A SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO NA LEI Nº 9099 … · A Suspensão Condicional do Processo...

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO ``LATU SENSU`` A SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO NA LEI Nº 9099 DE 26 DE SETEMBRO DE 1995 . ADALGIZO BENTO DOS REIS Rio de Janeiro 2009

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO ``LATU SENSU``

A SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO NA LEI Nº 9099 DE 26 DE SETEMBRO DE 1995 .

ADALGIZO BENTO DOS REIS

Rio de Janeiro

2009

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ADALGIZO BENTO DOS REIS

A SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO NA LEI Nº 9099 DE 26 DE SETEMBRO DE 1995.

Monografia apresentada ao Curso de Pós-Graduação em Direito Penal e Processo penal na Universidade Candido Mendes, como requisito parcial para a obtenção do grau de especialista e Direito Penal e Processo Penal.

Orientadora: Valesca Rodrigues

Rio de Janeiro

2008

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DOS REIS, Adalgizo Bento. A Suspensão Condicional do Processo na Lei Nº 9099 de 26 de setembro de 1995. Rio de Janeiro: UCM, 2009 72 p.; 21 x 29.7 cm. 1. A Suspensão Condicional. 2. Processo. 3. Iniciativa da Proposta.

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ADALGIZO BENTO DOS REIS

A SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO NA LEI Nº 9099 DE 26 DE SETEMBRO DE 1995.

––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Profa. Valesca Rodrigues – Orientadora

––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––––– Prof.

Rio de Janeiro

2009

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Dedico esta monografia a minha esposa Vanderlucia, que de forma incansável sempre me ajudou, pois sem ela não estaria realizando esse meu sonho.

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Instruir-te-ei e te ensinarei o caminho que deves seguir: e sob as minhas vistas, te darei conselho. Escrituras Sagradas no livro do Salmista Davi - Capítulo 32, versículo 8.

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De tanto vê crescer as nulidades;

De tanto vê crescer as injustiças;

De tanto vê agigantar-se os poderes nas mãos dos maus...

O homem chega a desanimar-se da virtude;

A rir-se da honra e ter vergonha de ser honesto. (Rui Barbosa )

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RESUMO

O trabalho tem por objetivo, discutir a titularidade da proposta do benefício legal da

suspensão condicional do processo, expondo a criação, conceito, natureza jurídica,

constitucionalidade e admissibilidade, constituindo em suspensão condicional do processo,

um direito do acusado ou uma faculdade atribuída ao Ministério Público?

Discutem-se também, os requisitos necessários para a concessão desse benefício

outorgado pela lei 9099/95 Lei do Juizado Especial Cível e Criminal.

Dessa forma, esse novo instituto, causou significativas mudanças no âmbito da justiça

penal brasileira e, afinal, vamos analisar à questão supramencionada, se tanto o Ministério

Público, como a requerimento do acusado, ou ainda, por iniciativa do magistrado, pode-se

obter a suspensão do processo. Verificaremos os requisitos legais, a doutrina e o

entendimento jurisprudencial sobre esse assunto. Palavras-chave: Suspensão, Condicional,

Processo, Lei Juizado Criminal.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO......................................................................................................... p. 9 2 A LEI DOS JUIZADOS ESPECIAIS CRIMINAIS.............................................

p. 11

2.1. Contexto Histórico da Suspensão Condicional do Processo.............................. p. 13 2.2. Princípios que determinam o Caráter Específico do Benefício legal............... p. 16 2.3. Conceito de Suspensão Condicional do Processo............................................... p. 22 2.4. Limites do Instituto Quanto ao Conceito de Menor Potencial Ofensivo......... p. 24 2.5. Objetivo do Artigo 89 da Lei 9099/95.................................................................. p. 28 2.6. Natureza Jurídica do Instituto............................................................................. p. 29 3 INICIATIVA DA PROPOSTA DO BENEFÍCIO LEGAL PELO MINISTÉRIO PÚBLICO............................................................................................

p. 31

3.1. Ação Penal Pública................................................................................................ p. 31 3.2. Atuação do Ministério Público – Iniciativa da proposta................................... p. 34 3.3. Aceitação da proposta pelo acusado e seu defensor........................................... p. 43 3.4. Atuação do Juiz..................................................................................................... p. 46 3.5. A decisão que suspende o Processo..................................................................... p. 50 3.6. Período de Prova................................................................................................... p. 51 4 CONTROLE SOCIAL............................................................................................

p. 56

4.1. Função Ressocializadora...................................................................................... p. 58 4.2. Pena ou Sanção...................................................................................................... p. 59 4.3. Das condições e o Descumprimento de Condições............................................. p. 61 CONCLUSÃO..............................................................................................................

p. 65

REFERÊNCIAS BIBLIOGRAFIAS.........................................................................

p. 68

ANEXO........................................................................................................................

p. 69

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1 INTRODUÇÃO

A partir do momento que o homem passou a conviver em sociedade, houve a

necessidade de estabelecer normas de convivência, sem a qual a coletividade faria o que bem

quisesse, só que o aumento da criminalidade fez com que as normas fossem modificadas a fim

de ajustar desequilíbrios sociais. A lei dos juizados criminais inovou o direito criminal na

tentativa de não mais aplicar pena privativa de liberdade aos crimes de pena máxima de um

ano. O exame desse tema é polêmico, visto que a sociedade brasileira vem sofrendo com o

aumento da violência e criminalidade.

A Suspensão Condicional do Processo foi criada na lei 9099/95 lei dos Juizados Cíveis

e Criminais. A Constituição da República Federativa Brasileira de 1988 permitiu a criação

dos Juizados para julgamento de crimes de menor potencial ofensivo, ou seja, menor potencial

de agressão, instituindo um novo modelo de justiça criminal e foram adotados os seguintes

institutos: transação penal e suspensão condicional do processo nos juizados criminais.

Vamos abordar somente a suspensão condicional do processo por tratar-se de medida

despenalizadora e que o sujeito acusado de cometer crime com pena máxima de um ano de

reclusão ou detenção, seria beneficiado por esse instituto. A proposta desse benefício legal é

feita pelo Ministério Público, somente ele poderá propor essa medida, mas há doutrinadores

que questionam isso, alegando que o juiz também poderá propor. Em audiência, o acusado

poderá aceitar ou negar essa medida. Caso aceite terá que cumprir requisitos como: de 3 em 3

meses deverá comparecer ao Juízo para prestar contas de suas atividades, não poderá mudar

ou sair do Estado sem a autorização do juiz, não deverá freqüentar locais de caráter duvidoso,

entre outros requisitos.

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As penas de detenção, ou seja, são penas de prisão sem isolamento diurno e noturno

no início de seu cumprimento, diferentemente da pena privativa de liberdade que é mais

severa ou rigorosa por haver um período inicial de isolamento noturno e diurno.

Ao que se deve o aumento da criminalidade? Culpamos o Judiciário, o Código Penal,

enfim. O Brasil tem uma das maiores legislações do mundo e, no entanto, a criminalidade

vem aumentando.

As Nações Unidas vem recomendando a aplicação efetiva da legislação criminal. Em

relação ao Brasil, nós não conseguimos aplicar nem isso. A premissa de manter um sistema de

Justiça Criminal justo, ético e eficiente,porém tal fato não vem ocorrendo.Este fato cria na

população a consciência de que não há punição.

Esta monografia destina-se a analisar qual é a titularidade de propor esse benefício, já

que é uma nova abordagem praticada no campo da justiça criminal brasileira.

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2 A LEI DOS JUIZADOS ESPECIAS CRIMINAIS

A lei 9099/95 disciplinou os Juizados Especiais Cíveis e Criminais e acabou por

regular o novo instituto da suspensão condicional do processo em seu art. 89.

Nos crimes em que a pena mínima cominada for igual ou inferior a 1 (um) ano, abrangidas ou não por esta lei, o Ministério Público, ao oferecer a denuncia, poderá propor a suspensão condicional do processo, por 2 (dois) a 4 (quatro) anos, desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro crime, presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena (art. 77 do Código Penal).1

Com o passar dos tempos o processo criminal passou a exigir mecanismos rápidos no

julgamento de crimes de menor potencial ofensivo, a fim de proporcionar um tempo maior

aos procedimentos de delitos mais graves. A intenção do legislador foi modernizar e dar

celeridade no tratamento de infrações penais de pequena gravidade e também dar efetividade

aos processos. Como assinala o ilustre jurista Luiz Flávio Gomes “paralelamente às leis mais

severas, surgiram o Projeto Temer, o Jobim e o Abi-Ackel, tendo este último dado origem à

lei 9099/95”.2

A Constituição da República Federativa Brasileira de 1988 em seu artigo 98, inciso I

estabeleceu o seguinte:

Juizados especiais, providos por juízes togados, ou togados e leigos, competentes para a conciliação, o julgamento e a execução de causas cíveis de menor complexidade e infrações penais de menor potencial ofensivo, mediante os procedimentos oral e sumaríssimo, permitidos, nas hipóteses previstas em lei, a transação e o julgamento de recursos por turmas de juízes de primeiro grau.3

1 Cf. Art .89, Lei 9099/95. 2 Cf.Luiz Flávio Gomes, Suspensão Condicional do Processo Penal, cit., p. 94 3 Cf. Art. 98, I, Constituição da República Federativa Brasileira de 1988.

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A tramitação do anteprojeto de lei deu-se antes mesmo da promulgação da

Constituição Federal. Dois juízes da magistratura estadual de São Paulo, Pedro Luiz Ricardo

Gagliardi e Marco Antônio Marques da Silva, ofereceram à Associação Paulista de

Magistrados a minuta do Anteprojeto sobre os Juizados Especiais. Com a promulgação do

texto constitucional foi constituído um grupo de trabalho para examinar o proposto pelos

juízes do Tribunal de Alçada Criminal do Estado de São Paulo, Antônio Carlos Viana dos

Santos, Manoel Carlos Vieira de Moraes, Paulo Costa Manso, Ricardo Antunes Andreucci e

Rubens Gonçalves, sendo convidada a Professora e titular de Processo Penal na Faculdade de

Direito da USP Ada Pellegrini Grinover, auxiliada pelos Procuradores de Justiça Antônio

Magalhães Gomes Filho e Antonio Scarance Fernandes. O Anteprojeto foi discutido pela

Seccional da Ordem dos Advogados do Brasil de São Paulo juntamente com Advogados,

Juízes, Ministério Público, Defensoria Pública entre outros. O Anteprojeto foi acolhido e

transformado no Projeto de Lei 1480/89, precedido pela mesma Exposição de Motivos que o

grupo havia elaborado mantendo seus nomes. Ocorreu à tramitação legislativa que o

Deputado Nelson Jobim havia apresentado projeto de lei, em separado referindo-se aos

Juizados Especiais Cíveis e Criminais entre outros projetos relativos às causas cíveis de

menor complexidade e às infrações penais de menor potencial ofensivo. Sendo o Relator de

todas as propostas o Deputado Ibrahim Abi-Ackel selecionou o Projeto de Michel Temer, no

âmbito penal, e o Projeto Nelson Jobim, no âmbito cível.

Portanto a Lei 9099/95, fala sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais, inspirada

no modelo político–criminal consensual e na despenalização.

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2.1 CONTEXTO HISTÓRICO DA SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO.

Existe a proximidade entre a Suspensão Condicional do Processo com o Instituto do

probation anglo-saxão, onde foi o nascedouro. A suspensão foi constituída no direito anglo-

saxão e neste primeiro vem à declaração de culpabilidade (conviction) e só depois vem o

momento da suspensão da prolação da sentença (sentence) e imposições de obrigações

impostas ao acusado. Embora seja fonte de inspiração no direito penal brasileiro, o juiz no

probation chega a declarar o réu culpado e posteriormente, caso haja concordância, o

beneficiário entra em período de prova por seis meses, conforme o Powers of Criminal Courts

Act, 1973. O que não acontece com a Suspensão.

O probation é concedido àquele que não é reincidente desde que o acusado consinta

em modificar suas atitudes, modificar seu comportamento e fazer crítica de si mesmo daquilo

que o levou a delinqüir. Nesse regime de prova o juiz da execução ajuda os interessados a

corrigir seu mau comportamento.

A probation também não é uma pena propriamente dita, pois não comporta, em si mesma, nenhuma disposição diretamente repressiva. Ela surge, assim, como uma medida, e uma medida de defesa social, pois, embora auxiliando a reinserção do condenado a sociedade, permite recuperar um indivíduo que se afastara ocasionalmente das regras da comunidade.4

O que se quer dizer é que o probation ou susrsis em regime de prova pressupõe

assistência ao delinqüente e uma participação deste no processo de reabilitação e readaptação

social.

No sistema italiano não há o que se falar em semelhança com a suspensão condicional

do processo, mas sim a celeridade processual. O Código de Processo Penal italiano de 1989

introduziu procedimentos criminais baseados no consenso entre o réu e Ministério Público.

4 Cf. Silveira, Alípio. O Sursis em regime de prova, p. 18.

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Iniciam-se tais procedimentos com o inquérito preliminar, acusação do Ministério Público,

em não havendo arquivamento segue para audiência preliminar e finaliza com julgamento.

Com a reforma objetivou-se simplificar esses procedimentos. Analisando sob o prisma

científico não há que se falar de semelhanças entre o direito penal brasileiro e o italiano, a

semelhança se dá concernente que a aplicação de pena ao imputado e no tocante a suspensão

não se fala de pena. Tecnicamente há influência da reforma processual italiana na lei 9099/95,

tanto é que há uma citação na Exposição de Motivos da Lei 9099/95.

O novo Código de Processo Penal italiano, promulgado em 1988 para viger a partir do ano em curso, nos arts. 439 e segs e 556, mantém, em observância ao disposto no n. 45 da legge delegada n. 81, de 16 de fevereiro de 1987, o instituto da lei 689/81, com algumas alterações que ampliam: o teto para a proposta de acordo, formulada por qualquer das partes e aceita pela outra , é a pena detentiva de até dois anos; deixa-se claro que a imposição da pena não surte efeitos civis e, conquanto equiparada a uma sentença condenatória, não deverá constar de certidões, nem impedirá a concessão de “sursis” sucessivo, não comportando, igualmente, condenação nas custas processuais. Dá-se ênfase, finalmente à atividade conciliativa na hipótese da ação pública condicionada à representação (artigo 557) – grifamos – (Exposição de Motivos da Lei 9099/95).5

No direito francês ocorre a suspensão condicional da pena, onde se prolata as

sentenças condenatórias, suspendendo-se a execução da pena privativa de liberdade mediante

o cumprimento de condições que, quando satisfeitas, extinguem a punibilidade e o réu perde a

primariedade, hipótese esta semelhante à suspensão condicional da pena no direito penal

brasileiro. Só em 02 de março de 1959 entrou em vigor o probation, nos artigos 738 e

seguintes, instituindo, ao lado do sursis ordinário e antigo, o “sursis em regime de prova” ou

probation. Havia um receio de que as obrigações impostas ao condenado atingissem os

direitos como de liberdade de pensamento, matéria religiosa e política ou contra a dignidade

da pessoa humana. Na França conforme afirma o professor Charles Germain “nós procuramos

criar um organismo tutelar capaz de seguir o probacionário durante todo o período de prova,

5 Cf. Ishida, Valter Kenji. A Suspensão Condicional do Processo, p. 22.

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de supervisioná-lo, de controlar suas atividades,...em sua tentativa de readaptação social.”6Os

agentes de probation, chamados pelos anglo-saxões de probation officer foram escolhidos

dentre os educadores da Administração Penitenciária, pois o legislador não quis enfrentar

inconvenientes quanto a improvisação dos agentes de probation, decidui em vista disso , por

achar prudente apoiar o instituto do probation no que já existia no sursis.

