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i UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS – UFMG INSTITUTO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS DEPARTAMENTO DE FISIOLOGIA E BIOFÍSICA FLAVIANA RIBEIRO FERNANDES AÇÃO DA ACETONA SOBRE AS CORRENTES DE SÓDIO EM NEURÔNIOS DOS GÂNGLIOS DAS RAIZES DORSAIS DE RATOS Belo Horizonte 2008

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UNIVERSIDADE FEDERAL DE MINAS GERAIS – UFMG

INSTITUTO DE CIÊNCIAS BIOLÓGICAS

DEPARTAMENTO DE FISIOLOGIA E BIOFÍSICA

FLAVIANA RIBEIRO FERNANDES

AÇÃO DA ACETONA SOBRE AS CORRENTES DE SÓDIO EM

NEURÔNIOS DOS GÂNGLIOS DAS RAIZES DORSAIS DE RATOS

Belo Horizonte

2008

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FLAVIANA RIBEIRO FERNANDES

AÇÃO DA ACETONA SOBRE AS CORRENTES DE SÓDIO EM

NEURÔNIOS DOS GÂNGLIOS DAS RAIZES DORSAIS DE RATOS

Dissertação submetida ao Departamento de

Fisiologia e Biofísica do Instituto de Ciências

Biológicas da Universidade Federal de Minas

Gerais, como requisito parcial à obtenção do título

de Mestre em Ciências Biológicas.

Orientador: Prof. Dr. Miguel José Lopes

Colaboradora: Profa. Dra. Maria Carolina Doretto

Belo Horizonte

2008

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho aos meus pais, Flávio e Francisca, por serem os meus

exemplos de vida, meus melhores amigos, que sempre me apoiaram e incentivaram

a seguir sempre em frente, pelos conselhos e por serem os grandes orientadores da

minha vida.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço a cima de tudo a Deus, e aos meus Santinhos, que me iluminaram por

toda vida.

Ao André, meu amorzinho, pela paciência imensurável, pelo incentivo nas horas

mais difíceis, pelo amor e carinho.

Ao meu querido orientador, Miguel, pela credibilidade e confiança depositada, pelos

muitos ensinamentos e conselhos.

Às professoras Maria Carolina Doretto e Lígia Naves pela colaboração e amizade.

Aos professores Christopher Kuschmerick, Sílvia Guatimosim, Maria Aparecida

Vieira e Leida Botiom pela contribuição científica, pela amizade e por estarem

sempre dispostos a ajudar.

Aos professores do LAMEX, Paulo Beirão e Jader Cruz, pelo apoio, por ceder o

laboratório para a realização de parte dos meus estudos e pela amizade.

Ao meu grande amigo, meu irmão Rafael Machado pela amizade, companheirismo e

muita paciência demonstrada ao longo dessa jornada.

Aos meus grandes amigos do Laboratório Eletrocel e Cardiomol, Priscila Elisa,

Verônica, Naiara, Jussara, Daniella Almeida, Fabíola, Marcinha, Marina Ladeira,

Fabrício, Pedro, Enéas, Mariana Gaviolli, Mariana Rosa, Amanda, Juliana, Léo e

Aline por tornarem o dia a dia super agradável.

Ao Ricardo Lima, meu cearense preferido, pela amizade, apoio e pelos grandes

ensinamentos.

Ao Adriano, pela amizade, apoio, pelas boas conversas e risadas.

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v

Aos meus queridos irmãozinhos, Éder e Anita, pela amizade, compreensão,

generosidade, conselhos e incentivo.

Aos meus amigos dos Laboratórios de Renal, Metabolismo Celular, LAMEX, NNC,

Farmacologia, Angiogênese, Biofísica de Sistemas Nanoestruturados, Hipertensão e

Endócrino.

Aos meus queridos tios, pelas orações e apoio.

À Rose, pelos conselhos e amizade.

À Rose, da limpeza, pelo carinho e por sua alegria contagiante.

Aos professores do Departamento de Fisiologia e Biofísica e de Farmacologia, pelos

ensinamentos e pela contribuição do meu amadurecimento científico.

E a todos que de alguma forma me ajudaram.

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SUMÁRIO

LISTAS DE ABREVIATURAS, SIGLAS E SÍMBOLOS........................................... vii

LISTA DE FIGURAS............................................................................................... viii

LISTA DE TABELAS............................................................................................... ix

RESUMO................................................................................................................ x

ABSTRACT............................................................................................................. xi

1 INTRODUÇÃO..................................................................................................... 12

2 REVISÃO DA LITERATURA................................................................................ 14

3 JUSTIFICATIVA................................................................................................... 24

4 OBJETIVOS......................................................................................................... 25

5 MATERIAIS E MÉTODOS................................................................................... 26

6 RESULTADOS..................................................................................................... 34

7 DISCUSSÃO........................................................................................................ 52

8 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS.................................................................... 56

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LISTAS DE ABREVIATURAS, SIGLAS E SÍMBOLOS

AMPA Ácido α-amino-3-hidroxi-5-metil-4-isoxazolepropiônico

AMPc Adenosina Monofosfato cíclico

ATP Adenosina Trifosfato

ASICs Canais Iônicos sensíveis a Ácido (do inglês, Acid-sensing Ion

Channels)

BKCa Canais para Potássio sensíveis ao Cálcio

DRG Gânglio da Raiz Dorsal (do inglês, Dorsal Root Ganglions)

GABA Ácido γ-aminobutírico

GMPc Guanosina Monofosfato cíclico

IC50 Concentração necessária para inibir 50% dos canais

KD Dieta cetogênica (do inglês, Ketogenic Diet)

NaV Canais para Sódio dependentes de Voltagem

NAN Canais para Sódio dependentes de Voltagem isoforma 1.9 (Nav 1.9)

NMDA N-metil-D-aspartato

NMDG N-metil-D-glucamina

PTZ Pentilenotetrazol

PUFAS Ácidos Graxos Poliinsaturados (do inglês, Poly-unsaturated fatty acids)

SNS Canais para Sódio dependentes de Voltagem isoforma 1.8 (Nav 1.8)

TEA Tetraetilamônio

TTX Tetrodotoxina

TTX-R Canais para Sódio dependentes de Voltagem resistentes à

tetrodotoxina

TTX-S Canais para Sódio dependentes de Voltagem sensíveis à tetrodotoxina

V50 Potencial necessário para que 50% dos canais alcancem a ativação ou

inativação

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LISTA DE FIGURAS

Figura 1 Organização das subunidades dos canais para sódio....................... 17

Figura 2 Curva concentração-resposta da acetona sobre as correntes de

sódio de corpos celulares de gânglios da raiz

dorsal.................................................................................................. 35

Figura 3 Registros representativos de correntes de sódio em neurônios dos

gânglios da raiz dorsal........................................................................ 37

Figura 4 Relação condutância - voltagem do processo de ativação das

correntes de sódio totais (na ausência de tetrodotoxina)................... 39

Figura 5 V50 do processo de ativação dos canais para sódio........................... 40

Figura 6 Dependência de voltagem do processo de inativação no estado

estacionário das correntes de sódio totais (na ausência de

tetrodotoxina)...................................................................................... 42

Figura 7 V50 do processo de inativação dos canais para sódio........................ 43

Figura 8 Registros representativos de correntes de sódio TTX-R em

neurônios dos gânglios da raiz dorsal................................................ 45

Figura 9 Dependência de voltagem do processo de ativação das correntes

de sódio TTX-R, na ausência e na presença de 20 mM de

acetona............................................................................................... 47

Figura 10 Dependência de voltagem do processo de inativação no estado

estacionário das correntes de sódio TTX-R, na ausência e na

presença de 20 mM de acetona......................................................... 49

Figura 11 Registros dos potenciais de ação em neurônios DRGs..................... 51

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LISTA DE TABELAS

Tabela I Características dos canais para sódio em neurônios DRGs............ 21

Tabela II Solução de dissociação dos corpos celulares de DRGs.................. 26

Tabela III Solução de pipeta empregada para medida de correntes de sódio. 30

Tabela IV Solução de banho empregada para medida de correntes de sódio. 31

Tabela V Solução de Ringer............................................................................ 31

Tabela VI Solução de pipeta (KCl) empregada para o registro de potenciais

de ação.............................................................................................

