O Essencial Sobre Averrois

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IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA Catarina Belo O essencial sobre AVERRÓIS

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IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA

Catarina Belo

O essencial sobre

AVERRÓIS

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AVERRÓIS NA HISTÓRIA DO PENSAMENTOISLÂMICO E OCIDENTAL

No panorama da filosofia islâmica medieval, Aver-róis ocupa um lugar de destaque. Juntamente comAvicena, é considerado o mais influente filósofo natradição islâmica medieval. Todavia, o filósofo an-daluz, nascido em Córdova em 1126, não é um fe-nómeno isolado do islão clássico. A filosofia desen-volveu-se a par de outras disciplinas do saber noimpério islâmico, que teve início com a emigraçãodo profeta Maomé de Meca para Medina, em 622.A teologia, as ciências naturais, a matemática, agramática, a historiografia, são exemplos de outrasdisciplinas que atingiram um elevado grau de desen-volvimento no mundo árabe e islâmico. Algumasdestas disciplinas tinham um carácter quase exclu-sivamente autóctone, como seja a teologia, que se

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desenvolveu a partir de uma reflexão sobre o Alco-rão, e a gramática árabe. Outras seguiam na sendado saber grego, como seja a matemática, a física ea cosmologia, expandindo e aperfeiçoando o alcanceda antiga ciência grega. A filosofia de inspiraçãogrega apresentava elementos da teologia islâmica.Um dos exemplos mais famosos da provável influên-cia da teologia islâmica na filosofia islâmica de raizgrega é a reflexão de Avicena (980-1037) sobre aexistência. A sua conclusão de que a existência éum acidente não tem uma origem óbvia em Aristó-teles, mas representa uma corrente teológica den-tro do islão que afirmava a separação entre essên-cia e existência de um ponto de vista da criaçãodivina, no sentido em que a primeira precedia a se-gunda. Logo, a filosofia islâmica, ainda que seguin-do a tradição clássica, apresenta claros traços deinfluência da teologia islâmica.

No âmbito dessa teologia, é de notar que as maisfamosas escolas eram a mu‘tazilita e a ash‘arita.A primeira, fundada em Baçorá por Wasil ibn ‘Ata’(m. 748) na primeira metade do século VIII, teve oseu apogeu durante a primeira metade do século IX,no califado dos Abássidas. Defendia uma interpre-

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tação menos literal e mais racionalista do Alcorão ea justiça e a unidade divinas. Segundo os mu‘tazi-litas, Deus é justo, logo o mal não é criado por Ele,mas advém das Suas criaturas. Logo, o mal moraladvém dos seres humanos, não de Deus, e eles sãoos seus responsáveis. Esta escola defende ainda queEle é uno, sem conter qualquer multiplicidade, peloque os atributos divinos referidos no Alcorão não sãodistintos da essência divina, mas sua parte consti-tuinte. Acreditavam ainda que o Alcorão era criadoe não a palavra eterna de Deus (pois apenas Ele eraeterno). A teoria da criação do Alcorão tornou-seuma doutrina oficial do califado durante o reinadodo califa abássida al-Ma’mun (m. 833), sendo pos-teriormente rejeitada por escolas teológicas contrá-rias ao mu‘tazilismo.

Por seu lado, os ash‘aritas, que representam aescola fundada por al-Ash‘ari (m. 935), opunham--se às teorias mu‘tazilitas. Defendiam uma interpre-tação mais literal do Alcorão. Acreditavam que Deusproduz os actos humanos (para salvaguardar a omni-potência divina), sendo depois esses actos adquiri-dos ou apropriados pelo agente humano, o que otornaria por eles responsável, e não o seu Criador.

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Afirmavam, contra os mu‘tazilitas, que os atributosdivinos são reais, e distintos da essência divina, eainda que o Alcorão é a palavra eterna de Deus, re-velada a Maomé em árabe através do anjo Gabriel.A teologia islâmica tem portanto origem na exegesedo Alcorão.

Por seu lado, a filosofia islâmica, tal como a co-nhecemos, tem início com as primeiras traduçõesdas obras de Aristóteles. O primeiro filósofo conhe-cido foi al-Kindi, que tinha um círculo de tradutoresdo grego para o árabe, por vezes por intermédio dosiríaco, visto haver já obras de Aristóteles traduzi-das para esta língua semita, que teve um papel fun-damental no cristianismo no Médio Oriente. Al-Kindicompunha também as suas próprias obras filosófi-cas. A tradução das mais importantes obras de Aris-tóteles teve lugar no século IX, e era fomentada anível oficial pelos califas. Outros dois importantesfilósofos muçulmanos são Alfarabi (870-950) e Avi-cena. Ainda que não se conheçam traduções inte-grais de diálogos de Platão para o árabe na IdadeMédia, as suas teorias eram conhecidas através dosepítomes de Galeno (c. 130-210), esses, sim, tradu-

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zidos para o árabe, e também através da crítica doEstagirita a Platão, em obras como a Metafísica.

Logo, Alfarabi escreve obras sobre a Metafísicade Aristóteles, e também, sob a influência de Pla-tão, o Tratado sobre as Opiniões dos Habitantesda Cidade Virtuosa, inspirado na República, A Har-monia entre as Filosofias dos Dois Sábios (Pla-tão e Aristóteles), bem como um comentário às Leisde Platão. Alfarabi apresenta igualmente influênciasneoplatónicas, cuja principal origem era a famosaobra A Teologia de Aristóteles, atribuída ao Es-tagirita, mas, na verdade, composta de excertos dasEnéadas de Plotino (século III). Avicena, outro fi-lósofo que foi influenciado pelo neoplatonismo, re-jeita categoricamente algumas teorias platónicas, talcomo a teoria das formas, mas é influenciado pelaTeologia de Aristóteles, obra à qual dedicou um co-mentário.

Segundo o modelo neoplatónico islâmico, Deus éum intelecto que se pensa a si mesmo (tendo emconta que a filosofia neoplatónica apresenta marcasde aristotelismo, como, por exemplo, a ideia de Deusenquanto ser supremo, cuja actividade consiste na

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auto-reflexão). Através da sua actividade auto-refle-xiva, gera-se um segundo intelecto, que, por sua vez,gera um terceiro intelecto, atingindo um total de dezintelectos, sendo o último o dador de formas (datorformarum, em latim), que fornece formas para amatéria do mundo sublunar e formas inteligíveis parao intelecto humano. Esse modelo da emanação é de-lineado de maneiras diferentes por Alfarabi e Avi-cena, mas evidencia as mesmas características ge-rais, e não tem qualquer base em Aristóteles, massim em Plotino.

As linhas principais do pensamento islâmico, queapresenta a influência do Estagirita (Deus enquantoactividade auto-reflexiva) e neoplatónica (a emana-ção dos intelectos a partir do primeiro intelecto di-vino), são criticadas por al-Ghazzali (1058-1111),teólogo muçulmano multifacetado. Conhecido pelasua vasta erudição e devoção ao misticismo islâ-mico, que viria a consagrar e tornar parte integran-te do islão sunita, estudara também as teorias dosfilósofos. Numa obra intitulada A Incoerência dosFilósofos, al-Ghazzali, conhecido por Algazel na Eu-ropa medieval, criticava os filósofos por uma con-

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cepção de Deus contrária ao Alcorão. Mais espe-cificamente, acusava-os de heresia ou infidelidadeem três casos: a defesa da eternidade do mundo, aincapacidade de provar que Ele conhece os parti-culares da criação e a incapacidade de demonstrara ressurreição do corpo. Além disso, al-Ghazzali opu-nha-se àquilo que considerava uma visão mecanicistado mundo e da criação. Segundo o famoso teólogo,também conhecido no mundo islâmico como «provado islão», o Deus dos filósofos não criara o mundopor sua vontade, mas automaticamente. Segundo ele,a divindade que os filósofos descreviam não era ver-dadeiramente o Deus omnipotente do Alcorão. Aver-róis atacaria acusações de al-Ghazzali na sua obraA Incoerência da Incoerência, uma resposta por-menorizada a este crítico. Veremos como a obradeste famoso teólogo viria a marcar decisivamenteo rumo filosófico do próprio filósofo cordovês.

Porém, o desenvolvimento da filosofia islâmica,que, como vimos, se deve fundamentalmente à fi-losofia grega e helenística, por um lado, e à teologiaislâmica, por outro, não se restringiu ao Oriente is-lâmico.

