Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à...

61
Março de 2007 • Ano 4 • nº 32 www.desafios.org.br do desenvolvimento desafios Março de 2007 • Ano 4 • nº 32 desafios ECONOMIA Seis anos após terrível crise econômica, a Argentina cresce, contraria previsões e passa por euforia de consumo TRANSPLANTES A falta de médicos preparados e de dados confiáveis dificulta a vida dos que esperam na fila de doações TRIBUTOS Estudo do Ipea mostra que milhares de prefeituras não conseguem avaliar os imóveis nem cobrar o IPTU adequadamente Telecomunicações: cada f io em seu lugar A tecnologia avançou e a legislação ficou para trás. O governo trabalha para criar uma regulação que inclua telefonia fixa e móvel, acesso à Internet e TV aberta e por assinatura R$ 8,90 Capa_32 05/03/07 14:28 Page 1

Transcript of Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à...

Page 1: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

M a r ç o d e 2 0 0 7 • A n o 4 • n º 3 2 w w w . d e s a f i o s . o r g . b r

do desenvolvimentodesafios

Março de 2

00

7 • A

no 4 • nº

32

desafios

ECONOMIASeis anos após terrível crise econômica,a Argentina cresce, contraria previsões e passa por euforia de consumo

TRANSPLANTESA falta de médicos preparadose de dados conf iáveis dif iculta a vidados que esperam na f ila de doações

TRIBUTOSEstudo do Ipea mostra que milhares deprefeituras não conseguem avaliar osimóveis nem cobrar o IPTU adequadamente

Telecomunicações: cada fio em seu lugar

A tecnologia avançou e a legislação f icou para trás. O governo trabalha para criar umaregulação que inclua telefonia f ixa e móvel, acesso à Internet e TV aberta e por assinatura

R$ 8,90

Capa_32 05/03/07 14:28 Page 1

Page 2: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

Desaf ios • março de 2007 3

16

Marc

os P

eron

/kin

o.co

m.br

24sx

c.hu

30

Ben

Edwa

rds/

Getty

Imag

es

52

Rica

rdo

Laba

stier

Miguel IgnatiosCâmbio trava a indústria

Divonzir Gusso...não é fácil, mas é indispensável

desafiosdo desenvolvimento

8

16

24

30

38

46

52

Entrevista Renato BaumannDiretor da Cepal avisa: disparidades dentro do Mercosul precisam diminuir

Legislação Competição para valerConvergência de mídias obriga governo a rever regulação das telecomunicações

Internacional A grama do vizinhoSeis anos após crise, a Argentina cresce a 8% e vive a euforia das compras

Saúde A vida que segueO Brasil tem o maior sistema público de transplantes, mas sofre problemas de gestão

Tributos Imposto concretoMuitas prefeituras não conseguem avaliar os imóveis nem cobrar o IPTU

Sociedade A nova velha geraçãoAs pessoas vivem mais e melhor. Continuam produzindo, consumindo e exigindo

Melhores práticas Parece impossível, mas não éEstudo analisa 33 escolas públicas que apresentaram bom desempenho na Prova Brasil

51

59

Sumário

Artigos

Giro

Circuito

Estante

Indicadores

Cartas

6

60

62

64

66

Seções

sumário 01/03/07 19:08 Page 3

Page 3: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

4 Desafios • março de 2007

Definir qual matéria seria a capa desta edição foi particularmente difícil.O leque de opções era muito bom e precisaríamos, no mínimo, de duas capaspara fazer justiça. Mas fomos obrigados a escolher uma, e a excelentereportagem “Concorrência para valer”, sobre o setor de telecomunicações,acabou conquistando o primeiro lugar. Na matéria, Ottoni Fernandes Jr.mostra as conseqüências que a convergência de mídias está provocando entre as empresas de telecomunicações. As operadores de telefonia vendemconteúdo, os provedores de Internet oferecem ligações telefônicas, as TVs por assinatura dão acesso à Internet… enfim, as fronteiras são cada vez maisconfusas e a legislação existente é insuficente para responder às necessidadesdo setor. Enquanto não se estabelece um marco regulatório abrangente, ascompanhias vão ocupando mais espaço com aquisições parciais, integrais,fusões etc.Vale a pena se informar, porque o debate sobre a mudança noCódigo Brasileiro de Telecomunicações deve ser destaque ao longo de 2007.A segunda reportagem que quase foi parar na capa é a sobre transplantes.O Brasil conta com excelentes profissionais, que nos colocam entre os paísesmais avançados em termos de transplantes. Porém, essa modernidade sóexiste na sala de cirurgia. O longo caminho que o paciente percorre desde odiagnóstico da doença até a operação é marcado por todo tipo de problema.Mutos médicos não estão preparados para identificar as condições e procederà captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejamperdidas. Também não existe um cadastro nacional e unificado de pessoas na fila de espera, assim como não há estatísticas confiáveis e atualizadas para auxiliar os que procuram aprimorar as práticas. Mesmo assim, areportagem traz boas notícias, já que o Ministério da Saúde está treinandoequipes que vão ajudar a aumentar as doações e o número de cirurgias.Outra reportagem que também traz esperança está na página 46. Ela mostraas mudanças no perfil dos idosos. As pessoas vivem cada vez mais e melhor,e a sociedade se prepara para conviver com essa grande fatia da populaçãoque continua a produzir, consumir e exigir. Eles são a nova velha geração.Nesta edição, ainda discutimos o fenômeno da Argentina, que, cinco anosapós uma tenebrosa crise econômica, cresce a taxas de 8% ao ano e atravessauma onda de euforia das compras. Há uma reportagem sobre as falhas nacobrança do Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU), um dos tributosque mais contribuem para melhorar a vida nas cidades; e outra que mostra 33 escolas públicas que, com criatividade e disposição, conseguiram driblaras difíceis condições sociais de seus alunos e obtiveram surpreendentesresultados positivos na Prova Brasil. Bons exemplos. Boa leitura!

Andréa Wolffenbüttel, Jornalista Responsável

Cartas ou mensagens eletrônicas devem ser enviadas para: cartas@desaf ios.org.brDiretoria de redação: SBS Quadra 01, Edifício BNDES, sala 801 - CEP 70076-900 - Brasília, DFVisite nosso endereço na internet: www.desaf ios.org.br

Carta ao leitor

Patrocínio

desafiosdo desenvolvimento

www.desafios.org.br

Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea)PRESIDENTE Luiz Henrique Proença Soares

Programa das Nações Unidas para oDesenvolvimento (Pnud)REPRESENTANTE INTERINO NO BRASIL Kim Bolduc

DIRETOR-GERAL Luiz Henrique Proença Soares

ASSISTENTE Mary Cheng

CONSELHO EDITORIAL Andréa Wolffenbüttel,Alexandre Marinho, Bruno Araújo, Divonzir Gusso,Francisco Gaetani, João Carlos Magalhães,Leonardo Rangel, Luiz Fernando L. Resende,Luiz Henrique P. Soares, Mary Cheng,Murilo Lobo, Pérsio Davison

RedaçãoSBS Quadra 01, Edifício BNDES, sala 801CEP 70076-900 - Brasília, DFTel.: (61) 3315-5188 Fax: (61) 3315-5031

JORNALISTA RESPONSÁVEL Andréa Wolffenbüttel

ColaboradoresTEXTO Ottoni Fernandes Jr., Lia Vasconcelos,Eliana Simonetti, Giedre Moura, Marina Nery e Sucena Shkrada Resk

FOTOGRAFIA Ricardo Labastier

ILUSTRAÇÃO Orlando Pedroso

REVISÃO Ivana Gomes

ARTE E DIAGRAMAÇÃO Renata Buono DesignRenata Buono, Rafaela Ranzani e Luciana Sugino

FOTO DA CAPA Eric Tucker/Getty Images

Circulação e PublicidadeRua Urussuí, 93, 13° andarCEP 04542-050 - São Paulo, SPTel./Fax: (11) 3073-0722

Administração Instituto UniempAv. Paulista, 2198, conjunto 161CEP 01310-300 - São Paulo, SPTel.: (11) 2178-0466 Fax: (11) 3283-3386

Assinaturas TeletargetTel.: (11) 3038-1479 Fax: (11) [email protected]

Atendimento ao Jornaleiro LM&XTel.: (11) 3865-4949

Impressão Prol Editora Gráfica

Distribuição Fernando Chinaglia Distribuidora S/A

Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada

Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão

Programa das Nações Unidas para o Desenvolvimento

Organização das Nações Unidas

OS ARTIGOS E REPORTAGENS ASSINADOS NÃO EXPRESSAM, NECESSARIAMENTE,A OPINIÃO DO IPEA E D OPNUD.É NECESSÁRIA A AUTORIZAÇÃO DOS EDITORES PARA A REPRODUÇÃO TOTAL OU PARCIAL

DO CONTEÚDO DA REVISTA.

CARTA 01/03/07 19:16 Page 4

Page 4: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

6 Desafios • março de 2007

GIRO

Combustíveis

O álcool na crista da onda

A insegurança quanto ao fornecimento e ao preçodo petróleo tem entusiasmado investidores a aplicarrecursos em álcool combustível. O setor se destacaentre os que buscam financiamento no BancoNacional de Desenvolvimento Econômico e Social(BNDES) – e tem sido atendido. O volume de recur-sos liberados deu um salto de quase 250% entre 2004e 2006. Isso porque o BNDES constatou, em seus es-tudos, que para atender à demanda crescente domercado interno será necessário elevar a produçãodos atuais 17 bilhões de litros ao ano para 25 bilhões.Para alimentar as máquinas das usinas, a produçãode cana-de-açúcar, de 425 milhões de toneladas, de-

verá atingir 685 milhões na safra de 2012-2013. Mais.O banco prevê que os preços do petróleo per-manecerão elevados. E que o interesse pelo álcool au-mentará, em todo o mundo, devido à preocupaçãocom os efeitos ambientais negativos da queima decombustíveis fósseis. Assim, o Brasil tem a oportu-nidade não apenas de produzir para o mercado in-terno, mas também para exportação, já que registrao menor custo e a maior produtividade do planeta.Bom para a balança comercial. Resta saber seinteressa ao país se transformar num latifúndio decana e soja e cristalizar seu papel de exportador decommodities no cenário internacional.

Agropecuária

Melhor para o Brasil

Monitordas reformas

O ano legislativo começouagitado. Só o Programa deAceleração do Crescimento(PAC) do governo federal re-presenta 21 Medidas Provisó-rias a serem votadas. Soma-das às mais de setecentasemendas apresentadas pelosparlamentares, virou uma ta-refa que só deve ser concluí-da no final do semestre. Paradar conta da missão, o presi-dente da Câmara,Arlindo Chi-naglia, anunciou que haverásessões deliberativas quatrodias por semana. Outro temaque ganhou destaque é a alte-ração da lei penal. O clamorpopular pela redução da maio-ridade penal voltou com forçadepois do assassinato do me-nino João Hélio, no Rio de Ja-neiro. Para responder a essademanda, foi instituída umasubcomissão especial paraanalisar os projetos de lei so-bre legislação penal e proces-sual. Das reformas que fica-ram pendentes da legislaturapassada, a única que aindatem merecido atenção é a re-forma política.

Pesquisa Andréa Wolffenbüttel Texto Eliana Simonetti Petrobras

Ao contabilizar o que significariaa abertura de seu mercado agríco-la diante de um acordo na Orga-nização Mundial do Comércio(OMC) que implicasse numa re-forma do sistema de subsídios,economistas da União Européia(UE) previram redução de 25%no número de propriedades agrí-colas na Europa nos próximosquinze anos.Segundo eles,o Brasilserá o país que apresentará maiorcrescimento em produção e ex-portação até 2020. Isso porque,

nos últimos trinta anos, a popu-lação mundial aumentou em 1 bi-lhão de pessoas – a maior parteem países em desenvolvimento –e, nos próximos quinze anos, essagente terá renda maior e consu-mirá mais soja, açúcar, frango ecarne bovina. Para aumentar acompetitividade de seus produtosno mercado externo, os europeuspretendem cortar,a partir de 2008,os subsídios à exportação e oreembolso aos produtores que nãoconseguem vender o que colhem.

500 milhõesde computadores fora de uso. Essa é a quantiaque a Organização dasNações Unidas paraEducação, Ciência e Cultura (Unesco) acredita que exista naEuropa.A entidade pretende reciclar esses equipamentos e usá-los em programas de inclusãosocial em países em desenvolvimento

Giro#32 01/03/07 19:18 Page 6

Page 5: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

Participação de alguns países nas emissões globais (em %)

Desaf ios • março de 2007 7

Efeito estufa

O problema não é só dos ricos

Em 1997, quando a Convençãodas Nações Unidas sobre Mudan-ças Climáticas apresentou o do-cumento que ficou conhecido co-mo Protocolo de Kyoto,ela propôsque os países industrializados sedispusessem a reduzir,voluntaria-mente, suas emissões de dióxidode carbono (CO2). Passados noveanos, o Relatório de Desenvolvi-mento Humano 2006, elaboradopelo Programa das Nações Unidaspara o Desenvolvimento (Pnud),também ligado à ONU,constatouque os países em desenvolvimen-to respondem, atualmente, pormais da metade do CO2 jogadona atmosfera.Mais especificamen-te, 153 países emergentes foramresponsáveis por 51,8% das emis-sões de dióxido de carbono em

2003, resultante da queima decombustíveis fósseis; das emissõesde gases em refinarias,plataformasde petróleo, indústrias e aterrossanitários; e da construção civil.Nesse grupo, os maiores poluido-res são China, Rússia e Índia – to-dos com taxas aceleradas de cres-cimento econômico há pelo me-nos seis anos. O Brasil até que sesai bem. Responsável por 2,9%das emissões históricas, respon-deu por 5% do gás carbônico lan-çado na atmosfera em 2003,sendoque 75% desse total é resultante dedesmatamento. Na outra ponta,países ricos arcam com 46,5% daresponsabilidade pelo aquecimen-to global, sendo que os EstadosUnidos são campeões absolutosem emissão de gás carbônico.

Comércio exterior

Cadê as pequenas?

Notícias sobre confecções de bi-quínis, produtores de mel e fabri-cantes de programas de computa-dor, que freqüentam feiras inter-nacionais e fecham contratos deexportação, dão a impressão deque os pequenos empreendedoresbrasileiros, finalmente, encon-traram o caminho dos portos.Umlevantamento feito pelo Ministé-rio do Desenvolvimento, Indús-

tria e Comércio Exterior (MDIC),entretanto, mostra que, entre 2005e 2006, a participação das peque-nas empresas nas exportações re-cuou de 51,6% para 45,8% – dadoque revela concentração dos ne-gócios em companhias de maiorporte. Isso em se tratando do nú-mero de empresas,pois em termosde faturamento as disparidadessão abissais: as grandes corpora-

ções ficaram com 91,2% do boloem 2006. O movimento segue di-reção contrária à verificada empaíses desenvolvidos, em que pe-quenos e médios empreendimen-tos chegam a responder por maisda metade do faturamento com ocomércio internacional.Ainda as-sim, os integrantes do ministérioestão otimistas,pois acreditam que2007 será um ano de recuperação.

Pesca

Salve a lagosta

Apreciada por chefs e gourmetsde todo o mundo, a lagosta bra-sileira está coorendo risco. Emvinte anos, o número de embar-cações lagosteiras em atuação nonas águas do Brasil saltou de 1,5mil para 5,9 mil.A concorrênciaestá levando os 11 mil pescado-res que se dedicam à captura docrustáceo a pegar animais pe-quenos próximos à costa, e comisso, além de diminuírem seusganhos, põem em risco a susten-tabilidade do negócio. Para re-solver o problema, o governo es-tabeleceu um plano de reduçãogradual da pesca. Em 2007 e2008 o número de armadilhasutilizadas por dia será de 40 mi-lhões (metade do que se permi-tia no ano passado). Em 2010 olimite baixará para 30 milhões.A medida foi definida pelo Co-mitê de Gestão para o Uso Sus-tentável da Lagosta, compostopor representantes da sociedadecivil e do governo.Espera-se que,com o tempo, o porte dos ani-mais e a produtividade da pescaaumentem.

Charleston/O.Express

Energia

Fique ligado

A Eletrobrás estima que, porusarem máquinas e instalaçõesantigas ou inadequadas, as in-dústrias brasileiras desperdiçamum terço da energia que deman-dam. O setor comercial poderiaeconomizar até 18,9% se reno-vasse seus equipamentos. Damesma forma, famílias pode-riam pagar contas 25% menores.Essa avaliação é feita no ano do22º aniversário do ProgramaNacional de Conservação deEnergia Elétrica (Procel). Trata-se de um selo que identifica pro-dutos eletroeletrônicos eficientese econômicos. Pelo que se vê,ainda tem muita gente que nãobusca o selo antes de decidir acompra. Mesmo assim, a Eletro-brás estima que, desde a criaçãodo Procel, a energia poupadacorresponde ao consumo totaldo estado do Rio Grande do Suldurante um ano. Sinal de que osistema funciona e merece aten-ção,especialmente neste momen-to, em que as contas de luz aca-bam de ser reajustadas. Comba-ter o desperdício de energia fazbem ao orçamento e ao meioambiente. Portanto, fique ligado!

Emissões de dióxido de carbono por renda (em %)

Países pobres Países em desenvolvimento Países ricos

EUA China Rússia Índia Japão Brasil Demais países

7,6

23 16,5 5,9 5,1 4,9

42,7 49,7

Fonte: Human Development Report 2006/Pnud

1,2 43,4

Giro#32 01/03/07 19:18 Page 7

Page 6: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

8 Desafios • março de 2007

A Constituição brasileira af irma que o que é acertado externamente nãoENTREVISTA

É para valer ou não é?

á doze anos diretor do escritório brasileiro da Comissão Econômica para a América Latina eo Caribe (Cepal), da Organização das Nações Unidas (ONU), Renato Baumann acredita que oMercosul vai superar a crise atual. Até porque os membros estão condenados à vizinhança e

o custo da separação seria muito alto. Mas avisa que, se Argentina e Brasil não tomarem providênciaspara reduzir as disparidades com o Uruguai e o Paraguai, o bloco nunca será uma união verdadeira.

Renato BaumannH

Rica

rdo

B.La

basti

er

ENTREVISTA 01/03/07 19:20 Page 8

Page 7: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

Desaf ios • março de 2007 9

Desafios – Após a reunião de Cúpula do Mercosul

em janeiro, a ex-embaixadora dos Estados Unidos no

Brasil, Donna Hrinak, disse que o mercado norte-ame-

ricano considera que o Mercosul, como um bloco co-

mercial sério, está morto. Como o senhor avalia essa

declaração?

Baumann – Apesar de conhecer bem oMercosul, temos de considerar que elaestá a alguns milhares de quilômetrosde distância. Eu acho que, ao olhar parao Mercosul, pode-se ver um copo meiocheio ou meio vazio.A afirmativa dela édo tipo meio vazio. Boa parte dos sinaisexternos que o Mercosul dá leva a essaavaliação, em particular depois daadesão da Venezuela, o que suscita umasérie de dúvidas. Mas, ao mesmo tem-po, há alguns avanços, entre aspas, quelevam ao copo meio cheio.

Desafios – Que avanços?

Baumann – O mais significativo é ovolume de comércio. Já foi melhor, masaté hoje, em alguns setores, como equi-pamentos eletroeletrônicos e linhabranca, tem um peso significativo. Essecomércio poderia e deveria ser maisexpressivo, mas há a influência da va-riação de renda, do ciclo econômicodas quatro economias originais e háefeitos do ponto de vista de gestão. Porexemplo, sabemos que a construção doarcabouço deveria estar bem mais

avançada do que está hoje, por razõesas mais diversas, políticas locais, con-junturas externas etc. Não podemosesquecer o baque que representou oreajuste do câmbio brasileiro em 1999.Também existe um desencontro denormas e legislações nacionais.

Desafios – Que tipo de desencontro?

Baumann – Por exemplo, o caso maisnotório é o da Constituição brasileira.Ela afirma que o que é acertado exter-namente não se sobrepõe às decisõesconstitucionais nacionais. Isso é umimpeditivo importante que faz com queos acordos internacionais não vigoremautomaticamente. Outra dificuldade éque o Brasil tem alguns milhares denormas técnicas, dos mais diversos ti-pos, enquanto alguns parceiros, comoo Paraguai, não chegam perto disso. Éum problema que só admite duas so-luções: ou você retrocede e elimina es-sas normas técnicas ou você espera queo sócio adote as mesmas normas. Nãohá uma terceira possibilidade.

Desafios – Que setores são afetados pela incompa-

tibilidade das normas técnicas?

Baumann – Todos, de certa forma. Hánormas técnicas fitossanitárias, porexemplo, que afetam o comércio de car-nes, laticínios e produtos primários em

se sobrepõe às decisões constitucionais nacionais. Isso dif iculta os acordos internacionais

No enorme grupo de pessoas que foram pre-judicadas pela crise do setor aéreo no finaldo ano passado, está Renato Baumann, impe-dido de mostrar sua boa forma na Maratonade São Silvestre. Com um sorriso conforma-do, ele explica que abriu mão do prazer dacorrida pelo medo de ter de comemorar oRéveillon no aeroporto de Congonhas, emplena capital paulista, longe da família. Aperspectiva é horrível para qualquer cario-ca, mesmo para este que foi levado paraBrasília aos 7 anos de idade e nunca maisdeixou a capital federal. Mas o tempo e adistância não conseguiram eliminar o so-taque cheio de erres e esses, típico do Riode Janeiro, como também um inspirado sen-so de humor, não muito comum entre os quelidam com relações internacionais e comér-cio exterior. Mas, desde o começo da car-reira, Baumann manteve os olhos voltadospara além das fronteiras e soube conciliar asimpatia carioca com o protocolo diplomáti-co. Depois de uma curta passagem pela Se-cretaria do Planejamento, do Ministério doPlanejamento, na década de 1970, esseeconomista formado pela Universidade deBrasília (UnB) e doutorado pela Universi-dade de Oxford foi trabalhar na Befiex, umaagência governamental de fomento à expor-tação. Desde então, sempre esteve envolvidocom relações estrangeiras. Ocupou a Coor-denação do Setor de Planejamento Externodo Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada(Ipea) e, em 1989, entrou para a ComissãoEconômica para a América Latina e o Ca-ribe (Cepal), da Organização das NaçõesUnidas (ONU). Seis anos depois assumiu adiretoria do escritório no Brasil, onde estáaté hoje. De sua posição pôde acompanharde perto todas as idas e vindas das nego-ciações do Brasil no Mercosul, assim comona Área de Livre Comércio das Américas(Alca) e na Organização Mundial de Comér-cio (OMC). Foi na condição de espectadorprivilegiado que ele concedeu esta entre-vista a Desafios.

Além das fronteiras

P o r A n d r é a W o l f f e n b ü t t e l , d e B r a s í l i a

ENTREVISTA 01/03/07 19:21 Page 9

Page 8: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

10 Desafios • março de 2007

por terceiras partes,como Índia,China,África do Sul etc. Eles têm de aceitar acláusula de que cada país não pode ne-gociar individualmente com outrosmercados,deve negociar em bloco.Têmde permitir a entrada livre de produtosdos quatro países em seus mercados.Ouseja, é uma corrida ladeira acima. Não éque eles vão entrar sem pagar pedágio.

Desafios - O que o senhor entende quando o presi-

dente Hugo Chávez diz que está entrando no Mercosul

para descontaminar o neoliberalismo do bloco?

Baumann – O que se supõe é que essaadesão é parte de uma trajetória quevisa fortalecer os vínculos entre paísessul-americanos. O discurso comportaqualquer dimensão, mas, sem quererentrar no mérito do discurso, o rele-vante é o sinal de que há um potencialentre países da região que deveria sermais bem explorado. O pedido vene-zuelano de adesão ao Mercosul é ante-rior a Chávez. No primeiro momento,o interesse era atender a demandaenergética do Norte e do Nordeste bra-sileiro e havia uma posição mais cau-telosa por parte dos outros sócios, até

geral, como frutas. Outro caso interes-sante aconteceu, se não me engano, nosegundo semestre de 1999. Quandocomeçou a se ressentir dos efeitos damudança cambial no Brasil, a Argenti-na adotou uma nova norma técnicapara a tampa de produtos de limpeza.Todos os produtos de limpeza eramobrigados a ter uma tampa igual àque-las dos remédios, que impedem que ascrianças abram os frascos. Esse simplesfato causou o embargo de vários lotesde produtos brasileiros com destino aomercado argentino. Isso quer dizer quea norma técnica pode ser muito boa,mas também pode ser uma barreiraimplícita ao comércio.

Desafios - Considerando que somos um bloco, não

deveria ser obrigatório algum tipo de consenso antes de

modif icar as normas?

Baumann – A adoção de novas normasé um terreno complicado porque exis-tem coisas que dizem respeito à ope-ração conjunta das quatro economias,mas também há o grau de soberania decada uma delas. Você não pode impe-dir que um chefe de seção do ministé-rio X adote certas normas. No Brasil,por exemplo, temos critérios de segu-rança em relação a brinquedos. Umbrinquedo não pode ser vendido se, aoquebrar, fica pontiagudo, para evitarque as crianças se machuquem. Essa éuma norma do MDIC (Ministério doDesenvolvimento, Indústria e ComércioExterior), não é uma norma do Mer-cosul. Há uma área cinzenta onde nãose distingue bem o que é negociável oupassível de apreciação conjunta antesde ser implementado e o que é o exer-cício de soberania.

Desafios - Se nem os quatro parceiros originais

conseguem chegar a um acordo, como fica a situação

com novos membros?

Baumann – Para ser membro é precisoadotar tudo o que já foi acertado. Por-tanto, a adesão da Venezuela e o even-tual ingresso da Bolívia implicam aaceitação e a adoção de todo o históricode normas já estabelecidas no âmbitoregional e de todos os acordos firmados

pela situação geográfica. Hoje, consoli-dou-se o interesse de parte a parte,sobretudo em função da questão ener-gética. Já a Bolívia pediu a formação deum grupo de trabalho, mas ainda nãosinalizou plenamente que quer entrar.Ela é um membro associado já há al-guns anos, mas pediu a formação dogrupo, sensatamente, porque a agendaa cumprir é muito complexa.

Desafios - O senhor falou que o volume de comércio

no Mercosul já foi mais alto. Por que caiu?

Baumann – São várias as respostas. Oponto máximo do comércio intrarre-gional ocorreu em 1997, 1998, quandoatingiu 25% de todo o fluxo de comér-cio externo do Brasil. Foi quando acon-teceram algumas crises externas, comoa asiática em 1997,a da Rússia em 1988,seguidas pela crise do Real em 1999. Is-so gerou muita turbulência. A segundaexplicação refere-se ao processo nego-ciador.Houve um período em que coin-cidiram três grandes negociações inter-nacionais, com os mesmo negociadoresem diversas chancelarias. A da Alca(Área de Livre Comércio das Américas)

ENTREVISTA 01/03/07 19:21 Page 10

Page 9: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

Desaf ios • março de 2007 11

começou com uma reunião vice-mi-nisterial, aqui em Belo Horizonte, em1997. Na época, já se tinha a perspecti-va da Rodada do Milênio,que depois setransformou na Rodada de Doha.E ha-via o Mercosul. Ora, a Rodada do Mi-lênio e a Alca eram acachapantes em re-lação ao Mercosul. Então o processonegociador do Mercosul ficou um pou-co em banho-maria. Além disso, noâmbito estrito do Mercosul há uma pe-culiaridade que não pode ser esqueci-da. Em 1995, foi adotada a Tarifa Exter-na Comum, a TEC. Isso significa que,em 1997, tudo o que se referia a comér-cio de mercadorias estava devidamentemapeado e equacionado. Portanto, pa-ra avançar, era necessário partir parapontos mais sensíveis: serviços, com-pras governamentais,questões ambien-tais, trabalhistas etc. Para deixar de sersó uma área de livre comércio e conso-lidar-se como uma união aduaneira,era preciso enfrentar temas delicados.Além de tudo, houve eleições em diver-sos países em 1998 e vieram as dificul-dades políticas para lidar com essespontos. Todo esse contexto dificultou o

progresso do Mercosul e gerou a avalia-ção cínica que muitos fazem do bloco.