32

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RESUMO

Os corpos cetônicos, acetona, 3-D-hidroxibutirato e acetoacetato, encontram-se

aumentados no plasma de pacientes tratados com a dieta cetogênica, empregada

como terapia alternativa para o tratamento de epilepsia resistente às drogas. Para

testar a hipótese de que a acetona está atuando sobre a excitabilidade celular,

avaliamos seu efeito sobre os canais para sódio dependentes de voltagem, quando

administrada agudamente, em corpos neuronais do gânglio da raiz dorsal (DRG) de

ratos. Para o registro das correntes foi utilizada a técnica de “patch-clamp” na

configuração “whole-cell”. Como os corpos celulares dos neurônios DRGs

apresentam diferentes isoformas de canais para sódio dependentes de voltagem,

sendo alguns deles sensíveis (TTX-S) e outros resistentes à tetrodotoxina (TTX-R),

realizamos medidas na presença e ausência desta toxina (250 nM). A acetona

diminuiu as correntes de sódio com uma IC50 de 21,5 mM. Na análise dos processos

de ativação e inativação no estado estacionário, a acetona demonstrou dois efeitos

distintos sobre os canais para sódio. O V50 do processo de ativação das correntes de

sódio, na ausência de TTX mostrou-se mais despolarizado: -29,8±1,03 mV para o

controle e -24,0±0,87 mV para acetona 20 mM. Na presença de tetrodotoxina não

houve diferença significativa no processo de ativação das correntes TTX-R,

enquanto que no processo de inativação, o V50 tornou-se mais hiperpolarizado: -

39,40±0,20 mV para o controle e -46,69±0,32 mV para acetona 20 mM. Concluímos

que a acetona exerce um efeito duplo sobre a excitabilidade celular, dificultando o

processo de ativação das correntes TTX-S e facilitando o processo de inativação das

correntes TTX-R.

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ABSTRACT

A high fat, very low carbohydrate diet is effective to treat drug resistant epilepsy.

Such a diet produces increased plasma levels of ketone bodies (acetone, 3-D-

hydroxybutyrate, and acetoacetate). To test the hypothesis that acetone per se can

decrease cellular excitability, we measured sodium currents present in dorsal root

ganglia (DRG) neurons cells of rats using the whole-cell configuration of the patch

clamp technique. DRG neurons express a mixture of both tetrodotoxin-sensitive

(TTX-S) and tetrodotoxin-resistant (TTX-R) sodium current that arises from distinct

sodium channel isoforms. To distinguish these, we measured sodium currents in the

presence or absence of TTX (concentration 250 nM). Acetone (21.5 mM) reduced the

amplitude of the total sodium current (TTX-S and TTX-R) by 50%, independent of the

voltage used to elicit current. Acetone also shifted the half-activation voltage to

depolarized values (-29.8±1.03 mV control vs -24.0±0.87 mV with 20 mM acetone).

In contrast, when measured in the presence of tetrodotoxin, acetone caused no

significant effect on the voltage dependence of activation, but shifted the half-

inactivation voltage to more negative values: (-39.40±0.20 mV in control vs -

46.69±0.32 mV in 20 mM acetone). We conclude that acetone has a dual effect on

the cell excitability, hindering the process of activation of current TTX-S and

facilitating the process of inactivation of the current TTX-R.

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1 INTRODUÇÃO

Canais iônicos são proteínas integrais de membrana fundamentais para o

funcionamento celular. Entre todos, os canais para sódio dependentes de voltagem

constituem um grande grupo que confere excitabilidade às células, desempenhando

um papel essencial na geração e propagação do potencial de ação em neurônios e

outras células excitáveis, como as de músculo estriado e algumas neuroendócrinas.

A expressão de isoformas diferentes de canais para sódio nas células determina sua

funcionalidade no que diz respeito à freqüência de disparo, velocidade de

propagação e reobase dos potenciais de ação. Os neurônios dos gânglios das

raízes dorsais (DRGs), responsáveis por transmitir informações sensoriais da

periferia para o sistema nervoso central, apresentam dois tipos de correntes de

sódio: as sensíveis à tetrodotoxina, representadas pelas isoformas Nav 1.1; 1.2; 1.3;

1.6 e 1.7 e as resistentes à tetrodotoxina representadas pelas isoformas Nav 1.5; 1.8

e 1.9, em proporções variáveis, dependendo do tamanho do corpo celular (ZHOU;

ZHAO, 2000).

A presença de múltiplas isoformas de canais para sódio nos neurônios DRG, garante

um controle preciso da excitabilidade celular, o que os tornam alvos terapêuticos,

pois os bloqueadores clássicos dos canais para sódio usados para reduzir a

excitabilidade celular, como os anestésicos locais, anticonvulsivantes e

estabilizadores de membrana apresentam pouca especificidade. Portanto, o modelo

apresenta amplas possibilidades para rastreamento de efeitos de drogas.

A dieta cetogênica tem sido empregada desde de 1920 como tratamento para casos

de epilepsia resistente às drogas. Trata-se de uma dieta rica em gordura e pobre em

carboidrato e proteínas. Porém, até os dias atuais, não se sabe ao certo qual é o

mecanismo de ação pelo qual essa dieta exerce seu efeito anticonvulsivante. Dentre

as várias hipóteses, o aumento da síntese de corpos cetônicos, composto por 3-D-

hidroxibutirato, acetoacetato e acetona, seria o responsável por modular a

excitabilidade celular (BOUGH; RHO, 2007).

Poucos trabalhos abordam o estudo funcional dos canais iônicos, mais

especificamente dos canais para sódio, sobre a excitabilidade dos neurônios

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submetidos ao tratamento agudo com corpos cetônicos. Com base no exposto, a

proposta deste trabalho foi avaliar o efeito da acetona, administrada agudamente,

sobre os canais para sódio dependentes de voltagem e para isto utilizamos corpos

celulares de neurônios DRGs de ratos.

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2 REVISÃO DA LITERATURA

2.1 CANAIS IÔNICOS

Os canais iônicos são complexos macromoleculares formados por proteínas

integrais de membrana que formam vias condutivas, de seletividade variada, que

permitem o fluxo de íons de um lado da membrana para o outro. As diferenças de

concentrações iônicas entre o líquido extracelular (LEC) e o líquido intracelular (LIC),

somadas à permeabilidade seletiva da membrana, resultam na geração de

gradientes de potenciais eletroquímicos para cada íon. As diferenças de potenciais

elétricos observados nas membranas são causadas pelo fluxo iônico a favor destes

gradientes eletroquímicos, e os tipos de canais existentes determinam as

características eletrofisiológicas de cada célula (HILLE, 2001). Além disso, o

gradiente eletroquímico determina o potencial de repouso da membrana celular, a

geração e propagação do potencial de ação, a regulação do volume celular, além do

transporte de substâncias. (ORLOV; HAMET, 2006).

Os canais iônicos podem ser classificados de acordo com os agentes químicos ou

físicos que controlam a sua a ativação, assim são divididos em grupos:

1. Canais ativados por variação do potencial de membrana, descritos como canais

ativados por (ou dependentes de) voltagem, estes apresentam uma seletividade a

um determinado íon específico (sódio, potássio ou cálcio) o que lhes confere suas

nomenclaturas, por exemplo, canais para sódio dependentes de voltagem.

2. Canais ativados por ligantes extracelulares, como os receptores para

neurotransmissores, por exemplo, receptor do tipo AMPA (ácido α-amino-3-hidroxi-5-

metil-4-isoxazolepropiônico) ativados por glutamato e os canais sensíveis a ácido

(ASICs, do inglês, Acid-sensing Ion Channels).

3. Canais ativados por segundos mensageiros ou ligantes intracelulares, como: íons

cálcio, ATP, AMPc ou GMPc, e incluem, por exemplo, os canais para potássio ou

cloreto ativados por cálcio.

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4. Canais ativados por pressão ou deformação, por exemplo, os canais para cloreto

ativados por aumento de volume celular ou estiramento da membrana.

Alguns canais respondem a múltiplos estímulos, como por exemplo, o receptor

NMDA (N-metil-D-aspartato) que é ativado não apenas pela interação do ligante

glutamato, mas também por mudança do potencial de membrana e apenas conduz

quando o glutamato estiver ligado e a membrana estiver despolarizada. Outros

canais, como os canais para potássio sensíveis ao cálcio (BKCa), também podem ser

ativados pela despolarização da membrana.

Nos últimos anos houve uma expansão na descoberta de doenças causadas por

mutações nos genes que codificam as proteínas dos canais iônicos, que levam ao

desenvolvimento de fisiopatologias nas áreas neurológica, cardíaca, renal e

respiratória. As síndromes causadas por disfunção dos canais são referidas como

canalopatias (CATTERALL, 2000; GRAVES, 2006).

2.2 CANAIS PARA SÓDIO DEPENDENTES DE VOLTAGEM

Os canais para sódio desempenham um papel essencial na geração e propagação

do potencial de ação em neurônios e em outras células excitáveis, como as

musculares cardíacas, as esqueléticas e as células neuroendócrinas (CATTERAL,

2000; CATTERAL et al., 2005)

Outros canais dependentes de voltagem como, por exemplo, canais para potássio

ou para cálcio, apresentam uma arquitetura semelhante ao canal para sódio que é

composto por uma subunidade α e uma ou mais subunidades β auxiliares (YU;

CATTERALL, 2003; CATTERALL et al., 2003). A principal subunidade do canal para

sódio, chamada subunidade α, é uma proteína transmembrana com

aproximadamente 2000 resíduos de aminoácidos (260 kDa), composta por quatro

domínios homólogos, e cada domínio contêm seis segmentos transmembranas (S1-

S6), os quatro domínios associados dentro da membrana formam o poro permeável

ao íon ( CATTERALL, 2000; GOLDIN, 2003), conforme observado na figura 1.