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Houve um movimento filosófico próprio do Anda-luz, que levantava as mesmas questões em torno darelação entre filosofia e religião, mais especificamen-te o islão. Num primeiro momento, a filosofia, de umaforma implícita, faz parte de uma mundivisão islâ-mica, como seja o caso de Ibn Hazm (994-1064),poeta, historiador, jurista, teólogo e filósofo andaluz,tal como Averróis, natural de Córdova. O primeirofilósofo andaluz a discutir explicitamente a questãoda harmonia entre o islão e a filosofia dos Antigos éIbn al-Sid al-Batalyusi, nascido em Badajoz em1052 1. Por sua vez Ibn Bajja (nascido provavelmenteentre 1085 e 1090 em Saragoça e falecido em Fezem 1138) viria a produzir comentários pormenori-zados às obras de Aristóteles, incluindo a Física (li-vros V-VIII), que teriam repercussões na obra deAverróis. Ibn Bajja comenta, de forma crítica, a fí-sica e a dinâmica de Aristóteles, abrindo caminho aum modelo único, aplicável tanto ao mundo celestecomo ao mundo sublunar. As abundantes referên-cias a este comentário de Ibn Bajja seriam lidas du-

1 Geoffroy, Averroè, p. 683.

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rante a Escolástica latina, abrindo assim caminho àrevolução de Galileu 2.

Outro filósofo andaluz que tem um impacto deci-sivo neste filósofo é Ibn Tufayl (nascido em Cádisna primeira década do século XII), seu contemporâ-neo e mentor. Num famoso episódio (que, segundoalguns, teria tido lugar em Marráquexe em 1169,segundo outros, em Sevilha em 1160), Ibn Tufaylapresenta Averróis ao emir dos Almóadas, AbuYa‘qub Yusuf (cujo reinado durou de 1163 a 1184,tendo morrido no cerco a Santarém), ele próprio in-teressado em filosofia, conhecedor de Aristóteles efomentador de comentários à sua obra.

Deste modo, Averróis, discípulo de Aristóteles eleitor atento dos seus comentadores helenísticos,como seja Alexandre de Afrodísias (m. c. 200) e Te-místio (século IV), seguiria os passos dos seus ante-cessores muçulmanos. Todavia, a sua obra distingue--se por uma procura gradual de maior fidelidade àfilosofia de Aristóteles, em detrimento da influêncianeoplatónica. Essa aproximação ao texto aristotélico

2 Ibidem, pp. 690-691.

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estaria presente desde o início da sua carreira en-quanto comentador, mas Averróis apercebe-se pou-co a pouco de que o modelo da emanação propostopor Avicena não tinha qualquer fundamento na obrado Estagirita.

Sem entrar de imediato em pormenores sobre omodo através do qual o filósofo andaluz restaura opensamento de Aristóteles, é nessa capacidade queele se torna conhecido no ocidente cristão. As suasobras, sobretudo os comentários, começam a ser tra-duzidas para latim a partir do segundo quartel do sé-culo XIII. As traduções do árabe para o latim, por ve-zes através do vernáculo, teriam lugar na PenínsulaIbérica, a partir do século XII. Os mais famosos tradu-tores de Aristóteles para latim seriam Gerardo de Cre-mona, Miguel Escoto, Hermanus Alemannus, tendoestes dois últimos traduzido obras de Averróis paralatim. As obras de Aristóteles eram frequentementetransmitidas na tradução latina com o comentário deAverróis, que, nos seus grandes comentários, cita àletra o texto do filósofo grego. Após a citação se-gue-se o comentário detalhado, tendo assim os lei-tores acesso ao texto aristotélico e à explicação.

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Anteriormente à tradução das obras de Aristóte-les do árabe para latim, encontrava-se disponível emlatim um reduzido número de obras dos pensadoresgregos ou helenísticos, tendo as obras lógicas sidotraduzidas por Boécio (480-524). A entrada do Es-tagirita no mundo ocidental latino, através da tradu-ção para latim das versões árabes, está ligada à fi-losofia de Averróis, que se torna assim o mais citadofilósofo muçulmano do período medieval. As obrasde Aristóteles, e posteriormente algumas das in-terpretações averroístas, serão condenadas pelaIgreja, mas não deixam de se propagar, acabandopor ser aceites em grande parte, o mesmo não sepodendo dizer de algumas teses averroístas.

Citado em latim a partir de 1230, Averróis é lidoe citado por Alberto Magno, mestre de S. Tomás deAquino em Colónia. Não podemos esquecer que ocurriculum de estudo medieval incluía primeiro o es-tudo da filosofia e em seguida o da teologia. Apesarde haver resistência e restrições ao estudo da filoso-fia aristotélica na Faculdade de Teologia da Univer-sidade de Paris, esse estudo prosseguiria. S. Tomássimboliza a incorporação do aristotelismo na doutrinacristã. Essa apropriação é influenciada pelos comen-

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tários do filósofo andaluz, porém, a recepção dosseus comentários não significou uma aceitação acrí-tica, como veremos.

S. Tomás de Aquino refere-se a Averróis como oComentador, na sua qualidade de comentador porexcelência de Aristóteles. A influência do filósofocordovês prolonga-se durante toda a Escolástica, osvários séculos em que se escrevem comentários àobra do Estagirita, até princípios do século XVII, quemarca o início da filosofia moderna, com as obrasde Descartes. Além de algumas teses averroístascondenadas por S. Tomás de Aquino no seu De uni-tate intellectus contra Averroistas, encontra-se ateoria de que o intelecto humano perde a sua indivi-dualidade no além e se funde inteiramente com ointelecto divino 3.

Algumas das teorias expostas nos grandes co-mentários, obras da maturidade, são rejeitadas porS. Tomás, como seja a eternidade do mundo (expli-

3 Langhade, Entre Islam et Chrétienté latine, pp. 250-254.Algumas das teses condenadas em 1270 incluíam a eternidadedo mundo, a negação do livre arbítrio ou ainda da providência eda omnisciência divinas, p. 255, n. 10.

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citamente defendida pelo Estagirita) e a teoria aver-roísta de que o intelecto humano se une ao intelectodivino na vida futura. S. Tomás condena-as enquantocontrárias à doutrina cristã. A segunda era contrá-ria ao dogma da ressurreição individual.

A par da corrente aristotélica mais moderada,que se atém aos dogmas cristãos, representada porS. Tomás de Aquino e outros teólogos, existe umacorrente aristotélica mais radical, a do chamado«averroísmo latino», cujas teses não se encontramnecessariamente em Averróis, mas decorrem do mo-vimento averroísta que se estende até ao Renasci-mento e é constituído, de facto, por vários ramos,havendo movimentos averroístas em Itália e França.

O declínio da influência do filósofo andaluz dá--se com o crepúsculo da tradição escolástica no sé-culo XVII. No Renascimento, há ainda vasta difusãodas obras de Aristóteles com os comentários deAverróis em latim, mas o início da nova era, na histó-ria da filosofia, relega essa hegemonia para os anaisda história. As novas tendências da filosofia faziam--se sentir, por exemplo, no pensamento de GiordanoBruno (1548-1600), que defendia um universo infinito,ao contrário do universo finito e fechado de Aris-

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tóteles. O averroísmo latino, baseado em Averróis,mas porventura levando mais longe a interpretaçãodesprendida da Escritura e defendendo uma leiturautilitarista da religião (que serviria para dominar ascamadas inferiores da população), leitura que Aver-róis discutira, mas rejeitara, no seu Discurso Deci-sivo, é considerado por alguns como presente emDescartes, que nas suas meditações usa apenas arazão e não a Escritura para provar a existência deDeus e a imortalidade da alma. O averroísmo foiconsiderado por alguns (na sua vertente da teoria dadupla verdade, debatida e rejeitada por Averróis) umantepassado do iluminismo europeu 4. A teoria dadupla verdade consistia na afirmação de que existeuma verdade filosófica que se exprime tal como elaé, mas que apenas é compreendida por uma mino-ria iluminada, a classe dos filósofos, e uma verdadereligiosa que se exprime através de metáforas e écompreendida, através da imaginação, por todos.Averróis defende que a verdade religiosa se exprimede várias maneiras, filosófica e metaforicamente,

4 Anderson, The Treatise of the Three Impostors and theProblem of the Enlightenment, pp. 142-143.

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mas afirma explicitamente na sua mais famosa obra,o Discurso Decisivo, que não há contradição en-tre filosofia e religião, ou seja, entre discurso reli-gioso e discurso filosófico, e que não se deve tomara verdade religiosa como mero estratagema para tor-nar as pessoas submissas e preservar a nossa exis-tência física neste mundo.

Porém, devido a algumas incompatibilidades en-tre a filosofia aristotélica — tal como foi exposta porAverróis — e a Escritura, a filosofia averroísta foicondenada por filósofos cristãos e defendida porpensadores menos ortodoxos.

Com o crepúsculo da Escolástica passa-se a es-tudar Averróis, não como fonte viva do pensamentodo Estagirita, mas como parte da história da filoso-fia. No início do século XIX, Hegel, nas suas Leitu-ras sobre a História da Filosofia, considera queos filósofos muçulmanos se haviam limitado a trans-mitir o pensamento grego, sem qualquer contribuiçãooriginal. Com o desenvolvimento dos estudos univer-sitários sobre o islão e em particular sobre a filosofiaislâmica, a partir da segunda metade do século XIX,essa abordagem muda gradualmente.

