AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE...

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1 EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA _____ VARA DA FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE PONTA GROSSA - PARANÁ “O cuidado como modo-de-ser perpassa toda existência humana e possui ressonâncias em diversas atitudes importantes. Através dele as dimensões de céu (transcendência) e as dimensões de terra (imanência) buscam seu equilíbrio e co- existência. Realiza-se também no reino dos seres vivos, pois toda vida precisa de cuidado, caso contrário adoece e morre” (Leonardo Boff. Saber Cuidar: ética do humano - compaixão pela Terra. Petrópolis: Vozes, 1999) O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ, por seu Promotor de Justiça signatário, em exercício na Promotoria de Justiça de Defesa da Saúde Pública da Comarca de Ponta Grossa, vem respeitosamente, perante Vossa Excelência, com base nos artigos 127, ‘caput’, 129, inciso II e III, 196 e 197, todos da Constituição Federal; art. 1º, II e IV, art. 5º, § 5º e 21, todos da Lei 7.347/85, art. 25, IV, “a”, da Lei nº 8625/93 no exercício de suas atribuições constitucionais e, combinados com o artigo 282, do Código de Processo Civil e demais legislações aplicáveis ao caso, propor a presente: AÇÃO CIVIL PÚBLICA COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA

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EXCELENTÍSSIMO SENHOR DOUTOR JUIZ DE DIREITO DA ___ __ VARA DA

FAZENDA PÚBLICA DA COMARCA DE PONTA GROSSA - PARANÁ

“O cuidado como modo-de-ser perpassa toda existência humana e possui ressonâncias em diversas atitudes importantes. Através dele as dimensões de céu (transcendência) e as dimensões de terra (imanência) buscam seu equilíbrio e co-existência. Realiza-se também no reino dos seres vivos, pois toda vida precisa de cuidado, caso contrário adoece e morre” (Leonardo Boff. Saber Cuidar: ética do humano - compaixão pela Terra. Petrópolis: Vozes, 1999)

O MINISTÉRIO PÚBLICO DO ESTADO DO PARANÁ ,

por seu Promotor de Justiça signatário, em exercício na Promotoria de Justiça de Defesa da

Saúde Pública da Comarca de Ponta Grossa, vem respeitosamente, perante Vossa

Excelência, com base nos artigos 127, ‘caput’, 129, inciso II e III, 196 e 197, todos da

Constituição Federal; art. 1º, II e IV, art. 5º, § 5º e 21, todos da Lei 7.347/85, art. 25, IV,

“a”, da Lei nº 8625/93 no exercício de suas atribuições constitucionais e, combinados com

o artigo 282, do Código de Processo Civil e demais legislações aplicáveis ao caso, propor a

presente:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA

COM PEDIDO DE ANTECIPAÇÃO DE TUTELA

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em face do ESTADO DO PARANÁ, pessoa jurídica de direito público, ente representado,

para fins judiciais, pelo Excelentíssimo Senhor Procurador-Geral do Estado, a ser citado na

Rua Conselheiro Laurindo, nº 561, Centro, no Município de Curitiba; e do MUNICIPIO

DE PONTA GROSSA, pessoa jurídica de direito público, representado, para fins judiciais,

pelo Excelentíssimo Senhor Prefeito Municipal, a ser citado na Avenida Visconde de

Taunay 950, Bairro Ronda, no município de Ponta Grossa, pelos seguintes fundamentos

fáticos e jurídicos.

1. DOS FATOS

No curso do Inquérito Civil MPPR nº 0113.02.000012-2,

apurou-se que pessoas portadoras de transtornos mentais residentes no Município de Ponta

Grossa, não vem recebendo do Poder Público a assistência médica devida.

Tal procedimento teve seu início em 11 de abril de 2002 a

partir da juntada de relatórios da instituição Recanto Maria Dolores, acolhedora de pessoas

com distúrbios mentais de 0 a 18 anos, a qual estava com grande número de jovens com

mais de 18 (dezoito) anos, sem ter estrutura para mantê-los. Porém, esforçando-se em

abriga-los, tendo em vista a ausência de convívio com a família.

Oficiada a responsável pela Fundação Promover acerca do

número de pessoas necessitando de eventual institucionalização, esta respondeu que

embora seja procurada diariamente por pessoas e familiares para este fim, não possuíam os

referidos dados, tendo em vista que na medida que surge a procura, tenta encaminhar as

pessoas as instituições.

Insta mencionar, que os relatórios apresentados pelas

entidades sociais, relatam a situação caótica do tratamento de saúde mental na cidade de

Ponta Grossa, inclusive solicitando medidas para resolver a questão, tais como implantação

do Programa Residência Terapêutica.

O Ministério Público na tentativa de solucionar a questão de

modo cordial, reportou a situação precária ao Prefeito Municipal, expondo a dificuldade

pela qual as pessoas portadoras de transtornos mentais, com idade igual ou maior de18

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(dezoito) anos, encontram no que tange a falta de instituições com estruturas próprias para

recebê-los, conforme fls. 38/40.

O referido pedido de providências desta Promotoria de

Justiça possuiu a finalidade de juntos, Ministério Público e Prefeitura Municipal, através de

esforços mútuos, buscar um modelo mais humano e garantidor dos direitos fundamentais

das pessoas portadores de transtorno mental a partir de programas como residências

terapêuticas, onde os pacientes poderiam desenvolver suas atividades, consoante determina

a Lei 10.216\2001.

Cumpre destacar que o oficio oriundo do Ministério Público,

solicitando providências para a implementação de uma politica adequada de saúde mental,

onde uma das medidas eficazes diz respeito a criação de residências terapêuticas foi

enviado em 25 de junho de 2005. Ocorre que somente foi respondido pelo Prefeito

Municipal em 02 de abril de 2008, após várias reiterações, demonstrando assim o descaso

com a saúde mental dos pacientes residentes no Município de Ponta Grossa.

É sabido que com o fechamento do Hospital Psiquiátrico

Franco da Rocha, em 2004, o atendimento médico psiquiátrico passou a ser realizado junto

ao Pronto Socorro Municipal, o qual presta tal atendimento em desacordo com o que

apregoa a política nacional de saúde mental.

Vale dizer, que o atendimento prestado pelo Pronto Socorro é

deficiente por falta de estrutura e atendimento técnico, visto que não se trata de um hospital

psiquiátrico, muito menos possui corpo clinico especializado em psiquiatria. Aliás, não

possui nem ala psiquiátrica em sua estrutura física.

O artigo 3º da lei 10.216\01, apregoa o atendimento de

pessoas portadoras de doença mental em hospital adequado para bem atende-los, o que não

se verifica na região de Ponta Grossa, pois todos os pacientes com surtos acabam sendo

internados no próprio Pronto Socorro, o qual é o único capaz de junto a Central de Leitos

solicitar vaga em local adequado, os quais se situam na cidade de Curitiba. Dessa forma, os

atendimentos prestados neste Município não são feitos em estabelecimento de saúde

mental:

Art. 3º. É responsabilidade do Estado o desenvolvimento da política de saúde mental, a assistência e a promoção de ações

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de saúde aos portadores de transtornos mentais, com a devida participação da sociedade e da família, a qual será prestada em estabelecimento de saúde mental, assim entendidas as instituições ou unidades que ofereçam assistência em saúde aos portadores de transtornos mentais.

