Escrever Com Arte.2ªEdição.AA2014

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Concurso literário, promovido pela biblioteca |cre e grupo disciplinar de Português, da Escola Artística António Arroio, em 2013/2014.

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Título: Concurso Literário Escrever com Arte, 2.ª edição, 2013/2014 Autores: AAVV © Escola Secundária Artística António Arroio e autores Ilustradores: alunos premiados, entre outros. Prefácio: Dionísio Fernandes e Julieta Silva Capa: Ana do Canto e Nuno Santos, a partir do cartaz do concurso da autoria de Filomena Garlito. Contracapa: Filomena Garlito Organização: Julieta Silva - Biblioteca | centro de recursos educativos Data: maio 2014

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escrever com arte Prémio António Arroio

2.ª edição 2013 2014

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PREFÁCIO

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ESCREVER COM ARTE

Acho que o processo criador de um pintor e do

escritor são da mesma fonte. Quando eu escrevo,

misturo uma tinta a outra e nasce uma nova cor.

Clarice Lispector, escritora brasileira (1920-1977)

Pelos caminhos da grande oficina, de mãos

dadas com a imagem, viajou a pequena palavra.

Dionísio Fernandes (professor AA)

A Escola Artística António Arroio tem o prazer de apresentar em

livro os textos premiados nesta 2ª edição do Escrever Com Arte.

Segundo Clarice Lispector, o génio criativo pode transitar de

linguagem para linguagem, tomando a forma que o artista quiser. A

Escola António Arroio lançou mais este desafio aos alunos de artes

visuais, esperando dar-lhes a oportunidade de revelarem a parte

criativa da esfera literária, tantas vezes esquecida. As ilustrações

são da autoria dos alunos premiados ou de colegas que quiseram

juntar-se a este evento.

Agradecemos a todos os alunos que participaram no concurso da 2ª

edição, aos professores colaboradores nesta iniciativa e à direcção

da escola que nos tem apoiado.

Biblioteca | Centro de Recursos e Grupo de Português

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POESIA

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Inês Isabel Salgado de Brito 11ºK

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Lombrigas

Pés gelados.

Pálpebras renitentes. Pensa-se que se sabe da vida. Quando é ela que sabe de nós. É ela que nos arranca da cama

Nos encarcera a cara contra o alarme E diz,

Telepaticamente: Levanta-te!

Corre. Luta.

Contra a tua vontade.

Sou um cruzado com coração de muçulmano. Sou uma tempestade que rosna por calor

Aqui dentro,

Remexem-se lombrigas dos açúcares do querer viver, Parasitas da minha energia.

Sugam-me tudo. Fazem rusgas durante as minhas pausas

Rogam por mais pensamentos, E brigam famintas com os meus neurónios,

Pois já não chega pra todas. Os tribunais abrem a porta,

Os jogos mentais acionam-se em correntes enferrujadas E,

O corpo baixa a cabeça E vai, ao movimento da maré

Feito garrafão vazio. Feito sem-alma.

-Tem calma.

O corpo desmaia nas falhas do passadiço Chorou tanto que nem deu por isso!

Exausto, ginga aos esses e tem saudades Do tempo em que ao menos

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A música o acolhia Do tempo em que ao menos a princesa o beijava Do tempo em que ao menos a mãe o abraçava.

O corpo sem alma tem saudades. Os parasitas saem,

Circundam-me, Sorriem-me,

E no fim ainda dizem que me amam. Que me querem pra sempre.

Que me odeiam Que me podem esmurrar

Ameaçar. De morte.

Ou então matar com o silêncio, Até podem tirar à sorte!

Fazer-me comer ao jantar uma nova gaiola de lombrigas, se quiser.

Vejo-me numa estrada De mão dada

Com o mundo cruel Onde os carros passam ao meu lado

E não me respondem Onde a mochila azul é a minha almofada

E as lágrimas a minha expressão artística calada.

Queria que o mundo me acolhesse. Queria pois que cada lombriga morresse.

Queria que fosse tão simples como parece ser, Não viver dentro de mim.

Adormecer num banco de jardim. E dar nome às flores.

E não ter olhos pra sociedade, Mas ter olhos pras flores.