Stühmer e colaboradores, em 1989, demonstraram através de estudos mutagênicos

que o segmento S4, composto por resíduos de aminoácidos carregados

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positivamente, funciona como sensor de voltagem. O movimento das cargas deste

sensor em resposta à despolarização da membrana está associado com a ativação

do canal.

Cada subunidade α está associada com uma ou mais subunidades β auxiliares (β1 a

β4), que são glicoproteínas compostas por um único domínio transmembrana com

um pequeno terminal-carboxila intracelular (33-36 kDa) (VIJAYARAGAVAN et al.,

2004). Elas influenciam o nível de expressão do canal na superfície celular, as

alterações cinéticas nas correntes geradas pela subunidade α e ainda a

dependência de voltagem. As subunidades β também funcionam como moléculas de

adesão celular, realizando interações com a matriz extracelular, e estão envolvidas

na regulação da migração e agregação celular e interação com proteínas do

citoesqueleto (ISOM et al., 1994; ISOM, 2002).

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Figura 1 : Organização das subunidades dos canais para sódio.

Os 4 domínios homólogos da subunidade α estão representados por cilindros, que associados dentro da membrana formam o poro permeável ao sódio. Sombreamentos entre os segmentos S5-S6 estão localizados os resíduos de aminoácidos, que formam o filtro de seletividade iônica e o sítio de ligação da tetrodotoxina. Os segmentos S4 da subunidade α, carregados com cargas positivas representam o sensor de voltagem. Os cilindros das extremidades representam as subunidades β1 e β2. LEC representa o Líquido Extracelular e LIC, o Líquido Intracelular. Esta figura foi baseada em dados de CATTERALL, 2000 e MEISIER; KEARNEY, 2005.

IV III

II I

Inativação

LEC

Poro

Membrana

LIC

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Variações do potencial de membrana podem abrir e/ou fechar os canais para sódio

dependentes de voltagem, causando uma mudança conformacional de sua estrutura

e esta transição ocorre numa escala temporal de milissegundos. A condutância dos

canais para sódio durante o potencial de ação é modificada transitoriamente. Após a

abertura, o canal para sódio é inativado quando o poro é ocluído por porções

citoplasmáticas do canal constituídas por três resíduos de aminoácidos hidrofóbicos

IFM (isoleucina-fenilalanina-metionina) (WEST et al., 1992; YU; CATTERALL, 2003),

presentes em uma região do canal diferente daquela que controla a ativação. Este

estado no qual o canal encontra-se não condutivo é chamado de inativação,

essencial para o retorno do potencial da membrana ao repouso (HILLE, 2001). Este

segmento é estruturalmente conservado em toda escala filogenética. O estado

inativado é distinto do estado fechado e a inativação é removida somente quando o

potencial de membrana retorna ao repouso. Dessa forma, a inativação contribui para

o surgimento dos períodos refratários, tempo após um potencial de ação onde um

neurônio se torna menos excitável ou não excitável, ou seja, período refratário

relativo e período refratário absoluto, respectivamente. Assim, a inativação também

contribui com a freqüência de potenciais de ação (CATTERALL et al., 2002;

CATTERALL et al., 2005). Como as informações no sistema nervoso são codificadas

pela freqüência de potenciais de ação, a cinética e a dependência de voltagem da

inativação são importantes parâmetros para entender a função fisiológica e

patológica dos canais para sódio.

Existem nove isoformas de canais para sódio dependentes de voltagem em

mamíferos (GOLDIN et al., 2000), sua nomenclatura foi baseada nos canais para

potássio dependentes de voltagem (CHANDY, 1991; CHANDY; GUTMAN, 1993),

onde é usado um sistema numérico para definir subfamília e subtipos baseado nas

similaridades entre a seqüência de aminoácidos dos canais. O nome consiste no

símbolo químico do principal íon permeante (sódio – Na+) com o principal regulador

fisiológico (voltagem) indicado como subscrito (Nav). O número seguinte ao subscrito

indica o gene da subfamília (normalmente Nav1), e o número seguinte ao ponto

decimal identifica a isoforma específica do canal (exemplo Nav1.1).

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Fatores exógenos, como drogas e toxinas, podem afetar os sítios funcionais do

canal para sódio, se ligando a receptores específicos da molécula ou simplesmente

bloqueando a via condutiva, podendo alterar deste modo a permeação, a

dependência de voltagem e a cinética de ativação e inativação do canal (CESTÈLE;

CATTERAL, 2000).

A tetrodotoxina, utilizada como importante ferramenta para o estudo molecular e

eletrofisiológico dos canais para sódio, age como um bloqueador seletivo e

reversível em várias preparações de neurônios (NARAHASHI, 1988; ROY;

NARAHASHI, 1992). Baseado na diferença de sensibilidade à tetrodotoxina e na

cinética de ativação e inativação do canal, as correntes de sódio foram tipicamente

classificadas em: (SCHOLZ et al., 1998, CUMMINS et al., 1999; RENAGANATHAN

et al., 2000; RENAGANATHAN et al., 2002).

1) sensíveis à TTX (TTX-S) de ativação e inativação rápida,

2) resistentes à TTX (TTX-R) rápidas,

3) TTX-R de inativação lenta,

4) TTX-R persistentes.

Os canais para sódio TTX-S são bloqueados por concentrações nanomolares da

toxina, e de acordo com Elliott e Elliott (1993), 100 nM de tetrodotoxina são

suficientes para suprimir 97% das correntes TTX-S em neurônios.

Os canais para sódio TTX-R são representados por três isoformas do canal, Nav1.5,

Nav1.8 e Nav1.9. As correntes TTX-R rápidas apresentam propriedades biofísicas

semelhantes às das correntes TTX-S, e são compatíveis com as correntes geradas

pelos canais Nav 1.5. (RENAGANATHAN et al., 2000; RENAGANATHAN et al.,

2002; LAI et al., 2004; RUSH et al., 2007). As correntes TTX-R de inativação lenta

apresentam uma cinética de ativação e inativação relativamente lenta, porém sua

recuperação da inativação é rápida, permitindo assim uma atividade sustentada

enquanto outros subtipos de canais estão inativados. Os canais Nav1.8 (SNS)

exibem este tipo de corrente, importantes para a geração dos potenciais de ação

nos neurônios, enquanto os canais Nav1.9 (NaN) produzem as correntes TTX-R

persistentes que contribuem para a determinação do potencial de repouso da

membrana dos neurônios, modulando a sua excitabilidade, e também para a

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despolarização associada a estímulos sublimiares (ELLIOT; ELLIOT, 1993; OGATA;

TATEBAYASHI, 1993; AKOPIAN et al., 1996, SANGAMESWARAM et al., 1996,

HERZOG et al., 2001). A cinética de ativação desta corrente é muito lenta, ela só se

torna ativa na fase de repolarização do potencial de ação, podendo prolongar essa

fase.

Existe ainda, outra corrente de cinética peculiar conhecida como corrente

ressurgente. Essa corrente exibe uma reativação e inativação lenta sobre a

repolarização rápida, sua expressão pode estar limitada a grandes neurônios DRGs.

Os canais Nav 1.2 e 1.6 podem produzir este tipo de corrente (RAMAN; BEAN,

1997, CUMMINS et al., 2005; RUSH et al., 2005; RUSH et al., 2007).

Os neurônios dos gânglios da raiz dorsal expressam uma variedade de isoformas de

canais para sódio, permitindo um preciso controle da excitabilidade celular (RUSH et

al., 2007). Os DRGs são estruturas que agregam os corpos celulares dos neurônios

que conduzem informações sensoriais da periferia para o sistema nervoso central.

Os corpos celulares destes neurônios constituem uma população com

características morfofuncionais heterogêneas, com os corpos celulares em ratos

adultos variando de tamanho entre 20 e 50 µm de diâmetro. Essas células

expressam dois tipos de correntes de sódio, TTX-S e TTX-R, em diferentes

proporções que dependem basicamente do diâmetro do corpo celular (ZHOU;

ZHAO, 2000). Kostyuk e colaboradores em 1981 foram os primeiros a analisar

eletrofisiologicamente os canais TTX-S e TTX-R em neurônios DRGs, na tabela 1

observa-se as diversas isoformas desses canais e suas características biofísicas,

porém os papéis destes dois tipos de correntes ainda não foram completamente

elucidados. (ROY; NARAHASHI, 1992; RENAGANATHAN et al., 2002; RUSH et al.,

2007).

