Aborto ainda é desafio para ações de saúde
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SALVADORSALVADOR TERÇA-FEIRA 20/3/2012A4
REGIÃO METROPOLITANA
Editor-coordenadorCláudio Bandeira
FÉ História de Irmã Dulce é contada em livroilustrado que será lançado dia 22 www.atarde.com.br
IMPACTO A interrupção induzida da gravidez aparece como quarta causa de morte materna e produz altos custos para o SUS
Aborto ainda é desafio para ações de saúdeJULIANA BRITO
Embora não represente aprincipal causa de morte ma-terna na Bahia, o aborto in-seguro – que é definido comoaquele realizado sem as ha-bilidades necessárias ou emambiente sem padrões mé-dicos mínimos– continua aapresentarumquadrodesaú-de pública preocupante. Ele éo quarto motivo de morte ma-terna, segundo dados do Mi-nistério da Saúde. A primeiracausa é hipertensão, seguidapor hemorragias e infecçãopós-parto.
Além disso, um estudo rea-lizado, em 2010, por pesqui-sadores da Universidade deBrasília (UnB) que, por suaamplitude continua servindode referência, mostra que, na-quele ano, mais de 220 milinternações por aborto – 23mil delas só na Bahia e maisde seis mil em Salvador – ge-raram um gasto superior aR$ 42 milhões ao SUS.
Dentre as causas das inter-nações, o aborto espontâneo(término acidental de umagravidez com menos de vintesemanas) representou, no Es-tado, 63% (14.637 mil) e, nacapital, 68% (4.766 mil, se-gundo a Secretaria de Saúdedo Estado da Bahia (Sesab).
De acordo com o médicoCarlos Menezes, o aborto in-seguro não é mais a principalcausa de morte materna, masnem por isso deixa de serpreocupante. “A redução dosdanos ao organismo não é ga-rantida”, diz.
CustosO diretor-técnico da Mater-nidade Tsylla Balbino, JamesCadidé estima que 30% dasinternações na instituiçãosão por aborto. “Estas pacien-tes ficam em média de dois atrês dias internadas. Conside-rando o custo médio de in-ternaçãodiáriaemR$120,istodá um custo mensal de R$46.800eumcustoanualdeR$561.600”, afirma.
Os custos psicológicos tam-bém são grandes. A comer-ciária Roberta*, 29 anos, pas-sou pela experiência de umaborto induzido há três anos.Solteira e desempregada, re-solveu interromper uma ges-tação de quatro meses commisoprostol tomando umaquantidade quatro vezesmaior que a usual.
“O bebê não saiu e eu fiqueicom medo. Lembrei de umaconhecida que teve um bebêportador de deficiência nu-ma situação igual a minha”,acrescenta a comerciária.
Ela resolveu pedir ajudaaos pais e procurar uma clí-nica de aborto. Por conta doprocedimento, a comerciáriaperdeu muito sangue e pre-cisou ser internada em umhospital para passar por umatransfusão. “É uma experiên-cia que não quero passar nun-ca mais na vida”, afirma.
Os especialistas são unâni-
Em 2010, asinternações poraborto geraram,para o SUS, umcusto deR$ 42 milhões
Para osespecialistas, énecessárioampliar as açõesde educação eassistência
Iperba realizaprocedimentoem casos compermissão legalNa Bahia, o único hospital au-torizado para realizar abortonos casos em que ele é per-mitido por lei – de feto anen-cefálico e gravidez por estu-pro –, é o Instituto de Peri-natalogia da Bahia (Iperba).“Há mais de quatro anos fa-zemos isso”, diz o coordena-dor-médico Henrique Amo-rim. Nos casos de estupro,basta que a mulher relate acausa da gravidez para poderrealizá-lo.
“Mas a gestante é atendidapor uma equipe multidisci-plinar e os pareceres são ava-liados pela Comissão de ÉticaMédica do Hospital. Se a co-missão não aprovar, não temcomo fazê-lo, mas nuncaocorreu aqui um caso destetipo”, explica a epidemiolo-gista Elizabeth Marinho.
LesãoA maternidade tem, em mé-dia, 18% das suas internaçõese 30% dos seus atendimentosrelacionados a abortos. “Cer-ca de 30% dos leitos daqui sãopara esses casos. No pré-par-to, há quatro leitos diaria-mente ocupados por essa cau-sa” , diz o médico.
Ele conta que na maioriados abortos induzidos há ouso da substância misopros-tol. “Isso representa uma evo-lução. Antigamente, as ges-tantes usavam ferros e até so-da cáustica. O custo do SUS,nesta época, era altíssimo porconta de lesões nas vísceras”,acrescenta o médico.
Religiões têmvisões diferentessobre a práticaabortivaAs religiões têm interpreta-ções variadas sobre o aborto.A mais difundida é a católica,que possui forte militânciacontra a prática. Membro domovimento Comunhão e Li-bertação, ligado à Igreja Ca-tólica, Gilberto Bomfim ex-plica a visão dos católicos so-bre o tema.
