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O lugar nenhum em algum lugar Em 1980, o meio de arte no Brasil foi chamado de “lugar nenhum” por Paulo Venancio Filho. De lá para cá, esse meio incrementou-se, e o artista se assumiu como profissional dentro de uma lógica de mercado, enquanto novos críticos, curadores, e produtores surgiram, juntamente com novos estabelecimentos oficiais para a arte, como museus e centros culturais, além das galerias comerciais. Tal movimentação leva a crer que esse lugar nenhum tenha amadurecido no sentido de se tornar algum lugar em que a arte circule de modo democratizado por entre instituições preparadas para apresentar práticas contemporâneas, seus discursos e suas possibilidades. Porém não é difícil constatar que a realidade permanece outra. O meio de arte no Brasil se ressente do descompasso entre o modelo institucional vigente e a produção de propostas contemporâneas, em especial aquelas que não se limitam ao suporte. Esse é o caso das práticas efêmeras em geral, residências, projetos processuais e interdisciplinares, entre outros. Salvo exceções, os espaços institucionais surgidos na última década se baseiam em formatos modernos, os quais precisam ser adaptados à produção de algum projeto de arte “menos convencional”. Ao mesmo tempo, observam-se novos locais cujas atividades conceituam-se no uso da tecnologia, mas que não têm em sua proposta dar conta da multiplicidade da produção contemporânea. É interessante perceber que nesse descompasso entre produção contemporânea e modelos institucionais caducos, a formação de base dos curadores e teóricos nos últimos 20 anos não necessariamente se deu na instituição de arte ou na escola especializada (que no Brasil não há). Assim, feiras, eventos e galerias oferecem mais oportunidades de estágios e treinamentos práticos para o futuro curador e o crítico do que propriamente o museu ou o centro cultural, com vagas e orçamentos em geral restritos. No caso específico do curador, quando este chega para atuar profissionalmente na instituição “oficial”, traz consigo uma formação múltipla, DOSSIÊ • INSTITUIÇÕES DE ARTE NO BRASIL 129 Instituições de arte no Brasil relatos de experiências Este dossiê, organizado pela equipe de Arte & Ensaios e relacionado à temática deste número – Exposições – procura levantar elementos para uma análise da condição recente das instituições de arte no Brasil, particularmente no âmbito expositivo. Teria havido alguma transformação significante na última década, em relação ao nosso tradicional confronto contra a precariedade? Após elaborar uma lista de colaboradores, a execução do dossiê ficou ao encargo de Guilherme Bueno, Joana Csekö e Ronald Duarte. Procuramos convidar pessoas de diversas regiões e experiências no país, tanto vinculadas formalmente às instituições, quanto em contato permanente com elas para responder livremente a estas perguntas: A partir de sua experiência profissional nas instituições nas quais trabalha (ou trabalhou), dos desafios locais e/ou específicos reconhecidos nesse período, das estratégias de trabalho desenvolvidas para enfrentá-los, como analisa as transformações havidas recentemente? Quais seriam as perspectivas que reconhece como os desafios atuais? A equipe de Arte & Ensaios agradece a todos aqueles que puderam responder-nos. Esperamos que tal painel nos auxilie a aprofundar a reflexão sobre um tema – como sempre – atual. Guilherme Bueno Instituições de Arte; Arte Brasileira – Sistema de Arte; Arte Contemporânea Brasileira – depoimentos.

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O lugar nenhum em algum lugar

Em 1980, o meio de arte no Brasil foi chamadode “lugar nenhum” por Paulo Venancio Filho. Delá para cá, esse meio incrementou-se, e o artistase assumiu como profissional dentro de umalógica de mercado, enquanto novos críticos,curadores, e produtores surgiram, juntamentecom novos estabelecimentos oficiais para a arte,como museus e centros culturais, além dasgalerias comerciais. Tal movimentação leva acrer que esse lugar nenhum tenha amadurecidono sentido de se tornar algum lugar em que aarte circule de modo democratizado por entreinstituições preparadas para apresentarpráticas contemporâneas, seus discursos esuas possibilidades.

Porém não é difícil constatar que a realidadepermanece outra. O meio de arte no Brasil seressente do descompasso entre o modeloinstitucional vigente e a produção de propostascontemporâneas, em especial aquelas que nãose limitam ao suporte. Esse é o caso das práticasefêmeras em geral, residências, projetosprocessuais e interdisciplinares, entre outros.

Salvo exceções, os espaços institucionaissurgidos na última década se baseiam emformatos modernos, os quais precisam seradaptados à produção de algum projeto de arte“menos convencional”. Ao mesmo tempo,observam-se novos locais cujas atividadesconceituam-se no uso da tecnologia, mas quenão têm em sua proposta dar conta damultiplicidade da produção contemporânea.

É interessante perceber que nesse descompassoentre produção contemporânea e modelosinstitucionais caducos, a formação de base doscuradores e teóricos nos últimos 20 anos nãonecessariamente se deu na instituição de arte ouna escola especializada (que no Brasil não há).Assim, feiras, eventos e galerias oferecem maisoportunidades de estágios e treinamentospráticos para o futuro curador e o crítico do quepropriamente o museu ou o centro cultural,com vagas e orçamentos em geral restritos.

