Ascensão e Queda Do Terceiro Reich Livro 2

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Shirer era um jornalista durão, um apurador nato. Portanto,Ascensão e queda do Terceiro Reich não poderia se resumir a suasmemórias. Assim que a Segunda Guerra acabou, em 1945, elevoltou "àquele outrora orgulhoso país". Foi um dos primeiros ase embrenhar e a sair com um relato coerente das montanhas dedocumentos produzidos pela zelosa burocracia nazista, inclusivediários de alguns de seus lideres. Muitos historiadores profissionaisnunca o perdoaram pelo "furo". Seu livro, porém, nem carecede rigor nem padece de sensacionalismo. É a narração objetiva,embora às vezes chocada, do seu título.Foi escrito nos anos 1950, durante o período que Shirer

Transcript of Ascensão e Queda Do Terceiro Reich Livro 2

  • Para um sujeito cego de um olho, William L. Shirer no se saiu

    nada mal como testemunha ocular da Histria. Ele nasceu em

    Chicago, em 1904. Aos 21 anos, j estava trabalhando como

    reprter na Europa. De quebra, acompanhou as andanas de

    Gandhi pela ndia entre 1930 e 1931. Aos 28 anos, perdeu a

    vista num acidente de esqui nos Alpes. Quando Hitler assumiu o

    poder, em 1933, Shirer estava de olho nele. E quando o ditador

    anexou a ustria, em 1938, j estava a postos em Viena. Depois,

    como correspondente em Berlim, acompanhou as tropas alems

    que avanaram fulminantemente pela Frana. Esteve presente

    rendio em Compigne. S deixou a Alemanha em 1940.

    Shirer era um jornalista duro, um apurador nato. Portanto,

    Ascenso e queda do Terceiro Reich no poderia se resumir a

    suas memrias. Assim que a Segunda Guerra acabou, em 1945,

    ele voltou "quele outrora orgulhoso pas". Foi um dos primeiros

    a se embrenhar e a sair com um relato coerente das montanhas

    de documentos produzidos pela zelosa burocracia nazista,

    inclusive dirios de alguns de seus lderes. Muitos historiadores

    profissionais nunca o perdoaram pelo "furo". Seu livro, porm,

    nem carece de rigor nem padece de sensacionalismo. a

    narrao objetiva, embora s vezes chocada, do seu ttulo.

    Foi escrito nos anos 1950, durante o perodo que Shirer amargou

    longe das redaes pela suspeita macarthista de ser comunista,

    e publicado em 1960. Logo tornou-se uma espcie de obra

    cannica sobre o Terceiro Reich, um relato minucioso sobre os

    delrios de grandeza que o engendraram e sobre a devastao

    que ele ocasionou e sofreu. A dureza do autor com a Alemanha

    manteve-se at o final de sua vida. Shirer morreu em 1993.

    Arthnr Danipvp

  • Ascenso e queda do Terceiro Reich

    O comeo do fim (1939-1945)

    William L. Shirer

    TRADUO

    Pedro Pomar eLenidas Gontijo de Carvalho

    Volume II

    Ia reimpresso

    AA g i r

  • Ttulo originalThe Rise and Fali ofthe Third ReichCopyright 1961, renewed 1989 by William L. ShirerCopyright da traduo Agir Editora Ltda., 2008

    CapaAngelo Venosa

    Imagem de capa Hulton Archive/Getty Images

    Copidesque Lo Schlafman

    Reviso Rebeca Martins Vincius Trindade Mareia Glenadel

    Produo editorial Mara Alves

    CIP-BRASIL. CATALOGAO-NA-FONTE

    SINDICATO NACIONAL DOS EDITORES DE LIVROS, RJ.

    S56a Shirer, William L. (William Lawrence), 1904-1993v.2 Ascenso e queda do Terceiro Reich, volume II: o comeo do fim

    (1933-1939)/William L. Shirer; [traduo de Pedro Pomar e Lenidas Gontijo de Carvalho] - Rio de Janeiro: Agir, 2008.

    Traduo de: lhe Rise and Fali of the Third Reich Inclui bibliografia ISBN 978-85-220-0912-1

    1. Hitler, Adolf, 1889-1945.2. Alemanha - Histria - 1933-1945.I. Ttulo.

    08-0002. CDD: 943.086CDU: 94(43)1933/1945

    Todos os direitos reservados Agir Editora Ltda. - uma empresa Ediouro Publicaes S.A.

    Rua Nova Jerusalm, 345 - Bonsucesso Rio de Janeiro - RJ - CEP 21042-235 Tel: (21) 3882-8200 Fax: (21) 3882-8212/8313 www.ediouro.com.br

  • Sumrio

    9 Nota do editor

    11 Prefcio

    I. A g u e r r a : p r i m e i r a s v i t r i a s e o m o m e n t o d e c i s i v o 19 c a p t u l o 1 . A queda da Polnia30 c a p t u l o 2. Sitzkrieg na frente ocidental 84 c a p t u l o 3 . A conquista da Dinamarca e da Noruega

    136 c a p t u l o 4. Vitria no Ocidente195 c a p t u l o 5. Operao Leo do Mar: a malograda invaso

    da Inglaterra 241 c a p t u l o 6. Barbarossa: a vez da Rssia 320 c a p t u l o 7. A reviravolta 344 c a p t u l o 8. A vez dos Estados Unidos 388 c a p t u l o 9. 0 grande momento decisivo: 1942 Stalingrado e

    El Alamein

    II. O c o m e o d o fim431 c a p t u l o 1 . A Nova Ordem 507 c a p t u l o 2. A queda de Mussolini 531 c a p t u l o 3. Invaso da Europa Ocidental pelos Aliados e

    tentativas de matar Hitler

    III. A q u e d a d o T e r c e i r o R e i c h 623 c a p t u l o 1 . A conquista da Alemanha652 c a p t u l o 2. Gtterdmmerung: os ltimos dias do Terceiro Reich

    699 Notas719 Bibliografia733 Agradecimentos737 ndice

    765 Sobre o autor

  • Sinto, no raro, profunda tristeza ao pensar no povo alemo, to estimvel como indivduo e to infortunado na generalidade...

    G o e t h e

    Hitler foi o destino da Alemanha, e esse destino no podia ser evitado.Wa lt er von Br a u c h it sc h

    Marechal-de-campo Comandante-em-chefe do exrcito alemo

    Mil anos passaro, e a culpa da Alemanha no ser apagada.H ans F ra n k

    Governador-geral da Polnia, pouco antes de ser enforcado em Nuremberg

    Os que no se lembram do passado esto condenados a reviv-lo.Santayana

  • Nota do editor

    Publicado pela primeira vez nos Estados Unidos em 1960, Ascenso e queda do Terceiro Reich contava mais de mil pginas em volume nico. Dois anos depois, ganhou edio brasileira, reorganizada em quatro tomos. Para esta nova verso, a Agir optou por dividir a obra em dois volumes, delimitados por um corte cronolgico.

    Nesta lgica, Triunfo e consolidao (1933-1939) registra as origens histricas e sociais do nazismo, a tomada de poder na Alemanha por Adolf Hitler e as ante- vsperas da Segunda Guerra Mundial. O comeo do fim (1939-1945) narra, por sua vez, o conflito blico mundial desde o avano inicial do nazismo sobre a Europa at o fracasso e o conseqente colapso do Terceiro Reich. As seis sees que Shirer designou originalmente como livros tiveram estrutura e ttulo mantidos e foram renumeradas dentro da lgica de cada volume.

    Preserva-se assim o contedo integral do clssico de Shirer, dividido em dois volumes que, apesar de evidentemente complementares, podem ser lidos de forma autnoma.

  • Prefcio

    Embora eu tenha vivido e trabalhado no Terceiro Reich durante a primeira metade de sua breve existncia, observando diretamente Adolf Hitler consolidar seu poder ditatorial sobre a grande mas desconcertante nao, e depois conduzi- la guerra e conquista, esta experincia pessoal no me levaria a escrever o presente livro, se no ocorresse, no fim da Segunda Guerra Mundial, um acontecimento nico na Histria.

    Esse acontecimento foi a captura de quase todos os arquivos confidenciais do governo alemo e de todos os seus departamentos, incluindo os do Ministrio do Exterior, do exrcito e da marinha, do Partido Nacional-Socialista e da polcia secreta de Himmler. Antes, creio eu, jamais to vasto tesouro caiu nas mos de historiadores contemporneos. At ento, os arquivos de um grande Estado, mesmo quando era derrotado na guerra e seu governo deposto por uma revoluo, como ocorreu na Alemanha e na Rssia, em 1918, eram preservados, e somente os documentos que serviam aos interesses do regime dominante subseqente eram posteriormente publicados.

    O rpido colapso do Terceiro Reich, na primavera de 1945, resultou na captura no apenas de enorme quantidade de documentos secretos mas tambm de outros materiais de inestimvel valor, tais como dirios ntimos, discursos altamente secretos, relatrios de conferncias, correspondncia, e at mesmo reprodues de conversas telefnicas entre os chefes nazistas, registradas por um corpo especial de funcionrios criados por Hermann Gring no Ministrio da Aeronutica.

    O general Franz Halder, por exemplo, conservava um volumoso dirio, em que anotava, em taquigrafia Gabelsberger, no somente o que ocorria dia a dia mas o que se verificava de hora em hora. Constitui esse dirio uma fonte concisa de informaes referentes ao perodo que vai de 14 de agosto de 1939 a 24 de setembro de 1942, quando ele era chefe do Estado-maior do exrcito e mantinha contatos

  • 12 ASCENSO E QUEDA DO TERCEIRO REICH: O COMEO DO FIM (l 9 3 9 " 1 9 4 5 )

    dirios com Hitler e outros lderes da Alemanha nazista. o mais revelador dos dirios alemes; mas h ainda outros de grande valor, entre os quais o do dr. Joseph Goebbels, ministro da Propaganda e ntimo colaborador de Hitler, e o do general Alfred Jodl, chefe de operaes do Alto-Comando das Foras Armadas (OKW). H dirios do prprio OKW e do Alto-Comando Naval. Com efeito, as sessenta mil pastas de documentos dos arquivos da marinha alem, capturadas em Schloss Tambach, perto de Coburg, contm, praticamente, todos os sinais convencionados, anotaes, dirios de bordo, memorandos, etc., desde abril de 1945, quando foram encontradas, at, reversivamente, 1868, quando foi fundada a moderna marinha germnica.

    As 485 toneladas de documentos do Ministrio do Exterior alemo, capturadas pelo lfi Exrcito americano em vrios castelos e minas das montanhas Harz, justamente quando estavam prestes a ser queimadas por ordem de Berlim, abrangem no apenas o perodo do Terceiro Reich, mas recuam, passando pela Repblica de Weimar, at o incio do Segundo Reich de Bismarck. Durante muitos anos, aps a Segunda Guerra Mundial, toneladas de documentos nazistas permaneceram selados num depsito do exrcito norte-americano situado em Alexandria, Virgnia, sem que nosso governo demonstrasse sequer interesse em abrir tais pacotes, a fim de ver que espcie de documentos de valor histrico poderiam conter. Finalmente, em 1955, dez anos depois de sua captura, graas iniciativa da American Historical Association e generosidade de duas instituies particulares, os documentos de Alexandria foram abertos, e um grupo lamentavelmente pequeno de eruditos, auxiliado por pessoal e equipamento inadequados, entregou-se tarefa de selecion-los e fotograf-los, antes que o governo, muito apressado em relao ao assunto, os restitusse Alemanha. Tais documentos constituram rico achado.

    O mesmo se pode dizer de documentos como o registro taquigrfico parcial de 51 Conferncias do Fhrer sobre a situao militar diria, tal como era vista e discutida no quartel-general de Hitler, e o texto completo das discusses dos grandes comandantes nazistas com seus antigos camaradas de partido e secretrios, durante a guerra. Os primeiros desses documentos foram salvos em meio aos restos carbonizados de outros papis de Hitler, em Berchtesgaden, por um oficial do servio secreto pertencente 101 Diviso Area dos Estados Unidos, e os segundos, encontrados entre os papis de Martin Bormann.