O presente inquérito civil foi instaurado no ano de 2002,

verifica-se assim, que mais de 10 (dez) anos se passaram e a situação continua a mesma, se

não mais precária, pois durante todo esse tempo, o Ministério Público diligenciou no

sentido de conseguir de forma acordada a implantação do Programa Residência

Terapêutica, com a estrutura completa para regular e desenvolvimento de todas as suas

atividades.

Contudo, todas as formas de buscar solucionar a questão de

forma conjunta e harmoniosa com os gestores municipal e estadual, restou-se insatisfatória,

uma vez que ambos em nenhum momento trouxeram medidas concretas para fazer

funcionar o programa residência terapêutica.

Verifica-se que na data de 02 de abril de 2008, conforme fls.

48, o Prefeito Municipal à época dos fatos, afirmou que não existia financiamento do

Ministério da Saúde para manutenção do programa Residência Terapêutica. Ainda aduziu

que a implantação do programa CAPS III estava em tramite no Ministério da Saúde para

autorização, porém até a presente data não foi implantado no Município de Ponta Grossa.

Também, foi apresentado pelo Prefeito Municipal o relatório

de atividades no que tange o tratamento de saúde mental em Ponta Grossa, consoante fls.

50\170, não havendo em nenhuma das atividades trazidas, o projeto para criação das

Residências Terapêuticas.

O Ministério Público em 26 de novembro de 2010, solicitou

informações atualizadas acerca do programa Residência Terapêutica, obtendo como

resposta a ausência de implantação pelo referido Município.

Oficiado o Secretário de Estado de Saúde, este informou às

fls. 207, o interesse do Estado do Paraná em implantar o programa Residência Terapêutica

no Município de Ponta Grossa. Todavia, passados mais de 02 (anos) do oficio, nada foi

implantado.

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Na oportunidade, renovamos que desde o mês de abril de

2002 até o mês de fevereiro de 2013, absolutamente nada foi realizado por parte do

Município de Ponta Grossa e pelo Estado no Paraná em relação a implantação do Programa

Residência Terapêutica.

Além de vários ofícios no sentido de encontrar motivos

razoáveis que justificassem a ausência de implantação do programa residência terapêutica

em Ponta Grossa, preocupou-se esta Promotoria de Justiça acerca da destinação das verbas

repassadas pelo Estado do Paraná aos hospitais psiquiátricos, no caso o antigo Franco da

Rocha.

Dessa forma, por várias vezes tentou-se saber se o Município

de Ponta Grossa estava recebendo verba estadual, antes repassada ao Hospital Franco da

Rocha, a fim de manter o tratamento de saúde mental dos pacientes do Município de Ponta

Grossa.

Todavia, todas as respostas da Secretaria de Estado de Saúde

foram insuficientes, pois em nenhum momento apresentou a destinação de tal verba ao

Município, apenas ressaltava o interesse na manutenção de políticas que abranjam a saúde

mental.

Apesar, do interesse demonstrado pelo Secretário de Estado

de Saúde, nada foi feito para mudar o contexto, pois pessoas continuam sofrendo pela falta

de instituição adequada aos pacientes com transtornos mentais no Município de Ponta

Grossa e região.

Importante frisar que Ponta Grossa possui mais de

300.000,00 (trezentos mil) habitantes, sendo que a região dos Campos Gerais abrange além

do citado Município, muito outros, quais sejam: Castro, Palmeira, Lapa, Arapoti, Campo do

Tenente, Cândido de Abreu, Ipiranga, Jaguariaíva, Ortigueira, Piraí do Sul, Porto

Amazonas, Reserva, Telêmaco Borba, Tibagi, Carambeí, Imbaú, Ivaí, Imbituva, Teixeira

Soares, Sengés, Ventania e Prudentópolis. Assim, mais de 10 (dez) municípios dependem

do sistema de saúde do Município de Ponta Grossa, o qual é um polo regional.

Mais uma vez, indagou-se o Secretário Municipal de Saúde

às fls. 261, com relação aos incentivos financeiros dados ao CAPS AD pelo Estado do

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Paraná, sendo que em resposta, este informou que até a data de 28 de janeiro de 2013, não

houve repasse de verbas estaduais.

Assim sendo, a partir de toda documentação juntada,

igualmente analisando a realidade dos fatos através do número relevante de pessoas que

procuram esta Promotoria de Justiça, relatando casos de familiares ou terceiros com algum

distúrbio mental e causando algum tipo de risco próprio ou a terceiros, se evidencia a

precariedade de atendimento de saúde mental junto ao Pronto Socorro e aos CAPS – Centro

de atendimento Psicossocial.

.Ainda, com relação ao CAPS, recebemos a informação

através de ofícios da Coordenadoria, que este não realiza busca ativa para realização de

tratamento em pacientes avessos a desintoxicação, estando em desacordo com a Portaria

GM 336/2002.

Oficiado a Coordenadora do CAPS AD, no Procedimento

Preparatório nº 0113.12.000804-41, esta informa que não é atribuição do CAPS AD

realizar busca ativa em pacientes que não fazem tratamento no citado serviço, ou seja, o

portador de doença mental ou toxicômano no Município de Ponta Grossa que se encontra

desassistido continuará sem tratamento adequado, situação esta que se não fosse tão

preocupante seria até hilária por parte do gestor municipal.

Por fim, durante o longo caminho de averiguação quanto ao

tratamento de saúde mental na cidade de Ponta Grossa, meros 11 (onze) anos, ainda não

houve a implantação do Programa Residência Terapêutica, embora se tenha apurado a

insuficiência do CAPS no atendimento à pessoas portadoras de doença mental e a falta de

implantação do CAPS III.

Diante do exposto, observa-se que os atendimentos de saúde

mental não estão sendo prestados de forma integral e suficiente pelo Município de Ponta

Grossa, pois é fato notório que os CAPS não estão prestando satisfatoriamente os serviços,

uma vez que não possuem capacidade para atender às necessidades de moradia de pessoas

portadoras de transtornos mentais graves, institucionalizadas ou não, fazendo-se necessária

a propositura da presente Ação Civil Pública a fim de resguardar a aplicação da

Constituição Federal de 1988, especificamente no que tange à dignidade da pessoa humana,

fundamento do Estado Democrático Brasileiro e do Direito à Vida e à Saúde.

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2. A LEGITIMIDADE ATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO

A vida e a saúde são os direitos mais fundamentais do ser

humano e pressupostos de existência dos demais direitos, adequando-se na categoria de

direitos individuais indisponíveis, pelos quais zela o Ministério Público e devem ser

garantidos pelo Estado através de adequada prestação de serviços.

A Magna carta em vigor, ampliando o campo de atuação do

Ministério Público, em seu art. 127 prevê que “O Ministério Público é instituição

permanente, essencial à função jurisdicional do Estado, incumbindo-lhe a defesa da

ordem jurídica, do regime democrático e dos interesses sociais e individuais

indisponíveis”, ao mesmo tempo que, de acordo com seu art.129, inciso II, dita que uma

das funções institucionais do Ministério Público é “zelar pelo efetivo respeito dos

Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados nesta

Constituição, e de promover as medidas necessárias à sua garantia” .

