

96 NORONHA, E. Magalhães. Direito penal. 34 ed. São Paulo: Saraiva, 1999 p. 234.97 DOWER, Nelson Godoy Brassil. Direito penal Simplificado. São Paulo: Nelpa, 1999 p. 66.98 Art. 33 - A pena de reclusão deve ser cumprida em regime fechado, semi-aberto ou aberto. A de detenção, em regime semi-aberto, ou aberto, salvo necessidade de transferência a regime fechado. § 1º - Considera-se: a) regime fechado a execução da pena em estabelecimento de segurança máxima ou média;b) regime semi-aberto a execução da pena em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar;c) regime aberto a execução da pena em casa de albergado ou estabelecimento adequado. § 2º - As penas privativas de liberdade deverão ser executadas em forma progressiva, segundo o mérito do condenado, observados os seguintes critérios e ressalvadas as hipóteses de transferência a regime mais rigoroso: a) o condenado a pena superior a 8 (oito) anos deverá começar a cumpri-la em regime fechado;b) o condenado não reincidente, cuja pena seja superior a 4 (quatro) anos e não exceda a 8 (oito), poderá, desde o princípio, cumpri-la em regime semi-aberto;c) o condenado não reincidente, cuja pena seja igual ou inferior a 4 (quatro) anos, poderá, desde o início, cumpri-la em regime aberto.§ 3º - A determinação do regime inicial de cumprimento da pena far-se-á com observância dos critérios previstos no art. 59 deste Código. § 4o O condenado por crime contra a administração pública terá a progressão de regime do cumprimento da pena condicionada à reparação do dano que causou, ou à devolução do produto do ilícito praticado, com os acréscimos legais.99 Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando: I - aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo; II - o réu não for reincidente em crime doloso; III - a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem que essa substituição seja suficiente. § 1o (VETADO). § 2o Na condenação igual ou inferior a um ano, a substituição pode ser feita por multa ou por uma pena restritiva de direitos; se superior a um ano, a pena privativa de liberdade pode ser substituída por uma pena restritiva de direitos e multa ou por duas restritivas de direitos. § 3o Se o condenado for reincidente, o juiz poderá aplicar a substituição, desde que, em face de condenação anterior, a medida seja socialmente recomendável e

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40espécies, quais sejam, reclusão, detenção e prisão simples.

A pena de reclusão e detenção são as duas principais penas

restritivas de liberdade e se constituem em decorrência da prática de crimes, e a

prisão simples é aplicada a contravenções penais. A legislação penal, em seu artigo

33, caput, estabelece que a pena de reclusão deve ser cumprida em regime

fechado, semi-aberto ou aberto, enquanto a pena de detenção será cumprida em

semi-aberto ou aberto, exceto, caso seja necessário transferência para o regime

fechado.

O mesmo preceito legal, em seu parágrafo primeiro, faz outra

diferenciação, desta vez quanto ao estabelecimento penal de execução. O regime

fechado deverá ser executado em estabelecimento de segurança máxima ou média,

em penitenciária, e em cela individual, nos termos dos artigos 87 e 88, da Lei nº

7.210 de 11/07/1984 (Lei de Execução Penal – LEP). O regime semi-aberto, em

colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar, podendo ser alojado em

compartimento coletivo (artigos 91 e 92 da LEP). O regime aberto a execução da

pena se dará em casa de albergado ou estabelecimento adequado, nos moldes dos

artigos. 93, 94 e 95 da LEP.

Cabe ainda, destacar algumas distinções feitas por Nucci100:

[...] a reclusão é cumprida inicialmente nos regimes fechado, semi-aberto ou aberto; a detenção somente pode ter seu início em regime aberto ou semi-aberto (art. 33, caput, CP); a reclusão pode ter por efeito da condenação a incapacidade para o exercício do pátrio poder, tutela ou curatela, nos crimes dolosos, sujeitos a esse tipo de pena (...); a reclusão propicia a internação, nos casos de medida de segurança; a detenção permite a aplicação do regime de tratamento ambulatorial; a reclusão é cumprida em primeiro lugar (art. 69, CP).

a reincidência não se tenha operado em virtude da prática do mesmo crime. § 4o A pena restritiva de direitos converte-se em privativa de liberdade quando ocorrer o descumprimento injustificado da restrição imposta. No cálculo da pena privativa de liberdade a executar será deduzido o tempo cumprido da pena restritiva de direitos, respeitado o saldo mínimo de trinta dias de detenção ou reclusão. § 5o Sobrevindo condenação a pena privativa de liberdade, por outro crime, o juiz da execução penal decidirá sobre a conversão, podendo deixar de aplicá-la se for possível ao condenado cumprir a pena substitutiva anterior.100 NUCCI, op. cit., p. 295.

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41Há outras diferenças, atinentes ao procedimento penal, como

a proibição de fiança nos crimes previstos com reclusão, cuja pena mínima

cominada for superior a dois anos (artigo 323, I, CPP).

A prisão simples é cabível unicamente para as contravenções

penais, devem ser cumpridas, sem rigor penitenciário, em estabelecimento especial

ou seção especial de prisão comum, em regime aberto ou semi-aberto. Os

condenados a prisão simples são separados dos demais condenados à pena de

prisão e reclusão, consoante artigo 6º, “caput” e § 1º, da Lei de Contravenções

Penais.101 É importante ressaltar que não há regime fechado na prisão simples, seja

inicialmente, seja em decorrência de regressão.

2.4.2 AS PENAS RESTRITIVAS DE DIREITO

Nos moldes do artigo 43, do Código Penal e artigo 5º, XLVI, da

Constituição Federal de 1988, as penas restritivas de direito são as seguintes:

prestação de serviços à comunidade, prestação pecuniárias, perda de bens e

valores,interdição temporária de direitos e limitação de fim de semana.

As penas restritivas de direito tem a substitutividade e

autonomia, indicadas no artigo 44 e 54, ambos do Código Penal, como

características marcantes.

São substitutivas porque resultam de um procedimento judicial

que, depois de aplicar a pena privativa de liberdade, efetua a sua substituição por

uma ou mais penas restritivas de direito, desde que presentes os requisitos legais e

autônomas porque não podem ser cumuladas com a pena privativa de liberdade.102

Os requisitos para a substituição da pena privativa de

liberdade em privativa de direito estão condicionados aos indicados pelo artigo 44, I

a III103, do Código Penal.101 MASSON, Cleber. Direito Penal Esquematizado. 2 ed. São Paulo: Método, 2009 p. 536.102 MASSON, op. cit., p. 632.103 Art. 44. As penas restritivas de direitos são autônomas e substituem as privativas de liberdade, quando:I - aplicada pena privativa de liberdade não superior a quatro anos e o crime não for cometido com violência ou grave ameaça à pessoa ou, qualquer que seja a pena aplicada, se o crime for culposo; II - o réu não for reincidente em crime doloso; III - a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e a personalidade do condenado, bem como os motivos e as circunstâncias indicarem

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42As penas restritivas de direitos podem ser classificadas como

genéricas ou especificas. As genéricas são aquelas que substituem a pena privativa

de liberdade em qualquer crime, desde que presentes os requisitos legais. As

específicas são aquelas aplicadas pela prática de crimes determinados.

2.4.2.1 PRESTAÇÃO PECUNIÁRIA

A prestação pecuniária, segundo o artigo 45, § 1º104, do Código

Penal, consiste no pagamento em dinheiro à vitima, a seus dependentes ou entidade

pública ou privada, com destinação social, de importância fixada pelo juiz, não

inferior a um salário mínimo nem superior a trezentos e sessenta salários mínimos.

Grego105 leciona que “para que a pena privativa de liberdade

possa ser substituída pela prestação pecuniária, não há necessidade de ter ocorrido

um prejuízo material, podendo ser aplicada nas hipóteses em que a vítima sofra um

dano moral”.

2.4.2.2 PERDA DE BENS E VALORES

Nucci106 conceitua a pena de perda e valores como “uma

sanção penal de caráter confiscatório, levando à apreensão definitiva por parte do

Estado de bens ou valores de origem lícita do individuo”. Afirma a exposição de

motivos da Lei 9.714/98, entretanto, não ter tal pena a conotação de confisco,

porque o crime é motivo mais do que justo para essa perda, embora não se esteja

discutindo a justiça ou injustiça da medida, mais apenas o ato do Estado de

apoderar-se de bens ou valores do condenado, ainda que por razão justificada.107

que essa substituição seja suficiente. 104 Art. 45. Na aplicação da substituição prevista no artigo anterior, proceder-se-á na forma deste e dos arts. 46, 47 e 48. § 1o A prestação pecuniária consiste no pagamento em dinheiro à vítima, a seus dependentes ou a entidade pública ou privada com destinação social, de importância fixada pelo juiz, não inferior a 1 (um) salário mínimo nem superior a 360 (trezentos e sessenta) salários mínimos. O valor pago será deduzido do montante de eventual condenação em ação de reparação civil, se coincidentes 105 GREGO, op. cit., p. 537.106 NUCCI, op. cit., p. 421.107 NUCCI, loc. cit.

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43De acordo com o artigo 45, § 3º108, do Código Penal, a pena de

perda bens e valores pertencentes aos condenados dar-se-á, ressalvada a

legislação especial, em favor do fundo Penitenciário Nacional, e seu valor terá como

teto – o que for maior – o montante do prejuízo causado ou do provento obtido pelo

agente ou por terceiro, em conseqüência da prática do crime.

2.4.2.3 PRESTAÇÃO DE SERVIÇOS À COMUNIDADE OU ENTIDADES PÚBLICAS

A prestação de serviços à comunidade ou entidades públicas

consiste na “atribuição de tarefas gratuitas aos condenados, que serão por eles

levadas à efeito em entidades assistenciais, hospitais, escolas, orfanatos e outros

estabelecimentos congêneres, em programas comunitários ou estatais”, sendo que

as tarefas que lhe serão atribuídas devem ser de acordo com as suas aptidões,

devendo ser cumpridas à razão de uma hora de tarefa por dia de condenação,

fixadas de modo a não prejudicar a jornada normal de trabalho (artigo 46, §§ 1º, 2º e

3º, do Código Penal)109

Tal pena somente será aplicada às condenações superiores a

seis meses de privação de liberdade, sendo que até seis meses poderão ser

aplicadas as penas substitutivas de prestação pecuniária, perda de bens e valores,

interdição temporária de direitos e limitação de fim de semana110.

O condenado pode antecipar a finalização da sua pena, desde

que o montante ultrapasse um ano, justamente porque foi aumentado para quatro

anos o limite de substituição (artigo 46 § 4º, do Código Penal). Seria exagerado

obrigar o condenado à permanecer por quatro anos prestando serviços a alguma

entidade, diária ou semanalmente, sem que pudesse antecipar o cumprimento. 111

108 “Art. 45. Na aplicação da substituição prevista no artigo anterior, proceder-se-á na forma deste e dos arts. 46, 47 e 48. (...) § 3o A perda de bens e valores pertencentes aos condenados dar-se-á, ressalvada a legislação especial, em favor do Fundo Penitenciário Nacional, e seu valor terá como teto - o que for maior - o montante do prejuízo causado ou do provento obtido pelo agente ou por terceiro, em conseqüência da prática do crime.”109 GREGO, op. cit., p. 542.110 GREGO, op. cit. p.543.111 NUCCI, op. cit., p. 422.

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44 2.4.2.4 INTERDIÇÃO TEMPORÁRIA DE DIREITOS

De acordo com o artigo 47 do Código Penal, são interdições

temporárias de direitos:

Art. 47 [...]I – proibição do exercício de cargo, função ou atividade pública, bem como de mandato eletivo; II – proibição do exercício de profissão, atividade ou ofício que dependam de habilitação especial, de licença ou autorização do poder público; III – suspensão de autorização ou de habilitação para dirigir veículo; IV – proibição de freqüentar determinados lugares.

Essas penas restritivas de direito devem ser individualizadas,

procurando o juiz adequá-las ao fato e as condições do condenado. Aplicam-se nas

sentenças condenatórias. 112

2.4.2.5 LIMITAÇÃO DE FIM DE SEMANA

Segundo a doutrina de Capez113, “a limitação de fim de

semana consiste na obrigação do condenado de permanecer aos sábados e

domingos, por cinco horas diárias, na casa do albergado (LEP, art. 93) ou outro

estabelecimento adequado”. O estabelecimento encaminhará mensalmente ao juiz

da execução relatório sobre o aproveitamento do condenado.

É pouco aplicada, uma vez que praticamente não existe casa

de albergado. E na linha do raciocínio do Superior Tribunal de Justiça: “se a pena de

limitação de fim de semana deve ser efetiva em casa de albergado, não pode o

paciente, na falta do referido estabelecimento, ser submetido ao cumprimento da

reprimenda em presídio, situação mais gravosa do que estabelecida pelo decreto

condenatório”.114

112 JESUS, Damásio E. de. Direito penal, vol. 1: parte geral. 31 ed. São Paulo: Saraiva, 2010 p. 584.113 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Vol. 1: parte geral. 9ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005 p. 408.114 MASSON, op. cit., p. 654.

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45 2.5 REGIMES PRISIONAIS

Na execução da pena privativa de liberdade, a determinação

dos regimes penais, fixa-se de acordo com a espécie, a quantidade de pena, a

reincidência associados ao bom comportamento do apenado e assim, definido o

regime para o cumprimento da pena o condenado articula a progressão pelo bom

comportamento.115

Os regimes prisionais na legislação brasileira estão previstos

tanto no Código Penal quanto na Lei de Execução Penal e classificam-se em

fechado, semi-aberto, aberto e diferenciado.

Por força do artigo 59, III, do Código Penal, o regime inicial do

cumprimento das penas privativas de liberdade é determinado pelo juiz na sentença,

que deve obedecer aos parâmetros impostos no artigo 33 §§ 2º e 3º do mesmo

Estatuto.116

É importante ressaltar que a legislação penal, em seu artigo

33 § 2º, adota o procedimento de progressão de regime. Acerca do tema, preleciona

Fernando Capez117:

[...] O processo de execução é dinâmico e, como tal, está sujeito a modificações. Todavia, o legislador previu a possibilidade de alguém, que inicia o cumprimento de sua pena em regime mais gravoso (fechado ou semi-aberto), obter o direito de passar a uma forma mais branda e menos expiativa da execução. Isso denomina-se progressão de regime. Trata-se da passagem do condenado de um regime mais rigoroso para outro mais suave, de cumprimento da pena privativa de liberdade desde que satisfeitas as exigências legais.