Desafios - Isso explica por que o Mercosul não

avançou, mas não explica por que ele regrediu.

Baumann – O problema é que todo essepanorama influenciou, em grande me-dida, algumas decisões de investimen-to, provocou um menor ritmo da inte-gração aduaneira; enfim, uma série deiniciativas que poderiam ter facilitado ofluxo de negócios não aconteceram.Além, obviamente, da disparidade en-tre as taxas de câmbio. Não esqueça-mos que a paridade argentina foi até2002 e o Brasil mudou seu regime cam-bial em janeiro de 1999.A mudança dataxa de câmbio brasileira provocou umimenso impacto em poucos meses. En-tre janeiro e março, o real desvalorizou60%. Argentina, Paraguai e Uruguai,que naquele momento dependiam domercado brasileiro para suas exporta-ções, perderam em dois, três meses, de20% a 25% de sua competitividade to-tal por uma decisão tomada aqui, naEsplanada dos Ministérios. Isso criouum trauma do qual os agentes econô-

micos ainda não se livraram porque émuito recente. Também existem difi-culdades práticas. Por exemplo, desde oinício sempre houve o compromisso deconvergência. Só que, ao tentar come-çar a fazer isso, surgiram coisas do tipo:como é que se define dívida pública?Os países usam critérios distintos. Co-mo são calculados os índices de preçoao consumidor? São apurados de for-ma muito distinta. Registro de capitalestrangeiro também é diferente. Então,existe um imenso dever de casa queprecisa ser feito para se começar a pen-sar, não em metas comuns, mas em al-gum tipo de convergência.

“A mudança cambial

brasileira provocou um imenso

trauma. Em poucos meses, os

produtos argentinos, paraguaios

e uruguaios perderam mais

de 20% da competitividade

no nosso mercado”

Fotos Ricardo B. Labastier

ENTREVISTA 01/03/07 19:22 Page 11

Page 10: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

12 Desafios • março de 2007

go do tempo se os participantes cons-tatarem que houve ganhos. Isso explica,em grande medida, as recorrentes ten-tativas, por exemplo, do governo uru-guaio de negociar de forma bilateralcom os Estados Unidos. Mesmo a Ar-gentina, no passado, tentou essa nego-ciação. E elas só não se concretizarampor uma resistência da parte dos Esta-dos Unidos, que sempre afirmaram quequerem negociar com os quatro.

Desafios - O acordo firmado entre o Uruguai e os

Estados Unidos no começo deste ano ameaça o

Mercosul?

Baumann – Isso foi um acordo bilate-ral de proteção ao investimento e algu-mas cláusulas de propriedade intelec-tual. No âmbito do Mercosul, entende-se que não se constitui um tratado delivre comércio porque não há prefe-rências comerciais.

Desafios - Mas a tendência desse tratado não é

evoluir para um acordo de livro comércio?

Baumann – Não sei se em Montevidéuhá consenso sobre isso. Eu acredito quenão. Houve muita discussão, muita in-conformidade, muita resistência emrelação a esse acordo assinado.Ao mes-mo tempo, já foi dito com todas as le-tras pelo chanceler brasileiro, e imagi-no que pelo argentino também, que seessa negociação evoluir para um trata-do de livre comércio o Uruguai terá deoptar. Ele não poderá continuar mem-bro do Mercosul tendo um tratado delivre comércio com os Estados Unidos.

Desafios – O senhor aposta que o Uruguai faria

qual opção?

Baumann – Hoje qualquer aposta émuito difícil. É prematuro dizer qual aprobabilidade de ir numa direção ouem outra. Só o tempo pode mostrar.Depende do que o Mercosul oferecerem termos compensatórios e do que osEstados Unidos oferecerem para levar auma satisfação maior.

Desafios – E quanto ao futuro do Mercosul? Es-

tamos condenados à vizinhança e a um entendimento ou

ele vai se desmanchar aos poucos?

Desafios - Mas agora a Alca já perdeu muita força,

até por uma decisão do Brasil...

Baumann – Do Brasil e de outros tam-bém. O Brasil não é a única pedra nosapato da Alca. O Brasil é, talvez, aeconomia que mais tem a perder se anegociação for malfeita. Por quê?Porque tem uma estrutura produtivadiversificada. Porque tem nítidas van-tagens comparativas no agronegócio.E porque tem interesse direto em re-gras em relação às quais boa parte dospaíses demonstra resistência em ne-gociar: disciplina de aplicação de có-digo antidumping, disciplina para apli-cação de subsídios, questões de pro-priedade intelectual e medidas de in-centivos a investimentos. Tudo isso éde extremo interesse brasileiro, e tudoisso não se quer negociar na Alca. En-tão qual é a graça? Não é que o Brasiltenha empatado a Alca, é que se elenão fizer isso corre o risco de ter umasignificativa perda.

Desafios - Bem, a Alca esfriou, Doha ora avança,

ora recua, e mesmo assim o Mercosul não evolui. O

comércio interno no bloco continua caindo.

Baumann – Acontece que em algunssetores, como linha branca e têxtil, oBrasil e a Argentina sempre foram con-correntes diretos. Por isso, os brasi-leiros, mais uma vez, aceitaram as cotasem termos de volume de suas expor-tações, entendendo que elas dariamespaço no mercado argentino para osprodutores locais. Mas uma das gran-des queixas, hoje, dos negociadoresbrasileiros é que acabou ocorrendo umdesvio de comércio. Em lugar da subs-tituição de produtos brasileiros porargentinos, está havendo uma enormesubstituição de produtos brasileirospor produtos chineses.

Desafios - E vice-versa da parte do Brasil. Em

2006, a China foi o segundo maior fornecedor para o

Brasil, ultrapassando a Argentina.

Baumann – Aí são coisas um poucodiferentes. No caso das importaçõesbrasileiras, trata-se do peso relativo deum fornecedor no valor total importa-do. Se você importa trigo da Argentina

pagando 100 e importa componenteseletrônicos da China pagando 2 mil, éclaro que as compras da China vãopesar mais. No caso que eu mencionei,é substituição produto a produto. Écomo se o Brasil se autolimitasse nassuas exportações de sapato e depoisdescobrisse que, em vez de os argenti-nos estarem produzindo sapatos, elesestão comprando sapato chinês.

Desafios - Brasil e Argentina vivem sempre em con-

flitos comerciais. Agora a Argentina está em disputa

com o Uruguai por causa da fábrica de papel. O Para-

guai há muito que se sente alijado do grupo e reclama

das assimetrias econômicas. O Mercosul é um casa-

mento em crise total.

Baumann – O casamento pode estar emcrise, mas pagar pensão é muito caro. Ocusto de sair é muito alto.Por isso,man-tém-se essa relação de amor e ódio. Em2006, nós fizemos aqui na Cepal umdocumento sobre os quinze anos do

Mercosul. Olhando os dados oficiaisapresentados nesse documento, é fácilconstatar que Uruguai e Paraguai nãotêm muito a festejar. Eles têm déficit co-mercial com os demais países do blocoe têm déficit em relação ao resto domundo. Era esperado que no comércioregional houvesse uma compensação,já que o Mercosul não tem nenhumfundo de desenvolvimento para supe-rar eventuais desequilíbrios comerciais.Há uma percepção crescente por partedo Brasil e da Argentina de que algo temde ser feito em relação aos sócios me-nores, já que só existe um exercício deintegração regional sustentável ao lon-

“O casamento pode

estar em crise, mas pagar

pensão é muito caro.

O custo de sair é muito alto.

Por isso, mantém-se

essa relação de amor e ódio”

ENTREVISTA 01/03/07 19:23 Page 12

Page 11: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

Desaf ios • março de 2007 13

Baumann – Um dos grandes desafiosque se coloca para o Mercosul hoje é omodismo dos acordos bilaterais. Tantodo ponto de vista de composição inter-na, ou seja, da coesão dos quatro, quan-to do ponto de vista do Mercosul comobloco. Claro que haverá dificuldades seeventualmente um dos membros nego-ciar um acordo mais profundo com osEstados Unidos. Isso porque os EstadosUnidos vão exigir boa parte das cláusu-las que foram aceitas por outros países.

Desafios – A que cláusulas o senhor se refere?

Baumann – Cláusulas ligadas à pro-priedade intelectual, ao controle do

capital de curto prazo, à política cam-bial. O Chile aceitou algumas restri-ções que transcendem o plano estrita-mente comercial, tais como as que sereferem a questões ambientais e traba-lhistas. Para uma economia pequenacomo a do Chile, a relação custo-bene-fício pode ser favorável. Mas, numaeconomia com as características dabrasileira, boa parte dessas condiçõesseria desastrosa ou, no mínimo, poten-cialmente daninha. À medida que seconsolida essa sucessão de acordos delivre comércio entre os Estados Unidose outros países da região, o grau de li-berdade do processo negociador do

Mercosul vai ficando cada vez maisrestrito. Isso faz com que os sócios me-nores, mesmo insatisfeitos, optem porpermanecer, pois o custo da alternativanão-Mercosul pode ser alto. E essespaíses dependem do mercado do Mer-cosul para um percentual importantede suas exportações.

Desafios – E quais são as possibilidades de chegar

a um acordo com a União Européia?

Baumann – É interessante reparar que anegociação do acordo com a UniãoEuropéia teve sempre um caráter “re-flexo”, ou seja, ela se intensificou quan-do se intensificaram as negociações daAlca. Os cronogramas são muito pró-ximos. O Tratado de Madrid, que des-lancha a negociação do acordo com aUnião Européia, vem de 1995. São on-ze anos de negociação rolando. Em se-gundo lugar, o mandato dos represen-tantes europeus é para negociar regiãopor região, quer dizer, União Européiacom Mercosul.Nesse caso,a entrada daVenezuela põe um enorme conjunto dedúvidas. Não se sabe se as condiçõespara avançar nas negociações com aUnião Européia permanecem tão favo-ráveis quanto antes.

Desafios – Que peso político tem a entrada da

Venezuela no Mercosul?

Baumann – Não é só político, existemquestões econômicas mesmo. Supo-nhamos que se concretize o discurso denacionalização das plantas produtorasde petróleo.Até onde isso é aceitável doponto de vista da União Européia?

Desafios – No acordo do Mercosul não há nenhuma

restrição à adoção de políticas desse tipo?

Baumann – Não. O Tratado de Assun-ção (documento que deu origem aoMercosul) preocupa-se muito com apreservação da democracia. Já em re-lação ao respeito à propriedade, supo-nho que o tratado o preserva, mas nãosei se há alguma cláusula explícita nes-se sentido. De qualquer modo, seriamuito estranha a convivência plenaentre quatro economias regidas pelasforças de mercado e uma não.

Ricardo B. Labastier

ENTREVISTA 01/03/07 19:24 Page 13

Page 12: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

14 Desafios • março de 2007

Desafios – Esse dilema vai ser um caos...

Baumann – É para ter o Mercosul? Éou não é? Se é para ter o Mercosul,deve-se ter alguma complementarida-de produtiva. É preciso viabilizar ascondições de oferta nas quatro eco-nomias. Onde é que está a carênciamaior? Nos dois sócios menores. Sóhá um jeito, então: fazer um jogo desoma positiva. É somar esforços paraesperar o crescimento do mercado deforma que todos ganhem. Porque atéagora tem sido um jogo de soma zero.É toma-lá-dá-cá. Eu abro o setor tal,você abre o setor tal. Isso é uma ma-nobra para um participar do mercadodo outro. Na hora em que somarmosesforços para explorar de forma con-junta terceiros mercados, todos ga-nham. Mas, para isso, é preciso terparques produtivos que falem entre si,iniciativas comerciais conjuntas, umapolítica de Estado, uma geopolíticaque comporte esse tipo de coisa. E issoexige recursos.

Desafios – Existe essa vontade política por parte

dos governos de Brasil e Argentina?

Baumann – Desde a administraçãoFernando Henrique, e certamente in-tensificando-se na administração Lula,há uma tentativa de recuperação,de es-treitamento dos laços com os vizinhos.Sem dúvida. Atualmente, existem li-nhas de financiamentos do BNDES,coisa que nunca existiu. Existe o fundode investimentos, que nunca existiu.Existem também medidas claras nasquais o governo brasileiro procuraidentificar oportunidades para vendano mercado brasileiro de produtos pa-raguaios, uruguaios e argentinos. Sãoiniciativas importantes, mas certa-mente não suficientes. É preciso esta-belecer uma política de compras go-vernamentais que use a capacidade decompra do governo brasileiro para,por exemplo, alavancar uma indústriauruguaia, sei lá...

Desafios – Mas vai ser outro caos aqui...

Baumann – Mas esse é o ponto. É paravaler ou não é?

há dezoito anos. E já existe um conjun-to de itens negociados bastante expres-sivo, existem investimentos de parte aparte e interesses consolidados.

Desafios – O senhor se refere a investimentos pro-

dutivos?

Baumann – Sim,investimentos de com-plementaridade produtiva. Empresasargentinas que se instalam no Brasil evice-versa. Esses investimentos, quesão produtivos, reais, geram uma resis-tência muito maior às influências po-líticas, porque há muito a perder. E,além de tudo,como já foi dito,há a per-cepção de que somos vizinhos. É umfato inexorável, temos de buscar a me-lhor forma de conviver.

Desafios – O senhor é um otimista?

Baumann – Sou, mas também sei que épreciso chegar a algumas definiçõesurgentemente.Por exemplo,o que fazerpara dar percepção de ganho aos só-cios menores? Essa é uma questão cru-cial. Eu estive falando de Mercosul noNordeste e fiz uma provocação. Disseque, em algum momento, a sociedadebrasileira vai ter de definir se põe al-gum recurso do BNDES (Banco Na-cional de Desenvolvimento Econômicoe Social) no Nordeste, que é a regiãomais carente do país,ou se põe esses re-cursos para financiar os investimentosde uma indústria na região metropoli-tana de Assunção.

Desafios – Claro que o Mercosul é um bloco que

deve transcender os poderes dos partidos, mas esta-

mos convidando a Venezuela e a Bolívia para juntar-se

ao Mercosul num momento particularmente difícil, não?

Baumann – Sim, para todos. Mas hávantagens do ponto de vista geopolíti-co no longo prazo. Sobretudo a com-plementaridade energética viabilizan-do, em teoria, o desenvolvimento daseconomias da região. Essa é a idéia ori-ginal. A superação de limitações de in-fra-estrutura no setor de energia e acomplementaridade dos mercados.Vale lembrar que são mercados de di-mensões não desprezíveis.A Venezuelatem uma população de 30 milhões dehabitantes, com um poder aquisitivorazoável. Portanto, há argumentos fa-voráveis para procurar alguma intensi-ficação nas relações econômicas. Aquestão é em que termos.

Desafios – Mas, se o chavismo tomar o rumo mais

radical, será muito incômodo para o Brasil, que pleiteia

maior participação no comércio mundial, tê-lo sob o

mesmo teto.

Baumann – São muitas interrogações.Aonde o processo vai nos levar? É mui-to difícil dizer. Por isso, voltando à pri-meira pergunta, muita gente enxerga ocopo meio vazio.Todo mundo quer umacordo de livre comércio com a Euro-pa, os Estados Unidos e a Ásia. O Mer-cosul não tem. O número de acordosde livre comércio com terceiras partes érelativamente limitado.As normas ado-tadas em comum estão num percentualabaixo do desejado. O volume e a par-ticipação do comércio intrarregionalpoderia ser muito maior. O percentualde complementaridade produtiva po-deria ser bem maior. As manifestaçõespor parte de grandes empresários dosquatro países são constantemente des-favoráveis. Então, claro, existe efetiva-mente uma leitura negativa.

Desafios – E ainda assim o senhor continua enxer-

gando o copo meio cheio?

Baumann – Sim, enxergo. Porque, ape-sar de o comércio atualmente ser a me-tade do que foi em seu auge, ele ainda émais de seis vezes superior ao que era

“Em algum momento,

a sociedade brasileira

vai ter de definir se põe

um recurso do BNDES

no Nordeste, que é

a região mais carente do

país ou se vai financiar

os investimentos de uma

indústria paraguaia”

d

ENTREVISTA 01/03/07 19:25 Page 14

Page 13: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

LEGISLAÇÃO

A tecnologia anda mais

rápido que a burocracia, e

a convergência dos meios

eletrônicos de comunicação

obriga o governo a se

apressar na concepção

de um novo marco

regulatório para o setor.

A lei precisa contemplar

telefonia f ixa e móvel,

rádio, televisão aberta e

fechada, e acesso à

Internet. Tudo isso signif ica

mexer com um grupo de

empresas que respondem

por 3% do PIB nacional

Competição

Radio_TV3 01/03/07 19:27 Page 16

Page 14: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

18 Desafios • março de 2007

Na maioria dos países desenvolvidos, a regulamentação do setor de comunicação de massa

s antenas parabólicas reluzemnos telhados das casas simples dopequeno povoado à beira darodovia 175, perto de Nossa Se-

nhora da Glória – a Capital do Sertão –, naregião noroeste de Sergipe.Assim que che-gou a eletricidade,no fim do ano passado,amaioria dos moradores tratou de instalaruma parabólica e comprar um aparelho detelevisão. Entraram no rol dos 46 milhõesde domicílios brasileiros que têm pelo me-nos uma televisão. Ainda demorará parachegar até lá a Internet de banda larga, quejá está em 5 milhões de residências bra-sileiras, ou a TV a cabo, com seus 4,6 mi-lhões de assinantes,que pagam mensalidademédia de 51 reais.A maioria da populaçãoda pequena cidade sertaneja não ouviu falarna tal da convergência tecnológica que jápermite assistir a vídeos no celular e fazerligações telefônicas por meio de um micro-computador.Mas é um fenômeno que atraia atenção dos executivos de setores da eco-nomia que movimentam 3% do ProdutoInterno Bruto (PIB) brasileiro – telecomu-nicação, televisão aberta e por assinatura,telefonia celular e acesso à Internet.

Não é para menos, o ministro da Co-

municação, Hélio Costa, anunciou no mêspassado que pretende enviar rapidamenteao Congresso um projeto de lei alterandoo Código Brasileiro de Telecomunicações(Lei n.° 4.117, de 1962), que regulamentao funcionamento das emissoras de rádio ede televisão aberta. É bom lembrar que es-ses serviços são uma concessão do gover-no federal, pois usam um bem público, aatmosfera terrestre, para fazer chegar, porondas eletromagnéticas, o som e a imagema quase toda a população brasileira. O mi-nistro Costa também sinalizou que podeser a oportunidade para rever a legislaçãoatualmente em vigor para outros setoresconexos, como televisão por assinatura outelecomunicação.

Até hoje, cada segmento dessa indús-tria é sujeito a diferentes regras.A Lei Geralde Telecomunicação (LGT), n.º 9.472, de1997, define o que pode e o que não podena área de telefonia; a TV a cabo por assi-natura é regida pela Lei n.º 8.977, de 1995,mas não existe legislação para o acesso àInternet nem para os sinais de TV pagaque chegam por microondas ou satélite.Adeclaração de Costa repercutiu no Con-gresso Nacional, onde já começam as pri-

meiras escaramuças da batalha legislativasobre a regulamentação do setor.

Propostas Logo após a abertura do anolegislativo de 2007, no dia 5 de fevereiro, odeputado federal Paulo Bornhausen (PFL-SC) colocou lenha na fogueira ao apresen-tar um projeto de lei que abre as portas pa-ra que as operadoras de telecomunicações,mesmo as que estão sob controle estran-geiro, entrem no mercado de TV a cabopor assinatura. De acordo com uma lei de1995, para explorar os serviços de TV acabo por assinatura,as empresas devem terpelo menos 51% de capital nacional.Bornhausen é um dos vice-presidentes daComissão de Ciência e Tecnologia da Câ-mara dos Deputados,que apreciará em pri-meiro lugar quaisquer propostas de mu-danças do marco regulatório dos setores detelecomunicação e comunicação eletrôni-ca. Pelo projeto de Bornhausen, prestado-ras de serviços de telecomunicação pode-rão produzir, programar e distribuir con-teúdo eletrônico. Assim, as empresas detelefonia fixa, por exemplo, poderiam ven-der serviços de televisão por assinatura,com conteúdo próprio ou de terceiros.

Assim que chegou a eletricidade, a primeira iniciativa dos moradores de N. S. da Glória, no sertão sergipano, foi instalar parabólicas e comprar televisões

Ottoni Fernandes Jr.

A

Radio_TV3 01/03/07 19:29 Page 18

Page 15: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

Desaf ios • março de 2007 19

Três dias depois foi a vez do deputadoNelson Marquezelli (PTB-SP) dar o trocoao propor o projeto de lei n.º 70/2007, quelimita em 30% a participação de capital es-trangeiro nos setores de produção, progra-mação e distribuição de conteúdo de co-municação eletrônica. Incluiria, portanto,o setor de televisão por assinatura, no qualexiste o limite de 51% de capital nacionalno caso de transmissão por cabo e nãoexiste restrição à participação estrangeirana transmissão por satélite e por microon-das, conhecida pela sigla MMDS (veja

quadro explicativo ao lado).A proposta de Marquezelli generaliza

uma regra que vale para as emissoras de rá-dio e TV aberta, cujas concessões só po-dem ser exploradas por brasileiros natosou naturalizados há mais de dez anos, oupor pessoas jurídicas constituídas sob asleis brasileiras, nas quais pelo menos 70%do capital deve ser nacional.A proposta deBornhausen não implica uma briga com opoderoso setor de radiodifusão, para oqual ele manteve a regra que limita em 30%a participação de capital estrangeiro. Sãoos primeiros confrontos de uma com-petição entre pesos pesados. Por enquan-to, a batalha envolve apenas as empresas detelefonia a as que vendem canais pagos detelevisão a cabo e está poupando as emis-soras de televisão aberta.

A intenção de Costa é aprovar até o fi-nal do ano a legislação para o setor de co-municação eletrônica. Não será fácil cum-prir essa tarefa, dada a complexidade dotema e os interesses envolvidos. “É umabravata do ministro dizer que vai aprovara legislação em 2007, pois será preciso umintenso debate público, já que é uma ques-tão estratégica para o país”,afirma GustavoGindre, coordenador executivo do Insti-tuto de Estudos e Projetos em Comunica-ção e Cultura (Indecs), organização não-governamental com sede no Rio de Janei-ro. Na avaliação de Gindre, “a legislaçãobrasileira é muito fracionada, pois existeuma norma para MMDS, portaria paratelevisão a cabo via satélite e leis ultrapas-sadas para telecomunicações e radiodifu-

são aberta. Ele lembra que todos os paísesdesenvolvidos que adotaram o sistema di-gital para a televisão aberta reformularamsua legislação de acordo com a realidadeda convergência das tecnologias de teleco-municação e comunicação eletrônica.“Te-mos de passar uma borracha em tudo, nãoserá necessário uma lei única, mas regrasclaras que envolvam todos os segmentos

da indústria”, diz Gindre, que defende acriação de duas agências diferentes para osetor: uma à imagem da atual Agência Na-cional de Telecomunicação (Anatel), quecuidaria da infra-estrutura tecnológica;outra que ficaria a cargo da programaçãoe do conteúdo dos meios de comunicaçãoeletrônica. O modelo de duas agências foiadotado pela França, observa Gindre.

Acesso Quem também duvida da possibi-lidade de aprovação, ainda em 2007, deuma nova lei para comunicação eletrônicaé Alexandre Annemberg,diretor executivoda Associação Brasileira de TV por Assina-tura (ABTA).“A discussão da nova legis-lação será longa e complexa, até porque osdonos de emissoras de rádio e de televisãoaberta têm forte presença no Congresso”,pondera ele. Em sua opinião, o novo mar-co regulatório deveria levar em conta a ca-deia de valor da área de comunicação ele-trônica: para os produtores de conteúdo,nacionais ou estrangeiros, deveriam valeros dispositivos constitucionais que regulama liberdade de imprensa e a legislação dosdireitos autorais; para as empresas quetransportam o conteúdo por ondas eletro-magnéticas, cabo, microondas ou satélite,a responsabilidade ficaria com a Anatel; fi-nalmente, valeria o Código de Defesa doConsumidor para as empresas que levam oserviço até o usuário final,seja televisão porassinatura, seja acesso de alta velocidade àInternet.Dessa forma,argumenta Annem-berg, seria possível que as empresas es-trangeiras entrassem no setor de transportedo conteúdo, que exigirá enormes investi-mentos em infra-estrutura.

Embora as empresas de televisão aber-ta pareçam ter sido poupadas nas primei-ras discussões, dificilmente ficarão fora dalinha de fogo. Laurindo Leal Filho, profes-sor da Escola de Comunicações e Arte(ECA) da Universidade de São Paulo (USP),defende a criação de uma única agênciapara controlar o conteúdo e as operaçõesde todos os meios de comunicação eletrô-nica e de telecomunicações.“Na maioriados países desenvolvidos, a nova regula-

foi alterada para acompanhar o avanço do processo de convergência tecnológica

Para compreender amontanha de siglas

ADSL (sigla em inglês de Linha de Assinan-te Digital Assimétrica) – Sistema usado pe-las operadoras de telefonia fixa no Brasilpara acesso à Internet, compartilhado coma linha telefônica normal por uma conexãode fio de cobre que segue até o tronco defibra óptica.Atinge até 6 Mbps.

Cabo coaxial – Cabo condutor com doisnúcleos de cobre isolados que permite con-duzir os sinais de televisão por assinaturasem interferências.

DTH (sigla em inglês de Direto para a Resi-dência) – Sistema de transmissão usado poroperadoras de televisão por assinatura,coma utilização de um decodificador de sinal euma antena que sintoniza um satélite.

MMDS (sigla em inglês de Sistema de Dis-tribuição Multiponto e Multicanal) – Sistemade distribuição de canais de TV por micro-ondas, usado por algumas operadoras detelevisão por assinatura no Brasil.

MPEG-4 (sigla em inglês de Grupo de Es-pecialistas em Imagem em Movimento) –Padrão utilizado primeiramente para com-pressão de dados digitais de áudio e vídeo.Foi introduzido no final de 1998.Quando uti-lizado em TV Digital, permite a transmissãode até quatro programações em formatostandard (igual ao de um filme em DVD) ouuma programação em alta definição.

Radio_TV3 01/03/07 19:30 Page 19

Page 16: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

20 Desafios • março de 2007

As operadoras de telefonia f ixa e TV a cabo tentam vender a seus usuários pacotes que incluem

A disputa começou a pegar fogo em2004, quando a poderosa Telefónica delMéxico (Telmex) fez um negócio com aGlobo Comunicação e Participação (Glo-bopar), da família Marinho. A Telmexcomprou todas as ações preferenciais e 49%das ações com direito a voto da Net Ser-viços,empresa que controlava 29 distribui-doras de televisão por assinatura em todoo Brasil, sendo a líder do segmento, com45% do total de usuários.Em dezembro de2004, a Anatel deu autorização prévia paraa transação e a aprovação definitiva ocor-reu em maio de 2006,quando a Net já esta-

mentação acompanhou o avanço da con-vergência tecnológica. Foi assim na In-glaterra, com a montagem em 2003 do Es-critório de Comunicação (Ofcom, da siglaem inglês), que também é responsável pe-las concessões de novos canais de televisãoaberta, em substituição aos cinco órgãosreguladores anteriormente existentes.”

