Fichamento5.Canaris.vinicius

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIA FACULDADE DE DIREITO PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DIREITO VINÍCIUS SOARES CARVALHO FICHAMENTO Nº 5 Salvador 2015

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UNIVERSIDADE FEDERAL DA BAHIAFACULDADE DE DIREITOPROGRAMA DE PS-GRADUAO EM DIREITO

VINCIUS SOARES CARVALHO

FICHAMENTO N 5

Salvador2015

VINCIUS SOARES CARVALHO

Fichamento textual do livro do professor catedrtico da Universidade de Munique Claus-Wilhelm Canaris, intitulado Pensamento sistemtico e conceito de sistema na cincia do direitoAtividade proposta pelo docente como requisito avaliativo para a disciplina Teoria Geral do Direito, PPGD/UFBa, no semestre letivo de 2015.1

Salvador2015

CANARIS, Claus-Wilhelm. Pensamento sistemtico e conceito de sistema na cincia do direito. Traduo de Antnio Menezes Cordeiro. Lisboa: Fundao Calouste Gulbenkian, 1989.Pgs.

IX XIIntroduo edio portuguesaI - OS DILEMAS DA CINCIA DO DIREITO1. O lastro de novecentos: formalismo e positivismoO sculo XIX presenciara profundas e promissoras alteraes no modo de entender e de realizar o Direito: retenham-se, no domnio exemplar do Direito privado, o xito das grandes codificaes, a revoluo metodolgica savignyana, o aparecimento, desenvolvimento e decadncia da exegese moderna e da jurisprudncia dos conceitos e a divulgao da jurisprudncia dos interesses. Outras orientaes mais tarde desenvolvidas, tais como o Direito livre, o formalismo neokantiano ou o psicologismo datam do sculo XIX. Esta profuso explicar porventura, num certo paradoxo, a quietude subsequente: as grandes opes possveis estavam equacionadas: a evoluo posterior limitar-se-ia a repens-Ias e a aprofund-Ias (...).

XV / XVIO formalismo e o positivismo, apresentados, respectivamente, como o predomnio de estruturas gnoseolgicas de tipo neo-kantiano e como a recusa, na Cincia do Direito, de consideraes no estritamente jurdico-positivas, constituem o grande lastro metodolgico do sculo vinte.No fundo, afloram aqui duas grandes cepas do pensamento jurdico moderno e contemporneo: o jusracionalismo, ele prprio manifestao exacerbada do jusnaturalismo tradicional e o cientismo, transposio para as humansticas das posturas lntelectivas desenvolvidas perante as Cincias da Natureza.

XIX / XX2. Crticas: a necessidade do discurso cientfico integralO primeiro bice que se ope ao formalismo reside na natureza histrico-cultural do Direito. Numa conquista da escola histrica contra o jusracionalismo antecedente, sabe-se que o Direito pertence a uma categoria de realidades dadas por paulatina evoluo das sociedades. A sua configurao apresenta-se, pelo menos ao actual estdio dos conhecimentos humanos, como o produto de uma inabarcvel complexidade causal que impossibilita, por completo, explicaes integralmente lgicas ou racionais. Assim sendo, o Direito deve ser conhecido de modo directo, tal como se apresenta; uma sua apreenso apriorstica resulta impossvel.

XXO segundo obstculo reside na incapacidade do formalismo perante a riqueza dos casos concretos. Na verdade, todas as construes formais assentam num discurso de grande abstraco e, como tal, marcado pela extrema reduo das suas proposies. Quando invocadas para resolver casos concretos, tais proposies mostram-se insuficientes: elas no comportam os elementos que lhes facultem acompanhar a diversidade de ocorrncias e, da, de solues diferenciadas.

XX XXII(...) um positivismo cabal no admite - no pode admitir - a presena de lacunas. E quando, levado pela evidncia, acabe por aceit-las, no apresenta, para elas, qualquer soluo material: a integrao da lacuna - operao que, por excelncia, exige o contributo mximo da Cincia do Direito - realizar-se-, pois, margem do pensamento jurdico.Muito importante na crtica ao positivismo a sua inoperacionalidade em situaes de contradies de princpios.Finalmente, o juspositivismo detm-se perante a questo complexa mas inevitvel das normas injustas.

XXIIIAs crticas acima alinhadas contra o formaIismo e o positivismo constatam, no fundo, a insuficincia de ambas essas posturas perante as necessidades da efectiva realizao do Direito.

XXIVEis, pois, o desafio. Confrontado com as insuficincias do formalismo e do positivismo, o discurso jurdico tem de, como primeira tarefa, ampliar a sua base de incidncia. Todo o processo de realizao de Direito, portanto todos os factores que interferem, justificam ou explicam as decises jurdicas, devem ser includos no discurso juscientfico.Noutros termos: o discurso cientfico deve ser integral.

XXVII3. O irrealismo metodolgicoO irrealismo metodolgico, enquanto fenmeno histrico-cultural devidamente situado, emerge duma complexidade causal de anlise difcil. Como foi dito, ele tem, na base, a incapacidade demonstrada pelos esquemas formalistas tradicionais e pelo juspositivismo em acompanhar as novas necessidades enfrentadas pelo Direito. Mas tal factor, j de si importante, viu o seu influxo multiplicado pela especializao dos juristas.

XXVIIITal o dilema da Cincia do Direito no final do sculo vinte: perante problemas novos, ou se intensifica um metadiscurso metodolgico irreal, inaplicvel a questes concretas e logo indiferente ao Direito, ou se pratica um formalismo ou um positivismo de recurso. Em qualquer dos casos, as solues so ora inadequadas ora assentes em fundamentaes aparentes, escapando ao controlo da Cincia do Direito.

XXXIIII- PERSPECTIVAS METODOLGICAS NA MUDANA DO SCULO4. Conspecto geralA jurisprudncia dos interesses reduzira, em extremo, as referncias atendveis, para efeitos de resoluo de casos jurdicos. A coberto dum apelo realidade da vida, tudo quanto extravasasse os juzos do legislador era rejeitado ou esquecido. S bastante mais tarde, num esforo constante, se procedeu a um alargamento paulatino dos elementos relevantes para o decidir jurdico. Trs notas podem, nesse particular, ser salientadas: os apelos ao racionalismo, Moral e Poltica.

XXXVIPartindo duma certa preocupao em alargar as bitolas de ponderao de interesses, - incluindo, de novo, o recurso ao sistema e aos conceitos - a jurisprudncia das valoraes, por falta de desenvolvimentos que capacitassem uma interveno efectiva, acabou por surgir como uma das reas que maior guarida assegurou ao irrealismo metodolgico.

XXXVIIIAs Cincias Humanas dos nossos dias permitem encarar a uma nova luz estes problemas clssicos. Na verdade, a Moral, num dado antropolgico objectivamente demonstrvel , ainda, um fenmeno da cultura. Assim, ela depende sempre de uma aprendizagem sendo, nessa medida, imposta do exterior. As regras de conduta - jurdicas ou morais - com os competentes cdigos de permitido, proibido ou obrigatrio so ministradas aos sujeitos sem uma particular diferenciao.

XXXIXAs regras jurdicas distinguem-se das demais regras sociais, apenas, pela sua incluso assumida num particular processo de deciso, ou seja: pela sua sujeio estrita Cincia do Direito. Mas isso no absorve todas as regras. necessidade de elementos suprapositivos soma-se o realismo no estabelecer das solues: estas, fatalmente influenciadas pelos cenrios culturais que presidem ao seu encontrar, apresentam sempre nveis ticos que no devem ser ignorados.

XLV5. A jurisprudncia analticaA crtica frontal cifra-se no seguinte: perante o dilema do final do sculo - positivismo versus irrealismo metodolgico - a jurisprudncia analtica optou decididamente pelo primeiro e abriu as portas ao segundo. Sucedem-se as obras e os desenvolvimentos: no h, no entanto, neles, quaisquer solues - ou quaisquer particulares solues - para as grandes questes do Direito privado: lacunas, conceitos indeterminados, contradies de princpios e normas injustas tm, assim, de procurar sada noutras latitudes.

LI6. A jurisprudncia problemticaFinalmente, a jurisprudncia problemtica revela todas as suas potencialidades no domnio das lacunas rebeldes aos processos sistemticos de integrao portanto analogia e aos princpios gerais: impedido de denegar justia, o intrprete-aplicador ter de buscar uma sada razovel que, ento, intentar justificar nos tpicos que encontrar.

LIIComo foi referido e vem, depois, explicado detidamente por CANARIS, o pensamento jurdico no , puramente, um pensamento tpico ou problemtico. A apreciao que agora importa fazer pe-se, contudo, noutras latitudes. A jurisprudncia analtica , de algum modo, o produto do positivismo dos princpios do sculo XX. Paralelamente, pode considerar-se a jurisprudncia problemtica como o resultado do evoluir do formalismo.

LX / LXI7. As snteses hermenuticasA legitimidade do discurso hermenutico opera pelo consenso das solues em que se corporiza. Mais do que um dado sociolgico ou poltico ou do que uma hiptese racional ou razovel de elaborao justeortica, o apelo ao consenso permite aferir a bondade das solues atravs da sua confluncia no sistema donde promanem.Chega-se, com isto, necessidade de um discurso sistemtico renovado que, do Direito, ponha a tnica no inter-relacionar das regras com os factos.

LXI8. Cultura e cincia da decisoAs perspectivas metodolgicas da actualidade podem, no rescaldo das consideraes acima tecidas, ser sintetizadas em duas ideias fundamentais: a natureza cultural do Direito e a necessidade de dotar as decises jurdicas de uma estruturao cientfica.

LXIVIII A TEORIA EVOLUTIVA DOS SISTEMAS9. A ideia de sistema como base do discurso cientficoOs fenmenos jurdicos implicam relaes estveis entre si; essas relaes facultam um conjunto de estruturas que permitem a consistncia ontolgica do conjunto. Seja qual for o labor terico que sobre ele incida, o Direito, ainda que relativizado segundo coordenadas histricas e geogrficas, pressupe como que uma concatenao imanente. Impe-se, desde logo, uma primeira ideia de sistema: o Direito assenta em relaes estveis, firmadas entre fenmenos que se repetem, seja qual for a conscincia que, disso, haja.A ideia de sistema em Direito provoca dvidas e discusses. Como hiptese de trabalho - e tal como faz CANARIS - , em regra, utilizada por KANT: sistema a unidade, sob uma ideia, de conhecimentos diversos ou, se se quiser, a ordenao de varias realidades em funo de pontos de vista unitrios.

LXVO papel do sistema no Direito vai, porm, bem mais longe. Enquanto realidade cultural, o Direito deve ser conhecido, para ter aplicao. A aprendizagem dos fenmenos jurdicos torna-se, assim, indispensvel.Tal aprendizagem pode, em teoria, processar-se por via emprica. As diversas situaes relevantes ministradas, caso a caso, aos sujeitos, funcionando, depois, em todas as conjunes similares. Pode-se, ento, dizer que o Direito, embora dotado necessariamente do seu sistema interno, segue vias assistemticas de reproduo.

