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    A Pluridimensionalizao de uma APRENDIZAGEM

    que, sendo Futebolstica, uma EMERGNCIA

    FUNCIONAL(mente) ESPECFICA, como Objecto de

    Conhecimento Futebolstico-Cientfico!

    Abordagem a uma Era Ps Futebol de Rua pela radiografia do

    Talentizar, NUM Futebol que FORMA, no deforma.

    Porto, 2008

    Rita Santoalha de Almeida e Silva

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    A Pluridimensionalizao de uma APRENDIZAGEM

    que, sendo Futebolstica, uma EMERGNCIA

    FUNCIONALmente ESPECFICA, como Objecto de

    Conhecimento Futebolstico-Cientfico!

    Abordagem a uma Era Ps Futebol de Rua pela radiografia do

    Talentizar, NUM Futebol que FORMA, no deforma!

    Monografia realizada no mbito da disciplinade Seminrio do 5. ano da licenciatura emDesporto e Educao Fsica, na opo deFutebol, da Faculdade de Desporto daUniversidade do Porto

    Orientador: Professor Vtor Frade

    Rita Santoalha de Almeida e Silva

    Porto, 2008

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    Santoalha, R. (2008). A Pluridimensionalizao de uma APRENDIZAGEM que,

    sendo Futebolstica, uma EMERGNCIA FUNCIONALmente ESPECFICA,

    como Objecto de Conhecimento Cientfico - Uma Abordagem a uma Era Ps

    Futebol de Rua pela radiografia do Talentizar NUM Futebol que FORMA, no

    deforma! Porto: R. Santoalha. Dissertao de Licenciatura apresentada Faculdade de Desporto da Universidade do Porto

    Palavras-Chave: MUDANA DE PARADIGMA; FUTEBOL DE RUA

    INTERACO; PERCEPAO; FUTEBOL FORMAL-RURAL; TALENTO.

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    I

    DEDICATRIA

    Emissria de um Rei desconhecido

    Eu cumpro informes instrues de alm

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    QUANDO SE ADMITIR QUE UM MOVIMENTODESPORTIVO DESINSERIDO E

    DESAJUSTADO DA RESPOSTA CORRECTA (MOVIMENTO AZELHA),POR MAIS SUOR QUE

    EXIJA,UMA TEORIA

    EQUE UMA PERCEPCOMENTALCORRECTA DUMA SITUAO J,(ANTES DO

    GESTO)UMA PRTICA?

    PARADIGMA PERDIDO

    (FRADE, 1976)

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    III

    AGRADECIMENTOS

    minha MEZINHAe ao meu PAIZINHO, minha IRMe ao meu IRMO,

    por me ensinarem a gostar, por me ajudarem a CRESCER e por me

    transmitirem exemplo de PERFEIO. H quem diga que a perfeio no

    existe, mas sabem? Eu c no acredito nisso A perfeio est, para mim, na

    entrega e no empenho, no esforo e na perseverana, no nimo e na vontade,

    na coragem e no PERCURSO!! Ser perfeito assumir uma atitude construtiva

    e, muito importante, aprendedora independentemente das circunstncias!! Ser

    perfeito adaptar, antes ir adaptando, o saber ao fazer e o fazer ao saber!!

    Vocs so Perfeitos e por isso eu sou FELIZ OBRIGADA Mam e Papporque a forma como me do, e vo dando, o muito que construram ajuda-me

    muito a seguir o vosso exemplo

    minha AVe LOLINHA, porque, em funo da emoo posta no mnimo

    que fazem, espelharam os meus neurnios e potenciaram a ambio

    SUPERIOR de imitar, num processo de singularizao natural, tudo o que

    fazem. E, em cada sexta-feira dou comigo a pensar que afinal tenho outravez a bata do colgio, a bola debaixo do brao, a mochila costas eu atiro a

    mochila para cima da cama onde dormem os deveres do dia seguinte e volto a

    sentar-me ao vosso colo, feito de mimo e de mel!... NETA pequenina at ao fim

    da vida!!!

    s SANTOALHSSIMAS e aos meus PRIMINHOS queridos, por

    enriquecerem a minha existncia e por serem smbolo de condominizaorural, por especializarem a rua da NOSSA av e por, assim, me deixarem

    experimentar a natureza praxiolgica do meu FUTEBOL.

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    IV

    minha TRENGUINHA e minha FILHOTINHA. No sei como poderia

    sobreviver sem as minhas AMIGAS. Mal, com certeza. Foram vocs, SEMPRE

    vocs, a desligar o complicmetro que me pertence por natureza herdado-

    adquirida e a potenciar, em funo de uma existncia em relao, a descoberta

    de sentido que , hoje, eixo orientador e, acima de tudo, director da minha

    entrega a esta NOSSA dissertao. Com vocs, da perfeio construo e da

    construo descoberta tudo me pareceu OBRA!! 4638 , talvez, a

    expresso mxima do que de vocs guardo e levo para todo o lado, onde quer

    que eu v e sempre que volto, sempre que chego meu Portinho, onde

    mergulha ainda intacta a memria da minha juventude, e as vejo receberem-

    me com um sorriso ILUMINADO, volto sempre ao melhor de mim e sinto-meoutra vez com dezassete anos!!!

    Ao MEU PROFESSOR, assim que sempre me refiro ao Professor Frade.

    L em casa dizem do professor, ser o professor, s o professor, o meu DOLO!!

    Eu no sei se essa a significao que cabe ao professor, no sei, sequer, se

    a definio que tenho para esta significao corresponde verdadeira. Sei, s,

    que do professor herdei o ser FIL-SOFA (amante da sabedoria, entenda-se) e o conhecimento do limite. Com o meu Professor aprendi a ser

    especialista da no especializao e descobri que s conhecendo possvel

    admitir fracturas, pensar para mudar e, enfim, evitar que os pr-conceitos

    normalizem a originalidade e a criatividade de um processo que, caminhando

    pelo questionar, ia ser aprendizagem verdadeira. Hoje sei, em funo de uma

    experimentao GUIADA (obrigada Professor), que das ideias concretizao

    vai um processo de construo que para no ser castrao deve ter sentidoeminentemente equilibrador!... Da assimilao, acomodao e

    equilibrao tudo, mesmo tudo, deve ser REFLEXO. Se a vida, como o

    JOGO, apresenta uma extrema sensibilidade s condies iniciais, ento,

    obrigada meu Deus por sujeitares a minha existncia presena do Professor.

    Adorava que o professor adorasse, como eu adoro, a perfeita imperfeio da

    presente dissertao

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    V

    Aos meus Amigos, a todos eles, e de forma muito especial ao Braguinha, ao

    Felgueirinhas e ao Dd, ao Nandinho (Festas) e ao Ricardo, ao Pi e ao

    Aores, Vnia e Professora (Teresa Sardoeira) Foi com vocs que

    aprendi o significado de palavras como ajuda, afecto, solidariedade,

    generosidade, sensibilidade e, at, FELICIDADE.

    Aos meus Entrevistados: Professor Bento, Professor Rui Pacheco, Professor

    Miguel Lopes, Professora Marisa Gomes e Professor Guilherme, pela

    disponibilidade evidenciada e pela forma apaixonada com que falaram de

    FUTEBOL. As vossas palavras, cada uma, foram ponto de reflexo e

    crescimento auto-hetero construdo.

    Cada pessoa que passa na nossa vida, passa sozinha, porque cada pessoa

    nica e nenhuma substitui a outra! Cada pessoa que passa na nossa vida

    passa sozinha e no nos deixa s porque deixa um pouco de si e leva um

    pouquinho de ns. Essa a mais bela responsabilidade da vida e a prova de

    que as pessoas no se encontram por acaso.

    (Charles Chaplin)

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    ndice Geral

    VII

    ndice Geral

    DEDICATRIA I

    AGRADECIMENTOS III

    NDICE GERAL VII

    NDICE DE FIGURAS X

    RESUMO XI

    ABSTRACT XIII

    RSUM XV

    1 INTRODUO 1

    2 - A Cincia da Experincia e a Experincia da Cincia:

    Aproximao Etnometodolgica Natureza Praxiolgica do

    Futebol 7

    3 - Do cientificar ao palavrizar!!!E do palavrizar ao

    cientificar!Uma espcie de conceptualizao futebolstico-

    cientfica (re)equacionada 133.1. - O exaltar da INTERACO, invariante estrutural da estrutura

    de rendimento doFUTEBOL para a (re)conceptualizao do

    Futebol, do Jogo, do Jogar e da Equipa 25

    3.2. - Da arte e da cincia do MOVIMENTAR-SEEm Futebol!!

    Porque a energia S o cavalo E a informao que o

    cavaleiro 38

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    ndice Geral

    VIII

    3.3 - Dimensionalizar esteticamente o Futebol para reavivar um

    gargalhar assente na FINTA, no TIMING e na VELOCIDADE da

    Caosificao do Jogar 44

    3.4 - A Pluridimensionalidade de uma inteligncia singular que,

    sendo futebolstica, uma Emergncia FUNCIONAL(mente)

    ESPECFICA (?)!!Do Maradona ao Pel e do Garrincha ao

    Eusbio 60

    4. - Uma vez que no se nasce jogador de Futebol! Trabalho,

    MUITO trabalho!! Mas que Trabalho?!... 654.1 - Da (re)conceptualizao do Talento em Futebol,

    Especificidade da estimulao PRECOCE e aoProblema do

    ajustamento infantil 65

    4.2. - A Construo de uma APRENDIZAGEM que requisita (por

    ser futebolstica)! a cerebralizao do msculo ea

    Corporalizao do crebro!! 76

    4.3. - Para a Alfabetizao emocional: Desrobotizar asomatizao emocional de um saber que se adquire na aco 87

