Conquista coletiva da terra no Semiárido

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O assentamento da Serra do Rancho Grande, situado a 30 quilômetros do município de Araripina, Sertão do Araripe de Pernambuco, é o primeiro assentamento da cidade e uma conquista recente, fruto da luta coletiva de algumas famílias agricultoras. Antes, os trabalhadores e a s trabalhadoras rurais eram empregados, não tinham renda fixa e dependiam de bicos para sobreviver. A maioria das famílias residia em pequenas propriedades alugadas, com menos de três hectares, e também periferias da cidade. Seu Antônio Gonçalves, liderança comunitária na época, morava na comunidade do Sítio Saúna, onde já percebia a deficiência do acesso à terra na região. Em 2003, ele começou a participar de conselhos e outros espaços coletivos, na tentativa de buscar uma solução para o problema vigente. Em 2001, alguns agricultores e agricultoras da comunidade perceberam a necessidade de se organizar para fortalecer a comunidade, e então fundaram a Associação do Sítio Torrinha e Saúna. O esforço coletivo foi direcionado para construção de projetos que pudessem beneficiar as famílias agricultoras e contribuir com o desenvolvimento local. Em 2007 houve a possibilidade do grupo se organizar em um assentamento. Assim, alguns integrantes da associação, que possuíam interesse em conquistar sua própria terra, envolveram-se no projeto, juntaram-se em prol dessa conquista. O novo grupo se desligou da associação e fundou a Associação dos Produtores do Assentamento da Serra do Rancho Grande, específica para desenvolver o projeto de acesso à terra, que na época foi encaminhado para o Fundo de Terras do Estado de Pernambuco (Funtepe), atualmente Instituto de Terras e Reforma Agrária de Pernambuco (Iterpe). No início, muitos não acreditavam que poderia dar certo, o que acarretou em várias desistências, dificultando a consolidação Pernambuco Ano 5 | nº 127 | setembro | 2011 Araripina - Pernambuco Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas Conquista coletiva da terra no Semiárido 1 Assentados/as da Serra do Rancho Grande. Famílias têm cisterna de placas e cisterna calçadão no assentamento.

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O assentamento da Serra do Rancho Grande, situado a 30 quilômetros do município de Araripina, Sertão do Araripe d e P e r n a m b u c o , é o p r i m e i r o assentamento da cidade e uma conquista recente, fruto da luta coletiva de algumas famí l ias agr icu l toras. Antes, os trabalhadores e a s trabalhadoras rurais eram empregados, não tinham renda fixa e dependiam de bicos para sobreviver. A maioria das famílias residia em pequenas propriedades alugadas, com menos de três hectares, e também periferias da cidade. Seu Antônio Gonçalves, liderança comunitária na época, morava na comunidade do Sítio Saúna, onde já percebia a deficiência do acesso à terra na região. Em 2003, ele começou a participar de conselhos e outros espaços coletivos, na tentativa de buscar uma solução para o problema vigente.

Em 2001, alguns agricultores e agricultoras da comunidade perceberam a necessidade de se organizar para fortalecer a comunidade, e então fundaram a Associação do Sítio Torrinha e Saúna. O esforço coletivo foi direcionado para construção de projetos que pudessem beneficiar as famíl ias agr icul toras e contr ibuir com o desenvolvimento local. Em 2007 houve a possibilidade do grupo se organizar em um assentamento. Assim, alguns integrantes da associação, que possuíam interesse em conquistar sua própria terra, envolveram-se no projeto, juntaram-se em prol dessa conquista.

O novo grupo se desligou da associação e fundou a Associação dos Produtores do Assentamento da Serra do Rancho Grande, específica para desenvolver o projeto de acesso à terra, que na época foi encaminhado para o Fundo de Terras do Estado de Pernambuco (Funtepe), atualmente Instituto de Terras e Reforma Agrária de Pernambuco (Iterpe). No início, muitos não acreditavam que poderia dar certo, o que acarretou em várias desistências, dificultando a consolidação

Pernambuco

Ano 5 | nº 127 | setembro | 2011Araripina - Pernambuco

Boletim Informativo do Programa Uma Terra e Duas Águas

Conquista coletiva da terra no Semiárido

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Assentados/as da Serra do Rancho Grande.

Famílias têm cisterna de placas e cisterna calçadão no assentamento.

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do grupo. As dificuldades aos poucos começaram a ser superadas e a conquista do assentamento ocorreu em 2008, quando 13 famílias foram contempladas, cada uma com um lote que equivale a 25 hectares.

Pela falta de terra para produzir, muitas famílias não tinham na agricultura o seu ofício principal. Assim, a conquista do assentamento significou o desenvolvimento da produção de alimentos para os agricultores na região. “Eu já tenho um trabalho com agroecologia, já tenho uma variedade de produtos e até plantas medicinais, mas a maioria não tinha terra suficiente para produzir, e o assentamento veio em boa hora”, afirma Antônio Gonçalves, presidente da associação e assentado. Os assentados irão aproveitar as linhas de crédito disponibilizadas pelo governo para investir na agricultura em suas propriedades.

As famílias ainda estão no processo de transição, estão se mudando aos poucos e procurando adequar os seus compromissos à rotina do assentamento. Logo quando chegaram, as famílias tinham que percorrer cerca de sete quilômetros para conseguir água para beber e cozinhar. Para as atividades domésticas há um barreiro que fica numa distância de 6 quilômetros do assentamento. No início do ano, logo no mês de janeiro, a comunidade começou a ser assessorada pelo Centro de Habilitação e Apoio ao Agricultor do Araripe (Chapada), através do Projeto Dom Helder Câmara (PDHC). Sendo assim, em março foi feito um projeto para construção de 13 cisternas de placas, com capacidade para armazenar 16 mil litros de água da chuva para o consumo humano. No mês de julho as cisternas foram concluídas e as famílias hoje têm uma água de qualidade para beber e cozinhar.

A vontade de produzir alimentos para garantir a segurança alimentar das famílias fez com que os assentados/as buscassem alternativas para potencializar a produção. Uma das alternativas encontradas foi o diálogo com a comissão municipal da Articulação no Semi-Árido Brasileiro (ASA), com o intuito de acessarem o Programa Uma Terra e Duas Águas (P1+2), através da construção de 13 cisternas calçadão. A cisterna calçadão é uma tecnologia social de captação de 52 mil litros e água das chuvas, onde a água é voltada para o fortalecimento da produção de alimentos e criação de animais. As tecnologias foram concluídas no mês de agosto. A maioria das famílias já começou a plantar feijão, mandioca, caju, andu, manga, maracujá, goiaba, abacate, abacaxi, tomate, graviola, pinha, macaxeira, batata, cebolinha, coentro, pimentão, maçã e algumas plantas medicinais.

Atualmente as famílias estão enfrentando dificuldades em relação a falta de energia, de transporte escolar, além da ausência de estradas complementares “Quando cheguei aqui não tinha água, as casas nem estavam prontas direito, não tinha como plantar, a gente só tinha a terra, mas hoje tudo está mudando e o que a gente precisa aos poucos está chegando. O meu objetivo é investir na roça e tirar meu sustento de lá”, acredita um dos assentados, Francivaldo Ribeiro. O acesso à terra permitiu às famílias uma vida digna no Semiárido, a perspectiva é que as famílias desenvolvam alternativas de convivência com a realidade local, a partir da assistência técnica do PDHC. As famílias assentadas também fizeram um projeto para melhorar a infraestrutura das suas propriedades, mas estão aguardando a aprovação.

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A família observando o canteiro de hortaliças.