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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES INSTITUTO A VEZ DO MESTRE PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE NO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM MONIQUE DA SILVA ORIENTADORA SIMONE FERREIRA Rio de Janeiro 2011

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE NO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM

MONIQUE DA SILVA

ORIENTADORA

SIMONE FERREIRA

Rio de Janeiro

2011

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

INSTITUTO A VEZ DO MESTRE

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

A IMPORTÂNCIA DA AFETIVIDADE NO PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM

Rio de Janeiro

2011

Apresentação de monografia à Universidade Candido Mendes como requisito parcial para obtenção do grau de especialista em Psicopedagogia Institucional. Por: Monique da Silva.

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AGRADECIMENTOS

Agradeço primeiramente á Deus, por me dar

forças e saúde. E a todas as pessoas que direta ou

indiretamente cruzaram a minha vida e me fizeram

entender que o afeto é um caminho para a educação.

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DEDICATÓRIA

Dedico este trabalho a minha família que muito

me ajuda e a Vinícius Ferreira Nunes Caldas, um aluno

que indiretamente me incentivou e me deu força e

perseverança em acreditar na minha grande missão como

educadora.

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RESUMO

Este trabalho apresenta uma revisão nas teorias de aprendizagem de Piaget, Vygotsky, Wallon, Freud e alguns autores correlacionando-as com o desenvolvimento da afetividade e sua influência na aprendizagem. Os conceitos de aprendizagem da atualidade fazem a dicotomia entre cognição e afeto e inserem a motivação e o desejo como instrumentos de apropriação da inteligência. As diversas abordagens atribuem a afetividade imprescindível valor para o desenvolvimento psíquico do ser humano. O vínculo emocional que se estabelece entre educador e educando na construção do autoconceito e da auto-estima do sujeito, propiciando-lhe ferramentas necessárias à aquisição da aprendizagem e sua conservação.

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METODOLOGIA

Partindo da premissa que um trabalho acadêmico não pode ser algo

improvisado e sim construído através de um processo sistemático, faz-se

necessária e indispensável a metodologia, a qual deve definir os caminhos e

procedimentos a serem adotados para realização da pesquisa. Essa é de

natureza bibliográfica, pois foram utilizados materiais teóricos para coleta de

dados, como livros de SALTINI, CUNHA E ALVES. Além de artigos, pesquisas

e textos reflexivos sobre o tema.

Vale ressaltar que a pesquisa foi baseada com dados nas teorias de

Piaget, Vygotsky e Wallon.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 8

CAPÍTULO 1 10

A AFETIVIDADE

CAPÍTULO 2 22

A AFETIVIDADE NO PROCESSO COGNITIVO

CAPÍTULO 3 32

A AFETIVIDADE E O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM

CONCLUSÃO 46

BIBLIOGRAFIA 48

ÍNDICE 49

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INTRODUÇÃO

A idéia de pesquisar o tema: Afetividade na escola surgiu em

decorrência do trabalho realizado com crianças e profissionais das séries

iniciais do Ensino Fundamental e suas respectivas queixas, que mobilizam e

levam a reflexão dos elementos que mediam o processo de aprender ou não

aprender. Dentre vários elementos, a presente pesquisa aborda como a

afetividade contribui no processo de ensino-aprendizagem na sala de aula.

Vivemos momentos de inquietações, as pessoas, diante das

mudanças promovidas pelas tecnologias e ciências avançadas, acabam tendo

de mudar sua forma de relacionar-se tanto com a vida, quanto consigo

mesmas.

Algumas formas de ensinar se baseiam apenas em concepções

pedagógicas que legitimam os conteúdos e se organizam em torno da

avaliação, portanto cabem aos profissionais da educação, buscarem novas

perspectivas educacionais e novos caminhos que possibilitem um aprendizado

qualitativo.

É muito comum, educadores dividirem a criança em duas metades:

cognitiva e afetiva. Esse dualismo é um dos maiores mitos presentes na

maioria das propostas educacionais da atualidade.

A educação sempre teve como meta transferir o conhecimento que

temos de um objeto a um sujeito que busca conhecer. Se a educação de faz

por uma inter-relação , no caso entre professor e aluno, essa relação não pode

ser alicerçada apenas na base de informações.

A afetividade acompanha o ser humano desde o nascimento até a

morte. Ela é a base a qual se constrói o conhecimento racional além de

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desempenhar um papel essencial ao desenvolvimento da aprendizagem. O

interesse e a motivação nascem a partir das relações de afetividade no

ambiente escolar e com isso entende-se a importância da criação de vínculos

afetivos entre professor e aluno. Dessa relação o afeto é fundamental na

construção da inteligência.

Aqui serão abordadas as teorias de Piaget, Vygotsky e Wallon e

suas contribuições para este tema. Num segundo momento, serão feitas na

algumas reflexões sobre o afetivo e o cognitivo na educação e a relação entre

professor e aluno, para que se possa ter um panorama geral sobre a

importância da afetividade no processo de aprendizagem.

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CAPÍTULO 1

A AFETIVIDADE

1.1 O que é Afeto?

Vários foram os pensadores e filósofos que, desde a Grécia Antiga,

postularam uma suposta dicotomia entre razão e emoção. Quando Platão

definiu como virtude a liberação e troca de todas as paixões, prazeres e valores

individuais pelo pensamento, considerado, por ele, um valor universal e á

imutabilidade das formas eternas (Silva, 2002), e quando Decartes criou a tão

conhecida e famosa afirmação na história da filosofia – “Penso, logo existo” -,

sugeriam a possibilidade de separação entre razão e emoção ou, o que seria

mais adequado, assumiram implicitamente uma hierarquia entre tais instâncias

do raciocínio humano, em que o pensamento tem valor de excelência.

Nessa mesma direção, Immanuel Kant, na obra Fundamentação da

metafísica dos costumes (1786), nos advertiu sobre a impossibilidade do

encontro entre razão e felicidade, quando afirmou que “quanto mais uma razão

cultivada se consagra ao gozo da vida e da felicidade, tanto mais o hoemem se

afasta do verdadeiro contentamento”. Afirmou também que se Deus tivesse

feito o homem para ser feliz não o teria dotado de razão. Esse filósofo

considerava, ainda, as paixões como “enfermidades da alma”. Tais reflexões

denotam, também, como Kant estabelecia uma hierarquia entre a razão e as

emoções.

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Longe de terem sido esquecidas, essas premissas da filosofia

permanecem vivas até os dias atuais.

Na história da psicologia, o cenário parece não ser muito diferente.

Por influência evidente da filosofia, de onde surgiram, durante muitas décadas

as teorias psicológicas estudaram separadamente os processos cognitivos e

afetivos. Seja por dificuldade em estudá-los de forma integrada, seja por crença

dos psicólogos e cientistas que se debruçaram sobre a temática, tal separação

parece ter nos conduzido a uma visão parcial e distorcida da realidade, com

reflexos nas investigações científicas e no modelo educacional inda vigente. Os

cientistas comportamentais, por um lado, ao centrarem seus estudos apenas

nos comportamentos externos dos sujeitos – e, portanto, relegando a um

segundo plano experiências mais subjetivas, como a das emoções. Por outro

lado, e de forma também distorcida, podemos entender algumas teorias que

privilegiam os aspectos efetivos e/ou inconscientes nas explicações dos

pensamentos humanos, dedicando um papel secundário aos aspectos

cognitivos.

Muitos autores (Fernandez, 1991; Dantas, 1992; Snyders, 1993;

Freire, 1994; Codo e Gazzotti, 1999, entre outros) vêm defendendo que o afeto

é indispensável na atividade de ensinar, entendendo que as relações entre

ensino e aprendizagem são movidas pelo desejo e pela paixão e que, portanto,

é possível identificar e prever condições afetivas favoráveis que facilitam a

aprendizagem.

Algumas pesquisas (Pinheiro, 1995; Almeida, 1997; Pereira, 1998;

Tassoni, 2000; Silva, 2001; Negro, 2001, entre outras) também vêm

contribuindo para a discussão da relevância da dimensão afetiva na

constituição do sujeito e na construção do conhecimento. Tendo como

pressupostos básicos as teorias de Wallon e Vygotsky. Mas, não se pode

negar que, dentre os fenômenos psicológicos, os afetivos apresentam uma

grande dificuldade de estudo, tanto no que se refere à conceituação, como

também quanto à metodologia de pesquisa e de análise. Na literatura encontra-

se, eventualmente, a utilização dos termos afeto, emoção e sentimento,

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aparentemente como sinônimos. Entretanto, na maioria das vezes, o termo

emoção encontra-se relacionado ao componente biológico do comportamento

humano, referindo-se a uma agitação, uma reação de ordem física. Já a

afetividade é utilizada com uma significação mais ampla, referindo-se às

vivências dos indivíduos e às formas de expressão mais complexas e

essencialmente humanas.

Engelmann (1978) faz uma profunda revisão terminológica quanto às

variações semânticas, ao longo do tempo, das palavras: emoções,

sentimentos, estados de ânimo, paixão, afeto e estados afetivos, em diversos

idiomas (francês, inglês, alemão, italiano e português). Esperava conseguir

clarear e precisar as peculiaridades de significado de cada termo que, às

vezes, são usados como sinônimos. Tinha a intenção de corrigir o caráter vago

e a inadequação de uso, em muitos casos.

Concluiu que existe uma variação conceitual muito grande,

dependendo do autor e do idioma a ser considerado.

