A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

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Fundação Getúlio Vargas Escola Brasileira de Administração Pública e de Empresas Centro de Formação Acadêmica e Pesquisa Mestrado Executivo DISSERTAÇÃO APRESENTADA POR Gustavo Guberman de Andrade TÍTULO A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro: uma análise do sistema. Professor Orientador Acadêmico: Prof. Dr. Marcelo Milano Falcão Vieira Rio de Janeiro – RJ 2003

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Fundação Getúlio VargasEscola Brasileira de Administração Pública e de Empresas

Centro de Formação Acadêmica e PesquisaMestrado Executivo

DISSERTAÇÃO APRESENTADA POR

Gustavo Guberman de Andrade

TÍTULO

A Avaliação de Desempenho Humano no ExércitoBrasileiro: uma análise do sistema.

Professor Orientador Acadêmico: Prof. Dr. Marcelo Milano FalcãoVieira

Rio de Janeiro – RJ2003

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Andrade, Gustavo Guberman de.

A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro: uma análise do

sistema. Rio de Janeiro: FGV/EBAPE, 2003.

183 p.

Dissertação (Mestrado) – Fundação Getulio Vargas, Escola Brasileira de

Administração Pública e de Empresas, 2003.

1. Avaliação de Desempenho. 2. Gestão de Pessoas. 3. Exército Brasileiro.

4. Tese (Mestrado – FGV/EBAPE). I. Título.

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Dedico este trabalho aos meus pais,

Osvaldo e Ida, eternos exemplos de

dedicação e devoção aos filhos, responsáveis

maiores por todos os meus sucessos, a quem

devo não somente a vida, mas o aprender a

trilhá-la de forma honrada, justa e

significativa; à minha irmã Cristiane, fonte de

eterna alegria e orgulho para meu coração; ao

meu irmão Flavio, amigo em todos os

momentos; e em especial memória aos

Mártires do Holocausto.

“Now and forever, in memory of those who

rebelled in the camps and ghettoes, fought in

the woods, in the underground and with the

allied forces, who braved their way to Eretz

Israel and those who died, sanctifying the

name of God”.

(Inscrição nos jardins do Museu Yad

Vashem, Jerusalém – Israel).

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AGRADECIMENTOS:

Nem mesmo a mais magnífica obra de arte tem em seu autor o únicoresponsável pela criação. O que se falar então de um trabalho acadêmico depesquisa? Muitos foram aqueles cujas contribuições foram fundamentais para aelaboração deste, aos quais estendo os mais sinceros votos de gratidão.

Ao meu orientador, o Prof. Dr. Marcelo Milano Falcão Vieira, que de formapaciente e diligente, guiou-me de forma sempre sábia a cada passo dado nestalonga e tortuosa jornada que é a Dissertação, confiando e acreditando em meutrabalho e incentivando-me sempre, tornando a convivência motivo de satisfaçãoprofissional e pessoal.

Aos Maj Cunha e Cap Silvia, ambos do Centro de Estudo de Pessoal doExército, pela forma como me receberam, franqueando-me acesso a todas asinformações do Projeto AVALOP, permitindo-me, inclusive, participar de reuniões domesmo. Sem este auxílio, o trabalho certamente perderia muito em seu conteúdo.

Em nossas vidas somos expostos a alguns exemplos que não simplesmentenos transmitem informações valiosas, mas tornam-se verdadeiros moldes paranossa vida. A Profª Drª Carmen Migueles, com toda sua sabedoria, correção edisposição em ajudar, ensinou-me muito mais que o conteúdo de livros e teorias,deu-me um exemplo grandioso e nobre de profissional, amiga e ser humano, a quemtenho o imenso orgulho, e honra ainda maior, de reverenciar como mestre.

Ao grande amigo Anderson Araújo de Carvalho, que não mediu esforços paraauxiliar-me nas mais diversas tarefas, com quem contraio inestimável dívida por estetrabalho.

Aos companheiros de jornadas acadêmicas, Kiyoshi Komamura e Rogério deMatos Dias, que, na diversidade das nossas convivências, ensinaram-me o quantoela é valiosa. Certamente, um pouco de cada um deles se encontra em cada páginadesta dissertação.

À querida amiga Sônia Regina Barone e ao mui caro amigo Flávio Alcoforado,por terem me proporcionado o apoio necessário e fundamental para que, nummomento tão atribulado de minha vida, eu tivesse a tranqüilidade necessária paracontinuar e concluir esta tarefa.

Ao ilustre amigo Fábio Barcellos de Melo, presente com seu apoioincondicional e suas fundamentais palavras de incentivo em todos os momentos.

Aos demais colegas da turma do mestrado, que nestes dois anos deconvivência, muito me honraram com o tanto que ensinaram, sendo tambémresponsáveis por agradáveis momentos vividos juntos.

Aos Bibliotecários da FGV e da COPPEAD/UFRJ, que prestaram fundamentalauxílio em minhas pesquisas.

E, acima de tudo, a D’us. Durante o transcurso da longa estrada da vida, Elenos brinda com a dificuldade, e por ela agradecemos a Sua confiança na nossacapacidade de vencê-la; nos apresenta as vitórias, que nos fazem refletir sobre onosso merecimento; e dá à nossa existência um sentido único e os momentos epessoas de que precisamos para fazermos da felicidade um caminho significativo,jamais um destino inalcançável.

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RESUMO

O objetivo do presente estudo é o de analisar a atual sistemática de Avaliação de

Desempenho utilizada pelo Exército Brasileiro, de forma a se identificar as suas

características que a impedem de cumprir os propósitos e objetivos aos quais ela se

propõe. Para tal, é utilizado o referencial teórico não somente relacionado à

Avaliação de Desempenho em si, mas também aquele que diz respeito a assuntos

que mantenham relação com ela. A despeito das formas múltiplas que a Avaliação

de Desempenho pode tomar, algumas características e coerências internas devem

ser observadas para que o sistema possa funcionar corretamente. Além disso, não

se pode esquecer que, como um instrumento, a avaliação será fortemente

influenciada pela cultura da organização em que é utilizada, a qual, por sua vez, não

se encontra isolada da sociedade em que a organização opera. Ao trazer todas

estas premissas para análise do sistema utilizado pelo Exército Brasileiro, uma série

de problemas emergem, destacando-se: a presença de objetivos de natureza

antagônica; falta de ligação com a estratégia da organização; falta de mecanismos

para operacionalizar os objetivos; avaliação utilizada como instrumento de coação,

na tentativa de manter o sistema de dominação que passa a ser contestado; adoção

de um método de avaliação que reforça a utilização coercitiva dela e que não

propicia uma visão completa do avaliado; falta de etapas no processo de avaliação,

também implicando na falta da adoção de parâmetros para a avaliação, inserindo

grande subjetividade no sistema e fornecendo feedback insuficiente aos avaliados;

utilização de instrumento também de grande subjetividade e reducionista; e um

sistema de premiação que, além de replicar as distorções do sistema de avaliação,

acrescenta outras.

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ABSTRACT

This study aims to analyze the current systematics of Performance Appraisal used by

the Brazilian Army, in a way that permits us to identify its characteristics that hinder it

to fulfill the purposes and objectives to which it proposes. In order to do so, it is used

the theoretical referential not only related to Performance Appraisal itself, but also

that one that focus on the subjects related to it. In spite of the multiple forms

Performance Appraisal can take, some internal characteristics and coherences must

be observed so that the system can function correctly. Moreover, it can not be

forgotten that, as a tool, the appraisal will be strongly influenced by the organizational

culture where it is used. The organizational culture, in turn, does not find itself

isolated from the society in which the organization operates. When all these

characteristics are brought to the analyses of the system used by the Brazilian Army,

several of problems emerges, including: the presence of objectives of antagonistic

nature; the lack of linking with the organization strategy; the absence of mechanism

to operate the objectives; appraisal used as a coercion tool, in the attempt to keep

the domination system that begin to be contested; adoption of an appraisal method

which strengthens the coercitive use of it and that does not propitiate a complete

vision of the apprasee; the lack of steps on the appraisal process, including in the

absence of parameters adoption for the appraisal, inserting great subjectivity into the

system and supplying insufficient feedback to the appraisees; use of an instrument

also of great subjectivity and reductionist; and a awarding system that, besides

replying the distortions of the evaluation system, adds others.

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SUMÁRIO

1 INTRODUÇÃO .........................................................................................................71.1 Objetivos Geral e Específicos............................................................................91.2 Justificativas Teórica e Prática ........................................................................101.3 Estrutura do Trabalho ......................................................................................12

2 METODOLOGIA ....................................................................................................142.1 Perguntas de Pesquisa....................................................................................142.2 Definição de Termos........................................................................................152.3 Delineamento da Pesquisa ..............................................................................162.4 População e Amostra.......................................................................................172.5 Coleta e Análise de Dados ..............................................................................182.6 Limitações do Estudo.......................................................................................23

3 REFERENCIAL TEÓRICO.....................................................................................263.1 Propósitos e Objetivos da Avaliação de Desempenho ....................................263.2 Considerações Gerais sobre o Desempenho Humano....................................343.3 Métodos de Avaliação......................................................................................463.4 Etapas da Avaliação de Desempenho.............................................................503.5 Os Instrumentos de Avaliação .........................................................................593.6 Avaliação de Desempenho na Administração Pública.....................................683.7 Resultados de outras Pesquisas .....................................................................75

4 TRANSFORMAÇÕES SÓCIO-CULTURAIS DA SOCIEDADE E SUASIMPLICAÇÕES PARA O EXÉRCITO BRASILEIRO ................................................86

4.1 Considerações Iniciais .....................................................................................864.2 A Importância da contribuição das demais Ciências Sociais ...........................874.3 O Fenômeno Pós-Moderno .............................................................................914.4 Implicações da Pós-Modernidade para a Gestão das Organizações ..............954.5 Implicações da Pós-Modernidade para a Gestão no Exército Brasileiro .......106

5 SISTEMÁTICA DE AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO DO EXÉRCITOBRASILEIRO ..........................................................................................................138

5.1 Considerações Iniciais ...................................................................................1385.2 Propósitos e Objetivos...................................................................................1395.3 Método de Avaliação .....................................................................................1435.4 Etapas da Avaliação ......................................................................................1475.5 O Instrumento de Avaliação...........................................................................1515.6 O Sistema de Valorização do Mérito .............................................................1565.7 O Projeto AVALOP – Avaliação de Oficiais e Praças ....................................1595.8 Considerações Finais ....................................................................................165

6 CONCLUSÃO ......................................................................................................1676.1 Principais Resultados Encontrados ...............................................................1686.2 Conclusão......................................................................................................1726.3 Sugestões para Trabalhos Futuros................................................................174

7 REFERÊNCIAS....................................................................................................175

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1 INTRODUÇÃO

O trabalho é uma atividade que já faz parte do cotidiano do homem desde que

este iniciou sua luta pela sobrevivência. Entretanto, o que antes se resumia a

atividades simples, como a caça e a coleta de alimentos, foi se sofisticando e

ganhando uma complexidade crescente à medida que o próprio homem começou a

trilhar o caminho do desenvolvimento tecnológico.

Atualmente, o trabalho não só faz parte do cotidiano do homem, como

desempenha papel fundamental no seu desenvolvimento como pessoa. Além disso,

o trabalho diversificou-se e se especializou de tal maneira que ele passou a integrar

uma vasta e complexa rede de relações interdependentes.

Nesta rede, a sociedade também foi se transformando. Em certa medida,

influenciando nas transformações pelos quais o trabalho passou. Em outra, sendo

influenciada por estas mesmas transformações.

Tomando o trabalho, então, como essa vasta rede, pode-se inferir sobre a

necessidade de que cada componente funcione corretamente, a fim de que toda a

rede cumpra a sua finalidade (a de agora não só garantir a sobrevivência do homem,

mas também o seu desenvolvimento). Desta forma, ao longo dos tempos, surgiu a

necessidade de se avaliar o desempenho das organizações, para que se pudesse

garantir este bom funcionamento.

As organizações, então, por sua vez, passaram a sentir a necessidade de

avaliar o desempenho de seu pessoal, buscando desta forma, garantir o bom

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desempenho das mesmas em função do bom desempenho de seus integrantes.

Assim, surgiu a avaliação de desempenho.

O Exército Brasileiro, como Instituição cujas unidades integram a complexa rede

do trabalho, também sente a necessidade de buscar avaliar o desempenho do

pessoal integrante delas, tanto que possui uma sistemática para tal.

Todavia, assim como todas as técnicas e tecnologias, a sistemática adotada

pelo Exército é passível de críticas. Estas, por sua vez, descortinam o caminho para

o aperfeiçoamento e até novas descobertas que propiciem um passo maior no

caminho do desenvolvimento.

Este trabalho, então, tratará de abordar a avaliação de desempenho no Exército

Brasileiro.

A problemática analisada partiu da suspeita, confirmada durante a pesquisa, de

que o sistema de Avaliação de Desempenho seria ineficaz para atingir os objetivos e

propósitos os quais se propõe a atingir. E por trás desta incapacidade, encontram-se

uma série de aspectos cujos reflexos extrapolam o próprio sistema em si.

A título de exemplo, o Exército utiliza a avaliação para efeitos de comparação

entre dois indivíduos que foram avaliados por instrumentos iguais, mas de conteúdo

diferente. Este aspecto evidente, suscitou a suspeita supracitada e, quando melhor

examinada, trouxe à luz outros elementos até então insuspeitos.

Desta forma, para que se possa efetivamente analisar o sistema de Avaliação

de Desempenho do Exército Brasileiro, o problema apresentado a seguir é

suscitado:

Quais são as características da atual sistemática de Avaliação de Desempenho

do Exército Brasileiro que a impede de cumprir os propósitos e objetivos por ela

mesma determinados?

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Qualquer verdade pode ser comparada a um prédio, ela é construída sobre

alicerces que não estão totalmente à vista do espectador. Nestes, podem estar

escondidas muitas das causas ignoradas de fenômenos aparentes.

Por esta razão, o presente estudo se preocupa em ir além do que a análise pura

e simples do sistema de Avaliação de Desempenho poderia apresentar, para que,

inclusive, se obtenha uma explicação mais completa e fidedigna das razões daquilo

que é observado na concepção e prática do sistema.

1.1 Objetivos Geral e Específicos

Desta forma, tem-se então que o objetivo geral desta dissertação é o de

analisar a atual sistemática de Avaliação de Desempenho utilizada pelo

Exército Brasileiro, de forma a se identificar as suas características que a

impedem de cumprir os propósitos aos quais ela se propõe.

Para que o objetivo geral seja alcançado, será necessário que sejam atingidos

os seguintes objetivos intermediários:

- identificação dos propósitos e objetivos da sistemática de Avaliação de

Desempenho do Exército Brasileiro;

- análise dos propósitos e objetivos à luz da literatura sobre Avaliação de

Desempenho;

- verificação do grau de sintonia existente entre o sistema de Avaliação de

Desempenho e o tratamento dado ao elemento humano na gestão no Exército

Brasileiro;

- identificação do método e das etapas da sistemática de Avaliação de

Desempenho; e

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- análise da praxis destas etapas, incluindo o instrumento utilizado, visando

identificar em que medida elas colaboram para a consecução dos propósitos e

objetivos da sistemática.

1.2 Justificativas Teórica e Prática

As justificativas do estudo proposto podem ser vislumbradas sob duas óticas. A

ótica teórica e a prática.

Com o passar do tempo, a Administração mudou sua abordagem sobre as

pessoas, as quais deixaram de ser consideradas como meros ativos para inclui-las

nas questões de crescimento e desenvolvimento das organizações (Wagner III et

Hollenbeck, 1999).

Ainda segundo os autores supracitados (ibidem, p. 99), “as pessoas serão

motivadas ao desempenho de alto nível desde que percebam que a recepção de

resultados de valência alta depende de sólido desempenho pessoal”.

Assim, juntando as duas idéias apresentadas, pode-se perceber a importância

que vem sendo dada ao desempenho individual, bem como àquilo que

possivelmente o motiva.

Logo, um estudo cujo foco é numa sistemática que aborda justamente a questão

do desempenho individual, deve ser considerado como relevante.

Considerando ainda que

“a técnica nessa perspectiva [a de ser ato de transformação do mundo e ato de

transformação do sujeito] é então evolutiva, porque diz respeito à ordem humana e

não só à ordem natural, a única dotada de uma consciência historicizante” (Dejours,

1997, p. 37).

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Pode-se então ressaltar ainda mais esta importância, justamente porque o

estudo em questão buscará resultados que poderão contribuir para a evolução da

técnica ora em uso. Esta que, na verdade, está relacionada a aspectos muito mais

abrangentes e profundos com relação ao papel do ser humano no trabalho e ao

como tal papel é vivido e tratado pelas organizações.

Esta última assertiva remete, então, à importância do estudo sob o ponto de

vista prático.

Indo aos propósitos e objetivos do sistema de Avaliação de Desempenho do

Exército Brasileiro, tem-se, por exemplo, um propósito que aborda a questão do

aperfeiçoamento individual constante (Brasil, 2001a). Ora, tal aperfeiçoamento só

será possível, a priori, caso sejam conhecidos os pontos necessários e/ou possíveis

de aperfeiçoamento. Logo, tem-se também que tal conhecimento deverá advir do

resultado da Avaliação de Desempenho.

Desta forma, enquanto técnica na perspectiva apresentada anteriormente, a

sistemática de Avaliação de Desempenho do Exército Brasileiro também deve ser

evolutiva. Assim, o presente trabalho reveste-se desta importância, a de fornecer

subsídios para o aprimoramento da instrumentalidade do sistema em vigor.

Além disso, citando um outro propósito, a de fornecer subsídio para a

formulação de política de pessoal (idem), pode-se afirmar o seguinte. Simplificando,

pode-se dizer que a Avaliação de Desempenho não passa de um instrumento. Como

tal, por si só, não tem validade alguma. Ou seja, só se pode falar em avaliação

considerando-se a teia de relações na qual ela se insere. Então, de nada adianta

buscar o esmero técnico do instrumento se sua utilização, se todos os elementos

que também têm relação com o instrumento não forem avaliados sob a ótica do

esmero que se pretende alcançar. Em última instância, neste caso, pode-se

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identificar esta teia como sendo a da própria política de pessoal do Exército

Brasileiro.

Logo, ao se estudar a sistemática de Avaliação de Desempenho do Exército

Brasileiro, descortina-se como de grande relevância a oportunidade que se cria de,

com base nos resultados obtidos, estudar-se a própria política de pessoal em si.

Por fim, pode-se dizer ainda que a relevância prática do estudo pode ser medida

em cada propósito e objetivo da sistemática de Avaliação de Desempenho, haja

vista que ele vem justamente buscar identificar a lacuna existente entre o logos e a

praxis da sistemática em vigor.

1.3 Estrutura do Trabalho

Para que os objetivos da presente dissertação sejam atingidos, o mesmo foi

dividido em cinco capítulos, além do primeiro – a presente introdução, bem como

constam, ao final, as referências citadas no texto.

O segundo capítulo – Metodologia – apresenta a delineação da pesquisa e o

método escolhido para a coleta e análise de dados.

O terceiro capítulo – Referencial Teórico – busca, a partir da apresentação da

Avaliação de Desempenho sob a perspectiva da literatura que aborda o tema,

construir o referencial sob o qual o sistema utilizado pelo Exército Brasileiro será

analisado.

O quarto capítulo – Transformações Sócio-Culturais da Sociedade e suas

Implicações para o Exército Brasileiro – é encarregado de aprofundar as questões

relativas ao tratamento dado ao elemento humano na gestão no Exército, buscando

estabelecer as implicações para o sistema de Avaliação de Desempenho.

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O quinto capítulo – Sistemática de Avaliação de Desempenho do Exército

Brasileiro – apresenta a sistemática utilizada pelo Exército, buscando identificar as

suas falhas e/ou incongruências existentes.

Por fim, o sexto capítulo – Conclusão – apresenta os principais resultados

encontrados e conclui o estudo, além de apresentar sugestões de futuros trabalhos

a serem desenvolvidos.

Espera-se, desta forma, ter dado ao assunto o tratamento necessário para que

as questões pertinentes tenham sido devidamente esclarecidas.

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2 METODOLOGIA

Ao se conduzir qualquer pesquisa na qual o elemento humano é seu objeto, a

escolha da metodologia encerra particular dificuldade. Isso porque são tantos os

prismas sob os quais o homem tem sido estudado que a escolha de um menos

adequado pode fornecer somente parte da resposta que se procura.

Desta forma, optou-se pelo emprego da metodologia apresentada a seguir, a fim

de que as perguntas de pesquisa possam ser respondidas convenientemente,

possibilitando chegar à raiz do problema pesquisado.

2.1 Perguntas de Pesquisa

Ao se aplicar a metodologia escolhida, as seguintes perguntas de pesquisa são

respondidas:

- Quais são os propósitos e objetivos da sistemática de Avaliação de

Desempenho do Exército Brasileiro?

- Os propósitos e objetivos são coerentes com aquilo que a literatura apregoa

como sendo pertinentes a um sistema de Avaliação de Desempenho?

- Há sintonia entre o sistema de Avaliação de Desempenho e o tratamento dado

ao elemento humano na gestão no Exército Brasileiro?

- Qual o método e quais etapas constituem a sistemática de Avaliação de

Desempenho do Exército Brasileiro?

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- Em que medida o método, a prática das etapas identificadas, bem como o

instrumento utilizado, contribuem para a consecução dos propósitos e objetivos da

sistemática de Avaliação de Desempenho?

2.2 Definição de Termos

Avaliação de Desempenho

Definição Constitutiva – “pode ser definida como o processo pelo qual uma

organização mede a eficiência e a eficácia dos seus colaboradores” (Almeida, 1996,

p. 15). Complementando, “o instrumental que com maior precisão tem respondido à

necessidade de conhecimento da organização sobre si mesma” (Bergamini et

Beraldo, 1988, p. 32).

Definição Operacional – para efeitos de estudo de campo, é entendida como

sendo o processo específico do preenchimento da ficha de avaliação de

desempenho por parte do superior hierárquico, incluindo neste processo o

posicionamento do avaliador quanto a este.

Sistemática de Avaliação de Desempenho

Definição Constitutiva – Nesta dissertação, será entendida como todo o

processo que se inicia com o estabelecimento dos propósitos e objetivos da

sistemática, passando pela Avaliação de Desempenho propriamente dita e sendo

concluída com a adoção das medidas corretivas necessárias, sendo este processo

permanente na organização. Nas palavras de Pontes (1999, p. 24),

“é um método que visa, continuamente, estabelecer um contrato com os funcionários

referente aos resultados desejados pela organização, acompanhar os desafios

propostos, corrigindo os rumos, quando necessário, e avaliar os resultados

conseguidos”.

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Definição Operacional – para efeitos do estudo de campo, o termo será

entendido como englobando desde o estabelecimento dos propósitos e objetivos da

sistemática, passando pela constituição do instrumento de avaliação, a avaliação

propriamente dita e o feedback fornecido aos integrantes da instituição.

2.3 Delineamento da Pesquisa

Utilizando-se a taxionomia apresentada por Vergara (2000), apresenta-se o tipo

de pesquisa classificando-a quanto aos fins e aos meios.

Quanto aos fins, a pesquisa é descritiva e explicativa. Descritiva porque

identifica algumas características específicas ausentes da sistemática de Avaliação

de Desempenho do Exército Brasileiro. Também é explicativa porque, com base nas

características identificadas, estabelece-se a causalidade entre estas e a

consecução dos objetivos e propósitos do sistema atual.

Quanto aos meios, a pesquisa é bibliográfica, documental, de campo e ex post

facto. Bibliográfica porque é com base na bibliografia disponível sobre o assunto que

repousa o referencial teórico do estudo. Documental porque também se faz uso de

documentos internos do Exército Brasileiro que normatizam o sistema de Avaliação

de Desempenho atual. Também foi de campo, pois a pesquisa colheu dados,

através do método etnográfico, conciliando a observação do pesquisador com

entrevistas que se fizeram necessárias para o esclarecimento de algumas questões.

Por fim, é também ex post facto, haja vista a impossibilidade do pesquisador

manipular e controlar as variáveis envolvidas.

A pesquisa trata-se de um estudo de caso, já que é especificamente o caso da

aplicação da Avaliação de Desempenho no Exército Brasileiro que é objeto de

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estudo. Sendo também qualitativa, pois serão estes os dados levantados terão esta

característica, bem como os resultados obtidos.

2.4 População e Amostra

O universo da pesquisa é composto por todos os militares avaliadores e

avaliados pela sistemática atual de Avaliação de Desempenho. Quais sejam, todos

os oficiais formados pela Academia Militar das Agulhas Negras, Instituto Militar de

Engenharia, Escola de Saúde do Exército e Escola de Administração do Exército,

bem como todas as praças (sargentos e subtenentes) formadas pela Escola de

Sargento das Armas, Escola de Instrução Especializada e Escola de Saúde do

Exército. Desta forma, estão excluídos deste universo os oficiais e praças

temporários, ou seja, o pessoal militar que não é de carreira.

Quanto à amostra, a parcela deste universo pesquisada em campo, tem-se sua

definição pelo critério da acessibilidade (idem). Ou seja, os sujeitos observados se

limitaram àqueles aos quais o pesquisador teve acesso, mas que abrangeram

indivíduos oriundos de todas as escolas de formação e de todas as especializações

existentes no Exército.

Os sujeitos, por sua vez, contaram com, no mínimo, dois anos de formado. Este

tempo mínimo foi requerido devido ao fato de ser o mínimo necessário para que os

sujeitos já tenham sido avaliados ao menos uma vez e tenham recebido o resultado

da avaliação.

Entretanto, para que os objetivos da pesquisa fossem atingidos, a terceira

pergunta de pesquisa (há sintonia entre o sistema de Avaliação de Desempenho e o

tratamento dado ao elemento humano na gestão no Exército Brasileiro?) requereu

que a observação não se limitasse aos sujeitos supracitados, abrangendo também,

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todos os integrantes do Exército aos quais se teve acesso, acima da graduação de

terceiro sargento.

A observação a estes permitiu que as perguntas relativas ao sistema de

Avaliação de Desempenho, mais especificamente com relação à sua prática,

pudessem ser respondidas. Todavia, como a pesquisa não se limitou a verificar a

prática do sistema, mas tudo que o engloba e no que ele implica, uma observação

mais ampla se fez necessária.

2.5 Coleta e Análise de Dados

Devido aos objetivos do trabalho, como também as particularidades que

envolveram a coleta de dados, o método utilizado para efetuá-la foi o etnográfico.

Uma série de razões motivou esta escolha.

Inicialmente, por ocasião da coleta de dados, o pesquisador era membro da

organização objeto da pesquisa. Logo, julgou-se que a utilização de um questionário

não traria resultado desejado.

Tal julgamento baseou-se na premissa de que, dependendo do objeto do

estudo, os respondentes dirão aquilo que pensam que o pesquisador considera

como sendo a resposta certa (Douglas, 1998).

O Exército é uma instituição onde o componente hierárquico tem uma grande

importância. O pesquisador, incluído nesta hierarquia, ao passar o questionário,

poderia influenciar na resposta do mesmo. Influência que se daria tanto com relação

àqueles que estivessem abaixo na hierarquia, quanto àqueles que estivessem

acima.

Com relação aos sujeitos que estivessem abaixo na hierarquia, corria-se o risco

de que ou estes tentariam dar as “respostas certas”, ou utilizar o questionário como

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mecanismo para protestar contra qualquer coisa, canalizando a insatisfação para o

sistema de Avaliação de Desempenho, devido à falta de mecanismos institucionais

pelos quais os integrantes do Exército possam apresentar suas reivindicações.

Por outro lado, com relação aos sujeitos que estivessem acima na hierarquia,

corria-se o risco de que eles evitassem respostas que, na visão deles, os

colocassem em posição de questionamento contra as suas próprias avaliações ou

que eles interpretassem como sendo um julgamento do pesquisador com relação a

eles. E estando o pesquisador abaixo na hierarquia, não haveria abertura para tal.