  • PREFCIO 1 3

    Centenas de milhares de documentos nazistas apreendidos foram apressadamente reunidos em Nuremberg, como provas, durante o julgamento dos principais criminosos de guerra nazistas. Enquanto fazia a cobertura jornalstica da primeira parte do julgamento, reuni montes de folhas mimeografadas e, mais tarde, os 42 volumes de depoimentos e documentos publicados, acrescidos de dez volumes de documentos importantes vertidos para o ingls. O texto de outros documentos, publicados numa srie de 15 volumes, acerca dos 12 julgamentos efetuados em Nuremberg, foi-me valioso, embora muitos papis e depoimentos tenham sido omitidos.

    Finalmente, alm desse acmulo sem precedente de documentos, h os registros dos exaustivos interrogatrios a que foram submetidos os oficiais alemes, os membros do Partido Nazista e os altos funcionrios do governo, e depoimentos subseqentes, feitos sob juramento, em vrios julgamentos do ps-guerra, proporcionando uma quantidade de material como ningum, creio eu, teve antes sua disposio, proveniente de tais fontes, depois das guerras anteriores.

    No li, por certo, toda essa atordoante quantidade de documentos, pois isso estaria muito alm da capacidade de um s indivduo. Mas examinei parte considervel desse material, retardando-me nessa pesquisa, como ocorre a todos os que esquadrinham to rico manancial, pela absoluta falta de ndices adequados.

    realmente extraordinrio que nenhum de ns, jornalistas e diplomatas que nos encontrvamos na Alemanha durante o nazismo, soubesse o que estava efetivamente ocorrendo atrs da fachada do Terceiro Reich. Uma ditadura totalitria, pela sua prpria natureza, age com grande sigilo, e sabe como manter esse sigilo longe dos olhares perscrutadores dos estranhos. Era bastante fcil registrar e escrever os simples, excitantes e, no raro, revoltantes acontecimentos que se verificavam no Terceiro Reich: a ascenso de Hitler ao poder; o incndio do Reichstag; o expurgo sangrento de Rohm; o Anschluss (anexao) da ustria; a capitulao de Chamberlain e Daladier em Munique; a ocupao da Tchecoslovquia; os ataques contra a Polnia, a Escandinvia, o Ocidente, os Blcs e a Rssia; os horrores da ocupao nazista e dos campos de concentrao; e a liquidao dos judeus. Mas as decises fatais tomadas secretamente, as intrigas, as traies, os motivos e as aberraes que conduziam a tais decises, os papis desempenhados pelos atores principais nos bastidores, a extenso do terror que exerciam e a tcnica de que se valiam para implant-lo tudo isso e muito mais permaneceu, em grande parte, oculto, at surgirem os documentos secretos alemes.

  • 1 4 ASCENSO E QUEDA DO TERCEIRO REICH: O COMEO DO FIM ( l 9 3 9 - 1 9 4 5 )

    Talvez se possa pensar que ainda muito cedo para algum tentar escrever uma histria do Terceiro Reich; que tal tarefa deveria ser deixada para uma gerao posterior de escritores, a quem o tempo proporcionasse melhor perspectiva dos acontecimentos. Constatei que essa opinio prevalecia particularmente na Frana, quando para l me dirigi, a fim de fazer algumas pesquisas. Os historiadores no deviam abordar nada que fosse mais recente do que a era napolenica, disseram-me.

    Essa opinio bastante pondervel. A maioria dos historiadores aguardou cinqenta, cem anos, ou mais, antes de tentar escrever uma narrao da vida de um pas, de um imprio, de uma poca. Mas no seria isso devido, principalmente, ao fato de levarem mais tempo a vir luz os documentos pertinentes que lhes fornecessem o material autntico de que necessitavam? E, embora ganhassem perspectiva, acaso no se perdia alguma coisa, devido ao fato de faltar aos autores, necessariamente, um conhecimento pessoal da vida e dos ambientes em que viveram as figuras histricas sobre as quais escreviam?

    No caso do Terceiro Reich, que caso nico, quase todo o material documental se tornou disponvel quando de sua queda, sendo enriquecido pelo testemunho de todos os lderes, militares e civis, sobreviventes, alguns dos quais foram posteriormente executados. Dispondo de fontes incomparveis de pesquisa e tendo ainda vivos na memria no s a lembrana da vida na Alemanha nazista, mas tambm o aspecto fsico, a conduta e a natureza dos homens que a governavam, sobretudo Adolf Hitler, decidi tentar escrever a histria da ascenso e queda do Terceiro Reich.

    Vivi durante toda a guerra, observa Tucdides em sua Histria da guerra do Peloponeso, um dos maiores livros de histria j escritos, numa idade em que me era dado compreender os acontecimentos, e dedicava-lhes ateno, a fim de conhecer a verdade exata a respeito deles.

    Pareceu-me extremamente difcil e nem sempre possvel conhecer a verdade exata acerca da Alemanha de Hitler. A avalanche de material documental nos impelia pelo caminho da verdade at um ponto que, vinte anos atrs, seria impossvel atingir; por outro lado, a prpria vastido desse material nos deixava, no raro, confusos, sobretudo quando se sabe que em todos os registros e depoimentos humanos costuma haver contradies embaraosas.

    Sem dvida, meus prprios preconceitos, que surgem inevitavelmente de minha experincia e formao pessoal, insinuam-se, de quando em quando, nas

  • PREFCIO 1 5

    pginas do livro. Detesto, em princpio, as ditaduras totalitrias e passei a odi-las mais ainda ao viver em uma delas e ao presenciar seus ataques revoltantes contra o esprito humano. No entanto, procurei ser, neste livro, rigorosamente objetivo, deixando que os fatos falassem por si prprios e anotando a fonte de cada um deles. Nenhum incidente, nenhum episdio ou citao provm de minha imaginao: baseiam-se todos em documentos, em depoimentos de testemunhas oculares e em minha prpria observao pessoal. Em algumas passagens, h certa especulao, devido ausncia de fatos positivos, mas ela est claramente rotulada.

    Minhas interpretaes, no tenho dvida, sero contestadas por muitos. Coisa inevitvel, j que nenhum homem infalvel em suas opinies. Aquelas que, aqui e ali, me aventurei a dar, a fim de esclarecer o leitor e aprofundar a narrativa, foi o que de melhor pude deduzir dos fatos evidentes e de meu conhecimento e experincia.

    Adolf Hitler talvez seja o ltimo dos grandes conquistadores aventureiros, dentro da tradio de Alexandre, Csar e Napoleo e o Terceiro Reich, o ltimo dos imprios a seguir o caminho percorrido anteriormente pela Macednia, Roma e Frana. A cortina desceu, afinal, sobre essa fase da Histria, devido inveno da bomba de hidrognio, dos msseis balsticos e de foguetes que podem ser dirigidos Lua.

    Em nossa poca de inventos letais, aterrorizadores, que to rapidamente suplantaram os antigos meios de destruio, a primeira grande guerra agressiva, se agora vier, ser deflagrada por homnculos suicidas que apertam um boto eletrnico. No haver vencedores nem vencidos, mas apenas os ossos carbonizados dos mortos sobre a crosta de um planeta desabitado.

  • A guerra: primeiras vitrias e o momento decisivo

  • CAPTULO 1

    A queda da Polnia

    s 1 Oh de 5 de setembro de 1939, o general Halder teve uma conferncia com o general von Brauchitsch, comandante-em-chefe do exrcito alemo, e o general von Bock, que dirigia o grupo de exrcitos do norte. Aps examinarem a situao, tal como ela se lhes afigurava ao comeo do quinto dia do ataque alemo contra a Polnia, concordaram, conforme Halder escreveu em seu dirio, que o inimigo est praticamente derrotado.

    Na noite anterior, a batalha pelo Corredor Polons terminara com a juno do 4e Exrcito, comandado pelo general von Kluge que, da regio da Pomernia, avanava para o leste, e o 3 fi Exrcito, sob o comando do general von Kchler, que, da Prssia Oriental, fazia seu avano. Foi nessa batalha que o general Heinz Guderian conquistou renome com seus tanques. Em determinado ponto, arrancando para o leste pelo Corredor, eles foram contra-atacados pela brigada de cavalaria de Pomorska. O autor deste livro, ao passar pelo campo de batalha dias depois, viu ali aterradora prova de carnificina, smbolo daquela breve campanha na Polnia.

    Cavalos contra tanques! A comprida lana dos cavalarianos contra o comprido canho dos tanques! Apesar de sua bravura, valor e temeridade, os poloneses foram facilmente dominados pelo ataque alemo. Foi sua primeira experincia e do mundo tambm da guerra-relmpago (blitzkrieg): o rpido ataque de surpresa; os avies de caa e os bombardeiros, roncando no alto, fazendo reconhecimentos, atacando, espalhando o incndio e o terror; os stukas zunindo ao mergulharem; os tanques, divises completas deles, rompendo linhas e avanando cinqenta ou sessenta quilmetros por dia; pesados canhes de autopropulso e fogo rpido rolando a sessenta quilmetros por hora, mesmo pelas estradas acidentadas da Polnia; a rapidez quase inacreditvel da infantaria, de todo aquele vasto exrcito de 1,5 milho de soldados em carros motorizados, dirigidos e

  • 20 A g u e r r a : p r im e i r a s v i t r i a s e o m o m e n to d e c i s iv o

    coordenados por um ddalo de comunicaes eletrnicas que consistiam de intrincadas instalaes de rdio, telefone e telgrafo. Era um monstruoso peso pesado mecanizado como jamais a terra havia presenciado.

    A fora area polonesa foi destruda no perodo de 48 horas, a maioria de seus quinhentos avies de primeira linha, pelo bombardeio que os alemes fizeram nos aerdromos antes que pudessem decolar. Incineraram-se as instalaes, e a maior parte das tripulaes de terra foram mortas ou feridas. Cracvia, a segunda cidade da Polnia, caiu em 6 de setembro. Nessa noite, o governo polons fugiu de Varsvia para Lublin. No dia seguinte, Halder ocupou-se dos planos para comear a transferncia das tropas para a frente ocidental, embora no percebesse ali qualquer atividade. Na tarde de 8 de setembro, a 4a Diviso dos panzer alcanou as proximidades da capital polonesa, enquanto, logo ao sul da cidade, o 10a Exrcito, comandado por Reichenau, vindo da Silsia e Eslovquia, conquistava Kielce, e o 14a Exrcito, de List, chegava a Sandomierz, na juno dos rios Vstula e San.

    Numa semana, fora vencido o exrcito polons. A maior parte de suas 35 divises tudo que houvera tempo de mobilizar foi esmagada ou colhida num vasto movimento de pinas que se fecharam em torno de Varsvia. Restara para os alemes a segunda fase: apertar o lao em volta das aturdidas e desorganizadas unidades polonesas que tinham sido cercadas, destru-las e completar um segundo movimento de pinas ainda maior a 160 quilmetros a leste, o qual colheria as remanescentes formaes polonesas a oeste de Brest Litovsk e do rio Bug.

    Essa fase comeou em 9 de setembro e terminou no dia 17. A ala esquerda dos exrcitos do grupo norte, do general von Bock, marchou para Brest Litovsk, que o 19a Corpo de Guderian atingiu no dia 14 e conquistou dois dias depois. Em 17 de setembro, encontrou as patrulhas do 14a Exrcito, de List, a oitenta quilmetros ao sul de Brest Litovsk, em Wlodawa, fechando as segundas grandes pinas. O contra-ataque, como Guderian observou mais tarde, chegara a uma concluso definitiva em 17 de setembro. Todas as foras polonesas, salvo certo nmero delas na fronteira russa, ficaram cercadas. Bolsas de tropas polonesas, no tringulo de Varsvia e, mais a oeste, nas proximidades de Posen, resistiram galhardamente, mas estavam condenadas. O governo polons, ou o que dele restara, aps ser incessantemente bombardeado e metralhado pela Luftwaffe, chegou a uma aldeia, na fronteira da Romnia, no dia 15. Para ele e para a altiva nao, tudo estava

  • A QUEDA DA POLNIA 2 1

    terminado, salvo para os moribundos, nas fileiras das unidades, que ainda resistiam com incrvel fora de vontade.