“A princípio, coloca-se nacondição de um pecado gra-víssimo, por matar um ser in-defeso”, diz. “Claro que no en-tendimento da Igreja há ate-nuantes, como o estupro, orisco de morte, mas não adotao aborto como solução. Oaborto é uma coisa que é feitapara resolver um problemada mulher, mas cria outro”.
Para André Peixinho, pre-sidente da Federação Espíritado Estado da Bahia (Feeb), oaborto induzido é reflexo domaterialismo. “As gestaçõessão formas de encarnação doespírito, por isso devem serpreservadas. Portanto, nadade aborto; a gravidez é umaexperiência que o espíritotem que passar”, opina.
Já para o babalorixá do ter-reiroOxumarê,SilvaniltoMa-ta, o aborto é uma questão desaúde pública. “O aborto nãoé permitido dentro da reli-gião, mas ela também não ocondena, até porque muitasjovens que o fazem acabammorrendo. O candomblé nãoprocura culpa, mas compre-ensão”, acrescenta o mais altosacerdote do terreiro locali-zado na Federação.
mes em apontar a necessida-de de investimentos em saú-de sexual e reprodutiva parareduzir os casos de aborto in-duzido. “As políticas nestesentido já foram mais eficien-tes em Salvador”, critica o mé-dico Carlos Menezes. “Essa é acapital no Brasil com o maiornúmero de abortos em com-paração ao número de par-
tos”, afirma.Menezes destaca a relação
estudo-aborto. “Quanto me-nos educada formalmente,menos preparada a mulhervai ser sexualmente. Isso re-sulta em uma gestação inde-sejada”, diz o médico.
Para a antropóloga DéboraDiniz, a combinação abortolegal e promoção de saúde re-
produtiva seria o ideal. “Es-tudos recentes vêm indican-do que o aborto legal aliado apromoção de saúde reprodu-tiva não causam a banaliza-ção do aborto”, diz.
* USO DE NOME FICTÍCIO A PEDIDODA FONTE
COLABOROU JULIANA DIAS
Discussão sobreas várias facesdo tema ainda étabu e gerapolêmica noBrasil
SAÚDE
Viroses sobrecarregam clínicasDAVI LEMOS
A operadora de caixa JéssicaVasconcelos, 20 anos, só con-seguiu atendimento para a fi-lha Emily Vasconcelos, dedois meses, às 18h de ontemno pronto atendimento doHospital Pediátrico ProfessorHosannahdeOliveira,daUni-versidade Federal da Bahia(Ufba). Isto depois de peregri-nar por outras quatro unida-des de emergência pediátri-ca, onde não achou vagas.
“Fui em um posto em Pi-rajá, depois passei pelo SantoIzabel e São Rafael e também
no Ramiro de Azevedo, noCampo da Pólvora”. Ela che-gou ao Hosannah às 15h13 einformou que nem atendi-
mento particular conseguiunasemergênciasdoSantaIza-bel e do São Rafael.
Pelo menos 20 pais e mãesaguardavam ontem atendi-mento no Hosannah. A mes-ma situação repetiu-se em clí-nicas particulares. Na Pró-Ba-by, na Barra, havia avisos noportão de acesso e na sala deespera, indicando lotaçãomáxima e demora de até duashoras para os atendimentosde emergência. Uma funcio-nária da clínica informou quenão havia também vagas parainternamento,poisos12apar-tamentos e os dez leitos de
enfermaria estavam ocupa-dos. A reportagem não con-seguiu contato com as dire-torias dessas unidades desaúde.
A médica pediatra Célia Sil-vany apontou que este au-mento de demanda é por con-ta do vírus sincicial respira-tório que causa quadros decongestão nasal, febre e di-minuição de apetite. Ela sa-lienta que em quadros comfalta de ar ou asma, deve-selevar a criança à emergência.Nos adolescentes, a pediatradiz que a época do ano é pro-picia a quadros de dengue.
Fernando Vivas / Ag. A TARDE
O Hospital Hosannah de Oliveira recebeu alta demanda
Infecçõesrespiratóriassão a principalcausa daprocura poratendimento
Gravidezectópica*
Molahidatiforme**
Outrosprodutos
anormais daconcepção***
20092008 2010
RANKING Números de internações por abortoem Salvador e Bahia
FONTE SESAB/SUVISA/DIS-SIH Editoria de Arte A TARDE
Abortopor razõesmédicase legais
Aborto nãoespecificado
165777
51248
561
4.286
31194
836
3.020
9522.843
8512.203
2287
47102
720
4.002
816
4.128
52292
94
304
254
969
3251.003
BahiaSalvador
Abortoespontâneo
14.164 14.630 14.637
4.590 4.541 4.766
*Gestação que ocorre fora da cavidade uterina
**Tumor que se desenvolve a partir de tecido placentário***Material orgânico em estado anormal