A simplicidade delas. Brancas e amarelas.

Apenas. Não há mais cores nem mais dilemas.

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Sou um corpo sem alma Tão aparentemente com a alma toda.

Inteira. Sou uma imitação esbanjada na bancada da feira.

E Mais perto estamos da noite Mais perto estamos da dor

Assim que expresso sentimentos Alguém me encolhe o seu amor...

Escondem-se os poemas

Esconde-se tudo Abraço o que me resta

O meu coração é mudo...

1.º PRÉMIO Inês Isabel Salgado de Brito

11º K

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Marta Morais 12ºI

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Sabes

Do nosso amor farão documentários,

dirão que uma cascata de cometas riscará o céu nocturno.

As nossas tardes alheias onde a arquitectura eram os teus olhos,

lembro-me de te beijar no intermitente Sol das tuas palavras.

Pelas áleas caminhamos o Universo e como se tudo fosse relativo

não nos olhamos.

Mas sorrimos entre planetas habitados.

Tenho sede, anda ao mar Adriático, tenho sede de esperanças e

fome de sonhos.

Não devia ter largado a tua mão na esquadra da polícia, onde os

hematomas se tornam os nossos votos.

Naquele protesto de almas e bandeiras por horizontes mais

longínquos.

Vem, vamos para longe de isto. A lua não é assim tão longe e já lá

fomos tantas vezes quando nos deitamos virados para cima.

Pega nas constelações e manda-me cartas

Pega nas árvores e faz origamis de pulmões em falência.

O petróleo voou para o céu, os rios voaram para Neptuno.

A terra esboçou o maior do silêncio, nem o chilrear da manhã

se ouvia

Nem o batimento do mar se sentia

Nem os carros debatiam por ruas de valor económico divergente.

Anda ao bar beber as ampulhetas que cintilam a nossa vida.

Devíamos navegar pelos raios cósmicos e ver se há algo para além

de mim e

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Sabes seremos como teias de aranhas em contra luz.

Só uma coisa não irei esquecer;

De todas as curvas da tua roupa, da tua pele macia e perfumada de

paz que trazias na brisa,

Dos sorrisos sedosos e calorentos que tornavam os meus versos em

cantos de cigarra,

Da tua postura angélica que irradiava nudez despida.

Do teu rosto que acalmou o Caos e trouxe Amor até aqui.

De ti, sabes, não me irei esquecer porque ainda não te conheço.

2.º Prémio Tiago de Matos Águas Baptista dos Santos

12º I

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Evandera Moura Quintas

11ºO

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Desafio

No final, todos fogem para voltar.

Tudo regressa, nada parte.

A harmonia é então descoberta,

nessa encosta aberta entre o espirito e a mente;

Equilibrando-me a mim,

A ti,

A nós.

Voz.

E o seu brilho ecoa pela terra

Ressuscitando-se.

3.º Prémio

Evandera Moura Quintas

11º O

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Madalena Wallenstein

10º G

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Adjetivo

Monótono era o caminho

e por ele entraste tu.

Sem razão,

sem propósito,

pelo caminho entraste tu.

Falso era o caminho

e tu entraste:

sem medo,

sem receio,

simplesmente caminhaste.

Humilde eras tu

e pelo caminho tu entraste.

Sem sentido,

sem saída.

Simplesmente ali ficaste.

MENÇÃO HONROSA

Madalena Wallenstein

10º G

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NARRATIVA

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Desci as escadas e sentei-me. Sob o véu sanguíneo das pálpebras,

escutei o martelar da música moribunda de todos os dias. No

momento em que olhei em frente, vi-o pela primeira vez, mas não

me surpreendi. Foi como se tivesse despertado de uma dormência

que tinha sido toda a vida antes daquele instante. Ele parecia

inofensivo, quase ridículo de tão inofensivo. Enorme, maciço, dormia

profunda e impavidamente deitado sobre os carris, os lábios

entreabertos deixando escapar um suspiro que lhe rolava no fundo

da garganta. Do outro lado do cais, duas pessoas esperavam o

comboio, um homem sentado e uma mulher de pé, e ambos

pareciam cegos e trôpegos. A senhora curvava a cabeça até esta

ultrapassar a marca amarela pintada no chão, o olhar ansioso

projetado na indefinida escuridão do túnel. O senhor, com uma

perna cruzada sobre a outra, lia atentamente o jornal do dia, o olhar

inchado de sono projectado na indefinida confusão das letras.