Já pela etnografia, o pesquisador teve condições de obter as informações que

necessitou, pois, se por um lado a observação evitou que fossem coletados dados

enviesados, por outro, o fato do pesquisador pertencer à organização o permite

acesso à “verdade formular” (Giddens, 1997, p. 83) ou ao conhecimento comunal

(Lash, 1997b) dela.

Ou seja, o pesquisador já conhece o seu objeto de estudo, minimizando o risco

de que suas interpretações acerca do observado se deixe enviesar por estereótipos

consagrados do objeto do estudo ou explicações tendenciosas por parte de alguns

dos seus integrantes.

Obviamente que a observação permitiu a coleta de dados isenta de qualquer

viés desta natureza somente porque esta também se deu de forma encoberta

(Roesch, 1999). Em outras palavras, os demais integrantes da organização não

tinham conhecimento que estavam sendo observados com a finalidade de suas

atitudes servirem como dados para uma pesquisa.

Buscou-se manter a predisposição de isenção por parte dos sujeitos, inclusive

quando algumas entrevistas foram feitas. Estas, com a finalidade de elucidar o

significado de fatos observados. Elas não se caracterizaram, a rigor, como

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entrevistas, pois, sempre que possível, os questionamentos foram feitos em meio a

conversas informais e aparentemente despretensiosas. Assim, descaracterizando a

inquirição direta, acredita-se ter obtido maior sinceridade por parte dos

respondentes.

Mas além de evitar que os dados coletados não contribuissem para a

consecução dos objetivos da pesquisa, a etnografia foi escolhida também por causa

dos objetivos em si.

A busca pelos significados do que é observado é o fim último da etnografia.

Assim, utilizou-se a perspectiva semiótica (Geertz, 1989) com a finalidade de extraí-

los dos fatos observados e das respostas dadas pelos respondentes. Significados

estes que, então, permitiram a consecução dos objetivos deste estudo.

O método etnográfico é aquele comprometido com a apresentação das

realidades sociais como elas são vividas, experimentadas, entendidas e familiares

às pessoas estudadas (Katz, 1997). Com isso, ele busca evitar que as realidades

sociais sejam vistas como os sujeitos da pesquisa podem querer mostrá-las, ou

ainda, como os estereótipos de determinado grupo nos queiram fazer acreditar. No

estudo de uma instituição como o Exército, ambos os riscos existem.

Katz (ibidem) ainda apresenta algumas outras justificativas para a utilização da

etnografia. Destas, apresenta-se aqui aquelas pertinentes ao presente estudo:

- a busca por significados escondidos das condutas das pessoas por receio

de condenação moral esta justificativa corrobora com o que já foi

apresentado, bem como se torna evidente nos resultados do presente

estudo;

- a presença de um novo fenômeno historicamente localizado a Pós-

modernidade, como fenômeno novo, traz implicações para a gestão do

Page 22: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

21

Exército Brasileiro com novas interações e desafios internos advindos

delas;e

- a necessidade de compreender como é criado o caráter particular das

práticas sociais para tanto, a instituição social precisa ser estudada no

seu contexto social, o que não ocorre, por exemplo, quando se utilizam

unicamente questionários.

Além do mais, os fenômenos sociais são distintos em caráter dos naturais.

Portanto, não podem ser entendidos em termos de puras relações causais ou pela

subordinação à leis universais (Hammersley et Atkinson, 1995).

Poder-se-ia questionar acerca da imparcialidade do julgamento do pesquisador

necessária ao estudo. O que não seria possível pela observação, mais

especificamente pela semiótica.

Ao que pese tal afirmativa, vale considerar que a percepção é parte de toda e

qualquer observação humana, percepção essa que invariavelmente envolverá a

interpretação daquilo que está sendo coletado (Fox, 1998).

Lembrando-se que a relação sujeito-objeto é recíproca, trazendo o dualismo

para a essência do conhecimento (Hessen, 1999), utilizar métodos que se dizem

objetivos, fingindo ignorar esta relação, pode, à rigor, prejudicar mais a qualidade

dos resultados do que aprimorá-la. A seção 4.2 – A Importância da contribuição das

demais Ciências Sociais – explora mais esta questão.

A análise dos dados, dada à natureza deles, será qualitativa. Desta forma, os

dados coletados tanto pela observação, quanto pelas entrevistas, serão

categorizados de acordo com as classificações existentes nas teorias pertinentes ao

assunto, de forma a colaborar para que os resultados sejam obtidos.

Page 23: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

22

Por fim, cabe explorar a validação dos resultados da pesquisa pelo método

utilizado.

Os critérios que validam qualquer pesquisa foram basicamente desenvolvidos

pelo paradigma positivista. Portanto, ao se utilizar um método construído sobre um

outro paradigma, eles devem ser repensados em uma perspectiva diferente (Guba et

Lincoln, 1985; Roesch, 1999).

Desta forma, a credibilidade da pesquisa se baseou no procedimento de que a

descrição feita pelo pesquisador foi ratificada pela observação de terceiros. Como

também os critérios de seleção do que foi observado, onde e quando foram assim

testados.

A escolha dos demais observadores se deu entre integrantes do Exército com

formação em áreas distintas que a administração. Com isso, buscou-se fazer com

que o foco destes se desse exclusivamente sobre o que foi observado, não sobre

categorizações ou reflexões de cunho da ciência administrativa.

A presença de viés por parte do pesquisador, ao se tratar de pesquisa

qualitativa, acontecerá sempre. Inicialmente, a própria escolha do método a ser

utilizado já indica um viés de preferência por determinado campo do conhecimento.

Por isso, a revisão das observações por terceiros e das conclusões acerca destas

buscou minimizar a medida em que o viés do pesquisador tenha influenciado nos

resultados.

Finalizando, a generalização dos resultados é extremamente limitada à

organização estudada. Devido às suas características bastante particulares, é com

extrema precariedade que os resultados obtidos possam ser estendíveis à outras

organizações. Todavia, naquilo em que as características se assemelharem, ao

Page 24: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

23

menos a dinâmica dos fenômenos pode ser tomada como semelhante,

possibilitando um ponto de partida para uma investigação específica mais profunda.

2.6 Limitações do Estudo

Apesar de todo o cuidado que foi tomado para que a metodologia utilizada

pudesse fazer com que o estudo produzisse resultados mais precisos possíveis, o

mesmo possui limitações que precisam ser apresentadas, tanto para que as

ressalvas quanto ao trabalho possam ser consideradas, quanto para justificar

alguma ocorrência do que possa ser julgado como aparente deficiência.

Em primeiro lugar, o fato do pesquisador ter sido membro da organização

estudada, apesar de lhe dar acesso à “verdade formular” (Giddens, 1997, p. 83) ou

ao conhecimento comunal (Lash, 1997b) dela, concorre para a ocorrência de algum

tipo de parcialidade no julgamento das questões observadas.

Já foi citado como se buscou certificar a precisão das observações. Todavia, a

interpretação das mesmas fica sujeita ao viés adotado pelo pesquisador, o que, pelo

objeto do estudo e pelas teorias utilizadas para analisar o problema, não goza de

unanimidade, sendo passível de críticas por parte daqueles que não são partidários

desta mesma linha de análise.

Além disso, ao se abordar questões como a disciplina militar, esta ligada

estritamente às operações tipicamente militares, e a disciplina no âmbito da gestão,

esta ligada ao andamento de atividades administrativas, o que também existe no

Exército, pode-se ter a impressão de que ambas precisariam ser claramente

distinguidas, de forma que o sistema de Avaliação de Desempenho pudesse ser

melhor analisado.

Page 25: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

24

Todavia, mesmo reconhecendo o imperativo desta necessidade, ela é julgada

como sendo uma armadilha na qual o pesquisador buscou evitar cair.

No cotidiano militar, ambas as esferas da disciplina são tratadas como uma

mesma, havendo um interlaçamento tão grande entre essas esferas que, tentar

apresentá-las distintamente pode se apresentar mais prejudicial aos resultados da

pesquisa do que as tratando juntas.

A conseqüência direta desta limitação é que não se tem como separar até que

ponto o atual sistema de Avaliação de Desempenho está mais adequado para

utilização no Exército enquanto organização com vida administrativa, necessitando

esta de uma atuação comparável à de organizações civis, da utilização no Exército

enquanto organização responsável pela garantia da segurança nacional, para a qual

é necessária a adoção de algumas práticas e posturas, especialmente no que tange

às relações de poder, que seriam vistas como anacrônicas se adotadas nas

organizações civis.

Portanto, principalmente pelo fato da Avaliação de Desempenho ter sido criada

como instrumento de gestão, é imprescindível que sejam considerados os assuntos

discutidos e os resultados apresentados como mais pertinentes à faceta

administrativa do Exército, à qual, como foi dito, não tem como ser estudada

isoladamente da sua faceta operacional.

As possíveis soluções apontadas que envolvem a situação de inseparabilidade

têm a sua limitação na carência de um maior número de evidências empíricas (vide

seção 4.5). Esta limitação existe justamente por serem poucas as unidades

especiais existentes, mesmo sendo verificado em todas elas os mesmos elementos

das características apresentadas.

Page 26: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

25

Por fim, essa série de limitações apontará para o fato de que, tanto os

resultados, quanto as conclusões apresentadas, apesar de os serem feitos de forma

propositiva, sejam mais fortes evidências que apontem para as possíveis causas do

que causas que efetivamente possam ser comprovadas. Tanto que, para isso, ainda

vem contribuir não uma limitação do estudo, mas uma deficiência de nível

estratégico da organização, apontada no capítulo 5, seção 5.2 – Propósitos e

Objetivos.

Page 27: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

3 REFERENCIAL TEÓRICO

3.1 Propósitos e Objetivos da Avaliação de Desempenho

O conhecimento e discussão dos propósitos e objetivos da Avaliação de

Desempenho devem ser os passos iniciais de qualquer trabalho de elaboração ou

análise de sua sistemática. Serão os propósitos os balizadores do trabalho do

pesquisador, justamente porque qualquer sistema, em princípio, deverá estar

construído sobre propósitos e objetivos bem definidos, a fim de que a sua

operacionalização não se perca ao enveredar por caminhos que privilegiem outros

aspectos.

“A existência dessa prática [avaliação de desempenho], tecnicamente elaborada,

pressupõe o estabelecimento de um processo de planejamento em que objetivos e

metas são fixados e os indicadores (medidas de desempenho) são predeterminados”

(Brito et al., 2001, p. 52).

Com esta assertiva, Brito et al. atentam para a necessidade da definição dos

propósitos e objetivos, sob risco de que a prática da avaliação de desempenho não

venha a produzir os resultados esperados, talvez ironicamente justamente porque

sem a definição, dificilmente saber-se-á o que se espera do sistema.

Bergamini et Beraldo (1988, p. 13), por sua vez, ao afirmarem que,

“o processo de Avaliação de Desempenho Humano nas organizações implica menos

na criação de um instrumental técnico sofisticado e mais no desenvolvimento de

uma atmosfera em que as pessoas possam relacionar-se umas com as outras de

maneira espontânea, franca e confiante”,

Page 28: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

27

argumentam que há um propósito maior que deve balizar o desenvolvimento do

processo de avaliação de desempenho, sendo este o de justamente criar um melhor

ambiente de trabalho, de forma justamente a se conseguir obter os melhores

resultados possíveis das pessoas no trabalho.

Então, poder-se-ia afirmar que, quanto ao ser humano, a Avaliação de

Desempenho tem uma grande correlação com a questão da motivação no trabalho.

Reforçam esta afirmação Wagner III et Hollenbeck (1999, p.99) ao colocarem que

“as pessoas serão motivadas ao desempenho de alto nível desde que percebam que

a recepção de resultados de valência alta depende de sólido desempenho pessoal”.

Sendo que esta valência seria a “satisfação que ele [o indivíduo] prevê receber de

um determinado resultado” (ibidem, p. 89).

Assim, a percepção desta valência estaria expressa justamente no resultado da

Avaliação de Desempenho, que se torna então um importante instrumento para que

os indivíduos se motivem na organização.

Cabe aqui, entretanto, ser feita uma breve digressão sobre a questão da

motivação. Böhmerwald (1999, p. 33) afirma que “o objetivo final da avaliação de

desempenho é contribuir para o aumento da motivação das pessoas na empresa”. A

uma primeira vista, pode-se ter a falsa impressão de que as organizações podem

motivar os seus integrantes. Todavia, como já foi apresentado no item anterior, a

organização influencia na motivação das pessoas mediante os fatores de satisfação

e contra-satisfação existentes na mesma. Portanto, a motivação é um fator interno a

cada indivíduo, sendo importante este conceito ao se tratar dos propósitos e

objetivos da avaliação de desempenho.

Page 29: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

28

Entretanto, há autores que discordam desta perspectiva que coloca a motivação

como cerne da questão da gestão de recursos humanos. Desta forma, a crítica a

esta perspectiva bem como outras serão apresentadas na seção seguinte.

Distintos autores apresentam uma enormidade de propósitos, finalidades e

objetivos para os sistemas de Avaliação de Desempenho. Stoffel (2000) e Pontes

(1999), por exemplo, apresentam o sistema de Avaliação de Desempenho como

sendo dependente do planejamento estratégico da organização. A guisa de

ilustração, dentre os objetivos propostos por Pontes (1999, p. 26, 27), destacam-se:

“- tornar dinâmico o planejamento da empresa;

- conseguir melhorias na empresa voltadas à produtividade, qualidade e satisfação

dos clientes, bem como em relação aos aspectos econômicos e financeiros;

- ...;

- estabelecer um clima de confiança, motivação e cooperação entre os membros das

equipes de trabalho;

- ...; e

- servir como instrumento para levantamento de necessidades de treinamento e

desenvolvimento”.

A dependência do desempenho humano com relação ao planejamento

estratégico também é defendida por Coens et Jenkins (2000, p. 80) ao

argumentarem que

“to perform effectively, employees require basic information. They need to

understand the aim of the organization and understand how their works relates do

the whole”1.

Assim, pode-se argumentar que o entendimento do objetivo da organização e da

relação da tarefa individual com o todo da organização, providenciado por esta

1 “para atuar de forma eficaz, os empregados requerem de informações básicas. Eles precisamentender o objetivo da organização e como seus trabalhos se relacionam com o todo”.

Page 30: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

29

informação básica, permitiria aos integrantes da organização perceberem como suas

avaliações relacionam-se com o desempenho efetivamente ocorrido, permitindo,

inclusive, que haja uma maior facilidade de identificação de eventuais discrepâncias

no sistema por parte dos próprios integrantes da organização.

Almeida (1996), Lucena (1992), Gillen (2000), Bader et al. (2000), Böhmerwald

(1999) e Stoffel (2000) apresentam objetivos os quais, em linhas gerais, alinham-se

com os apresentados por Pontes.

Cabe também ressaltar o que Phillips (1996, p. 3) afirma acerca da contribuição

do departamento de recursos humanos para o resultado final das organizações.

“HR departments are taking significant strides in reducing costs, enhancing

customer service, improving profits and boosting productivity. They accomplish this

through a rigorous program of accountability for the function, and at the heart of

accountability is measurement and evaluation [grifo nosso] ”2.

Ou seja, pode-se dizer que o grande objetivo do sistema de Avaliação de

Desempenho seria o de medir a parcela de contribuição de cada integrante para os

resultados da organização. Desta forma, seu propósito então seria o de alimentar os

demais sistemas de recursos humanos com informações que os possibilitassem

transformar esta contribuição na maior possível, buscando o desenvolvimento

daqueles integrantes que o necessitem, bem como servir de parâmetro para a

seleção dos melhores habilitados a ocupar cargos que porventura vaguem.

Neste ponto, porém, emergem as primeiras contradições inerentes aos sistemas

de avaliação de desempenho. Coens et Jenkins (2000, p. 46-47), por exemplo,

contradizem Phillips (1996) ao afirmarem que há uma interdependência

2 “Os departamentos de RH estão tendo avanços significativos na redução de custos, melhoria doserviço ao consumidor, aumento de lucros e produtividade. Eles atingem isso através de um rigorosoprograma de contabilidade para a função, e no centro da contabilidade estão a medição e avaliação”.

Page 31: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

30

fundamental entre todos os componentes do sistema organizacional e que, portanto,

“because of the interdependency of the parts, improvement strategies aimed at the

parts, such as appraisal, do little or nothing to improve the system ”3.

Assim, o primeiro questionamento suscitado é justamente o da validade do

sistema de avaliação de desempenho como ferramenta de desenvolvimento das

pessoas e, em conseqüência, de melhoria da organização. Ambos os pontos estão

ligados ao fato de que normalmente a avaliação não considera a interdependência

de todas as partes da organização. Desta forma, qualquer tentativa de melhoria de

uma destas sem considerar o todo, será inútil. (Coens et Jenkins, 2000).

Poderia-se argumentar, entretanto, que caso o sistema de avaliação seja

desenhado em consonância com a estratégia da organização, tal crítica perderia sua

validade.

Mesmo assim, ainda sim se verificariam novos problemas. Inicialmente,

considerando-se a ligação entre a estratégia da organização e o desenho do sistema

de avaliação, Figueiredo (2002) sustenta que as competências de uma organização

em todas as suas funções devem ser acumuladas e mantidas em paralelo. Ou seja,

não adiantaria somente que a avaliação de desempenho fosse desenhada em

consonância com a estratégia da organização, como também seria necessário que a

organização, ao buscar desenvolver seus recursos humanos, o fizesse em nível

paralelo ao desenvolvimento das demais funções da organização.

Por outro lado, mesmo que tal condição fosse satisfeita, o que, a priori, pode-se

dizer, é algo que depende fundamentalmente da organização fazer, há ainda um

outro problema cuja solução não parece tão simples.

3 “por causa da interdependência das partes, estratégias de melhoria focadas nas partes, como aavaliação, fazem pouco ou nada para melhorar o sistema”.

Page 32: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

31

Recordando, tem-se que há dois principais propósitos para a avaliação de

desempenho: a de desenvolver e a de premiar os integrantes da organização. Estes

dois própositos, porém, já se revelam conflitantes entre si.

O ato de premiar, por si, traz a noção de julgamento sobre a capacidade e/ou

competência das pessoas. Desta forma, quem estiver sendo julgado poderá adotar

uma postura defensiva contra esse julgamento e, principalmente, contra o juiz, o

avaliador, normalmente o superior hierárquico.

Por outro lado, desenvolvimento significa melhoria e, necessariamente, boa

vontade das pessoas em reconhecer suas necessidades de melhoria em acordo

com aqueles em condições de propiciar os meios necessários para tal. Neste caso,

também será o superior hierárquico aquele que deverá desempenhar o papel de

facilitador para o desenvolvimento de seus subordinados.

Como então, esperar que uma mesma pessoa, atuando em dois papéis distintos

frente a um mesmo fato, possa efetivamente desempenhar os dois com a isenção

requerida para um bom desempenho de ambos?

Block (2000, p. XV) já coloca que

“when we combine compensation with a developmental discussion, we undermine

the openness and vulnerabity that development requires, and all our ears can hear is

the money ”4.

Ou seja, não somente haverá dificuldade do superior em atuar bem nos dois

papéis, mas também os subordinados não adotarão a postura aberta necessária.

Com isso, então, o que Bergamini et Beraldo (1988) colocaram sobre a atmosfera de

4 “Quando nós combinamos compensação com discussão para o desenvolvimento, minamos aabertura e vulnerabilidade que o desenvolvimento requer, e tudo o que nossos ouvidos conseguemouvir é o dinheiro”.

Page 33: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

32

relacionamento espontânea e confiante não se concretizará, fazendo com que a

avaliação de desempenho perca sua finalidade.

Beer et Ruh (1990) apontam para ambas as dificuldades, tanto no que concerne

ao fato do papel de juiz do superior interferir na sua habilidade de auxiliar no

desenvolvimento do desempenho do subordinado, quanto à posição defensiva que o

subordinado tenderá a adotar.

Estas contradições também são apontadas por Meyer et al. (1990) ao condenar

a utilização das entrevistas de avaliação que buscam, ao mesmo tempo, aperfeiçoar

o desempenho das pessoas e servir de base para negociações salariais e

promoções. Assim, eles apregoam que para propósitos distintos, distintas avaliações

devam ser conduzidas.

Bader et al. (2000) apontam para o mesmo caminho, ao considerarem que as

avaliações deverão ser comparadas com a primeira, a qual deverá servir de diretriz

básica. Isto converge com a idéia de Stoffel (2000) sobre administração de

desempenho, no qual o principal objetivo deve ser o desenvolvimento do integrante

da organização.

Lenvinson (1990a) vai um pouco mais longe em sua crítica. Além dos dois

propósitos já citados, ele também lista o feedback dado a cada pessoa sobre sua

performance. Todavia, ele também coloca que os sistemas atuais são incapazes de

servir a qualquer uma dessas funções. Esta incapacidade, além da contradição entre

os diferentes propósitos teria uma série de outros motivos de característica

operacional, questões essas que serão exploradas mais adiante.

Fechando as críticas, Coens et Jenkins (2000) ressaltam que o problema não é

a avaliação em si, mas sim sua abordagem com vários propósitos, estes, como já

apresentados, antagônicos em essência. Eles ainda apresentam um diagrama numa

Page 34: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

33

tentativa de mostrar todas as variáveis envolvidas no desempenho de um indivíduo,

visando demonstrar que qualquer sistema que vise cobrir todos aqueles aspectos é

ilusório. Portanto, qualquer sistema desenhado para melhorar a performance

baseado em prêmios ou incentivos estaria fadado ao fracasso.

As discussões acerca das contradições existentes nos propósitos dos sistemas

de avaliação de desempenho levam a constatação de que, no mínimo, há

necessidade de se reavaliar os sistemas em uso.

Desenvolver versus premiar. Propósitos distintos que, conforme foi visto,

deverão dar origem a sistemas distintos. A idéia de administração do desempenho,

defendida tanto por Stoffel (2000) quanto por Bader et al. (2000), Beer et Ruh (1990)

e Coens et Jenkins (2000) já pode apontar para um caminho que talvez concretize o

primeiro.

Contudo, como atingir concretizar o segundo propósito sem que isso interfira no

primeiro, especialmente quando premiar inclui não somente o reconhecimento pelo

ótimo desempenho, mas também a possibilidade de promoção?

A resposta exigirá o desenho de um sistema que, além de apresentar

características específicas para tal fim, o que varia de organização para

organização, consiga apresentar-se como algo totalmente desvencilhado do outro

aos olhos dos integrantes da organização, bem como um grande preparo por parte

dos avaliadores de ambos os sistemas.

Concluindo, pode-se dizer que a avaliação de desempenho apresenta-se como

uma sistemática muito mais complexa e difícil do que se poderia supor a uma

primeira vista. Portanto, antes que se possa efetivamente operacionalizá-la, faz-se

necessário que se conheça mais sobre os fatores que influenciam no desempenho

humano no trabalho, objeto da próxima seção.

Page 35: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

34

3.2 Considerações Gerais sobre o Desempenho Humano

A compreensão do ser humano no trabalho é um desafio que se apresenta aos

pesquisadores da administração desde os seus primeiros estudos. Desde Taylor e

seus princípios da administração científica, os pesquisadores têm buscado conhecer

as variáveis atuantes no desempenho das pessoas no trabalho, visando, desta

forma, desenvolver mecanismos ou técnicas que visem obter o melhor desempenho

delas.

Os últimos anos são testemunhas da crescente complexidade que o trabalho e

as relações interpessoais neste ambiente ganharam. As atividades, em sua grande

maioria, deixaram de ser essencialmente manuais e passaram a exigir a utilização

cada vez maior do intelecto dos trabalhadores. Stoffel (2000) realça a importância

dessa utilização do intelecto, ao afirmar que o maior diferencial entre os

concorrentes deixou de ser a tecnologia para passar a ser o conhecimento.

Com isso, então, não basta apenas o treinamento. O desenvolvimento das

pessoas e a criação de um ambiente propício tornam-se mister para a geração do

conhecimento. Lucena (1992), então, aponta as condições para o desempenho

humano, sendo estas a qualificação profissional, a cultura organizacional, o estilo

gerencial e o ambiente externo.

Estas condições, então, serão aquelas que atuarão diretamente no

comportamento do ser humano no trabalho.

“Considerando então que o desenvolvimento da estrutura comportamental do ser

humano se dá pela interação entre elementos intrínsecos e extrínsecos à sua

constituição, que gera ao longo do processo a imagem que o indivíduo tem de si e o

afeto que sente por si mesmo, é natural que deseje e recuse ao mesmo tempo

Page 36: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

35

situações que confirmem, coloquem em xeque ou contrariem sua auto-imagem”

(Bergamini et Beraldo, 1988, p. 12).

Com esta afirmação, Bergamini et Beraldo apresentam um outro aspecto de

grande influência no desempenho humano no trabalho, os elementos intrínsecos,

dos quais pode-se destacar a motivação para o trabalho.

Assim, por um lado, há os fatores, ou condições, externos para o desempenho,

apresentadas por Lucena, as quais, entre outras coisas, são responsáveis pelo

“paradigma emergente [que] pressupõe que o desempenho humano seja regulado

pela relação gerente/colaborador e que vise ao comprometimento de todos com os

objetivos da organização” (Stoffel, 2000, p. 11). E, por outro, há os fatores internos

para o desempenho, como a motivação, para a qual contribuirão os fatores de

satisfação e de contra-satisfação existentes no ambiente de trabalho, o qual

determinarão a direção do comportamento humano no trabalho (Archer, 1997;

Bergamini, 1997).

Pode-se então dizer que o desempenho humano será o resultado da interação

entre o colaborador e sua chefia, conjuntamente com suas características individuais

e fatores situacionais (Almeida, 1996).

O tema da motivação tem sido visto por muitos autores como o ponto chave

para a obtenção de um desempenho superior dos integrantes de um organização

por esta (Wagner III et Hollenbeck, 1999; Archer, 1997; Davis et Newstrom, 1992).

Segundo esta corrente de pensamento, a motivação estaria diretamente

relacionada às necessidades do homem. Por isso mesmo ela deriva em grande

parte da Teoria das Necessidades de Maslow.

Segundo esta teoria, há uma classificação de necessidades hierarquizadas, as

quais só podem ser satisfeitas à medida que aquelas de grau inferior se encontrem

Page 37: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

36

saciadas. Em ordem crescente, são elas: fisiológicas, de segurança, sociais, de

estima e de auto-realização (Wagner III et Hollenbeck, 1999).

Sobre esta teoria, novas idéias foram sendo formuladas e adaptadas. Archer

(1997), por exemplo, desenvolveu seu argumento no sentido de que, para ele, cada

um desses níveis de necessidades, possui uma multiplicidade de necessidades

distintas. Dentre estas, algumas precisam ser plenamente satisfeitas para que se

passe a buscar a satisfação de necessidades de níveis mais elevados e, para

outras, basta apenas a satisfação parcial.

A Teoria das Necessidades Manifestas de Murray pode também ser evocada

para exemplificar construções feitas sobre o modelo original de Maslow. Essa teoria

“sustentava que um indivíduo pode ser motivado por mais de uma necessidade de

cada vez, e sugeria também que, às vezes, as necessidades podiam entrar em conflito

entre si” (Wagner III et Hollenbeck, 1999).

Desta forma, então, conclui-se que a primordial tarefa das organizações seria a

identificação das necessidades que motivariam seus integrantes ao trabalho,

atuando nelas no intuito de se obter o desempenho desejado.

Aprofundando-se um pouco mais no assunto, Herzberg (1997) aponta para o

“enriquecimento do cargo” como sendo o caminho para a motivação dos integrantes

de uma organização.

Em resumo, pode-se dizer que a premissa por trás desta idéia é a de que há

fatores higiênicos e motivadores por trás do desempenho de qualquer cargo, sendo

que somente esses últimos são responsáveis pelo aumento da satisfação no

trabalho e, portanto, possibilitam a motivação dos empregados.

Page 38: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

37

Desta forma, há necessidade de que haja uma correta adequação entre a

capacidade do ocupante do cargo e o seu nível, com investimentos sobre os fatores

motivadores de forma a se obter um melhor desempenho dos empregados.