O probation no Brasil, segundo o penitenciarista “professor Charles Germain em

Conferência pronunciada na Faculdade de Direito da Universidade de São Paulo,”7 há vários

anos já dizia que o artigo 58 do código penal brasileiro já continha o início do probation, “no

sentido que ele dá ao Juízo ou tribunal poderes discricionários na escolha das obrigações que

podem ser impostas ao condenado”8. Para o ilustre professor dever-se-ia depositar confiança

na sabedoria dos juízes e parabenizou em virtude disso a lei brasileira, em que o magistrado

impunha condições negativas como se abster de bebidas alcoólicas, de freqüentar certos

lugares etc.

A suspensão condicional do processo foi idealizada pelo ilustre Desembargador

Weber Martins Batista e apresentada pela primeira vez, em 1981, em um seminário realizado

pela Escola Superior da Magistratura Nacional, na UERJ, Rio de janeiro. Em 1986, o instituto

foi introduzido no Código de Processo Penal português, como seguinte nome: “suspensão

provisória do processo”. Em 1994, a Comissão de Reforma do Código de Processo Penal,

presidida pelo Ministro do Superior Tribunal de Justiça Dálvio de Figueredo Teixeira

pretendeu introduzir no direito brasileiro o instituto da suspensão condicional do processo.

Posteriormente, a Comissão para a Reforma da Parte Geral do Código Penal , presidida pelo

Professor Miguel Reale Júnior, apresentou ao Ministro da Justiça um Projeto de Lei,o qual foi

por este enviado ao Congresso Nacional no ano de 2000, e que em seu art. 100-B prevê a

6 Cf. Siveira, Alípio. Sursis em Regime de Prova, p. 37. 7 Cf. Silveira, Alípio. Sursis em Regime de Prova, cit. Professor Charles Germain, p. 35. 8 Cf. Silveira, Alípio. Sursis em Regime de Prova, cit. Professor Charles Germain, p. 35

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“suspensão facultativa da ação penal”, que substituiria a suspensão condicional do processo

prevista no art.,89 da Lei 9099/95. Ver anexo.

A situação nos presídios é de grande mal e agrava mais ainda quando se envia

condenados menos perigosos, ao invés de proporcionar-lhes regimes chamados recuperativos

de semiliberdade ou em regime de prova.

2.2 PRINCÍPIOS QUE DETERMINAM O CARÁTER ESPECÍFICO DO BENEFÍCIO

LEGAL.

O princípio da oportunidade ou discricionariedade regrada tem dois aspectos:

a) O Ministério Público deve se orientar pelo que está na lei e não agir soberanamente e

nem justificar a não propositura por raciocínios que fujam os elencados em lei;

b) A atividade do Parquet está sujeita ao controle judicial.

O primeiro aspecto diz respeito ao poder-dever “poderá propor a suspensão do

processo”9 é o poder-dever do Ministério Público. “Este usará da oportunidade de suspender a

ação penal que estava obrigado a propor sempre que presente àquela situação regulada pela

lei”10. Esse poder-dever gera em contrapartida um direito subjetivo do réu, a jurisprudência

na suspensão condicional da pena falou acerca desse entendimento.11 O juiz natural não pode

negá-la ao réu quando existentes os pressupostos legais. De modo que na suspensão

condicional do processo ocorre o mesmo. Há doutrinadores que sustentam a premissa de que

nesse instituto está encaixada a idéia de consenso, tendo em vista o acordo de vontades

9 Cf. Art. 89 da Lei 9099/95. 10 Cf. Cintra Junior, Dyrceu Aguiar Dias, Suspensão Condicional do Processo e Desclassificação do Crime em Face dos Princípios da Igualdade e da Proteção Judiciária. RT n. 746, v. 86, p. 468, Dez 1997. 11 Cf. STF: RT 663/366; RT 642/361; RTJ 98/138.

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exercido pela manifestação de vontade entre o Ministério Público e o réu (acusado) em

conceder o benefício. Mas, observando os princípios da Lei Magna, pois está em jogo o ius

libertatis, como afirma a Declaração Universal de Direitos Humanos “Artigo I todas as

pessoas nascem livres e iguais em dignidade e direitos...”12. Isso tem fundamento no princípio

da dignidade da pessoa humana e por conseguinte a conclusão é a de que o Ministério Público

não pode em nosso sistema constitucional, exercer vontade acima da lei, como também o juiz

não o pode.

A proposição de que a suspensão do processo, desde que cumprido os requisitos

legais, é direito subjetivo do réu foi escorada pelo jurista Luís Flávio Gomes13. O autor fala a

respeito de que a oportunidade criada pela lei não é sinônimo de conveniência do Ministério

Público. O promotor de justiça está vinculado à lei art. 129, I, in fine da Constituição da

República Federativa Brasileira de 1988:

São funções institucionais do Ministério Público: I -promover, privativamente, a ação penal pública, na forma da lei.

Parte considerável da doutrina defende a idéia de que, presentes às condições

estabelecidas na lei, o juiz pode, por iniciativa própria ou a pedido do acusado, suspender o

processo. Acontece que se são preenchidas as condições legais, a suspensão provisória é um

direito do acusado, não configurando sua proposição uma faculdade do MP. Então vamos

verificar como está o entendimento jurisprudencial aplicado a esse instituto. Algumas Turmas

do STJ, apesar do entendimento contrário já consolidado no STF, vêm sustentando que tal

proposta é direito público subjetivo do réu, aduzindo que “o juiz não deve estar vinculado à

12 Cf. Art. 1º, Declaração Universal de Direitos Humanos. 13 Cf. Revista dos Tribunais, São Paulo, v. 86, n. 746, p.466, cit Suspensão Condicional do Processo penal. Ed. RT, 1995. P.168 ET SEQ.; “Sobre a natureza jurídica “, cit. 190.

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recusa do Ministério Público” (RHC n. 7.583/SP, 5ª Turma, Rel. Min. Edson Vidigal, j.

23.06.98, v.u, DJU 31/08/98, p. 110).

Uma vez ofertada a peça acusatória, “o Ministério Público, se satisfeitas as exigências

legais, tem o dever de propor a suspensão condicional do processo, ficando ao acusado com a

faculdade de aceitar ou não a proposta”³. Feita esta se o acusado e seu defensor aceitarem,

caberá ao juiz, proferir despacho liminar deferindo ou indeferindo a medida.

O Promotor de Justiça pode deixar de formular a proposta de suspensão? O promotor de justiça verificará se os requisitos legais foram preenchidos, o que deverá se manifestar, consoante exigência do artigo 129, inciso VIII da Constituição da República Federativa Brasileira de 1988. 14

O juiz poderá discordar do entendimento do Parquet?

Da mesma forma que concede o sursis, haja ou não manifestação pró ou contra o Ministério Público, certamente o direito pretoriano, considerando a finalidade do instituto, haverá permitir que, em casos dessa natureza, o juiz proponha a suspensão ao acusado presente o seu defensor. Aceita a proposta, o juiz suspenderá o curso do processo por 2 a 4 anos, dependendo da natureza da infração, impondo regime de prova a ser observado. Se o Ministério Público discordar da solução dada pelo juiz, poderá apelar com fundamento no art. 593, II CPP. 15

O que vemos disso é um poder que o juiz tem ante a ausência de proposta do

Ministério Público de decidir o conflito de interesses estabelecido entre este e o réu, em que

o juiz deverá em relação ao cumprimento da norma e do direito, dizer ao acusado do

benefício da lei e suspenderá o processo por 2 a 4 anos. Mas, isso é questionável, veremos

essa discussão no próximo capítulo.

Ao comentar o projeto da lei nº 9099/95, a professora Ada Pellegrini Grinover afirma que “o instituto insere-se perfeitamente na filosofia que informa o Anteprojeto, consistente na desburocratização e aceleração da Justiça penal...”16

14

Tourinho Filho, Fernando da Costa. Código de Processo Penal Comentado. p. 142 15 Idem 16Grinover, Ada Pellegrini. Novas Tendências do Direito Processual: de acordo com a Constituição de 1988. 2.ed. Rio de Janeiro: FU, 1990, p. 408-409.

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Quanto ao segundo aspecto refere-se ao controle judicial quanto ao caminho a ser

tomado pelo juiz quando o promotor de justiça não faz a proposta ao réu e este afirma querer

recebê-la. Há controvérsias.

Há os que entendam, como a professora Ada Pellegrini Grinover e Alberto Zachaias

Toron, que o juiz natural deve aplicar analogia o art. 28 do CPP de acordo com TACRIM-SP:

Ap. 1.017.745/1 – relator: Walter Guilherme – 12ª Câm., j. em 08/07/1996. (ver anexo). Não

houve acolhida, quanto a esse entendimento, pois esse iter apontado, pois na suspensão do

processo o réu tem direito a um pronunciamento jurisdicional a respeito do controvertido,

como sinaliza o artigo 5ª , inciso XXXV, da Carta Magna (ver anexo). Ocorre que o

procedimento previsto no art. 28 do CPP é meio de controle do princípio da obrigatoriedade

da ação penal quando o juiz entender que o promotor dele se afasta ao não propor a ação

penal, este nada pode fazer porque não é atribuída a ele a atividade persecutória. Na

suspensão há o conflito incidental, ou seja, a obrigação de acusar já foi exercida pelo

promotor, que não quer propor a suspensão, e o réu, quer recebê-la, só que havendo os

requisitos legais da lei 9099/95, caberá ao juiz dentro de suas funções típicas no processo

decidir o conflito garantindo o exercício do bom direito.

Damásio E. de Jesus “preserva que o juiz possa suspender o processo sem a proposta

do Ministério Público, de ofício, bastando que esteja identificado de forma inequívoca o

interesse do réu de obter o benefício”.17

Diante disso, fica insculpido que a política criminal do Estado – da qual se exterioriza

a medida despenalizadora da Lei 9099/95, que é traçada pelo poder público e não pela política

institucional do Ministério Público, deve agir conforme as regras jurídicas vigentes e não

conforme suas convicções. O promotor e o juiz estão vinculados, neste tema, ao princípio da

oportunidade regrada.

17 Cf. Jesus, Damásio E. Lei dos Juizados Especiais Criminais anotada. Saraiva, 1995. p. 92.

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20

O princípio da autonomia da vontade do acusado. Historicamente, desenvolvido no

século XIX, sob o efeito da doutrina econômica liberal alicerça-se sobre uma análise

filosófica individualista dos direitos subjetivos, parte da premissa de que os indivíduos em sua

essência abstrata, ou seja, estado natural, são livres e iguais, depreendendo que nada pode

obrigá-los, exceto quando expressa seu consentimento. O princípio da autonomia autos, eu,

nomos, lei indica que todos devem ser responsáveis por seus atos e essa responsabilidade,

implica atos de escolha, capacidade de a pessoa governar-se a si mesma, escolher, dividir,

avaliar, sem restrições internas ou externas. Na qualidade de plenos sujeitos de direitos, a

partir de suas próprias convicções surge então a liberdade de escolha. Convém lembrar que

SANTO TOMÁS DE AQUINO já considerava a pessoa como o que de mais perfeito e

elevado que existe no universo, definindo-a como “toda substância individual na natureza

racional”.

Neste diapasão de demonstrar a inquestionável natureza e principal razão de ser do

Estado, torna-se mais comum à inserção de determinados “direitos do homem” nas modernas

Constituições supremas que venham a adquirir forma positivada, sejam expressamente

elencados em capítulos a eles dedicados, sejam tacitamente derivados de princípios ou regras

disseminados no restante do corpo constitucional.

E não foge à regra a Carta Magna de 1988, que especialmente em seu artigo 5o presta-

se a uma tentativa de dispor os direitos e “garantias” individuais, não obstante reconheça a

limitação de um tal dispositivo e assim não despreze as demais normas e princípios que em

mesmo sentido norteiem as atividades legislativas 18. O importante é ter em mente que a

norma jurídica não é a única forma de se expressar os direitos fundamentais, e que a

composição jurídica deve ser examinada como um todo, ou seja, como um ordenamento, um

18Cf. artigo 5o. § 2o: “Os direitos e garantias expressos nesta Constituição não excluem outros decorrentes do regime e dos princípios por ela adotados, ou dos tratados internacionais em que a República Federativa do Brasil seja parte”. “Direitos Fundamentais do homem na Constituição de 1988”. In www.valorjustica.com.br

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conjunto de situações jurídicas derivadas não só objetivamente, mas subjetivamente dos

preceitos legais. A necessidade de defesa técnica no ato do consentimento expressa a

preocupação da comunidade com os direitos e garantias fundamentais. Dentro de referidos

direitos está inserida a ampla defesa, isto é a condição de quem esteja sendo submetido a

procedimento administrativo ou criminal para apuração de responsabilidade, vir a se defender

da imputação, usando para tanto de todos os meios lícitos previstos, como impedindo o

desrespeito à sua condição paritária no processo, seja ele de que natureza for. O regulamento

constitucional brasileiro em vigor, consagra em seu art. 5º, inciso LV, a plenitude de defesa,

sendo sua importância ressaltada por José Afonso da Silva:

Agora a seguinte passagem do magistério de Liebman tem ainda maior adequação ao

Direito Constitucional brasileiro:

O poder de agir em juízo e o de defender-se de qualquer pretensão de outrem representam a garantia fundamental da pessoa para a defesa de seus direitos e competem a todos indistintamente, pessoa física e jurídica, italianos (brasileiros) e estrangeiros, como atributo imediato da personalidade e pertencem por isso à categoria dos denominados direitos cívicos 19.

No caso da suspensão cabe acrescentar que a aceitação por parte do acusado nada mais

significa a ampla defesa garantida no art. 5ª da Constituição, aceitar ou não a suspensão passa

a ser estratégia da defesa e por isso que a lei exige que o acusado e seu defensor se

manifestem.

A pena de prisão hoje em nosso país é cumprida de forma inconstitucional, todas as

formas de penas proibidas formalmente na Constituição Brasileira de 1988 acham-se

presentes no dia a dia do cárcere brasileiro, sendo desumana e cruel, ao invés de ressocializar,

dessocializa, pouco é feito conforme consta no 1º artigo da Lei de Execução Penal que diz

sobre a implantação de condições propícias à integração social do preso, mas aqui eu não vou 19 . http://www.valorjustica.com.br/artigo1.htm. Direitos Fundamentais do homem na Constituição de 1988.Data 08/09/06 às 13:04h.

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me deter a falar da pena de prisão e sim da despenalização que é um novo modelo consensual

na lei 9099/95. O terceiro princípio da suspensão está no princípio da desnecessidade da pena

de prisão de curta duração. Ao invés de fazer com que o réu cumpra uma pena de curta

duração, o que pode ser trágico, o melhor é fazer com que o sujeito cumpra certas condições,

fora do cárcere.

2.3 CONCEITO DE SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO

A suspensão condicional do processo é sustar a ação penal após o recebimento da

denúncia, sendo que o réu tem que preencher determinados requisitos e obedecer a certas

condições durante um prazo fixado, ao findar esse prazo ficará extinta a punibilidade, quando

não der causa à revogação do benefício. Isso quer dizer, que ocorre a paralisação do processo,

suspende ab initio. Nesse instituto o acusado não contesta a imputação, não admite a culpa

(nolo contendere) e nem proclama a sua inocência.

O instituto difere do sursis que é a suspensão condicional da pena, neste instaura-se

um processo, realiza-se a instrução criminal e no final se o juiz condenar o acusado pode

suspender a execução de acordo com os requisitos legais art. 77 do CP, da pena privativa de

liberdade por um determinado tempo em que o condenado cumprirá algumas condições. Para

a suspensão condicional do processo o limite será a pena cominada limite mínimo de um ano

e não existe ainda condenação, leva-se em consideração a pena in abstrato. No sursis a

referência será sempre a pena aplicada pena in concreto que não poderá exceder a dois anos,

salvo o sursis etário cuja pena pode ir até quatro anos. Mas, há algo em comum com o

probation, como foi visto no capítulo anterior, sursis e suspensão condicional do processo

penal que é evitar o aprisionamento de réus primários.