Todavia, o artigo 118, da Lei de Execução Penal, vem

disciplinar a regressão do regime, a qual prevê que a execução da pena privativa de

115 Bitencourt. Cezar Roberto. Tratado de Direito Penal: parte geral. V. 1. 8ed. São Paulo: Saraiva, 2003 p. 422/423.116 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução Penal. 10 ed. São Paulo: Atlas, 2002 p.353.117 CAPEZ, Fernando. Curso de Direito Penal. Vol. 1: parte geral. 9ª ed. São Paulo: Saraiva, 2005 p. 365.

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46liberdade ficará sujeita à forma regressiva, com transferência para qualquer dos

regimes mais rigorosos, quando o condenado: I – praticar fato definido como crime

ou falta grave; II – sofrer condenação, por crime anterior, cuja pena, somada ao

restante da pena em execução, torne incabível o regime (artigo 111 da LEP).118

2.5.1 REGIME FECHADO

Dispõe os artigos 33 e 34, ambos do Código Penal, que o

cumprimento da pena privativa de liberdade em regime fechado, obrigatoriamente

inicia-se em estabelecimento penal de segurança máxima ou mínima, onde o

condenado ficará sujeito ao trabalho no período noturno e ao isolamento durante o

repouso noturno.

Nesse sentido, ensina Barros119:

A rigor, o regime fechado deve ser cumprido em penitenciária afastado do centro urbano, alojando-se o condenado em cela individual, com área mínima de seis metros quadrados, que conterá dormitório, aparelho sanitário e lavatório (arts. 88 e 90 da LEP).

Nos termos do artigo 34, do Código Penal, o condenado será

obrigatoriamente submetido, para o inicio do cumprimento da reprimenda, a exame

criminológico de classificação para individualização da execução.

Teles120 disciplina acerca do trabalho em comum durante o dia,

conforme suas aptidões e as ocupações anteriores, desde que compatíveis com sua

privação de liberdade:

O trabalho interno é obrigatório e está regulado na Lei de Execução Penal, nos arts. 31 a 35, cabendo ressaltar que a jornada de trabalho não será inferior a seis e nem superior a oito horas, assegurado o descanso nos domingos e feriados. O objetivo é a formação profissional do condenado.

118 GREGO, op. cit., p. 514.119 BARROS, Flávio Monteiro de. Direito Penal: parte geral. V 1. 4 ed. São Paulo: Saraiva, 2004, p. 452.120 TELES, Ney Moura. Direito Penal: parte geral. São Paulo: Atlas, 2004. p. 342/343.

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47Cabe salientar, que o artigo 34, § 3º, do Código Penal prevê a

possibilidade de o condenado em regime fechado trabalhar fora do estabelecimento

penal, em serviços ou obras públicos desde que cumprido pelos menos um sexto da

pena, contudo, é evidente que o trabalho merecerá rígida fiscalização, para evitar

fuga e indisciplina.

2.5.2 REGIME SEMI-ABERTO

O cumprimento da pena em regime semi-aberto será em

colônia penal agrícola ou industrial, ou estabelecimento penal similar, nos termos do

artigo 35, do Código Penal.

Alude Prado que121:

[...] a pena será cumprida em colônia agrícola, industrial ou similar. Poderá o condenado ser alojado em compartimento coletivo, observados, porém, os requisitos de salubridade ambiental, bem como as exigências básicas das dependências coletivas: a) seleção adequada dos presos; b) limite de capacidade máxima que atenda aos objetivos de individualização da pena ( arts. 91 e 92, LEP).

Greco122 preleciona que “é admissível o trabalho externo, bem

como a freqüência a cursos supletivos profissionalizantes, de instrução de segundo

grau ou superior”.

O trabalho externo, diferentemente do regime fechado, poderá

ser autorizado, ainda que em obras ou serviços particulares, mediante remuneração

e fiscalização, todavia, sem vigilância.123

Cabe destacar, que podem ocorrer, ainda, saídas sem a

vigilâncias para visitas à família ou para participação de atividades concorrentes

para o retorno ao convívio social. A autorização depende, entretanto, de

comportamento adequado do sentenciado, cumprimento de no mínimo um sexto da

121 PRADO, Luiz Regis. Curso de direito penal brasileiro. São Paulo: Revista dos Tribunais, 1999 p. 302.122 GREGO, op. cit., p. 510.123 TELES, op. cit., p. 343.

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48pena (se primário) ou de um quatro (se reincidente) e compatibilidade do benefício

com os objetivos da pena.124

2.5.3 REGIME ABERTO

O regime aberto “é uma ponte para a completa reinserção do

condenado na sociedade. O seu cumprimento é realizado em estabelecimento

conhecido como Casa do Albergado”.125 A base desse regime é a autodisciplina e o

senso de responsabilidade do condenado (art. 36, CP), que terá plena liberdade

durante o período diurno dos dias da semana, devendo dedicar-se ao trabalho lícito,

fora do estabelecimento, sem, contudo, qualquer vigilância, recolhendo-se à casa do

albergado todas as noites e nos dias de folga, feriados e fins de semana.126

Nesse sentido, cita-se Albergaria127:

Nesse regime deposita-se plena confiança no condenado, pois há prova de que regredirá no processo de ressocialização. Há ausência de precaução sobre a segurança e vigilância, em razão da aceitação voluntária da disciplina e do senso de responsabilidade do condenado. No regime aberto, propõe-se a realização intensiva de formação escolar e profissional e a reinserção social progressiva, notadamente a reinserção profissional.

Para o ingresso no regime aberto, o artigo 114, da Lei de

Execuções Penais estabelece os requisitos necessários: a) estar o condenado

trabalhando ou comprovar a possibilidade de fazê-lo imediatamente; b) apresentar,

por seus antecedentes ou exame, indícios de que irá se ajustar-se,

responsavelmente, ao novo regime.

Neste norte, Prado128 leciona acerca das condições para a

concessão do regime aberto:

Para a concessão de regime aberto, é impositivo o estabelecimento, pelo juiz, das seguintes condições gerais, sem prejuízo de outras

124 NUCCI, op. cit., p. 398.125 GREGO, loc. cit.126 TELES, op. cit., p. 344.127 ALBERGARIA, Jason. Comentários à lei de execução penal. Rio de Janeiro: Aide, 1987 p. 235.128 PRADO, op. cit., p. 552.

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49especiais: a) permanência do condenado no local que for designado, durante o repouso e nos dias de folga; b) saída para o trabalho com retorno nos horários fixados; c) compromisso de não se ausentar da cidade onde reside, sem autorização judicial; d) comparecimento a juízo, para informar e justificar suas atividades, quando for determinado. O ingresso do condenado nesse regime menos rigoroso, porém, encontra-se condicionado à aceitação de seu programa e das condições impostas pelo juiz.

É claro que as outras condições deverão levar em conta as

características pessoais do condenado e do crime por ele praticado, com vistas a

oferecer melhores condições para a sua recuperação.129

2.5.4 REGIME DISCIPLINAR DIFERENCIADO

O Regime Disciplinar Diferenciado foi introduzido pela Lei

10.972 de 1º de dezembro de 2003, inserido no artigo 53, V130, da Lei de Execução

Penal. Segundo Renato Marcão131, o regime disciplinar diferenciado caracteriza-se

pelos seguintes aspectos:

Duração máxima de 360 dias, sem prejuízo de repetição da sanção por nova falta grave de mesma espécie, até o limite de um sexto da pena aplicada; Recolhimento em cela individual; Visitas Semanais de duas pessoas, sem contar as crianças, com duração de duas horas; o preso terá direito à saída da cela por duas horas diárias para banho de sol.

Cabe destacar o posicionamento de Mirabete132:

Não é um novo regime de cumprimento de pena, em acréscimo aos regimes fechado, semi-aberto e aberto. Constitui-se em um regime de disciplina carcerária especial, caracterizado por maior grau de isolamento do preso e de restrições ao contato com o mundo exterior, ao qual poderão ser submetidos os condenados ou presos provisórios.

129 TELES, op. cit., p. 345.130 Art. 53. Constituem sanções disciplinares:[...] V - inclusão no regime disciplinar diferenciado.131 MARCAO, Renato. Curso de execução penal. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 2008 p. 39.132 MIRABETE. Julio Fabbrini. Manual de direito penal: parte geral. São Paulo: Altas, 1999 p. 255/256

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50Desta feita, a imposição desse regime depende de decisão do

juiz das execuções penais e poderá ter lugar, de acordo com a norma legal, sempre

que ocorrer “a prática de fato previsto como crime doloso”, que provoque “subversão

da ordem ou disciplina internas”. Também ficam sujeitos ao regime o preso que

apresentar “alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal ou da

cidade” e aquele sobre o qual recaiam “fundadas suspeitas de envolvimento ou

participação, a qualquer título, em organizações criminosas, quadrilha ou bando”.133

É válido destacar que há discussões acerca da

constitucionalidade do regime disciplinar diferenciado. Os defensores da medida

arguem, a respeito da necessidade social da medida como inibidora e punitiva da

prática delituosa, entretanto no Brasil vem sendo substituída, gerando com enorme

prejuízo para a segurança pública, por penas cada vez mais brandas e muitas vezes

os juízes substituem a pena de privação de liberdade por restrição de direitos.

Outrossim, muitos estudiosos a consideram o regime

inconstitucional, tendo em vista que fere a Constituição Federal, que dispõe, em

cláusulas pétreas que “ninguém será submetido à tortura nem a tratamento

desumano ou degradante” e “que não haverá penas cruéis" (art. 5º,III e XLVII).

133 JESUS, Damásio E. de. Direito penal, vol. 1: parte geral. 31 ed. São Paulo: Saraiva, 2010 p. 571/572.

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51

CAPÍTULO 3

O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA E O SISTEMA CARCERÁRIO

3.1 O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

O Estado Democrático de Direito é fundamentado em

princípios, construídos e aperfeiçoados durante séculos, de forma filosófica e

empírica, os quais são os norteadores da aplicabilidade de qualquer norma jurídica.

No entanto, há um princípio que se destaca entre os demais,

tão primordial que abrange a todos os outros, o princípio fundamental da dignidade

da pessoa humana.

3.1.1 CONCEITO

No que tange a tal princípio, cabe, inicialmente, destacar o

pensamento de Tomás de Aquino:

[...] a noção de dignidade humana encontra seu fundamento na circunstância de que o ser humano foi feito à imagem e semelhança de Deus, mas também radica na capacidade de toda determinação inerente à natureza humana, de tal sorte que, por força de sua dignidade, o ser humano, sendo livre por natureza, existe em função da própria vontade.134

Infere-se que a filosofia de Tomás de Aquino se relaciona ao

pensamento cristão, pautando-se entre a razão e a fé, que consiste justificar

racionalmente a existência de Deus e os dogmas religiosos.

134 SARLET. Ingo Wolfgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. 5 ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007 p. 31.

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52Destarte, a dignidade da pessoa humana, apresentada pelo

filósofo, está difundida em sua obra, onde se revela por meio de deduções

decorrentes de conceitos, noções e correlatos sobre Deus, o homem e a sociedade.

Segundo a doutrina de Günter Dürig, a dignidade da pessoa

humana consiste no fato de que “cada ser humano é humano por força de seu

espírito, que o distingue da natureza impessoal e que o capacita para, com base em

sua própria decisão, tornar-se consciente de si mesmo, de autodeterminar sua

conduta, bem como de formatar a sua existência e o meio em que o cincunda”.135

Por sua vez, Ingo Wolfgang Salet, explica que:

a dignidade da pessoa humana corresponde à qualidade intrínseca e distintiva de cada ser humano que o faz merecedor do mesmo respeito e consideração por parte do Estado e da comunidade, implicando, neste sentido, um complexo de direitos e deveres fundamentais que assegurem a pessoa tanto contra todo e qualquer ato de cunho degradante e desumano, como venham a lhe garantir as condições existenciais mínimas para uma vida saudável, além de propiciar e promover sua participação ativa e co-responsável nos destinos da própria existência e da vida em comunhão com os demais seres humanos.136

É valido destacar o entendimento da Ministra do Supremo

Tribunal Federal, Cármen Lúcia Antunes Rocha no que se refere à dignidade da

pessoa humana:

Dignidade é o pressuposto da idéia de justiça humana, porque ela é quem dita a condição superior do homem como ser de razão e sentimento. Por isso é que a dignidade humana independe de merecimento pessoal ou social. Não há de ser mister ter de fazer por merecê-la, pois ela é inerente à vida, e nessa contingência, é um direito pré-estatal. Toda pessoa é digna. Essa singularidade fundamental e insubstituível é ínsita à condição humana do ser humano, qualifica-o nessa categoria e o põe acima de qualquer indagação. Quando se questiona, nestes chamados tempos

135 SARLET, op. cit., p. 46.136 Apud SIRVINSKAS, Luis Paulo. Introdução ao estudo do direito penal: (evolução histórica, escola penais, valores constitucionais, princípios penais e processuais e direitos humanos). São Paulo: Saraiva, 2003. p 169.

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53modernos, se há de permitir ou não, o nascimento de um feto no qual se detecte a existência de anomalia a impossibilitá-lo para uma vida autônoma, está-se a infirmar aquela assertiva e a tornar a humanidade um meio para a produção de resultados e a desconhecer ou desprezar a condição do homem de ser que é fim em si mesmo e digno pela sua própria natureza. Aquilo se traduz, pois, como injustiça com os que não se apresentam em iguais condições psicofisiológicas, intelectuais etc. É a injustiça havida na indignidade revelada na desumanidade do tratamento dedicado ao outro. É a injustiça do utilitarismo que se serve do homem e o dota de preço segundo a sua condição peculiar, que se expressa numa forma ao invés de se valer pela essência humana de que se dota.137

No mesmo sentido, assevera Azevedo:

É a qualidade integrante e irrenunciável da condição humana, devendo ser reconhecida, respeitada, promovida e protegida. Não é criada, nem concedida pelo ordenamento jurídico, motivo porque não pode ser retirada, pois é inerente de cada ser humano.138

Observa-se que a dignidade da pessoa humana é um direito

natural, isso porque não foi criado pelo Estado, mas sim anteriormente a ele, sendo

inerente ao ser humano, cabendo mencionar que tal princípio, em virtude da

positivação, deu suporte ao processo de humanização na sociedade politicamente

organizada.