Davis et Newstrom (1992) já adotam uma abordagem que entende a motivação

como produto de uma multiplicação cujos fatores seriam a expectância, a valência e

a instrumentalidade. Entendendo-se por valência a satisfação de um indivíduo ao

obter determinado resultado; por expectância, a crença individual na capacidade de

se desempenhar uma tarefa; e por instrumentalidade, a crença que o desempenho

bem-sucedido resultará em recompensa. Para tal, eles apregoam que a atuação

com reforços positivos e negativos nos comportamentos desejados e indesejados,

respectivamente, serão de suma importância, isso em conjunto com o feedback

dado aos integrantes da organização.

Normalmente aborda-se a temática da motivação focalizando os subordinados e

o papel da gerência, a qual justamente, recordando o que já foi apresentado, recai

sobre os fatores de satisfação, as necessidades e os reforços dos comportamentos.

Todavia, seguindo o raciocínio das teorias expostas, pode-se dizer que há também a

necessidade de que a gerência se encontre motivada para desempenhar seu papel

de catalisadora ou indutora dos aspectos ligados à motivação.

McClelland et Burnham (1990) estudaram esta questão e concluiram ser o poder

o fator preponderante na motivação dos gerentes. Todavia, eles alertam, é delicado

a utilização deste fator por parte da organização, haja vista o risco de que isso leve a

um imperialismo ou autoritarismo nas organizações, o que faria com que a

motivação dos subordinados se esvaísse à medida em que aumentassem os

comportamentos autoritários da gerência.

Page 39: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

38

Em torno do debate sobre os fatores de satisfação, mais especificamente ligado

à instrumentalidade, é importante que haja uma vinculação do pagamento ao

desempenho (Wagner III et Hollenbeck, 1999; Lawler III, 1997; Kanter, 1990). Ou

seja, a remuneração deverá conter também uma parcela variável, esta dependente

do desempenho individual ou da equipe. Todavia, é importante tomar cuidado na

implantação dessa prática, pois ela torna visiveís as questões concernentes à

eqüidade (Kanter, 1990), podendo isto levar a questionamentos ou reações ao

sistema, dependendo se os integrantes da organização o percebam como justo ou

não.

A despeito do grande respaldo que a teoria da motivação tem entre os adeptos

da psicologia organizacional e da validade por eles atribuída a ela, a forma como ela

foi construída é passível de críticas.

A construção da teoria da motivação segue o caminho previamente trilhado pela

ciência positivista, imparcial em tese, fruto do pensamento cartesiano.

O pensamento cartesiano tem suas origens no pensamento grego e na

dicotomia criada pelos gregos, quando a unicidade do mundo foi dividida entre o

Belo e o útil (Marcuse, 1997). Esta dicotomia acabou hierarquizando o

conhecimento, elevando a racionalidade pura e instrumental ao sinônimo de

verdade.

O primeiro questionamento a esta promoção da racionalidade é se colocar a

questão de que, segundo Nietzsche (1983), o homem é o criador dos valores aos

quais ele não somente se apega, como hierarquiza. Todavia, parece que o homem

se esquece de tal característica. Em conseqüência, essa criação do homem acaba

por transcendê-lo, ocupando um lugar acima dele.

Page 40: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

39

Na filosofia pré-socrática, a distinção entre o Belo e o útil não existia, tampouco

a sua hierarquização. Ou seja, Belo e útil, assim como vida e morte, criação e

destruição seriam todos partes de um continuum no qual o homem estaria inserido.

Considerando, então, como já dito, que os valores são criados pelo homem,

passa então a ser uma questão de interpretação o fato de se considerar, em

primeiro lugar, Belo e útil como distintos e opostos e, em seguida, hierarquizar,

estabelecendo a precedência de um sobre o outro.

É justamente por este motivo que esta hierarquização, considerada como a

verdade por Sócrates (Marcuse, 1997), é por Nietzsche (1983) veementemente

criticada. Afinal de contas, questões como a verdade ou a felicidade não estão além

da sensibilidade do homem, diferente do apregoado por Sócrates.

Kant (1999) vem corroborar com isso, ao afirmar “que todo o nosso

conhecimento começa com a experiência”, com exceção da própria faculdade de

conhecer, ou seja, a razão. E qual é fruto da experiência se não interpretações do

fenômeno experimentado?

Todavia, ao contrário do que uma má interpretação de Kant possa sugerir, o fato

da razão em si não estar sujeita à experiência não significa que ela esteja num plano

superior ao da sensibilidade, como propõe a filosofia socrática, pois o que ela produz

depende desta. Portanto, há uma complementaridade, uma unicidade entre ambas e

não a dicotomia apregoada por Sócrates.

Assim como Kant (1999), Nietzsche (1983) também critica a metafísica, pois

esta independeria da experiência e, portanto, estaria isenta das interpretações, o

que, segundo ele, seria impossível de acontecer.

Em crítica similar, Damásio (1996) contradiz o pressuposto cartesiano de que o

raciocínio deveria desprover-se de qualquer veste emocional para que as respostas

Page 41: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

40

obtidas fossem as melhores possíveis. E as emoções, o que são, se não reações

neurobiológicas aos significados atribuídos às interpretações dos fatos?

Portanto, estas críticas permitem a afirmação de que os significados atribuídos

aos fenômenos, advindos da interpretação dos mesmos, são os mais releventes

aspectos concernentes à hierarquização dos mesmos.

Direcionando esta afirmação para a questão da motivação, tem-se então que o

papel dos significados do trabalho, das tarefas desempenhadas pelas pessoas e de

tudo o mais que cerca a atividade produtiva do homem reveste-se da maior

importância como determinante da motivação individual.

Estas críticas também permitem que se trace um paralelo entre elas e o

conceito de cultura formulado por Geertz (1989), o qual utiliza a semiótica para seu

entendimento.

Para Geertz (1989, p. 15), “o homem é um animal amarrado a teias de

significados que ele mesmo teceu”, sendo, portanto, essas teias a cultura. Este

conceito é convergente com o que Nietzsche (1983) coloca sobre a criação e

hierarquização dos valores. À semiótica, então, cabe o papel de identificar e

compreender as teias tecidas pelo homem.

Em resumo, a semiótica busca identificar os significados com os quais se

revestem as ações do homem que, portanto, passam a ser vistas como ações

simbólicas.

A ação simbólica pode ser definida como o significado que há por trás de cada

comportamento, refletida na importância com a qual se reveste cada ação do

comportamento humano. Esta importância, por sua vez, será determinada, para

cada indivíduo, na sua base social.

Page 42: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

41

A partir do momento em que se vislumbra toda a ação simbólica que está por

trás dos atos, a estranheza ou incoerência com a qual se percebe o comportamento

humano de determinado grupo se desmancha. Mais especificamente para os

estudos da administração, aquilo que impulsiona o homem a ter determinado tipo de

comportamento se revela.

Por outro lado, é interessante observar que a compreensão destes significados,

via de regra, ocorre pela observação dos mesmos atos e comportamentos que

inicialmente se apresentam como sendo estranhos, ou os quais se busca explicar.

Assim então, tem-se que todo o comportamento humano é revestido de

simbolismos que permitem a um observador compreendê-lo melhor. Entretanto, a

forma de conhecimento destes simbolismos não é outra senão a orientada pelo

próprio comportamento humano, a qual apresentar-se-á pela base social do grupo

ao qual o indivíduo observado pertence.

Para ser corretamente identificado e compreendido, os significados devem ser

observados dentro do contexto em que ocorrem as ações, a este entendimento,

deve-se somar o fato de que a própria comunicação em si passa a ser um elemento

estruturante dos significados e, portanto, da própria cultura (Eco, 1991).

Em linhas gerais, a comunicação ocorre por intermédio do código utilizado.

Assim, tem-se que cabe ao código ordenar os símbolos, de forma que, então, possa

ocorrer a comunicação.

Considerando-se o que se entende por relações semasiológicas, ou seja, o fato

de determinados símbolos poderem designar determinados significados, mais uma

possibilidade de comunicação se abre. Tem-se o que também é apresentado como

o sentido denotativo e conotativo da comunicação. Sendo, então, este último sujeito

a alterações da relação supracitada, a qual, nas palavras de Eco (1991, p. 23),

Page 43: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

42

“pode mudar, crescer, deformar-se; o símbolo permanece constante e o significado

torna-se mais rico ou mais pobre”.

Acrescenta-se, ainda, o fato da relação entre o símbolo e o referente ser algo

indireto e não natural, sendo somente a relação entre aquele e a referência algo

imediato, recíproco e reversível.

Todas estas relações têm como conseqüência, o fato de que a comunicação,

desta forma, fica sujeita a uma série de fatores externos ao significante mediante o

qual deseja-se transmitir o significado.

Considera-se ainda que a informação, elemento nuclear do processo de

comunicação, só ganha valor a partir do momento que o destinatário traduz a

mensagem-significante recebida em mensagem-significado, isto se tomando por

base o léxico pelo qual ela é determinada.

Desta forma, o contexto na visão de Eco é justamente este léxico, ou subcódigo,

que trabalhará estabelecendo o significado conotativo dos símbolos. Este

significado, então, será fundamental para que a mensagem-significante seja

recebida pelo destinatário e transformada, enfim, em mensagem-significado.

A compreensão da questão da comunicação e seu papel na cultura é importante

principalmente em dois aspectos. O primeiro se refere ao sentido conotativo de

como ela ocorre no ambiente organizacional, cuja análise já poderá dar pistas

acerca da eficácia ou não de discursos que visam a motivação ou outras ações a

serem adotadas pelos empregados.

O segundo, com estreita relação com o primeiro, diz respeito ao fluxo de

informações dentro da organização. Com relação a este aspecto, de nada adianta o

esforço na construção de canais de comunicação dentro da organização, se o

Page 44: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

43

contexto no qual devam ocorrer as trocas de informação não o favorecerem, por

quaisquer razões que sejam.

A abordagem sobre cultura e o papel da comunicação remetem ao que Lucena

(1992) classificou como sendo uma condição externa para o desempenho, ou um

fator extrínsico (Bergamini et Beraldo, 1988). Porém, a análise da ação humana pela

lente semiótica sobrepõe tal idéia, já que se percebe ser a base social a

determinante dos significados e da importância relativa de cada um deles.

Ou seja, na ação humana há presente um forte elemento de estratégia de

inserção social, o que tem sua importância avultada quando se trata de

comportamento no trabalho, justamente pelo importante significado atribuído ao

papel do homem no trabalho e como as sociedades atribuem ao trabalho a função

das construções das próprias identidades individuais.

Isto permite que se afirme que o estudo isolado da motivação perde seu sentido

de ser porque, para ser bem compreendida, a motivação deve ser estudada

levando-se em conta a teia de significados da empresa na qual o indivíduo está

inserido, que, por sua vez, terá relação com a cultura da sociedade na qual esta se

encontrar (Barbosa, 2001; Barros et Prates, 1997; Amado et al., 1994; Chanlat,

1999). Do contrário, corre-se o risco de se identificar e atuar em fatores que somente

aparentam ter relação com a motivação das pessoas, mas que numa descrição

densa, revelariam-se insignificantes.

Por outro lado, a partir do momento que se tem uma compreensão mais acurada

da cultura e dos significados que cercam e permeiam as pessoas no trabalho, já se

tem em mãos um conhecimento muito mais abrangente e profundo que o sobre a

motivação pura e simplesmente pode revelar, tornando, portanto, este estudo menos

relevante.

Page 45: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

44

Há ainda um ponto que vem se somar ao já exposto. Dejours (1997), ao discutir

os pressupostos relativos ao trabalho e os da pesquisa sobre fator humano,

apresenta que, a partir do momento em que se submete o comportamento humano a

leis, ou seja, utilizando-se a racionalidade instrumental, não se abre espaço para as

falhas humanas. Em elas ocorrendo, deixam de ser responsabilidade do executante

e passam a ser daqueles que não compreendem bem as leis e que, portanto, não

adequaram suas condutas com relação aos subordinados adequadamente, a fim de

que as tarefas sejam corretamente desempenhadas. Isso se aplica perfeitamente

como crítica à Teoria da Motivação, como nas suas próprias palavras:

“a motivação, ... , seria transferível a qualquer atividade, o que também constitui

uma simplificação considerável, já que mesmo nas condições ideais de comando ou

de organização resta um lugar para falhas humanas, erros ou acidentes que a

referência exclusiva à qualidade das relações de trabalho e da motivação não permite

explicar” (p. 34).

Em outras palavras, as relações instrumentais e diretas entre motivação e

desempenho não são suficientes para nem explicar o desempenho humano,

tampouco garantir determinado nível deste.

É interessante como se pode encontrar evidências implícitas que levem a esta

mesma conclusão em autores que tratam especificamente de motivação. O controle,

por exemplo, é interpretado como um nefasto integrante das organizações, o qual os

empregados tentam burlar quando possível e sendo também um agente responsável

pela queda de motivação dos funcionários. A solução apontada para evitar tal queda

é a participação dos empregados, o que garantiria maior produtividade e substituiria

o controle pelo compromentimento individual (Walton, 1990; Meyer et al., 1990).

O primeiro fato a se contradizer é a questão do fim do controle. Barker (1993)

apresenta que grupos auto-gerenciados, os quais reforçam a participação de todos,

Page 46: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

45

acabam por exercer um controle ainda mais rigoroso do que aqueles anteriormente

impostos pela organização, apresentando inclusive tendências à normatização. Ou

seja, o controle em si não é o responsável pela queda ou aumento da motivação dos

empregados, mas sim, o que se esconde por trás do controle, que vem a ser

justamente os aspectos culturais da organização.

Talvez por inabilidade em identificá-los, ou por circunscrever o conceito de

controle àquele meramente praticado pela organização, os autores que consideram

o controle como enfraquecedor da motivação, assim o tenha classificado.

Na verdade, é possível que tal visão distorcida do controle seja fruto da

dicotomia existente entre a racionalidade instrumental ainda predominante nas

organizações e a consciência de ruptura mais forte do que sua vivência (Carvalho,

2002). O controle normativo, que pode ser classificado como artefato da

racionalidade instrumental, acaba sendo visto como expressão desta e, então, passa

a ser identificado como a fonte dos problemas para a motivação, quando na

verdade, o verdadeiro alvo da crítica, mesmo incoscientemente é a racionalidade

instrumental.

Há uma convergência entre esta afirmação e o que foi apresentado por Dejours

(1997). Guerreiro Ramos (1981) também coloca esta questão, sendo suas críticas

mais diretas. Segundo ele, o pensamento racional-positivista tende a abordar as

organizações e as suas dinâmicas internas como sendo passíveis de explicação

pelo ponto de vista estritamente psicológico. Isto porque esta racionalidade é

permeada por uma “orientação controladora do mundo”. Desta forma, sob este

prisma, a compreensão dos fenômenos organizacionais ficaria circunscrita aos

limites da psicologia.

Page 47: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

46

Esta limitação da compreensão dos fenômenos organizacionais abre uma

lacuna que necessita ser preenchida. Esta seção justamente buscou apresentar

elementos que visam preenchê-la, baseando-se na pertinência das abordagens

sociológicas para cumprir tal papel.

Por fim, é importante ressaltar que não é papel desta seção esgotar a

apresentação daquilo tudo que envolve a compreensão dos fenômenos

organizacionais, dado inclusive o próprio título desta. Entretanto, durante o restante

do texto, outras inserções necessárias serão feitas, tudo com vistas à consecução

do objetivo desta pesquisa.

3.3 Métodos de Avaliação

Tomando-se por base os objetivos e princípios da Avaliação de Desempenho,

tem-se a situação na qual é necessário que as informações obtidas sobre os

integrantes da organização sejam as mais completas e precisas possíveis.

Assim, a avaliação efetuada deverá ser capaz de apresentar um perfil completo

e acurado do desempenho individual na organização. Para tanto, esta pode ser

efetuada de distintas formas. Caberá, então, à organização selecionar aquela que

ela julgue ser a melhor para que os objetivos de seu sistema sejam atingidos, bem

como ela pode se valer de mais de uma maneira para efetuar esta avaliação.

Bergamini et Beraldo (1988) apresentam três métodos mediante os quais a

Avaliação de Desempenho pode ser levada a cabo. São elas a Avaliação direta,

Avaliação conjunta e Auto-avaliação. A estas, Chiavenato (1999) acrescenta a

Avaliação pela equipe, Avaliação 360º e Avaliação para cima.

A Avaliação direta é aquela mais tradicionalmente conhecida. Nela, cabe ao

superior efetuar a avaliação de seus subordinados. É interessante observar que este

Page 48: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

47

método está tão intrínseco na cultura administrativa, que alguns autores

simplesmente o consideram como o único método que deva ser utilizado, não

chegando sequer a fazer referência sobre os demais. Este é o caso, por exemplo, de

Stoffel (2000), Pontes (1999), Almeida (1996) e Lucena (1992). Ou ainda, quando se

chega a citar outro método, como é o caso de Böhmerwald (1999) ao falar da

avaliação do superior pelo subordinado, só o faz para criticá-la e censurá-la.

Gillen (2000), por outro lado, considera um anacronismo a utilização de somente

a avalação direta, isto porque, ao se pregar o trabalho em equipe, o

compromentimento de todos e a participação de todos na definição dos objetivos a

serem alcançados no trabalho, soa como contracenso, justamente na hora de se

avaliar como a equipe se saiu, que somente o chefe seja o dono da verdade.

Pode-se inferir ainda que tal tipo de procedimento passe a desencadear na

equipe o comportamento de que a participação na definição dos objetivos, bem

como o próprio desempenhar dos papéis, passem a ser pautados pelas expectativas

e preferências dos chefes, a quem os subordinados buscarão atender de forma a

serem melhor avaliados.

A Avaliação conjunta é uma variação do primeiro método apresentado. Nela,

não cabe só ao superior efetuar a avaliação. Este e seu avaliado devem preencher a

ficha de avaliação em conjunto, ou qualquer outro instrumento utilizado para

documentar a avaliação.

No outro extremo desta linha, encontra-se a Auto-avaliação. Nela, cabe ao

próprio avaliado o julgamento de seu desempenho, bem como o preenchimento da

ficha de avaliação, ou documento correspondente. Cabe acrescentar que,

normalmente, este método não é utilizado como único meio de avaliação, sendo

normalmente empregado em conjunto com algum dos outros apresentados.

Page 49: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

48

A Avaliação pela equipe ocorre quando são os próprios membros da equipe de

trabalho os responsáveis pela elaboração da avaliação de cada um dos seus

membros. Esta também é conhecida como Avaliação lateral ou Avaliação 180º.

Um dos métodos considerados mais completos, mas também mais recentes, é a

Avaliação 360º. Em resumo, ela consiste na avaliação feita por todos aqueles que

circunscrevem a vida organizacional do avaliado: seu chefe, seus pares e seus

subordinados. Alguns modelos ainda incluem os chamados clientes internos e

externos e os fornecedores do avaliado.

Talvez pela sua recenticidade seja também um dos métodos mais criticados,

especialmente por aqueles que vêm a Avaliação direta como o único método

aceitável. A guisa de exemplo, cabe apresentar a crítica feita por Böhmerwald (1999,

p. 31):

“A avaliação no sentido inverso [do superior pelo subordinado] poderia desencadear

efeitos indesejáveis, tais como enfraquecimento ou mesmo perda da autoridade,

além de oferecer oportunidades para manifestações de revanchismo”.

Em resposta a este tipo de crítica, Edwards et Ewen (1996) apresentam que por

trás desse discurso encontra-se, na verdade, o medo que alguns superiores têm de

ser criticados, ou mesmo o medo que os subordinados têm de criticar. Eles ilustram

isso de forma interessante, apresentando como exemplo a resposta dos súditos da

estória infantil da Nova Roupa do Imperador, quando este os argüia sobre a beleza

de seus novos trajes.

Coens et Jenkins (2000) endossam esta posição, ao afirmarem que

“one positive influence of the 360-degree feedback movement has been greater

awareness of the multitude of people who can offer critical and useful information.

Page 50: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

49

While supervisory feedback is benefical, it makes little sense to design a feedback

process that facilitates feedback exclusively or predominantly from the supervisor”5.

Na realidade, não se pode esquecer que uma equipe, cujo mote dos trabalhos é

a participação, necessita de toda a informação útil para que seu trabalho possa ser

corretamente avaliado. Ademais, o receio citado anteriormente só será justificado se

o ambiente de relacionamento espontâneo e confiante apregoado por Bergamini et

Beraldo (1988) não existir. Caso isso não se verifique, então, poder-se-á dizer que a

avaliação de desempenho não está cumprindo o seu papel.

Ou seja, em qualquer uma das hipóteses, o trabalho não estaria funcionando

como desejado e talvez necessário para a prosperidade da organização. Desta

forma, tudo não passaria de uma ilusão ou de um estelionato administrativo na

tentativa de obter de cada integrante da organização o melhor de si, sem a devida

contrapartida.

Mais ainda, tal melhor de si seria baseado por aquilo que o superior acreditaria

ser o comportamento mais adequado, o que, em última instância, acabaria por

desprezar as contribuições autênticas de cada integrante da organização, perdendo

esta os potenciais ganhos advindos da diversidade de pensamento.

Em resumo, então, pode-se dizer que a avaliação de desempenho, mais um

meio do que um fim sem si, dependerá muito mais de como a organização

trabalhará seu todo – ponto no qual se volta a evocar a questão da interdependência

levantada por Coens et Jenkins (2000) – do que tratará exclusivamente de um ou

outro sistema.

5 “Uma influência positiva do movimento pela avaliação 360º tem sido a maior consciência damultiplicidade de pessoas que podem oferecer informação crítica e útil. Mesmo sendo o feedback dosupervisor é benéfico, faz pouco sentido desenhar um processo de feedback que o tenhapredominante ou exclusivamente do supervisor”.

Page 51: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

50

Antes de encerrar, porém, cabe citar a existência também da Avaliação para

cima. Esta nada mais é do que uma variação do método anterior. A diferença

existente, então, limita-se a não ocorrência das avaliações laterais e da direta.

3.4 Etapas da Avaliação de Desempenho

Pelo que foi apresentado até agora, pode-se dizer que a sistemática de

Avaliação de Desempenho é um método para que a organização possa atingir todos

aqueles objetivos e propósitos determinados por ela. Considerando-se, então, este

foco, pode-se dizer que as suas etapas devem ser configuradas e controladas de

forma a, assim, conduzirem a organização aos resultados desejados.

Desta forma, para este fim, pode-se tomar da Qualidade Total o método do Ciclo

PDCA de controle. Segundo Campos (1992), este se constitui num método de

controle de processos.

Ainda segundo ele (ibidem, p. 29),

“os termos no Ciclo PDCA têm o seguinte significado:

Planejamento (P) – Consiste em:

a. estabelecer metas sobre os itens de controle; e

b. estabelecer a maneira (o caminho, o método) para se atingir as metas propostas.

...

Execução (D) – Execução das tarefas exatamente como prevista no plano e coleta de

dados para verificação do processo. Nesta etapa é essencial o treinamento no

trabalho decorrente da fase de planejamento.

Verificação (C) – A partir dos dados coletados na execução, compara-se o resultado

alcançado com a meta planejada.

Atuação corretiva (A) – Esta é a etapa onde o usuário detectou desvios e atuará no

sentido de fazer correções definitivas, de tal modo que o problema nunca volte a

ocorrer ”.

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51

Tanto Böhmerwald (1999) quanto Stoffel (2000) adaptaram este método à

Avaliação de Desempenho. Entretanto, eles o fizeram sob diferentes perspectivas.

Para o primeiro (Böhmerwald, 1999), fica assim configurado o método:

a. Na etapa do planejamento – P – são definidos as metas para o modelo de

avaliação de desempenho que será utilizado.

b. Na etapa da execução – D – o modelo é executado, ou seja, ocorre a avaliação

propriamente dita.

c. Na etapa da verificação – C – os dados levantados são comparados com as

metas padrão.

d. Por fim, na etapa da atuação corretiva – A – são promovidas ações no sentido de

se corrigir os eventuais desvios encontrados no modelo.

Já Stoffel (2000) configurou desta forma o método:

a. Na etapa do planejamento – P – são estabelecidos as metas, os indicadores e os

controles do desempenho. Além disso, são previstos os recursos necessários à

consecução das metas, englobando estes os recursos materiais, tecnológicos e

financeiros.

b. Na etapa da execução – D – ocorrem os treinamentos necessários e a execução

da tarefa. Ou seja, é nesta etapa que se dá o desempenho.

c. Na etapa da verificação – C – se dá o que se chama de acompanhamento do

desempenho. Em resumo, são comparados os resultados obtidos com os

esperados. É importante frisar que acompanhamento não significa atuação

corretiva, com a qual pode ser confundida. Enquanto aquele é “a coleta ou

aquisição de dados ou informação sobre a execução” (Valeriano, 1998, p. 415),

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52

esta faz uso destes dados e informação para sua avaliação e decisão de

correção.

d. Finalmente, na etapa da atuação corretiva – A – os dados levantados na etapa

anterior são analisados e são tomadas ações visando corrigir os desvios

encontrados.

A diferença básica entre as duas abordagens é que Böhmerwald (1999) foca a

sua no aperfeiçoamento do modelo de avaliação de desempenho em si, enquanto

Stoffel (2000) o faz com relação ao próprio desempenho individual.

Essa diferença é decorrente da própria visão que cada autor tem da avaliação

de desempenho. Conforme já foi visto, Böhmerwald (1999) considera a avaliação

direta como o único método a ser utilizado, portanto, sua abordagem trata

exclusivamente da operacionalização do mesmo, focando no aprimoramento do

instrumento. Justamente essa prescrição é o ponto fraco de sua abordagem, pelos

motivos já apresentados na seção anterior.

Já Stoffel (2000) apresenta uma abordagem que, conforme ele mesmo

denomina, visa administrar o desempenho. Por esta, avaliação de desempenho

deixa de ser o fim em si e sua validade estará atrelada à capacidade de

monitoramento e auxílio no aprimoramento do desempenho individual, sendo este

aprimoramento o fim último.

Tal posição é coadunada por Bader et al. (2000), de cuja argumentação acerca

da avaliação de desempenho extrai-se a dinâmica de um modelo que se iniciaria

com uma primeira avaliação, na qual os dados coletados serviriam de diretriz básica.

A partir daí, à medida que as outras avaliações fossem sendo feitas, seu novo

desempenho registrado seria comparado com a diretriz básica.

Page 54: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

53

Esta dinâmica deixa uma lacuna em aberto. Mesmo considerando-se válida as

linhas gerais desta, certamente alguma performance mínima deve ser necessária

para que o desempenho no cargo apresente uma eficácia para o trabalho da

organização.

É justamente nesta lacuna que a administração do desempenho se encaixaria,

não só preocupando-se com padrões mínimos de eficácia, como também visando o

assessoramento dos diversos integrantes da organização para que estes padrões

sejam atingidos e aperfeiçoados ao longo do tempo.

É pertinente afirmar-se que, com relação à última etapa, sob a abordagem de

Stoffel (2000), cabe o seguinte adendo. Caso sejam identificadas como causas do

desempenho aquém do esperado fatores externos ao indivíduo, como falta de

recursos, a ação corretiva a ser tomada é mais facilmente determinada. Ou ainda,

caso seja perfeitamente identificável como sendo por falta de uma habilidade

requerida, também vale a afirmação anterior.

Já se as causas forem intrínsecas ao indivíduo, torna-se tarefa mais complexa

tomá-las. Entretanto, independente de como será procedida esta tarefa, há um ponto

que é de fundamental importância para o sucesso da ação corretiva: o feedback

dado ao indivíduo.

Normalmente o feedback é dado naquilo que um grande número de autores

chama de entrevista de avaliação. Como diz Pontes (1999, p. 140), “a Avaliação de

Desempenho é, antes de mais nada, um processo de comunicação”. Assim, a forma

com que os resultados da avaliação são comunicados aos avaliados tem uma forte

correlação com a maneira como eles reagirão a estes resultados.

Coda (1997) apresenta o processo de comunicação como sendo um dos fatores

que mais influenciam na satisfação dos indivíduos nas organizações, haja vista ser

Page 55: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

54

este, entre outros, elemento de “adequação das informações recebidas ao correto

desempenho das atividades” e “instrumento facilitador da integração da empresa”

(ibidem, p. 104).