    Chegara ento a hora de os russos invadirem o pas devastado para apoderar- se de seu quinho nos despojos.

    Os russos invadem a Polnia

    O Kremlin, em Moscou, como todas as outras sedes de governo, surpreendeu- se com a rapidez com que os exrcitos alemes se movimentaram na Polnia. Em 5 de setembro, Molotov, ao responder formalmente sugesto dos nazistas para que a Rssia atacasse a Polnia, do leste, declarou que isso seria feito em ocasio oportuna, e que essa ocasio no havia ainda chegado. Julgava que uma presso excessiva poderia prejudicar a causa dos soviticos. Insistiu, porm, em que os alemes, mesmo que chegassem primeiro, deveriam observar escrupulosamente a linha de demarcao na Polnia, conforme fora acordado nas clusulas secretas do pacto nazi-sovitico.1 J se tornavam evidentes as desconfianas dos russos em relao aos alemes. A impresso, no Kremlin, era de que a conquista da Polnia pelos alemes levasse talvez um tempo bastante longo.

    Logo depois da meia-noite de 8 de setembro, porm, depois que uma diviso blindada alem atingiu as imediaes de Varsvia, Ribbentrop enviou urgentemente uma mensagem secretssima a Schulenburg, em Moscou, declarando que as operaes da Polnia estavam progredindo muito alm de nossas expectativas e que, em tal circunstncia, a Alemanha apreciaria conhecer as intenes militares do governo sovitico.2 s 16:10h do dia seguinte, Molotov respondeu que a Rssia se movimentaria militarmente dentro dos prximos dias. Horas antes, nesse dia, o comissrio dos Negcios Estrangeiros do governo sovitico felicitou oficialmente os alemes pela entrada das tropas alemes em Varsvia.3

    Em 10 de setembro, Molotov e o embaixador von der Schulenburg viram-se em situao bastante embaraosa. Aps declarar que o governo sovitico fora pego completamente de surpresa pelos xitos militares alemes inesperadamente rpidos e que a Unio Sovitica se achava, por conseqncia, em situao difcil, o comissrio das Relaes Estrangeiras referiu-se escusa que o Kremlin

  • 22 A GUERRA: PRIMEIRAS VITRIAS E O MOMENTO DECISIVO

    teria que apresentar pela sua prpria agresso na Polnia. A escusa, conforme a mensagem telegrfica urgentssima e secretssima de Schulenburg a Berlim, foi:

    que a Polnia se estava esfacelando e que, por conseguinte, era necessrio que a Unio Sovitica fosse em auxlio dos ucranianos e russos brancos que se viam ameaados pela Alemanha. Esse argumento [disse Molotov] tornava-se necessrio para que os povos aceitassem a interveno da Unio Sovitica, evitando-se, ao mesmo tempo, que lhe dessem a aparncia de agressora.

    Alm disso, Molotov queixou-se de que o general von Brauchitsch tinha acabado de ser citado pela D.N.B. como tendo declarado que no mais se tornava necessria uma ao militar na fronteira oriental alem. Se era assim, se a luta estava terminada, a Rssia, disse Molotov, no podia iniciar uma nova guerra. Toda aquela situao lhe havia desagradado bastante.4 Para complicar mais ainda a questo, chamou Schulenburg ao Kremlin, em 14 de setembro, e, aps inform-lo de que o Exrcito Vermelho iria pr-se em marcha mais cedo do que o previsto, quis saber quando se daria a queda de Varsvia. Com o propsito de justificar suas operaes, os russos deviam aguardar a conquista da capital polonesa.5

    O comissrio levantou algumas sugestes embaraosas. Quando cairia Varsvia? Como os alemes acolheriam o fato de serem responsabilizados pela interveno da Rssia? Na noite de 15 de setembro, Ribbentrop expediu uma mensagem urgentssima e secretssima a Molotov, pela embaixada alem, respondendo quelas perguntas. Varsvia, informou ele, seria ocupada nos prximos dias. A Alemanha acolheria prazerosamente as operaes militares dos soviticos agora. Quanto desculpa da Rssia de a Alemanha ser responsabilizada por esse fato, isso estava fora da questo (...) contrrio s verdadeiras intenes dos alemes (...) estaria em contradio com os arranjos feitos em Moscou e finalmente (...) faria os dois Estados aparecerem inimigos perante o mundo inteiro. Terminou pedindo ao governo sovitico que marcasse o dia e a hora em que atacaria a Polnia.6

    Foi o que se fez na noite seguinte. Dois despachos de Schulenburg, que figuram entre os documentos capturados aos alemes dizendo como isso foi feito, demonstram claramente o estratagema dos russos.

  • A QUEDA DA POLNIA 2 3

    Estive com Molotov s 18h [telegrafou Schulenburg em 16 de setembro]. Ele declarou que a interveno militar da Unio Sovitica estava iminente talvez se verificasse mesmo amanh ou depois. Stalin achava-se, no momento, em conferncia com chefes militares (...)Molotov acrescentou que (...) o governo sovitico pretendia justificar a ao como se segue: o Estado polons desintegrara-se e no existia mais; em conseqncia, todos os acordos concludos com a Polnia ficaram nulos; outras potncias talvez tentassem aproveitar-se do caos surgido. O governo sovitico considerava-se obrigado a intervir, a fim de proteger seus irmos ucranianos e russos brancos e possibilitar a esse infeliz povo trabalhar em paz.

    Como a Alemanha podia ser a nica possvel terceira potncia na questo, Schulenburg fez suas objees.

    Molotov admitiu que os argumentos do governo sovitico encerravam uma nota que feria a sensibilidade dos alemes, mas pediu-nos, dada a difcil situao do governo sovitico, que no nos ofendssemos por uma coisa assim insignificante. O governo sovitico no via, infelizmente, possibilidade de quaisquer outras razes, uma vez que a Unio Sovitica no havia, at ali, considerado as condies de sua minoria na Polnia e precisava, de um modo ou de outro, justificar perante o estrangeiro sua presente interveno.7

    s 17:20h de 17 de setembro, Schulenburg expedia outra mensagem urgentssima e secretssima para Berlim.

    Stalin recebeu-me s 14h (...) e declarou que o Exrcito Vermelho atravessaria a fronteira sovitica s 18h (...) Os avies soviticos comeariam a bombardear o distrito a leste de Lww [Lemberg].

    Quando Schulenburg se ops a trs pontos do comunicado sovitico, o ditador russo muito prontamente alterou o texto.8

    Foi assim que, com o mesquinho pretexto de que a Polnia deixara de existir e de que o pacto de no-agresso sovitico-polons, portanto, deixara tambm de

  • 24 a g u e r r a : p r im e i r a s v i t r i a s e o m o m e n to d e c i s iv o

    existir e se tornava necessrio proteger seus prprios interesses e os das minorias de ucranianos e russos brancos, a Unio Sovitica comeou a esmagar a Polnia prostrada, na manh de 17 de setembro. Para maior afronta dessa injustia, o embaixador polons, em Moscou, foi informado de que a Rssia manteria estrita neutralidade no conflito da Polnia! No dia seguinte, 18 de setembro, as tropas soviticas encontraram-se com os alemes em Brest Litovsk, onde, exatamente 21 anos antes, um recm-nascido governo bolchevista menosprezara os laos que o ligavam a seus Aliados ocidentais, recebendo e aceitando, do exrcito alemo, uma paz em separado sob rgidas condies.

    Conquanto fossem agora cmplices da Alemanha nazista em varrer do mapa a Polnia, os russos se mostraram ao mesmo tempo cheios de desconfianas para com seus novos companheiros. Na reunio que tivera com o embaixador alemo, na vspera da agresso sovitica, Stalin manifestara suas dvidas, conforme Schu- lenburg notificou devidamente a Berlim, de que o Alto-Comando alemo manteria os acordos firmados em Moscou e se retiraria para a linha com a qual haviam concordado. O embaixador procurou tranqiliz-lo a esse respeito, mas, ao que parece, sem xito. Em vista da conhecida atitude de desconfiana de Stalin, tele- grafou Schulenburg a Berlim, eu ficaria satisfeito se fosse autorizado a fazer uma nova declarao dessa natureza de modo a remover as ltimas dvidas.9 No dia seguinte, 19 de setembro, Ribbentrop telegrafou ao embaixador, dando-lhe a autorizao: Informe Stalin de que os acordos que fiz em Moscou sero naturalmente mantidos, e ns os consideramos a pedra fundamental nas novas relaes amistosas entre a Alemanha e a Unio Sovitica.10

    Continuaram, entretanto, os atritos entre os dois scios forados. Em 17 de setembro, houve um desentendimento sobre o texto de um comunicado conjunto que justificaria a destruio da Polnia pelos russos e alemes. Stalin ops-se verso alem, porque ela apresentava os fatos com demasiada franqueza. Escreveu imediatamente sua prpria verso, uma obra-prima de subterfgios, e forou os alemes a aceit-la. Declarava que o objetivo comum da Alemanha e da Rssia era restaurar a paz e a ordem na Polnia, que haviam sido destrudas com a desintegrao do Estado polons, e auxiliar o povo a estabelecer novas condies para sua poltica. Em matria de cinismo, Hitler encontrara em Stalin um igual.

    A princpio, ao que parece, ambos os ditadores pensaram em estabelecer um Estado polons tampo feio do gro-ducado de Varsvia de Napoleo

  • A QUEDA DA POLNIA 2 5

    com o propsito de abrandar a opinio pblica mundial. Mas, em 19 de setembro, Molotov revelou que os bolchevistas j estavam com idias diferentes a respeito. Aps protestar irritadamente junto a Schulenburg que os generais alemes estavam desrespeitando o acordo de Moscou, ao procurarem apoderar-se do territrio que devia caber Rssia, ele feriu o ponto principal.

    Molotov deu a entender [telegrafou Schulenburg a Berlim] que a primeira tendncia manifestada pelo governo sovitico e por Stalin pessoalmente, de permitir a existncia do que restasse da Polnia, cedera lugar tendncia de dividi-la ao longo da linha Pissa-Narew-Vstula-San. O governo sovitico deseja comear imediatamente as negociaes.11

    Partiu assim dos russos a iniciativa de dividir completamente a Polnia e negar ao povo polons qualquer existncia prpria e independente. No foi preciso insistir muito para que os alemes concordassem. Em 23 de setembro, Ribbentrop telegrafou a Schulenburg ordenando-lhe que informasse Molotov de que a idia russa de uma linha limtrofe, ao longo do curso daqueles quatro rios conhecidos, coincide com o ponto de vista do governo do Reich. Props ir novamente de avio a Moscou para elaborar os detalhes desse plano e da estrutura definitiva da rea polonesa.12

    Stalin, ento, encarregou-se pessoalmente das negociaes, e os Aliados alemes e, mais tarde, os Aliados britnicos e americanos, puderam ver o quanto ele era um negociador inflexvel, cnico e oportunista. O ditador sovitico chamou Schulenburg ao Kremlin s 20h do dia 25. O telegrama do embaixador, horas depois, prevenia Berlim de algumas duras realidades e de outras novidades.

