Artigo_violencias

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¹Bacharel em Escultura e graduada em Licenciatura em Desenho e Plástica pela Escola de Belas Artes da UFMG - email: [email protected] AUTOBIOGRAFIA PROCESSUAL: violências Gilmara Oliveira¹ Resumo À margem da sociedade e destinados a serem esquecidos como toda situação de desconforto, os que optam por ser aquilo que lhes abrilhantam a alma são vistos como um problema a ser ignorado enquanto estiverem distantes, e agredidos quando muito próximos. Refletindo acerca destas questões, principalmente da violência por detrás, compartilho algumas vivências autobiográficas pensando-as como impulsionadoras das poéticas que, por vezes, representam um expurgo e ou alguma indagação, mas também funcionam enquanto ativadores memoriais do outro. Palavras-Chave: Violências, Diferença, Processo artístico. Abstract In the margins of society and are intended to be forgotten as every situation of distress, those who choose to be what brighten their souls are seen as a problem to be ignored while distant, and beaten when very close. Reflecting on these issues, especially violence behind, I share some autobiographical experiences considering them as the impetus in poetic that sometimes represent a purge and or any inquiry, but also function as activator Memorial other. Keywords: Violence, Difference, Artistic process Na arte contemporânea, principalmente em performance art, é comum alguns artistas exporem o próprio corpo à violência, como recurso para criações corporais viscerais como é o caso de Gina Pane (ITA) em Azione Sentimentale (1973) -, mas deparamos-nos também com as que expõem esta truculência apenas de maneira simbólica [como Ana Mendieta (CUB) em Rape Scene(1973)], o que, de qualquer forma, institui uma relação diferenciada com o público. Cito exemplos da década de 1970 porque são as referências que me vieram no momento da escrita, porém, na década atual, temos Eli Neira (CH), Wagner Rossi Campos (BR), dentre tantos outros que utilizam o corpo como instrumento político. A questão é que a arte atual vem se configurando como um reflexo da época desumana, violenta e de adoção da política do medo, em que estamos vivendo. Violência esta, bastante associada às questões da diversidade, já que a intolerância com o jeito de ser do outro, seja por questões religiosas, filosóficas e ou políticas é o que vem gerando tantas agressões (como se justificasse). Violentada sexualmente por um tio-avô na pré-adolescência, a abordagem de tal assunto no processo artístico seria óbvio enquanto expurgo poético; no entanto, qualquer tipo de violência merece não ser esquecido, mas sim debatido, sem mais truculência; e esta é a linha de pesquisa que, assim como tantos, escolho adotar não como algo fechado em si, mas como ativador. Segundo Seligmann-Silva, a arte, ao longo do século XX, assumiu um importante papel político na construção da identidade social, atuando como espaço de intensificação de afetos, de abertura a novas experiências sensíveis e de desalienação do corpo em relação ao mundo concreto, auxiliando na articulação memorial dos indivíduos como um convite ao enfrentamento, em

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Relato autobiográfico de processos artísticos ligados à questão da violência

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¹Bacharel em Escultura e graduada em Licenciatura em Desenho e Plástica pela Escola de Belas Artes da UFMG - email: [email protected]

AUTOBIOGRAFIA PROCESSUAL:

violências

Gilmara Oliveira¹

Resumo

À margem da sociedade e destinados a serem esquecidos como toda situação de desconforto, os que optam por ser aquilo que lhes abrilhantam a alma são vistos como um problema a ser ignorado enquanto estiverem distantes, e agredidos quando muito próximos. Refletindo acerca destas questões, principalmente da violência por detrás, compartilho algumas vivências autobiográficas pensando-as como impulsionadoras das poéticas que, por vezes, representam um expurgo e ou alguma indagação, mas também funcionam enquanto ativadores memoriais do outro.

Palavras-Chave: Violências, Diferença, Processo artístico.

Abstract

In the margins of society and are intended to be forgotten as every situation of distress, those who choose to be what brighten their souls are seen as a problem to be ignored while distant, and beaten when very close. Reflecting on these issues, especially violence behind, I share some autobiographical experiences considering them as the impetus in poetic that sometimes represent a purge and or any inquiry, but also function as activator Memorial other.