Apesar das dificuldades de conceituação que vêm acompanhando,

historicamente os fenômenos afetivos, Pino (mimeo) tem destacado com

clareza que tais fenômenos referem-se às experiências subjetivas, que revelam

a forma como cada sujeito “é afetado pelos acontecimentos da vida ou, melhor,

pelo sentido que tais acontecimentos têm para ele” (p.128). Portanto,

“os fenômenos afetivos representam a maneira como os acontecimentos repercutem na natureza sensível do ser humano, produzindo nele um elenco de reações matizadas que definem seu modo de ser-no-mundo. Dentre esses acontecimentos, as atitudes e as reações dos seus semelhantes a seu respeito são, sem sombra de dúvida, os mais importantes, imprimindo às relações humanas um tom de dramaticidade. Assim sendo, parece mais adequado entender o afetivo como uma qualidade das relações humanas e das experiências que elas evocam (...). São as relações sociais, com efeito, as que marcam a vida humana, conferindo ao conjunto da realidade que forma seu contexto (coisas, lugares, situações, etc) um sentido afetivo” (idem, p. 130-131).

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Embora os fenômenos afetivos sejam de natureza subjetiva, isso

não os torna independente da ação do meio sociocultural, pois relacionam-se

com a qualidade das interações entre os sujeitos, enquanto experiências

vivenciadas. Dessa maneira, pode-se supor que tais experiências vão marcar e

conferir aos objetos culturais um sentido afetivo.

A questão da afetividade tem sido bastante discutida por professores

pais e educadores em que é percebida a importância da afetividade no

processo de ensino e aprendizagem. Mas o que é afetividade? Segundo

Ferreira (1999, p.62) afetividade significa: Conjunto de fenômenos psíquicos

que se manifestam sob a forma de emoções, sentimentos e paixões,

acompanhados sempre da impressão de dor ou prazer, de satisfação ou

insatisfação, de agrado ou desagrado, de alegria ou tristeza.

Na sua definição etimológica, o afeto é neutro. Pode exprimir um

sentimento de agrado ou desagrado em diferentes graus de complexão;

disposição da alma, que tanto pode revelar seu amor ou ira. O afeto,

entretanto, quando resulta da prática do amor, torna-se amorosidade, atitude

que se reveste em um estímulo para o aprendizado, dando clareza e

entendimento à consciência.

O afeto é assim. No mundo atual, parece uma novidade, mas ele

existe desde que respiramos. Decerto, é uma respiração; transpiração e

inspiração para a vida.

1.2 A concepção de Piaget sobre a afetividade.

Um breve histórico de Jean Piaget (1896 – 1980) nasceu em

Neuchâtel, na Suíça e morreu em Genebra deixando uma obra de mais de 75

livros e centenas de trabalhos científicos. Estudou Biologia e Filosofia na

Universidade de Neuchâtel. Após se formar, trabalhou como psicólogo

experimental em Zurich, onde frequentou as aulas ministradas por Jung.

Piaget influencia-se com os métodos informais de psicologia como

as análises, entrevistas e conversas com pacientes, passando a combinar com

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a psicologia experimental que é o estudo formal e sistemático. Em 1919, ele

muda-se para a França e passa a trabalhar com Alfred Binet, que era um

renomado psicológico infantil tendo desenvolvido teses de inteligência

padronizadas para crianças. Nessa época, Jean Piaget inicia seus estudos

experimentais sobre o desenvolvimento das habilidades cognitivas.

Em um trabalho publicado a partir de um curso que ministrou na

Universidade de Sorbonne (Paris) no ano acadêmico de 1953-54,” Lês relations

entre l’intelligence at l’affectivité dans lê développement de l’enfant”, o autor

nos advertiu sobre o fato de que, apesar de diferentes em sua natureza, a

afetividade e a cognição são inseparáveis, indissociadas em todas as ações

simbólicas e sensório-motoras. Ele postulou que toda ação e pensamento

comportam um aspecto cognitivo, representado pelas estruturas mentais, e um

aspecto afetivo, representado por uma energética, que é a afetividade.

Na concepção Piagetiana, a crianças é concebida como um ser

dinâmico, interagindo a todo momento com a realidade, operando ativamente

com objetos e pessoas. Essa interação com o ambiente faz com que construa

estruturas mentais e adquira maneiras de fazê-las funcionar. “Equilíbrio e

estrutura são os dois aspectos complementares de toda organização do

pensamento” (Piaget apud SALTINI, 1997 p. 87). O eixo central é organismo-

meio e isso acontece através de dois processos simultâneos: a organização

interna e a adaptação ao meio, funções exercidas pelo organismo ao longo da

vida.

De acordo com Piaget, não existem estados afetivos sem elementos

cognitivos, assim como não existem comportamentos puramente cognitivos.

Quando discute os papéis da assimilação e da acomodação cognitiva, afirma

que esses processos da adaptação também possuem um lado afetivo: na

assimilação, o aspecto afetivo é o interesse em assimilar o objeto ao self (o

aspecto cognitivo é a compreensão); enquanto na acomodação a afetividade

está presente no interesse pelo objeto novo (o aspecto cognitivo está no ajuste

dos esquemas de pensamento ao fenômeno).

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A afetividade não se restringe somente às emoções e aos

sentimentos, mas engloba também as tendências e a vontade. Não se pode

explicar a inteligência pela afetividade e tampouco a afetividade pela

inteligência.

[...] os aspectos afetivos, sociais e cognitivos da conduta são, de fato, indissociáveis, a afetividade constitui a energética das condutas cujas as estruturas correspondem às funções cognitivas e, se a energética não explica a estruturação nem o inverso, nenhuma poderia funcionar sem a outra. (PIAGET, 1968, p. 104).

Nessa perspectiva, o papel da afetividade para Piaget é funcional na

inteligência. Ela é a fonte de energia de que a cognição se utiliza para seu

funcionamento. Ele explica esse processo por meio de uma metáfora,

afirmando que a afetividade seria como a gasolina, que ativa o motor de um

carro mas não modifica sua estrutura. Ou seja, existe uma relação intrínseca

entre a gasolina e o motor (ou entre a afetividade e a cognição) porque o

funcionamento do motor, comparando com as estruturas mentais, não é

possível sem o combustível, que é a afetividade.

1.3 A concepção de Vygotsky sobre a afetividade.

Em 15 de novembro de 1896, na cidade de Orsh, em Bielarua, hoje,

União Soviética nasceu Lev Semenovich Vygotsky. Ele deixou contribuições

significativas para a psicologia, linguagem, educação, neurologia entre tantos

outros, vindo a falecer em 1934, vítima de tuberculose no mesmo país em que

nascera.

Sua teoria fundamenta-se no desenvolvimento humano como

resultado de um processo sócio-histórico, uma maior importância ao papel da

linguagem e da aprendizagem, tendo como centro das atenções a aquisição de

conhecimentos pela interação do sujeito com o meio.

O psicólogo também tematizou as relações entre afeto e cognição,

postulando que as emoções integram-se ao funcionamento mental geral, tendo

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uma participação ativa em sua configuração. Reconhecendo as bases

orgânicas sobre as quais as emoções humanas se desenvolvem, Vygotsky

buscou no desenvolvimento da linguagem – sistema simbólico básico de todos

os grupos humanos -, os elementos fundamentais para compreender as

origens do psiquismo.

Vygotsky explicita claramente sua abordagem unificadora entre as

dimensões cognitiva e afetiva do funcionamento psicológico. Afirma ele que

(1996):

“A forma de pensar, que junto com o sistema de conceito nos foi imposta pelo meio que nos rodeia, inclui também nossos sentimentos. Não sentimos simplesmente: o sentimento é percebido por nós sob a forma de ciúme, cólera, ultraje, ofensa. Se dizemos que desprezamos alguém, o fato de nomear os sentimentos faz com que estes variem, já que mantêm uma certa relação como nossos pensamentos.”

Marta Kohl de Oliveira (1992), numa explanação acerca da

afetividade na teoria de Vygotsky, salienta que o autor soviético distinguia, no

significado da palavra, dois componentes: o “significado” propriamente dito

(referente ao sistema de relações objetivas que se forma no processo de

desenvolvimento da palavra) e o “sentido” (referente ao significado da palavra

para cada pessoa). Neste último, relacionado às experiências individuais, é que

residem as vivências afetivas. Em tal sentido, a autora afirma que “no próprio

significado da palavra, tão central para Vygotsky, encontra-se uma

concretização de sua perspectiva integradora dos aspectos cognitivos e

afetivos do funcionamento psicológico humano”.

As reflexões feitas por Vygotsky possibilitaram destacar a imensa

complexidade que envolve o desenvolvimento das emoções humanas e afirmar

que tal desenvolvimento está em harmonia com a própria distinção que faz

entre processos psicológicos superiores e inferiores e sua concepção de

desenvolvimento cognitivo. Defende que as emoções não deixam de existir,

mas evoluem para o universo do simbólico, entrelaçando-se com os processos

cognitivos.

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Vygotsky (apud Oliveira, 1992) defende que o pensamento “tem

sua origem na esfera da motivação, a qual inclui inclinações, necessidades,

interesses, impulsos, afeto e emoção. Nesta esfera estaria a razão última do

pensamento e, assim, uma compreensão completa do pensamento humano só

é possível quando se compreende sua base afetivo-volitiva” (p. 76). Afirma,

ainda, que o conhecimento do mundo objetivo ocorre quando desejos,

interesses e motivações aliam-se à percepção, memória, pensamento,

imaginação e vontade, em uma atividade cotidiana dinâmica entre parceiros

(Machado, 1996).

1.4 A concepção de Wallon sobre a afetividade.

Henri Wallon nasceu em Paris, França, em 1879 e faleceu em 1962.

