Características, dinâmica e história das paisagens de exceção do setor sul da Serra da...

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O território brasileiro abriga seis grandes domínios morfoclimáticos, que são divisões naturais, não lineares cartograficamente, com feições mais ou menos homogêneas de relevo, tipos de solos, condições climáticas e hidrológicas e vegetação. No entanto, no interior das áreas nucleares dos domínios existem “paisagens de exceção”, que condizem com feições mais típicas de outros domínios vizinhos. No setor sul da Serra da Mantiqueira e região bragantina do estado de São Paulo são encontrados fragmentos de campos cerrados, campos de altitude e Mata de Araucária, em meio à matriz predominantemente florestal do Bioma Mata Atlântica. Essas paisagens sofreram mudanças significativas por intervenção antrópica, desde a ocupação regional (desmatamento para a lavoura cafeeira, ocorrida principalmente no século XIX) até épocas mais recentes, devido à construção do reservatório Jaguari-Jacareí, o investimento no turismo e intervenções viárias. O objetivo deste estudo é reunir os conhecimentos sobre a evolução, as características, a dinâmica e a história da Mata de Araucária, dos campos de altitude e campos cerrados localizados na região de Joanópolis (SP), buscando interpretar a origem destes ecossistemas e sua distribuição atual no contexto paisagístico local. Para o desenvolvimento desta pesquisa foi necessário realizar uma vasta revisão bibliográfica, tendo em vista a multidisciplinaridade do tema. Tendo agrupado as experiências já produzidas sobre o assunto, realizou-se uma interpretação sobre estes dados, tendo como arcabouço metodológico a proposta em que se valoriza a observação e a contribuição de eventos, considerando a paisagem como um todo, extraindo as informações sistemáticas da estrutura delas e entendendo os processos morfodinâmicos e pedogenéticos para bem entender a fisiologia das paisagens abordadas. Entre os resultados obtidos estão a identificação e descrição de 3 fragmentos atuais de campos cerrados. Também foi realizada a revisão, integração e discussão de dados paleoecológicos das paisagens ímpares da região nos últimos 45 mil anos, bem como sua dinâmica e estrutura, além da evolução histórica. Este trabalho não é um fim, mas sim um meio para que as paisagens de exceção da região possam ser identificadas, mais bem estudadas e adequadamente conservadas, tendo em vista que representam um refúgio de biodiversidade local.

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    INSTITUTO SUPERIOR DE CINCIAS APLICADAS

    ENGENHARIA AMBIENTAL

    CARACTERSTICAS, DINMICA E HISTRIA DAS

    PAISAGENS DE EXCEO DO SETOR SUL DA SERRA DA

    MANTIQUEIRA, MUNICPIO DE JOANPOLIS, SP.

    Diego de Toledo Lima da Silva

    LIMEIRA SP

    2013

  • 2

    Diego de Toledo Lima da Silva

    CARACTERSTICAS, DINMICA E HISTRIA DAS PAISAGENS DE

    EXCEO DO SETOR SUL DA SERRA DA MANTIQUEIRA, MUNICPIO

    DE JOANPOLIS, SP.

    Trabalho de Concluso de Curso apresentado

    como exigncia para a obteno do ttulo de

    Bacharel em Engenharia Ambiental pelo

    Instituto Superior de Cincias Aplicadas, sob

    orientao da Prof. Dra. Luciana Savoi Rossi.

    LIMEIRA SP

    2013

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    Diego de Toledo Lima da Silva

    CARACTERSTICAS, DINMICA E HISTRIA DAS PAISAGENS DE

    EXCEO DO SETOR SUL DA SERRA DA MANTIQUEIRA, MUNICPIO

    DE JOANPOLIS, SP.

    Banca Examinadora

    ______________________________

    Prof. Dra. Luciana Savoi Rossi

    ______________________________

    Prof. Dr. Marcos Roberto Masson

    ______________________________

    Prof. Me. Juliano Gullo de Salvo

  • 2

    DEDICATRIA

    A minha linda esposa e companheira, aos meus pais e familiares, aos meus velhos

    camaradas, dedico este trabalho e este momento.

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    AGRADECIMENT O

    Seria injustia citar meia dzia de nomes para uma jornada feita de tanta gente, fruto de uma

    relao sincera, alegre e de respeito. Um caminho que resulta em fortes relaes sociais,

    tendo como elo a histria e a natureza. Agradeo a todos, sem exceo, pois cada um

    contribuiu de sua forma. Em especial, batalhadora Prof. Luciana Savoi Rossi, que orientou

    este trabalho e abraou o projeto desde o incio. Ao velho amigo Amilcar Donato Barletta,

    que viajou antes do combinado, mas que deixou sua extensa obra e que proporcionou o meu

    contato com os cerrados bragantinos. A todos os professores, que constroem o futuro desse

    pas. Serra da Mantiqueira, minha grande paixo!

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    EPGRAFE

    que resistissem! Eram barbaramente exterminados. E, assim,

    tribos inteiras desapareciam, como a erva dos campos desaparece, medida que o fogo

    caminha, consumindo-a (Auguste de Saint-Hilaire)

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    RESUMO

    O territrio brasileiro abriga seis grandes domnios morfoclimticos, que so divises

    naturais, no lineares cartograficamente, com feies mais ou menos homogneas de relevo,

    tipos de solos, condies climticas e hidrolgicas e vegetao. No entanto, no interior das

    , que condizem com feies

    mais tpicas de outros domnios vizinhos. No setor sul da Serra da Mantiqueira e regio

    bragantina do estado de So Paulo so encontrados fragmentos de campos cerrados, campos

    de altitude e Mata de Araucria, em meio matriz predominantemente florestal do Bioma

    Mata Atlntica. Essas paisagens sofreram mudanas significativas por interveno antrpica,

    desde a ocupao regional (desmatamento para a lavoura cafeeira, ocorrida principalmente no

    sculo XIX) at pocas mais recentes, devido construo do reservatrio Jaguari-Jacare, o

    investimento no turismo e intervenes virias. O objetivo deste estudo reunir os

    conhecimentos sobre a evoluo, as caractersticas, a dinmica e a histria da Mata de

    Araucria, dos campos de altitude e campos cerrados localizados na regio de Joanpolis

    (SP), buscando interpretar a origem destes ecossistemas e sua distribuio atual no contexto

    paisagstico local. Para o desenvolvimento desta pesquisa foi necessrio realizar uma vasta

    reviso bibliogrfica, tendo em vista a multidisciplinaridade do tema. Tendo agrupado as

    experincias j produzidas sobre o assunto, realizou-se uma interpretao sobre estes dados,

    tendo como arcabouo metodolgico a proposta em que se valoriza a observao e a

    contribuio de eventos, considerando a paisagem como um todo, extraindo as informaes

    sistemticas da estrutura delas e entendendo os processos morfodinmicos e pedogenticos

    para bem entender a fisiologia das paisagens abordadas. Entre os resultados obtidos esto a

    identificao e descrio de 3 fragmentos atuais de campos cerrados. Tambm foi realizada a

    reviso, integrao e discusso de dados paleoecolgicos das paisagens mpares da regio nos

    ltimos 45 mil anos, bem como sua dinmica e estrutura, alm da evoluo histrica. Este

    trabalho no um fim, mas sim um meio para que as paisagens de exceo da regio possam

    ser identificadas, mais bem estudadas e adequadamente conservadas, tendo em vista que

    representam um refgio de biodiversidade local.

    Palavras-chave: campos cerrados, Mata de Araucria e campos de altitude.

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    ABSTRACT

    Brazilian territory is home to six major morphoclimatic domains, which are natural

    divisions, nonlinear cartographically, with features more or less homogeneous relief, soil

    types, climatic and hydrological conditions and vegetation. However, within the nuclear areas

    domains. In the southern sector of the Serra da Mantiqueira and Bragantina region of So

    Paulo are found fragments of savanna, altitude fields and Araucaria Forest, amidst the forest

    matrix predominantly Atlantic Forest Biome. These landscapes have undergone significant

    changes by human intervention, since the occupation regional (clearing land for coffee

    plantations, which occurred mainly in the 19th century) until more recent times, due to the

    construction of the reservoir Jaguari-Jacarei, investment in tourism and road interventions.

    The aim of this study is to gather knowledge about the evolution, characteristics, dynamics

    and history of Araucaria Forest, the altitude fields and savanna located in the region of

    Joanpolis (SP), seeking to interpret the origin of these ecosystems and their current

    distribution in the context landscaped site. For the development of this research was necessary

    to perform an extensive literature review, in view of the multidisciplinary nature of the topic.

    Having grouped the experiences ever produced on the subject, held an interpretation of these

    data, with the methodological framework for the proposal that values the contribution of

    observation and events, considering the landscape as a whole, extracting the information of

    the systematic structure of these and understanding the morphodynamic processes and

    pedogenic well to understand the physiology of landscapes addressed. Among the results are

    the identification and description of three fragments of current savanna. We also carried out

    the review, discussion and integration of paleoecological from unique landscapes of the

    region over the past 45,000 years, as well as its structure and dynamics, and historical

    identified in the region, most well researched and properly maintained in order to represent a

    refuge for local biodiversity.

    Keywords: savanna, Araucaria Forest and altitude fields.

  • 7

    LISTA DE FIGURAS

    FIGURA 1 Domnios morfoclimticos brasileiros (Disponvel em:

    http://blog.educacaoadventista.org.br/professorthiago/index.php?op

    =post&idpost=2&titulo=Conhecendo+os+Dominios+Morfoclimati

    cos+do+Brasil. Acesso em: 08 Junho 2013)..................................21

    FIGURA 2 Vista interna de um fragmento de Floresta Ombrfila Densa Montana (Foto:

    Autor, 2013)....................................................................................................23

    FIGURA 3 Mapa de distribuio regional da vegetao natural, com a identificao da rea

    de estudo (Fonte: IBGE, 2004).........................................................................26

    FIGURA 4 Fragmento de Mata de Araucria localizado na Serra do Lopo (Foto: Autor,

    2013)...............................................................................................................27

    FIGURA 5 Trecho de campo de altitude localizado na Serra do Lopo (Foto: Autor,

    2013)...............................................................................................................32

    FIGURA 6 Fisionomia de um fragmento de campo cerrado, localizado no Bairro Paiol

    Queimado, Joanpolis (Foto: Autor, 2013)....................................................33

    FIGURA 7 Fragmento de campo cerrado bastante alterado, localizado no Bairro da Penha,

    Bragana Paulista (Foto: Autor, 2013).............................................................34

    FIGURA 8 Imagem de satlite com os principais caminhos percorridos neste trabalho

    (Fonte: Google Earth, 2013)..........................................................................44

    FIGURA 9 Localizao do municpio de Joanpolis/SP (Sem escala)................................45

    FIGURA 10 Distribuio dos locais com dados paleoecolgicos apresentados neste

    http://blog.educacaoadventista.org.br/professorthiago/index.php?op=post&idpost=2&titulo=Conhecendo+os+Dominios+Morfoclimaticos+do+Brasilhttp://blog.educacaoadventista.org.br/professorthiago/index.php?op=post&idpost=2&titulo=Conhecendo+os+Dominios+Morfoclimaticos+do+Brasilhttp://blog.educacaoadventista.org.br/professorthiago/index.php?op=post&idpost=2&titulo=Conhecendo+os+Dominios+Morfoclimaticos+do+Brasil
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    trabalho em relao rea de estudo. AS Aparados da Serra (RS); SFP -