Pensei chamá-los, talvez gritar “Ele está ali!”. Mas para quê?

Levantei-me, à cautela, dei uns quantos passos em direção ao limite

do precipício, estiquei o pescoço e pude observar o homem mais de

perto, aquele sobe e desce redondo e volumoso da respiração. A

senhora do outro lado da linha examinou-me, desconfiada, e, por

entre o espaço vazio (preenchido pela enorme presença) que nos

separava, senti uma tensão tal como se um julgamento invisível que

decorresse entre nós me tivesse declarado insana.

Quando olhei novamente para baixo ele já não estava.

Era cedíssimo, e eu procurava fixar duas pernas bamboleantes num

chão em movimento. Navegava por um mar revolto de luz azul-

brilhante e odor a peixe decomposto. À deriva, vi uma gravata ruça,

uma testa lustrosa, uma mãozinha rechonchuda apertando uma

pasta. Uma barba, espetada em todas as direcções, que escorria por

um pescoço estrangulado numa camisa de iniciais bordadas.

Engoli a náusea, sempre consciente de uns olhos miúdos cheios de

riso, presos em mim, daquele nariz aquilino e rubicundo apontando

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Clara de Carvalho Pinheiro Leitão

12ºF

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para o mesmo chão que me fazia vacilar. Vi a gigante boca

comprimida num trejeito de escárnio, e por entre o ruído nervoso de

motores e andamentos, consegui distinguir um ruído que…

zombava. Senti-me afrontada. Troçava de mim ou da pestilência?

Saí.

Outro dia. Uma mulher absurdamente morena, vestida numas

apertadas calças de padrão leopardo e num casaco de cabedal justo,

falava sozinha, frenética, possuída por incompreensíveis vocábulos

que jorravam de uns lábios inchados a ponto de rebentar. Nas mãos

irremediavelmente marcadas pela idade examinava três diferentes

tons de batom, esfregando ora um ora outro com um lenço

amarrotado. Balbuciava “Este aqui… não dá… que chatice!”, e “Não

sai… não sai!”, como louca.

Olhei em redor e a carruagem fluorescente pareceu de repente

carregada de um negrume de fossa. Cresceu o chiar ininterrupto, o

guincho das engrenagens, travando, arrancando, fincadas no meu

cérebro como um colossal martelo pneumático.

Mesmo antes de o ver, senti-o sentado ao lado da mulher. Juntos

constituíam uma visão impressionante. Ele sério, monumental

(estava maior?), sereno, ela já choramingando, gemendo, gemendo.

Dois pequeníssimos e aguçados olhos penetravam-me como que

devorando os meus globos oculares, e faziam-me doer as pupilas.

Então vi-o pegar na mulher (agora em pranto), pela mão.

O comboio parou bruscamente. Esta estação era outra, outra que eu

não conhecia. Era o cais? Ou ainda o túnel? Vi-os partir de mãos

dadas e de costas, um corpo nu, de gigante e um outro de leopardo

de andar gasto.

Uma dor aguda perfurou-me os membros e a espinha. Quando olhei

para baixo as minhas mãos e pés tinham triplicado de tamanho.

1.º PRÉMIO

Clara de Carvalho Pinheiro Leitão 12º F

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Onde vivo?