LXXA rejeio do sistema surge como o coroar do irrealismo metodolgico: na sua falta [do sistema], as fontes tornam-se no-manuseveis e as decises irredutveis, inexplicveis e incontrolveis.Os progressos hermenuticos alcanados, com relevo para a substantivao da linguagem, permitem, em definitivo, colocar a ideia de sistema na base do discurso cientfico.

LXXXIII10. A evoluo do direito e a sucesso de modelos sistemticos: os modelos perifrico, central e integrado natureza histrica do Direito junta SAVIGNY uma outra e importante caracterstica: o ser uma Cincia filosfica, devendo ...na sua conexo interior, produzir uma unidade. Apela-se, pois, e de modo expresso, necessidade de um sistema. Nenhum destes aspectos foi, tomado em si, original. O Humanismo j havia proclamado a essncia histrica do Direito, desenvolvendo esforos para valorizar essa dimenso. Por seu turno, as necessidades de construo sistemtica, exigncia clara do cartesianismo, foram implantadas e desenvolvidas pelo jusracionalismo. A originalidade savignyana analisa-se na sntese desses dois aspectos: a natureza histrico-cultural do Direito deve articular-se com um adequado sistema de exposio. Nasce, assim, a terceira sistemtica ou sistemtica integrada.

LXXXIV / LXXXV11. Modelos sistemticos e codificaes civisA relevncia substantiva do sistema - ou dos diversos modelos sistemticos - pode ser comprovada atravs dos seus reflexos nas codificaes civis.A codificao no se confunde com uma compilao. Uma compilao implica sempre um conjunto de fontes, submetido a determinada ordenao.

LXXXVA codificao torna-se possvel apenas com a obteno de um certo estdio de desenvolvimento da Cincia do Direito. A tarefa morosa e muito complexa: o nvel necessrio s foi atingido em Frana, nos finais do sculo XVIII. Acrescente-se ainda que no basta, para uma codificao, a obteno de particulares resultados juscientficos. No Direito, jogam-se sempre amplas dimenses culturais, pelo que uma codificao requer ainda circunstncias polticas e universitrias favorveis

XCII / XCIIIA influncia dominadora, cientfica e cultural, do Cdigo Civil francs esmoreceria perante o aparecimento, nos finais do sculo XIX, de uma nova codificao, assente em dados cientficos mais perfeitos e avanados: o Cdigo Civil alemo. Este merece, a ttulo pleno, a designao de segunda codificao.

XCVIITambm aqui, o essencial residia, no entanto, na Cincia do Direito que lhe estava subjacente: esta pode enfrentar, com xito, os dois grandes desafios que lhe foram lanados.O primeiro derivou da inexistncia, no prprio texto do BGB, de normas adaptadas ao trabalho, tal como este se desenvolve nas sociedades industriais; o seguinte adveio das perturbaes econmicas e sociais profundas que no cessaram de aumentar depois da primeira guerra mundial.Em resposta ao primeiro problema nasceu o Direito do trabalho, como Direito privado especial; o segundo conduziu ao desenvolvimento de vrios institutos importantes, no mbito civil.

XCVIII / XCIX Nesta sequncia, chamar-se- codificaes tardias aos cdigos civis surgidos depois do BGB, isto , aos cdigos do sc. XX; especialmente em causa ficam os Cdigos civis suo (1907), grego (1940), italiano (1942) e portugus (1966). As codificaes tardias tm, essencialmente, as seguintes caractersticas:- so fruto da terceira sistemtica;- correspondem a uma certa universalizao do Direito e da sua Cincia;- tm em conta as crticas sectoriais feitas s primeira e segunda codificaes e consagram certos institutos novos obtidos j depois delas;- apresentam desvios provocados pelas diversas realidades nacionais.

XCIXAs codificaes tardias so fruto da terceira sistemtica. Foram precedidas pela recepo e pelo desenvolvimento de uma Cincia Jurdica de tipo pandectstico, que procurando evitar os extremos de um Direito puramente racionalista ou de um Direito emprico no seu todo, efectuou a sntese integrada desses dois nveis jurdicos.As codificaes tardias assentam em transferncias culturais relevantes, ocorridas entre os diversos espaos nacionais. O Cdigo Napoleo um produto da doutrina francesa, tal como o BGB da doutrina alem. Mas as diversas codificaes do sculo XX tiveram, na sua base, estudos cientficos alargados, que no se detiveram em fronteiras nacionais ou lingusticas.NOTA: Com base no pensamento da Escola Histrica do Direito de Savigny, o pandectismo veio a construir uma sistemtica integrada, a terceira sistemtica, sendo, de certa forma, a sntese das que lhe antecederam: da sistemtica perifrica humanista, caracterizada pela nfase na natureza histrica do Direito; e da sistemtica central jusracionalista, que, com base no cartesianismo, desenvolveu uma real construo sistemtica do Direito. Assim, a sistemtica integrada, conjugando elementos da perifrica e da central, aceita o direito perifrico como irrecusvel herana histrico-cultural, mas o reelabora cientificamente, sistematizando-o. (Andrei Pitten Velloso)

CIIV A REALIZAO DO DIREITO12. O esquema concepto-subsuntivo; crticas; a unidade de realizao do direito e a natureza constituinte da decisoO processo da realizao do Direito era decomposto em vrias operaes: a determinao da fonte relevante, a sua interpretao, a integrao de eventuais lacunas - admitidas com dificuldade, como foi visto -, a delimitao da matria de facto resultante, sua qualificao jurdica e a aplicao.

CIIIPor seu turno, a subsuno abre as portas ao mtodo da inverso: com base na construo de conceitos, procedia-se sua definio exacta e sua reconduo a conceitos gerais; estes so, depois, usados para integrar lacunas, invertendo-se, com isso, a relao entre o especial e o geral.

CIV13. Os modelos de deciso; pr-entendimento, silpica e integrao horizontalO pr-entendimento, j considerado, implica aqui que o intrprete-aplicador, quando confeccione e manuseie os modelos de deciso, tenha j uma pr-viso do problema, fruto da sua experincia, dos seus conhecimentos, das suas convices e da prpria linguagem. Esta realidade no pode escapar Cincia do Direito, sob pena de se admitirem reas no-cientficas no processo de deciso. Por isso, atravs da anlise dos factores pr-firmados da deciso, e assumindo-se, designadamente, a dimenso pedaggica do Direito, h que integrar, na medida do possvel, o prprio pr-entendimento nos modelos de deciso, limando arestas e valorizando os factores sistemticos que inclua.

CX / CXIPara alm da finalidade do Direito, a consignar condignamente nos modelos de deciso, h que lidar com as consequncias dessa prpria deciso. Na verdade, a sequncia da deciso - domnio, em princpio, fora j da esfera do julgador - pode sufragar ou inviabilizar os objectivos da lei e do Direito. Ignor-lo, enfraquece a mensagem normativa; inclu-lo no prprio modelo de deciso permite, em definitivo, superar estdios meramente formais no domnio da aplicao do Direito. Nessa linha, surge a sinpica: trata-se de um conjunto de regras que, habilitando o intrprete-aplicador a pensar em consequncias, permitem o conhecimento e a ponderao dos efeitos das decises.

CXII / CXIII 14. O novo pensamento sistemticoAs exigncias renovadas de uma Cincia Jurdica clara e precisa, capaz de responder a uma realidade em evoluo permanente e que tenha em conta os actuais conhecimentos hermenuticos e as exigncias de maleabilidade deles decorrentes apontam para um novo pensamento sistemtico.Tal pensamento pode ser comodamente indiciado atravs de quatro requisitos presentes no sistema por ele postulado: trata-se de um sistema aberto, mvel, heterogneo e ciberntico. Aberto no duplo sentido de extensivo e intensivo; extensivo por oposio a pleno: admite questes a ele exteriores, que tero de encontrar sadas; intensivo por oposio a contnuo: compatibiliza-se, no seu interior, com elementos materiais a ele estranhos. Mvel por, no seu seio, no postular proposies hierarquizadas, antes surgindo intermutveis. Heterogneo por apresentar, no seu corpo, reas de densidade diversa: desde coberturas integrais por proposies rgidas at s quebras intra-sistemticas e s lacunas rebeldes analogia. Ciberntico por atentar nas consequncias de decises que legitime, modificando-se e adaptando-se em funo desses elementos perifricos.

05(...) Enquanto, por exemplo, SAUER exclama com nfase: Apenas o sistema garante conhecimento, garante cultura. Apenas no sistema possvel verdadeiro conhecimento, verdadeiro saber e H. J. WOLFF diz: A Cincia do Direito ou sistemtica ou no existe, EMGE opina, com discrio cptica: Um sistema sempre um empreendimento da razo com um contedo exagerado ~ uma afirmao que est apenas a curta distncia da clebre frase de NIETZSCHE que caracterizou a aspirao ao sistema como uma falta na consecuo do Direito e uma doena no carcter. (...)

06

(...) como a metodologia jurdica, em toda a sua extenso, est numa conexo estreita com a Filosofia do Direito em geral, colocamo-nos, com celeridade, perante a problemtica dos valores jurdicos mais elevados e da relao entre eles (6).

(6) Cf., com mais pormenores, infra 1 II 2, 4- IV 3, 5 lI, 6 I 4 b e 7 lI.

07(...) VIEHWEG foi contraditado por DIEDERICHSEN por ter conduzido uma luta contra moinhos de vento e um combate aparente, visto o sistema axiomtico-lgico, por ele questionado, no ser, h muito, defendido por ningum - e, com efeito, aqui est uma fraqueza essencial do trabalho de VIEHWEG. (...)

09 / 10 1 A FUNO DA IDEIA DE SISTEMA NA CINCIA DO DIREITO

1 AS QUALIDADES DA ORDEM E DA UNIDADE COMO CARACTERSTICAS DO CONCEITO GERAL DE SISTEMA

(...) ainda determinante a concepo clssica de KANT, que caracterizou o sistema como a unidade, sob uma ideia, de conhecimentos variados ou, tambm, como um conjunto de conhecimentos ordenado segundo princpios. (...)

10 / 11(...) segundo SAVIGNY, o sistema a concatenao interior que liga todos os institutos jurdicos e as regras de Direito numa grande unidade, segundo STAMMLER uma unidade totalmente coordenada, segundo BINDER, um conjunto de conceitos jurdicos ordenado segundo pontos de vista unitrios, segundo HEGLER, a representao de um mbito do saber numa estrutura significativa que se apresenta a si prpria como ordenao unitria e concatenada, segundo STOLL um conjunto unitrio ordenado e segundo COING uma ordenao de conhecimentos segundo um ponto de vista unitrio.