Ora, sendo a saúde um dos serviços de maior relevância pública

prestados pelo Estado, como bem destaca o art. 197 da CF, e não estando o gestor

municipal e estadual da saúde prestando tal serviço, fica claro que o Ministério Público ao

pleitear a implantação do Programa Residência Terapêutica no Município de Ponta Grossa,

está cumprindo com sua função institucional e constitucional.

Dentro desse contexto, extrai-se que o Parquet através do

manejo desta ação civil pública está promovendo as medidas necessárias para restaurar o

respeito dos Poderes Públicos aos direitos constitucionalmente assegurados.

Ademais, com base exclusivamente nas regras constitucionais

afetas ao Ministério Público, pode-se concluir que há legitimidade ativa ad causam, pois a

pretensão é voltada à defesa de um direito de todos os cidadãos, com espeque

constitucional, é de natureza indisponível, visto que se trata da vida e da saúde do

interessado.

Em caso análogo, já decidiu os Egrégios Tribunais:

AÇÃO CIVIL PÚBLICA. CABIMENTO. DIREITO COLETIVO. RELEVÂNCIA SOCIAL. LEGITIMIDADE. MINISTÉRIO PÚBLICO.

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COMPETÊNCIA. JUSTIÇA ESTADUAL. A saúde de acordo com preceitos constitucionais é direito de todos e dever do Estado, tendo a Carta Maior conferido às instituições privadas a possibilidade de participar deste serviço. Há interesse coletivo quando da prestação de serviços de grande relevância social, público, permanente e gratuito, sem destinação de clientela por entidade beneficente, sem fins lucrativos. O Ministério Público tem a função e o dever de ajuizar Ação Civil Pública no intuito de zelar pelo efetivo respeito dos Poderes Públicos e dos serviços de relevância pública aos direitos assegurados na Constituição, promovendo medidas necessárias a sua garantia, bem como para a proteção de interesses difusos e coletivos. Agravo não provido.Carta Maior Constituição. (100240442759640011 MG 1.0024.04.427596-4/001(1), Relator: PEREIRA DA SILVA, Data de Julgamento: 26/09/2006, Data de Publicação: 20/10/2006) AGRAVO REGIMENTAL EM AGRAVO DE INSTRUMENTO. AÇÃO CIVIL PÚBLICA. LEGITIMIDADE. MINISTÉRIO PÚBLICO. DEFESA DE DIREITOS COLETIVOS. POSSIBILIDADE. AGRAVO IMPROVIDO. I -A jurisprudência desta Corte firmou-se no sentido de que o Ministério Público tem legitimidade para ajuizar ação civil pública na defesa de direitos coletivos, relativos a pessoas determináveis, e individuais homogêneos socialmente relevantes. Precedentes. II -Agravo regimental improvido. (781029 RJ , Relator: Min. RICARDO LEWANDOWSKI, Data de Julgamento: 23/08/2011, Segunda Turma, Data de Publicação: DJe-171 DIVULG 05-09-2011 PUBLIC 06-09-2011 EMENT VOL-02581-03 PP-00441)

Assim, extrai-se que o Ministério Público possui

indiscutivelmente legitimação outorgada pela própria Constituição Federal para zelar pelas

funções institucionais a ele atribuídas, inclusive promovendo ações que visem a proteção

dos direitos individuais indisponíveis e coletivos, como o direito à saúde e à vida.

O direito à saúde – além de qualificar-se como direito fundamental que assiste a todas as pessoas – representa conseqüência constitucional indissociável do direito à vida. O Poder Público, qualquer que seja a esfera institucional de sua atuação no plano da organização federativa brasileira, não pode mostrar-se indiferente ao problema da saúde da população, sob pena de incidir, ainda que por censurável omissão, em grave comportamento inconstitucional. (STF – AGRG. 271.286-8/RS. DJU, 24/11/2000)

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3. A LEGITIMIDADE PASSIVA DO ESTADO DO PARANÁ E DO MUNICÍPIO DE

PONTA GROSSA

A Lei da Ação Civil Pública não especifica nenhuma condição

especial para que alguém, seja pessoa física ou jurídica, se encontre na posição de

legitimado passivo, bastando para isso que lese ou ameace causar lesão a algum interesse

metaindividual: meio-ambiente, consumidor, patrimônio cultural, ou qualquer outro

interesse difuso ou individual homogêneo. In casu, na polaridade passiva deve figurar o

Estado do Paraná e o Município de Ponta Grossa.

O Poder Público é obrigado a efetivar o direito à saúde, não

importando tratar-se de ente federal, estadual ou municipal, já que se trata de competência

comum e nesta esteira a tutela judicial é cabível em face de qualquer um dos entes

federados.

Dessa forma, é necessário estabelecer o dever estatal em garantir

o direito à saúde a todos e ainda esclarecer a peculiaridade deste direto, pois o direito à vida

e, em sua conseqüência, o direito à saúde antecedem qualquer outro.

A Constituição garante o direito à saúde e traz a incumbência de

torná-lo efetivo ao Estado, pois veja-se: “Art. 196 - A saúde é direito de todos e dever do

Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem à redução do risco de

doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua

promoção, proteção e recuperação”. (grifo nosso)

A propósito, a relevância da demanda deve também ser

destacada, pois o que se observa é a omissão do Poder Público em garantir o acesso

universal à saúde, haja vista que limita a entrada de pacientes de forma espontânea,

demonstrando a precariedade no sistema e a desídia estatal no que tange a efetividade dos

direitos fundamentais.

O direito à saúde é inquestionavelmente reconhecido como

Direito Humano Fundamental e dentre as suas características destacamos a efetividade, pois

como bem observa ALEXANDRE DE MORAES, na sua obra DIREITOS HUMANOS

FUNDAMENTAIS, Atlas Editora, 5º Ed., pag. 41, “... a atuação do Poder Público deve

ser no sentido de garantir a efetivação dos direitos e garantias previstos, com mecanismos

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coercitivos para tanto, uma vez que a Constituição Federal não se satisfaz com o simples

reconhecimento abstrato”.

Ainda, este pensamento nos faz lembrar saudosamente dos

ensinamentos do Jusfilósofo NORBERTO BOBBIO, in A ERA DOS DIREITOS, que em

uma das suas brilhantes reflexões sobre o presente e futuro dos Direitos do Homem,

consignou que “... o problema que temos diante de nós não é filosófico, mas jurídico e,

num sentido mais amplo, político. Não se trata de saber quais e quantos são esses direitos,

qual é sua natureza e seu fundamento, se são direitos naturais ou históricos, absolutos ou

relativos, mas sim qual é o modo mais seguro de garanti-los, para impedir que, apesar das

solenes declarações, eles sejam continuamente violados”.

A pessoa humana, sujeito de direitos e dotado de dignidade, tem

nos direitos sociais aparato de significativa importância, pois é dentre eles que a garantia da

dignidade humana se sobressai, com destaque o Direito à Saúde.