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Tabela I: Características dos canais para sódio em neurônios DRGs

Isoformas de Canais para sódio

Tipo (Cinética e Farmacologia)

Características Biofísicas em DRGs

Papel na geração do Potencial de Ação

Nav 1.1 TTX-S, rápida Desconhecido Desconhecido

Nav 1.2 TTX-S, rápida

Ativação/ Inativação em potenciais despolarizados,

pode produzir corrente ressurgente

Pode manter o disparo quando “expressados” em

neurônios danificados

Nav 1.3 TTX-S, rápida Corrente Persistente,

corrente de rampa e rápida recuperação

Disparos ectópicos quando “expressados” em neurônios

danificados

Nav 1.5 TTX-R, rápida Não foi caracterizado muito bem Desconhecido

Nav 1.6 TTX-S, rápida Corrente Persistente, rápida recuperação, pode produzir

corrente ressurgente

Mantém alta freqüência de disparo quando presente

Nav 1.7 TTX-S, rápida Início lento da inativação

levando a uma corrente de rampa, rápida recuperação

A corrente de rampa amplifica pequenas

entradas

Nav 1.8 TTX-R, lenta

Ativação/ Inativação em potenciais muito

despolarizados e rápida recuperação

Maior contribuinte para a fase de subida do potencial

de ação e disparos repetitivos em pequenos

neurônios

Nav 1.9 TTX-R, persistente

Ativação em potenciais hiperdespolarizados,

sobrepondo a curva de ativação/ intivação,

Inativação ultra-lenta

Contribui para a determinação do potencial de repouso da membrana, amplificação de entradas e manutenção da ativação

dos canais Nav 1.8

Tabela modificada de RUSH et al., 2007.

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2.3 DIETA CETOGÊNICA

A dieta cetogênica (KD) é caracterizada por ser rica em lipídeos, balanceada em

proteínas (o suficiente para garantir o crescimento) e pobre em carboidratos, a qual

induz a uma cascata de mudanças metabólicas, incluindo o quadro de cetose e uma

mudança no metabolismo energético cerebral (SCHWARTZKROIN, 1999;

FREEMAN et al., 2006). Esta dieta tem sido empregada como terapia alternativa

para o tratamento de epilepsia resistente às drogas (refratárias) desde 1920, quando

observações na rápida supressão das crises epilépticas, foram correlacionados aos

altos níveis de corpos cetônicos no plasma de pacientes (SWINK et al., 1997). No

entanto poucos trabalhos abordam, na célula isolada, mecanismos pelos quais a KD

exerce o efeito anticonvulsivante (BOUGH; RHO, 2007).

Alguns mecanismos propostos para explicar este efeito incluem:

1. Mudança do pH cerebral, porém os estudos realizados por Al-Mudallal (1996),

sugerem que o efeito anticonvulsivante da KD é pouco provável de ser mediada pela

acidose cerebral;

2. Mudança no balanço hidroeletrolítico. Porém, estudos realizados por Appleton

e DeVivo em 1974 não confirmaram esta hipótese esta hipótese.

3. Ação inibitória direta dos ácidos graxos, como por exemplo, ácidos graxos

poliinsaturados (PUFAs), que são longas cadeias hidrocarbonadas com duas ou

mais duplas ligações e um grupamento carboxila terminal, são encontrados em

membranas biológicas por serem partes de moléculas de fosfolipídios e glicolipídios.

Possuem atividade anticonvulsivante por modular canais iônicos dependentes de

voltagem (VREUGDENHIL et al., 1996; CUNNANE et al., 2002). Os ácidos graxos

também induzem a atividade das proteínas desacopladoras mitocondriais,

resultando numa redução do gradiente de prótons através da membrana

mitocondrial interna, que entre outros efeitos, causaria uma redução na síntese de

ATP (HORVATH et al., 2003). Além disso, os canais para potássio sensíveis ao ATP

são modulados pela atividade metabólica da célula e, os baixos níveis de ATP

decorrentes da dieta cetogênica, resultam na abertura destes canais, e

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hiperpolarização da membrana. Portanto, este efeito protegeria o cérebro contra o

estresse metabólico (SCHWARTZKROIN, 1999; VAMECQ et al., 2005).

4. Alteração da disponibilidade dos neurotransmissores. Em estudos realizados

por Cheng e colaboradores (2004), foi demonstrado que a restrição calórica

resultante da dieta cetogênica, aumentou a expressão da enzima ácido glutâmico

descarboxilase, responsável pela biossíntese do GABA (ácido γ-amino butírico),

sugerindo um aumento dos níveis desse neurotransmissor inibitório.

5. Altos níveis de corpos cetônicos mantidos durante a KD. Os corpos cetônicos

referem-se a três componentes: a acetona, o 3-D-hidroxibutirato, e o acetoacetato,

formados nas mitocôndrias dos hepatócitos a partir da acetil-CoA, resultante da β-

oxidação dos ácidos graxos e que podem ser utilizados por muitos tecidos, com

resultante formação de ATP. A demonstração de que o sistema nervoso central é

capaz de metabolizar os corpos cetônicos, sugere que estes poderiam estar

relacionados com o efeito da dieta (Owen et al., 1982).

A acetona é formada por uma reação espontânea de descarboxilação do

acetoacetato (acetoacetato acetona + CO2) e é eliminada nos pulmões e na

urina. Estudos recentes realizados por Likhodii e colaboradores (2000), sugerem que

a acetona apresenta efeitos sobre o sistema nervoso central, com efeitos

anticonvulsivantes, e, portanto, afeta a excitabilidade celular de alguma maneira.

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3 JUSTIFICATIVA

Historicamente, desde os tempos bíblicos, o jejum foi associado ao poder de cura

das epilepsias e, ainda hoje, as dietas cetogênicas são utilizadas no seu tratamento,

principalmente nos casos refratários aos tratamentos farmacológicos. Nas alterações

do metabolismo da glicose, como no diabetes mellitus, a hipossensibilidade à dor

aparece como conseqüência da doença não controlada, permitindo-nos supor um

efeito direto dos corpos cetônicos sobre a excitabilidade celular.

Estudos realizados recentemente, demonstram a capacidade anestésica e

analgésica da acetona e do hidroxibutirato, sem entrar no mérito dos mecanismos

celulares. Por ser produzida em menor quantidade quando comparada aos outros

corpos cetônicos, a acetona não despertou muito interesse científico, o que pode

explicar o pequeno número de estudos eletrofisiológicos com esta substância

(LIKHODII; BURNHAM, 2002). A escolha da acetona para este estudo sustenta-se

no seu coeficiente de partição, igual a um, o que lhe confere uma ampla distribuição

nos compartimentos do organismo, sendo livremente difusível para o sistema

nervoso central, enquanto que o 3-D-hidroxibutirato e o acetoacetato requerem um

transportador para ácidos-monocarboxílicos para atravessar a barreira

hematoencefálica (MUSA-VELOSO, et al., 2006).

A escolha dos neurônios DRGs para os estudos eletrofisiológicos propostos, se faz

primeiramente pela dificuldade de se isolar células do Sistema Nervoso Central. E

também devido ao fato de que as células do cérebro de roedores imaturos

apresentam naturalmente um quadro de cetose, ocasionado pelo período de

amamentação, quando sua nutrição é predominantemente composta por lipídeos

(NEHLIG, 2004). Outro aspecto, que merece ser considerado, é que os canais para

sódio TTX-R são especificamente expressados em neurônios sensoriais

nociceptivos, o que nos permite supor que, na cetoacidose diabética, esta via de

sinalização não funcione adequadamente.

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4 OBJETIVOS

4.1 Objetivo Geral

Avaliar o efeito agudo da acetona sobre as correntes de sódio dependentes de

voltagem, usando como modelo corpos celulares de neurônios obtidos de gânglios

das raizes dorsais de ratos.

4.2 Objetivos Específicos

• Determinar o IC50 da acetona sobre as correntes de sódio de células DRGs.

• Determinar a dependência de voltagem da ativação e inativação das correntes

totais de sódio de células DRGs.

• Determinar a dependência de voltagem da ativação e inativação das correntes de

sódio resistentes à tetrodotoxina de células DRGs.

• Explorar alterações funcionais causados pela acetona na morfologia de

potenciais de ação de células DRGs, na presença ou não da tetrodotoxina.

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5 MATERIAIS E MÉTODOS 5.1 ANIMAIS

Foram utilizados ratos Wistar machos, com massa corporal variando entre 220 e 280

g, procedentes do Centro de Bioterismo (CEBIO) do Instituto de Ciências Biológicas

da Universidade Federal de Minas Gerais.

O projeto de pesquisa desenvolvido com esses animais foi aprovado pelo Comitê de

Ética em Experimentação Animal (CETEA) da Universidade Federal de Minas Gerais

com o protocolo número 43/2005.

5.2 CULTURA PRIMÁRIA 5.2.1 Dissociação de neurônios DRG

Os métodos utilizados para a dissociação de neurônios DRG foram baseados no

protocolo estabelecido por Eckert e colaboradores em 1997.

5.2.2 Soluções As seguintes soluções foram utilizadas na dissociação e cultura de neurônios DRGs.

Dissecação e Dissociação :

A tabela II apresenta a composição da solução de Ringer Mamífero, sem adição de

Ca2+ e Mg2+, utilizada para a dissociação celular.

Tabela II : Solução de Dissociação dos corpos celulares de DRGs (a)

(a) pH ajustado para 7,4 com NaOH e osmolalidade de 295 mOsm/Kg H2O

REAGENTES CONCENTRAÇÃO (mM)

NaCl 140,0

KCl 2,5

Glicose 7,5

HEPES 10,0

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Solução Enzimática 1 : Papaína (1 mg/mL), ativada pela adição de 0,1 mg de

cristais de cisteína diluídos em 3 ml de solução de Ringer filtrada.