    5. - Do Futebol de Rua s Escolinhas de Futebol e das

    Escolinhas de Futebol ao Futebol de Rua NAS Escolinhas de

    Futebol 95

    5.1 - Do Brincar e do no Brincar Que influncia para o Jogar? 95

    5.2. - Categorizar o Futebol de Rua Para melhor o poderFORMALIZAR!! Para um universo particular, contedos tambm

    particulares:Uma abordagem formativa a uma era ps futebol de rua 101

    5.2.1. - Para alm da fronteirizao vedada: A Complexidade da

    Categorizao 101

    5.2.1.1 - A importncia do existir do ESTADO DE ALMA Para a

    espontaneidade do ser TALENTO!! Que se desenvolve

    JOGANDO!! 105

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    ndice Geral

    IX

    5.2.1.2 - A importncia de ter limo no bolso: Para VARIABILIZAR

    qualitativamente a QUANTIDADE de RELAO COM BOLA!! 111

    5.2.1.3 - A importncia capital de saber IMITAR bem o exterior

    Para potenciar mais e melhor o interior!! Na construo de um

    projecto de Talento! 120

    5.2.1.4 - A muita importncia do RECORDE (superador) num

    imaginrio que tem muito de COMPETIO 129

    5.2.1.5 - Para desviar a hiperproteco contextualiazar, no

    mandar!! Da AUTO-DESCOBERTA Descoberta Guiada: A

    Descoberta Guiada como catalisador de uma aprendizagemtalentosa 138

    6 - Uma Espcie de CONCLUSO Introdutria 145

    7. Referncias Bibliogrficas 147

    8. ANEXOS I

    Anexo 1: Entrevista a Jorge Olmpio Bento I

    Anexo 2: Entrevista a Miguel Lopes XVII

    Anexo 3: Entrevista a Rui Pacheco XLV

    Anexo 4: Entrevista a Marisa Gomes LXV

    Anexo 5: Entrevista a Jos Guilherme Oliveira XLI

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    ndice de Figuras

    X

    ndice de Figuras

    Figura 1 Linha Quadrado e Cubo 30

    Figura 2 Curva de Von Kock 31

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    RESUMO

    XI

    RESUMO

    O Futebol um fenmeno profundamente dependente do Mundo global. Por

    este motivo, quando o Mundo muda, o Futebol reflecte essa mudana e, de

    uma forma ou de outra, reclama, em cada momento, a racionalizao dos

    processos propiciadores de desempenho talentoso. Este , em funo de uma

    adaptabilidade conjecturada, tanto mais qualitativo quanto mais precocemente

    for estimulado, no respeito pelo Futebol. O presente estudo procura

    multidisciplinarizar a procura do conhecimento em exame, sem que isso

    implique um afastamento da Especificidade que lhe prpria, no sentido de

    contribuir para a resoluo dos possveis bloqueios epistemolgicos

    dimanantes dos seguintes objectivos: (1) evidenciar que o futebol carece deuma mudana de paradigma; (2) (re)equacionar o quadro conceptual

    futebolstico-cientfico de base; (3) apresentar o Futebol como um fenmeno

    catico, auto-organizador, complexo e multifractalizador que carece de uma

    abordagem sistmica; (4) inferir, de forma sustentada, acerca da existncia de

    uma Inteligncia de Jogo; (5) tornar evidente a possibilidade de, pela

    aprendizagem, cerebralizar o msculo e corporalizar o crebro; (6)

    evidenciar que as emoes e os sentimentos so parte integrante daaprendizagem futebolstica; (7) averiguar a influncia que a prtica precoce de

    Futebol tem na exponenciao de Talentos no Futebol; (8) identificar e

    cientificar as prticas de infncia dos Talentos no Futebol; (9) compreender a

    influncia das alteraes sociais na matriz gentica do Futebol; (10) evidenciar

    que a racionalizao qualitativa do processo de formao torna exequvel a

    reciclagem do Futebol de Rua pelas Escolas e Clubes de Futebol; (11) Definir

    categorias formais-rurais. Como concluso destacamos a necessidade deentender profundamente o fenmeno para a operacionalizao de uma

    Periodizao La Long assente na reciclagem do Futebol de Rua e, por isso,

    preocupada em criar um jogar de qualidade, de realidade plural e adaptada

    Especificidade de cada escalo, desencadeando a emergncia de uma

    Inteligncia de Jogo.

    Palavras-Chave: MUDANA DE PARADIGMA; FUTEBOL DE RUA

    INTERACO; PERCEPO; FUTEBOL FORMAL-RURAL; TALENTO

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    ABSTRACT

    XIII

    ABSTRACT

    Football is a phenomenon highly dependent of the global world. For this reason

    when the world changes Football reflects that change and in one way or

    another it claims at each moment the rationalization of the processes matching

    the talented performance. In function of a conjectured adaptability this is in such

    a way more qualitative as more precociously it is stimulated, when it comes to

    Football. The present study looks to multidisciplinate the search of knowledge in

    examination, without implying the removal of the proper Specificity of an

    identitary phenomenon, regarding the contribution to resolving the possible

    epistemological blockades deriving from the following objectives: (1) to

    evidence that football lacks a paradigm change; (2) to (re)equate the football-scientific conceptual picture bases; (3) to present Football as a chaotic, self-

    organizing, complex and multifractionary phenomenon in need of a systemic

    approach; (4) to infer, in a sustained way, about the existence of a Game

    Intelligence; (5) to become evident the possibility of, by learning, cerebralizing

    the muscle and corporalizing the brain; (6) to stand out that emotions and

    feelings are integrant part of the footballistic learning; (7) to inquire the influence

    that the precocious practice of Football has on the exponentiation of FootballTalents; (8) to identify and scientify the infancy practices of the Football Talents;

    (9) to understand the influence of social alterations on Footballs genetic matrix;

    (10) to evidence that the qualitative rationalization of the development process

    becomes executable to recycle the Street Football by Football Schools and

    Clubs; (11) to supply some practical orientations to the Football Training in the

    Development scope by the definition of formal-rural categories. In conclusion

    we detach the exponentiation of the Football Talent, the need to deeplyunderstand the phenomenon to the operationalization of La Longs

    Periodization settled in the recycling of Street Football and for this reason

    concerned in creating a quality playing, of plural reality and adapted to the

    Specificity of each step, unchaining the emergency of a Game Intelligence.

    Key-Words: PARADIGM CHANGE; STREET FOOTBALL INTERACTION;

    PRECOCITY, STIMULATION; PERCEPTION.

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    RSUM

    XV

    RSUM

    Le Football est un phnomne dpendant du Monde Global. Ainsi, quand le

    Monde change, le Football reflte ce changement et revendique, chaque

    instant, la rationalisation des processus assortis laccomplissement

    talentueux. Celui-ci est, en fonction dune adaptabilit conjecture, dautant plus

    qualitatif quil est prcocement stimul, dans le respect du Football. La prsente

    tude vise rendre multidisciplinaire la recherche de la connaissance en

    examen, sans pour autant que cela implique un loignement de la Spcialit en

    vue de contribuer la rsolution des blocages pistmologiques rsultants des

    objectifs suivants: (1) mettre en vidence que le football a besoin dun

    changement de paradigme; (2) (re)quationner le modle conceptuelfootballistique-scientifique de base; (3) prsenter le Football comme un

    phnomne chaotique, auto organisateur, complexe et multi fractionnel qui

    manque d un abordage systmique; (4) infrer, de forme soutenable, propos

    de lexistence dune Intelligence de Jeu; (5) rendre vidente la possibilit de

    crbraliser le muscle et corporaliser le cerveau par lapprentissage ;

    rendre vident que les motions et les sentiments font partie de lapprentissage

    footballistique; (7) enquter sur linfluence que la pratique prcoce de Football asur lexponentiation de Talentes;(8) identifier et scientifier les pratiques

    denfance;(9) comprendre linfluence des modifications sociale sur la matrice

    gntique du Football;(10) dmontrer que la rationalisation qualitative du

    processus de formation rend excutable le recyclage du Football de Rue par les

    coles et les Clubs de Football;(11) fournir quelques orientations pratiques pour

    lentranement de Football au sein de la formation par la dfinition de catgories

    formelles-rurales. En conclusion, nous faisons ressortir pour lexponentiation duTalent dans le Football, la ncessit de comprendre profondment le

    phnomne pour loprationnalisation dune Priodisation La Longreposant

    sur le recyclage du Football de Rue et donc, avec la proccupation de crer

    un jeu de qualit, de ralit plurielle et adapte la Spcificit de chaque

    niveau, menant lmergence dune intelligence de Jeu.

    Mots-cls: CHANGEMENT DE PARADIGME; FOOTBALL DE RUE;

    INTRACTION; PRCOCIT; STIMULATION

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    INTRODUO

    1

    1 - Introduo

    A ideia separada da aco gera conflito. Mesmo quando repetimos certas palavras de profunda

    significao, vivemos, em geral, muito superficialmente; vivemos num mundo verbal, num mundode aces e emoes superficiais. A verdade deve estar antes de toda a verbalizao, toda

    bizantinice, todo nominalismo

    (Frade, 1985)

    No universo desportivo j um lugar comum afirmar que o rendimento

    competitivo multidimensional por serem vrios os factores que concorrem

    para a sua efectivao.

    Assim, como premissa inicial admite-se que o Futebol tem a marca daespecificidade e da complexidade.

    O Futebol, sim o Futebol, , para a maioria dos adeptos, um jogo simples de

    entretenimento enquadrado numa lgica de paixo clubista sem qualquer rigor

    metodolgico ou universal.

    De facto, fcil olhar para este fenmeno e ver uma simplicidade incrvel

    na forma como se pode jogar, e aqui reiteramos, mais uma vez, na forma como

    se pode jogar. O que realmente importa ganhar, todas as equipas entram em

    campo para vencer, independentemente das possibilidades de cada uma, o

    que elas querem sempre ganhar. O que move os praticantes, os

    espectadores, os jornalistas, os dirigentes, os elementos das equipas tcnicas,

    o que os tira do conforto das suas casas e os deixa feliz, o que os faz passar

    pelo frio e perder a voz, o que os faz dar tempo, o que os leva ao Futebol a

    simples vontade de ganhar, o sonho de um dia poder gritar ao mundo eu sou

    campeo ou somos campees.

    Ento, seguindo a lgica do ganhar, o futebol , sem mais, a busca de

    caminhos para chegar vitria. Aparentemente o Futebol assim, simples.

    Mas o que aparente quase sempre mente (Bento, 2005). E a incerteza e

    imprevisibilidade das situaes, do resultado? E o jogador, a equipa? E a

    defesa, o ataque? E as aces motoras, mentais? E a forma, o contedo?

    nossa pretenso evidenciar que o Futebol necessita uma Mudana de

    Paradigma, assente numa crise epistemolgica baseada em princpios

    metodolgicos fragmentados, por apresentar mltiplas dimenses, que actuam

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    INTRODUO

    2

    de forma convergente aquando da sua expresso, atravs de um princpio de

    regulao recproca.