    So Francisco de Paula (RS); CS - Cambar do Sul (RS); SRR Serra do

    Rio do Rastro (SC); MI Morro da Igreja (SC); SBV Serra da Boa Vista

    (SC); SCG Serra dos Campos Gerais (PR); BO Botucatu (SP); AE -

    rea de Estudo; MV Monte Verde (MG); CJ Campos do Jordo (SP);

    SB - Serra da Bocaina (SP); SC Serra da Caraa, Catas Altas (MG)

    (Fonte: Google Earth, 2013)......................................................................48

    FIGURA 11 Condies climticas atuais e paleoclimticas (Fonte: VIADANA, 2002)....54

    FIGURA 12 Linha de Araucrias que delimita a divisa entre os estados de SP e MG (Foto:

    Autor, 2012)....................................................................................................56

    FIGURA 13 Grafismo rupestre do Abrigo Fazenda do Mato, Extrema (Foto: Jean Marie

    Polli, 2011)......................................................................................................57

    FIGURA 14 Vertente sudeste da Serra do Lopo, vista do municpio de Joanpolis (Foto:

    Autor, 2013)..................................................................................................62

    FIGURA 15 Trajetos percorridos por Anthony Knivet no Brasil, reconstituio realizada

    por Teodoro Sampaio (Fonte: Extrado de KNIVET, 2008).......................63

    FIGURA 16 Variedade de xilopdio de um subarbusto tpico do campo cerrado (Foto:

    Autor, 2013)..................................................................................................73

    FIGURA 17 Fisionomia de campo limpo, fragmento de cerrado do Bairro da Dvida (Foto:

    Autor, 2013)....................................................................................................76

    FIGURA 18 Fotografia do antigo vale do rio Jacare, suas grandes plancies e campos

    (Fonte: Extrado de BARLETTA, 2000).....................................................81

  • 9

    FIGURA 19 Pastoreio em um dos fragmentos de campo de altitude da Serra do Lopo

    (Foto: Autor, 2013)......................................................................................83

    FIGURA 20 Intensa florescncia de gramneas ps-fogo, Bairro Paiol Queimado (Foto:

    KK. Alcovr, 2012)......................................................................................88

    FIGURA 21 Indivduo regenerante de T. ochracea (Foto: Autor, 2013).............................89

    FIGURA 22 Rebrota de indivduo de M. nictitans ps-fogo, Bairro do Paiol Queimado

    (Foto: Leonil Junior, 2012)..........................................................................90

    FIGURA 23 Indcio de queimadas anteriores na casca de um Barbatimo, fragmento de

    campo cerrado do Bairro do Pico (Foto: Autor, 2013)...................................91

    FIGURA 24 Adensamento de indivduos de B. dracunculifolia, Bairro do Pico (Foto:

    Autor, 2013)..................................................................................................92

    FIGURA 25 Viso de campo do avano da vegetao florestal sobre o campo cerrado

    (Foto: Autor, 2013)......................................................................................94

    FIGURA 26 Imagem de satlite de 10/11/2003 com a delimitao poligonal do fragmento

    de Floresta Ombrfila Densa Montana (FODM) em contato com o campo

    cerrado (CC), Bairro do Paiol Queimado, Joanpolis (Fonte: Google Earth,

    2013)...............................................................................................................95

    FIGURA 27 Imagem de satlite de 07/05/2012 com a delimitao poligonal do fragmento

    de Floresta Ombrfila Densa Montana (FODM) em contato com o campo

    cerrado (CC), Bairro do Paiol Queimado, Joanpolis (Fonte: Google Earth,

    2013)...............................................................................................................95

    FIGURA 28 Aerofoto oblqua de 16/01/1940 do Morro do Lopo, n 170, Tombo 2.635,

  • 10

    rea de ocorrncia natural dos campos de altitude em contato com a Floresta

    Ombrfila Densa Alto-Montana (Fonte: IGC Instituto Geogrfico e

    Cartogrfico)...................................................................................................97

    FIGURA 29 Imagem de satlite de 07/05/2012 do Morro do Lopo, demonstrando a

    expanso da Floresta Ombrfila Densa Alto-Montana sobre os campos de

    altitude (Fonte: Google Earth, 2013)...........................................................97

    FIGURA 30 Aerofoto oblqua de 16/01/1940 da Pedra do Guaraiva, n 171, Tombo 2.637,

    rea de ocorrncia natural dos campos de altitude em contato com a Floresta

    Ombrfila Densa Alto-Montana (Fonte: IGC Instituto Geogrfico e

    Cartogrfico)...................................................................................................98

    FIGURA 31 Imagem de satlite de 07/05/2012 da Pedra do Guaraiva, demonstrando a

    expanso da Floresta Ombrfila Densa Alto-Montana sobre os campos de

    altitude (Fonte: Google Earth, 2013).............................................................98

    FIGURA 32 Diagrama mostrando as diferenas nas mdias de comprimento dos gros de

    plen entre os tipos de vegetao campestre e a variabilidade dentro de um

    mesmo tipo de vegetao, sendo que cada coluna representa uma amostra

    (Fonte: BEHLING et al., 2009)...................................................................100

    FIGURA 33 Bosque de Araucrias no Bairro da Dvida (Foto: Autor, 2013)..................104

    FIGURA 34 Indivduo do gnero Eryngium em rea de transio (Foto: Autor, 2013)...106

    FIGURA 35 Indivduo longevo de A. angustifolia com 3,20 m. de DAP, no interior de

    fragmento florestal preservado no Bairro da Dvida (Foto: Autor, 2013)...108

  • 11

    LISTA DE TABELAS

    TABELA 1 - Algumas das espcies vegetais encontradas nos fragmentos florestais da regio

    (Fonte: SAAD et al., 2008)..............................................................................24

    TABELA 2 - Composio do estrato arbreo inferior da Floresta de Araucria (Fonte:

    KLEIN, 1975).................................................................................................28

    TABELA 3 Sntese da Era Cenozica (Fonte: Elaborado pelo autor).................................40

    TABELA 4 reas de campos cerrados identificadas no municpio de Joanpolis (SP).......70

    TABELA 5 Resultado da anlise qumica bsica realizada da amostragem de solo coletada

    no campo cerrado do Bairro do Paiol Queimado, Joanpolis

    (SP)..................................................................................................................71

    TABELA 6 Espcies identificadas no campo cerrado do Bairro Paiol Queimado, Joanpolis

    (SP)..................................................................................................................72

    TABELA 7 Resultado da anlise qumica bsica realizada da amostragem de solo coletada

    no campo cerrado do Bairro da Dvida, Joanpolis (SP)...............................75

    TABELA 8 Espcies identificadas no campo cerrado do Bairro da Dvida, Joanpolis

    (SP)..................................................................................................................75

    TABELA 9 Resultado da anlise qumica bsica realizada da amostragem de solo coletada

    no campo cerrado do Bairro do Pico, Joanpolis (SP)...................................77

    TABELA 10 Espcies identificadas no campo cerrado do Bairro do Pico, Joanpolis

    (SP)...............................................................................................................78

  • 12

    TABELA 11 Distribuio em famlias das espcies identificadas nos trs fragmentos de

    campo cerrado, municpio de Joanpolis (SP).............................................84

    TABELA 12 Distribuio das espcies por fragmento de campo cerrado, municpio de

    Joanpolis (SP).............................................................................................86

    TABELA 13 Distribuio das espcies identificadas nos trs fragmentos de campo cerrado

    por hbito, municpio de Joanpolis (SP).....................................................87

    TABELA 14 Comparao da rea de campo cerrado em contato com a Floresta Ombrfila

    Densa Montana, Bairro do Paiol Queimado, municpio de Joanpolis (SP),

    entre os anos de 2003 e 2012........................................................................96

  • 13

    SUMRIO

    1. INTRODUO...........................................................................................................15

    1.1. Justificativa........................................................................................................17

    2. OBJETIVOS................................................................................................................19

    2.1. Objetivo geral....................................................................................................19

    2.2. Objetivo especfico............................................................................................19

    3. FUNDAMENTAO TERICA.............................................................................19

    3.1. Ecologia de paisagem, domnios morfoclimticos e ectonos..........................19

    3.2. Bioma regional..................................................................................................22

    3.3. Paisagens de exceo.........................................................................................25

    3.3.1. Mata de Araucria.......................................................................................25

    3.3.2. Campos de altitude......................................................................................29

    3.3.3. Campos cerrados.........................................................................................33

    3.4. Unidades de Conservao locais.......................................................................35

    3.4.1. APA Piracicaba/Juqueri-Mirim (rea II)...................................................37

    3.4.2. APA do Sistema Cantareira........................................................................37

    3.5. Paleoecologia.....................................................................................................38

    3.5.1. A Grande Idade do Gelo.............................................................................39

    4. MATERIAL E MTODOS ........................................................................................42

    4.1. Pesquisa histrica..............................................................................................43

    4.2. Trabalhos de campo...........................................................................................43

    4.3. Descrio da localizao geogrfica da rea de estudo.....................................45

    4.4. Identificao das espcies vegetais...................................................................46

    4.5. Amostragem e anlise de solo dos campos cerrados.........................................46

    4.6. Interpretao das reas de contato entre unidades de paisagem........................46

    5. RESULTADOS E DISCUSSO................................................................................47

    5.1. Reconstituio paleoecolgica..........................................................................47

    5.2. Paleoecologia e suas evidncias........................................................................53

    5.3. timo Climtico e a ocupao pr-histrica da regio.....................................56

    5.4. Reconstituio histrica da paisagem................................................................60

  • 14

    5.5. Relatos histricos e a paisagem.........................................................................68

    5.6. Campos cerrados na paisagem atual..................................................................70

    5.6.1. Campo cerrado do Bairro Paiol Queimado.................................................70

    5.6.2. Campo cerrado do Bairro da Dvida..........................................................74

    5.6.3. Campo cerrado do Bairro do Pico...............................................................77

    5.7. Paisagens campestres.........................................................................................79

    5.8. Caractersticas climticas e edficas dos campos..............................................80

    5.9. A vegetao dos campos cerrados.....................................................................84

    5.10. O fogo e a influncia sobre os campos..............................................................87

    5.11. Expanso florestal sobre a paisagem campestre................................................94

    5.12. Origem dos campos cerrados e de altitude........................................................99

    5.13. Araucria: sucesso ecolgica e regenerao..................................................103

    6. CONSIDERAES FINAIS...................................................................................109

    7. REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS ....................................................................111

  • 15

    1. INTRODUO

    Os biogegrafos que estudaram os grandes mosaicos de floras e faunas dividiram o

    mundo em categorias espaciais que constituem os biorreinos um dos quais se denomina

    Neotropical (VIADANA, 2002). O domnio Neotropical alm de incluir a maior parte da

    Amrica do Sul, se estende ainda por toda a Amrica Central at a pennsula da Baja

    Califrnia. Apenas o extremo sudoeste da Amrica do Sul includo no Sub-Antrtico

    (HUECK, 1972).

    Para LOURENO (2005), as paisagens so objeto de estudo geogrfico desde a poca

    dos viajantes naturalistas do sculo XIX. Foram com as expedies de Alexander von

    Humboldt pela Amrica do Sul que elas foram se transformando em objeto de estudo

    cientfico e da surgir a Geografia Moderna. Segundo PASSOS (2003), um dos primeiros

    parmetros que serviu para o estudo cientfico de paisagens foi a noo de homogeneidade e

    heterogeneidade da natureza.