151.1 A ADEQUAO VALORATIVA E A UNIDADE INTERIOR DA ORDEM JURDICA COMO FUNDAMENTOS DO SISTEMA JURDICO

1. Adequao e unidade como premissas teortico-cientficas e hermenuticas

No entanto, o concluir, sem mais, pela existncia da unidade do Direito, a partir da natureza cientfica da jurisprudncia ou do postulado metodolgico do entendimento unitrio, conduz a uma petitio principii. (...)

15 / 16(...) Pois o ser a jurisprudncia uma Cincia suscita, logicamente, a questo prvia, inteiramente procedente, de saber se a aceitao desse carcter cientfico no ser um erro, por inadequao do seu objecto; assim, os adversrios do pensamento sistemtico, em parte na sequncia desse seu princpio bsico, tm negado o carcter cientfico da jurisprudncia, reconhecendo-Ihe apenas a categoria de uma espcie de arte ou de tcnica. E o mesmo acontece com as regras da interpretao sistemtica, da pesquisa dos princpios gerais de Direito e do entendimento unitrio que, como todas as mximas metodolgicas, devem permanecer meros postulados inalcanveis, quando no encontrem no seu objecto, isto , na ordem jurdica, uma correspondncia.

16NR n 21 VIEHWEG caracteriza a tpica como a tcnica do pensamento problemtico e parece conceber a expresso tcnica como o oposto de cincia (...). De facto, dever-se-ia pensar que um processo que apenas queira dar indcios (p. 15), que evite compromissos (p. 23), que apoie a legitimao das suas premissas apenas na aceitao do interlocutor (p. 24), etc. etc., no poderia aspirar seriamente natureza cientfica. No entanto, VIEHWEG parece reconhecer, junto das cincias que trabalham de modo lgico-dedutivo, um segundo tipo de Cincia (com que ele concordaria) e no qual quer situar a Cincia do Direito, tambm atravs da afirmao da sua estrutura tpica fundamental (cf., p. ex., p. 1 s., p. 53 s., p. 63 s.) (o que seria difcil de conciliar, pelo menos com o conceito tradicional de Cincia).

18(...) A ideia da ordem interior e da unidade carece, por isso, de uma confirmao que se deve fundamentar na prpria estrutura do seu objecto, portanto na essncia do Direito.

2. Adequao e unidade como emanaes e postulados da ideia de Direito

(...) A ordem interior e a unidade do Direito so bem mais do que pressupostos da natureza cientfica da jurisprudncia e do que postulados da metodologia; elas pertencem, antes, s mais fundamentais exigncias tico-jurdicas e radicam, por fim, na prpria ideia de Direito. Assim, a exigncia de ordem resulta directamente do reconhecido postulado da justia, de tratar o igual de modo igual e o diferente de forma diferente, de acordo com a medida da sua diferena: tanto o legislador como o juiz (...) esto adstritos a proceder com adequao. (...)

19(...) constitui a primeira indicao decisiva para a aplicao do pensamento sistemtico na Cincia do Direito, - o que, por exemplo, FLUME, seguindo SAVIGNY, certeiramente exprime quando caracteriza o sistema como a consequncia do Direito, interiormente pressuposta. adequao da ordem interior do Direito ou ordem interior simplesmente

20(...) Tambm esta no , de modo algum, apenas um postulado lgico-jurdico, antes se reconduzindo, da mesma forma, ao princpio da igualdade. (...) unidade da ordem interior do Direito

(...) garante-se que a ordem do Direito no se dispersa numa multiplicidade de valores singulares desconexos, antes se deixando reconduzir a critrios gerais relativamente pouco numerosos; e com isso fica tambm demonstrada a efectividade da segunda caracterstica do conceito de sistema, da unidade. aspecto positivo da unidade (o aspecto negativo o afastamento de contradies j garantido pela ordem interior)

22Longe de ser uma aberrao, como pretendem os crticos do pensamento sistemtico, a ideia do sistema jurdico justifica-se a partir de um dos mais elevados valores do Direito, nomeadamente do princpio da justia e das suas concretizaes no princpio da igualdade e na tendncia para a generalizao. Acontece ainda que outro valor supremo, a segurana jurdica, aponta na mesma direco. (...)

23(...) O papel do conceito de sistema , no entanto, como se volta a frisar, o de traduzir e realizar a adequao valorativa e a unidade interior da ordem jurdica.

NR 39 Tambm para realizar; pois a unidade e a adequao no so apenas afirmadas, mas tambm sempre pretendidas, portanto no apenas pressuposio, mas tambm um postulado.

26 2 O CONCEITO DE SISTEMA

I - CONCEITOS DE SISTEMA QUE NO SE JUSTIFICAM A PARTIR DAS IDEIAS DA ADEQUAO VALORATIVA E DA UNIDADE INTERNA DA ORDEM JURIDICA

1. O sistema externo

A este propsito no releva, em primeiro lugar, o chamado sistema externo no sentido da conhecida terminologia de HECK que, no essencial, se reporta aos conceitos de ordem da lei; pois este no visa, ou no visa em primeira linha, descobrir a unidade de sentido interior do Direito, antes se destinando, na sua estrutura, a um agrupamento da matria e sua apresentao to clara e abrangente quanto possvel. (...)

NOTA: Qual a diferena entre sistema interno e sistema externo?

272. O sistema de puros conceitos fundamentais

So tambm imprprios para traduzir a unidade interior e a adequao de uma ordem jurdica, todos os sistemas de puros conceitos fundamentais tal como STAMMLER, KELSEN ou NAWIASKY os desenvolveram. Trata-se, neles, de categorias puramente formais, que subjazem a qualquer ordem jurdica imaginvel, ao passo que a unidade valorativa sempre de tipo material e s pode realizar-se numa ordem jurdica historicamente determinada; (...)

28(...) quando se fala de pensamento sistemtico - porventura em oposio ao pensamento problemtico ou tpica no se tem em vista, habitualmente, um sistema de puros conceitos fundamentais, mas sim o do Direito positivo.

29 / 303. O sistema lgico-formal

a) O sistema lgico da jurisprudncia dos conceitos

(...) Assim pode o filsofo WUNDT dizer que a Cincia do Direito, por fora do seu processo jurdico-conceptual, uma Cincia eminentemente sistemtica e que, atravs do seu carter estritamente lgico, ela em certa medida comparvel Matemtica.

30(...) a unidade interna de sentido do Direito, que opera para o erguerem sistema, no corresponde a uma derivao da ideia de justia de tipo lgico, mas antes de tipo valorativo ou axiolgico. (...)

31(...) Os valores esto, sem dvida, fora do mbito da lgica formal e, por consequncia, a adequao de vrios valores entre si e a sua conexo interna no se deixam exprimir logicamente, mas antes, apenas, axiolgica ou teleologicamente. (...)

35 / 36(...) Quando a investigao de KLUG sobre a estrutura lgica da analogia termina com a afirmao - indiscutvel - de que a resposta questo, to essencial na prtica (poder-se-ia bem dizer: apenas essencial na prtica) da admissibilidade de determinada analogia no se obtm com os meios da lgica, mas antes depende da definio do respectivo crculo de semelhana, o qual s possvel de acordo com critrios teleolgicos, ento resulta muito claro quo pouco a lgica formal (na sua forma clssica ou moderna) pode oferecer Cincia do Direito. (...)

38(...) Por consequncia, hoje no mais se pode pr em dvida que um sistema lgico-formal no sirva, de alguma maneira, nem a essncia do Direito, nem as tarefas especificas do jurista.b) O sistema axiomtico-dedutivo no sentido da logstica

39 / 40(...) Deve, designadamente, questionar-se que seja possvel uma formao plena de axiomas, na Cincia do Direito. Para tal formao, seria necessrio, como reconhecido, reunir pelo menos duas (34) exigncias: a da ausncia de contradies e a da plenitude; ora se a viabilidade da primeira , desde logo, extraordinariamente problemtica, a da segunda de recusar, sem objeces.

NR 34: Alm disso, requerida ainda, muitas vezes, a mutonomia, isto , a indedutibilidade dos axiomas uns dos outros. Esse postulado pode, contudo, no ser considerado no presente desenvolvimento, uma vez que tem a natureza de mera economia de pensamento ou talvez, tambm de tipo esttico; seria, em qualquer caso, de acatar na Cincia do Direito, caso, no restante, singrasse uma axiomatizao.

44 / 45(...) Acresce ainda que a passagem de tais clusulas carecidas de preenchimento com valoraes para as demais disposies inteiramente fluida podendo mesmo dizer-se que todas as determinaes da lei carecem, numa ou noutra direco, de concretizao valorativa. Estas complexidade e variabilidade de sentido opem-se, em ltima anlise, sempre axiomatizao. aqui, CLASULAS GERAISA confeco de um sistema axiomtico-dedutivo no , assim, possvel e contradiz a essncia do Direito. Semelhante tentativa decorre, tal como, sobretudo, as consideraes sobre a necessidade da plenitude dos axiomas deixaram claro, da utopia de que, dentro de determinada ordem jurdica, todas as decises de valor necessrias se deixam formular definitivamente - decorre, portanto, de um pr-julgamento tipicamente positivista, que hoje pode considerar-se como definitivamente rejeitado.

454. O sistema como conexo de problemas

a) O conceito de sistema de MAX SALOMON

(...) O ponto de partida de SALOMON foi o objectivo de fundamentar o carcter cientfico da jurisprudncia. Mas na sua opinio s pode ser considerado como Cincia o empreendimento dirigido a um objeto permanente (...)

46(...) Retira-se, assim, sem mais, o que at hoje se chamava Cincia do Direito, do crculo das Cincias, ficando apenas, como objecto da verdadeira Cincia do Direito, a formao do sistema dos problemas da legislao possvel.

(...) Pois o Direito no um somatrio de problemas, mas antes um somatrio de solues de problemas; por isso a sua unidade de sentido tambm s pode ser encontrada nesses pontos de vista de base e no em questes isoladas. O conceito de sistema de SALOMON tambm no , por isso, capaz de contribuir para o esclarecimento do tema colocado na presente investigao.

47(...) Os problemas, como tais, no so mais do que questes isoladas, que se podem escolher arbitrariamente e que, por isso, para poderem integrar uma relao sistemtica, carecem de um elemento instigador de sentido e de unidade, que s pode existir fora deles prprios. (...)

49 / 50b) A concepo de FRITZ VON HIPPEL

(...) preocupou-se em descobrir a conexo imanente de problemas necessariamente consubstanciada com o reconhecimento da autonomia privada e desenvolveu, com base nesse exemplo, ideias gerais sobre a construo do sistema. (...)

51(...) A conexo inseparvel da resposta com o problema e a nova resposta com o novo problema , para VON HIPPEL, totalmente consciente. Ele tambm no disse que a conexo de problemas forma a sistemtica sendo pois, como lhe atribui VIEHWEG, a ela idntica, mas apenas que ns podemos conhecer a sistemtica, porque ns podemos agora ordenar as diferentes solues.