Gillen (2000) reforça ainda mais esta idéia ao colocar que a eficácia do sistema

de avaliação como um todo depende da forma como a avaliação é discutida entre o

avaliador e o avaliado. E não somente um fator chave, mas a maneira como o

feedback é feito também tem um papel importante em todo o processo da avaliação

de desempenho (Coens et Jenkins, 2000).

Voltando então ao que foi abordado sobre a correlação entre os fatores de

satisfação e a motivação individual, tem-se que este processo de comunicação,

especialmente no que se refere à Avaliação de Desempenho, tem o fundamental

papel de ser o catalisador para o alavancar do desempenho individual.

Complementando, Bergamini et Beraldo (1988, p. 192) ressaltam a importância

da entrevista de avaliação ao afirmarem que

“os empregados de uma empresa precisam necessariamente dessa orientação formal

[a entrevista], pois não se pode pretender que tenham claro para si mesmos seu

próprio nível de eficiência diante daquilo que deles é esperado”.

Stoffel (2000) ainda ressalta a importância de que não somente sejam

apresentados os aspectos negativos, nos quais o avaliado deverá se esforçar para

melhorar o seu desempenho. É também relevante que seja dado o reforço positivo

aos aspectos nos quais o avaliado destacou-se, a fim de que sua percepção de

valência sobre seu desempenho positivo em alguns aspectos possa contribuir para a

melhoria nos demais.

Mas nem mesmo a mais completa e franca discussão resultará em melhorias

efetivas do desempenho se durante o processo de feedback não forem

Page 56: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

55

estabalecidas ou esboçadas ações necessárias para a correção das deficiências

levantadas ou das necessidades de aperfeiçoamento (Bader et al., 2000).

Para tal, portanto, boa vontade de ambas as partes não basta. É fundamental

que a organização possua meios para operacionalizar as mudanças necessárias.

Isso implica, portanto, na alocação de recursos destinados a tal fim, quaisquer que

sejam as suas naturezas.

Mesmo havendo os meios para se operacionalizar as mudanças necessárias, há

um componente que não pode ser esquecido, a disposição do avaliado em mudar.

Esta dependerá, dentre outros fatores, da validade que o avaliado der à sua

avaliação e ao interlocutor do feedback (McGregor, 1990). Podendo-se dizer,

também, que a preparação do avaliado para receber o feedback é outro aspecto a

ser observado e que deve ser fomentado na organização.

Além disso, também é importante que o tipo e a freqüência do feedback se

adequem às características do trabalho avaliado, incluindo-se nessas características

o tempo de exercício do cargo por parte do avaliado, bem como características do

próprio (Coens et Jenkins, 2000).

A utilização de um mesmo tipo de feedback, numa mesma freqüência, para

todos os cargos, pode ser comparado à utilização do relógio para medir a duração

de um evento, a distância entre dois pontos e o peso de algo. Dependendo de como

for feito, obter-se-á resultados em termos de tempo para cada uma dessas funções,

todavia, esta somente será efetivamente útil para uma delas.

A despeito da existência de todos os fatores supracitados que permitem que o

feedback tenha efeitos positivos, é de suma importância que a organização o veja

como mais um mecanismo de aprendizagem para a organização, preocupando-se

em criar o ambiente propício para tal. Um dos aspectos já comentados e o

Page 57: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

56

considerado de maior impacto para esse objetivo é o reforço nos pontos positivos,

sobre os quais é melhor direcionar para um nivelamento das competências do que

focar nos pontos fracos (idem).

Com relação à questão da comunicação, cabe uma breve digressão.

Recordando o que foi discutido na seção 3.2 – Considerações Gerais sobre o

Desempenho Humano, tem-se que se pode considerar os fenômenos de cultura

como sendo fatos de comunicação (Eco, 1991).

Esta, por sua vez, é dependente do contexto no qual ocorre. Assim, tudo o que

foi citado até o momento sobre os fatores que influenciam a comunicação estão

subordinadas, antes de mais nada, ao contexto no qual ocorre a comunicação, de

forma que o significado da informação seja corretamente interpretado pelo avaliado.

No caso específico da avaliação de desempenho, no qual há os contextos de

julgamento e auxílio para o aperfeiçoamento do desempenho, requerendo cada qual

um papel diferente por parte do avaliador, a possibilidade de que seu feedback

venha efetivamente a se transformar em subsídios para que o avaliado se

aperfeiçoe está relacionada a uma cultura de confiança mútua entre o avaliador e o

avaliado de que o feedback fornecido por aquele visa, acima de tudo, o

aprimoramento do avaliado.

Isto, por sua vez, encontra uma ligação com a Teoria do Agir Comunicativo de

Habermas (Tenório, 2000).

Dejours (1997) apresenta uma síntese bem elaborada dos tipos de agir.

Segundo ele, o agir pode ser instrumental (ou estratégico), moral-prático (ou

comunicativo) ou expressivo (ou dramatúrgico). O primeiro é o utilizado visando um

objetivo, submeter o mundo físico ao seu próprio interesse, levando-se em conta os

comportamentos dos outros. O segundo já é “orientado para o entendimento,

Page 58: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

57

suporta o objetivo do viver em conjunto e diz respeito à vida boa”. O terceiro, por fim,

estaria ligado à intersubjetividade, ao sujeito transmitir a legitimidade de sua ação a

outro.

A estes três tipos de ação, Ingram (1987) acrescenta o agir normativo, que é

uma ação social na qual a intenção primordial das partes envolvidas é atender

reciprocamente às expectativas, adequando seus comportamentos às normas e

valores sociais.

As fronteiras entre cada tipo de ação não são tão fáceis de serem delimitadas,

isto porque se pode afirmar que é praticamente impossível encontrar uma ação que

seja puramente instrumental, normativa, comunicativa ou expressiva. O que se tem

é que cada ação desenvolvida num plano refletirá nos demais, em maior ou menor

intensidade.

Entendimento é a palavra-chave no Agir Comunicativo. Através dele é que o

objetivo de “viver em conjunto” será alcançado. Mas a noção de viver em conjunto

pode, e deve, ser ampliada para a de consenso também. Não se pode pensar em

viver em conjunto como sinônimo de tolerar a convivência. Pois esta, na verdade, se

caracteriza mais como ação estratégica do que como ação comunicativa. Afinal de

contas, a tolerância pura e simples é unicamente o reconhecimento da

impossibilidade de supressão do outro. Desta forma, o entendimento deve ser a

tônica no viver em conjunto, a fim de que, então, o conjunto chegue a um consenso

e, como um todo, caminhe para a mesma direção.

Não se pode imaginar que o entendimento possa ser alcançado sem serem

considerados os fatores que nele influenciam. Assim, pode-se caracterizar o

processo de se chegar a um entendimento como sendo composto pelas seguintes

etapas (Aragão, 1992):

Page 59: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

58

- o intérprete deve estar familiarizado com as condições de validade do

proferimento (considerando-se um ato de fala);

- ele deve observar sob quais condições estas são aceitas como válidas;

- conhecer as razões implícitas que levaram os participantes a assumirem

suas posições; e

- finalmente, o intérprete também deve ser conduzido para o interior do

processo de afirmação das pretensões de validade.

Habermas (1991) reafirma a importância da linguagem no processo da ação

comunicativa ao afirmar que atos de fala podem fazer a ligação dos planos de ação

de um ator com os dos outros atores, mediante a motivação racional da

concretização de se obter um entendimento, melhor do que o exercício do poder.

Pode-se ainda apresentar mais uma posição, na qual se considera que,

somente no caso da ação comunicativa há realmente entendimento. Alexander

(1991, p. 63), ao estudar a Teoria Crítica de Habermas, diz que a ação estratégica

não envolve nem entendimento, tampouco intenção de comunicação, o máximo a

que ela se permite é um emprego não comunicativo do conhecimento.

Ingram (1987, p. 35) também alerta para o fato de que, sociologicamente

falando, como qualquer ação provoca alterações no contexto social da vida, não há,

diria-se assim, entendimento neutro.

Desta forma, então, pode-se concluir esta seção não somente reforçando a

importância do feedback em si, mas principalmente, tendo-se em mente o quão

complexo é o processo de comunicação (para que este possa efetivamente

contribuir para a eficácia do feedback), envolvendo uma série pressupostos de

sócio-antropológicos, que, a despeito da importância de cada etapa da avaliação de

desempenho, há necessidade de uma melhor preparação por parte dos

Page 60: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

59

responsáveis em fazê-lo, justamente para que um feedback mal fornecido não venha

por abaixo a validade de todo um sistema.

3.5 Os Instrumentos de Avaliação

Uma atenção especial deve ser dada ao instrumento de avaliação que será

utilizado no processo. Isto porque, mesmo considerando que há outras questões

mais importantes em Avaliação de Desempenho, ele ainda é o maior alimentador de

dados do sistema, se não o único, na grande maioria das organizações.

Pode-se dizer que o instrumento de avaliação tem por objetivo o de registrar os

dados de desempenho do trabalho do indivíduo de forma a se verificar sua

adequação ao desempenho previsto. Bergamini et Beraldo (1988, p. 132) dizem que

“dois elementos são necessariamente considerados nesse momento e devem

convergir para o mesmo ponto: as características de trabalho em si e as possíveis

variações comportamentais que podem ser exibidas ao executá-lo”.

Tomando-se isso, então, os instrumentos a serem utilizados poderão variar

enormemente, tanto em forma quanto em conteúdo, não só dependendo da

organização, mas também dentro das características do cargo ocupado.

Vale relembrar que a construção do instrumento de avaliação deverá ser guiado

para que os dados coletados possam ser úteis na consecução dos objetivos

propostos pelo sistema. Para tanto, é importante a observação de Bader et al.

(2000) para que a avaliação ocorra somente sobre o que interessa à organização

para aquele fim. Do contrário, ela corre o risco da ineficácia.

Esta posição é reforçada por Oberg (1990), o qual atribui à adequação da

escolha com relação aos objetivos do sistema o sucesso do mesmo. Ou seja, a

Page 61: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

60

prática da avaliação deverá estar de acordo com o seu propósito, sendo o

instrumento de avaliação engrenagem fundamental desta prática.

Para que tais aspectos sejam observados, é mister que a organização esteja

alerta ao fato de que normalmente os instrumentos focam no desempenho individual

do cargo, como se fosse possível isolar tal fenômeno. Desta forma, esta limitação

pode fazer com que o instrumento seja incapaz de efetivamente coletar os dados

necessários à avaliação do desempenho. Assim, caberá à organização estar alerta a

isso (Lenvinson, 1990b) e criar mecanismos para suplantar tal deficiência de

informação.

Independente de qual seja o instrumento de avaliação, o mesmo deverá ser

elaborado observando-se alguns critérios, condições sine qua non para que os

indivíduos da organização o percebam como adequado para atingir os objetivos e

propósitos aos quais se destina. Bergamini et Beraldo (1988) os apresentam como

sendo a confiabilidade, validade, sensibilidade, objetividade e simplicidade.

No que tange à confiabilidade, é o critério que permite que, sob as mesmas

condições, dois desempenhos semelhantes sejam medidos de forma semelhante.

A validade é o critério que está intimamente relacionado aos objetivos do

sistema. Ou seja, o instrumento deve permitir, por exemplo, que indivíduos de

desempenhos explicitamente melhores sejam assim classificados. É importante

frisar, porém, que não basta verificar a validade do instrumento como um todo, mas

também devem ser testados todos os seus itens.

O critério da sensibilidade é percebido pela capacidade do instrumento em

discriminar as diferenças das pessoas que estão sendo avaliadas.

Page 62: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

61

Já quanto à objetividade, pode-se dizer que um instrumento é objetivo quando

ele consegue minimizar que as tendências do avaliador influenciem no resultado da

avaliação.

Neste ponto, a fim de ressaltar a importância deste critério, toma-se emprestado

um conceito de Economia Política, derivado do public choice. Monteiro (2000, p. 15)

afirma que em Política Econômica é importante

“estabelecer um conjunto de regras que funcionem bem, independentemente de

quais sejam os comportamentos individuais desses participantes [os participantes do

jogo do governo representativo]”.

Assim, por analogia, pode-se dizer que é de suma importância que o

instrumento de avaliação funcione bem, independente de quais sejam as tendências

do avaliador. Se isso for conseguido e, acima de tudo, percebido pelos integrantes

da organização, o próprio instrumento será visto como sendo mais confiável.

Esta posição também é adotada por Barbosa (2001, p. 34), quando ela diz que

“é preciso fazer com que os processos avaliativos sejam os mais objetivos possíveis,

no sentido de medir o mais exatamente possível o desempenho de cada um, sem

distorções resultantes de interesses particulares ou da subjetividade dos avaliadores”.

Por fim, tem-se a simplicidade. As pessoas nas organizações certamente

possuem outras tarefas além da de avaliar. Assim, seus tempos devem ser divididos

de forma que possam arcar com todas as suas responsabilidades. Desta forma, um

instrumento complexo pode gerar dúvidas, prejudicando a validade e a

confiabilidade do instrumento, bem como reduzir a predisposição do avaliador para

utilizá-lo, prejudicando o resultado da avaliação.

Page 63: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

62

É importante que se observe que, na verdade, estes cinco critérios

apresentados são interdependentes. Normalmente, o rigor na observância de um

deles contribuirá para o aprimoramento dos demais.

Observados, então, os critérios balizadores para a elaboração do instrumento,

tem-se os diversos tipos de instrumentos que podem ser utilizados.

Antes, porém, de serem apresentados os diversos tipos, é importante ressaltar

que o método a ser utilizado deve ser construído de forma a se minimizar os “fatores

que contribuem para uma deterioração da validade dos sistemas de Avaliação de

Desempenho” (Almeida, 1996, p. 34). São eles o estereótipo, o efeito de halo, o erro

de contraste, o erro de semelhança, o erro de primeira impressão e os fatores

situacionais (Bergamini et Beraldo, 1988; Lucena, 1992; Pontes, 1999; Böhmerwald,

1999; Stoffel, 2000; Bader et al., 2000, Gillen, 2000; Coens et Jenkins, 2000).

O estereótipo deve ser entendido na semântica de sua palavra, ou seja, um

juízo particular baseado numa falsa pressuposição sobre determinado grupo ao qual

a pessoa pertença.

O efeito de halo é “a tendência para classificar uma pessoa uniformemente nos

vários elementos componentes da avaliação, por efeito de uma apreciação global”

(Almeida, p. 34).

O erro de contraste “ocorre quando o avaliador é influenciado por avaliações

feitas anteriormente” (idem). Neste caso, tanto faz se são as avaliações passadas do

indivíduo ou a avaliação de um outro indivíduo com o qual se compara o primeiro.

Quando o avaliador possui afinidades com o avaliado, quer seja por

pertencerem a mesmos grupos sociais fora da organização ou por questões de

gostos e valores, pode ocorrer o erro de semelhança. Ou seja, o avaliador pode ter a

Page 64: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

63

noção de que, por exemplo, uma má avaliação deste indivíduo em questão

signifique uma má auto-avaliação.

O erro de primeira impressão, como o próprio nome diz, é decorrente da

primeira impressão que o avaliador tem do avaliado permanecer, independente do

comportamento deste mudar ou não.

Por fim, os fatores situacionais são aqueles que podem contribuir para um

enviesamento da avaliação. Por exemplo, características do avaliado que são

irrelevantes para o desempenho são sobrevalorizadas, ou particularidades da

organização que valorizam tais características individuais, independente da sua

correlação com o desempenho.

Almeida (1996) faz uma divisão inicial dos instrumentos obedecendo a seguinte

classificação: resultado de funções individuais, instrumentos tradicionais de

atribuição de pontos, instrumentos de ordenação e instrumentos baseados em

observação de comportamentos. A esta classificação segue-se uma nova divisão

dentro de cada categoria supracitada.

Chiavenato (1999) já apresenta uma classificação mais simples, que englobam

as classificações feitas por Almeida (1996), composta dos seguintes instrumentos:

escalas gráficas, escolha forçada, pesquisa de campo e incidentes críticos.

Classificações semelhantes também são apresentadas por Bergamini et Beraldo

(1988), Lucena (1992) e Pontes (1999). Já Böhmerwald (1999) e Stoffel (2000)

limitam-se a apresentar o instrumento julgado por eles como sendo o mais

adequado.

Cabe agora, então, detalhar cada um dos instrumentos apresentados.

O Instrumento das Escalas Gráficas é “baseado em uma tabela de dupla

entrada: nas linhas estão os graus de avaliação e nas colunas estão os graus de

Page 65: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

64

avaliação do desempenho” (Chiavenato, 1999, p. 195). Podem ocorrer algumas

variações, mas o cerne do instrumento permanece o mesmo.

Este instrumento possui alguns pontos positivos e outros negativos. São seus

pontos positivos (Chiavenato, 1999, Bergamini et Beraldo, 1988 e Pontes, 1999):

- facilidade de planejamento e de construção do instrumento de avaliação,

segundo as características mais valorizadas pela organização;

- simplicidade e facilidade de compreensão e de sua utilização;

- visão gráfica e global dos fatores de avaliação envolvidos; e

- facilidade na comparação dos resultados de vários funcionários.

São seus pontos negativos (idem):

- superficialidade e subjetividade na avaliação do desempenho;

- produz efeito de generalização (efeito de Halo);

- produz efeito tendência central;

- peca pela categorização e homogeneização das características

individuais;

- limitação dos fatores de avaliação: funciona como sistema fechado;

- rigidez e reducionismo no processo de avaliação;

- deixa dúvidas quanto às gradações utilizadas;

- dificulta o entendimento do feedback do resultado por parte do

avaliado; e

- avalia apenas o desempenho passado.

A escolha forçada, também conhecida como frases descritivas, é o instrumento

no qual são apresentados blocos de frases descritivas num formulário e o avaliador

deve escolher aquela que mais se adequar ao comportamento do avaliado.

Page 66: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

65

São os pontos positivos desse instrumento (Chiavenato, 1999 e Bergamini et

Beraldo, 1988):

- evita o efeito de generalização (efeito de Halo) na avaliação, isso se

forem misturadas as frases que apresentam as diversas gradações das

características;

- evita o efeito tendência central;

- reduz a influência pessoal do avaliador, isto é, a subjetividade;

- apresenta maior precisão nos itens;

- ocasiona menos dúvidas no momento da avaliação e na compreensão

de seu feedback; e

- requer menos treinamento dos avaliadores para sua aplicação.

São seus pontos negativos (idem):

- complexidade no planejamento e na construção do instrumento,

necessitando de maior tempo para o levantamento dos dados e para a

implantação na organização;

- não proporciona uma visão global dos resultados da avaliação; e

- não permite comparações.

O terceiro instrumento é o da pesquisa de campo, a qual consiste em

entrevistas entre um especialista em avaliação e o gerente do avaliado, os quais,

conjuntamente, procedem à avaliação.

São seus pontos positivos (Chiavenato, 1999 e Pontes, 1999):

- envolve a responsabilidade de linha (o gerente avalia) e a função de staff

(o DRH assessora) na avaliação de desempenho;

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66

- permite planejamento de ações para o futuro, como o desenvolvimento

profissional de cada um; e

- permite um diagnóstico padronizado do desempenho dos funcionários.

São seus pontos negativos (idem):

- custo operacional elevado por exigir a assessoria de especialista; e

- processo de avaliação lento e demorado.

Além dos pontos positivos e negativos, a eficácia deste instrumento dependerá

muito da competência do staff para conduzir as entrevistas, bem como a própria

relação entre o gerente e o staff e como as entrevistas serão conduzidas. Estes

pontos tem relação com o que foi abordado anteriormente sobre a comunicação.

Por fim, o instrrumento dos incidentes críticos é aquele que se baseia no registro

de “características extremas (incidentes críticos) que representam desempenhos

altamente positivos (sucesso) ou altamente negativos (fracasso)” (Chiavenato, p.

198).

São seus pontos positivos (Chiavenato, 1999 e Pontes, 1999):

- calcado em fatos reais;

- enfatiza os aspectos excepcionais do desempenho. As exceções

positivas devem ser realçadas e melhor aplicadas, enquanto as

exceções negativas devem ser eliminadas ou corrigidas; e

- instrumento de fácil montagem e fácil utilização.

São seus pontos negativos (idem):

- não se preocupa com aspectos normais do desempenho;

- peca pela subjetividade, pois o conceito de incidente crítico pode diferir

de pessoa para pessoa; e

Page 68: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

67

- peca por fixar-se em poucos aspectos do desempenho. Donde sua

tendenciosidade e parcialidade.

É importante frisar que os pontos positivos de cada instrumento só se

transformarão em ganhos para a organização se a mesma estiver imbuída do

objetivo de criar um ambiente propício para o desenvolvimento das pessoas,

principalmente no que se refere à comunicação, participação e cooperação. Pelo

mesmo motivo, ou pela combinação de distintos instrumentos, os pontos negativos

de cada instrumento podem ser minimizados, já que cada um contempla indicações

diferentes que servirão a objetivos e propósitos diferentes (Bader et al., 2000).

De qualquer forma, é importante também que se tenha em mente que por mais

abrangentes e complementares que sejam os instrumentos utilizados, discretas

diferenças de desempenho poderão não ser detectadas pelos mesmos, o que tem

como conseqüência imediata a possibilidade de dois integrantes da organização

terem a mesma avaliação, mas, de fato, possuírem desempenhos distintos. Com

isso, então, a organização deverá atentar para que a avaliação de desempenho não

acabe por se tornar um fim em si, resultando em futuras má decisões pelos dogmas

assumidos de seus resultados.

Por fim, concluindo esta seção, é bom relembrar que

“deve-se ter bem claro que o sucesso da avaliação de desempenho bem como seu

fracasso podem também ser determinados pela boa ou má qualidade do instrumento

que se está colocando em uso, tendo esse aspecto tanta importância quanto os

demais” (Bergamini et Beraldo, 1988, p. 167).

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68

3.6 Avaliação de Desempenho na Administração Pública

Como é de se supor, o Exército Brasileiro não é o único órgão público a adotar

uma sistemática de Avaliação de Desempenho, vários outros também o fazem.

Entretanto, verifica-se a ocorrência de distintas sistemáticas, as quais variam desde

os objetivos quais devam atingir, passando por todos os tópicos relacionados à

atividade de avaliação, já apresentados neste capítulo. Esta variação ocorre

inclusive dentro de um mesmo órgão, neste caso normalmente quando da

implantação de uma nova sistemática distinta da empregada até então, servindo de

laboratório.

A ocorrência de tal diversidade deve ser analisada com grande interesse, pois

dela poderão ser obtidas idéias para o aperfeiçoamento dos sistemas utilizados,

quer seja pela adoção de alguma prática adotada por outro órgão ou pelo resultado

da reflexão sobre o próprio sistema utilizado.

De forma breve, então, apresenta-se-á a seguir um comparativo entre a

sistemática de Avaliação de Desempenho utilizada pela Delegacia da Receita

Federal de Belém (DRF/Belém), a Fundação Joaquim Nabuco (FJN), o Serviço

Federal de Processamento de Dados (SERPRO), a Secretaria Federal de Controle

(SFC), a Empresa Brasileira de Pesquisa Agropecuária (EMBRAPA) e a

Universidade Federal de Uberlândia (UFU).

Todos os dados apresentados nas subseções que se seguem são fruto de uma

pesquisa da Escola Nacional de Administração Pública (Brasil, 2000a). Para melhor

atender aos objetivos desta dissertação, extraiu-se da pesquisa apenas o que é

considerado mais relevante para este estudo, o que não significa dizer, porém, que

esta abordagem esgota o assunto, pois há outros elementos os quais não foram por

ela explorados.

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69

3.6.1 Própositos e Objetivos

Ao se visualizar os propósitos e objetivos dos distintos sistemas utilizados,

contabiliza-se um universo de dezesseis itens. Destes, alguns contemplam a quase

totalidade dos órgãos pesquisados, enquanto outros são encontrados em somente

um ou dois sistemas.

As três ocorrências mais freqüentes são: (1) desenvolvimento e capacitação de

pessoal – abrangida por todos os sistemas, (2) promoção e (3) progressão salarial

por mérito. Sendo que as duas últimas somente não são encontradas no sistema da

SFC. No outro extremo, tem-se a (1) demissão, (2) a seleção, (3) a punição e (4) a

assistência social. As duas primeiras existindo somente no sistema do SERPRO, a

terceira somente no da EMBRAPA e a última no da FJN.

Com relação aos órgãos especificamente, tem-se que a FJN e a EMBRAPA,

com respectivamente onze e dez objetivos, são os órgãos que prevêem a mais

ampla gama de finalidades para o sistema. No outro extremo tem-se a SFC, cujo

sistema conta com apenas dois objetivos: (1) o desenvolvimento e capacitação de

pessoal e (2) a informação para outros sistemas de avaliação e premiação.

O exposto já permite que se identifique a existência uma forte convergência com

relação ao que poderia se chamar de principais objetivos do sistema,

especificamente com relação ao objetivo de desenvolvimento e capacitação de

pessoal, o qual pode ser destacado como o objetivo principal dos sistemas de

avaliação de desempenho.

Por outro lado, ao se observar a ocorrência de uma variada gama de objetivos

em dois órgãos, contrastando com a SFC que tem apenas dois objetivos, pode-se

dizer que os sistemas daqueles órgãos apresentam uma propensão muito maior a

Page 71: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

70

não conseguir comprir seus papéis, justamente pela dificuldade que já foi levantada

anteriormente de um sistema conseguir contemplar vários objetivos distintos,

dependendo de como estiver estruturado, bem como devido ao antagonismo natural

existente entre a adoção de objetivos de premiação e de desenvolvimento ocorrendo

concomitantemente, problema já explorado na seção 3.1 – Propósitos e Objetivos da

Avaliação de Desempenho.

3.6.2 Os Métodos de Avaliação

Assim como se verificou uma variedade de objetivos e propósitos na

comparação dos diversos sistemas, também se verificou a ocorrência de quase

todos os métodos apresentados na seção 3.3 – Métodos de Avaliação, sendo que

somente a Avaliação Conjunta não é utilizada.

A participação da chefia imediata é exclusiva somente em dois sistemas, sendo

que nos demais há participação dos pares. A participação dos subordinados é

verificada como regra somente em um órgão, podendo ainda ocorrer num outro.

Especificamente a respeito de cada órgão, tem-se que a EMBRAPA apresenta

maior flexibilidade quanto à adoção dos métodos. Além da chefia imediata, cabe a

cada setor o estabelecimento das figuras dos avaliadores, os quais poderão ser os

pares, os próprios avaliados (auto-avaliação) e os subordinados, havendo

combinações entre estes elementos. De qualquer forma, os resultados,

independente do método utilizado, são compilados por um comitê composto por

representantes dos empregados e pelas chefias.

Na DRF/Belém, participam como avaliadores as chefias, os próprios avaliados e

os subordinados.

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71

Na FJN, a avaliação que ocorre é somente a Direta, mesmo quando o

funcionário estiver lotado em área diferente da sua de origem, sendo que, neste

último caso, prescreve-se a consulta à chefia do local no qual o funcionário

efetivamente trabalhava para efeitos da avaliação.

Na UFU ocorre a Avaliação pela Equipe. Todavia, há a restrição de que, no

máximo, vinte integrantes participem da avaliação, sendo que a chefia

obrigatoriamente inclui-se neste universo.

A Avaliação pela Equipe também é norma no SERPRO, sendo que, neste caso,

o número de pares que participam é somente de três, todos escolhidos pelo

avaliado, além da participação da chefia imediata. Lá também ocorre a auto-

avaliação.

Por fim, a SFC utiliza-se somente da Avaliação Direta.

Em princípio, deveria-se esperar uma variação nos métodos em paralelo com a

variação no número de objetivos em cada órgão. Todavia, as variações encontradas

diferem.

Já se argumentou na seção anterior da provável dificuldade em que os sistemas

da FJN e da EMBRAPA incorrem para que seus objetivos sejam atingidos. Uma

maior gama de objetivos distintos pressupõe uma maior e melhor capacidade de

uniformização tanto na coleta, quanto na tabulação e interpretação dos dados sobre

o desempenho humano no trabalho.

Ora, a uma primeira vista, pode-se perceber que os sistemas dos órgãos

supracitados correm em direção contrária. Pelas suas construções, os mesmos

tendem mais a dificultar a comparabilidade dos resultados do que a facilitar.