3.1.2 EVOLUÇÃO HISTÓRICA

Historicamente, cumpre ressaltar que o valor intrínseco da

dignidade da pessoa humana deita raízes no pensamento clássico e ideário

cristão.139

No contexto do cristianismo, a elaboração de uma concepção

de dignidade humana, surge no Antigo Testamento, verificando-se a idéia de que o

137 ROCHA, Carmem Lúcia. O princípio da dignidade da pessoa humana e a exclusão social. Revista do Instituto Brasileiro de Direitos Humanos, Fortaleza, ano 2, v. 2, n. 2, p.53-67, 2001. p.55-56.138 AZEVEDO, Antônio Juqueira. Réquem para uma certa Dignidade da Pessoa Humana. IN: Cunha Pereira, Rodrigo da (Coord.) Anais do III Congresso Brasileiro de Direito de Família. – Família e Cidadania. O novo CCB e a Vacatio Legis. Belo Horizonte: Dei Rey, IBDFAM, 2002 p. 41.139 SARLET, op. cit., p. 29/30.

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54ser humano foi criado por Deus à sua imagem e semelhança. Nesse sentido,

destaca-se o livro de Gênesis (capítulo 1, versículo 26):

Deus disse: Façamos do homem à nossa imagem, conforme nossa semelhança, domine sobre os peixes do mar, sobre as aves do céu, sobre os animais domésticos, e sobre toda a terra, e sobre o réptil que se arrasta sobre a terra.

Extrai-se da citação retro, que a concepção de dignidade

humana está na semelhança do ser humano ao divino, pelo fato de que o ser

humano é apresentado como o significado maior de todo o processo de criação.

Na Antiguidade Clássica, um dos primeiros relatos conhecidos

como dignidade da pessoa humana foi na Grécia, na obra de Sófocles, denominada

"Antígona", datada de 441 a.C.

Nessa peça, a personagem Antígona, percebendo que a

dignidade da pessoa de Polinice, seu irmão, estava sendo violada por não ter o

corpo sepultado, contrariou as ordens do Rei Creonte e as leis do Estado,

procedendo às honras fúnebres de seu consaguíneo.

Sófocles, na referida obra, defende o direito natural,

considerando-o superior e independente de qualquer lei escrita, além de elevar a

condição essencial da dignidade da pessoa humana.

Dessa vertente, destaca-se da referida obra:

[...] CREONTE. E te atreveste a desobedecer às leis? ANTÍGONA Mas Zeus não foi o arauto delas para mim, nem essas leis são as ditadas entre os homens pela Justiça, companheira de morada dos deuses infernais; e não me pareceu que tuas determinações tivessem força para impor aos mortais até a obrigação de transgredir normas divinas, não escritas, inevitáveis; não é de hoje, não é de ontem, é desde os tempos mais remotos que elas vigem, sem que ninguém possa dizer quando surgiram. E não seria por temer homem algum, nem o mais arrogante, que me arriscaria a ser punida pelos deuses por violá-las. Eu já sabia que teria de morrer (e como não?) antes até de o proclamares, mas, se me leva morte prematuramente, digo que para mim só há vantagem nisso. Assim, cercada de

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55infortúnios como vivo, a morte não seria então uma vantagem? Por isso, prever o destino que me espera é uma dor sem importância. Se tivesse de consentir em que ao cadáver de um dos filhos de minha mãe fosse negada a sepultura, então eu sofreria, mas não sofro agora. Se te pareço hoje insensata por agir dessa maneira, é como se eu fosse acusada de insensatez pelo maior dos insensatos [...] 140

Cabe lembrar que na metade do Século XVIII, Cesare Beccaria

insurgiu-se contra a prática da tortura, da pena de morte, das prisões desumanas e do

banimento, sobre o contexto da dignidade da pessoa humana, manifestando-se pela

proporcionalidade da pena ao delito.

No mesmo vértice, destacam-se as lições do filósofo Sêneca:

É necessário ressaltar que nenhuma dentre as virtudes é tão conveniente para o ser humano como a clemência, porque nenhuma é mais humana.141 Saiba como lutar contra os vícios. Resista e repreenda em alguns a enfermidade, iluda a outros com procedimentos suaves, visto que os curará de modo mais rápido e seguro, disfarçando os remédios. Preocupe-se o príncipe tanto com a saúde como em não deixar que fiquem marcas desonrosas. Nenhum rei alcança glória mediante um castigo cruel, embora possa infligi-lo. Ela será altaneira, quando livra a muitos da ira alheia e não sacrifica a ninguém à sua.142Clemência é a moderação de espírito humano no desempenho do poder de castigar ou então a brandura do superior em face do inferior, quando da aplicação da pena [...] Em todo caso, pode a clemência ser definida como uma inclinação da alma para o abrandamento do ato de impor o castigo.143

Observa-se nas passagens acima transcritas, que em 55 a.C.,

Sêneca, em sua obra “A Clemência”, se expressava acerca da dignidade humana,

ainda que implicitamente, fazendo menção à prudência quanto à aplicação da pena,

condenando as penas cruéis.

140 SÓFOCLES. A Trilogia Tebana: Édipo Rei, Édipo em Colono, Antígona. Tradução do grego, introdução e notas de Mário da Gama Kury. 6. ed. Rio de Janeiro: Jorge Zahar Ed., 1997. P.214/215.141 SÊNECA, A Clemência. Tradução do grego, introdução de Luiz Ferracine. São Paulo: Editora Escala, 2007. p. 31.142 SÊNECA, op. cit. p. 67.143 SÊNECA, op. cit. p. 95.

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56 3.1.3 A POSITIVAÇÃO E A VALORIZAÇÃO DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

Embora na Antiguidade já se havia feito menção ao princípio

da dignidade humana, somente no decorrer do Século XX tal princípio passou a

fazer parte de ordenamentos jurídicos positivos, podendo-se remeter à Constituição

Alemã de 1919 (Constituição de Weimar) como precursora da positivação da

dignidade humana, estabelecendo em seu artigo 151, inciso I, que o objetivo maior

da ordem econômica é o de garantir uma existência humana.144

Também as constituições de Portugal de 1933 em seu artigo

6, nº 3, e da Irlanda de 1937 (preâmbulo), consignavam expressa referência à

dignidade da pessoa humana.145

Contudo, ao longo do século XX, tão-somente a partir da

Segunda Guerra Mundial, a dignidade da pessoa humana passou a ser reconhecida

expressamente nas constituições, notadamente após ter sido consagrada pela

Declaração Universal da ONU de 1948146, in verbis:

Artigo I. Todos os seres humanos nascem livres e iguais em dignidade e direitos. São dotados de razão e consciência e devem agir em relação uns aos outros com espírito de fraternidade.

Nesse sentido, como bem explica Douglas Predo Mateus147:

“Os Direitos Humanos vêm sendo construídos ao longo da história humana, mas é

inegável que tais direitos sofreram grande impulso no séc. XX, especialmente após a

II Guerra Mundial”.

Piovesan148 explana que “a Declaração Universal de 1948, ao

introduzir a concepção contemporânea de direitos humanos, acolhe a dignidade

humana como valor a iluminar o universo de direitos”. Aduz, ainda, que a condição

144 SARLET, Ingo Wolgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 6ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 113.145 SARLET, loc. cit.146 SARLET, Ingo Wolgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. 5ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 64.147 MATEUS, Douglas Predo. O Direito fundamental à educação (artigo) - Anais do XV Congresso Nacional do CONPEDI, Florianópolis, 2007 – Fundação BOITEUX.148 PIOVESAN. Flávia. Direitos humanos: o princípio da dignidade humana e a constituição brasileira de 1988. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2005. p. 41/43.

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57humana “é requisito único e exclusivo para a titularidade de direitos. Isso porque

todo o ser humano é requisito que lhe é inerente, sendo incondicionada, não

dependendo de qualquer outro critério, senão ser humano”.

Ilustrando, em uma análise de direito comparado, destacam-se

os seguintes Estados que inseriram o princípio da dignidade humana em seu

ordenamento constitucional: dos países da União Européia, somente as

constituições da Alemanha (art. 1º, I), Espanha (preâmbulo e art. 10, I), Grécia (art.

2º, I), Irlanda (preâmbulo), Portugal (art. 1), consagraram expressamente o princípio,

também na constituição da Itália encontra-se referências expressa à dignidade na

passagem que reconhece todos os cidadãos da mesma dignidade social, inobstante,

não se tenha referido expressamente à dignidade da pessoa humana.149

A constituição da Bélgica, a partir de janeiro de 1994, passou a

incluir no artigo 23 tal princípio, assegurando aos estrangeiros que se encontrarem

em território belga de levar uma vida de acordo com a dignidade humana.150

A constituição da Turquia (art. 17, III), a despeito de não ter

reconhecido o principio da dignidade da pessoa humana em dispositivos autônomos,

não deixou de mencioná-lo, proibindo a aplicação de penas que atentem contra a

dignidade da pessoa humana.151

Já as constituições da Dinamarca, Holanda e Luxemburgo,

não mencionam a dignidade da pessoa humana entre seus princípios ou direitos

fundamentais.152

No âmbito do Mercosul, apenas a Constituição do Brasil (art.

1º, III) e a do Paraguai (preâmbulo), guindaram o valor da dignidade ao status de

norma fundamental.153

149 SARLET, Ingo Wolgang. A eficácia dos direitos fundamentais. 6ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2006. p. 113/114.150 SARLET, Ingo Wolgang. Dignidade da pessoa humana e direitos fundamentais na Constituição Federal de 1988. 5ª ed. Porto Alegre: Livraria do Advogado, 2007. p. 65.151 SARLET, op.cit., p. 64.152 SARLET, loc. cit.153 SARLET, op.cit., p. 65.

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58No que tange aos demais estados americanos, cumpre citar as

constituições de Cuba (art. 8º) e da Venezuela (Preâmbulo), além da referência

direta ao valor da dignidade da pessoa humana encontrada na Constituição do Peru,

onde são reconhecidos outros direitos além dos expressamente positivados, desde

que derivem da dignidade humana, da soberania popular, do Estado social e

democrático de Direito da forma republicana do governo (art. 4º). A Carta Magna da

Bolívia, de 1976, reformada em 1994, dispõe, em seu art. 6º, inc. II, que a dignidade

e a liberdade são invioláveis, incumbindo o Estado o dever de respeitá-las e protegê-

las. Igualmente a Constituição Chilena (art. 1º) e em que pese sua origem autoritária,

consta que os homens nascem livres e iguais em dignidade e direitos, reprisando, de

tal dicção da Declaração Universal de 1948, formulação esta também encontrada no

art. 4º da Constituição da Guatemala, que, no seu preâmbulo, fala na primazia da

pessoa humana.154

Na mesma linha evolutiva situam-se os países da Europa

Oriental, onde também se constata forte e majoritária tendência no sentido de

acolher a dignidade no contexto constitucional, referindo-se, a título exemplificativo,

a Constituição da Rússia, que passou a rever expressamente, em seu art. 121, que

“a dignidade da pessoa humana é protegida pelo Estado. Nada pode justificar seu

abatimento”.155

No mesmo âmbito, cabe, ainda, destacar que por meio da

Carta dos Direitos Fundamentais da União Européia, promulgada em Nice, em

dezembro de 2000, restou consignado em seu artigo 1º, que “A dignidade do ser

humano é inviolável. Deve ser respeitada e protegida”.156

3.1.4 DO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE HUMANA NA CONSTITUIÇÃO BRASILEIRA

Atendo-se ao ordenamento jurídico pátrio, o Princípio da

Dignidade da Pessoa Humana é acolhido como valor fundamental do Estado, além

de se tratar de uma cláusula pétrea. Nestes termos, destacam-se os seguintes

textos constitucionais:

154 SARLET, loc. cit.155 SARLET, op.cit., p. 65/66.156 SARLET, loc. cit.

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59Art. 1º - A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: [...]

III - a dignidade da pessoa humana;

Art. 4º - A República Federativa do Brasil rege-se nas suas relações internacionais pelos seguintes princípios: [...]

II - prevalência dos direitos humanos;

É valido ressaltar que o artigo 226 da Carta Magna, também

se refere expressamente ao princípio da dignidade da pessoa humana:

Art. 226. A família, base da sociedade, tem especial proteção do Estado. [...]

§ 7º - Fundado nos princípios da dignidade da pessoa humana e da paternidade responsável, o planejamento familiar é livre decisão do casal, competindo ao Estado propiciar recursos educacionais e científicos para o exercício desse direito, vedada qualquer forma coercitiva por parte de instituições oficiais ou privadas.

Desse modo, toda e qualquer norma brasileira deve atender

primordialmente o princípio da dignidade humana, e não é diferente com as leis

penais.

Segundo leciona Farias157:

O princípio fundamental da dignidade da pessoa humana cumpre um relevante papel na arquitetura constitucional: o de fonte jurídico-positiva dos direitos fundamentais. Aquele princípio é o valor que da unidade e coerência ao conjunto dos direitos fundamentais. Desta arte, o extenso rol de direitos e garantias fundamentais da constituição federal de 1988 traduz uma especificação e densificação do princípio fundamental da dignidade da pessoa humana (art. 3º, III).

No mesmo sentido, vale observar os ensinamentos de Taiar158:

157 FARIAS, Edilsom Pereira de. Colisão de direitos. Porto Alegre: Fabris, 2003. p. 395.158 TAIAR, Rogério. A dignidade da pessoa humana e o direito penal. São Paulo: SRS Editora, 2008. p. 76.

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60[...] o sistema penal deve incorporar em si os valores constitucionais e com base neles forjar sua estrutura específica, a qual deixará transparecer as feições da ideologia constitucional que lhe inspirou.

Segundo Palazzo159, dentre os valores penalmente

fundamentais “encontram-se os princípios estruturantes do Estado Constitucional

(artigos 1º a 4º), os princípios constitucionais penais expressos e implícitos (vários

incisos do artigo 5º), bem como todas as normas constitucionais (princípios e regras

que determinam a política criminal e a dogmática penal)”.