No caso específico do curador, quando estechega para atuar profissionalmente na instituição“oficial”, traz consigo uma formação múltipla,

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Instituições de arte no Brasilrelatos de experiências

Este dossiê, organizado pela equipe de Arte & Ensaios e relacionado à temática deste

número – Exposições – procura levantar elementos para uma análise da condição recente

das instituições de arte no Brasil, particularmente no âmbito expositivo. Teria havido alguma

transformação significante na última década, em relação ao nosso tradicional confronto

contra a precariedade? Após elaborar uma lista de colaboradores, a execução do dossiê

ficou ao encargo de Guilherme Bueno, Joana Csekö e Ronald Duarte. Procuramos convidar

pessoas de diversas regiões e experiências no país, tanto vinculadas formalmente às

instituições, quanto em contato permanente com elas para responder livremente a estas

perguntas: A partir de sua experiência profissional nas instituições nas quais trabalha (outrabalhou), dos desafios locais e/ou específicos reconhecidos nesse período, das estratégias

de trabalho desenvolvidas para enfrentá-los, como analisa as transformações havidasrecentemente? Quais seriam as perspectivas que reconhece como os desafios atuais? A

equipe de Arte & Ensaios agradece a todos aqueles que puderam responder-nos. Esperamos

que tal painel nos auxilie a aprofundar a reflexão sobre um tema – como sempre – atual.

Guilherme Bueno

Instituições de Arte; Arte Brasileira – Sistema de Arte; Arte Contemporânea Brasileira – depoimentos.

árdua de ser objetivada sem uma tutoria, masnão menos eficaz para a obtenção de um perfildiversificado. Hoje, a atuação desseprofissional é entendida como a de umpesquisador polivalente que deve saberconjugar teoria da arte, prática de montagem,acompanhamento crítico, produção,administração e até captação de recursos.

Notamos, portanto, que, se atualmente asinstituições de arte não representam um vínculoempregatício garantido nem uma escola parainiciantes em curadoria e crítica, elas funcionamcomo parceiras do profissional autônomo,permitindo que determinada idéia se realize eque então circule.

Diminuir o descompasso entre os modelosainda modernos, dos espaços institucionais, e aspropostas de arte contemporânea depende deuma reforma conceitual ampla. Tal reformaconsiste em valorizar projetos artísticos que nãose limitem ao suporte, ao objeto ou à exposiçãoem si. Isso ampliará o campo de infiltração socialde subprodutos artísticos como livros, vídeos,cds, catálogos, simpósios, etc. Ao mesmotempo, é preciso encorajar o investimentoprivado em arte sem vistas ao lucro,acreditando em projetos culturais de pesquisaao longo prazo, desinteressados em lancescomerciais e de marketing.

Conseguir desvencilhar-se da lógica comercial éainda um desafio para a produção de arte noBrasil, que continua sendo legitimada de acordocom sua inserção no mercado. Frente a essasituação se consolidam, quase como uma outrainstância institucional, as muitas iniciativasindependentes que compõem o cenárioalternativo hoje. Tais iniciativas terminam porconstruir uma lógica própria para a circulação depropostas artísticas e curatoriais com difícilentrada nos espaços “oficiais” para a arte, sejamgalerias ou museus.

Entre as atividades que serviram comotreinamento profissional para mim e outroscolegas está a Revista Número, uma publicaçãotemática e gratuita, de arte e crítica, apoiadainicialmente apenas pelo CentroMariantonia/USP e por alguns anúncios privados,principalmente de galerias.

A Número UM foi lançada em 2003, abordandojustamente o tema “iniciativas independentes”.Seu surgimento deu-se após pouco mais de umano de atividades do grupo de “jovens críticos”,reunido por Lorenzo Mammi para estudar crítica

de arte e escrever nos catálogos das exposiçõesdo Ceuma.

Hoje, a revista chegou ao sétimo número,contando com a parceria de outras instituiçõespaulistanas, como o CCSP e a Pinacoteca, alémdos necessários apoios com merchandising deestabelecimentos comerciais. Após alteraçõesem seu esquema de sobrevivência e da troca dealguns editores, ela é publicada comperiodicidade inconstante, enfrentando percalçosburocráticos e financeiros, mas firme em seupropósito cultural.

Mesmo com as dificuldades enfrentadas, aproposta obteve sucesso e sugeriu um novoformato de publicações de arte no Brasil. Alémde dar espaço para a circulação de muitos textose projetos artísticos, a Número foi umaplataforma de amadurecimento profissional parao próprio grupo editorial.

No circuito independente, a Revista Númeroainda é privilegiada por ter, desde o início,respaldo institucional – o que não ocorre com amaioria das iniciativas do mesmo tipo no Brasil.Porém, creio que essa experiência sintetiza aimportância que o circuito alternativo tem,estimulando a formação da prática profissionalem geral, ampliando a circulação de propostasmenos convencionais e ajudando na formaçãode um público de arte contemporânea.