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Em trabalhos mais recentes estuda-se, por exem-plo, o impacto da teologia islâmica (kalam) na filo-sofia árabe, bem como características distintas decada filósofo, nomeadamente as diferenças radicaisentre as metafísicas de Avicena e de Averróis.

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BIOGRAFIA

Averróis, de nome completo Abu-l-Walid Mu-hammad ibn Ahmad ibn Muhammad ibn Rushd,al-hafid (o neto), nasceu em Córdova em 1126, comomembro de uma eminente família de juristas doAndaluz. O seu avô (falecido em 1126, ano do seunascimento) fora um jurista pertencente à escolamaliquita (predominante na Península Ibérica e noNorte de África, e uma das quatro escolas sunitasde direito islâmico), e também grande juiz (qadi) deCórdova e imã da grande mesquita. O seu pai, Abu--l-Qasim ibn Rushd, fora igualmente qadi de Cór-dova. Logo, Averróis teve formação completa nasciências religiosas e no direito maliquita. Tendo sidodiscípulo de al-Hafiz Abu Muhammad ibn Rizq, te-ria decorado a grande obra de Malik ibn Anas, al--Muwatta’, fundador da escola maliquita. O filósofo

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cordovês iria ser, ele próprio, autor de uma obrasobre direito islâmico, Bidayat al-Mujtahid wa-ni-hayat al-muqtasid (O Início do Intérprete do Di-reito [que efectua o juízo pessoal] e o Fim Da-quele que Se Contenta [com o ensino recebido]).Além da formação jurídica, Averróis recebeu forma-ção em teologia islâmica, em particular no ash‘aris-mo, tendo estudado enquanto jovem as obras de al--Ghazzali, que, além de crítico dos filósofos e místicoislâmico (como vimos foi ele quem tornou o sufis-mo, a mística islâmica, uma corrente aceite dentrodo islão ortodoxo), era teólogo ash‘arita. Averróis re-cebeu também formação médica, tornando-se mé-dico pessoal do emir Abu Ya‘qub Yusuf, após IbnTufayl ter ocupado esse posto, além de ter uma for-mação literária sólida. Averróis teve assim um pa-pel importante na sociedade do seu tempo, mas ésobretudo como filósofo que se distingue para aposteridade.

A dinastia reinante no Andaluz, quando nasceuAverróis, eram os Almorávidas, que aí tinham to-mado o poder em 1086. São depostos por outra di-nastia, de origem norte-africana, os Almóadas, fun-dada por Ibn Tumart (m. 1130), por volta de 1120 e

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«exportada» para o al-Andalus. Os Almóadas entramem Espanha em 1147, quando Averróis tem cercade vinte anos. É pouco depois dessa altura que ou-tro filósofo contemporâneo de Averróis, como ele na-tural de Córdova e considerado o maior filósofo me-dieval da tradição judaica, Maimónides, abandona aPenínsula Ibérica com a família em direcção a Mar-rocos, antes de prosseguir para o Egipto, onde viriaa falecer, em 1204.

Já durante o regime almorávida se dera um de-senvolvimento das ciências filosóficas, como o pro-va o aparecimento de filósofos como Ibn Hazm eIbn al-Sid. Há, também, um grande interesse pelalógica aristotélica. Todavia, é com a reforma religiosade Ibn Tumart que a filosofia ganha terreno fértilpara se desenvolver. Ibn Tumart é responsável poruma reforma religiosa no Andaluz. Anteriormente, oislão andaluz fora bastante uniforme, seguindo a es-cola maliquita de direito islâmico, baseando-se emprecedentes legais, através dos «ramos da jurispru-dência» (furu‘ al-fiqh), apresentando casos que ser-viriam para resolver todos os problemas dos muçul-manos. Por sua vez, em termos de direito islâmico,Ibn Tumart defende um aprofundamento do regresso

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aos fundamentos do direito islâmico (usul al-fiqh),o Alcorão e a Sunna (a tradição sobre os ditos e osfeitos do profeta Maomé) 5. No domínio teológico,defende uma rigorosa teoria da unidade e transcen-dência divinas. Enquanto tal, rejeita uma leitura lite-ral e antropomórfica do Alcorão. Essa leitura literaltinha sido anteriormente aceite pelos doutores da leimaliquitas, e era contrária à filosofia de origemgrega. As teorias de Ibn Tumart seriam adoptadase posteriormente impostas pelos emires almóadas (doárabe al-muwahhidun, aqueles que professam aunidade divina), entre os quais se encontrava AbuYa‘qub Yusuf, que fomentaria a filosofia durante oseu reinado.

Averróis é jovem quando os Almóadas tomam opoder no Andaluz, e é após a passagem do poderdos Almorávidas para os Almóadas que inicia os seusestudos filosóficos, através de um médico que co-nhecia as obras de Aristóteles, Abu Ja‘far Ibn Ha-run. Em 1153 desloca-se a Marráquexe. Nesse pri-

5 Geoffroy, Averroè, p. 702. Ver também Fricaud, «Le pro-blème de la disgrâce d’Averroès», p. 161.

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meiro período escreve o comentário ao Mustasfa deal-Ghazzali (1157), bem como os breves comen-tários, ou epítomes, à Física, De caelo, De gene-ratione et corruptione e Meteorologica de Aris-tóteles. Por volta de 1160, escreve os epítomes deDe anima e da Metafísica.

Em 1163 toma o poder Abu Ya‘qub Yusuf, comoresultado da morte de seu pai, o emir almóada ‘Abdal-Mu’min, passando Sevilha a capital do impérioalmóada. Seria este emir a encomendar comentá-rios de Averróis à obra de Aristóteles. Como vimos,é alvo de polémica a data do primeiro encontro en-tre aquele e o emir, e os especialistas questionam--se se teve lugar em finais da década de 1150 e prin-cípio da década de 1160 ou alguns anos mais tarde,por volta de 1169. Averróis teria composto já na al-tura do primeiro encontro com este emir, por inter-médio de Ibn Tufayl, seu mentor, alguns dos seuscomentários a Aristóteles, e é na qualidade de filósofoque Ibn Tufayl o apresenta ao soberano. O relatoé-nos transmitido pelo cronista al-Marrakushi, queo havia ouvido de um discípulo do próprio Averróis.Após uma introdução em que o emir elogia os ante-passados do filósofo cordovês, a discussão passa a

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temas filosóficos, altura em que o emir pergunta aAverróis se os filósofos consideram o céu criado oueterno, ou seja, se existira desde toda a eternidadeou teria um começo. (Os filósofos muçulmanos comoAvicena e Alfarabi haviam defendido que o mundoera eternamente criado, não no tempo — ou seja,não tendo havido uma altura em que Deus existiasem o mundo —, mas produzira o mundo eterna-mente.) Averróis dedicaria partes das suas obras aesse problema. Inicialmente, teme a questão, e alu-de ao carácter herético da mesma, mas quando oemir demonstra o seu interesse e abertura, e a dis-cute com Ibn Tufayl, demonstrando conhecimentoda filosofia grega, Averróis participa na discussão.Segundo o cronista, o emir ter-se-ia também quei-xado, numa conversa com Ibn Tufayl, da obscuri-dade dos textos do Estagirita, pelo que desejava queum filósofo se ocupasse da sua explicitação. Porém,Ibn Tufayl considerava-se com demasiada idade edemasiado ocupado para tal tarefa, pelo que a trans-feriu para Averróis.

Assim teriam origem os comentários do filósofocordovês, ainda que, como frisámos, é provável quejá tivesse composto alguns comentários ou epítomes

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à obra de Aristóteles antes deste marcante aconte-cimento. Segundo Geoffroy, que acredita numa da-tação anterior do encontro, mas não antes da pro-dução dos primeiros comentários, foi esse encontroque levou Averróis a atingir a segunda fase da suacarreira filosófica, em que escreve os comentáriosmédios (talkhis). 6 Na primeira fase, em que escre-vera os comentários breves, faz uma síntese de umadisciplina, como a Física ou a Metafísica, mas nasegunda fase distinguem-se mais nitidamente oselementos propriamente aristotélicos. A crítica a Avi-cena e o conhecimento da obra de al-Ghazzali fa-zem-se notar desde o início, por exemplo, no Comen-tário Breve à Metafísica de Aristóteles, mas é maistarde que se dá a recusa do sistema neoplatónicoda emanação. No domínio da política, contudo, se-gue Platão e o seu discípulo Alfarabi, na opinião deque o soberano deve ser sábio e que o filósofo nãose deve encerrar numa contemplação solitária.

Em 1167 escreve a paráfrase aos Tópicos e o seucompêndio de direito, intitulado Bidayat al-mujtahid.