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A suspensão condicional do processo também não se confunde como plea bargaining

do direito norte-americano, ampla possibilidade de transação que tem por objetivo exclusivo o

avanço ou não do processo, sobre a qualificação jurídica e as conseqüências penais e há um

acordo feito extraprocessualmente. No nosso sistema tudo tem que ser celebrado na presença

do juiz conforme art. 89 §1ª da Lei 9099/95.

Aceita a proposta pelo acusado e seu defensor, na presença do juiz, este, recebendo a denúncia, poderá suspender o processo, submetendo o acusado a período de prova, sob as seguintes condições.20

O fato é que no Brasil essa transação processual é necessariamente bilateral depende

da aceitação do acusado e seu defensor e tudo tem que contar com a aprovação do juiz,

também de acordo com o art. 89, §2ª da lei 9099/95.

O juiz poderá especificar outras condições a que fica subordinada a suspensão, desde que adequadas ao fato e à situação pessoal do acusado. 21

No guilty plea do direito anglo-saxão, o acusado admite o fato ilícito a ele atribuído e

com isso evidencia o dever de indenização na esfera cível. O que difere da suspensão onde o

acusado não admite e nem discute a imputação.

A transação penal que também é um instituto despenalizante, é um procedimento

penal celebrado no art. 76 da lei 9099/95, ainda não existe processo, ou seja, não há o

oferecimento da peça de Denúncia ofertada pelo Ministério Público. É oferecido ao acusado

transacionar inexistindo o reconhecimento de culpa. Já na Suspensão o Parquet oferece a

Denúncia e segue o processo até que o Titular da ação proponha o benefício ao acusado.

20Art. 89§1ª, Lei 9099/95. 21Cf. Art. 89, §2ª, Lei 9099/95.

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2.4 LIMITES DO INSTITUTO QUANTO AO CONCEITO DE MENOR POTENCIAL

OFENSIVO

Durante o julgamento do Recurso Ordinário em Habeas Corpus nº 12033/MS –

Acórdão publicado em 09/09/02, a Quinta Turma, Relator Ministro Félix Fischer, entendeu

que a lei nº 10.259/01 havia alterado não só o limite do conceito de infração de pequeno

potencial ofensivo, como também o instituto em tela. Decisão esta que causou estranheza na

doutrina, pois que a norma derrogou apenas o artigo 61 da Lei 9099/95. O art. 89 da Lei

9099/95 cede espaço para a suspensão do processo, frente ao preenchimento dos requisitos

elencados em lei.

O Ministério Público Federal opôs Embargos de Declaração, que foi acolhido pela

quinta Turma, excepcionando-o em caráter infringente, para “nos termos do voto do Ministro

Relator Félix Fischer, restabelecer o entendimento de que a alteração do art. 2ª da Lei

10.259/01 não alcançou o patamar previsto para a suspensão condicional do processo(art. 89

da Lei 9099/95), que permanecem inalterado”.22

Já o art. 89 da Lei 9099/95 inserido na lei por simples aproveitamento do legislador,

disciplina um instituto de despenalização e leva em conta a pena mínima, abrangendo não só

as infrações de menor potencial ofensivo dos Juizados, mas também outras infrações de maior

gravidade, mas limitadas pela quantidade de pena, enquanto o art. 61 considera a pena

máxima abstrata.23 No mesmo sentido posicionou-se Ada Pellegrini Grinover, em sua obra

Juizados Especiais Criminais, 4 ed. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2002, p. 257.

A posição de Ada Pellegrini Grinover e de seus seguidores é que na suspensão o que

vale é o critério da pena mínima cominada, não o da pena máxima. Não se pode confundir o

22 Cf.Lélio Braga Calhau “Suspensão Condicional do Processo: STJ reforma entendimento que ampliava os limites do instituto.” In www.direitopenal.adv.br 23 Cf. In Ampliação do rol dos Crimes de Menor Potencial Ofensivo e Suspensão Condicional do Processo. São Paulo: Complexo Jurídico Damádio de Jesus. Set. 2002. Disponível em www.damasio.com.br/htm/frame_artigos.htm

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suspensão do processo (pena mínima) com infração de menor potencial ofensivo (pena

máxima). De modo que somente cabe suspensão condicional do processo se a pena mínima

cominada não exceder a um ano. Os Tribunais Superiores contam hoje com forte

jurisprudência nesse sentido: “A lei dos Juizados Especiais Federais não ampliou o limite

para o susrsis processual previsto no art. 89, da Lei 9099/95. Hábeas Corpus indeferido”

(STF, HC 83.104-RJ, rel. Min. Gilmar Mendes, j. 21.10.2003; cf. ainda : STJ RHC 15.684-sp,

REL. Min. Gilson Dipp, j. 06.05.2004: “o instituto da suspensão condicional do processo não

sofreu qualquer alteração com o advento da Lei 10.259/2001, sendo permitido apenas para os

crimes que tenham pena mínima não superior a 01 ano”; STJ, HC 31.424-SP, rel. Min. Jorge

Scartezzini, j. 06.04.2004). No ROHC 12.033-MS, relator Min. Félix Fischer, o STJ,

sustentou pela alteração do limite, mas nos embargos de declaração, com efeito, infringente,

aclarou o entendimento de não alteração do limite de um ano, como já havíamos

supramencionado.24 Como relatamos não há dúvida entre o conceito de menor potencial

ofensivo e o instituto da suspensão processual.

Em relação a abrangência a primeira constatação que se faz é que o novo instituto se

aplica não só às infrações de menor potencial ofensivo, que a lei definiu como sendo as

contravenções e os crimes cuja pena máxima cominada não seja superior a um ano, vez que

foi utilizada a expressão “abrangidas ou não por esta lei”, sendo um erro de redação não há

qualquer dúvida de que o legislador pretendeu referir-se a “crimes abrangidos ou não por esta

lei”. Dessa forma a suspensão do processo é aplicável também a outros crimes desde que a

pena mínima cominada seja igual ou inferior a um ano. Vejamos, por exemplo, o crime de

descaminho, tipificado no Código Penal Brasileiro, previsto no art. 334, a pena mínima

cominada é de um ano de reclusão, apesar de não se enquadrar na definição de infração de

menor potencial ofensivo, pois a pena máxima é de quatro anos, ultrapassando o máximo de 24 Cf. Grinover, Ada Pellegrini, Gomes Filho, Antonio Magalhães, Fernandes, Antonio Scarance, Gomes, Luiz Flávio. Juizados Especiais Criminais – 5. ed. Ver., atual. E ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 271-272.

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um ano, este tipo possibilita sim a suspensão condicional do processo pela pena mínima

cominada, desde que preenchidos os requisitos para concessão desse benefício. Esse exemplo

é significativo, pois esse crime está fora da competência dos Juizados.

Nas contravenções penais é possível a suspensão condicional do processo, sob pena

de flagrante violação ao princípio da igualdade e da proporcionalidade, antes de ocorrer a

suspensão, deve-se respeitar a fase preliminar e só na hipótese de haver Denúncia art. 77 da

Lei 9099/95 é que se torna cabível, em tese, a suspensão. O julgado TaCrimSP, Apelação

1.006.179, rel. Fábio de Araújo, rolo-flash 1027/128; TACrimSP, Embargos

infringentes/nulidade 947.473, rel. Ciro Campos, rolo-flash 1019/529; TACrimSP, AC

1176199/4, rel. Ricardo Dip, j. 13.03.2000. Em sentido contrário: TACrimSP, Apelação

1.008.949, rel. Pires Neto, rolo flash 1036/020.(Ver Anexo).

O mestre Julio Fabrini Mirabete ensina que o susrsis processual é um instituto de

despenalização indireta ou processual que visa evitar a imposição ou a execução da pena nos

casos de crimes de menor gravidade.25

DA LEI Nº 11.313, DE 28 DE JUNHO DE 2006.

As alterações promovidas pela Lei nº 11.313, de 28 de junho de 2006, nos arts. 60 e 61

da Lei nº 9.099/95 e no art. 2º da Lei 10.259/01, estão relacionadas com o conceito de crime

de menor potencial ofensivo, assim como a problemática sobre competência, nos casos de

conexão e continência entre crimes de menor potencial ofensivo e delitos de competência do

juízo comum, ver anexo (Lei 11313/06). Esta lei pôs fim à controvérsia. Atualmente, existe

apenas um conceito de menor potencial ofensivo. Deve-se enfatizar que o art. 98, I, da CR/88

proibiu que outras infrações penais, que não as de menor potencial ofensivo, sejam julgadas

25Cf. In Juizados Especiais Criminais – Comentários Jurisprudência Legislação. Atlas. 2001. p. 273.

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pelo Juizado; o juízo comum, no entanto pode julgar excepcionalmente as infrações penais de

menor potencial ofensivo (art. 88, parágrafo único e 77, §§ 2º e 3º). A inovação trazida pelo

texto legal consistiu na determinação expressa da incidência das medidas despenalizadoras da

Lei dos Juizados, ainda que a infração de menor potencial ofensivo tramite pelo juízo comum

ou no tribunal do júri, por força das regras de conexão ou continência.

Diante da lei em vigor o Ministério Público, nos casos de continência ou conexão,

entre delitos de menor potencial ofensivo e os de competência do juízo comum, ao oferecer

denúncia em relação a este e em relação ao crime de menor potencial ofensivo, propor a

suspensão condicional do processo, nos termos do art. 89 da Lei nº 9.099/95.

No encontro que houve nos dias 06 e 07 de outubro do corrente ano, no Hotel Blue

Tree Park, em Angra dos Reis, tema “ Questões penais e processuais onde se fizeram

presentes os Desembargadores das Câmaras Criminais do Tribunal de Justiça do Rio,

Ministros do Superior Tribunal de Justiça, o professor Maurício Kuehne, 2º vice-presidente

do Conselho Nacional de Política Criminal e Penitenciária, o Ministro do STJ Arnaldo

Esteves Lima. A segunda palestra no dia 07 foi sobre "Aplicação das Medidas

Despenalizadoras da Lei 9.099/95 na Segunda Instância", com a Ministra do STJ Maria

Thereza Rocha de Assis Moura. A Ministra mostrou algumas questões que ainda apresentam

controvérsias dentro do Superior Tribunal de Justiça a respeito da lei 9.099/95, que dispõe

sobre os Juizados Especiais Cíveis e Criminais: "uma das questões controversas diz respeito

às condições necessárias para que haja a suspensão condicional e o conseqüente trancamento

da ação penal, assim como os casos em que pode haver revogação dessa decisão, caso não

sejam cumpridas as condições que a possibilitaram". Ela também afirmou que já estão

pacificadas as condições para que um crime seja considerado de menor potencial ofensivo:

"são as contravenções penais e crimes a que a lei aplica pena máxima não superior a dois

anos, cumulada ou não com multa", explicou a ministra.

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Isso infere que o objetivo do instituto é impedir, nos caso de crimes de menor

gravidade, a estigmatização da condenação e do próprio processo, evitando a aplicação da

reprimenda penal. Como é sabido, não há no país a sanção perpétua, o objetivo é

“ressocializar” ou “regenerar” o preso, no caso em discussão, o acusado. O que se deseja é

conceder um crédito de confiança ao acusado e o estimular a não delinqüir. O aumento do

limite da pena mínima para 2 (dois) anos, para efeito da suspensão condicional do processo,

no Estatuto Repressivo, dos crimes mais graves previstos, passaria a admitir o benefício – o

que geraria uma repulsa social, já que o instituto não permite cominação de nenhuma sanção,

mas somente o cumprimento de condições.

2.5 OBJETIVO DO ARTIGO 89 DA LEI 9099/95.

Esse artigo instituiu a despenalização, ou seja, dificulta a aplicação da pena de prisão,

ou diminui a pena de um delito sem discriminalizá-lo, evitando dessa forma a pena de prisão.

De acordo com o ilustre Luiz Flávio Gomes, despenalizar significa: adotar processos ou

medidas substitutivas ou alternativas, de natureza penal ou processual, que visam, sem rejeitar

o caráter ilícito da conduta, dificultar ou evitar ou restringir a aplicação da pena de prisão ou

sua execução ou, ainda, pelo menos sua redução.

Sendo aceita a medida, o juiz paralisa o processo, extingue a punibilidade sob

condições acordadas para que sejam cumpridas durante um determinado período de prova.

O objetivo é evitar pena privativa de liberdade para os crimes de menor gravidade,

economia processual, celeridade processual e efetividade.

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2.6 NATUREZA JURÍDICA DO INSTITUTO

O que esclarece a natureza jurídica da suspensão condicional do processo é o nolo

contendere, que consiste numa forma de defesa em que o acusado não confirma a imputação,

não admite culpa e nem sua inocência.

“No que concerne a natureza jurídica da suspensão, verifica-se tratar-se de uma

medida despenalizadora, que se pauta no nolo contendere, que tem a natureza mista e é um

ato bilateral”.26

Acontece que no nolo contendere o sujeito não admite culpa, mas a indenização é

discutida. Observamos que essa discussão tem origem no instituto anglo-saxão do guilty plea,

onde o imputado admite que cometeu o fato a ele atribuído e se causou dano tem que

indenizar, na suspensão, como já foi dito o sujeito não discute a culpa, mas tem que indenizar,

reparar os danos causados – art. 89,§1º, I, da Lei dos Juizados Especiais. Entendemos que no

nolo contendere o acusado não admite culpa, mas tem que indenizar, a reparação do dano é

indiscutível.

No que se refere a ato bilateral para efetivação da medida terá o Ministério Público

que fazer a proposta e tem que haver aceitação por parte do acusado e de seu defensor. Nada

impede que o acusado não aceite as condições da proposta e faça uma contraproposta, pelo

princípio da oportunidade poderá ocorrer a transação processual, isso quer dizer que tanto o

Parquet tem que ceder como também o acusado pelo modo da informalidade e oralidade, esse

é o aspecto material. Por isso entende-se que há bilateralidade, e não unilateralidade onde o

Ministério Público postula e impõe a pena que considera justa. A bilateralidade é consensual.

Pode ser verificada no artigo 89 §1º da lei dos Juizados Criminais.

26Seabra, Silvia Cives; Suspensão Condiconal do Process. p. 15.

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Para que haja a suspensão do processo, há necessidade da aceitação da proposta tanto

pelo acusado quanto por seu defensor, a transação é perfeitamente cabível na medida, portanto

há a possibilidade de que o acusado e/ou seu defensor façam uma contraproposta27.

Esse instituto tem natureza mista, ou seja, natureza processual e penal. Quanto a

natureza processual decorre da paralisação do feito, se o acusado aceita a proposta formulada,

os autos do processo ficam sobrestados, isso quer dizer que ocorre a interrupção temporária

do andamento de um processo ou ato jurídico, no caso em tela o processo paralisa até o

término do período de prova ou mesmo até a revogação da medida. Já a natureza penal pode

levar à extinção da punibilidade codificada no código penal brasileiro, premia-se com a

cessação da punibilidade o que aceita cumprir algumas condições e as cumpre

verdadeiramente, durante um lapso de tempo, sem que haja a revogação do benefício, o juiz

declarará extinta a punibilidade.