    Boaventura Sousa Santos (1989) permite antever o aparecimento de um

    quadro conceptual futebolstico-cientfico reequacinado, j no marcado pela

    abrangncia totalitria de um conhecimento formatado num mtodo pronto-a-

    vestir, mas sim fundado na humildade da valorizao do pormenor, da

    especificidade, enfim, um mtodo pronto--medida das necessidades do

    utilizador.

    Procuraremos, para cumprir a valorizao da especificidade e da

    complexidade futebolsticas inerentes ao nosso estudo, actualizar a

    cientificidade do Futebol pela definio, bem, de um quadro conceptual debase.

    Ao longo desta dissertao procuraremos evidenciar que o processo evolutivo

    determinou uma configurao social baseada numa lgica de condomnio

    fechado que teve como consequncia futebolstica alteraes profundas na

    matriz gentica do Futebol.

    No sentido de compreender a relao entre a condominizao da

    sociedade e a desqualificao do Jogo e do Jogar, encontramos o Futebol derua, sua eclipsao, e posterior proliferao das Escolas de Futebol.

    Da despontaneizao dos processos de formao urge a necessidade da

    sua racionalizao. Ora, o Futebol o Jogo de situao por excelncia que, por

    ser catico, complexo, auto-organizador e multifractalizador, requisita, por parte

    do ser que joga, uma gesto permanente do instante assente na resoluo

    momentnea de cada aqui e agora, sustentada numa inteligncia, por ser

    futebolstica, Especfica, de operacionalizao fundamental, por requisitarconstantemente a relao do corpo com o exterior e deste com o corpo.

    Face a esta requisio, a cerebralizao do msculo e a corporalizao

    do crebro so uma imposio, sendo nossa inteno ao longo da dissertao

    evidenciar que tal imposio tanto mais passvel de ser levada a efeito com

    sucesso, quanto mais precocemente os indivduos so estimulados no domnio

    considerado.

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    INTRODUO

    3

    Com o intuito de cumprir a totalidade da racionalizao formativa proposta,

    importa configurar a precocidade imanente ao Talento futebolstico a

    exponenciar.

    Assim, de igual forma, no sentido de compreender a relao (des)evolutiva

    entre a eclipsao do Futebol de Rua e a proliferao das escolas de Futebol,

    encontramos a necessidade de pensar a reciclagem do Futebol de Rua em

    funo da criao desse Futebol nas prprias escolas e clubes de Futebol.

    nossa inteno, com a realizao desta dissertao, outorgar, pelo

    entendimento aprofundado do fenmeno, tal possibilidade, facilitando-a,

    cientificando-a e extrapolando-a, num verdadeiro raciocnio lgico devidamente

    estruturado e fundamentado.Face ao exposto, estabelecemos, para a presente dissertao, os seguintes

    objectivos:

    Evidenciar que o futebol carece de uma mudana de paradigma;

    (Re)equacionar o quadro conceptual futebolstico-cientfico de base;

    Apresentar o Futebol como um fenmeno catico, auto-organizador,

    complexo e multifractalizador que carece de uma abordagem sistmica;

    Inferir, de forma sustentada, acerca da existncia de uma Inteligncia deJogo;

    Tornar evidente a possibilidade de, pela aprendizagem, cerebralizar o

    msculo e corporalizar o crebro;

    Evidenciar que as emoes e os sentimentos so parte integrante da

    aprendizagem futebolstica;

    Averiguar a influncia que a prtica precoce de Futebol tem na

    exponenciao de Talentos no Futebol; Identificar e cientificar as prticas de infncia dos Talentos no Futebol;

    Compreender a influncia das alteraes sociais na matriz gentica do

    Futebol;

    Evidenciar que a racionalizao qualitativa do processo de formao

    torna exequvel a reciclagem do Futebol de Rua pelas Escolas e Clubes de

    Futebol;

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    INTRODUO

    4

    Fornecer algumas orientaes prticas para o treino do Futebol no

    mbito da Formao pela definio de categorias formais-rurais.

    Quanto estrutura, o presente estudo ser estruturado em sete pontos

    fundamentais.

    No primeiro, Introduo, pretendemos apresentar e justificar a pertinncia do

    estudo, definir a abordagem sustentadora (a sistmica) e apresentar os

    objectivos desta dissertao.

    No segundo ponto, A Cincia da Experincia e a Experincia da Cincia:

    Aproximao Etnometodolgica Natureza Praxiolgica do Futebol

    justificaremos os motivos para a elaborao do presente estudo no seguir as

    metodologias de investigao convencionais.No terceiro ponto, Do cientificar ao palavrizar!!!E do palavrizar ao

    cientificar!Uma espcie de conceptualizao futebolstico-cientfica

    (re)equacionada procuraremos explicitar que o Futebol carece de uma

    mudana de paradigma assente numa crise epistemolgica, baseada em

    princpios metodolgicos fragmentados, o que, como procuraremos explicitar,

    se repercute na necessidade de reconfigurar o quadro conceptual futebolstico-

    cientfico de base.No quarto ponto, Uma vez que no se nasce jogador de Futebol! Trabalho,

    MUITO trabalho!! Mas que Trabalho?!... evidenciaremos a necessidade

    do Talento ser entendido como uma construo que carece da cerebralizar o

    msculo e corporalizar o crebro, e que tal carncia tanto mais susceptvel

    de ser revertida com sucesso, quanto mais precocemente os indivduos so

    estimulados em Especificidade.

    No quinto ponto, Do Futebol de Rua s Escolinhas de Futebol e dasEscolinhas de Futebol ao Futebol de Rua NAS Escolinhas de Futebol

    procuraremos definir categorias formais rurais, no sentido de facilitar a

    reciclagem do Futebol de Rua pelas Escolas e Clubes de Futebol e ainda

    evidenciar que a racionalizao dos processos de formao, quando baseada

    em pressupostos qualitativos, permite fomentar a exponenciao de Talento no

    Futebol bem como a edificao da pessoa Humana.

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    INTRODUO

    5

    No sexto ponto, Uma espcie de CONCLUSO Introdutria, sero

    apresentadas as concluses do presente estudo.

    No stimo ponto apresentar-se- a totalidade das referncias bibliogrficas

    mencionadas ao longo da dissertao.

    No oitava ponto, Anexos, podem ser consultadas as transcries integrais

    das entrevistas gravadas atravs de gravador udio Olympus VN-2100 PC,

    tendo estas sido posteriormente revistas pelos respectivos entrevistados,

    servindo de complemento ao que ser abordado ao longo deste estudo e

    encontrando-se apresentadas por ordem cronolgica de realizao.

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    A Cincia da Experincia e a Experincia da Cincia: Aproximao Etnometodolgica NaturezaPraxiolgica do Futebol

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    2 - A Cincia da Experincia e a Experincia da Cincia: Aproximao

    Etnometodolgica Natureza Praxiolgica do Futebol

    A anlise do contedo muitas vezes uma falcia das cincias moles, ou uma insuficincia das

    cincias moles, perante o determinismo das cincias duras. E portanto, h situaes em que a

    anlise do contedo no funciona de todo

    (Cunha e Silva, 2008)

    O Futebol, apesar de frequentemente encarado como realidade inferior,

    disciplina de importncia menor, desprezada, pouco vocacionada a despertar

    pessoas para uma carreira acadmica como especialidade em investigao

    consequente , no entanto, um objecto de estudo complexo em que umamultiplicidade de factos e de acontecimentos se do a ver ao mesmo tempo

    (Frade, 1976), e cuja pertinncia de estudo de qualquer das facetas deste

    fenmeno nos parece sempre justificada, desde que atenda definio, bem,

    de uma epistemologia clara e adequada decifrao da realidade por

    representao conceptual potencialnente praxiolgica. que A ideia separada

    da aco gera conflito. Mesmo quando repetimos certas palavras de profunda

    significao, vivemos, em geral, muito superficialmente; vivemos num mundoverbal, num mundo de aces e emoes superficiais. A verdade deve estar

    antes de toda a verbalizao, toda bizantinice, todo nominalismo (Frade,

    1976).

    Face a este entendimento, urge a necessidade de adequar a maneira de

    estudar o objecto emprico sua prpria natureza, pela adopo de uma

    abordagem que evite os mtodos de anlise formal e se sustente no carcter

    sistmico de tal adequao.Temos que, para ns, o ponto de partida de uma investigao constitui uma

    questo decisiva e, no sentido de respeitar o carcter sistmico da adequao

    em configurao, afastamo-nos da tradicional viso em funil, preferimos a

    posio do outro extremos. Posio extrema por ser dos extremos que se tem

    melhor perspectiva, e que da virtude mdia se tem divisa (Frade, 1976).

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    A Cincia da Experincia e a Experincia da Cincia: Aproximao Etnometodolgica NaturezaPraxiolgica do Futebol

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    Nesse afastamento, adoptamos a etnometodologia por considerarmos ser

    capaz de atender natureza do assunto em estudo sem incorrer na falcia

    das cincias moles (Maciel, 2008).

    O Homem isolado uma abstraco e o Futebol separado uma realidade

    assassinada, por exigir um contexto de sentido de cuja definio depende uma

    certa unicidade fenomenal.

    A Etenometodologia, por transgredir o que convencionalmente se faz em

    Sociologia (Molnat, 2008), prope qualquer coisa mais que as investigaes

    conduzidas pelos procedimentos de anlise formal (Garfinkel, 2001), pela

    elaborao de uma srie de detalhes que lhe do um sentido prtico (Watson,

    2001) assente na singularidade prtica dimanante do contexto singular queequaciona.

    A Etnometodologia a pesquisa emprica dos mtodos que os indivduos

    utilizam para dar sentido e, ao mesmo tempo, realizar as suas aces de todos

    os dias, diferenciando-se, nisso, dos socilogos que geralmente consideram o

    saber do senso comum como uma categoria residual. Os Etnometedlogos

    tm a pretenso de estar mais perto das realidades correntes e, para isso,

    trabalham com a hiptese que os fenmenos quotidianos se deformam quandoexaminados atravs da grande descrio cientfica (Coulon, 1995).

    De facto, onde outros vm dados, factos, coisas, a etnometodologia v um

    processo atravs do qual os traos da aparente estabilidade da organizao

    social so continuamente criados (Garfinkel, 2006) e, assim, em vez de se

    sustentar na hiptese de que os actores seguem regras, a etnometodologia

    pe em evidncia os mtodos pelos quais os actores fabricam um mundo

    racional no sentido de nele poderem viver (Coulon, 1995).Ser, portanto, de importncia capital observar como os actores de senso

    comum produzem essa fabricao e como utilizam a linguagem como recurso.