    Stalin declarou (...) que considerava um erro deixar um Estado polons tampo independente. Props que, partindo do territrio a leste da linha de demarcao, toda a provncia de Varsvia que se estende at o Bug fosse adicionada ao nosso quinho. Em troca, renunciaramos s nossas pretenses sobre a Litunia.Stalin (...) acrescentou que, se consentssemos, a Unio Sovitica trataria imediatamente da soluo do problema dos pases blticos, de conformidade com o protocolo [secreto] de 23 de agosto, e, a esse

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    respeito, esperava o apoio irrestrito do governo alemo. Stalin citou expressamente a Estnia, a Letnia e a Litunia, mas no mencionou a Finlndia.13

    Era uma barganha demasiado dura e difcil. Stalin oferecia trocar duas provncias polonesas, que os alemes j haviam conquistado, pelos Estados blticos. Estava tirando vantagem do grande servio que havia prestado a Hitler tornando- lhe possvel atacar a Polnia a fim de obter para a Rssia tudo o que pudesse enquanto a oportunidade era boa. Alm disso, propunha que os alemes pusessem sob seu domnio a massa do povo polons. Como russo, ele sabia perfeitamente o que os sculos, na histria, haviam ensinado: os poloneses jamais se submeteriam pacificamente perda de sua independncia. Que eles dessem dores de cabea aos alemes, no aos russos! Entrementes, ele obteria os Estados blticos arrebatados da Rssia depois da Primeira Guerra Mundial e cuja posio geogrfica oferecia Unio Sovitica grande proteo contra algum ataque surpresa de seu aliado alemo.

    Ribbentrop chegou de avio a Moscou pela segunda vez, s 18h de 28 de setembro. Antes de dirigir-se ao Kremlin, teve tempo de ler dois telegramas procedentes de Berlim que o notificavam do que os russos estavam arquitetando. Eram telegramas expedidos pelo ministro alemo em Tallinn, a capital, relatando que o governo estoniano tinha acabado de informar que a Unio Sovitica exigira, sob a mais grave das ameaas de ataque iminente, bases militares e areas na Estnia.14 Mais tarde, nessa noite, aps uma longa conferncia com Stalin e Molotov, Ribbentrop telegrafou a Hitler que nesta mesma noite estava sendo concludo um pacto que colocaria duas divises do Exrcito Vermelho e uma brigada da fora area no territrio da Estnia, sem abolir, porm, o sistema de governo desse pas, no momento. Mas o Fhrer, muito experiente nessas questes, sabia como seria transitria a durao da Estnia. Logo no dia seguinte, Ribbentrop foi informado de que Hitler ordenara a evacuao dos 86 mil Volksdeutsche da Estnia e Letnia.15

    Stalin apresentava sua conta, e Hitler, pela primeira vez, pelo menos, teve de pag-la. Estava abandonando imediatamente no s a Estnia mas a Letnia, ambas as quais concordara no pacto nazi-sovitico pertenciam esfera dos interesses soviticos. Antes de terminado o dia, renunciava tambm Litunia, na

  • A QUEDA DA POLNIA 2 7

    fronteira nordeste da Alemanha, a qual, segundo as clusulas secretas do pacto de Moscou, pertencia esfera do Reich.

    Stalin apresentou aos alemes duas opes na conferncia com Ribbentrop, que comeara s 22h de 27 de setembro e durara at lh. Conforme sugerira a Schulenburg, no dia 25, eram: aceitao da primitiva linha de demarcao na Polnia, ao longo dos rios Pissa, Narew, Vstula e San, obtendo a Alemanha com isso a Litunia; ou cesso da Litunia Rssia em troca de mais territrio polons (a provncia de Lublin e as terras a leste de Varsvia), o que entregaria aos alemes quase todo o povo polons. Stalin insistiu fortemente na segunda opo. Ribbentrop, num longo telegrama expedido s 4h de 28 de setembro, submeteu-a a Hitler, que concordou.16

    A diviso da Europa Oriental exigiu um bom nmero de traados intrincados nos mapas. Aps mais trs horas e meia de negociaes na tarde de 28 de setembro, a que se seguiu um banquete oferecido pelo governo, no Kremlin, Stalin e Molotov retiraram-se a fim de conferenciar com uma delegao da Letnia, que tinham chamado a Moscou. Ribbentrop correu para a pera a fim de assistir ainda a um ato do O lago dos cisnesy voltando ao Kremlin meia-noite para fazer novas consultas sobre mapas e outras questes. s 5h, ele e Molotov apuseram suas assinaturas num novo pacto oficialmente chamado Tratado de Amizade e Limites Germano-Sovitico, enquanto Stalin mais uma vez se mostrava, conforme relatou mais tarde um alto funcionrio alemo, visivelmente satisfeito.* Tinha razo para isso.17

    O prprio tratado, que se tornou pblico, anunciava os limites dos interesses nacionais dos dois pases no antigo Estado polons e declarava que, nos territrios adquiridos, iriam restabelecer a paz e a ordem e assegurar ao povo que l vivia uma vida pacfica em harmonia com seu carter nacional.

    Mas, da mesma maneira que o acordo nazi-sovitico anterior, havia protocolos secretos trs, alis, dos quais dois encerravam a parte substancial. Um acrescentou a Litunia esfera de influncia dos soviticos e as provncias de Lublin e Varsvia oriental dos alemes. O segundo era curto e decisivo.

    * Esse alto funcionrio, Andor Hencke, subsecretrio do Ministrio das Relaes Exteriores, que duran

    te muitos anos servira na Embaixada de Moscou, escreveu um minucioso e interessante relatrio sobre

    as conversaes. Foi o nico registro que os alemes fizeram das conferncias do segundo dia.18

  • 28 A GUERRA: PRIMEIRAS VITRIAS E O MOMENTO DECISIVO

    Ambas as partes no toleraro em seus territrios qualquer agitao dos poloneses que possa afetar os territrios da outra. Eliminaro, em seus territrios, toda agitao em seu incio e informaro, um ao outro, sobre as medidas convenientes para tal objetivo.

    E assim a Polnia, semelhana do que se passara anteriormente com a ustria e a Tchecoslovquia, desapareceu do mapa da Europa. Dessa vez, porm, Hitler fora auxiliado e secundado na destruio pela Unio das Repblicas Socialistas Soviticas, a qual, durante tanto tempo, se conclamava paladina dos povos oprimidos. Era a quarta vez que a Rssia e a Alemanha dividiam a Polnia* (a ustria tomara parte nas outras) e, enquanto isso durou, revestiu-se da mais feroz crueldade. No protocolo secreto de 28 de setembro,** Hitler e Stalin concordaram em instituir na Polnia um regime de terror destinado a suprimir brutalmente a liberdade, a cultura e a vida nacional.

    Hitler guerreou contra a Polnia e ganhou a batalha, mas o maior vencedor foi Stalin, cujas tropas quase no dispararam um tiro.*** A Unio Sovitica obteve quase metade da Polnia e um baluarte nos Estados blticos. Isso bloqueava a Alemanha mais solidamente do que nunca em dois de seus principais objetivos a longo prazo: o trigo ucraniano e o petrleo romeno, dos quais ela tinha grande necessidade se quisesse sobreviver ao bloqueio britnico. Mesmo a regio petrolfera de Borislav-Drogobycz, na Polnia, que Hitler desejava, foi exigida por Stalin, e ele prazerosamente concordou em vender aos alemes o equivalente da produo anual dessa rea.

    Por que Hitler pagou aos russos um preo assim to elevado? verdade que concordara com isso em agosto, a fim de manter a Unio Sovitica afastada do campo dos Aliados e fora da guerra. Ele nunca fora defensor de acordos feitos e, com a Polnia conquistada por uma incomparvel proeza das armas alems, era de esperar que violasse o pacto de 23 de agosto, conforme insistia o exrcito. Se Stalin fizesse objeo, o Fhrer poderia amea-lo com o ataque do exrcito mais

    * Amold Toynbee, em seus vrios trabalhos, chama-a "a quinta diviso"

    ** Conquanto fosse assinado s 5h de 29 de setembro, o tratado datado oficialmente de 28 de setembro.

    *** As baixas alems na Polnia foram oficialmente apresentadas como sendo 10.752 mortos, 30.322 feridos e 3.400 desaparecidos.

  • A QUEDA DA POLNIA 2 9

    poderoso do mundo, de que a campanha da Polnia acabara de dar provas. Ser que poderia? No enquanto os ingleses e franceses estivessem com seus exrcitos no Ocidente. Ele precisava manter livre sua retaguarda, para guerrear com a Inglaterra e a Frana. Conforme suas declaraes posteriores deixariam bem claro, essa era a razo por que permitiu fechar aquele negcio to duro com Stalin. No se esqueceu, contudo, das speras negociaes do ditador sovitico ao voltar depois sua ateno para a frente ocidental.

  • CAPTULO 2

    Sitzkrieg na frente ocidental

    Nada importante acontecera na frente ocidental. No se dera sequer um tiro. O homem de rua alemo comeava a cham-la de a guerra de braos cruzados Sitzkrieg. No Ocidente, seria logo apelidada de guerra de mentira. Ali estava o exrcito mais poderoso do mundo (o francs) para dizer com as palavras do general britnico J. F. C. Fuller, enfrentando no mais que 26 divises (alems), sendo imvel e abrigado por trs de ao e concreto enquanto um aliado quixotescamente valente estava sendo exterminado!1

    Mostravam-se surpresos os alemes? Bem pouco. No primeiro registro do dirio de Halder, o de 14 de agosto, este chefe do Estado-maior geral avaliou minuciosamente a situao na frente ocidental caso a Alemanha atacasse a Polnia. Considerou no muito provvel uma ofensiva por parte da Frana. Tinha certeza de que ela no mandaria seu exrcito atravessar a Blgica contra a vontade dela Concluiu dizendo que os franceses permaneceriam na defensiva. Em 7 de setembro, com o exrcito polons aniquilado, Halder, conforme se notou, j se ocupava com os planos de transferncia das divises alems para o Ocidente.

    Nessa noite, ele anotou o resultado de uma conferncia que Brauchitsch tivera tarde com Hitler.

    A operao no oeste ainda no est clara. Segundo indicaes, no h realmente inteno de se travar uma guerra (...) Falta ao gabinete francs uma tmpera herica. Tambm na Inglaterra vislumbra-se prudente reflexo.

    Dois dias depois, Hitler expedia a Diretiva nfi 3 para a orientao da guerra, ordenando que se providenciasse a remessa de unidades do exrcito e da fora area, da Polnia para o Ocidente. No necessariamente para lutar, porm, Mesmo

  • SITZKRIEG NA FRENTE OCIDENTAL 3 1

    aps a hesitante abertura das hostilidades pela Inglaterra (...) e a Frana, uma ordem expressa minha, traava a diretiva, deve ser obtida em cada um dos seguintes casos: cada vez que nossas foras de terra (ou) (...) um de nossos avies cruzarem as fronteiras do Ocidente; (e) para cada ataque areo contra a Inglaterra.2

    Que haviam a Frana e a Inglaterra prometido Polnia caso fosse atacada? A garantia britnica era de ordem geral. A da Frana, porm, era especfica. Fora traada no acordo militar franco-polons de 19 de maio de 1939. Nele, acordara- se que os franceses desencadeariam progressivamente operaes de ofensiva contra limitados objetivos por volta do terceiro dia aps o Dia da Mobilizao Geral. A mobilizao geral foi decretada em l de setembro. Mas, alm disso, concordou-se que assim que o principal esforo dos alemes se desenvolver contra a Polnia, a Frana desencadear uma ofensiva contra a Alemanha com o grosso de suas foras, a partir do 15a dia aps o primeiro dia da mobilizao geral dos franceses. Quando o representante-chefe do Estado-maior polons, coronel Jaklincz, perguntou quantos soldados franceses estariam disponveis para essa grande ofensiva, o general Gamelin respondeu que haveria cerca de 35 a 38 divises.3

    Mas, em 23 de agosto, quando se tornava iminente o ataque alemo contra a Polnia, o tmido generalssimo francs informava ao seu governo, conforme j vimos,* que ele possivelmente no poderia preparar uma sria ofensiva em menos de dois anos, aproximadamente (...) em 1941-1942 na suposio, acrescentara, de que a Frana, nessa ocasio, tivesse o auxlio das tropas inglesas e do equipamento norte-americano.