Era médico, filósofo e psicólogo. Atendeu pessoas com distúrbios psiquiátricos

durante a 1ª Guerra Mundial. Criou um laboratório de psicologia para pesquisar

o comportamento das crianças. Além de ter sido professor da Sorbonne e vice-

presidente do grupo Francês da Educação Nova, coordenou o projeto de

Reforma do Ensino da França.

Voltado às questões políticas e sociais, era também muito sensível e

voltado às artes. Em sua carreira de psicólogo foi se aproximando da educação

e viu o estudo da criança e da infância como uma porta para entender o

psiquismo humano. Foi um pesquisador e debatedor ativo sobre os problemas

da educação em sua época.

Wallon dedicou grande parte de seu trabalho ao estudo da

afetividade, adotando, além disso, uma abordagem fundamentalmente social

do desenvolvimento humano. Busca, em sua psicogênese, articular o biológico

e o social. Atribui às emoções um papel de primeira grandeza na formação da

vida psíquica, funcionando como uma amálgama entre o social e o orgânico.

As relações da criança com o mundo exterior são, desde o início, relações de

sociabilidade, visto que, não tem

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“meios de ação sobre as coisas circundantes, razão porque a satisfação das suas necessidades e desejos tem de ser realizada por intermédio das pessoas adultas que a rodeiam. Por isso, os primeiros sistemas de reação que se organizam sob a influência do ambiente, as emoções, tendem a realizar, por meio de manifestações consoantes e contagiosas, uma fusão de sensibilidade entre o indivíduo e o seu entourage” (WALLON, 1971,p.262).

Wallon estabelece uma distinção entre emoção e afetividade (1968).

Segundo o autor as emoções são manifestações de estados

subjetivos, mas com componentes orgânicos.

Ao defender o caráter biológico das emoções, destaca que estas

originam-se na função tônica. Toda alteração emocional provoca flutuações de

tônus muscular, tanto de vísceras como da musculatura superficial e,

dependendo da natureza da emoção, provoca um tipo de alteração muscular.

Wallon “identifica emoções de natureza hipotônica, isto é, redutoras de tônus,

tais como susto e a depressão. (...) Outras emoções são hipertônicas,

geradoras de tônus, tais como a cólera e a ansiedade, capazes de tornar

pétrea a musculatura periférica” (Dantas, 1992,p.87).

A afetividade, por sua vez, tem uma concepção mais ampla,

envolvendo uma gama maior de manifestações, englobando sentimentos

(origem psicológica) e emoções (origem biológica). A afetividade corresponde a

um período mais tardio na evolução da criança, quando surgem os elementos

simbólicos. Segundo Wallon, é com o aparecimento destes que ocorre a

transformação das emoções em sentimentos. A possibilidade de

representação, que consequentemente implica na transferência para o plano

mental, confere aos sentimentos uma certa durabilidade e moderação.

Almeida (1999,p.42) ao mencionar Wallon diz que ele “atribui à

emoção como os sentimentos e desejos, são manifestações da vida afetiva, um

papel fundamental no processo de desenvolvimento humano. Entende-se por

emoção as formas corporais de expressar o estado de espírito da pessoa, este

estado afetivo pode ser penoso ou agradável.”

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O desenvolvimento é um processo contínuo, pois o homem nunca

está pronto e acabado, esse desenvolvimento refere-se ao mental e ao

crescimento orgânico, conhecendo as características comuns de uma faixa

etária, reconhecendo as individualidades.

Segundo Almeida (1999,p.44), “com a influência do meio, essa

afetividade se manifestava em simples gestos lançados no espaço, transforma-

se em meios de expressão cada vez mais diferenciados, inaugurando o

período emocional.”

A inteligência não se desenvolve sem a afetividade. Segundo

Almeida (1999,p.50): A afetividade, assim como a inteligência, não aparecem

pronta nem permanece imutável. Ambas evoluem ao longo do

desenvolvimento: são construídas e se modificam de um período a outro, pois

à medida que o indivíduo se desenvolve, as necessidades afetivas se tornam

cognitivas.

Assim como Piaget e Vygotsky, Wallon mostra-nos, em seus

escritos, compartilhar da ideia de que emoção e razão estão, intrinsecamente,

conectadas (1986):

“A comoção do medo ou da cólera diminui quando o sujeito se esforça para definir-lhes as causas. Um sofrimento físico, que procuramos traduzir em imagens, perde algo de sua agudez orgânica. O sofrimento moral, que conseguimos relatar a nós mesmos, cessa de ser lancinante e intolerável. Fazer um poema ou um romance de sua dor era, para Goethe, um meio de furtar-se a ela.”

Na perspectiva de Henri Wallon, inteligência e afetividade estão

integradas: a evolução da afetividade depende das construções realizadas no

plano da inteligência, assim como a evolução da inteligência depende das

construções afetivas. No entanto, o autor admite que, ao longo do

desenvolvimento humano, existem fases em que predominam o afetivo e fases

em que predominam a inteligência.

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1.5 A concepção de Freud sobre a afetividade.

Dentro da Psicanálise (que buscou na terminologia da psicologia

alemã-Affekt), o termo afeto seria a expressão de qualquer estado afetivo,

penoso ou agradável que se manifesta sob a forma de uma descarga ou não.

Nascido Sigismund Schlomo Freud, em 1877 em Freiberg, Império

Austríaco (atualmente pertencente a República Tcheca), mais conhecido como

como Sigmund Freud. Foi um médico neurologista judeu – austríaco, fundador

da Psicanálise.

Para S.Freud afeto é a mais pura expressão da quantidade de

energia pulsional frente às suas variações, ou seja, podem-se notar explosões

afetivas da alegria e podem-se notar diminutas explosões de alegria.

Em Freud, o conceito de afeto (affekt) está ligado ao de pulsão

(trieb). A pulsão é uma produção teórica de Freud, “conceito situado na

fronteira entre o mental e o somático, como o representante psíquico dos

estímulos que se originam dentro do organismo e alcançam a mente, como

uma medida de exigência feita à mente no sentido de trabalhar em

consequência de sua ligação como o corpo” (Freud, 1915ª, Ed. St. Br.,

1974,p.142).

Depreende-se, desta conceituação de pulsão, que esta, ao mesmo

tempo que representa o corpo no psiquismo só se faz presente, neste último,

através de seus representantes psíquicos. Estes são a representação, ou

elementos ideativos ou ideia (Vorstellung) e o afeto (affekt).

Nos escritos metapsicológicos (O recalcamento – Die Verdrangung,

1915; O inconsciente – Das Unberwussie, 1915 – Ed. St. Br., 1974, vol XIV)

Freud designa o afeto como sendo a tradução subjetiva da quantidade de

energia pulsional. Ele utiliza o termo “quantum de afeto” para designar esse

outro elemento do representante psíquico de pulsão e o conceitua como

correspondendo à pulsão, “na medida que esta se afasta da ideia e encontra

expressão proporcional à sua quantidade em processos que são sentidos como

afetos” (Freud, 1915b, Ed. St. Br., 1974,p.176).

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Para Freud, apenas os representantes ideativos de pulsão podem

ser recalcados, enquanto os afetos, como expressão qualitativa da quantidade

de energia pulsional, sofrem outros destinos.

A antítese entre consciente e inconsciente, na teoria freudiana, não

se aplica às pulsões. Uma pulsão, escreveu Freud, nunca pode tornar-se

objeto de consciência. “Se a pulsão não se prendeu a uma ideia ou não se

manifestou como um estado afetivo, nada poderemos conhecer sobre ela (...).

Podemos apenas referirmo-nos a um impulso pulsional cuja representação

ideativa é inconsciente (...). (...) faz parte da natureza de uma emoção que

estejamos cônscios dela, isto é, que ela se torne conhecida pela consciência.

Assim, a possibilidade do atributo da inconsciência seria completamente

excluída no tocante às emoções, sentimentos e afetos” (Freud, 1915c, Ed. St.

Br., 1974, p.203).

Quanto aos destinos do afeto, Freud (1915c) aponta três

possibilidades: ou ele permanece, no todo ou em parte, como é; ou é

transformado num afeto qualitativamente diferente, sobretudo em angústia; ou

é suprimido, isto é, impedido de se desenvolver. Suprimir o desenvolvimento do

afeto constitui, para Freud, a verdadeira finalidade de recalcamento (e da

repressão). Aliás, ele admite falar de “afetos inconscientes” apenas nos casos

em que estes foram inibidos, em seu desenvolvimento, pelo processo de

recalcamento.

Freud chama a atenção, no entanto, para a diferença produzida pela

incidência do recalcamento na ideia e no afeto. Após o processo de

recalcamento, diz ele, “as ideias inconscientes continuam a existir como

estruturas reais no sistema inconsciente, ao passo que tudo o que naquele

sistema corresponde aos afetos inconscientes é um início potencial impedido

de se desenvolver” (Freud, 1915c, Ed. St. Br., 1974,p. 204). Portanto, não

existem, para Freud, rigorosamente falando, afetos inconscientes da mesma

forma que existem ideias.

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CAPÍTULO 2

A AFETIVIDADE NO PROCESSO COGNITIVO

2.1 Definindo cognição

Segundo o Dicionário Aurélio, “aquisição de conhecimento”.

Apesar da simplicidade da definição, a palavra “cognição” é

bastante complexa.