Daniela Labra, curadora independente

setembro de 2006

instituições de arte

Vivemos hoje uma gigantesca crise institucional,do congresso ao museu de belas artes,passando por saúde pública, transporte urbano econcessões de rádio e tevê; acima de tudo,vivemos uma grande crise cultural, resultado daabsurda falta de investimento educacional, dasegregação social e, quem sabe, da mistura denossa popular herança mameluca com as elitistascapitanias hereditárias – dois espaços em que afalta de amor nos deixou abandonados nomundo, seja pela família, de origem duplo-bastarda mameluca, seja pela terra hereditáriatão distante, longe dos amados filhos, esposas,amigos e amantes; vivemos uma criseinstitucional e cultural por falta de amor, a nossopaís, a nossa terra, a nossa história, a nossasinstituições... parece que do positivismo

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pescaram aquelas duas estranhas palavras,ordem e progresso, e esqueceram do amor quevinha em seguida; de qualquer forma isso nãomudaria nada, pois ‘ordem e progresso’ parecepiada quando se fala de Brasil.

Na maioria das instituições de arte poderemosencontrar um lugar para analisar a crise geralque acontece em nosso país; cada uma é umreflexo de nossa cultura burocrática eextrativista, e entender o que se passa nestemicrocosmo é entendermo-nos como um todo.

Diante do espaço limitado, vamos à prática emsi. Acima de tudo o que falta a nosso presenteinstitucional, seja na Presidência da República ouna curadoria de uma instituição, é a noção doprograma, qual é o destino de nosso país, denosso povo, qual é o destino de nossainstituição... na direção de uma instituiçãopodemos e devemos criar objetivos concretospara conquistas coletivas – afinal, as instituiçõessão o que somos, o que nos representa,existem para o coletivo e não para o pessoal.Sendo assim, definidos esses objetivos, ficamuito mais fácil organizar a tropa, pois todosestão cientes do rumo que seguiremos; paracumprir esse destino ideal, porém, é preciso umprograma. Ele até pode começar um poucoincompreensível, mas é sua continuidade que vaidar identidade à instituição... e, aliás, parafalarmos agora simplesmente de instituições dearte, já que focalizando nesse horizontepodemos analisar a problemática geral, postoque o conflito é cultural, nos deparamos com aprimeira das ferramentas que constituem adeformação de nosso projeto cultural – as leisde incentivo. Elas não valorizam o programa esim eventos isolados; deveríamos ter leis deincentivo estruturais, aplicadas a programas efinalmente leis complementares para viabilizareventos isolados que poderiam até e deveriamser parte do programa... claro que, diante doestado de coisas, tanto os programas deveriamser desenvolvidos quanto a lei deve sofrer umprocesso evolutivo; é preciso pensar a longoprazo e não simplesmente no aqui e agora

O programa necessita texto... vivemos a era docurador; na verdade, o intelectual está afastadodo debate, talvez pelo gerente de marketing;virou figura simbólica; falta o texto, o discurso,falta a palavra-ação com o posicionamentopolítico no verbo, contextualizando oacontecimento artístico no contexto culturalhumano, terra Brasil, século 21 – vibraçõespoéticas são importantes, mas, sem contexto

histórico cultural, se tornam belezas vazias. Achoque toda abertura institucional deveria ter odiscurso obrigando diretor e curador aassumirem posições de responsabilidade políticasobre o que está sendo apresentado; e acreditoque assumir essa responsabilidade é umamaneira de dar transparência ao programa e dese tornar mais forte para conseguir ofinanciamento para a instituição.

Parece que estamos vivenciando uma realidadecosmético-cultural que se porta superior aointelecto estrutural.

Somos seres culturais, a única forma desobrevivência e desenvolvimento de umasociedade humana é através da cultura, ciência,educação, arte; não existe a menor condição dese libertar historicamente como país se não foratravés do conhecimento, da cultura... afinal,isso é o que nos difere dos cachorros, gatos,ursos, vacas, etc. Parece, porém, que asociedade brasileira auto-extrativista ainda nãoacordou para essa realidade; não adiantaresponsabilizar a falta de verba para justificar afalta de criatividade – é necessário o verbo, ogrito! As instituições precisam funcionar, delasdependemos enquanto corpo coletivo, éabsolutamente necessário e urgente que sepense no coletivo, que o intelectual assuma suaresponsabilidade histórica, que tomemosconsciência do tempo e das vidas que estamosjogando fora com nossa inércia.

SSeegguunnddaa ppaarrttee

Das principais instituições de artecontemporânea, isto é, a interpretação de nossomundo artístico, hoje podemos citar e julgar.