    Nas primeiras semanas da guerra, para sermos exatos, a Inglaterra infelizmente dispunha de poucos soldados para enviar Frana. Em 11 de outubro, trs semanas aps o trmino da luta na Polnia, estava com quatro divises 158 mil homens na Frana. Uma contribuio simblica, assim a designou Churchill, e Fuller anotou que a primeira baixa britnica um cabo morto por um tiro quando em misso de patrulhamento s se verificou em 9 de dezembro. Uma guerra assim to destituda de sangue, comenta Fuller, jamais ocorrera desde as batalhas de Molinella e Zagonara.**

    * Ver captulo "O incio da Segunda Guerra Mundial: triunfo e consolidao (1933-1939)".

    ** Em 9 de outubro, este autor fez uma viagem por estrada de ferro pela margem leste do Reno, onde, numa extenso de 160 quilmetros, o rio forma a fronteira franco-germnica, e anotou em seu dirio:

  • 32 A GUERRA: PRIMEIRAS VITRIAS E O MOMENTO DECISIVO

    Fazendo um retrospecto, em Nuremberg, os generais alemes concordaram que os Aliados ocidentais perderam uma excelente oportunidade ao deixar de atacar, a oeste, durante a campanha da Polnia.

    O xito na luta contra a Polnia somente foi possvel [declarou o general Halder] ao desfalcarmos quase completamente nossas fronteiras ocidentais. Se os franceses tivessem percebido essa situao lgica e se aproveitado do momento em que as foras alems se achavam empenhadas na Polnia, teriam podido atravessar o Reno sem que pudssemos impedir e teriam ameaado a rea do Ruhr, a qual era o fator mais decisivo na direo da guerra traada pelos alemes.4 (...) No sofremos um colapso em 1939 [disse o general Jodl], devido apenas ao fato de que, durante a campanha polonesa, aproximadamente 110 divises francesas e inglesas, no Ocidente, mantiveram-se completamente inativas contra as 23 divises alems.5 E o general Keitel, chefe do OKW, acrescentou este testemunho:Ns, soldados, sempre esperamos que a Frana nos atacasse durante a campanha polonesa, e ficamos muito surpresos de nada ter acontecido (...) Um ataque francs teria encontrado apenas uma tropa alem de cobertura, no uma verdadeira defesa.6

    Por que, ento, o exrcito francs (as duas primeiras divises britnicas somente se desdobraram na primeira semana de outubro), que tinha uma esmagadora superioridade sobre as foras alems no oeste, no atacou, como o general Gamelin e o governo francs prometeram por escrito que fariam?

    Muitas foram as razes: o derrotismo no Alto-Comando francs, no governo e no povo; a lembrana de como a Frana se esvara em sangue na Primeira Guerra Mundial e a determinao de no sofrer novamente tal carnificina se pudessem

    "No h sinal de guerra, e o pessoal do trem contou-me que no se dera um tiro nessa frente desde que a guerra comeara (...) Podamos avistar os abrigos franceses e, em muitos lugares, grandes redes de ao, atrs das quais os franceses construam fortificaes. Via-se quadro idntico no lado da Alemanha.

    Os soldados (...) entregavam-se a suas atividades vista e ao alcance uns dos outros (...) Os alemes iavam canhes e suprimentos na linha frrea, sem que os franceses os perturbassem. Que guerra mais

    esquisita." (Berlin Diary, p. 234).

  • SITZKRIEG NA FRENTE OCIDENTAL 3 3

    evitar; a compreenso de que, em meados de setembro, o exrcito polons fora de tal forma derrotado que os alemes logo iriam poder movimentar um nmero superior de foras para o oeste e, com isso, eliminar provavelmente quaisquer avanos iniciais dos franceses; o temor da superioridade dos alemes em armamentos e no ar. Na verdade, o governo francs insistira, desde o princpio, em que a Real Fora Area britnica no bombardeasse objetivos na Alemanha, temendo represlias contra as fbricas francesas, se bem que um bombardeio total no Ruhr, o corao das indstrias do Reich, pudesse redundar em desastre para os alemes. Isso foi motivo de grandes preocupaes para os generais alemes, em setembro, como muitos deles admitiram mais tarde.

    Fundamentalmente, a resposta pergunta de por que a Frana no atacara a Alemanha, em setembro, talvez tivesse sido enunciada melhor por Churchill. Esta batalha, escreveu ele, fora perdida uns anos antes.7 Em Munique, em 1938, por ocasio da reocupao da Rennia, em 1936; no ano anterior, quando Hitler proclamou o recrutamento para a formao do exrcito, desrespeitando o Tratado de Versalhes. O preo dessa lamentvel falta de ao dos Aliados tinha de ser pago agora, embora parecesse que, em Paris e em Londres, se julgava que, de um modo ou de outro, poderia-se fugir ao pagamento pela inao.

    No mar lutava-se, porm.A marinha de guerra alem no ficara naquela estagnao em que se com-

    prazia o exrcito no Ocidente. Durante as primeiras semanas de hostilidades, ps a pique 11 navios britnicos, num total de 64.595 toneladas, quase metade da tonelagem destruda no apogeu da guerra submarina em abril de 1917, quando a Inglaterra estivera s portas de uma catstrofe. As perdas britnicas decresceram depois disso: 53.561 toneladas na segunda semana, 12.750 na terceira e apenas 4.646 na quarta para um total, durante o ms de setembro, de 26 navios de 135.552 toneladas afundados pelos submarinos alemes e trs navios de 16.488 toneladas pelas minas.*

    * Churchill, na ocasio primeiro-lorde do almirantado, revelou as cifras gerais na Cmara dos Comuns, em 26 de setembro. D as cifras oficiais retificadas, em suas memrias. Informou tambm Cmara que

    seis ou sete submarinos alemes haviam sido postos a pique, mas, na verdade, conforme observa em

    seu livro, veio a saber-se que foram apenas dois.O discurso de Churchill foi marcado por uma anedota engraada, na qual conta como o comandante

    de um submarino alemo lhe havia expedido pessoalmente uma mensagem, assinalando a posio de um navio britnico que tinha acabado de ser posto a pique e aconselhando que fossem em socorro dos

  • 34 A GUERRA: PRIMEIRAS VITRIAS E O MOMENTO DECISIVO

    Havia uma razo, que os britnicos desconheciam, para aquele ntido declnio. Em 7 de setembro, o almirante Rder teve uma longa conferncia com Hitler. O Fhrer, exultante com suas primeiras vitrias na Polnia e com a falta de ataque por parte da Frana no Ocidente, aconselhou sua marinha que agisse mais morosamente. A Frana estava demonstrando entraves polticos e militares; os britnicos, sua hesitao. Em vista dessa situao, ficara decidido que os submarinos, no Atlntico, poupariam todos os barcos de passageiros sem exceo e se abste- riam completamente de atacar os de nacionalidade francesa, e que os encouraa- dos de bolso, o Deutschland, no Atlntico Norte, e o GrafSpee, no Atlntico Sul, se recolheriam, entrementes, a seus postos de espera. A poltica geral, observou Rder em seu dirio, seria a de exercer controles at que se tornasse mais clara a situao poltica no Ocidente, o que levar mais ou menos uma semana.8

    O afundamento do Athenia

    Houve outra deciso com que Hitler e Rder concordaram por ocasio da conferncia de 7 de setembro. O almirante anotou no seu dirio: No se dever fazer tentativa alguma para solucionar a questo do Athenia at que os submarinos regressem a suas bases.

    A luta no mar, conforme notamos, comeou dez horas depois da declarao de guerra da Inglaterra, quando o vapor ingls Athenia, repleto de passageiros, mais ou menos em nmero de 1.400, foi torpedeado sem aviso s 21h de 3 de setembro, a 320 quilmetros a oeste das Hbridas, com a perda de 112 vidas, incluindo 28 americanos. O Ministrio de Propaganda alemo conferiu os primeiros comunicados de Londres com o Alto-Comando naval; informaram-no de que no havia nenhum submarino alemo nas vizinhanas. Negaram prontamente que o navio tivesse sido afundado pelos alemes. Essa catstrofe embaraou Hitler e o comando naval. A princpio no acreditaram nos comunicados ingleses. Haviam sido dadas ordens estritas a todos os comandantes de submarinos para que observassem a Conveno de Haia, a qual proibia que se atacasse um

    sobreviventes. "Eu no tinha muita certeza quanto ao endereo para o qual devia enviar uma resposta",

    disse Churchill. "Contudo, o homem est agora em nosso poder." No estava, porm. O autor entrevis

    tou o comandante do submarino, capito Herbert Schulze em Berlim, dois dias depois, numa transmisso radiofnica para os Estados Unidos. Ele mostrou, em seu dirio de bordo, a mensagem que havia enviado a Churchill. (Ver Churchill, The Gathering Storm, p. 436-7; Berlin Diary, p. 225-7).

  • SITZKRIEG NA FRENTE OCIDENTAL 3 5

    navio sem aviso. Como todos os submarinos alemes mantinham silenciosos seus rdios, no havia meios de verificar imediatamente o que acontecera.* Isso no impediu que os jornais controlados pelos nazistas afirmassem, dali a dois dias, que os ingleses torpedearam seu prprio navio a fim de provocar a entrada dos Estados Unidos na guerra.

    A Wilhelmstrasse se achava realmente preocupada com a reao americana catstrofe, que causara a morte de 28 cidados americanos. No dia seguinte ao afundamento, Weizscker chamou o encarregado de negcios americano, Ale- xander Kirk, e negou que um submarino alemo tivesse torpedeado o vapor. Nenhum barco alemo se achava nas imediaes, acentuou ele. Nessa noite, segundo depoimento que ele mais tarde prestou em Nuremberg, o secretrio de Estado procurou Rder e lembrou-lhe como o afundamento do Lusitnia pelos alemes, durante a Primeira Guerra Mundial, contribura para a entrada dos Estados Unidos no conflito e instou com ele que se fizesse tudo para evitar-lhes provocaes. O almirante garantiu-lhe que nenhum submarino alemo estivera envolvido no caso.9

    A instncias de Ribbentrop, o almirante Rder convidou o adido naval americano para que fosse v-lo em 16 de setembro, declarando-lhe, ento, que j recebera relatrios de todos os submarinos, pelos quais ficou esclarecido definitivamente que o Athenia no fora afundado por submarinos alemes. Pediu-lhe que informasse o seu governo a respeito, o que o adido fez prontamente.**10

    O almirante no dissera toda a verdade. No haviam ainda regressado ao porto todos os submarinos que se achavam no mar, em 3 de setembro. Entre eles encontrava-se o [7-30, comandado pelo tenente Lemp, que somente aportou em guas alems em 27 de setembro, sendo ali recebido pelo almirante Karl Dnitz, comandante de submarinos que, anos depois, em Nuremberg, descreveu e revelou, finalmente, a verdade sobre quem afundara o Athenia.

    Encontrei o comandante, o tenente Lemp, nas docas, em Wilhelmsha-ven, na ocasio da chegada do submarino ao porto. Pediu permisso

    * No dia seguinte, 4 de setembro, todos os submarinos alemes receberam a seguinte mensagem:"Por ordem do Fhrer, no devero levar a efeito, de maneira alguma, operaes contra navios de passagei

    ros, mesmo quando estiverem escoltados."

    ** Aparentemente a mensagem no foi escrita em cdigo. Exibiu-se em Nuremberg uma cpia da que o adido naval expediu para Washington, a qual constava dos documentos navais alemes.