27

Seabra, Silvia Cives; Suspensão Condiconal do Processo. p. 20

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3 INICIATIVA DA PROPOSTA DO BENEFÍCIO LEGAL PELO MINISTÉRIO

PÚBLICO

3.1 AÇÃO PENAL PÚBLICA

O Ministério Público é uma instituição social acoplada ao Poder Estatal,

juridicamente, “é a organização ou função social capaz de elaborar a norma reguladora dos

interesses individuais ou coletivos nela representados, e dotada de um poder de império, ou

direito de dominação, suficiente para dar eficácia à norma elaborada com aqueles fins”28

Segundo Francisque Goyet (Le Ministère Public, 3ª ed. Atualizada por Marcel

Rous:Elet e Maurice Patin, Recueil Sirey, Paris, 1953, p. 2-3) assinala que “a designação de

Parquet,que serve para indicar os magistrados do Ministério Público, também se explica

historicamente. Primitivamente os Procuradores do Rei, ao invés de terem assento sobre um

estrado, permaneciam na parte, denominada parquet, da sala de audiência em que ficam os

representantes das partes. Tendo-se tornado, posteriormente, magistrados e adquirido o direito

de ter assento ao lado dos juízes, o termo Parquet continuou a designá-los”. É a expressão

largamente usada no Brasil.29

No Brasil, as origens do MP encontram-se nas Ordenações Manuelinas. A Carta

Imperial de 1824 não cuidou do Ministério Público. O Código de Processo Criminal de 1832,

reformado em 1841, colocou o Parquet em posição subalterna. A Lei 261 de 3-12-1841,

regulamentada pelo Reg. nº 120, de 31-01-1842, que tratava dos Promotores. Aponta-se o

Decreto nº 5.618, de 02-05-1874 (art. 18), como o diploma que empregou, pela primeira vez

entre nós, a expressão Ministério Público.

28 Cf. Ferreira, Sergio de Andréa. Princípios Institucionais do Ministério Público.Rio de Janeiro: 3º ed. , 1995, p. 9. In Afonso Arinos de Melo Franco, Curso de Direito Constitucional Brasileiro, vol. I, 1958, p. 10-11. 29Cf. Ferreira , Sérgio de Andréa. Princípios Institucionais do Ministério Público. 3ª ed. Rio de Janeiro: 1995, p. 13.

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O art. 1º da Lei Complementar 40/81 dá-lhes a responsabilidade pela defesa da ordem

jurídica e dos interesses indisponíveis da Sociedade e pela fiel observância da Constituição e

das leis, para o que promove a execução e a aplicação das normas jurídicas, opinando,

provocando, investigando e propondo, inclusive, ações penais e cíveis (art. 3º). Na

Constituição de 1988, o Ministério Público conquistou posição em Capítulo próprio - art. 127,

caput.

A representação da Sociedade no foro criminal, pelo Promotor, é a parte central da

atuação da instituição do Ministério Público. É, sem dúvida, atividade típica sua, fundamental

no sistema processual penal acusatório. Ao promotor deve ficar entregue, com exclusividade,

o direito da propositura da ação penal, no caso pública.

A invocação do princípio da obrigatoriedade consiste na obrigação que tem o

promotor de propor a ação, bem como na impossibilidade de dela desistir. Ao Ministério

Público cabe agir, não se compreendendo recusar-se a fazê-lo. Identificando uma hipótese na

qual a lei exige sua atuação, se recuse a agir, é nesse sentido que se pode dizer, que sua

atuação lhe é um dever, seja quando se trate de ajuizar uma ação penal ou mesmo quando

tenha que interpor um recurso.

As Ações Públicas, quando o poder de provocar o exercício da jurisdição é atribuído a

um determinado órgão do Estado, muito especialmente o Ministério Público, que age por

dever de ofício.

Acrescente-se, se não tem o Ministério Público discricionariedade para agir ou deixar

de agir quando identifica hipótese de agir, ao contrário, tem e precisa mesmo ter a necessária

liberdade para apreciar se ocorre hipótese em que sua atuação se torna obrigatória. No

processo penal, ele também tem ampla liberdade para apreciar os elementos de convicção do

inquérito policial, para verificar se identifica ou não a existência de crime a denunciar, mas, se

reconhece a presença de tal pressuposto e se proclama que a seu ver houve crime, a partir

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desse momento não pode recusar-se a agir, é o que acontece na suspensão condicional do

processo, se o acusado preenche os requisitos elencados em lei, não pode o parquet deixar de

propor o benefício.

Análise da atuação do Ministério Público no processo penal:

1) Titularidade da ação penal pública - que é exclusiva do Ministério Público

consiste na promoção da ação conforme art 129 da CR/88, e há uma exceção ao

princípio da iniciativa exclusiva na promoção que é a ação penal privada

subsidiária conforme art. 5ª, LIX da CR/88.

2) Relação de organicidade - o promotor de justiça é agente estatal que exerce o

ofício de Ministério Público, estabelecendo-se entre ambos uma relação de

organicidade e não apenas de representação. O órgão é o Ministério Público;

ele não representa apenas a Instituição num feito em que atua. Assim, desde que

o órgão tenha atribuições legais para oficiar em função judicial ou extrajudicial,

tudo aquilo que ele disser ou fizer, dentro dos limites do ofício e das atribuições

que desempenha, será a própria Instituição que esta dizendo ou fazendo;

nenhum outro órgão, por mais hierarquizado que seja, poderá substituir sua

vontade lançada em sua manifestação, desde que o ato praticado tenha provido

de quem tenha atribuições para praticá-lo. O promotor de justiça comunga uma

parte do todo da Instituição. Hely Lopes Meirelles, assinala essa lição dizendo

“é um dos órgãos da soberania do Estado, encarregado de tomar as últimas

decisões, na esfera de suas atribuições, sobre matérias que a própria

Constituição lhe incubiu.”30 O MP nos colegiados e Juízos, o membro do

Parquet senta-se ao lado do Juiz-presidente, integrando, com o secretário ou

30 Cf. Mazzilli, Hugo Nigro. Funções Institucionais do Ministério Público. Série Cadernos Informativos APMP. São Paulo: APMP, 1991, p. 20.

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escrivão, a mesa da justiça, esta posição o coloca no papel institucional de

órgão da lei e fiscal de sua execução.

3) O Ministério Público é parte – o papel do MP no processo penal é parte

parcial, imparcial, não é parte, qual seria sua verdadeira posição no processo

penal? Há uma discussão a respeito disso, parte suis generis, (Manzini,

Tornaghi); parte imparcial (De Marsico, Noronha); parte parcial (Carnelutti);

parte Material e processual (Frederico Marques); parte formal, instrumental ou

processual (Olmedo, Leone, Tourinho); não é parte (Otto Mayer, Petrocelli).

Vamos relatar o que Manzini sustentou, “o Ministério Público parte no sentido

material, porque não é seu o direito que promove, mas do Estado soberano;

lembrou o grande penalista que o Ministério Público não tme um interesse seu

contraposto ao de alguém, antes e fora do processo”. Diante da acolhida da

teoria da organicidade, é possível conjugar que ser parte é ser titular de ônus e

faculdade processuais. Seu dever é buscar a verdade, sua liberdade de acusar oi

de pedir absolvição ou mesmo propor o benefício de lei (art. 89 da Lei

9099/95), por certo não desnaturam sua posição de órgão do Estado, que

concentra nas mãos a titularidade exclusiva de promover o ius puniendi do

Estado.

3.2 ATUAÇÃO DO MINISTÉRIO PÚBLICO – INICIATIVA DA PROPOSTA

Há na doutrina controvérsias acerca da legitimidade ativa da suspensão condicional do

processo. O art. 89 da Lei fala que o Ministério Público, ao oferecer a denúncia, poderá

propor a suspensão do processo, estabelecendo, em seguida , os requisitos para o benefício

“desde que o acusado não esteja sendo processado ou não tenha sido condenado por outro

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crime, presentes os demais requisitos que autorizariam a suspensão condicional da pena (art.

77 do Código Penal). Vamos mostrar os dois posicionamentos doutrinários a esse respeito, a

seguir:

O entendimento do Desembargador Weber Martins Batista, que pugna a respeito da

proposta do benefício legal ser de ofício, a norma do art. 89 da Lei dos Juizados Especiais

deve ser interpretada da seguinte forma: tendo o Parquet opinado contra a suspensão, ou não

tendo ele se manifestado, a concessão do benefício é possível. Sendo assim verifica-se que

esta manifestação de vontade não é essencial para que seja aplicada a suspensão condicional

do processo, podendo o juiz agir de ofício, desde que presente os requisitos (grifo nosso). Para

o Desembargador nada é mais lógico concluir que o juiz, mesmo sem menção expressa em lei,

mas com alicerce nos princípios que regem sua atuação no processo, pode conceder a

suspensão do processo sem a proposta do Ministério Público, sendo, portanto, de ofício por

iniciativa do magistrado ou a pedido da parte interessada. Afirma que a concessão, ou não, da

suspensão condicional do processo está incluída entre as decisões que o juiz pode tomar de

ofício como, por exemplo, decretar ou revogar a prisão preventiva. Fundamenta seu

posicionamento no sistema acusatório, pelo qual compete ao Ministério Público promover a

ação penal pública. O juiz não tem a iniciativa da ação, o impulso é dado ao Parquet, exceto

na ação penal privada.

Para tornar claro, vamos utilizar os ensinamentos do Dr. Fernando da Costa Tourinho

Filho31: “o direito pátrio adotou o sistema acusatório, isto é, a acusação nos crimes da ação

penal pública é da competência exclusiva do Ministério Público, quem julga são os juízes

permanentes há contraditório, o processo é público e escrito”. Há igualdade entre as partes

lhes é fornecida uma gama de recursos. Este sistema é diametralmente oposto ao inquisitório,

que despontou em Roma e foi introduzido pelo Direito Canônico. O sistema inquisitório tem 31Cf. Tourinho Filho, Fernando da Costa. Processo Penal. P. 16. ed. São Paulo: Saraiva, 1994. v. 1, p. 83-88. In Seabra, Silvia Cives. Suspensão Condiconal do Processo. Ed. Lúmen Júris, Rio de Janeiro: 1998, p. 39.

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traços básicos: três fases que são secretas, escritas, sem contraditório e com as funções de

acusar, defender e julgar concentradas nas mãos do juiz, a saber: a investigação preliminar, a

instrução preparatória e a fase do julgamento. Um terceiro sistema existente é o misto ou

também denominado de acusatório formal. Neste sistema as duas primeiras etapas são

secretas e sem contraditório. Na terceira faz, o processo é oral, público e há contraditório. As

três funções (acusar, defender e julgar) são exercidas por pessoas distintas.

No entanto, esse entendimento recebeu acolhida pela Comissão Nacional de

Interpretação da Lei 9099/95, sob a coordenação da Escola Superior de Magistratura, em

reunião realizada em Belo Horizonte, em 1995, que diz a conclusão Décima Terceira “Se o

Ministério Público não oferecer proposta de suspensão do processo, nos termos dos arts. 79 e

89, poderá o juiz fazê-lo”.

Outro argumento para atuação de ofício é o de que a suspensão condicional do

processo seria um direito subjetivo do réu, e, na ausência de proposta do Ministério Público,

poderia o juiz concedê-la, a requerimento do acusado ou mesmo de ofício. Esse entendimento

foi apresentado pela 10ª Câmara do TACrimSP:

“É o entendimento pacífico desta Câmara que a proposta e ‘susris’ processual pode ser formulada de ofício pelo juiz, pois constituindo o novo instituto direito público subjetivo do autor da infração, o exame de cada caso concreto de preenchimento ou não dos requisitos para a obtenção do benefício não pode ficar ao alvedrio da acusação, devendo ao contrário estar submetido ao controle jurisdicional...”32

Damásio de Jesus, também comunga desse entendimento relacionada à atuação de

ofício pelo magistrado, pois faz duas justificativas: a primeira, baseada nos princípios da

informalidade e da celeridade processual; e a segunda, na capacidade do magistrado em

aplicar o sursis. Para Damásio, no que tange ao sue primeiro ponto de vista, a exclusividade

do Ministério Público não seria compatível com o anseio de celeridade e simplicidade,

32 TACrimSP, Ap. 1.184.927/7, São Paulo, 10ª Câm., Rel. Juiz Ricardo Feitosa, j. 22-3-2000, v.u.).

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tratando-se de apego ao formalismo. Quanto ao segundo ponto, se o juiz pode aplicar o sursis

que tem natureza punitiva e sancionatória.

Vejamos agora o argumento favorável quanto a exclusividade do Ministério Público

referente à propositura do benéficio legal:

De acordo como Luiz Flávio Gomes, cabe unicamente ao representante do Ministério

Público a iniciativa da proposta. Tem ele a exclusividade para propositura do benefício. O

Magistrado não admite que o juiz possa agir de ofício, também não aceita aplicação analógica

do art. 28 do Código de Processo Penal. Tal dispositivo é forma de controle do princípio da

obrigatoriedade da ação penal. Para solucionar o problema da omissão do MP sugere,

inicialmente, a inversão da iniciativa postulatória, isto é, o acusado com base no princípio da

isonomia processual poderia requerer a suspensão, devendo o juiz emitir um provimento

jurisdicional. Posteriormente, o ilustre Magistrado chegou a uma conclusão de que esta

inversão não seria a melhor solução, pois não resolveria a questão da disponibilidade da ação

penal.

Julio Fabrini Mirabete33 também considera que o Ministério Público tem exclusividade

para propor a suspensão, por ser ele o titular do ius persequendi. Entende que, sendo a

concessão do benefício uma faculdade do parquet, deve-lo-à fundamentar a razão da não

apresentação da proposta, caso contrário, haverá constrangimento ilegal, sanável pela via do

hábeas corpus.

Seguindo este posicionamento têm-se o seguinte acórdão:

Juizado especial criminal. Suspensão do processo. Atribuição do Ministério Público. Lei 9099/95, art. 89. (...) a suspensão do processo se constitui em providência inerente ao exercício da ação penal, que a CR/88 atribui privativamente ao Ministério Público, que, a toda evidência, não pode ser substituído pelo Juiz, mesmo que venha a ocorrer a inércia do órgão responsável pela persecução penal, o que não

33 Cf. Seabra, Silvia Cives. Suspensão condicional do Processo Penal. Rio de Janeiro: Ed. Lúmen Júris Ltda, 1998, p. 37. in . Mirabete, Julio Fabrini.Juizados Especiasi Criminais: Comentários, Jurisprudência, Legislação. São Paulo: Atlas, 1997, p. 153-154.

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é o caso dos autos, pois, como se disse, o Ministério Público entendeu que não era aplicável o dispositivo legal invocado.34

No mesmo sentido esclarece Ada Pellegrini Grinover, Magalhães Gomes Filho e

Antonio Scarance Fernandes, entendem que o juiz não pode tomar a iniciativa. “Não pode

agir de ex officio, em razão do processo tipo acusatório instaurado com a Constituição de

1988. Quem detém, em princípio, a iniciativa da proposta é o Ministério Público, que deve

abrir mão (dispor) da ação penal pública. Mas essa iniciativa do Ministério Público não lhe

confere uma atuação ‘arbitrária’”.35

Vemos que o entendimento desses doutrinadores enfatiza que o Ministério Público é o

titular, privativo, da ação penal pública, caso seja afastada a possibilidade de iniciativa

surgindo disponibilidade para o juiz (art. 129, I, da CR/88), não pode no sistema acusatório

brasileiro, um órgão não pode apoderar atribuições ou competência do outro. Por

conseqüência, ao titular do ius persequendi pertence com exclusividade também a

disponibilidade da ação penal. A regra quanto à propositura da ação penal pública é

estabelecida pelo princípio da obrigatoriedade prevista na Constituição Federal.

Somos levados a acreditar que a doutrina supramencionada no item com respeito a

ação penal e titularidade exclusiva do Ministério Público para a proposta do benefício legal,

veda a atuação de ofício do magistrado. No julgado a seguir assenta esse entendimento:

Em se tratando de Juizado Especial Criminal, entendendo o Magistrado injusta a recusa do Ministério Público em propor a suspensão condicional do processo, aplica-se analogicamente o art. 28 co CPP, já que ao Juiz é vedado, de ofício, tomar a iniciativa da propositura do benefício36.