Continua dizendo que, com efeito, erigida como um dos

princípios estruturantes (artigo 1º, III), a dignidade humana é o fundamento máximo

constitucional em matéria penal e, quando da elaboração do ordenamento penal,

deixa de ser apenas um imperativo axiológico-normativo-constitucional, para se

tornar também um imperativo axiológico-normativo-penal.160

Taiar ainda esclarece a função garantista do sistema penal,

asseverando o princípio da dignidade humana:

A segunda função – garantista – corresponde à compatibilização entre o exercício da função protetiva e o padrão de política criminal, tanto na aplicação da lei penal em esfera dos cidadãos quanto na preservação da dignidade do agente do delito, com o objetivo de ressociá-lo. [...] Assim sendo, a inclusão social torna-se um dos objetivos primordiais do ordenamento penal. Perseguir esse propósito, também é promover a dignidade humana.161

Em consonância com a dignidade humana, há diversos

princípios que nela se fundamentam, tais como os expressos e implícitos no artigo 5º

da CRFB/88162, sendo possível elencar o princípio da legalidade penal (inc.

XXXIX163), do qual decorrem os princípios da reserva legal, da taxatividade e o da

159 PALAZZO, Francesco. Valores constitucionais e o direito penal. Porto Alegre: Fabris, 1989. p. 22-26.160 TAIAR, op.cit., p. 76.161 TAIAR, op.cit, p. 79.162 “Art. 5º Todos são iguais perante a lei, sem distinção de qualquer natureza, garantindo-se aos brasileiros e aos estrangeiros residentes no País a inviolabilidade do direito à vida, à liberdade, à igualdade, à segurança e à propriedade, nos termos seguintes:”163 “XXXIX - não há crime sem lei anterior que o defina, nem pena sem prévia cominação legal”;

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61retroatividade da lei penal mais benigna e irretroatividade da mais gravosa (inc.

XL164), bem como encontramos o princípio do devido processo legal (inc. LIII165,

LIV166 e LVI167), o princípio processual do contraditório e da ampla defesa (inc. LV168

e XXXVIII169) e o princípio da presunção de inocência do acusado (inc. LVII170).

Taiar ainda enumera alguns princípios constitucionais

implícitos derivados do princípio da dignidade humana: da proporcionalidade, da

insignificância, da intervenção mínima, da responsabilidade pessoal (inc. LVI171), da

individualização da pena (inc. XLVI172), o da humanidade (inc. III173, XLVII174, XLIX175

e L176).177

Destarte, a presença do princípio da dignidade da pessoa

humana em matéria penal, como se percebe, se faz presente por meio dos

princípios constitucionais, tanto os especificamente penais, como os pertinentes ao

direito penal.

164 “XL - a lei penal não retroagirá, salvo para beneficiar o réu”.165 “XLIII - a lei considerará crimes inafiançáveis e insuscetíveis de graça ou anistia a prática da tortura, o tráfico ilícito de entorpecentes e drogas afins, o terrorismo e os definidos como crimes hediondos, por eles respondendo os mandantes, os executores e os que, podendo evitá-los, se omitirem”;166 “LIV - ninguém será privado da liberdade ou de seus bens sem o devido processo legal”;167 “LVI - são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”;168 “LV - aos litigantes, em processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados o contraditório e ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”;169 “XXXVIII - é reconhecida a instituição do júri, com a organização que lhe der a lei, assegurados: a) a plenitude de defesa; b) o sigilo das votações; c) a soberania dos veredictos; d) a competência para o julgamento dos crimes dolosos contra a vida;”170 “LVII - ninguém será considerado culpado até o trânsito em julgado de sentença penal condenatória”;171 “LVI - são inadmissíveis, no processo, as provas obtidas por meios ilícitos”;172 “XLVI – a lei regulará a individualização da pena e adotará, entre outras, as seguintes: a) privação ou restrição da liberdade; b) perda de bens; c) multa; d) prestação social alternativa; e) suspensão ou interdição de direitos”;173 “III - ninguém será submetido à tortura nem a tratamento desumano ou degradante”;174 “XLVII - não haverá penas: a) de morte, salvo em caso de guerra declarada, nos termos do art. 84, XIX; b) de caráter perpétuo; c) de trabalhos forçados; d) de banimento; e) cruéis”;175 “XLIX - é assegurado aos presos o respeito à integridade física e moral”;176 “L - às presidiárias serão asseguradas condições para que possam permanecer com seus filhos durante o período de amamentação”;177 TAIAR, op.cit., p. 80.

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62 3.1.5 O PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA E O SISTEMA PENITENCIÁRIO

O sistema penitenciário apresenta vários problemas históricos

como o desrespeito aos apenados, a ausência de atividade educativa e laboral do

cárcere, e principalmente a superpopulação carcerária e a desconsideração das

recomendações da ONU no que se refere à adoção de medidas concretas para

aprimorar as condições do sistema penal. Tais fatos desrespeitam a dignidade

humana, bem como privam os encarcerados de direitos elementares.

Observa-se que o ordenamento jurídico mundial é vasto no

que se refere à dignidade da pessoa humana. Além da Declaração Universal dos

Direitos Humanos de 1948, como já citada, pode-se destacar a Convenção

Americana de Direitos Humanos de 1969, também conhecido como Pacto de São

José da Costa Rica, o qual o Brasil é signatário, dispõe em seu Artigo 5º que

“Ninguém deve ser submetido a torturas, nem a penas ou tratos cruéis, desumanos

ou degradantes. Toda pessoa privada de liberdade deve ser tratada com o respeito

devido à dignidade inerente ao ser humano”.

O Pacto Internacional dos Direitos Civis e Políticos – ONU, de

1966, estabelece que:

Artigo 7º - Ninguém poderá ser submetido a tortura, nem a penas ou tratamentos cruéis, desumanos ou degradantes. Será proibido, sobretudo, submeter uma pessoa, sem seu livre consentimento, a experiências médicas ou científicas.

Artigo 10 – §1. Toda pessoa privada de sua liberdade deverá ser tratada com humanidade e respeito à dignidade inerente à pessoa humana.

a) As pessoas processadas deverão ser separadas, salvo em circunstâncias excepcionais, das pessoas condenadas e receber tratamento distinto, condizente com sua condição de pessoas não condenadas.

b) As pessoas jovens processadas deverão ser separadas das adultas e julgadas o mais rápido possível.

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63§ 2º. O regime penitenciário consistirá em um tratamento cujo objetivo principal seja a reforma e reabilitação moral dos prisioneiros. Os delinqüentes juvenis deverão ser separados dos adultos e receber tratamento condizente com sua idade e condição jurídica.

Por fim, estabelece a Convenção contra a tortura e outros

tratamentos ou penas cruéis, desumanos ou degradantes – ONU, de 1984, que:

Artigo 11 - Cada Estado Parte manterá sistematicamente sob exame as normas, instruções, métodos e práticas de interrogatório, bem como as disposições sobre a custódia e o tratamento das pessoas submetidas, em qualquer território sob a sua jurisdição, a qualquer forma de prisão, detenção ou reclusão, com vistas a evitar qualquer caso de tortura.

Artigo 12 - Cada Estado Parte assegurará que suas autoridades competentes procederão imediatamente a uma investigação imparcial, sempre que houver motivos razoáveis para crer que um ato de tortura tenha sido cometido em qualquer território sob sua jurisdição.

A Resolução nº 1998/23 do Conselho Econômico e Social da

ONU, produziu a chamada “Cooperação Internacional com vista à redução da

superpopulação carcerária”, documento que trás recomendações específicas para

dedução da população carcerária, incentivando à aplicação de penas alternativas,

em razão da ineficácia do cárcere e reinserção social do condenado em respeito à

dignidade humana.

No âmbito nacional, destaca-se, a Constituição da República

Federativa do Brasil de 1988, conforme já mencionado, a Lei de Execuções Penais

(Lei 7.210/84), em seu artigo 3º, o qual dispõe que “Ao condenado e ao internado

serão assegurados todos os direitos não atingidos pela sentença ou pela lei”,

cumpre-se salientar que é a mesma dicção do artigo 38 do Código Penal, além do

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64artigo 40178 e 41179, ambos do diploma de execução penal, que garante ao apenado

respeito a seus direitos, integridade física e moral.

O Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária

(CNPCP), motivado pela discussão havida no IV Congresso das Nações Unidas

sobre a Prevenção do Delito e Tratamento do Delinqüente, realizado em Kioto, em

1970, bem como no V Congresso das Nações Unidas, ocorrido em Genebra, em

1975, fixou regras mínimas para o tratamento do preso no Brasil por meio da

Resolução n.º 14, de 11 de novembro de 1994.180

Apenas para melhor ilustrar o que fora explanado cita-se

Jesus:

[...] A declaração Universal dos Direitos do Homem, em seu art. 5º, estabelece que ‘ninguém será submetido tratamento degradante. A Convenção Americana sobre Direitos Humanos (Pacto de São José), tratando dos direitos à incolumidade pessoal, prevê à integridade moral do condenado na aplicação e execução da pena (art. 5, nº 1), respeito devida à dignidade interna ao ser humano (n. 2) e ‘à sua honra’ (art. 11 n.2). Nessa linha, a Carta Magna de 1988 assegurou aos presos respeito à integridade moral (art. 5º, XLIX), seguindo a regra de que ‘ninguém será submetido a tratamento degradante (art. 5º, III), mandamentos aplicáveis às penas restritivas de direitos. E a LEP, em seu art. 40, impões a todas as autoridades respeito à integridade moral dos detentos, determinando que a execução da pena ‘tem por objetivo proporcionar condições para a harmônica integração social do condenado’, o que não se obterá se ficar sujeito

178 “Art. 40 - Impõe-se a todas as autoridades o respeito à integridade física e moral dos condenados e dos presos provisórios”.179 “Art. 41 - Constituem direitos do preso: I - alimentação suficiente e vestuário; II - atribuição de trabalho e sua remuneração; III - Previdência Social; IV - constituição de pecúlio; V - proporcionalidade na distribuição do tempo para o trabalho, o descanso e a recreação; VI - exercício das atividades profissionais, intelectuais, artísticas e desportivas anteriores, desde que compatíveis com a execução da pena; VII - assistência material, à saúde, jurídica, educacional, social e religiosa; VIII - proteção contra qualquer forma de sensacionalismo; IX - entrevista pessoal e reservada com o advogado; X - visita do cônjuge, da companheira, de parentes e amigos em dias determinados; XI - chamamento nominal; XII - igualdade de tratamento salvo quanto às exigências da individualização da pena; XIII - audiência especial com o diretor do estabelecimento; XIV - representação e petição a qualquer autoridade, em defesa de direito; XV - contato com o mundo exterior por meio de correspondência escrita, da leitura e de outros meios de informação que não comprometam a moral e os bons costumes. XVI – atestado de pena a cumprir, emitido anualmente, sob pena da responsabilidade da autoridade judiciária competente”.180 MINISTÉRIO DA JUSTIÇA. Regras mínimas para o tratamento do preso no Brasil. Ministério da Justiça, Brasília: Ministério da Justiça, 2007.

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65ao escárnio da coletividade em face de natureza da sanção imposta [...]181

Acerca das mazelas do sistema penitenciário brasileiro,

destaca-se entendimento de Romeu Falconi:

[...] o sistema penitenciário brasileiro é desorganizado, faltam verbas públicas, é defeituoso, perverso e sobrevivente de improvisações, onde o condenado cumpre sua pena em condições precárias e desumanas. Um estabelecimento de superlotação onde a falta de espaço leva corrupção á outros setores internos, revelando a difícil realização laboral do preso que contradita o Código Penal, que, ao invés de educar e contribuir para sua formação e valorização social e retributiva, o que se constatam é a exploração e a pouca remuneração deste trabalho, logrando dessa forma a proposta de ressocialização e, fazendo emergir todos os meios como fonte de renda, com o conluio de funcionários da instituição prisional: o tráfico de drogas, o repasse de alimentação, a mercantilização sexual de jovens presos. Destarte, tais reajustes decorrentes da desordem laboral do preso, deteriorizam as relações humanas, tornando-se abjecto o trabalho do apenado, destituindo-o de dignidade, desponjando-o de seus direitos e aniquilando qualquer possibilidade de reintegração social.182

Silva afirma que:

[...] A prisão é realmente monstruosa, [...] A política criminal hoje dominante no pensamento científico dos estudiosos do direito penal é: a prisão só em ultima ratio, só em último caso. O cidadão, não sendo perigoso, vamos encontrar outra maneira de permitir que ele volte à sociedade. Ainda, há mais argumentos em favor desta posição: é que o preso custa muito dinheiro, de três a sete salários mínimos por mês. Se você der esse dinheiro ao preso, em muitos casos, ele não vai cometer crime algum [...] nos casos em que a prisão é desnecessária para a recuperação do indivíduo, o justo, o correto, o inteligente, o racional, é que não haja prisão [...]183

181 JESUS. Damásio E. de. Penas Alternativas: anotação da Lei 9.714, de novembro de 1988. 2 ed. São Paulo: Saraiva, 2000 p. 38.182 FALCONI, Romeu. Sistema Presidial: reinserção social? São Paulo: Ícone Editora, 1998. p. 48, 68, 70 e 79.183 SILVA, Evandro Lins e. O salão dos passos perdidos depoimento ao cpdoc. 5ª impressão. Rio de Janeiro: Editora Nova Fronteira, 1997. p. 214/215.

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66Para Nicoli:

[...] a imagem do presídio contemporâneo é, decerto, das figuras mais incômodas e desafiadoras para a proteção dos direitos humanos, constituindo mazela sempre urgente. Não nos parece necessário, sequer, descrever aquilo que é óbvio ululante. O quadro de barbárie das condições carcerárias é conhecido de todos. Também o são as conseqüências da suposta reabilitação penal pela privação de liberdade. A bestialização patrocinada pelo ‘tratamento prisional’ para os egressos do cárcere alia-se a todo o patológico sistema para nos levar à conclusão de que a prisão soçobra.184

Portanto, como se nota do exposto, atualmente o princípio da

dignidade da pessoa humana não é respeitado nos estabelecimentos carcerários

brasileiros, incluindo-se os ergástulos catarinenses. Nesse sentido, destacam-se

precedentes jurisprudenciais:

AGRAVO DE INSTRUMENTO. PRESÍDIO SUPERLOTADO. OFENSA AO PRINCÍPIO DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA. EXEGESE DOS INCISOS III, XLVIII, XLIX DO ART. 5º DA CARTA MAGNA. SUPERLOTAÇÃO. CONDIÇÕES INSALUBRES. RISCO À SEGURANÇA E SAÚDE PÚBLICAS. REMOÇÃO. MEDIDA COM CARÁTER URGENTE. LIMINAR MANTIDA. RECURSO DESPROVIDO.185

PRESIDIÁRIO. INTEGRIDADE FÍSICA E MORAL. RESPEITO À DIGNIDADE HUMANA. GARANTIA INDIVIDUAL. É princípio fundante do Estado Democrático de Direito o respeito á dignidade da pessoa humana. Constitui garantia individual que ninguém será submetido à tortura ou tratamento degradante, inclusive preso na sua integridade física e moral, devendo a lei punir as práticas atentatórias aos direitos fundamentais, direitos que se opõem ao Estado, de forma auto-aplicável, sem prejuízo dos vários tratados de que somos signatários, recentemente compilados pelo Centro de Estudos da Procuradoria Geral do Estado, que instrumentaliza proteção de direitos humanos.186

184 NICOLI. Pedro Augusto Gravatá. Trabalho encarcerado e privatização dos presídios: reflexões à luz da convenção 29 da OIT. Disponível em http://www.conpedi.org.br/manaus/ arquivos/anais/brasilia/11_226.pdf. Acessado em 13/03/11.185 BRASIL. Tribunal de Justiça de Santa Catarina. Agravo de Instrumento n. 2008.006338-1, Relator Desembargador José Volpato de Souza, julgado em 27.11.2008.