52(...) Na verdade, ele disse com toda a razo: tambm o legislador, na medida em que responda a estas questes, cria um Cdigo Civil; no entanto, devia-se ainda acrescentar: ele apenas faz um sistema na medida em que responda. Mas VON HIPPEL, no diz, contudo, o que d, a essas respostas, o sentido unitrio, nem segundo que pontos de vista valorativos sobre-ordenados resolve o legislador os problemas (...)

53(...) salienta a conexo imanente de problemas, necessariamente ligada a uma determinada deciso fundamental - isto , desde j: a uma soluo de problemas. indubitveI que aquela conexo existe, merecendo, por isso, as ideias de VON HIPPEL, inteira concordncia; (...)

555. O sistema como relaes da vida

(...) deve prevenir-se contra uma identificao desta ordem com a conexo especfica das normas jurdicas, pois haveria a um sociologismo alheio ao valor do Direito.

6. O sistema de decises de conflitos no sentido de HECK e da jurisprudncia dos interesses

(...) Deriva, como se sabe, de HECK a distino fundamental entre o sistema externo e o interno. Para apurar a unidade e a adequao da ordem jurdica releva, de antemo, apenas o sistema interno; pois entre as suas tarefas deve haver, segundo as palavras de HECK, no domnio de uma conexo material, uma ordem imanente. (...)

56a) A posio da jurisprudncia dos interesses quanto ideia da unidade do Direito

HECK rejeita expressamente a ideia - em si evidente - de que os elementos da ordem imanente sejam visveis nos interesses singulares e caracteriza o sistema como sistema de decises de conflitos. A questo, porm, de saber at onde este realiza a unidade interior e a adequao da ordem jurdica conduz imediatamente questo prvia de como se coloca a jurisprudncia dos interesses perante a ideia da unidade do Direito - e, com isso, a um ponto crtico nas bases filosficas desta doutrina. (...)

59(...) Ele apenas considera como adequada a esse escopo a formao c1assificatria de conceitos de grupos de generalidade sempre crescente. Conceitos gerais abstractos so porm, inteiramente inadequados para captar a unidade de sentido, sempre concreta, do Direito e tornam-se totalmente inutilizveis para esse escopo quando se lhes deixe apenas a funo rudimentar que HECK atribui aos seus conceitos de grupo. (...)

60Assim fica apenas uma ltima indicao: a referncia de HECK ao efeito remoto dos juzos de valor legais, dos quais apenas haveria um passo at pressuposta consequncia interna do Direito. Est fora de qualquer discusso que uma das contribuies metodolgicas essenciais da jurisprudncia dos interesses est na elaborao deste momento. Pe-se agora a questo de onde se encontram esses juzos de valor: s nos valores singulares do legislador ou tambm nas camadas mais profundas do Direito? Presumivelmente responderia HECK no segundo sentido e ento a censura de HEGLER de que a jurisprudncia dos interesses negligencia as realidades mediadoras procederia no essencial. (...)

61 / 62(...) No h dvidas: a fora da jurisprudncia dos interesses localizou-se na discusso do problema singular e no na elaborao das grandes concatenaes - o que alis plenamente compreensvel, no prisma da histria da metodologia, como contra-movimento antittico contra os exageros da poca anterior. Assim, dever-se-ia confirmar inteiramente o duro juzo de COING de que ele corresponde sobretudo apenas ao princpio sociolgico fundamental da teoria dos interesses genticos.

65 / 66b) As fraquezas do conceito de sistema da jurisprudncia dos interesses

(...) Para alm disso, de acentuar que a jurisprudncia dos interesses produziu um trabalho muito valioso, no prprio domnio da problemtica do sistema e que, sobretudo com a ideia de sistema interno e com a referncia ao seu carcter teleolgico, obteve pontos essenciais que cabe receber e desenvolver.

67 / 68II - O DESENVOLVIMENTO DO CONCEITO DE SISTEMA A PARTIR DAS IDEIAS DE ADEQUAO VALORATIVA E DA UNIDADE INTERIOR DA ORDEM JURDICA

1. O sistema como ordem axiolgica ou teleolgica

(...) o prprio conceito de sistema um termo especificamente lgico e s a lgica permite determinar onde existe, afinal, um autntico sistema. Ulrich Klug em Methode und System des Rechts

70 / 71(...) Por outras palavras: quem negue a possibilidade de um sistema teleolgico nega, com isso, igualmente a possibilidade de captar racionalmente a adequao do pensamento teleolgico e, com isso, tambm a possibilidade de exercer racionalmente a jurisprudncia, no seu mbito decisivo; pois o sistema, no sentido aqui entendido (tanto quanto est em discusso neste local) no , por definio, justamente mais do que a captao racional da adequao de conexes de valoraes jurdicas.

71(...) assim como KANT no perguntou se existe uma Cincia da Natureza, mas antes o pressups, tendo procurado, compreend-lo, tambm se deve, primeiro, partir de que existe uma Cincia do Direito e, ento, perguntar qual o seu sentido e o que fundamenta a sua pretenso de cientificidade. (...) BINDER

74 / 75(...) Embora a sua estrutura possa ser ainda pouco esclarecedora, poder-se- dizer em resumo: a hiptese de que a adequao do pensamento jurdico-axiolgico ou teleolgico seja demonstrvel de modo racional e que, com isso, se possa abarcar num sistema correspondente, est suficientemente corroborada para poder ser utilizada como premissa cientfica. Ela a condio da possibilidade de qualquer pensamento jurdico e, em especial, pressuposto de um cumprimento, racionalmente orientado e racionalmente demonstrvel, do princpio da justia de tratar o igual de modo igual e o diferente de forma diferente, de acordo com a medida da sua diferena.

adequao valorativa (igualdade material)

75 / 76(...) Garantir a adequao formal , em consequncia tambm a tarefa do sistema teleolgico, em total consonncia com a sua justificao a partir do princpio formal da igualdade.

adequao formal (igualdade formal)

2. O sistema como ordem de princpios gerais do Direito

Com a caracterizao do sistema como ordem teleolgica ainda no foi, contudo, dada resposta segunda pergunta essencial: a dos elementos constitutivos nos quais se tornem perceptveis a unidade interna e a adequao da ordem jurdica. No entanto, ficou j esclarecido que se deve tratar de valores, ainda que isso no possa constituir a resposta final, pois se mantm a questo mais vasta de que valores se trata: todos ou apenas alguns? Se se quisesse optar pelo primeiro sentido, chegar-se-ia a um conceito de sistema que seria muito semelhante ao sistema de conflitos de decises de HECK e perante o qual procederiam as mesmas objeces; ele no poderia tornar perceptvel, de modo algum, a unidade. Trata-se, pois, de encontrar elementos que, na multiplicidade dos valores singulares, tornem claras as conexes interiores, as quais no podem, por isso, ser idnticas pura soma deles.

Nesta ocasio, deve-se recordar de novo a caracterstica principal da ideia da unidade, acima elaborada: a reconduo da multiplicidade do singular a alguns poucos princpios constitutivos. (...)

77(...) trata-se, assim, de apurar, por detrs da lei e da ratio legis, a ratio iuris determinante. Pois s assim podem os valores singulares libertar-se do seu isolamento aparente e reconduzir-se procurada conexo orgnica e s assim se obtm aquele grau de generalizao sobre o qual a unidade da ordem jurdica (...)

(...) O sistema deixa-se, assim, definir como uma ordem axiolgica ou teleolgica de princpios gerais de Direito, na qual o elemento de adequao valorativa se dirige mais caracterstica de ordem teleolgica e o da unidade interna caracterstica dos princpios gerais.

adequao valorativa volta-se para a ordem teleolgica unidade interna volta-se para os princpios gerais

81a) As vantagens, na formao do sistema, dos princpios gerais de Direito, perante normas, conceitos, institutos jurdicos e valores.

No que toca, em primeiro lugar, a um sistema de normas, surge este como pouco significativo, porquanto se deve procurar justamente, a conexo aglutinadora das normas - e esta no pode, por seu turno, consistir tambm numa norma (...)

81 / 82(...) tambm no se deveriam considerar, para a formao do sistema, os conceitos gerais abstractos, mas apenas os conceitos concretos no sentido de HEGEL, pois apenas os ltimos surgem capazes de recolher em si o pleno sentido constitutivo da unidade interna. (...)

83 / 84(...) ela [formulao de conceitos] imprescindvel para a preparao da subsuno, devendo, assim, ser ordenado um sistema de conceitos jurdicos correspondente aos princpios. (...)

85 (...) o facto de, para vrios institutos, os mesmos princpios serem, em parte, constitutivos por exemplo para o da auto-responsabilidade ou da proteco da esfera de liberdade - mostra que, na procura da unidade do Direito, se regressa, por ltimo, sempre e de novo aos princpios gerais do Direito (...)

87 / 88um sistema de conceitos teleolgicos, de institutos jurdicos ou de valores superiores deveria assemelhar-se muito a um sistema de princpios: deveria deixar-se reformular neste outro, de modo extenso, quando no total.

88b) Os tipos de funes dos princpios gerais do Direito na formao do sistema

Apurada e demonstrada a escolha para elementos constitutivos unitrios dos princpios gerais de Direito, surge, como nova tarefa, o tecer consideraes mais pormenorizadas sobre o modo e a forma pelo qual eles acatam a sua funo sistematizadora. Salientem-se, aqui, quatro caractersticas: [1] os princpios no valem sem excepo e podem entrar entre si em oposio ou em contradio; [2] eles no tm a pretenso da exclusividade; [3] eles ostentam o seu sentido prprio apenas numa combinao de complementao e restrio recprocas; e eles [4] precisam, para a sua realizao, de uma concretizao atravs de sub-princpios e valores singulares, com contedo material prprio. - Quatro caractersticas dos princpios gerais acima pontuadas (pgs. 88 - 99)

102c) As diferenas dos princpios gerais de Direito perante os axiomas

(...) os princpios so inutilizveis como base de um sistema lgico-axiomtico, uma vez que a ausncia de contradies dos axiomas irrenuncivel. (...) a formao de um sistema teleolgico no se ope, de modo algum, possibilidade de contradies de princpios; ela impede, em todo o caso, uma configurao perfeita desse sistema.