No Brasil, diz Leal, é necessário mudaro atual modelo de outorgas das concessõesde canais de TV aberta, que ainda é forte-mente influenciado por interesses políti-cos, especialmente pela ação de deputadose senadores que são proprietários de emis-soras de rádio e televisão. Outro erro dosistema brasileiro é que ganha a licitaçãoda emissora de televisão aberta quem dero maior lance, enquanto na Inglaterra ovencedor pagará uma mensalidade, calcu-lada sobre o faturamento, sustenta Leal.“Além disso, no nosso modelo, na hora dalicitação não é avaliado o conteúdo queserá transmitido, ao contrário do sistemainglês, onde a Ofcom recentemente con-cedeu a licença a um canal que apresentoua melhor programação, embora o aluguelproposto fosse mais baixo.”

O consultor Juarez Quadros, da OrionConsultores Associados, acredita que seavançará ao longo do ano,mas a aprovaçãodeverá ficar para 2008.“O processo deveriater começado antes”,diz Quadros,que foi oúltimo ministro das Comunicações do go-verno FHC e entregou um esboço de Lei deComunicação de Massa a seu sucessor,Miro Teixeira,atual deputado federal (PDT-RJ), que não fez avançar o processo. Para

Quadros, a convergência tecnológica re-comenda a existência de uma única agên-cia reguladora, e a Anatel, que já está estru-turada,deveria ocupar esse espaço,mas co-mo órgão independente do ExecutivoFederal, com função de Estado. SegundoQuadros,a LGT permite que as operadorasde telefonia fixa explorem serviços de TVpor assinatura fora de suas áreas geográfi-cas de concessão, mas isso estava condi-cionado ao cumprimento das metas de ex-pansão do número de terminais públicos eprivados em suas regiões, conforme foi es-tabelecido nos contratos que firmaram coma Anatel.Atualmente,existem 42 milhões deconexões telefônicas fixas no Brasil,e a taxade crescimento é muito inferior à dos tele-fones celulares ativos,que atingiram a mar-ca de 100,7 milhões de unidades em janeiro.As maiores empresas de telefonia fixa –Brasil Telecom, Embratel, Telefónica eTelemar – já cumpriram as metas de univer-salização há muito tempo e agora queremvender serviços de valor adicionado a seusclientes,além de Internet de alta velocidade.

Pacote As batalhas que ocorrerão no Con-gresso refletem a crescente competiçãopela conquista de maiores nacos nos mer-cados de televisão por assinatura,acesso dealta velocidade à Internet e telefonia fixa.As operadoras de telefonia fixa e de TV pa-ga querem vender ao mesmo usuário oserviço chamado triple play, um pacotemúltiplo enviado pelo mesmo meio: cabode TV por assinatura, linha telefônica oumicroondas e satélite.

2003 2004 2005 2006

Telefones fixos em operação 39,2 39,6 39,6 –

Celulares em operação 46,4 65,6 86,2 99,9

TV por assinatura (assinantes) 3,5 3,8 4,2 –

Usuários de Internet residenciais 20,5 17,9 18,9 22,1

Conexões de banda larga 1,2 2,3 3,8 –

Fonte: Anatel

Evolução das telecomunicações no Brasil (em milhões)

Equipamentos do laboratório de TV Digital da

Radio_TV3 01/03/07 19:31 Page 20

Page 17: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

Desaf ios • março de 2007 21

va oferecendo serviços de triple play, pois,além dos canais por assinatura e acesso dealta velocidade à Internet,que já constavamde seu portfólio, incluiu as ligações de tele-fonia fixa, local, nacional e internacional.Isso foi possível porque a Embratel tambémpertence à Telmex, a exemplo da operado-ra de telefonia móvel Claro. A lógica donegócio é tirar partido da infra-estruturade cabos já instalada e aumentar o fatura-mento com cada usuário, aproveitando omesmo canal de transmissão de sinais.

Em julho de 2006, foi a vez da Telemaravançar seu peão ao comprar por meio desua subsidiária Oi, de telefonia celular, ocontrole acionário da Way TV. Desembol-sou 132 milhões de reais para ficar com aoperadora de TV a cabo, que também for-nece acesso de banda larga à Internet emBelo Horizonte, Uberlândia, Barbacena ePoços de Caldas. A Net Serviços, líder dosegmento de televisão por assinatura, esta-va qualificada para participar do leilão daWay TV, mas não apresentou proposta.

Entretanto, não demorou para que aNet desse o troco. Em 13 de outubro domesmo ano, fez o primeiro movimento

para assumir o comando da Vivax, empre-sa de capital aberto que opera TV a cabono interior paulista, ao comprar os 36,7%de seu capital social, que pertencia a Ho-rizon Telecom International (HTI). Naépoca, a Vivax tinha 312,7 mil assinantesde TV por assinatura e 106,2 mil no servi-ço de banda larga, enquanto a NET Ser-viços tinha, respectivamente, 1,6 milhão e532,2 mil. O acordo prevê uma segundaetapa, em que a Net assumirá o comandoacionário por meio da troca de ações comoutros acionistas da Vivax.

Logo em seguida,no dia 29 de outubro,foi a vez da Telefónica, operadora de telefo-nia fixa de capital espanhol, fazer sua ma-nobra ao comprar as operações de distri-buição de televisão por assinatura por mi-croondas (MMDS) da TVA, do GrupoAbril, nas cidades de São Paulo, Rio deJaneiro, Curitiba e Porto Alegre.A empresaespanhola também abocanhou 100% dasações preferenciais e parte das ações or-dinárias das operações de TV a cabo daTVA em São Paulo,Curitiba,Florianópolise Foz do Iguaçu, até o limite de 49% docapital,definido pela Lei n.° 8.977,que rege

a TV a cabo.Não existe restrição para a par-ticipação do capital estrangeiro na dis-tribuição de serviços de TV por assinaturavia MMDS.

Mas a operadora de telefonia fixa de ca-pital espanhol resolveu ganhar tempo e jáestá oferecendo serviço de televisão por as-sinatura (DTHi), transmitido por satélite,com uma programação completa, que in-clui os principais canais de filmes, entrete-nimento pelo preço promocional de 79 reaismensais, sem cobrar pelo conjunto deco-dificador e antena. É um preço muito infe-rior ao oferecido pela Net.Annemberg, daABTA, acha que esse “é um benefício apa-rente temporário, uma forma de dumping,ou seja, vender abaixo do preço de custopara ganhar mercado”. Para explorar esseserviço, a Telefónica comprou no anopassado a licença de operar televisão porassinatura distribuída por satélite da Astral-sat. José Fernandes, presidente AssociaçãoBrasileira de Concessionárias do ServiçoTelefônico Fixo Comutado (Abrafix),disseem um seminário organizado pela EditoraConverge,em Brasília,no mês passado,queuma das funções da agência reguladora

ligações telefônicas, acesso de alta velocidade à Internet e canais de TV por assinatura

Bruno Miranda/Folha Imagem Marcelo Ximenez/Folha Imagem

Universidade Mackenzie, em São Paulo (acima), e telefone acoplado ao computador mostrando f isicamente a convergências das mídias

Radio_TV3 01/03/07 19:31 Page 21

Page 18: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

22 Desafios • março de 2007

O lançamento da TV dig ital brasi leira pode ser uma oportunidade para que produtoras

setembro de 2006,enquanto os acessos pe-lo sistema ASDL só aumentaram 40,5% nomesmo período.

Atualmente, a tecnologia usada pelasempresas de TV a cabo por assinatura ga-rante maior velocidade de acesso à Internetdo que a empregada pelas empresas de tele-fonia fixa, que ainda usam fios de cobrepara ligar suas redes de fibra óptica aoponto onde estão instalados os telefones.Segundo Rubens Glasberg, diretor e editorgeral da Editora Converge, especializadaem comunicação eletrônica, a Telefónicacolocará brevemente em teste em bairrosde alto poder aquisitivo da capital paulistauma rede que chegará aos consumidoresfinais por fibra óptica. A BT, maior ope-radora de telefonia fixa da Inglaterra, estáinvestindo cerca de 18 bilhões de dólaresnuma nova infra-estrutura de comuni-cação, toda em fibra óptica.As telefônicasquerem multiplicar suas fontes de receita etemem a competição das empresas de TVa cabo, que já oferecem pacotes que en-volvem acesso de banda larga à Internet etelefonia fixa,além dos canais por assinatu-ra, como é o caso da NET. Tudo por causa

Avanço A resposta das operadoras de tele-visão a cabo foi contestar junto à Anatel,por meio da ABTA, o avanço das empresasde telefonia fixa sobre a Way TV e TVA.“Sea Anatel não impedir as aquisições”, avisaAnnemberg, do ABTA,“entraremos comrecurso no Conselho Administrativo deDefesa Econômica (Cade), pois as empre-sas de telefonia fixa poderão sufocar toda aconcorrência se oferecerem serviços de TVpor assinatura nas regiões onde têm suasconcessões,uma vez que contam com umainfra-estrutura de distribuição imbatível.”Para Annemberg, as empresas de telefoniafixa não estão realmente interessadas noserviço de venda de TV por assinatura,massim no fornecimento de acesso à Internetpor banda larga. Em setembro do ano pas-sado,existiam 3,9 milhões de usuários queacessavam a Internet banda larga pelo siste-ma ASDL (leia quadro explicativo na pág.19)das operadoras de telefonia fixa (77% dototal) e 1,1 milhão que utilizavam os cabosdas empresas de TV por assinatura (21%).O que deve estar preocupando as telefôni-cas é o crescimento dos usuários via TV acabo,que subiu 100,2% nos doze meses até

deveria ser preservar os investimentos dastelefônicas que cumpriram seus planos deaplicações. Ele aproveitou para dar umacutucada nas empresas de televisão a cabo,“que têm proteção legal há dez anos, masnão fizeram os investimentos propostos,que ficaram restritos às grandes cidades”.

A Telemar e a Brasil Telecom retruca-ram em fevereiro, assinando um acordooperacional com a Sky-DirectTV, empre-sa que domina o mercado de televisão porassinatura transmitida por satélite.Agora,as duas operadoras vão passar a oferecer opacote triple play, com ligações telefônicas,acesso de banda larga à Internet e canaisde televisão por assinatura. A Brasil Te-lecom lançará o produto inicialmente emBrasília e Campo Grande, mas sem incluirainda a telefonia celular, com previsãopara março. Já a Telemar dará a largada,também em março, no Rio de Janeiro eem Niterói, mas oferecerá telefonia móvel,por meio da Oi. Nenhuma das operado-ras cobrará pelo decodificador e antena,pelo menos na fase de lançamento, a ex-emplo do que fez a Telefónica com seuserviço Você TV.

O ministro da Comunicação, Helio Costa, pretende aprovar ainda neste ano a legislação para o setor de comunicação eletrônica

Sergio Lima/Folha Imagem

Radio_TV3 01/03/07 19:32 Page 22

Page 19: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

da convergência de tecnologias, a mesmaque permite fazer ligações gratuitas e falarcom pessoas em qualquer parte do mun-do através de dois microcomputadores quetenham o programa Skype instalado.

Wimax O próximo lance da competiçãono setor será o leilão que a Anatel fará nes-te ano das licenças para explorar o sistemaWimax de acesso sem fio, de alta veloci-dade, à Internet. O Wimax poderá ser usa-do por microcomputadores ou telefonescelulares, que utilizam a faixa de 3,5 GHza 10,5 GHz do espectro eletromagnético.A Anatel tentou realizar o leilão no anopassado, mas teve de suspendê-lo em ra-zão de uma decisão judicial solicitada pelaAbrafix. No ano passado, cerca de cemempresas apresentaram propostas, mas oedital da Anatel impedia que as operado-ras de telefonia fixa disputassem as licen-ças em suas áreas de concessão.“Para pro-mover a concorrência faz sentido deixarfora do ambiente Wimax as operadorasfixas para que não haja um fechamento demercado por parte delas tanto no leilãoquanto na operação”, avalia Ronaldo Se-roa da Mota, pesquisador do Instituto dePesquisa Econômica Aplicada (Ipea). Asoperadoras de telefonia fixa até aceitariamficar fora da operação de Wimax em suasáreas de concessão por dois anos, o pro-blema é que os vencedores da licitação le-varão, pelo menos, cinco anos para mon-tar uma rede em condições de competircom seus concorrentes pesos pesados, se-gundo Mota.

No começo de fevereiro, a Anatel abriunovamente o processo de consulta públicaque precede a elaboração do edital.O novotexto trará mudanças formais em relação aolançado no ano passado, mas deverá man-ter as restrições à participação das telefôni-cas em suas áreas de concessão. O editaldefinirá preços mínimos e máximos, nú-mero de operadores por região geográfica,as obrigações dos concessionários e quemestará autorizado a participar do processo.

A forma de operacionalizar a TV digi-tal aberta e gratuita no Brasil é outro tema

que vai gerar muita polêmica e deverá estarpresente na discussão do novo marco re-gulatório. Em julho do ano passado, o go-verno federal emitiu o Decreto Lei n.°5.820, que adotou o padrão japonês para atelevisão digital aberta brasileira e estabele-ceu um período de transição até 2016 paraque todas as emissoras de TV aberta, de-tentoras das atuais concessões, passem atransmitir a programação apenas em sinaldigital.“O Ministério da Comunicação po-deria ter aproveitado a implantação do sis-tema digital para abrir novas licitações paraos canais digitais, mantendo as concessõesanalógicas para os detentores das outor-gas”, sustenta Leal, da ECA-USP. A opçãodo governo federal foi entregar às atuaisemissoras o direito de explorar em consig-nação os novos canais digitais,explica Leal,“mas acabou dando muito mais, pois a di-gitalização dos sinais permite que nummesmo intervalo de freqüência sejamtransmitidas várias programações”.

No sistema analógico, cada emissoraque ganhou a outorga recebeu uma faixa de6 Mhz no espectro eletromagnético, ou se-ja, um canal, pelo qual só podia ser trans-mitida uma única programação, explicaGindre, do Indecs,“mas a tecnologia digi-tal permitirá colocar várias programaçõesno mesmo canal,dependendo da definição(qualidade) da imagem”. Quem optar portransmitir em alta definição manterá umaúnica programação, mas quem escolher adefinição padrão (imagem com a quali-dade de um filme em DVD) poderá colo-car no ar quatro diferentes programaçõesse for usado o método de compressão desinal MPEG4 (leia quadro explicativo na

pág. 19).“Minha sensação é que só a TVGlobo dará a partida nas transmissões di-gitalizadas e as outras emissoras vão espe-rar para ver,pois é muito alto o custo de im-plantação do novo sistema”,aposta Gindre.

O lançamento da TV digital brasileirapode ser uma oportunidade para que pro-dutoras independentes ganhem espaço naprogramação das emissoras abertas. “Seriapreciso criar uma legislação que determi-nasse um porcentual mínimo de progra-

mação regionalizada e independente, bemcomo um ente regulador que faça cumpriras regras.” Está parado no Congresso des-de 2003 o Projeto de Lei n.° 59, apresenta-do pelo deputado federal João PauloCunha (PT-SP), que obrigaria as emisso-ras de televisão a transmitir um númeromínimo de horas de programação cultu-ral, artística ou jornalística, produzidos naregião onde estão sediadas, sendo que 40%desse total deveria ser de responsabilidadede produtoras independentes. Leal Filhoacredita que o novo órgão regulador da co-municação eletrônica de massa terá de en-frentar o desafio de influir na programaçãoda televisão aberta para melhorar a quali-dade do conteúdo veiculado e também co-brar de quem ganhar a concessão a res-ponsabilidade por tudo que vai ao ar.

Defensores da melhoria da qualidade daprogramação das emissoras de televisãoaberta, Gindre entre eles, propõem que aconcessão das licenças definitivas para ex-plorar a televisão digital incluam regras quelevem em conta o conteúdo e fortaleçam aprodução independente,o que contribuiriapara o desenvolvimento da indústria cul-tural brasileira. Motta, do Ipea, concordaque o objetivo das mudanças nas regras de-verá ser melhorar a qualidade dos serviçosprestados aos usuários,mas acha difícil tirarda jogada as emissoras e as retransmissorasde televisão aberta,“que investiram duranteanos e cujo prazo de concessão ainda nãoterminou”. O debate promete.

independentes ganhem espaço na programação das emissoras abertas

Agência Nacional de Telecomunicação (Anatel)www.anatel.gov.br

Associação Brasileira de TV por Assinatura (ABTA)www.abta.org.br

Fórum Nacional pela Democratização |da Comunicação (FNDC)www.fndc.org.br

Instituto de Estudos e Projetos em Comunicação e Culturawww.indecs.org.br

Saiba mais:

d

Desaf ios • março de 2007 23

Radio_TV3novo 05/03/07 14:52 Page 23

Page 20: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

INTERNACIONAL

sxc.

hu

Argentina_ok 01/03/07 19:35 Page 24

Page 21: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

A grama do vizinhoNo f inal de 2001, a Argentina parecia condenada a queimar no fogo do inferno. Em plena recessão,

com taxas estratosféricas de desemprego e atravessando uma profunda crise política, poucos

apostariam que seis anos depois o vizinho estaria registrando crescimento do PIB na casa dos 8%

e ostentando um risco-país inferior ao do Brasil. Como foi que isso aconteceu?

P o r G i e d r e M o u r a , d e S ã o P a u l o

Argentina_ok 01/03/07 19:36 Page 25

Page 22: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

26 Desafios • março de 2007

“A pr ime ira co isa que deve f icar c lara é que o caso da Argent ina é abso lu tamente

saram após a Segunda Guerra Mundial.Atão falada modernidade alemã só veioporque o país foi destruído e precisou sereconstruir”, exemplifica Ricupero.

Passado Para entender melhor a trajetóriaargentina é preciso refrescar a memória. Sehoje o país tem a moeda bem desvaloriza-da em relação ao dólar, por toda a décadade 1990 a economia funcionou dentro daparidade com a moeda norte-americana; ea crise de 2001 pode ter sido a mais grave,mas não foi a primeira.Apesar de conflitosentre conservadores militares e liberais civisna primeira metade do século passado, aeconomia da Argentina conseguiu transitarcom certa tranqüilidade no entre-guerras.As incertezas políticas e econômicas só ti-veram início na segunda metade do séculoXX. Podemos então começar a contar ahistória a partir do final da Segunda Guerra,quando sobe ao poder o general Juan Do-mingo Perón,personagem que deu origemao movimento peronista, de cunho na-cionalista e altamente centralizador. Ele caiem 1955,e se segue uma intensa troca de po-der entre presidentes civis e militares,golpese ditaduras, que dura quase três décadas.

Em 1983, Raúl Alfonsín assume a Pre-sidência com a missão de colocar o paísnos trilhos da democracia, mas não conse-gue controlar as rédeas da economia e, nofinal da década de 1980, a Argentina se vêcompletamente tomada pela inflação. Em1988, o índice chega a 348% e, no ano se-guinte, ultrapassa a casa dos 3.000%. Équando o peronista Carlos Menem entraem cena e convoca Domingo Cavallo parao Ministério das Finanças com a tarefa dedebelar a hiperinflação. Ele estabelece oPlano Cavallo – ou Plano de Convertibili-dade –, que fixa, na Constituição, o pesono valor do dólar. A fórmula funciona e,entre 1991 e 1993, o PIB cresce a taxas se-melhantes às da atualidade.

Em 1995, porém, surgem os primeirossinais de recessão. Começam os efeitos docontágio, quando a economia de um paísfica abalada pelas turbulências ocorridasem outras regiões.Do México vem o Efeito

editor de vídeo Marcelo Kohekvoltou deslumbrado de sua via-gem de ano-novo a Buenos Aires.O encantamento não é fruto ape-

nas da conhecida beleza arquitetônica dacidade, ele vem mais do bolso do que dosolhos.“Lá o ônibus custa menos da metadeque em São Paulo. Tudo é mais barato!”Asurpresa vivida na estada de alguns dias nacapital portenha fez com que o editor cogi-tasse seriamente a hipótese de mudar paraum país aparentemente mais tranqüilo ebarato que o Brasil.

Ficar impressionado com a Argentina,cinco anos após uma crise econômica quedeixou mais de 50% da população abaixoda linha de pobreza,não é coisa só de turis-ta. O mesmo tom de admiração pode sernotado nas declarações de economistas,que não escondem elogios – e alguns a sur-presa – por ver como a Argentina conse-guiu sair daquele que foi considerado umdos maiores colapsos econômicos da Amé-rica Latina. Alguns poucos, mais céticosem relação aos feitos do governo, acredi-tam que pode se tratar de uma nova bolha.Mas a conclusão de todos é uma só: a Ar-gentina do ano 2007 é um país completa-mente diferente do passado.

As taxas de crescimento do Produto In-terno Bruto (PIB) na casa dos 8%, já poralguns anos consecutivos, colocam umadúvida no peito de países vizinhos que malconseguem crescer 3%, como o Brasil. Alógica simplista é: por que não adotar omodelo argentino, dar calote, proteger omercado interno, gerar emprego e crescerde forma significativa? Bem, as coisas nãosão exatamente fáceis assim.“A primeiracoisa que deve ficar clara é que o caso daArgentina é absolutamente excepcional.Dificilmente se pode extrair algo a ser ex-perimentado pelo Brasil, ou por qualqueroutro país, que amarga baixas taxas decrescimento”, alerta o embaixador RubensRicupero, diretor da Faculdade de Econo-mia da Fundação Armando Álvares Pen-teado (Faap), em São Paulo.“É como que-rer exigir da Inglaterra uma modernizaçãocomo a que a Alemanha e o Japão pas-

Tequila, da Ásia as instabilidades dos Ti-gres Asiáticos e, por fim, a crise da Rússia.A fragilidade das economias dos países emdesenvolvimento leva os investidores a evi-tar os mercados emergentes. A contribui-ção brasileira para a derrocada Argentinavem em 1999, com a desvalorização do realem relação ao dólar. O país vizinho per-manece firme na paridade e a poucos pas-sos do precipício econômico.

Em plena recessão, sai Menem e entraFernando de la Rúa, que dá continuidadeà política do governo anterior, com medi-das de redução do dinheiro em circulaçãoe controles tributários, forçando a queda

O

Argentina_ok 01/03/07 19:37 Page 26

Page 23: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

excepc iona l . D i f i c i lmente se pode ex tra i r a lgo a ser exper imentado pe lo Bras i l ”

Desafios • março de 2007 27

dos preços. Sem poder para dominar ataxa de juro, a Argentina vê os investimen-tos estrangeiros secarem e a população,desconfiada, sacar a poupança dos bancos.Tal qual Menem, o novo presidente resga-ta Cavallo, o pai da paridade, que nela in-siste. Com a crise cada vez mais forte, mi-nistro e presidente renunciam, e a Argenti-na cai no buraco sem nenhuma rede deproteção. Era dezembro de 2001.

Ao contrário do final de ano tranqüilopresenciado pelo brasileiro Marcelo Kohekem 2006,há cinco anos o réveillon em Bue-nos Aires foi pautado pelo caos.Foram cin-co presidentes em menos de duas semanas

e violentos panelaços que levaram à mortemais de trinta pessoas.No bairro de PuertoMadero, a Copacabana argentina para as-suntos de Réveillon, poucos restaurantesabertos e parcos turistas estrangeiros ten-tavam brindar o ano que chegava. Os ar-gentinos ficaram em casa,sem motivos paracelebrar ou ter esperanças em 2002.A faltade confiança era justificada.Ao final daque-le ano,o PIB tinha despencado mais de umadezena de pontos percentuais (veja gráfico

na pág. 28) e mais de 50% da população es-tava empobrecida.

Diante desse cenário,a moratória foi de-clarada e, com ela, a suspensão total do

Centenas de desempregados protestaram na Plaza de Mayo, em Buenos Aires, durante a recessão, em 2003

Reuters/Enrique Macarian

pagamento das dívidas,que somavam mais100 bilhões de dólares,seguida do “corrali-to” financeiro, que limitou os saques ban-cários dos argentinos a 250 pesos por se-mana.Após o troca-troca de comando naPresidência,Eduardo Duhalde foi eleito pe-lo Congresso numa sessão de emergênciae veio, finalmente, a inevitável desvaloriza-ção do peso. Saldo final: um país que, noinício do século passado, ocupava o postode sétima economia mundial viu,em 2002,sua taxa de desemprego alcançar os 21%.

Reconstrução O PIB da Argentina nes-sa época acumulava perdas de 18% e o

Argentina_ok 01/03/07 19:38 Page 27

Page 24: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

28 Desafios • março de 2007

Maior integração no processo produtivo do Brasi l e da Argentina só v ir ia a contribuir

internacional da Universidade de Quil-mes, em Buenos Aires.

Tomás Málaga, economista-chefe doBanco Itaú, também prefere esperar poruma análise mais longa dos ciclos da eco-nomia argentina antes de dizer que o paísestá saudável.“Se pegarmos o período de1979 a 2006 como base de comparação,veremos um crescimento médio da Argen-

tina na casa dos 2%,algo muito semelhanteao do Brasil. É sempre bom ter em menteque o índice de quase 9% foi atingido combase em uma grande derrocada e a muitocusto.A Argentina é hoje um país que viveuma política de incentivo de demandabaseada no aumento do consumo internoe do gasto público, na política monetária eno mercado externo”, analisa Málaga.

governo de Duhalde escalou, em abril de2002, um novo ministro da Economia,Roberto Lavagna, que ficou no cargo até2005, transitando entre os mandatos deDuhalde e Néstor Kirchner,presidente des-de 2003.“Diante do caos que tomou contado país, a recuperação foi realmente sur-preendente.A política adotada por Lavagnafuncionou,principalmente quando chegoua hora de conversar com os credores. Eleobteve descontos inacreditáveis”, opinaRicupero. Outro fantasma que assolava aArgentina eram as conseqüências das pri-vatizações do governo Menem. Os con-tratos com concessionárias que foram fir-mados em dólar atingiram valores exorbi-tantes.“A renegociação levou muitas em-presas a deixarem a Argentina e não é à toaque nos tribunais de arbitragem interna-cional o país lidera as reclamações”, com-pleta o embaixador.

A estratégia econômica também man-teve os gastos do país sob controle. Com aintensa desvalorização do peso e o aumen-to das exportações, veio o superávit fiscal.O Banco Central emitiu pesos para a com-pra do dólar e, com medidas como a taxa-ção das exportações agrícolas, a Argentinacomeçou a respirar ao final de 2003. “OBanco Central tem muito poder de fogopara enxugar a moeda e comprar divisassem provocar desequilíbrio. A Argentinahoje é o espelho oposto do Brasil. Aqui, apreocupação é com a estabilidade e o cres-cimento moderado”, opina Fabio Giam-biagi, pesquisador do Instituto de PesquisaEconômica Aplicada (Ipea).