    Os primeiros viajantes europeus, os chamados responsveis pelo

    estudo e caracterizao do mosaico vegetacional brasileiro. Dentre eles, destaca-se o botnico

    austraco Carl Friedrich Philipp von Martius (1794-1868). Martius explorou regies ainda

    pouco conhecidas, percorrendo mais de dez mil quilmetros em trs anos, inventariando

    informaes no campo sobre a botnica, geologia, antropologia, etc. (HAUCK, 2005).

    A experincia geogrfica na descrio e classificao de paisagens sofreu grandes

    transformaes, j que este objeto de estudo atravessou sculos e, durante este tempo, a viso

    que a sociedade atual tem da natureza sofreu grandes mudanas. natural que existam muitos

    conceitos sobre este objeto e como elas so classificadas (HAUCK, 2009a).

    O estudo atual contempla o reconhecimento das paisagens brasileiras por domnios

    morfoclimticos ( 1977; 2003). Tal classificao uma interpretao da

    espacialidade e homogeneidade da natureza numa viso fisiolgica dos Geossistemas

    Seguindo a definio de METZGER (2003), a paisagem caracterizada

    como uma unidade heterognea composta por um mosaico de unidades interativas ou por um

    gradiente de variaes, que pode ser observada em micro ou macro-escala.

    A paisagem, quando se apresenta sob forma de mosaico, composta por fragmentos

    (manchas ou unidades), corredores, bordas, entre outros componentes estruturais, interagindo

  • 16

    com uma rea maior, que a matriz. A estrutura da paisagem pode ser definida pela rea,

    forma e disposio espacial das unidades que a compe, diferindo tambm fundamentalmente

    pela origem e dinmica. A origem dos fragmentos difere de acordo com regimes de distrbios

    no fragmento e/ou na matriz, distribuio natural de recursos ambientais, espcies exticas

    introduzidas e pelo tempo (FORMAN & GODRON, 1981).

    Cada tipo de componente da paisagem, como unidades de recobrimento e uso do

    territrio, ecossistemas ou tipos de vegetao, caracteriza uma unidade (METZGER, 2001;

    2003). Uma unidade da relativamente homogneas, pois,

    assim como na definio de paisagem, dependem do observador, ou seja, se micro ou macro-

    escala. Os nveis abrangidos na macro-escala permitem realizar uma classificao de unidades

    com limites definidos por componentes abiticos (por ex. geomorfologia) e, com

    correspondentes biticos (vegetao) como indicadores da estrutura da paisagem. As unidades

    de paisagem so os principais tipos de componentes da paisagem, tm limites definidos e, por

    esse motivo so mais facilmente operacionalizveis para o manejo (GOMES, 2009).

    Conforme HAUCK (2005), o territrio brasileiro abriga seis grandes domnios

    morfoclimticos que so divises naturais, no lineares cartograficamente, com feies mais

    ou menos homogneas de relevo, tipos de solos, condies climticas e hidrolgicas e

    vegetao. No entanto, no interior das reas nucleares dos domnios, existem paisagens de

    exceo que condizem com feies mais tpicas de outros domnios vizinhos.

    Segundo os estudos geomorfolgicos de ALMEIDA (1974), o municpio de

    Joanpolis (SP) situa-se no limite da Serra da Mantiqueira com a Zona Cristalina do Norte, na

    provncia geomorfolgica do Planalto Atlntico, na zona da Serra da Mantiqueira, Parte

    Ocidental.

    O Complexo da Serra da Mantiqueira estende-se pelos estados de So Paulo, Minas

    Gerais, Rio de Janeiro e Esprito Santo. Constitui um importante centro de conservao e de

    diversidade de espcies da flora e da fauna. Trabalhos com descries florsticas e estruturais

    na Serra da Mantiqueira ainda so poucos. A despeito da sua importncia florstica e

    ecolgica, ela ainda pouco conhecida (YAMAMOTO, 2009). uma das maiores cadeias de

    montanhas do leste sul-americano e ocupa uma extensa rea da regio Sudeste do Brasil,

    sendo um dos principais ncleos da Mata Atlntica brasileira (RIZZINI, 1997).

    Apresenta diversidade gentica e especfica considervel, possivelmente por estar, em

  • 17

    muitas pores, posicionada em reas de transio entre diferentes formaes e tambm por

    apresentar regies, conforme designado por VELOSO et al. (1991), de refgios vegetacionais

    (campos de altitude e campos rupestres), ambas com elevado ndice de endemismo (LIMA,

    2008).

    Este trabalho prope em fazer um esforo no reconhecimento das paisagens de

    exceo existentes no setor sul da Serra da Mantiqueira, municpio de Joanpolis (SP),

    reunindo e analisando pesquisas e conhecimentos sobre a evoluo da paisagem local. Para

    tanto, a abordagem ser apoiada em evidncias indiretas, como a interpretao de paisagens

    mpares (campos cerrados, campos de altitude e Mata de Araucria) da regio, subsidiados

    por trabalhos de campo; e tambm diretas, como as pesquisas e estudos palinolgicos com

    dataes - produzidos e publicados por diversos pesquisadores, alm de interpretaes

    paleoecolgicas.

    1.1. Justificativa

    A alterao de ecossistemas gerada pelas aes antrpicas tem provocado perda de

    biodiversidade, falta de recursos, fome, xodo rural e misria. Desde o incio da colonizao

    do Brasil o homem tem tratado a natureza de forma insustentvel, como fonte inesgotvel de

    riquezas e recursos, explorando-a ou destruindo-a, e esse comportamento est intimamente

    relacionado ao desenvolvimento econmico do pas (MACHADO, 2010). O grande e

    crescente nmero de seres humanos combinados com os rpidos avanos do desenvolvimento

    tecnolgico provoca extensos danos aos ecossistemas, tornando-os degradados (CAIRNS JR.,

    1997).

    A regio em estudo constitui uma rea de alta importncia biolgica e ambiental,

    estabelecida no corredor Cantareira-Mantiqueira, alm de estar localizada no Sistema

    Cantareira, o maior manancial de abastecimento pblico da Grande So Paulo. Os processos

    de ocupao antrpica e fragmentao florestal ocasionaram impactos e perda de

    biodiversidade, sendo necessrias aes para a reverso do quadro, bem como o

    estabelecimento de programas alternativos pela conservao e recuperao da biodiversidade

    (DA SILVA, 2010).

    Observa-se uma crescente ocupao do solo na regio, em decorrncia do

  • 18

    parcelamento de diversas propriedades, com a criao de chcaras para atividade de lazer.

    Pela proximidade de grandes cidades, como So Paulo e Campinas, tem sido foco de turismo.

    Esse crescimento vem trazendo srios impactos e afetando uma rea de grande importncia de

    conservao ambiental, devido existncia de uma densa rede hdrica, com presena de

    inmeros crregos e nascentes de guas e importantes remanescentes florestais. essencial

    no s preservar como tambm estudar reas nessas condies (YAMAMOTO, 2009).

    A rea sofreu mudanas significativas, por interveno antrpica, desde a sua

    ocupao (desmatamento para a lavoura cafeeira, ocorrida principalmente no sculo XIX) at

    pocas mais recentes, devido construo do reservatrio Jaguari-Jacare, o investimento no

    turismo de fim-de-semana e intervenes virias. Apesar de no se tratar de uma rea

    densamente povoada, a ocupao e o uso da terra que ocorrem na regio vm causando

    mudanas significativas nos sistemas naturais do local, tais como a ampliao dos processos

    erosivos (SOARES, 2008). Registra-se que o desmatamento intenso ocorreu no sculo XIX

    para abrigar as plantaes de caf, posteriormente, devido crise cafeeira de meados do

    sculo XX, a atividade desenvolvida foi a pastagem, uma vez que as altas declividades no

    permitiam a agricultura mecanizada (SAAD et al., 2008).

    Portanto, devido intensa ocupao do solo e explorao econmica direta e/ou

    indireta dos recursos naturais, o conhecimento cientfico e tcnico da situao da vegetao

    original da regio; bem como sua relativa dinmica de evoluo em tempos geolgicos

    recentes so fundamentais para a adoo de prticas conservacionistas e de manejo adequadas

    daquilo que restou da biota original.

    Soma-se o fato que as paisagens de exceo constituem formaes que

    tradicionalmente foram utilizadas pelas populaes humanas, sem, contudo associar-se os

    riscos inerentes. Os nichos ecolgicos estabelecidos nestas reas so nicos. Porm,

    culturalmente no so vistos como detentores de biodiversidade e no se considera a

    importncia destes ambientes como fragmentos de ambientes naturais, muitas vezes, sendo

    consideradas paisagens exticas e invasoras, em meio ao ambiente predominantemente

    florestal da regio.

  • 19

    2. OBJETIVOS

    2.1. Objetivo geral

    Reunir os conhecimentos sobre a evoluo, as caractersticas, a dinmica e a histria

    das paisagens de exceo localizadas na regio de Joanpolis (SP), buscando interpretar a

    origem destes ecossistemas e sua distribuio atual no contexto paisagstico local.

    2.2. Objetivos especficos

    - Revisar e discutir os conhecimentos paleoecolgicos das paisagens da regio e sua

    evoluo fitogeogrfica;

    - Interpretar as origens das paisagens de exceo da regio e sua conexo com

    paisagens de outras regies;

    - Aplicar tcnicas de ecologia, botnica e ecologia de paisagem, analisando a

    ocorrncia atual destas unidades de paisagem mpares, bem como a reconstituio indireta das

    mesmas utilizando-se de relatos histricos sobre sua dinmica.

    3. FUNDAMENTAO TERICA

    3.1. Ecologia de paisagem, domnios morfoclimticos e ectonos

    Enquanto a ecologia tradicional abrange o estudo das inter-relaes verticais entre

    plantas, animais, ar, gua e solo dentro de uma unidade espacial homognea, a ecologia de

    paisagem, por sua vez, traz um novo enfoque, centrando-se no estudo das inter-relaes

    horizontais entre as diversas unidades espaciais (RAVAN & ROY, 1995).

    Na prtica, a ecologia de paisagem combina abordagem horizontal do gegrafo,

    atravs do exame das inter-relaes espaciais de um fenmeno natural, com a abordagem

    vertical de um ecologista. Por isso, ela se desenvolveu a partir de uma interface comum entre

    as duas cincias, cujo tema central conhecido como a paisagem (FILHO, 1998).

    BERTRAND (1968) define a paisagem como sendo:

  • 20

    Uma determinada poro do espao que resulta

    da combinao dinmica dos elementos fsicos,

    biolgicos e antrpicos, os quais interagindo

    dialeticamente uns sobre os outros formam um

    conjunto nico e indissocivel em perptua

    De fato, a evoluo de uma paisagem resulta de trs mecanismos operando em

    diferentes escalas temporais: processos geomorfolgicos/geolgicos ocorrendo durante um

    longo tempo, padres de colonizao de organismos se desenvolvendo em uma escala mdia

    de tempo e intermediados, por vezes, por rpidas perturbaes em ecossistemas locais

    (FORMAN & GODRON, 1986).