Por trás desse conceito ocultam-se diferenças essenciais entre

teorias e visões do mundo e, ao tentar defini-lo, somos confrontados com

questões do tipo: Qual a relação entre cognição e percepção? E entre cognição

e consciência? Percebemos o mundo como ele realmente é ou nossa

percepção e nosso cérebro é que determinam nossa visão do mundo? Qual o

papel da nossa cultura, da nossa linguagem, em nossa percepção das coisas?

Como representamos “em nossas cabeças” o conhecimento que temos do

mundo?

Como se pode ver, essas e outras questões espinhosas, às quais

diferentes correntes dão diferentes respostas, estão longe de ser resolvidas. O

melhor que podemos fazer, se não tivermos preocupações filosóficas ou

necessidade de rigor acadêmico, é evitar essas discussões ou respeitar o fato

de que pessoas igualmente inteligentes têm opiniões completamente diferentes

sobre a definição clara do conceito e de seus pressupostos.

O que é cognição? Cognição é o ato ou processo de conhecer, que

envolve atenção, percepção, memória, raciocínio, juízo, imaginação,

pensamento e linguagem.

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Mas a cognição é mais do que simplesmente a aquisição de

conhecimento e consequentemente, a nossa melhor adaptação ao meio – mas

é também um mecanismo de conversão do que é captado para o nosso modo

de ser interno. Ela é um processo pelo qual o ser humano interage com os

seus semelhantes e com o meio em que vive, sem perder a sua identidade

existencial. Ela começa com a captação dos sentidos e logo em seguida ocorre

a percepção. É portanto, um processo de conhecimento, que tem como

material a informação do meio em que vivemos e o que já está registrado na

nossa memória.

Mas de onde veio este termo, “cognitivo”? Há muitas versões

diferentes da história, mas entre as mais populares está aquela que afirma que

psicólogos como Jerome Bruner, George Miller, e Ulrich Neisser transformaram

uma psicologia dominada pelo behaviorismo, voltando a colocar num lugar de

honra um conjunto de tópicos psicológicos tradicionais que uma vez tinham

sido completamente banidos pelos behavioristas na época de sua ascendência.

O que justificou esta reintrodução (à parte o fato de que tais termos eram o pão

com manteiga tradicional do pensamento psicológico antes de Watson entrar

em cena) foi o desenvolvimento de uma maneira nova e rigorosa de estudá-los

juntamente com suas funções: a abordagem do “processamento da

informação” (Nota 1 – Um revisor anônimo de um primeiro rascunho deste

estudo argumentou que Neisser duvidava do processamento da informação;

que a justificativa para o estudo dos processos cognitivos era simplesmente

que eles existem. Superficialmente isto pode ser verdade, mas o que o

processamento da informação nos forneceu foi uma maneira de estudarmos

tais processos de maneira rigorosa. Por contraste, o processamento da

informação não forneceu uma maneira rigorosa de se estudar a consciência e,

assim, apesar de todos admitirem que ela “está aí”, seu estudo não teve muito

sucesso e sua pesquisa ainda é vista com suspeita por muita gente).

Alguns acreditam que o ímpeto desta mudança se originou na

psicologia e dali se espalhou para a filosofia, a linguística, etc. (por exemplo,

Craik, 1991). Em outra publicação (Green, 1994) esta visão é historicamente

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incorreta; que a cognição eram uma preocupação constante em filosofia,

inteligência artificial, e linguística bem antes de atrair a psicologia experimental.

Mesmo assim, isso não explica como o termo “cognitivo” veio a ser usado para

cobrir bastante bem o que era conhecido como “mental”, desavenças

metodológicas à parte. Obviamente, “cognitivo” é um homólogo do “cogito”

cartesiano. De fato, alguns daqueles que se opuseram à tão-chamada

revolução cognitiva (por exemplo, Skinner, 1989) argumentaram que ela nada

mais é do que um ressurgimento anacrônico do dualismo cartesiano. Mas

fazendo-se um exame mais de perto esta visão parece ser mais tendenciosa e

incompleta do que mesmo suspeita visão carlyliana de que uns poucos

psicólogos corajosos se juntaram contra a opressiva maré behaviorista dos

anos 50 para salvar a psicologia de si mesma. (Nota 2 - Thomas Carlyle (1795

– 1881) acreditava que a história é levada à frente por líderes fortes e heróicos,

como Julio César e Napoleão, e não por ser primariamente o produto de forças

sociais sobre as quais os indivíduos tem pouco controle. A visão histórica de

Carlyle está hoje em dia decididamente fora de voga entre a maioria dos

historiadores profissionais). Baars (1986,p. 158) argumentou que o termo

“cognitivo” é inerentemente ambíguo; especificamente, que um uso à moda

antiga significando “consciente” compete com dois usos mais contemporâneos

– um deles referindo-se ao uso de variáveis intervenientes em teoria

psicológica, e o outro referindo-se a uma área particular da psicologia que tem

a ver com memória, raciocínio e coisas assim.

Antes de existir um ramo da psicologia chamado de “cognitivo”, o

termo foi popularizado entre os psicólogos, principalmente por psicólogos

sociais como Asch, Festinger, e Heider. À medida que o interesse em

pensamento, linguagem, e memória começou a aumentar entre os psicólogos

experimentais – primariamente sob a influência do trabalho de pesquisadores

de inteligência artificial, lingüistas, e filósofos (ver Green, 1994) – o significado

técnico vindo de fora da psicologia começou a se misturar com o significado

mais solto empregado pelos psicólogos sociais. O significado estrito nunca se

firmou na psicologia, todavia, e a fusão dos dois levou muitos psicólogos a

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equacionar efetivamente o cognitivo com quase tudo visto flexivelmente

como “mental”. Este destino acaba sendo um pouco irônico, porque a aplicação

do termo “cognitivo” a problemas da mente por filósofos tinha a intenção

específica de dividir o mental em suas categorias – uma na qual os métodos a

lógica e das ciências da computação pudessem ser aplicados com sucesso, a

“cognitiva”, e outra na qual não pudessem. Assim, os advogados filosóficos do

termo “cognitivo” nunca pretenderam que ele fosse sinônimo de “mental”, e por

consequência muito daquilo que hoje recebe o nome de “cognição” em

psicologia não é realmente “cognitivo” no sentido estrito.

Certamente os significados das palavras se desenvolvem e se

modificam com o tempo, e não existe nenhuma razão a priori para que os

cognitivistas contemporâneos se conformem ao uso (NT – do conceito

“cognitivo”) desenvolvido pelos éticos há quase meio século. Mas acontece que

foram justamente aqueles segmentos da psicologia cognitiva que não são

cognitivos em sentido estrito que demonstraram ser os menos susceptíveis a

um estudo científico rigoroso. De fato, foi precisamente na tentativa de se

desautorizar cientificamente aspectos perturbadores do “mental”, como emoção

e consciência, ao mesmo tempo em que se retinham aqueles como

pensamento, crença, e desejo, que o termo “cognitivo” foi invocado pelos

psicólogos filósofos das décadas de 1950 e 1960. Quer dizer, as distinções que

os filósofos faziam quanto à aplicação do termo “cognitivo” aos problemas da

mente são distinções importantes, que os psicólogos ignoram por sua própria

conta e risco.

É um mecanismo de conversão do que é captado para o nosso

modo de ser interno. Ela é um processo pelo qual o ser humano interage com

os seus semelhantes e com o meio em que vive, sem perder a sua identidade

existencial. Ela começa com a captação dos sentidos e logo em seguida ocorre

a percepção. É portanto, um processo de conhecimento, que tem como

material a informação do meio em que vivemos e o que já está registrado n

nossa memória. A Psicologia Cognitiva afirma que é um processo de interfere

no nosso comportamento, o que parece razoável, já que a Cognição, além de

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ser esse fenômeno de aprendizagem – visa a protecção do nosso “Eu” mais

íntimo, para que a nossa matriz interna não seja absorvida completamente pela

realidade que nos cerca. Toda a informação vinda do meio, através da

captação dos sentidos, é adequada e convertida, tendo o seu efeito adaptado,

para que possa fazer parte dos parâmetros do nosso “eu”. Ao contrário, não

resistiríamos por exemplo,

ás grandes perdas. A dor da perda é uma reação cognitiva intensa para

preservação da nossa matriz existencial, a fim de que haja uma recuperação

mais rápida. Mas como ela não tem vínculo direto com a realidade lá fora, e

sim com a realidade interna, muitas vezes nos faz tomar decisões com base

em dados convertidos pela nossa própria interpretação interna ou modelos da

nossa mente.

2.2 Afetividade e cognição na educação

Ultimamente, vários estudos têm direcionado o olhar para a

dimensão afetiva do comportamento humano. A partir de abordagens que dão

ênfase nas interações sociais, destacando-se o papel determinante do outro no

desenvolvimento e na constituição do indivíduo, tem se configurado uma

tendência na consolidação de teorias que se baseiam numa visão mais

integrada do ser humano.

A tradicional visão dualista do Homem enquanto corpo/mente,

matéria/espírito, afeto/cognição, que tem permeado a trajetória do pensamento

e do conhecimento humano há muitos séculos, tem se manifestado em estudos

sobre o comportamento a partir de uma visão cindida entre racional e

emocional, pressupondo-se, geralmente, que o primeiro deveria dominar o

segundo, impedindo uma compreensão da totalidade do ser humano.

O advento de concepções teóricas, como a abordagem histórico-

social, marcadas pela ênfase nos determinantes culturais, históricos e sociais

da condição humana, tem possibilitado uma nova leitura das dimensões afetiva

e cognitiva no ser humano, na direção de uma interpretação monista, em que

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pensamento e sentimento se fundem, não mais possibilitando análises

isoladas dessas dimensões. Tais interpretações têm provocado profundas

modificações na Psicologia, seja enquanto área de produção científica, ou

enquanto área que subsidia diversas práticas profissionais.