Atualmente, é dado um novo enfoque as normas que visam

efetivar direitos individuais, pois em sendo normas garantidoras da dignidade da pessoa

humana, não necessitam de legislação regulamentar para se tornarem eficazes. De outro

giro, a Carta Magna é clara ao determinar que os direitos e garantias fundamentais tem

aplicação imediata.

O Estado do Paraná, juntamente com o Município de Ponta

Grossa não estão atendendo seus cidadãos da forma esperada, de maneira satisfatória em

relação aos seus direitos individuais e sociais, principalmente no que tange as politicas de

saúde mental. E falando em saúde, esta deve ser prestada na sua forma global e não

parcialmente, onde o Estado prestaciona somente parte do Direito, como se as

peculiaridades humanas não tivessem condições de permear as necessidades de cada ser

como sói o presente caso. Por sorte o cidadão pode se socorrer ao Poder Judiciário para

buscar ser realizado o seu direito, pois além de garantir direitos, hoje se faz necessário

efetivá-los.

Bem como não cabe aos gestores, seja estadual ou municipal alegarem o

Principio da Reserva do Possível para se eximir da responsabilidade com relação à saúde de

qualquer pessoa, bem como sustentar sobreposição do Judiciário em relação ao Executivo,

mas apenas de tornar verdadeiramente eficaz os fundamentos e princípios da própria

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Constituição da República. Acrescente-se que, se restringindo a prestação da saúde, se

restringe também os direitos à saúde e à vida, violando-se o Princípio da Dignidade da

Pessoa Humana.

Nesse sentido, é o entendimento do Supremo:

Cumpre advertir, desse modo, que a cláusula da ‘reserva do possível’ - ressalvada a ocorrência de justo motivo objetivamente aferível - não pode ser invocada, pelo Estado, com a finalidade de exonerar-se do cumprimento de suas obrigações constitucionais, notadamente quando, dessa conduta governamental negativa, puder resultar nulificação ou, até mesmo, aniquilação de direitos constitucionais impregnados de um sentido de essencial fundamentalidade. (STF – ADPF nº 45 – Relator: Min. Celso de Mello. Informativo do STF 345) o Judiciário não desconhece o rigorismo da Constituição ao vedar a realização de despesas pelos órgãos públicos além daqueles em que há previsão orçamentária; este Poder, todavia, sempre consciente de sua importância como integrante de um dos Poderes do Estado, como pacificador dos conflitos sociais e defensor da Justiça e do bem comum, tem agido com maior justeza optando pela defesa do bem maior, veementemente defendido pela Constituição – A VIDA – interpretando a lei de acordo com as necessidades sociais imediatas que ela se propõe a satisfazer. (Apel. Cível nº 98.006204-7, Santa Catarina, Rel. Nilton Macedo Machado, 08/09/98).

Isso posto, imprescindível se faz a promoção de políticas

públicas que assegurem o acesso integral aos serviços públicos de saúde a qualquer pessoa

humana, bem como dever da família, da sociedade e do Estado em amparar as pessoas

enfermas, assegurando sua participação na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-

estar e garantindo-lhes o direito à vida.

Não obstante, pode-se concluir que é opção do autor promover

ação judicial em face de qualquer dos entes federados de forma separada ou conjuntamente

visando ao tratamento de saúde imediato e adequado aos pacientes que dele necessitem.

Caso o ente federado que figura na qualidade de réu se sinta prejudicado com a obrigação, é

possível que o mesmo intente ação regressiva contra o ente que entenda ser o responsável

pela efetivação do direito à saúde a todos os cidadãos.

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4.DA FALTA DE IMPLEMENTAÇÃO DO DIREITO À SAÚDE MENT AL

INEXISTÊNCIA DE RESIDÊNCIAS TERAPÊUTICAS NO MUNICÍP IO DE

PONTA GROSSA

A saúde é direito de todos e dever do Estado, devendo ser

garantido mediante a implementação de políticas públicas sociais e econômicas que

visem à redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e

igualitário às ações e serviços para a sua promoção, proteção e recuperação, conforme

artigos 6º e 196, ambos da Constituição Federal:

Art. 6º- São direitos sociais a educação, a saúde, o trabalho, o lazer, a segurança, a previdência social, a proteção à maternidade e à infância, a assistência aos desamparados, na forma desta Constituição. Art. 196 – A saúde é direito de todos e dever do Estado, garantido mediante políticas sociais e econômicas que visem a redução do risco de doença e de outros agravos e ao acesso universal e igualitário às ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

Ainda, a Magna Carta assegura proteção especial as pessoas

portadoras de deficiência, seja mental ou física, garantindo proteção integral à saúde:

Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição à seguridade social, e tem por objetivos: IV- a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária.. Os serviços e ações de saúde integram uma rede regionalizada e

hierarquizada e um sistema único, organizado a partir de diretrizes de descentralização,

com direção única em cada esfera de governo, atendimento integral, com prioridade

para as atividades preventivas, sem prejuízo dos serviços assistenciais e participação

da comunidade.

É grande o número de procedimentos autuados nesta Promotoria

de Justiça para requisição de tratamento de pessoas portadoras de algum tipo de doença

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mental no Munícipio de Ponta Grossa, contudo quando estes necessitam de tratamento em

regime fechado, estes são orientados a procurar o Pronto Socorro, o qual funciona como

“porta aberta”, sendo o único hospital no Município a solicitar através da Central de Leitos

vaga em hospital psiquiátrico para tais pessoas.

Vale dizer, que muitas delas não necessitariam de internamento,

mas sim de um tratamento digno através das residências terapêuticas, impedindo assim que

entrassem em surtos, pois muitas vezes pacientes em crise passam perambulando pela rua,

haja vista não possuir na cidade hospital adequado para atendê-los.

Ainda, enfrentamos a falta de vaga do gênero, pois apesar do

Pronto Socorro solicitar atendimento especializado através da Central de Leitos, a espera é

enorme, fazendo com que muitos doentes mentais se evadam do local, dessa forma sequer

recebam tratamento extra-hospitalar, em regime de residência.

Denota-se, que o número de pacientes doentes mentais em Ponta

Grossa é relevante, analisando os casos individuais que chegam até esta Promotoria, bem

como os demais relatados pelas entidades, o que demonstra a criação de serviço de

Residência Terapêutica.

As instituições que atendem tais pacientes de modo recluso não

possuem a estrutura devida. Contudo, se viram obrigadas a recolher pessoas portadoras de

doença mental oriundas do Hospital Franco da Rocha, por necessidade, sem vinculo

familiar acabaram ficando em locais não especializados, tais como Associação Vila Velha,

Recanto Espirita Maria Dolores e até mesmo asilos como São Vicente de Paulo.

Com a falta das residências terapêuticas, muitos pacientes

portadores de doença mental seguem sem o tratamento de que necessitam e, portanto,

encontram-se absolutamente desassistidos, o que viola frontalmente a Constituição Federal.

A ausência de residência terapêutica em Ponta Grossa é fato

explicito do descumprimento da Lei Federal nº 10.216/2001, que dispõem sobre a proteção

e os direitos das pessoas portadoras de doença mental, pois quando nossos pacientes

conseguem vaga para tratamento, o que não é fácil, estes são inseridos em residências

terapêuticas ou até mesmo em hospitais psiquiátricos fora do Município, permanecendo

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distantes de sua família, dessa forma o vinculo familiar que é tão essencial acaba se

perdendo.