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    para falar-me em particular. Logo observei que parecia acabrunhado. Contou-me ento que julgava ser o responsvel pelo afundamento do Athenia na rea do Canal do Norte. De conformidade com minhas instrues anteriores, ele estivera exercendo severa vigilncia sobre possveis barcos mercantes armados, nas vias de acesso s Ilhas Britnicas, e torpedeara um navio que, depois, pelas mensagens de rdio, identificara como sendo o Athenia. Torpedeara-o sob a impresso de que se tratava de um barco mercante armado em servio de patrulhamento (...) Mandei-o imediatamente de avio para Berlim, a fim de comunicar o fato ao Estado-maior da guerra naval [SKL]; entrementes, como medida provisria, ordenei que se mantivesse completo sigilo. Mais tarde, nesse mesmo dia, ou nas primeiras horas do dia seguinte, recebi uma ordem do Kapitn zur See Fricke de que:1 . O caso devia ser mantido em completo segredo.2. O Alto-Comando naval [OKM] considerava no ser necessrio um conselho de guerra, porque achava que o comandante agira de boa-f.3. Esclarecimentos polticos seriam tratados pelo OKM*No tomei parte nos acontecimentos polticos, no decorrer dos quais o Fhrer alegara que nenhum submarino alemo afundara o Athenia.11

    Mas Dnitz, que devia ter suspeitado da verdade durante todo aquele tempo, pois de outro modo no teria estado nas docas para saudar o regresso do [7-30, exerceu um papel no caso ao alterar o dirio do submarino e o dele, a fim de eliminar qualquer prova que denunciasse a verdade. De fato, conforme confessou em Nuremberg, ele prprio ordenou que se eliminasse do dirio do U-30 qualquer meno ao Athenia e fizera o mesmo em seu prprio dirio. Fez os tripulantes do barco jurarem que guardariam absoluto sigilo.**

    * Grifos do almirante.

    ** Os oficiais, Lemp inclusive, e alguns membros da tripulao foram transferidos para oU-1We afundaram com ele em 9 de maio de 1941. Um membro da tripulao fora metralhado por avio poucos dias aps o afundamento do Athenia. Foi desembarcado em Reykjavik, Islndia, comprometendo-se a guardar o mais estrito sigilo; mais tarde foi levado para um campo de prisioneiros de guerra, no Canad. Assinou, depois da guerra, um depoimento relatando os fatos. Ao que parece, os alemes receavam

    que ele "desse com a lngua nos dentes", mas ele s falou ao terminar a guerra.12

  • SITZKRIEG NA FRENTE OCIDENTAL 3 7

    Os Altos-Comandos militares de todos os pases costumam indiscutivelmente manter certos segredos em seus gabinetes no decurso de uma guerra, e era compreensvel, seno louvvel, que Hitler, conforme o almirante Rder deps em Nuremberg, insistisse em que o caso do Athenia fosse mantido em segredo, sobretudo depois que o comando naval, agindo de boa-f, negou, a princpio, a responsabilidade da Alemanha. Ele teria ficado deveras embaraado se tivesse que admiti-la depois. Mas Hitler no ficou s nisso. Na noite de domingo, 22 de outubro, o ministro da Propaganda Goebbels, falando pelo rdio o autor recorda-se perfeitamente da irradiao , acusou Churchill de ter afundado o Athenia. No dia seguinte, o jornal oficial nazista, o Vlkischer Beobachter; publicou uma histria na primeira pgina com o ttulo Churchill afundou o Athenia\ nela declarando que o primeiro-lorde do almirantado colocou uma bomba-relgio no poro do navio. Ficou esclarecido em Nuremberg que o Fhrer; pessoalmente, ordenara a declarao pelo rdio e a publicao daquele artigo e tambm que Rder, Dnitz e Weizscker, embora grandemente desgostosos com to deslavada mentira, no ousassem fazer coisa alguma a respeito.13

    Essa submisso da parte dos almirantes e do suposto lder antinazista no Ministrio das Relaes Exteriores, que era completamente compartilhada pelos generais, toda vez que o diablico chefe nazista explodia, ia conduzir a Alemanha a uma das pginas mais negras de sua histria.

    Hitler prope a paz

    Esta noite os jornais falam abertamente na paz, anotei em meu dirio em 20 de setembro. Todos os alemes, com os quais conversei hoje, esto absolutamente certos de que teremos paz dentro de uma semana. Esto muito animados.

    Na tarde do dia anterior, eu ouvira, no ornamentado salo da prefeitura de Dantzig, Hitler fazer seu primeiro discurso desde a orao com que se dirigira ao Reichstag, em Ia de setembro, ao desencadear a guerra. Conquanto ele estivesse enfurecido por ter ficado impedido de fazer aquele discurso em Varsvia, cuja guarnio resistia ainda heroicamente, e instilasse veneno toda vez que citava a Inglaterra, fez um leve gesto a favor da paz. No tenho nenhum propsito de guerra contra a Inglaterra e a Frana, disse. Minhas simpatias acham-se voltadas

  • 38 A GUERRA: PRIMEIRAS VITRIAS E O MOMENTO DECISIVO

    para opoilu [soldado francs da Grande Guerra]. Ele no sabe por que est lutando. E invocou o Todo-Poderoso que agora abenoou nossas armas para que os outros povos compreendam como esta guerra ser intil (...) e reflitam sobre os benefcios da paz.

    Em 26 de setembro, na vspera da queda de Varsvia, os jornais e o rdio alemes desencadearam uma grande ofensiva de paz. Registrei em meu dirio o que diziam: Por que a Frana e a Inglaterra querem lutar agora? No h razo para a luta. A Alemanha nada pretende no Ocidente.

    Dois dias depois a Rssia, abocanhando rapidamente seu quinho na Polnia, uniu-se quela ofensiva. Juntamente com a assinatura do Tratado de Amizade e Limites Germano-Sovitico, com suas clusulas secretas de dividir a Europa Oriental, Molotov e Ribbentrop prepararam e assinaram em Moscou, em 28 de setembro, uma vibrante declarao em favor da paz.

    Os governos da Alemanha e da Rssia [dizia], aps terem resolvido definitivamente os problemas oriundos da desintegrao do Estado polons e criado uma base firme para uma paz duradoura na Europa Oriental, exprimem mutuamente sua convico de que atenderia aos verdadeiros interesses de todos os povos dar paradeiro ao estado de guerra entre a Alemanha e Inglaterra e Frana. Ambos os governos dirigiro, portanto, seus esforos comuns (...) no sentido de atingir esse objetivo o mais breve possvel.Caso, porm, os esforos de ambos os governos se tornem infrutferos, isso demonstrar que a Inglaterra e a Frana ficam responsveis pelo prosseguimento desta guerra (...)

    Desejaria Hitler a paz ou desejaria continuar a guerra e, com o auxlio dos soviticos, lanar sobre os Aliados ocidentais a responsabilidade de sua continuao? Talvez ele mesmo no soubesse, embora estivesse convencido disso.

    Em 26 de setembro, ele teve uma longa conferncia com Dahlerus, que ainda no renunciara de todo aos seus esforos em favor da paz. Dois dias antes, esse infatigvel sueco visitara seu velho amigo Ogilvie Forbes, em Oslo, onde o antigo conselheiro da embaixada em Berlim servia ento, nessa mesma posio, na le- gao britnica da capital norueguesa. Dahlerus informou Hitler, segundo um

  • SITZKRIEG NA FRENTE OCIDENTAL 3 9

    memorando confidencial do dr. Schmidt,14 que Forbes lhe comunicara que o governo ingls desejava a paz. A nica questo estava no seguinte: como poderiam os ingleses salvaguardar seu prestgio?

    Se os ingleses desejam verdadeiramente a paz, respondeu Hitler, podero t-la em duas semanas (...) sem que, com isso, percam seu prestgio.

    Eles teriam que conformar-se com o fato de que a Polnia no podia erguer- se novamente, disse o Fhrer. Alm disso, ele estava preparado declarou para manter o status quo do restante da Europa, incluindo as garantias de segurana para a Inglaterra, a Frana e os Pases Baixos. Seguiu-se um debate sobre como iniciar as conversaes de paz. Hitler sugeriu que Mussolini o fizesse. Dah- lerus aventou a idia de que a rainha da Holanda talvez conviesse mais, dada a neutralidade de seus pas. Gring, que se achava presente, sugeriu que representantes da Inglaterra e da Alemanha primeiro se encontrassem na Holanda, e depois, se fizessem progresso, a rainha convidaria ambos os pases para entabularem as conversaes sobre o armistcio. Hitler, que vrias vezes se manifestara ctico quanto vontade da Inglaterra de fazer a paz, finalmente concordou com a proposta do sueco, pela qual ele iria Inglaterra no dia seguinte a fim de sondar na direo indicada.

    Os ingleses podero ter a paz se a quiserem, declarou Hitler a Dahlerus no momento em que ele saa, mas tero de se apressar.

    Foi essa uma tendncia do pensamento do Fhrer. Manifestou outra a seus generais. No dia anterior, 25 de setembro, um registro no dirio de Halder menciona o recebimento de um comunicado sobre o plano de Hitler para atacar o Ocidente. Em 27 de setembro, dia que se seguiu garantia que dera a Dahlerus de que estava pronto a fazer a paz com a Inglaterra, Hitler convocou os coman- dantes-em-chefe da Wehrmacht para uma reunio na chancelaria e informou-os de sua deciso de atacar no Ocidente o mais breve possvel, porque o exrcito franco-britnico no se acha ainda preparado. Segundo Brauchitsch, ele mesmo estabeleceu uma data para o ataque: 12 de novembro.15 Sem dvida, Hitler estava entusiasmado nesse dia pela notcia de que Varsvia finalmente capitulara. Provavelmente julgara que, pelo menos, poderia dominar a Frana com a mesma facilidade que tivera na Polnia, se bem que dois dias depois Halder fez uma anotao no dirio para explicar ao Fhrer que a tcnica da campanha polonesa no serviria de receita para o Ocidente. No adiantaria contra um exrcito coeso.

  • 40 A GUERRA: PRIMEIRAS VITRIAS E O MOMENTO DECISIVO

    Talvez Ciano penetrasse melhor o esprito de Hitler quando manteve com ele uma longa conferncia em Berlim, em lfi de outubro. O jovem ministro das Relaes Exteriores da Itlia, que, a essa altura, j detestava bastante os alemes, mas tinha de manter as aparncias, encontrou o Fhrer disposto a confidncias. Ao traar seus planos, os olhos do chanceler faiscavam de maneira sinistra sempre que discorria sobre seus mtodos e seus meios de luta, observou Ciano. Resumindo suas impresses, o visitante italiano escreveu:

    (...) Hoje, oferecer ao povo uma paz slida aps uma grande vitria talvez constitua um objetivo que ainda seduz Hitler. Mas, se para alcan-lo ele tiver que sacrificar, mesmo num mnimo grau, o que lhe parece frutos legtimos de sua vitria, haveria ento de preferir mil vezes a batalha*16

    Quando assisti sesso do Reichstag que comeou ao meio-dia, em 6 de outubro, e ouvi Hitler pronunciar seu apelo de paz, isso me pareceu um velho disco de gramofone que estava tocando pela quinta ou sexta vez. Quantas vezes, antes, o ouvira daquela mesma tribuna, aps sua ltima conquista, e, com o mesmo aparente tom de seriedade e sinceridade, propor o que semelhava se se esquecesse de sua ltima vtima uma paz decente e razovel. Ele o fizera assim naquele dia revigorante e claro de outubro, com sua habitual eloqncia e hipocrisia. Fora um longo discurso uma de suas oraes pblicas mais compridas , mas no final, aps mais de uma hora de tpicas distores da histria e de um relato jactancioso dos feitos das armas alems na Polnia (este ridculo Estado), chegou s propostas de paz e s razes para isso.

    Meu principal esforo tem sido libertar nossas relaes com a Frana de todos os traos de m vontade e torn-las tolerveis para ambas as naes (...) A Alemanha nada mais pretende contra a Frana (...) Recusei at mesmo mencionar o problema da Alscia-Lorena (...) Sempre manifestei Frana meu desejo de sepultar, de uma vez por todas, nossa

    * Mussolini no compartilhou da confiana de Hitler na vitria, que Ciano lhe comunicara. Achava que os ingleses e os franceses "resistiriam firmemente (...) Por que escond-lo?" Ciano escreveu em seu

    dirio, em 3 de outubro: "Ele (Mussolini) est um tanto ressentido com a sbita expanso da fama de Hitler." (Ciano Diaries, p. 155).