34 Cf. Seabra, Silvia Cives. Suspensão condicional do Processo Penal. Rio de Janeiro: Ed. Lúmen Júris Ltda, 1998, p. 38. In São Paulo (Estado). Tribunal de Justiça. Correição Parcial nº 205.563. Relator: DÊS. Nélson Fonseca. 16 de maio de 1996. Boletim Informativo da Juruá, Paraná, nº 140/10646 35 Cf. Grinover, Ada Pellegrini. Gomes Filho, Antonio Magalhães. Fernandes , Antonio Scarance. Gomes, Luiz Flávio. Juizados Especiais Criminais: comentários à Lei 9.099, de 26.09.1995. 5.ed. ver., atual. E ampl. São Paulo: Ed. Revista dos Tribunais, 2005, p.315. 36 Cf. Rel.Juiz França Carvalho, RJDTACrim, 35:211. In Ishida, Valter Kenji. A Suspensão Condicional do Processo. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 76.

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O que não é concedido é o poder de ausente a proposta do Parquet, o juiz determinar

imediatamente a pena ou mesmo deferir a suspensão condicional.

O Supremo Tribunal Federal decidiu “por seu plenário, tratar-se de faculdade exclusiva do MP, a quem cabe promover privativamente a ação penal pública (CF, art. 129, I), não podendo o juiz da causa, diante de recusa fundamentada e por se tratar de ato discricionário do ‘Parquet’, e não de direito subjetivo do réu, substituir-se a ele.” 37

Considerada a natureza processual do instituto, impedindo o julgamento de mérito a

suspensão condicional poderia ser tratada como condição genérica da ação, como condição

especial de procedibilidade ou então como pressuposto processual. Juarez Costa de

Andrade38, após fazer menção aos institutos processual, posiciona a prévia oferta Ministerial

como pressuposto processual objetivo de validade da relação processual.

Entendemos que embora de natureza precipuamente processual, a proposta de

suspensão não está inserida como condição para o exercício da ação penal, pois o juiz ao

receber a denúncia, poderá rejeitá-la com base no art. 43 e incisos do Código de Processo

Penal. A verificação pelo juiz da falta de pressupostos procedimentais impede-o de prolatar a

sentença de mérito. Deve nesse caso submeter à apreciação do Chefe da Instituição do

Ministério Público. Não pode o juiz retirar do Ministério Público o direito de pedir a

prestação jurisdicional quando entende que deve exercê-la, pois infringirá, ainda, o sistema

acusatório, consagrado pela Constituição Federal, na medida em que não pode um órgão

usurpar a atribuição do outro. No inquérito policial há uma série de informações que

subsidiam a formação do convencimento do dominus litis, ou seja, ao autor que manda na

ação penal. Essa fase prepara a persecução penal a ser levada ao juízo por meio da ação penal.

A nossa Carta Magna adotou o sistema acusatório e, no entanto, é permitido pelo direito crer

37 Cf. HC 75.343-MG, STF-Pleno, Rel. Min. Sepúlveda Pertence, vencido nesse ponto o Min, Marco Aurélio, Informativo STF, n. 92, 10-14 nov. 1997. In Ishida, Valter Kenji. A Suspensão Condicional do Processo. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 76. 38 Cf. a oferta obrigatória pelo Ministério Público..., Revista Jurídica, cit., p. 298. In Ishida, Valter Kenji. A Suspensão Condicional do Processo. São Paulo: Saraiva, 2003, p. 94.

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que é vedado ao magistrado a atuação ex officio, usurpadora da atribuição ministerial na

suspensão condicional do processo. Na suspensão art. 89, §1ª, da lei 9099/95 o juiz tem o

poder judicial de aprovar a proposta e assim dizer das condições ao acusado do cumprimento

das condições ou mesmo especificar outras condições da suspensão, conforme regra do art.

89, §2ª, da referida lei.

Antes de falarmos da aceitação da proposta pelo acusado e seu defensor, falaremos do

direito subjetivo público do acusado, da faculdade de agir e do poder discricionário do

Ministério Público, apontando o que a doutrina e a jurisprudência tem a dizer.

O direito em sentido subjetivo significa o poder de ação legalmente assegurado a toda

pessoa para defesa e proteção de toda e qualquer espécie de bens materiais ou imateriais, do

qual decorre faculdade de exigir a prestação ou abstenção de atos, ou o cumprimento da

obrigação, a que outrem esteja sujeito.39

È denominado facultas agendi, uma vez que, em virtude do direito subjetivo de que a

pessoa é titular, vem à faculdade demonstrada no poder de exigir a defesa do direito. O

direito(norma agendi), por sua vez, fornece o remédio jurídico (ação correspondente).

Verificando-se que o acusado está sendo processado por crime cuja pena é igual ou

inferior a um ano, contanto que o momento não esteja sendo processado, nem tenha sido

condenado por outro crime e preencha os requisitos do art. 77 do Código Penal acerca do

susris, nasce o direito subjetivo público de o acusado ver o processo-crime em que figura

suspenso condicionalmente. Damásio de Jesus, que entende tratar-se de direito penal público

subjetivo de liberdade40. Preenchidos os requisitos a suspensão é um direito do acusado, não

dando a forma de faculdade do Ministério Público.

39Cf. De Plácido e Silva. Vocabulário Jurídico. Rio de Janeiro: forense, p. 277. In Ishida, Valter Kenji. A suspensão Condicional do Processo . São Paulo: Saraiva, 2003, p.79. 40Cf. Lei dos Juizados Especiais Criminais Anotada, cit., p.89. In Ishida, Valter Kenji. A suspensão Condicional do Processo. São Paulo: Saraiva, 2003, p.80.

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O magistrado Luiz Flávio Gomes analisa as correntes adotadas sobre a natureza

jurídica da proposta de suspensão condicional do processo. Primeiramente, refere-se aos

adeptos da doutrina do facultas agendi, citando os Doutores Pedro Henrique Demercian e

Jorge Assaf Maluly. Estes autores afirmam que há uma faculdade na formulação da proposta,

sendo deferido ao Ministério Público em exame sobre a conveniência ou não do

prosseguimento da persecução penal. E concluem:

[...] respeitando as posições em sentido contrário, reafirmamos nossa convicção em relação a não representar o instituto da suspensão em direito subjetivo do acusado, mas uma faculdade conferida ao dominus litis no sentido de, em determinadas hipóteses legalmente limitadas, sempre pautado no indeclinável bom senso, deixar de prosseguir na ação proposta.41

Segundo os adeptos dessa corrente, se o Ministério Público não propor a suspensão

nada poderá ser feito, pois o papel do juiz é de mero homologador. O ilustre magistrado acima

referido diz a seguinte assetiva:

[...] os que sustentam a doutrina do facultas agendi entendem que a suspensão condicional do processo constitui mero instrumento de execução da política criminal traçada pelo Ministério Público, que seria soberano (intocável) nessa tarefa, seja em relação a uma política criminal institucional, seja no que concerne às políticas criminais de cada “comarca”. Suspender ou não ao processo é uma mera questão de conveniência, Nisso residiria a discricionariedade (ou oportunidade) regrada ou limitada 42.

E diz mais, o Ministério Público é mero agente executor da política criminal que é

traçada pelo Poder Público. Afirma que pra que haja segurança jurídica é necessário que as

regras do jogo sejam seguidas, portanto não se admite que um agente público atue de acordo

com a sua conveniência. Além disso, na suspensão condicional do processo está presente um

direito fundamental do indivíduo que é o ius libertatis, sendo assim é um direito público

41 Cf. Demercian, Maluly apud Gomes, Sobre a Natureza Jurídica..., op. Cit., p. 130-131. In Seabra , Silvia Cives. Suspensão Condiconal do Processo – Lei 9099/95. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 1998, p.42 42 Cf. Gomes, Sobre a Natureza Jurídica..op. cit., p. 132. In. Seabra , Silvia Cives. Suspensão Condiconal do Processo – Lei 9099/95. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 1998, p.42

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subjetivo do acusado e, desde que estejam presentes os requisitos que a lei exige, deve o

Ministério Público fazer a proposta.

Com o mesmo posicionamento do jurista Luiz Flávio Gomes, tem-se o

Desembargador Weber Martins Batista e o Magistrado Adilson Paukoski Simoni. Conforme o

ilustre Desembargador: “...não importa o verbo usado, mas desde que o legislador tenha

estabelecido pressupostos para a concessão da medida, presentes aqueles, tem o acusado

direito a esta.”43

Chegamos ao ponto crucial, há dois tipos de interpretação:

a) Primeiro, diz trata-se de direito subjetivo – nesta hipótese, admitindo-se o direito

subjetivo do réu, estaria aí justificada a atuação de ofício do magistrado, ou

preservando-se o princípio do ne procedat judex es officio aguardar o requerimento do

réu, para então deferir-se o pedido. Isso quer dizer que a falta de proposta ministerial

permitiria ao acusado a faculdade de solicitar ao magistrado a sua proposição. Logo,

estabeleceríamos um silogismo nessa hipótese. Premissa maior - em se tratando de

direito subjetivo do acusado, o juiz poderia atuar de ofício na defesa desse direito.

Premisssa menor – que a suspensão condicional do processo seria um direito

subjetivo. E, finalmente, a conclusão de que, na suspensão, pode o juiz propor de

ofício o benefício.

b) Segundo, de poder discricionário – nessa hipótese, tratando-se de ato discricionário

ministerial, veda-se-ia a proposta judicial, cabendo utilizar-se por analogia o art. 28 do

CPP, ficando no âmbito do Ministério Público a última palavra sobre a proposta.

Verificando-se o desrespeito ao direito subjetivo do acusado, posta a situação fática do

caso em análise, o magistrado possui igualmente o controle jurisdicional-

43 Cf. Batista; Fux, op. cit., p. 375. In Seabra, Silvia Cives. Suspensão Condiconal do Processo – Lei 9099/95. Rio de Janeiro: Lúmen Júris, 1998, p. 44.

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administrativo, o art. 28 do CPP consagrou o controle jurisdicional-administrativo, que

é usado por analogia, na hipótese de suspensão condicional do processo. Então deve

encaminhar os autos do processo ao Procurador-Geral de Justiça, para posterior

análise. Se preenchidos os requisitos, surge então o direito público subjetivo do réu ao

benefício de lei. A discricionariedade reside tão-só na hipótese de verificar na

realidade fática a incidência dos requisitos ensejadores da suspensão. Logo, não existe

incompatibilidade entre o ato discricionário do membro do Parquet e o direito público

subjetivo do acusado. Não é porque este exista que haverá justificativa para a

intervenção de ofício pelo magistrado.

Ficou entendido que poder-se-ia justificar a atuação do magistrado com fulcro no

art. 5ª, XXXV, da Carta Magna, que concebe que a “a lei não excluirá da apreciação

do Poder Judiciário lesão ou ameaça a direito”. A norma constitucional do art. referido

com a norma do art. 129, I, convivem harmonicamente.

No processo penal moderno, exige-se um processo de partes e um juiz imparcial.

Como poderia um juiz que, substituindo-se à parte acusadora, propõe a suspensão

condicional do processo? Sabe-se que a instrução criminal contraditória, sob a

presidência do juiz imparcial, é garantia constitucional decorrente do devido processo

legal (art. 5ª, LIII a LV, da CR/88).

3.3 ACEITAÇÃO DA PROPOSTA PELO ACUSADO E SEU DEFENSOR.

Jamais a suspensão do processo será possível sem a concordância clara e inequívoca

do acusado. O acusado pode negar ou não a proposta, o que configura estratégia de defesa,

porém, o que não pode haver é espaço para imposições que desnature o instituto da suspensão,

a não aceitação pelo acusado não se concretiza o benefício. O caráter bilateral da suspensão

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condicional do processo sofreu destaque também pelo STJ “A suspensão condicional do

processo constitui ato bilateral a demandar, inclusive, a aceitação por parte do acusado (art.

89,§ 7ª), que poderá recusar-se e preferir o curso normal da ação penal” (STJ, Resp 264.183-

PR, rel. Min., Hélio Quaglia Barbosa, j. 25.08.2004).

A manifestação de vontade do acusado deve reunir atributos juridicamente válidos, é

pessoalíssima, voluntária, absoluta, formal, vinculante e tecnicamente assistida. Todas são

válidas, passemos a falar de forma resumida tais atributos válidos:

• Ato personalíssimo – ninguém pode aceitar a suspensão no lugar do acusado, mesmo

porque ela tem por fundamento a autodisciplina e o senso de responsabilidade. Nunca

será possível tal ato por procurador, ainda que conte com poderes especiais. É o

acusado que tem que saber das condições da suspensão e assumi-las, ou seja, assume

responsabilidades. O juiz tem que conversar com o próprio acusado, inclusive para

ajustar a dosimetria das condições, tão importante em termos de prevenção geral

(intimidação) como especial (ressocialização). Se o acusado é revel ou não comparece

(salvo motivo justo) na audiência de conciliação torna-se impossível à suspensão.

• Ato voluntário – será voluntária a aceitação se for consciente e livre. Para ser

consciente o acusado tem que saber a natureza exata da suspensão, seus efeitos, suas

conseqüências. Deve ter consciência inequívoca de que participa de uma transação,

que significa abrir mão de seus direitos constitucionais (direito ao devido processo

legal, direito à prova, duplo grau de jurisdição, contraditório, ampla defesa etc.). Deve

haver comunicação prévia das condições a serem cumpridas pelo acusado. O êxito do

acordo celebrado depende muito do grau de consciência de todos os participantes, Ato

livre é ato não imposto, isento de qualquer tipo de coação. Nem mesmo o juiz nem o

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Ministério Público podem sugerir qualquer tipo de represália para a eventualidade de

não aceitação da proposta. Serão indignos do cargo se procederem de modo diferente.

• Ato Absoluto – a aceitação, de outra parte, não pode ser condicional(verbi gratia:

aceito a transação se não for denunciado um parente em outro processo etc.). Não

pode estar atrelada a nenhuma condição fixada pelo acusado que transborde os limites

da legalidade ou da moralidade ou da dignidade humana. A aceitação, ademais, não

pode implicar obrigação ou compromisso para terceira pessoa. È ato inter partes. Uma

condição é admitida até mesmo pela jurisprudência estrangeir consiste na declaração

de inocência.

• Ato Formal – a aceitação tem que reunir todas as solenidades exigidas pela lei. Não

pode ser extraprocessual. E se o for, tem que ser pessoalmente ratificada em juízo.

Deve acontecer “na presença do juiz”, como manda a lei. Não tem nenhum valor a

aceitação concretizada fora da presença do juiz. Será em regra oral. Mas pode ser

expressa de outra forma, desde que presente a voluntariedade (consciência e

liberdade). O surdo, o mudo, o surdo-mudo ou o estrangeiro – que vive no Brasil, mas

não entende nossa língua - desde que consigam entender o sentido do ato e se

comunicar, por si mesmo ou por terceira pessoa, não estão impedidos de obter a

suspensão.

• Ato vinculante - a aceitação da suspensão só é válida nos limites que tudo foi

transacionado. Ela está atrelada a uma acusação formal; portanto, possui vínculo com

os fatos narrados e com a qualificação jurídica dada. Vincula o órgão acusador, mas

não o juiz, evidentemente. Se bem que o juiz, para rejeitar a aceitação, formulada em

sua presença, deve apresentar motivo justo e fundamentar sua decisão, que ficará

sujeita ao controle recursal, evidentemente. Na hipótese de o acusado não concordar

com os limites da proposta (com as condições), nada impede que faça contraproposta.

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O ato é transacional, informal, oral, logo, deve-se discuti-la. O promotor não impõe as

condições. Essa é a tarefa do juiz. Mas nada impede que ele faça sugestões, inclusive

no ato da proposta.

• Ato tecnicamente assistido – implica na renúncia ou no recuo de direitos e garantias

fundamentais, quis o legislador cercar a aceitação de uma garantia mais: deve ser

tecnicamente assistida, é dizer, só pode se realizar na presença de defensor. E não só

isso, a lei foi mais longe: também deve haver aceitação do defensor (diz o art. 89, § 1º:

“aceita a proposta pelo acusado e seu defensor...”). Sua carga emocional também é

importante para tudo que se espera da suspensão: reconciliação, reconhecimento da

vítima, reparação, ressocialização etc. Se o acusado for advogado, sua presença única

é o suficiente. E se houver divergência entre a vontade do acusado e do seu defensor

(um querendo a suspensão e o outro não)? A resposta nos é dada pela própria lei, art.