Além do PIB elevado, um indicativo darecuperação são as reservas internacionaisna casa dos 30 bilhões de dólares. Para2007, a estimativa de crescimento do PIBestá acima de 7%.“É muito cedo para afir-mar que a economia argentina se recuper-ou plenamente, mas há um consenso deque estamos transitando por um períodode franco crescimento.Agora é preciso vercomo essa situação favorável atual seráaproveitada no longo prazo para fazeruma real reconstrução do país”, alertaGustavo Lugones, professor de economia

Puerto Madero, bairro novo e elegante de Buenos Aires, que recuperou seu glamour após a crise

Variação do PIB argentino (% em relação ao ano anterior)

1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

8,1

3,9

8,8 9,0 9,28,0

-3,4

-0,8

-4,4

-10,4

Fonte: FMI - valores de 2005 e 2006 projetados pelo FMI

sxc.hu

Argentina_ok 01/03/07 19:39 Page 28

Page 25: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

Desaf ios • março de 2007 29

Controle Na rua Florida,tradicional corre-dor de comércio de Buenos Aires,pedestresdesfilam com suas sacolas cheias de pro-dutos recém-adquiridos. Tudo vende feitoágua. Os preços estão baixos e MarceloKohek aproveitou sua estada para compraralgumas camisetas por 20 pesos (aproxi-madamente 13 reais) as quais,segundo ele,no Brasil não sairiam por menos de 60 reais.Comprar está na moda na Argentina.

A união das diversas medidas econômi-cas, como a desvalorização, o protecionis-mo, a retenção sobre as exportações e o in-centivo à produção,tornou os produtos na-cionais mais atrativos. Some-se a isso umapolítica rigorosa de controle dos preços quemantém mais baixo o valor estampado nasetiquetas. Tarifas públicas, como a de ener-gia elétrica, também estão baratas, fazendocom que os nossos vizinhos paguem menosda metade pelo uso da eletricidade do queos brasileiros e outros latino-americanos.Ocerco aos preços deve continuar,pelo menosaté as novas eleições presidenciais,marcadaspara o final deste ano.Manter os preços temsido uma das principais funções da atualministra da Economia, Felisa Miceli.

Alimentos, roupas, eletrodomésticosmais centenas de outros produtos que tive-ram seu preço rigorosamente congelado fi-zeram com que o setor agropecuário es-perneasse contra a política de Kirchner e,em conseqüência, a carne ficasse mais raranos supermercados.Algo que lembra a rea-lidade brasileira na época do Plano Cruza-do.“Nisso a Argentina hoje é muito diferentedo Brasil. Aqui vigora a política livre depreços, lá o presidente telefona ao dono dosupermercado para perguntar por que opreço do óleo subiu”, comenta Giambiagi.

Com essa marcação cerrada, a Argen-tina conseguiu fechar o ano passado coma inflação na casa dos 12%. Mas nem to-dos confiam cegamente nesse índice. Noinício de 2007, surgiu a suspeita de que ainflação estaria sendo manipulada pelogoverno, com o controle intenso dos pro-dutos que mais interferem no Índice dePreços ao Consumidor (IPC).A acusaçãoé que a manobra estaria varrendo para

debaixo do tapete uma inflação real demais de 2% ao mês.“Uma das dúvidas so-bre a sustentabilidade do modelo argenti-no é a ameaça da volta da inflação. Se real-mente está em 2%, é um risco inflacio-nário superior a 20% ao ano”, reflete Má-laga. Outro entrave na arrancada do paísé a questão energética. Com a aceleraçãoda economia, a previsão é que as reservasde gás, que teriam condições de sustentaro país por quinze anos, não sejam sufi-cientes para dez.

Até o momento, a supervalorização dascommodities no mercado internacionaltem colaborado de forma decisiva para oprocesso de recuperação, mas para Lugo-nes está na hora de pensar numa alteraçãodo perfil produtivo do país, estimulandoa fabricação de itens de maior valor agre-gado, especialmente na área de biotec-nologia e informática.“Mesmo em produ-tos menos complexos podemos priorizaras diferenças. Não há como a Argentinacompetir com o mercado brasileiro nosegmento de calçados populares, mas po-demos aprimorar o trabalho com designe qualidade diferenciados, como peças ex-clusivas”, exemplifica o professor.

Social Três anos de ajustes foram necessá-rios para reverter o quadro econômico pós-crise,mas reparar as seqüelas sociais adqui-ridas nas últimas décadas é uma tarefa queparece bem mais complexa. Uma análisenumérica mostra que alguns índices sociaismelhoraram,como o desemprego,que ho-je está na casa dos 10%,e a taxa de pobreza,que recuou. Mas é impossível dizer que asociedade argentina como um todo saiu dacrise.A reversão do quadro social preocu-pa.“Temos o PIB crescendo, mas não po-demos falar que a recuperação da Argen-tina é total.A crise deixou um custo socialelevadíssimo. No auge dos problemas, apopulação ficou 50% mais empobrecida,mas esse índice ainda é alto, de 20%”, res-salta Bernardo Kosacoff,diretor da Comis-são Econômica para a América Latina e oCaribe (Cepal) em Buenos Aires.

Kosacoff é um dos defensores da idéia

de que a economia da Argentina não devesofrer grandes alterações econômicas nospróximos tempos,mas que o país tem umaagenda social intensa para discutir, e a in-clusão soa como um dos maiores desafiosdo novo país que surgiu no pós-crise.“Oque a sociedade argentina precisa hoje éfirmar projetos de desenvolvimento nolongo prazo. Perdemos muita qualificaçãodos recursos humanos e também a capaci-dade de inovação e competitividade.A re-cuperação plena só virá com esses aspec-tos”, completa o diretor da Cepal.

Guillermo Anlló, especialista em eco-nomia da inovação da Cepal, alerta para agrande desigualdade social, que ficou ain-da maior durante a crise.“A informalidadeainda é alta, embora os empregos formaisestejam aumentando. Mas a crise fez sur-gir fenômenos como os cartoneros (cata-dores de lixo), que não existiam antes.Temos hoje uma Argentina com diferençassociais muito amplas.”

Pouca coisa deve mudar na Argentinaaté o final do ano, quando serão realizadasas eleições presidenciais. Pelo menos atéoutubro, os argentinos deverão viver noclima de congelamento de preços e aque-cimento de mercado. Os nomes mais co-tados para a briga pela sucessão, por en-quanto, são o da primeira-dama, CristinaKirchner, enfrentando o ex-ministro daEconomia Roberto Lavagna. Ambos têmcomo trunfo terem participado do gover-no da reconstrução, apoiado pela maioriados cidadãos – ou, como gosta de lembraro atual presidente nas entrevistas concedi-das à imprensa, “cuja missão é tirar aArgentina do inferno e colocá-la no pur-gatório”. O futuro em dias de globalizaçãoe interferências externas é incerto. EMarcelo Kohek, menos empolgado comuma mudança de país, deve ficar mais umtempo no Brasil, ainda que inconformadocom os preços praticados aqui. “Eu al-moçava um bife de chorizo enorme por 6pesos lá”, lembra. Mas pretende continuaracompanhando a Argentina, nem que se-ja somente assistindo aos jogos do BocaJuniors pela TV.

para o desenvolv imento econômico dos dois países e deveria ser incentivada

d

Argentina_ok 01/03/07 19:40 Page 29

Page 26: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

SAÚDE

A vida que segue

P o r S u c e n a S h k r a d a R e s k , d e S ã o P a u l o

O Brasil tem o maior sistema público de

transplantes do mundo, que cobre 75% dos

15 mil procedimentos realizados anualmente

no país. Porém, fora das salas de cirurgia,

o sistema sofre com a falta de prof issionais

capacitados para detectar potencia is

doadores, a concentração geográf ica dos

hospitais credenciados e a ausência de

informações conf iáveis

á oito anos, Luiz César Rossi, um paulista de 49 anos, passa trêsvezes por semana por sessões de hemodiálise que duram, emmédia,quatro horas cada uma.“Eu gostaria de sair da máquina,porque maltrata muito a gente”, desabafa.Ele é um dos mais de

33 mil brasileiros que estão na fila do transplante à espera de um rim.Enquanto o tempo passa, Rossi luta contra o “fantasma da morte”e ali-menta a expectativa de dias melhores. A história de Rossi não parececondizer com a realidade de um país que mantém o maior sistema públi-co de transplantes do mundo, cobrindo 75% de todos os procedimen-tos realizados, e conta com um corpo médico da mais alta qualificaçãona especialidade. O problema é que, se a técnica é moderna, a gestão dosistema jamais atingiu o mesmo patamar de excelência.Muito pelo con-trário. O estigma de uma fila de 68.195 pessoas à espera de órgãos, deacordo com dados mais recentes do Sistema Nacional de Transplantes(SNT),que só vão até julho do ano passado; a subnotificação no registro

H

Ben

Edwa

rds/

Getty

Imag

es

Saude novo 05/03/07 14:54 Page 30

Page 27: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

Saude novo 05/03/07 14:55 Page 31

Page 28: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

Desaf ios • março de 2007 33

cientes a um serviço de referência para suainclusão na lista de espera, contemplandotodo o território nacional”,afirma Schlind-wein.No processo de ampliação,as mais re-centes Centrais Estaduais de Transplanteforam implementadas no Acre, em Ron-dônia e no Amapá.“Já são realizados trans-plantes renais no Acre e existe autorizaçãopara o transplante de medula na regiãoNordeste”,informa o coordenador do SNT.

Para manter o SNT em funcionamento,o Ministério da Saúde empenhou 521,88milhões de reais em 2005, o que represen-tou 29,11% mais que em 2004. Conside-rando que o número de transplantes reali-zados cresceu somente 0,2% entre 2004 e2005, percebe-se um aumento do desem-bolso sem um crescimento proporcional deeficiência. E a tendência é manter essa tra-jetória, já que de janeiro a julho de 2006 osgastos somaram 360,15 milhões de reais,oque projeta um valor de aproximadamente617 milhões de reais para o ano todo.

Comissões Em junho do ano passado, oMS tomou uma iniciativa que promete me-lhorar muito o processo de captação de ór-gãos: regulamentou a implementação decomissões intra-hospitalares de doação deórgãos e tecidos em todos os hospitais pú-blicos,privados e filantrópicos com mais deoitenta leitos.Cada grupo deve ter no mín-imo três integrantes com médicos e/ou en-fermeiros,entre outros profissionais de níveluniversitário.Na avaliação de Schlindwein,uma das dificuldades do sistema é a falta depercepção de muitos profissionais da áreade saúde de que a doação de órgãos e teci-dos deve ser entendida como um direito deopção dos familiares do indivíduo falecido.

Até hoje, muitos acreditam que a decisãoprecisa ter sido tomada em vida pelo doa-dor (leia quadro na página ao lado).“A detec-ção de uma situação de potencial doação éuma atribuição da equipe de saúde, quedeve estar preparada para,além de oferecera possibilidade de doação aos familiares,por meio de uma entrevista, realizar umatriagem clínica adequada para garantir a se-gurança dessa doação”, afirma.

Com a implementação das comissõesintra-hospitalares, o coordenador do SNTespera um aumento significativo da ofertae captação de órgãos,possibilitando maioragilidade no atendimento à lista de espera.“Estamos concentrando os esforços na or-ganização e no treinamento dessas comis-sões em todo o Brasil.Na área de captação,o Ministério da Saúde já promoveu 43 cur-sos de formação de coordenadores intra-hospitalares em vinte estados e no DistritoFederal,com a participação 3 mil profissio-nais”, conta Schlindwein, informando queforam implantadas 528 comissões no país.

A nefrologista Maria Cristina Ribeirode Castro, da ABTO, explica que em mui-tas ocasiões não é levado em consideraçãoo fato de que um único doador pode sal-var até quinze vidas. “De uma pessoa épossível obter córneas, pâncreas, ossos,medula óssea, pele, válvulas cardíacas eórgãos vitais, como coração, fígado e pul-mão. Em casos excepcionais, já são realiza-dos no Brasil transplantes de intestinos. Demaneira geral, falta uma cultura nos hos-pitais em relação ao tema”, avalia. Mas elachama a atenção para problemas especí-ficos da portaria que instituiu as comis-sões.“O MS não definiu nenhum tipo desanção para quem descumprir a determi-

nação nem especificou de onde partirão osrecursos para a formação dos grupos mul-tidisciplinares, com dedicação exclusiva aesse trabalho. É importante destacar quesão mais de 1.000 instituições em todo opaís”, analisa Ribeiro de Castro.

Para o médico Milton Glezer, delegadoregional do Conselho Regional de Medici-na do Estado de São Paulo (Cremesp),nãobasta formar as comissões intra-hospita-lares, a modificação tem de começar noscursos de medicina.“Culturalmente,o mé-dico se sente incomodado em dar diagnós-tico de morte encefálica. Pouco se fala so-bre transplantes nas faculdades.Falta maiorempenho nesse sentido. Deveria haver umtreinamento nessa área nos cursos de gra-duação”, considera.

Disparidades Como acontece freqüente-mente no Brasil, o SNT apresenta desem-penhos desiguais nas diferentes regiões dopaís.Atualmente, os estados da Bahia e doRio de Janeiro representam duas grandespreocupações da ABTO. “São estados po-pulosos e importantes, onde há uma dis-paridade enorme, com filas extensas e pre-cária captação de órgãos”, constata a pre-sidente da entidade. O número de pessoasque aguardam por um transplante é, res-pectivamente, 3.045 e 7.561 (dados até ju-lho de 2006). Nessas duas unidades da fe-deração são encontradas as maiores des-proporções entre demanda e oferta nas lis-tas de rim, fígado e córneas.

Na outra ponta do ranking de desem-penho,estão os estados de Santa Catarina eRio Grande do Sul,cujas filas de espera têm1.441 e 3.743 pessoas,respectivamente.“Nocaso de Santa Catarina,são quinze doadores

de cada o i to mortes encefá l icas apenas uma é not i f icada à centra l de transp lantes

Número de transplantes realizados em 2005

5.241

SP PR

968

RS

898

GO

622

MG

593

OUTROS

2.773

Fonte: SUS

Saude 02/03/07 15:00 Page 33

Page 29: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

para 1 milhão de pessoas; no Rio Grandedo Sul, são catorze ou quinze. Em termosnacionais,a média não passa de 5,8”,infor-ma a nefrologista Ribeiro de Castro.Apesarde Santa Catarina ter o melhor desempenhono país, ainda é pouco se comparado àEspanha,que é uma referência mundial emtransplantes. Lá são trinta doadores para 1milhão, de acordo com dados da ABTO.

Por uma questão geopolítica e popula-cional, o estado de São Paulo figura comorecordista em número de transplantes (re-presenta cerca de 45% dos procedimentosno país),de pacientes e,conseqüentemente,de mortes na lista de espera. De janeiro de2005 a julho de 2006, foram realizados8.318 transplantes no estado e, até julho doano passado, eram 16.081 pessoas na fila.

“Diante das estatísticas que mostram obaixo nível de oferta, não há como negarque a subnotificação é grave”, afirma JoséOsmar Medina Pestana, presidente da So-ciedade Latino-Americana de Transplantese diretor do Programa de Transplantes daUniversidade Federal de São Paulo (Uni-fesp).Ao mencionar a subnotificação, Pes-tana quer dizer que há inúmeros casos demorte encefálica que não são notificados

nos hospitais brasileiros,o que inviabiliza adoação. “Estatisticamente, nos hospitaiscom potencial de atendimento de urgênciae emergência,de cada oito mortes encefáli-cas apenas uma é notificada à central detransplantes. Mas, quando a temática dadoação é bem abordada com os familiares,60% deles aceitam realizar o procedimen-to”, diz. De acordo com Pestana, o preparodas equipes das comissões intra-hospita-lares é hoje o melhor caminho para a so-lução desse problema.

Coração O diretor da Cirurgia CardíacaPediátrica e do Transplante Infantil do Ins-tituto do Coração (Incor), em São Paulo,Miguel Barbero Marcial, reforça essa opi-nião.Ele lembra que a situação é mais graveainda em unidades hospitalares da perife-ria e do interior, principalmente por en-traves burocráticos e devido à sobrecargade trabalho dos plantonistas.“Poderiamtambém ser montadas equipes móveis quevisitassem as UTIs para fazer os levanta-mentos de morte encefálica. No caso decrianças, conseguir um órgão ainda é maisdifícil, porque há menos óbitos do que en-tre os adultos. Hoje temos seis crianças na

fila do transplante no Incor”, diz.A unidade é referência nacional e atende

a pacientes de todo o país. Segundo Mar-cial, o tempo é precioso para o receptor, jáque a média de resistência dos pacientes in-fantis atendidos pela sua equipe é de ummês a um ano, dependendo da situaçãoclínica.“A gente acaba vendo infelizmenteo quadro de saúde piorar pouco a pouco e,por causa dessa espera,a mortalidade chegaa 60% dos casos”, afirma.

Pulmão No caso da fila do transplante depulmão no Incor, a mortalidade está nopatamar dos 30% num prazo máximo deum ano. O esclarecimento é da pneumolo-gista Marlova Caramori,chefe da equipe deTransplantes de Pulmão da instituição,quehoje conta com uma fila de quarenta pa-cientes.“Além da dificuldade de doação,porfalta de esclarecimento e de conscientizaçãodas famílias dos doadores, enfrentamos adificuldade de que o pulmão é o órgão quemais se inviabiliza para a cirurgia,por causada morte encefálica. De cem órgãos, apro-veita-se em média vinte,devido ao compro-metimento com pneumonias ou excesso deágua, por exemplo”, explica a médica.

34 Desafios • março de 2007

Em 2005 e 2006, os gastos do s istema naciona l de transplantes cresceram 29,11%

No Brasil, as regras para transplantes do fígado, que é um dos princi-pais órgãos vitais, sofreram modificações no ano passado após um consen-so entre o Ministério da Saúde e demais órgãos representativos de pacientese médicos. Em maio de 2006, foi baixada uma portaria ministerial que modi-ficou os critérios de distribuição de fígado de doadores para transplantes aoimplantar e ampliar o critério de gravidade do estado clínico do paciente.Antes o procedimento ficava restrito principalmente à hepatite fulminante.Adeterminação foi recebida positivamente pela Associação Brasileira dosTransplantados de Fígado e Portadores de Doenças Hepáticas (TransPática).

“O transplante de fígado tem sido descentralizado no Brasil, com o au-mento da atividade na região Nordeste,principalmente no Ceará,e com a re-cente reautorização da atividade no Distrito Federal (que apresentava irregu-laridades administrativas). Entretanto, temos uma lista de espera de 7.450pacientes em diferentes situações de gravidade de seu estado clínico, o que

levou o Ministério da Saúde, após estudos que se iniciaram em outubro de2004,a rever os critérios de distribuição desses órgãos em julho de 2006”,explica o coordenador do SNT, Roberto Schlindwein.

De acordo com Sidnei Moura Nehme, fundador e um dos conselheirosda TransPática,antes quem realmente precisava do transplante por causa dagravidade morria na fila.“Segundo levantamento do próprio SNT, em 2005,60% das pessoas presentes na lista não precisavam com urgência da inter-venção”, afirma. Nehme cita como exemplo a história de sua vida, já que foio primeiro paciente de transplante duplo de rim e fígado inter-vivos no Brasil(entre pai e filho), em 1998. Praticamente desenganado pelos médicos, aos48 anos ele foi salvo pelos órgãos de seu filho Fábio,na época com 24 anos.

“Eu era o número 45 na fila do SNT e a previsão era de que eu con-seguiria passar pelo transplante no mínimo em seis meses, mas não haviatempo para esperar a doação. Por duas vezes, entrei em coma”, conta.

Lista de transplante de fígado muda e prioriza gravidade

Saude 02/03/07 15:00 Page 34

Page 30: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

Desaf ios • março de 2007 35

e o número de c irurg ias aumentou apenas 0,2%

Sobreviver só foi possível porque ele tinha condições de pagar pela cirurgiainovadora em um hospital particular de São Paulo.Depois dessa experiência,decidiu fundar uma associação que desse assistência a milhares de pessoasque sofrem com a doença e não dispõem de recursos.“Assim nasceu aTransPática”, conta.

Com os novos critérios na fila do transplante de fígado, a esperança to-mou conta do baiano Antônio Carlos Martins dos Santos,de 51 anos,que des-de o fim de 2006 está na fila do transplante duplo de fígado e rins, após verseu quadro piorando desde 2003. Santos, que mora em São Paulo, submete-se a diálises mensais e convive com a dor enquanto aguarda sua vez.“Aindaposso ser útil ao país.Quero voltar a trabalhar”,afirma.Santos,que está afas-tado do cargo de supervisor ferroviário, espera ter mais sorte que um vizi-nho, que estava na fila do transplante de fígado há cinco anos, mas não re-sistiu e faleceu.

O cirurgião e professor emérito da Faculdade de Medicina daUniversidade de São Paulo (USP) Silvano Raia, que coordenou o primeirotransplante bem-sucedido de fígado no país, em 1985, considera o critério

de gravidade favorável.“A questão,entretanto,estimula uma análise mais de-talhada. Hoje, a Fundação do Fígado, em São Paulo, realiza um estudo multi-cêntrico, com dezenove equipes, para esclarecer qual é a relação entre asduas variáveis, o critério cronológico e questão da gravidade”, diz.

De acordo com Raia,nos últimos vinte anos verificou-se um evidente pro-gresso tecnológico e sua sedimentação em muitas equipes de transplantesdistribuídas principalmente no centro-sul e no nordeste do país.“O sistemase defronta, entretanto, com grande escassez de órgãos, o que explica maisde 60 mil candidatos inscritos atualmente em lista de espera.”

O cirurgião afirma ser favorável à instituição das comissões intra-hos-pitalares.“A Fundação do Fígado,em convênio com a Secretaria de Saúde deSão Paulo, está patrocinando cursos para formação dessas equipes e crian-do condições financeiras de melhorar o desempenho de suas funções”, in-forma.Segundo Raia, numa ação simultânea, também está sendo estimuladoo uso da técnica inter-vivos para os transplantes de fígado e rim e, assim,contornar a dificuldade da falta de órgãos de doador falecido.“Em muitoscentros já representam 50% dos transplantes de rim e 30% de fígado”, diz.

Em 2000, um grupo de pacientes do Hospital das Clínicas se reuniu para comemorar quinze anos de transplantes de fígado bem-sucedidos

Rossana Lana/Folha Imagem

Saude 02/03/07 15:01 Page 35

Page 31: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

36 Desafios • março de 2007

Os gastos com a aqu is ição de med icamentos imunossupressores têm u l trapassado

A pneumologista considera fundamen-tal que haja mais campanhas de divulgaçãosobre a importância da doação, mas lem-bra que para sua área ainda há a necessi-dade do aumento do número de centros detransplantes de pulmão.“São nove ao todo,mas os que atuam com menor dificuldadeficam na Santa Casa de Porto Alegre, que épioneira, e no Incor, além de duas outrasunidades em São Paulo, no interior do es-tado, e no Rio de Janeiro”, afirma.

O coordenador do SNT, RobertoSchlindwein, concorda que, do ponto devista logístico, o transplante de pulmão é oque ainda apresenta maior dificuldades,de-vido à concentração nas regiões Sul e Su-deste e ao reduzido número de equipes mé-dicas.O Rio Grande do Sul responde atual-mente por 70% dos transplantes no Brasil.

Córneas Para Francisco Neto de Assis,pre-sidente da Aliança Brasileira pela Doaçãode Órgãos e Tecidos (Adote), é preciso re-verter esse quadro.“A baixa notificação dodiagnóstico de morte encefálica às centraisde transplantes é um ato médico que estásendo negligenciado. A expectativa é en-contrar pelo menos sessenta casos por anonuma população de 1 milhão de pessoas.No Brasil, com cerca de 180 milhões dehabitantes, calculam-se 10.800 potenciaisdoadores anualmente”,diz.A entidade con-sidera a situação da doação de córneas amais absurda,porque o potencial doador équalquer pessoa com o diagnóstico demorte, desde que a retirada ocorra até seishoras após a parada cardíaca.

A Adote realizou um levantamento en-tre janeiro e setembro de 2006 numacidade com 350 mil habitantes e chegou aoseguinte resultado. No período, pelomenos 460 pessoas entre 4 e 64 anos pode-riam ter sido doadores do órgão, mas so-mente duas córneas foram captadas. Umadas metas estabelecidas pelo Ministério daSaúde é zerar a fila do transplante decórnea no país. Mas as 26.403 pessoas queestavam na fila da espera em julho do anopassado mostram que a meta ainda estálonge de ser alcançada, apesar do número

de pacientes à espera estar caindo.Segundo Schlindwein, em 2005 e 2006

o Ministério da Saúde, em um trabalhoconjunto com a Agência Nacional de Vigi-lância Sanitária (Anvisa) e com o SNT, or-ganizou treinamentos descentralizados paraos servidores das vigilâncias estaduais e mu-nicipais para fiscalização em Bancos deTecidos Oculares. Em dezembro do anopassado,foi promovido o primeiro curso de

capacitação para profissionais em captaçãode córneas em parceria com os Bancos deOlhos do Distrito Federal e de Goiânia.Aexpectativa é organizar melhor a atividadenos Bancos de Olhos, o que possibilitará aredução gradativa do tempo de espera paratransplante de córnea, principalmente noRio Grande do Sul, Santa Catarina, SãoPaulo e Distrito Federal.“Hoje,cerca de 83%da demanda anual é atendida por esse tipo

O tratamento dos pacientes que estão à espera de um órgão é mais caro do que o valor dos transplantes

Otávio Dias de Oliveira/Folha Imagem

Saude 02/03/07 15:02 Page 36

Page 32: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

Desaf ios • março de 2007 37

de transplante no Brasil. O problema é quea procura aumenta significativamente a ca-da ano. Em 2006, foram realizados 10.641transplantes de córnea, mas 12.886 novospacientes ingressaram na fila”, diz ele.

Imunossupressores Mas quem avalia oSNT olhando somente para as cirurgiasenxerga apenas parte do todo.É importantedestacar que o processo de transplante nãoacaba na cirurgia.Para garantir que não ha-ja posterior rejeição do órgão, o transplan-tado tem de tomar pelo resto da vida os cha-mados imunossupressores, que tambémsão bancados pelo SUS.“Apesar de havercerta deficiência na distribuição dos medi-camentos em alguns estados, essa cobertu-ra é atendida”,afirma o presidente da Adote.

“Nesse aspecto, o Brasil é destaque, jáque países desenvolvidos,como os EstadosUnidos, só financiam os medicamentospor seis meses”, esclarece a presidente daABTO, Maria Cristina Ribeiro de Castro.De acordo com o coordenador do SNT,Roberto Schlindwein,atualmente os gastoscom a aquisição de medicamentos imunos-supressores têm ultrapassado os relaciona-dos com os procedimentos específicos decaptação e transplante.

Custo-benefício Na análise do economistaMarinho, do Ipea, o elevado número detransplantes realizados no Brasil e de pa-cientes na lista de espera também refleteoutro questionamento.“É um sinal de queas atividades de prevenção e promoção dasaúde,que poderiam diminuir a necessida-de de transplantes,precisam ser incremen-tadas”, avalia. Segundo Marinho, a grandeprevalência na população de doençascrônicas não transmissíveis que levam aostransplantes, como diabetes, hipertensão,hepatite e alcoolismo,deveriam estar sendoevitadas ou controladas no SUS de modomais efetivo.“As ações deveriam ser reali-zadas preferencialmente na Atenção Básica(Unidades Básicas de Saúde e no Programade Saúde da Família). Não será possívelaprimorar o sistema sem melhorar o SUS,inclusive com a melhoria das emergências

e das UTIs”,diz o pesquisador da Diretoriade Estudos Macroeconômicos do Ipea.