Solução Enzimática 2 : Colagenase (2,5 mg/mL – Tipo IA, Sigma-Aldrich, St. Louis,

MO, USA), diluída em 3 mL de solução de Ringer filtrada.

Plaqueamento dos Corpos Celulares : Meio de cultura F12 suplementado com

10% v/v de soro bovino fetal (inativado e estéril – Cultilab, Campinas, SP, Brasil) e

1% v/v de antibiótico (100 U.I./mL de penicilina e 100µg/mL de estreptomicina –

Sigma Chemical Company).

Alimentação dos Neurônios : Meio de cultura L15 suplementado com 10% v/v de

soro bovino fetal (inativado e estéril – Cultilab, Campinas, SP, Brasil) e 1% v/v de

antibiótico (100 I.U./mL de penicilina e 100 µg/mL de estreptomicina – Sigma).

5.2.3 Superfícies para plaqueamento

Lamínulas de vidro (5 mm de diâmetro) foram autoclavadas e cobertas com

aproximadamente 30 µl de poli-L-lisina (20 µg/mL – Sigma, St. Louis, MO, USA).

Estas foram mantidas a 4ºC por, no mínimo, 12 horas. Os discos foram lavados com

água deionizada estéril e estocados a 4ºC.

No dia em que foram utilizados para plaqueamento, os discos de vidro foram

cobertos com solução de laminina diluída em solução de Ringer (20 mg/mL) e

mantidos refrigerados por, no mínimo, 2 e, no máximo, 12 horas. A laminina foi

removida minutos antes do plaqueamento dos corpos celulares.

5.2.4 Dissecação

Os ratos foram mantidos com dieta comercial e água, ad libitum, até serem

decapitados por guilhotinamento. A pele do dorso foi removida, assim como a parte

anterior do gradil costal e vísceras torácicas. Também foram removidos os corpos

vertebrais, expondo a medula e os nervos que dela ermegem. Nos nervos

posteriores estão localizados os Gânglios da Raiz Dorsal.

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Após a remoção do excesso de tecido conjuntivo e meninges, os gânglios foram

cortados ao meio para facilitar a ação das enzimas.

5.2.5 Dissociação

Os DRGs foram incubados a 37ºC em tubos tipo Falcon de 15 mL contendo 3 mL da

solução enzimática 1 por 20 minutos, gentilmente agitada a cada 5 minutos. Foram

centrifugados por 30 segundos a 3000 x g e o sobrenadante foi descartado.

A solução enzimática 2 foi adicionada, repetindo-se o procedimento de incubação e

centrifugação.

O processo enzimático era interrompido pela adição de 3 mL do meio de cultura F12

contendo 10% de soro bovino fetal, seguido de centrifugação e descarte de 2 mL do

sobrenadante. Os DRGs foram, então, submetidos à trituração mecânica com

pipetas Pasteur de vidro, com as pontas polidas em fogo, em 1 mL de F12.

Após a trituração mecânica, o meio de cultura encontrava-se repleto de corpos

celulares neuronais em suspensão. Esses neurônios foram transferidos para as

lamínulas de vidro previamente tratadas com poli-L-lisina e laminina e mantidos em

repouso por 2 horas, à temperatura de 37ºC, em atmosfera com 5% de gás

carbônico, para permitir a adesão dos corpos celulares aos discos de vidros. Após

este período foi adicionado meio de cultura L15 para nutrir os neurônios.

5.2.6 Alimentação dos neurônios

Os neurônios foram mantidos com meio de cultura L15 em temperatura ambiente por

24 horas, para que se tornassem viáveis para os registros eletrofisiológicos. Os

neurônios foram utilizados até 72 horas após o seu isolamento.

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5.3 ELETROFISIOLOGIA

Os neurônios submetidos aos registros eletrofisiológicos foram previamente

transferidos, na lamínula, para uma câmara de superfusão confeccionada em

acrílico. As correntes de sódio foram registradas através da técnica de patch-clamp,

na configuração Whole-cell, em temperatura ambiente com variação entre 20-25ºC.

Os experimentos foram realizados em uma mesa anti-vibratória caseira, com

visualização em microscópio invertido modelo Olympus CK-2 (Japan) com oculares

de 10x e objetiva de 40x de aumento. O posicionamento da micropipeta era

realizado através de dois sistemas de micromanipulação independentes: um

mecânico Mitutoyo (Japan) e outro piezoelétrico (Newport M-42 – Irvine, CA, USA)

com controle remoto triaxial (PCS-201 – Burleigh Instruments Inc., Fishers, NY,

USA). As correntes foram registradas através de um amplificador Axopatch 200B

(Axon Instruments – USA), ligado a um conversor analógico-digital (Digitada série

1200B, Axon Instruments – USA), gerenciado pelo aplicativo pClamp7 (Axon

Instruments – USA). As pipetas foram acopladas ao sistema através de suporte com

hemi-célula de Ag/AgCl mergulhado na solução de pipeta. O circuito elétrico foi

fechado pelo eletrodo de referência de Ag/AgCl, que se encontrava mergulhado na

solução de banho.

As pipetas com resistência entre 1,0 e 3,0 MΩ foram fabricadas a partir de capilares

de vidro para micro-hematócrito (diâmetro interno: 1 mm e externo: 1,5 mm,

Perfecta, SP, Brasil), usando um estirador vertical de pipetas de dois estágios (PP

830 Narishige, Tokyo, Japan).

As correntes foram medidas na configuração whole-cell alcançada após a obtenção

de um selo de alta resistência, chamado de giga-selo, formado entre a membrana

celular e a parede da pipeta, com aplicação de uma pressão negativa e posterior

rompimento da membrana. Foi utilizado um sistema de compensação rápida do

amplificador, que neutralizava a capacitância da pipeta e a capacitância intrínseca

do pré-amplificador modelo CV203 (Axon instruments, CA, USA). A obtenção da

configuração whole-cell foi realizada a partir de uma sucção adicional através da

pipeta, causando uma ruptura da membrana celular e permitindo a difusão da

solução da pipeta para dentro da célula, enquanto a capacitância da membrana e a

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resistência de acesso eram compensadas manualmente (HAMILL et at., 1981). O

transiente capacitivo foi cancelado e a resistência em série foi compensada em 40%,

quando a corrente encontrava-se exageradamente grande (acima de 3 nA).

5.3.1 Soluções do Banho e da Pipeta

As tabelas abaixo (III a VI) trazem a composição das soluções utilizadas nas

medidas eletrofisiológicas, o potencial de equilíbrio eletroquímico para o íon sódio

calculado de acordo com a equação de Nernst foi de 14,1 mV. Os reagentes

utilizados para a preparação das soluções foram obtidos da Sigma-Aldrich. A

osmolalidade das soluções foi medida, antes dos experimentos, em osmômetro de

pressão de vapor, VAPRO-5520 (Wescor, Logan, UT, USA).

Tabela III: Solução de Pipeta empregada para medida de correntes de Na+(b)

REAGENTES CONCENTRAÇÃO (mM)

CsF 100

NaCl 20

MgCl2 5

EGTA 11

TEA-Cl 10

HEPES 10 (b) pH ajustado para 7,2 com CsOH e osmolalidade de 295 mOsm/KgH2O

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REAGENTES CONCENTRAÇÃO (mM)

NaCl 140,0

KCl 2,5

MgCl2 1,0

CaCl2 1,8

HEPES 10,0

Glicose 7,5

REAGENTES CONCENTRAÇÃO (mM)

NaCl 35,0

NMDG 107,5

KCl 2,5

MgCl2 1,0

TEA-Cl 20,0

CaCl2 1,8

CdCl2 0,2

NiCl2 0,2

HEPES 10,0

Glicose 7,5

Tabela IV: Solução de Banho empregada para medida de correntes de Na+(c)

(c) pH ajustado para 7,4 com HCl e osmolalidade de 305 mOsm/KgH2O

Tabela V: Solução de Ringer (d)

(d) pH ajustado para 7,4 com NaOH e osmolalidade de 305 mOsm/KgH2O

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REAGENTES CONCENTRAÇÃO (mM)

NaCl 2,5

KCl 140,0

MgCl2 1,0

NaATP 2,0

EGTA 0,5

HEPES 10,0

As correntes de potássio foram bloqueadas utilizando Cs+ como principal cátion

interno e pela presença de TEA na solução de pipeta e de banho. Os canais para

cálcio foram bloqueados por Cd2+ (0,2 mM) e Ni2+ (0,2 mM) na solução de banho,

por F- e EGTA na solução de pipeta e Mg2+ em ambas soluções (ELLIOTT;

ELLIOTT, 1993). Estas concentrações de Cd2+ e Ni2+ também reduzem a

condutância de canais TTX-R em neurônios do DRG e outros neurônios sensoriais

(IKEDA; SCHOFIELD, 1987; KUO et al., 2002) Entretanto, estes bloqueios não

alteraram os nossos resultados porque as correntes de sódio TTX-R remanescentes

ainda eram suficientemente grandes para a obtenção de registros eletrofisiológicos.