A partir do momento em que, no caso da FJN, por exemplo, a chefia direta

avalia o funcionário mesmo quando este se encontra efetivamente exercendo sua

Page 73: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

72

atividade profissional em área distinta, abre-se margem para distorções na

percepção do desempenho, mesmo quando há a consulta à chefia do local no qual o

funcionário efetivamente trabalhava, pois não se pode garantir nem a colaboração

plena entre as duas chefias no tocante à troca de informações, bem como há o risco

de que ruídos na comunicação gerem distorções e, ainda, há inclusive a questão da

validade que a chefia direta atribuirá às informações passadas pela outra.

O sistema da EMBRAPA apresenta um quadro ainda mais complexo no que se

refere à capacidade de atingir os seus objetivos. Por exemplo, promoção e

desenvolvimento pessoal são dois dos objetivos contemplados pelo sistema. Além

do conflito existente entre objetivos de natureza originariamente antagônica, a

flexibilidade existente na adoção do método, dotando cada departamento de

autonomia, certamente dificulta a uniformização das informações, mesmo havendo a

compilação pelo comitê, pois esta, em princípio, por tratar somente com dados já

coletados, provavelmente atua mais na questão da formatação dos mesmos do que

na avaliação do conteúdo.

Desta forma, mais especificamente aos objetivos relacionados à premiação

ficam mais seriamente comprometidos que os ligados ao desenvolvimento, já que

modelos diferentes utilizados por distintos departamentos tem grande tendência a

gerar comparações enviesadas.

Fechando esta seção, então, pode-se perceber que a adoção dos métodos sem

que os mesmos estejam intimamente relacionados com os objetivos dos sistemas

aos quais devem servir, tendem a comprometer tanto o alcance dos objetivos quanto

a validade dos resultados do sistema.

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73

3.6.3 Os Instrumentos de Avaliação

A variada gama de possibilidades de instrumentos de avaliação pode ser

verificada na seção 3.5 – Os Instrumentos de Avaliação, bem como os pontos

positivos e negativos de cada um e a importância da construção do instrumento.

Todavia, é curioso observar que, com exceção da UFU, todos os órgãos

pesquisados utilizam instrumentos bastante semelhantes, ocorrendo poucas

variações entre eles.

A Escala Gráfica é o instrumento utilizado por eles, sendo que a EMBRAPA

utiliza dois formulários, um buscando atingir os objetivos relacionados com o

desenvolvimento pessoal do avaliado e o outro, chamado de avaliação

complementar, relacionado aos objetivos de premiação, como promoção e

progressão salarial.

É interessante notar o peso que é dado por atividades no formulário de

avaliação de desempenho. Todavia, a despeito destes pesos buscarem brindar o

instrumento com uma maior precisão, dois problemas emergem.

Inicialmente, tem-se a questão de que “no serviço público, entre os problemas

enfrentados para a avaliação de desempenho, está a definição genérica de cargos e

funções” (Brasil, 2000a). Ou seja, mesmo que o peso vise a obtenção de uma

medição mais precisa, se o que se deve medir não é definido corretamente, a

validade da medição obtida certamente não poderá ser tomada como totalmente fiel

à realidade.

Além disso, um instrumento fechado, no qual pontuações indicam o patamar de

desempenho individual, dificilmente é capaz de fornecer os subsídios realmente

necessários à adoção de medidas de desenvolvimento pessoal. Esta observação

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74

não se restringe ao instrumento utilizado pela EMBRAPA, sendo estendível aos

instrumentos utilizados pelos demais órgãos.

A DRF/Belém utiliza três formulários em seu sistema: formulário de

competências, formulário de contratação e avaliação de metas e formulário de

síntese da avaliação. Destacando-se neste caso a escala composta por cinco

conceitos distintos, o que pode contribuir para a ocorrência do efeito de tendência

central.

Instrumentos similares são utilizados pela FJN, SERPRO e SFC, com as

seguintes particularidades: o sistema da FJN também adota pesos distintos para

fatores, o do SERPRO é informatizado e o da SFC também é possuidor de

características que podem contribuir para a ocorrência do efeito de tendência

central.

O instrumento utilizado pela UFU pode ser classificado como uma pesquisa de

campo, seguindo a taxionomia apresentada na seção 3.5 – Os Instrumentos de

Avaliação. São dois os formulários utlizados, sendo um para a auto-avaliação do

funcionário e outro para a avaliação feita pelo grupo. O mais interessante é que este

é o único caso, dentre os descritos, que não utiliza um sistema fechado, ou seja, o

resultado não é um simples conceito ou índice final.

A apresentação dos instrumentos de avaliação utilizados, em contraste com os

métodos e os objetivos dos diversos sistemas permite concluir que, em linhas gerais,

há uma série de incongruências internas e deficiências a serem corrigidas na

maioria dos órgãos apresentados.

Estas encontram-se deste as definições de objetivos antagônicos entre si,

passando pela escolha de métodos que não contribuem para a consecução dos

objetivos estabelecidos, culminando com a escolha de instrumentos que vem

Page 76: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

75

agravar ainda mais os problemas trazidos pela errônea escolha de alguns dos

métodos e que fazem suscitar novos.

Ademais, a maioria dos sistemas peca por uma instrumentalidade excessiva,

instrumentalidade essa no sentido dado pela seção 3.2 – Considerações Gerais

sobre o Desempenho Humano – à maneira positivista de se abordar a questão da

motivação para o trabalho. Porém, mesmo que se considerasse válida esta

abordagem, a crítica feita acerca da descrição genérica dos cargos e funções

acabaria por suscitar problemas de validade na medição dos instrumentos, fazendo

com que tais problemas refletissem na validade do próprio sistema.

Os vários problemas verificados nos sistemas apresentados encontram eco nos

resultados de algumas pesquisas sobre avaliação de desempenho, as quais são

apresentadas na seção que se segue.

3.7 Resultados de outras Pesquisas

Por mais controversa e polêmica que se apresente, mesmo sendo reconhecida

como um tema de grande importância, a avaliação de desempenho não tem sido

objeto de muitos trabalhos acadêmicos. Pode-se especular pelas razões que levam

a esta situação, somente especular, mas não afirmar.

Justamente por se tratar de um tema controverso, talvez alguns acadêmicos

prefiram não se expor em demasia ao julgamento que deles se fará por adotar uma

ou outra posição com relação ao tema, pois é praticamente impossível ingressar na

seara de uma polêmica mantendo-se neutro com relação a mesma.

Outro motivo, ainda, reside na questão da instrumentalidade. Para os adeptos

da Teoria da Motivação e das correlatas que embasariam a avaliação de

desempenho, esta seria apenas conseqüência da operacionalização dos

Page 77: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

76

pressupostos da teoria na prática organizacional. Portanto, a questão da avaliação

de desempenho passaria a ter um papel secundário ou intelectualmente menos

estimulante.

Entretanto, acredita-se que o apresentado na seção 3.2 – Considerações Gerais

sobre o Desempenho Humano – já é suficiente para mostrar como a avaliação de

desempenho está longe de ser intelectualmente menos estimulante, tampouco

conseqüência simples da aplicação de teorias sobre motivação e afins.

Desta forma, apresenta-se a seguir as pesquisas sobre avaliação de

desempenho relatadas em dissertações de Mestrado de algumas instituições, sendo

as mesmas dispostas das mais recentes para as mais antigas.

De forma a sistematizar as apresentações das pesquisas, bem como fazê-las de

forma suscinta, opta-se por apresentar o objetivo principal, a metodologia utilizada e

as conclusões. Quando for o caso, algumas observações adicionais são feitas.

A pequisa de Lang (2001, p. 3) teve por objetivo

“fornecer uma visão geral sobre a teoria e realidade e relacionar os indicadores

capazes de auxiliar a implantação de um programa de Avaliação de Desempenho

Humano”.

A metodologia utilizada foi tanto a bibliográfica quanto a pesquisa de campo, a

qual se constituiu de entrevistas efetuadas em uma organização.

Das conclusões da pesquisa, cabe destacar:

- há uma grande lacuna entre a teoria e a prática na avaliação de

desempenho;

- necessidade de um preparo e melhoria da capacitação técnica dos

profissionais relacionados aos recursos humanos durante a implantação

do sistema;

Page 78: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

77

- importância da divulgação ampla e clara do programa de avaliação de

desempenho a todos os integrantes da organização;

- importância do estabelecimento conjunto entre avaliadores e avaliados

dos objetivos a serem alcançados;

- necessidade de flexibilidade do sistema para se adequar tanto ao tipo de

organização, quanto ao setor da mesma e para ser modificado quando

necessário; e

- necessidade de conhecimento da cultura da organização para a que o

sistema adotado seja eficaz.

A segunda pesquisa apresentada é a de Gago (2001), cujo objetivo era (p.20)

“identificar os procedimentos de Avaliação de Desempenho utilizados atualmente

pela Unicred Florianópolis, verificando sua compatibilidade com as teorias das

Organizações em Aprendizagem”.

Para que tal objetivo fosse alcançado, utilizou-se da pesquisa bibliográfica e

documental, aliada à pesquisa de campo, constituida de questionários e entrevistas

não estruturadas.

As conclusões da pesquisa foram:

- o modelo de avaliação de desempenho adotado devará ser construído

considerando-se as peculiaridades culturais da organização;

- este também deverá ser guiado pela maneira como a organização avalia

seus resultados, para que haja compatibilidade entre como os gerentes

são avaliados e como esses avaliam seus subordinados;

- o modelo deverá ser construído com a participação de todos os

envolvidos no sistema; e

Page 79: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

78

- devido à posturas partenalistas e autocráticas da organização, o objetivo

de desenvolvimento das pessoas não é atingido.

Farah (2000) é o autor da terceira pesquisa, cujo objetivo foi o de

“verificar a consistência entre um certo conjunto de valores [éticos] aceitos

consensualmente e a conduta das empresas em relação a seus empregados, conduta

essa que se expressa, entre outras ações, na prática dos processos avaliativos” (p.8).

A lista de valores utilizada foi definida com base nas convenções da

Organização Internacional do Trabalho e na Declaração Universal dos Direitos do

Homem, da Organização das Nações Unidas, vistos sob à ótica da Ética Humanista.

A metodologia utilizada constituiu-se de pesquisa bibliográfica e pesquisa de

campo, a qual constituiu-se de um questionário enviado a 260 empresas, das quais

34 responderam.

A principais conclusões da pesquisa foram:

- os sistemas são, em sua quase totalidade, subjetivos, não baseados em

evidências factuais;

- somente a Avaliação por Objetivos e por Incidentes Críticos são

“eticamente promissores” – os demais não o são (Comparação aos

Pares, Distribuição Forçada, Ordenamento, Escolha Forçada e Escalas

Gráficas);

- os processos avaliativos são injustos, pois: faltam mecanismos capazes

de assegurar a consistência das avaliações, eles impõem discriminação

com respeito às categorias que devam ser avaliadas, são mais rigorosos

em cobrar o desempenho do que em fornecer informações prévias sobre

o desempenho esperado, não examinam as queixas dos funcionários

sobre o sistema de avaliação, avaliam a personalidade do funcionário e

Page 80: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

79

não o seu desempenho e são omissos no treinamento das pessoas para

a avaliação, na revisão das avaliações anteriores e na difusão das

normas dos sistemas; e

- há uma predominância de preceitos antiéticos nas normas de Avaliação

de Desempenho na maioria das empresas, denotando falta de

preocupação moral do processo avaliativo.

O objetivo da pesquisa de Campos (1999, p. 2), quarta a ser apresentada, foi o

de

“examinar o quanto as práticas de avaliação de desempenho de uma empresa,

estruturada em centros de responsabilidade, se aproxima do ideal, ou seja, daquilo

que é preconizado pela teoria, exposta na literatura de controle de gestão”.

Bastante peculiar nesta pesquisa é tanto a aproximação que se faz dos temas

do controle de gestão e avaliação de desempenho, como a correlação presumida

entre desempenho individual e organizacional, tendo-se a impressão, em alguns

pontos do relatório, de não se saber se o pesquisador está tratando do desempenho

individual ou do organizacional.

Além de bibliográfica, foi feita pesquisa de campo com base em entrevistas.

Estas, com o apoio da documentação da organização sobre seu sistema de

avaliação de desempenho, foram confrontadas com o preconizado pela literatura de

controle de gestão.

Resumidamente, as principais conclusões da pesquisa foram os seguintes:

- há um hiato entre a prática da organização e a teoria estudada;

- o sistema de avaliação de desempenho é importante para motivar os

funcionários, alinhando os objetivos individuais com os globais;

Page 81: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

80

- o sistema utilizado é considerado injusto, pois foca somente os

resultados financeiros obtidos;

- tal injustiça leva à desmotivação dos funcionários;

- o sistema de avaliação de desempenho aperfeiçoa o controle; e

- a descontinuidade de gestão, originada por questões de cunho político,

tem gerado problemas para o aproveitamento dos resultados da

avaliação de desempenho.

A quinta pesquisa é a de Silva (1999, p. 6), cujo objetivo foi o de “propor um

instrumento de avaliação de desempenho de recursos humanos utilizando-se o

sistema de Custeio Baseado em Atividades (ABC) como suporte”.

A metodologia utilizada foi a bibliográfica, aliada com a pesquisa-ação, na

medida em que, partindo da pesquisa bibliográfica, propos-se o modelo que foi

testado em uma unidade de uma empresa prestadora de serviços.

As principais conclusões as quais se chegou pela pesquisa foram:

- a falta de integração entre a avaliação de desempenho individual e as

estratégias organizacionais distanciam as pessoas dos resultados da

organização; e

- os resultados e a aplicação do método são positivos, no sentido de que,

corretamente aplicado, ele é capaz de fornecer subsídios para diminuir o

caráter comportamental do processo.

O aspecto mais interessante desta pesquisa é que a unidade da organização

estudada é composta das lojas de atendimento ao público de uma concessionária de

serviços públicos. Portanto, esta é uma unidade que não tem outra fonte de receita

que não os recursos advindos do orçamento da empresa.

Page 82: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

81

Este fato é importante, inclusive para possíveis discussões acerca da

generalização ou não da aplicação método, haja vista o mesmo se utilizar do

sistema de Custeio Baseado em Atividades, o que poderia sugerir uma não

aplicabilidade a organizações do setor público, isso sem se entrar no mérito do

mesmo neste presente trabalho.

A pesquisa de Marques (1994, p.8) teve por objetivo:

“discutir os atuais pressupostos em que se fundamentam as relações de trabalho no

pradigma vigente de modo a permitir às organizações um novo olhar nos atuais

modelos de avaliação de desempenho”.

A metodologia consistiu-se da observação, aliada a entrevistas e análise de

documentos de seis organizações, três do setor público e três do setor privado,

baseando o trabalho também em ampla bibliografia sobre avaliação de

desempenho, o homem no trabalho e organizações.

A escolha de organizações do setor público e privado pode levar à expectativa

de que as conclusões apresentarão um comparativo entre os setores, expectativa

essa que é frustada, pois as conclusões apresentadas são gerais. Todavia, tal fato

não chega a ser demeritório para a pesquisa, a qual apresenta um aprofundamento

teórico bastante considerável, em especial em comparação com as demais

pesquisas aqui apresentadas.

Suas principais conclusões foram:

- há uma dissonância entre o discurso das organizações e as práticas –

por exemplo, fala-se em liberdade e criatividade necessárias ao

funcionário, mas se exige comportamento padronizado;

- independente dos objetivos do sistema de avaliação de desempenho,

percebe-se que todos são classificatórios;

Page 83: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

82

- é também expressivo o foco dos sistemas nas metas e não no

aperfeiçoamento das pessoas ou na geração do conhecimento;

- as organizações têm visão reducionista sobre a avaliação de

desempenho, o que leva à criação de mecanismos de práticas

antagônicas e perpetuadoras do status quo;

- quando se busca o aprimoramento do sistema, as mudanças

implementadas simplesmente ocorrem em termos de forma, o que

acarreta na obtenção dos mesmos resultados; e

- os modelos utilizados contemplam somente fragmentos da organização

e não o todo.

“Avaliar a percepção do executivo sobre a validade e utilidade do Sistema de

Avaliação de desempenho” foi o objetivo da pesquisa de Agostinho (1992, p.11).

Para tal, a pesquisadora procedeu sua pesquisa de campo, utilizando-se de

questionários fechados, aliada à pesquisa bibliográfica.

As principais conclusões da pesquisa, apontam para a percepção dos

executivos para a Avaliação de Desempenho como:

- sendo um mecanismo eficiente para indicar potencial;

- somente através dela poderão ser identificadas as alternativas de

funções a serem desempenhadas;

- sendo capas de detectar as limitações e potenciais dos funcionários,

havendo preocupação da empresa em atender essas questões;

- dotada de instrumentos e critérios adequados;

- sendo o feedback apropriado, possibilitando que os empregados

melhorem; e

Page 84: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

83

- não havendo predominante opinião sobre a necessidade de revisão e

atualização dos sistema de Avaliação de Desempenho.

Apesar de não ter sido o escopo dessa pesquisa, cabe a observação de que,

considerando especialmente o objetivo de desenvolvimento do funcionário, a

percepção dos executivos deve ser confrontada com a dos funcionários para que se

possa atestar a eficácia do sistema. Porque se estes o consideram injusto ou

incapaz de apontar deficiências, dentre outros pontos, dificilmente eles darão crédito

ao feedback do sistema e, conseqüentemente, adotarão as medidas necessárias

para o seu desenvolvimento.

O escopo da pesquisa de Lemos (1981) é bastante peculiar, o que se pode ver

pelo seu objetivo, que veio a ser a verificação da aplicabilidade da Análise

Discriminante como mecanismo de fornecimento de informações para o

Departamento de Recursos Humanos sobre a avaliação de desempenho no que

tange à inferência da homogeneidade dos avaliadores no julgamento dos fatores de

avaliação, na identificação dos fatores que mais contribuem para homogeneizar a

avaliação e na elaboração de um programa de treinamento para a homogeneização.

Para tal, ele pesquisou uma organização na qual se comparou a avaliação de

desempenho de dois distintos grupos avaliados por diferentes avaliadores, todos

escolhidos aleatoriamente, mediante a utilização do método de Análise

Discriminante.

Suas conclusões são apresentadas de forma simples, dando-se mais ênfase

aos resultados estatísticos do que às consequências dos resultados, o que deveria

ser o esperado, haja vista o objetivo da elaboração de um programa de treinamento,

do qual o pesquisador se ocupa bem superficialmente. Em resumo tem-se que:

Page 85: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

84

- foram encontradas correlações entre fatores nas avaliações, bem como

diferenças significativas entre os dois grupos avaliados, evidenciando a

falta de homogeneidade de julgamento por parte dos avaliadores; e

- foram identificadas, para a organização pesquisada, três fatores os quais

mais contribuem para a homogeneização das avaliações.

É importante ressaltar que, apesar de não estar explícito no relatório, pode-se

deduzir que a organização pesquisada não possuía um treinamento para os

avaliadores. Tal dedução baseia-se tanto na não citação de tal treinamento, quanto

no objetivo de se elaborar um programa de treinamento. Caso houvesse,

provavelmente o pesquisador utilizaria a expressão reformular o programa.

As pesquisas apresentadas nesta seção, a despeito de tratarem de objetivos

diferentes, são convergentes quanto às suas conclusões. Resumindo os pontos

principais apontados pelos pesquisadores, pode-se dizer que há uma distância entre

a teoria e a prática da avaliação de desempenho nas organizações. Tal distância

pode, ao mesmo tempo, ter como parcela de causa e como parcela de

conseqüência o fatos dos sistemas serem injustos e até antiéticos. Para isso,

também contribuem a parcialidade com que os avaliadores efetuam suas avaliações.

Outra causa apontada para a distância entre a teoria e a prática da avaliação

está no desconhecimento quanto à cultura da organização no qual o sistema é

implantado. Sendo que esta última causa, apesar de bem alinhada com a seção 3.2

– Considerações Gerais sobre o Desempenho Humano, na verdade só abrange

parte dessas deficiências, pois são os próprios pressupostos sobre o desempenho

humano que merecem um estudo mais minucioso.

Por fim, a percepção da avaliação de desempenho por parte dos executivos

aponta para uma direção totalmente oposta, fazendo crer que ou há uma miopia

Page 86: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

85

quanto a realidade da avaliação ou, como são os principais avaliadores, eles não

criticam os sistemas com medo, mesmo inconsciente, de estarem se auto-criticando

como avaliadores.

Page 87: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

4 TRANSFORMAÇÕES SÓCIO-CULTURAIS DA SOCIEDADE E SUAS

IMPLICAÇÕES PARA O EXÉRCITO BRASILEIRO

4.1 Considerações Iniciais

É lugar comum falar-se das transformações pelas quais o mundo vem passando

nos últimos anos. Tão lugar comum que por vezes pode ser interpretado como clichê

acadêmico na tentativa de se valorizar o próprio trabalho ou de se demonstrar a

atualidade ou pertinência do mesmo.

Independente das críticas, muitas vezes justificadas, feitas a tais abordagens,

ao se tratar de uma instituição como o Exército Brasileiro, possuidora de mais de

180 anos de história, certamente se justifica tal necessidade. Necessidade ainda

mais acentuada se forem consideradas as suas características de instituição total,

tal qual descreve Foucault (1987, p. 117) ao falar de disciplina:

“o soldado tornou-se algo que se fabrica; de uma massa informe, de um corpo

inapto, fez-se a máquina de que se precisa; corrigiram-se aos poucos as posturas;

lentamente uma coação calculada percorre cada parte do corpo, se assenhoreia dele,

dobra o conjunto, torna-o perpetuamente disponível, e se prolonga, em silêncio, no

automatismo dos hábitos”.

Mesmo quando se trata de um assunto específico, tal qual a Avaliação de

Desempenho, ainda sim não é somente justificada, senão necessária, tal

abordagem.

Page 88: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

87

Mauss (1974) trata cada fato social como sendo um “fato social total”. Por este,

entende-se que o todo deve ser considerado ao se analisar um aspecto particular,

mais especificamente, aquelas inter-relações com os demais campos do

conhecimento. Em suas próprias palavras (ibidem, p. 199), “quer estudemos fatos

especiais ou fatos gerais, no fundo é sempre com o homem completo que temos de

lidar”.

Esta abordagem vem justamente ao encontro da crítica de Guerreiro Ramos

(1981), apresentada na seção 3.2 – Considerações Gerais sobre o Desempenho

Humano, o que reforça ainda mais a importância de se considerar a contribuição das

demais Ciências Sociais no estudo das organizações.

4.2 A Importância da contribuição das demais Ciências Sociais

A ciência, com a finalidade de compreender o mundo, foi se dividindo ao longo

do tempo, à medida que determinado campo do conhecimento se apresentasse

complexo e grande o suficiente que justificasse a necessidade de uma ciência

específica para estudá-lo.

Entretanto, as divisões surgidas muitas vezes criaram barreiras quase que

intransponíveis entre as diversas ciências, pois cada uma parece esquecer-se da

heterogeneidade com a qual o mundo se apresenta e se julga capaz de, a partir do

seu ponto de vista, compreendê-lo. Todavia é esquecido ser justamente “o homem

que introduz a heterogeneiradade à natureza” (Dejours, 1997, p. 74).

Se na natureza em geral o homem introduz a heterogeneidade, pode-se inferir

também que cada parte componente da natureza também encerra em si um grande

número de distintos aspectos que são objetos de estudos particulares, mas que

também foram introduzidos pelo homem. Nestas partes, se encontra o próprio

Page 89: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

88

homem, o qual pode ser estudado sob vários prismas, mas que, para ser melhor

compreendido, não pode ser limitado à visão de somente um deles.

“para a teoria crítica [frankfurtiana], o homem não pode ser visto isolado de seu

contexto social, quer em sociedade, onde se manifestam relações de classe, quer nos

subsistemas de produção, local no qual se reproduzem essas manifestações sob a

divisão hierarquizada” (Tenório, 2000, p.37).

Desta forma, já se pode perceber que o ser humano no trabalho não pode ser

compreendido totalmente por abordagens que encerrem a sua compreensão aos

limites da psicologia, sendo necessário agregar outros conhecimentos.

Todavia, a consciência dessa necessidade nem sempre é tão óbvia, pois cabe

recordar que o pensamento racional-positivista está intrinsecamente relacionado à

forma como são vistas a gestão das organizações e das pessoas, gerando uma

“concepção mecânica e energética da gestão que ainda subsiste até nossos dias, a

despeito de todas as críticas que lhe foram feitas” (Chanlat, 1999, p. 38).

E essas críticas, além das já apresentadas, podem ser encontradas tanto no

simples questionamento da eficácia daquele tipo de abordagem na gestão das

organizações (Solé, 2000), quanto na assertiva do imperioso de se adotar uma visão

sociológica sobre o fenômeno (Douglas, 1998) ou até mesmo na dialética entre a

sociedade e o indivíduo (Migueles, 1999).

Mesmo quando se tem consciência da necessidade da utilização das demais

Ciências Sociais para a compreensão do homem e da organização, a transposição

dessa consciência para a prática não se revela instantânea, tampouco fácil de

ocorrer.

Vários motivos concorrem para que tal transposição não ocorra. Douglas (1998,

p. 87) aponta para o fato de que “os psicólogos são institucionalmente incapazes de

lembrar que os seres humanos são seres sociais. Assim que tomam consciência

Page 90: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

89

desse fato, esquecem-no”. Quando este não é o caso, pode ocorrer a dificuldade da

utilização de distintas abordagens concomitantemente, sem se conseguir identificar

qual a linearidade a ser seguida, especialmente se for relembrado que a formatação

do pensamento cartesiano demanda a linearidade.

Este, todavia, não se apresenta como sendo uma dificuldade a qual não se

possa transpor. Considerando que “o fator humano é marcado pelo selo do histórico,

do social, do contextual” (Dejours, 1997, p. 76), tem-se que estes selos devem ser

compreendidos e analisados a priori.

Mais além, pode-se considerar cada selo como sendo um subsistema de ação

social (Castro, 2002), havendo uma hierarquização entre entres, sendo que os mais

altos na hierarquia regulariam os demais. Desta forma, ter-se-ia o cultural como o

grande regulador, seguido pelo social, pelo psíquico e pelo biológico.

Obviamente não se pode supor que os subsistemas abaixo na hierarquia não

influenciem os primeiros, já que, apesar dos primeiros regularem os demais, isso só

se faz possível se houver a capacidade de replicação prática daquilo que o cultural e

social regulam. Em outras palavras, há um constante realinhamento entre as

demandas do cultural e do social e a capacidade de atendimento destas que, por

sua vez, também podem ser balizadas por essa capacidade, o que não chega a

caracterizar uma relação dialética entre os subsistemas, mas de forte

interdependência.

E não somente é importante que todos os subsistemas sejam considerados,

como também a prática da gestão sob o prisma único da psicologia acaba também

por se revelar contraproducente (Chanlat, 1999).

Antes, porém, que seja mal interpretado o que se coloca nesta seção, é

importante ressaltar que

Page 91: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

90

“o que nós reclamamos não é a erradicação de disciplinas, com objetos próprios e

métodos diferenciados, mas o reconhecimento do direito e mesmo do dever de

circular, a valorização do livre trânsito, o levantamento de barreiras à associação

com pessoas diferentes, sociólogos, economistas, psicólogos, biologistas, filósofos,

administradores e tantas outras disciplinas que consideram o homem com ser vivo,

consciente e sociável [sic]” (Chanlat, 1999, p.64).

Ou seja, em resumo, o mais importante é ter a consciência de que a

consideração da contribuição de cada disciplina para o estudo do homem não

somente é recomendada, como se revela como um verdadeiro imperativo para que o

objeto do estudo seja melhor compreendido.

Recordando a questão das hierarquias dos subsistemas, se for considerado que

“as instituições estão se tornando mais culturais em seu caráter” (Lash, 1997a, p.

245), é mister que se busque examinar as razões de tal fenômeno e, então, se

procure visualizar as implicações desse movimento para a gestão das mesmas, com

o intuito de se poder estabelecer um quadro mais completo do homem na

organização.

Ao se estudar qualquer assunto específico em gestão, isso não deve ser feito

especificamente per se, já que as condições culturais e sociais que a motivaram

podem ter mudado.