    Para Garfinkel (2006), uma palavra tem uma significao trasns-si-tuacional e

    tem, tambm, um significado distinto em toda a situao particular em que

    usada. A interrogao etnometodolgica sobre a linguagem provm,

    precisamente, do reconhecimento da indicialiade das expresses da linguagem

    ordinria. Segundo o mesmo autor (2006), as palavras s ganham o seu

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    A Cincia da Experincia e a Experincia da Cincia: Aproximao Etnometodolgica NaturezaPraxiolgica do Futebol

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    sentido completo no seu contexto de produo, quando so indexadas a

    uma situao de intercmbio lingustico e, por isso, subentende uma funo

    extrapoladora, a que muito etnometodlogos designaram de et caetera, capaz

    de potenciar uma aceitao e compreenso comuns daquilo que se diz quando

    as descries so consideradas evidentes, e mesmo que no sejam

    imediatamente evidentes (Coulon, 1995). Daqui se subentende a necessidade

    do complemento de demonstrao que pretendemos estar presente ao longo

    de toda a dissertao.

    Neste comprimento de onda, uma vez que o Futebol um fenmeno de

    expresso plural, na qual cada jogo influncia e influenciado pelo Jogo

    (Maciel, 2008), o nosso estudo, por ter objecto nesse Fenmeno, subentende ocomplemento demonstrativo enunciado e exige um entendimento lingustico-

    cientfico que, em vez de menosprezar as expresses indicais, as estuda

    profundamente com o intuito de as localizar e senso-comunizar. que,

    tendo a linguagem quotidiana um sentido ordinrio que as pessoas no

    sentem dificuldade para compreender (Coulon, 1995), a tentativa de limpar o

    mundo das expresses indiciais, que uma tentativa de as substituir por

    expresses objectivas, torna-se um tema de descrio e anlise ao invs deum esforo para resolver o problema (Benson & Hughes 1993 cit. por Coulon,

    1995).

    Ento, no sentido de resolver o problema, futebolizado, adoptamos, para o

    nosso estudo, uma abordagem Etnometodolgica assente na convico de

    que, tal como o mundo social, o Futebol accountable, por ser descritvel,

    inteligvel, relatvel, analisvel, em funo da sua natureza praxiolgica e,

    claro, do seu carcter eminentemente situacional.O mundo no dado de uma vez por todas. Ele realiza-se nos nossos actos

    prticos do mesmo modo que o Futebol se realiza em cada construo auto-

    hetero dirigida e em cada membrizao - e um membro no apenas uma

    pessoa que respira e pensa. Um membro , tal como adverte Garfinkle (2006),

    uma pessoa dotada de um conjunto de modos de agir, de mtodos, de

    actividades, de savoir-faire, que a fazem capaz de inventar dispositivos de

    adaptao para dar sentido ao mundo que a cerca. algum que, tendo

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    A Cincia da Experincia e a Experincia da Cincia: Aproximao Etnometodolgica NaturezaPraxiolgica do Futebol

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    incorporado os etnomtodos de um grupo social considerado, exibe

    naturalmente a competncia social que agrega a esse grupo e lhe permite

    fazer-se reconhecer e aceitar.

    E o jogar , ou no, uma emergncia de fabricao operacionalizada no

    sentido de os jogadores nele poderem viver?

    O jogar aquilo onde ns queremos chegar, e estamos sempre a evoluir, a

    nossa criao, a nossa emergncia. Isso o jogar e esse jogar tanto melhor

    quanto melhor ns soubermos aquilo que queremos, quanto melhor os

    jogadores perceberem aquilo que ns queremos e jogarem em funo desse

    jogar e serem criativos nesse jogar (J. G. Oliveira, Anexo 5), ou seja, quanto

    mais MEMBROS emanarem da singularizao da construo futebolsticafenomenal.

    Desta maneira, a etnometodologiao do nosso estudo , antes de uma

    opo, uma imposio determinada pela Natureza Praxiolgica do objecto de

    estudo Fenomenal que nos atrevemos a (re)cientificar.

    Atravs do estudo etnometodolgico, pretendemos, tal como coloca Fornel,

    Ogien & Qur (2001), colocar nfase no empirismo e nas questes que

    resultam do desenvolvimento da realidade concreta em estudo: o Futebol,sendo que, para isso, recorremos a fontes muito diversas, desde uma extensa

    bibliografia composta por livros de diferentes temticas, programas televisivos

    nacionais e internacionais, biografias relativas a temticas que consideramos

    pertinentes para a abordagem em questo, artigos e entrevistas publicados na

    imprensa e ainda comunicaes efectuadas por diferentes autores. A

    informao providenciada por estes recursos foi, ainda, enriquecida com um

    conjunto de cinco entrevistas abertas, realizadas propositadamente para estadissertao.

    O critrio adoptado para a seleco dos entrevistados relaciona-se com os

    motivos abaixo enunciados:

    Jorge Olmpio Bento:Presidente do Conselho Directivo da Faculdade

    de Desporto da Universidade do Porto, Autor de vrios livros no mbito da

    Pedagogia do Desporto e Cronista do Jornal desportivo A Bola, tem

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    pertinncia contributiva no sentido em que pensa e contacta com as

    problemticas desportivo-cintficas constantemente actualizadas.

    Miguel Lopes: Licenciado em Cincias do Desporto pela Faculdade de

    Desporto da Universidade do porto, , actualmente, coordenador tcnico da

    Escola de Futebol Dragon Force do Futebol Clube do Porto, a qual baseia a

    sua configurao em quatro manifestaes fundamentais: Escola de Futebol,

    Clinics, Road Shows e Campos de Frias, e manifesta preocupaes em se

    adaptar ao progressivo desaparecimento do Futebol de Rua, o que, por si s,

    justifica a pertinncia dos seus relatos.

    Rui Pacheco:Ex-treinador dos escales de Formao do F.C. Porto e

    actual Coordenador da Escola de Futebol Hernni Gonalves, confere, ao

    presente estudo, a possibilidade de balizar as caractersticas das crianas que

    frequentam, em potncia, as Escolas de Futebol.

    Marisa Gomes:Licenciada em Cincias do Desporto pela Faculdade de

    Desporto da Universidade do Porto e estando a frequentar a Licenciatura emNeurofisiologia na Escola Superior Tcnica do Porto, foi durante quatro pocas

    coordenadora da Escola do Drago do Futebol Clube do Porto, tendo

    posteriormente desempenhado o cargos de treinadora no escalo sub-13 do

    mesmo clube. Com o curso de treinadora de Futsal nvel 1 e o nvel 2 de

    Futebol, actualmente coordenadora tcnica do departamento de formao e

    treinadora dos Juvenis do Futebol Clube da Foz. Dada a preocupao em

    prover-se de Conhecimentos e Competncias Multidisciplinares, praticando-as,sem ignorar a importncia dos conhecimentos tericos, o seu contributo

    respeita aquela que ser nossa preocupao premissial: Contextualizar a

    Praxiologia do Fenmeno em estudo. A pertinncia da sua contribuio ,

    ainda, justificada pelo trabalho (actual e passado, publicado e no publicado)

    relativamente formao em Futebol e ao conhecimento global do fenmeno.

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    A Cincia da Experincia e a Experincia da Cincia: Aproximao Etnometodolgica NaturezaPraxiolgica do Futebol

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    Jos Guilherme Oliveira: Trabalho de vrios anos desenvolvido no

    Futebol Clube do Porto como treinador nos escales de formao e actual

    preparador fsico da Seleco Nacional de Futebol, aliada sua formao em

    Cincias do Desporto, possibilita um contributo que associa teoria prtica de

    algum que percorreu o Futebol desde a formao ao Rendimento Superior,

    podendo assim cooperar no conhecimento dessa globalidade, relacionando

    todo o processo.

    Segundo Cunha e Silva (2008), a anlise do contedo muitas vezes uma

    falcia das cincias moles, ou uma insuficincia das cincias moles, perante o

    determinismo das cincias duras. E portanto, h situaes em que a anlise docontedo no funciona de todo. Corroborando com a opinio enunciada e

    entendendo que o nosso estudo representa uma dessas situaes por atender

    inteireza do fenmeno futebolstico, optamos, tal como Maciel (2008), por

    utilizar os relatos dos nossos entrevistados, interconectando-os com os dados

    recolhidos atravs das fontes supra descritas e que, conjuntamente, nos

    permitem, ao longo da dissertao, inferir acerca da aplicabilidade ou no de

    tais informaes para a problemtica em estudo. Atendendo, desta maneira, desquantificao pela qualitativao subjacente ao estudo etnomedolgico

    em vigor.

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    Do cientificar ao palavrizar!!!E do palavrizar ao cientificar!Uma espcie deconceptualizao futebolstico-cientfica (re)equacionada

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    3 - Do cientificar ao palavrizar!!!

    E do palavrizar ao cientificar!

    Uma espcie de conceptualizao futebolstico-cientfica

    (re)equacionada

    Para alm do mundo objectivo da matria, que a cincia magistral a explorar, existe o mundo

    subjectivo dos sentimentos, emoes e pensamentos

    (Dalai Lama, 2006, p. 43)

    Enquanto prtica social, o futebol tem uma histria, inclusivamente, uma geografia. Da, no se

    tome por nico o que plural, e por plural o que nico. O futebol pr-existe ideia que dele se

    tem. O problema est em saber, se as ideias que dele se tem, se lhe ajustam.

    (V.M.d.C. Frade, 1990, p. 3).

    O futebol atingiu, de acordo com Frade (2006) uma relevncia social enorme

    a nvel planetrio e muito por culpa deste facto que a discusso acerca do

    jogo j uma realidade cultural com mais presena e impacto no quotidiano

    que muitas outras de domnios scio-politico-econmicos.