Ademais, além da dificuldade na obtenção da vaga fora do

Munícipio de Ponta Grossa, o sistema é moroso, tornando-se na maioria das vezes ineficaz,

uma vez que quando o paciente inicia o tratamento, de regra, já cometeu tantos atos

insanos, que a família sem poder dar a assistência que o mesmo precisa, acaba se

ausentando, fazendo com que a reabilitação seja ainda mais difícil.

Caso o serviço existisse em Ponta Grossa, a inserção de muitos

doentes mentais no sistema de tratamento, dar-se-ia tão logo a deficiência mental fosse

constatada, gerando maiores chances de recuperação.

Segundo informações do próprio Município de Ponta Grossa, há

apenas um neurologista no Município para prestar atendimento no SUS, dessa forma muitas

pessoas com familiares portadores de algum tipo de doença mental, procuram esta

Promotoria de Justiça desesperados, pois sequer tem consulta com data próxima ao

paciente, que já vem apresentando sinais acentuados da doença mental diante da falta de

medicamentos, pois os fármacos somente são prescritos por médico especialistas, uma vez

que se trata de medicação controlada.

O descaso chega a um limite insuportável, pois desassistidos na

sua medicação e sem poder ter um tratamento adequado, os pacientes acabam não raras

vezes, tendo suas crises sem nenhum amparo médico.

Muito se discutiu acerca da necessidade do programa de

residência terapêutica, mas é imprescindível esclarecer o conceito e no que consiste tal

serviço, para assim entender o tamanho de sua importância.

Primeiramente as residências terapêuticas são alternativas de

moradia terapêutica para pessoas que ficaram muito tempo internadas em hospital

psiquiátricos ou não possuem amparo ou estrutura familiar para recebê-los.

Podemos conceituar o serviço de Residência Terapêutica não

apenas como moradia urbana a doentes mentais, mas também um serviço que atenda a

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necessidade de cada individuo, buscando sempre a reabilitação, conforme disposto no

programa do Ministério da Saúde (http://bvsms.saude.gov.br/bvs/publicacoes/120.pdf):

O Serviço Residencial Terapêutico (SRT) – ou residência terapêutica ou simplesmente "moradia" – são casas localizadas no espaço urbano, constituídas para responder às necessidades de moradia de pessoas portadoras de transtornos mentais graves, institucionalizadas ou não. O número de usuários pode variar desde 1 indivíduo até um pequeno grupo de no máximo 8 pessoas, que deverão contar sempre com suporte profissional sensível às demandas e necessidades de cada um. O suporte de caráter interdisciplinar (seja o CAPS de referência, seja uma equipe da atenção básica, sejam outros profissionais) deverá considerar a singularidade de cada um dos moradores, e não apenas projetos e ações baseadas no coletivo de moradores. O acompanhamento a um morador deve prosseguir, mesmo que ele mude de endereço ou eventualmente seja hospitalizado. O processo de reabilitação psicossocial deve buscar de modo especial a inserção do usuário na rede de serviços, organizações e relações sociais da comunidade. Ou seja, a inserção em um SRT é o início de longo processo de reabilitação que deverá buscar a progressiva inclusão social do morador.

O programa Residência Terapêutica em saúde mental foi

previsto pela Portaria GM/MS nº 106, de 11 de fevereiro de 2000, tendo em vista a Lei

antimanicomial, prevendo assim moradias urbanas destinadas a cuidar dos portadores de

transtornos mentais, egressos de internações psiquiátricas de longa permanência, que não

possuem suporte social e laços familiares e que viabilizem sua inserção social, consoante

art. 1º, parágrafo único, a fim de substituir a internação psiquiátrica prolongada:

ART.2º Definir que os Serviços Residenciais Terapêuticos em Saúde mental constituem uma modalidade Assistencial substitutiva da internação psiquiátrica prolongada, de maneira que, a cada transferência de paciente do Hospital Especializado para o Serviço de Residência Terapêutica, deve-se reduzir ou descredenciar do SUS igual N.º de leitos naquele hospital, realçando o recurso da AIH corresponde para os tetos orçamentários do estado ou município que se responsabilizará pela assistência ao paciente e pela rede substitutiva de cuidados em saúde mental.

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ART.3º Definir que aos Serviços Residenciais Terapêuticos e Saúde Mental cabe: a) garantir assistência aos portadores de transtornos mentais com grave dependência institucional que não tenham possibilidade de desfrutar de inteira autonomia social e não possuam vínculos familiares e de moradia: b)atuar como unidade de suporte destinada, prioridade aos portadores de transtornos mentais submetidos tratamento psiquiátrico em regime hospitalar prolongado: c)promover a reinserção desta clientela á vida comunitária. ART. 4º Estabelecer que os Serviços Residenciais Terapêuticos em Saúde Mental deverão ter projeto terapêutico baseado nos seguintes princípios e diretrizes: a) ser centrado nas necessidades dos usuários, visando à construção progressiva de sua autonomia nas atividades da vida cotidiana e à ampliação da inserção social; b) ter como objetivo central contemplar os princípios da reabilitação psicossocial, oferecendo ao usuário um amplo projeto de reintegração social, por meio de programas de alfabetização, de reinserção social, no trabalho, de mobilização de recursos comunitários de autonomia para as atividades domesticas e pessoais e de estimulo à formação de associações de usuários, familiares e voluntários. c) respeitar os direitos do usuário como o do cidadão e como sujeito em condição de desenvolver uma vida com qualidade e integrada ao ambiente comunitário.

Também, para diferenciarmos as atribuições do CAPS (Centro

de Assistência Psicossocial), que não se confunde com o programa pleiteado, temos as

Portarias 339 e 189, ambas de 2002, que regulam o citado serviço como ações de saúde

mental do tipo aberto e comunitário do Sistema Único de Saúde (SUS), consistente no

atendimento diário às pessoas com transtornos mentais severos e persistentes, realizando o

acompanhamento clínico e a reinserção social destas pessoas através de ações intersetoriais

que visam facilitar o acesso ao trabalho, lazer, exercício dos direitos civis e fortalecimento

dos laços familiares e comunitários.

Todavia há pacientes que somente atendimentos diários não

surtem efeito, pois a doença vai além de ações do tipo aberto, sendo que muitos devido a

própria doença são incapazes de buscar sozinhos ou mesmo através da família, apoio em tal

serviço.

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Ressalta-se que durante vários procedimentos para tentarmos

fornecer atendimento a pacientes portadores de doença mental, oficiando o CAPS para

prestação de atendimento, recebemos por parte de sua Coordenação a resposta que em

Ponta Grossa não se é realizado busca ativa, consoante oficio em anexo, indagamos acerca

da Portaria GM/336 do Ministério da Saúde, a mesma Coordenadora afirma que somente

realiza busca ativa em pacientes que frequentam o referido serviço. Assim, concluímos que

pacientes que não procuram auxilio diante do quadro mental e relutância, acabam ficando

desprotegidos e sem assistência alguma por parte do gestor municipal e estadual.