Resolvi pôr-me a pensar neste tema. Onde vivo? Não falo de uma localização no mapa político, mas num tempo verbal. Qual é o meu tempo verbal? Acho que o sonho de qualquer um é viver no presente, porque viver no presente é viver muito à frente. Se todos tivessem vivido no presente, se todos os que causaram a destruição nesta esfera de texturas tivessem vivido no seu presente, talvez nunca tivesse havido destruição. Se todos nós fossemos capazes de viver no presente, como os fantásticos artistas de há mil anos, que ainda hoje fazem sentido… Quem me dera ser do presente. Quem me dera que a minha cabeça pertencesse ao presente, e não apenas o meu corpo. Todos os nossos corpos vagueiam por aí, a marcar presença , mas todos pensamos em algo que já aconteceu, ou fazemos análises para o que acontecerá, tendo sempre como base algo já acontecido. Não sou do pretérito perfeito, não tenho sequer cultura geral suficiente para responder corretamente a todas as questões sobre determinada época, não vivi lá. E, se soubesse responder a todas as questões, seria apenas um narrador omnisciente, logo também não teria vivido lá. Da mesma forma, não poderei nunca caber no pretérito imperfeito. Se não consigo viver nestes tempos passados, nem no presente, então não caibo no futuro. Sou demasiado limitada, sou um ponto de interrogação. Sou alguém que deixa as minhas convicções, a fruição e o prazer criarem distâncias de um milhão de quilómetros entre mim e o futuro. Aliás, mesmo que o futuro seja o meu vizinho, então há certamente algo em mim que o fará mudar de casa e destruir todas as provas da sua existência na minha rua. Aposto que está neste momento a fazer as malas…

Pensei no pretérito mais-que-perfeito. Mas eu não vivo no pretérito mais-que-perfeito, vivo, quanto muito, num pretérito mais-que-perfeito. É, a meu ver, indefinido (obviamente que sendo a meu ver, até pode nem o ser). É assim. Se este tempo verbal fosse uma pessoa não ia saber nada sobre o seu Nous, não ia saber nada do seu interior, apesar de estar em constante introspeção. Daí ser

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Maria Madalena Jorge Pequito 12º F

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apenas “um”, nunca “o”. É assim que estou… sou as reticências que

sugerem um futuro, viveram uma infância, mas não fazem ideia do

que vai acontecer. Sou apenas uma sucessão de pontos. Tudo

nublado, invisível, defumado. Estes três pontos ainda não decidiram

qual o seu tempo verbal, mas, eventualmente saberão. Talvez o

futuro se mude de novo para a casa do lado. Por agora sou três

pontos, mas cada ponto é tão minucioso quanto o outro. Sou três

pontos, e isso é certo, ao menos isso.

2.º PRÉMIO Maria Madalena Jorge Pequito

12º F

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Analogia Primeira Sinto os degraus ressaltarem pesadamente enquanto desço a escada

metálica que apenas é usada em caso extremo, mas estando eu no

limiar da extremidade, não é emergência?

Tento encaixar-me nos recortes da torre de saída porém estes

balançam, oscilando sob o seu eixo, levando-me a crer na existência

de um escorrega amplo, que me torne livre e induza adrenalina no

meu corpo inerente à inércia, tornando-me crente. Outra vez.

Caio, mas não morro; recomponho-me. O primeiro degrau do fim da

escada permite-me uma ligeira acrobacia, deixando-me saltar

desengonçadamente e aquelas pernas outrora frágeis mostram-se

gordas, complexadas, agitadas no ar sob a sua pele de ganga que

termina nuns velhos ténis de lona preta gasta e usada, mas tão

moldados e ajustados que essa pequena extensão de mim aterra

perante o meu devaneio, tão abruptamente, ressoando dor pelo meu

corpo acima.

Calco os bolsos das calças azuis claras à procura da caixa de

cigarros, o meu pequeno luxo; um, dois, três passos e estou em

frente à porta do prédio. Sob a superfície lúcida, debruço-me e olho

de um lado para o outro, captando a movimentação da rua, quase

nula nesta altura do dia. Agarro o ferro da grande porta e arrasto-a

até mim, passando o seu limite.

Sento-me no pequeno conjunto de escadas e permito-me a um

cigarro.

Apenas um.

De óculos postos, contradizendo-me com o final de tarde de

princípio de outono, deixo-me negro e azul.

E triste, envolto nas mágoas prometidas do meu sucesso, pois não

sou jamais aquela criança ambiciosa, que tanto lhe ambicionaram;

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Evandera Moura Quintas 11ºO

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que tanto planeou para si mesma, conduzindo-se pela ilusão de que

o futuro se corrompe com promessas.