    Assim, sabendo que o que confere cientificidade a um objecto de estudo a

    forma como realizada a sua abordagem (Garganta, 2001), qualquerpretenso em aprofundar (logo cientificar), no sentido de potenciar evoluo,

    um conhecimento que tem muito de especificidade (o do Futebol, entenda-se),

    deve ter incio na definio, bem, de um quadro conceptual que base do

    problema cientfico em estudo. Para alm disso, um ser humano no um

    crebro embutido num crnio de um corpo. , sim, uma unidade psicofsica, um

    animal que consegue percepcionar, agir intencionalmente, raciocinar e sentir

    emoes, um animal utilizador de linguagem que no s meramenteconsciente, mas tambm autoconsciente (Srgio, 2003). Ento, importa

    perceber que as questes conceptuais so questes respeitantes s nossas

    formas de representao e que, por isso, quando se lida com problemas

    empricos sem a adequada clareza conceptual - incapacidade de prestar a

    devida ateno s estruturas conceptuais relevantes - estamos sujeitos a pr

    problemas mal concebidos, e provvel que se siga uma investigao mal

    orientada (Bennet & Hacker, 2003). No fundo, todo e qualquer quadro

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    Do cientificar ao palavrizar!!!E do palavrizar ao cientificar!Uma espcie deconceptualizao futebolstico-cientfica (re)equacionada

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    conceptual, quando considerado cientfico, deve cumprir, em rigor, uma mesma

    funo explicativa (Sousa Santos, 1991), no confunditiva, sem, contudo, ter

    a pretenso de dar uma explicao cabal de todas as coisas e que as

    consegue transformar e modificar (J. O. Bento, Anexo 1). Para alm disso, a

    cincia, sabendo que nenhuma forma de conhecimento , em si mesma,

    racional, procura dialogar com outras formas de conhecimento deixando-se

    penetrar por elas e, em funo dessa permisso, procura sensocomunizar-se

    (Sousa Santos, 1991) entendendo, tal como Wittgenstein (1973, cit. Por Bennet

    & Hacker, 2003, p. 40), que tudo o que se deixa dizer deixa-se dizer

    claramente. S assim possvel imperativizar o desejo de Nietzsche (cit. por

    Bennet & Hacker, 2003, p. 40) ao dizer que todo o comrcio entre os homensvisa que cada um possa ler na alma do outro, e a lngua comum a expresso

    sonora dessa alma comum.

    Contudo, um pensamento que sai do sujeito para se exteriorizar, mais no

    do que um pensamento que se declara na LINGUAGEM (Serro, 2007) e, por

    isso, todo o conhecimento autoconhecimento (Sousa Santos, 1991). A

    cincia no descobre, cria, e o acto criativo protagonizado por cada cientista e

    pela comunidade cientfica no seu conjunto tem de se conhecer intimamenteantes que se conhea o que com ele se conhece do real (Sousa Santos,

    1991).

    A linguagem (forma de representao) tem por funo significar o

    pensamento, sendo que a palavra (quer dizer, um som) o signo de uma ou

    vrias ideias. Isto , a linguagem, com as suas palavras e frases uma

    representao daquilo que comea por existir sob uma forma no verbal

    (Damsio, 2003b) e, sendo assim, dever existir um si no verbal e umconhecimento no verbal para os quais as palavras formao e equipa ou a

    frase jogamos bem constituem as tradues apropriadas. Ou seja, o

    fundamental para a nossa reflexo inicial no a linguagem cientfica, per si,

    mas antes a sua capacidade de traduzir, com rigor, os factos representados

    em palavras e em frases; a sua capacidade de classificar o conhecimento,

    rpida e economicamente, sob a capa protectora de uma palavra; a

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    Do cientificar ao palavrizar!!!E do palavrizar ao cientificar!Uma espcie deconceptualizao futebolstico-cientfica (re)equacionada

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    capacidade, enfim, para exprimir construes imaginrias ou abstraces

    remotas atravs de uma palavra simples e eficaz (Damsio, 2003b).

    Assim, por exemplo, no futebol, toda e qualquer posse TEMPORRIA

    potencia um conjunto alargado de interpretaes verbais de um mesmo

    conceito que, para ser conceito cientfico, deve assegurar a presena

    coincidente, no interior de uma comunidade cientfica, de um si no verbal que

    precede e motiva tais interpretaes verbais.

    No restam, j duvidas, ento, que secundarizao da linguagem

    corresponde um primado da imagem (Damsio, 2003b) e que, por isso,

    cincia importa assegurar, em cada momento, uma harmonia viva entre o que

    conceptual e o que apreendido dessa conceptualizao, pois que asquestes conceptuais antecedem os assuntos da verdade e da falsidade. So

    questes respeitantes nossa forma de representao, e no questes

    respeitantes verdade ou falsidade de declaraes empricas (Bennet &

    Hacker, 2003, p. 16).

    Embora durante muito tempo tenha vigorado a ideia de que as teorias

    cientficas reflectem o real, partindo-se do princpio de que a cincia se limitava

    a dar voz aos factos, no isso que se verifica: a cincia contemporneaconstitui diversas ORIENTAES de anlise da realidade e, assim sendo,

    revela-se permanentemente incapaz de descobrir a verdade de todo e qualquer

    assunto conceptual sob investigao atravs da teoria e da experincia

    (Bennet & Hacker, 2003). O trabalho dos cientistas a procura da verdade,

    sabendo, contudo, que prprio da natureza da verdade ser contextual e

    mutvel, depender do ponto de vista, e que as verdades de hoje so as

    hipteses contestadas de amanh e, por isso, um cientista tem sempre aliberdade de introduzir novos conceitos se achar que os j existentes so

    inadequados ou insuficientemente aperfeioados (Swain, 2002). Ou seja, o

    mundo vai mudando e, porque o mundo muda, as cincias, se querem

    continuar a reflectir e a ter um olhar que retrate o que se passa, tm que

    procurar inventar novos conhecimentos, novos saberes, novos instrumentos,

    novas perspectivas, novas e ideias e por isso que esse trabalho, esse labor

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    de reflexo cientfica inesgotvel, inconclusivo, inacabado, est sempre a

    caminho (J. O. Bento, Anexo 1).

    Importa, neste comprimento de onda, imperativizar uma necessidade

    futebolstico-cientfica: assegurar, em cada momento, que o conhecimento do

    futebol vive de renovaes e se despede de qualquer pretenso possessiva

    porque, para o bem ou para o mal, tudo se encontra em estado de mudana.

    Nada fica como est, ns no buscamos a permanncia (Masatoshi Naito cit.

    por Bento, 2004a, p. 88) e, por isso, no h uma verdade, existe um conjunto

    de factos que necessrio analisar e extrair o seu significado: as hipteses

    no podem nunca ser certezas sob o risco do fracasso, mas, de forma alguma

    podemos desprezar um fragmento, por mais pequeno que seja ou maisinsignificante que parea. O puzzle to complicado que a mais insignificante

    parcela pode impedir a sua decifrao. E o resultado nunca pode ser uma

    posse (no deve ser uma gratificao em si mesmo), mas sim um crescimento,

    uma evoluo. O conhecimento deixa de ser uma coisa acrescentada, uma

    simples adio a outra que j existe; torna-se sim uma transformao

    espiraloidal da estrutura original, tornando-se a cada passo o indivduo num

    ser (Frade, 1976, p. 74). precisamente neste contexto de transformao espiraloidal que

    introduzimos, aqui e agora, o conceito de paradigma, no futebol, sua

    revoluo e (des)construo complexificadora.

    Edgar Morin (2003), na sua obra introduo ao pensamento complexo, sugere

    uma reflexo relacionada com o conhecimento cientfico. Refere, deste modo,

    que o conhecimento opera por seleco de dados significativos e rejeio de

    dados no significativos: separa (distingue ou desune) e une (associa,identifica); hierarquiza (o principal, o secundrio) e centraliza (em funo de um

    ncleo de noes mestras). Estas operaes, que, como refere o autor,

    utilizam a lgica, so comandadas por princpios supralgicos de organizao

    do pensamento ou paradigmas. Princpios ocultos que governam a nossa viso

    das coisas e do mundo sem que disso tenhamos conscincia.

    Parafraseando Sousa Santos (1991), podemos afirmar hoje que as nossas

    trajectrias de vida pessoais e colectivas (enquanto comunidades cientficas) e

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    os valores, as crenas e os prejuzos que transportam so prova ntima do

    nosso conhecimento, sem o qual as nossas investigaes laboratoriais ou de

    arquivo, os nossos clculos ou os nossos trabalhos de campo constituiriam um

    emaranhado de diligncias absurdas sem fio nem pavio. Tambm o nosso

    entrevistado (J. O. Bento, Anexo 1), considera que ns vemos aquilo que

    somos, porque ns vamos construindo a nossa identidade e a nossa identidade

    construda por vrias peas: pela nossa racionalidade, que no a mesma,

    no dever ser, de quando nascemos, a nossa espiritualidade, a nossa

    afectividade, as nossas convices, os nossos princpios, os nossos ideias, os

    nossos valores, a nossa concepo de deveres, a tica, a deontologia

    Sendo assim, quando o sujeito se confronta com a existncia dos objectos deque os sentidos parecem ser testemunhas, levado a pr em questo a

    existncia do prprio corpo, concebido como elemento do mundo exterior e

    como intermedirio entre esse mundo e o sujeito que percebe. Ou seja, se

    admitirmos, tal como Dalai-Lama (2006, pp. 68), que o mundo constitudo

    por uma rede de realidades dependentemente originadas e inter-relcionadas,

    dentro das quais causas dependentemente originadas produzem

    consequncias dependentemente originadas segundo leis da causalidadedependentemente originadas, percebemos, facilmente, que tudo o que

    fazemos ou pensamos afecta TUDO aquilo a que estamos ligados e, por isso,

    mudar o nvel de percepo do OBJECTO implica, de modo directo, a mudana

    do OBJECTO; mudar o nvel de percepo multiplica os objectos como um

    espelho diablico (Barthes cit. por Frade, 1990).

    Deste modo, se nos colocarmos do ponto de vista da exterioridade, obtemos

    o sujeito, que percebe, e o mundo exterior. Os dois so considerados objectosobservveis e a percepo uma certa relao entre ambos que se trata de

    descrever fazendo variar as condies nas quais decorre a observao.

    Mas afinal, onde se passa a percepo?! Ao nvel do aparelho corporal, ou ao

    nvel reflexivo de uma conscincia cuja existncia se afirma para explicarmos

    no s que percebemos, mas que percebemos que percebemos ou a ambos

    os nveis?!...