A concentração de sódio da solução de superfusato da tabela IV, foi utilizada para

evitar correntes do íon sódio exageradamente grandes. As correntes de sódio foram

isoladas com base nos estudos de Rush e Waxman (2005).

A concentração inicial de acetona no superfusato foi preparada a partir de estudos

de Likhodii e Burnham (2002), onde demonstraram que 10 mM de acetona no fluído

cerebroespinhal foi capaz de produzir um efeito anticonvulsivante significativo em

modelo de ratos PTZ (pentilenotetrazol). A partir deste dado, foi possível traçar a

curva concentração-resposta para a acetona, com uma concentração mínima de 5

mM e uma máxima de 60 mM, onde, na maior concentração, não foi possível manter

(e) pH ajustado para 7,3 com NaOH e osmolalidade de 295 mOsm/KgH2O

Tabela VI: Solução de Pipeta (KCl) (e)

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um selo estável. A acetona foi diluída em solução de banho empregada para medida

de correntes de Na+ (tabela IV) e também na solução de ringer (tabela V).

5.4 ANÁLISE DOS RESULTADOS

Os resultados foram analisados empregando-se o programa Clampfit (Axon

Instruments, CA, USA). Os ajustes das curvas concentração-resposta foram

calculados pelo modelo de regressão logístico, empregando-se a seguinte equação:

(1)

Onde: X, é o logarítmo da concentração; Y, é a resposta, e EC50 é a dose

responsável por 50% do efeito máximo observado. Também foram utilizados os

testes t de Student e ANOVA de uma entrada do programa Prism (Graphpad, USA)

com pós-teste de Dunnett, com nível de significância P < 0,05.

Y = Mínimo + (Máximo – Mínimo)

1 + 10

(Log E50 – X) Inclinição de Hill

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6 RESULTADOS

As correntes de sódio foram registradas utilizando as soluções de pipeta e de banho

descritas na tabela III e IV, respectivamente. O íon NMDG foi utilizado na solução de

banho para substituir o sódio, em proporção equimolar, para manter uma

concentração final de sódio baixa (35 mM). Esta estratégia foi adotada para reduzir

as correntes de sódio e permitir um controle mais eficaz das voltagens estabelecidas

pela técnica de patch-clamp na configuração whole cell. As células foram mantidas a

-60 mV por pelo menos 10 minutos após a obtenção da configuração whole cell,

permitindo uma estabilização das correntes de sódio.

6.1 Efeito da acetona

O efeito de diferentes concentrações de acetona sobre as correntes de sódio é

mostrado na figura 2. As concentrações utilizadas foram: 5, 10, 15, 20, 30, e 40 mM

de acetona. As correntes foram registradas imediatamente após a superfusão da

acetona em concentrações molares crescentes. A concentração de acetona capaz

de promover a inibição de 50% dos canais para sódio foi calculada pelo ajuste da

curva concentração-resposta (equação 1) em 21,5 mM, não sendo observado

qualquer dependência de voltagem sobre a inibição das correntes (resultados não

mostrados). Nas concentrações de 30 e 40 mM, o selo mostrou-se instável, durando

menos que 10 minutos. Além disso, não foi possível registrar correntes de sódio em

doses maiores que 40 mM, invariavelmente por perda do giga-selo, denotando

possíveis modificações nas características físico-químicas da membrana celular. O

efeito máximo da acetona, calculado pela curva de ajuste, seria alcançado na

concentração de 250 mM, muito além da que utilizamos. Mesmo assim, este valor é

compatível com valores citados na literatura para anestesiar girinos em aquários

(YANG et al., 2007).

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35

0.0 0.3 0.6 0.9 1.2 1.5 1.8 2.1 2.40

25

50

75

100

log [acetona]

I/Im

áx

Figura 2: Efeito inibitório da acetona sobre as correntes de sódio de corpos celulares de gânglios da raiz dorsal medidos na voltagem de -15 mV (N=8). A amplitude foi normalizada pela maior corrente. No inserto, apresentamos esquematicamente o protocolo utilizado: as células foram mantidas em -60 mV, hiperpolarizadas a -100 mV por 100 ms, e submetidas a pulsos de voltagem que variaram de -60 a +45 mV em incrementos de 15 mV por 40 ms, retornando ao potencial de manutenção de -60 mV.

-60 mV

-100 mV

+45 mV

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36

6.2 Efeito da acetona nas correntes de sódio evocad as em neurônios DRGs

A figura 3 mostra registros representativos das correntes de sódio obtidas no

controle, na presença de 20 mM de acetona e após a lavagem da acetona. Os

neurônios DRGs foram submetidos a um pré-pulso hiperpolarizante de -100 mV por

100 ms, para garantir a remoção do estado de inativação dos canais, e as correntes

de sódio foram evocadas por uma sequência de pulsos de voltagem de -100 mV a

zero mV, em incrementos de 5 mV.

A acetona reduziu a amplitude da corrente de sódio e após a sua lavagem com

solução controle, mas não houve total recuperação. O efeito inibitório foi observado

imediatamente após a superfusão da acetona e, após um minuto, já registrávamos o

efeito máximo. Como padronização, as análises de todas as correntes de sódio

foram realizadas após um minuto de exposição à acetona. Para confirmar a

recuperação parcial a lavagem foi efetuada por mais de uma vez com solução

controle até um período máximo de 10 minutos, não houve diferença na amplitude

da corrente durante este tempo.

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Figura 3: Registros representativos de correntes de sódio em neurônios DRGs. Os registros no canto inferior direito reproduzem os traços obtidos nas condições controle, acetona 20 mM, e recuperação, durante o pulso de -15 mV. No esquema superior, apresentamos o protocolo utilizado (descrito no texto). Nem todas as correntes foram representadas para melhor visualização.

-60 mV

100 ms -100 mV

0 mV

0,5nA

10 ms

Controle Acetona 20 mM

Recuperação Controle Recuperação Acetona 20 mM

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6.3 Efeito da acetona sobre o V 50 do processo de ativação da corrente de sódio

A dependência de voltagem do processo de ativação das correntes de sódio totais

(TTX-S e TTX-R) das células DRGs está representada na figura 4. A condutância

(G) de sódio dependente de voltagem foi calculada usando-se a seguinte equação:

G = I / (Vm – ENa) (2)

Onde I é a amplitude da corrente, Vm é o potencial de membrana e o ENa é o

potencial de equilíbrio eletroquímico para o íon sódio, calculado de acordo com a

equação de Nernst. As curvas da dependência de voltagem da ativação da corrente

de sódio são ajustes da equação de Boltzmann aos pontos experimentais:

G / Gmax = 1 / (1 + exp ((V50 – Vm) / k)) (3)

Onde Gmax é a condutância máxima da série de pulsos, V50 é o potencial em que

G/Gmax alcança a metade do valor máximo e, k é o grau da inclinação que descreve

os passos da dependência de voltagem de ativação.

O protocolo utilizado na análise do processo de ativação, parte de um potencial

manutenção de -60 mV, apresenta um pré-pulso de -100 mV por 100 ms, e continua

com uma série de pulsos despolarizantes (-100 mV a 0 mV em incrementos de 5

mV) com duração de 100 ms.

A acetona causou modificação da relação condutância-voltagem, observada na

alteração dos valores de V50, de maneira dose-dependente, para potenciais mais

despolarizados. Observando os valores resumidos na figura 5, notamos que a menor

concentração de acetona efetiva, para este processo, foi de 20 mM, com reversão

parcial do efeito após a retirada da acetona por 10 minutos (período de

recuperação). Esta modificação certamente confere menor excitabilidade aos

neurônios DRGs.

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39

-60 -50 -40 -30 -20 -100.0

0.2

0.4

0.6

0.8

1.0ControleAcetona 10 mMAcetona 20 mMAcetona 40 mMRecuperação

Vm-ENa

G/G

max

Figura 4: Relação condutância - voltagem do processo de ativação das correntes de sódio totais (na ausência de tetrodotoxina). A condutância foi normalizada pela a maior condutância e plotada em função da força motriz para o íon sódio (Vm-ENa). Algumas curvas foram omitidas para melhor visualização do gráfico. O esquema no topo da figura representa o protocolo utilizado (descrito no texto).

-60 mV

100 ms -100 mV

0 mV

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40

V50 da Ativação

-35

-30

-25

-20ControleAcetona 5 mMAcetona 10 mMAcetona 20 mMAcetona 30 mMAcetona 40 mMRecuperação

** ****

*

mV

Figura 5: V50 do processo de ativação dos canais para sódio. O V50 obtido foi de -29,8±1,03 mV (13) para o controle, -30,7±1,24 mV (13) para acetona 5 mM, -27,7±0,86 mV (13) para acetona 10 mM, -24,0±0,87 mV (13) para acetona 20 mM, -22,8±1,06 mV (13) para acetona 30 mM, -21,1±1,06 mV (11) para a acetona 40 mM e -26,9±1,16 mV (9) para a recuperação. (*P<0,05, ** P< 0,001).