6 Geoffroy, Averroè, p. 730

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O termo ijtihad designa a decisão/juízo pessoal ouindependente daquele que se ocupa de casos legaisislâmicos, e ainda o uso da analogia (qiyas) nessescasos. Esse uso era aceite normalmente durantes osdois ou três primeiros séculos do islão. A partir domomento em que o direito islâmico sunita se crista-lizou, começou-se a questionar quem devia ter odireito a ijtihad. Por volta do início do século quar-to do calendário islâmico, século X da era cristã,quando as questões principais do direito islâmico ti-nham sido resolvidas, os especialistas das váriasescolas de direito islâmico decidiram que o juízopessoal já não devia ser exercido, e que todas asdecisões deviam ser baseadas nas leis existentes.Daí a importância de Averróis em reavivar o princí-pio do uso do juízo pessoal (posteriormente, IbnTaymiyya também defenderia esse princípio), maisuma prova do seu desejo de uso da razão, em vezde um seguimento puramente tradicional das leisestabelecidas.

De 1169 a 1171 é juiz em Sevilha. Regressa aCórdova em 1171, onde permanece na corte do emiralmóada. Escreve vários comentários médios nestaépoca. Em 1169 escreve De animalibus e o Comen-

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tário Médio à Física (que sobrevivem na traduçãomedieval hebraica, mas dos quais se perdeu o origi-nal árabe). Em 1170 escreve De sensu et sensatu,em 1171, De caelo, em 1172, De generatione etcorruptione, e em 1175, os comentários médios àRetórica e à Metafísica. Desta última também seperdeu o original árabe, tendo restado a traduçãohebraica medieval. Em 1177 escreve o comentáriomédio à Ética a Nicómaco, do qual temos as tra-duções medievais latina e hebraica. Em 1178 per-manece algum tempo em Marráquexe, onde termi-na De substantia orbis (Sobre a Substância daOrbe/Corpo Celeste). Em 1179 é qadi de Sevilha.Nessa qualidade está encarregado de nomear e gerirtodo o pessoal jurista/religioso. É nesse período quecompõe as suas obras ditas «originais»: o DiscursoDecisivo (Fasl al-maqal) e também Kashf ‘anmanahij al-adilla f i ‘aqa’id al-milla (Revelaçãodos Métodos da Demonstração relativamente àsDoutrinas da Comunidade Religiosa) e finalmenteA Incoerência da Incoerência.

Em 1182, Averróis torna-se médico pessoal doemir, substituindo Ibn Tufayl nesse cargo. Em 1186

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escreve o Grande Comentário à Física. Seguem--se os outros grandes comentários às obras de Aris-tóteles. Após a morte de Abu Ya‘qub no cerco deSantarém em 1184, Averróis parece perder a sua in-fluência política sobre o emir, quando Abu YusufYa‘qub al-Mansur lhe sucede. Este emir tem me-nos interesses intelectuais do que o seu predeces-sor. No seu reinado, Averróis cairia em desgraça.Apesar do florescimento da filosofia no Andaluz, ofacto de aí haver vários escritos a favor do estudoe prática da filosofia mostra que essa prática esti-vera sempre sob certa ameaça, ameaça que se tor-naria agora real. A oposição religiosa à filosofia eaos filósofos acentua-se, havendo mesmo um epi-sódio, que Averróis conta na primeira pessoa, segun-do o qual ele e o seu filho, ao entrar na mesquita deCórdova para rezar, foram expulsos pela multidão 7.Os motivos do seu exílio, imposto pelo novo emir,prendem-se com questões religiosas e políticas. Aorejeitar o uso da casuística dos juristas maliquitas criouinimizades. As suas posições filosóficas eram consi-

7 Fricaud, «Le problème de la disgrâce d’Averroès», p. 177.

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deradas contrárias à religião, tendo sido distorcidasdurante a sua acusação e julgamento.

Em 1197 Averróis é exilado em Lucena, localidadea sul de Córdova, por ordem do emir, durante cercade ano e meio. Posteriormente é revogado o seuexílio e ele é de novo chamado para a corte emMarráquexe. Morre em Dezembro de 1198. No anoseguinte, os seus restos mortais são levados paraCórdova.

O grande impacto da obra de Averróis não seriano Andaluz ou no mundo árabe, provavelmente de-vido à hostilidade crescente em relação à filosofia— se bem que as suas obras continuassem a ser es-tudadas no Andaluz e no Magrebe (por exemplo, écitado por Ibn ‘Arabi, místico andaluz do século XIII,e por Ibn Khaldun, famoso historiador muçulmanonatural de Tunes no século XIV) —, mas no mundocristão, através de pensadores cristãos e judeus, queimediatamente se encarregariam de traduzir as obrasde Averróis para latim e para hebraico.

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OBRAS

A obra de Averróis é vasta, abrangendo a suaprodução mais de quarenta décadas. Mais de cemtítulos são conhecidos e apresentam grande diversi-dade, reflectindo os seus interesses, formação ecarreira profissional. Além dos escritos filosóficosque o colocaram na história da filosofia medieval,escreveu, como já foi referido, um compêndio dedireito maliquita (bidayat al-mujtahid) e obrasmédicas, como seja as Generalidades sobre Me-dicina (al-Kulliyat fi-l-tibb, traduzida para latimcomo Colliget). As obras filosóficas também sãomultifacetadas. No que diz respeito aos comentários,é habitual serem divididos em breves (mukhtasar oujami‘), médios (talkhis) e longos (tafsir ou sharh),devido ao facto de, em certos casos, Averróis ter

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produzido três comentários à mesma obra de Aris-tóteles, como, por exemplo, a Física e a Metafísica.Os comentários breves são por vezes sumários enem sempre mais curtos do que os comentários mé-dios. Os comentários breves, ao contrário dos lon-gos ou grandes, não constituem uma leitura literal deAristóteles, mas seguem o modelo dos comentáriosantigos. A tradição de comentários às obras de Pla-tão e Aristóteles remonta à Antiguidade Clássica esurge, por exemplo, entre filósofos neoplatónicos earistotélicos, como seja Alexandre de Afrodísias eTemístio, ou ainda Filópono (m. 530). Nos seus co-mentários breves, que nalguns casos são apenasepítomes de determinada disciplina, Averróis nãosegue necessariamente Aristóteles à letra ou mes-mo em espírito, como sucede no comentário breveà Metafísica, onde propõe o modelo de emanaçãoneoplatónico, desenvolvido anteriormente por Alfa-rabi e Avicena. Logo, estes epítomes, incluindo o epí-tome a De anima, em que se notam as influênciasde Alexandre de Afrodísias, Temístio, Alfarabi e IbnBajja, são resumos da disciplina com base na filo-sofia do Estagirita, apresentando outras influências.Entre os comentários médios é de notar o Comen-

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tário à República de Platão, que Averróis compõepor não ter tido acesso à Política de Aristóteles.Nessa obra, analisa a realidade política muçulmanado seu tempo ao discutir a filosofia política de Pla-tão e a comunidade ideal.

Entre os comentários de Averróis, é de destacaros grandes comentários, compostos na última faseda sua carreira, em que atinge a maturidade filosó-fica, e nos quais o texto do Estagirita é citado, emárabe, seguindo-se o comentário literal de Averróis.Houve quem visse nesses comentários uma inspira-ção na tradição do comentário pormenorizado aoAlcorão, aplicado agora às obras de Aristóteles 8.Porém, não se deve concluir que o filósofo cordo-vês abdique do seu juízo pessoal: ao expor as teo-rias do filósofo grego, considerado sempre um autorobscuro que requeria explicitação, fornece interpre-tações que geralmente seriam tidas como sinónimasdas opiniões de Aristóteles, e considerado, na suaexegese, a autoridade máxima durante a Escolástica

8 Roccaro, Conoscenza e Scienza nel Tafsir Ma ba‘d at--Tabi‘a di Ibn Rushd, pp. 23-24.

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latina. Os grandes comentários são precedidos cro-nologicamente pelos tratatos de carácter religioso.Por um lado, é nesses grandes comentários queAverróis segue mais à letra o texto do Estagirita. Poroutro lado, ao debruçar-se a fundo sobre o texto ea problemática aristotélicas, formula novas teoriasque iriam revolucionar a metafísica e a psicologiamedievais. Dos grandes comentários chegaram-noscinco, a De anima, Física, Segundos Analíticos,De caelo, Metafísica, provavelmente segundo estaordem.

Algumas das suas obras perderam-se, como porexemplo um comentário à Profissão de Fé (‘Aqi-da) de Ibn Tumart. Nem todos os seus textos seencontram disponíveis no original árabe. Em algunscasos, apenas subsiste a tradução medieval latina oua tradução medieval hebraica. Tal é o caso, porexemplo, de duas das suas obras mais influentes, osgrandes comentários à Física e a De anima, deAristóteles, cuja versão de referência é a traduçãomedieval latina, efectuada pouco depois da suamorte, no século XIII. O trabalho do especialista étambém dificultado devido ao facto de ainda nãohaver edições críticas de muitas das suas obras.

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Existem outras obras escritas para lidar com umproblema específico, seja ele um aspecto da filoso-fia aristotélica, como a substância da esfera celeste(De substantia orbis), ou a conjunção do intelectohumano com o intelecto activo (três opúsculos sobrea conjunção).