No estudo “Avaliação da Eficiência Téc-nica e da Eficiência de Escala do SistemaNacional de Transplantes”, elaborado porMarinho e pela assistente de pesquisa doIpea Simone de Souza Cardoso, pode-sever quanto custa o tratamento de quem es-tá na fila da espera.Em 2005,os gastos comas chamadas terapias renais substitutivassomaram 1,16 bilhão de reais. É um valoranual significativamente superior ao apli-cado nos transplantes.

“Não há dúvida de que o custo dodoente transplantado é menor do que ogasto terapêutico com o paciente crônico”,afirma o delegado regional do Cremesp,Milton Glezer. Para o presidente da Socie-dade Latino-Americana de Transplantes ediretor do Unifesp, o médico José OsmarMedina Pestana, é preciso ainda analisarque o paciente transplantado terá condi-ções de retornar ao mercado de trabalho emelhorar sua qualidade de vida.

“Hoje,estatisticamente,o melhor resul-tado é do transplante de córneas, com cer-ca de 95% de sucesso após um ano da in-tervenção cirúrgica. Já o fígado, que é umórgão vital, resulta em 90% de sucesso nomesmo período. No caso do pulmão, porexemplo, o índice de eficiência é de 70%dos enxertos”, explica Maria Cristina Ri-beiro de Castro, da ABTO.

Informações Até aqui, esta reportagemprocurou traçar um panorama das quali-dades e dos problemas do SNT. Foi possí-vel confeccionar um mosaico apresentan-do diversos aspectos do assunto,mas é pra-ticamente impossível chegar a uma sólidaconclusão. Essa dificuldade é enfrentadapor todos os que se debruçam sobre o te-ma.“A falta de informações atualizadas so-bre a estrutura do SNT,desde a capacidadede retaguarda até estatísticas de procedi-mentos e filas para transplantes, dificultauma análise mais aprofundada da gestãodos transplantes no país”,afirma Marinho,do Ipea. A mesma avaliação é feita pelaAdote.“Reivindicamos maior transparên-

cia de dados no site do SNT”, diz o presi-dente da entidade,Francisco Neto de Assis.

Em fevereiro deste ano,o banco de dadosconsolidado do Ministério da Saúde dis-ponibilizava informações somente até julhode 2006.O SNT está implementando a redede informação on-line nas 25 CentraisEstaduais de Transplantes distribuídas nopaís (com exceção de Roraima e Tocantins),sob coordenação das secretarias de Saúde,que são interligadas a 555 estabelecimentoshospitalares e a 1.376 equipes médicas.“Osistema informatizado em rede desenvolvi-do pelo Datasus e pelo SNT encontra-se ins-talado em dezoito estados e no DistritoFederal, e deve atingir todo o território na-cional até o final de março.Esse sistema per-mitirá o acesso a relatórios gerenciais com asmais variadas informações estatísticas tan-to para os gestores de saúde como para apopulação”, esclarece Schlindwein.

A ferramenta de comunicação via Internetviabilizará também, segundo ele, a implan-tação de um sistema adequado de alimen-tação de informações por parte dos profis-sionais,sobre o segmento de pacientes trans-plantados e a avaliação dos resultados dostransplantes.Tomara que esses avanços pos-sam levar à melhor gestão de todo o sistemapara salvar a vida dos 68 mil brasileiros quedormem e acordam, diariamente, à esperada chegada de um órgão salvador.

os re lac ionados com os proced imentos espec í f i cos de captação e transp lante

Sistema Nacional de Transplantes (SNT)www.saude.gov.br/transplantes

Associação Brasileira de Transplantes de Órgãos (ABTO)www.abto.org.br

Aliança Brasileira pela Doação de Órgãos e Tecido (Adote)www.adote.org.br

Assoc. Bras. dos Transplantados de Fígado ePortadores de Doenças Hepáticas (TransPática)www.transpatica.org.br

Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea)www.ipea.gov.br

Saiba mais:

d

Saude 02/03/07 15:03 Page 37

Page 33: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

TRIBUTOS

O IPTU é a segunda maior fonte de renda dos municípios. Porém, com dados defasados e estrutura precária, muitas prefeituras não conseguem avaliar os imóveis e cobrar o imposto de maneira adequada. A inadimplência é altíssima e a população não

compreende que, além de ser garantia de propriedade, esse tributo é o caminho mais curto para as melhorias urbanas

Divu

lgaç

ão/E

mbra

tur

IPTU 02/03/07 10:15 Page 38

Page 34: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

Imposto concretoP o r E l i a n a S i m o n e t t i , d e S ã o P a u l o

IPTU 02/03/07 10:17 Page 39

Page 35: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

Por região e faixa de renda Salários mínimos de 0 a 2 de 2 a 5 de 5 a 15 de 15 a 30 de 30 a 60 mais de 60

Norte 2,14 2,26 1,18 2,22 1,22 0,68

Nordeste 1,42 0,50 0,72 0,63 0,45 0,80

Sudeste 2,37 1,52 0,95 0,69 0,61 0,54

Sul 1,55 1,03 0,75 0,60 0,50 0,48

Centro-Oeste 1,35 0,92 0,74 0,62 0,50 0,47

Brasil 1,60 1,30 0,88 0,65 0,60 0,57

Em algumas capitais que aplicam alíquota progressivaSalários mínimos de 0 a 2 de 2 a 5 de 5 a 15 de 15 a 30 de 30 a 60 mais de 60

Belém 0,14 0,12 0,14 0,31 0,04 0,07

Fortaleza 0,37 0,36 0,43 0,74 0,63 0,12

Salvador 0,43 0,52 0,55 0,26 1,71 1,51

Belo Horizonte 1,05 0,82 0,81 0,61 0,64 0,68

São Paulo 3,18 1,87 1,08 0,73 0,56 0,53

Curitiba 0,23 1,24 0,74 0,54 0,76 0,48

Goiânia 1,06 0,65 0,39 0,68 1,12 0,88

Participação do IPTU na renda familiar mensal entre 2002 e 2003 (em %)

Obs: Salário mínimo vigente de maio de 2002 a abril de 2003, no valor nominal de 200 reaisFonte: POF/IBGE, microdados

Retrato do IPTU no Brasil e as vantagens da progressividadeO estudo “IPTU no Brasil: progressividade, arrecadação e aspectos extrafiscais”, de Pedro HumbertoBruno de Carvalho Jr., pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea),envolve dezes-seis capitais brasileiras. Em resumo, destaca o seguinte:• No Brasil, apesar da alta variação, as alíquotas de IPTU situam-se entre 0,3% e 1,5%.Alguns países

em desenvolvimento apresentam nível de tributação mais alto.Em Buenos Aires,na Argentina,a alíquo-ta média está entre 1% e 2%. Em Bogotá, capital da Colômbia, fica entre 0,85% e 2%. Na África doSul, varia de 5% a 10%, embora existam descontos para empresas e residências.

• A informalidade e os mecanismos de evasão para driblar o Imposto de Renda tornam o IPTU uma al-ternativa eficiente de financiamento da máquina pública,por ter base de cálculo em ativo real e visí-vel cujo pagamento é condição para o exercício do direito de propriedade.

• As avaliações imobiliárias são regressivas e têm baixo nível técnico. Como conseqüência, os con-tribuintes mais pobres comprometem parcela maior de sua renda com o pagamento do que os maisricos. Em geral, nos municípios que adotam alíquotas progressivas de IPTU, o pagamento do impos-to tende a comprometer menos o orçamento das camadas de renda mais baixa (veja as tabelasParticipação do IPTU na renda familiar mensal entre 2002 e 2003).

• A conclusão do estudo:“Dependendo das decisões relacionadas à política de tributação imobiliária,adotada em nível local, o IPTU pode ser utilizado como um eficiente instrumento de política urbanae habitacional para o município,bem como contribuir para distribuição de renda e captura de 'mais-valia' decorrente de valorização imobiliária gerada fundamentalmente por investimentos públicos”.E mais:“Uma política tributária mais progressiva, acompanhada de um gasto público focalizado napopulação pobre pode tornar mais acentuada a redução da desigualdade de renda,gerando receitaspara aplicação em gastos sociais”.

40 Desafios • março de 2007

Na maior ia dos estados brasi le iros, apenas metade dos imóveis está cadastrada e o

indo o Carnaval, começou de fatoo ano de 2007 – e com ele projetosa realizar, preocupações com con-tas e tudo o que compõe uma nova

jornada.Considerando que a carga tributá-ria brasileira beira os 40% e o carnê do Im-posto Predial e Territorial Urbano (IPTU)já chegou a nossas casas,para pagamento deuma fatura que sempre nos parece salgada,aqui vão alguns bons argumentos para nãodeixá-lo perdido num fundo de gaveta.Co-mo diz o economista inglês T.Vickers, queestuda o imposto sobre propriedade na In-glaterra,“sem propriedade não podemosviver; sem impostos não há administração;sem informações sobre propriedade e im-postos ficamos impotentes para mudar amaneira de sermos governados”. Bemadministrado,o IPTU pode ser um instru-mento de garantia de direito de proprie-dade, inclusão cidadã, autonomia dos mu-nicípios e melhoria das condições nos locaisonde as pessoas vivem.

Ocorre que,embrulhado em um sistematributário dispendioso e complexo, cujosbenefícios não são facilmente constatáveis,o brasileiro jamais demonstrou grande pen-dor por pagamento de impostos e taxas.Nocaso do IPTU especificamente, a inadim-plência supera 60% em algumas locali-dades,como Alta Floresta,no Mato Grosso,e Porto Velho, em Rondônia. Você achoumuito? “Em 2004, a inadimplência era de80%”, lembra Wilson Correia da Silva, se-cretário municipal de Fazenda.A situaçãochegou a um ponto que há prefeituras sor-teando carros,eletrodomésticos e premian-do bairros que andarem na linha.Rio Claro,no interior paulista,já distribuiu quatro au-tomóveis, duas motocicletas, bicicletas evários eletrodomésticos a contribuintes quepagam impostos em dia, dentro da cam-panha “IPTU dá Prêmios”, lançada no anopassado. Em Campo Grande, no MatoGrosso do Sul, quem pagou o IPTU à vistaconcorre a um automóvel e,ainda,a trezen-tos aparelhos celulares. Segundo o prefeitoNelsinho Trad, o IPTU é a principal fontede receita de Campo Grande e registra ín-dice de inadimplência de 27%.Na capital do

F

IPTU 02/03/07 10:18 Page 40

Page 36: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

Desaf ios • março de 2007 41

va lor do IPTU é s imból ico, o que reduz a independênc ia admin istrat i va das c idades

estado vizinho, em Mato Grosso, outdoorsdizem:“Quem ama Cuiabá, paga IPTU”.Em 2005, a prefeitura da cidade alterou aPlanta Genérica de Valores (leia quadro na

pág. 44) e aumentou a alíquota do IPTUpara terrenos baldios de 1% para 2%. De-talhe: dos 58,5 mil terrenos baldios registra-dos na cidade,apenas 17% estão quites como Fisco municipal.

Exemplos de comportamentos dessenaipe indicam mudanças significativas.Asadministrações municipais esforçam-separa aumentar as receitas próprias, inde-pendentes de transferências de estados e daUnião, e de investimentos pré-definidospara fazer frente à demanda de cidadãosque, ao que tudo indica, são cada vez maisexigentes (leia quadro na pág. 42). Levanta-mentos feitos pelo Banco Nacional deDesenvolvimento Econômico e Social(BNDES), com base em informações doMinistério da Fazenda, revelam que em2001, cerca de 90% dos municípios brasi-

leiros cobraram impostos próprios, apre-sentaram superávits e mantiveram suasdespesas com pessoal dentro dos limites es-tabelecidos pela Lei de ResponsabilidadeFiscal.“Há um processo de descentraliza-ção e fortalecimento democrático em an-damento que leva à melhoria da gestão etransforma o município em agente de po-líticas públicas”,diz Ângela Penalva Santos,economista e professora da UniversidadeEstadual do Rio de Janeiro (UERJ).

Pesquisadores vêm buscando soluçõespara dar maior eficiência e efetividade à co-brança e à aplicação do imposto sobre pro-priedades urbanas – que tem grande partede seus recursos livres de vínculos (excetosaúde e educação) e pode ser investido nasolução de questões locais; além de ser ar-recadação previsível, estável e controlável.O mais recente é de autoria de Pedro Hum-berto Bruno de Carvalho Jr., pesquisadordo Instituto de Pesquisa Econômica Apli-cada (Ipea). Segundo ele, o país enfrenta

muitos problemas nessa área.“Entre outros,as propriedades são mal avaliadas; existegrande pressão política em torno de umimposto amplamente visível; os fundos detransferências de recursos federais e esta-duais tendem a acomodar as prefeituras; e

Estados e municípios e acarga tributária no Brasil

Fonte: AFE/BNDES (Receita Tributária)

Participação

de estados e

Carga total municípios na receita

(% do PIB) disponível (%)

1960 17,4 40,5

1970 26,0 39,2

1980 24,5 31,8

1990 28,8 41,1

2000 32,7 43,3

2002 34,9 42,4

Carlos Ruggi/Secom

Em Curitiba, no Paraná, os proprietários de áreas verdes ganham 30% de desconto no IPTU para manter a mata intacta

IPTU 02/03/07 10:18 Page 41

Page 37: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

42 Desafios • março de 2007

Segundo o IBGE, em 1998 apenas 12,6% dos mun ic íp ios consegu iram cobrar 80%

a população ignora que o imposto possi-bilita sua maior participação na adminis-tração dos problemas das cidades” diz ele.Em suas palavras, o IPTU é um “impostocidadão”, capaz de estimular as pessoas areclamar seus direitos perante os entespúblicos. Seu próximo projeto é produzirum modelo de avaliação imobiliária quepossa simplificar a tarefa de cadastramen-to e tornar o imposto mais justo e eficiente.

O mundo real Carvalho Jr. identificou quea importância do IPTU nas finanças mu-nicipais é maior em cidades com popu-

lação superior a 200 mil habitantes.A razãoprincipal está no fato de que o imposto temelevado custo administrativo, requer pro-cessos sofisticados de avaliações imobiliá-rias,cadastro atualizado digitalizado e refe-renciado, procuradoria e auditoria efi-cientes. Na arrecadação do IPTU, por me-nor que seja a dimensão de uma adminis-tração municipal,a gerência integra agentesde controle da legislação tributária, fun-cionários de controle e atualização do ca-dastro técnico imobiliário, fiscais e enge-nheiros que se deslocam em busca da con-firmação das informações prestadas pelos

contribuintes. Cidades pequenas não dãoconta do recado.Assim, enquanto nos Es-tados Unidos quase todos os imóveis sãocadastrados, na maioria dos estados doBrasil a taxa se situa entre 50% e 60%. E,embora quase a totalidade dos municípiosbrasileiros arrecade IPTU, seu valor costu-ma ser simbólico (leia quadro com a síntese

da pesquisa na pág. 40).O BNDES e o Banco Interamericano

de Desenvolvimento (BID) já entraramem campo para subsidiar, principalmenteas localidades pequenas (de até 20 milhabitantes), que compõem cerca de 90%

Municípios e tributaçãoO princípio federativo estabelecido na Constituição de 1988 valorizou os mu-nicípios.Eles passaram a receber parcela da receita arrecadada pelo gover-no federal acumulada no Fundo de Participação dos Municípios (FPM).Recebem repasses do FPM de acordo com o número de habitantes, além de25% da arrecadação estadual do ICMS e de 50% da receita do ImpostoTerritorial Rural (ITR), também do estado. E têm liberdade na determinaçãode onde e como aplicar os recursos (veja no gráfico a evolução dos inves-timentos não financeiros, por instância de governo).A restrição contida naCarta é o percentual de 25% da receita, a ser aplicado em educação. No en-tanto,a partir de meados dos anos 1990 emendas constitucionais vincularamparte das verbas a alocações específicas, em particular a programas desaúde e Educação Fundamental.A Lei de Responsabilidade Fiscal, promulga-da em 2000, também limitou a capacidade de despesa dos municípios e suacapacidade de endividamento.

Assim, ganharam relevância, nas administrações, as fontes de recursoslocais. Entre elas o Imposto sobre Serviços de Qualquer Natureza (ISS) é omais importante em termos absolutos.Os serviços são listados em lei federale cada município é autônomo para determinar as alíquotas até o teto de 5%.O IPTU é o segundo maior imposto local e o que registra índice de evasãomais elevado.Segundo o IBGE,em 1998 apenas 12,6% dos municípios conse-guiram cobrar 80% do imposto devido – e desse total apenas a metade foipaga.A Emenda Constitucional 29/2000 explicitou que o IPTU pode ter alíquo-tas diferenciadas não só em razão do valor do imóvel,mas também de sua lo-calização e uso, de forma a onerar mais os donos de imóveis de maior valor.A medida vem sendo lentamente implantada.“Muitos prefeitos estão receososde questionamentos na Justiça e adiam a implantação do imposto progressi-vo”,diz Marco Antonio Mesquita Pessôa,advogado do departamento de cadas-tro do IPTU da prefeitura do Rio de Janeiro,que contabiliza 3 milhões de imó-veis e, com alíquotas progressivas, atinge inclusive as favelas.

A Constituição também criou mecanismos de participação das comu-nidades locais em fóruns decisórios e de controle dos resultados de políti-cas públicas, entre eles os conselhos municipais setoriais. O Orçamento

Participativo,praticado inicialmente em Porto Alegre,não foi induzido por le-gislação federal, mas tem se expandido no país. Segundo Celina Souza,pesquisadora do Centro de Recursos Humanos da Universidade Federal daBahia, no período de 1986 a 1998 havia apenas duas experiências; entre1989 e 1992 o número aumentou para 12; e 140 cidades brasileiras tinhamorçamentos participativos em 2000.

Em 2001, a Lei n.° 10.257, conhecida como Estatuto das Cidades, am-pliou o papel do governo local no processo de desenvolvimento urbano e degestão do território.Entre outras medidas,delegou aos municípios a tarefa defazer valer a função social da propriedade urbana,com uma nova concepçãode planejamento e gestão.A missão mais complicada contida no estatuto: aregularização das posses urbanas,com simplificação da legislação de parce-lamento,de uso e ocupação do solo,de modo a facilitar o enquadramento dasconstruções realizadas pela população às normas de edificações e aumen-tar a oferta de unidades habitacionais.

Evolução da participação das

três instâncias de governo nas despesas

não financeiras (em %)

Fonte: IBGE: Contas Nacionais

44

3136

32

20

37

União Estados Municípios

1998 2000 1998 2000 1998 2000

IPTU 02/03/07 10:19 Page 42

Page 38: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

Desaf ios • março de 2007 43

do imposto dev i do – e metade dos que foram cobrados qu i t a ram as pendênc i as

dos municípios brasileiros,oferecendo doisprogramas de financiamento. O ProgramaNacional de Apoio à Gestão Administrati-va e Fiscal dos Municípios Brasileiros(PNAFM) presta assistência técnica ecooperação financeira para a moderniza-ção das administrações tributária, finan-ceira, patrimonial e previdenciária. O Pro-grama de Modernização da AdministraçãoTributária e da Gestão dos Setores Sociais(Pmat) inclui equipamentos de informáti-ca, capacitação de recursos humanos, de-senvolvimento de projetos, equipamentosoperacionais e instalações para atendimen-to aos cidadãos – tudo destinado à melho-ria da qualidade do gasto numa perspecti-va de desenvolvimento local sustentado.

O serviço tem de ser completo.Segundodados da Pesquisa de Informações BásicasMunicipais do Instituto Brasileiro de Geo-grafia e Estatística (IBGE), de 1998 a 2004,entre as cidades que atualizaram informa-ções e valores dos imóveis, pouco mais dametade obteve aumento real na arrecadaçãomédia nos anos seguintes.Ou seja,não bas-ta dispor de informações,é preciso tambémcobrar de forma eficiente.Várzea Grande,no Mato Grosso, acaba de inaugurar seuprocesso de modernização. O último ma-pa da cidade, completamente desatuali-zado, tem 24 anos. Com o suporte doBNDES, vem sendo feito novo mapea-mento, por geoprocessamento.“Teremosuma planta genérica, processo de atendi-mento automatizado ao cidadão e melhorplanejamento das ações da administra-ção”, diz Bolanger José de Almeida, se-cretário de Fazenda do município.

Disparidades Outras incongruências po-dem ser assinaladas. Municípios do estadode São Paulo arrecadam mais de 1% de suarenda com o IPTU, nível equivalente ao depaíses desenvolvidos. Por outro lado, amaior parte dos municípios do Norte e doNordeste não atinge 0,2% de sua receitatributária. Pior: para 30% dos municípioso IPTU não alcança 0,05% dos recursosdisponíveis. Brasília, cidade moderna, pa-trimônio arquitetônico da humanidade,

cobra alíquota de 0,3% para imóveis resi-denciais e obtém arrecadação per capitacorrespondente a 1% de sua renda anual.Em outro extremo, Franco da Rocha, naperiferia de São Paulo, com alíquota de 2%para imóveis residenciais (mais de seis ve-zes superior à de Brasília), registra arreca-dação per capita inferior, de 0,85% de suarenda anual.

Despreparadas do ponto de vista técni-co-científico e político, e com economiafrágil, as pequenas cidades dependem dosrecursos oriundos do Fundo de Partici-pação dos Municípios (FPM),cujo critériode distribuição de verbas é o tamanho dapopulação. Assim, cidades com menos de20 mil habitantes são penalizadas por nãoconseguir ter receitas próprias e por ficarcom uma porção pequena do dinheiro do

Fundo. Os efeitos deletérios são facilmentecomprováveis. Em todo o Rio Grande doNorte,a educação encontra-se municipali-zada, mas em grande parte das pequenascidades faltam condições infra-estruturaise pessoas qualificadas para a oferta de to-das as séries do Ensino Fundamental.Ape-nas 5% dessas cidades oferecem o EnsinoMédio.Resultado: as prefeituras financiamo transporte escolar para que os alunosdêem continuidade aos estudos em cidadespróximas – o que, embora seja positivo, éfator de desestímulo para os jovens.

Pequenos No Pará, 83% dos municípiossão de pequeno porte, com baixa ar-recadação de recursos próprios. Neles, amédia do IPTU per capita é 95 centavos dereal – baixo desempenho explicado por

As experiências de Orçamento Participativo, que nasceram em Porto Alegre, RS, têm se multiplicado pelo país

João Fiorin/PMPA

IPTU 02/03/07 10:20 Page 43

Page 39: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

suas características eminentemente rurais,segundo Liane Silva Ramos, engenheiraque realizou um estudo sobre estrutura easpectos das finanças públicas dos municí-pios paraenses.“O potencial de arrecadaçãodo IPTU nos municípios paraenses estálonge de ser atingido e conta com todas asdificuldades de se cobrar um imposto di-reto,que não está embutido no preço de al-guma mercadoria.Além disso,em municí-pios pequenos a proximidade entre oadministrador e os contribuintes é muitogrande, o que pode inibir a cobrança”, diz.

Um caso interessante em São Paulo, es-tado mais rico do país, demonstra a im-portância do investimento na arrecadaçãoe na boa gerência dos tributos locais. Ita-pecerica da Serra tem 130 mil habitantes edensidade demográfica de 852,7 habitantespor quilômetro quadrado. Dados da Em-presa Paulista de Planejamento Metropo-litano (Emplasa) e do IBGE indicam queentre 1970 e 2001 a população cresceu410,2% – com o agravante de que o inchaçose verificou em áreas de mananciais. Em1989, o IPTU representava 0,9% da com-posição da receita orçamentária do municí-pio. Então, em 1991 a prefeitura estruturou

a planta genérica,cadastrou imóveis e esta-beleceu tributação progressiva. Naqueleano, o IPTU já representava 4,4% das ver-bas disponíveis na cidade e, em 1992,11,8%.“Influência política, nível de tribu-tação dos municípios vizinhos e cultura re-gional impactam na arrecadação.O fato criaum efeito cascata. Quem arrecada e investepior apresenta desempenho cada vez maisnegativo, pois sem melhorias urbanas osimóveis não se valorizam e a arrecadaçãotributária não aumenta. Numa amostra de3.724 cidades,verifica-se que 1% de aumen-to do gasto em Habitação e Urbanismo au-menta em 0,14% o nível de IPTU”, revelaCarvalho Jr., pesquisador do Ipea.

Vida melhor Se incompatibilidades podemser resolvidas com a modernização dasmáquinas administrativas municipais, háoutras questões que demandam atenção.O IPTU não é apenas um imposto quegarante recursos para pavimentação e ilu-minação de ruas ou tratamento do lixo ur-bano. É também um instrumento de po-lítica para a definição do ambiente da ci-dade e para o estímulo ao desenvolvimen-to econômico. O Pelourinho, na área cen-

tral de Salvador, contava desde 1985 como título de “patrimônio mundial”, conce-dido pela Organização das Nações Unidaspara Educação,Ciência e Cultura (Unesco)– espécie de certificado da importância dosítio histórico para a humanidade. Naépoca, as edificações, à beira da ruína,foram desapropriadas e restauradas comrecursos provenientes da arrecadação deIPTU, o que valorizou os imóveis e os ne-gócios que neles se instalaram para aten-der turistas interessados em conhecer oconjunto arquitetônico.

Curitiba, no Paraná; Rio de Janeiro, ca-pital fluminense; São Luís,no Maranhão; eSantos, no litoral sul paulista, aumentaramas taxas cobradas aos proprietários deimóveis visando restaurar e conservar asedificações e a paisagem urbana,recuperara economia e criar novos espaços de lazerpara os cidadãos. Na cidade do Rio deJaneiro, o programa Corredor Cultural, de1984, envolveu quatro grandes áreas cen-trais, de grande vitalidade comercial, masdesvalorizadas pela poluição, pelo trânsitoe pela falta de conservação predial. Foramretirados anúncios e fachadas falsas que re-cobriam as edificações do século XIX e os

44 Desafios • março de 2007

Entre 1988 e 1998, o vo lume de recursos própr ios dos munic íp ios aumentou 197%.

Imposto Predial e Territorial Urbano (IPTU) é o imposto pago ao mu-nicípio por proprietários de imóveis (terreno ou edifício). O valor daalíquota, definido por lei municipal, varia conforme localização, dimen-sões, estado de conservação e benfeitorias, entre outros fatores.

Valor Venal do Imóvel é o resultado da adição dos valores do terreno eda construção, além de considerações acerca de infra-estrutura urbana,criminalidade, acesso a transportes e outros melhoramentos. Serve comobase de cálculo para o IPTU, normalmente fixado entre 50% e 70% dovalor de mercado.

Atualização da Planta Genérica de Valores (APGV) consiste na alte-ração dos valores do metro quadrado dos terrenos em que estão os imóveisa fim de aproximá-los do valor de mercado.A planta tem de ser aprovadapela Câmara de Vereadores, mas o Executivo pode reajustar os valores pordecreto, de acordo com a variação de um índice de preços definido em lei.

Cadastro Imobiliário Fiscal é uma base de dados dos imóveis do mu-nicípio. Inclui mapas cartográficos que identificam o parcelamento, a lo-calização, detalhes sobre a edificação e a identificação do proprietário.O recadastramento deve ser periódico para possibilitar melhor planeja-mento urbano, instalação de serviços e programas de regularizaçãofundiária.

Geoprocessamento é uma tecnologia que abrange procedimentos paraa localização de dados sobre a sociedade local, associados à cartografiado território: atividades econômicas, esportivas ou culturais, dis-ponibilidade e organização de serviços públicos.