Logo, os Centros de Assistência Psicossocial em Ponta Grossa,

funcionam de maneira insuficiente e como única referência de tratamento de saúde mental,

o que torna imprescindível a implementação do serviço de residência terapêutica, o qual

funcionará vinculado ao CAPS, pois ambos juntos formarão uma rede integrada de auxilio.

Não obstante o tempo decorrido das normas e portarias citadas e

as diligências pelo Ministério Público no sentido de garantir a implementação do serviço de

residência terapêutica no Munícipio de Ponta Grossa e região, bem como as respostas

emanadas tanto pelo gestor municipal como estadual, não houveram ações por parte do

Estado do Paraná ou do Município para implantar as residências terapêuticas, a fim de que

os pacientes psiquiátricos com longa permanência hospitalar pudessem ser direcionados.

Nesse mesmo diapasão, não criou de maneira suficiente e satisfatória

os Centros de Atenção Psicossocial (CAPS) no Município de Ponta Grossa, sendo que o Ministério

da Saúde recomenda que localidades com mais de 200 mil habitantes tenham pelo menos três CAPS

em funcionamento. Entretanto, o Munícipio de Ponta Grossa com mais de trezentos mil habitantes

não possui todos os CAPS dispostos na Portaria GM 336/00, faltando o CAPS III, bem como tendo

o CAPS AD e II que não conseguem fornecer tratamento adequado a todos os pacientes com doença

mental, recusando-se, inclusive a fazer busca ativa.

Isso posto, os fatos mencionados aliado a documentação em anexo,

demonstram a omissão do Estado do Paraná e do Município de Ponta grossa Por fim, os fatos

noticiados demonstram a inação do Estado na assistência e a promoção de ações de saúde aos

portadores de transtornos mentais.

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Nesse sentido, é a Jurisprudência reconhecedora do dever do

Estado em prover o direito a assistência de pacientes portadores de doença mental por meio

de implantação de residências terapêuticas:

A Lei Federal 10.216/2001 impõe aos poderes públicos, em complemento ao art. 196 da Constituição da República, a proteção e a tutela dos direitos dos portadores de sofrimento psíquico,sabidamente vulneráveis socialmente. A Portaria nº 106/2000 do Ministério da Saúde organiza e estrutura os Serviços Residenciais Terapêuticos, na forma e com os fins que devem ser perseguidos pelos Municípios. As provas, colhidas no inquérito civil público preparatório da presente ação civil, indiciam que o Município de Canoas não dispõe de instituição adequada para o acolhimento e tratamento dosportadores de sofrimento psíquico, que estão sendo atendidos em instituições inadequadas, ou, simplesmente estão desatendidos, o que demonstra o perigo de dano, se houver demora no provimento. O princípio da reserva do possível não pode justificar o descumprimento de políticas públicas que contemplem o atendimento à saúde em seu grau mínimo de proteção. Procede a antecipação de tutela recursal para obrigar o Município à implementação do Serviço Residencial Terapêutico - SRT, nos moldes da legislação nacional, sob pena de multa de R$ 10.000,00, devendo ser apresentado, em 20 dias, cronograma do projeto para implementação do SRT, pelo Município. AGRAVO DE INSTRUMENTO PROVIDO. UNÂNIME. (Agravo de Instrumento Nº 70024042095, Segunda Câmara Cível, Tribunal de Justiça do RS, Relator: Denise Oliveira Cezar, Julgado em 13/08/2008)

5. DOS FUNDAMENTOS JURÍDICOS DO PEDIDO

A Constituição Federal estabelece que a saúde é direito

fundamental, sendo assegurando a todos o acesso universal, igualitário e integral às ações

e serviços de saúde. Ainda, deixa claro que cabe ao Estado, em qualquer uma de suas

esferas, promover ações e serviços para sua promoção, proteção e recuperação.

A Lei Orgânica da Saúde, 8.080/90, que regulamenta as ações e

serviços de saúde estabeleceu que a atuação do Estado, no que tange à Saúde, se efetivaria

através do Sistema Único de Saúde – SUS, e também salienta em seu art. 2º que:

Art. 2º A saúde é um direito fundamental do ser humano, devendo o Estado prover as condições indispensáveis ao seu pleno exercício.

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§ 1º O dever do Estado de garantir a saúde consiste na formulação e execução de políticas econômicas e sociais que visem à redução de riscos de doenças e de outros agravos e no estabelecimento de condições que assegurem acesso universal e igualitário às ações e aos serviços para a sua promoção, proteção e recuperação. § 2º O dever do Estado não exclui o das pessoas, da família, das empresas e da sociedade.

Resulta do exposto que o Poder Público deve prestar

atendimento integral e gratuito à saúde, fornecendo todas as condições para tanto, não

podendo impedir que pessoas portadoras de transtornos mentais fiquem desassistidas. Por

este motivo, a Administração Pública, ao se omitir da obrigação de implantar serviços

especializados como Residência Terapêutica para atender doentes mentais, age de maneira

ilegal, restringindo o acesso aos atendimentos de saúde, bem como fornece serviço público

ineficiente, fazendo-se essencial a tutela jurisdicional destes direitos difusos e coletivos.

Logo, deve o Estado do Paraná e o Município de Ponta Grossa,

com a máxima urgência, providenciar a implantação do Programa Residência Terapêutica

no Munícipio de Ponta Grossa, visando a garantir o acesso universal e célere àqueles que

necessitam de atendimento médico especializado, assegurando o direito à saúde e a uma

vida digna, pois não é possível manter a atual situação em que se encontra. Deste modo, os

pacientes que necessitam de tais cuidados médicos devem ser encaminhados pelos órgãos

referenciados ou ao Pronto Socorro – Hospital Amadeu Puppi, o qual possui limitações

físicas e clínicas diante de sua estrutura ser insuficiente para atender pacientes portadores

de doença mental, bem como a ineficiência do serviço CAPS AD, que não consegue dar

conta de toda demanda de pacientes com distúrbios mentais, deixando assim vários deles

totalmente desassistidos.

Embora já alegado, a previsão do Programa Residência

Terapêutica se encontra na Portaria/GM nº 106, de 11/02/2000, cujo Ministro de Estado da

Saúde visualiza a importância de tal serviço no âmbito dos Municípios:

Portaria/GM Nº 106/200: O Ministro de Estado da Saúde, no uso de suas atribuições, considerando: a necessidade da reestruturação do modelo de atenção ao portador de transtornos mentais, no âmbito do Sistema Único de Saúde - SUS; a necessidade de garantir uma assistência integral em saúde mental e eficaz para a reabilitação psicossocial; a necessidade da humanização do

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atendimento psiquiátrico no âmbito do SUS, visando à reintegração social do usuário; a necessidade da implementação de políticas de melhoria de qualidade da assistência à saúde mental, objetivando à redução das internações em hospitais psiquiátricos, resolve:

Art. 1.º Criar os Serviços Residenciais Terapêuticos em Saúde Mental, no âmbito do Sistema Único de Saúde, para o atendimento ao portador de transtornos mentais. (grifo nosso)

O conceito de Residência Terapêutica é previsto pelo artigo

parágrafo único da mesma Portaria, afirmando ser “moradias ou casas inseridas,

preferencialmente, na comunidade, destinadas a cuidar dos portadores de transtornos

mentais, egressos de internações psiquiátricas de longa permanência, que não possuam

suporte social e laços familiares e, que viabilizem sua inserção social”. e pelo artigo

Conforme já supramencionado, os destinatários do serviço,

portanto, são pessoas com transtornos mentais severos, privadas do contato e cuidado da

família.