Outros escritos, como, por exemplo, A Revelaçãodos Métodos da Demonstração (Kashf ‘an ma-nahij), versam sobre questões de teologia islâmica(kalam), como as provas da existência de Deus, aunidade divina, os atributos divinos, os actos divinos,a justiça divina e ainda a natureza da profecia, ouseja, as questões fundamentais da teologia islâmicaque tinham atraído a atenção dos teólogos mu‘ta-zilitas.

Outra obra a destacar é A Incoerência da Incoe-rência (Tahafut al-tahafut), uma refutação, pontopor ponto, da obra de al-Ghazzali intitulada A Incoe-rência dos Filósofos (Tahafut al-falasifa). Comovimos, o teólogo ash‘arita ataca nessa obra a con-cepção filosófica de Deus, acusando os filósofosmuçulmanos dos erros dos filósofos gregos e pagãos.Na sua refutação de al-Ghazzali, Averróis demons-tra que a filosofia grega, ou melhor, a filosofia de

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Aristóteles, não é incompatível com o islão. Aquiloque é incompatível com o islão é a leitura erróneado aristotelismo por parte de Avicena, em particulara teoria da emanação, que leva ao paradoxo de umDeus autómato. Na sua obra o Discurso Decisivodefende, a partir de uma perspectiva jurídica, o es-tudo da filosofia grega num meio muçulmano e de-monstra ainda a compatibilidade entre Aristóteles eo islão. As obras de cariz religioso ou teológico, ouseja, o Discurso Decisivo, A Revelação dos Mé-todos e A Incoerência da Incoerência, vão sendoescritos, cronologicamente, entre os breves e osgrandes comentários.

No que diz respeito à evolução do seu pensamen-to, nos breves comentários defende uma teoria daemanação semelhante à de Alfarabi e de Avicena(se bem que fosse já crítico de Avicena no brevecomentário à Metafísica), mas rejeita o modelo daemanação no comentário médio e no grande comen-tário à Metafísica, bem como em A Incoerênciada Incoerência. Segundo Avicena, seguindo umprincípio neoplatónico, do uno apenas procede umefeito, logo Deus apenas produz uma causa. MasAverróis afirma que esse tipo de modelo só se apli-

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ca à causalidade eficiente, que ele exclui do mundoceleste, e não à causalidade final e formal. Logo, deDeus tudo é criado num único fiat. Além disso, iden-tifica a primeira causa com o motor imóvel que éapresentado no oitavo livro da Física de Aristóte-les. Segundo este novo modelo, Deus é causa, so-bretudo enquanto objecto de desejo dos intelectoscelestes, e, de um modo geral, de toda a criação.É após uma reflexão profunda sobre a obra deal-Ghazzali, de Avicena e de Aristóteles, que pro-cura restaurar o verdadeiro pensamento do Estagi-rita. Paradoxalmente, é nessa tentativa de fidelidadeao texto do Estagirita que sobressai a sua verda-deira originalidade e se destaca dos outros pen-sadores muçulmanos.

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FILOSOFIA E RELIGIÃO

A questão da relação entre filosofia e religião emAverróis não se reflecte apenas nos seus escritos,mas faz parte das questões debatidas na sociedadedo seu tempo. O seu exílio prende-se, em grandeparte, com uma acusação de irreligiosidade. De ummodo geral, a filosofia grega fora geralmente vistano mundo islâmico com alguma apreensão e descon-fiança por parte das autoridades religiosas. Na Es-colástica latina, e sobretudo com o desenvolvimentodo averroísmo latino, houve outras acusações deheresia, ou pelo menos de incompatibilidade do seupensamento e do de Aristóteles com a doutrina cris-tã. Essas considerações, nomeadamente a atribuiçãoda teoria da dupla verdade ao filósofo cordovês,encontram ecos ainda no estudo académico de Aver-róis nos séculos XIX e XX.

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Nas obras ditas «originais» ou religiosas, em quenão comenta o texto aristotélico, responde às ques-tões de al-Ghazzali, seu interlocutor explícito (emA Incoerência da Incoerência) ou implícito (emA Revelação dos Métodos ou no Discurso De-cisivo).

Em A Incoerência da Incoerência apresentavinte teses, que incluem dezasseis de metafísica,seguidas de quatro de física. As duas primeiras sãodedicadas à eternidade do mundo, no passado, e nofuturo. Seguem-se respostas às questões de al--Ghazzali sobre a concepção errónea, segundo ele,do criador por parte dos filósofos e a sua incapaci-dade de provar que ele é autor do mundo. Aborda,nas questões seguintes, a incapacidade dos filóso-fos, segundo al-Ghazzali, de provar que Deus é uno,a sua concepção dos atributos divinos, a ideia de queEle não tem quididade ou essência. Outras questõesrelativas a Deus, de que trata Averróis, são a incor-poreidade divina. As questões onze, doze e trezetratam do conhecimento divino, da demonstração deque Deus conhece o que se passa neste mundo, daincapacidade, segundo o teólogo ash‘arita, de pro-

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var que Ele se conhece a si mesmo, e a tese se-gundo a qual Deus não conhece os particulares.Seguem-se três questões de cosmologia: a questãode provar que o céu é animado, a doutrina do movi-mentos dos céus e a teoria de que as almas celes-tes conhecem as realidades individuais. As quatroúltimas questões, de ciências naturais/física, colo-cadas por al-Ghazzali de que trata Averróis, são oataque à teoria da causalidade, a incapacidade deprovar a espiritualidade da alma, a teoria da imorta-lidade, a negação da ressurreição do corpo.

Nas vinte teses refutadas por Averróis, al-Ghaz-zali acusa os filósofos de apresentarem uma visãoda divindade que não se coaduna com o Deus doAlcorão. É um Deus sem vontade que produz omundo de forma necessária. Nesse ponto distingue--se a crítica ao sistema neoplatónico da emanação,adoptado tanto por Avicena como por Alfarabi an-tes dele e, como vimos, tendo por base a traduçãode excertos das Enéadas de Plotino, que circulavamsob o título A Teologia de Aristóteles, erroneamenteatribuída a Aristóteles. Como referimos, al-Ghazzaliacusa os filósofos em particular de três teorias, que

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são susceptíveis da acusação de heresia ou infideli-dade, de 1) defenderem a eternidade do mundo, in-compatível com a ideia de um Deus criador, comoé apresentado no Alcorão. São acusados também de2) negarem que Deus conhece os particulares, peloque Deus não conheceria os profetas, incluindoMaomé, não conheceria o começo do islão e seriaincapaz de julgar indivíduos no dia do Juízo Final.Uma outra acusação diz respeito 3) à ressurreiçãodo corpo. Filósofos como Alfarabi e Avicena — sen-do este último o grande alvo de al-Ghazzali — acre-ditavam na vida eterna da alma, pelo menos daque-les que haviam exercitado nesta vida a faculdaderacional, ou seja, os filósofos, mas não necessaria-mente na ressurreição do corpo. Averróis explica nãosó que as teorias dos filósofos gregos são coeren-tes e racionais, como estão em consonância com otexto do Alcorão, desde que este seja interpretado.Nem sempre discorda de al-Ghazzali, mas diz queas suas críticas seriam válidas contra Avicena, masnão contra Aristóteles. Em A Incoerência da In-coerência sentiu-se na necessidade de defender afilosofia do ataque de al-Ghazzali. Este afirmara que

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a filosofia islâmica, baseada na filosofia grega, eracontrária ao islão. Averróis rejeitava particularmentea acusação de heresia, contra os filósofos, no quediz respeito às três questões referidas.

Em A Revelação dos Métodos ataca a teologiaash‘arita de que al-Ghazzali fora expoente e queeste usara para combater os filósofos. Como vimos,entra nos debates dogmáticos que haviam divididoas diferentes escolas do islão, em particular osmu‘tazilitas e os ash‘aritas. Baseadas na interpre-tação do Alcorão, essas escolas discutiam, por exem-plo, a questão de Deus, dos atributos divinos, as ac-ções divinas, e em seguida questões de profecia,escatologia, e política, entre outras questões teoló-gicas, que Averróis se propõe resolver usando im-plicitamente princípios aristotélicos. Assim, os filó-sofos estavam mais próximos da teologia mu‘tazilita,nomeadamente no acentuar da interpretação me-tafórica do Alcorão (que estava ligada, para osmu‘tazilitas, ao facto de considerarem o Alcorão odiscurso criado por Deus, em vez de ser o Seu dis-curso eterno). Por conseguinte, o grande alvo dascríticas de Averróis era a teologia ash‘arita. Apre-

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senta um modelo alternativo à teologia ash‘arita, queseria válida num contexto almóada. Averróis tratadas provas da existência de Deus, sugerindo que seencontram ao observar a natureza e a sua harmo-nia, que demonstra as marcas do criador, e a ori-gem da vida. Baseia a sua argumentação em prin-cípios aristotélicos, como seja a teoria da causalidade,ou a distinção entre substância e acidente.