Sistema de Informação Geográfica (SIG) integra dados definidos es-pacialmente, permitindo análises e previsões. É útil à elaboração de plan-tas de valores e cadastros para a arrecadação de tributos, além de ma-pas temáticos e ambientais para o planejamento urbano.

Termos técnicos

IPTU 02/03/07 10:21 Page 44

Page 40: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

Desaf ios • março de 2007 45

proprietários que promoveram restaurações(50%) obtiveram isenção de IPTU.Em SãoLuís e Santos, mediante desapropriaçãopontual e isenção fiscal, promoveu-se a re-cuperação de áreas semi-abandonadas, oque beneficiou o turismo. Em São Luís,neste ano,a prefeitura isentou do pagamen-to de IPTU os proprietários de 2,2 mil pré-dios bem conservados, localizados na áreaconsiderada pela Unesco como patrimônioda humanidade. Em Curitiba, o caso é pe-culiar.O IPTU é utilizado como instrumen-to de estímulo à preservação das áreasverdes – 77,7 quilômetros quadrados, ou17,97% da área total do município.Trata-sede um mecanismo de proteção das florestasparticulares em áreas urbanas, com a ofer-ta de redução de 30% do IPTU aos quecuidam direitinho das matas nativas.

Há,portanto,duas questões fundamen-tais para os municípios. Uma é incremen-tar a qualidade de vida e de trabalho em suaárea administrativa. A outra é reforçar ocaixa.Um caso exemplar é Belo Horizonte,a capital mineira. Conta com um sistemade informações geográficas que abrange to-da a sua extensão e envolve dados sociais(saúde e educação), de serviços urbanos(transporte coletivo, rede de água e esgo-tos) e de projetos viários. O sistema come-çou a ser projetado nos anos 1970 e ganhouforça com a informatização.“Hoje, o Sis-tema de Informação Geográfica (SIG) deBelo Horizonte é a maior base de dados ur-banos do país”, diz Clodoveu AugustoDavis Jr.,responsável pela companhia Pro-cessamento de Dados do Município deBelo Horizonte S.A. (Prodabel).

A prefeitura de Vitória da Conquista,terceiro maior município do estado daBahia, entrou nessa batalha em 1997. Na-quele ano, por atraso no pagamento dossalários do funcionalismo, a cidade estavasem os serviços públicos de limpeza de ruase coleta de lixo.A prefeitura estava endivi-dada com fornecedores.Para resolver o im-passe era preciso aumentar a receita – euma maneira de tornar a medida palatávelà população foi a implantação de um sis-tema de participação popular na decisãosobre investimentos públicos. O IPTU dasmaiores propriedades foi reajustado e fa-mílias com renda de até dois salários mí-nimos, sem outro imóvel além daquele emque residiam, foram isentas do pagamentodo imposto. Hoje, 16% dos contribuintessão responsáveis por 66% da arrecadaçãomunicipal. A administração recuperou acredibilidade e investe os recursos do IPTUem programas sociais.

Nos dez anos seguintes à promulgaçãoda Constituição, o volume de recursospróprios dos municípios elevou-se 197% –crescimento anual médio duas vezes maisacelerado do que o dos tributos estaduais.Mas os recursos tributários próprios aindatêm participação relativamente baixa no to-tal das receitas municipais: 26,5%. Há es-paço, portanto, para aumento da arreca-dação, especialmente do IPTU. Para isso, épreciso que os contribuintes se conscienti-zem de que seus imóveis serão valorizadoscom novos investimentos e que,com a par-ticipação de todos, a vida nas cidades serácada vez melhor.

Mas a part ic ipação do IPTU nas receitas munic ipais a inda é baixa, de apenas 26,5%

Secretaria do Tesouro Nacionalwww.stn.fazenda.gov.br/estados_municipios/financas

Estatuto da Cidadewww.estatutodacidade.org.br

Banco Nacional de Desenvolvimento Econômico eSocial (BNDES) – Programas de Modernização www.bancofederativo.bndes.gov.br

Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID)www.iabd.org/int/fiscal/spanish/docum_main.html

Saiba mais:

d

O pagamento do IPTU gera recursos para a resolução dos problemas que afetam o cotidiano dos cidadãos

Valdecir Galor/SMCS

IPTU 02/03/07 10:21 Page 45

Page 41: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

SOCIEDADE

Idosos 02/03/07 15:04 Page 46

Page 42: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

Desaf ios • março de 2007 47

A nova velhageraçãorovavelmente, nunca foi tão difí-cil como hoje caracterizar umapessoa idosa. Os antigos clichêsnão se aplicam mais.Os aposen-

tados de pijama e as senhoras que passamos dias a fazer tricô desaparecem aos pou-cos e dão lugar a figuras muito diferentes.Quem tem medo de envelhecer não se as-susta mais com frases do tipo “Eu sou você

amanhã”, ícone de um famoso comercialdos anos 1970. Ao que tudo indica, o a-manhã parece cada vez mais promissor.

Yara Lígia Lemos, de 61 anos, psiquia-tra,com mestrado em psicanálise,mora naBarra da Tijuca,no Rio de Janeiro,e acaboude arrumar um namorado. O rapaz é umpouco mais jovem do que ela, o que só aju-da na hora de ir para a balada, para a praiaou como incentivo para a compra de novase mais modernas roupas. Ela é a prova vivade que os sexagenários continuam na ati-va. Quem ainda tiver alguma dúvida, bas-ta esperar chegar ao Brasil o quinto filmeda série Rocky, no qual o ator SylvesterStallone mais uma vez aparece no papel do

famoso boxeador. Ele apresenta, aos 60anos de idade, todo o seu vigor físico, evi-denciando que a vida continua muito bemdepois da sexta década.

A bola cristal dos pesquisadores sociaisaponta para uma espécie de personagem-padrão do futuro.Seria um idoso high-tech,celular na mão, piercing na orelha, adeptodo videogame,consumista,trabalhador ati-vo, reivindicador político, com mais esco-laridade e mais renda que seus própriosavôs e beneficiado pela tecnologia médico-cosmetológica. Com vários casamentos,poucos filhos, e levando vida autônoma, aúnica semelhança que ele manteria com osidosos de antigamente seriam as queixas de

que os filhos e os netos só dão despesas enão lhe dedicam a atenção devida.

Perfil “Com base nas projeções dos resul-tados do Censo 2000, o Brasil será o sextopaís mais envelhecido do mundo em2025”, informa Ana Amélia Camarano,pesquisadora do Instituto de Pesquisa Eco-nômica Aplicada (Ipea) e vice-presidentedo Conselho Nacional dos Direitos do Ido-so. A pesquisadora, em seu livro Os NovosIdosos Brasileiros – Muito Além dos 60?,traçou um perfil dessa nova velha geração.São os filhos do baby boom, a numerosaprole nascida entre 1946 e 1962. É umaparcela da população em que as mulheres

Projeções indicam que dentro de vinte anos o Brasil será a sexta nação mais envelhecida

do mundo. É preciso que a sociedade se prepare agora para conviver com um número

maior de idosos mais ativos, conscientes, exigentes e integrados. O desaf io está lançado

PP o r M a r i n a N e r y , d o R i o d e J a n e i r o , R J

Idosos 02/03/07 15:05 Page 47

Page 43: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

48 Desafios • março de 2007

No mundo todo ex i s tem cerca de 600 m i l hões de pessoas com ma is de 60 anos

“A população com mais de 80 anos crescemais que o conjunto geral de idosos”, in-forma Faleiros, que também é um dos au-tores do Diagnóstico do Envelhecimentono Brasil, elaborado pelo Ministério doDesenvolvimento Social e Combate à Fo-me e pela Secretaria Especial de DireitosHumanos. Segundo o relatório, o aumen-to médio do conjunto de idosos é de 3,5%,enquanto o grupo daqueles com mais de80 anos cresce 4,7%.

Dos 14,5 milhões de idosos encontradospelo Censo Demográfico de 2000, 55% e-ram mulheres. Quando desagregados emsubgrupos de idade, a proporção de mu-lheres aumenta. Esse fato é explicado pelamortalidade diferencial por sexo– o que le-va à constatação de que “o mundo dos mui-to idosos é um mundo de mulheres”. Por-tanto,haverá uma “feminização”da velhice.

A geração que está entrando nos 60anos já se beneficiou dos grandes avançosda tecnologia médica, cosmetológica, dareposição hormonal e foi influenciada pe-lo culto à juventude. Independentementeda classe social, esse grupo de idosos apre-senta maior disponibilidade para o con-sumo,principalmente em relação a produ-tos para a preservação do corpo. Eles vive-ram a revolução na família,casaram-se,des-casaram-se,recasaram-se ou não,e tiveram

menos filhos. Não casar e não ter filhospassou, inclusive, a ser uma opção.

Conseqüências Todas essas mudanças trou-xeram conseqüências inesperadas para asnações e também para o microuniverso dasfamílias que estão enfrentando a seguintequestão: como a sociedade está se prepa-rando para lidar com esse novo tipo de se-xagenário, septuagenário, octogenário emais adiante? A pesquisadora Ana AméliaCamarano sempre chama a atenção para ofato de que a maior longevidade da popu-lação é positiva, contudo maior populaçãode velhos no futuro exige planejamento es-pecífico para essa faixa etária, a fim de evi-tar um transtorno social. “Não se devedeixar que o sucesso traga a sua falência”,opina ela. Mas é difícil definir um retratocomum a todos,sobretudo no Brasil.“Cadaum tem sua própria trajetória individual,mas sabemos que essas trajetórias são forte-mente marcadas por desigualdades sociais,regionais e raciais em curso no país. Aspolíticas sociais podem reforçar essas de-sigualdades ou mesmo atenuá-las,bem co-mo os mitos, os estereótipos e os precon-ceitos em relação à população idosa”, re-conhece Camarano. Principalmente numpaís desigual como o Brasil, as pessoas en-velhecem desigualmente. Isso faz dos ido-sos um grupo heterogêneo.No entanto,pa-ra finalidades operacionais, define-se co-mo população idosa a de 60 anos ou mais,tal como estabelecido no Estatuto do Idoso(Lei nº 10.741,de 1.º/10/2003) e na PolíticaNacional do Idoso (Lei nº 8.842, de 4/1/1994), que funcionam como um marco le-gal da terceira idade.

Segundo uma das profissionais maisdedicadas à questão do envelhecimentono Brasil, a professora e pesquisadora doPrograma de Mestrado e Doutorado emGerontologia da Universidade de Cam-pinas (Unicamp),Anita Liberalesso Néri,“há um discurso ambíguo das instituiçõessociais e do Estado brasileiro em relaçãoaos idosos, que em certos casos são prote-gidos e em outros acusados de provocar osmales dos sistemas públicos de saúde e

ganharam mais escolaridade, entrarammaciçamente no mercado de trabalho e setransformaram, atualmente, em provedo-ras e cuidadoras. Se, por um lado, podemcontribuir com mais renda para o cuidadodos idosos, dispõem de menos tempo eatenção dos descendentes.

Multidão “Há 600 milhões de pessoas commais de 60 anos no planeta”, afirma osubsecretário de Promoção Humana daSecretaria Especial de Direitos Humanos(SEDH), Perly Cipriano, citando dados daOrganização das Nações Unidas (ONU).Eles já formam um contingente nada des-prezível, que representa cerca de 10% doshabitantes da Terra.O envelhecimento po-pulacional é um fenômeno mundial. Sig-nifica que há um crescimento mais elevadoda população idosa do que dos demais gru-pos etários. Esse aumento é produto deuma das maiores conquistas sociais doséculo XX, que foi o maior acesso popularàs tecnologias e aos serviços de saúde. Issofez com que a esperança de vida dos brasi-leiros aumentasse cerca de dez anos, entre1980 e 2000, atingindo 71 anos, em média,no início do século XXI.

Segundo o Instituto Brasileiro de Geo-grafia e Estatística (IBGE),o Brasil está den-tro dos padrões globais e a população idosacorresponde a 10% do total, cerca de 18milhões de pessoas.Mas daqui a vinte anosas projeções são de que esse número saltepara 14,5%,um aumento de quase 50%.“Éuma transição demográfica muito rápida,principalmente se considerarmos que ou-tros países levaram mais de um século pararealizar esse movimento, como a França”,afirma Vicente Faleiros, professor do mes-trado de Gerontologia da Universidade Ca-tólica de Brasília, autor do livro Gestão So-cial por Sujeito/Idade na Velhice.

Classificação E, quanto mais idoso, maiorserá o aumento da participação na popu-lação. No Brasil de hoje são consideradosidosos jovens aqueles que têm entre 60 e70 anos de idade; medianamente idososentre 70 e 80; e muito idosos acima de 80.

Retrato do idosobrasileiro hoje

• 17,7 milhões de pessoascom mais de 60 anos – cerca de 10% da população, segundo o IBGE.

• A cada ano, 650 mil novos idosossão incorporados à população brasileira.

• 13% dos eleitores têm mais de 60 anos.

• Os idosos são, em média, 55,5% mulheres e 44,5% homens, mas onúmero de mulheres pode ser bem maiorem algumas capitais, como Porto Alegre,que tem 63% de mulheres.

Fonte: IBGE

Idosos 02/03/07 15:06 Page 48

Page 44: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

Desaf ios • março de 2007 49

previdência”. Posições desse tipo ajudama criar estereótipos, como o de que todosos idosos são pobres, doentes, dependen-tes e com baixa escolaridade.“Encarar oidoso como um peso e um risco social éuma concepção apenas parcialmente ver-dadeira”, afirma Néri.

Para o professor Faleiros, os problemascomplexos surgidos com a nova geração deidosos podem ser resolvidos no Brasil comatitudes objetivas.“É só o governo destinarà seguridade o que já é financeiramentegarantido a ela pela Constituição mas vemsendo aplicado em outras áreas”,critica.Naopinião dele,“a contribuição para a Previ-dência Social virá cada vez mais do lucrolíquido das empresas em vez do maciço des-conto em folha do empregado, como é ho-je.” O professor também aconselha a cria-

ção de campanhas de conscientização dosjovens para que saibam conviver com a fu-tura realidade de um mundo povoado pormuitos idosos. Afinal, a tendência é que oidoso se torne cada vez mais um ator políti-co,aumentando sua representatividade nosgovernos,no Poder Legislativo,na socieda-de civil organizada e em outros setores.Poresse motivo,o Estado precisará se aparelharmelhor para atender às reivindicações o-riundas dessa parcela da população.

Trabalho Em relação ao mercado de traba-lho, o maior desafio será manter a popu-lação na ativa o maior número possível deanos.“A saída será aumentar o avanço tec-nológico para reduzir a necessidade de es-forço físico”, sugere Camarano. Para isso épreciso saber aproveitar que os idosos pos-

suem grande capacidade de envolvimento,grau de comprometimento e cumprimen-to de metas.Os idosos de hoje viveram a vi-da ativa num período marcado pelo cresci-mento econômico e por empregos estáveise formais.Estão,atualmente,beneficiando-se dos ganhos da Constituição de 1988 emrelação à ampliação da cobertura dos bene-fícios da seguridade social,principalmentenas áreas rurais. Em 2003, quase 80% dapopulação idosa recebia benefícios da se-guridade social e 86% residiam em casaprópria, em razão dos financiamentos doBanco Nacional de Habitação (BNH). Po-rém, esse fácil acesso à aposentadoria aca-bou ajudando a criar um problema: o há-bito do mercado de não contratar profis-sionais mais velhos, por temor de que en-cerrem rapidamente a carreira. E a verdade

d e i d ade , o que co r r e sponde , a p rox imadamen te , a 10% da popu l a ção da Te r ra

Inflação da terceira idade

Ele é pouco conhecido, mas é um termô-metro do bolso do consumidor idoso. O Ín-dice de Preços ao Consumidor da TerceiraIdade (IPC-3i), da Fundação Getulio Vargas(FGV), tem sete classes de despesas e con-sidera o consumo de famílias em que pelomenos metade dos componentes tem maisde 60 anos. Em janeiro deste ano, o IPC-3ido ano passado foi divulgado e acumulou al-ta de 2,26%, superior ao Índice de Preçosao Consumidor Brasil (IPC-BR), que foi de2,06%. Segundo o Coordenador do IPC Bra-sil, André Furtado Braz,“os maiores gastosdos idosos brasileiros foram com saúde, ha-bitação e transporte”. Esses produtos au-mentaram de preço e têm peso maior no or-çamento dos idosos.

Na análise do economista Marcelo Néri,da FGV,“os índices de inflação para a popu-lação idosa permitem uma medida mais pre-cisa da evolução de seu efetivo poder decompra”. Funcionam como um sistema dereferências para a execução de políticas so-ciais, nas áreas de saúde e previdência.

Idosos 02/03/07 15:07 Page 49

Page 45: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

50 Desafios • março de 2007

Cada vez mais acredita-se que um prof issional sênior melhora a ef iciência do trabalho

Uma academia para o cérebro

O game Brain Age (“Idade do cérebro”, emportuguês), da Nintendo, tem uma propostainovadora: determina a idade da mente do jo-gador e lança desafios de raciocínio lógico(entre os quais o sudoku) para rejuvenescero cérebro.Quando ligado pela primeira vez, ojogo pedirá para que se faça alguns testes,que, dependendo do desempenho da pessoa,determinarão a idade de seu cérebro. Essaidade nada tem a ver com a idade cronológi-ca,sendo a mínima 20 e a máxima 80.Quantomais jovem, melhor. O grande objetivo é al-cançar a cobiçada idade de 20 anos.Para is-so, Brain Age conta com um acervo de noveminigames, a maioria é habilitada à medidaque se vão vencendo etapas.

é que no Brasil as pessoas se aposentaram,por qualquer parâmetro, antes de ser ido-sas.E as reformas da Previdência ajudarampouco. Em 1998, 91% dos homens que es-tavam aposentados por tempo de contri-buição tinham começado a receber antesde completar 60 anos. Em 2002, essa pro-porção diminuiu para 84%. No caso dasmulheres, o índice caiu de 98% para 97%.

Conhecimento “Sou contra a visão econo-micista de que os velhos são um peso paraa sociedade,pelo custo previdenciário,masesse problema tem de ser enfrentado”, dizCamarano. Mas, ao que parece, o aumentodo tempo de vida produtiva das pessoastende a convencer as empresas de que épossível aproveitar os mais velhos, em vezde rejeitá-los. É cada vez mais comum oconceito de que a presença de um profis-sional sênior melhora a eficiência das equi-

pes.E ainda a mudança de paradigma como fato de que alguém pode ser contratadocom 60 anos e ser mantido na empresa du-rante dez, quinze ou até vinte anos.

Cuidados Por outro lado, a sociedade teráde enfrentar a pouca disponibilidade detempo dos familiares para dedicar aosidosos.Sobretudo se eles forem em númerocada vez maior.Com a intenção de dar umasolução a essa demanda, os idosos foramclassificados em três grupos diferentes. Osindependentes, que conseguem realizar astarefas necessárias à sua sobrevivência. Osparcialmente dependentes, que executamdiversas tarefas, mas precisam eventual-mente de auxílio para sair de casa ou fazeralgo mais complexo.E os dependentes,quenecessitam de assistência constante. Que-rendo ou não, a sociedade terá de criar es-paços onde cada uma dessas categoriaspossa viver, usufruindo de seus recursos.“Considerando-se a insuficiência de rendae a falta de autonomia para lidar com as ati-vidades do cotidiano como indicadores deidosos que necessitam de algum tipo deproteção social, assume-se que as políticasmais importantes para esse segmento são ade geração de renda e a de cuidados de lon-ga duração”, resume Camarano.

Mas ainda restam algumas questões:será que a longevidade estaria ao alcance detodos, de igual modo, em todo o planeta?Como obtê-la? Pode a sociedade sustentaruma crescente população envelhecida? Atéquando deveríamos trabalhar se pudésse-mos viver muito mais tempo? Será quecontinuaremos a respeitar os idosos quan-do seu número subir vertiginosamente?

Entretanto, o saldo geral é que a hu-manidade vem evoluindo no sentido decriar melhores condições para as popu-lações na velhice. À medida que os idososalcançam diversas vantagens, como asimensas possibilidades de lazer e consumocom boa qualidade de vida, é possívelchegar à conclusão positiva do professor degerontologia da Universidade Católica deBrasília Vicente Faleiros: “A velhice não éum peso, e sim uma conquista”. d

Idosos 02/03/07 15:08 Page 50

Page 46: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

Desaf ios • março de 2007 51

M i g u e l I g n a t i o sARTIGO

pós quatro anos de “céu de brigadeiro”naeconomia, eis que surgem, no horizonte,nuvens escuras, que poderão causar tur-bulências na travessia de 2007. Trata-se

do câmbio, ou, como preferem alguns, da valori-zação do real frente ao dólar e de seus efeitos so-bre o setor industrial. Por enquanto, analistasabordam o tema com cautela.Alguns acham queo real não estaria assim tão valorizado. Para ou-tros, o problema seria o dólar, muito desvaloriza-do, e não o real. Talvez ambas as correntes este-jam certas, mas apenas em parte.

O importante é que,de uma forma ou de outra,tal fenômeno não é recente e continuará por umbom tempo sendo uma espécie de contraponto ne-gativo ao “mar de rosas”idealizado por estrategis-tas do Planalto.Em outras palavras,mais depressado que imagina,o governo terá de deixar de lado aagenda política (definição de alianças na Câmarae no Senado,reforma ministerial etc.) para dedicar-se, com afinco e seriedade, à questão do câmbio.

O problema sempre reaparece na mídia quan-do o dólar cai para a faixa de 2,10 reais, mas éabordado como se fosse uma disputa pessoal en-tre o ministro da Fazenda, Guido Mantega, e opresidente do Banco Central (BC), HenriqueMeirelles. Ou então como uma briga por espaçoentre desenvolvimentistas e monetaristas.

Da mesma forma que o ex-presidente Fer-nando Henrique Cardoso teve de desvalorizar oreal, em janeiro de 1999, no início de sua segun-da gestão, em algum momento do segundo man-dato de Luiz Inácio Lula da Silva o governo teráde enfrentar tal desafio.

Vamos analisar rapidamente os fatores respon-sáveis pela alta da nossa moeda. Em primeiro lu-gar, no período 2003-2006, soja, açúcar, café, car-ne bovina e frango,entre outras mercadorias agrí-colas de exportação,valorizaram-se bastante,prin-cipalmente devido às elevadas taxas de crescimen-to das economias de China, Índia e Rússia, gran-des consumidoras desses produtos.

Em 2006,a quantidade de commodities agríco-las de exportação embarcada para o exteriorelevou-se apenas 3% em relação a 2005,menos dametade da taxa de crescimento do comércio inter-

nacional registrada no ano passado.Apesar disso,e do aumento das importações,o superávit na ba-lança comercial foi superior a 45 bilhões de reais.

As perspectivas para 2007 são de que os preçosde tais mercadorias subam ainda mais, puxadospelo consumo maior de etanol, que passará a sermisturado à gasolina consumida nos EstadosUnidos e na União Européia.Além disso, Chinae Índia, pelo menos, deverão crescer bem acimada média dos demais emergentes, o que signifi-ca mais exportações brasileiras de soja, açúcar,café, frango e de carnes bovina e suína.

Por último, mas não menos importante, con-tinua inalterada a política do BC de reduzir lenta-mente as taxas básicas de juro. Isso tem atraídopara cá uma “enxurrada” de dólares do exterior,em busca da remuneração elevada, que é paga,por exemplo, pelos títulos da dívida pública.

Só há uma forma de o governo não mexer nocâmbio: é lançar uma política industrial para utili-zar a “montanha” de dólares estocados no BC nosetor produtivo da economia. Trata-se daquelamesma política que, timidamente, o governo fez“vazar”para a mídia, em 2004, baseada na substi-tuição seletiva de importações de máquinas e equi-pamentos, na produção de fármacos e de chips.

Financiar via Banco Nacional de Desenvol-vimento Econômico e Social (BNDES) impor-tações necessárias para a implantação e o fortale-cimento desses setores é a primeira coisa a fazer.Depois disso, o governo poderia apoiar, por meioda criação de linhas de crédito para importaçõesseletivas, os setores que vêm perdendo terrenopara concorrentes de fora: calçados, têxteis, mó-veis e brinquedos, entre outros.

Isso é urgente e necessário.Até porque se as ne-gociações entre Estados Unidos, União Européiae Grupo dos 20 avançarem no âmbito da Rodadade Doha, muitos outros setores industriais ficarãoexpostos à concorrência de similares americanose europeus. Seria uma compensação mais do quejusta enquanto as reformas não forem aprovadas.Agora, há recursos. E em dólares!

Miguel Ignatios é presidente da Associação dos Dirigentes de Vendas e

Marketing do Brasil (ADVB)

Câmbio trava a indústria

“Só há uma forma de

o governo não mexer

no câmbio: é lançar

uma política

industrial para

utilizar a 'montanha'

de dólares estocados no

BC no setor produtivo

da economia”

ADivu

lgaç

ão

Miguel 02/03/07 10:23 Page 51

Page 47: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

MELHORES PRÁTICAS

Parece impossível,

Rica

rdo

Laba

stier

P o r L i a V a s c o n c e l o s , d e G u a r á , D F

melhores praticas2 02/03/07 10:24 Page 52

Page 48: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

mas não é

Pesqu isa rea l i zada pe lo Un icef e pe lo Min istér io da Educação ana l isa 33 esco las que,

apesar de loca l i zadas em reg iões prob lemát icas tanto soc ia l como economicamente,

consegu iram obter bom desempenho na Prova Bras i l . A fórmula é acess íve l a qua lquer

um : c r i a t i v i d ade , empenho e d i s pos i ç ão de p ro fe sso res , f u nc i o ná r i o s , pa i s e a l u nos

Aluno de escola pública do Distrito Federal

desenha a “cara” da Matemática

melhores praticas2 02/03/07 10:25 Page 53

Page 49: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

Aprova Brasil:o direito de aprenderO estudo realizado pelo MEC e Unicef analisou as condições de 33 escolas espalhadas por 14 estados e o DF

54 Desafios • março de 2007

A l g umas ca rac te r í s t i c a s comuns a e ssas e sco l a s : b oas p rá t i c a s pedagóg i c as ,

o primeiro dia de aula do ano leti-vo, os alunos do Centro Educa-cional 03 do Guará, cidade-saté-lite de Brasília, no Distrito Fede-

ral, recebem um manual. Entre as muitasinstruções, está lá escrito que sua respon-sabilidade é estudar, fazer as tarefas e de-mais trabalhos solicitados e entregá-lospontualmente nas datas especificadas peloprofessor. Também é preciso respeitar asnormas disciplinares da escola e ser hones-to na realização das verificações de apren-dizagem. Mas não pensem que os alunostêm somente deveres. Nessa escola, elestambém têm direitos.Um deles é o respeitoà dignidade, independentemente da con-vicção religiosa, política ou filosófica, gru-po social, etnia e nacionalidade. Outro é agarantia de que lá o aluno terá a oportu-nidade de desenvolver sua potencialidadeao máximo. O Centro Educacional gravitaentre dois pólos: a rigidez e o respeito.E temsido justamente a manutenção do comple-xo equilíbrio desse pêndulo o segredo dessaescola, que coleciona resultados positivos.