Na área educacional, a crença de que a aprendizagem é social,

mediada por elementos culturais, produz um novo olhar para as práticas

pedagógicas. A preocupação que se tinha com o “o que ensinar” (os conteúdos

das disciplinas), começa a ser dividida com o “como ensinar” (a forma de, as

maneiras, os modos).

Jean Piaget, foi um dos primeiros nomes a questionar a separação

entre cognição e afetividade, compartilha juntamente com os teóricos Lev S.

Vygotsky e Henry Wallon, da ideia de que a emoção e a razão estão

intrinsecamente ligadas. O desenvolvimento intelectual é considerando como

tendo dois componentes: o cognitivo e o afetivo. Paralelo ao desenvolvimento

cognitivo está o desenvolvimento afetivo. Afeto inclui sentimentos, interesses,

desejos, tendências, valores e emoções em geral.

Toda ação e pensamento compreendem um aspecto cognitivo, que

são as estruturas mentais, e um aspecto afetivo, que serve como uma

energética. De maneira geral, a afetividade seria funcional para a inteligência:

ela é a fonte de energia pela qual a cognição funciona. Piaget afirma que a

afetividade e cognição são diferentes em natureza, porém inseparáveis em

todas as ações humanas. Segundo Moreno et al. (1999,p.15): “Não há nada

que justifique voltar-se a educação para somente um deles, excluindo o outro.

A não ser que se tenha interesse em manter as relações humanas – em suas

múltiplas facetas – tais como estão.”

Wallon destaca os conceitos de alternância e predominância

alternada da afetividade e da cognição nas diferentes fases do

desenvolvimento:

“Apesar de alternarem a dominância, afetividade e cognição não se mantém como funções exteriores uma à outra. Cada uma, ao reaparecer como atividade predominante num dado estágio, incorpora as conquistas realizadas pela outra, no

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estágio anterior, construindo-se reciprocamente, num permanente processo de integração e diferenciação” (Galvão, 1996,p. 45).

No estreito entrelaçamento entre a afetividade e cognição, as

conquistas do plano afetivo são utilizadas no plano cognitivo, e vice-versa.

Outro autor que enfatizou, em seus estudos, a íntima relação entre

afeto e cognição é Vygotsky. Denuncia que a separação desses dois aspectos.

“enquanto objetos de estudos, é uma das principais deficiências da psicologia tradicional, uma vez que esta apresenta o processo de pensamento como um fluxo autônomo de pensamentos que pensam a si próprios, dissociados da plenitude da vida, das necessidades e dos interesses pessoais, das inclinações e dos impulsos daquele que pensa”(1993,p.6).

Abordar os sentimentos humanos como um conteúdo escolar, de

forma sistematizada é algo insólito em nossa realidade educacional. Mas como

trabalhar na sala de aula os conteúdos tradicionais e conteúdos do cotidiano,

como os sentimentos? A princípio os educadores podem achar isso difícil de

ser feito, até mesmo uma utopia. Mas, desprendendo-se das formas

tradicionais de educação de acordo com os quais foram acostumados a

pensar, quem sabe isso não fosse tão utópico como parece.

É mais difícil abandonar velhas formas de pensamento que durante

anos nos pareceram as únicas possíveis do que descobrir e praticar novas

metodologias e uma forma de ensino menos discriminatória. Como diz Moreno

et al. (1999,p.13) “[...] mais difícil do que adquirir novos conhecimentos é

conseguir desprender-se dos velhos. Abandonar uma ideia supõe renunciar a

uma parte de nosso pensamento, é deixar-se fascinar pelo insólito, é nisso que

reside o gérmen do progresso.”

Não se trata e abandonar os conteúdos tradicionais e sim, conduzi-

los de forma diferenciada. Onde, o científico e o cotidiano se aproximem,

tornando-se a aprendizagem mais atraente e útil aos educandos e não uma

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obrigação, um tédio. Não se pode falar de uma verdadeira mudança, se

forem mantidos os vazios tradicionais do conhecimento social e afetivo já que é

este conhecimento que conduz às mudanças reais no comportamento das

pessoas.

A educação não é uma transmissão do conhecimento, de um saber

ou até mesmo de uma conduta, mas sobretudo, uma iniciação à vida. É o local

das primeiras interações com um meio mais amplo (natureza e cultura); um dos

espaços onde a pessoa começa a viver com os primeiros elementos simbólicos

que lhe lembram o lugar de onde veio (família e ventre); um lugar onde possa

se preparar para enfrentar e assimilar o contexto social. Nesta perspectiva, é

um espaço e um tempo intermediário entre o nascimento e o destino, o

trabalho, a profissão, a vida madura e adulta. Então, segundo Saltini

(1997,p.31):

[...] a escola que não leva em consideração a interação entre a vida egocêntrica, familiar, uterina e a vida psicosociocultural como todos os seus devidos fatores e correspondentes repercussões de uns sobre os outros, não poderia ser considerada uma escola séria e responsável, em termos evolutivos e menos ainda no sentido de sequência e consequência para o futuro do indivíduo.

A vida nos propõe atitudes de constante transformação, entendendo

as necessidades do momento e do tempo dos indivíduos perante os problemas

sempre novos que se apresentam. As máquinas, a mentalidade, as

necessidades mudam, tudo está em constante mudança. Por isso, a educação

deverá ter uma certa sensibilidade com isso, pois quando nos colocamos

diante de uma criança devemos pensar em como prepará-la para daqui a dez

ou vinte anos e não encaminhá-la para lições, informações e soluções que só

tem validade para hoje. Será que algum educador já pensou nisso? Ou será

que só propõe a cumprir o currículo. É aí que deve começar a reflexão em prol

de uma transformação na maneira de conceber o ato educativo.

As escolas não devem esperar que as crianças façam tudo o que

querem, mas que queiram tudo o que fazem e que ajam e não sejam forçadas

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à ação, explorando seus interesses, ligando-os à elas, à sua vida, ao seu

cotidiano. Para que assim tenham verdadeiro significado. Segundo Freire apud

Saltini (1997,p.85):

Para ser válida toda educação, toda a ação educativa, deve necessariamente ser precedida de uma reflexão sobre o homem e de uma análise do meio de vida concreto, do homem concreto a quem queremos educar ou melhor: a quem queremos ajudar a que se eduque. Se vier a faltar tal reflexão sobre o homem, corre-se o risco de adotar métodos educativos e maneiras de agir que reduzem o homem à condição de objeto, quando a sua vocação é a de ser sujeito e não objeto.

Entretanto, não é possível ensinar e conhecer uma criança sem

considerar seus aspectos energéticos.

A relação afetiva que se estabelece é um vínculo entre seres

humanos, é uma relação de afeto no contexto da educação. A televisão ou o

computador, por si sós, não podem educar, pois para que haja conhecimento e

que este evolua para um saber, precisamos estabelecer uma relação humana,

sem a qual não há possibilidade do indivíduo crescer.

De nada adianta termos os melhores programas de televisão ou de

computador, se não houver a relação afetiva, não há o desenvolvimento de

ninguém. Apenas o homem pode conduzir o homem ao crescimento. Se

conseguirmos articular o aspecto cognitivo com o aspecto afetivo, teremos um

amplo conhecimento de como é o funcionamento do ser humano.

A educação é uma arte. Não é uma mera profissão ser educador.

Nós manipulamos a educação com as duas mãos: do afeto e da lei e das

regras. O afeto buscando o prazer se transforma em interesse e este por sua

vez provoca a interação com o meio. Por que eu aprenderia, recriaria no meu

interior aquilo que não me interessa? Para educar o ser humano é

imprescindível conhecê-lo profundamente, bem como, respeitar seu

desenvolvimento. É necessário ter a percepção correta de como esse ser se

desenvolve. “As escolas deveriam entender mais de seres humanos e de amor

do que de conteúdos e técnicas educativas. Elas têm contribuído em demasia

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para a construção de neuróticos por não entenderem de amor, de sonhos, de

fantasias, de símbolos e de dores”. (SALTINI, 1997 p.15)

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CAPÍTULO 3

A AFETIVIDADE E O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM

3.1 Ensinar e aprender: as duas faces da educação

Ensinar vem do latim insignare, que significa “marcar com um sinal”,

atuar na construção do significado do que fazemos. Tudo o que fazemos,

precisamos fazer com sentido, tudo o que estudamos tem que ter sentido.

O ensinar é conceituado, de uma forma geral, como o ato que

consiste na transmissão de conhecimento. Transmissão que supõe,

necessariamente, um sujeito, o professor, que toma para si a função de ensinar

a um outro sujeito, o aprendiz. O conhecimento, por sua vez, enquanto produto

da história e da cultura, consideradas nos seus aspectos materiais e

simbólicos, pode ser definido como “a organização operatória de um código,

isto é, as regras pelas quais se pode gerar significado” (Pain, 1991b, p.80).

Assim compreendido, o conhecimento não pode ser transmitido de uma só vez

e sua transmissão não se dá no vácuo, ou seja, na ausência do outro.

Pain (1991b) refere que “não há, propriamente falando, auto-

aprendizagem, pois as estruturas mentais não atuam no vazio” (p.80). Segundo

ainda a autora, mesmo nos casos de autodidatismo, em que o aprendiz se

transforma em seu próprio mestre, encontraremos, na base dessa atitude, um

processo de identificação com um outro, que se torna modelo permanente de

possíveis intercâmbios cognoscitivos e ao qual o sujeito se referencia para

legitimar as aprendizagens aprendidas por essa via.