Outra obra que não é um comentário aos textosaristotélicos é o Discurso Decisivo sobre a Har-monia entre a Religião e a Filosofia. Nela, Aver-róis apresenta, sob a forma de um problema legal, aperspectiva jurídica sobre o estudo da filosofia, ouseja, se o estudo da filosofia, em particular dos An-tigos, se coaduna com o Alcorão e a tradição islâ-mica, e se pode ou deve ser estudada, do ponto devisto da lei islâmica, a shari‘a. Averróis conclui queesse estudo é obrigatório. Afirma que não só podemas deve ser estudada por parte daqueles que têma capacidade intelectual para a compreender. Impli-citamente, também conclui que a filosofia de Aris-tóteles não é incompatível com o Alcorão e que asverdades da filosofia grega, em particular a de Aristó-

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teles, concordam com as verdades do Alcorão.A chave da harmonização está numa interpretaçãomenos literal do Alcorão. A temática deste opúsculoresume a questão central da filosofia medieval, a re-lação entre filosofia grega e escritura, e ainda a re-lação entre fé e razão. O Discurso Decisivo podeser considerado uma opinião legal ou fatwa emitidapor um jurista, por forma a legitimizar o estudo dafilosofia numa sociedade islâmica.

Mas o debate não se limita à questão da aceita-ção da filosofia na sociedade andaluza da sua épo-ca. Averróis entra em pormenores sobre questõesque discutira em A Incoerência da Incoerência,como seja a eternidade do mundo, e o conhecimen-to que Deus tem dos particulares, desta vez usandoo Alcorão como prova de que as teorias de Aristó-teles não divergem da letra da Escritura. Mais im-portante ainda, como referimos, é a sugestão de umainterpretação metafórica do Alcorão, que de restonão era uma inovação em termos do pensamentoteológico islâmico, e se torna uma solução-chavepara a harmonização entre Aristóteles e a doutrinaislâmica. Nesse sentido, Averróis distingue três ní-

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veis de interpretação que se adequariam aos diver-sos tipos de compreensão de cada indivíduo, do maisliteral ou antropomórfico ao mais abstracto, de for-ma a transmitir o significado da Escritura a todos osmuçulmanos.

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METAFÍSICA E FÍSICA

A metafísica de Averróis caracteriza-se por umaforte influência aristotélica. Rejeita a teoria das for-mas de Platão (que conhecia através da Metafísica)e interessa-se por particulares, de que se abstraemposteriormente os universais. Estes não existemenquanto formas, ou independentemente de substân-cias concretas, mas apenas na mente, enquantoabstracções.

No que diz respeito à teoria da existência, Aver-róis marca um regresso a Aristóteles na medida emque pensa nos existentes, em vez de pensar na exis-tência em si mesma, teorizando sobre ela, como fi-zera Avicena, que considera a existência como umacidente (‘arad), uma vez que é, pelo menos con-ceptualmente, se não mesmo cronologicamente, dis-tinta da essência. Uma vez que esta teoria parece

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paradoxal, por levar à conclusão de que as essên-cias «existem» antes de existirem, alguns especia-listas de Avicena afirmaram que se trata apenas deuma distinção conceptual, não real. Contudo, Avicenaafirma que a existência é um acidente em várias dassuas obras, pelo que não se pode discutir esse facto.Essa afirmação assume tal importância no seu sis-tema que a usa para demonstrar que só Deus temuma essência que inclui a sua existência, argumen-to que entraria para a Escolástica latina, surgindocomo argumento ontológico da existência de Deusnas Meditações Metafísicas de Descartes. Emtodas as outras substâncias, a existência é algo aci-dental, não incluído na essência, ao contrário deDeus.

Por seu lado, Averróis afirma que a existência nãoé um acidente, mas apenas expressão da verdadeou concebida, como em Aristóteles, segundo as dezcategorias. Afirma o absurdo da teoria de Avicenano sentido em que, se a existência é acidente, tam-bém se poderia predicar a existência deste acidentee assim ad infinitum. Logo, não procede à reifica-ção da existência como o faz Avicena. Ecos deste

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debate encontram-se também em Kant, que na suaCrítica da Razão Pura afirma que a existência nãoé um predicado.

Outra posição metafísica de Averróis que se des-taca da de Avicena é a metafísica modal. No quediz respeito à distinção entre possível e necessário,Avicena inaugura uma nova fase na filosofia medie-val ao falar do possível em si, necessário através deoutro. Todos os seres são possíveis (ou contingen-tes) em si mesmos, se não se leva em conta a causaque os produziu. Só em Deus a existência é absolu-tamente necessária, sem causa. Todos os seres exis-tentes em acto são possíveis em si, necessários atra-vés de outro, a sua causa. Segundo Avicena, anecessidade é equivalente à existência, pois tudo oque existe existe necessariamente, através de umacausa. O possível ou o contingente em si é, pordefinição, aquilo que não existe. Só Deus é neces-sário por si mesmo, nele a essência inclui a existên-cia. Esta distinção tornar-se-ia famosa na Escolás-tica latina, e seria adoptada por S. Tomás de Aquinono seu opúsculo De ente et essentia. No entanto,esta concepção das modalidades metafísicas, que

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resulta na filosofia de Avicena num determinismometafísico, desvia-se da teoria de Aristóteles, quesimplesmente definia na sua Metafísica o necessá-rio como aquilo que existe eternamente e não podeser de outra maneira, sendo a questão da causali-dade uma consideração subalterna dentro do con-ceito de necessidade.

Averróis rejeita a classificação de Avicena e afir-ma que o possível é aquilo que dura um tempo limi-tado, ou seja, todos os seres sujeitos a geração ecorrupção. Logo, apenas os seres celestes e Deussão necessários, e apenas Deus é incausado.

Como vimos, Averróis rejeita a teoria da emana-ção, restringindo o domínio da causalidade eficienteao mundo empírico. Desse modo, revela-se outradivergência em relação a Avicena, ou seja, umamaior ênfase na causa final do que na causa efi-ciente. Avicena também realçara a causa final ou ofim ou o objectivo de cada acção, voluntária ou na-tural, mas é Averróis que explicita o domínio dacausa final sobre as outras três causas aristotélicas:eficiente, formal e material (sendo a causa eficien-te o agente, a causa material a matéria ou substân-

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cia de que algo é feito, a causa final o objectivo e acausa formal a definição ou forma de algo).

Averróis afirma a primazia da causa final, em vezda causa eficiente, como fizera Avicena na sua fi-losofia natural. Este defende uma teoria de obstá-culos segundo a qual a causa eficiente produz sem-pre o seu efeito, se não houver qualquer obstáculo(por exemplo, o fogo queima a madeira se esta nãoestiver húmida). Averróis, por seu lado, contrarian-do a tendência mecanicista de Avicena, afirma noseu Grande Comentário à Física que, se umagente não produz o seu efeito, isso se deve aopróprio sujeito da acção em atingir o seu objectivodevido à sua constituição intrínseca, oferecendoassim maior liberdade ao sujeito da acção. A umnível mais geral, toda a causalidade é subordinadaà causa final suprema, Deus. Avicena apresenta umsistema em que tanto Ele produz, como causa efi-ciente, o mundo, como tudo aspira a Ele. Ao abo-lir o sistema da emanação, Averróis defende quetudo é produzido por Deus imediatamente, mas namedida em que todos os seres O têm como causafinal.

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No que diz respeito à física, Averróis pode-seconsiderar um defensor da experiência empírica.Nas suas observações sobre os corpos celestes,sobre o clima como sobre a medicina tem recurso adados empíricos.

Ainda relativamente à física, e em mais uma crí-tica a Avicena, Averróis prova a existência de Deus,ou do primeiro motor, na Física, tal como fizeraAristóteles. Segundo o Estagirita, nos SegundosAnalíticos, uma ciência não pode provar o seu pró-prio objecto de estudo, senão haveria um argumen-to circular. Por conseguinte, a metafísica, que seocupa do ser em geral (enquanto ontologia) e do serpor excelência, Deus (enquanto teologia), não podeprovar a existência de Deus. Daí a existência deDeus ter de ser provada através da física. Avicena,porém, defendera que a metafísica se ocupa emprimeiro lugar do ser em si mesmo, para obviar acircularidade.

De um modo geral, o sistema metafísico de Aver-róis é um sistema teleológico, por oposição ao siste-ma mecanicista de Avicena, que se imporia de novona história da filosofia no século XVII.