Verdade seja dita que não sou nem um terço daquilo que pensara

ser e agora aqui, envergonho a minha criança interior ao desiludi-la,

qual inteligência qual quê!, enforcando-me por caminhos

comparativos, enganado na busca da distinção.

E invejo todos aqueles que o conseguem ser, competitivos, fortes e

audazes; que continuem assim, mal não tem. Apenas vos torna

fortes, grandes monstros da sociedade, bisontes, pois a minha

capacidade de transmutação agora é nula.

Ainda que levemente saboreando o cigarro, este cansa-se rápido e

logo me escapará da mão.

Apaixono-me uma vez mais pela vida em meu redor, sobre a

moldura dos meus óculos negros e retiro fragmentos para

encarcerar em mim, congelando momentos roubados aos seus

donos inocentes.

Porque a vida como a conheci chegou a um fim.

Porque não sou assim tão boa pessoa.

O cigarro chega ao fim.

Suicídio.

3.º PRÉMIO Evandera Moura Quintas

11º O

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Mihaela Popa 12ºD

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Será? Espreito pela janela, sinto a aragem fresca que vem do exterior,

inspiro...expiro. Não consigo evitar esboçar um sorriso. Vejo

movimento no fim da rua, o que será? Provavelmente alguém a

chegar do emprego, após um longo dia. Dou uns passos em direção

à minha cama, sento-me nela, coloco os chinelos naqueles quatro

quadrados do chão, deito-me e adormeço; abro o meu livro e fecho-o

de seguida, apressadamente, ouvi um ruído invulgar lá fora, o que

será desta vez? Vou à janela, espreito, vejo apenas vultos, manchas

negras a deambularem pela rua, mas consigo sentir agitação, algum

nervosismo proveniente de algo que não consigo ver, estou a

experienciar algo novo, sinto um alvoroço dentro de mim, a

curiosidade transborda por tudo o que é sítio, mas não consigo ver!

“Põe os óculos”, diz uma vozinha interior, obedeço. O que estou a

ver deixa-me atordoada, é algo incomum… algo que nunca vi!

Criaturas, brancas como a neve, provenientes dum sítio mais longe

que as nuvens, cantarolando numa voz quase inaudível a

esvoaçarem pelo ar, como se estivessem a ensaiar uma dança

especial. Continuo numa espécie de transe a ver toda esta cena, só

posso estar a sonhar, mas consigo sentir tudo, o quão dura é a

mesa, o quão fria é a pedra da janela, quão fresca está a noite.

Começo a refrescar, e como reflexo dou um espirro, Atchim! E como

num filme, todas elas param; sinto que cometi um erro, será? Deixei

de ouvir o seu cântico, pararam de dançar, começam a desaparecer;

estico a mão, chamo por elas, peço-lhes que não vão, e como

resposta dão-me o silêncio e começam a percorrer-me a pele

descoberta; num abrir e fechar de olhos estou tão branca como a

neve, sinto-me leve, como se fosse apenas um conjunto de

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partículas no meio de mais umas e outras, sinto-me a desintegrar, e

quando dou por mim estou a flutuar para lá das nuvens, consigo

apenas vê-las com estes olhos que já o deixaram de ser, e sinto-as

sem as poder sentir já que não sou um todo, e cheiro-as tentando

recordar o verdadeiro sentido da palavra, e ouço-as numa melodia

melancólica que me deixa nostálgica por algo que nunca foi meu.

Estou a ser levada para um sítio familiar e desconhecido, para o

fundo da minha imaginação, para o imenso sem fim. Sinto-me a

sufocar, as criaturas desvaneceram, deixaram-me só neste lugar, e

não sei para onde ir, a camada branca dissipa-se da minha pele,

começo a extinguir-me, aquele sentimento de quietude desapareceu,

sou menos que partículas, sou nada.

MENÇÃO HONROSA Carolina da Silva Carvalho

12º D

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Índice Prefácio 02

POESIA

1.º Prémio 08

2.º Prémio 13

3.º Prémio 16

Menção Honrosa 18

NARRATIVA

1.º Prémio 22

2.º Prémio 26

3.º Prémio 30

Menção Honrosa 34

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