O Paço Imperial é definitivamente uma dasinstituições mais ativas da cidade, com váriassalas e mostras; já teve mais identidade, antesdo ar-condicionado, e agora mescla história comcontemporaneidade; tem em sua curadoria umavocação para a diversidade, o que é ótimo;deveria investir em textos e publicações... comtantos artistas que por lá passaram, a federaçãoperdeu e perde oportunidade histórica de darcontexto cultural, conteúdo político esimplesmente de valorizar suas ações. Por sualocalização privilegiada e sua importante históriarecente, o Paço deveria ter uma biblioteca, umdepartamento educativo, enfim, a federaçãodeveria aproveitar a oportunidade de realizarum centro cultural importante para a história dopaís; e finalmente deveria, assim como todas asinstituições, valorizar o artista financeiramente na

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hora da produção do trabalho que vai serexposto – isso não é “ajudar” o artista; éfortalecer a instituição.

O Espaço Cultural Sérgio Porto é uma dasinstituições mais importantes do Rio, por sevoltar – ou, pelo menos, assim era – para aprodução mais jovem, que forma a base dapirâmide; perdeu muito crédito devido àpéssima gestão cultural dos últimos governosmunicipais. Diante de seu formato atual, comduas galerias, acredito que deveria daroportunidade para que dois curadores diferentescriassem um programa para cada sala; seriainteressante dar espaço a curadores jovens paraincentivar a prática de organizar e contextualizarmostras; a produção de texto é fundamental.

O Museu Nacional de Belas artes, coitado, nosmeus 20 anos de artes plásticas em nenhummomento teve qualquer expressividade comolugar cultural, mais parecendo um museu dealuguel com alguns momentos isolados debrilho; é triste a saída de Paulo Herkenhoff dadireção, mais lamentável ainda a declaraçãopública da nova diretora – finalmente temosagora um técnico na direção –, isto é,funcionário de carreira daquele ícone da inérciaburocrática das instituições brasileiras.

O Centro de Arte Hélio Oiticica teve,embora conservadora, ótima gestão nostempos da Vanda Klabin – era um lugar vivo,agraves de mostras, palestras e publicações;não se sabe o que acontece por lá hoje, poissuas salas estão fechadas, um dos maioresabsurdos no que se refere a instituiçõesculturais; todos os envolvidos devemexplicações à sociedade. Pobre Hélio, portudo que fez, merecia mais do que ser hojeuma placa no meio da Luís de Camões.

A Funarte, que sumiu depois da brilhanteadministração de Iole de Freitas, ressurge dascinzas com um interessante projeto deintegração nacional e com o Programa Projéteis.Lógico que, como órgão do Ministério daCultura, poderia fazer muito mais, no entanto,que ministério é esse?

O MAM é sempre um mistério; acho que serianecessário um choque de criatividade para darmais vida ao museu, um símbolo carioca; eleestá ativo, porém muito aquém do que deveriarepresentar diante da sociedade. De algumaforma parece que a distância que vivemos comomeio (artes plásticas) pode ser verificada peladesimportância que o MAM tem como lugar

cultural na sociedade carioca como um todo.Curiosamente, para além dos objetivosadministrativos e curatoriais, acho que até amaravilhosa arquitetura do museu atrapalha suavocação de lugar cultural; seria fundamental paraa saúde do meio o fortalecimento do MAM.

Seria uma idéia tanto o MAM como o HélioOiticica e o Paço terem uma sala destinada aum programa independente curado por gentemais jovem. Acho que é fundamental avalorização do intelectual jovem, bem como apluralidade de intelectuais curadores na gestãodos espaços culturais.

Chegamos ao CCBB; o que é o CCBB? Não éde fato um lugar em que podemos identificarum programa, apesar de sua intensa atividade;parece sempre fora de contexto; seria umaespécie de butique cultural, um luxo; cumpre opapel de um museu, mas é um lugar semresponsabilidade cultural – o episódio dacensura da obra de Márcia X pela pressão deseitas religiosas foi um tapa na cultura e mostrouclaramente a distância e o medo da instituiçãopara o debate cultural; tudo está muito bomdesde que não se incomode ninguém... não éassim que se faz cultura, não é assim que sedesenvolve um país. Como maior bancopúblico, deveria ter mais amor ao presente efuturo de nossa sociedade; como exemplo,deveria ter aproveitado a oportunidade parachamar a sociedade para o debate e não seesquivar; a retirada da obra foi umaatrocidade cultural.

Um dos melhores programas dos últimos anosaconteceu: o Museu de Arte da Pampulha, deum lugar sem expressão no panorama culturalmineiro ou brasileiro, se tornou referência apartir do programa de exposições, bolsas eresidências desenvolvido pelo curador AdrianoPedrosa, continuado por Rodrigo Moura, sob oapoio da diretora Priscila Freire. Como tudo quebrilha no Brasil dura pouco, o lugar já foiminado por (des)intereses políticos; seacontecer como de costume em se tratandode instituições de arte públicas, em breve vaisumir do baticum cultural e vai ser mais ummomento perdido na história.

É bom lembrar algumas atitudesindependentes, como o AGORA e ointeressante trabalho do capacete projects,que, além de mostras, residências e viagem,lançou várias publicações, algumas comótimas entrevistas e textos, tem atividade

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discreta mas importante e constante; semesquecer Alfândega, Galaxie, Ralador, Postee outras atitudes autônomas, que têm sido agrande novidade.