Keywords: Violence, Difference, Artistic process

Na arte contemporânea, principalmente em performance art, é comum alguns artistas exporem o

próprio corpo à violência, como recurso para criações corporais viscerais – como é o caso de

Gina Pane (ITA) em Azione Sentimentale (1973) -, mas deparamos-nos também com as que

expõem esta truculência apenas de maneira simbólica [como Ana Mendieta (CUB) em Rape

Scene(1973)], o que, de qualquer forma, institui uma relação diferenciada com o público. Cito

exemplos da década de 1970 porque são as referências que me vieram no momento da escrita,

porém, na década atual, temos Eli Neira (CH), Wagner Rossi Campos (BR), dentre tantos outros

que utilizam o corpo como instrumento político. A questão é que a arte atual vem se configurando

como um reflexo da época desumana, violenta e de adoção da política do medo, em que estamos

vivendo. Violência esta, bastante associada às questões da diversidade, já que a intolerância com

o jeito de ser do outro, seja por questões religiosas, filosóficas e ou políticas é o que vem gerando

tantas agressões (como se justificasse).

Violentada sexualmente por um tio-avô na pré-adolescência, a abordagem de tal assunto no

processo artístico seria óbvio enquanto expurgo poético; no entanto, qualquer tipo de violência

merece não ser esquecido, mas sim debatido, sem mais truculência; e esta é a linha de pesquisa

que, assim como tantos, escolho adotar – não como algo fechado em si, mas como ativador.

Segundo Seligmann-Silva,

a arte, ao longo do século XX, assumiu um importante papel político na construção da identidade social, atuando como espaço de intensificação de afetos, de abertura a novas experiências sensíveis e de desalienação do corpo em relação ao mundo concreto, auxiliando na articulação memorial dos indivíduos como um convite ao enfrentamento, em

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¹Gilmara Gonçalves Oliveira

contrapartida à tendência de negação e recalque frente à violência vigente (SELIGMANN-SILVA, 2014, p.30).

Concordo com Silva e penso que abordar este tema é como seguir à contramão de quem faz de

tudo para esquecer, e ou ignorar, as atrocidades diárias (e gosto deste lugar). Grande parte da

população evita pensar a respeito das milhares de outras que sofrem torturas e demais

violências, acreditando não serem da sua conta. Como cita Slavoj Zizek acerca do esquecimento

enquanto gesto de negação: “Sei, mas não quero saber o que sei, e por isso não sei” (ZIZEK,

2014, p.54). Mas isto ocorre apenas até que algum ente querido esteja envolvido, porque, neste

caso, a revolta cresce e a pessoa grita por justiça, já que esquecer é impossível.

Em vias de arte contemporânea e de convivências cada dia menos pacíficas e respeitosas,

conforme mencionado anteriormente, é natural que uma gama de artistas pelo mundo abordem

este tema em seu processo e que às vezes até repitam o que já foi feito; mas a maneira como é

apresentada(o) definirá o alcance e as leituras possíveis.

Como marco inicial de minhas investigações acerca da violência, de um modo geral, considero o

ano de 2009, quando alguns trabalhos bidimensionais foram apresentados por meio de coletivas,

apesar de dez anos antes (1999) já explorar o assunto de maneira mais erotizada, retratando atos

sexuais entre seres sem face - a pausa processual de uma década se deve ao período em que a

dedicação foi exclusiva à arte-educação (período do qual dissertarei brevemente mais adiante) -.

Em 2011 umas experimentações com bolhas de sabão pigmentadas deram início à aproximação

do universo da performance; pensava na agressão do estouro, proposital ou não, de algo tão

delicado, efêmero, que remetia ao feminino por sua forma, apesar de tantos olharem apenas

como confirmação das leis da física/química. Neste processo, colhia as marcas deixadas e nelas

intervia. A partir daí, o corpo em ação foi para o vídeo, num trabalho colaborativo com duas outras

artistas (Deise Oliveira e Eliana Magela), ambas de Belo Horizonte (MG), sob orientação da

performer nigeriana Otobong Nkanga, intermediada pelo CEIA 2012 – paixão pura foi o que

pulsou naquele momento de valorização do processo, do fazer. A partir daí, meu olhar se voltou

para a arte da ação, na certeza de que era o que queria seguir realizando, investigando,

vivenciando.