Assim, para que o estudo sobre o sistema de Avaliação de Desempenho do

Exército Brasileiro apresente resultados mais elucidativos para os problemas que

enfrenta, faz-se necessário um aprofundamento sobre o que cerca, as condições

nas quais foi concebido e é aplicado. Ainda mais, sendo um instrumento, e não uma

teoria, a compreensão da utilização dele será invariavelmente dependente desta

visão.

Page 92: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

91

4.3 O Fenômeno Pós-Moderno

A culturalização das instituições, se assim for resolvido alcunhar o movimento

identificado por Lash (1997a), é vista e interpretada por diversos autores de forma

distinta. No que há maior convergência, entretanto, são que as mudanças não

somente vêm acontecendo, como também é no indivíduo que suas conseqüências

podem ser percebidas em primeiro lugar.

A esta época de mudanças, alguns autores rotulam como sendo o Pós-

Modernismo (Hall, 2001; Motta, 1997; Castro; 2002). Podendo ainda receber o nome

de Modernização Reflexiva (Beck, 1997a), Modernidade Reflexiva (Lash, 1997b),

Terceira Onda (Srour, 1998) ou ainda Sociedade Pós-Tradicional (Giddens, 1997).

Obviamente que não somente os rótulos são vários. Como já foi dito, algumas

características atribuidas aos fenômenos são vistas de forma distinta por cada autor.

Todavia, antes de se apresentarem como abordagens antagônicas, as mesmas

podem e devem ser vistas como complementares, pois fato é que, se for

considerado como um fenômeno ainda em curso, não há como qualquer um delas

isoladamente conseguir compreendê-lo por completo.

Partindo para análise da identidade, como ponto de percepção das

conseqüências das mudanças para os indivíduos, Hall (2001) apresenta três

concepções culturais. São elas: o sujeito do Iluminismo, o sujeito sociológico e o

sujeito pós-moderno.

O sujeito do Iluminismo seria um indivíduo totalmente centrado, unificado,

dotado das capacidades da razão, de consciência e da ação. Em resumo, “o centro

essencial do eu era a identidade de uma pessoa” (ibidem, p. 11). Ou seja, uma

concepção que se apresenta ao mesmo tempo individualista e valorizando a razão.

Page 93: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

92

A complexidade do mundo moderno, surgida após a Revolução Industrial, gerou

a noção do sujeito sociológico. Neste sujeito,

“a identidade é formada na ‘interação’ entre o eu e a sociedade. O sujeito ainda tem

um núcleo ou essência interior que é o ‘eu real’, mas este é formado e modificado

num diálogo contínuo com os mundos culturais ‘exteriores’ e as identidades que

esses mundos oferecem” (idem).

Por fim, o sujeito pós-moderno, caracteriza-se como não sendo possuidor de

uma identidade fixa, esta

“torna-se uma ‘celebração móvel’: formada e transformada continuamente em

relação às formas pelas quais somos representados ou interpelados nos sistemas

culturais que nos rodeiam” (ibidem, p. 13).

Ou seja, o sujeito pós-moderno deixa de ser visto como alguém unificado,

moldando-se aos sistemas culturais com os quais haja o sentimento de pertença por

parte dele. Nas palavras de Beck (1997a, p. 19), “o eu [self] não é mais o eu

inequívoco, mas se tornou fragmentado em discursos fragmentados do eu”.

Mas como as estruturas que cercam o cotidiano do indivíduo não se adaptam

tão rapidamente à nova realidade quanto esta atua e modifica o indivíduo, os

discursos das instituições, ainda evocando o sujeito unificado, podem acabar

fazendo com que os indivíduos levem a fragmentação para o interior das

organizações, desejando vivê-las lá, o que traz conseqüências para elas.

A compreensão das implicações para as organizações, porém, exige uma

melhor compreensão de como as mudanças se processam, o que, obviamente, não

é limitado à questão da identidade.

E isso não se limita à detecção da ocorrência delas, mas principalmente

perceber que as mudanças ocorrem sobre um novo paradigma (Wood Jr, 2002), o

Page 94: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

93

que significa também dizer que a própria mudança em si está mudando

(Rothwell,1994).

A primeira recomendação que deve ser dada para qualquer um que busque

compreender os fenômenos é a de olhá-los sob perspectivas diferentes daquelas

utilizadas até então para a compreensão do ambiente e das suas implicações para

as organizações.

A análise da abordagem de Motta (1997), por exemplo, pode transmitir a falsa

idéia de que o fenômeno pós-moderno ocorre em todos as sociedades e, em

conseqüência, em todas as organizações destas sociedades, delineando-nos um

futuro que proporcionará um maior bem estar a toda a sociedade.

Beck (1997a, p. 25-26), ao falar de “individualização”, coloca que a

fragmentação do eu depende da “desintegração das certezas da sociedade

industrial”, bem como coloca que as novas certezas criadas apresentam-se

globalmente interdependentes.

A Modernização Reflexiva, então, ao se processar nas diversas sociedades,

seria fortemente determinada por questões de como se organiza e qual a dinâmica

industrial e qual a influência do papel desempenhado pela globalização na vida de

cada sociedade.

Se isso contraria a abordagem de Motta (1997) por um lado, esta determinante

advinda da interação globalização e industrialização vai ao encontro da abordaqem

de Srour (1998).

Motta (1997), ao apresentar os benefícios trazidos pela pós-modernidade para o

trabalho e a sociedade, os apresenta como sendo um fenômeno generalizável, o

que é contestado por Srour (1998). Motta (1997) havia colocado a modernidade

como elemento de aumento das desigualdades mundiais. Apesar dele não colocar

Page 95: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

94

de forma explícita, tem-se a nítida impressão de que sua conclusão é no sentido de

que tais distorções seriam corrigidas pela pós-modernidade. Srour (1998), por outro

lado, coloca de maneira bem clara que, ao contrário de corrigidas, as fortes

assimetrias existentes serão mantidas pela globalização.

Enquanto nos países desenvolvidos poderão ser observados muitos dos

fenômenos apresentados por Motta (1997), bem como outros apresentados por

Srour (1998), os países do terceiro mundo continuarão a ser vítimas dos males da

modernidade, bem como não serão contempladas com as bênçãos da pós-

modernidade, como indústrias limpas e valorização do ser humano no trabalho. Tais

fatos já podem ser verificados atualmente no mundo, já que as grandes marcas da

indústria mundial possuem seus centros de pesquisa, design e gerencial em países

do primeiro mundo, enquanto seus produtos são fabricados em países do terceiro,

onde, na grande maioria das vezes, as condições de trabalho são bastante inferiores

àquelas dos países de primeiro mundo, os salários pagos são consideravelmente

menores e a legislação ambiental é normalmente muito menos rígida (e a sua

aplicação também).

Neste sentido, as assimetrias podem ser vistas inclusive com relação à própria

velocidade e profundidade com as quais as mudanças se processam em cada

sociedade, formando um ciclo que se retroalimenta.

Este ciclo apresenta uma face relativa à dicotomia do sujeito pós-moderno em

organizações modernas, na qual o sujeito precisa se libertar das estruturas sociais

modernas para que plenamente seja tal sujeito (Lash, 1997b) e uma outra

considerando “a capacidade de refletir sobre as condições sociais de sua existência

e, assim, modificá-las” (Beck, 1997b, p. 207) como aquilo que permite ao sujeito a

sua libertação.

Page 96: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

95

Ou seja, a capacidade de reflexão é necessária à libertação do sujeito das

amarras das organizações modernas. Por sua vez, enquanto o indivíduo estiver lá

preso, sua capacidade de reflexão sobre as condições e de modificação delas não

será plena. Isso, então, pode se apresentar como um ciclo virtuoso ou vicioso,

dependendo do grau de interação da sociedade com o universo industrial e

globalizado.

Só que isso não tem implicações somente para os indivíduos. Quando se opera

em ambiente globalizado, no qual a sociedade como um todo é receptora dos

movimentos de mudanças, o agora paradoxo de pessoas pós-modernas em

organizações modernas pode ter como conseqüências o aumento da insastifação no

trabalho e a queda da produtividade.

Isto posto, cabe às organizações buscarem conhecer as mudanças pelas quais

as sociedades nas quais estão inseridas vêm passando e, principalmente,

descortinarem as implicações que estas mudanças trazem para as suas gestões.

4.4 Implicações da Pós-Modernidade para a Gestão das Organizações

Todo este novo ambiente complexo e em rápida transformação traz

conseqüências para a dinâmica interna das organizações. Conforme já dito, é por

demais importante a compreensão das implicações para as organizações dos

fenômenos que ocorrem na sociedade para que, antes de mais nada, elas

sobrevivam.

Todavia, a tarefa de abordar as implicações da Pós-Modernidade para a Gestão

das Organizações revela-se extremamente ardilosa. Em primeiro lugar porque, por

se tratar de um fenômeno extremamente dinâmico, no qual uma série de

interdependências estão envolvidas, qualquer alteração em uma das variáveis pode

Page 97: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

96

mudar todo o quadro final, o que torna a análise um trabalho bastante complexo, se

não meticuloso.

Além disso, a generalização pode se mostrar incapaz de atender às

necessidades específicas das organizações, tanto pela questão do grande número

de interdependências, quanto pelo caráter fragmentado do fenômeno, o que faz com

que cada caso mereça uma análise particular. Por este motivo, então, é que se

busca uma análise particular das implicações para o Exército Brasileiro na próxima

seção.

Entretanto, a despeito das dificuldades apresentadas, algumas características

comuns das implicações insinuam-se em meio as interdependências. Desta forma,

longe de esgotar o assunto, estas características comuns serão apresentadas nesta

seção.

Dejours (1997, p. 13) coloca que “todos os que trabalham [...] são pressionados

a ter um certa concepção sobre o funcionamento do ser humano”, pressão essa que

se revela ainda maior para os que ocupam cargo executivo, especialmente por

serem os executivos aqueles sobre os quais recaem, entre outros, o dever de avaliar

o desempenho de seus subornidados.

Entretanto, o que vem a ser concepção sobre o funcionamento do ser humano é

uma questão tão fundamental quanto a própria pressão para que tal concepção seja

criada. Dilema este que emerge da própria pós-modernidade.

Quando se busca identificar como a pós-modernidade reflete na gestão das

organizações, mais especificamente nos recursos humanos, costuma-se evocar a

dicotomia entre a gestão objetiva e subjetiva das pessoas na organização. Pois

enquanto esta seria uma necessidade advinda com a pós-modernidade, aquela seria

característica da gestão moderna.

Page 98: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

97

Davel et Vergara (2001) apresentam a importância de se considerar os aspectos

subjetivos na gestão de recursos humanos. Segundo eles (ibidem, p. 32), “como a

subjetividade, normalmente, atrelada ao ‘ser’, tanto quanto a objetividade,

normalmente, atrelada ao ‘ter’, merece atenção na gestão organizacional”.

Especificando mais um pouco, tem-se que

“o modo ter (possuir) origina-se do fator biológico do desejo de sobrevivência,

enquanto o modo ser (partilhar) é impulsionado pelas condições específicas da

existência humana e pela necessidade inerente de ultrapassar o isolamento e

socializar-se” (idem).

Ou seja, apesar de ambos estarem presentes na composição do ser humano, a

visão mecanicista do homem que imperava até a época moderna fazia com que

somente o aspecto objetivo da gestão das pessoas fosse considerado, ou, no

máximo, que se destinasse uma posição secundária para a subjetividade.

A abordagem de Davel et Vergara (ibidem) tem a limitação de tratar a

subjetividade e a objetividade na organização como dois opostos imiscíveis.

Tratamento este que pode ser questionado. Afinal de contas, até que ponto um não

define o outro?

Thompson et McHugh (1994) vêm justamente responder a este questionamento,

quando apresentam que as diversas interações vividas pelas pessoas no trabalho

vão construindo suas identidades. E, indo mais além, as diversas interações que

ocorrem em contextos sociais distintos faz com que as pessoas acabem por

desempenhar papéis distintos nesses respectivos contextos.

O grande mérito de Thompson et McHugh (idem) é o fato deles buscarem a

convergência entre as abordagens psicológica e sociológica da gestão de pessoas.

Tal convergência fica clara ao colocarem que

Page 99: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

98

“personal, subjective identity consists of the meanings and images we have found to

represent us accurately in the past. Social identity, where it is different from the

former, consists of the negotiated position between our personal identity and the

meanings and images demanded of us in our current social context”1 (ibidem, p.

289-290).

Apesar do contexto social atual ser apresentado como o da pós-modernidade,

não se pode esquecer que ele também é composto pelos contextos das

organizações às quais o indivíduo pertence, tendo portanto, as interações indivíduo

– organização um peso para a definição das implicações da pós-modernidade para a

gestão.

Este tipo de interação faz emergir a real dicotomia que há, que pode ser

constatada na imensa maioria, se não totalidade, das organizações: o homem pós-

moderno amarrado à instituições modernas.

Neste contexto, em que a consciência social das pessoas as permite modificar

as condições de existência (Beck, 1997b), sendo que as amarras modernas das

instituições não permitem que as pessoas adquiram tal capacidade de forma plena

(Lash, 1997b), é desenrolado um jogo no qual se contestam tradições, mas as

organizações se defendem como se a contestação às tradições significasse uma

contestação à própria insituição que as detém (Beck et al., 1997).

É plausível a especulação de que tal defesa, impossibilitada de separar a

contestação às tradições da contestação às instituições, seja um reflexo das suas

características modernas, a qual evocam o sujeito unificado e, portanto, a instituição

unificada. Com isso, não conseguem elas distinguir, no discurso fragmentado

1 “identidade subjetiva, pessoal, consiste dos significados e imagem que tenhamos encontrado paranos representar adequadamente no passado. Identidade social, que é diferente desta última, consisteda posição negociada entre nossa identidade pessoal e os significados e imagens demandadas denós em nosso atual contexto social”.

Page 100: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

99

daqueles que contestam, que uma contestação não obrigatoriamente implica na

outra.

Tendo tal questão em mente, poderia parecer simples para as organizações

evitar a ocorrência do conflito que emerge da tentativa de defesa das tradições. Ou

talvez, diante da impossibilidade de evitar o conflito, que elas minimizassem os

danos advindos dele.

Entretanto, as mudanças, os questionamentos e as contestações ocorrem

silenciosamente (Beck, 1997a), dificultando ou impossibilitando a constatação das

ocorrências. Ou ainda, quando constatadas, elas são analisadas sob os antigos

prismas, trazendo como resultado da análise algo enviesado, de pouca serventia

para que se lide com a questão.

Algo desta natureza pode acontecer com relação à postura da organização

frente aos seus integrantes. Determinado comportamento observado poderá ser

interpretado de forma distinta daquele qual seria o seu objetivo por parte das

pessoas que o adotam, fazendo com que um eventual conflito organização-

indivíduo, ao invés de resolvido, seja exacerbado.

Considerando que a natureza do social é dialética (Castro, 2002), as

contestações passam a ser necessárias para que a mudança ocorra. Esta natureza

dialética, porém, explicita a necessidade de se observar a dinâmica das forças que

operam no interior da organização (contestação versus defesa) de forma que o

resultado da dialética não seja destrutivo para a organização e que seja possível

canalizá-la de forma que ela produza, ao menos, uma destruição criativa, tomando

emprestado o termo de Schumpeter (1997).

Dialética esta que, também não se pode esquecer, será influenciada pelo papel

exercido na lógica cultural da empresa pela cultura nacional na qual ela estiver

Page 101: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

100

operando (Barbosa, 2001; Barros et Prates, 1997; Amado et al., 1994; Chanlat,

1999).

Uma forma de contestação das tradições é o questionamento das

regras/normas da organização, muitas vezes também ligada à própria contestação

de toda aquela “aura” conferida pela autoridade.

Há uma interdependência entre o sentido impessoal do termo e a pessoa que a

detém. A organização que, normalmente, vê tudo como uma coisa unificada,

também a vê assim. Desta forma, acaba criando normas e regras que não dissociam

tais papéis. Por outro lado, os contestadores não somente vêem os papéis distintos

como podem acabar tratando com deboche, ou outra denominação depreciativa

qualquer, aqueles que perdem a “aura” da autoridade, ou seja, que insistem em agir

da forma antiga mesmo quando a contestação já existe (Giddens, 1997).

Além disso, a rápida inovação com a qual as organizações se deparam, faz com

que o trabalho seja intensivo no conhecimento e menos material. E a

“intensidade do conhecimento envolve necessariamente a reflexividade. E envolve a

auto-reflexividade, pois o monitoramento heterônomo dos trabalhadores por regras é

substituído pelo automonitoramento. Isso envolve (e implica) a ‘reflexidade

estrutural’, pois o fato de as regras e os recursos (estes últimos incluindo os meios de

produção) do chão-de-fábrica (shopfloor) não mais controlarem os trabalhadores

torna-se objeto de reflexão da ação. Isto é, os agentes podem reformular e usar essas

regras e recursos em uma variedade de combinações para, cronicamente, inovar”

(Lash, 1997b, p. 146).

Neste caso, os sujeitos podem refomular as regras, na medida em que

automonitoramento é a norma. Assim, a contestação dará lugar ao impulso inovador

direcionado para a modificação das regras conforme direcionada pela reflexidade do

grupo.

Page 102: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

101

Entretanto, há um dicotomia entre a racionalidade instrumental ainda

predominante nas organizações e a consciência de ruptura mais forte que sua

vivência (Carvalho, 2002) e, no mesmo sentido que as amarras modernas impedem

a plenitude da reflexidade (Lash,1997b), esta racionalidade instrumental aliada à

reflexidade não plena, pode ter como conseqüência uma normatização de controle

criada pelo grupo que se torne ainda mais instrumental e presa à estrutura moderna

do que a existente previamente (Barker, 1993).

Se por um lado, a ocorrência deste controle estritamente moderno valida a

observação da dicotomia que há entre a consciência de ruptura ser mais forte que a

sua vivência nas organizações essencialmente instrumentais, por outro, demonstra

que a reflexividade ainda pode ser considerada mais fraca que as estruturas que ela

tenta transformar.

Uma possível justificativa para o predomínio das estruturas sobre a

reflexividade, particularmente relativo ao caminho da excessiva normatização, pode

ser derivada do fato de que todas essas mudanças, apesar de não acontecerem de

modo totalmente incosciente, não chegam porém a ocorrer de modo inteiramente

consciente nem de forma dirigida (Beck, 1997a).

Portanto, as organizações, ao adotarem grupos automonitorados, muitas vezes

conseqüência das contestações ou da própria característica das atividades

intensivas em conhecimento, se não cercarem o processo de desenvolvimento

destes grupos com todo o cuidado, poderão acabar por ter resultados insatisfatórios,

especialmente no que se refere ao desenvolvimento posterior das regras e, por fim,

da própria inovação.

Por outro lado, como há uma característica de fluidez no pós-modernismo, as

estruturas sociais, à medida que vão se adequando, moldam-se como estruturas de

Page 103: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

102

informação e comunicação (Lash, 1997b). Neste rastro, seguindo a mesma premissa

das mudanças não ocorrerem de forma consciente, tampouco de forma dirigida, as

estruturas de informática criadas constumam trilhar o mesmo caminho de

acirramento dos controles seguido pelos grupos automonitorados, com a vantagem

deste tipo de controle ter a capacidade de ser praticamente invisível aos olhos dos

integrantes da organização (Rosen et Baroudi, 1992).

A recorrência da questão do controle é devido ao fato de que normalmente o

controle é percebido pelos integrantes da organização como sendo algo perverso. É

provável que tal percepção se dê fundamentalmente porque o controle remete à

organização burocrática, moderna em sua essência.

Além disso, segundo Motta et al. (1995), o controle burocrático gera uma série

de tensões e problemas na organização. Ademais, com a complexidade do trabalho

atual, o mesmo se mostra ineficaz no sentido de condução para a produção de bons

resultados.

Assim, o controle social surge como alternativa, como um método mais eficaz,

pois faz com que o controle deixe de ser algo externo e passe a ser algo interno.

Para tal, “surge o simbolic manager, que utiliza símbolos, rituais, linguagem e outros

elementos da cultura organizacional como forma de controle social na empresa”

(ibidem, p. 120). Mesmo assim, pode ocorrer resistência, principalmente por parte da

gerência média, contra essa estratégia simbólica levada a cabo pela organização.

A estratégia simbólica só é utilizada nas organizações intensivas em

conhecimento, onde o trabalho intelectual é priorizado sobre o manual. Este fato traz

algumas considerações. Primeiramente, quando o trabalho intelectual é priorizado,

pressupõe-se que o nível de operação é detentor da tecnologia, considerando-se

Page 104: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

103

aqui a tecnologia de produção do conhecimento. Segundo, quando a tecnologia é

possuída pelo nível operacional, o controle externo torna-se difícil de ser exercido.

Com isso em mente, tem-se que as organizações verticalizadas, com controles

exercidos pelos superiores são incapazes de atuar sobre a produção do

conhecimento. Desta forma, como normalmente esta atividade não é singularmente

individualizada, mas compartilhada por times, tem-se que o controle passa então a

estar disseminado pela organização, mediante muitas vezes o poder de exclusão de

um membro, mesmo que esta se processe exclusivamente no nível simbólico

(Foucault, 1996).

Então, tem-se que o poder nos modelos de gestão de conhecimento é muitas

vezes exercido simbolicamente, mas com tão grande eficácia nestes modelos

quanto tinha o poder disciplinar na sociedade industrial.

Este simbolismo é principalmente exercido ao dar [restringir o] acesso, àqueles

que trabalharem conforme o [aquém do] esperado, a objetos de desejo e/ou

símbolos de status. (Sendo que no caso da restrição, tem-se uma espécie de

violência simbólica).

Considerando que o trabalho também compreende o funcionamento do “tecido

social e [d]as dinâmicas intersubjetivas indispensáveis à psicodinâmica do

reconhecimento” (Dejours, 1997, p. 58), é reforçado que o caráter do controle social

e as suas vertentes de punição e recompensa podem produzir profundos impactos

na organização em todos os seus aspectos.

Mas o controle está também intimamente ligado à liderança, mais

especificamente ao fato de que a natureza da liderança implica em controle direto ou

indireto dos subordinados. Este é exercido conforme o estilo de liderança adotado, o

Page 105: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

104

qual depende das expectativas da liderança com relação à resposta dos

subordinados a ele (Johnson et Gill, 1993).

Isso também apresenta ligação com a questão da contestação às regras e à

autoridade. Portanto, a liderança deve estar ciente de que a construção das suas

expectativas com relação à resposta dos subordinados terá íntima ligação com como

culturalmente são aceitos os diversos estilos.

Desta forma, pode-se perceber a formação da teia de intensa interdependência

que se forma mediante a interação da cultura local, com todas as suas causas e

implicações já apresentadas, com a questão do controle e agora da liderança.

Resumindo, todas as questões que implicam em mudanças na postura das

pessoas no trabalho, e que também vão ter reflexos em como as organizações

reagem à essas mudanças, vão ser fundamentais para que o processo de Avaliação

de Desempenho adquira sua legitimidade junto aos integrantes da organização.

Afinal de contas, não se pode esquecer que a avaliação pode ser descrita como

um processo que, de alguma forma, exerce um controle do desempenho, quer seja o

objetivo do sistema o de desenvolvimento das pessoas ou o de premiação (vide

seção 3.4 – Etapas da Avaliação de Desempenho).

Por outro lado, quem desempenha o papel de avaliador, normalmente a chefia,

é a figura que distribui as recompensas e punições. E o estilo de liderança que esta

resolver adotar impactará na validade do julgamento feito, também impactando na

percepção, por parte dos demais integrantes da organização, da legitimidade do

sistema.

Legimitidade esta que fica mais em xeque quando o papel da liderança é

desvirtuado e o avaliador passa a utilizar o controle e a avaliação como elemento de

coação ou “moeda de troca” com seus subordinados. É por isso que o controle

Page 106: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

105

social emerge, e que a vigilância sobre os subordinados não pode ser visível

(Carvalho et Alcadipani, 2001), o que faz reforçar a pertinência da existência dos

grupos auto-monitorados.

Antes de finalizar esta seção cabe a observação de que, ao se falar das

mudanças pelas quais a sociedade e, em conseqüência, a gestão vem passando,

pode-se ter a falsa percepção de que, recentemente, de uma ora para outra, o

homem percebeu sua alienação no trabalho – ou se percebeu amarrado à uma

estrutura na qual ele não mais se sentia confortável – (conseqüência do choque

entre a dialética da relação com o contexto social e sua prévia gestão puramente

objetiva e todas as outras implicações já apresentadas) e, por conta disso, as

empresas vêem-se hoje na necessidade por novas formas de gestão que atentem

para os problemas identificados.

Aktouf (2001), ao fazer um breve histórico recente dos acontecimentos,

demonstra não somente que os sinais de tais mudanças já vêm surgindo desde os

anos 70, mais notavelmente, como também nos permite inferir as causas que

levaram as novas técnicas administrativas a tomarem os caminhos que tomaram.

Conhecedoras das implicações da característica dialética do social, é mister que

as organizações mantenham-se constantemente monitorando os sinais de

mudanças emanados pelo ambiente no qual se inserem e que busquem identificar,

dentro dos seus contextos sociais particulares, as implicações refletidas nas suas

gestões.

Com isso, participando de forma ativa nos processos de mudanças, dando um

direcionamento onde necessário e sabendo distinguir entre o que cada contestação

visa atingir, as organizações têm condições tanto de sentir menos os efeitos

Page 107: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

106

negativos dos processos de mudança, quanto de obter resultados que as

possibilitem alavancarem-se com o resultado dos mesmos.

4.5 Implicações da Pós-Modernidade para a Gestão no Exército Brasileiro

As implicações da Pós-Modernidade para a Gestão nas organizações, para

serem compreendidas melhor, demandam que sejam consideradas as

características daquela sobre a qual se deseja inferir.

Uma série de características distingue o Exército Brasileiro das demais

organizações existentes. Pois não se trata apenas de uma instituição pública, mas

de uma instituição na qual os imperativos da tradição desempenham papel nuclear

na construção da sua própria identidade.

“As Forças Armadas, constituídas pela Marinha, pelo Exército e pela Aeronáutica,

são instituições nacionais permanentes e regulares, organizadas com base na

hierarquia e na disciplina” [grifo nosso] (Brasil, 1994, P. 70).

A Constituição Federal, ao caracterizar o Exército Brasileiro como permanente e

baseado na hierarquia e disciplina, já explicita os princípios norteadores da

atividade militar, elevando, neste caso de forma tácita, a tradição à própria essência

da instituição.

Ademais, a dinâmica da atividade profissional do Exército Brasileiro pode ser

caracterizada como sendo de trabalho intensivo. Isso, levando em conta que “a

organização encontra-se numa configuração com a qual interage, que constitui a

fonte de insumos e o objeto do consumo dos produtos” (Castro, 2002, p. 118), traz

uma nova conseqüência de ampla dimensão.

O ambiente, assim chamada a configuração na qual a organização se encontra,

interage com a organização. Quando a organização é do tipo de trabalho intensivo,

Page 108: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

107

ou seja, boa parte dos insumos produtivos é constituída por pessoas, a dinâmica

interna do trabalho tende a sofrer fortes influências deste ambiente, mais

especificamente no que se refere às características da sociedade na qual estiver

inserida.

Todavia, para que tais influências não prejudiquem o processo produtivo, uma

certa flexibilidade será exigida das organizações. Flexibilidade essa que, no caso de

uma instituição com características de instituição total (Goffman, 1992), torna-se, aos

olhos dela mesma, ameaçadora à própria existência.

Essa visão de ameaça vai além daquela normalmente adotada pelas demais

organizações, cujas estruturas essencialmente modernas as impedem de distinguir

entre o que vem a ser contestação à regra e o que vem a ser contestação à

organização.

Consideradas a hierarquia e a disciplina como pilares da organização militar e,

mais ainda, o carater de dedicação exclusiva e permanente ao serviço por parte do

servidor militar (Brasil, 1980), ela tem a sua estrutura construida de tal forma que

efetivamente as contestações às regras se tornam contestações à instituição, mas

neste caso, as contestações não existem com relação à legitimidade da mesma,

mas ao seu modus operandi.