    A combinao destes trs mecanismos resulta em uma paisagem terrestre, composta

    por diferentes formas de relevo, tipos de vegetao e usos do solo, organizados em um arranjo

    ou mosaico de retalhos ou manchas, que formam um agrupamento nico de ecossistemas em

    interao (FILHO, 1998).

    A observao, a percepo e as mltiplas compreenses/interpretaes da paisagem

    sempre so feitas pelas lentes ou filtros da formao cientfica e da cultura do observador. E

    justamente por essa razo, por ser uma unidade visual, a paisagem no pode ser definida de

    forma universal, sem considerar a lente ou o filtro do observador (METZGER, 2001).

    Dessa forma, as observaes dependem apenas da sensibilidade e dos pressupostos

    tericos do pesquisador que faz relaes entre os fatores ambientais, formulando vrias

    hipteses. A grande vantagem dessa abordagem a concepo integral e sinttica da realidade

    na escala da paisagem (MARTINS et al., 2004).

    Em contraste com muitos ramos da ecologia, fatores antropognicos so

    explicitamente includos no reconhecimento do potencial do homem em influenciar a

    estrutura e funo da paisagem. Portanto, o estudo da ecologia de paisagem se concentra no

    somente nas dimenses biolgicas e fsicas de um ambiente, mas tambm nos aspectos

    histricos, culturais, socioeconmicos da ecologia humana, que se encontram conectados aos

    diferentes usos do solo (FILHO, 1998).

    Por isso, do ponto de vista etimolgico, paisagem (ou landscape) engloba a descrio

    das caractersticas estticas e dinmicas de determinada regio, nos aspectos naturais e

    culturais (MARTINS et al., 2004).

  • 21

    Seguindo a proposta utilizada neste trabalho, a classificao desenvolvida por

    divide o territrio brasileiro em seis domnios morfoclimticos:

    Pradarias Mistas; Planalto das Araucrias; Mares de Morros Florestados; Caatinga; Floresta

    Amaznica; e Cerrados (Figura 1).

    FIGURA 1 Domnios morfoclimticos brasileiros (Disponvel em:

    http://blog.educacaoadventista.org.br/professorthiago/index.php?op=post&idpost=2&titulo=Conhe

    cendo+os+Dominios+Morfoclimaticos+do+Brasil. Acesso em: 08 Junho 2013).

    No entanto, os seis domnios morfoclimticos reconhecidos no Brasil no apresentam

    uma delimitao linear e clara. So delimitados por meio de reas de transio, em que

    elementos tpicos de um ou outro domnio se alternam de acordo com as condies locais, que

    http://blog.educacaoadventista.org.br/professorthiago/index.php?op=post&idpost=2&titulo=Conhecendo+os+Dominios+Morfoclimaticos+do+Brasilhttp://blog.educacaoadventista.org.br/professorthiago/index.php?op=post&idpost=2&titulo=Conhecendo+os+Dominios+Morfoclimaticos+do+Brasil
  • 22

    favorecem ou desfavorecem a formao de um ou outro domnio (HAUCK, 2009a).

    Estas reas de transio apresentam no somente as caractersticas dos dois domnios

    morfoclimticos vizinhos, mas muitas vezes a combinao deles (HAUCK, 2009a), podendo

    ser interpretado como uma terceira paisagem. As faixas de transio tambm podem ser

    conceituadas como ectonos, que, segundo ODUM (1988), a transio entre duas ou mais

    comunidades diferentes, sendo uma zona de unio ou um cinturo de tenso.

    3.2. Bioma regional

    No estado de So Paulo, a floresta tropical Atlntica (conhecida genericamente como

    Mata Atlntica) cobria uma rea de 16.918.918 ha, ou seja, 68% da rea territorial do estado.

    Atualmente est restrita a aproximadamente 15,78% de sua extenso original (SOS MATA

    ATLNTICA & INPE, 2011).

    Conforme o Mapa de Distribuio Regional de Vegetao Natural (IBGE, 2004), a

    rea de estudo englobada pelo Domnio da Floresta Ombrfila Densa (Figura 2). Este tipo

    de vegetao caracterizado por fanerfitos, justamente pelas subformas de vida macro e

    mesofanerfitos, alm de lianas e epfitas em abundncia, que a diferenciam das outras classes

    de formaes. Porm, a caracterstica ecolgica principal reside nos ambientes ombrfilos,

    et al., 1991).

  • 23

    FIGURA 2 Vista interna de um fragmento de Floresta Ombrfila Densa Montana (Foto: Autor, 2013).

    Ocorre sob um clima ombrfilo sem perodo biologicamente seco durante o ano e,

    excepcionalmente, com at 2 meses de umidade escassa. Assim mesmo, quando isso

    acontece, h uma grande umidade concentrada nos ambientes dissecados das serras (IBGE,

    2004).

    No setor sul da Serra da Mantiqueira, a Floresta Ombrfila Densa pode ser subdividida

    nas Formaes Aluvial, Montana e Alto-Montana. A Formao Aluvial no varia

    topograficamente e apresenta os ambientes repetitivos, dentro dos terraos aluviais dos cursos

    entre 500 m. e 1.500 m. de altitude; enquanto a Formao Alto-Montana est situada acima de

    1.500 m. de altitude (VELOSO et al., 1991).

    Conforme SO PAULO (2009), os fragmentos florestais da Mata Atlntica cobrem

    25,4% da rea de estudo, sendo 9.504 ha de Floresta Ombrfila Densa (Mata Atlntica sensu

    lato) e apenas 5 ha de Floresta Ombrfila Mista (Mata de Araucria).

  • 24

    As espcies encontradas nos fragmentos florestais da regio esto apresentadas na

    Tabela 1.

    TABELA 1 Algumas das espcies vegetais encontradas nos fragmentos florestais da regio (Fonte: SAAD et

    al., 2008). Famlia Botnica Espcie/Gnero

    Vochysiaceae Vochysia tucanorum

    Euphorbiaceae Alchornea triplinervia

    Euphorbiaceae Joannesia princeps

    Lecythidaceae Cariniana estrellensis

    Phytolaccaceae Gallesia integriflia

    Meliaceae Cedrela fissilis

    Lauraceae Ocotea spp.

    Lauraceae Nectandra spp.

    Cyatheaceae Cyathea spp.

    Cyatheaceae Alsophila spp.

    Dicksoniaceae Dicksonia sellowiana

    Bromeliaceae Vriesia spp.

    Bromeliaceae Aechmea spp.

    Bromeliaceae Nidularium spp.

    Bromeliaceae Alcantarea imperialis

    Poaceae Chusquea mimosa

    No interior das florestas da regio, o solo de fertilidade mdia a baixa, que se

    mantm pela decomposio acelerada de matria orgnica (devido a fatores climticos como a

    temperatura e umidade, alm da intensa atividade microbiolgica) proveniente dos restos

    vegetais (serrapilheira) que caem no solo (processo de ciclagem de nutrientes) (DA SILVA,

    2010). Segundo o CETEC (2000), na rea de estudo ocorrem os tipos de solo: Latossolo

    Vermelho-Amarelo distrfico (LVAd), Argissolo Vermelho-Amarelo distrfico (PVAd) e

    Cambissolo Hplico distrfico (CXd). BISTRICHI (2001) aponta a ocorrncia pontual de

    Gleissolo Hplico (GX) e Neossolo Litlico (RL).

    Segundo DA SILVA (2010), a fauna da Serra da Mantiqueira muito rica em espcies

    endmicas, muitas delas em risco ou ameaadas de extino. Algumas espcies da fauna

    identificadas na rea so: Ona-parda (Puma concolor); Lobo-guar (Chrysocyon

    brachyurus); Sabi-ferreiro (Turdus subalaris); Macaco-sau (Callicebus nigrifrons) e Cobra-

  • 25

    jararaca (Bothrops jararaca).

    3.3. Paisagens de exceo

    Esta regio apresenta diversas fisionomias vegetacionais segundo a classificao de

    HUECK (1972), tais como: florestas pluviais, florestas de araucrias, florestas de

    Podocarpus, campos de altitude e afloramentos rochosos. Devido aos considerveis desnveis

    de altitude e sua grande extenso, h uma grande variao fsica e ambiental que resulta em

    grande variedade na fisionomia da vegetao, com diferentes graus de diversidade, riqueza e

    composio florstica (GATTO et al., 1983 apud YAMAMOTO, 2009). Na regio bragantina,

    as paisagens mpares que tm chamado ateno dos pesquisadores so a Mata de Araucria,

    os campos de altitude e os campos cerrados.

    3.3.1. Mata de Araucria

    Segundo BEHLING (2006), a cobertura vegetacional da Mata com Araucria poca

    do incio da colonizao europeia foi estimada, com base em dados botnicos, em 200.000

    km. Ocorria de forma abundante nos estados do Paran, Santa Catarina e Rio Grande do Sul

    e de modo esparso em So Paulo, Minas Gerais e Rio de Janeiro.

    Para RIBEIRO et al. (2009), essa tipologia florestal foi reduzida a 12,6% da rea de

    ocorrncia original (Figura 3).

  • 26

    FIGURA 3 Mapa de distribuio regional da vegetao natural, com a identificao da rea de estudo

    (Fonte: IBGE, 2004).

    Sobre a vegetao que existia na regio, um dos poucos documentos histricos sobre o

    tema encontrado em MARTINS & LAURITO (1943), que citam a viagem dos naturalistas

    alemes von Spix e von Martius capitania de So Paulo em 1817 e que chegaram ao Morro

    do Lopo, regio noroeste e s margens do local da atual represa Jaguari/Jacare. Do relato,

    pode-se inferir que, adicionalmente a outros tipos de vegetao, a regio do entorno da atual

    represa, pertencia ao domnio da Floresta Ombrfila Mista (Floresta de Araucria). Tal

    afirmao apoiada pela ocorrncia atual de vrios fragmentos de floresta de Araucrias nesta

  • 27

    e em outras reas montanhosas da regio bragantina, em altitudes superiores a 900 m. de

    elevao (SAAD et al., 2008).

    Estudando esta Serra (do Lopo), localizada no extremo sul da Serra da Mantiqueira,

    entre os municpios de Joanpolis e Extrema (MG), YAMAMOTO (2009) confirma que a

    vegetao da Serra tambm poderia ser classificada como Floresta Ombrfila Mista Alto-

    Montana, tambm chamada Mata de Araucria (Figura 4), devido presena de Araucaria

    angustifolia.

    FIGURA 4 Fragmento de Mata de Araucria localizado na Serra do Lopo (Foto: Autor, 2013).

    Ainda segundo a autora, apesar de no haver populaes representativas de Araucria

    na Serra do Lopo, atualmente, alguns pouqussimos indivduos ainda so encontrados no meio

    da vegetao, principalmente indivduos jovens. Em conversas com moradores antigos do

    local, ouviu-se a descrio da existncia de uma floresta bem desenvolvida de Araucrias,

    exterminada pela extrao macia da madeira (YAMAMOTO, 2009).

  • 28

    A Floresta Ombrfila Mista (Mata de Araucria) exclusiva do Planalto Meridional

    Brasileiro, com disjunes em reas elevadas das Serras do Mar e da Mantiqueira. Ocorre sob

    um clima ombrfilo, com temperatura mdia de 18 C, mas com alguns meses bastante frios,

    ou seja, 3 a 6 meses com mdias inferiores aos 15 C (IBGE, 2004). As condies climticas

    da Mata de Araucria caracterizam-se por alto ndice de chuvas e por temperaturas

    moderadas, amide baixas no inverno (HUECK, 1972).