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    A actividade perceptiva diz respeito totalidade perceptiva de um sujeito

    encarnado e implicado num mundo. Assim, a percepo humana

    determinada por um mundo de significaes inerente ao vivido perceptivo. De

    facto, a percepo que um objecto assume na percepo depende do contexto

    em que se encontra (um paraleleppedo na rua ou utilizado como uma arma de

    lanamento pode ser o mesmo objecto mas no tem a mesma significao);

    esta depende, tambm, da natureza fsica do ser humano: um trao qualquer

    da realidade externa no sempre um sinal desencadedor de uma mesma

    reaco para todos os seres humanos (Bennet & Hacker, 2003).

    Ento, como se constituem as significaes?!... Quais os elementos

    integrados para a constituio do mundo que o acto de sentir desdobra? Umavez que h formas internas ao sentir, de onde provm essas formas?! grande

    a tentao, influncia da norma, de uma interpretao em termos biolgicos (e

    j no meramente fisiolgicos). Contudo, se a percepo humana depende de

    um universo de significaes, poder ela ser independente de um universo

    social?!... H povos que no dispem de nomes para certas cores que ns

    designamos: poderemos dizer que, de qualquer modo, as percebem tambm?!

    Qual o papel da linguagem na percepo? Se fizermos da organizaoperceptiva um universo de formas fixas dadas a priori, como explicar a

    transformao perceptiva, ou seja, a variao das percepes com a idade, as

    transformaes sociais, as situaes, etc. ? Observa-se que a riqueza do

    conhecimento depende da percepo, mas qual a relao exacta entre uma e

    outra? Haver continuidade entre a percepo e a cincia?

    Parece ser no sentido de descodificar as dvidas anteriores que Merleau-

    Ponty (cit. por Frade, 1990) afirma que, resultando a complexidade dosproblemas aferentes percepo do seu carcter de processo global e

    dependendo a percepo de um tratamento apropriado da informao, a

    percepo , em si mesma, j um comportamento.

    Constata-se, desta maneira, que a linguagem subjectiva por depender da

    percepo e, contudo, quando procuramos analisar a linguagem, o instrumento

    de que dispomos a prpria linguagem (Coughlan, 2002). Ou seja, a

    linguagem no apenas uma maneira de trocarmos pensamentos, antes, o

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    instrumento do pensamento que expressa mas tambm da forma quilo que

    pensamos.

    Assim, a natureza paradoxal da realidade percebida, at aqui evidenciada,

    assenta num problema essencialmente epistemolgico que, procurando

    conceptualizaes e compreenses coerentes, potencia, de modo real, uma

    anlise fenomenolgica do conhecimento.

    Fenomenologicamente, conhecer dizer o acto pelo qual um sujeito apreende

    um objecto, ou seja, como o representa na conscincia.

    Num conhecimento, um sujeito (o que conhece) e um objecto (o conhecido)

    esto face a face. Mas para haver conhecimento no suficiente um sujeito e

    um objecto, necessrio que entre eles se estabelea uma relao, umacorrelao (Sousa Santos, 1991), e, por isso, no h sujeitos sem os objectos

    pelos quais eles so definidos, no h objectos sem os sujeitos para os

    apreender, no h executantes sem coisas executadas (Dalai-Lama, 2006, p.

    65).

    Assim, por exemplo, os jogadores (que treinam) s o so em relao ao

    treinador, e o treinador s treinador em relao aos jogadores, fora do treino

    os jogadores deixam de ser jogadores e o treinador deixa de ser treinador. Otreinador s treinador porque os jogadores o determinaram como treinador, e

    os jogadores s so jogadores porque o treinador os determinou como

    jogadores.

    De acordo com Kuhn (1975), o conhecimento realiza-se em trs momentos

    essenciais:

    1. -O sujeito sai da sua esfera, deixa de estar fechado na sua mente, abre a

    vontade de conhecer;2. - O sujeito faz uma incurso pormenorizada para captar o mximo de

    caractersticas do objecto;

    3. -O sujeito regressa sua esfera enriquecido. Uma vez regressado a si,

    forma-se na conscincia uma imagem ou representao do objecto.

    A actividade do sujeito manifesta-se quando o sujeito sai da sua prpria

    esfera e revela o desejo de querer conhecer o objecto, e quando o sujeito

    regressa a si e constri a imagem ou representao mental do objecto. H

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    receptividade quando o sujeito capta as caractersticas que o objecto

    disponibiliza.

    O conhecimento realiza-se, ento, seguindo uma lgica de sair de si. Assim

    como no chega simular que se domina um aspecto, por exemplo o drible ()

    porque este gesto somente faz sentido na harmonia com o contexto; no tem

    valor em si mesmo (Bento, 2005) tambm no chega conhecer de Futebol

    e, ento, Quem s sabe de desporto nem de desporto sabe (Bento, 2005), ou

    antes Quem s sabe de Futebol nem de Futebol sabe (Frade, 2006).

    De facto, tudo o que tem existncia e uma identidade, s o tem dentro da

    rede total de tudo com que possa estar relacionado, ou potencialmente

    relacionado. No existe nenhum fenmeno com uma identidade independenteou intrnseca.

    E o mundo feito de uma rede de inter-relaes complexas. No podemos

    falar da realidade de uma entidade discreta fora do contexto da sua esfera de

    inter-relaes com o seu meio e outros fenmenos, incluindo a LINGUAGEM,

    os CONCEITOS e outras convenes (Dalai-Lama, 2006, pp. 64).

    A expresso trazemos a alma vestida , portanto, particularmente

    interessante se a entendermos como uma aluso ao facto da nossa culturaestar atrelada ao modo de pensar binrio, ou pensamento linear, o qual estreita

    e obscurece os nossos horizontes mentais, e assim nos impede de perceber

    muitas das mudanas da realidade (Morin, 2003).

    Ento, capital pensar fenomenologicamente o Futebol. A clebre frase

    voltar s coisas mesmas, de Edmund Husserl, significa que o esforo

    fenomenolgico implica suspender os preconceitos, as ideias prvias, as

    teorias e, mediante essa disposio, observar os fenmenos tal como eles seapresentam nossa experincia imediata.

    , portanto, caminho verdadeiro, como disse Hegel na sua lgica, o de

    ultrapassar a tenso insolvel do transcendental e do emprico, da condio e

    do condicionado.

    Assim, uma vez que o desporto, e especificamente o futebol, no s

    biolgico mas MUITO mais do que isso (Tani, 2005), necessrio ultrapassar

    esta forma de ver as coisas complementando a interpretao quantitativa que

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    lhe atribuda com uma interpretao qualitativa. que o rigor cientfico,

    porque fundamentado no rigor matemtico, um rigor que quantifica e que, ao

    QUANtificar, desqualifica, um rigor que, ao objectivar os fenmenos, os

    objectualiza e os degrada, que, ao caracterizar os fenmenos, os caricaturiza

    (Sousa Santos, 1991).

    Ao interpretarmos a prestao de um jogador, por exemplo, temos

    necessariamente que ter em conta as partes que o constituem assim como as

    possveis relaes existentes entre elas e entre todas as componentes em

    JOGO. Ou seja, ns no podemos perceber o jogador se no estivermos a

    analisar o jogador no jogo. Do mesmo modo, ns no podemos perceber o jogo

    na sua globalidade se no entendermos a deciso do jogador. No fundo, temque haver uma interaco entre jogo e jogador para percebermos aquilo que

    est a acontecer e, por isso, ns no podemos perceber no que que estamos

    a falhar, por exemplo no ataque, se no percebermos como que estamos a

    defender (J. G. Oliveira, Anexo 5).

    Segundo Kuhn, a cincia uma obra colectiva de uma comunidade cientfica,

    a partir de paradigmas. Um paradigma um conjunto de teorias, regras,

    metodologias, aceites por uma comunidade cientfica, construindo a sua formade ver o mundo, isto , de o interpretar.

    O desenvolvimento da cincia realiza-se em duas fases, a Cincia Normal e a

    Cincia Revolucionria.

    A cincia Normal a cincia dos perodos em que um paradigma aceite

    pela comunidade cientfica. A cincia Normal uma actividade de resoluo

    de enigmas e, numa dada poca, a comunidade cientfica tenta resolver os

    problemas que surgem no seio do paradigma dominante, de acordo com osprincpios e os modos de soluo j assimilados. Isto significa que os cientistas

    so conservadores, isto , tm tendncia para evitar pr em causa o paradigma

    em vigor. Assim se justifica que os cientistas tentem resolver os novos

    problemas dentro do paradigma em vigor, contribuindo, ento, para a sua

    confirmao e no para a sua refutao. De facto, em condies normais, o

    cientista investigador no um inovador mas um solucionador de puzzles, e os

    puzzles em que ele se concentra so precisamente aqueles que acredita

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    poderem ser formulados e resolvidos pela tradio cientfica existente (Kuhn

    cit. por Gleick, 2005, p. 63).

    Pr em causa um paradigma equivale a pr em causa a percepo da

    realidade que dele depende, e na qual todos ns fomos instrudos.

    Deste modo, quando surge uma anomalia, um facto problema que no tem

    soluo dentro do paradigma em vigor, uma nova cincia surge no seio de

    outra que chegou a um beco sem sada (Gleick, 2005) e, por isso, a cincia

    entra num perodo de crise. Desta crise pode resultar a reformulao do

    paradigma ou o aparecimento de um novo paradigma (o paradigma

    emergente), que acabe por substituir o anterior. Neste ultimo caso impe-se a

    revoluo cientfica que consequncia de uma ruptura epistemolgicadependente de bloqueios epistemolgicos.

    O novo paradigma, o tal paradigma emergente, redefine os problemas at

    ento insolveis e d-lhes uma soluo convincente, e nesta base que se vai

    impondo revoluo cientfica. No entanto, a substituio do paradigma no

    rpida. O perodo de crise revolucionria em que o velho e o novo paradigma

    se defrontam e entram em concorrncia pode ser bastante longo.

    Dito isto percebe-se que a cincia cclica, est em constante progressoatravs de duas fases distintas, revelando que o desenvolvimento cientfico

    ocorre atravs de descontinuidades e rupturas entre paradigmas, na medida

    em que os paradigmas so incomensurveis, isto , no permitem qualquer

    tipo de dialogo entre si e implicam sempre que quando se adopta um

    paradigma se tem que rejeitar o outro.

    Mas precisamente essa incongruncia que, quando muda o modo de um

    cientista ver as coisas, torna possveis os mais importantes progressos (Gleick,2005).