A finalidade e os princípios que regem esta forma de terapia aos

doentes mentais, vêm cautelosamente dispostos nos seguintes artigos da Portaria 106/200

do Ministério da Saúde:

Art. 3.º Definir que aos Serviços Residenciais Terapêuticos em Saúde Mental cabe: garantir assistência aos portadores de transtornos mentais com grave dependência institucional que não tenham possibilidade de desfrutar de inteira autonomia social e não possuam vínculos familiares e de moradia; atuar como unidade de suporte destinada, prioritariamente, aos portadores de transtornos mentais submetidos a tratamento psiquiátrico em regime hospitalar prolongado; promover a reinserção desta clientela à vida comunitária.

Art. 4º Estabelecer que os Serviços Residenciais Terapêuticos em Saúde Mental deverão ter um Projeto Terapêutico baseado nos seguintes princípios e diretrizes:

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ser centrado nas necessidades dos usuários, visando à construção progressiva da sua autonomia nas atividades da vida cotidiana e à ampliação da inserção social; ter como objetivo central contemplar os princípios da reabilitação psicossocial, oferecendo ao usuário um amplo projeto de reintegração social, por meio de programas de alfabetização, de reinserção no trabalho, de mobilização de recursos comunitários, de autonomia para as atividades domésticas e pessoais e de estímulo à formação de associações de usuários, familiares e voluntários. respeitar os direitos do usuário como cidadão e como sujeito em condição

Assim, além da obrigação legal de criar serviços para atender

doentes mentais, disponibilizando várias formas de terapias, também é dever constitucional

por parte da Administração Publica, já que a Magna Carta, no artigo 23, II, determina que

se trata de competência comum da União, Estados e Municípios, cuidar da saúde.

Ademais, a implantação do serviço de Residência Terapêutica

deve ser efetivo, devendo a Prefeitura Municipal de Ponta Grossa adequar um local para

moradia que leve em consideração, sobretudo, o interesse das pessoas com transtornos

mentais, buscando a reinserção social desses pacientes, pois não se pode mais “arrastar” por

mais 10 (dez) anos a precária situação em tela.

6. DA DIGNIDADE DA PESSOA HUMANA

É um verdadeiro descaso deixar a Administração Pública de

fornecer tratamento adequado a pacientes portadores de doença mental, deixando-os

desassistidos ou a mercê de um atendimento sem técnica compatível acerca dos cuidados

que necessita, como é o caso do Pronto Socorro. Ora, o Pronto Socorro tem condições de

atender em caráter de urgência e emergência somente os casos de baixa e media

complexidade, tendo em vista sua estrutura.

Porém, apesar do referido nosocômio apresentar condições

técnicas para atender a unidade de emergência e urgência, insta mencionar que conforme

verificado em vistoria realizada no dia 27 de setembro de 2012 pelo Conselho Regional de

Medicina do Estado do Paraná (fls. 110/219 do Inquérito Civil MPPR 0113.11.000634-4),

o Hospital Municipal Amadeu Puppi, não é capaz de atender integralmente a demanda da

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população do município de Ponta Grossa, deixando milhares de pacientes desassistidos,

tornando, da mesma forma, o atendimento precário. Ora, quem dirá então, o atendimento

ESPECIALIZADO A PORTADORES DE DOENÇA MENTAL?

Resta evidente que o tratamento dispensado pelo Pronto Socorro

Municipal aos portadores de doença mental durante seus surtos não é condizente com as

normas da Politica Nacional de Saúde Mental, ou seja, seria praticamente o caso de um

paciente com leucemia ser tratado pela Unidade Básica de Saúde, a qual jamais poderia

realizar procedimentos de quimioterapia.

Portanto, os portadores de doença mental no Município de Ponta

Grossa não estão recebendo tratamento adequado no que tange a sua patologia, pois ao

doente somente resta receber doses de medicamentos e manda-lo embora para seu seio

familiar, cuja família quando não é inexistente, como é o caso de pessoas moradoras em

instituições, acabam não possuindo estrutura para mantê-lo.

É mister mencionar, que o Hospital São Camilo possui ala

psiquiátrica, contudo este não trabalha no sistema “porta aberta”, assim já informou via

oficio a esta Promotoria de Justiça que cabe ao Pronto Socorro Municipal solicitar vaga em

hospital adequado através da Central de Leitos. Ainda, se trata de um hospital, cujo local é

apenas de tratamento paliativo, logo recebe a medicação e recebe alta hospitalar.

Destarte, nenhum hospital de Ponta Grossa possui o tratamento

adequado para doentes mentais, assim passada a crise, momento em que o paciente se torna

agressivo, acaba retornando ao seu estado desassistido, o que piora ainda mais sua saúde

mental, dessa forma com o serviço de Residências Terapêuticas, vários doentes mentais

iriam ter atenção integral e consequentemente melhor no quadro clinico e ressocialização.

Diante do todo apresentado, é nítido que os portadores de doença

mental no Município de Ponta Grossa estão tendo sua dignidade violada, na medida que o

Estado e o Município, que deveriam garantir seu bem-estar, não vem protegendo seu

direito a saúde de forma eficiente.

Segundo Alexandre de Moraes, a dignidade da pessoa humana é

um valor espiritual e moral inerente à pessoa:

Um valor espiritual e moral inerente a pessoa, que se manifesta singularmente na autodeterminação consciente e responsável da própria vida e que traz consigo a pretensão ao

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respeito por parte das demais pessoas, constituindo-se um mínimo invulnerável que todo estatuto jurídico deve assegurar, de modo que, somente excepcionalmente, possam ser feitas limitações ao exercício dos direitos fundamentais, mas sempre sem menosprezar a necessária estima que merecem todas as pessoas enquanto seres humanos.

A dignidade da pessoa humana engloba a saúde, bem como sua

integridade física e emocional, Principio este consagrado pela Constituição Federal no

artigo 1.º, item III, que assim estabelece:

A República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados e Municípios e do Distrito Federal, constitui-se em Estado Democrático de Direito e tem como fundamentos: I- a soberania; II- a cidadania; III- a dignidade da pessoa humana;

Destarte, que alegar a ausência de implantação do serviço de

Residência Terapêutica em Ponta Grossa por falta de incentivo financeiro, é o mesmo que

admitir que o Estado tem poder de vida e morte sobre as pessoas, ficando a vida de alguém

a mercê da vontade da Administração Pública, o que fere de modo expresso os direitos

fundamentais e o Princípio da Dignidade Humana

Vale dizer, que negar os meios para o adequado tratamento de

qualquer cidadão é regredir para o Estado Absolutista Monárquico, onde o Estado “faz

viver e deixa morrer”, conforme expressão de Michel Foucault, negando-lhes direitos

fundamentais.

6. DA ANTECIPAÇÃO DOS EFEITOS DA TUTELA COM PEDIDO DE LIMINAR

Os requisitos necessários para que se conceda a antecipação de

tutela são: o fumus boni iuris e o periculum in mora.