    Ocorre de forma disjunta dentro do estado de So Paulo, estendendo-se nos morros da

    Serra da Mantiqueira, altos da Serra do Mar e demais elevaes. No sul do estado, esse tipo

    de formao florestal aparece em altitudes mais baixas, porm quase sempre acima de 900 m.

    de altitude, sendo favorecida pelo clima mais frio que domina a regio (CRESTANA et al.,

    2006).

    Apresenta a A. angustifolia como espcie caracterizadora, com uma estrutura bastante

    variada, constituda por adensamentos onde se destacam Ocotea e Nectandra e agrupamentos

    pouco desenvolvidos com predomnio de Podocarpus lambertii (Pinheirinho), Drimys

    brasiliensis (Casca- Capsicodendron dinisii (Pimenteira) e Ilex spp. (Erva-mate,

    Canas e Congonhas) (IBGE, 2004).

    KLEIN (1979) acrescenta que, nesta formao, a Dicksonia sellowiana e outra

    Ciatecea, Nephelea setosa, fazem parte do estrato arbustivo, por vezes se tornando muito

    abundantes, sobretudo no incio das encostas.

    O estrato arbreo inferior da Floresta de Araucria altamente diversificado,

    composto principalmente pelas espcies:

    TABELA 2 - Composio do estrato arbreo inferior da Floresta de Araucria (Fonte: KLEIN, 1975).

    Famlia Botnica Espcie

    Caesalpiniaceae Apuleia leiocarpa

    Apocynaceae Aspidosperma olivaceum

    Apocynaceae Aspidosperma polyneuron

    Salicaceae Casearia decandra

    Meliaceae Cedrela fissilis

    Caesalpiniaceae Copaifera trapezifolia

    Clethraceae Clethra scabra

    Winteraceae Drimys brasiliensis

    Aquifoliaceae Ilex paraguariensis

    Aquifoliaceae Ilex theezans

  • 29

    CONTINUAO TABELA 2

    Famlia Botnica Espcie

    Anacardiaceae Lithraea brasiliensis

    Poaceae Merostachys multiramea

    Myrtaceae Myrciaria delicatula

    Lauraceae Ocotea porosa

    Lauraceae Ocotea pulchella

    Mimosaceae Parapiptadenia rgida

    Podocarpaceae Podocarpus lambertii

    Podocarpaceae Podocarpus sellowii

    Myrtaceae Siphoneugena reitzii

    Elaeocarpaceae Sloanea monosperma

    Styracaceae Styrax leprosus

    Symplocaceae Symplocos celastrina

    Symplocaceae Symplocos itatiaiae

    Symplocaceae Symplocos nitidifolia

    Cunoniaceae Weinmannia paulliniifolia

    Na regio bragantina, a Mata de Araucria pode ser classificada em 3 tipos de

    e 900 at

    mais ou menos 1.000 m. de altitude, e Alto-Montana, acima de 1.000 m. de altitude

    (VELOSO et al., 1991).

    3.3.2. Campos de altitude

    Nas ltimas dcadas, a flora das montanhas do Leste do Brasil tem atrado a ateno

    de diversos botnicos e muitos estudos sobre taxonomia vegetal e fitogeografia vm sendo

    realizados nessas reas altas cobertas pelas vegetaes dos campos rupestres e campos de

    altitude. Estas paisagens ocorrem nas partes mais elevadas dos trs principais sistemas

    orogrficos desta regio: Cadeia do Espinhao, Serra da Mantiqueira e Serra do Mar, sendo

    reconhecidos como importantes centros de endemismo da flora neotropical

    (VASCONCELOS, 2011).

    Os campos de altitude esto inseridos na complexidade do Bioma Mata Atlntica e

    ocorrem nas pores mais elevadas da Serra do Mar, nos estados de Santa Catarina, Paran,

  • 30

    So Paulo e Rio de Janeiro, e da Serra da Mantiqueira, com rea total de distribuio estimada

    em 350 km (SAFFORD, 1999a).

    Comportam formaes vegetais herbceas e arbustivas de grande beleza cnica.

    Apesar de ser uma paisagem , homognea, e aparentemente sem grandes

    mudanas, elas so muito biodiversas, pois estes campos so formados por milhares de

    espcies vegetais, principalmente da famlia das Poaceae, Asteraceae e Cyperaceae (HAUCK,

    2009b). So tpicos dos pontos mais elevados de montanhas que se soergueram

    principalmente durante o Tercirio (Serras do Mar e da Mantiqueira), estando geralmente

    situados acima de 1.500 m. de altitude e associados a rochas gneas ou metamrficas, como

    granito e gnaisse (VASCONCELOS, 2011).

    FREITAS (2002) expe que os campos de altitude so formados por espcies de ervas

    e arbustos de diversas famlias e tambm por arvoretas, as quais se encontram distribudas em

    estratos contnuos de gramneas e ciperceas. Esta vegetao apresenta caractersticas muito

    peculiares, tais como flora rica, numerosos casos de endemismo, muitas espcies com

    populaes pequenas, conexes biogeogrficas com habitats sub (alpinos) dos Andes e

    condies climticas adversas para uma rea tropical.

    Para MOCOCHINSKI & SCHEER (2008):

    -se em

    condies ambientais peculiares, decorrentes dos

    efeitos da altitude e do relevo acidentado. A

    altitude elevada acarreta temperaturas mais

    baixas e ventos mais velozes. Paralelamente, o

    relevo acidentado origina solos rasos e forma um

    mosaico de microhabitats. Essas condies,

    distintas do contexto do entorno, podem ocasionar

    Pela dificuldade de acesso e adversidade das condies ambientais, os campos de

    altitude permaneceram, em grande parte, a salvo dos processos de converso dos ambientes

    naturais para usos antrpicos. Dessa forma, consistem em uma das raras amostras da natureza

    bem conservada nas regies Sul e Sudeste do Brasil. Entretanto, sua integridade vem sendo

    ameaada por processos como a contaminao biolgica e a presso do turismo

    (MOCOCHINSKI & SCHEER, 2008).

    Segundo DE OLIVEIRA (2012), entre as espcies mais significativas dessa flora esto

  • 31

    raras bromlias, orqudeas, as coloridas aucenas e a conhecida planta denominada Rainha-

    do-abismo, entre tantas outras. MARTINELLI (1989) estudando seis trechos de ocorrncia

    dos campos de altitude na Serra do Mar e da Mantiqueira, no Sudeste do Brasil, detectou

    taxas de endemismos variando entre 12 e 22% em cada rea. Em uma anlise de endemismos

    restritos, ou seja, espcies ocorrentes apenas na rea estudada, o mesmo autor encontrou taxas

    entre 2 e 11%, sendo este ltimo valor medido na regio do Planalto de Itatiaia.

    encontram-se na Serra da Mantiqueira e na Serra do Mar, dentro do domnio da Mata

    Atlntica. Na Mantiqueira predominam os granitos e os gnaisses, e rochas de grau

    metamrfico intermedirio, como migmatitos.

    Segundo SAFFORD (1999a), a fisionomia mais frequentemente encontrada a de

    plats relativamente extensos, compostos por mosaicos de arbustos, especialmente espcies

    da famlia Asteraceae como Baccharis, Vernonia, vrios representantes da tribo Eupatorieae,

    Melastomataceae como Tibouchina e Leandra, alm de espcies da famlia Myrtaceae e

    pequenas rvores, como por exemplo, Escallonia (Convolvulaceae), Weinmannia

    (Cunoniaceae), Myrsine (Myrsinaceae), Symplocos (Symplocaceae), Maytenus (Celastraceae)

    e Roupala (Proteaceae), inseridos em uma matriz de touceiras de gramneas (por exemplo,

    Cortaderia, Calamagrotis e Andropogon) e bambus (Chusquea spp.), com esparsas ervas e

    pteridfitas.

    Nos afloramentos rochosos, a vegetao composta por espcies epilticas, ou seja,

    diretamente assentadas sobre a rocha nua, e espcies de Cyperaceae e Velloziaceae tidas

    como formadoras de tapetes de monocotiledneas (BARTHLOTT et al., 1993 apud

    BENITES et al., 2003). Essas espcies propiciam o suporte para os prximos passos

    sucessionais, principalmente por aumentar a heterogeneidade do ambiente em termos de

    disponibilidade de gua e suporte mecnico (MEIRELLES, 1996). Ocupando

    -se vrias espcies gefitas e terfitas. As famlias

    sempre bem representadas so Orchidaceae, Asteraceae, Bromeliaceae, Melastomataceae e

    Cyperaceae (CAIAFA, 2002).

    DE OLIVEIRA (2012) relatando os campos de altitude da Montanha do Leitesol,

    Bragana Paulista (SP), aponta como plantas endmicas o Amarylis ou Aucena (gnero

    Hippeastrum, famlia Amaryllidaceae), bromlias do gnero Tillandsia (nos paredes

  • 32

    rochosos existentes), alm das Bromlias Antiacantha e Dyckia.

    Na Serra do Lopo, YAMAMOTO (2009) destaca a ocorrncia de vrios afloramentos

    rochosos, que ocorrem entremeando a vegetao circundante, e de campos de altitude (Figura

    5), alm da formao florestal.

    FIGURA 5 Trecho de campo de altitude localizado na Serra do Lopo (Foto: Autor, 2013).

    A autora tambm lista as espcies herbceas, arbustivas, arbreas (menores que 3

    metros espcies tpicas dos campos de altitude) e trepadeiras ocorrentes na Serra do Lopo e

    imediaes, com a identificao de 535 espcies distribudas em 68 famlias. Analisando a

    listagem, observa-se a predominncia de espcies da famlia Asteraceae 91 espcies

    (17,0%), seguido de Poaceae 47 espcies (8,8%), Orchidaceae 40 espcies (7,5%) e

    Solanaceae 28 espcies (5,2%). Outras famlias com espcies frequentes so: Rubiaceae

    (4,3%), Fabaceae (4,1%), Cyperaceae (3,6%) e Melastomataceae (3,2%) (YAMAMOTO,

    2009).

  • 33

    3.3.3. Campos cerrados

    O domnio de vegetao do Cerrado ocupava uma rea de aproximadamente 79.618,8

    km do Estado de So Paulo, ou seja, 32% de sua rea territorial (IBGE, 2004), restando nos

    dias atuais apenas 8,5% de sua rea original (METZGER & RODRIGUES, 2008).

    Os campos cerrados so paisagens campestres com pequenas rvores e arbustos

    esparsos, disseminados num substrato graminide (Figura 6). Vegetao constituda por uma

    flora mais alta arbrea-arbustiva (at 3 m.) integrada por indivduos bastante espaados entre

    si, com porte geralmente atrofiado, distribudos no estrato herbceo, baixo, graminide, onde

    frequentemente encontram-se o Capim-barba-de-bode e o Capim-gordura (SERRA FILHO et

    al., 1974).

    FIGURA 6 Fisionomia de um fragmento de campo cerrado, localizado no Bairro Paiol Queimado, Joanpolis

    (Foto: Autor, 2013).