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67Vale suscitar, por fim, decisum do magistrado Marcos d’Avila

Scherer, titular da Segunda Vara Cível da Comarca de Navegantes, Santa Catarina:

“Inaceitável que seres humanos sejam mantidos em situação tal como a vivenciada na carceragem da Delegacia de Polícia de Navegantes. Não é preciso sequer enumerar os direitos que estão sendo violados pelo Estado de Santa Catarina ao manter os presos provisórios naquelas condições. Argumentos acerca da chamada reserva do possível não merecem guarida diante de tais quadro. A tese de que não se pode impor ao Estado uma obrigação que depende de recursos financeiros escassos não me parece mais importante que o resguardo da integridade física das pessoas submetidas ao poder estatal, respeitadas as opiniões em contrário. Adentrando apenas de forma perfunctória na chamada teoria do custo dos direitos, é possível afirmar atualmente que nenhum direito se mostra desacompanhado de um custo a ser suportado pela sociedade, mesmo aqueles tradicionalmente chamados de primeira geração187. Portanto, sustentar a flagrante violação ao direito da dignidade da pessoa humana que se encontra enclausurada na Delegacia de Navegantes na ausência de recursos financeiros soa verdadeiramente pouco razoável.”188

Para o resgate da dignidade da pessoa humana na atual

realidade carcerária brasileira, faz-se mister a reestruturação de todo o sistema

prisional, evitando-se a superpopulação carcerária e propiciando à pena a sua real

função, qual seja, ressocializar.

Um dos principais pressupostos para garantir a efetividade da

ressocialização do apenado é a submissão deste à realização de atividades laborais

(trabalho prisional), que contribuam para sua qualificação profissional, de modo a

garantir a reintegração à sociedade de forma humanamente digna.

186 BRASIL. Vara da Comarca de Altinópolis, SP. Ação Indenizatória. Processo n. 323/97, relator: Juiz Evandro Renato Pereira.187 Segundo Marcelo Antônio Teodoro (in Direitos Fundamentais e sua concretização. Cuiabá: Juriá, 2002. p. 28/29), são direitos de notória inspiração jus naturalista, como o direito à vida, à liberdade, á propriedade e à igualdade perante a lei (igualdade normal). Complementam-se esses direitos pelas chamadas liberdades (de expressão, e imprensa, reunião e associação) e pelos direitos de participação política, como o direito ao voto e à capacidade eleitoral.188 BRASIL, 2ª Vara da Comarca de Navegantes, SC. Ação Civil Pública. Processo n. 135.10.004590-5, relator: Juiz Marcos d’Ávila Scherer. Decisão proferida em de 07 de abril de 2010. fls. 38/40.

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CAPÍTULO 4

O TRABALHO CARCERÁRIO

4.1 O TRABALHO CARCERÁRIO

De acordo com Dallari189, “o trabalho permite que a pessoa

desenvolva sua capacidade física e intelectual, conviva de modo positivo com outros

seres humanos, realize-se integralmente como pessoa, obtenha condições

financeiras para suprir suas necessidades básicas, melhore sua auto–estima e

comunicação além de outros benefícios”.

Com efeito, a constituinte de 1988 deu grande valor ao

trabalho, conforme se extrai dos artigos 1º, 170 e 193:

Art. 1º A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: [...]

IV - os valores sociais do trabalho e da livre iniciativa;

Art. 170. A ordem econômica, fundada na valorização do trabalho humano e na livre iniciativa, tem por fim assegurar a todos existência digna, conforme os ditames da justiça social, observados os seguintes princípios [...]

Art. 193. A ordem social tem como base o primado do trabalho, e como objetivo o bem-estar e a justiça sociais.

É importante ressaltar que no Brasil a ociosidade é anti-social

e a vadiagem é classificada como um ilícito penal previsto no artigo 59, caput, da Lei

de Contravenções Penais.

Logo, para que a sociedade e o Estado possam ter

legitimidade em abominar a ociosidade e a vadiagem, devem primeiramente assumir

efetivamente a responsabilidade de proporcionar oportunidades de trabalho a todos.

189 DALLARI, Dalmo de Abreu. Direitos Humanos e Cidadania, São Paulo: Moderna, 2006, p. 41.

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69 O que se verifica, entretanto, é que muitos governos

desenvolvem políticos voltados apenas para economia, considerando o desemprego

como algo participante e pacífico.190

Segundo Medeiros:

[...] a laboterapia é a pedra de toque de toda a moderna Penalogia. O trabalho acaba com a promiscuidade carcerária, com os malefícios da contaminação dos primários pelos veteranos delinquentes e dá ao condenado a sensação de que a vida não parou e de que ele continua a ser útil e produtivo, além de evitar a solidão, que gera neuroses, estas, por sua vez, fator de perturbação nos estabelecimentos penais e fermento de novos atos delituosos.191

A verdade é que a ociosidade impera em nossos presídios, e

como bem diz Heleno Fragoso, “como não há orientação no sentido de incentivar

escolas profissionalizantes que ensinem os internos e aperfeiçoem os seus

conhecimentos, perdem a oportunidade de utilizar maneira mais produtiva no

período da pena e de desenvolver suas aptidões, as quais se vêem adaptadas às

necessidades da prisão”.192

Segundo Juçara Fernandes Leal193, “a falta de trabalho numa

penitenciária estimula a pederastia, dá oportunidades para que os presos criem

novas formas de delinquir e maquinem vingança”.

Em consonância, leciona Mesquita Júnior:

De há muito é conhecido o brocardo popular de que a mente vazia é a oficina do diabo. Assim, a LEP dá o devido destaque à questão laborativa, infelizmente, não compreendido tal aspecto, haja vista a visível deficiência de oportunidade para os privados de liberdade. Estimados, nos dias de hoje – out./08 – em mais de 450.000 privados de liberdade, o percentual daqueles que labutam mal atinge 20%. Quadro deveras lamentável.194

190 DALLARI, op. cit.,.p. 50.191 MEDEIROS, Rui. Prisões Abertas. Forense, 1985. p. 61.192 FRAGOSO, Heleno Cláudio. Direitos dos Presos. Forense, 1980. p. 107.193 LEAL, Juçara Fernandes. O Trabalho Penitenciário. Revista da Faculdade de direito da Universidade Federal de Minas Gerais, v. 27, n. 22, p. 221-240, out. 1979. p. 224.194 KUEHNE, Maurício. Lei de Execução Penal anotada. 8 ed. Curitiba: Juruá, 2010 p. 154.

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70Extrai-se da leitura da Exposição de Motivos à Lei de

Execução Penal que o trabalho dos condenados tem a finalidade de educar e gerar

produção, garantindo também a dignidade humana:

56. O Projeto conceitua o trabalho dos condenados presos como dever social e condição de dignidade humana tal como dispõe a Constituição, no artigo 160, inciso II, assentando-o em dupla finalidade: educativa e produtiva.195

Atualmente, a Lei de Execução Penal trata sobre o trabalho

prisional dentro dos artigos 28 a 37, destacando-se no presente momento os três

primeiros dispositivos, in verbis:

Art. 28 - O Trabalho do condenado, como dever social e condição de dignidade humana, terá finalidade educativa e produtiva.

§ 1º Aplicam-se à organização e aos métodos de trabalho as precauções relativas à segurança e à higiene.

§ 2º O trabalho do preso não está sujeito ao regime da Consolidação das Leis do Trabalho.

Art. 29 – O trabalho do preso será remunerado, mediante prévia tabela, não podendo ser inferior a três quartos do salário mínimo.

§ 1º O produto da remuneração pelo trabalho deverá atender:

a) à indenização dos danos causados pelo crime, desde que determinados judicialmente e não reparados por outro meio;

b) à assistência à família;

c) às pequenas despesas pessoais;

d) ao ressarcimento ao Estado das despesas realizadas com a manutenção do condenado em proporção a ser fixada e sem prejuízo da destinação prevista nos parágrafos anteriores;

195 MAIA NETO, Cândido Furtado. Direitos humanos do preso: lei de execução penal, Lei nº 7.210/84. Rio de Janeiro: Forense, 1998. p. 65.

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71§ 2º Ressalvadas outras aplicações legais, será depositada a parte restante para constituição do pecúlio, em cadernetas de poupança que será entregue ao condenado quando posto em liberdade.

Art. 30 – As tarefas executadas como prestação de serviços à comunidade não serão remuneradas.

Cabe ressaltar ainda as disposições do artigo 39, inciso V196, e

41, inciso II197, que dispõem ser o trabalho um dever e um direito do preso,

respectivamente, o artigo 50, inciso VI198, prevendo falta grave para o

descumprimento do dever de trabalhar.

O trabalho é um direito e uma obrigação do condenado, sendo

que os preceitos constantes na LEP, bem como os insertos no Código Penal (arts.

34-36199), têm vasto apoio doutrinário. Historicamente, a preocupação com o trabalho

sempre esteve presente em nosso ordenamento jurídico, o que se pode verificar

com a inserção de vários artigos regulamentando o trabalho penitenciário200.201

Desse modo, todo o capítulo III do título II do CEC202 é

destinado ao trabalho, dispondo este é dever de condenado (art. 28, caput), salvo o

196 BRASIL, Lei nº 7.210 de 1984 - LEP – Art. 39 – Constituem deveres do condenado: [...] V – execução do trabalho, das tarefas e das ordens recebidas.197 BRASIL, Lei nº 7.210 de 1984 - LEP - Art. 41 – Constituem direitos dos presos: [...] II – atribuição de trabalho e sua remuneração.198 BRASIL, Lei nº 7.210 de 1984 - LEP – Art. 50 – Comete falta grave o condenado à pena privativa de liberdade que: [...] VI – inobservar os deveres previsto nos incisos II e V do artigo 39 desta lei.199 Art. 34 - O condenado será submetido, no início do cumprimento da pena, a exame criminológico de classificação para individualização da execução. § 1º - O condenado fica sujeito a trabalho no período diurno e a isolamento durante o repouso noturno. § 2º - O trabalho será em comum dentro do estabelecimento, na conformidade das aptidões ou ocupações anteriores do condenado, desde que compatíveis com a execução da pena. § 3º - O trabalho externo é admissível, no regime fechado, em serviços ou obras públicas; Art. 35 - Aplica-se a norma do art. 34 deste Código, caput, ao condenado que inicie o cumprimento da pena em regime semi-aberto. § 1º - O condenado fica sujeito a trabalho em comum durante o período diurno, em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento similar. § 2º - O trabalho externo é admissível, bem como a freqüência a cursos supletivos profissionalizantes, de instrução de segundo grau ou superior; Art. 36 - O regime aberto baseia-se na autodisciplina e senso de responsabilidade do condenado. § 1º - O condenado deverá, fora do estabelecimento e sem vigilância, trabalhar, freqüentar curso ou exercer outra atividade autorizada, permanecendo recolhido durante o período noturno e nos dias de folga. § 2º - O condenado será transferido do regime aberto, se praticar fato definido como crime doloso, se frustrar os fins da execução ou se, podendo, não pagar a multa cumulativamente aplicada. 200 O Projeto de Código Penitenciário nº 1, de 1935, foi elaborado em 1933, regulamentando o trabalho em seu título IX (artigos 509-555).201 MESQUITA JÚNIOR. op. cit., p. 170.202 Código de Execução Criminal.

Page 72: O TRABALHO DO APENADO COMO INSTRUMENTO DE RESGATE …siaibib01.univali.br/pdf/Aline Vieira Silva.pdf · realiza através de processo de igual nome, mediante meios executórios de

72condenado por crime político (art. 200) devendo-se se aplicar às preocupações de

higiene e segurança (art. 28, § 1º), mas que o trabalho do preso não se enquadra no

regime celetista (art. 28, § 2º).203

Consoante § 1º do art. 28 da LEP, necessário se faz

estabelecer para o trabalho penitenciário as mesmas exigências em relação à

higiene que existe no trabalho livre e as prescrições preventivas de segurança. Cabe

ao Estado a proteção, responsabilizando-se pelos acidentes.

A remuneração obrigatória do trabalho prisional, por sua vez,

foi introduzida em nosso ordenamento jurídico pela Lei 6.416 de 1977 e acolhida

pela Lei de Execução Penal. Esta dispõe que o trabalho do preso não estando

sujeito ao regime da Consolidação das Leis do Trabalho (art. 28, § 2º), será

remunerado, mediante prévia tabela, não podendo ser inferior a ¾ do salário mínimo

(art. 29, caput), assim, a obrigatoriedade do trabalho no presídio decorre da falta do

pressuposto de liberdade, pois, em contrário, poder-se-ia considerar a sua prestação

como manifestação de um trabalho livre, que conduziria a sua inclusão no

ordenamento jurídico trabalhista.204

Dispõe o artigo 29 da Lei de Execução Penal sobre a

destinação do rendimento do trabalho penitenciário, como o fizera em parte, a Lei

6.416 de 1977, prevendo o desconto para indenização do dano ex delito e

assistência a família, bem como o ressarcimento do Estado pela despesa com a

manutenção do preso ou internado.205

A esse respeito, merece guarida o comentário de Pimentel:

O trabalho do preso deve ser remunerado não apenas do pagamento do pecúlio, a cargo do Estado, mas propiciando-se ao interno uma ocupação rendosa que tenha uma direta relação de proporcionalidade com o seu ganho. Para o preso institucionalizado o trabalho é um valor negativo. Mas o dinheiro é um fator positivo. Conjugar esses dois valores, para que o interno, objetivando o fim

203 MESQUITA JÚNIOR, Sidio Rosa de. Execução Criminal. 6ª ed. São Paulo: Atlas, 2010. p. 170.204 PRADO, Luis Regis. Curso de Direito Penal Brasileiro. 7ª ed. São Paulo: RT, 2007. p. 575.205 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução Penal. 10ª ed. São Paulo: Atlas, 2002. p. 93.