Finalmente, a quarta caracterstica distingue tambm os princpios gerais dos axiomas; a partir destes todos os teoremas se devem deixar deduzir, com a utilizao exclusiva das leis da lgica formal e sem a intromisso de novos pontos de vista materiais enquanto que, como foi mostrado, para a concretizao dos princpios gerais de Direito, so sempre necessrias, nos diversos graus, novas valoraes parciais autnomas. alm da terceira caracterstica, qual seja a POSSIBILIDADE DE COMPLEMENTAO E RESTRIO RECPROCAS, tambm pela quarta: NOVAS SUBESPCIES PARA A CONCRETIZAO

103 / 104 3 A ABERTURA DO SISTEMA

No que toca, em primeiro lugar, abertura, encontram-se, na literatura, utilizaes lingusticas diferentes. Numa delas, a oposio entre sistema aberto e fechado identificada com a diferena entre uma ordem jurdica construda casuisticamente e apoiada na jurisprudncia e uma ordem dominada pela ideia da codificao; nesse sentido, o sistema do Direito alemo actual deve-se considerar, pela sua estrutura, sem dvida como fechado. Na outra, entende-se por abertura a incompletude, a capacidade de evoluo e a modificabilidade do sistema; neste sentido, o sistema da nossa ordem jurdica hodierna pode caracterizar-se como aberto.

106I A abertura do sistema cientfico como incompletude do conhecimento cientfico

No que toca ao primeiro, portanto ao sistema de proposies doutrinrias da Cincia do Direito, a abertura do sistema significa a incompletude e a provisoriedade do conhecimento cientfico.

107(...) ningum pode afirmar que o fenmeno da abertura do sistema na jurisprudncia se possa reconduzir, apenas, provisoriedade do conhecimento cientfico. Aceitar que as referidas modificaes do sistema respeitam, exclusivamente, a progressos de penetrao cientfica na matria jurdica seria pura utopia. Mas isso leva, naturalmente, concluso de que subjazem mudanas no sistema objectivo, isto , na prpria unidade da ordem jurdica, e de que ele, por isso, deve ser aberto.

108 / 109II - A abertura do sistema objetivo como modificabilidade dos valores fundamentais da ordem jurdica

Na verdade, teoricamente, sempre que um novo princpio constitutivo para o sistema obtivesse validade, poder-se-ia aceitar o nascimento de outro sistema, que absorvesse o at ento existente; mas com isso, no se teria resolvido o fenmeno aqui em causa. Pois esta modificao do Direito no se verifica com saltos bruscos, antes operando num desenvolvimento paulatino e contnuo; isso vale mesmo quando no se trate de um aperfeioamento jurisprudencial, mas sim de mera interveno do legislador: por exemplo, se este, ao consagrar sempre mais previses de responsabilidade pelo risco, elevar assim um novo princpio jurdico categoria de um elemento constitutivo do sistema, no fica, por isso, modificada a identidade do nosso sistema de Direito privado; este apenas se modificou, - nada de diferente, alis, do que o que ocorre com a identidade de uma individualidade que no negada pelas modificaes no tempo, se esta comparao for permitida.

III O significado da abertura do sistema para as possibilidades do pensamento sistemtico e da formao do sistema na Cincia do Direito

abertura como incompletude do conhecimento cientfico acresce assim a abertura como modificabilidade da prpria ordem jurdica. Ambas as formas de abertura so essencialmente prprias do sistema jurdico e nada seria mais errado do que utilizar a abertura do sistema como objeco contra o significado da formao do sistema na Cincia do Direito ou, at, caracterizar um sistema aberto como uma contradio em si. A abertura do sistema cientfico resulta, alis, dos condicionamentos bsicos do trabalho cientfico que sempre e apenas pode produzir projectos provisrios, enquanto, no mbito questionado, ainda for possvel um progresso, e, portanto, o trabalho cientfico fizer sentido; o sistema jurdico partilha, alis, esta abertura com os sistemas de todas as outras disciplinas. Mas a abertura do sistema objectivo resulta da essncia do objecto da jurisprudncia, designadamente da essncia do Direito positivo como um fenmeno colocado no processo da Histria e, como tal, mutvel.

112 / 113IV Os pressupostos das modificaes do sistema e a relao entre modificaes do sistema objectivo e do sistema cientfico

(...) o sistema cientfico modifica-se quando tenham sido obtidos novos ou mais exactos conhecimentos do Direito vigente ou quando o sistema objectivo ao qual o cientfico tem de corresponder, se tenha alterado; o sistema objectivo modifica-se quando os valores fundamentais constitutivos do Direito vigente se alterem. Em consequncia, o sistema cientfico est em estreita dependncia do objectivo e deve mudar-se sempre com este enquanto o sistema objectivo, pelo seu lado, no Influenciado por modificaes dentro do cientfico.

1141. Modificaes do sistema objetivo

De acordo com a doutrina tradicional das fontes do Direito, deve partir-se do princpio de que, em primeira linha, a modificao cabe ao legislador. () No entanto, no sempre necessrio verificar-se semelhante interveno directa. As modificaes do sistema podem antes resultar de actos legislativos que respeitem, primeiramente, a domnios jurdicos inteiramente diferentes; nota-se, aqui, de modo particular, o postulado da unidade valorativa e, com isso, a fora do pensamento sistemtico.

117 / 118O reconhecimento de um novo instituto no significa, de facto, qualquer modificao do sistema objectivo, mas apenas uma alterao no cientfico, uma vez que os valores relevantes j se continham, de antemo, na lei e apenas no eram reconhecidos no seu alcance total. (...)

No entanto, nem todos os referidos institutos se podem apoiar, desse modo, nos valores da lei; muitos deles no so exigidos atravs da teleologia imanente da lei, mas apenas inspiradas por ela; doutros, nem isso se pode dizer.

121 / 122(...) para alm da lei e do costume, tambm podem conduzir a alteraes do sistema objectivo aqueles princpios gerais do Direito que representam emanaes da ideia de Direito e da natureza das coisas. No entanto, estes critrios no se devem entender de modo no histrico e, em simultneo, esttico; pelo contrrio, os princpios redutveis ideia de Direito s ganham o seu poder concreto em todas as regras atravs da referncia a uma determinada situao histrica e da mediao da conscincia jurdica geral respectiva, outro tanto sucedendo com a natureza das coisas.

NOTA: CONSCINCIA JURDICA GERAL como mediadora das modificaes encontradas no sistema objetivo por fora dos princpios gerais do Direit, alm de a lei e os costumes modificarem em primeira linha.

123 / 124Por fim, o mesmo sucede, no essencial, com as clusulas gerais carecidas de preenchimento com valoraes, como as remisses para os bons costumes ou a boa f, nas quais a prpria lei deixa uma margem para a erupo de valoraes extra-legais e, necessariamente, mutveis: tambm aqui existe um indcio da modificao do sistema objectivo, que decorre de modo inteiramente semelhante ao da concretizao de princpios gerais de Direito (para os quais as clusulas gerais remetem com frequncia).

125 / 1262. Modificaes no sistema cientfico

(...) as modificaes do sistema objectivo reportam-se, no essencial a modificaes legislativas, a novas formaes consuetudinrias, concretizao de normas carecidas de preenchimento com valoraes e erupo de princpios gerais de Direito extra-legais, que tm o seu fundamento de validade na ideia de Direito e na natureza das coisas. As modificaes do sistema cientfico resultam dos progressos do conhecimento dos valores fundamentais do Direito vigente e traduzem, por outro lado, a execuo de modificaes do sistema objectivo. As modificaes do primeiro seguem, fundamentalmente, as alteraes do ltimo; os sistemas objectivo e cientfico esto tambm ligados na dialctica geral entre o Direito objectivo em vigor e a sua aplicao.

127 4 A MOBILIDADE DO SISTEMA

A mobilidade do sistema , muitas vezes, confundida com a sua abertura. (...)

129I AS CARACTERSTICAS DO SISTEMA MVEL NO CONCEITO DE WILBURG

Para a mobilidade do sistema, caracterstico, por um lado, que WILBURG negue a determinao de uma determinada hierarquia entre os elementos, que coloca, pois, ao mesmo nvel e, por outro, que eles no devam surgir sempre todos, mas antes se possam substituir uns aos outros. As caractersticas essenciais do sistema mvel so, pois, a igualdade fundamental de categoria e a substituibilidade mtua dos competentes princpios ou critrios de igualdade- pois de facto disso que se trata quando WILBURG fala de elementos ou de foras mveis.

130a modificabilidade dos valores e dos princpios, caracterstica para este, no precisa, de modo necessrio, de ocorrer num sistema mvel, pois os competentes elementos podem ser inteiramente firmes, e, inversamente, a abertura do sistema no tem fatalmente, como consequncia, a igual categoria dos seus princpios e a renncia a previses firmes; um sistema mvel pode, portanto ser aberto ou ser fechado e um sistema aberto pode ser mvel ou rgido.

131II SISTEMA MVEL E CONCEITO GERAL DE SISTEMA

Tpicas do sistema so, como foi dito no incio, as caractersticas da unidade e da ordem. A primeira verifica-se, sem dvida, em WILBURG. Como deve ser expressamente acentuado perante mltiplos mal entendidos, todo o seu pensamento se dirigiu para a elaborao de alguns poucos princpios constituintes, de cuja concatenao resulta toda a multiplicidade das decises singulares; o sistema mvel deve, pois, tornar perceptvel a unidade na pluralidade.

133 / 134a ideia de uma certa hierarquia no pode, de modo algum, ser estranha concepo de WILBURG, pois em muitos problemas particulares, surgem, para os elementos por ele elaborados, pontos de vista secundrios, aos quais um pensamento to diferenciado e como o dele no pode, justamente, renunciar e os quais possuem, perante aqueles, um peso menor. S dentro dos princpios fundamentais - ordenadores existe, portanto, igualdade de categoria - e mesmo aqui, WILBURG no exclui, evidentemente, de modo pleno, a possibilidade de uma ordenao - ao passo que na relao entre estes e os restantes critrios relevantes para um problema singular, se pode falar inteiramente de certa hierarquia. Por tudo isto, a concepo de WILBURG merece, com razo, a qualificao de sistema, mesmo quando no se deva desconhecer que se trata aqui de um caso limite.

134III SISTEMA MVEL E DIREITO VIGENTE

1. A prevalncia fundamental das partes rgidas do sistema

(...) o sistema do Direito alemo vigente no , fundamentalmente, mvel mas sim imvel. Pois ele atribui, em regra, aos princpios singulares, mbitos de aplicao delimitados, dentro dos quais eles no so substituveis e prefere a formao rgida de previses normativas, que exclua uma determinao varivel das consequncias jurdicas, em funo da discricionariedade do juiz, ainda que vinculada.

137 / 1382. A existncia de partes mveis no sistemaEncontram-se numerosos exemplos da mobilidade do sistema, em especial onde as previses normativas rgidas se complementam e acomodam atravs de clusulas gerais: para determinar se um despedimento anti-social, se existe um fundamento importante, se um negcio jurdico ou um comportamento so contrrios aos bons costumes, etc., necessrio ponderar entre si determinados pontos de vista segundo o nmero e o peso, sem uma relao hierrquica firme. No entanto, a formao rgida de proposies normativas - pode-se diz-lo sem mais - representa a regra; a mobilidade traduz a excepo. O Direito positivo compreende, portanto, partes do sistema imveis e mveis, com predomnio bsico das primeiras.