  • 34

    SAAD et al. (2008) relatam que, embora o Projeto RADAMBRASIL (1983) no

    evidencie vegetao de cerrado na regio, a presena desse tipo de vegetao sugerida pela

    leitura de jornais bragantinos do final do sculo, como, por exemplo, a coleo do jornal

    Cidade de Bragana, fundado em 1895. Segundo essas fontes, nomes de regies como

    cerrados, inseridas dentro do contexto florestal da regio. At os dias atuais, algumas

    pequenas ilhas de cerrados, com o predomnio do Barbatimo (Stryphnodendron sp.) com

    poucas espcies tpicas dessa formao, ainda podem ser encontrados na regio bragantina,

    tais como as ilhas de cerrado do municpio de Bragana Paulista (Figura 7).

    FIGURA 7 Fragmento de campo cerrado bastante alterado, localizado no Bairro da Penha, Bragana Paulista

    (Foto: Autor, 2013).

    BARLETTA (2011a) e (2011b) tambm cita a ocorrncia de cerrados no Bairro da

    Penha - Bragana Paulista, bem como no municpio de Pedra Bela (SP). BUENO et al. (2007)

    concluem que, a partir da existncia de vrios fragmentos modernos de cerrado, que este tipo

  • 35

    de vegetao j foi mais abundante no passado, no municpio de Bragana Paulista.

    Descrevendo o antigo trajeto Bragana Paulista Joanpolis, como se fosse realizado

    em 1920, BARLETTA (2000) expe:

    iagem, logo passamos pela igreja de

    So Sebastio da gua Comprida e, j adiante,

    encontramos o Bairro da Serrinha, onde

    lentamente nosso trole vai vencendo a escalada

    mais ngreme do trajeto at chegarmos ao ponto

    mais elevado, de onde avistamos um cenrio de

    rara beleza, a maior reserva de cerrados da regio

    bragantina, os famosos Campos do Jacare. A

    podemos encontrar exemplares de vegetais como

    barbatimo, barba-de-bode, sassafrs e muitos

    outros. Nessa verdadeira savana, muitas codornas

    alam vo faze

    Para BARLETTA (2000), essa regio oferecia muitos contrastes: as plancies que

    margeavam o rio eram frteis e, em suas ondulaes, formavam uma pobre vegetao de

    cerrado que recebia a denominao de Campos do Jacare, constitudo, basicamente, de barba-

    de-bode, pequenos arbustos de barbatimo, sassafrs, lembrando muito as savanas africanas.

    J as montanhas possuam encostas com matas nativas da Mantiqueira, as quais, at hoje,

    continuam intactas fazendo contraponto com os azuis das guas da represa da SABESP.

    Segundo CRESTANA et al. (2006), o cerrado no uma formao florestal uniforme

    e sim um complexo vegetacional com diferentes fisionomias florsticas, iniciando com as

    formaes campestres como o campo limpo e campo sujo, as formaes savnicas

    representadas pelo cerrado stricto sensu e a formao florestal, com rvores de grande porte,

    representada pelo cerrado, notadamente onde o solo mais frtil e a acidez e o teor de

    alumnio so menores. Assim, essa diferenciao em formaes ocorre em razo das

    caractersticas do solo.

    3.4. Unidades de Conservao locais

    A criao de Unidades de Conservao (UC) foi regulada pela Lei Federal n

    9.985/2000 e o Decreto Federal n 4.340/2002 (OLIVEIRA & BARBOSA, 2010).

    So espaos territoriais, incluindo seus recursos ambientais, com caractersticas

  • 36

    naturais relevantes, que tm a funo de assegurar a representatividade de amostras

    significativas e ecologicamente viveis das diferentes populaes, habitats e ecossistemas do

    territrio nacional e das guas jurisdicionais, preservando o patrimnio biolgico existente.

    Estas reas asseguram s populaes tradicionais o uso sustentvel dos recursos naturais de

    forma racional e ainda propiciam s comunidades do entorno o desenvolvimento de atividades

    econmicas sustentveis. Esto sujeitas a normas e regras especiais. So legalmente criadas

    pelos governos federal, estaduais e municipais, aps a realizao de estudos tcnicos dos

    espaos propostos e consulta populao (OLIVEIRA & BARBOSA, 2010).

    A rea de estudo englobada por duas UC de uso sustentvel: a APA (rea de

    Proteo Ambiental) Piracicaba/Juqueri-Mirim (rea II) e a APA do Sistema Cantareira,

    sendo que h sobreposio de uma rea sobre a outra. Para obteno das informaes sobre as

    UCs foi consultado o banco de dados da Fundao Florestal do Estado de So Paulo

    (www.fflorestal.sp.gov.br).

    Segundo o Art. 15 da Lei Federal n 9.985/2000, a rea de Proteo Ambiental uma

    rea em geral extensa, com um certo grau de ocupao humana, dotada de atributos abiticos,

    biticos, estticos ou culturais especialmente importantes para a qualidade de vida e o bem-

    estar das populaes humanas, e tem como objetivos bsicos proteger a diversidade biolgica,

    disciplinar o processo de ocupao e assegurar a sustentabilidade do uso dos recursos

    naturais.

    A APA constituda por terras pblicas e/ou privadas. OLIVEIRA & BARBOSA

    (2010) observam que esta uma categoria de UC que permite a instalao de loteamentos,

    projetos agrcolas, equipamentos tursticos e at alguns tipos de indstrias.

    Tambm foi identificada a existncia de 1 Reserva Particular do Patrimnio Natural

    (RPPN) na rea de interesse deste estudo, sendo denominada RPPN Stio Sabiauna, com uma

    rea de 50 ha, proprietrio Josef Gruber, reconhecida pela Portaria IBAMA n 58-N, de 23 de

    Agosto de 1995.

    Conforme o Art. 21 da Lei Federal n 9.985/2000, a RPPN uma rea privada,

    gravada com perpetuidade, com o objetivo de conservar a diversidade biolgica.

    A RPPN a nica UC de uso sustentvel que s permite o uso indireto dos recursos

    naturais. Desta forma, observa-se que, na prtica, ela funciona como UC de proteo integral,

    considerando que s so permitidas atividades de pesquisa e ecoturismo. As RPPN so

    http://www.fflorestal.sp.gov.br/
  • 37

    criadas mediante solicitao expressa do proprietrio do imvel ao rgo gestor de unidades

    de conservao (ao Instituto Chico Mendes para Conservao da Biodiversidade, de mbito

    federal ou aos rgos estaduais de meio ambiente que possuem legislao especfica com essa

    finalidade) (OLIVEIRA & BARBOSA, 2010).

    3.4.1. APA Piracicaba/Juqueri-Mirim (rea II)

    Foi criada para proteger os recursos hdricos e o patrimnio ambiental da regio,

    representado pela paisagem formada por remanescentes de Mata Atlntica e a fauna a ela

    associada; pelas cachoeiras, especialmente a Cachoeira dos Pretos, e pelos promontrios,

    como a Pedra Grande em Atibaia e Pedra Bela, no municpio de mesmo nome.

    Sua paisagem variada, representada pela vegetao formada por pastagens, culturas

    perenes e temporrias, capoeiras e remanescentes preservados da Mata Atlntica, que abriga

    vrios mamferos como a jaguatirica e a suuarana, preguia, bugio, gato-do-mato e lontra. E

    espcies em risco de extino, como o gavio-de-penacho.

    A regio apresenta um polo industrial e tecnolgico, representado pelos municpios de

    Bragana Paulista e Atibaia, contrastando com a ocupao restante, baseada em atividades

    agrcolas, em geral por pequenas propriedades e chcaras de lazer.

    Criada pelo Decreto Estadual n 26.882, de 11 de Maro de 1987, e pela Lei Estadual

    n 7.438, de 16 de Julho de 1991. Apresenta uma rea de 280.330 ha, englobada pelo Bioma

    Mata Atlntica. Sua rea envolve as sub-bacias dos rios Atibainha, Atibaia, Jaguari e

    Camanducaia. Os municpios abrangidos so: Campinas, Nazar Paulista, Piracaia, Amparo,

    Bragana Paulista, Holambra, Jaguarina, Joanpolis, Monte Alegre do Sul, Morungaba,

    Pedra Bela, Pedreira, Serra Negra, Socorro, Santo Antnio de Posse, Tuiuti, Vargem e

    Mairipor.

    3.4.2. APA do Sistema Cantareira

    Criada para proteger os recursos hdricos da regio, especialmente os reservatrios que

    compem o Sistema Cantareira: Jaguari, Jacare, Cachoeira, Atibainha e Paiva Castro.

    Apresenta diversas cachoeiras, especialmente a Cachoeira dos Pretos, e pelos promontrios,

  • 38

    como a Pedra Grande, em Atibaia, e Pedra Bela, no municpio de mesmo nome.

    Sua rea bastante urbanizada, parcialmente localizada na Regio Metropolitana de

    So Paulo, tendo Atibaia e Bragana Paulista, como as cidades mais urbanizadas.

    A regio apresenta um polo industrial e tecnolgico, representado pelos municpios de

    Bragana Paulista e Atibaia, contrastando com a ocupao restante, baseada em atividades

    agrcolas, em geral por pequenas propriedades e chcaras de lazer.

    A delimitao desta APA se superpe s APAs Piracicaba/Juqueri-Mirim (rea II) e

    Represa Bairro da Usina, reforando a proteo aos recursos hdricos da regio,

    particularmente nas reas que formam a bacia de drenagem do Sistema Cantareira, um dos

    principais responsveis pelo abastecimento da Regio Metropolitana de So Paulo.

    Criada pela Lei Estadual n 10.111, de 04 de dezembro de 1998, apresenta uma rea

    de 249.200 ha, englobada pelo Bioma Mata Atlntica. Os municpios abrangidos so: Atibaia,

    Nazar Paulista, Bragana Paulista, Joanpolis, Piracaia, Vargem e Mairipor.

    3.5. Paleoecologia

    uma cincia que estuda os ecossistemas que existiram no passado, baseando-se nos

    fsseis encontrados em sedimentos. Ela tem como base a Geologia e a Biologia e utiliza seus

    fundamentos e terminologias. Enquanto a Ecologia estuda a complexa relao entre os

    organismos vivos e o ambiente fsico em que eles vivem, a Paleoecologia tem objetivos

    semelhantes, mas difcil deduzir a relao biota-ambiente no passado quando se utiliza a

    evidncia dada pelos organismos fossilizados para reconstruir este paleoambiente

    (SALGADO-LABOURIAU, 1998).

    A palinologia faz parte da rea de pesquisa designada como micropaleontologia e a

    cincia que abrange o estudo dos gros de plen das angiospermas e gimnospermas, esporos

    das pteridfitas e brifitas, assim como esporos de algas e fungos e outras estruturas

    biolgicas no destrudas (SIQUEIRA, 2006), tambm denominadas microfsseis. Desse

    modo, a anlise palinolgica refere-se ao estudo da composio palinolgica de sedimentos,

    resultando nos espectro polnico e palinolgico (BARTH, 2004).

    Os organismos somente se preservam bem como fsseis quando esto em condies

    especiais. Os microfsseis podem ser encontrados aos milhares em um centmetro cbico de

  • 39

    sedimento, o que d uma base estatstica confivel a sua ocorrncia. Eles so hoje em dia a

    principal fonte de dados para a reconstruo do ambiente antigo (SALGADO-LABOURIAU,

    1998).