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73(dinheiro), habitue-se com o meio (trabalho), é uma estratégia necessária.206

Além disso, parte da remuneração do trabalho carcerário

desonera os cofres públicos, pois “o preso deverá pagar o custeio de sua estada no

estabelecimento penal a fim de que as prisões não sejam pesos mortos para o

Estado”.207

As disposições seguintes da LEP referentes ao trabalho

prisional tratam acerca do trabalho interno e externo dos apenados.

4.1.1 TRABALHO INTERNO

Trabalho interno, como a própria nomenclatura sugere, é o

trabalho realizado nas dependências do ergástulo prisional, nos moldes dos artigos

31 a 35 da LEP:

Art. 31 – O condenado à pena privativa de liberdade está obrigado ao trabalho na medida de suas aptidões e capacidade.

Parágrafo único – Para o preso provisório o trabalho não é obrigatório, e só deverá ser executado no interior do estabelecimento.

Art. 32 – Na atribuição do trabalho deverão ser levadas em conta a habilitação, a condição pessoal e as necessidades futuras do preso, bem como as oportunidade oferecidas pelo mercado.

§ 1º Deverá ser limitado tanto quanto possível o artesanato sem expressão econômica, salvo nas regiões de turismo.

§ 2º Os maiores de 60 (sessenta) anos poderão solicitar ocupação adequada à sua idade.

§ 3º Os doentes ou deficientes físicos somente exercerão atividades apropriadas ao seu estado.

206 PIMENTEL, Manoel Pedro. O crime e a pena na atualidade. São Paulo: RT, 1983. p. 352.207 LEAL, Juçara Fernandes. O Trabalho Penitenciário. Revista da Faculdade de direito da Universidade Federal de Minas Gerais, v. 27, n. 22, p. 221-240, out. 1979. p 225.

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74Art. 33 – A jornada normal e trabalho não será inferior à 6 (seis) nem superior à 8 (oito) horas, com descanso nos domingos e feriados.

Parágrafo único – poderá ser atribuído horário especial de trabalho aos presos designados para os serviços de conservação e manutenção do estabelecimento penal.

Art. 34 – O trabalho poderá ser gerenciado por fundação, ou empresa pública, com autonomia administrativa, e terá por objetivo a formação profissional do condenado.

§ 1º Nessa hipótese, incumbirá a comunidade gerenciadora promover e supervisionar a produção, com critérios e métodos empresariais, encarregar-se de sua comercialização, bem como suportar as despesas, inclusive pagamento de remuneração adequada.

§ 2º Os governos federal, estadual e municipal poderão celebrar convênio com a iniciativa privada, para implantação de oficinas de trabalho referentes à setores de apoio dos presídios.

Art. 35 – Os órgão da administração direta ou indireta da União, dos Estados, Territórios, Distrito Federal e dos Municípios adquirirão, com dispensa de concorrência pública, os bens ou produtos do trabalho prisional, sempre que não for possível ou recomendável realizar-se a venda à particulares.

Parágrafo único – Todas as importâncias arrecadadas com as vendas reverterão em favor da fundação ou empresa pública a que alude o artigo anterior ou, na sua falta, do estabelecimento penal.

O artigo 31 da Lei de Execução Penal, além de confirmar o

dever de trabalhar do preso, refere-se às aptidões e capacidade do condenado,

remetendo-se às condições físicas, mentais, intelectuais e profissionais do detento.

Cita-se, por oportuno, o item 58 das Exposições de Motivos da

Lei de Execução Penal:

58. Evitando possíveis antagonismos entre a obrigação de trabalhar e o princípio da individualização da pena, a LEP dispõe que a

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75atividade laboral será destinada ao preso na medida de suas aptidões e capacidade. Serão levadas em conta a habilitação, a condição pessoal e as necessidades futuras do preso, bem como as oportunidades oferecidas no mercado.

Segundo Mirabete:

[...] o trabalho nas prisões, que podem ser industrial, agrícola ou intelectual, tem como finalidade alcançar a reinserção social do condenado e, por isso, deve ser orientado segundo as aptidões dos presos, evidenciadas no estudo da personalidade e outros exames, tendo-se em conta, também, a profissão ou ofício que o preso desempenhava antes de ingressar no estabelecimento. Na medida do possível, deve permitir-se que o preso eleja o trabalho que prefere e para o qual se sinta mais motivado e atraído. Devem ser levadas em conta, todavia, a habilitação, a condição pessoal e as necessidades futuras do preso, bem como as oportunidades oferecidas pelo mercado.208

De acordo com as Regras Mínimas da ONU, o trabalho deve

ser suficiente para ocupar o preso durante a duração de uma jornada normal (nº

71.3209), devendo a lei ou regulamento fixar o número máximo da atividade

laborativa, tendo em conta os regulamentos ordinários e os usos locais referentes ao

emprego do trabalhador livre (75.1210).211

Mesquita Júnior, remetendo-se às dependências e a estrutura

dos presídios no que tange à efetividade do trabalho prisional, diz que:

[...] o trabalho é um direito buscado por todo preso, visto que trará benefícios para o mesmo como no cômputo da pena. Infelizmente, o presídio não está aparelhado para assegurar a eficácia da lei, com efeito, a grande maioria dos condenados que se encontram em regime fechado não está classificada para o trabalho, o que representa um desvio na execução, pois um direito não está sendo assegurado, sendo que a concretização do trabalho atende ao

208 MIRABETE, op. cit., 93/94.209 71.3. Será proporcionado aos reclusos um trabalho produtivo, suficiente para ocupá-los durante a jornada normal de trabalho.210 75.1 A lei e o regulamento administrativo fixaram o número máximo de horas de trabalho para os reclusos, por dia e por semana, tomando em consideração os usos locais seguidos com respeito dos trabalhadores livres.211 MIRABETE, op. cit., p. 96.

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76objetivo da reintegração social do detento. Assim, independentemente do regime fixado, o condenado terá direito ao trabalho212.

Nota-se que a LEP limita o tipo de trabalho a ser realizado

pelos apenados, sendo que o artesanato sem expressão econômica, por exemplo, é

permitido apenas nos presídios existentes em regiões de turismo (item 61 da

Exposições de Motivos).

4.1.2 TRABALHO EXTERNO

Acerca do trabalho externo dos apenados, dispõe o item 54 da

Exposição de Motivos da LEP:

54. O Projeto adota a idéia de que o trabalho penitenciário deve ser organizado de forma tão aproximada quanto o possível do trabalho na sociedade. Admite-se por isso, observado o grau de recuperação e os interesses de segurança pública, o trabalho externo do condenado, nos estágios finais de execução da pena.

A Lei 7.210/84, por sua vez, disciplina o trabalho externo nos

seus artigos 36 e 37:

Art. 36 – O trabalho externo será amissível para os presos em regime fechado somente em serviço ou obras públicas realizadas por órgão da administração direta ou indireta, ou entidades privadas, desde que tomadas as cautelas contra fuga e em favor da disciplina.

§ 1º O limite máximo do número de presos será de 10% (dez por cento) do total de empregados na obra.

§ 2º Caberá ao órgão da administração, à entidade ou à empresa empreiteira a remuneração desse trabalho.

§ 3º A prestação de trabalho depende do consentimento expresso do preso.

Art. 37 – A prestação de trabalho externo será autorizada pela direção do estabelecimento e dependerá de aptidão, disciplina,

212 MESQUITA JÚNIOR, op. cit., p. 174.

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77responsabilidade, além do cumprimento mínimo de 1/6 (um sexto) da pena.

Parágrafo único – Revogar-se-á a autorização de trabalho externo ao preso que vier a praticar ato definido como crime, for punido por falta grave, ou tiver comportamento contrário aos requisitos estabelecidos neste artigo.

Enquanto a LEP, em seu artigo 36 dispõe que o trabalho

externo é admissível para o condenado que se encontra no regime fechado, o artigo

35 Código Penal estabelece que o trabalho externo é admissível aos condenados

que se encontrarem em regime fechado e semi-aberto.

O condenado que estiver cumprindo pena em regime semi-

aberto está sujeito ao trabalho em colônia agrícola, industrial ou estabelecimento

similar (art. 35, § 1º, CP), sendo admissível à atribuição do trabalho externo, bem

como a frequencia em cursos profissionalizantes (art. 35, § 2º, CP). Nada impede

que esse trabalho seja prestado a empresas privadas ou mesmo que tenha caráter

autônomo. Segundo o artigo 36, caput, da Lei de Execução Penal, e artigo 34, § 3º,

do Código Penal, ao preso que estiver cumprindo a pena em regime fechado,

somente poderá ser atribuído trabalho externo em serviços ou obras públicas,

realizados por órgãos da administração direta ou indireta ou entidades privadas,

tomadas as cautelas contra a fuga e em favor da disciplina213.

Entende-se por serviço público aquele que é mantido e

executado pelo Estado, por meio de suas instituições e seus órgãos, com o objetivo

de satisfazer as necessidades coletivas.214

Segundo Mirabete:

[...] tratando-se de serviços ou obras públicas, não há vinculo empregatício entre o condenado e a Administração ou empresa privada que realiza tais obras, pois as normas que regem o trabalho prisional são de direito público e não estão sujeitas à Consolidação das Leis do Trabalho. Somente ao condenado que se encontra em

213 MIRABETE, op. cit., p. 36.214 MIRABETE, op. cit., p. 100.

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78regime aberto possibilita-se o trabalho com vínculo empregatício, sujeito às normas da CLT.215

O trabalho externo do condenado que cumpre pena em regime

fechado e efetuado sob vigilância direta da Administração, ou seja, é necessária a

escolta como cautela contra a fuga e em favor da disciplina.216

Algumas considerações são importantes visto que a LEP limita

a concessão do trabalho externo por parte da autoridade policial. Estabelece que a

concessão do benefício do trabalho externo dependerá do cumprimento de 1/6 da

pena. Entretanto, esse requisito temporal restringe-se ao condenado que está em

regime fechado. Outrossim, o requisito só será exigido quando o benefício for

concedido pela administração do estabelecimento, ex vi o disposto no artigo 37 da

LEP217.

Acerca da desnecessidade do cumprimento mínimo de 1/6 da

pena para a concessão do trabalho externo para o condenado em regime semi-

aberto, colaciona-se o seguinte precedente do Superior Tribunal de Justiça:

O trabalho do condenado é de suma relevância no processo de sua reeducação e ressocialização, elevando-se a condição de instrumento de afirmação de sua dignidade humana. Admite-se o benefício do trabalho externo ao condenado que inicia o cumprimento da pena em regime semi-aberto, independentemente do cumprimento de 1/6 da pena, se a situação fática e as condições pessoais do sentenciado o favorecem e guardam sintonia com o princípio da razoabilidade.218

Não podemos nos olvidar que o trabalho é um direito do preso,

o qual deve ser proporcionado pelo Estado. Como o Estado não pode dar eficácia à

previsão legal, não se deve negar o direito ao condenado de trabalhar externamente,

com vínculo empregatício, quando o mesmo tem oferta de emprego, ou quando o

mesmo pode atuar como profissional liberal.219

215 MIRABETE, op. cit., p. 101.216 MIRABETE. op. cit., p. 101.217 MESQUITA JÚNIOR, op. cit., p. 174.218 BRASIL. STJ – REsp. 450.592-RS, 6ª Turma, relator Ministro Vicente Leal, DJU 04/08/2003. 219 MESQUITA JÚNIOR, op. cit., p. 176.

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79O trabalho externo do preso no regime semi-aberto é admitido,

mas o trabalho com vínculo empregatício só é regra no regime aberto. Nesse tipo de

trabalho, o condenado trabalhará normalmente, retornando à casa de albergado, ou

para o presídio, somente nos momentos de folga. Não obstante, a caótica situação

do sistema penitenciário nacional transforma em regra o trabalho externo com

vínculo empregatício no regime semi-aberto.220

4.2 REMIÇÃO

Remir significa resgatar, abater, descontar, pelo trabalho

realizado dentro do sistema prisional, parte do tempo de pena a cumprir. O preso

provisório, que não está obrigado ao trabalho, se trabalhar, também poderá remir

parte de sua futura condenação.221

A Lei de Execução Penal trata do instituto da remissão em

seus artigos 126 a 130, in verbis:

Art. 126. O condenado que cumpre a pena em regime fechado ou semi-aberto poderá remir, pelo trabalho, parte do tempo de execução da pena.

§ 1º. A contagem do tempo para o fim desde artigo será feita à razão de 1 (um) dia de pena por 3 (três) de trabalho.

§ 2º. O preso impossibilitado de prosseguir no trabalho, por acidente, continuará a beneficiar-se com a remissão.

§ 3º. A remição será declarada pelo Juiz da execução, ouvido o Ministério Público.

Art. 127. O condenado que for punido com falta grave perderá o direito ao tempo remido, começando o novo período a partir da data da infração disciplinar.

Art. 128. O tempo será computado para a concessão de livramento condicional e indulto.

220 MESQUITA JÚNIOR, op. cit., p. 176-177.221 BITENCOURT, Cezar Roberto. Manual de direito penal: Parte Geral, v. 1. 6 ed. São Paulo: Saraiva, 2000. p. 435-436.

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80Art. 129. A autoridade administrativa encaminhará mensalmente ao Juízo da execução cópia do registro de todos os condenados que estejam trabalhando e dos dias de trabalho de cada um deles.

Parágrafo único. Ao condenado dar-se-à relação de seus dias remidos.

Art. 130. Constitui crime do art. 299 do Código Penal declarar ou atestar falsamente prestação de serviço para fim de instruir pedido de remição.

A LEP prevê o incentivo ao trabalho, uma vez que o mesmo

constitui um dos mais eficazes meios de reintegração social do condenado. Tal

incentivo manifesta-se pela remição, ou seja, o condenado que estiver trabalhando

será beneficiado com a redução da pena, descontando-se um dia da execução, a

cada três dias trabalhados.222

Trata-se de um meio de abreviar ou extinguir parte da pena.