89 § 7º: o que prevalece é a vontade do acusado. Cuida-se de tema polêmico que dará

ensejo a muita controvérsia certamente.

3.4 ATUAÇÃO DO JUIZ

Estabelece o § 1º do art. 89 que “aceita a proposta pelo acusado e seu defensor, na

presença do juiz, este, recebendo a denúncia, poderá suspender o processo...” Oferecida a

denúncia o juiz poderá recebê-la ou rejeitá-la, após verificar se estão ou não presentes os

pressupostos mencionados no art. 41 e 43 do Código de Processo Penal, bem como se a

mesma se apóia, ou não, em prova do fato, pois o processo existe como garantia do acusado,

para evitar que o acusado seja condenado por crime que não cometeu ou que a pena seja mais

severa do que merece. O juiz só deve receber a denúncia e dar continuidade ao processo se a

mesma se fundar em prova que demonstre que a acusação é viável e verossímel.

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A decisão do juiz que determina a suspensão do processo não julga o mérito, isto é,

nem absolve nem condena e nem julga extinta a punibilidade. Não se trata de sentença,

portanto. Muito menos de mero despacho. Só resta admitir que é uma decisão interlocutória.

Sobrestamento não é encerramento. Não se pode confundir o ato que suspende o processo

com o que aplica imediatamente a pena alternativa aceita (art. 76).

Para indeferir a proposta de suspensão do processo, é evidente que o juiz deve

fundamentar sua decisão. Indeferimento sem fundamentação é nulo, e não se pode falar em

motivação implícita.

A atuação do juiz se faz presente nos atributos válidos da manifestação de vontade do

acusado descrito no item 3.3. A atuação do juiz se limita também, quando cuidando-se do

crime, fixá-lo além ou aquém do limites presentes em relação a fixação do quantum no do

período de prova estabelecido na lei.

Vamos abordar nesse ponto o recurso cabível previsto na legislação para que o

acusado interponha da decisão que concede ou não a suspensão condicional do processo,

ocorre apenas a paralisação, suspensão do processo, ao longo do qual pode o mesmo retornar

ao seu andamento, se o acusado descumprir a obrigação imposta.

Cuida-se de decisão interlocutória não prevista, evidentemente, no art. 581 do CPP.

Quando o juiz defere a suspensão, portanto, não é o caso de se interpor recurso em sentido

estrito. O recurso correto é o de apelação, nos termos do art. 593, II, do CPP. É histórica, entre

nós, a discussão dobre a natureza jurídica da enumeração legal contida no art, 581. É taxativa,

embora cada um dos incisos, como se sabe, admite aplicação analógica, nos termos do art. 3º

do CPP.

No entender de Ada pelegrini Grinover e seus seguidores, só resta considerar o ato do

juiz (na suspensão do processo) como “decisão com força definitiva” não prevista no art. 581

(v. CPP, art. 593, II).

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Desse modo, o recurso cabível é o de apelação, aplicando-se em tudo o Código de Processo Penal subsidiariamente: TACrimSP, Apelação 1.017.745, voto vencedor de Junqueira Sangirardi, rolo-flash 1048/563. Como bem proclamou, entretanto, o Colendo STF (HC76. 437-1, rel. Min. Octavio Gallotti, DJU de 21.08.1998, p. 4), “em face do princípio da fungibilidade, não é suscetível de causar prejuízo ao paciente a controvérsia acerca do cabimento, na espécie, de correição parcial ou de apelação”.44

Para haver apelação, de outro lado, a parte tem que ter interesse (fundado na utilidade

da tutela judicial). Se o juiz fixar alguma condição não acordada (transacionada), por

exemplo, surge o interesse recursal. Esse interesse se faz presente quando o juiz fixa

condições em desacordo com o Ministério Público.

Agora se o juiz indefere a suspensão? A via extrema é a do hábeas Corpus . O recurso

deve ser dirigido ao Tribunal competente de acordo com as regras constitucionais e de

organização judiciária de cada Estado. Se a decisão é proferida em sede de Juizado Criminal,

o recurso deverá ser dirigido para o tribunal descrito no art. 82 da lei dos Juizados, ou seja,

Turma Recursal Criminal.

RESOLUÇÃO Nº 07/200645

Altera o Regimento Interno do Conselho Recursal, dando nova redação à Resolução nº

07/2002.

O CONSELHO DA MAGISTRATURA DO TRIBUNAL DE JUSTIÇA DO ESTADO

DO RIO DE JANEIRO, no uso de suas atribuições legais (art. 9º, do Regimento Interno do

Tribunal de Justiça), e tendo em vista o decidido na sessão realizada no dia 23 de março de

2006 (Processo nº 2006.011.315),

44Cf. Grinover, Ada Pellegrini ...[et.al]. -5 ed, ver., atual. E ampl. São Paulo: ED. Revista dos Tribunais, 2005, p. 340. 45Cf. www.tj.gov.br 14/10/06 às 20:04.

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CONSIDERANDO a necessidade de adequação da instância recursal dos Juizados Especiais

ao notável incremento da demanda jurisdicional observada no segmento, o que se perfaz com

a criação de novas Turmas Recursais e a implementação de práticas tendentes a otimizar o

trabalho das já existentes; e

CONSIDERANDO ser de todo recomendável estruturar-se em um todo harmônico as normas

regimentais alusivas às Turmas Recursais integrantes do Sistema de Juizados Especiais do

Estado do Rio de Janeiro;

R E S O L V E:

PROMOVER alterações no comando da Resolução CM nº 06/99, na redação dada pela

Resolução CM nº 07/2002, consolidando o seu texto na forma abaixo.

CAPÍTULO I

Da Competência, Composição, Presidência e Reunião das Turmas Recursais.

Artigo 1º – Haverá, na Comarca da Capital, seis Turmas Recursais, quatro Cíveis e duas

Criminais, com competência para julgamento de Mandados de Segurança, Habeas-Corpus e

recursos das decisões proferidas pelos Juizados Especiais de todas as Comarcas do Estado do

Rio de Janeiro, bem como de outras ações e recursos a que a lei lhes atribuir a competência.

Se o juiz indefere a suspensão condicional do processo, cabe o hábeas corpus: TACrimSP, HC 368188-9, rel. A. C. Mathias Coltro, j. 06.09.2000, rolo/flash 135/182.46

46Cf. Grinover, Ada Pellegrini ... [et.al]. -5 ed, ver., atual. E ampl. São Paulo: ED. Revista dos Tribunais, 2005, p. 341.

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3.5 A DECISÃO QUE SUSPENDE O PROCESSO

O juiz pode ou deve suspender o processo? Nos termos do art. 89, §1º, da lei 9099/95,

o juiz poderá suspender o processo. Tudo que foi dito em relação ao Ministério Público

aplica-se aqui, ipsis litteris. Presente os requisitos legais, deve o juiz suspender o processo.

Conseqüências da suspensão do processo – é ato processual que gera muitos efeitos,

como:

• O processo fica parado, não será realizado nenhum outro ato processual

relacionado ao que está descrito na denúncia, muito menos ato de instrução

como interrogatórios, oitiva de testemunhas etc. A única exceção concebível

seria a realização de atos urgentes, nos termos do art. 225 do CPP;

• Suspende-se o curso da prescrição art. 89 § 6º “o benefício da suspensão

condicional do processo suspende o curso do prazo prescricional”. Não se trata

de interrupção que se dará com o recebimento da denúncia, senão de suspensão

do prazo.

• Inicia-se o período de prova. Não gera ato da suspensão nenhum efeito penal

secundário típico de sentença penal condenatória (rol de culpados, maus

antecedentes, reincidência etc.).

Nem mesmo os direitos políticos resultam afetados: TJSC. Processo 96002025-0, rel. Nilton Machado. De outro lado, “deferida e aceita a proposta de suspensão do processo, não será realizado nenhum outro ato processual relacionado como o thema probandum 47descrito na peça acusatória”: TACrim, Apelação 1.086.025, rel. Carlos Biosotti, rolo-flash 1178/263.

47Cf. Grinover, Ada Pellegrini ... [et. al]. -5 ed, ver., atual. E ampl. São Paulo: ED. Revista dos Tribunais, 2005, p. 342.

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3.6 PERÍODO DE PROVA

Presentes os requisitos legais, o juiz poderá suspender o processo submetendo o

acusado a período de prova (art. 89, §1º). Esse período constitui o lapso temporal em que o

acusado que aceitou a suspensão deve cumprir determinadas condições, isso quer dizer que o

acusado deve demonstrar autodisciplina, senso de responsabilidade, bom comportamento e

ressocialização. È o período que o acusado tem pra mostrar a desnecessidade da pena de

prisão no caso concreto, que é o fundamento desse benefício. É o pressuposto abstrato que

deve ser comprovado em concreto.

Os requisitos de admissibilidade da suspensão do processo são:

a) inexistência de condenação anterior por crime;

b) presença dos demais requisitos do art. 77 do CP, que são:

b.1) que o condenado não seja reincidente em crime doloso;

b.2) que a culpabilidade, os antecedentes, a conduta social e personalidade do agente, bem

como os motivos e as circunstâncias autorizem a concessão do benefício.

Caso a suspensão tenha sido concedida, somente depois, descobre-se que o acusado é

reincidente ou multirreincidente ou que já é beneficiário de outra suspensão, a solução mais

adequada é a cassação da suspensão, motivadamente, mas depois de ouvido o acusado e seu

defensor. O acusado, por seu turno, conta com o hábeas corpus para a eventualidade de que

tenha havido abuso ou ilegalidade no ato da cassação. Pode ocorrer que o acusado não tenha

nenhum processo em andamento – mas já teve crime anterior ‘prescrito’. Não se trata de

processo em curso nem se pode falar, de outro lado, depois da prescrição, em antecedentes

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criminais, por causa do princípio da presunção de inocência. Mas, pode-se pensar o seguinte:

esse fato precedente pode ser levado em conta em termos de aferibilidade da personalidade

(quais foram suas conseqüências, motivação, dolo ou grau de culpa, reparação dos danos,

consideração com a vítima etc.). Tudo isso reflete a personalidade do acusado, seu caráter, sua

aderência ao sentido de justo. O fato precedente, de outro lado, pode revelar que o delito

posterior não é algo isolado na vida do acusado. Algo que faz parte de suas tendências. Ter

bons antecedentes é requisito da suspensão condicional do processo. Logo, quem não tem

bons antecedentes, não faz jus a essa medida alternativa. Pelo que está previsto no art. 89,

estando em curso outro processo contra o acusado, já não haveria possibilidade de suspensão.

No que tange a isso, o art. 89 conflita flagrantemente com o princípio constitucional da

presunção da inocência. Estando o processo em curso o acusado é reputado inocente. Logo,

não pode o legislador tratá-lo como condenado fosse. A regra de tratamento derivada da

presunção de inocência impede que o “acusado” seja tratado como “condenado”.A existência

de outro processo em curso, impõe ao juiz um exame mais aprofundado das chamadas

condições judiciais (culpabilidade, conduta social, personalidade, motivos etc.)

Voltando a questão do período de prova, quanto à duração o processo será suspenso,

diz o art. 89, por dois a quatro anos. O juiz terá que se ater a esse quantum descrito no caput

do art. 89, o que poderá flexibilizar é em relação às condições.

No momento da audiência em que se vá propor a suspensão condicional do processo, o

juiz deve esclarecer detalhadamente ao acusado o tempo exato do período de prova, pode

ocorrer de o acusado aceitar o benefício legal e discordar do tempo do período de prova. É

imprescindível o consenso do acusado. Propõem-se maior período de acordo com a natureza e

gravidade da infração. Não existe susrsis “etário”, que tem por fundamento a pena em

concreto. N a suspensão o que vale é a pena em abstrato. Temos jurisprudência paulista

afirmando esse entendimento exposto por Ada Pellegrini:

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O prazo de duração da suspensão condicional do processo pode ser distinto do prazo do período de prazo do sursis, anteriormente concedido: Apelação 1.021.493, TACrimSP, rel. Samuel Junior, rolo-flash 1076/477. É impossível a fixação de período de prova inferior ao previsto na lei: TACrimSP, SER 1.078.433, rel. Samuel Junior, rolo-flash 1172/263.48

Também falaremos da revogação da suspensão condicional do processo nesse capítulo.

Pelo que ficou estatuído nos parágrafos terceiro e quarto do art. 89, quatro são as causas que

revogam a suspensão do processo:

a) ser processado por outro crime no curso de período de prova;

b) não efetuar, sem motivo justificado, a reparação do dano;

c) ser processado, no curso do período de prova, por contravenção;

d) descumprir qualquer outra condição imposta.

As duas primeiras são causas obrigatórias de revogação do instituto(§3º: “a suspensão

será revogada se no curso do prazo, o beneficiário vier a ser processado por outro crime ou

não efetuar, sem motivo justificado, a reparação do dano”). Já as duas últimas são causas

facultativas (§4º: “a suspensão poderá ser revogada se o acusado vier a ser processado, no

curso do prazo, por contravenção, ou descumprir qualquer outra condição imposta”).

Na revogação obrigatória, não tem o juiz faculdade de não suspender o processo

segundo sua discricionariedade, já que o legislador determinou que a suspensão processual

“será revogada”. São previstas, portanto, duas causas de revogação obrigatória da suspensão

processual, quais sejam:

48 Cf. Cf. Grinover, Ada Pellegrini ...[et.al]. -5 ed, ver., atual. E ampl. São Paulo: ED. Revista dos Tribunais, 2005, p.344.

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a) O fato de o acusado vir a ser processado por outro crime, e não reparar ele,

injustificadamente, o dano causado pela sua infração. Há um questionamento a

esse respeito, porque para uns haveria ofensa ao princípio constitucional da

presunção de inocência, já que “não se declara o acusado culpado nem se impõe

pena, mas se estabelece que, não cumprindo as condições impostas, deve o

processo prosseguir”.49 Para outros, a revogação da suspensão processual pelo

simples fato de ser o acusado processado por outro crime ofende referido

princípio constitucional, pois “quem é presumido inocente não pode ser tratado

como condenado”50. Assim sendo, negar ao acusado a suspensão processual no

momento da iniciativa da proposta, simplesmente pelo fato de vir a ser ele

processado por outro fato, sem decisão de mérito a respeito, é tratá-lo como se

já fosse culpado por esta outra infração, em clara violação do princípio da

presunção. O que pode ocorrer á a prorrogação do período de prova, devem

cessar todas as obrigações impostas, e deve-se aguardar apenas a decisão de

mérito, com trânsito em julgado, no segundo processo.

b) A não reparação do dano pelo acusado, sendo possível fazê-lo, também é causa

de revogação obrigatória da suspensão processual. Pode ter sido acordado que a

reparação do dano fosse efetivada durante o decurso do período de prova, em

parcelas. Assim, se durante o prazo, interrompe o réu o pagamento dessas

parcelas, deverá o juiz ouvi-lo a respeito do inadimplemento, e se não forem

justificáveis seus motivos, deverá revogar a suspensão. Nesse ponto, tem o

acusado o ônus de demonstrar que está impossibilitado de efetuar o acordo

49 Cf. Folgado, Antonio Nobre. Suspensão Condicional do Processo Penal como Instrumento de Controle Social. São Paulo: Ed. Juarez de Oliveira, 2002, p. 129. 50 Cf. Folgado, Antonio Nobre. Suspensão Condicional do Processo Penal como Instrumento de Controle Social. São Paulo: Ed. Juarez de Oliveira, 2002, p. 129.

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celebrado, por uma causa superveniente, não bastando alegações e sim provas

efetivas da sua condição financeira.