141IV O SIGNIFICADO LEGISLATIVO E METODOLGICO DO SISTEMA MVEL

1. O sistema mvel e a necessidade de uma diferenciao mais marcada

A diferenciao e a luta contra a falsa absolutizao de princpios singulares no pressupe, necessariamente, a mobilidade, e assim a grande diferenciao do pensamento de WILBURG no afirma, como tal, ainda nada de essencial sobre o valor de um sistema mvel."

141 / 1422. Sistema mvel e clusula geralApenas as especificidades do sistema mvel so decisivas, isto , a ausncia de uma formao rgida de previses normativas assim como a permutabilidade livre e a igualdade fundamental de categoria dos princpios de valorao. () caracterstico para a clusula geral ela estar carecida de preenchimento com valoraes, isto , ela no dar os critrios necessrios para a sua concretizao, podendo-se estes, fundamentalmente, determinar apenas com a considerao do caso concreto respectivo: a aspirao de WILBURG, pelo contrrio, de determinar, em geral, os elementos competentes, segundo o contedo e o nmero e confeccionar a sua relao de interpenetrao de modo varivel, deixando-a independente das circunstncias do caso. Assim WILBURG bate-se tambm expressamente contra as decises segundo a mera equidade porque - num argumento altamente decisivo para o seu pensamento - lhe falta a presena de princpios fundamentais; as clusulas gerais, pelo contrrio, so sempre caracterizadas, e pelo menos em parte, com razo, como pontos de erupo da equidade.

Palavra-chave: RELAO DE INTERPENETRAO dos elementos variveis

1433. A posio intermdia do sistema mvel entre a clusula geral e a previso normativa rgida e a necessidade de uma ligao entre estas trs possibilidades de formulao

Embora o sistema mvel no aparente a mesma estrutura das clusulas gerais carecidas de preenchimento com valoraes, no se deve negar um certo parentesco com estas: o sistema mvel ocupa uma posio intermdia entre previso rgida e clusula geral. Daqui provm as suas vantagens e as suas fraquezas. No que toca s ltimas, evidente que um sistema mvel garante a segurana jurdica em menor medida do que um sistema imvel, fortemente hierarquizado com previses normativas firmes.

NOTA: MENOR SEGURANA JURDICA NOS SISTEMAS MVEIS

143 / 144Deve-se tambm, pensar que seria exigir demasiado do juiz se deparasse, sem excepo, com um sistema mvel ficando por isso, em cada caso, perante as dificuldades da ponderao entre o relativamente frequente nmero elevado de elementos. E finalmente, no se deve ainda ignorar que, para alm do valor da segurana jurdica, tambm o da justia pode entrar em contradio com um sistema mvel; pois a tendncia generalizadora do princpio da justia, que resulta do princpio da igualdade, contraria cada considerao das circunstncias do caso singular e, com isso, tambm uma ponderao de elementos - ainda que fixados genericamente.

A justia, no entanto, no remete apenas para uma tendncia generalizadora mas, tambm, para uma individualizadora: compreende-se que se recorra a esta para justificar o sistema mvel.

145(...) o sistema mvel representa um compromisso particularmente feliz entre os diversos postulados da ideia de Direito - e tambm a segurana jurdica sempre garantida em maior medida do que perante uma mera clusula de equidade - e equilibra a polaridade deles numa soluo ponderada e intermdia; tanto se afasta do rigorismo das normas rgidas como da ausncia de contornos da pura clusula de equidade.

FORMA INTERMEDIRIA DE RESOLUO DOS PROBLEMAS JURDICOS SUA MOBILIDADE: ENTRE A RIGIDEZ DAS NORMAS IMPERATIVAS E A MABEABILIDADE DA CLUSULA DE EQUIDADE PURA

147 / 148No se pode, porm, dizer em geral qual a soluo prefervel; isso depende da estrutura particular da matria em causa e do valor que lhe subjaza. Neste campo cabe, ao sistema mvel, um papel especialmente importante uma vez que ele, como se disse, d, de modo muito feliz, um meio termo entre as previses normativas firmes e as clusulas gerais e confere uma margem quer tendncia generalizadora da justia, quer individualizadora. , porm, apenas uma das vrias possibilidades formulativas a considerar no devendo, por outro lado, sobre-estimar-se a sua capacidade. Com esta limitao pode-se, no entanto, dizer que a ideia de um sistema mvel, tal como foi desenvolvida por WILBURG, constitui um enriquecimento decisivo do instrumentrio quer legislativo quer metodolgico devendo, por isso, incluir-se sem dvida entre as descobertas jurdicas significativas.

149 5 SISTEMA E OBTENO DO DIREITO

O conceito e as qualidades do sistema jurdico esto suficientemente esclarecidas para se poder passar questo que, em ltima anlise, decisiva para o significado do pensamento sistemtico na Cincia do Direito: a da relevncia prtica do sistema. (...)

149 / 150Esta possibilidade negada, com convico, por uma opinio muito difundida. Segundo ela, o sistema no possui qualquer valor na vida e, em especial, qualquer valor de conhecimento, nem qualquer valor para a obteno do Direito; apenas valor de representao ou de ordenao. (...)

151(...) Tudo o que alegado pelos adversrios do pensamento sistemtico respeita, designadamente, a apenas dois tipos bem determinados de sistema: ao sistema externo ou ao sistema axiomtico-dedutivo. (...)

152 / 153(...) O significado do sistema para a obteno do Direito torna-se evidente quando se subscreva a opinio, aqui defendida, do sistema interno de uma ordem jurdica como axiolgico ou teleolgico (...)

153(...) o argumento sistemtico , ento, apenas uma forma especial de fundamentao teleolgica e, como tal, deve, desde logo, ser admissvel e relevante. Pode-se, nessa linha, falar de uma capacidade de derivao teleolgica ou valorativa do sistema (...)

153 / 154Com isto, apenas se evidenciou a possibilidade fundamental de aproveitar o sistema para a obteno do Direito; trata-se, agora, de elaborar o seu significado particular nesse domnio, bem como em especial nas especificidades do pensamento sistemtico perante outras formas de argumentao teleolgica. Tambm aqui se pode, de novo, trabalhar com os dois elementos do conceito de sistema: o da [1] ordenao teleolgica e o da [2] defesa da unidade valorativa e da adequao do Direito.

156I - ORDENAO SISTEMTICA E DETERMINAO DO CONTEDO TELEOLGICO

(...) Deve-se, por exemplo, conhecer primeiro a ratio legis do 833/1 BGB antes de poder ordenar esse preceito na responsabilidade pelo risco. Mas por outro lado, a descoberta dessa ratio seria bem mais difcil se a categoria sistemtica da responsabilidade pelo risco no estivesse j disponvel. Alm disso - o que ainda mais importante - s a ordenao sistemtica permite entender a norma questionada no apenas como fenmeno isolado, mas como parte de um todo. (...)

157(...) no se pode duvidar do valor para o conhecimento da ordenao sistemtica; da resulta, tambm o seu significado para a obteno do Direito; como se trata aqui do esclarecimento do contedo teleolgico, ela no pode, perante a jurisprudncia preponderantemente virada, hoje, para a argumentao teleolgica, surgir sem influncia na interpretao e no aperfeioamento do Direito. As ordenaes sistemticas desempenham, de facto, um papel considervel, em todos os nveis da obteno do Direito.

lembrar do PROCESSO DIALTICO DE ESCLARECIMENTO DUPLO presente quando h ordenao sistemtica e sistema correlato.

1591. A interpretao sistemtica

Tais argumentos s so, porm, efectivamente eficazes quando os valores resultantes da insero sistemtica sejam extrapolados; trata-se, ento, porm, j de uma argumentao retirada do sistema interno. E esta , de facto, do maior significado. Enquanto a interpretao a partir do sistema externo apenas traduz, em certa medida, o prolongamento da interpretao gramatical, a argumentao baseada no sistema interno, exprime o prolongamento da interpretao teleolgica. (...)

1672. A integrao de lacunas a partir do sistema

O que foi concludo para a interpretao em sentido estrito, isto , para a interpretao das normas no quadro do seu sentido literal vale, mutatis mutandis, para a integrao de lacunas. A afirmao da jurisprudncia dos interesses de que a integrao das lacunas no seria possvel atravs duma argumentao a partir do sistema improcedente para um sistema teleolgico (...)

170 / 171(...) No procede, pois, a afirmao de HECK de que a deciso por uma ou por outra destas teorias no contm qualquer juzo de valor e no deveria ser tomada antes da integrao da lacuna, mas s depois. Existe antes aqui, precisamente, aquele efeito mtuo que foi acima descrito: procura-se, primeiro, entender as determinaes da lei com o auxlio de uma das teorias e orden-Ias nos valores fundamentais do nosso Direito privado; de seguida, retiram-se, da teoria, as concluses para os casos no regulados; pondera-se a convincibilidade dos resultados assim obtidos; modifica-se, disso sendo o caso, a teoria, numa ou noutra direco, ou renovam-se as suas consequncias, e assim por diante. Portanto, no se integra primeiro a lacuna e, ento, se confecciona a teoria; a lacuna antes integrada a quando da formao da teoria e a teoria elaborada a quando da integrao da lacuna. (...)

sempre os valores, cristalizados nos princpios, serviro de baliza para as escolhas, seja quando da formao da teoria adequada, seja quando da integrao da lacuna.

172 / 173II - O SIGNIFICADO DO SISTEMA PARA A DEFESA DA UNIDADE VALORATIVA E DA ADEQUAO NA INTERPRETAO DO DIREITO

No que toca ao modo de eficcia do sistema na preservao da unidade e da adequao no processo da obteno do Direito, pode ele ser quer conservador. quer dinamizador, travando, pois, ou acelerando o aperfeioamento do Direito. No primeiro caso, uma determinada soluo censurada como contrria ao sistema; no segundo, ela desenvolve-se, de novo, como determinada pelo sistema; no primeiro caso trata-se essencialmente da preveno de contradies de valores, no segundo da determinao de lacunas.

duas funes do sistema para a defesa de sua unidade valorativa e da adequao no tocante interpretao do direito REVISAR

1751. A preveno de contradies de valores [primeira funo]

O significado prtico do sistema para a preveno de contradies de valores no se mostra apenas na questo de saber se o Direito deve, de todo em todo, ser aperfeioado, mas tambm no problema de como deve ocorrer tal aperfeioamento (depois da sua admissibilidade j ter sido determinada). (...)

1762. A determinao de lacunas [segunda funo]

(...) A ideia da adequao e da unidade do Direito demonstra, designadamente, uma extraordinria fora dinamizadora, desde que no se entenda, de modo resignado, o Direito como um conglomerado causal de decises singulares historicamente acumuladas. (...)

Mas quando [1] se tenha reconhecido uma vez um princpio como geral, e, em especial, [2] se tenha determinado o seu peso tico-jurdico e [3] a sua hierarquia jurdico-positiva, ele pode conduzir, em ligao com a regra da adequao valorativa, a um aperfeioamento inesperado do Direito: no outra coisa o que sucede com a determinao de uma lacuna com recurso a um princpio geral. (...)