  • SITZKRIEG NA FRENTE OCIDENTAL 4 1

    antiga inimizade e reunir esses dois pases, ambos os quais encerram um passado to glorioso (...)

    E a Inglaterra?

    No menores tm sido meus esforos para chegar a um entendimento anglo-germnico, ou antes, mais do que isso, concretizao das amizades anglo-germnicas. Em tempo algum e em lugar algum agi contra os interesses ingleses (...) Acredito que mesmo hoje em dia s poder haver verdadeira paz na Europa e em toda parte do mundo se a Alemanha e a Inglaterra chegarem a um entendimento.

    E a paz?

    Por que se deveria travar esta guerra no Ocidente? Para restaurao da Polnia? A Polnia do Tratado de Versalhes jamais se erguer novamente (...) A questo do restabelecimento do Estado polons um problema que no ser solucionado pela guerra no Ocidente, porm exclusivamente pela Rssia e pela Alemanha (...) Seria insensato aniquilar milhes de homens e destruir propriedades valendo milhes a fim de reconstruir um Estado que, na prpria ocasio em que nasceu, foi tachado de aborto por todos aqueles que no eram de origem polonesa.

    Que outras razes existem?

    Se se deve realmente travar esta guerra somente para dar Alemanha um novo regime (...) ento milhes de vidas sero sacrificados inutilmente (...) No, esta guerra no Ocidente no poder solucionar nenhum problema (...)

    Havia problemas para serem resolvidos. Hitler apresentou toda uma lista deles: formao de um Estado polons (que ele j tinha concordado com os russos que no devia existir); acomodao e soluo do problema judaico; colnias para a Alemanha; restaurao do comrcio internacional; garantia de uma paz

  • 42 A GUERRA: PRIMEIRAS VITRIAS E O MOMENTO DECISIVO

    incondicional; reduo dos armamentos; regulamentao da guerra area, gases venenosos, etc.; e soluo dos problemas das minorias na Europa.

    Para atingir esses grandes objetivos ele props uma conferncia das principais naes europias depois da mais perfeita preparao.

    impossvel [continuou ele] que tal conferncia, que tem por fim determinar o destino deste continente para muitos anos vindouros, possa levar a efeito suas deliberaes enquanto os canhes estiverem troando ou os exrcitos mobilizados estiverem fazendo presso para exercer influncia sobre ela.Se, porm, esses problemas devem ser solucionados logo ou mais tarde, ento mais sensato atacar a soluo antes que se enviem para a morte intil milhes de homens, e que se destruam incomensurveis riquezas. Inconcebvel a continuao do presente estado de coisas no Ocidente. Dentro em pouco, cada dia que passar ir exigir sacrifcios cada vez maiores (...) A riqueza nacional da Europa ser dissipada em forma de granadas, e o vigor de todas as naes, debilitado nos campos de batalha (...)Uma coisa certa. Jamais houve, no curso da histria do mundo, dois vencedores; quase sempre, porm, somente perdedores. Oxal esses povos e seus lderes, que so da mesma opinio, dem agora sua resposta. E deixemos que aqueles que consideram a guerra a melhor soluo rejeitem a mo que agora estou estendendo.

    Ele estava pensando em Churchill.

    Mas, se as opinies de Churchill e seus adeptos prevalecerem, esta minha declarao ter sido a ltima que fao. Ento lutaremos (...) No haver outro novembro de 1918 na histria da Alemanha.

    Parecia-me altamente duvidoso, conforme escrevi em meu dirio, ao voltar do Reichstag, que os ingleses e franceses dessem, durante cinco minutos, ouvidos quelas vagas propostas. Mas os alemes se mostraram otimistas. A caminho para a estao de rdio, naquela noite, adquiri um exemplar da edio matinal do jornal de Hitler, o Vlkischer Beobachter. Os flamejantes ttulos diziam:

  • SITZKRIEG NA FRENTE OCIDENTAL 4 3

    D e s e jo s d e p a z d a A l e m a n h a N e n h u m d e s g n io d e g u e r r a

    CONTRA A FRANA E A INGLATERRA NENHUMA OUTRA REVISO DAS

    PRETENSES, EXCETO AS RELATIVAS S COLNIAS REDUO DOS AR

    MAMENTOS C o o p e r a o c o m t o d a s a s n a e s d a E u r o p a

    PROPOSTA DE UMA CONFERNCIA.

    Sabe-se agora, pelos documentos secretos alemes, que a Wilhelmstrasse se sentiu encorajada a acreditar, pelos relatrios que recebia de Paris dos embaixadores italiano e espanhol ali, que os franceses no se mostravam inclinados a continuar a guerra. J em 8 de setembro, o embaixador espanhol informara aos alemes que Bonnet est se esforando para conseguir um entendimento assim que ficarem concludas as operaes na Polnia, dada a grande impopularidade da guerra, na Frana. H certas indicaes de que ele se acha em contato com Mus- solini para esse fim.17

    Em 2 de outubro, Attolico entregou a Weizscker o texto da ltima mensagem do embaixador italiano em Paris, a qual afirmava que a maioria dos membros do gabinete francs era a favor de uma conferncia de paz e que a questo girava agora, principalmente, em torno de possibilitar Frana e Inglaterra salvaguardarem seu prestgio. Ao que parecia, porm, o primeiro-ministro Daladier no fazia parte dessa maioria.*18

    Via-se a uma bela argcia. Em 7 de outubro, Daladier respondeu a Hitler. Declarou que a Frana no deporia as armas enquanto no obtivesse garantia de uma paz verdadeira e segurana geral. Mas Hitler mostrou-se mais interessado em receber notcias de Chamberlain do que do primeiro-ministro francs. Em 10 de outubro, por ocasio de um breve discurso no Palcio dos Esportes, para a inaugurao do Auxlio de Inverno, ele novamente acentuou sua boa vontade para estabelecer a paz. A Alemanha, acrescentou, no tem motivos para uma guerra contra as potncias ocidentais

    A resposta de Chamberlain chegou em 12 de outubro. Foi uma ducha fria para o povo alemo, seno para Hitler.** Dirigindo-se Cmara dos Comuns, o

    * Pouco depois, era 16 de novembro, os italianos comunicaram aos alemes que, segundo informaes recebidas de Paris, "considera-se o marechal Ptain advogado de uma poltica de paz na Frana

    (...) Se a questo da paz se tornar mais aguda em Frana, Ptain vir a exercer um grande papel".19 Isso

    parece ser a primeira indicao, para os alemes, de que Ptain talvez lhes viesse a ser til mais tarde.

    ** No dia anterior, 11 de outubro, ocorreu em Berlim uma desordem relacionada paz. Pela manh, um

    comunicado no rdio de ondas longas de Berlim anunciava que o governo britnico havia cado e que

  • 44 A GUERRA: PRIMEIRAS VITRIAS E O MOMENTO DECISIVO

    primeiro-ministro declarou serem vagas e incertas as propostas de Hitler, observando que elas no contm sugestes para corrigir os males feitos Tchecos- lovquia e Polnia. No se podia confiar nas promessas do atual governo alemo, disse ele. Se o governo alemo desejava a paz, que apresentasse atos e no somente palavras. Exigiu que Hitler desse provas convincentes de que desejava realmente a paz.

    O homem de Munique no se ludibriaria mais com as promessas de Hitler. No dia seguinte, 13 de outubro, uma declarao oficial alem dizia que Chamberlain, ao rejeitar a proposta de paz de Hitler, havia deliberadamente escolhido a guerra. O ditador nazista tinha, agora, sua desculpa.

    Na verdade, como agora sabemos pelos documentos capturados dos alemes, Hitler no esperou pela resposta do primeiro-ministro para ordenar os preparativos para um ataque imediato no Ocidente. Em 10 de outubro, reuniu os chefes militares, leu-lhes um longo memorando sobre a situao da guerra e do mundo, e lanou a Diretiva ne 6 para a orientao da guerra.20

    O fato de o Fhrer insistir, no fim de setembro, em que se preparasse um ataque no Ocidente o mais breve possvel, deixou o Alto-Comando do exrcito surpreso. Brauchitsch e Halder, auxiliados por vrios outros generais, uniram-se para provar-lhe que uma ofensiva imediata estava fora de questo. Levaria vrios meses, disseram, para que os tanques usados na Polnia pudessem ser readaptados. O general Thomas forneceu cifras para demonstrar que a Alemanha, mensalmente, registrava um dficit de 600 mil toneladas de ao. O general von Stlpnagel, chefe do servio de intendncia do exrcito, informou que havia munies disponveis apenas para cerca de um tero de nossas divises, para quatorze dias de combate o que, certamente, no era suficiente para ganhar uma batalha contra a Frana. O Fhrer no deu ouvidos ao comandante-em-chefe do exrcito e ao chefe do Estado-maior geral quando eles lhe apresentaram um relatrio formal sobre as deficincias do exrcito em 7 de outubro. O general Jodl, principal patente do OKW, depois de Keitel, preveniu Halder de que se estava esboando uma crise muito sria por causa da oposio do exrcito a uma ofensiva no Ocidente, e que o Fhrer estava irritado porque os generais alemes no lhe obedecem.

    haveria logo um armistcio. A capital berlinense rejubilou-se ao se espalhar esse rumor. Mulheres j de idade, nas feiras, tomadas de alegria, atiraram suas cestas para o ar, destruram suas barracas e dirigiram-se para o bar mais prximo a fim de brindar a paz com schnaps.

  • SITZKRIEG NA FRENTE OCIDENTAL 4 5

    Foi nesse cenrio que Hitler convocou os generais s llh, em 10 de outubro. No lhes foi pedido que dessem opinio. A Diretiva n2 6, datada da vspera, disse- lhes o que deviam fazer:

    SECRETSSIMO

    Caso se torne aparente em faturo prximo que a Inglaterra e, com sua liderana, tambm a Frana, no esto dispostas a dar paradeiro guerra, estou decidido a agir vigorosa e agressivamente sem grande demora (...)Por conseguinte, dou as seguintes ordens:

    a Devem ser feitos preparativos para uma operao de ataque (...) nas reas de Luxemburgo, Blgica e Holanda. Esse ataque deve ser realizado (...) o mais cedo possvel.b O objetivo ser derrotar fortemente uma parte do exrcito de operaes da Frana e dos Aliados que combatem a seu lado, e, ao mesmo tempo, conquistar uma rea to grande quanto possvel na Holanda, na Blgica e no norte da Frana, como base para realizarmos uma promissora guerra area e martima contra a Inglaterra (...)Peo aos comandantes-em-chefe que me dem, o mais breve possvel, minuciosos relatrios sobre seus planos com base nesta diretiva, e me mantenham constantemente informado (...)

    O memorando secreto, tambm datado de 9 de outubro, que Hitler leu para os chefes militares antes de apresentar-lhes a diretiva, constitui um dos documentos mais impressionantes que o antigo cabo austraco escreveu. Mostrou no s domnio da histria, do ponto de vista alemo, e de estratgia e ttica militares, o que notvel, como tambm o que se provaria mais tarde a noo proftica de como a guerra se desenvolveria no Ocidente e com que resultados. A luta entre a Alemanha e as potncias ocidentais que disse ele vinha prosseguindo desde a dissoluo do Primeiro Reich alemo pelo Tratado de Mnster (Vestflia), em 1648, teria que ser resolvida de um modo ou de outro. Aps a grande vitria na Polnia, contudo, no haveria objeo em terminar a guerra, contanto que as conquistas na Polnia no ficassem comprometidas.

  • 46 A g u e r r a : p r im e ir a s v it r ia s e o m o m e n t o d e c is iv o

    No objeto deste memorando examinar as possibilidades nessa direo ou mesmo lev-las em considerao. Limitar-me-ei exclusivamente ao outro caso: a necessidade de continuar a luta (...) O alvo da guerra alem destruir militarmente o Ocidente, isto , destruir a fora e a capacidade das potncias ocidentais de novamente poderem opor-se consolidao do Estado e ao novo desenvolvimento do povo alemo na Europa.No que tange ao mundo exterior, esse alvo eterno ter de sofrer vrios ajustes para propaganda (...) Isso no alterar o objetivo da guerra. e ser a destruio de nossos inimigos ocidentais.