Já a revogação facultativa, na hipótese de vir a ser processado, no curso do prazo

deveria o legislador ter previsto expressamente a possibilidade de prorrogação do prazo de

suspensão processual, a fim de que não se tenha ofensa ao princípio constitucional da

presunção de inocência, com já discorremos no requisito de admissibilidade da suspensão e na

revogação obrigatória. Assim, no caso de um novo processo a respeito de contravenção penal,

a solução justa será a prorrogação do período de prova, em analogia como o disposto no art.

81, §2º, do Código Penal, sem que nela haja a obrigatoriedade do cumprimento das condições.

E, se o novo processo extrapolar o período de prova? Pensamos que a resposta está no

art. 81, §2ª, do CP, aplicável subsidiariamente (nos termos do art. 92 da Lei 9099/95) que diz:

“Se o beneficiário está sendo processado por outro crime ou contravenção, considera-se

prorrogado o prazo da suspensão até o julgamento definitivo”.

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4 CONTROLE SOCIAL

As pessoas incorporam valores por meio da convivência social estes valores são

processados por meio da aprendizagem pelo poder paterno e pelo poder estatal, adquirindo

com o passar do tempo uma consciência ético-social que são necessários para a vida em

sociedade. Nisso a sociedade espera que o indivíduo renuncie seus impulsos egoístas, e aja de

acordo como os valores prezados socialmente. Caso a pessoa venha agir de forma contrária a

expectativa social, há elementos coativos que visam a não proliferação dessa espécie de

comportamento, são chamados de coação social, que tem por objetivo garantir a ordem,

controlando as condutas das pessoas. “ O controle social determina, pois, os limites da

liberdade humana na sociedade, constituindo, ao mesmo tempo, um instrumento de

socialização de seus membros.”51 O eventual comportamento contrário às expectativas sociais

é sancionado por essas instâncias de controle com uma “pena”, que pode variar do desprezo,

até a expulsão da pessoa do grupo social, passando pela advertência e pela perda de prestígio

perante a comunidade. Todas essas sanções têm por objetivo evitar o comportamento

indesejável pela sociedade, motivando seus membros a incorporar os valores sociais

estabelecidos por meio do consenso, e a não agir de maneira anti-social.

Embora a sanção penal seja a mais grave de todas as formas de controle social, nem

por isso é mais eficaz. Necessita ela das outras instâncias de controle para, em conjunto, poder

oferecer à sociedade uma resposta adequada aos desvios sociais praticados por alguns de seus

membros, pois as normas penais por si só são insuficientes. Daí se dizer que o Direito Penal

deve se pautar pelos princípios da ultima ratio, da subsidiariedade e da fragmentariedade, ou

seja, o princípio da intervenção mínima articula-se com os princípios da fragmentariedade e

subsidiariedade. A natureza fragmentária implica em que o Direito Penal não se obriga a 51 Cf. Francisco Munoz Conde. Derecho Penal y Control Social, p. 25. In Folgado, Antonio Nobre. Suspensão Condicional do Processo Penal como Instrumento de Controle Social. São Paulo: Ed. Juarez de Oliveira, 2002, p137.

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sancionar todas as condutas lesivas aos bens jurídicos, mas apenas aquelas mais graves

praticadas contra bens mais relevantes. A subsidiariedade, a seu turno, parte do

reconhecimento de que o Direito Penal não é a única forma de controle social. Por ser o que

utiliza instrumentos mais enérgicos e mais custosos, o Direito Penal deve ser acionado

somente na hipótese em que outros meios de coerção se mostrem ineficazes.

A sanção penal deve significar uma reafirmação dos valores sociais estampados nos

bens jurídicos os quais foram vulnerados pela infração penal. O bem jurídico é fruto do

consenso das pessoas a respeito de um valor social. O qual é obtido por meio da interação

comunicativa das pessoas.

Mesmo levando-se em consideração os males causados pelo cárcere, “a pena privativa

de liberdade não pode ser abolida pura e simplesmente, isto porque para a criminalidade

grave, em especial para a violenta e aqueles fatos cometidos com armas de fogo ou com

ameaça de violência, deve-se manter esse tipo de punição”52. Quanto a suspensão, por se

tratar de crimes de baixa ou média criminalidade, as condições estabelecidas durante o

período de prova da suspensão do processo penal exercem a função de prevenção geral

positiva, pois reafirmam na consciência jurídica da sociedade o valor do bem jurídico atingido

pela infração, ao mesmo tempo em que, ao contrário da pena privativa de liberdade,

contribuem para a ressocialização do acusado, já que se conta com seu consentimento no

cumprimento dessas condições, o que faz com que este internalize o valor social tutelado pela

norma penal violada.

52 Cf. Francisco Munoz Conde. Teoria general Del delito. Bogotá : Temis, 1984, p. 99, apud Antonio Luís Chaves Camargo, Motivo, vontade, intenção e dolo, p. 144. In Folgado, Antonio Nobre. Suspensão Condicional do Processo Penal como Instrumento de Controle Social. São Paulo: Ed. Juarez de Oliveira, 2002, p.142

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4.1 FUNÇÃO RESSOCIALIZADORA

No que diz respeito a suspensão condicional do processo, as condições estabelecidas e

aceitas pelo acusado têm um forte efeito ressocializador, já que não são impostas

unilateralmente pelo Estado. Mas, ao contrário, necessitam de expresso consentimento deste

para serem aplicados, o que facilita o reconhecimento do erro por ele praticado, e ao mesmo

tempo o estimula a não reincidir. Com o acordo para a suspensão processual, o acusado toma

consciência de que o Estado lhe está oferecendo uma segunda oportunidade pra que não volte

a praticar condutas anti-sociais. Por sua vez, a aceitação daquele no cumprimento das

condições indica arrependimento e tendência ao abandono da prática delitiva.

As condições especificadas na lei 9099/95 orientam-se no sentido de possibilitar a

ressocialização do acusado. A condição de reparação dos danos causados pela infração penal

faz com que o acusado se conscientize que sua conduta foi prejudicial a alguém, refletindo um

mal, pois segundo Claus Roxin “com o dever de reparar se estimula que o autor se confronte

com os danos ocasionados e com a pessoa da vítima de um modo totalmente distinto do que

poderia resultar com uma vítima abstrata e anônima. Isto pode afetar internamente,

favorecendo assim a ressocialização”.53 Essa reparação é um estímulo para que o acusado não

volte a praticar a mesma conduta anti-social, e passe a respeitar os valores vigentes para a

maioria sem causar danos sociais.

Por seu turno, a condição de comparecer a juízo pessoalmente uma vez a cada mês

para justificar sua atividade, durante o período de suspensão do processo, deixa claro ao

acusado que o poder estatal está acompanhando sua conduta nesse período, o que faz que este

evite cometer desvios, caso contrário o processo retoma seu curso normal. A própria ameaça

53 Cf. Guadalupe Pérez Sanzberro, Reparación y conciliación em el sistema penal... p. 239. In. Folgado, Antonio Nobre. Suspensão Condicional do Processo Penal como Instrumento de Controle Social. São Paulo: Ed. Juarez de Oliveira, 2002, p. 153.

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de revogação da suspensão caso o acusado, venha cometer outro crime ou contravenção penal,

previsto no art. 89, §3º e 4º, da Lei do JECRIM, não deixa de ser um estímulo para que o

acusado se comporte de acordo com a expectativa social.

4.2 PENA OU SANÇÃO

O direito está ligado à idéia de organização e conduta, então deve ser ele entendido

como um conjunto de normas de conduta que disciplinam as relações sociais. O mundo do

direito é o mundo das relações entre os homens, pois na conjugação desses dois elementos – a

sociedade e o indivíduo - encontram a sua razão de ser. Cuida, pois o direito da disciplina das

relações extrínsecas do homem, cabendo à moral a disciplina de suas relações intrínsecas.

As normas de conduta têm duas características:

• obrigatoriedade

• sanção

Em regra as normas de conduta são obrigatórias, isto é, de observância necessária. E

nem poderia ser diferente, sob pena de o direito não atingir os seus objetivos. Claro está que,

se a observância das normas jurídicas fosse facultativa, totalmente inócua se tornaria à

disciplina por elas imposta.

Não percebemos que o direito é, sobretudo obrigação porque estamos habituados a

obedecer a suas normas, a tal ponto que não lhe sentimos quase o peso, da mesma forma que

não sentimos certas imposições físicas, como a gravidade, Ocorre também que, em geral e por

definição, essas normas correspondem à nossa maneira de pensar e sentir, tal o nosso

condicionamento social. Que o direito é uma obrigação no sentido em que confere um

benefício, vantagem ou poder cria uma obrigação ou dever para outrem, e vice-versa.

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No momento em que transgredimos qualquer dessas normas, entretanto, tomamos logo

consciência da sua obrigatoriedade, pois temos então que responder pelas conseqüências.

Alguns autores, em lugar de obrigatoriedade, preferem falar em coercibilidade da norma, para

indicar que ela envolve a possibilidade jurídica de coação. Assim, ao contrário das demais

normas sociais, a jurídica se caracteriza pela coercibilidade. Se inobservada, é imposta

coativamente.

O direito dirige-se a seres dotados de liberdade, que agem comandados pela vontade.

Como podem as pessoas inobservá-los, tornou-se necessário estabelecer uma sanção, o meio

mais eficaz encontrado pela sociedade para tomar a norma jurídica de observância necessária.

Há em nosso entender, uma pequena diferença entre sanção e pena, embora na prática os autores e a própria lei não a considerem. Sanção é a ameaça de castigo para o transgressor da norma, e pena já é o próprio castigo imposto; sanção é a pena abstratamente considerada, e a pena sanção concretizada; a sanção é cominada pelo legislador, e a pena é fixada pelo juiz; a sanção exerce uma coação psicológica sobre os indivíduos, ao passo que a pena exerce uma coação física ou material.54

Essa coação psicológica, geradora do temor à pena, faz com que a maioria se conduza

dentro dos limites do direito. É a chamada prevenção geral, através da qual consegue o direito

evitar a ocorrência de inumeráveis conflitos. Para uma minoria não basta a coação

psicológica, acabando por transgredir as normas, na esperança de não ser punida. Para esses

destina-se a coação física ou material. A autoridade pública aplica a pena, empregando o

poder coercitivo de que dispõe para punir o responsável ilícito. É o remédio extremo usado

contra uma minoria que não observa as normas, no empenho de levá-la a respeitar o direito,

livrando a sociedade de sua conduta perniciosa.

54 Cf. Cavalieri Filho, Sérgio. Programa de Sociologia Jurídica (Você conhece?). Rio de Janeiro: Forense, 2001, p. 24.

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4.3 DAS CONDIÇÕES E O DESCUMPRIMENTO DE CONDIÇÕES

O acusado é submetido as seguintes condições:

• Reparação do dano, salvo impossibilidade de fazê-lo, ou seja, tendo em vista as

condições peculiares do caso, em face da natureza do delito;

• Não freqüentar ambientes não condizentes coma a sua conduta social, ou seja,

proibição de freqüentar determinados lugares;

• Proibição de ausentar-se da comarca onde reside, sem autorização do juiz, por

mais de trinta dias;

• Comparecimento pessoal e obrigatório a juízo, mensalmente, para informar e

justificar suas atividades.

Vejamos a seguir um modelo de Assentada sob cópia cedida pela 32ª Vara Criminal:55

“Aos 23 dias do mês de agosto de 2006, na Sala de audiência deste Juízo,

estavam presentes o MM Juiz de Direito Drª ANA CAROLINA GANTOIS

CARDOSO e o Ministério Público representado pela Drª Somane Patrícia Cerruti

Lisboa. Feito o pregão às 13:40h, ao mesmo respondeu a acusada acompanhada da Drª

Defensora.

Aberta a audiência, foi a ré interrogada, conforme termo em apartado.

Posteriormente, dada a palavra ao Ministério Público foi dito que deseja fazer

proposta de suspensão do processo, mediante as seguintes condições: 1)

Comparecimento mensal em juízo, até o 10º dia do mês; 2) não se ausentar do Estado

55 Cf. Cópia cedida pela 32ª Vara Criminal da Comarca da Capital do Rio de Janeiro. 26/10/06 às 15:20h.

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do Rio de Janeiro por mais de 10 dias sem autorização do Juízo; 3) Comunicar

eventual mudança de residência; 4) Vinda da FAC sem anotações.”

Pela ré foi dito que aceitava a proposta, o que foi ratificado pela Drª Defensora.

Pelo M.M Dr. Juiz foi proferida a seguinte DECISÃO:

1) Suspendo o processo, pelo prazo de 2 anos, nos termos do artigo 89 da Lei

9099/95....

Nada mais havendo, determinou o M.M. Dr. Juiz que se encerrasse o presente às

14:00H, que lido e achado conforme assinam, Eu, Secretário , o digitei....”

Notamos que, em regra, após a serventia certificar que o réu não compareceu ao

cartório, o juiz costuma remeter os autos ao Ministério Público, que muitas vezes se

pronuncia de maneira concisa, postulando a revogação do benefício e a expedição do

mandado de prisão.

Neste momento, antes de decidir, o julgador deve determinar a intimação da defesa

técnica, para esta se pronunciar, ou seja, o advogado ou defensor público terá que e

pronunciar sobre o descumprimento da condição. É causa de nulidade a não oitiva da defesa

técnica, por ser garantido a ampla defesa e o contraditório. Entende-se que a primeira

providência a ser requerida pela defesa técnica e adotada pelo juízo é a intimação do

réu/acusado para justificar o motivo, alíás, é o procedimento exibido pela 32ª Vara Criminal

da Comarca da Capital do Rio de Janeiro e a 2ª Vara Criminal da Comarca de Duque de

Caxias, essa citação é só para ilustrar. A efetivação do contraditório só poderá ser exercida

quando o acusado esclarecer o motivo de sua falta, pelo que somente por meio de mandado de

intimação, ou seja, não pode haver a restrição do ius libertatis, sem contraditório e ampla

defesa. Para motivo de maiores informações a 32ª Vara Criminal da Comarca da Capital do

Rio de Janeiro, semestralmente, expede ofício a Receita Federal, ao TRE, ao Sistema

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Penitenciário, a fim de averiguar se os acusados que foram beneficiados por esse instituto

cometeram algum crime ou se mudaram de endereço. Na hipótese de mera falta de

comparecimento ao cartório, deve o réu ser intimado. Assim, para revogar o benefício o juiz

terá de decidir se o descumprimento foi ou não justificado.

Tais condições muitas vezes, por falta de fiscalização, acabam se limitando ao

comparecimento ao cartório para assinar, mensalmente livro de freqüência, fica a impressão,

para a sociedade e especialmente para a vítima, de que nada aconteceu com o autor do delito.

Justamente temendo a instalação de um sistema de impunidade, o ilustre Paulo Lúcio

Nogueira fez o seguinte alerta:

Não há dúvida de que há uma tendência despenalizadora em relação a certos crimes, como o aborto, o uso de drogas etc., o que representa um perigo para a sociedade. Na esteira dessa perspectiva a tolerância vai-se infiltrando e afastando os crimes que parecem ser insignificantes ou de bagatela; depois são atingidos os mais graves e implanta-se em regime de impunidade. Se atualmente já existe uma queixa generalizada contra a criminalidade e sua impunidade, no futuro essa queixa ainda será maior, quando os órgãos públicos mantidos para combater os crimes não tiverem a devida atuação. Se agora se omitirem, ao arrepio das leis existentes, futuramente não agirão amparados por, que só beneficiam os criminosos em detrimento da sociedade.56

Quanto à fiscalização dessas condições competem ao juízo processante, não ao juízo

das execuções. A lei, não disse nada a respeito no art. 89. O art. 105 e 147 e outros da lei de

execução penal, só fala em competência da Vara de Execução após o trânsito em julgado da

sentença. Em se tratando de suspensão do processo, é evidente que não existe pena nem

sentença de mérito nem trânsito em julgado.

Na lei 9099/95 não foi criado uma estrutura especial para controlar as condições desse

benefício, não existe um órgão para essa finalidade. Ada Pellegrini e outros autores infere que

talvez seja porque o instituto tem por base a autodisciplina e o senso de responsabilidade.