Quando falo em performance penso-a como uma junção de diversas linguagens artísticas, ou

não, onde o corpo torna-se o elemento principal na construção da poética desejada, e através da

qual uma ponte se abre frente ao espectador (passante ou público/plateia). Dewey acredita que o

juízo acerca da obra artística nasce da experiência de sua recriação no organismo de quem dela

provar (DEWEY, 2010, p.646), e a esta visão acrescento a minha de que o trabalho se completa

no entendimento do outro, claro que de distintas formas já que cada indivíduo terá uma leitura do

que fora apreciado. Dewey não se referia à performance especificamente, mas sim à arte de um

modo geral, porém me aproprio de suas palavras e a complemento por ver na linguagem que

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¹Gilmara Gonçalves Oliveira

investigo a potência libertária e unificadora da sociedade contemporânea (incluindo aí a parcela

mais conservadora e politicamente correta).

Numa pausa para dissertar sobre o vermelho, sua importância simbólica no cotidiano e no

processo artístico de quem vos fala nestas linhas, compartilho alguns adjetivos a que este matiz

me remete: sangue, vida, morte, corte, fraco, forte, vergonha, raiva, paixão, explosão, tesão,

tensão, fogo, bebida, sexo, espelho, pedra, porta, pentelho, cabelo, puta, cigana, pomba-gira,

luxúria, labuta, boca, menstruação, hemorroida, nudez, histeria, pecado, indumentária, fetiche,

perigo, pare,etc. Tudo isto pode ser óbvio, mas qual o problema de ser evidente em meio a uma

sociedade que tende ao esquecimento e banalização do que lhe é incômodo ou ditado como fora

da normalidade do que se entende por equilibrado e sereno? Penso que o reforço de algumas

questões/indagações sociais, políticas e sistêmicas na vida e na arte acerca do óbvio, banal,

aprimoram a capacidade de percepção pessoal e do outro, público, espectador, passante.

Sempre tive afinidade com o vermelho, apesar de ouvir quando criança, por parte de amigos e

alguns entes, que em minhas unhas ruídas ficavam como mãos de empregada doméstica – logo

retruco: qual o problema? Os pré-conceitos. Com o tempo larguei os esmaltes, pois os roia

também e permanecia apenas o vermelho das feridas nas cabeças arredondadas e gigantes

desta mão tida como nada feminina. Quando me permitiram, ousei me jogar nos batons – digo

quando me permitiram porque antigamente criança não podia usar tal cosmético -, mas, em

minhas bocas carnudas diziam só enxergar a boca, pela escolha do matiz rubro tão associado à

luxúria; o que fez com que me abafasse em tons de marrom, já que, na época, a opinião do outro

era de suma importância. Saí de casa aos dezessete anos para estudar Arte e, ao me deparar

com a política de que quase tudo era permitido (ainda mais distante dos olhares e julgamentos

alheios ao pensamento daquela cidadezinha), motivada pelas madeixas de Rita Lee, referência

de coragem e ousadia, fui do vermelho bordô ao tom ‘pequena sereia’ em meus cabelos e abusei

consideravelmente desta cor nos lábios e nas vestimentas.

Habituei-me aos comentários alheios e, quanto mais era provocada com apelidos e taxações,

sentia ainda mais conforto por não ser igual a tantos (me curei da necessidade de aprovação

alheia). Movia pela cidade sendo devorada pelo olhar do outro - ou seria possuída, lembrando

uma citação de Sartre? -. Tocha humana, pica-pau, vermelhinha, cabelo de fogo, Natasha,

doidona, Rita Lee (desta comparação gostava), Moranguinho, etc. A dificuldade em lidar com a

diversidade é característica e apesar da aprovação de uns poucos, a maioria afirma não ter

coragem ou sentir receio de não ser aceito, e que, sendo eu das artes a licença poética para ser

esquisita ou o que quer que queira (risos) era mais tranquilo. O fato é que é mais confortável ser

como os iguais do que como se é, ou se deseja ser, afinal, os diferentes ficam à margem da

sociedade como rebeldes sem causa, desajustados, seres a serem tratados, apagados ou

esquecidos – se for mulher, negra(o), trans, bi ou homossexual ainda por cima, piorou! E em

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todas estas situações de violência, porque é isto, visualizo o vermelho pulsante nos olhos de

quem julga e na face de quem é julgado.