Sei, ou espero, que todos os gestoresenvolvidos nas instituições citadas ou não estãofazendo o que podem, as dificuldades sãomuitas, mas obviamente esses são problemas dogestor; o público quer o resultado. A realidade éque temos que assumir nossas responsabilidadese estar preparado para as críticas, queinfelizmente no nosso cotidiano pós-ditadura,antes não sei, são feitas de forma velada.Estamos todos no mesmo barco, e o inimigo defato está entre aqueles que defendem aignorância, a injustiça, a obscuridade, aquelesque acreditam que se domina o outro semcultura com mais facilidade, acham que estátudo ótimo, já que o particular está garantido enão acreditam ou têm medo da potência criativae intelectual do povo brasileiro.

Ernesto Neto, artista

Considero que o principal desafio para otrabalho institucional (estou falando deinstituições museológicas lidando com artecontemporânea) no Brasil é o desenvolvimentode estratégias para conferir espessura evisibilidade à produção intelectual/artística nocontexto das instituições. A meu ver, issoequivaleria a fazer com que elas tivessempresença efetiva na sociedade. É preciso que asinstituições se livrem de uma espécie de sina deser ponta (final) e segunda mão no processo designificação do trabalho de arte, a ponto de serlugares onde foi parar aquilo que pouco ou nadainteressa ao público e mesmo aos artistas. Éduro afirmar, mas, mesmo com todas asexceções honrosas (e já não são poucas), as

instituições têm corrido o risco de se tornar algodesnecessário. Quando devem serimprescindíveis. Pensemos isso no contexto doinegável fortalecimento do mercado de artecomo força legitimadora e circuito expositivo,das megaexposições do art-marketing a sedar opúblico (e o privado também), do surgimentode comunidades artísticas auto-suficientes e nofranco ocaso da prática colecionista pública!

Num estranho paradoxo, o trabalho dasinstituições precisa, urgentemente, serreconhecido para existir de fato.

No caso do Museu de Arte da Pampulha, ondeatuei como curador assistente e curador, de2001 a 2006, foi desenvolvido um programaradical de descondicionamento de uma culturade trabalho conservadora que pautava ainstituição – embora num prédio revolucionário,num contexto progressista e com algum passadovanguardista. Citando a leitura (negativa) feitapor um colega mais experiente, é como se ainstituição tivesse sido expulsa dela mesma. Defato. Foram realizadas mais de 40 exposiçõesindividuais, mesclando artistas de projeção locale internacional, buscando ter uma ocupação doespaço constante e efetiva, com artistas que, namaioria dos casos, desenvolveram exposiçõesexclusivas para o Museu (curadas, organizadas eproduzidas pela instituição). Foi dada ênfase amostras de escultura e instalações, permitindouma leitura mais fluida do prédio, que duranteanos esteve coberto por cenografias dasexposições temporárias. Além disso, foi criada aBolsa Pampulha, para artistas emergentesbrasileiros, extinguindo-se o modelodesatualizado, burocrático e festivo do Salão, einiciou-se uma política colecionista, inédita noMuseu. Sobre esse tripé, construíram-selegitimidade e apoio junto aos artistas, o quepode ter conseqüências ainda maiores se forpensado o desenvolvimento de políticas maisamplas de publicações, de comunicação, deeducação e de público.

Muito ao contrário, em Inhotim, onde está seformando um centro de arte baseado em umacervo permanente, o desafio é garantir atuaçãoinstitucional e cultural à altura desse acervo, comrespostas curatoriais/museológicas para ocontínuo desenvolvimento da coleção e de suasestratégias de exposição num contexto único emuito distante daquele dos museus urbanos. Nomomento, consolidamos alguns espaçosmonográficos e permanentes dedicados a

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artistas que consideramos referenciais para oescopo da coleção (Cildo Meireles, Tunga,Adriana Varejão, Doris Salcedo) e outrosespaços para exposições temporárias, cuja tarefaé reinterpretar a coleção de dois em dois anos,criando relações novas com o acervo. Esse é onúcleo do Museu, permeado por um parquebotânico, que esperamos expandir para outrassituações, formando um grande arquipélago:obras de arte no interior da mata, trabalhandoem projetos site-specific e dando condições deos artistas desenvolverem projetos únicos eambiciosos. Simultaneamente, estamos atuandonum amplo projeto educativo para Inhotim,envolvendo vários departamentos da instituiçãoe a comunidade do entorno. Está emdesenvolvimento o Centro Educativo, que seráum complexo com salas de aula, auditório ebiblioteca, onde vamos desenvolver cursos paraadultos, capacitação de professores para asvisitas guiadas, atividades práticas com os gruposescolares e oficinas de criação para acomunidade. Potencialmente gostaríamos deatuar em contato direto com a rede escolar,criando atendimento sistemático e açõescontinuadas com a cidade e o Estado.

Resumindo, para mim, enquanto nós,curadores, não nos sentarmos comadministradores, arquitetos, comunicadores,educadores, empresários, museólogos etc.,criando diálogos multidisciplinares de alto padrãopara garantir a gestão técnica e continuada e oacesso descentralizado do público às instituições,corremos o risco de ver o bonde passar. Depoispode ser muito tarde.