56 Cf. In Juizados Especiais Cíveis e Criminais. Saraiva, 1996, p. 99. In Doutrina ADCOAS, RJ, v. 6, n.11, p. 351, Nov. 2003.

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Diante de que foi exposto no decorrer desse trabalho, na hipótese do acusado cumprir

as condições, expirado o prazo sem revogação nos termos do art. 89,§ 5º, o juiz declarará

extinta a punibilidade. A sentença do juiz é meramente declaratória, isto é, a extinção se dá no

último dia do período de prova, não no dia em que o juiz declara extinta a punibilidade.

A sentença que extingue a punibilidade, após o período de suspensão do processo, sem que ocorra sua expressão revogação, tem natureza meramente declaratória e, pois, simplesmente reconhece o fato jurídico da extinção no prazo final do sursis processual (artigo 89, §5º, da Lei 9099/95: “expirado o prazo sem revogação, o Juiz declarará extinta a punibilidade)” (STJ, Resp 447.783-PB, rel. Min. Hélio Qualia Barbosa, j. 14.09.2004).57

Conseqüências da extinção da punibilidade:

• É como se o fato objeto do processo suspenso nunca tivesse ocorrido

na vida do acusado;

• Não se fala em reincidência;

• Não se fala em antecedentes criminais;

• Requerida uma certidão, tem que sair “nada consta”, ressalvada a

hipótese de requisição judicial;

• Nenhum efeito penal subsiste se a suspensão condicional do processo

foi devidamente cumprida.

57Cf. Grinover, Ada Pellegrini, Gomes Filho, Antonio Magalhães, Fernandes, Antonio Scarance, Gomes, Luiz Flávio. Juizados Especiais Criminais – 5. ed. Ver., atual. E ampl. São Paulo: Editora Revista dos Tribunais, 2005, p. 369.

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CONCLUSÃO

Com o passar dos anos o processo criminal passou a exigir mecanismos rápidos no

julgamento de crimes de menor potencial ofensivo, a fim de proporcionar um tempo maior

aos procedimentos de delitos mais graves. A intenção do legislador foi modernizar e dar

celeridade no tratamento de infrações penais de pequena gravidade e também dar efetividade

aos processos. Para isso foi criada a lei 9099/95 que fala sobre os Juizados Especiais Cíveis e

Criminais, inspirada no modelo político–criminal consensual e na despenalização.

Há a proximidade entre a Suspensão Condicional do Processo com o Instituto do

probation anglo-saxão, onde este foi o seu nascedouro. Aquele foi constituído no direito

anglo-saxão em que primeiro vem à declaração de culpabilidade (conviction) e só depois vem

o momento da suspensão da prolação da sentença (sentence) e imposições de obrigações

impostas ao acusado. Embora seja fonte de inspiração no direito penal brasileiro, o juiz chega

a declarar o réu culpado e posteriormente, caso haja concordância, o beneficiário entra em

período de prova por seis meses. O que não acontece com a Suspensão.

Os princípios desse instituto são o da discricionariedade regrada, autonomia da

vontade do acusado e desnecessidade de prisão. A suspensão condicional do processo susta a

ação penal após o recebimento da denúncia, ocorre então a paralisação do processo desde o

início.

O advento da lei 11.313/06 veio e pôs fim à controvérsia do conceito de menor

potencial ofensivo e alterou o art. 60 e 61 da lei 9099/95 e não atingiu a suspensão

condicional do processo em que não se pode confundir a pena mínima com infração de menor

potencial ofensivo (pena máxima).

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O que torna compreensível a natureza jurídica da suspensão processual é o nolo

contendere, que consiste uma forma de defesa em que o acusado não confirma a imputação,

não admite culpa e nem sua inocência.

Para que haja a suspensão do processo, há necessidade de aceitação da proposta tanto

pelo acusado quanto por seu defensor, a transação será cabível.

As Ações Penais Públicas ocorrem quando o poder de provocar o exercício da

jurisdição é atribuído a um determinado órgão do Estado, muito especialmente o Ministério

Público, que age por dever de ofício. A invocação do princípio da obrigatoriedade consiste na

obrigação que tem o promotor de propor a ação, bem como na impossibilidade de dela

desistir. Ao Ministério Público cabe agir, não se compreendendo recusar-se a fazê-lo.

Identificando uma hipótese na qual a lei exige sua atuação, se houver recusa em agir, é nesse

sentido que se pode dizer, que sua atuação lhe é um dever, seja quando se trate de ajuizar uma

ação penal ou mesmo quando tenha que interpor um recurso.

Já na iniciativa da proposta pelo Ministério Público há um entendimento do benefício

legal ser de ofício, ou seja, dar ao juiz o poder de agir de ofício, desde que presente os

requisitos. Mesmo sem expressa em lei, mas com alicerce nos princípios que regem sua

atuação no processo, pode conceder a suspensão do processo sem a proposta do Ministério

Público. Outro argumento que abarca essa tese é a de que o benefício legal seria um direito

subjetivo do réu, na ausência de proposta do Parquet, poderia o juiz concedê-la, a

requerimento do acusado ou mesmo de ofício.

A posição majoritária é que cabe unicamente ao representante do Ministério Público a

iniciativa da proposta, tem ele a exclusividade para propositura do benefício. Não cabe no

sistema acusatório brasileiro, um órgão apoderar-se de atribuições ou competência do outro.

O poder discricionário Ministerial reside tão somente na hipótese de verificar na realidade

fática a incidência dos requisitos ensejadores da suspensão.

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A suspensão do processo não será possível sem a concordância inequívoca do acusado

sem manifestar o consentimento de forma clara. A mesma é personalíssima, voluntária,

absoluta, formal, vinculante e tecnicamente assistida.

Concluímos que a sanção penal deverá ser a última forma de controle social, nem por

isso produz os efeitos desejados, necessitando de outras estruturas de controle, daí a

consideramos que o direito penal deve se pautar pelos princípios da ultima ratio. A pena

privativa de liberdade não pode ser abolida simplesmente, até porque crimes graves cometidos

com arma de fogo, ameaça de violência e hediondos, devem manter esse tipo de punição. Por

outro lado à suspensão processual gera para o acusado condições que deverão ser cumpridas

durante o período de prova, deixando claro ao acusado que o poder estatal está acompanhando

sua conduta nesse período, o que desestimula o acusado de cometer novos crimes e se vier a

praticar delito a suspensão é revogada e o processo segue nos termos ulteriores. Inexiste pena

na suspensão condicional do processo, o que ocorre é o cumprimento de condições.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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BITTENCOURT, Cezar Roberto. Manual de Direito Penal – parte geral, vol. I. Rio de Janeiro: ed. Saraiva, 2003.

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FILHO, Sérgio Cavalieri. Programa de Sociologia Jurídica. 10ª ed. Forense, pp. 23-24.

FOLGADO, Antonio Nobre. Suspensão Condicional do Processo como Instrumento Controle Social. São Paulo: Juarez de Oliveira, 2000.

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MARQUES, José Frederico. Estudos de Direito Processual em Homenagem a José Frederico Marques no seu 70º aniversário/ Ada Pellegrini Grinover...[et. al] – São Paulo: Saraiva, 1982, pp. 320-324.

MAZZILLI, Hugo Nigro. Funções Institucionais do Ministério Público. Série: Cadernos Informativos APMP. São Paulo: APMP, 1991, p.p 20-22.

REVISTA DOS TRIBUNAIS, v. 86, n.º 746, p.p 466-475, São Paulo, DEZ. 1997.

SEABRA, Silvia Cives. Suspensão Condicional do Processo Penal. Rio de Janeiro: lúmen Júris, 1998, p.p 4-6;13-19;37-45.

TOURINHO FILHO, Fernandes da Costa. Código de Processo Penal Comentado Arts. 394 a 811. 6ª ed. São Paulo: Saraiva, 2001, p.p 139-152.

TOURINHO FILHO, Fernandes da Costa. Manual de Processo Penal. 3ª ed. revista, atual e aumentada. São Paulo: Saraiva, 2001, p.p.565-567.

VADE MECUM. Ed. Saraiva, 2006.

www.tj.rj.gov.br

www.stf.gov.br

www.valorjustica.com.br/artigo1.htm.

www.direitopenal.adv.br

www.planalto.gov.br

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ANEXO

ACÓRDÃO

Origem: TRIBUNAL - SEGUNDA REGIÃO – www2.trf2.gov.br 25/09/06 ás 15:40h

Classe: HC – HABEAS CORPUS - 4165

Processo: 2005.02.01.007771-0 UF: RJ órgão Julgador: PRIMERIA TURMA ESP.

Data da Decisão: 05/10/2005 Documentos: TRF 2001146915

Fonte

DJU DATA : 13/10/2005 PÁGINA: 141

Ementa

Processual Penal. Hábeas Corpus. Não Oferecimento da Suspensão Condicional do Processo.

Fundamentação sem suporte fático. Envio à Procuradoria –Geral da República. Ordem

Parcialmente Concedida. 1. Suspensão Condicional do Processo. Requisitos objetivos e

subjetivos. Art. 98 da Lei 9099/95. 2. Pena mínima inferior a 1 (um) ano. Arrependimento

posterior. Art. 16, CP. Causa obrigatória de diminuição de pena. Requisito objetivo

verificado. 3. Culpabilidade. Fundamentação Ministerial afirmando acentuada

reprovabilidade. Ausente suporte fático desabonador. A presença dos requisitos para o

recebimento da denúncia não impossibilita a concessão do sursis processual, sendo, ao

contrário, pressuposto lógico de sua aplicabilidade. 4. Ministério Público. Novo

Pronunciamento. Possibilidade. Súmula 696. Aplicação do art. 28 do Código de Processo

Penal. 5. Ordem que se concede em parte.

Relator

www.tjrn.gov.br 21/09/06 ás 15:49h.

Julgamento: 23/02/2005 Órgão Julgador: Câmara Criminal

EMENTA:

RECURSO ESPECIAL. PROCESSUAL PENAL. SUSPENSÃO CONDICIONAL DO

PROCESSO. CONCESSÃO EX OFFICIO PELO ÓRGÃO JULGADOR.

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IMPOSSIBILIDADE. PRERROGATIVA DO MINISTÉRIO PÚBLICO. EXISTÊNCIA DE

SENTENÇA CONDENATÓRIA. INAPLICABILIDADE DO INSTITUTO.

FUNDAMENTO CONSTITUCIONAL INADIMISSIBILIDADE.

1. É vedado ao juiz conceder sursis processual ex officio ou a requerimento da parte, uma

vez que tal prerrogativa é exclusiva do Ministério Público.

2. Prolatada a sentença condenatória não mais se cogita de concessão do benefício do

susrsis, que se baseia na pena in abstrato.

3. Compete ao Supremo Tribunal Federal, via recurso extraordinário, e não ao Superior

Tribunal de Justiça. O exame da matéria constitucional.

4. Recurso especial não conhecido “RESP 605812/PB, Rel. Min, Laurita Vaz , Quinta

Turma, julgado em 05/10/2004, decisão unânime) ( grifos acrescidos).

SÚMULA DA JURISPRUDÊNCIA PREDOMINANTE DO

SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL

www.stf.gov.br 29/10/06 ás 17:24.

Súmula 696

Reunidos os pressupostos LEGAIS PERMISSIVOS DA SUSPENSÃO CONDICIONALDO

PROCESSO, mas se recusando promotor de justiça a propô-la, o juiz, dissentido, remeterá a

questão ao Procurador-Geral, aplicando-se por analogia o art. 28 do Código de Processo

Penal.

Data da aprovação - Sessão Plenária de 24/09/2003

Fonte de Publicação: DJ de 09/10/2003, p. 5; DJ de 10/10/2003, p. 5; DJ de 13/10/2003, p. 5.

Referência Legislativa: Código Penal de 1941, art. 28. Lei 9099/95, art. 89.

SUSPENSÃO CONDICIONAL DO PROCESSO. TITULARIDADE. MP

Discute-se, no caso, a possibilidade ou não de o juiz propor a suspensão condicional do

processo de ofício, nos caso em que o Ministério Público recusou-se a fazê-lo. Cabe ao MP a

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titularidade para a proposição da suspensão condicional do processo, não podendo o juiz

substituí-lo nessa função. Por conter requisitos de natureza axiológica, a suspensão

condicional do processo não é direito subjetivo dor réu. Divergindo juiz e promotor acerca da

suspensão condicional do processo, devem ser os autos encaminhados ao procurador-geral por

aplicação analógica do disposto no artigo 28 do CPP (súm. n. 696-STF). Precedente citado:

REsp 479.682-SP, DJ 30/03/2004. REsp 208.923-SP, Rel. Min. Hélio Quaglia Barbosa,

julgado em 24/8/2004.

PROJETO DE LEI58

“Suspensão facultativa da ação penal. Art. 100-B. Na ação penal de iniciativa pública, em que

a pena máxima cominada não for superior a dois anos, o Ministério Público poderá com o

oferecimento da denúncia, propor a suspensão pelo prazo de dois a quatro anos, desde que: I –

o réu não tenha sido condenado por outro crime ou já beneficiado por suspensão ou transação;

II – o motivos determinantes e as conseqüências do crime não recomendarem o benefício; III

– atenda, cumulativamente, as seguintes condições: a) obrigatória reparação do dano, que

poderá ser satisfeita em parcelas, exigíveis a partir do trigésimo dia da concessão da

suspensão, salvo comprovada impossibilidade de fazê-lo; b) proibição de freqüentar

determinados lugares; c) proibição de ausentar-se da comarca ou circunscrição em que reside,

por mais de oito dias, sem autorização do juiz; d) comparecimento pessoal e obrigatório a

juízo, mensalmente, para informar e justificar susa atividades. §1º - A suspensão será

revogada se, no curso do prazo. O beneficiário vier a ser processado por outro crime ou

descumprir qualquer condição imposta. § 2º - A suspensão poderá ser revogada se o

beneficiário vier a ser processado por contravenção. §3º - Expirado o prazo sem revogação, o

juiz declarará extinta a punibilidade.

58 Cf. Folgado, Antonio Nobre. Suspensão Condicional do Processo Penal como Instrumento de Controle Social. São Paulo: Editora Juarez de Oliveira, 2002, p. 111.

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Lei nº 11313 de 28-06-2006 - PRESIDENTE DA REPÚBLICA Faço saber que o

Congresso Nacional decreta e eu sanciono a seguinte Lei:

Art. 1o Os arts. 60 e 61 da Lei no 9.099, de 26 de setembro de 1995, passam a vigorar com as seguintes alterações:

“Art. 60. O Juizado Especial Criminal, provido por juízes togados ou togados e leigos, tem competência para a conciliação, o julgamento e a execução das infrações penais de menor potencial ofensivo, respeitadas as regras de conexão e continência.

Parágrafo único. Na reunião de processos, perante o juízo comum ou o tribunal do júri, decorrentes da aplicação das regras de conexão e continência, observar-se-ão os institutos da transação penal e da composição dos danos civis.” (NR)

“Art. 61. Consideram-se infrações penais de menor potencial ofensivo, para os efeitos desta Lei, as contravenções penais e os crimes a que a lei comine pena máxima não superior a 2 (dois) anos, cumulada ou não com multa.” (NR)

Art. 2o O art. 2o da Lei no 10.259, de 12 de julho de 2001, passa a vigorar com a seguinte redação:

“Art. 2o Compete ao Juizado Especial Federal Criminal processar e julgar os feitos de competência da Justiça Federal relativos às infrações de menor potencial ofensivo, respeitadas as regras de conexão e continência.

Parágrafo único. Na reunião de processos, perante o juízo comum ou o tribunal do júri, decorrente da aplicação das regras de conexão e continência, observar-se-ão os institutos da transação penal e da composição dos danos civis.” (NR)

Este texto não substitui o publicado no D.O.U. de 29.6.2008

www.planalto.gov.br data: 08/11/08 ás 11:26