178Assim surge junto primeira e de algum modo negativa funo do sistema, de prevenir o aparecimento de contradies de valores, a funo, em certa medida positiva, de desenvolver o Direito de acordo com o peso interior dos seus princpios constitutivos ou gerais; em ambos os casos trata-se da defesa da unidade valorativa, que constata, tambm, numa lacuna no integrada contra a regra da igualdade, uma contradio de valor, em sentido amplo.

178 / 179III O CONTEDO VALORATIVO DAS CONSTRUES LEGAIS

A ordenao sistemtica inclui valores em si. Isso no vale apenas para a formao do sistema atravs da Cincia e da jurisprudncia, mas tambm para as construes do legislador. (...)

186IV - OS LIMITES DA OBTENO DO DIREITO A PARTIR DO SISTEMA

As consideraes produzidas at este momento acentuam o significado do sistema para a obteno do Direito mais do que o habitual; no entanto, no se deve sobrestimar este, desconhecendo em especial os limites que se pem obteno sistemtica do Direito. Cabe, a tal propsito, distinguir vrios aspectos.

1881. A necessidade de um controlo teleolgico

(...) A proposio arvorada a argumento sistemtico, sobre a recusa de proteco da boa f na aquisio por fora de lei s pode, por isso, ser utilizada quando, em princpio, se lhe veja, por detrs, o seu princpio jurdico constituinte e, sendo o caso (atravs de uma espcie de reduo teleolgica), ele seja consequentemente limitado.

1892. A possibilidade de um aperfeioamento do sistema

(...) Antes vale tambm para o sistema o que ENGISCH averiguou para a ideia de unidade da ordem jurdica - a este subjacente: no apenas axioma mas, tambm, postulado, no apenas pr-dado mas, tambm, a elaborar e significa, para as relaes entre formao do sistema e obteno do Direito, que entre estes no existe uma dependncia unilateral mas sim uma relao mtua; tal como o sistema influencia a obteno do Direito, assim se desenvolve, de modo inverso, a formao plena do sistema apenas no processo de obteno do Direito. (...)

1903. Justeza sistemtica e justia material

(...) o sistema, como conjunto de todos os valores fundamentais constitutivos para uma ordem jurdica, comporta justamente a justia material, tal como esta se desenvolve e representa na ordem jurdica positiva; com razo caracterizou, por isso, COING o sistema como a tentativa de comportar o conjunto da justia com referncia a uma determinada forma de vida social num conjunto de princpios racionais, e tendo mesmo LARENZ equiparado-o a uma ideia de Direito historicamente concretizada. (...)

194(...) como se apresentou desenvolvidamente no 3, o sistema aberto, portanto permevel a uma modificao; um tal aperfeioamento pode resultar tambm de exigncias da justia material. (...)

196Resumindo, deve dizer-se: a soluo adequada ao sistema , na dvida, vinculativa, de lege lata e , fundamentalmente de reconhecer como justa, no domnio de uma determinada ordem positiva; pontos de vista de justia material contrrios ao sistema s podem aspirar primazia perante argumentos do sistema quando existam as especiais pressuposies nas quais admissvel uma complementao do Direito legislado com base em critrios extra jurdico-positivos.

196 / 1974. Os limites da formao do sistema como limites da obteno do Direito a partir do sistema

As prevenes at aqui realizadas quanto obteno do Direito a partir do sistema no representam verdadeiras falhas nele mas, to-s, como que limites imanentes; pois tanto a [1] necessidade de controlo teleolgico como a [2] possibilidade de um aperfeioamento do Direito - e na ltima devem-se tambm [3] contar os poucos casos nos quais a justia material pode prosseguir contra a adequao sistemtica - traduz, no fundo, apenas a consequncia evidente de denominadas qualidades do sistema, que existem com total independncia da problemtica da obteno do Direito: da sua natureza teleolgica e da sua abertura. (...)

197(...) A obteno do Direito a partir do sistema v-se, em consequncia, confrontada com limites inultrapassveis, que so os mesmos que se deparam formao do sistema. (...)

200 6 OS LIMITES DA FORMAO DO SISTEMA

(...) Quebras no sistema e lacunas no sistema so, por isso, inevitveis.

em decorrncia da dicotomia: tendncia generalizadora do pensamento sistemtico x tendncia individualizadora da justia (esta ltima grande barreira a ser transpassada por uma viso de sistema (com UNIDADE E ADEQUAO)

201I QUEBRA NO SISTEMA

1. Quebras no sistema como contradies de valores e de princpios

2. Delimitao das contradies de valores e de princpios perante os fenmenos aparentados

Para o esclarecimento deste tema necessrio, em primeiro lugar, circunscrever o conceito das contradies de valores e de princpios. Para tanto, h que delimit-las dos fenmenos aparentados.

a) Perante as diferenciaes de valores

A tal propsito, devem-se excluir, em primeiro lugar, as meras diferenciaes de valores; traduzem-se, com isso, as diferenas valorativas que se justificam materialmente (...)

NR n 4 (...) diferentemente, ENGISCH, Einheit, p. 64, nota 2 e Einfhrung, p. 160 e 162, que no subordina as contradies de princpios s de valores, mas antes as coloca lado a lado (cf., porm, tambm Einheit, p. 64, nota 2, ltima proposio e Einfhrung, p. 164); tal , do seu ponto de vista, adequado, pois ao contrrio da opinio aqui defendida, ele tambm conta como contradies de princpios, casos nos quais no h qualquer verdadeira contradio de valores, mas apenas meras oposies de princpios (...)

202 b) Perante os limites imanentes de um princpio

Alm disso, tambm so de excluir os limites imanentes de um princpio, pois estes no contrariam, verdadeiramente, o princpio, mas apenas tornam claro o seu verdadeiro significado. (...)

c) Perante a combinao de princpios

No poucas vezes se fala, sem razo, de contradies de princpios onde, na realidade, apenas se trata de uma ligao entre dois princpios. (...)

206d) Perante as oposies de princpios

(...) enquanto as oposies de princpios aqui em causa pertencem necessariamente essncia de uma ordem jurdica e s a esta do o seu pleno sentido (...) ENGISCH, em INTRODUO AO PENSAMENTO JURDICO? VERIFICAR!

2073. As possibilidades de evitar contradies de valores ou de princpios, atravs da interpretao criativa do Direito

(...) Isso no deve ser admitido, semelhantes contradies representam uma violao da regra da igualdade qual tanto o legislador como o juiz esto vinculados (...)

recorrer a TODO O ARSENAL METODOLGICO

208a) As possibilidades da interpretao sistemtica

Como meio auxiliar metodolgico surge primeiro a interpretao sistemtica e, dentro desta, sobretudo os princpios sobre a lex specialis, a lex posterior e a lex superior (...)

211b) As possibilidades de complementao sistemtica das lacunas

Com isso alcanou-se j um segundo degrau na eliminao de contradies de valores e de princpios: junto da interpretao conforme com o sistema tambm a complementao de lacunas conforme com ele. Tambm aqui se devem utilizar os processos tradicionais, tais como a analogia, o argumentum a fortiori e a reduo teleolgica que nada mais traduzem do que exteriorizaes metodolgicas do princpio da igualdade. (...)

216c) Os limites da eliminao de contradies de valores e de princpios atravs da interpretao criativa do Direito

Em resumo, fica assim determinado que h contradies de valores que no podem ser ultrapassadas com auxlio dos mtodos legtimos da interpretao e da interpretao criativa do Direito. Tal o caso em que a contradio de valores no se traduza numa lacuna, mas num erro jurdico-poltico ou em que existia, na verdade, uma lacuna, mas a sua integrao seja proibida ou impossvel.

2354. A problemtica da vinculabilidade de normas contrrias ao sistema e a ligao do legislador ao pensamento sistemtico

a) A soluo com auxlio da aceitao de uma lacuna de coliso

b) A soluo com auxlio do princpio constitucional da igualdade

c) O significado das quebras sistemticas que se mantenham para as possibilidades do pensamento sistemtico e da formao do sistema na Cincia do Direito

(...) O significado do sistema para a Cincia do Direito (...) resultou, no decurso dos presentes estudos, um aspecto no qual a formao do sistema de relevncia prtica: atravs da possibilidade de nulidade das normas contrrias ao sistema.

235 / 236II NORMAS ESTRANHAS AO SISTEMA

1. Normas estranhas ao sistema como violao do princpio da unidade da ordem jurdica

A problemtica das normas estranhas ao sistema est estreitamente aparentada das quebras do sistema. Mas enquanto nestas e, em especial, nas normas contrrias ao sistema, violada a regra da adequao valorativa, existe, naquela, uma inobservncia do postulado da unidade interior: trata-se de proposies jurdicas que no esto numa contradio de valor com outras determinaes ou com os princpios fundamentais da ordem jurdica, mas que, por outro lado, tambm no se deixam reconduzir aos princpios jurdicos gerais, permanecendo, por isso, valorativamente isoladas dentro da ordem jurdica global (...)

238(...) em qualquer caso ter-se- de restringir tais corpos estranhos ao mais curto espao possvel dentro da ordem jurdica, de tal modo que se possa apresentar como mxima interpretativa fundamental uma regra de interpretao restritiva ou, pelo menos, uma proibio de interpretao extensiva. (...)

239III LACUNAS NO SISTEMA

1. Lacunas no sistema como lacunas de valores

Os perigos das lacunas no sistema ameaam a sua formao em termos bem mais pesados do que as quebras no sistema, relativamente remediveis, e do que as tambm pouco frequentes normas estranhas ao sistema. (...)

(...) No se duvide de que semelhantes lacunas de valores possam ocorrer, pois no s no h nenhuma compleitude lgica do Direito, como, tambm, no existe nenhuma compleitude teleolgica. (...)

240(...) Na verdade, as lacunas da lei primeiro referidas so uma falha pesada; tambm muitas normas em branco nada mais representam do que uma desagradvel soluo de embarao; mas por outro lado as clusulas gerais carecidas de concretizao tm frequentemente uma funo totalmente legtima e opem-se a uma generalizao demasiado rgida, facultando a penetrao da equidade no sentido da justia do caso concreto. (...)

(...) torna-se portanto notvel que formao do sistema, como j foi salientado, no s se oponha a origem histrica do Direito e a limitao das possibilidades humanas lingusticas e de conhecimento mas tambm - como limites de certo modo imanentes a tendncia individualizadora da justia.

2412. Lacunas no sistema como erupes de modos de pensar no-sistemticos

decorrente da tendncia individualizadora da justia a TPICA admitindo-se ento valores novos

243 / 2447 PENSAMENTO SISTEMTICO E TPICA

(...) VIEHWEG apresentou a tese de que a estrutura da Cincia do Direito no poderia ser captada com o auxlio do pensamento sistemtico, mas apenas com base na doutrina da tpica. (...)