Rodrigo Moura,

jornalista cultural, editor e crítico de arte.Curador do Museu de Arte da Pampulha e,desde 2004, curador adjunto de exposições eda coleção do Centro de Arte ContemporâneaInhotim (Minas Gerais, Brasil).

As perspectivas para se dirigir o Museu de ArteContemporânea do Centro Dragão do Mar deArte e Cultura são muito positivas atualmente.Não tenho dúvida, em minhas andanças, de queeste museu que dirijo é uma das instituiçõesmais vibrantes do país quando observamos aatuação de outros museus nacionais. Asatuações política e cultural, na maioria dos casos,não se definem. São confusas, e não seesclarecem as estratégias adotadas,

principalmente quando pensamos em artemoderna e contemporânea. Desconhecem-seos critérios definidores adotados para asexposições e como se dá o fomento para aprodução artística.

De certa forma, no MAC buscamos solidificarnossa atuação perante a arte contemporânea eprocuramos criar um diálogo objetivo e emprimeira instância com o público do museu parajustificar nossa existência nas comunidades doentorno. E com essas ações no contexto dosprogramas Artista Invasor e Obra emDestaque, bem como com a ativação doserviço educativo, estamos, definitivamente,colocando Fortaleza no circuito cultural doNordeste e abrindo novas perspectivasmuseológicas além do eixo Rio-São Paulo.

Em sintonia com a produção mais instigante daarte, o MAC CDMAC, apenas como ilustraçãodo acerto do caminho que tomamos, foiindicado este ano pela Associação Brasileira deCríticos de Arte com uma menção honrosa pelotrabalho desenvolvido em 2005. Com eleitoresdo Brasil todo, a lembrança de nosso nomeconfirma que foi feliz a escolha de nossa políticade exposições e ações museológicas,valorizando a produção local, investindo naformação tanto do corpo profissional do museuquanto de um acervo. Além desse trabalho,criamos junto à Presidência do Centro aprimeira biblioteca dedicada às artes visuais noestado, a Biblioteca de Artes Visuais Leonilson.

Desde o início do ano, conseguimos cerca de300 doações para a formação de uma coleção.Em menos de dois anos conseguimos saltar das55 obras que compunham o acervo do MACpara cerca de 400. Não é muito secomparamos com outras instituições em melhorsituação no país, mas já é uma coleção suficientepara ocupar por diversas vezes todas as salas deexposição do museu com mostras do acervo. Eainda conseguimos ser aprovados em doisimportantes editais, o da Petrobras e o da CaixaEconômica Federal, com investimentos quesomam cerca de 700 mil reais. Pelo primeiro,vamos equipar nossa reserva técnica erequalificar nossas salas de exposição. Pelosegundo, vamos adquirir acervo. Fato inédito noestado a envergadura das ações.

No entanto, definir nossa linha de atuaçãomuseológica foi o primeiro desafio enfrentado

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quando assumi a direção da instituição, emmarço de 2005. O museu estava semprogramação, e a equipe, desmotivada diante dafalta de um diretor havia mais de três meses. Averba, que em um primeiro momento poderiaassustar e espantar, seria o segundo obstáculo.Tornou-se um desafio gerir o equipamento, que,apesar da estrutura museológicareconhecidamente qualificada com cerca de800m2 de área expositiva, demonstravadeficiência na produção de mostras e nonúmero de obras de arte contemporânea emacervo. No entanto, essa tarefa motivou a novagestão a buscar soluções criativas para ascarências do MAC.

Dirigir um museu fora do eixo Rio – São Paulonão é tarefa das mais fáceis num país poucoafeito a suas instituições culturais. Mas quando seencontra uma equipe competente e disposta ainovar, torna-se mais curto o caminho para osucesso da iniciativa. O mérito está em saberdescobrir em cada um dos funcionários aspotencialidades individuais e coletivas, ainda maisquando se trata de uma equipe reduzida como anossa. E o mérito não é do diretor em percebertais qualidades, é dos próprios funcionários quese deixam descobrir. Cabe ao diretor trazer anoção de equipe e as condições do trabalho aser desenvolvido. Depois, é só colher os frutos.

Ter sido o escolhido em um processo seletivoinédito no país, em que um conselho curatorialindicou o diretor do museu, me dá uma certaisenção política. Mas, se não contasse com oapoio incondicional da Presidência do Institutode Arte e Cultura do Ceará, a organizaçãosocial do estado que gerencia o CentroCultural Dragão do Mar de Arte e Cultura, doqual somos mais um equipamento, parte donosso sucesso profissional e institucional nãoseria possível.

Ricardo Resende

Diretor Museu de Arte Contemporânea CentroDragão do Mar de Arte e Cultura

A condição tardia do meio das artes doBrasil e a experiência do MAMAM

A situação das instituições museológicasbrasileiras parece sugerir que o Brasil chegou àcontemporaneidade tardiamente. Em um

momento no qual as demandas que o campodas artes coloca para os museus sãoaproximadamente as mesmas para qualquerpaís, há uma pronunciada diferenciação entre acapacidade sustentada de resposta dasinstituições brasileiras a esses requerimentos e acapacidade de adaptação de instituições situadasem países que há muitas décadas estabeleceramum sistema museológico diversificado e denso.