Para Fernanda Leôncio da Paz, de 14anos,aluna da 8ª série,“a escola nos mostraque estamos aqui para estudar. Os profes-sores são rígidos, mas sabemos que é parao nosso bem”. Sua colega de série, LetíciaAguiar de Melo, de 13 anos, resume o sen-timento:“Às vezes achamos ruim, mas asregras nos dão maturidade”.O Centro Edu-cacional 03 do Guará é uma das 33 escolaspúblicas que fazem parte do estudo “AprovaBrasil, o direito de aprender”, realizado pe-lo Fundo das Nações Unidas para a Infância(Unicef) e pelo Ministério da Educação(MEC).A maioria das escolas pesquisadasestá localizada em pequenos municípios ouna periferia de grandes cidades e é freqüen-tada por crianças de famílias de baixa ren-da.Tudo conspirava contra,mas essas insti-tuições mostraram que nenhum obstáculoé incontornável para a criatividade e para osmétodos inovadores.Elas conseguiram dri-blar as precariedades e oferecem um ensinode qualidade a seus alunos.

Cada escola está em um canto diferentedo país e tem, em seu entorno, uma reali-

dade própria (veja mapa abaixo), mas algu-mas características são denominadores co-muns e servem para explicar seu sucesso:boas práticas pedagógicas, professorescomprometidos e com atitude positiva emrelação aos alunos, participação ativa dosestudantes e dos pais,gestão democrática eparcerias externas. Combinando algunsdesses fatores, essas 33 escolas, localizadasem catorze estados e no Distrito Federal,conseguiram melhorar a qualidade do en-sino oferecido, garantindo o acesso à edu-cação e a permanência escolar.As institui-ções estudadas foram selecionadas peloInstituto Nacional de Estudos e PesquisasEducacionais Anísio Teixeira (Inep) e peloUnicef não só segundo o desempenho deseus alunos na Prova Brasil (leia quadro na

pág.56),mas também de acordo com o per-fil socioeconômico dos alunos e do mu-nicípio onde estão instaladas.

Superação “Grande parte dessas escolasestá situada em lugares pobres e mesmo as-sim tiveram notas acima da média nacionalna Prova Brasil. Nosso desafio era desco-

brir o que essas instituições de ensino fa-ziam de diferente”,conta Fabiana de Felício,coordenadora de articulações institucio-nais do Inep. Segundo ela, as 33 escolas fo-ram escolhidas com base num cruzamen-to das informações socioeconômicas dosalunos que participaram da Prova Brasilem 2005 com os dados dos municípiosonde elas se localizam e o desempenho mé-dio de cada escola. A esse cruzamento foidado o nome de Índice de Efeito Escola(IEE).As escolas selecionadas para o estu-do “Aprova Brasil, o direito de aprender”foram instituições em que o IEE era posi-tivo. Ou seja, onde o desempenho médiodos alunos,tanto da 4ª como da 8ª série,emportuguês e matemática, estava acima dovalor esperado para escolas em que osalunos tivessem perfis socioeconômicossimilares. Portanto, de acordo com o estu-do, que foi realizado entre os meses desetembro e novembro de 2006, as 33 esco-lhidas não são necessariamente escolas queconseguiram as melhores notas na ProvaBrasil, mas instituições que tiveram maiorimpacto na vida de seus alunos quando

São Paulode Olivença

Carauari

Uarini

Fonte Boa

Esperantinópolis

Vigia

Salvador

MucugêPosse

Brasília

ItabiritoS. Brás Suaçuí

Nova FriburgoDuque de Caxias

Rio de Janeiro

Itatinga

Aquidauana

Ibema

Charrua

Sertãozinho

RN

PB

ALSE

PE

ES

RJ

Conselheiro Lafaite

Novas Russas

BarbalhaTeresinaTocantinópolis

NatividadeTrajano de Moraes

Desterro do Melo

Barra do Chapéu

Dourados

Diamante do Sul

Prudentópolis

CE

PI

MAPA

AP

BA

TO

MT

MS

GO

DF

SP

PR

SC

RS

MG

RO

AM

AC

RR

N

melhores praticas2 02/03/07 10:26 Page 54

Page 50: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

Desaf ios • março de 2007 55

p r o fe sso res comprome t i d os e pa r t i c i p a ção a t i v a d e pa i s e e s t udan te s

Fotos Ricardo Labastier

O Centro Educacional 03 do Guará conta com uma boa infra-estrutura. Além da quadra de esportes (ao alto) também tem sala de leitura, sala de vídeo e TV,

laboratório de informática, três laboratórios de ciências e auditório. Tudo funcionando sob o comando da vice-diretora Cândida Vieira (acima)

melhores praticas2 02/03/07 10:27 Page 55

Page 51: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

56 Desafios • março de 2007

To d o s o s d e ze s s e i s p r o fe s s o r e s d a e s c o l a d o G u a r á t êm fo rmaç ã o n o E n s i n o

comparadas às demais de semelhante per-fil socioeconômico de alunos e do municí-pio. “Não escolhemos as melhores insti-tuições de ensino.O estudo alia os bons re-sultados na Prova Brasil a uma situação devulnerabilidade e exclusão social.Na maiorparte das pesquisas, a tendência é procuraras razões do fracasso.Nosso estudo foi atrásdas razões do sucesso escolar, e a principalinstrução que demos aos pesquisadores queforam a campo era que tivessem olhos,ou-vidos e coração abertos para compreendercada escola em sua originalidade”, explicaMaria de Salete Silva, consultora do Unicefpara educação e coordenadora do estudo.

Vida No Centro Educacional, a explicaçãopara a escola ter conquistado tantos resul-tados positivos está na ponta da língua.“Nós temos a missão de preparar nossosalunos para a vida.Aqui,os estudantes nãosão só um número, são pessoas. Eles têmacesso direto à direção e temos todos umarelação muito próxima. Incentivamos oaluno para que ele possa ser sempre o me-lhor”,diz Cândida Angélica Freitas Alencar

Vieira, vice-diretora da escola, que sabe onome de cada um dos estudantes e os re-cebe sempre com um sorriso na sua sala,que fica cheia durante os intervalos. Elatambém aponta outras razões do sucesso:a boa gestão das verbas públicas, o empe-nho, o comprometimento e a capacidadede inovar dos funcionários, a manuten-ção da infra-estrutura – apesar das limita-ções –, a valorização dos alunos e a boaformação dos professores.

“Um dos grandes destaques dessa esco-la é que as práticas pedagógicas são desen-volvidas com base em projetos bimestraisinterdisciplinares”, explica Fabiane Robl,pesquisadora do estudo “Aprova Brasil, odireito de aprender”.Os temas dos projetossão definidos com a participação dos alu-nos, dos professores, dos coordenadores eda direção. No ano passado, a escola esco-lheu trabalhar com cidadania e valores pormeio da programação da rádio da escola.Foram abordados a Copa do Mundo deFutebol, com uma gincana dos países, elei-ções, com campanha, votação e até a pres-tação de contas que seguiam as regras do

Tribunal Superior Eleitoral (TSE), além dafeira de ciências no último bimestre. A rá-dio da escola vai ao ar todos os dias porvinte minutos durante os intervalos das au-las. Os próprios alunos redigem o texto eescolhem as músicas, sempre com a super-visão de um professor, e revezam-se nasfunções de locutor e técnico. No segundodia de aula deste ano,os estudantes recebe-ram incentivos para um bom aproveita-mento do ano letivo e dicas de como estu-dar melhor.“Os projetos são fundamentais,pois despertam o interesse dos alunos e dãoà escola uma dinâmica diferente. Os estu-dantes passam a ter outra relação com oconteúdo”, explica Maria do Socorro Fer-reira Paixão, coordenadora pedagógica.Ainda em planejamento, o tema do proje-to transversal deste ano já foi escolhido:tanto o Ensino Médio como o Fundamen-tal estudarão o aquecimento global.

Parâmetros As escolas foram pesquisadascom base em cinco dimensões: as práticaspedagógicas (trabalho coletivo,projetos deensino, inovações na organização da esco-

O que é a Prova Brasil A Prova Brasil, idealizada para produzir informações sobre o ensino ofere-cido pelos municípios e escolas que sirvam como apoio para o governo naelaboração de políticas públicas, faz parte do Sistema Nacional de Avaliaçãoda Educação Básica (Saeb) e é desenvolvida e realizada pelo InstitutoNacional de Estudos e Pesquisas Educacionais Anísio Teixeira (Inep), autar-quia do Ministério da Educação (MEC).Sua primeira edição ocorreu em no-vembro de 2005 e avaliou cerca de 3,3 milhões de alunos de 4ª e 8ª sériesdo Ensino Fundamental em 41 mil escolas públicas urbanas com mais detrinta alunos matriculados na série avaliada. Foram aplicadas, nos 5.398municípios, provas de língua portuguesa (com foco em leitura) e matemáti-ca.Além das provas, os alunos responderam a um questionário que coletouinformações sobre seu contexto social, econômico e cultural.A expectativado MEC é que a segunda edição da Prova Brasil aconteça no final deste anoe seja ampliada às escolas rurais.

Na prova de leitura, os alunos da 4ª série do Ensino Fundamental de-vem localizar informações explícitas em textos narrativos mais longos e emanúncios de classificados, reconhecer o tema de um texto informativo maissimples e identificar marcas lingüísticas que evidenciam os elementos que

compõem uma narrativa. Os alunos da 8ª série, por sua vez, devem inferir osentido de uma expressão metafórica e o efeito de sentido de uma ono-matopéia, estabelecer relações entre partes de um texto pela identificaçãode substituições pronominais ou lexicais e reconhecer a relação de causae conseqüência explícita entre partes e elementos em textos verbais e não-verbais de diferentes gêneros.A média geral dos estudantes mais novos foi172,9 numa escala única para todas as séries que vai até 350 pontos.Já osda 8ª série tiveram média 222,6.

Na avaliação de matemática, o desempenho foi similar. Os estudantesda 4ª série tiveram média de 180. Isso significa dizer que eles são capazesde ler as horas e os minutos em relógios digitais,de calcular operações en-volvendo intervalos de tempo e de resolver problemas relacionando dife-rentes unidades de uma mesma medida para cálculos de intervalos e decomprimento.A média dos alunos de 8ª série foi 237,5.Ou seja,eles recon-hecem a representação numérica de uma fração com o apoio de represen-tações gráficas, resolvem uma divisão exata por número de dois algarismose uma multiplicação cujos fatores são números de dois algarismos e com-param e calculam áreas de figuras poligonais em malhas quadriculadas.

melhores praticas2 02/03/07 10:28 Page 56

Page 52: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

Desaf ios • março de 2007 57

la, ensino contextualizado, realização deatividades externas com os alunos, incen-tivo à prática de jogos e esportes e imple-mentação de novas formas de acompa-nhamento e avaliação da aprendizagem); aimportância do professor (formação e va-lorização); a gestão democrática e a parti-cipação da comunidade escolar; a partici-pação dos alunos e as parcerias externas.Entraram também na conta fatores comoo ambiente da escola (relações entre pes-soas), a existência e a boa manutenção dasbibliotecas, quadras de esporte e labora-tórios de informática e ciências, e a inte-gração entre a escola,as secretarias munici-pais e estaduais e as demais escolas da redee do município.

O Centro Educacional 03 do Guaráconta com uma boa infra-estrutura.São 26salas permanentes, sala de leitura, sala devídeo e TV, laboratório de informática, la-boratório de ciências, laboratório de quí-

mica, laboratório de física, auditório, qua-dra de esportes e área de lazer.A biblioteca,que tem um acervo de 25 mil livros, fun-ciona de segunda a sexta-feira das 8 horasda manhã às 8 horas da noite e atende nãosó a escola, mas a comunidade do entorno.Mesmo dispondo de todo esse espaço, oCentro Educacional estimula e promove arealização de atividades fora dos muros daescola por meio de diversas parcerias exter-nas. A escola tem convênio com cinemas,museu, espaço cultural, o Ministério Pú-blico e a Universidade de Brasília (UnB),que oferece oficinas de matemática aos alu-nos.“As parcerias são feitas a cada ano, de-pendendo dos projetos interdisciplinares.Elas são valiosas porque dão acesso a mun-dos que transcendem as paredes da esco-la”, acredita Vieira.

Não são só os alunos que estão satis-feitos com a escola,os professores também.“Aqui, temos ótimas condições de traba-

lho”, diz Erundina Barbosa da Silva, pro-fessora de matemática da 7ª e da 8ª série.Todos os dezesseis professores da escola têmformação no Ensino Superior, e o CentroEducacional incentiva a capacitação cons-tante.“Estimulamos o professor para que eleparticipe de cursos do governo do DistritoFederal e da UnB mesmo quando há con-flitos de horário.Sempre damos um jeito deliberá-los”,conta a vice-diretora.Na escola,o regime de jornada é ampliado.Os profes-sores trabalham trinta horas por semana emsala de aula, mas recebem o equivalente aquarenta horas.“Nas dez horas restantes,fi-cam na escola na parte da coordenação,cor-rigem provas, elaboram atividades e aten-dem alunos e pais”, explica Vieira.

Estímulo Cuidados desse tipo ajudam acriar um ambiente estimulante para estu-dantes e funcionários, o que melhora aqualidade da convivência em geral. “Oque nos surpreendeu positivamente foique em nenhum momento houve recla-mação sobre o aluno. Nas 33 escolas, o es-tudante é valorizado e tratado com muitorespeito. Em geral, essas instituições deensino não cumprem o calendário esco-lar de forma mecânica. Propõem ativida-des simples e criativas. Afinal, o que dife-rencia uma escola é sua alma”, afirmaSilva, do Unicef.

Exemplos de boas práticas não faltam evêm das mais diferentes regiões do país.Nacidade de Sertãozinho (SP),a biblioteca Soldo Saber, da Escola Municipal ProfessorJosé Negri,atrai os alunos e procura desen-volver o gosto das crianças pela leitura. Asaulas de português ganham reforço tam-bém com aulas de teatro e textos escritos ouadaptados pelos estudantes. O clássico deMachado de Assis Dom Casmurro fez tan-to sucesso que os alunos organizaram umjulgamento para a fictícia Capitu. Coubeaos estudantes desempenhar os papéis dejúri, juiz,advogados e promotores.As aulasde matemática são reforçadas com oficinasespeciais.Noções como as de fração são en-sinadas de maneira divertida. A mais fa-mosa é o bolo da escola. Quem pode traz

Sup e r i o r, e o C e n t r o Ed u c ac i o n a l i n c e n t i v a a c a p ac i t a ç ã o c o n s t a n t e

Unicef/SViana

Crianças da escola Prof. José Negri, em Sertãozinho (SP), aprendem noções de frações preparando bolos

melhores praticas2 02/03/07 10:29 Page 57

Page 53: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

58 Desafios • março de 2007

P r á t i c a s i n ovado ras dependem mu i to pouco de r e cu r sos f i n ance i r o s

corredor, logo na entrada do Ciep, infor-ma a destinação do dinheiro. Os pais par-ticipam da Associação de Apoio à Escola(AAE), que se reúne bimestralmente.

Disseminação Práticas inovadoras depen-dem muito pouco de recursos financeiros.Sua força motriz está na criatividade e noenvolvimento de todos em torno de umamissão comum e compartilhada. Entre-tanto, reunir essas experiências num livro,como foi feito com o estudo “Aprova Brasil,o direito de aprender”, não basta. Entre oscompromissos assumidos pelo MEC e pe-lo Unicef está o de colaborar com o debatesobre a urgência para que a escola públicaconsolide suas boas práticas e que estas se-jam disseminadas para todos.As duas en-tidades também pretendem articular umaampla gama de parceiros para dar visibili-dade a essas e outras boas práticas já siste-matizadas e dar continuidade a esse estudoampliando o universo de pesquisa e apro-fundando os conceitos.“O livro em si já éum bom começo, pois é de fácil leitura.Faremos com que ele chegue a todas as es-colas e secretarias de Educação do país.Além disso, vamos organizar semináriosregionais sobre o Prova Brasil para debatercomo as informações reunidas por esseexame podem ser usadas pelas instânciaseducacionais.O estudo ‘Aprova Brasil,o di-reito de aprender’ também vai servir dereferência para que o MEC desenhe suaspolíticas daqui para a frente”, garante Rey-naldo Fernandes, presidente do Inep.

Apesar de todas essas boas intenções,Divonzir Gusso, pesquisador do Institutode Pesquisa Econômica Aplicada (Ipea), écético. “Hoje, não existe uma política dequalidade da educação no sentido de usarum repertório de boas soluções educa-cionais criadas pela própria sociedade. Adisseminação das experiências é complexa.Ou cria-se um incentivo de vontade pró-pria ou estimula-se por meio de políticas pú-blicas.”Como se vê,práticas simples podemfazer toda a diferença, mas pouco adiantase elas forem transformadas apenas em umlivro que embeleza a estante.

um bolo para a aula e todos se reúnem nopátio. A aula de matemática, temor demuitos, transforma-se numa grande con-fraternização entre alunos e professorescortando e comendo bolo.Os pais e pessoasda comunidade também são convidados.Jáem Ibema (PR),dança,teatro,jograis e poe-sias preenchem a Hora Cultural, um proje-to mensal desenvolvido pelos alunos da Es-cola Municipal Getúlio Vargas. Para fecharas atividades com chave de ouro, os estu-dantes apresentam-se para a comunidadeno espaço cultural da prefeitura.

Campeonato Para enfrentar as dificuldadesem leitura e escrita dos alunos, a EscolaMunicipal Leonor Mendes de Barros, emBarra do Chapéu (SP), desenvolveu o pro-jeto Poeta na Escola, que organiza oficinasde leitura e redação fora do horário deaula. As crianças são constantemente in-centivadas a levar livros para leitura emcasa e podem participar também do cam-peonato de leitura, durante o qual fazemuma resenha do livro que leram e apresen-tam aos colegas da turma. Na escola 1º deMaio, em Salvador (BA), crianças e ado-lescentes são estimulados a resgatar a his-tória de suas famílias e de sua comuni-dade. Os projetos Minhas Raízes, MinhaIdentidade e Resgatando Minha Identi-dade combinam conteúdos de português,matemática, história e ciências. Os estu-dantes exercitam a expressão escrita, no-ções de tempo, fatos históricos e noçõesde biologia para resgatar suas histórias efalar sobre racismo, preconceito, discrim-inação e identidade étnico-racial. Os pro-jetos terminam com a produção de umvídeo com o relato das crianças.

Na Escola Municipal Wanda GomesSoares,em Duque de Caxias (RJ),a partici-pação da comunidade é levada a sério. Lá,mães desempregadas se envolvem em ofici-nas de profissionalização que acontecemdentro da escola. O projeto, que foi batiza-do de Família na Escola,oferece oficinas deartesanato e confecção de tapetes.As mãestambém fabricam brinquedos pedagógi-cos, que podem ser levados para casa com

o objetivo de estimular o desenvolvimentodas crianças. Pais e professores reúnem-sebimestralmente; e os pais, escolhidos emvotação direta,ainda participam do conse-lho escolar. E, para driblar a escassez de re-cursos, o grêmio estudantil da Escola Es-tadual Inglês de Souza, em Charrua (RS),promove atividades para arrecadar fundospara projetos especiais da escola, como acompra de livros.As crianças e os adoles-centes têm acesso à escola no horário con-trário ao turno que estudam e nesse perío-do fazem seus trabalhos e também man-têm um grupo de dança. Os alunos quevivem na área rural do município usam oespaço da escola para almoçar e fazer astarefas de casa. Uma gestão transparentetambém é fundamental. No Ciep 279Professor Guiomar Gonçalves Neves, emTrajano de Morais (RJ), o conselho fiscalescolar acompanha a aplicação dos recur-sos destinados à escola. Um painel no

UNICEF/ Jlucini

Crianças aprendem a reconhecer e valorizar a

riqueza da fauna em escola na Amazônia

d

melhores praticas2 02/03/07 10:29 Page 58

Page 54: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

Desaf ios • março de 2007 59

D i v o n z i r G u s s oARTIGO

novar é como dançar; quem fica na beirado salão acha fáceis e leves as passadas evolteios. Complicado e pouco predizível épara quem se encoraja a inovar (ou dan-

çar). Até porque alguma pessoa pode imaginarser “novo” o que é apenas desconhecido por ela.

Especialmente nas escolas, onde as práticaspedagógicas e de gestão não foram enriquecidaspor acumulação histórica de experiências e conhe-cimentos, providências comezinhas podem pare-cer inovadoras.Até dão resultados.Talvez devidosmenos a elas do que ao entusiasmo e re-motivaçãoda comunidade escolar com sua descoberta.

Inovações, porém, tornaram-se algo muitoprestigioso e prometedor na vaga de mundia-lização econômica e cultural ao final do séculoXX. Sem condutas inovadoras seria impossível,às empresas, ganhar o céu da competitividade edas demandas dos consumidores. E, por exten-são, igualmente aos governos, também instadosa converter-se àquela fé, para dar conta da pro-visão de bens e serviços aos cidadãos.

Só que inovações em educação não são análo-gas às tecnológicas e organizacionais que fortale-cem as grandes corporações globais; nem às ino-vações sociais em senso estrito. Um reputadopesquisador francês, Cros, se indaga “se elas nãoseriam uma forma abastardada de uma e outradestas ou das duas ou ainda diferente”. Pois em-presta de cada qual alguns de seus componentessem chegar a somá-los. Chegam a parecer-se comas tecnológicas quando, malgrado um ambientetotalmente distinto, afetam o fazer educativo e aação profissional do mestre; assim como seme-lha inovação social ao mexer com as relaçõespedagógicas ou docentes/alunos, as relações como saber coletivo ou de sociabilidade dos alunos,com suas vacilações e ambigüidades.

Por isso, estimular vastos movimentos deinovações educacionais se mostra muito proble-mático.

Inglaterra, Chile, Nova Zelândia adotarampolíticas variadas de livre escolha das escolaspelas famílias, dando-lhes subsídios para pagaranuidades àquelas mais inovadoras e, pois, commelhor desempenho acadêmico e social.Acaba-

ram alargando as indesejadas disparidades e, aocabo, nem todo mundo saiu inovando para ga-nhar mais clientes (perdão, alunos!).

Atualmente, duas iniciativas se destacamdentre muitas nos Estados Unidos. Uma consisteno carro-chefe da política federal, o No Child LeftBehind, que estimula escolas com dificuldadesde desempenho para situar seus alunos num pa-drão desejado de qualidade educativa, receben-do, quando monitoradas, recursos adicionaispara inovar e melhorar seu trabalho (veja em

www.ed.gov/nclb).A segunda são as Charter,“es-colas públicas inovativas, sujeitas à escolha pelasfamílias e a maior cobrança de resultados”; po-dendo pais e patrocinadores controlar seu plane-jamento e desempenho mediante contrato (veja

em www.uscharterschools.org).Apesar de seu em-penho e de dispor de vultosos meios, tem sidodifícil manter a credibilidade desses programas,em face das críticas estampadas toda semana nagrande imprensa.

Malgrados os tropeços, algumas lições têm fi-cado das experiências dos últimos anos. Desdelogo, a de que tradição e rotina corroem a eficá-cia do ensino e a relevância social da escola. Porisso, as redes públicas de educação básica nãopodem permanecer à míngua de meios (huma-nos, técnicos e materiais) qualificados para man-ter um patamar mínimo decente de funciona-mento (como é comum no Brasil).

Sem esse mínimo, a comunidade escola difi-cilmente se entusiasma para inovar – seja partin-do de sua própria reflexão, seja dos avanços dasciências e das tecnologias, seja aprendendo comos outros –, mesmo quando acicatada pelas cres-centes queixas da sociedade.

Não por último, competências e conhecimen-tos legitimados precisam ser gerados e sistemati-camente disseminados para que haja mais ino-vação e menos “achismo” ou “achamentos”.

Inovar, como dançar, exige talento, empenhoe muito fôlego e animação.

Divonzir Gusso é pesquisador do Instituto de Pesquisa Econômica e Aplicada (Ipea)

...não é fácil, mas é indispensável

“Malgrados os

tropeços, algumas

lições têm ficado das

experiências dos

últimos anos. Desde

logo, a de que tradição

e rotina corroem

a eficácia do ensino

e a relevância social

da escola”

IDivu

lgaç

ão

Divonzir 02/03/07 10:31 Page 59

Page 55: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

60 Desafios • março de 2007

Após cinco anos de pesquisa, ci-entistas brasileiros e francesesidentificaram genes responsáveispela acumulação de açúcar nogrão de café, que, durante a torre-fação, libera aroma e sabor, alte-rando suas qualidades originais.Com isso, garantem estar mais pró-ximos da produção de uma bebidaperfeita. O trabalho, que envolve o

Centro de Cooperação Internacio-nal em Pesquisa Agronômica parao Desenvolvimento (Cirad), daFrança, e o Instituto Agrícola doParaná, do Brasil, visa agregarvalor ao produto, cujo preço nomercado internacional, atualmen-te, é inferior ao registrado háduas décadas, segundo a Interna-tional Coffee Organization.

Entrou em fase de testes um filmeplástico para embalagens feito àbase de amido de mandioca eaçúcares que é biodegradável ecomestível. Além disso, ele tempropriedades bactericidas e mu-da de cor de acordo com o esta-do de conservação de seu con-teúdo. Foi desenvolvido por CynthiaDitchfield, pesquisadora do Labo-ratório de Engenharia de Alimen-tos da Escola Politécnica da Uni-versidade de São Paulo (USP). Anotícia é muito boa. Segundo aAssociação Brasileira de Embala-gens, são reciclados apenas 16,5%dos cerca de 4 milhões de tonela-das de plástico consumidas anual-mente no Brasil.A estimativa paraa decomposição do material noambiente é cem anos e, em todo oplaneta, busca-se a criação deum polímero natural biodegra-dável. Mas a pesquisa brasileiravai mais adiante.A adição de cra-vo e canela, antimicrobianos na-turais, resulta em aumento da vi-da útil do produto embalado. Ex-tratos naturais de repolho roxo,uva e cereja, pigmentos que mu-dam de cor com o pH, indicam ograu de deterioração e oferecemsegurança ao consumidor.

Com cinzas de ossos bovinos, cau-lim e feldspato, o físico Ricardo Yo-shimitsu Miyahara, do Departamen-to de Engenharia Metalúrgica e deMateriais da Escola Politécnica daUniversidade de São Paulo (USP),produziu uma porcelana de ossosmais branca, leve e resistente doque a comum. O material, superiorao feito na Inglaterra desde o sécu-lo XVIII, pode ser utilizado na con-fecção de próteses odontológicas.Produzida também nos EUA e naChina, a porcelana de ossos temelevado custo de importação. Se-gundo o pesquisador, como o Brasilé grande criador de gado e temtradição na fabricação de produtoscerâmicos, poderá se tornar expor-tador da nova porcelana.

CIRCUITOciência&inovação

Pesquisa Andréa Wolffenbüttel Texto Eliana Simonetti

Novos materiais I

Embalagemplásticainteligente

Novos materiais II

Porcelana de osso

As eleições de 2008 terão uma no-vidade nos estados de Mato Grossodo Sul, Rondônia e Santa Catarina:urnas dotadas de um dispositivo deleitura que permite o reconhecimen-to do eleitor pela impressão digital.Os leitores biométricos foram colo-cados em 25.538 máquinas com-pradas para as eleições de 2006,mas não foram usados.Agora, paraviabilizar sua utilização, o TribunalSuperior Eleitoral (TSE) está ajus-tando o programa de seu banco dedados e fará o cadastramento dasimpressões digitais dos eleitoresdos três estados. É mais um avançonuma área em que o Brasil detémtecnologia de ponta. O sistema de-senvolvido aqui já foi transferidopara Argentina,Equador,Costa Rica,República Dominicana e México.