O conhecimento constitui, portanto, os conteúdos concretos e mais

variados que serão transmitidos na relação ensino-aprendizagem. É através

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desta relação que o aprendiz, usando uma série de estruturas cognitivas, e

mobilizando afetos e desejo, se apropriará do conteúdo ensinado,

transformando-o e sendo capaz de reproduzí-lo enquanto conhecimento

elaborado.

Para Fernández (1991) “o conhecimento é conhecimento do outro,

porque o outro o possui, mas também porque é preciso conhecer o outro, quer

dizer, pô-lo no lugar do professor (...) e conhecê-lo como tal. Não aprendemos

de qualquer um, aprendemos daquele a quem outorgamos confiança e direito

de ensinar” (p.52).

A aprendizagem é concebida por Pain (1991b) como processo de

transmissão de conhecimento, na qual se localizam dois pólos, entre os quais

se produz a transferência de saber. Um dos pólos é constituído pela instância

daquele que sabe, isto é, o outro conhecimento, e o segundo pólo pela

instância do sujeito do conhecimento, que se torna sujeito justamente devido à

transmissão, ou seja, na medida em que se instaura a sujeição a uma cultura.

Nesta concepção, ensinar e aprender constituem um único processo

inter-ativo, pois não há ensino sem transmissão de conhecimento a um outro,

assim como não há aprendizagem sem aquele que é reconhecido como

detentor de um determinado saber. É na relação que se instaura entre os dois

pólos que se compreende, de forma mais clara, porque “o conhecimento é o

conhecimento do outro” (Pain, 1991b; Fernández, 1991).

A aprendizagem, neste sentido, é tanto um processo quanto uma

função. Processo enquanto transmissão (e apropriação) de conhecimento, e

função cuja finalidade é permitir que alguém se torne sujeito, justamente

através da aprendizagem: sujeito humano, inserido na cultura.

A relação que caracteriza o ensinar e o aprender é sempre vincular e

ocorre, inicialmente, no seio da família para, progressivamente, estender-se ao

meio social.

Enveredar pelos caminhos da Educação estabelece muito mais do

que formação acadêmica, domínio de conteúdo para repassar subsídios e

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agilidade para gerenciar conflitos... É imprescindível preceitos para transitar

pelas veredas do “ensinar e aprender” sem lesar, provocar danos aos que

buscam o saber como caminho das conquistas e necessitam de orientação,

apoio, incentivo... Pois o conhecimento é um farol que atrai sentidos e

ambições, mas se ofusca com informações, teores ou formas de aplicação que

não auxiliam no desenvolvimento humano.

Mesmo com tantas alertas, o sistema de ensino insiste em ostentar

problemas por deficiência de alternativas para sanar dificuldades históricas,

entre elas, como injetar a dose dos ingredientes para montar a fórmula que

promova o ensino-aprendizagem.

O fato é que a maioria dos “fazedores de Educação” parte para a

batalha desprovida do kit compromisso, pois o ofício de ensinar determina

evolução constante ─ aprendizagem contínua de quem trabalha com o

imprevisível ─ e isso impõe competências para atender aos anseios dos que

buscam auxílio.

E, mesmo com a consciência de que ensinar não deve sobrepujar ao

prazer de aprender, pois ensino sem aprendizagem é um caminho sem

horizontes definidos, muito pouco se tem feito para transformar esse cenário.

O reflexo daqueles que admitem que necessitam aprender para

ensinar é a diferença que distingue os grandes educadores, exatamente por

aceitarem o desafio de ensinar com a consciência de que é preciso superar o

comodismo e desafiar o decreto: “O que sei é o bastante para regar a vida de

quem tem sede de novo”.

Ensinar é ter um olhar diferenciado, no qual todo um acervo de

influências é posto em xeque, desde a origem familiar ao apoio, ao incentivo e

à desenvoltura para fazer o envolvimento da família no processo educacional,

que é o identificador educacional, a base do contexto social, emocional e

intelectual do aluno.

Se educadores e o sistema não almejarem como meta da Educação

despertar no aluno a paixão de aprender como perspectiva de crescimento

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humano, de nada adiantará os investimentos em infraestrutura física,

tecnologia, material didático... Pois a escola continuará a se um espaço sem

emoção, sem encantos para despertar a paixão que atrai os sequiosos de

aprender e ensinar.

Por que em outras áreas ─ como Saúde ─ os profissionais se

preocupam em fazer um trabalho que não afete a imagem profissional, pois os

erros são punidos, na maioria das vezes, com severidade, e na Educação não

ocorre o mesmo?

Apesar do processo de avaliação do profissional da Educação que

expõe qualidades, dificuldades e problemas, muitos não se preocupam com

críticas, pois uma barreira denominada lei, que proporciona a estabilidade, os

ampara. E, com isso, comprometem o aprendizado, mesmo conscientes de que

para ensinar bem é preciso estudar muito.

Há uma necessidade urgente de (re)avaliar as tendências

educacionais para gerar alternativas que (re)despertem a paixão de ensinar,

fazendo com que a sala de aula se torne um ambiente atraente para o aluno e

prazeroso para o professor.

Contudo, diante de tantos percalços, o sistema tropeça nas

dificuldades para agir e perde força, autonomia para exigir metas e resultados

dos “fazedores da Educação” e para exigir que os professores, coordenadores,

gestores, governo e pais entendam que informação é uma bagagem que deve

ser transformada em conhecimento para promover o desenvolvimento humano.

A mente da criança é um universo que absorve tudo à sua volta, um

terreno fértil. Se os responsáveis pela sua formação não depositarem uma

semente de qualidade, as ervas daninhas dos problemas sociais, familiares e

educacionais a transformarão em devoradores de valores.

O retardamento do cultivo da semente da paixão por ensinar, em

mentes cada vez mais produtivas pode intensificar os problemas da Educação,

que resiste em ensaiar o primeiro passo para encontrar a saída, como o

indicado pelo mestre Rubem Alves: “O nascimento do pensamento é igual ao

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nascimento de uma criança: tudo começa com um ato de amor. Uma

semente há de ser depositada no ventre vazio. E a semente do pensamento é

o sonho. Por isso os educadores, antes de serem especialistas em ferramentas

do saber, deveriam ser especialistas em ferramentas do amor: intérpretes de

sonhos”. É preciso que o sistema de ensino assuma posturas enérgicas, como

cobrança de resultados do corpo docente para que se entreveja a diferença

entre professor e educador. Professor é o que vai à escola, cumpre horário,

aplica os conteúdos, mas sem se dar ao luxo de olhar para o seu aluno; e o

educador abnegado é o que se doa para seu aluno desenvolver competências,

crescer como humano e se tornar cada vez mais independente como pessoa.

Não carecemos de professores que apenas ensinem o ABC, a

formar sílabas, palavras... A ler para decifrar os códigos do

mundo...Precisamos de educadores que despertem a paixão de aprender dos

seus alunos com aulas dinâmicas, prazerosas... Educadores que estudem para

melhorar a prática; investiguem para descobrir novas formas de ensinar nesse

manancial de informações que se tornou a sala de aula, provocada pelo mundo

globalizado.

O conceito psicanalítico de transferência pode nos auxiliar na

compreensão de como o desejo se faz presente na relação ensinar-aprender.

É no relato de Fragmento da análise de um caso de histeria, o

famoso caso Dora, que Freud (1901) passou a conceber a transferência como

uma exigência indispensável da técnica analítica. Neste texto, Freud define a

transferência como “reedições, reproduções das moções e fantasias que,

durante o avanço da análise, soem despertar-se e tornar-se conscientes, mas

com a característica (própria do gênero) de substituir uma pessoa anterior pela

pessoa do médico. Dito de outra maneira: toda uma série de experiências

psíquicas é revivida, não como algo passado, mas como um vínculo atual com

a pessoa do médico” (Freud, 1901, Ed. St. Br., 1989,p.110).

Freud descobre, com a análise de Dora, que a transferência,

enquanto manifestação do incosciente, e, até então, percebida como

“destinada a constituir o maior obstáculo à psicanálise, converte-se em sua

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mais poderosa aliada quando se consegue detectá-la a cada surgimento e

traduzí-la para o paciente” (Freud, 1901, Ed, St. Br., pp. 111-112).

A transferência, entretanto, não ocorre apenas na relação paciente-

analista; trata-se de um fenômeno que permeia qualquer relação humana,

embora, na análise, ela assuma características singulares.

Podemos pensar, então, na relação transferencial que ocorre no

campo das relações professor-aluno como será abordado no próximo item.

3.2 A relação professor-aluno

As relações humanas, embora complexas, são peças fundamentais

na realização comportamental e profissional de um indivíduo. Desta forma, a

análise dos relacionamentos entre professor/aluno envolve interesses e

intenções, sendo esta interação o expoente das consequências, pois a

educação é uma das fontes mais importantes do desenvolvimento

comportamental e agregação de valores nos membros da espécie humana.

Vygotsky (1994), ao destacar a importância das interações sociais,

traz a ideia da mediação e da internalização como aspectos fundamentais para

a aprendizagem, defendendo que a construção do conhecimento ocorre a partir

de um intenso processo de interação entre as pessoas. Portanto, é a partir de

sua inserção na cultura que a criança, através da interação social com as

pessoas que a rodeiam, vai se desenvolvendo. Apropriando-se das práticas

culturalmente estabelecidas, ela vai evoluindo das formas elementares de

pensamento para formas mais abstratas, que a ajudarão a conhecer e controlar

a realidade. Nesse sentido, Vygotsky destaca a importância do outro não só no

processo de construção do conhecimento, mas também de constituição do

próprio sujeito e de suas formas de agir.