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PSICOLOGIA

O estudo da alma na filosofia islâmica baseia-seem primeiro lugar na obra De anima (Sobre a Al-ma) de Aristóteles. Todavia, a teoria do Estagiritasobre a alma já fora estudada pelos seus comenta-dores helenísticos, como, por exemplo, Alexandre deAfrodísias e Temístio. Segundo Aristóteles, a almaé a forma do corpo, sendo aquilo que anima o corpoe torna o ser animado num ser vivo. A sua psicolo-gia inclui três tipos de alma. Existe a alma nutritiva,que se encarrega da alimentação do corpo, e écomum a todos os seres vivos, incluindo as plantas.Em seguida, existe a alma sensitiva, que os huma-nos partilham com os animais, e envolve a percep-ção sensível, através dos cinco sentidos. Por fim,existe a alma racional, que é exclusiva dos seres

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humanos. Na alma residem também a imaginaçãoe o intelecto. Estas funções são aquelas que permi-tem o conhecimento, aquilo que distingue humanosde animais, e constitui a diferença específica daespécie humana. É o intelecto que, na tradição aris-totélica, e segundo Averróis, abstrai a forma da ma-téria em qualquer ser individual ou substância pri-meira. Em contacto com essa substância dá-se aabstracção do particular para o universal. O filósofocordovês recebe de Aristóteles a teoria da abstrac-ção, segundo a qual os universais são obtidos atra-vés da abstracção da forma a partir da análise desubstâncias primeiras, até à obtenção do universal.

Tanto Averróis como Avicena, anteriormente, re-jeitaram a teoria das formas de Platão, no sentidoem que essas formas, segundo eles, não se encon-tram numa realidade atemporal e transcendente.Avicena, porém, acredita que essas formas residemno décimo intelecto que emana a partir do intelectodivino, o dador de formas. Desse modo, não é pos-sível separar a teoria da psicologia em Averróis eAvicena, sem nos debruçarmos sobre a sua cosmo-logia. O filósofo cordovês, como referimos, não

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aceita a teoria da emanação, nem a ideia de que asformas são fornecidas pelo dador de formas. O dé-cimo intelecto é responsável por actualizar formasque são potencialmente inteligíveis nas substânciasprimeiras.

No que diz respeito ao intelecto, Aristóteles apli-ca a distinção entre potência e acto, distinguindoaquele que está em acto — separado e impassível,imortal e eterno, que intelige universais em acto, eé causa de todos os inteligíveis — do intelecto empotência, que tem a capacidade de receber os uni-versais, e que não tem qualquer qualidade, de for-ma a poder receber qualquer universal, mas é pas-sivo em relação ao intelecto agente, como a matériaem relação à forma.

Esses dois tipos eram provavelmente para Aris-tóteles apenas diferentes funções do mesmo intelectohumano. No entanto, os seus comentadores, aindano período helenístico, reificaram os diferentes tiposde intelecto, além de fazerem várias distinções.Contudo, uma vez que o Estagirita tinha descrito ointelecto agente como «separado», os comentadorestinham-no identificado com uma inteligência separada

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e distinta do intelecto humano. Alexandre de Afro-dísias identifica o intelecto agente com o primeiromotor, ou Deus. Posteriormente, é identificado como décimo e último intelecto na série total, o dadorde formas. Ao contrário dos outros intelectos, estenão se encontra ligado a um corpo celeste.

Segundo Aristóteles uma coisa só pode passar dapotência a acto se houver algo, com a caracterís-tica daquilo que vai actualizar, que transforme o in-teligível em potência em inteligível em acto, sendo opróprio agente da transformação uma substânciaimaterial. Logo, segundo os comentadores helenísti-cos e medievais, há a necessidade de um elementoexterno, que esteja sempre em acto, para fazer queo intelecto humano compreenda os universais emacto. Avicena situara esse poder no dador de for-mas, que concentraria as formas que são emanadaspara o mundo sublunar. Desse modo pode falar-sede um certo platonismo de Avicena, visto que o inte-lecto agente é responsável pelo fornecimento das for-mas separadas, os universais, ao intelecto humano.

Averróis aceita a teoria de que o intelecto agentenão é parte do intelecto humano, seguindo a inter-pretação de Aristóteles, rejeitada pelo consenso dos

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estudiosos actuais, segundo a qual esse é um inte-lecto divino, que se encontra no mundo celeste.Porém, não aceita que forneça as formas, mas queajuda o intelecto humano a abstraí-las dos objectossensíveis, a actualizar as formas que podem poten-cialmente ser inteligíveis pelo intelecto humano.

No que diz respeito à origem das formas, Aver-róis aceita inicialmente o modelo do dador de for-mas. Posteriormente, e à medida que procura des-trinçar as verdadeiras teorias de Aristóteles dasteorias neoplatónicas que circulavam em conjunçãocom as obras do Estagirita traduzidas para árabe,rejeita a teoria do dador de formas. Vai ainda maislonge, ao afirmar que as formas naturais, que seencontram no mundo terrestre e estão em potênciana matéria-prima, são activadas por elementos na-turais, como, segundo afirma Averróis, mostra aexperiência. É essa a teoria que defende em A In-coerência da Incoerênica e no Grande Comen-tário à Metafísica. O agente físico produz tanto osubstrato como a forma. O calor vital que se en-contra em organismos vivos pode vir do Sol ou deelementos supralunares, como as estrelas, mas não

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do intelecto agente, que não é responsável pela ema-nação das formas naturais.

No que diz respeito às considerações sobre o in-telecto, os filósofos muçulmanos dividem-no, de ummodo geral, em quatro categorias 9: 1) o intelectoagente, que é totalmente separado do humano, e oactualiza, bem como os inteligíveis em potência.Como vimos, a teoria, já proposta pelos comentado-res helenísticos, segundo a qual não constituía umafaculdade humana, advinha da afirmação de Aristó-teles segundo a qual este intelecto é separado e eter-no; 2) o intelecto potencial, ou material, a capaci-dade de receber inteligíveis por parte do ser humano;3) o intelecto habitual ou especulativo, o estado a quechega quando adquiriu alguns universais, e 4) o in-telecto adquirido, quando adquiriu todos os inteligí-veis. Averróis fala ainda do intelecto passivo, ligadoa uma função da alma.

Sendo o intelecto agente separado e não humano,Averróis discute nas suas várias obras a natureza

9 Black, «Psychology: soul and intellect», in The CambridgeCompanion to Arabic Philosophy, pp. 317-318.

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do que é material, ou seja, o intelecto humano quetem a capacidade de pensar os inteligíveis. Alexandrede Afrodísias chamara ao intelecto em potênciamaterial, designação incorporada por Averróis.

Averróis escreveu três comentários, breve, mé-dio e grande, sobre De anima de Aristóteles. É nogrande comentário que desenvolve algumas dou-trinas de grande impacto na Escolástica latina, no-meadamente a teoria sobre o intelecto material,que evoluiu ao longo da sua carreira enquantocomentador.

Existem duas interpretações distintas sobre a na-tureza deste. Aristóteles comparara a capacidade dopensamento humano a uma tábua rasa, porém, essacapacidade é vista de diferentes formas 10. Alexan-dre considera-o uma disposição no homem, não umasubstância em si mesma. Ibn Bajja especifica quese trata de uma disposição ligada à imaginação, eesta adição é aceite por Averróis. Por seu lado,Temístio considera o intelecto material como sepa-

10 Davidson, Alfarabi, Avicenna, and Averroes, on Intellect,pp. 268-269.

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rado, ou seja, enquanto uma substância eterna eseparada, não apenas uma disposição. Visto que eraeterno, como afirmara Aristóteles, não podia estarligado a uma função perecível da alma.

No comentário breve Averróis considerara, comoAlexandre de Afrodísias, que o intelecto humano erauma disposição para receber as formas da ima-ginação.

No Comentário Médio a De anima, funde asteorias de Alexandre de Afrodísias e de Temístio eafirma que o intelecto material é tanto uma disposi-ção para receber uma forma activa como uma subs-tância. No Grande Comentário a De anima con-sidera não apenas o agente, mas também o materialcomo perfeição da humanidade, separado, e uno,apenas um para toda a espécie humana. Isso deve--se ao facto de o intelecto, sendo separado, não tersubstância material que o distinga de um ser huma-no para outro. Assim, não apenas o intelecto agenteé separado, mas também o intelecto material huma-no, que serve todos os seres humanos, mas que temuma função especificamente humana.

Juntamente com a questão de o intelecto mate-rial, humano, ser o mesmo para todos os seres hu-

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manos, prende-se a questão da conjunção deste como intelecto agente no acto da intelecção, bem comoa possibilidade de o intelecto agente ser objecto dointelecto material. A opinião de Averróis é de queessa conjunção é possível no acto de conhecimento.

O problema deste esquema é que não é compa-tível com a sobrevivência do intelecto individual. Apósa morte, este tornar-se-ia uno com o intelecto divino,teoria categoricamente rejeitada por filósofos ortodo-xos da Escolástica latina, como, por exemplo, S. To-más de Aquino. O facto de Averróis defender aexistência de um intelecto para todos os humanos ede não haver um, humano, individualizado para cadaum de nós vai contra a teoria cristã da sobrevivên-cia individual da alma (e do corpo). É de notar quevários filósofos árabes já haviam negado a ressur-reição do corpo ou mostrado a sua impossibilidade.Averróis vai ainda mais longe ao negar a possibili-dade da sobrevivência de um intelecto individual. Aounir-se com o intelecto divino, após a morte, toda aindividualidade e memórias individuais, ligadas aomundo material, se perderiam.