Obviamente, é de se supor que tão conflitante e complexa situação apresente-

se aparentemente sem solução. Pois se o modus operandi da insituição militar está

intimamente relacionado, transpassando e sendo transpassado por aquilo que define

a si própria, como se conseguir a flexibilidade necessária para que as influências da

sociedade sobre os integrantes da instituição não acabe gerando uma situação de

prejuízo ao processo produtivo? Por outro lado, qual grau de alienação ou

desmotivação não será provocado pela insistência da instituição em não buscar

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108

esse entendimento entre as influências da sociedade e os reflexos internos para a

gestão?

A compreensão destes fenômenos vai obrigatoriamente passar por uma

abordagem que os explore partindo da relação dialética entre o indivíduo e a

sociedade e explorando, então, as conseqüências dessa relação no ambiente

interno do Exército Brasileiro (Migueles, 1999).

Se por um lado, já se abordou como a Pós-modernidade tem provocado

modificações no indivíduo, mais especificamente com relação à questão da

identidade, quando este movimento se observa nos integrantes do Exército

Brasileiro, uma particularidade de grande importância emerge.

O processo de integração social do indivíduo, ao internalizar neste os “valores,

padrões, modelos, normas e símbolos sociais” (Castro, 2002, p. 40), se constitui na

base sobre a qual a identidade que emergirá da dialética se construirá.

No Exército, o processo de integração social ocorre de forma distinta entre os

diversos grupos que nele se encontram.

No universo dos oficiais de carreira, encontram-se aqueles oriundos das

seguintes escolas de formação: Academia Militar das Agulhas Negras (AMAN),

Instituto Militar de Engenharia (IME), Escola de Saúde do Exército (EsSEx) e Escola

de Administração do Exército (EsAEx). Além destes, há os oficiais temporários,

oriundo dos Centros e Núcleos de Preparação dos Oficiais da Reserva (CPOR e

NPOR, respectivamente).

Apesar do sistema de Avaliação de Desempenho só contemplar os oficiais de

carreira, é importante explicitar as características de cada escola de formação, já

que todas fornecem pessoal para as diversas organizações militares. Ou seja,

Page 110: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

109

elementos que estarão participando desta dialética indivíduo-sociedade com reflexos

para a gestão no Exército Brasileiro.

Os oficiais formados pela AMAN correspondem ao núcleo principal do Exército

Brasileiro, bem como formam a maior parte do efetivo dos oficiais de carreira. A

quase totalidade dos oficiais-generais são oriundos da AMAN, bem como os

comandantes das diversas organizações militares, com exceção daqueles

específicas de saúde ou técnicas de engenharia, também o são. São estes oficiais

os que compõem os quadros chamados operacionais. A formação na AMAN tem

duração de quatro anos, sendo que, para os oficiais formados antes de 1994, havia

um percentual oriundo da Escola Preparatória de Cadetes do Exército (EsPCEx –

correspondente ao Ensino Médio), totalizando para os incluídos neste percentual

sete anos de formação, e, para os oficiais formados a partir de 1994, todos são

oriundos da EsPCEx, a qual passou a compreender somente o último ano do Ensino

Médio, totalizando, então, cinco anos de formação.

O curso da AMAN, durante toda a sua duração, funciona em regime de

internato, com saída franqueada aos cadetes (título concedido aos seus instruendos)

nos finais-de-semana, feriados e período de férias.

Ao longo do curso, atividades acadêmicas e operacionais alternam-se. Aos

cadetes ainda é imposto horários para o levantar, refeições e o chamado silêncio,

momento a partir do qual não se permite atividade alguma que produza barulho

considerado pertubador.

Além disso, são submetidos a controles quanto ao asseio dos uniformes, dos

alojamentos e estabelecidos prazos máximos para corte de cabelo (controlado

através de um “cartão de cabelo”).

Page 111: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

110

Por fim, cabe ressaltar que a AMAN somente forma oficiais do sexo masculino,

sendo que as demais escolas de formação de oficiais de carreira são mistas.

(A EsPCEx, etapa obrigatória para ingresso na AMAN vive rotina semelhante à

descrita para a AMAN).

O IME forma os oficiais que compõem o quadro de Engenheiros Militares,

divididos por 10 especializações diferentes. O curso dura cinco anos, dos quais no

primeiro está incluída a instrução militar básica e nos demais as atividades são

restritas às acadêmicas.

No primeiro ano, os alunos do IME estão sujeitos à rotina similar aos da AMAN.

Mesmo assim, a rotina é considera bem mais branda, já que estes futuros oficiais se

destinarão a trabalhar em áreas técnicas.

A partir do segundo ano, porém, aos alunos já é permitido residir fora da escola,

sendo franqueada a saída a todos quando fora do horário de aulas, mantendo-se o

controle de asseio de uniforme, cabelo (mas sem a existência do “cartão de cabelo”,

o qual só é aplicado aos alunos do primeiro ano) e alojamentos para aqueles que

continuem a residir na escola.

Na EsSEx e na EsAEx a formação se dá de maneira muito semelhante entre

elas. Enquanto a primeira forma os oficiais médicos, dentistas e veterinários (com

formação acadêmica prévia nestes campos), a segunda forma os oficiais do

chamado quadro complementar, compreendendo economistas, advogados,

administradores, entre outras formações de nível superior.

A duração dos cursos é de dez meses, durante os quais os alunos já são

considerados oficiais, compreendendo um período de instrução militar básica e

diversas instruções que objetivam familiarizar os alunos com as peculiaridades

Page 112: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

111

administrativas do Exército, com as quais eles se depararão no exercício de suas

funções.

Apesar de, em tese, ser feito o controle de asseio de uniformes, horários e corte

de cabelo, a formação não funciona em regime de internato (somente no primeiro

mês), bem como esses controles são bem mais brandos que os exercidos no IME.

A formação dos oficiais temporários tem a duração de um ano, do qual somente

um mês em regime de internato. Ao fim do ano, todos passam por um estágio de um

mês em diversas organizações militares, dos quais alguns passam a exercer as

funções de oficial por um período de até oito anos.

O primeiro mês do curso nos diversos CPOR e NPOR é similar ao primeiro ano

da AMAN, sendo que, nos demais meses, a saída dos alunos passa a ser

franqueada, mantendo-se, porém os controles de asseio de uniforme, alojamentos

para aqueles que continuem residindo e cabelo (com a manutenção do “cartão de

cabelo”).

As atividades dos CPOR e NPOR se restrigem às operacionais.

Normalmente, a idade média para ingresso na EsPCEx (etapa obrigatória para a

AMAN) é de 17/18 anos e no IME gira em torno dos 19/20. Havendo grande

variação na EsSEx e EsAEx, sendo que, nestas, a idade máxima não ultrapassa os

35 anos. Já os alunos dos CPOR e NPOR ingressam com 18/19 anos, a idade dos

demais prestadores do serviço militar obrigatório.

O objetivo da suscinta descrição das diversas escolas é o de possibilitar que se

perceba os diferentes processos de integração social pelos quais passam os oficiais

formados pelas diversas escolas.

Page 113: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

112

Apesar de não minuciosa, a descrição permite concluir de antemão que, pela

duração e idade de ingresso, os resultados das interações sociedade-indivíduo

tendem a ser diferentes para os indivíduos pertencentes aos distintos grupos.

Por exemplo, a construção da identidade profissional para os formados pela

AMAN e pelo IME será diferente da construção dos formados pela EsSEX e pela

EsAEx, cujos alunos já possuem uma identidade profissional prévia e distinta da

militar.

Até mesmo entre os formados pela AMAN e pelo IME tal construção se dará de

forma distinta, pois somente naquela as atividades operacionais fazem parte da

rotina durante toda a formação.

Assim, considerando o Exército como “Instituição Total”, pode-se ver que tal

premissa será mais marcante para os oficiais oriundos da AMAN do que para os

demais, os quais, mesmo assim, não estão imunes às interações com a sociedade,

pois, findo período de formação, também finda a reclusão.

Como medida de como a rotina da AMAN busca controlar a totalidade dos

aspectos da vida do interno, a transcrição de parte do regulamento da “Casa dos

jovens detentos em Paris”, datado da década de 1780, feita por Foucault (1987)

apresenta um paralelo assombroso com a rotina daquela Academia Militar.

Fornecendo também uma medida de como se dá parte do processo de moldagem

do indivíduo.

Uma outra faceta deste processo se deve à própria grade curricular acadêmica.

Nos dois primeiros anos, as disciplinas encontram-se quase todas, com exceção da

língua portuguesa, no universo das quantitativas/exatas. Sendo que disciplinas com

conteúdo mais teórico-crítico são ministradas apenas nos dois últimos anos.

Page 114: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

113

Um docente mais antigo naquela Academia, certa vez confidenciou que o

objetivo de tal ordenação é o de justamente só permitir que as discussões naturais

advindas das disciplinas teórico-críticas sejam conduzidas de acordo com os valores

passados pela AMAN nos anos anteriores.

Este processo já não é conduzido pelos professores, mas pelos oficiais que

comandam as companhias de alunos, quer seja na rotina, no desenrolar das

atividades operacionais ou ainda nas sessões destinadas a tratar de temas ligados a

valores militares, ocorridas com freqüência semanal durante os dois primeiros anos,

nas quais normalmente o comandante da companhia aborda os valores já com a sua

interpretação. Neste processo, portanto as disciplinas de caráter exato tem o papel

de não interferir na recepção dos valores.

Apesar de tal afirmativa não ser de possível comprovação, pois é bem difícil que

tal intenção esteja manifesta em algum documento, ela se apresenta como sendo

bastante coerente com o que se observa tanto no que estaria no escopo de uma

“Instituição Total” deste tipo, quanto no próprio decorrer do curso da AMAN.

O universo dos sargentos de carreira possui formação muito similar. Curso com

duração de dez meses em regime de internato e todas as peculiaridades da

formação da AMAN com relação aos controles. Entretanto, suas atividades se

restrigem à instruções operacionais, sendo exigido a conclusão do Ensino

Fundamental como pré-requisito de ingresso. (Normalmente, a média de idade de

ingresso na escolas de formação de sargentos é de 21/22 anos).

Já a formação dos sargentos temporários é feita na mesma unidade no qual já

estão servindo (os sargentos temporários são selecionados dentro do universo de

cabos e soldados lotados normalmente na organização militar para a qual há vagas),

Page 115: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

114

ou em outras unidades por motivo de economia de escala, cujos cursos têm duração

de aproximadamente três meses.

As diferenças internas com relação ao resultado das dialéticas indivíduo-

sociedade, observadas como conseqüência das distintas formações dos oficiais,

acentuam-se ainda mais ao se considerar a formação dos sargentos. Pois esta além

de ser de menor duração que a dos oficiais da AMAN, tem como público alvo

pessoas com escolaridade média menor que a dos oficiais.

Trazendo isso para o campo das mudanças pelas quais a sociedade passa e

suas implicações em termos de contestações, como se viu na seção anterior,

configuram-se três principais situações.

Na primeira, e que vem a ser a imensa maioria dos casos, tem-se as unidades

cujos quadros são compostos em sua maioria, se não totalidade, por oficiais

oriundos da AMAN.

Se as distintas integrações sociais produzem dialéticas distintas para cada

grupo, não somente se percebe um menor grau de contestação por parte dos oficiais

oriundos da AMAN, como também eles se apresentam como menos perceptivos às

mudanças.

Já se colocou que as mudanças não ocorrem de forma consciente, mas os

indivíduos, à medida que sentem algum grau de desajuste em seus ambientes de

trabalho, estão vivenciando as manifestações que essas mudanças desencadeiam

em suas vidas.

Se a formação dos oficiais de AMAN, tem como conseqüência uma não

transferência da experiência que vivenciam na sociedade para o interior das

organizações, não permitindo que eles percebam qualquer desajuste, isso também

Page 116: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

115

terá implicações na percepção que as mudanças têm implicações mais profundas

para a própria organização.

Desta forma, eles se tornarão os principais bastiões de defesa das tradições e

regras, estando incapacidados de fazer a distinção entre contestação das regras e

da organização.

Esta conduta também não se dá de forma uniforme. E este grau de

diferenciação não se dá somente de forma idiossincrática (analisá-la seria por

demais complexo, bem como fugiria ao escopo e à metodologia deste trabalho), mas

é observada em diferentes grupos.

Entre os oficiais oriundos da AMAN, são observadas notadamente diferenças de

posturas em dois grupos principais: os oficiais mais jovens e os oficiais do Serviço

de Intendência.

A época pós-moderna não surgiu num instante. Sinais das mudanças já vêm

sendo dados desde a década de 70 (Aktouf, 2001). Quanto mais jovem a pessoa,

mais sua identidade como indivíduo foi construída neste novo cenário. Assim,

mesmo com toda a característica da formação da AMAN, a qual produz um alto grau

de conformidade dos seus formandos com as normas, as características da

sociedade pós-moderna já fazem parte do indívido, o que resulta no observado

maior grau de contestação por parte dos oficiais mais novos.

Um outro fator pode ser identificado. O percentual de oficiais mais novos que

freqüentam cursos superiores é maior que passado. Pode-se inclusive observar que,

no interior do círculo dos oficiais mais novos, há um certo consenso quanto à

importância de se freqüentar outro curso superior. Isso traz como uma conseqüência

uma maior troca com a sociedade e todos os reflexos que esta troca tem para o

indivíduo e sua vida no Exército.

Page 117: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

116

(Não há base de dados disponível para que se possa quantificar este aumento

de percentual. Todavia, ao se entrevistar os oficiais quanto a essa questão, tem-se

que o que antes era exceção, e raro, atualmente é um fato bastante comum. Adendo

este que também diz respeito ao nível de escolaridade dos sargentos, abordado

mais adiante).

Além da própria informação advinda do conteúdo dos cursos, a troca de idéias,

o ambiente de questionamento aberto normalmente existente nas instituições de

ensino superior fazem suscitar o espírito crítico nesses oficiais, o que acaba alguns

deles a o levar para o interior das unidades nas quais servem.

Não se pode precisar em que medida um dos fatores afeta o outro. É bem

provável que a própria característica dos oficiais mais novos os levem a buscar outro

curso superior, o que acaba por reforçar o espírito crítico já latente neles, ratificando,

então, tal necessidade. De qualquer maneira, é um movimento que, se bem

conduzido, poderá encontrar o caminho para que as mudanças das regras não

necessariamente se traduza em fim da instituição.

O outro grupo observado é o dos oficiais do Serviço de Intendência. Este

pessoal é o responsável pela vida administrativa e logística do Exército Brasileiro.

Como direta conseqüência da natureza das suas funções, há um constante e

considerável contato com empresas civis, envolvendo negociações de contratos,

aquisições de bens e contratação de serviços.

Muitas vezes, ainda, esse pessoal é obrigado a encontrar soluções “fora da

norma” para problemas que afligem as unidades, como, por exemplo, o risco de

interrupções de fornecimento de material por falta de crédito orçamentário ou para

que sejam sanadas as deficiências em material que determinada unidade tenha,

caso o crédito seja específico para outro tipo de material, problemas esses que, por

Page 118: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

117

conta das amarras da legislação que regulamenta o assunto, não poderiam ser

resolvidos dentro da norma.

Todo esse contato com o público civil, aliado à necessidade muitas vezes

cobrada pelos superiores hierárquicos de resolver os problemas administrativos das

unidades, obrigando-os a transitarem fora da norma, trazem como conseqüência a

percepção, mesmo que inconsciente, de que normas e regras podem ser

questionadas e mudadas sem que a instituição em si seja questionada.

Quando, por fim, se tem a interseção destes dois grupos, ou seja, oficiais mais

novos do Serviço de Intendência, já se pode supor que todas essas considerações

são potencializadas, haja vista o reforço mútuo das questões inerentes a cada

grupo.

Na segunda situação, estão as unidades de Saúde. Nestas, a quase totalidade

dos quadros é composta por médicos e dentistas (formados pela EsSEx) e

sargentos auxiliares de enfermagem.

A formação dos oficiais do Serviço de Saúde, além de ser de curta duração e

contar com formandos de maior faixa etária, é feita em indivíduos que já tinham uma

prévia identidade profissional constituída.

Neste caso, a eficácia da formação no que se refere à conformidade com as

normas é limitada, podendo-se concluir que, de maneira geral, o que se observa nas

organizações civis com relação às mudanças e suas implicações ocorre de forma

semelhante, inclusive porque, nestas unidades, até o comando é composto por

oficiais do Serviço de Saúde.

Entretanto, a capacidade de mudança de regras é limitada. Se forem regras que

digam respeito específico à unidade, as mudanças não são tão difíceis de

acontecerem, desde que não interfiram na interface da unidade de Saúde com as

Page 119: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

118

demais. Mas as que extrapolam esses limites dificilmente mudam, pois estas, para

serem mudadas, normalmente dependem da aprovação de oficias oriundos de

AMAN, superiores hierarquicamente ao comandante da Unidade de Saúde em

questão, e que, portanto, são mais resistentes às mudanças.

Na terceira, unidades com grande percentual de Engenheiros Militares

(formados pelo IME) ou do Quadro Complementar (formados pela EsAEx). Este

pessoal apresenta a mesma característica do pessoal de Saúde quanto à questão

da formação.

O que é observado nestas unidades, porém, difere das unidades de Saúde.

Como muitas vezes os superiores hierárquicos deste pessoal são oficiais de AMAN,

mesmo as mudanças restritas às unidades são difíceis de acontecer. Mesmo assim,

a especificidade do assunto técnico faz com que algumas mudanças sejam

possíveis, diante da impossibilidade de alguns superiores de outra formação

opiniarem sobre a legitimidade da necessidade delas. Todavia, há resistência na

mesma medida em que é percebida qualquer ameça à autoridade.

De qualquer maneira, a despeito dessas peculiaridades, os dois grupos de

oficiais oriundos da AMAN (mais novos e do Serviço de Intendência) e as segunda e

terceira situações de unidades, não só se constituem em minoria, como também o

poder decisório para implementação de quaisquer mudanças estruturais ainda se

encontra além da esfera de competências deles.

Por isso mesmo que, ao se falar em reflexos da Pós-Modernidade para a

Gestão no Exército Brasileiro, e mais especificamente no que se refere ao sistema

de Avaliação de Desempenho, o quadro mais freqüente observado é o da primeira

situação apresentada: unidades com oficiais oriundos da AMAN. Sendo este,

portanto, o objeto de análise mais minuciosa a partir de agora, e inclusive aquele

Page 120: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

119

que apresenta o quadro mais conflitante e com maior impacto para o sistema de

Avaliação de Desempenho.

Mesmo assim, quando se apresenta as demais situações existentes, tanto com

relação aos distintos tipos de formações, quanto com relação às diferentes

composições de unidades, pode-se perceber como diversas lógicas existem dentro

de uma organização cujo estereótipo adotado pelo cidadão comum não comportaria

e como essas lógicas, ao mesmo tempo que existem, provam que há espaços para

mudanças que não comprometam a existência da organização.

Neste ambiente, observa-se nitidamente uma dicotomia: a atitude dos oficiais

versus as atitudes dos sargentos.

As diferenças nas formações trazem conseqüências que só não são mais

manifestas, graças ao poder coercitivo dos regulamentos, que assim o são em prol

da manutenção da hierarquia e disciplina.

Entretanto, não é incomum se escutar frases como “não entendo como os

oficiais aceitam tudo sem reclamar”, pronunciadas por sargentos em diversas

situações. E se pode ousar dizer que é em torno desta dicotomia que residem as

maiores implicações para gestão no Exército Brasileiro. Pois ela não se trata

somente de trazer o dilema emergido da Pós-modernidade para o interior do

organização, mas sucita diferentes percepções sobre o fenômeno que tornam ainda

maior a lacuna entre esses dois grupos.

A origem desta pode ser entendida como uma extensão das diferenças entre o

poder ideológico mediante o qual os oficiais se dobram às regras da instituição e o

poder coercitivo que doma os espíritos dos sargentos.

Contudo, mesmo com a aparente eficácia da coerção dos regulamentos em

domar os insatisfeitos, não se extingue a reação. Pois o poder coercitivo não é tão

Page 121: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

120

duradouro quanto o ideológico, abrindo possibilidade para contestação ou até

retaliação quando ao indivíduo é possível escapar das garras da punição (Foucault,

1987).

Partindo da construção da própria identidade para se retomar a questão do

poder mais adiante, enveredando-se na sua dinâmica, a pós-modernidade, ao

fragmentar o inequívoco eu em diversos discursos fragmentados (Beck, 1997a),

torna tal discurso fragmentado um problema para o Exército.

Há militares que desempenham funções estritamente administrativas, outros

estritamente técnicas. Todavia, se no universo destes houver aqueles que queiram

desempenhar seus papéis de técnicos em um momento e de militares em outro,

quando a situação assim demandar, na imensa maioria das vezes estes são

confrontados pelos superiores hierárquicos com a internamente conhecida assertiva:

“você é militar em primeiro lugar, depois é administrador (médico, engenheiro, entre

outros)...” .

Esta situação acontece mais freqüentemente com sargentos que ocupam

funções de auxiliares administrativos, oficiais da administração e mais

freqüentemente com médicos lotados em unidades que não sejam de saúde e

outros técnicos em similar situação.

Pode ser apontada outra razão para este tipo de frase o fato de que, para

ocupar cargos administrativos, são selecionados indivíduos de cargos operacionais

mais antigos, sem a preocupação formal de prepará-los para estes cargos.

Assim, muitos daqueles oficiais recolocados diretamente de funções

operacionais para funções administrativas, sem qualquer tipo de treinamento formal

para tal, passam a tratar os seus subordinados em funções administrativas da

Page 122: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

121

mesma forma como tratavam seus subordinados operacionais, esperando daqueles

o mesmo tipo de resposta que esperariam destes.

Isso, portanto, reforça a necessidade da compreensão de todas as esferas de

atividades existentes no Exército, bem como denota a incapacidade de separação

das duas para a presente análise, pois invariavelmente a prática operacional acaba

sendo levada para a prática administrativa, com as conseqüências a seguir.

A reação a esse tipo de discurso não é maior apenas por parte dos sargentos e

dos oficiais com formação que não seja a da AMAN. Também entre os oficiais

oriundos da AMAN, especialmente os do Serviço de Intendência, por

desempenharem atividades administrativas, reagem negativamente a esse tipo de

discurso.

Reação essa que cria um clima de desânimo e frustração porque, normalmente,

o bom andamento das atividades administrativas depende invariavelmente da

capacidade de contornar as normas, que implica, principalmente, no

estabelecimento de canais de comunicação extra-oficiais com as demais unidades

das quais depende a vida administrativa da unidade em questão.

Ademais, tais afirmativas são mais freqüentemente utilizadas para a negação de

alguma solicitação e “esquecidas” quando os superiores esperam que seus

subordinados resolvam determinados problemas pelas vias não-oficiais.

Esse aparente paradoxo pode soar quase que como uma postura imatura por

parte dos superiores. Na verdade, porém, ela tem uma causa mais profunda e tácita.

Recordando, o ambiente atual é um no qual as tradições estão sofrendo

constantes contestações, precisando se defender (Beck et al., 1997). Defesa esta

normalmente incapaz de distinguir contestação às tradições de contestação à

instituição, normalmente fruto das características modernas desta.

Page 123: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

122

Todavia, quando as tradições são tomadas como sendo a própria essência da

organização, sendo elas inclusive instrumento para se perpetuar o seu caráter de

instituição total, ainda com lógica da tradição como essência permeando também os

oficiais que têm o poder para modificá-las, a defesa se torna ainda mais ferrenha.

A defesa normalmente se dá normalmente em seus próprios termos, típico da

frase “desde o tempo de Caxias é assim” (referência ao Duque de Caxias, patrono

do Exército Brasileiro), várias vezes evocada para se justificar alguma tradição

quando os argumentos para defendê-la não são encontrados, ou insuficientes para

convencer o contestador. Podendo se dar, ainda, justificando-as como tendo valor

em contraposição aos de outro setor da sociedade (Giddens, 1997). Neste segundo

caso, busca-se evocar a aparente superioridade moral dos valores da caserna sobre

aqueles da sociedade civil.

Uma outra razão para a defesa das tradições ser exacerbada é o fato de que o

Exército pode ser considerado como um sistema social atributivo, na definição de

Douglas (1998). Este tipo de sistema, ao mesmo tempo que possui uma atuação

mais marcante sobre a sua memória, também dela depende para sobreviver. O

problema existe quando defesa de tradições se confunde com imobilismo da

organização, o que costuma acontecer por medo de que a organização perca a sua

referência.

Na prática, a defesa dessas tradições erguem barreiras consideráveis a

qualquer processo de mudança. Por um lado, devido às características modernas

das organizações, também encontradas no Exército Brasileiro. Por outro, a formação

do Exército republicano se deu sobre a égide positivista, de caráter essencialmente

cartesiano, o que potencializa a fixação das estruturas sobre o qual o Exército se

desenvolve.

Page 124: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

123

Esta formação, atrelada ao pensamento cartesiano, tem desdobramento quanto

à mudança. Como a racionalidade cartesiana considera prejudicial no processo

racional a presença da emotividade, normalmente este aspecto não é considerado

na sua gestão, tampouco quando se trata de questões de mudança.

Entretanto, a dinâmica coletiva é condicionada pela afetividade existente entre

os membros de determinado grupo, com conseqüências na forma como

informalmente o trabalho será configurado e para a qualidade deste (Chanlat, 1999).

Isso reforça a necesidade de consideração destes aspectos na racionalidade,

revelando-se a sua ausência no processo racional problemática para o mesmo

(Damásio, 1996).

Portanto, quando a emotividade é trazida pelos contestadores quer seja no

discurso de contestação, seja como objetivo final da contestação, a reação é quase

sempre extremamente negativa.

A interação da postura de adoção da racionalidade cartesiana em contraste com

o conteúdo emotivo das contestações, devido as peculiaridades das relações de

poder existentes no Exército Brasileiro, bem como a forma como a maioria dos

oficiais oriundos de AMAN tem internalizado tais pressupostos, acaba fazendo com

que qualquer mudança que não planejada por quem tenha a legitimidade

institucional para tal tem um custo individual muito elevado, muitas vezes mais

elevado do que o indivíduo esteja disposto a se sacrificar.

Além disso, a visão cartesiana também acaba por ver essas mudanças como

desvios nos procedimentos, o que é visto com desconfiança pela hierarquia, muitas

vezes por questões de poder e domínio sobre os subordinados (Dejours, 1997).

Poder e domínio são palavras intimamente relacionadas com hierarquia e

disciplina. Considerados como os pilares básicos da organização militar, conforme já

Page 125: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

124

apresentado, quaisquer ações que os enfraqueçam estarão invariavelmente, na

visão da organização, enfraquecendo-a.

Como as suas características eminentemente modernas a impedem de

distinguir o que venha a ser contestação à regra de contestação à organização,

também a impedem de conceber qualquer tipo de processo que possa ameaçar tal

ordem.

A grande implicação para isso é que há uma clara distinção entre os

“pensantes” e os “executantes”. Com isso, busca-se evitar que aqueles que não

disponham da prerrogativa de pensar ameacem a ordem estabelecida.

Na origem, tal distinção classificava os oficiais como sendo o grupo “pensante” e

os demais (sargentos, cabos e soldados) no grupo “executante”. Independentemente

de o quão bem ou mal essa divisão tenha funcionado até o presente, percebe-se

atualmente algumas conseqüências negativas dessa distinção que, apesar de não

ser mais tão rigorosa no que diz respeito aos sargentos, ainda existe.

E esta separação vai na contramão daquilo necessário para que os integrantes

da organização sintam-se motivados a participar de programas de qualidade e

inovação, fundamentais para a sobrevicência das organizações (Migueles, 1999).

Talvez esta seja uma das razões do relativo insucesso da implantação do Programa

de Gestão pela Qualidade Total no Exército Brasileiro como um todo, só sendo

verificados casos isolados de êxito na implantação, mesmo assim tendo sido

apontada a falta de preparo dos recursos humanos como um forte óbice à

consecução dos objetivos do Programa (Andrade, 1999).