Nesse contexto, a programação do Museu deArte Moderna Aloisio Magalhães – MAMAMtem-se pautado, desde sua criação, em 1997,pela ambigüidade que permeia as atividadesda maior parte dos museus de arte modernabrasileiros: embora criados como instituiçõesvoltadas para a conservação e a difusão daarte moderna, esses museus assumem, noambiente institucionalmente rarefeito do país,também a responsabilidade de expor artistas(maduros e jovens, de suas regiões ou dosmais diversos cantos) que partilhem acondição de ser construtores ativos davisualidade contemporânea.

Adicionalmente, e mais uma vez de modosimilar ao que ocorre com a maior parte dosmuseus de arte moderna e contemporâneabrasileiros, a realização das exposições doMAMAM – sejam elas individuais ou coletivas –depende, em grande medida, do empréstimode acervos de colecionadores privados, degalerias, de outras instituições, ou dos própriosartistas. Se essa situação indica a incapacidade dasociedade brasileira de formar acervos públicose atualizados até mesmo das produções de seusmais importantes criadores, ela tem tambémpermitido a ampliação do repertório visual àdisposição daqueles a quem esses museusservem, atualizando seu olhar e oferecendo ocontato com formas diversas de negociaçãoartística com o mundo.

É precipitado, portanto, formular uma oposição,em termos de relevância para o desempenho dafunção educativa dos museus, entre exposiçõespermanentes de acervo e exposiçõestemporárias. Em várias situações, as exposiçõestemporárias podem ser de tal importânciaformativa e afetiva para o público dos museus,que é mesmo possível considerar as obrasnelas incluídas pertencentes a um acervosimbólico das instituições que as abrigam (ainda

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que de veloz circulação e sem quaisquerimplicações patrimoniais).

O fundamental, todavia, é que, qualquer queseja a origem do acervo exibido (próprio ouemprestado), as exposições e demais açõeseducativas a elas relacionadas (sejam elasdiscursivas, editoriais ou de criação)estabeleçam e estimulem, em seu conjunto,uma relação crítica e reflexiva do público com aprodução artística. Isso implica, entretanto, queos museus precisam adquirir, desenvolver ourecuperar sua capacidade de formulação e deimplementação de um projeto institucional, ouseja, é preciso encontrar os meios adequados(e inovadores) de financiamento e de gestão demuseus para lidar com essa condição tardia,não fazendo dela impedimento para assumir aresponsabilidade frente às necessidades domeio das artes do país.

Ao longo dos últimos seis anos (2001-2006), osesforços do MAMAM foram voltados,prioritariamente, para a consolidação dessacapacidade de posicionar-se criticamente frenteà produção artística moderna e contemporânea.Para alcançar esse intento, o Museu assumiu,gradualmente, a responsabilidade de conceber eproduzir a maior parte das exposições nelerealizadas, promovendo a profissionalização desua equipe e comissionando, em diversos casos,a criação de obras novas por parte dos artistasconvidados. Mais do que simplesmente inserir-se em um circuito de exposições já existente nopaís, o MAMAM optou por ampliá-lo e alimentá-lo a partir de um ponto de vista local.

Também fundamental nesse esforço derequalificação institucional foram as publicaçõeseditadas pelo Museu para acompanhar cadaexposição nele concebida ao longo desseperíodo. Aliando textos críticos que privilegiam aanálise das obras expostas e projetos gráficosque respeitam e favorecem sua visualização,esses catálogos são oferecidos como alternativaeditorial para um segmento comumentemarcado pelos extremos de precariedade edesperdício. A criação de uma bibliotecaespecializada em arte moderna econtemporânea aberta à consulta públicasolidificou ainda mais a importância que o

MAMAM concede a atividades de reflexão sobrea produção artística.

O reconhecimento do papel formativo que asexposições temporárias desempenham nasprogramações dos museus de arte no Brasil nãodesobrigou o MAMAM, contudo, daresponsabilidade que possui em relação a seuacervo. Simultaneamente a projetos derecatalogação e de informatização de toda a suacoleção, de higienização e de restauro de todoo acervo em papel e de parte de seu acervo depintura, de implementação de novo sistema decontrole ambiental da reserva técnica (projetosfinanciados pela VITAE) e à criação de uma novareserva técnica para obras tridimensionais, oMuseu constituiu, em sua coleção, um núcleoexpressivo da produção contemporânea do paísem artes visuais, composto de 130 obras de 60artistas, a maior parte delas generosamentedoada por artistas, galerias e colecionadores apartir de solicitações do MAMAM. Além disso, oMuseu adquiriu, mediante patrocínio doPrograma Caixa de Adoção de EntidadesCulturais, 80 gravuras de Gilvan Samico, que,somadas às obras desse importante artista jáexistentes no acervo, perfazem toda a suaprodução da década de 1950 aos dias atuais.