    O conhecimento da distribuio geogrfica e da ecologia das espcies atuais

    fundamental para o estudo paleoecolgico. Da mesma forma, os princpios bsicos de

    geologia permitem estimar a idade relativa dos ecossistemas antigos e do a cronologia dos

    acontecimentos (SALGADO-LABOURIAU, 1998).

    Estudos palinolgicos do Quaternrio, embora recentes, tm-se tornado cada vez mais

    significativos medida que possibilitam a determinao de alteraes na cobertura vegetal,

    estas correlacionveis muitas vezes a fenmenos ligados s mudanas climticas (SIQUEIRA,

    2006).

    A reconstruo dos ecossistemas do Quaternrio direta porque uma parte dos

    animais e praticamente todas as plantas atuais existiram durante todo o Quaternrio. medida

    que se estudam perodos cada vez mais antigos, esta reconstruo vai se tornando mais difcil,

    porque aumenta o nmero de organismos extintos, sobre os quais no h dados ecolgicos.

    Efetivamente, a paleoecologia necessita das informaes no somente das cincias biolgicas

    e geolgicas, mas tambm da climatologia e da geografia para integrar e interpretar o

    paleoambiente. E todas estas informaes juntas tm que fazer sentido (SALGADO-

    LABOURIAU, 1998).

    Segundo SIQUEIRA (2006), no Quaternrio tem-se ainda os sinais atuais da

    vegetao, os parmetros climticos modernos e a ciclicidade destes eventos como dados a

    serem considerados no processo de interpretao paleoclimtica e paleovegetacional.

    3.5.1. A Grande Idade do Gelo

    O Quaternrio foi um perodo de grandes mudanas climticas, com longos intervalos

    de tempo com temperaturas muito baixas (as glaciaes) intercalados com tempos mais

    quentes, como o atual. As glaciaes do Quaternrio representam uma importante

    caracterstica desse perodo e tem atrado uma diversidade de pesquisas cientficas, sendo que,

    muitos autores, denominam esse perodo como (Tabela 3). Os

    estudos dos seus ciclos glaciais e das consequncias deles sobre o Sistema Terrestre so os

  • 40

    modelos para entender as glaciaes do passado mais remoto (SALGADO-LABOURIAU,

    1998).

    TABELA 3 Sntese da Era Cenozica (Fonte: Elaborado pelo autor). Era Perodo poca

    Cenozica

    Tercirio

    Paleoceno

    Eoceno

    Oligoceno

    Mioceno

    Plioceno

    Quaternrio Pleistoceno

    Holoceno

    o (ltimos 65 milhes de

    anos) o territrio brasileiro esteve sujeito s flutuaes climticas inter e subtropicais; ora

    envolvendo climas quentes ou subquentes midos, ora sujeito expanso anastomosada de

    climas secos, em condies menos quentes ou de inverno bem mais frios.

    Com o resultado dos estudos da paleoclimatologia, verifica-se que, ao longo da

    histria da Terra, o clima apresentou variaes em diferentes escalas de tempo e espao. Tais

    escalas de tempo so correspondentes a perodos geolgicos (na ordem de milhes de anos),

    perodos de registros histricos (na ordem de milhares de anos) e seculares ou instrumentais

    (perodos de 100 a 150 anos) (RAMOS et al., 2008).

    Mudanas climticas constituem-se em flutuaes do clima predominante de uma

    determinada regio, que podem estender-se de algumas dezenas de anos (mais de 30-35 anos

    segundo AYOADE, 2002) at dezenas de milhares de anos (SUGUIO, 2008). A variao

    espacial e a flutuao temporal so caractersticas marcantes do tempo e do clima. A flutuao

    temporal do clima uma caracterstica que deve ser pesquisada e discutida com maiores

    detalhes, desde o passado longnquo (paleoclima), o passado recente e como o no presente,

    permitindo a construo de modelos e simulao de cenrios climticos futuros (RAMOS et

    al., 2008).

    Os ltimos 15 mil anos, que incluem todo o Holoceno (ltimos 10 mil anos) e o final

    do Pleistoceno constituem o intervalo de tempo com o maior nmero de informaes

    paleoecolgicas e por isto o mais bem conhecido. um intervalo pequeno do ponto de vista

  • 41

    geolgico, porm extremamente importante por incluir a histria da nossa civilizao e as

    grandes intervenes do homem sobre os ecossistemas naturais e sobre o equilbrio dinmico

    destes sistemas (SALGADO-LABOURIAU, 1998).

    Segundo BRANCO & MARQUES (2008), no perodo compreendido entre 1,8 milho

    de anos e 11,7 mil anos AP (Antes do Presente):

    Norte, quase 30% de toda a superfcie dos

    continentes estavam cobertas por uma camada de

    gelo e ocorria gelo no mar em ambas regies

    polares. Como consequncia desta grande

    remoo de gua livre no sistema global, houve

    uma queda acentuada no nvel do mar e de

    pluviosidade; existem evidncias mostrando que

    existiram quatro perodos de muito frio no

    Hemisfrio Norte no Pleistoceno, o primeiro deles

    h 600 mil anos; e em todas estas pocas, as

    geleiras do rtico expandiram-se para as regies

    de latitudes mais baixas da Eursia e Amrica do

    Norte e, nas pocas mais quentes, as geleiras

    retraram para o Norte; no Hemisfrio Sul, a

    glaciao foi muito mais limitada e, na maioria da

    vezes, confinada s altitudes maiores, como por

    exemplo nos Andes; h 20 mil anos AP, o planeta

    vivia o pice de uma era glacial, durante este

    perodo a plataforma continental brasileira estava

    quase completamente exposta, dado a quantidade

    de gelo retida nas calotas polares, o que fez o nvel

    do mar recuar mais de 100 metros verticalmente

    (ou 100 quilmetros em relao linha de costa

    atual) formando uma extensa plancie costeira;

    embora o domnio glacial no tenha atingido o

    Brasil, o clima desta poca era consideravelmente

    Segundo DE OLIVEIRA et al. (2005) apud SIQUEIRA (2006), o ltimo Mximo

    Glacial (UMG) caracterizado pelo extremo climtico mais forte ocorrido em 20 mil anos

    AP, com queda de 5 C na temperatura mdia anual.

    Para SIQUEIRA (2006), vrios estudos relacionados ao UMG buscam interpretaes

    sobre as variaes climticas ocorridas neste perodo. Alguns autores afirmam que ele foi

    caracterizado por seca generalizada, enquanto outros preferem admitir a ocorrncia de um

    perodo extremamente mido. O que parece ser consenso que no houve sincronia de

  • 42

    eventos entre diferentes regies.

    Calcula-se que durante a ltima glaciao o gelo glacial cobriu a superfcie de uns 39

    milhes de km, o que corresponde a 27% da superfcie total da Terra (SALGADO-

    LABOURIAU, 1998).

    J no Primeiro timo Climtico (8 mil anos AP), o clima transformou-se em quente e

    mido, havendo subida do nvel do mar de at 5 metros (BRANCO & MARQUES, 2008).

    Portanto, a fase em que estamos agora, e que comeou com o retrocesso do gelo glacial em

    todo o planeta, constitui um interglacial que j dura uns 12 mil anos. Se o ciclo continua, deve

    tender no futuro a outra idade do gelo (SALGADO-LABOURIAU, 1998).

    SUGUIO (1999) explica que a compreenso da natureza s pode ser atingida pelo

    conhecimento de sua estrutura e dos seus estgios evolutivos por enfoques multi e

    principalmente interdisciplinares. Os estudos do Quaternrio so capazes de estabelecer o elo

    de ligao entre o passado geologicamente pouco remoto e o presente, podendo levar, em

    situaes favorveis, ao estabelecimento de prognsticos futuros.

    Por fim, o conhecimento dos processos atuantes no presente e a interpretao desses

    para desvendar o cenrio pretrito (Princpio do Atualismo), ao qual pertenceram os terrenos

    atuais, podem auxiliar no desenvolvimento cientfico em geral e na evoluo das pesquisas

    vinculadas organizao espacial do territrio nacional.

    4. MATERIA L E MTODOS

    Para o desenvolvimento desta pesquisa, num primeiro momento, utilizando o mtodo

    proposto por HAUCK (2009a), foi necessrio realizar uma vasta reviso bibliogrfica, tendo

    em vista a multidisciplinaridade do tema. Desta forma, foi necessrio reunir alguns dos

    trabalhos j publicados sobre a temtica nas diversas reas das cincias naturais e da histria.

    Tendo agrupado as experincias j produzidas sobre o assunto, foi necessrio realizar

    uma interpretao sobre estes dados, tendo como arcabouo metodolgico a proposta de

    considerando a paisagem como um todo, extraindo as informaes sistemticas da estrutura

    delas e entendendo os processos morfodinmicos e pedogenticos para bem entender a

    fisiologia das paisagens abordadas (HAUCK, 2009a).

  • 43

    Assim, sero trabalhadas algumas hipteses nesta pesquisa, sendo o ponto de partida

    para a abordagem transversal aqui proposta. As hipteses so as seguintes:

    - Que as paisagens mpares - Mata de Araucria, campos de altitude e campos cerrados

    - so nativas da rea de estudo, sendo que sua extenso, dinmica e composio variaram nos

    ltimos 45.000 anos, devido s mudanas climticas e ambientais que ocorreram na regio.

    - A relao do fogo natural com os campos cerrados, como fator de dinmica,

    manuteno e regenerao natural.

    - A diminuio do territrio das unidades de paisagem campestres, com a regenerao

    e expanso da Floresta Ombrfila Densa.

    - Da existncia de campos cerrados na paisagem atual, distribudos de forma esparsa

    no ambiente predominantemente florestal da regio. Estes campos cerrados so ecossistemas

    no sentido da unidade de paisagem apresentada por BARLETTA (2000), que existiam no vale

    do rio Jacare, atualmente inundados pelo reservatrio Jaguari/Jacare, do Sistema Cantareira.

    4.1. Pesquisa histrica

    A partir da colonizao do territrio brasileiro, torna-se possvel a utilizao dos

    relatos histricos de naturalistas, religiosos, governantes e outros, numa forma indireta de

    reconstituio da paisagem regional. Para tanto, foi preciso buscar correlaes entre fatos

    relatados e as unidades de paisagem objeto deste estudo, de forma a estabelecer um vnculo

    entre o relato e a realidade.

    Assim, foram utilizados os relatos histricos na tentativa de reconstituio indireta das

    unidades de paisagem estudadas, auxiliados por relatos de naturalistas que exploraram a

    regio, como von Spix, von Martius, Glimmer e Saint-Hilaire.

    4.2. Trabalhos de campo

    Previamente foram escolhidas reas relevantes para amostragem e levantamento de

    campo, por meio do conhecimento do autor em relao paisagem regional, alm de mapas e

    imagens de satlite. Como ponto de incio dos trabalhos de campo foi definido a rea urbana

    do municpio de Joanpolis.

  • 44

    Os trabalhos de campo foram realizados percorrendo as estradas da regio (asfaltadas

    e de terra), trilhas e outros caminhos de interesse, inclusive no interior de fragmentos

    florestais e das paisagens mpares. Entre os bairros que foram percorridos esto: Paiol

    Queimado, Dvida, Bocaina, Terra Preta, Pires, Carvalhos, do Lopo, Sabiuna, Liberdade, do

    Pico, dos Pintos, dos Pretos, Mosquito, do Azevedo, entre outros (Figura 8).