    Os generais tinham se oposto a apressar a ofensiva no Ocidente. O tempo, porm, favorecia o inimigo, disse-lhes ele. Lembrou-lhes que as vitrias na Polnia foram possveis porque a Alemanha, na verdade, teve apenas um front. Prevalecia ainda essa situao (...) mas por quanto tempo ainda?

    No se pode assegurar neutralidade duradoura com a Rssia sovitica, com tratados ou pactos. Presentemente, o bom senso no admite que a Rssia abandone sua neutralidade. Daqui a oito meses, um ano ou mesmo vrios anos, isso talvez fique alterado. Tem-se provado, nos ltimos anos, da parte de todos, o valor insignificante dos tratados. A maior proteo contra qualquer ataque russo est (...) numa demonstrao imediata do poderio alemo.

    Quanto Itlia, a esperana do apoio italiano Alemanha dependia, em grande parte, de Mussolini viver e de haver novos xitos alemes para atrair o Duce. Nisso, o tempo constitua tambm um fator, como o era para a Blgica e a Holanda, as quais podiam ser obrigadas pela Inglaterra e pela Frana a renunciar sua neutralidade coisa que para a Alemanha no convinha esperar. Mesmo em relao aos Estados Unidos, tinha de se considerar o tempo como trabalhando contra a Alemanha.

    Havia grandes perigos para a Alemanha, admitiu Hitler, numa guerra longa. Enumerou vrios deles. Os neutros amistosos e inamistosos (parece que se referia principalmente Rssia, Itlia e aos Estados Unidos) poderiam ser atrados para

  • SITZKRIEG NA FRENTE OCIDENTAL 47

    o lado oposto, como na Primeira Guerra Mundial. Alm disso continuou a base limitada de alimentos e matrias-primas da Alemanha faria que se tornasse difcil encontrar os meios para levar avante a guerra. O maior perigo, disse ele, estava na vulnerabilidade do Ruhr. O ataque a esse centro da produo industrial alem acarretaria o colapso da economia de guerra da Alemanha e, portanto, de sua capacidade de resistir.

    Deve-se admitir que, nesse memorando, o antigo cabo demonstrou extraordinria compreenso de estratgia e ttica militares, se bem que fosse acompanhada de uma tpica falta de moral. H vrias pginas sobre a nova ttica desenvolvida pelos tanques e avies, na Polnia, e uma anlise minuciosa de como essa ttica podia surtir efeito no Ocidente e nos pontos devidos. O principal, declarou ele, era evitar a guerra de posies de 1914-1918. As divises blindadas devem ser usadas nas rupturas decisivas das linhas de defesa.

    Elas no devem perder-se por entre o labirinto de infindveis filas de casas nos centros das cidades belgas. No necessrio atacar os centros, porm (...) que mantenham o fluxo do avano do exrcito, impeam as linhas de frente de se tornarem estacionrias pelas investidas em massa nas posies fracamente defendidas.

    Era uma predio horrivelmente exata de como a guerra no Ocidente seria travada. Quando a lemos, admiramo-nos de que ningum, no lado dos Aliados, tivesse tido idntico discernimento.

    Segue-se tambm uma estratgia de Hitler: A nica possvel rea de ataque, disse ele, era atravs de Luxemburgo, Blgica e Holanda. Deveria haver em mente, primeiro, dois objetivos militares: destruir os exrcitos holandeses, belgas, franceses e britnicos e, com isso, conquistar posio no Canal e mar do Norte, dos quais a Luftwaffe pudesse ser empregada brutalmente contra a Inglaterra.

    Antes de tudo, disse, voltando questo ttica, improvisem!

    A natureza peculiar desta campanha talvez torne necessrio recorrer ao mximo improvisao, concentrando no ataque ou defendendo foras em certos pontos numa proporo acima da normal [por exemplo, foras de tanques ou antitanques] e, em concentrao anormal, em outras.

  • 48 A GUERRA: PRIMEIRAS VITRIAS E O MOMENTO DECISIVO

    Quanto ocasio do ataque, Hitler declarou a seus relutantes generais, nunca seria cedo demais para inici-lo. Quaisquer que fossem as circunstncias, tinha que realizar-se (se de todo possvel) neste outono.

    Os almirantes alemes, contrariamente aos generais, no tiveram necessidade de ser incitados por Hitler a tomar a ofensiva, no obstante a inferioridade da armada em relao britnica. De fato, no fim de setembro e nos primeiros dias de outubro, Rder pleiteou junto ao Fhrer que levantasse todas as restries que pesavam sobre a armada. Isso foi feito gradativamente. Em 17 de setembro, um submarino alemo torpedeou o porta-avies britnico Courageous a sudoeste da Irlanda. Em 27 do mesmo ms, Rder ordenou que os encouraados de bolso Deutschland e GrafSpee deixassem suas reas de espera e comeassem a atacar a navegao britnica. Em meados de outubro, eles destruram sete navios mercantes britnicos e apreenderam o navio americano City ofFlint.

    Em 14 de outubro, o submarino alemo U-47, comandado pelo tenente Gn- ther Prien, penetrou nas defesas aparentemente inacessveis de Scapa Flow, a grande base naval da Inglaterra, e torpedeou, pondo a pique, o encouraado Royal Oak que ali estava ancorado, com perda de 786 vidas entre oficiais e marinheiros. Foi um notvel xito, explorado ao mximo pelo dr. Goebbels em sua propaganda, o que enalteceu a marinha de guerra no esprito de Hitler.

    Os generais, porm, continuaram a ser um problema. A despeito do longo e meditado memorando que Hitler lhes endereou e a exposio da Diretiva ne 6, instando a que se preparassem para um ataque no Ocidente, procuraram ganhar tempo. No que tivessem escrpulos contra a violao dos territrios belga e holands; duvidavam, simplesmente, do xito naquela ocasio. Havia, porm, uma exceo.

    O general Wilhelm Ritter von Leeb, comandante do grupo C de exrcitos, que defrontava os franceses no Reno e ao longo da Linha Maginot, no s se mostrava ctico quanto vitria no Ocidente como tambm sozinho conforme revelam os documentos existentes se ops, pelo menos em parte e com fundamentos de ordem moral, a que se atacassem a Blgica e a Holanda, dada sua neutralidade. No dia que se seguiu conferncia de Hitler com os generais, 11 de outubro, Leeb preparou, ele mesmo, um longo memorando que enviou a Brauchitsch e outros generais. O mundo inteiro, escreveu ele, voltar-se-ia contra a Alemanha,

  • SITZKRIEG NA FRENTE OCIDENTAL 4 9

    que, pela segunda vez em 25 anos, ataca a Blgica! A Alemanha solenemente garantira e prometera preservar e respeitar essa neutralidade fazia poucas semanas!

    Finalmente, aps detalhar argumentos militares contra um ataque no Ocidente, fez um apelo em favor da paz. Toda a nao, disse ele, anseia pela paz.21

    Mas Hitler, a essa altura, ansiava pela guerra, pela batalha, e j no mais tolerava a atitude dos generais, que julgava imperdovel pusilanimidade. Brauchitsch e Halder, em 14 de outubro, reuniram-se para uma demorada conferncia. O chefe do exrcito via trs possibilidades: atacar; esperar para ver; mudanas fundamentais. Halder anotou-as em seu dirio nesse dia e, depois da guerra, explicou que as mudanas fundamentais significavam o afastamento de Hitler. Mas o fraco Brauchitsch considerou essa drstica medida essencialmente negativa e tendente a tornar-nos vulnerveis. Chegaram concluso de que nenhuma das trs possibilidades oferecia perspectivas de xitos decisivos. A nica coisa a fazer era continuar a ver o que se podia conseguir junto a Hitler.

    Brauchitsch visitou o Fhrer novamente em 17 de outubro, mas seus argumentos, contou ele a Halder, no surtiram efeito. A situao era desesperadora. Hitler disse-lhes secamente, conforme Halder escreveu em seu dirio nesse dia, que os ingleses estaro dispostos a conferenciar somente depois de uma surra. Precisamos atac-los o mais depressa possvel. A data: entre 15 e 20 de novembro, o mais tardar.

    Houve novas conferncias com o senhor supremo da guerra nazista, o qual traou, em 27 de outubro, as normas que os generais deviam seguir. Aps uma cerimnia, em que conferiu a 14 deles a comenda de Cavalheiro da Cruz de Ferro, o Fhrer passou logo a discorrer a respeito do ataque no Ocidente. Quando Brauchitsch procurou explicar que o exrcito s estaria preparado para isso dali a um ms, a 26 de novembro, Hitler respondeu que seria demasiado tarde. O ataque, ordenou ele, comearia em 12 de novembro. Brauchitsch e Halder retiraram-se da conferncia abatidos e derrotados. Nessa noite, procuraram consolar- se um ao outro. Brauchitsch acha-se cansado e descorooado, anotou Halder em seu dirio.

  • 50 A GUERRA: PRIMEIRAS VITRIAS E O MOMENTO DECISIVO

    A conspirao de Zossen para derrubar Hitler

    Chegara ento o tempo para os conspiradores entrarem mais uma vez em ao, ou assim pensaram eles. Os infelizes Brauchitsch e Halder viram-se diante de duas opes: ou levariam a efeito a terceira daquelas possibilidades que haviam examinado em 14 de outubro o afastamento de Hitler ou organizariam um ataque no Ocidente, que julgavam desastroso para a Alemanha. Os conspiradores militares e civis, que subitamente entraram em cena, aconselharam a primeira opo.

    J tinham deixado escapar uma oportunidade uma vez, desde que a guerra comeara. O general von Hammerstein, que havia muito estava afastado da ativa, fora novamente chamado para servir temporariamente, s vsperas do ataque Polnia. Foi-lhe dado um comando no Ocidente. Durante a primeira semana da guerra, ele insistiu para que Hitler visitasse o seu quartel-general a fim de mostrar-lhe que no estava negligenciando naquela frente, enquanto se conquistava a Polnia. Hammerstein, na verdade, era um implacvel adversrio de Hitler e planejava prend-lo. Fabian von Schlabrendorff, j havia informado confidencialmente Ogilvie Forbes sobre esse plano, no dia em que a Inglaterra declarou a guerra 3 de setembro num rpido encontro que tiveram no hotel Adlon, em Berlim. Mas o Fhrer, desconfiado de qualquer coisa, declinou do convite para aquela visita ao antigo comandante-em-chefe do exrcito, e logo depois destituiu-o.22

    Os conspiradores continuaram a manter contato com os ingleses. Tendo deixado de tomar qualquer medida para impedir que Hitler destrusse a Polnia, concentraram seus esforos no sentido de evitar que a guerra se espalhasse para o Ocidente. Os membros civis perceberam, mais do que nunca, que o exrcito era a nica organizao no Reich que possua os meios de deter Hitler; seu poder e importncia aumentaram enormemente com a mobilizao geral e com a vitria relmpago na Polnia. Mas a prpria expanso do exrcito, conforme Halder procurou explicar aos civis, constitua tambm um empecilho. As fileiras de oficiais ficaram repletas de elementos da reserva, muitos deles nazistas fanticos, e a massa das tropas achava-se completamente imbuda da doutrina nazista. Seria difcil, assinalou Halder era um grande personagem para salientar dificuldades quer a amigos quer a inimigos descobrir uma formao do exrcito na qual se pudesse confiar para um golpe contra o Fhrer.

  • SITZKRIEG NA FRENTE OCIDENTAL 51

    Houve outra considerao que os generais apontaram e que os civis compreenderam perfeitamente. Se preparassem uma revolta contra Hitler, a que se seguiria uma confuso no exrcito e no pas, no se aproveitariam os franceses e ingleses para atacar no Ocidente, ocupar a Alemanha e