Durante o período em que lecionava (1999-2009) os estereótipos eram recorrentes, mas ninguém

via isto como uma violência; apenas como algo que deveria tolerar devido à escolha de andar na

contramão do que acreditavam ser normal. Nas vivências ao longo dos dez anos nesta profissão

aprendi muito - mais com os alunos que com a equipe pedagógica (salvo raras exceções*). É que

os jovens têm a mente mais aberta à percepção das diferenças e conseguem trabalhar o respeito

com mais facilidade (*). Passei por onze diretorias distintas nas oito escolas em que lecionei, mas

a última, da escola particular em que fiquei por mais tempo, foi a mais marcantemente frustrante

devido à sua forma de manipular, constranger e intimidar as pessoas. Com ela, foi necessário de

cobrir as tatuagens a evitar o vermelho dos cabelos – me disse, logo que assumiu o cargo, que

não achava pertinente para o ambiente pedagógico minhas tatuagens, pelo fato de ser eu

formadora de opiniões, e que deveria passar a cobri-las (questionei em vão e acatei a contragosto

pra não perder o emprego); já quanto ao cabelo, foi num momento em que dei uma pausa de

tintura rubra e ela me disse que havia ficado ótimo pra mim e que eu não precisava voltar para o

vermelho – surtei mas acreditava, até então, precisar daquele trabalho - naquele ano, as

madeixas foram roxas, azuis, pretas, mel, laranja (menos vermelho) e depois me afastei do cargo

vítima de depressão. No período de reclusão, percebi que minha trajetória como arte-educadora

havia chegado ao fim, e que era a hora da retomada de meu processo artístico – chutei tudo pro

alto e reatei com o vermelho. Os ex-alunos que encontro em eventos artísticos, em movimentos

de ocupação pela cidade, e em ONGs culturais, são o que tenho de mais caro enquanto

lembrança deste período em que intentava formar jovens criativos e pensantes; no mais, viro a

página.

Segundo a educadora da UFBA, Edméa dos Santos,

o respeito à diversidade é uma forma de garantir que a cidadania seja exercida e os vínculos sociais fortalecidos. Trata-se de uma atitude política para com a diversidade gerada pelas diferenças de classe, gênero, etnia, opção sexual, capacidades, enfim, de atributos que fazem parte da identidade pessoal e definem a condição do sujeito na cultura e na sociedade. O desenvolvimento de atitudes de tolerância e respeito à diversidade tem a ver com o direito à educação, o direito à igualdade de oportunidades e o direito à participação na sociedade (SANTOS, s/d, p.3);

e penso ainda, que para que este respeito seja trabalhado, a recorrência de ações artísticas que

abordem tais questões, tantas vezes vistas como mero enfrentamento, devam continuar

coexistindo nos espaços possíveis, que não necessariamente precisam ser um cubo branco

(vulgo galeria).

Inicialmente, a retomada do vermelho veio de forma moderada em alguns trabalhos

bidimensionais e somente após o período de investigação com as bolhas de sabão pigmentadas

(já citadas) foi que explodiu gritantemente. Ao encontrar a performance enquanto caminho poético

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possível este matiz domina enquanto expurgo de agressões vivenciadas outrora e oferta de

afetos em alguns casos. Inúmeras ações foram realizadas neste contexto e com esta cor no

domínio das construções imagéticas de 2012 a 2014, mais especificamente até o dia 10 de

outubro de 2014 – data em que foi realizada a ação ‘Liber[t]a’ (Fig. 1) pelo Perpendicular Bienal,

na 31ª Bienal de Arte de São Paulo, sob curadoria e convite do artista Wagner Rossi -. Durante

esta última performance em que o vermelho se fez presente, retiro todo o cabelo nesta cor e

distribuo-o aos presentes como forma de partilha da energia que representa e o é. Após o término

da mesma, uma amiga artista que estava presente e também participando do evento

(Perpendicular) veio compartilhar um fato emocionante comigo, que ocorreu enquanto estava em

ação – uma criança de dez anos que assistia à performance junto a um grupo de colegas de

escola, disse a ela, após ser questionada sobre o que estaria havendo ali, que o que se passava

era pra mostrar que as mulheres são muito mais que só cabelo (o lacrimejar dos olhos e o arrepio

na espinha foram inevitáveis, fazendo reacender a esperança no futuro da humanidade). Após

saber disso, a decisão de manter a careca por um tempo me soou como necessário; assim, a

violência dantes representada pelo matiz rubro passa a se dar na ausência. A ausência de pelos,

a ausência de cor - que opto por definir como P&B – e a ausência de novas propostas. Releitura

autobiográfica passa a ser o termo que define de maneira pessoal esta nova etapa processual.