Voto tecnológico

Biometria nas urnas

O primeiro carro elétrico produzidono Centro de Pesquisa, Desenvolvi-mento e Montagem de Veículo Elétri-co, instalado na Usina Hidroelétricade Itaipu, em Foz do Iguaçu, no Pa-raná, será usado pela Eletrobrás nosJogos Pan-Americanos do Rio de Ja-neiro. O veículo tem autonomia de120 quilômetros e atinge velocidadede 130 quilômetros por hora.Agora,o desafio é melhorar a bateria, detecnologia européia, que demoraoito horas para ser carregada. Atédezembro, o centro testará outros

dezesseis modelos.A intenção inicialé produzir nos próximos cinco anosveículos comercialmente competi-tivos com componentes nacionaisque atendam à demanda das com-panhias de energia interessadas emreduzir as despesas com combustí-vel. O motor está sendo desenvolvi-do pela empresa catarinense Weg.Alinha de montagem, implantada pelaFiat, fica num galpão de 2,2 mil me-tros quadrados dentro das instala-ções de Itaipu e, a princípio, deveráempregar doze pessoas.

Carro elétrico

Modelo nacional estará no Pan

Genética

Mais perto do café perfeito

Embrapa

Circuito#32 02/03/07 10:32 Page 60

Page 56: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

Desaf ios • março de 2007 61

US$ 18,5 bilhões

Essa deverá ser a quantia investida noBrasil em tecnologia dainfomação (TI) durante2007, segundo projeçõesda IDC, consultoria especializada em TI e telecomunicações.O valor é 14,5% superiorao registrado em 2006.

Até o final do ano, Cascavel, cida-de a 500 quilômetros de Curitiba,vai ganhar um novo laboratório depesquisas. A missão dos estudio-sos será descobrir fungos queprovocam doenças em insetos, pa-ra combater as pragas das plan-tações. Os principais clientes se-rão os pequenos agricultores or-gânicos e agroecológicos do oes-te do Paraná, que não utilizamagrotóxicos.A produção dos fungospara controle biológico – de baixoimpacto ambiental – será coorde-nada pela Universidade Estadualdo Oeste do Paraná (Unioeste)com tecnologia semelhante à apli-cada em São Paulo, onde o arroz éutilizado para o cultivo dos micror-ganismos. A equipe da Unioeste,que já utiliza insetos para o con-trole de lagartas e percevejos nocampus localizado na cidade deMarechal Cândido Rondon, pre-tende também ampliar as pesqui-sas para a produção da bactériaBacillus thuringiensies, cujas va-riedades podem atacar o pernilon-go urbano.

Agricultura

Natureza contranatureza

Pelas previsões da Comissão deAperfeiçoamento de Pessoal deNível Superior (Capes), em breve aAlemanha será a principal baseacadêmica do Brasil na Europa.Atualmente,o país é o terceiro prin-cipal destino de brasileiros que es-tudam no exterior. Os mais pro-curados são os Estados Unidos e aFrança. Segundo o Serviço Alemãode Intercâmbio Acadêmico (Daad),a cooperação acadêmica entre osdois países dobrou em uma década.Entre 1993 e 2003,o número anualde brasileiros participando de pro-gramas de intercâmbio universitá-rio na Alemanha passou de 426para 900 – alta de 111%. No mes-mo período, a elevação do númeroanual de alemães que fizeram par-te de seus estudos ou pesquisas noBrasil foi ainda maior, de 170%.AUniversidade de São Paulo (USP) éa líder em benefícios recebidos doDaad, que oferece bolsas a 52 ins-tituições públicas brasileiras, entreas quais 31 universidades federais,doze estaduais, quatro tecnológicase cinco centros de pesquisa; alémde 27 instituições particulares deensino e pesquisa.

Pesquisa II

Alemanhaencosta na França

Um estudo realizado pela SchneiderKreuznach,empresa alemã especiali-zada em componentes óticos,confir-ma a tendência de os telefones celu-lares substituírem as câmaras digi-tais.A pesquisa sobre padrões de usode câmaras digitais e aparelhos ce-lulares envolveu cerca de 1.000pessoas na Alemanha, na China, naÍndia e nos Estados Unidos.Um quar-to dos entrevistados afirmou que usariaapenas o telefone celular para tirarfotos se a qualidade fosse igual ou

superior à das câmaras atuais depreço médio. Apenas 32% dão pre-ferência à câmara digital.Na Índia ena China, mais da metade dos entre-vistados tira fotos com seu celularvárias vezes por semana.O efeito dasdescobertas foi imediato: os fabri-cantes de telefone celular já estãocriando modelos que fotografam comresolução maior e têm melhores sis-temas de lente. O estudo está dispo-nível em www.schneiderkreuznach.com/pdf/mobil_phone_study.pdf.

Celular

Olha o passarinho!

O número de doutores brasileirostem crescido à taxa anual de 12%.Em 2006, 10 mil acadêmicos com-pletaram o doutorado. Mas, segundoespecialistas da Coordenação deAperfeiçoamento de Pessoal de NívelSuperior (Capes), para promover odesenvolvimento e aumentar a com-petitividade é preciso mais:16 mil tí-tulos por ano. Além disso, é neces-sário uma correção de rota.A maiorparte dos doutores trabalha no meioacadêmico ou obtém bolsas de pós-doutorado e desenvolvimento cientí-fico oferecidas pelo Conselho Na-cional de Desenvolvimento Científicoe Tecnológico (CNPq), pela Capes epor outras fundações estaduais. As

indústrias deveriam aproveitar osprofissionais para evitar, por exem-plo, que por falta de tecnologia oBrasil, maior exportador de suco delaranja do mundo, seja obrigado aimportar ácido cítrico, um dos prin-cipais componentes de sua produ-ção. Não faltam instrumentos quefuncionam como abre-alas para o in-vestimento industrial em pesquisa.Entre eles estão a Política Industrial,Tecnológica e de Comércio Exterior(Pitce), a Lei de Inovação e auxíliosoferecidos pelo Banco Nacional deDesenvolvimento Econômico e Social(BNDES) e pela Financiadora de Es-tudos e Projetos (Finep).Só faltam osempresários entrarem na passarela.

Pesquisa I

Mercado para doutores

TheNewsMarket

Intercâmbio

Brasil-Alemanha(evolução registrada em

26 programas de intercâmbio)

Fonte: DAAD Rio

Brasileiros na Alemanha

Alemães no Brasil

1993

2003

1993

2003

426

900

304

820

Circuito#32 02/03/07 10:33 Page 61

Page 57: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

editora Saraiva precisa corrigir aficha catalográfica desse livro,pois ela registra “negócios”, não“negociações internacionais”, co-

mo seria o certo. No mais, trata-se de umaobra correta: indispensável, mesmo, emmuitos cursos de graduação em relações in-ternacionais (talvez alguns de pós tam-bém), que costumam servir aos alunosuma mistura de antiglobalização com pre-conceitos contra o livre comércio. Escritopor um diplomata e um pesquisador aca-dêmico, o livro combina méritos inegáveisnos dois campos em que ele pode ser con-siderado excelente: a reconstituição sintéti-ca da evolução histórica do comércio inter-nacional, do mercantilismo à globalização;seguida de uma exposição igualmente bre-ve, mas adequada, das teorias sobre o co-mércio internacional. Pena que essa partese encerre por um capítulo solitário de “in-trodução às negociações internacionais”.Aúltima parte tenta substituir esse vastocampo tratando do processo decisório empolítica comercial, mas seus dois capítulossão desiguais e algo insatisfatórios.

O filet mignon do livro está no trechosobre “política comercial brasileira”, apesarde restrita por se ater basicamente às ex-periências do Mercosul, da Alca, da Orga-

nização Mundial do Comércio e de outrasnegociações.Essa parte é relevante,mas umpouco dependente de matérias de jornais,de comunicados de chancelarias e de arti-gos de revistas. Os autores citam casos con-cretos que ilustram a política comercialpraticada pelo Brasil, mas o conjunto dá aimpressão de uma assemblagem heterócli-ta de episódios conjunturais ilustrativos dateoria, antes que uma análise sistemática daessência e da prática da política comercial.

Essa parte demonstra, também, quemesmo autores experientes no tratamentode questões internacionais podem incorrerem postura enviesada na avaliação do mé-rito relativo de políticas comerciais con-cretas.Em perspectiva implicitamente com-parativa em relação às posturas adotadas,respectivamente,pelo Mercosul e pelo Chi-le – membro associado do bloco desde 1996e cortejado,desde sempre,para um “ingres-so pleno” –, os autores revelam visão invo-luntariamente introvertida, ou “mercosu-liana”,dessas relações.Eles acham,por exem-plo, que a aceitação pelo Chile de um acor-do de livre comércio com os Estados Uni-dos “distanciou, ainda mais, do ponto devista político,o Chile do Mercosul”(p.324),como se a política comercial do Mercosulfosse o paradigma pelo qual devessem ser

julgadas as políticas comerciais de outrospaíses. Do ponto de vista estritamenteeconômico,parece bem mais racional a “en-trada”do Mercosul no Chile do que o inver-so,observados o coeficiente de abertura ex-terna e as duas dúzias de acordos de livrecomércio já concretizados pelo país andino.

Diversas passagens revelam ambigüi-dade no pensamento dos autores, como é ocaso da teoria das vantagens comparativas.Eles acham que “o livre comércio foi umaideologia nascida na Grã-Bretanha que foidecisiva para a abertura de mercados exter-nos para os produtos industrializados bri-tânicos” (p. 180), esquecendo-se de que aabolição das “leis dos cereais” se deu comvistas ao abastecimento do mercado inter-no daquele reino em produtos importados.

No cômputo global, porém, e levando-se em conta a pobreza da bibliografia nessaárea, o livro de Serapião e Magnoli preen-che de modo satisfatório a necessidade deatualização da literatura e de discussão bemembasada dos principais problemas ligadosao comércio internacional para os cursospertinentes (relações internacionais,econo-mia e administração, quando não os deciência política ou ciências sociais aplicadas,de modo geral). Numa próxima edição,sugere-se que os autores eliminem o caráterde “assemblagem” de matérias de jornais,sistematizem e uniformizem sua reflexãosobre todos os pontos tratados e produzamum verdadeiro textbook acadêmico sobrepolíticas e negociações comerciais.

Paulo Roberto de Almeida

Comércio e diplomacia:

história e atualidade

Comércio Exterior e NegociaçõesInternacionais:Teoria e PráticaDemétrio Magnoli e Carlos Serapião Jr.Ed. Saraiva, 2006, 378 p., R$ 79,00

A

62 Desafios • março de 2007

ESTANTElivros e publicações

Estante 02/03/07 10:34 Page 62

Page 58: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

ssa obra não deveria figurar nas es-tantes de negócios ou de adminis-tração, e sim nas de livros de terror.A lista de horrores nele descrita, da

qual deriva nosso baixo crescimento,não dámargem a dúvidas.

São catorze capítulos, todos contendo apalavra “custo” no enunciado, e um últimocapítulo sobre as boas práticas (de outros paí-ses, of course).O autor deixou de mencionarum 15.º custo,que,para ele,todavia,é lucro:o fato de tantas pessoas, entre economistas,professores e jornalistas, terem de ocupar-sede questões como essas, males auto-infligi-dos, problemas criados para infernizar a vi-da empresarial e convertê-la numa atividadea um só tempo heróica e temerária.

Não por outra razão tantos brasileirospreferem, à saga insana de começar a vidacomo empreendedores, prestar concursopara algum cargo público,qualquer um.É ohobby preferido de 95% de meus alunos degraduação e de pós,uma atitude,na verdade,perfeitamente racional: por que iriam elesenfrentar a selva de dificuldades burocráti-cas, quando é tão mais fácil triunfar na vidagozando da estabilidade e da tranqüilidadede um emprego público?

Certamente, o Estado tem muito a vercom a lista demoníaca de custos identifica-dos por Roth: tributação, infra-estruturaprecária, corrupção, burocracia, informa-lidade, custo do capital, morosidade legisla-tiva, lentidão judiciária, educação deficien-te, falta de políticas setoriais, ineficiênciageral das instituições e vários outros malesque são essencialmente made in Brazil,mantidos pela nossa incapacidade em fazerreformas. Apenas sobre o primeiro doscustos, o autor lista nada menos do que 76tributos federais, doze estaduais, quinzemunicipais, além de cinco outros “latentes”,isto é, que podem vir a ser implementados,num total de 109 impostos, taxas e contri-buições, sem contar pedágios e cobrançaspor serviços específicos.

Os escandinavos,mais tosquiados do queos brasileiros, nunca acrescentaram ao pesoimpositivo a burrice das obrigações de-

claratórias, que constituem outra forma detortura.O Brasil é hors concours nesse tipo debobagem,ainda mais irracional na era da tec-nologia das informações. Mas deixemos delado o desfile de horrores. Melhor consultaro benchmark de experiências bem-sucedidasdescritas no último capítulo.

Como diz o autor, o foco dos problemasabordados no livro “está relacionado com apresença do governo na vida do cidadão eno ambiente de negócios” (p. 171). As re-comendações são simples e já foram feitasinúmeras vezes: fazer, pela Internet, abertu-ra de empresas, compras governamentais erecolhimento unificado de impostos, fixarprazos para as ações do governo (e de seusresponsáveis), reduzir o custo da mão-de-obra (principal fator de informalidade). Osmaiores obstáculos ao crescimento, porém,estão nas enormes despesas públicas, e aconseqüente carga fiscal desmesurada,o queexigiria tratamento imediato, e na baixaqualificação educacional da população,cuja solução demandará mais tempo. Tudoisso é bem conhecido de todos nós. Parececlaro que a classe política não está à altura desuas responsabilidades.Talvez com livros co-mo esse a sociedade se conscientize de vezque estamos atirando todos os dias em nos-sos próprios pés...

Paulo Roberto de Almeida

A arte de atirar nos próprios pés

Cidade mágica

hega às livrarias brasileiras o es-plêndido Salônica,do britânicoMark Mazower, obra que recu-pera a memória de uma das ci-

dades mais fascinantes do Mediterrâneo,carrefour entre a Grécia clássica, cristã eateniense, e a Grécia antiga, varrida domapa com a muçulmanização do impé-rio bizantino. Salônica foi durante sécu-los o entroncamento natural entre a Eu-ropa, a África e a Ásia, e porto seguropara milhares de judeus que conseguiamescapar, entre os séculos XV e XVI, dasperseguições na Península Ibérica. Olivro recupera o período histórico quevai de 1430, ano da conquista islâmicaotomana da metrópole, a 1923, quandofoi reintegrada à Grécia. Salônica, nosséculos abordados por Marzower,emer-ge como uma cidade cosmopolita, naqual judeus,cristãos e muçulmanos con-viveram em relativa harmonia. DessaSalônica mágica descrita por Marzowerveio a família de um dos campeões deaudiência da televisão brasileira, SilvioSantos, nome artístico de Senor Abra-vanel.A família do homem do Baú, for-mada por notáveis rabinos da espanho-la Toledo, refugiou-se em Salônica du-rante a Inquisição. Único senão à versãobrasileira é a própria edição, que aquiganhou uma capa confusa e pobre.

Albino Castro

Por Que Não Crescemos como Outros Países?: Custo BrasilJoão Luiz RothEd. Saraiva, 2006, 194 p., R$ 31,00

Salônica, Cidade de FantasmasMark Mazover Companhia das Letras, 2007, 582 p., R$ 68,00

E

C

Desaf ios • março de 2007 63

Estante 02/03/07 10:35 Page 63

Page 59: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

Tem mais dinheiro para o setor privado

Empréstimos realizados pelo sistema financeiro em 2006 (R$ bilhões)

Distribuição dos

empréstimos realizados pelo

setor financeiro em 2006

Distribuição dos

empréstimos concedidos ao

setor privado em 2006

Crédito

INDICADORES

p o r A n d r é a

W o l f f e n b ü t t e l

64 Desafios • março de 2007

A expressão união aduaneira simbolizauma associação de um grupo de paísesque se caracteriza por dois pontos: aadoção de uma tarifa externa comum e alivre circulação das mercadorias oriundasdos países associados.A implantação de uma Tarifa Externa Comum, conhecidacomo TEC, quer dizer que todos os paísesdo grupo aplicarão a mesma taxação emrelação à importação de bens de paísesfora do grupo. Essa TEC vai eliminar aconcorrência entre os associados juntoaos fornecedores. O Mercosul, formadopor Brasil,Argentina, Paraguai e Uruguai,adotou a TEC em 1995. Isso implica,por exemplo, que o Brasil não podedecidir sozinho reduzir a taxação sobredeterminado produto que ele compra daChina em troca de algum benefício nomercado chinês. Para mudar a taxa, épreciso fazer um acordo com todos osquatro países-membros, que tambémreduzirão suas tarifas, ou seja, é precisonegociar em bloco.A segundacaracterística da união aduaneira é a formação de uma zona de livrecirculação de mercadorias entre osdiversos membros. No caso do Mercosul,essa segunda medida ainda não foiadotada. Os produtos argentinos, paraguaiose uruguaios têm salvaguardas para entrarno Brasil, e vice-versa. Por isso, o Mercosulé considerado uma união aduaneiraimperfeita. Dois exemplos de uniõesaduaneiras completas são a União Européiae a Southern África Customs Union (Sacu, União Alfandegária do Sul da África),bloco liderado pela África do Sul.

O que é?

União aduaneira

Durante o mês de fevereiro, quase todas as atenções se voltaram para a análise do Plano de Acele-ração do Crescimento (PAC), anunciado pelo governo federal. Uma das ferramentas básicas paraaquecer a economia é a concessão de crédito. No Brasil, os valores emprestados pelo sistema finan-ceiro têm aumentado significativamente, mas, se comparados com o valor do PIB, a curva muda deinclinação.Ao lado são apresentados oito gráficos mostrando o comportamento dos empréstimos nosúltimos doze anos. É fácil perceber que nesse período a fatia destinada ao setor privado aumentoubastante,enquanto a do setor público encolheu.Dentro da atividade privada,a indústria é a que recebemais crédito, porém o setor de serviços vem aumentando bem o seu quinhão. Já os empréstimos con-cedidos para habitação diminuíram tanto em valor como em participação no PIB. Confira os valores.

7.975,4

7.735,9

1.768,6

1.297,7

851,9

850,7

392,8

Total

Setor privado

Indústria

Serviços

Comércio

Rural

Habitação

Setor público 239,5

97%

8%

34%

25%

17%

16%3%

Setor público Setor privado Indústria Serviços Comércio Rural Habitação

Indicadores#32 02/03/07 10:37 Page 64

Page 60: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

32,5

Desaf ios • março de 2007 65

Em % do PIB Em bilhões de reais

Empréstimos ao comércio

1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Comparando 2006 com 1995 O valor cresceu 154% A participação no PIB caiu 23,4%

Comparando 2006 com 1995 O valor cresceu 200,7% A participação no PIB caiu 9,9%

Repare: Em termos de participação no PIB, o total de empréstimos caiu de 1995 a 2003, quando atingiuseu menor valor (24,9%).A partir daí, começou a se recuperar

Empréstimos ao setor privado

1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Comparando 2006 com 1995 O valor cresceu 242,5% A participação no PIB cresceu 28,8%

Repare: Os empréstimos ao setor privado foram os que registraram maior crescimento em relação àparticipação no PIB

Empréstimos ao setor de serviços

1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Comparando 2006 com 1995 O valor cresceu 309,8% A participação no PIB cresceu 23,1%

Repare:Acompanhando o crescimento de sua importância na economia, o setor de serviços foi o queregistrou o maior aumento percentual nos valores dos empréstimos

Empréstimos ao setor público

1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Empréstimos ao setor rural

1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Comparando 2006 com 1995 O valor cresceu 241,8% A participação no PIB cresceu 2,7%

Empréstimos à indústria

1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

Empréstimos para habitação

1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

36,1

Empréstimos totais

1995 1996 1997 1998 1999 2000 2001 2002 2003 2004 2005 2006

33,031,7

29,3 28,3 27,7 27,826,3

24,9

29,0

26,1

2,6522,966 3,262 3,223

3,4263,662

4,0534,321

4,732

5,471

7,975

6,586 16,014,7 14,1 13,8 13,7 14,2

17,3 16,9

15,1 16,0

18,1

20,7

2,2582,471 2,665

2,935 3,1643,450

3,8754,198

45,61

5,254

6,349

7,736

5,4

394

5,5

5,7

2,62,2

1,61,2 0,8 0,9 1,1 1,0 1,0

495

597

287261

212177

123170

216 237 239

Comparando 2006 com 1995 O valor caiu 39,2% A participação no PIB caiu 81,7%

Repare: O setor público foi o que registrou maiores perdas no período

8,4

7,77,3

7,78,2

7,37,9 7,9

7,2

6,9

6,9 7,2

619690 749

845989 965

1,149

1,298 1,3711,439

1,5681,769

Comparando 2006 com 1995 O valor cresceu 185,6% A participação no PIB caiu 14,5%

590

4,6

4,2

3,33,0

2,7 2,6

2,9 2,8

2,6

2,83,1

3,5

335374 342

328 324 342

420460

852

487

589

714

4,3

3,93,5 3,7 3,7

3,8

4,5 4,6 4,3

4,44,6

5,3

317 350 363411 440

506

655761

918

1,040

1,298

812

3,4

2,8

2,42,6

2,5 2,52,2 2,2

2,6

2,93,2

3,5

249 251 248289

299 323 324358

492

614

724

851

7,36,5

5,8 5,75,4 5,2

3,0

1,8 1,6 1,4 1,5 1,6

536579

624 649688

431

288 295 303326

393

Comparando 2006 com 1995 O valor caiu 26,8% A participação no PIB caiu 78,1%

Repare: Os empréstimos para habitação junto com os empréstimos ao setor público são os únicos queregistraram variação negativa tanto em valor como em participação no PIBFonte: Banco Central

97

Indicadores#32 02/03/07 10:38 Page 65

Page 61: Capa 32 05/03/07 14:28 Page 1 desafiosrepositorio.ipea.gov.br/bitstream/11058/6968/1/...à captação de órgãos, o que faz com que preciosas oportunidades sejam perdidas. Também

Gostaria de manifestar minha sur-presa ao ler a reportagem “Cabode guerra” (Desafios nº 29, de-zembro/2006), sobre a questão dolicenciamento ambiental. Para areportagem (e alguns dos entre-vistados), a necessidade de ade-quação ambiental e participaçãopopular nos processos de tomadade decisão ambiental são entraves.Surpreende, pois não esperava queo Ipea (por meio da revista De-safios do Desenvolvimento, daqual sou assinante) tratasse asquestões ambientais como entra-ve, retomando uma visão pré-Rio/92 sobre o assunto. Tambémjamais esperava que a possibili-dade de a população se manifestarnos processos de licenciamentoambiental fosse considerada umentrave. Adequação ambiental écondicionante de todas as ativi-dades (públicas e privadas) e aparticipação popular (diretamen-te ou por meio do Poder Judiciá-rio) é democracia direta sendo co-locada em prática.Acerta a repor-tagem ao destacar a necessidadede desburocratização do procedi-mento de concessão das licenças.Burocracia excessiva é, sim, umentrave que deve ser resolvido,mas que não justifica a reduçãodas exigências ambientais. Me sur-

preende uma revista tão progres-sista (no bom sentido) retomar al-gumas das idéias de crescimento aqualquer custo e de democraciaautoritária.

Leonardo Zagonel SerafiniCuritiba - PR

Prezado Leonel, o intuito da repor-tagem não era considerar como en-traves a adequação ambiental dosprojetos nem a participação popu-lar. O objetivo foi mostrar que esta-mos falhando na hora de conciliarproteção do meio ambiente com es-tímulo ao desenvolvimento. Claroque se trata de uma questão delica-da, mas a matéria procurou apre-sentar diferentes pontos de vista,constatando que todos têm parcelade razão. E, sobretudo, concluindoque existe carência de recursos hu-manos e materiais para atender ademanda de emissões de licenças.

Primeiramente quero parabenizá-los pela ótima reportagem, pelacompetência em adquirir as infor-mações e finalmente pela diagra-mação da matéria “Fábrica de sons”(Desafios nº 30, janeiro2007).Adorei o texto e acho,sinceramente,que uma cópia deveria ser não so-mente enviada, mas “lida” pelosnossos ministros Gilberto Gil e LuizFernando Furlan, além do própriopresidente Lula e do ministro CiroGomes.Acho que os sensibilizariapara melhorar as condições dos in-centivos e estímulos para o apren-dizado musical no Brasil.

Juliano DinizEmpresário

Franco da Rocha - SP

Considero oportuna a inclusão nosite de Desafios de um link suge-rindo o encaminhamento a algum

amigo. Isso aumentaria muito adivulgação da revista.

Cláudio MachadoRecife - PE

Prezado Cláudio, agradecemos asugestão e vamos implementá-la.

Gostaria de informar que recebi oexemplar do mês de janeiro de2007 e estou muito satisfeita como conteúdo da revista. Parabéns!

Darlyne Fontes VirginioNatal - RN

Pertenço a uma ONG que traba-lha com pequenos agricultores,moradores do campo, em regiõesdistantes do progresso. Eles nãotêm luz nem energia elétrica, e eugostaria de ajudá-los. Para tanto,preciso obter mais informaçõessobre o sistema de eletrificação ru-ral apresentado na reportagem“Uma idéia luminosa” (Desafiosnº 31, fevereiro/2007).

Boris RamosViña del Mar - Chile

Caro Boris, o meio mais fácil deconseguir as informações solicita-das é entrando em contato com aONG Instituto para o Desenvol-vimento de Energias Alternativas eda Auto-Sustentabilidade (Ideaas),fundada pelo engenheiro FabioRosa. O endereço da instituição naInternet é www.ideaas.org.br.

Com todo o respeito, discordodessa idéia de taxar carros pelo fa-

to de que muitos problemas sãocausados por eles. Já pago o sufi-ciente em impostos e vocês aindaquerem criar mais uma despesapara a combalida receita da classemédia? Meu carro é um simplesFiat Uno 1.0, não é muito polu-ente, utiliza álcool/gasolina e só outilizo nos fins de semana. Logo,como podem constatar, já limitoseu uso conscientemente. Nãodêem idéias a governantes ladrõespara que eles possam, nos rouban-do, roubarem mais ainda, aumen-tando, inclusive, o próprio salário.

Robermar Ferreira VieiraRio de Janeiro - RJ

Caro Robemar, a reportagem sobreo pedágio urbano (Desafios nº 31,fevereiro/2007) foi feita em busca dealguma solução para os engarrafa-mentos que infernizam a vida dosmotoristas das grandes cidades. Po-rém, no seu caso, queremos infor-má-lo que não terá de pagar pedá-gio algum, já que o sistema seria ins-tituído apenas em algumas regiões e,certamente, somente nos dias úteis.Portanto, parabéns pelo uso cons-ciente do carro e fique tranqüilo queseus gastos não aumentarão porcausa do pedágio urbano.

Gostei muito da entrevista com odr. Ciro de Quadros (Desafios nº31, fevereiro/2007). É bom saberque existem brasileiros espalhadospelo mundo fazendo coisas tãoimportantes para a ciência e paraa humanidade.

Marisa Mendes Farmacêutica

São Paulo - SP

CARTAS A correspondênc i a para a redação deve se r env i ada para car tas@desaf i os .o rg .b r

ou para SBS Quadra 01 - Ed i f í c io BNDES - Sa la 801 - CEP: 70076-900 - Bras í l i a DF

Repr

oduç

ão

66 Desafios • março de 2007

Acesse o conteúdo da revista Desaf ios do Desenvolvimento no endereço:

www.desafios.org.br

cartas 02/03/07 10:39 Page 66