O requisito do fumus boni juris está demonstrado pelos

relatórios das entidades sociais, pela ausência de projeto efetivo por parte do Estado e do

Munícipio de Ponta Grossa em implantar o serviço pleiteado, pelas várias tentativas do

Ministério Público em solucionar administrativamente a questão, pela grande procura de

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doentes mentais nesta Promotoria de Justiça, os quais se encontram desassistidos de

tratamento de saúde mental e, principalmente pelo lapso temporal de mais de 10 (dez) anos,

sem nenhuma ação governamental para efetivar o programa Residência Terapêutica,

documentação comprobatória acostada ao Inquérito Civil MPPR 0113.02.000012-2, que de

modo inequívoco, mostram a necessidade do Poder Público atender seus pacientes,

portadores de doença mental, de forma universal, não restringindo o acesso destes na

obtenção de cuidados médicos, permitindo o direito à saúde como direito público e

subjetivo e do dever do poder público estadual e municipal de prover o devido atendimento

especializado e adequado.

Portanto, a problemática em questão merece ser amparado pela

tutela jurisdicional, pois respaldada nos dispositivos presentes no texto constitucional e

infraconstitucional, detém o direito à prestação integral da saúde por parte do Estado do

Paraná, conforme art. 5º, inciso III, da Lei nº 8.080/90: “ a assistência às pessoas por

intermédio de ações de promoção, proteção e recuperação da saúde, com a realização

integrada das ações assistenciais e das atividades preventivas”.

Quanto à existência do periculum in mora, este se caracteriza

pela urgência da concessão da antecipação dos efeitos da tutela, em virtude da falta de

assistência adequada de pacientes portadores de doença mental, os quais não possuem

mais vinculo com sua família ou possuidores de vínculos frágeis, que desassistidos

aguardam atendimento por meio do Hospital Municipal ou através de ações judiciais

para internamento em hospital psiquiátrico, quando conseguem, mas que por muitas

vezes vêem seu direito à saúde ser restringido devido as normas operacionais do Sistema

Único de Saúde.

Ainda se tratando do periculum in mora, a necessidade de

implantação do serviço Residência Terapêutica se impõem inadiável para o atendimento

adequado às pessoas portadoras de transtornos mentais domiciliadas no Município de

Ponta Grossa e região, sendo que a falta do atendimento em epigrafe prevê risco para a

saúde e para a vida dessas pessoas. Igualmente a colocam à margem do processo de

ressocialização.

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Deste modo, a importância da causa de pedir advém da visível

discrepância entre a conduta omissiva do Estado do Paraná e do Município de Ponta

Grossa e as normas legais e constitucionais mencionadas.

Outrossim, o medo da ineficácia do provimento pleiteado

também resta configurado, tendo em vista que os pacientes doentes mentais não estão

obtendo do Estado e do Município de Ponta Grossa a assistência médica, psiquiátrica e

psicológica necessária no que tange a saúde mental.

Portanto, de tudo o que já foi demonstrado até o momento,

pode-se constatar sem dificuldades que este pressuposto não só se faz presente como é

intrínseco à propositura da ação com pedido de antecipação dos efeitos da tutela, a fim de

evitar que maiores perigos de lesão aos direitos à vida e a saúde de diversos pacientes com

doença mental que ainda não possuem tratamento adequado e de acordo com as Portarias

do Ministério da Saúde.

Assim sendo, a concessão da liminar para determinar que o

Estado do Paraná juntamente com o Munícipio de Ponta Grossa implante o Programa de

Residência Terapêutica no Município de Ponta Grossa com a finalidade de atender

pacientes portadores de doença mental, egressos de internações psiquiátricas de longa

permanência, que não possuam suporte social e laços familiares e, que viabilizem sua

inserção social.

Logo, com fundamento no art. 273, I do CPC, e diante das

conseqüências irreversíveis que podem acometer aos portadores de transtornos mentais,

enquanto o serviço pretendido não começar a funcionar, estará em permanente estado de

risco social, é que se pleiteia a antecipação dos efeitos da tutela no sentido de

determinar que o Estado do Paraná e o Munícipio de Ponta Grossa promovam a

implantação e execução do Programa Residência Terapêutica para atendimento a

pacientes portadores de doença mental que não possuam suporte social e laços

familiares, em sistema de residência prolongada, com proposta terapêutica adequada

e equipe multiprofissional, em ambiente protegido, nos moldes da Portaria 106/00 do

Ministério da Saúde, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias, tudo sob pena de multa

diária de R$ 10.000,00 (dez mil reais) pelo descumprimento de quaisquer dos itens do

pedido antecipatório que venham a ser deferidos pelo Juízo.

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6. DOS PEDIDOS

Ante o exposto requer o Ministério Público do Estado do Paraná:

a concessão da tutela antecipada, tendo em vista a gravidade e urgência do caso,

inaudita altera pars, determinando ao Estado do Paraná e ao Município de

Ponta Grossa, por meio de suas Secretarias, promovam a implantação e

execução do Programa Residência Terapêutica para atendimento a pacientes

portadores de doença mental que não possuam suporte social e laços familiares,

em sistema de residência prolongada, com proposta terapêutica adequada e equipe

multiprofissional, em ambiente protegido, nos moldes da Portaria 106/00 do

Ministério da Saúde, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias, tudo sob pena de multa

diária de R$ 10.000,00 (dez mil reais) pelo descumprimento de quaisquer dos itens

do pedido antecipatório que venham a ser deferidos pelo Juízo.

b) a citação do ESTADO DO PARANÁ, na pessoa do Excelentíssimo Procurador-

Geral do Estado e do MUNICÍPIO DE PONTA GROSSA, na pessoa do

Excelentíssimo Prefeito Municipal para, querendo, contestar no prazo legal a

presente ação, sob pena de suportar os efeitos da revelia;

c) ao final, a condenação definitiva do Estado do Paraná e do Município de Ponta

Grossa, determinando-lhe por meio de suas Secretarias de Saúde a implantação

e execução do Programa Residência Terapêutica para atendimento a pacientes

portadores de doença mental que não possuam suporte social e laços familiares,

em sistema de residência prolongada, com proposta terapêutica adequada e equipe

multiprofissional, em ambiente protegido, nos moldes da Portaria 106/00 do

Ministério da Saúde, no prazo de 180 (cento e oitenta) dias . Na hipótese de

descumprimento de tais medidas que eventualmente forem determinadas, requer-se

a aplicação de multa diária no valor de R$10.000,00 (dez mil reais.

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d) a produção de todos os meios de prova admitidos em direito, em especial o

depoimento pessoal e provas documentais, testemunhais, periciais, inclusive pela

juntada do Inquérito Civil MPPR – 0113.02.000012-2, que segue em anexo;

e) a condenação do Estado do Paraná e do Município de Ponta Grossa ao pagamento

das despesas processuais.

Dá-se à causa o valor de R$ 1.000,00 (mil reais), para efeitos

fiscais.

Nestes termos,

Pede deferimento.

Ponta Grossa, 05 de fevereiro de 2013.

FUAD FARAJ

Promotor de Justiça

L.C