Oferece-se ao preso um estímulo para corrigir-se, abreviando o tempo de

cumprimento da sanção para que possa passar ao regime de liberdade condicional

ou a liberdade definitiva. 223

Segundo Dias, trata-se de um instituto completo, “pois reeduca

o delinquente, prepara-o para a sua reincorporação à sociedade, proporciona-lhe

meios para reabilitar-se diante de si mesmo e da sociedade, disciplina sua vontade,

favorece sua família e sobretudo abrevia a condenação, condicionando esta ao

próprio esforço do condenado.”224

Cumpre mencionar que a Súmula 341225 do STJ “garante a

remição da pena pelo estudo, nos regimes fechado e semi-aberto, explicando que a

abreviação da condenação pelo instituto em comento, tem por objetivo a

222 MESQUITA JUNIOR, op. cit., p. 408. 223 MIRABETE, op. cit., p. 478.224 DIAS, Maria da Graça Morais. A redenção das penas pelo trabalho. Breve notícia de um sistema. RT 483/251.225 STJ - Súmula 341: A freqüência a curso de ensino formal é causa de remição de parte do tempo de execução de pena sob regime fechado ou semi-aberto.

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81ressocialização, possibilitando o uso da analogia in bonam partem”, para admitir a

aplicação da remição, no caso de atividades não expressas no texto legal.

O condenado que for punido com falta grave (artigos 50 a

52226, LEP), perderá o direito ao tempo remido, começando a contar novo período a

partir da data da infração disciplinar (artigo 127227 da LEP). A perda dos dias remidos

pode ser decretada, a qualquer tempo, enquanto não extinta a pena do preso, uma

vez que a decisão que concede a remição não faz coisa julgada material.228

4.3 O TRABALHO DO APENADO COMO INSTRUMENTO DE RESGATE DA DIGNIDADE HUMANA

Conforme ressaltado no tópico anterior, o artigo 28 da LEP

reza que o trabalho prisional tem caráter de resgate da dignidade da pessoa humana

e finalidade educativa e produtiva, assim como disciplina o item 56 da Exposição de

Motivos da LEP.

226 Art. 50. Comete falta grave o condenado à pena privativa de liberdade que: I - incitar ou participar de movimento para subverter a ordem ou a disciplina; II - fugir; III - possuir, indevidamente, instrumento capaz de ofender a integridade física de outrem; IV - provocar acidente de trabalho; V - descumprir, no regime aberto, as condições impostas; VI - inobservar os deveres previstos nos incisos II e V, do artigo 39, desta Lei; VII – tiver em sua posse, utilizar ou fornecer aparelho telefônico, de rádio ou similar, que permita a comunicação com outros presos ou com o ambiente externo; Parágrafo único. O disposto neste artigo aplica-se, no que couber, ao preso provisório.

Art. 51. Comete falta grave o condenado à pena restritiva de direitos que: I - descumprir, injustificadamente, a restrição imposta; II - retardar, injustificadamente, o cumprimento da obrigação imposta; III - inobservar os deveres previstos nos incisos II e V, do artigo 39, desta Lei.

Art. 52. A prática de fato previsto como crime doloso constitui falta grave e, quando ocasione subversão da ordem ou disciplina internas, sujeita o preso provisório, ou condenado, sem prejuízo da sanção penal, ao regime disciplinar diferenciado, com as seguintes características: I - duração máxima de trezentos e sessenta dias, sem prejuízo de repetição da sanção por nova falta grave de mesma espécie, até o limite de um sexto da pena aplicada; II - recolhimento em cela individual;

III - visitas semanais de duas pessoas, sem contar as crianças, com duração de duas horas; IV - o preso terá direito à saída da cela por 2 horas diárias para banho de sol; § 1o O regime disciplinar diferenciado também poderá abrigar presos provisórios ou condenados, nacionais ou estrangeiros, que apresentem alto risco para a ordem e a segurança do estabelecimento penal ou da sociedade.

§ 2o Estará igualmente sujeito ao regime disciplinar diferenciado o preso provisório ou o condenado sob o qual recaiam fundadas suspeitas de envolvimento ou participação, a qualquer título, em organizações criminosas, quadrilha ou bando. 227 Art. 127. O condenado que for punido por falta grave perderá o direito ao tempo remido, começando o novo período a partir da data da infração disciplinar.228 MALULY, op. cit., p. 731.

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82Hassen apud. Vasconcelos229, considera “o trabalho no sistema

prisional, positivo para criar laços sociais, transmitir ética social, apresentar-se como

um valor que diferencia os homens do bem, sendo sinal de decência, organização e

marca de honestidade”.

Além disso, a laborterapia diminui as promiscuidades

carcerárias, dando ao apenado a sensação de que a vida não parou. Faz com que a

pessoa sinta-se útil, responsável, evita a ociosidade, solidão, perturbações que

fomentam até novos delitos, motins e rebeliões.

O trabalho como princípio educativo no sistema prisional não

somente ensinará uma profissão, mas formará um indivíduo com características de

trabalhador, preparado para buscar sua própria reinserção.

Àssaly assevera que “o trabalho penitenciário, consagrado em

todas as legislações hodiernas, constitui umas das pedras fundamentais dos

sistemas penitenciários vigentes e um dos elementos básicos da política criminal”.230

Segundo a doutrina de Mirabete231, “a concepção de trabalho

penitenciário, inicialmente, estava vinculada à idéia de vingança e castigo, mantendo

suas características como forma mais grave e aflitiva de cumprir a pena de prisão”.

Explica, ainda, que na concepção moderna, “a pena passou a conter uma finalidade

reabilitadora, logo, o trabalho prisional constitui-se um mecanismo de complemento

do processo de reinserção social para promover a readaptação do preso, prepará-lo

para uma profissão, inculcar-lhe hábitos e evitar a ociosidade”. Por fim, assinala o

seu caráter ressocializador, afirmando “serem notórios os benefícios que da

atividade laborativa trás para a conservação da personalidade do delinquente”.

Conforme ensinamento de Foucault, a prisão passa a ser

responsável pela administração de toda dimensão temporal da vida dos apenados,

além do controle dos seus corpos: deve haver uma modificação do tempo do

229 VASCONCELLOS, Fernanda Bestetti. Trabalho Prisional e Reinserção Social: Função Ideal e Realidade Prática. Revista Sociologia Jurídica. São Paulo, SP, n. 05, jul/dez 2007.230 ÀSSALY, Alfredo Issa. O trabalho penitenciário. São Paulo: Martins, 1944 p. 15.231 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução Penal. 11 ed. São Paulo: Atlas, 2007 p. 89/90.

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83indivíduo em tempo disponibilizado ao trabalho e a transformação do seu corpo para

a realização do trabalho; deve “qualificar-se como um corpo capaz de trabalhar”.232

Ressalta, ainda, o fato de que a relação entre a prática de

encarceramento e as exigências do trabalho, sustenta que o prisioneiro que pode e

quer trabalhar será libertado não tanto pelo fato de ser novamente útil à justiça, mas

porque de novo aderiu ao grande pacto da existência humana233.

Acerca da finalidade do trabalho penitenciário, Miotto

assevera:

O trabalho tem seu sentido ético, como condição de dignidade humana, e assim assume um caráter educativo. Se o condenado já tinha o hábito do trabalho, depois de recolhido ao estabelecimento penal o seu labor irá manter aquele hábito, impedindo que ele se degenere; se não tinha, o exercício regular do trabalho contribuirá para ir gradativamente disciplinando-lhe a conduta, instalando-se na sua personalidade o hábito de atividade disciplinadora.234

No mesmo vértice, Arus:

O trabalho do preso é imprescindível por uma série de razões: do ponto de vista disciplinar, evita os efeitos corruptores do ócio e contribui para manter a ordem; do ponto de vista sanitário, é necessário que o homem trabalhe para conservar seu equilíbrio orgânico e psíquico; do ponto de vista educativo o trabalho contribui para a formação da personalidade do individuo; do ponto de vista econômico, permite ao recluso de dispor de algum dinheiro para suas necessidades e para subvencionar sua família; do ponto de vista da ressocialização, o homem que conhece um ofício tem mais possibilidades de fazer uma vida honrada ao sair em liberdade.235

Afirma Reale Júnior que “o trabalho revela-se, portanto,

fundamental à saúde e futuro do preso, e primordial para o equilíbrio e a paz na

prisão”.236 Na mesma linha, Silva da Silva e Boschi, dizem:232 FOCAULT, Michel. Vigiar e Punir. Rio de Janeiro: Editora Vozes, 1997. p. 124.233 FOCAULT, op. cit., p. 73.234 MIOTTO, Armida Bergamini. Curso de ciências penitenciária. São Paulo: Saraiva. 1975. p. 495.235 MIRABETE, Julio Fabbrini. Execução Penal: comentários à lei nº 7.210 de 11-07-84. 8 ed. São Paulo: Atlas, 1997 p. 93.236 NOGUEIRA. Paulo Lúcio. Comentários à Lei de Execuções Penais. 3 ed. Saraiva, 1996 p. 41

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84[...] todo o ser humano, uma vez capacitado à atividade laboral, para manutenção de sua própria subsistência e sua perfeita integração na sociedade, de onde é produto, tem necessidade de fugir da ociosidade através do trabalho, como dever social e condição da dignidade humana, terá finalidade educativa e produtiva.237

Já Nogueira defende “a necessidade do trabalho aos

condenados, eis que devidamente disciplinados e remunerados, só assim haverá

condições de torná-los úteis, produtivos e devidamente ocupados, o que evitará

outros males próprios da prisão”.238

A respeito do papel do trabalho penitenciário, descreve

Martinez239:

O trabalho útil tem papel extraordinário durante o cumprimento da pena. Resgata a personalidade diminuída pela prisão, ocupa o tempo do recolhido ao presídio, impõe ordem na carceragem, cria subordinação necessária, disciplina o comportamento das pessoas, ensina uma profissão, oferece algum recurso financeiro, faz emergir a dignidade humana quase perdida, recupera o individuo e prepara a volta à sociedade. Portanto, é absolutamente importante para quem está preso.

Modernamente predomina o caráter reeducativo e humanitário

do trabalho penitenciário. Colabora na formação da personalidade do condenado ao

criar-lhe hábitos de auto-domínio e disciplina social, e na preparação da reinserção

social, ao dar ao recluso uma profissão, a ser posta a serviço da comunidade livre.

Se, para todo homem, o trabalho é um instrumento de auto-realização e

aperfeiçoamento, para o condenado será um instrumento de humanização e

liberação.240

237 SILVA, Odir Odilon Pinto e BOSCHI, José Antônio Paganella. Comentários à Lei de Execução Penal. Aide, 1986 p. 39.238 NOGUEIRA, op. cit., p. 44.239 MARTINEZ. Wladimir Novais. Direito de trabalhar dos presos. Revista IOB Trabalhista e Previdenciária. Porto Alegre. Síntese. V. 21, n. 242, agosto 2009, p.14.240 ALBERGARIA, Jason. Direito penitenciário e direito do menor. Belo Horizonte, 1999, p. 166.

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85Segundo explica Oliveira:

[...] o trabalho visa não só manter o preso ocupado, evitando o ócio, mas numa espécie de terapia ocupacional, sendo, também, considerado como uma fonte geradora de riqueza que diminui os custos operacionais do sistema penitenciário, preparando o recluso para o retorno à sociedade.241

Por sua vez, Costa assevera que a reeducação dos apenados

através do trabalho, não está somente em retirá-los da ociosidade, mas também

abrindo efetiva possibilidade de inserção futura na sociedade, através da

profissionalização e perspectiva de um trabalho digno.242

Um instrumento, que juntamente com o trabalho deve ser

realçado como fator de relevante caráter ressocializador e garantidor da dignidade

humana do preso é a qualificação profissional. Nesse sentido, Resende disciplina:

Outro aspecto que merece destaque é a educação profissionalizante dentro das penitenciárias, como é o caso de padarias, marcenarias, pequenas confecções e fábricas de objetos de artesanatos. O trabalho, além de valorizar o preso, ser-lhe-á muito útil em sua vida pós-cárcere, não sendo incomum que o ex- presidiário consiga, logo, vaga no mercado de trabalho, em ofício assemelhado ao que aprendera na prisão243

Para Barros244:

[...] a formação profissional do preso é condição sine qua nom para seu reingresso no mercado de trabalho além de constituir um fator importante para evitar a reincidência criminal. Relata, que o cenário mundial revela um aumento crescente de desempregados, vítimas de recessão econômica, da falta de qualificação profissional, do empobrecimento e da globalização econômica e cultural.

241 OLIVEIRA, Odete Maria de. Prisão: um paradoxo social. Florianópolis: Editora da UFSC, 1984. p. 181.242 COSTA, Alexandre Marino. O trabalho prisional e a reintegração social do detento. Florianópolis: Insular, 1999, p. 40.243 REZENDE. Humanização das prisões e penas alternativas – Palestra proferida no 1º Congresso sobre Execução da Pena, Fortaleza-Ceará, 1997 p. 09/10.244 BARROS in COSTA, Alexandre Marino. O trabalho prisional e a reintegração social do detento. Florianópolis: Insular, 1999, p. 40.

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86Afirma, ainda, que “neste cenário, o preso/egresso estará

automaticamente excluído do mercado de trabalho, pois a pouca oferta de mão-de-

obra torna o processo altamente seletivo entre contratar uma pessoa sem

passagem, na justiça e outra com passagem, certamente o seguindo estará

descartado”.