“Liber[t]a” – Gilmara Oliveira – Performance - Registro fotográfico: Eli Neira - Perpendicular Bienal – 31ª Bienal

Internacional de Arte de São Paulo – São Paulo (SP) – Brasil – 2014.

Sobre as vivências com esta careca no cotidiano vejo bem próximas às experimentadas com o

vermelho no que concerne ao olhar do outro. Chamam-me carequinha, perguntam acerca do

câncer, indagam se entrei pro Candomblé e virei Santo, se me tornei lésbica ou bi, e até se sou

mulher traíra de bandido (risos). Mas o julgamento mais surreal foi por parte de um pedagogo, de

uma ONG na qual ministro oficinas semanalmente, que quando me viu de cabeça raspada,

perguntou o que meu esposo e filhos achavam da mudança. Até aí estava ótimo; eu o respondi

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dizendo que meu companheiro não questionava minhas escolhas e que tanto ele como meus

filhos, por conviverem comigo diariamente e já estarem a par da performance, não enfrentaram o

estranhamento que as demais pessoas poderiam vir a ter; mas que, de qualquer forma, toda

mudança levava um tempo para se acostumar. Então, o sujeito me pediu desculpas e fez a

pergunta fatal, que queimou-me o estômago: “- e.... seu filho adolescente, dá trabalho como os

meninos que cumprem medida sócio-educativa aqui? É que olhando para você toda tatuada, e

com um visual tão exótico, a gente imagina que seu filho seja um perdido (e tornou a pedir

desculpas); respirei bem fundo pra não soltar o dragão que cresceu dentro de mim naquele

momento, sorri e respondi apenas que ele estava sendo preconceituoso ao me julgar pela

aparência e que muito me admirava isto vir de um pedagogo, mas, respondendo à pergunta, meu

filho não me dá este tipo de trabalho pois o diálogo está bem presente em nossa relação (pedi

licença e saí dizendo que iria ajeitar a sala de oficina para receber a turma).

O fato é que ser o que se é ou se está a fim de ser quando isto implica em um desvio do padrão é

sempre visto como um problema a ser questionado e ou resolvido, e, se não é possível, agredir-

vos-ei; afinal de contas, para uma maioria, nem seu corpo é seu.

É preciso promover a diversidade enquanto valor social e não enquanto desigualdade, apesar da

dificuldade de alguns indivíduos com a ruptura da hegemonia dos iguais vigente há anos em

nossa sociedade. Não tenho a receita pronta de como fazê-lo, mas acredito que a arte da

performance seja um excelente instrumento de provocação da reflexão e discussão acerca do

assunto. Todos somos diferentes, não havendo, a meu ver, um parâmetro de normalidade para

apontamento do que foge ao padrão de grupos ou indivíduos – ainda mais em se tratando de

século XXI, onde as identidades são construídas nas vivências do mundo globalizado e apenas

alguns poucos ainda se permitem serem moldados nas tradições familiares - . Acredito ainda, que

a singularidade do outro esteja na construção que cada ser ou grupo constrói visualmente e ou

mentalmente segundo suas bagagens e tradições; portanto é o respeito que necessita ser

exaltado enquanto conduta.

No mais, sigo com minhas análises acerca das violências presentes na sociedade, nesta fase de

releituras, me deixando guiar pelas energias que pulsam e agitam querendo sair, se reconfigurar,

questionar o que para tantos se tornou banal e digno de ser ignorado, em prol de cuidar da

própria vida (que já não é fácil).

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

DEWEY, John. Arte como Experiência; trad. Vera Ribeiro; São Paulo: MARTINS FONTES,

2010, p.646.

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¹Gilmara Gonçalves Oliveira

ZIZEK, Slavoj. Violência: seis reflexões laterais; trad. Miguel Serras Pereira; São Paulo:

BOITEMPO, 2014, p. 54.

SELIGMANN-SILVA, Márcio. A Arte como Inscrição da Violência – Resistência da Memória em

uma Era Pós-Histórica. Revista Brasileira de Cultura - Cult. São Paulo, n. 197, p. 30, dez. 2014.

SANTOS, Edméa Oliveira dos. Políticas Públicas para a Educação Brasileira: Diversidade e

Inclusão na Escola - Aspectos Gerais. Moodle/UFBA. Sem data. Disponível em:

<http://goo.gl/k3mCkf>. Acesso em: 26 Mar. 2015.