Segundo o autor, o processo de internalização envolve uma série de

transformações que colocam em relação o social e o individual. Afirma que

“todas as funções no desenvolvimento da criança aparecem duas vezes:

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primeiro, no nível social, e, depois no nível individual; primeiro entre as

pessoas (interpsicológica), e, depois, no interior da criança (intrapsicológica).”

(p.75).

Partindo desse pressuposto, o papel do outro no processo de

aprendizagem torna-se fundamental. Consequentemente, a mediação e a

qualidade das interações sociais ganham destaque.

Smolka e Góes (1995), ao se referirem à ideia de mediação,

representam-na como uma relação sujeito-sujeito-objeto. “Isto significa dizer

que é através de outros que o sujeito estabelece relações com objetos de

conhecimento, ou seja, que a elaboração cognitiva se funda na relação com o

outro” (p.9).

Pino (1997), ao discorrer sobre os processos cognitivos, defende

que o conhecer humano é uma atividade que pressupõe uma relação que

“envolve três elementos, não apenas dois: o sujeito que conhece, a coisa a

conhecer e o elemento mediador que torna possível o conhecimento” (p.6).

Afirma que

“embora a atividade de conhecer pressuponha a existência no sujeito de determinadas propriedades que o habilitam a captar as características dos objetos, há fortes razões para pensar que o ato de conhecer não é obra exclusiva nem do sujeito, nem do objeto, nem mesmo da interação [direta], mas da ação do elemento mediador, sem o qual não existe nem sujeito nem objeto de conhecimento” (idem,p.2).

De maneira semelhante, Klein (1996) defende que o objeto do

conhecimento não existe fora das relações humanas. “De fato, para chegar ao

objeto, é necessário que o sujeito entre em relação com outros sujeitos que

estão, pela função social que lhe atribuem, constituindo esse objeto enquanto

tal” (p. 94). Nesse sentido, são as relações humanas que formam a essência

do objeto de conhecimento, pois este só existe a partir de seu uso social.

Portanto, é a partir de um intenso processo de interação com o meio social,

através da mediação feita pelo outro, que se dá a apropriação dos objetos

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culturais. É através dessa mediação que o objeto de conhecimento ganha

significado e sentido.

Na verdade, são as experiências vivenciadas com outras pessoas é

que irão marcar e conferir aos objetos um sentido afetivo, determinando, dessa

forma, a qualidade do objeto internalizado. Nesse sentido, pode-se supor que,

no processo de internalização, estão envolvidos não só os aspectos cognitivos,

mas também os afetivos.

A escola, por ser o primeiro agente socializador fora do círculo

familiar da criança, torna-se a base da aprendizagem quando oferece

condições necessárias para que ela se sinta segura e protegida. Portanto, é

indispensável a presença de um educador que tenha consciência de sua

importância não apenas como um mero reprodutor da realidade e sim, como

um agente com uma visão sócio-crítica da realidade.

Para que a criança tenha um desenvolvimento saudável e adequado

dentro do ambiente escolar, e consequentemente no social, é necessário que

haja um estabelecimento de relações interpessoais positivas, possibilitando

assim o sucesso dos objetivos educativos.

Hoje em dia é assim: “eu preciso”, “eu quero”, “eu vou”. Cada vez

mais a sociedade estimula as crianças e adolescentes a terem atitudes

individualistas, que passam bem longe da reflexão e da responsabilidade com

o próximo. O jovem só se sensibiliza quando se sente parte de um grupo ─ a

família, a turma da escola, a sociedade ─ e entende que, em cada um deles,

sua presença e sua contribuição são importantes.

Como e escola proporciona isso? Oferecendo ao aluno o direito de

ser ouvido e compreendido. Os professores que trabalham dessa maneira dão

ao estudante caminhos para reconhecer seus sentimentos, desde pequeno.

Daí para que ele se torne responsável por suas atitudes é um pulo. Para criar

esse ambiente acolhedor, é necessário entender o que é afetividade e por

que ela é fundamental na formação de pessoas felizes, éticas, seguras e

capazes de conviver com os outros e com o planeta.

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Quando a criança percebe que o professor gosta dela e que

demonstra certas qualidades como paciência, dedicação, vontade de ajudar e

atitude democrática, a aprendizagem torna-se mais facilitada. Ao perceber os

gostos da criança, o professor deve aproveitar ao máximo suas aptidões e

estimulá-la para o ensino. Já o autoritarismo, inimizade e desinteresse podem

levar o aluno a perder a motivação e o interesse por aprender, já que estes

sentimentos são consequentes da antipatia por parte dos educandos, que por

fim associarão o professor à disciplina, e reagirão negativamente a ambos.

Segundo Saltini:

(...) o educador serve de continente para a criança. Poderíamos dizer, portanto, que o continente é o espaço onde podemos depositar nossas pequenas construções e onde elas tomam um sentido, um peso e um respeito, enfim, onde elas são acolhidas e valorizadas, tal qual um útero acolhe um embrião. (SALTINI 1997, p.89).

O trabalho do professor em sala de aula, seu relacionamento com os

alunos é expresso pela relação que ele tem com a sociedade e com a cultura.

ABREU & MASETTO (1990: 115), afirma que “é o modo de agir do professor

em sala de aula, mais do que suas características de personalidade que

colabora para uma adequada aprendizagem dos alunos; fundamenta-se numa

determinada concepção do papel do professor, que por sua vez reflete valores

e padrões da sociedade”.

Segundo FREIRE (1996: 96), “o bom professor é o que consegue,

enquanto fala, trazer o aluno até a intimidade do movimento do seu

pensamento. Sua aula é assim um desafio e não uma cantiga de ninar. Seus

alunos cansam, não dormem. Cansam porque acompanham as idas e vindas

de seu pensamento, surpreendem suas pausas, suas dúvidas, suas

incertezas”.

Ainda segundo o autor, “o professor autoritário, o professor

licencioso, o professor competente, sério, o professor incompetente,

irresponsável, o professor amoroso da vida e das gentes, o professor mal-

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amado, sempre com raiva do mundo e das pessoas, frio, burocrático,

racionalista, nenhum deles passa pelos alunos sem deixar sua marca”.

A escola recebe crianças com auto-estima baixa, tristeza,

dificuldades em aprender ou em se entrosar com os colegas e as rotula de

bagunceiras, sem limites ou sem educação. Por isso, seria ótimo manter um

diálogo com a criança, em que se possa perceber o que está acontecendo,

usando tanto o silêncio quanto o corpo, abraçando-a e beijando-a se ela

permitir. É interessante também, utilizar as situações de agressividade e

violência para conversar sobre elas e tentar encontrar soluções. Enfim, dar

oportunidade para os educandos colocarem seus sentimentos na escola, não

apenas sua inteligência ou sua capacidade de aprender.

Também o tratamento imparcial para com todos os alunos precisa

ser sempre mantido e explicitado, e nenhuma criança deve ter a percepção de

ser perseguida ou amada em demasia. É preciso observar, que a opinião de

cada criança tem o mesmo respeito e valor, sem fazer comparações ou

desprezar uma ou outra nem salientar diferenças entre meninos e meninas em

brincadeiras ou jogos, porque isto seria prejudicial ao desenvolvimento afetivo

sadio.

É preciso encorajar a criança a descobrir e inventar, sem ensinar ou

dar conceitos prontos. A resposta pronta só deve ser dada quando a pergunta

da criança focaliza um ato arbitrário (funções do objeto cotidiano). Manter – se

atento ao desenvolvimento e as descobertas que as crianças vão fazendo,

dando-lhes possibilidades para isso.

É mais importante dar inventivo à pergunta do que à resposta,

buscando no grupo a resposta o professor poderá sistematizar e coordenar as

ideias emergentes. “A relação que se estabelece com o grupo como um todo e

a pessoal com cada criança é diferenciada em todos os seus aspectos

quantitativos e cognitivos respeitando-se a maturidade de seu pensamento e a

individualidade”. Saltini também menciona a questão da manutenção da

serenidade por parte do educador e da criança:

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A serenidade e a paciência do educador, mesmo em situações difíceis faz parte da paz que a criança necessita. Observar a ansiedade, a perda de controle e a instabilidade de humor, vai assegurar à criança ser o continente de seus próprios conflitos e raivas, sem explodir, elaborando-os sozinha ou em conjunto com o educador. A serenidade faz parte do conjunto de sensações e percepções que garantem a elaboração de nossas raivas e conflitos. Ela conduz ao conhecimento do si-mesmo, tanto do educador quando da criança. ( SALTINI, 1997, p. 91).

Acreditar no estudante é uma forma de ajudá-lo a crescer. O modo

como os professores enxergam a criança é muito importante para o sucesso da

aprendizagem, quando não julgam e procuram se aproximar do educando,

observam seu comportamento e incentivam suas capacidades, ele tem tudo

para crescer.

Respeitar, ouvir e orientar funciona tanto quanto o elogio. O cuidado

com o educando vai muito além de dar um beijo, elogiar e acarinhar. Muitas

vezes o afeto é demonstrado de forma contrária: quando o professor é rígido.

Se ele é justo e chama a atenção de forma respeitosa, o estudante passa a

respeitá-lo e admirá-lo.