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CONCLUSÃO

Averróis teve indubitavelmente um lugar marcantena história da filosofia em virtude do seu projecto,que tinha como finalidade harmonizar filosofia e reli-gião, e em virtude da sua interpretação de Aristóte-les. A sua fama deve-se ainda a correntes devidaou indevidamente associadas à sua filosofia.

A história do averroísmo latino é associada amovimentos em que a religião é considerada secun-dária em relação à filosofia, ou mesmo um artifíciopolítico para manter as camadas inferiores da popu-lação sob controlo. Estas opiniões, e a apropriaçãode Averróis, parecem não ter base nos seus textos,em particular o Discurso Decisivo, onde explicita-mente rejeita a noção de que a religião serve apenasde estratagema para a preservação da existênciafísica no mundo terreno, ou seja, que a promessa doalém serve apenas para manter a ordem nas socie-

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dades humanas. Apenas um apêndice do DiscursoDecisivo foi traduzido para latim no século XIV, quan-do algumas teses consideradas contrárias à religiãoatribuídas a Averróis já circulavam, como, por exem-plo, a eternidade do mundo ou a fusão da alma indi-vidual com o intelecto divino após a morte, negan-do assim não apenas a ressurreição do corpo comoa sobrevivência da alma na sua individualidade.Consequentemente, houve uma apropriação nega-tiva e redutora da obra de Averróis. O averroísmofoi equacionado com um ataque velado à religião euma espécie de racionalismo extremo que dispen-sava os dados da revelação, favocerendo apenas ouso da razão natural.

Outra apropriação semelhante aparece mais re-centemente com a identificação de Averróis comuma figura pré-iluminista, quase anunciando valoresiluministas da razão. No mundo árabe houve tam-bém no século XX uma leitura do filósofo cordovêsnesse sentido.

A contribuição de Averróis para a história da fi-losofia tem múltiplos aspectos. As suas interpreta-ções da filosofia de Aristóteles abriram caminho paranovas teorias, inspiradas em Aristóteles, mas apro-

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fundando-as. Tal é, por exemplo, o conteúdo dassuas discussões sobre a existência e a afirmação deque não se trata de um atributo, ao contrário do queafirmara Avicena, que previligiara a essência em de-trimento da existência e considerara esta como umarealidade merecedora de estudo em si mesma, in-fluenciando assim S. Tomás e outros filósofos es-colásticos na sua reflexão sobre a existência. Aver-róis, por sua vez, previlegiaria uma reflexão sobreos seres existentes, não considerando a sua existên-cia isoladamente.

No seu Grande Comentário à Física de Aristó-teles, também favorece a causalidade final na natu-reza. Por seu lado, Avicena apresenta um sistemamecanicista em que, apesar de a causa final ter umlugar de destaque, é a causalidade vertical, do mun-do celestial para a terra — no esquema da emana-ção através do qual Deus cria e sustenta o univer-so —, que predomina. Do mesmo modo, enquantoAvicena privilegia uma filosofia da natureza em quea causa eficiente domina, e tudo resulta de aconte-cimentos determinados por encontros entre dois ele-mentos, Averróis destaca o poder do agente. Dessemodo, a filosofia de Avicena apresenta inegáveis

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traços deterministas, enquanto Averróis, apesar deafirmar que todos os acontecimentos e substânciastêm uma causa determinada, coloca a ênfase noagente e no sujeito, oferecendo desse modo ummodelo de causalidade que oferece mais liberdadeno campo moral. Todas estas interpretações do cor-pus aristotélico teriam impacto na Escolástica latina.

A obra do filósofo cordovês é, como vimos, mul-tifacetada. Os estudos académicos que começarama ser encetados a partir de meados do século XIX

puseram de parte a ideia errónea de Hegel, umaopinião então generalizada, de que Averróis e osoutros filósofos árabes ou muçulmanos do períodomedieval se haviam limitado a repetir Aristóteles semacrescentar nada de novo. Circulava também a teo-ria de que os filósofos muçulmanos tinham apenassido úteis por terem proporcionado a transmissão dosaber grego, tendo preservado esse saber de formaa ser utilizado pelos filósofos da Escolástica e pos-teriormente no Renascimento, até à revolução dafilosofia moderna iniciada por Descartes.

Um estudo mais aprofundado da tradição filosó-fica medieval demonstra que a história da filosofiaislâmica não foi estática. Os filósofos muçulmanos,

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entre os quais Averróis, não se interessavam porAristóteles apenas de forma académica, mas viamnele solução para problemas filosóficos seus. Alémdisso, a influência da teologia islâmica (kalam) ine-vitavelmente produziu elementos originais. Dessemodo, o debate filosófico não se dava a nível unica-mente filosófico, mas envolvia questões teológicas.Um estudo dos vários pensadores muçulmanosrevelou profundas diferenças. Al-Kindi, apelidado«o filósofo dos árabes», não defendia a eternidadedo mundo, ao contrários do seus sucessores maisilustres, e Alfarabi revela um interesse pela filosofiapolítica mais acentuado do que o dos seus homólo-gos. Como vimos, os sistemas metafísicos de Avi-cena e Averróis são totalmente divergentes, para nãodizer opostos. A partir de meados do século XIX, umolhar mais atento e académico iniciou essa reava-liação da filosofia islâmica. Porém, o trabalho sobreAverróis e outros filósofos muçulmanos tem aindaum longo caminho a percorrer, sobretudo devido ànecessidade de editar as obras que se encontramapenas preservadas em manuscritos, sendo tambémnecessária a tradução para línguas modernas des-sas mesmas obras.

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O legado de Averróis mantém-se ainda vivo, nãoapenas pelas posições que toma relativamente atemas metafísicos, como a existência e a causalida-de, mas pela tentativa de harmonizar filosofia e re-ligião, e por propor um modelo de racionalidade quenão exclui a religião.

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URVOY, Dominique, Averroès. Les ambitions d’un intellectuelmusulman, Paris, Flammarion, 1998.

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ÍNDICE

1. Averróis na história do pensamento islâmicoe ocidental .......................................................... 3

2. Biografia ............................................................. 19

3. Obras .................................................................. 31

4. Filosofia e religião ............................................. 39

5. Metafísica e física ............................................. 47

6. Psicologia ........................................................... 53

Conclusão ............................................................... 63

Bibliografia ............................................................ 69

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Colecção Essencial

Últimas obras publicadas:

70. O TEATRO LUSO-BRASILEIRODuarte Ivo Cruz

71. A LITERATURA DE CORDEL PORTUGUESACarlos Nogueira

72. SÍLVIO LIMACarlos Leone

73. WENCESLAU DE MORAESAna Paula Laborinho

74. AMADEO DE SOUZA-CARDOSOJosé-Augusto França

75. ADOLFO CASAIS MONTEIROCarlos Leone

76. JAIME SALAZAR SAMPAIODuarte Ivo Cruz

77. ESTRANGEIRADOS NO SÉCULO XXCarlos Leone

78. FILOSOFIA POLÍTICA MEDIEVALPaulo Ferreira da Cunha

79. RAFAEL BORDALO PINHEIROJosé-Augusto França

80. D. JOÃO DA CÂMARALuiz Francisco Rebello

81. FRANCISCO DE HOLANDAMaria de Lourdes Sirgado Ganho

82. FILOSOFIA POLÍTICA MODERNAPaulo Ferreira da Cunha

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83. AGOSTINHO DA SILVARomana Valente Pinho

84. FILOSOFIA POLÍTICA DA ANTIGUIDADE CLÁSSICAPaulo Ferreira da Cunha

85. O ROMANCE HISTÓRICORogério Miguel Puga

86. FILOSOFIA POLÍTICA LIBERAL E SOCIALPaulo Ferreira da Cunha

87. FILOSOFIA POLÍTICA ROMÂNTICAPaulo Ferreira da Cunha

88. FERNANDO GILPaulo Tunhas

89. ANTÓNIO DE NAVARROMartim de Gouveia e Sousa

90. EUDORO DE SOUSALuís Lóia

91. BERNARDIM RIBEIROAntónio Cândido Franco

92. COLUMBANO BORDALO PINHEIROJosé-Augusto França

93. AVERRÓISCatarina Belo

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Composto e impressona

Imprensa Nacional-Casa da Moedacom uma tiragem de 800 exemplares.

Orientação gráfica do Departamento Editorial da INCM.

Acabou de imprimir-seem Agosto de dois mil e sete.

ED. 1013956ISBN 978-972-27-1541-6

DEP. LEGAL N.o 255 257/07

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AVERRÓIS

IMPRENSA NACIONAL-CASA DA MOEDA

Catarina Belo

O essencial sobre

AVERRÓIS

9 7 8 9 7 2 2 7 1 5 4 1 6

ISBN 978-972-27-1541-6

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