    FIGURA 8 Imagem de satlite com os principais caminhos percorridos neste trabalho (Fonte: Google Earth,

    2013).

    Os levantamentos de campo foram realizados pelo pesquisador, sendo que, em alguns

    deles, houve acompanhamento de tcnicos e/ou moradores locais. Para caracterizao das

    unidades de paisagem locais foi utilizado o procedimento proposto por GOMES (2009), que

    constitudo de 2 etapas: interpretao visual da paisagem e amostragem da vegetao. No caso

    dos fragmentos campestres, a amostragem foi realizada por caminhamento diagonal,

    abrangendo toda extenso.

    Em relao s reas estratgicas para interpretao visual da paisagem, identificadas

    durante os trabalhos de campo, buscou-se uma correlao entre a realidade de campo com

    mapas e material bibliogrfico, alm da realizao de registro fotogrfico.

  • 45

    4.3. Descrio da localizao geogrfica da rea de estudo

    A rea de estudo abrange parte da poro territorial correspondente ao municpio de

    Joanpolis, localizado na regio bragantina do estado de So Paulo (Figura 9). A rea

    territorial do municpio de 374,28 km.

    As coordenadas geogrficas da rea central da poro urbana do municpio so:

    A Provncia Geomorfolgica da rea de estudo o Planalto Atlntico, representado

    pela Zona Serra da Mantiqueira Ocidental (IPT, 1982). Est localizada no setor leste da Bacia

    do rio Piracicaba ou UGRHI-05 (PCJ Piracicaba/Capivari/Jundia), abrangendo as

    cabeceiras de drenagem das sub-bacias hidrogrficas dos rios Jacare e Cachoeira.

    FIGURA 9 Localizao do municpio de Joanpolis/SP (Sem escala).

  • 46

    4.4. Identificao das espcies vegetais

    Nos trabalhos de campo nas unidades de paisagem da regio foram realizados os

    registros fotogrficos das plantas, bem como a prvia anotao em rascunho de algumas

    informaes (porte, presena ou ausncia de espinhos/pelos, entre outras), visando

    determinao das espcies. Para subsidiar tal etapa foram utilizadas as obras de LORENZI

    (1998), JOLY (2002), LIMA (2008), YAMAMOTO (2009), GOMES (2009), entre outros

    autores.

    Muitas das espcies foram identificadas em campo pelo nome popular, com posterior

    identificao cientfica utilizando a chave botnica de identificao elaborada por SOUZA &

    LORENZI (2007). Tambm foram coletadas partes vegetais de alguns indivduos para

    composio de um herbrio.

    4.5. Amostragem e anlise de solo dos campos cerrados

    Nas unidades de paisagem campestres identificadas foram realizadas amostragens de

    solo, seguindo os procedimentos descritos por BRASIL (2009). Tais amostras foram

    encaminhadas a um laboratrio especializado, para fins de anlise qumica bsica.

    Os parmetros analisados foram: pH (Potencial Hidrogeninico), V% (Saturao por

    Bases), CTC (Capacidade de Troca Catinica), SB (Soma de Bases), MO (Matria Orgnica),

    COT (Carbono Orgnico Total), P (Fsforo), K (Potssio), Ca (Clcio), Mg (Magnsio), Al

    (Alumnio) e H (Hidrognio). Os parmetros analisados foram interpretados.

    4.6. Interpretao das reas de contato entre unidades de paisagem

    Aps a realizao dos trabalhos de campo e a identificao das reas de relevante

    interesse, que apresentam contato entre diferentes unidades de paisagem, foram utilizadas as

    imagens de satlite disponibilizadas pelo Software Google Earth (Mosaico 2003-2012),

    atravs da respectiva delimitao poligonal das unidades de paisagem.

    no Aplicativo Google Earth Path (GE Path, verso 1.4.6). Na etapa seguinte, o resultado

  • 47

    obtido para cada unidade de paisagem foi lanado e trabalhado em planilha eletrnica no

    Software Excel, possibilitando a discusso e interpretao dos resultados.

    5. RESULTADOS E DISCUSSO

    5.1. Reconstituio paleoecolgica

    Para apresentao da histria paleoecolgica das paisagens estudadas, os dados e

    informaes foram trabalhados partindo da regio Sul do pas, subindo at a regio Sudeste,

    percorrendo as reas atuais de ocorrncia das unidades de paisagem em estudo (Figura 10). As

    reas com dados paleoecolgicos so: Aparados da Serra, So Francisco de Paula e Cambar

    do Sul (RS); Serra do Rio do Rastro, Morro da Igreja e Serra da Boa Vista (SC); Serra dos

    Campos Gerais (PR); Botucatu (SP); Monte Verde (MG); Morro de Itapeva - Campos do

    Jordo (SP); Serra da Bocaina (SP); e Serra da Caraa - Catas Altas (MG).

    Tal caminho percorrido deve-se ao fato que a rea nuclear de ocorrncia de Mata de

    Araucria o Sul do Brasil, onde esta unidade de paisagem ocorre em contato com paisagens

    campestres (campos sulinos). No Sudeste, os dados apresentados so de lugares de ocorrncia

    de Mata de Araucria e de unidades campestres, sendo possvel correlacionar estas duas

    unidades e suas alteraes ao longo dos ltimos milhares de anos.

  • 48

    FIGURA 10 Distribuio dos locais com dados paleoecolgicos apresentados neste trabalho em relao rea

    de estudo. AS Aparados da Serra (RS); SFP - So Francisco de Paula (RS); CS - Cambar do

    Sul (RS); SRR Serra do Rio do Rastro (SC); MI Morro da Igreja (SC); SBV Serra da Boa

    Vista (SC); SCG Serra dos Campos Gerais (PR); BO Botucatu (SP); AE - rea de Estudo;

    MV Monte Verde (MG); CJ Campos do Jordo (SP); SB - Serra da Bocaina (SP); SC Serra

    da Caraa, Catas Altas (MG) (Fonte: Google Earth, 2013).

    Na regio Sul, em sntese, quatro perodos climticos distintos podem ser

    reconhecidos desde o final do Pleistoceno at os dias atuais. Entre cerca de 42 e 10 mil anos

    AP (incluindo a ltima glaciao), as paisagens campestres dominavam a regio, indicando

    um clima frio e seco. Provavelmente, a maior parte da regio foi desprovida de rvores, sendo

    que os elementos florestais estavam restritos a vales profundos de rios e plancie costeira.

    Aps 10 mil anos AP, as temperaturas aumentaram, no entanto, a Mata de Araucria no

    expandiu, pois o clima permaneceu seco. Entretanto, a Floresta Atlntica migrou na direo

    sul ao longo da costa, pois as condies deveriam ser mais midas nestas reas. J a partir do

    incio do Holoceno o fogo se tornou mais frequente, como indicado pela maior abundncia de

    partculas de carvo em turfeiras da regio (BEHLING et al., 2004; 2005; OVERBECK et al.,

    2009).

    Provavelmente, este aumento esteve relacionado chegada das populaes indgenas

    na regio, juntamente com um clima de caracterstica mais sazonal. Aproximadamente na

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    mesma poca, houve a extino de grandes animais pastadores (KERN, 1994). provvel que

    as populaes indgenas utilizavam o fogo para caar e manejar a terra (KERN, 1994;

    SCHMITZ, 2006), porm no h evidncias diretas sobre isso. Aps a metade do Holoceno

    (cerca de 4 mil anos AP), o clima se tornou mais mido, permitindo a expanso lenta da

    paisagem florestal, principalmente ao longo dos rios. Quanto velocidade dessa expanso,

    esta aumentou aps 1.100 anos AP, levando substituio mais pronunciada das paisagens

    campestres pela vegetao florestal, formando reas maiores de cobertura florestal contnua

    sobre o planalto e de florestas riprias nas plancies (BEHLING et al.,

    2004; 2005; BEHLING & PILLAR, 2007; BEHLING et al., 2007; OVERBECK et al., 2009).

    Dessa forma, na regio Sul, a vasta vegetao campestre indica condies climticas

    frias e secas no Pleistoceno Tardio. Os dados sugerem que ocorriam repetidas geadas e

    temperaturas mnimas de -10 C em meses de inverno. A temperatura mdia anual foi,

    provavelmente, de 5 a 7 C mais fria do que nos dias atuais entre 26 mil e 17 mil anos AP

    (aproximadamente), isto , durante o perodo do ltimo Mximo Glacial - UMG (BEHLING

    & LICHTE, 1997).

    Em Botucatu (SP), registros de plen e carvo em depsitos de cabeceiras de

    drenagem abundantes em matria orgnica indicaram uma cobertura vegetal principalmente

    de campos com poucos espaos de floresta subtropical, caracterizando um clima frio e seco

    durante o perodo glacial, registrado desde 30 mil a 18 mil anos AP, aproximadamente.

    Durante esse perodo, queimadas ocorreram nos campos e a rara presena de A. angustifolia

    indicou uma temperatura de, pelo menos, 5 a 7 C menor que a atual (BEHLING & LICHTE,

    1997).

    SIQUEIRA (2006) apresenta importante pesquisa da histria ambiental da floresta de

    Araucaria na regio de Monte Verde (MG), atravs da anlise palinolgica e sedimentolgica

    e da compreenso da dinmica das mudanas ambientais e climticas como base para a

    validao e compreenso sistematizada de modelos, j apresentados por outros autores, que

    envolvem o UMG e o Holoceno. A regio de Monte Verde vizinha rea de estudo, sendo

    que o trabalho apresentado por SIQUEIRA (2006) representa uma importante referncia da

    cobertura vegetal regional em tempos passados.

    O perodo equivalente fase do UMG est contido no intervalo palinolgico da zona

    MOV1 (20.830 a 11.000 anos AP), caracterizada pela alta concentrao de plen de

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    elementos tpicos da Mata de Araucria, tais como Araucaria, Miconia, Myrsine, Podocarpus,

    Symplocos, Agarista e outros. Os resultados sugerem que a vegetao era fisionomicamente

    mais fechada que a floresta atual de pinheiros que cobre a regio montanhosa de Monte Verde

    (SIQUEIRA, 2006).

    Por volta de 17 mil a 15 mil anos AP (idade extrapolada, a partir de datao calibrada),

    inicia-se um declnio gradual e constante dos gneros Araucaria, Miconia, Myrsine,

    Podocarpus, Prunus e Weinmannia, ao mesmo tempo em que se inicia um aumento de

    Drimys e outros elementos que so encontrados na floresta moderna local. Tal mudana na

    composio florstica pode se explicada pelos processos naturais de sucesso ecolgica

    descrita por KLEIN (1975). Para este autor, florestas clmax de Araucaria possuem

    composies florsticas diferentes, de acordo com o estgio em que se encontram. Portanto,

    observa-se que o aumento expressivo de Psidium (Myrtaceae), Drimys, Ilex e Weinmannia

    possam representar esse fenmeno de sucesso. O clima sugerido pela composio

    palinolgica encontrada na zona MOV1 de frio e mido (SIQUEIRA, 2006).

    O perodo subsequente, ou seja, a partir de 11 mil anos AP (idade extrapolada, a partir

    de datao calibrada), corresponde fase final do UMG e incio de condies mais quentes e

    midas, o que evidenciado localmente com o declnio de Araucaria, Drimys, Myrsine,

    Podocarpus e Psidium. Tal fase est inteiramente contida na zona polnica denominada

    MOV2 (SIQUEIRA,