Costa afirma que:

O trabalho do preso trouxe os seguintes benefícios: ajuda na administração do presídio através de melhorias do ambiente; houve uma ocupação produtiva do tempo ocioso dos presos; o auxílio na reintegração e ressocialização do preso; e, além do contato traz consigo um rendimento extra para ajudar o preso e sua família. Há, além disso, uma considerável melhoria no comportamento dos internos, devido, também, à diminuição do estresse causado pela frustração.245

Verifica-se que o aprendizado de uma nova profissão e,

conseqüentemente, uma oportunidade de obter renda de forma lícita, abre para o

detento a esperança de um futuro melhor. Pode-se dizer que a contribuição do

trabalho prisional para o desenvolvimento do detento está no fato de que aumenta a

empregabilidade deste ao sair da prisão. Além disso, o sentimento de ser útil a

sociedade, a gratidão da família pelo fato de o detento estar contribuindo para o seu

sustento e, ao mesmo tempo, demonstrando uma notória vontade de mudar de

rumo, são aspectos potencializados pelo trabalho, que acabam por influir

diretamente na qualidade de vida do detento.246

É oportuno mencionar que Mesquita Júnior diz que “não se

deve admitir colônia agrícola, salvo em raras exceções, porque, o preso brasileiro,

como regra, provem do meio urbano. Como a colônia agrícola exige maior espaço e

vigilância, além de não apresentar efeitos futuros positivos, deve ser evitada”.247

Destarte, observa-se que a solução para os problemas do

sistema penal não está apenas na ampliação do número de vagas, mas também na

245 COSTA, op. cit., p. 86.246 COSTA, op. cit., p. 89/90.247 MESQUITA JUNIOR, op. cit., p. 173.

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87busca de alternativas para torná-lo mais produtivo, assim como reeducar o preso

através do trabalho, resgatando a dignidade dos apenados.

4.4 EXEMPLO DE TRABALHO CARCERÁRIO COMO INSTRUMENTO DE RESGATE DA DIGNIDADE HUMANA

Na presente pesquisa científica foi demonstrado como o

trabalho é um instrumento de extrema influência na vida em cárcere, pois auxilia no

combate à ociosidade dos presos e age como fator de resgate de sua cidadania e

dignidade para que retorne à sociedade ressocializado.

Em que pese o trabalho carcerário possuir grande alicerce

legal, consubstanciado na Constituição Federal, na Lei de Execução Penal, no

Código Penal e até em regras internacionais, além dos entendimentos doutrinário e

jurisprudencial, sua efetividade depende de uma estrutura que é quase que

inexistente no atual cenário carcerário brasileiro.

Contudo, há algumas exceções a esta realidade, como é o

caso da Penitenciária Jucemar Cesconetto, em Joinville, Santa Catarina, que

considera o valor social do trabalho como instrumento de resgate da dignidade

humana, a qual passa-se a citar.

A Penitenciária Industrial de Joinville foi inaugurada no ano de

2005 pelo Governo do Estado de Santa Catarina, e tem como objetivo a

ressocialização dos apenados através do trabalho e estudo, com o envolvimento da

comunidade, concedendo condições dignas e adequadas para o cumprimento da

pena, dentro das obrigações impostas ao Estado pela Lei de Execuções Penais.

Em relatório elaborado no ano de 2010, o qual encontra-se em

anexo à presente pesquisa científica, o diretor do estabelecimento prisional industrial

de Joinville, Richard Harrison Chagas dos Santos, esclarece as medidas tomadas na

unidade para que o apenado retorne à sociedade e não volte a reincidir no crime.

Vale ressaltar pontos deste relatório, nas palavras do próprio

diretor:

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88“O trabalho no cárcere ainda é a atividade melhor aceita socialmente para o indivíduo encarcerado, porém este trabalho não é somente a troca de atividade por remuneração, ele contribui positivamente para a reinserção social do indivíduo e tem seus efeitos terapêuticos reconhecidos”

Ele ainda giza alguns instrumentos que são trabalhados

terapeuticamente nos grupos laborais onde estão inseridos os internos, como os

instrumentos no contexto social, que são: a) estabelecimento e manutenção das

teias de relacionamento; b) aceitação social; c) comunicação interpessoal com

conteúdos verbais e não verbais; d) gestão do ambiente circundante independente

das alterações.

Além dos instrumentos no processo de aprendizagem

individual, quais sejam: a) noção de responsabilidades e direitos; b) capacitação; c)

treinamento; d) desenvolvimento social; e) educação.

Segundo o relatório, o departamento responsável pelas

atividades de trabalho é a Gerência Laboral, sendo que a atividade desta é de suma

importância no que diz respeito ao andamento da produtividade e finalidade da

penitenciária, que é o trabalho como meio ressocializador.

Atualmente, a Penitenciária conta com trezentos e sessenta e

seis presos, exatamente sua capacidade máxima, e por meio de convênios com

onze empresas privadas, conta com canteiros de trabalho destinados à laborterapia

dos apenados.

Tais empresas garantem emprego para 240 internos, sendo as

seguintes: Ciser (parafusos e porcas), Tigre (tubos e conexões hidráulicas), Caribor

(elastômeros), Panificadora Maycon (panificação), Nutribem (alimentação),

Montesinos (administração prisional), First Line (embalagens), Artbor (borrachas e

plásticos), Schulz (compressores de ar), Plasnor (plásticos e PVC) e Nova Aliança

Construtora (construção civil), dividindo a mão-de-obra carcerária da seguinte forma:

EMPRESAS Nº DE INTERNOSCISER 90

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89

TIGRE 38CARIBOR 31

MONTESINOS 16PANIFICADORA MAYCON 15

NUTRIBEM 13FIRST LINE 11

ARTBOR 7NOVA ALIANÇA CONSTRUTORA 7

PLASNOR 7SCHULZ 5TOTAL 240

É importante destacar que o trabalho além de reduzir as

mazelas do cárcere e do ócio, representa uma fonte de renda ao apenado e sua

família. Com uma renda de um a dois salários mínimos, atentando-se que deste

montante pelo menos 25% é destinado diretamente ao interno, conforme as

disposições da LEP, o apenado, mesmo encarcerado, auxilia no orçamento familiar.

Ou seja, o encarceramento do individuo, que em outras unidades prisionais é uma

despesa a mais para a família, se torna uma fonte de renda auxiliar.

De outro lado, o Estado igualmente tem vantagens com o

trabalho do apenado. Primeiro porque por força do instituto da remição, para cada

três dias de trabalho um dia é descontado da pena, sendo que esta remição traduz-

se em economia, uma vez que o apenado alcançará a liberdade mais cedo,

desonerando os cofres públicos.

Nesse sentido, consoante o relatório da Penitenciária Industrial

de Joinville, entre os anos de 2006 e 2010 a soma dos dias trabalhados pelos

apenados totalizou 198.923 (cento e noventa e oito mil novecentos e vinte e três)

dias, sendo remidos 63.308 (sessenta e três mil trezentos e oito) dias.

Considerando, portanto, que um apenado custa aos cofres públicos R$ 77,93

(setenta e sete reais e noventa e três centavos) por dia, a remição na Penitenciária

Industrial de Joinville representou nestes quatro anos uma economia de R$

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904.870.284,44 (quatro milhões oitocentos e setenta mil duzentos e oitenta e quatro

reais e quarenta e quatro centavos).

O resultado da atividade laborativa, além da economia pelos

dias remidos, é demonstrado pelos níveis de reincidência dos egressos da

Penitenciária.

Depreende-se que entre o período de 2005 a 2010, dos 698

(seiscentos e noventa e oito) apenados liberados da Penitenciária Industrial Jucemar

Cesconetto, apenas 69 (sessenta e nove) retornaram à prisão por cometimento de

novos delitos.

Segundo o relatório, consultando dados do sistema prisional

do país, apenas 9 % (nove por cento) dos egressos da Penitenciária Industrial de

Joinville voltam a delinquir, o que contrasta com níveis de 80 % (oitenta por cento)

de reincidência no sistema prisional brasileiro.

Na opinião do Coronel da Polícia Militar Calixto Antônio

Fachini248, ex-diretor da Penitenciária, o tratamento dispensado ao condenado é

essencial para reintegrá-lo à sociedade. Isso porque o sistema implantado envolve a

dignidade dos detentos, proporcionando cuidados, principalmente no que tange ao

trabalho.

Segundo ele, “no sistema convencional, os presidiários saem

pior do que entraram, e por não haver expectativa quanto ao futuro, regressam à

vida de crimes. O que PIJ está proporcionando é justamente o contrário, fomentado

a esperança de uma vida melhor por meio de serviços prestados ao apenado”.

Como se nota, os egressos trabalhadores do sistema prisional

têm maior chance de voltar a ter uma vida digna, pois ganharam oportunidade,

respeito e dignidade na penitenciária, dignidade esta que tende a ser cada vez mais

realçada pela própria mente do apenado, a qual está limpa e arejada por causa do

trabalho por ele perpetrado.

248 Revista Segurança Pública em Destaque. Coluna Opinião. Ed. 1. Joinville: Editora Grapho’s, 2010. p. 33.

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91

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ao final de um percurso como este, muitas questões ganham

relevo, permitindo um olhar panorâmico sobre o objeto de estudo, afim de que se

possa apontar aquilo que mais se destaca, além de apresentar algumas

compreensões possíveis sobre o contexto estudado.

Como demonstrado, o crime é fruto da relação entre os

homens. É quase que impossível haver convivência sem que haja conflitos de

interesses, muitos destes de caráter egoísta, que ferem o direito do outro,

caracterizando no decorrer dos tempos o que hoje denominados crimes.

A evolução das penas de acordo com dados e informes

históricos colhidos mostra a plena convicção de que, atualmente, temos os melhores

tratamentos dados aos apenados em todos os tempos da humanidade.

Ao longo da história humana, evolui-se das penas aplicadas

em favor das divindades para as penas decorrentes da infringência ao pacto social

de direitos, das penas cruéis para penas mais brandas e humanas, tanto que

atualmente caminha-se para uma efetividade extrema da intervenção mínima do

estado, colocando o sistema penal como ultima ratio para a solução dos conflitos

sociais.

No atual sistema penal, a tutela dos bens jurídicos socialmente

relevantes (vida, patrimônio, honra, fé pública, etc.) fica a cargo do Estado, que

investiga, acusa, processa e julga o delinquente, aplicando-lhe as penas previstas

na legislação e, particularmente, a pena de reclusão aos crimes mais relevantes.

Contudo, apesar da nítida evolução que sofreu o sistema

pena, no que tange ao sistema brasileiro, há questões que ainda merecem a devida

atenção, e uma das principais é a obediência aos preceitos legais da Lei nº

7.210/84, Lei de Execuções Penais, mormente no que é pertinente ao trabalho

prisional, uma das questões de maior relevância durante o período da reclusão.

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92Há um velho ditado popular que cada vez mais ganha força

nas cadeias: “cabeça vazia, oficina do diabo”. Como já o conhecemos, bem como

demonstrado no decorrer desta pesquisa, o trabalho é essencial à vida humana. O

trabalho interliga as relações entre os indivíduos, estando presente em todos os

setores da sociedade e servindo como força motriz para o desenvolvimento,

econômico, social e cultural da sociedade.

No meio carcerário não é diferente. Em que pesem

entendimentos no sentido de que o trabalho penitenciário somente serve como meio

disciplinador, conduzindo à remição das penas e sem ter a mínima função de

capacitação ou intenção de tornar o delinquente um homem reformado, há que se

prevalecer o caráter educativo e ressocializador do trabalho prisional.

O trabalho cumpre uma das suas mais nobres funções quando

aplicado aos apenados, que se encontram reclusos nas celas frias de uma prisão,

servindo para afastar o condenado da inércia, do ócio, dos pensamentos negativos.

Além disso contribui na remição da pena e ajuda na renda do apenado, que pode

auxiliar em sua despesa pessoal e também sua família.

Somando estes fatores, o trabalho prisional faz com que o

apenado venha a recuperar sua autoestima e ser valorizado como ser humano,

recuperando sua dignidade.

Dignidade. Condição declarada como fundamental para a

República Federativa do Brasil em sua Constituição de 1988, um preceito inerente

ao ser humano, fator essencial a uma vida plena em sociedade, pelo qual o homem

pode ter perspectiva de que sua vida tenha um futuro, e que possua condições para

efetivar sua dignidade.

Entretanto, essa não é a situação que encontramos nas celas

das cadeias brasileiras, onde prevalecem insetos, ratos e demais e imundices, além

do ócio e dos planos de fuga e organizações de crime, sendo ambiente em que não

há qualquer traço de dignidade humana, a qual, embora garantida pela Constituição,

é esquecida pelos governantes.

Page 93: O TRABALHO DO APENADO COMO INSTRUMENTO DE RESGATE …siaibib01.univali.br/pdf/Aline Vieira Silva.pdf · realiza através de processo de igual nome, mediante meios executórios de

93Em que pese haver vários exemplos de como a dignidade

humana encontra-se distante do sistema carcerário, há estabelecimentos prisionais

que acatam o princípio da dignidade da pessoa humana como valor fundamental e,

esse é o caso da Penitenciária Industrial de Joinville, destacada na parte final do

quarto capítulo desta pesquisa.

A PIJ tem como principal missão valorizar o trabalho prisional,

em cooperação com diversas empresas privadas a fim de que se possa dar

oportunidades aos apenados, fazendo com que estes tenham remidos os dias

laborados, além de estarem aptos ao trabalho fora da prisão e, conseqüentemente,

ressocializados.

A demonstração da recuperação da dignidade dos presos está

no baixíssimo nível de reincidência dos egressos do citado ergástulo. Índices

demonstrados na pesquisa destacam que em comparação com a reincidência de

egressos nacional, o nível de Joinville é dez vezes menor.

Ocupados com o trabalho, os presos ocupam sua mente,

encontram utilidade em suas ações, além de aprenderem um ofício e arrecadarem

certa quantia em dinheiro, facilitando que retornem a sociedade de maneira digna e

não voltem a delinquir.

Nesse sentido, a hipótese levantada, portanto, foi concluída no

sentido de que o trabalho prisional constitui sim fator de alcance para a dignidade

humana dos apenados, uma vez que por meio do trabalho o preso enobrece sua

alma, limpa a mente, e, além disso, pode aprender uma profissão, tornando-se

menos inerente à reincidência, recuperando sua dignidade perante a sociedade.

Neste fim de pesquisa, analisando a função do trabalho

prisional, pode-se afirmar que além de ser muito importante como fator

ressocializador para o indivíduo que cumpre pena privativa de liberdade, coincide

com a melhora da relação com a sua família.

Ao ingressar em um programa de trabalho prisional, o preso

passa a poder colaborar com o sustento da família, ao contrário de depender dela.

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94Por menor que seja a remuneração pelo trabalho, há a possibilidade de dispor dela

para a família, uma vez que a sobrevivência material mínima é garantida ao preso

pelo sistema penitenciário vigente.

As variáveis foram concluídas no sentido de que a Lei de

Execução Penal, em que pese ser “quase perfeita”, não é aplicada às prisões

brasileiras, seja por falta de vontade política, por falta de organização do erário, ou

até mesmo pela pouca atenção dada pela opinião pública ao assunto.

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