    Ora, No tratamento cientfico do Desporto podemos reflectir sobre questes

    no ortodoxas no discurso da cincia Normal (Sobral, 1995). Assim,

    considerando a diversidade, a extenso e interdependncia dos problemas no

    Futebol, a primeira tarefa a que nos impomos, nesta dissertao, a de

    assumir uma forma de ver e entender o Jogo e o Jogar, a formao e o formar,

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    traduzida num saber que questiona a cegueira (Morin, 2003) do modelo

    mental dominante.

    O mesmo autor (2003) refere que vivemos sob o imprio dos princpios de

    disjuno, de reduo e de abstraco, cujo conjunto ele denomina de

    paradigma da simplificao. Descartes formulou este paradigma ao separar o

    sujeito pensante (ego cogitans) e a coisa externa (res externa).

    De facto, este o erro de Descartes: a separao abissal entre corpo e

    mente, entre a substncia corporal, infinitamente divisvel, com volume, com

    dimenses e com um funcionamento mecnico, por um lado, e a substncia

    mental, indivisvel, sem volume, sem dimenses e intangvel; a sugesto de

    que o raciocnio, o juzo moral e o sofrimento adveniente da dor fsica ouagitao emocional poderiam existir independentemente do corpo (Damsio,

    2003a).

    Nesta medida, o Futebol est, ainda, muito ligado a paradigmas que no so

    muito sistmicos e esses paradigmas fazem com que ns estejamos sempre a

    dividir as coisas. H diviso entre o tctico, o tcnico, o fsico, o psicolgico, h

    diviso entre o ataque, a defesa, a transio. Contudo, s se compreende o

    Jogo analisando-o na sua globalidade e, ento, em vez de proceder definiode fronteiras entre assuntos e conceitos futebolsticos, a cincia deve

    considerar o Jogo em diferentes patamares que esto obrigatoriamente em

    constante interaco. Isto , dentro do jogo h sub-dinmicas diferentes, por

    sectores, inter-sectores ou em termos individuais, mas esto todas em

    intereco umas com as outras e s percebemos realmente o Jogo quando

    percebemos o Jogo com estas interaces e com estas sub-dinmicas

    diferenciveis que se relacionam permanentemente (J. G. Oliveira, Anexo 5).Ou seja, o conhecimento tem avanado pela especializao e, nesta medida,

    sendo conhecimento disciplinar, tende a ser um conhecimento disciplinado por

    segregar uma organizao do saber orientada para balizar as fronteiras entre

    as disciplinas e por rigorizar o conhecimento na proporo directa da

    arbitrariedade com que espartilha o real (Sousa Santos, 1991).

    Queremos com isto afirmar que o Desporto, no seu conjunto, tem finalidades

    que o transcendem e para o interpretar preciso recorrer a uma srie de

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    conhecimentos muito diversificados e plurais. Sem essa diversidade de

    olhares, sem essa diversidade de anlise cai-se numa viso muito simplista,

    numa viso muito reduzida. (J. O. Bento, Anexo 1). Portanto, o conhecimento

    do futebol no se basta em si mesmo mas configura-se numa

    interdisciplinaridade recorrente da sua complexidade fenomenal e, por isso, se

    o rendimento desportivo condicionado por uma estrutura multifactorial de

    elementos interagindo de forma complexa, s igualmente de forma complexa,

    em cooperao interdisciplinar, ser possvel formular hipteses de

    investigao de maior alcance, desenvolver mtodos de investigao novos e

    complexos, mais efectivos, e abrir novas reservas de conhecimento (Marques,

    2007).Nesta medida, uma vez que consideramos, tal como Bento (2004), que as

    Cincias do Desporto tm pela frente uma larga panplia de perspectivas de

    crescimento e desenvolvimento e admitimos, tal como Gleick, que a

    incongruncia entre modos de ver as coisas que potencia os mais

    importantes progressos cientficos, defenderemos, ao longo desta dissertao,

    que so, hoje, muitos e fortes os sinais de que o modelo de cientificao

    futebolstica atravessa uma profunda crise, essencialmente ao nvel daanlise do Jogo e das metodologias de Treino (J. G. Oliveira, Anexo 5).

    Assim, defenderemos nesta dissertao: primeiro, que essa crise no s

    profunda como irreversvel; segundo, que estamos a viver um perodo de

    revoluo cientfica que se iniciou com Einstein e a mecnica quntica e no se

    sabe ainda quando acabar mas; terceiro, que os sinais nos permitem to s

    especular acerca do paradigma que emergir deste perodo revolucionrio mas

    que, desde j, se pode afirmar com segurana que colapsaro as distinesbsicas em que assenta o paradigma dominante.

    Em suma, estando as Cincias do Desporto a registar aquilo que Capra

    (2005) designou de ponto de mutao, ou recorrendo designao de Kuhn.

    (1962, cit. por Capra, 1996) verifica-se uma mudana de paradigma (Maciel,

    2008), em funo de um Corpus de conhecimento que questiona a

    simplificao paradigmtica NORMAL, e sabendo, por Gleick (2005), que

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    muitas vezes uma revoluo tem um carcter interdisciplinar, ser nossa

    preocupao, ao longo desta dissertao, multidisciplinarizar a procura do

    conhecimento futebolstico-cientfico em estudo sem que isso implique um

    afastamento da especificidade prpria de um fenmeno que, por ser antropo-

    social-total (Maciel, 2008), essencialmente identitrio, no sentido de

    contribuir, de algum modo, para a resoluo dos bloqueios epistemolgicos

    actuais (essncia primeira da cincia revolucionria, lembre-se) e consequente

    reformulao de um paradigma que, por ser futebolstico, complexo e

    sistematizvel (passvel de abordagem sistmica, entenda-se).

    Decidimo-nos, assim, a escrever este captulo devido nossa admiraopelas realizaes da cincia desportiva no sculo XX, e ao desejo de contribuir

    para o tema futebolstico em estudo.

    Nesta medida, esforar-nos-emos, ao longo das pginas seguintes, por

    proporcionar uma representao clara do campo conceptual de cada um dos

    conceitos problemticos subjacentes temtica da nossa dissertao.

    3.1. - O exaltar da INTERACO, invariante estrutural da estrutura de

    rendimento do

    FUTEBOL para a (re)conceptualizao do Futebol, do

    Jogo, do Jogar e da Equipa

    Tudo aquilo que foi fragmento e enigma e horrvel acaso at que a vontade criadora

    acrescente: Mas assim que eu queria! at que a vontade criadora acrescente: Mas assim que

    eu quero! assim que eu quererei

    (Atlan, H. , 2005, pp. 263)

    O Futebol existe muito antes de pensarmos nele, o Futebol existe

    independentemente de haver quaisquer pensamentos, o Futebol existe

    concretamente. Ou seja, o Futebol pr-existe ideia que dele se tem (Frade,

    1990, p. 3) e, por isso, o contexto de sentido de toda e qualquer

    conceptualizao futebolisticamente cientfica deve partir do isolar daquilo

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    que na NATUREZA DO JOGO DE FUTEBOL CONSTANTE E

    FUNDAMENTAL.

    Assim, se admitirmos, tal como G. Oliveira (2006), que o jogo de Futebol

    uma UNIDADE colectiva por ter uma dinmica COLECTIVA originada pela

    INTERAO de um conjunto de aspectos que esto relacionados, obtemos

    imediatamente uma questo chave: saber como os jogadores agindo na

    estrutura de rendimento so levados a interagir com os contedos da

    actividade proposta (Frade, 1990, p. 4).

    Conforme salienta Atlan (2003), nas actividades dos seres humanos

    observam-se movimentos corporais associados a actividades mentais,

    determinando na INTERaco, essa associao, uma causalidade imanente,da natureza em geral sobre ela mesma em cada um dos seus fenmenos e

    dos seus indivduos, dependente de uma causalidade eficiente, pela qual as

    coisas se produzem umas s outras numa cadeia infinita de causas e de

    efeitos.

    Para o mesmo autor, cada uma das causalidades enunciadas e auto-hetero

    implicadas, profundamente diferente de incerteza, imprevisto e indeciso.

    Entendemos a este respeito que, sendo o futebol um jogo de dinmicas cujainvariante estrutural a interaco, o jogar uma totalidade que resulta das

    interaces dos jogadores e, por isso, no deve ser interpretado como um

    somatrio de acontecimentos aleatrios porque se inscreve num contexto

    colectivo.

    Tal entendimento obriga-nos a caminhar no sentido de uma necessidade

    CRIADORA. Isto , se o futebol associa movimentos corporais a

    actividades mentais e se inscreve numa essncia eminentementecolectiva, transformando em cada momento cada aco numa

    INTERaco, de que forma possvel operacionalizar (j potenciar) uma

    interpretao colectiva capaz de antecipar a INTERaco e pr-

    determinar as INTERaces futuras?

    O jogo de futebol, pelas suas caractersticas estruturais e funcionais, pode ser

    entendido como um confronto entre sistemas caticos determinsticos com

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    organizao fractal (Gaiteiro, 2006). Olh-lo segundo esta perspectiva

    sistmica reconhecer-lhe caractersticas como a complexidade, a auto-

    organizao (potenciadora de auto-engendrao), o carcter catico e um

    dimensionamento multifractal (Resende et. al., 2006 ).

    Nesta medida, a Equipa um sistema catico determinstico por ser

    caracterizada pela imponderabilidade e imprevisibilidade do seu

    comportamento e, ainda assim, conter traos de regularidade e mesmo de

    universalidade no seu Jogar. Ento, sendo sistema catico, a Equipa de

    Futebol , obrigatoriamente, detentora de padres observveis e analisveis.

    Na verdade, uma vez que a preciso imprecisa, tambm a previso

    imprevisvel e, por isso, a previsibilidade d lugar probabilidade (Cunha eSilva, 1999). Isto , se o Jogar de uma Equipa de Futebol revela uma grande

    dependncia do que acontece em cada instante, uma vez que qualquer

    acontecimento que ocorra durante o jogo tem implicaes nos acontecimentos

    que se seguem e pode modificar e alterar completamente a sequncia, a lgica

    e o resultado do processo (Resende et. al., 2006), s podemos prever (antes

    PROBABILIZAR) comportamentos se conhecermos os padres de aco

    que constituem a essncia do Jogar da Equipa em anliseDe facto, uma equipa de futebol uma micro-sociedade que tem uma

    cultura, que tem uma linguagem, que tem uma identidade e muitas outras

    coisas prprias. Como tal deve ser entendida e tratada numa perspectiva de

    fenmeno complexo (Oliveira, 2006).