Logo, a relação entre professor e aluno depende,

fundamentalmente, do clima estabelecido pelo professor, da relação empática

com seus alunos, de sua capacidade de ouvir, refletir e discutir o nível de

compreensão dos alunos e da criação das pontes entre o seu conhecimento e

o deles. Indica também, que o professor, educador da era industrial, com raras

exceções, deve buscar educar para as mudanças, para a autonomia, para a

liberdade possível numa abordagem global, trabalhando o lado positivo dos

alunos e para a formação de um cidadão consciente de seus deveres e de

suas responsabilidades sociais.

3.3 Afeto: a solução para a aprendizagem

Torna-se fundamental, nesse cenário social, que os aprendizes

desenvolvam noções claras de sua personalidade, seus objetivos, suas

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possibilidades, sua história e as qualidades das relações que estabelece. A

partir desse conhecimento é que as relações afetivas tomam um cenário de

importância, pois será através dela que a vinculação com o ato de aprender,

em meio a diversidade, pode viabilizar as aprendizagens necessárias para que

os aprendizes façam boas escolhas nesses tempos de incertezas e diferenças.

A proposta curricular das escolas prioriza o aspecto cognitivo dos

alunos, deixando de lado o afetivo. É como se dividi-se o aluno em duas

partes: afetiva e cognitiva. Esta ignora que se não houver afetividade no

cotidiano escolar, com certeza o educando não se sentirá valorizado e

respeitado e a tendência é que ignore o que lhe é proposto.

A ênfase nos fatores emocionais influenciou o modo como

pensamos os fins da educação, ampliando muito a função da escola. Desta,

espera-se cada vez mais que promova também o desenvolvimento afetivo e

moral de crianças e jovens.

Uma frase de Paulo Freire mobiliza a novas reflexões:

Como prática estritamente humana jamais pude entender a educação como experiência fria, sem alma, em que os sentimentos e as emoções, os desejos, os sonhos devessem ser reprimidos por uma espécie de ditadura racionalista. Nem tampouco jamais compreendi a prática educativa como uma experiência a que faltasse rigor em que se gera a necessária disciplina intelectual (1996,p.146).

Mas, é preciso ter bom senso, pois a escola pode colaborar para

formar pessoas de bem, mas não fará isso sozinha.

Sua maior contribuição sera criar oportunidades de aprendizagens

que ajudem na constituição de uma auto-estima positiva. Pois enfrentar

sentimentos não é fácil para ninguém, mas vale dizer que os sentimentos e

emoções do educando precisam ser levados em conta, já que podem favorecer

ou desfavorecer o desenvolvimento cognitivo, por isso trabalhar as emoções é

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importante e necessário como compromisso pedagógico de uma instituição

que se preocupa com o desenvolvimento integral dos educandos.

Os educadores, precisam estar atentos ao fato de que, enquanto

não derem atenção ao fator afetivo na relação educador-educando, correrão o

risco de estarem só trabalhando com a constituição do real, do conhecimento,

deixando de lado o trabalho da constituição do próprio sujeito que envolve

valores e o próprio caráter, necessário para o seu desenvolvimento integral.

A relação entre inteligência e afetividade, razão e emoção no

desenvolvimento do aluno e no contexto da educação estão inteiramente

ligadas ao desempenho escolar. Pois o desenvolvimento é um processo

contínuo e a afetividade tem um papel imprescindível nesse processo de

desenvolvimento do aluno, no entanto, o meio deve proporcionar relações de

afetividade.

Uma vez que a ausência de uma educação que aborde a emoção

tanto na sala de aula quanto na família traz prejuízos que não poderão ser

corrigidos pela ação pedagógica resultando em grandes dificuldades de

aprendizagens por parte do aluno.

Cabendo aos pais e aos professores construírem com o papel de

afetividade no desenvolvimento da criança, onde sejam trabalhadas as

emoções de forma prazerosa, pois o resultado do trabalho com essas emoções

pode resultar em grandes aprendizagens significativas, seja ela em casa ou na

escola.

Para Bossa (2000,p.18): “Sabemos que o sentido da aprendizagem

é único e particular na vida de cada um, e que inúmeros são os fatores afetivos

emocionais que podem impedir o investimento energético necessário às

aquisições escolares.”

Mas existem dois fatores principais que interferem na aprendizagem,

impossibilitando o fluxo normal do processo de aprender: Primeiro são os

fatores internos de ordem orgânico ou psicológico (devemos analisar a história

da criança, incluindo a avaliação de sua estrutura familiar, para que se possa

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identificar como a aprendizagem é significada por este grupo). E o segundo

são os fatores externos ligados à metodologia de ensino, às condições sócio-

econômicas e ainda aos recursos do educador.

A dificuldade de aprendizagem é resultante de conflitos que se

encontram diretamente relacionado à metodologia pedagógica, ao sistema de

ensino e, ainda, ao vínculo que o sujeito estabelece com a escola, bem como

com os professores, pais e sociedade.

Assim o afeto explica a aceleração ou retardamento da formação

das estruturas; aceleração no caso de interesse e necessidade do aluno,

retardamento quando a situação afetiva é obstáculo para o desenvolvimento

intelectual da criança.

A afetividade, nas diferentes concepções teóricas expostas neste

trabalho, desempenha uma função indispensável e indissociável das diferentes

tarefas e atividades desenvolvidas pelo ser humano.

Se os afetos, as emoções, têm íntima ligação com a inteligência e

vice-versa, e se o ato de ensinar-aprender ocorre num processo relacional,

vincular, necessariamente, essa relação terá de levar em consideração toda a

variada gama de expressões dos afetos e das emoções, presentes na relação

professor-aluno e, consequentemente, na transmissão e apropriação do

conhecimento.

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CONCLUSÃO

O presente trabalho procurou apresentar a afetividade como fator

influente no processo de ensino-aprendizagem e condição imprescindível para

o desenvolvimento do estudante.

Fundamenta-se nas teorias de Piaget, Vygotsky, Wallon, Freud entre

outros. Tem por objetivo fazer com que o professor entenda a necessidade de

se estabelecer vínculo com o aluno e entender as diversas atitudes e

comportamentos deles em sala de aula.

Vale ressaltar que a escola deve enfatizar as questões como a

interação social e o desenvolvimento afetivo, como elementos fundamentais no

processo de construção de pensamento, durante o processo de ensino-

aprendizagem.

A qualidade da relação professor-aluno deve ser entendida como

uma relação humana didática com os alunos. O professor não vai à sala de

aula dar beijinhos ou fazer carinho nos alunos e sim para ajudá-los a prender e

para que essa dinâmica aconteça, a afetividade é fundamental. Ela faz com

que os professores busquem mudanças no campo pedagógico, metodológico e

social, portanto, a aprendizagem começa pela área afetiva para se consolidar

na cognitiva, onde a forma de ensinar muda a relação professor-aluno, no qual

as emoções são a exteriorização da afetividade que provocam modificações

durante o processo educacional.

Sendo assim, como parte da humanidade e de um sistema muito

maior, penso na afetividade e nas emoções decorrentes no processo de

aprender ou não aprender como parte, que como toda parte, é indispensável à

composição de um todo.

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Considerando que as emoções são contagiosas, e até epidêmicas,

podemos encerrar desejando que tanto pais e professores se sentissem mais

emocionados para a tarefa de educar, que por sinal é um ato de amor.

Fica aqui uma reflexão que está em 1 Coríntios 13:4-8:

O amor é paciente, é benigno; o amor não arde em ciúmes, não se ufana, não se ensoberbece, não se conduz inconvenientemente, não procura os seus próprios interesses, não se exaspera, não se ressente do mal; não se alegra com a injustiça, mas regozija-se com a verdade; tudo sofre, tudo crê, tudo espera, tudo suporta. O amor jamais acaba.

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BIBLIOGRAFIA

ALMEIDA, A. R. S. A emoção em sala de aula.Campinas- Papirus, 1999.

CUNHA, Antonio Eugênio. Afeto e aprendizagem: relação de amorosidade e saber na prática pedagógica. Rio de Janeiro- Wak , 2010.

DANTAS, H. Afetividade e construção do sujeito na psicogenética de Wallon, em La Taille, Y., Dantas, H., Oliveira, M. K. Piaget, Vygotsky e Wallon: teorias psicogenéticas em discussão. São Paulo- Summus Editorial, 1992.

GARCIA-ROZA, Luiz Alfredo. Freud e o inconsciente. Rio de Janeiro- Jorge Zahar, 2009.

ROSSINI, Maria Augusta S. Pedagogia afetiva. Rio de Janeiro- Vozes, 2008.

SALTINI, Claudio J. P. Afetividade e inteligência. Rio de Janeiro- DPA, 1997.

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ÍNDICE

AGRADECIMENTOS 3

DEDICATÓRIA 4

RESUMO 5

METODOLOGIA 6

SUMÁRIO 7

INTRODUÇÃO 8

CAPITÚLO 1 10

A AFETIVIDADE 10

1.1 O que é afeto? 10

1.2 A concepção de Piaget sobre afetividade 13

1.3 A concepção de Vygotsky sobre afetividade 15

1.4 A concepção de Wallon sobre afetividade 17

1.5 A concepção de Freud sobre afetividade 20

CAPÍTULO 2 22

A AFETIVIDADE NO PROCESSO COGNITIVO 22

2.1 Definindo cognição 22

2.2 Afeto e cognição na educação 26

CAPÍTULO 3 32

A AFETIVIDADE E O PROCESSO DE ENSINO-APRENDIZAGEM 32

3.1 Ensinar e aprender: as duas faces da educação 32

3.2 A relação professor-aluno 37

3.3 Afeto: a solução para a aprendizagem 42

CONCLUSÃO 46

BIBLIOGRAFIA 48

ÍNDICE 49