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41

6.4 Efeito da acetona na dependência de voltagem da inativação no estado

estacionário das correntes de sódio

A dependência de voltagem do processo de inativação no estado estacionário das

correntes de sódio totais das células DRG está representada na figura 6. O protocolo

utilizado para verificar a fração disponível da corrente de sódio, consiste

basicamente por dois pulsos, o primeiro chamado de pré-pulso, é usado para

estabilizar a inativação no estado estacionário e o segundo pulso é usado para

avaliar a corrente disponível de sódio. As curvas da dependência de voltagem da

inativação da corrente de sódio representam ajustes calculados através da equação

de Boltzmann:

G / Gmax = 1 / (1 + exp ((Vm – V50) / k)) (4)

Onde Gmax é a condutância máxima da série, V50 é o potencial em que a razão

G/Gmax alcança a metade do valor máximo e, k é o grau da inclinação que descreve

os passos da dependência de voltagem na cinética de inativação.

Ao contrário do que vimos anteriormente, a acetona causou modificação da relação

condutância-voltagem, observado na alteração dos valores de V50, de maneira

dose-dependente, para potenciais mais hiperpolarizados. Observando os valores

resumidos na figura 7, notamos que a menor concentração de acetona efetiva, para

este processo, foi de 5 mM, com reversão parcial do efeito após a retirada da

acetona por 10 minutos. Assim como a modificação observada no processo de

ativação, esta também confere menor excitabilidade aos neurônios DRGs. Além

disso, este processo mostra-se mais sensível à ação da acetona, haja vista o efeito

significativo observado na concentração de 5 mM.

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42

-60 -50 -40 -30 -20 -10 00.0

0.2

0.4

0.6

0.8

1.0ControleAcetona 10 mMAcetona 20 mM

Acetona 40 mMRecuperação

Vm-ENa

G/G

max

Figura 6: Dependência de voltagem do processo de inativação no estado estacionário das correntes de sódio totais (na ausência de tetrodotoxina) em solução controle (linha preta) e na presença de acetona 20 mM (linha azul). O protocolo utilizado na análise do processo de inativação, para medir a fração disponível da corrente de sódio, consiste de uma série de pré-pulsos (-100 mV a 0 mV em incrementos de 5 mV) por 100 ms, seguido por um pulso de 0 mV por 40ms. A condutância foi normalizada para a maior condutância da série e plotada contra a força motriz para o íon sódio (Vm-ENa).

-60 mV

-100 mV 100 ms 100 ms

0 mV

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43

V50 da Inativação

-42.5

-40.0

-37.5

-35.0

-32.5

-30.0ControleAcetona 5 mMAcetona 10 mMAcetona 20 mMAcetona 30 mMAcetona 40 mMRecuperação

****

**

**

***

mV

Figura 7: : V50 do processo de inativação dos canais para sódio. O V50 foi de -32,2±0,19 mV (13) para o controle, -33,3±0,16 mV (13) para acetona 5 mM, -33,5±0,24 mV (13) para acetona 10 mM, -35,9±0,12 mV (13) para acetona 20 mM, -36.9±0,37 mV (12) para acetona 30 mM, -40,3±0,59 mV (10) para a acetona 40 mM e -35,7±0,24 mV (8) para a recuperação. (* P < 0,05, ** P<0,001).

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6.5 Efeito da acetona sobre as correntes de sódio T TX-R evocadas em

neurônios DRGs

Como visto até agora, a acetona afetou tanto o processo de ativação quanto o

processo de inativação no estado estacionário das correntes totais de sódio, ambos

observados com a alteração do V50. É razoável supor que estas alterações

determinam menor excitabilidade aos neurônios DRGs. Para diferenciarmos o efeito

da acetona sobre as correntes de sódio TTX-S e TTX-R, utilizamos a tetrodotoxina

na concentração de 250 nM. As correntes de sódio TTX-R foram medidas sob

condições idênticas às correntes totais de sódio. A figura 8 mostra uma família de

correntes de sódio TTX-R, aqui denominada condição controle, e na presença de 20

mM de acetona. Assim como foi observado anteriormente nas correntes totais de

sódio, a acetona reduziu a amplitude das correntes de sódio TTX-R.

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45

Figura 8: Registros representativos de correntes de sódio TTX-R em neurônios dos gânglios da raiz dorsal (DRGs). O registro inferior compara os traços de cada condição experimental, obtidos nas condições controle (TTX) e na presença de TTX mais acetona 20 mM, durante o pulso de -15 mV. O protocolo utilizado foi idêntico àquele utilizado nas correntes totais. (escala: 500 pA por 10 ms)

TTX 250 nM TTX (250 nM) + acetona (20 mM)

TTX TTX + acetona

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6.6 Efeito da acetona na dependência de voltagem da ativação da corrente de

sódio TTX-R

A figura 9 mostra a dependência de voltagem do processo de ativação da corrente

de sódio TTX-R nas células DRGs. As curvas da dependência de voltagem da

ativação das correntes de sódio TTX-R foram ajustadas através da equação 3.

Como observado anteriormente, nas correntes totais, a acetona modificou o V50 de

ativação para valores mais despolarizados. Não houve diferença significativa do V50

entre as correntes de sódio TTX-R na ausência e na presença de acetona 20 mM.

Juntos, estes dados sugerem que a ação da acetona se dá sobre o processo de

ativação dos canais TTX-S, mas não sobre a ativação dos canais TTX-R.

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-60 -50 -40 -30 -20 -100.0

0.2

0.4

0.6

0.8

1.0

TTxTTx + Acetona

Vm-ENa

G/G

max

Figura 9: Dependência de voltagem do processo de ativação das correntes de sódio TTX-R, na ausência e na presença de acetona 20 mM, V50 (mV) = -36,37±0,20 (19) e -35,14±0,18 (19), respectivamente. O protocolo utilizado neste experimento foi o mesmo da dependência de voltagem no processo de ativação das correntes de sódio na ausência de tetrodotoxina.

-60 mV

100 ms -100 mV

0 mV

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48

6.7 Efeito da acetona na dependência de voltagem da inativação no estado

estacionário da corrente de sódio TTX-R

As correntes macroscópicas foram registradas em células submetidas ao tratamento

com tetrodotoxina na ausência e na presença de acetona 20 mM. A dependência de

voltagem do processo de inativação no estado estacionário das correntes de sódio

TTX-R das células DRGs está representada na figura 10. O protocolo e a análise

dos dados foram os mesmos utilizados na dependência de voltagem da inativação

das correntes de sódio totais, para que pudéssemos comparar diretamente os

dados.

De acordo com o que observamos aqui, a acetona também causou modificação da

relação condutância-voltagem para potenciais mais hiperpolarizados, da mesma

magnitude daquele observado para o V50 das correntes totais. Assim, é razoável

atribuir o efeito observado anteriormente à ação da acetona sobre os canais TTX-R.

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-70 -60 -50 -40 -30 -20 -100.0

0.5

1.0TTxTTx + Acetona

Vm -ENa

G/G

max

Figura 10: Dependência de voltagem do processo de inativação no estado estacionário das correntes de sódio TTX-R, na ausência e na presença de acetona 20 mM, V50 (mV) = -39,40±0,20 (19) e -46,69±0,32 (19)*, respectivamente (*P<0,001).

-60 mV

-100 mV 100 ms 100 ms

0 mV

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50

Com o intuito de verificarmos possíveis efeitos sobre a morfologia dos potenciais de

ação, realizamos medidas de clampeamento de corrente. Para estudarmos o efeito

da acetona sobre os potenciais de ação utilizamos as soluções de banho e de pipeta

descritas nas tabelas V e VI, respectivamente. Os registros dos potenciais de ação

foram realizados através de dois protocolos de pulsos de corrente. Um protocolo

consistia em um único pulso despolarizante com duração de 1 ms, e o outro

(estímulo persistente) com duração de até um segundo. As análises dos parâmetros

de amplitude, duração, e taxa de despolarização (dV/dt) ficaram prejudicadas,

devido a grande variabilidade na morfologia dos potenciais de ação entre as células

e na densidade de corrente. (BLAIR; BEAN, 2002).

Como exemplo de efeito funcional sobre os potenciais de ação, a figura 11 mostra

registros de potenciais de ação deflagrados por estímulo persistente, obtidos na

condição controle, na presença de 250 nM de tetrodotoxina e na presença de 20 mM

de acetona mais 250 nM de tetrodotoxina. Podemos observar que a estimulação

persistente gera potenciais de ação repetitivos em todas as condições

experimentais, sem que as freqüências de disparos medidas do primeiro ao último

pico, apresentassem grandes diferenças. Como o esperado, os canais TTX-R foram

capazes de deflagrar uma seqüência de disparos maior que a do grupo controle,

condição que foi abolida na presença de acetona.