245 / 246I PARA A CARACTERIZAO DA TPICA

1. Tpica e pensamento problemtico

Na opinio de VIEHWEG o ponto mais importante na considerao da tpica a determinao daquela tcnica do pensamento que se orienta pelo problema e, em conformidade, define sinteticamente a tpica como a tcnica do pensamento problemtico. (...)

248(...) O pensamento aportico no conduz assim, de modo algum, necessariamente tpica mas sim, apenas, abertura do sistema.

APORIA: [Do gr. aporia, caminho inexpugnvel, sem sada, dificuldade.] 1. Dificuldade, impasse, paradoxo, momento de auto-contradio ou blindspot que impede que o sentido de um texto ou de uma proposio seja determinado. Na filosofia grega antiga, o termo comeou por servir para designar contradies entre dois juzos (o que se chamaria depois, com mais propriedade, antinomia). Na filosofia de Zeno de Eleia, por exemplo, podemos falar de aporias nos juzos sobre a impossibilidade do movimento. Mais tarde, designaram-se alguns dilogos platnicos como aporticos, isto , inconclusivos. Ao estudo das aporias chama-se aportica. Aristteles definir a aporia como uma igualdade de concluses contraditrias

250A orientao pelo problema no pois, de modo patente, o decisivo; para alm disso, ela no poderia traduzir em termos teortico-cientficos nenhum critrio de deciso utilizvel. (...)

252(...) O processo para a obteno de semelhantes premissas a tpica, que se caracteriza no por quaisquer particularidades do processo de deciso por ela utilizado, mas to s pelas especialidades das premissas em que ela se baseia ou mais precisamente: atravs do modo particular pelo qual se fundamentam essas premissas. (...)

254(...) evidente que no est aqui em causa a busca da verdade mas antes do sucesso retrica puramente exterior, portanto do triunfo no poucas vezes bastante fcil sobre o parceiro na discusso ou, ainda, apenas do aplauso da multido. A tpica poderia assim agradecer tambm sua ligao com a retrica o seu desdm alargado como resulta, por exemplo da afirmao de KANT de que a tpica poderia servir mestres e oradores a procurar, sob certos ttulos do pensamento, o que melhor convenha para a sua matria em causa e para matutar ou cavaquear com verbalidade sobre ela, com uma aparncia de fundamentao.

256II - SIGNIFICADO DA TPICA PARA A CINCIA DO DIREITO

1. A crtica bsica da tpica

a) A impraticabilidade da vertente retrica da tpica

(...) as premissas so fundamentalmente determinadas para os juristas atravs do Direito objectivo, em especial atravs da lei e no so susceptveis de uma legitimao por via do parceiro na conversa (qual?!), nem disso carecem.

259 / 260b) A insuficincia da tpica perante o problema da validade e da adstringibilidade jurdicas

(...) Um tpico portanto, apenas e sempre uma proposta de deciso e, assim, ele precisa de um critrio complementar para proporcionar a sua adstringibilidade e para possibilitar a escolha entre os diversos pontos de vista, consoante as circunstncias, para a soluo de um determinado problema. (...)

260(...) torna-se, com isso, claro que a tpica desconhece, no fundamental, a essncia da Cincia do Direito. Pois no se determina qual seja o Direito vigente ou qual o ponto de vista vinculativo, em regra, atravs do common sense ou da opinio de todos ou da maioria ou dos mais sbios, mas antes atravs do Direito objectivo.(...) IMPORTANTE

262 / 263c) A tpica como doutrina da actuao justa e a jurisprudncia como Cincia do entendimento justo

(...) HORN, por exemplo, fez notar com razo que os exemplos da tpica aristotlica so, na maior parte, retirados da tica e que ARISTTELES, por conseguinte, pensa, a, claramente nos domnios cientficos que ocupam da actuao humana, portanto na filosofia prtica em sentido amplo: tica economia e 'poltica', isto , Direito e Cincia Poltica (...) HORN caracteriza, por isso, a tpica como mtodo das Cincias da aco e, da mesma forma, j antes HENNlS lhe reconhecera a categoria de uma lgica das Cincias prticas. (...)

265 / 266Por consequncia, a Cincia do Direito tambm no , no fundamental, uma Cincia da aco no sentido em que HORN utiliza o conceito, mas sim uma cincia hermenutica: ela , largamente, uma Cincia do entendimento correcto e no da actuao certa. (...)

270 / 2712. As possibilidades remanescentes da tpica

a) A tpica como meio auxiliar perante a falta de valores legais bastantes, em especial nos casos de lacunas

(...) em primeiro lugar, referir certos casos de lacunas da lei, para cuja interpretao o Direito positivo no compreenda valoraes. O exemplo clssico que ocorre, a tal propsito, a falta de uma regulao sobre o estatuto das obrigaes no Direito internacional privado alemo. (...) falou em vontade hipottica das partes

271b) A tpica como processo adequado perante remisses legislativas para o common sense e perante decises de equidade

O segundo grupo aqui em causa o das clusulas gerais carecidas de preenchimento com valoraes. Tambm nestas se deixam surpreender as caractersticas do pensamento tpico. (...)

272(...) Perante o pensamento sistemtico, a tpica tem, assim, aqui, uma funo complementadora inteiramente legtima a cumprir; pode-se mesmo dizer que, nesta questo, se exprime de novo a polaridade dos valores jurdicos mais elevados: a tpica ordena-se na equidade, portanto na tendncia individualizadora da justia; ela representa o processo adequado para um problema singular formulado o mais estritamente possvel ou uma argumentao de equidade, orientada para o caso concreto, na qual, no essencial, nenhum ponto de vista discutvel se pode rejeitar liminarmente como inadmissvel, tal como tpico do pensamento sistemtico abstracto, apoiado na tendncia generalizadora da justia.

2732. A Interpenetrao e a mltipla complementao dos pensamentos sistemtico e tpico

inelegvel no livro virtual, todavia d para aferir a duplicidade entre os dois pensamentos, como j fora abordado acima, seja no tocante complementao valorativa, seja no uso da equidade como tcnica do discurso tpico, seja no surgimento de NOVOS PRINCPIOS E SUA LEGITIMAO PELOS JURISTAS (e povo, tambm, residualmente?)

279 8 TESES

1 A FUNO DA IDEIA DE SISTEMA NA CINCIA DO DIREITO

As caractersticas do conceito geral do sistema so ordem e a unidade. Eles encontram a sua correspondncia jurdica nas ideias da adequao valorativa e da unidade interior do Direito (...)

280A funo do sistema na Cincia do Direito reside, por consequncia, em traduzir e desenvolver a adequao valorativa e a unidade interior da ordem jurdica. A partir da, o pensamento sistemtico ganha tambm a sua justificao que, com isso, se deixa derivar mediatamente dos valores jurdicos mais elevados.

2 O CONCEITO DE SISTEMA

O conceito de sistema jurdico deve-se desenvolver a partir da funo do pensamento sistemtico. Por isso, todos os conceitos de sistema que no sejam capazes de exprimir a adequao valorativa e a unidade interior da ordem jurdica so inutilizveis ou, pelo menos, de utilizao limitada; isso aplica-se, em especial, ao sistema externo, ao sistema de conceitos puros fundamentais, ao sistema lgico da jurisprudncia dos conceitos, ao sistema axiomtico-dedutivo no sentido da logstica, ao sistema de conexes de problemas de SALOMON e ao sistema de decises de conflitos no sentido de HECK e da jurisprudncia dos interesses.

Uma vez determinado o conceito de sistema com referncia s ideias de adequao valorativa e unidade interior do Direito, deve-se definir o sistema jurdico como ordem axiolgica ou teleolgica de princpios jurdicos gerais. Tambm imaginvel uma correspondente ordem de valores, de conceitos teleolgicos ou de institutos jurdicos.

281 3 A ABERTURA DO SISTEMA

Este sistema no fechado, mas antes aberto. Isso vale tanto para o sistema de proposies doutrinrias ou sistema cientfico, como para o prprio sistema da ordem jurdica, o sistema objectivo. A propsito do primeiro, a abertura significa a incompletude do conhecimento cientfico, e a propsito do segundo, a mutabilidade dos valores jurdicos fundamentais.

(...) A abertura do sistema objectivo , pelo contrrio, possivelmente, uma especialidade da Cincia do Direito, pois ela resulta logo do seu objecto, designadamente, da essncia do Direito como um fenmeno situado no processo da Histria e, por isso, mutvel.

281 / 282 4 A MOBILIDADE DO SISTEMA

(...) A mobilidade, no sentido que este termo recebeu de WILBURG, significa a igualdade fundamental de categoria e a mtua substituibilidade dos critrios adequados de justia, com a renncia simultnea formao de previses normativas fechadas.

282O Direito positivo dominado, fundamentalmente, no por um sistema mvel mas antes por um imvel. No entanto, ele compreende partes mveis.

O sistema mvel est, legislativamente, entre a formao de previses normativas rgidas, por um lado, e a clusula geral, por outro. Ele permite confrontar de modo particularmente feliz, a polaridade entre os mais altos valores do Direito, em especial a tendncia generalizadora da justia e a individualizadora e constitui, assim, um enriquecimento valioso do instrumentrio legislativo.

283 5 SISTEMA E OBTENO DO DIREITO

(...) O sistema possui, com isso, aptido para a derivao teleolgica.

NOTA: a DERIVAO TELEOLGICA difere de uma simples deduo dentro de um sistema, podendo ser axiolgica esta derivao tambm, como salientado na pgina 153, pelas vias do ARGUMENTO SISTEMTICO, podendo ser o maior substrato da INTERPRETAO CRIATIVA.

(...) O sistema cumpre sobretudo, em particular, duas tarefas na obteno do Direito: ele contribui para a plena composio do contedo teleolgico de uma norma ou de um instituto jurdico o que conduz a interpret-Ios como parte do conjunto da ordem jurdica e sobre o pano de fundo das conexes relevantes e ele serve para a garantia e a realizao da adequao valorativa e de unidade interior do Direito, porquanto mostra as inconsequncias valorativas, proporcionando, com isso, o aperfeioamento do Direito, tanto pela delimitao de ameaadoras contradies de valores como pela determinao de lacunas.

NOTA: TAREFAS DO SISTEMA (COMO UMA ORDEM TELEOLGICA) NA OBTENO DO DIREITO [1] ordenao teleolgica e [2] defesa da unidade valorativa e da adequao do Direito.

284O princpio da aptido para a derivao teleolgica do sistema vale tambm para as construes do legislador. (...)

(...) Ele est, sobretudo, sempre sob a dupla reserva de um controlo teleolgico, do argumento sistemtico e da possibilidade de um aperfeioamento do sistema, em consonncia com o princpio da sua abertura.

NOTA: ENGISCH fala em relao mtua entre SISTEMA e OBTENO DO DIREITO, cita Canaris.