Esse esforço busca, talvez utopicamente, aimplantação gradual de um modelo deformação visual que não dependa quaseexclusivamente de exposições temporárias feitascom acervos emprestados, mesmo queformatadas a partir dos museus e voltadas paraas necessidades das comunidades que osfreqüentam. Por mais relevantes que tenhamsido e ainda sejam para a atualização do olharde sua audiência, é necessário que asexposições temporárias cedam aos acervospermanentes dos museus o lugar de primaziaque hoje ocupam, passando a desempenhar, nofuturo, um papel especulativo ou de releiturados juízos de valor assentados por aquelascoleções. Somente assim será possível fazercom que, no correr do tempo, os museusjustifiquem, em termos menos defensivos doque aqueles ainda empregados, o porquê deser, afinal, instituições sociais importantes.

Moacir dos Anjos

Diretor do MAMAM

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R E V I S T A D O P R O G R A M A D E P Ó S - G R A D U A Ç Ã O E M A R T E S V I S U A I S E B A • U F R J • 2 0 0 6

O avião não decola

Breves considerações sobre as artes visuaisem Brasília

O ambiente da cultura visual em Brasília cresceue profissionalizou-se, razoavelmente, napresente década.

Algumas instituições públicas e privadasvêm contribuindo para a demarcação deum território brasiliense na artes visuaisbrasileiras e estrangeiras.

Na esfera pública federal, os editais de estataisde centros culturais como os da Caixa e doCentro Cultural Banco do Brasil, criados aindanesta década, vêm aproximando o públicoamante das artes de projetos de exposiçõesnacionais e internacionais, embora artistas do DFse ressintam de apoio à cultura brasiliensenesses espaços.

Apostando na arte contemporânea, a Funartelocal desenvolve um programa para as artesvisuais em Brasília, que poderia ampliar seuseditais de galerias privilegiando também asintervenções urbanas, tendência em francodesenvolvimento nas artes da capital federal.

A Secretaria de Cultura de Estado do DF, porsua vez, não apresenta, no momento, nenhumapolítica concreta para as artes visuais. Nenhumprêmio de incentivo à produção para as artesvisuais foi instituído desde 1990. Só o Iate Clubede Brasília, e não regularmente, organizou umprêmio com vistas à produção emergente. Hojeextinto, o prêmio Iate deixa uma lacuna nosmeios artísticos da cidade.

As galerias da Casa da Cultura da AméricaLatina, da Universidade de Brasília, desenvolvemum programa de artes visuais voltado para apesquisa e experimentação, dandooportunidades aos jovens artistas, muitos delesegressos do Instituto de Artes da UnB, únicocentro oficialmente voltado para o ensino dasartes no DF.

Ressalte-se que, em Brasília, a total ausência deescolas de arte prejudica e causa retrocesso nodesenvolvimento da cultura visual da cidade, queem seu apogeu, nos idos de 1960, abrigou umoriginal e exemplar modelo de arte- educação,na figura dos centros interdisciplinares, como é

o caso das escolas parques e do Espaço Cultural508 Sul, onde se formaram excelentes artistas,que hoje já consolidaram suas carreiras dentro efora do estado. Sem nenhuma expressividadeatual na formação dos jovens artistas brasilienses,o Espaço da 508 Sul encontra-se à margem doprocesso de transmissão do conhecimento,embora seja ainda um emblemático centrocultural de Brasília, mais por seu passado do quepor seu presente. A questão é que por aqui nãose investe mais no processo, o que prejudica oproduto. Aposta-se muito no evento emdetrimento do advento da formação artística.

Ainda no âmbito da Secretaria de Cultura deEstado do DF, o FAC (Fundo de Apoio àCultura do DF) desenvolve um mecanismo defomento às artes, mas que funciona semcritérios eletivos claros para projetos culturais,destinando seus recursos aleatoriamente, emineficaz tentativa de constituir uma instânciademocrática para a distribuição dos parcosrecursos públicos para a área.

O MAB, Museu de Arte de Brasília, que possuium belo acervo de arte contemporâneabrasileira, desenvolve uma tímida políticacultural. Refém do futuro Museu da República,em fase inaugural na Esplanada dos Ministérios,o MAB, antigo museu da cidade, vive dias deincertezas e falta total de recursos para suamanutenção.

O novo museu é uma grande incógnita.Plantado na Esplanada, a grande cúpula brancade Oscar Niemeyer não apresentou até agoraprogramação nem divulgou à classe interessadao conceito do museu a ser implantado.Sabendo-se que um museu pode ativareconômica e culturalmente uma cidade,presume-se que a grande incógnita do iglu daEsplanada venha devolver a Brasília a identidadecultural perdida e também reconduzi-la ao postode cidade nascida sob o signo da arte.

Não obstante as dificuldades descritas, Brasília éhoje um centro de excelência das artes visuaisbrasileiras. Artistas e coletivos locais ultrapassamconstantemente as divisas da capital e projetam-se no cenário das artes nacionais einternacionais.

Wagner Barja, Artista Visual

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