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Controle TTX 250 nM

TTX + Acetona

Controle TTX 250 nM

TTX + Acetona

Controle TTX 250 nM

TTX + Acetona

Figura 11: Registros dos potenciais de ação em neurônios DRGs. O registro inferior mostra potenciais de ação submetidos à ação da acetona após 2 minutos de exposição. (escala: 20 mV por 0,2 s)

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7 DISCUSSÃO

O mecanismo de ação pelo qual a dieta cetogênica atua como anticonvulsivante

ainda não é bem compreendido. Uma das hipóteses seria o aumento da síntese dos

corpos cetônicos, porém não existem estudos sobre o efeito desses compostos em

células isoladas, principalmente quanto a um possível efeito per se destas

substâncias sobre a excitabilidade celular. Nossos resultados demonstram

claramente que a acetona tem efeito inibitório direto sobre as correntes de sódio de

células DRGs.

Os corpos celulares dos neurônios DRGs expressam uma variedade de isoformas

de canais para sódio dependentes de voltagem (CATTERALL et al., 2005). De

acordo com os nossos experimentos, podemos admitir a presença de dois tipos de

canais para sódio: aqueles que demonstraram sensibilidade à TTX, cujas correntes

são geradas pelas isoformas Nav 1.1, Nav 1.6 e Nav 1.7 e as correntes geradas pelos

canais resistentes à TTX, representadas pelas isoformas Nav 1.8 e Nav 1.9 (RUSH et

al., 2007). A associação destas isoformas exibe um misto de suas características

(demonstrado na tabela I) durante os registros eletrofisiológicos.

De acordo com os nossos resultados, a acetona apresentou efeitos distintos sobre

as correntes de sódio. Nas correntes totais ocorreu uma alteração no processo de

ativação, e o V50 tornou-se mais positivo em relação ao controle. Este efeito não foi

observado na presença de tetrodotoxina, sugerindo uma ação direta da acetona

sobre o processo de ativação das correntes TTX-S, mas não das TTX-R. Por outro

lado, nas correntes de sódio TTX-R a acetona afetou somente o processo de

inativação no estado estacionário, o V50 tornou-se mais negativo, apresentando

mesma magnitude de variação que aquela observada nas correntes totais. A

combinação desses efeitos permite-nos concluir que a acetona exerce efeito

inibitório diferencial sobre os canais TTX-S e TTX-R.

A concentração equivalente ao IC50 (efeito inibitório sobre as correntes totais de

sódio) foi de 21,5 mM, suficiente para atuar sobre o processo de ativação das

correntes TTX-S (figura 2), na qual ainda conseguíamos reverter o efeito inibitório

sobre as correntes de sódio, ainda que parcialmente. Temos que considerar se o

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efeito sobre a ativação das correntes totais carrega significado fisiológico, pois a

menor concentração efetiva da acetona foi de 20 mM, um valor que aparenta ser

muito elevado para uma condição de cetoacidose. Foi possível observar no entanto,

o efeito da acetona na concentração de 5 mM sobre o processo de inativação das

correntes TTX-R. Alguns estudos in vivo, têm demonstrado que a concentração de

acetona no plasma pode atingir valores iguais ou acima de 15 mM (SULWAY;

MALINS, 1970). Estes valores plasmáticos podem ser explicados pelo fato de que o

acetoacetato produzido em maior quantidade que a acetona, seria convertido em

acetona por uma reação de descarboxilação (REICHARD et al., 1979, OWEN et al.,

1982). Pacientes epilépticos que responderam favoravelmente à KD, apresentaram

aumento da concentração de acetona no cérebro acima de 1 mM (1mmol/Kg por

peso do cérebro), detectado por espectroscopia de ressonância magnética

(SEYMOUR et al., 1999). Mais recentemente Likhodii e Burnham (2002),

demonstraram que a administração aguda de acetona (10 mmol/Kg) em modelos de

ratos PTZ, elevou os níveis de acetona no fluido cerebroespinhal para 10,3 mM,

também detectado por espectroscopia de ressonância magnética. Nesta

concentração, a acetona foi capaz de produzir efeito anticonvulsivante significativo.

As concentrações de acetona no plasma e no fluido cerebroespinhal são similares e

diretamente proporcionais à dose injetada, possivelmente pelo fato da acetona não

se ligar significativamente a proteínas plasmáticas e por difundir-se livremente

através da barreira hematoencefálica, diferentemente dos outros dois corpos

cetônicos que requerem um transportador (LIKHODII et al., 2003; MUSA-VELOSO,

et al., 2006). Quando comparada com os demais corpos cetônicos, a concentração

plasmática da acetona sugere um papel fisiológico potencialmente importante para

esta substância.

Uma possível explicação para o mecanismo de ação da acetona, seria sua

capacidade de modificar a fluidez da membrana celular. Estudos realizados por

Overton (1901) e Meyer (1937) sugerem que a potência anestésica de uma

substância apresenta uma correlação direta com a sua lipossolubilidade. Segundo

esta hipótese, a presença destes agentes na bicamada lipídica produziria uma

mudança na fluidez da membrana. A acetona, além de possuir coeficiente de

partição igual a um, possui também propriedades anestésicas (MUSA-VELOSO et

al., 2006; TANII, 1996). Portanto, mudanças na fluidez de membrana alterariam as

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propriedades dos canais para sódio, contribuindo para o efeito inibitório da acetona

sobre a excitabilidade de neurônios DRGs. Vários experimentos demonstram que a

fluidez de membranas de hemácias de diabéticos diminui com o aumento tanto da

concentração dos corpos cetônicos plasmáticos, como também da glicemia,

atribuindo-se a estes fatores o efeito observado (CANDILOROS et al.,1995)

Outros estudos sugerem que o efeito anestésico estaria correlacionado com a

habilidade da substância em se ligar a proteínas dos canais para sódio, diminuindo a

sua condutância (FRANKS; LIEB, 1984; LARSEN et al., 1996). No entanto, nossos

resultados admitem outra hipótese, pois a acetona atua em diferentes canais de

sódio e em processos distintos. O modelo de Hodgkin-Huxley assumia os

componentes de ativação e inativação como processos independentes na cinética

dos canais iônicos, mas atualmente vários estudos têm demonstrado que o processo

de inativação dos canais para sódio é independente de voltagem e promovido pela

ativação do canal (HODGKIN; HUXLEY, 1952; KUO; BEAN, 1994; BEAN, 2007).

Existem evidências de que a propriedade de proteção anticonvulsivante conferida

pela KD, dependeria das propriedades anestésicas dos compostos que contêm

grupos cetônicos (VAMECQ et al., 2005)

Os canais para sódio dependentes de voltagem em neurônios DRGs estão

envolvidos na percepção da dor associado com a inflamação ou lesão do nervo

(AMIR et al., 2006). Em pequenos neurônios DRGs, assumidos como nociceptores,

há um aumento na expressão das isoformas Nav 1.3, 1.7 e 1.8 em modelos de dor

inflamatória usando a carragenina (BLACK et al., 2004). A hiperexcitabilidade

observada em neurônios aferentes danificados está correlacionada com um aumento

das propriedades intrínsecas eletrogênicas de suas membranas e não devido a uma

ação sináptica, fazendo dos canais para sódio um contribuinte essencial para a dor

neuropática. Entre os fármacos utilizados para o alívio da dor neuropática estão os

estabilizadores de membrana como, por exemplo, os anestésicos locais (ex.

lidocaína) e anticonvulsivantes (ex. carbamazepina), que além de suprimir a

excitabilidade da membrana conferem uma ação analgésica (DEVOR, 2006).

Os canais TTX-R de inativação lenta apresentam uma recuperação rápida da

inativação, permitindo uma atividade sustentada em resposta a estímulos repetitivos,

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desta forma, estes canais contribuem para o processo de adaptação lenta (ELLIOTT;

ELLIOTT, 1993). Pudemos observar na figura 11 eventos repetitivos por estímulos

persistentes, que devem ser mantidos pelos canais TTX-R. No entanto, na presença

de acetona, observamos a diminuição do número de disparos, denotando a

capacidade da acetona em minimizar possíveis aumentos na freqüência de

potenciais de ação. O mecanismo pelo qual a acetona exerce este efeito não está

restrito à diminuição da corrente iônica, podendo também haver a facilitação da

acomodação ao estímulo. Achamos pouco provável que haja comprometimento do

tempo de recuperação da inativação dos canais, visto que não houve diferenças

significativas na recuperação de correntes medidas no intervalo de 12 ms nas

condições controle e na presença de acetona 20 mM (resultados não mostrados).

Ainda de acordo com nossos resultados, a contribuição da acetona para o

mecanismo de ação da dieta cetogênica deve ser levado em consideração. Contudo,

é necessário maior esclarecimento sobre o efeito da acetona na recuperação das

correntes de sódio após a inativação, sobre os potenciais de ação, e também avaliar

o efeito crônico desta substância. Estudos sugerem que a acetona aumenta a

condutância de cloreto via receptores gabaérgicos e glicinérgicos e inibe a função

dos receptores de NMDA, produzindo uma hiperpolarização neuronal (YANG et al.,

2007), e se a expressão dos canais para sódio é afetada em longo prazo.

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