    Assim, assumindo a complexidade perspectivada, importa reconhecer, tal

    como Cunha e Silva (1999), que um sistema complexo um sistema que no

    pode ser caracterizado a partir da reunio das caractersticas e qualidades dassuas partes constituintes, e cujo comportamento no pode ser previsto a partir

    das suas partes componentes. Pelo contrrio, uma vez que o Futebol o

    desporto de situao por excelncia, dado que tende a criar situaes novas

    continuamente, dando lugar a um estado constante de imprevisibilidade, a

    ordem ou organizao de um todo (entenda-se uma equipa), ou sistema,

    transcende aquilo que pode ser oferecido pelo conjunto das suas partes

    quando esto consideradas isoladas umas das outras (Frade, 1976) e, por isso,

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    probabilizar comportamentos no interior de um jogo de futebol implica

    reconhecer a importncia da existncia de um Projecto (entenda-se um

    Modelo de Jogo) criador e recreador capaz de assegurar, em cada momento,

    uma auto-eco-organizao (Morin, 1990) que exponencia necessariamente

    uma tomada de deciso que no abstracta, porque tem repercusses no

    contexto onde se inscreve, mas INTERACTIVA porque, em jogo, a tomada de

    deciso de um elemento potencia uma interpretao e ANTECIPAO pelos

    demais elementos, condicionando, assim, o desenvolvimento futuro do sistema,

    ou seja, as INTERaces (Gomes, 2006).

    Parece, deste modo, que, havendo vrias formas de resolver os problemas

    em jogo, a existncia de um projecto implica uma resoluo problemticasubordinada a uma determinada lgica criada, recriada e inventada durante o

    processo de treino, porque o treino visa exactamente isso. Ns apetrechamos

    os jogadores e a equipa para que eles consigam resolver os problemas que no

    jogo se colocam de uma forma permanente, dentro de determinada forma de

    resoluo desses problemas (Oliveira, 2006) e, por isso, o treino uma

    aprendizagem que permite intencionalizar comportamentos pela

    autonomizao do jogador e da equipa., quanto a ns, precisamente esta intencionalizao que confere Equipa

    uma determinada padronizao ESSENCIAL (de essncia, entenda-se)

    capaz de potenciar probabilizao.

    Segundo Atlan (2003), um comportamento intencional produzido

    causalmente num corpo complexo pelos efeitos integrados de comportamentos

    no intencionais dos seus constituintes. Entendemos, a este propsito, que as

    decises dos jogadores resultam dos dados contextuais mas sosobreconfiguradas por regras colectivas que os levam a optar por

    determinadas escolhas em detrimento de outras, sendo que as interaces dos

    jogadores expressam a INTENO individual que subjugada a um projecto

    colectivo de jogo (Oliveira, 2004).

    precisamente a este nvel que Paulo Cunha e Silva (in Maciel, 2008)

    caracteriza a equipa como um mosaico fluido capaz de produzir um jogar

    COMPLEXO (por ser, tambm ela complexa) por encerrar constituintes

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    HETEROGNEOS, os jogadores, que se encontram inseparavelmente

    associados.

    Ento, uma vez que a equipa uma colectividade feita de singularidades

    (Cunha e Silva, 2008), importa, aqui e agora, assegurar um entendimento do

    todo que extrapole a homogeneidade dos seus constituintes porque, sendo um

    todo, a equipa feita de partes e essas partes so fundamentais por serem

    elas a assegurar, em cada momento, a descristalizao do todo, antes a

    evoluo do todo pela capacidade de incorporao do NOVO, porque um

    sistema saudvel (Capra, 2005) no uma realidade esttica mas sim um

    sistema que evidencia flexibilidade face mudana, logo ABERTO e, por

    isso, potencialmente livre e criativo.A este respeito, Cruyf (2002) considera que os senhores que mandam no

    futebol nunca esto verdadeiramente interessados no jogador enquanto

    indivduo, preferindo concentrar todas as atenes na equipa como um todo.

    Contudo, uma equipa constituda por onze indivduos e cada um deles

    merece ateno, uma equipa quando os jogadores dessa mesma equipa,

    com o contributo do treinador, conseguem ser individuais e simultaneamente

    colectivos e ser esse colectivo individual tambm. Ou seja, h umadiferenciao entre jogadores mas h um patamar superior que a equipa,

    essa individualidade que a equipa (J. G. Oliveira, Anexo 5) e, por isso, o

    aparente paradoxo de fazer evoluir o que de individual uma equipa tem para

    fazer evoluir a prpria equipa fica desparadoxo quando descobrimos que o

    individual no evolui pela individualidade das tarefas mas pela sua

    colectividade. Ou seja, o indivduo evolui como indivduo NA equipa.

    Ora vejamos, o senso comum leva-nos a considerar que os vrios objectosque observamos podem ter uma, duas, ou trs dimenses. Contudo, se formos

    confrontados com a noo de uma dimenso no inteira, digamos 1.2 ou 2.3, o

    mais natural que no nos demos imediatamente conta do que se trata.

    Deste modo, se associar a ideia de uma dimenso a por exemplo, uma linha,

    duas dimenses a um quadrado, e trs a um cubo (fig. 1), e analisarmos o que

    se encontra por trs dessa noo intuitiva obtemos, certamente, algumas

    concluses.

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    Se dividirmos uma determinada linha em N partes idnticas, estaremos

    indirectamente a obter N cpias da linha original reduzidas escala de = 1/N.

    De forma semelhante, para um quadrado, se o dividirmos em N partes

    semelhantes, estaremos desta vez a reduzi-lo escala de = 1/N ou seja, um

    quadrado reduzido escala de 0.5, possuir um quarto da rea inicial. No caso

    do cubo, raciocnio semelhante, leva-nos a concluir que, ao dividi-lo em Npartes iguais, estamos a reduzi-lo a uma escala de = 1/3N, permitindo-nos

    estabelecer informalmente que = 1/DN em que D representa a dimenso do

    objecto.

    Olhemos agora para a figura 2. (curva de Von Koch) Imaginemos uma linha

    que ao ser dividida em trs partes mantm as suas caractersticas de dimenso

    1. No entanto, se substituirmos o seu tero mdio por dois segmentos de igual

    tamanho ao segmento anterior (fig. 2.a), ficamos com uma figura que possui 4segmentos, cada um com 1/3 do comprimento original da linha. A relao com

    o que dissemos anteriormente directa. Se reduzirmos esta figura a uma

    escala () de 1/3, obteremos 4 segmentos idnticos (N) e teremos portanto D =

    log4/log3 = 1.26 (fig. 3.b), tal como em fig. 3.c e 3.d em que D = log16/log9 e D

    = log64/log27, respectivamente.

    Figura 1 Linha, quadrado e cubo(Adaptado de Barnsley et. al., 1988, p. 29)

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    Caminhando a este passo, entramos inevitavelmente na anlise fractal de

    uma equipa de futebol. Etimologicamente Fractal provm do latim fractus que

    significa fragmento ou irregular.Um fractal , de acordo com Paul Celle (2006), um padro geomtrico

    irregular, que pode ser subdividido mas em que cada parte uma cpia mais

    pequena do todo inicial. um padro geomtrico semelhante em todas as

    escalas, da mais reduzida maior.

    Uma das caractersticas dos fractais, a sua auto-semelhana. Como

    podemos ver na imagem anterior, o conjunto total constitudo por pequenas

    rplicas desse mesmo conjunto e basicamente neste princpio que assenta oconceito de auto-semelhana, ou seja, qualquer que seja a ampliao

    considerada, obteremos sucessivas cpias do objecto inicial.

    Para Paul Celle (2006) possvel distinguir dois tipos diferentes de auto-

    semelhana: a exacta e a estatstica. No caso da curva de von Koch, a auto-

    semelhana exacta uma vez que as rplicas que vamos obtendo, so de

    facto perfeitas. Podemos no entanto, imaginar determinado tipo de figuras que

    ao serem ampliadas apresentem uma auto-semelhana estatstica, ou seja,

    Figura 2 Curva de Von Kock(Adaptado de Barnsley et. al., 1988, p. 30)

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    uma semelhana que no sendo exacta, apresenta os mesmos padres, no

    fundo, imagens que possuem as mesmas caractersticas em termos gerais.

    Entendemos, neste comprimento de onda, que o Jogar de uma equipa de

    Futebol possui uma auto-semelhana estatstica por ser identificado por

    padres fractais que guiam a equipa dentro do contexto de variabilidade e

    aleatoriedade do jogo.

    Uma equipa um sistema sempre em construo. Os jogadores so as

    partes que concorrem para a sua efectivao e so eles que, pela sua

    evoluo, lhe conferem uma determinada identificao.

    Sabemos, j, que o todo sempre superior soma das partes mas sem

    as partes, sua constante evoluo, o todo no existe e, ento, os jogadores,para exprimirem toda a sua qualidade, tm que se exprimir em funo das

    exigncias do prprio jogo, daquilo que est a acontecer. Para isso, os

    jogadores tm que estar inseridos numa forma de ver o Jogo e de encarar o

    Jogo que lhes permita exprimir as suas qualidades em termos individuais, em

    conformidade com a equipa, e, para alm disso, a equipa tem que entender as

    qualidades individuais dos jogadores de modo a permitir a maximizao da

    qualidade dos jogadores e, consequentemente, da qualidade da equipa (J. G.Oliveira, Anexo 5). Ou seja, tem que haver uma relao muito grande entre

    Jogador - Equipa e Equipa - Jogador.

    O jogo de futebol desenvolvido por seres humanos que possuem corpo e

    alma, e que esto sujeitos imprevisibilidade e diversidade do prprio jogo

    (Valdano, 2002).

    Assim, tal como o Ser Humano, tambm o jogador, no existe de uma forma

    isolada, no se basta em si mesmo e a sua essncia nica acompanhada deuma existncia em relao. Ou seja, o homem, o jogador, no somente existe,

    mas fundamentalmente, inter-existe e, ainda assim, esta existncia em

    relao no anula a individualidade, mas, pelo contrrio potencia-a. Deste

    modo, tal como o jogo, tambm os jogadores se tm como complexos. Ento,

    num jogo que se apresenta complexo, com jogadores igualmente complexos, o

    jogo no existe sem o jogador nem o jogador sem o jogo. Isto , os jogadores

    fazem o jogo, dando-lhe sentido

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