Ainda mais, “na modernidade reflexiva, as oportunidades de vida são uma

questão de acesso [...] e do lugar nas novas estruturas de informação e

comunicação” (Lash, 1997b, p. 147). Ou seja, ao colocar os sargentos numa posição

Page 126: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

125

secundária na estrutura de informação e comunicação do Exército, eles percebem a

restrição a que são impostos com relação às oportunidades de vidas, além das

limitações que a carreira já tem em si.

A posição de descrédito com relação ao Sistema de Avaliação de Desempenho

também pode ter a mesma causa. Ao se verem alijados das estruturas de

informação e comunicação que encerram o de Avaliação de Desempenho, ou

ocupando posições de meros espectadores nestas, os sargentos podem passar a

considerá-lo como algo imposto pelo comando ou mais um instrumento coercitivo

deste, passando a desconsiderar a validade das informações advindas dele.

Mas essas implicações não se limitam aos sargentos. Também entre os oficiais

ocorrem reações similares. Apesar destes estarem no grupo “pensante”, a posição

na estrutura de informação se dá pelo grau hierárquico. Aqueles abaixo de

determinado grau hierárquico não têm possibilidade de opinar sobre questões que,

muitas vezes, dizem respeito a eles. Desta forma, ao se desprezar esta capacidade

de contribuição, produz-se efeito semelhante ao produzido nos sargentos.

Esta situação pode ser interpretada por estes como a de excluídos, que fazem a

organização sobreviver à custa de seu trabalho, mas que só tem acesso à recepção

da informação e não ao seu envio. Além desta situação se apresentar como um

poderoso combustível para a crítica (Lash, 1997b), também traz conseqüências

danosas para a organização.

Entre os principais objetivos da Avaliação de Desempenho encontra-se o de

conseguir melhorias voltadas à qualidade, bem como clima de cooperação entre os

membros das equipes de trabalho, entre outros. Os programas de qualidade, que

têm íntima ligação com a inovação nas organizações, dependem da participação

ativa e motivada dos seus integrantes para produzir resultados satisfatórios. E tal

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126

participação não se verificará, pois não pode esperar que os ressentimentos

advindos desta separação sejam transpassados por qualquer sentimento de

cooperação entre as equipes, pois estas tampouco são assim vistas, graças à

separação entre quem pensa e quem faz.

Indo mais além, a estratégia de uma organização é algo que pode também ser

desenvolvida inadvertidamente. Isso ocorre normalmente por um processo de

aprendizagem, o que é dificultado quando ocorre tal dicotomia, refletindo no fato da

inovação não conseguir ser nunca institucionalizada (Mintzberg, 1994).

Este tipo de processo de aprendizagem tem início com o indivíduo. O qual,

mediante sua experiência, descobre novas formas de se efetuar o trabalho ou novas

estratégias naquilo que esteja ligado ao seu trabalho específico.

Como essas novas formas não fazem parte da norma, sendo o inovador

pertencente ao grupo “executante”, elas são vistas como desvios no procedimento,

recaindo-se na desconfiança dos superiores (Dejours, 1997).

Como essas novas formas, interpretadas como desvios, provavelmente

impactarão negativamente na avaliação daquele que as adotar, ou os indivíduos

buscarão evitar a agir de forma inovadora, evitando serem mal avaliados, ou não se

importarão com a má avaliação que lhes for feita. Em resumo, é configurado um

quadro em que as duas situações possíveis são desfavoráveis ao desenvolvimento

da organização.

O curioso é observar o paradoxo existente no discurso da organização com

relação a este assunto. Por um lado, é freqüente a conclamação para que os

indivíduos tenham iniciativa durante o trabalho. Por outro lado, é comum se escutar

a frase: “inventor começa com I e termina com R. Nunca chega a B” (referência aos

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127

conceitos de desempenho “insuficiente”, “regular” e “bom”). Ou seja, iniciativa, neste

caso, só pode ser sinônimo de antecipar os desígnios da chefia, e nada mais.

Resumindo, a separação entre quem “pensa” e quem “faz” causa danos tanto ao

sistema de Avaliação de Desempenho per se, pois as possíveis atitudes

supracitadas dos indivíduos se traduzem em resultados imprecisos da avaliação,

quanto para o desenvolvimento da organização.

Por um lado, o processo de inovação não contará com a necessária participação

daqueles potenciais descobridores de novas formas de executar as atividades. Por

outro, como o resultado da Avaliação de Desempenho não será preciso, este

perderá em eficácia para a consecução de seus objetivos.

A dicotomia faz x pensa também é conseqüência da forma como o Exército

Brasileiro vê o processso de inovação, fazendo com que o caminho escolhido para

gerenciá-la adquira tal característica (Bessant, 2002).

Levando esse raciocínio para a Avaliação de Desempenho, o Exército, com sua

característica de Instituição Total, amarrado à todas as estruturas sobre as quais já

se abordou, acaba, de fato, utilizando-a como instrumento de dominação. E ao

desencorar qualquer atitude que permita aos executantes modificarem rotinas que

possam inclusive vir a refletir em mudanças do próprio sistema de Avaliação de

Desempenho, este ciclo tende a se auto-reforçar e, por fim, perpetuar.

Mas o Exército não se encontra isolado. O ambiente no qual se encontra

interage com os sues integrantes, lançando neles a sua influência. E vem a ser

justamente pelas influências do ambiente que os choques começam a emergir.

A pós-modernidade, quanto mais vai sendo absorvida pela sociedade, mais dá a

capacidade de reflexão aos indivíduos sobre as suas condições sociais e, então, os

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128

possibilita modificá-las (Beck, 1997b). E esta absorção vem ocorrendo na sociedade

brasileira.

Em conseqüência, observa-se no interior das unidades do Exército Brasileiro um

forte criticismo com relação às condições sociais, pois todas as estratégias de

dominação e controle total passam a ser questionados pelos seus integrantes.

Este criticismo é muito mais forte por parte dos sargentos. Criticismo que é tanto

contra aquelas normas ou procedimentos que são utilizados como instrumentos de

dominação, caráter este percebido pelos sargentos, quanto contra eventuais ordens

ou decisões da instituição que também visam perpetuar tal sistema.

Apesar dos sargentos não possuirem autoridade suficiente para modificar as

primeiras, podendo somente utilizar estratégias de ação de desvios nos

procedimentos, possibilitando-os minimizar os efeitos destes, a reação é mais direta

com relação às últimas.

Quando qualquer ordem ou decisão gera um descontentamento muito grande

entre os sargentos, é comum que eles solicitem uma reunião com o emissor de tal

ordem, quando possível. Se concedida, tentam revertê-la.

Muitas vezes não conseguem, quando o emissor utiliza sua autoridade para

fazer prevalecer sua ordem, contra a qual só restará aos sargentos lamentar e

manter as reclamações entre eles. Mas em outras conseguem revertê-la ou produzir

modificação naquilo que na ordem mais desagrada.

Já no círculo de oficiais, muito raramente se vê alguma solicitação de reunião

quando alguma ordem desagrada. Quando muito, solicitam que a reinvidicação seja

levada ao emissor por algum superior hierárquico não diretamente envolvido na

ordem. Entretanto, em especial entre os oficiais mais novos, as reclamações entre

eles acontecem. Indiretamente, a reivindicação levada por um superior se traduz

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129

num tácito reconhecimento de que os superiores são mais aptos a decidir,

denotando claro reflexo da implicação da formação dos oficiais nas suas atitudes, ou

ainda, de que tal reivindicação não é uma contestação à ordem, o que poderia ser

interpretado como quebra de hierarquia.

É tão notável a diferença entre os oficiais e sargentos com relação à reações

contra ordens daquela natureza, que não é incomum se escutar em conversas entre

sargentos e oficiais que possuem maior proximidade os sargentos dizerem: “não sei

como é que os oficiais aceitam tudo sem reclamar”; ou: “os oficiais abaixam a

cabeça para tudo o que é ordem”.

Além da diferença na formação fazer com que as influências do ambientes

gerem uma reação mais forte por parte dos sargentos do que dos oficiais, há ainda

um outro fator que vem a potencializar a propensão a reagir.

O número de sargentos que possuem curso superior ou estão cursando algum

tem aumentado a cada ano. Não se pode precisar o que tem levado um maior

número de sargentos a procurar as universidades, mas duas constatações podem

estar contribuindo.

Em primeiro lugar, a abertura de um maior número de instituições de curso

superior, reduzindo os custos das mensalidades, tornando assim o curso superior

mais acessível. Ademais, observa-se que os próprios sargentos tratam o ingresso no

curso superior como uma necessidade, na maioria para que possam ter outras

oportunidades profissionais.

Independente de quais sejam as razões, as conseqüências são claras. O curso

superior contribui para o aumento do capital intelectual dos sargentos. Este aumento

se transforma numa maior capacidade deles em decifrar e manipular estruturas

complexas (Bourdieu et Passeron, 1994).

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130

Assim, os sargentos começam a questionar as regras, procedimentos e práticas

que têm o latente objetivo de dominação, pois eles passam a ter essa capacidade

decifratória de que antes não dispunham. E não somente estas, mas como todas

aquelas que, se modificadas, permitiriam uma otimização do processo de trabalho. É

importante lembrar que os sargentos são vistos como executores. Como tais, suas

maiores preocupações são o de efetuar suas atividades da forma que for mais fácil

para eles. Não tendo eles, portanto, e também por conta da formação, uma devoção

à norma pela norma, em especial quando identificam nela elementos de dominação.

Estes dois fatores, absorção da pós-modernidade pela sociedade e maior capital

intelectual dos sargentos, não somente potencializam a propensão a reagir. Eles

também se reforçam mutuamente, na medida em que a reflexão sobre as condições

sociais levam muitos sargentos a perceberem suas necessidades de um maior

aprimoramento intelectual, os levando à universidade. Lá ingressando, o maior

capital intelectual aquirido durante o curso, aprimora ainda mais a sua capacidade

reflexiva. Sendo criado, assim, uma espiral ascendente de maior criticismo e

propensão à reação.

Essa transformação, diria-se assim, de atitude dos sargentos é percebida pelos

oficiais. Tanto que observações do tipo “não tem ninguém bobo hoje em dia”,

mencionadas com relação aos sargentos, não são raras. Entretanto, esta percepção

é ingênua, pois ela não enxerga que essa transformação vai ao ponto do

questionamento das estruturas sob as quais se buscar subjulgar os indivíduos.

Portanto, ela é ineficaz no sentido de se gerar ações que evitem as reações dos

sargentos ou as direcione para a reformulação das estruturas.

Considerando que a cognição é sociologicamente dependente (Fleck, 1981),

pode-se supor que a posição inerente dos oficiais de inquestionabilidade das

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estruturas os impeça, em grande parte de chegar a qualquer outra percepção além

daquela que já têm. Tanto isso que, apesar de afirmar-se que “não há ninguém mais

bobo”, mantem-se a separação entre quem pensa e quem faz, nem considerando a

possibilidade de contribuição que outro grupo possa dar.

Com isso, muitas vezes a natural reação diante à impossibilidade do

convencimento, é o apelo à hierarquia, que, apesar de questionada, só não é

abertamente desafiada pelo poder disciplinar imposto aos indivíduos.

Segundo Foucault (1987), o homem produtivo só é possível por ele estar preso

a um sistema de sujeição. Ou seja, só há utilidade produtiva no homem na medida

em que ele for submisso. E, como já se viu, o poder simbólico é aquele que permite

essa submissão em tempos pós-modernos.

Todavia, as estruturas sobre as quais o Exército foi construído, e tenta se

manter, não permitem que este tipo de poder seja institucionalmente utilizado. Como

instituição total, ainda é o poder coercitivo o mais utilizado. Este, por sua vez, leva à

alienação dos indivíduos (Etzioni, 1989).

Mas como os indivíduos recebem outras influências, bem como vêm ganhando

maior capital intelectual, a submissão à qual são sujeitos para produzir também são

contestadas por estes, sendo que, como não têm o poder de modificá-las, acabam

sufocando o lado produtivo.

Em outras palavras, como há a percepção da inadequação para os sargentos e

outros contestadores do poder exercido, não podendo os mesmos modificá-lo, o

resultado final é a queda na satisfação destes no trabalho e também de sua

produtividade.

Na medida em que saber e poder estão relacionados diretamente (Foucault,

1987), pode-se reforçar a idéia de que a Avaliação de Desempenho é uma forma de

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exercício de poder sobre o subordinado, no caso específico do Exército, até mesmo

de subjugação.

Só que a subjugação não se restringe ao sistema de Avaliação de Desempenho.

Para ser eficaz, deve manter a disciplina. Portanto, daí a necessidade do quartel

como lugar isolado do mundo exterior. Pois a cerca evita que o contato com o

mundo civil crie quarelas à disciplina (Foucault, 1987). Apesar dos militares poderem

se ausentar dos quartéis após o término do expediente, há em todas as esferas de

formação, em maior ou menor duração, um período de internato, de isolamento do

mundo exterior.

Mesmo durante as atividades diárias, o poder disciplinar é utilizado para

subjugar os indivíduos, com definições estritas de horários e realizações de paradas

e formaturas que, por fim, visam atuar na elaboração temporal dos atos, por corpo e

gesto em correlação e articular corpo-objeto (idem).

Com isso, disciplinando o corpo, busca-se disciplinar a alma do soldado. Donde

vem o sentido da frase que “se percebe se uma tropa é boa pela sua ordem unida”.

Ou seja, há todo um sistema de sujeição mais complexo do que o já discutido. E a

noção de boa tropa vem, antes de mais nada, pela sua disciplina.

O indivíduo vai sendo construído via poder disciplinar, objetivo que tenta ser

alcançado via as relações de poder, regimes de verdade e discursos que sustentam

as relações (Foucault, 2000). E essa construção também será derivada das

analogias sobre as quais a organização estiver construída (Douglas, 1998).

No Exército se observa a ênfase que é dada à ordem unida, a disciplina do

grupo, às muitas vezes punições coletivas aplicadas e aos discursos de espírito de

corpo e lealdade. Isso busca canalizar os pensamentos individuais para uma visão

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mais harmônica de interesse e poder. Só que isso não considera aquilo que é

central nas ciências humanas, o estudo da dominação e sofrimento (Chanlat, 1999).

Desprezando tais questões, a artificialidade que é a disciplina do corpo ainda é

utilizada como mecanismo de poder (Foucault, 1987), esquecendo-se que o

indivíduo atualmente reflete sobre e não mais se deixa convencer. Não é sem razão

que, quando a vigilância que deveria ser permanente, ilimitada, exaustiva e

indiscreta (Carvalho et Alcadipani, 2001), se ausenta, ocorre todo tipo de

manifestação não permitida.

Poder-se-ia argumentar que este tipo de disciplina se justificaria no Exército,

devido à natureza das suas atividades. Afinal de contas, numa organização que se

destina a combater, em que invariavelmente a morte estará circundando os seus

integrantes, como abrir espaço para outra coisa que não a razão instrumental e o

poder disciplinar?

Na verdade, esse tipo de indagação é mais estereotipada do que

correspondente à realidade. Normalmente ela é evocada pelos próprios militares

para justificar suas práticas. Entretanto, a maior parte das atividades que os

soldados desempenham nas suas rotinas diárias passa longe do que seria o cenário

do campo de batalha.

Mesmo assim, isso por si só não seria suficiente para justificar o abandono dos

antigos modos de vida, já que, quando se fizesse necessário o combate, eles seriam

decisivos em fazer com que os soldados se portassem corretamente no campo de

batalha.

Mas esta argumentação, evocada por aqueles que visam defender as práticas

do Exército, é refutada a partir do seguinte raciocíonio.

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A noção de habitus reflete o fato da verdade não ser conceitual, mas seriam as

práticas compartilhadas que a tornariam evidente (Lash, 1997b). E que práticas

compartilhadas são essas?

As práticas compartilhadas são as rotinas vivenciadas que fazem emergir o self

do indivíduo (Bourdieu, 1977). Portanto, a noção do habitus é justamente a

predisposição com a qual os indivíduos agirão dentro dos mundos nos quais estas

práticas existem.

Portanto, trazendo esta noção para o mundo Exército, observa-se que

justamente as unidades mais operacionalmente ativas diferem-se das demais no

que se refere ao habitus.

Nestas, como o Batalhão de Forças Especiais e as demais unidades da Brigada

de Infantaria Pára-quedista, percebe-se uma nítida diferença em todas as esferas de

relacionamento de poder, controle e da dicotomia entre fazer e pensar que torna o

ambiente destas muito menos rígido do que o das demais unidades.

Justamente por serem unidades consideradas de elite, talvez elas se permitam

agir assim sem que aparentemente estejam em flagrante choque com aquilo que é

preconizado pela organização como um todo. É importante que se reforçe que o

habitus atua em categorias impensadas, sendo quase que como um inconsciente

coletivo. Assim, as rotinas que se configuram nestas unidades, no qual há uma

predisposição para o ambiente de confiança mútua que se revela nas práticas

adotadas, aparecem naturalmente.

Entretanto, o ambiente mais aberto que existe não causa perda de rendimento

algum aos seus integrantes quando em situação de combate. Pois quando lá se

encontram, passam a agir pela lógica de combate, que produz um habitus diferente

daquele vivido na situação de paz.

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Esta distinção surge na própria formação das unidades de elite. Por terem esta

característica, os oficiais e sargentos que lá ingressam passam previamente por um

curso específico. Durante este, a lógica do combate é vivida exaustivamente,

quando o instruendo, quer seja ele oficial ou sargento, é considerado como um

aluno, identificado apenas por um número, e que deve obediência aos instrutores,

sejam estes superiores ou subordinados hierarquicamente.

Assim, quando em combate, a lógica que permeará a predisposição do indivíduo

será aquela formada pelo habitus do curso e, fora daquela situação, será o outro

habitus que atuará.

Ao contrário do que se pode inadvertidamente supor, a utilização do termo

habitus para o tempo de paz é feito somente para explicitar a contraposição ao

habitus de combate. Reconhece-se que não há sentido em se falar em habitus se

não for considerado que o mesmo só é formado partindo-se do disciplinamento do

corpo (idem).

Este disciplinamento ocorre, como já foi dito, durante os cursos especiais, no

qual situações de combate, incluindo a privação do sono, o desgaste físico, entre

outras mais situações que atuam diretamente no corpo dos indivíduos contribuem

para a construção do habitus de combate.

Já a prática compartilhada e vivenciada em tempo de paz, a qual se chamou de

habitus em termos de paz para contrapor ao habitus específico das operações

daquelas unidades, é justamente aquela que se verifica quando o ambiente que

circunscreve é outro que não o operacional.

Continuando, coloca-se lógica da ação porque ela vem a ser moldada

socialmente para cada tipo de ambiente em que o indivíduo se encontrar (Bauman,

1998). Isso, então, corrobora com a perspectiva de Bourdieu (1977) e vai de

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encontro à teoria da resposta idiossincrática a situações diferentes e que justificaria

o permanente estado de tensão e sujeição dos subordinados no Exército para que,

em combate, estes mantivessem a obediência.

Entretanto, a prática das unidades de elite mostra que não somente é possível

adotar outro tipo de postura nas situações fora de combate, como provavelmente

esse tipo de ambiente foi se moldando a partir do momento que os acontecimentos

nas atividades de combate demonstraram essa necessidade, justamente para evitar

insubordinações ou outras reações mais graves por parte dos subordinados. E este

outro tipo de postura, em momento algum, evidenciou casos de quebra de hierarquia

e disciplina em níveis além daqueles normalmente vistos nas demais unidades.

Pode-se especular esta razão porque já foram observados no Centro de

Avaliação de Adestramento do Exército situações que reforçam isso. Neste centro,

cujo objetivo é avaliar as tropas num o ambiente de combate o mais próximo da

realidade, já ocorreram alguns casos de deliberado fraticídio contra superiores que,

quando apurados, tinham origem em descontentamentos gerados na postura dos

superiores nas rotinas da caserna.

É por estes motivos que, então, mediante os processos sociais envolvidos nas

atividades que a postura dos oficiais e comandantes nessas unidades é bem

diferente do que nas demais. E o estilo deles de gerenciar seu pessoal tem um

fundamental papel na formação do ambiente social delas (Migueles, 1999).

As questões de controle – poder – indivíduos no Exército Brasileiro e como a

Avaliação de Desempenho se vê afetada por isso encontra-se num certo paralelismo

com relação às questões abordadas na seção anterior.

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Todavia, por tudo o que foi exposto, as características peculiares do Exército

tornam essa relação muito mais conflituosa e complexa do que a das organizações

civis em geral.

Deste quadro, emergem dois principais questionamentos. Em primeiro lugar,

vem a reflexão quanto à pertinência da manutenção do sistema de sujeição com

características de instituição total, frente aos danos causados pelo mesmo para a

produtividade e o bem-estar dos indivíduos, e a possibilidade observada de

procedimentos distintos sem que estes reflitam em quebra da hierarquia e disciplina,

medo que justifica a maior parte da resistência à mudanças por parte dos oficiais.

Em segundo lugar, deve ser refletido em até que ponto podem ser considerados

válidos os resultados de um sistema de Avaliação de Desempenho que, entre outros

pressupostos, depende de ambiente aberto e de confiança mútua para funcionar

corretamente. Ademais, é utilizado como instrumento de subjugação, o que vai

flagrantemente contra alguns dos objetivos gerais dos sistemas de Avaliação.

Portanto, quando da análise do sistema de Avaliação de Desempenho do

Exército Brasileiro, objeto do próximo capítulo, estes questionamentos servirão de

base para que a análise do mesmo não se restrinja aos seus aspectos técnicos e

contemplem as condições sociais sobre as quais deve ser construído.

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5 SISTEMÁTICA DE AVALIAÇÃO DE DESEMPENHO DO EXÉRCITO

BRASILEIRO

5.1 Considerações Iniciais

O capítulo anterior lançou questionamentos importantes sobre a validade do

sistema de Avaliação de Desempenho utilizado pelo Exército Brasileiro. Em linhas

gerais, pode-se perceber que as questões que circundam este instrumento de

gestão são muito mais profundas e complexas do que poderia se supor a uma

primeira vista.

Além do que foi apresentado naquele capítulo, há uma outra questão que aflora,

mas também como conseqüência daquilo. Há uma lacuna ética em geral nos

sistemas de Avaliação de Desempenho (Farah, 2000). Lacuna essa que tende a se

consolidar e alargar a partir do momento em que se considera não ser possível que

um instrumento montado sobre bases cartesianas seja ético (Bauman, 1998),

principalmente quando este trata o homem como recurso, ou seja, como meio,

quando para a ética o homem é tratado como um fim (Chanlat, 1999).

Isso tudo, aliado ao fato do sistema assim montado manter os integrantes da

organização distantes do acesso às estruturas de informação e comunicação,

retirando-os as oportunidades de vida (Lash, 1997b), traz descontentamento e até

descrédito com relação a ele.

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139

O sistema de Avaliação de Desempenho é mais um instrumento da

administração que visa atender ao seu objetivo de alcance da eficácia nas

organizações (Chanlat, 1999).

Este selo da eficácia, caracterizado por indicadores de lucratividade,

produtividade, entre outros, pressupõe um equilíbrio interno entre os interesses

conflitantes dos empresários e dos funcionários da organização. Pressuposição essa

advinda da formação da ciência administrativa, surgida sobre o paradigma da

Economia Clássica. Entretanto, cada tipo de sociedade demanda um equilíbrio

diferente, o qual deverá ser demonstrado (Douglas, 1998).

Assim, ao se iniciar a apresentação do sistema de Avaliação de Desempenho

do Exército Brasileiro, coloca-se mais uma indagação: até que ponto um instrumento

desses pode ser importado para a gestão pública, mais especificamente para uma

instituição como o Exército, e apresentar os mesmos resultados que se espera dele

no setor privado, considerando, já na essência, que os objetivos desses distintos

tipos de instituições são diferentes?

5.2 Propósitos e Objetivos

Os propósitos e objetivos do sistema de Avaliação de Desempenho adotado

pelo Exército Brasileiro estão definidos em portaria emitida pelo Comandante do

Exército. São estes os propósitos (Brasil, 2001a):

“I - sob o ponto de vista individual:

a) fornecer à Instituição a imagem de cada um de seus integrantes;

b) detectar possíveis desvios comportamentais e suas causas;

c) possibilitar o planejamento e o desenvolvimento de ações para a correção

de desempenhos insatisfatórios;

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d) facilitar a designação de tarefas compatíveis com a efetiva qualificação do

indivíduo; e

e) permitir o constante aperfeiçoamento do avaliado;

II - sob o ponto de vista organizacional:

a) subsidiar a formulação da política de pessoal; e

b) subsidiar o aprimoramento do sistema de ensino”.

Já quanto aos objetivos, tem-se os seguintes (idem):

“I - direcionar o militar aos cargos mais adequados;

II - subsidiar, em particular, os processos de promoção, de movimentação, de

outorga de honrarias e condecorações, de seleção para cursos, estágios, comando

(chefia ou direção) de organização militar (OM), instrutores ou monitores de

estabelecimentos de ensino e missões no exterior, dentre outros;

III - estimular a maior produtividade; e

IV - permitir que o militar, mediante o conhecimento de sua avaliação, aperfeiçoe o

seu desempenho”.

Ao serem observados os propósitos e objetivos, duas inadequações emergem:

uma interna a eles e outra na sua ligação com a organização.

Internamente, percebe-se a conjugação de elementos de desenvolvimento com

elementos de premiação. Há uma série de problemas para qualquer sistema de

avaliação quando esses dois tipos de objetivos antagônicos se encontram (vide

seção 3.1 – Propósitos e Objetivos da Avaliação de Desempenho).

Assim, ao adotar ambos num mesmo sistema, o Exército já está abrindo mão de

conseguir atingi-los. Na prática, só se verifica a ocorrência do elemento de

premiação, mais ainda não de forma plena, fato este melhor explorado nas seções

5.4 e 5.6.

Abordando mais especificamente os objetivos em si, tem-se que eles estão

compatíveis com o que é pregado pela literatura, apesar de um deles estar

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causando o antagonismo entre a premiação e o desenvolvimento. Contudo, dos

quatro objetivos determinados pelo sistema, três carecem de mecanismos

institucionais que possibilitem a operacionalização necessária dos seus

desdobramentos.

Com relação ao objetivo de direcionamento do militar aos cargos mais

adequados, a ausência do estabelecimento de perfis para os cargos existentes no

Exército faz com que, mesmo que se conheça perfeitamente cada um dos seus

integrantes, a adequação homem-cargo não tem como ocorrer via sistema.

Ao determinar como objetivo do sistema o de estímulo ao aumento da

produtividade, indicadores claros da produtividade das atividades desempenhadas

pelos indivíduos abrangidos pelo sistema seriam necessários, os quais não existem.

Assim, não há como determinar até que o ponto o sistema consegue promover o

estímulo se não há como medir os seus resultados.

O objetivo de aperfeiçoamento de desempenho por parte do avaliado é

prejudicado pela coexistência de objetivos de premiação no mesmo sistema, bem

como por outros fatores que serão apresentados no decorrer deste capítulo.

Por fim, com relação ao objetivo relacionado à premiação (II), há o chamado

sistema de Valorização do Mérito, objeto da seção 5.6, que trata de operacionalizar

os resultados da avaliação para a consecução daquele objetivo.

Na sua ligação com a organização, não se verifica uma ligação explícita,

tampouco prática, entre os objetivos da avaliação e aqueles da organização,

definidas pela estratégia da organização.

O planejamento estratégico para as unidades do Exército está enquadrado

como a terceira etapa do Programa de Administração pela Qualidade Total.

(Andrade, 1999). Portanto, antes de traçar a linha geral do que deve ser buscado

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142

pela organização, ele está envolto em outro processo que não se pode definir até

que ponto prejudica na definição da estratégia da organização.

Além disso, a ligação entre o planejamento estratégico e as suas etapas

antecessoras e o sucessoras são praticamente inexistentes (idem). Assim, mesmo

tendo nos propósitos do sistema o de fornecer subsídios à formulação da política de

pessoal, esta falta de ligação faz com que não se possa crer na capacidade do

sistema de avaliação efetivamente contribuir para tal.

É importante observar como esta falta de ligação com a estratégia, em parte

também pela própria indefinição e falta de interligação dela com as atividades da

organização, vem somente reforçar os problemas relacionados à questão da

inovação, já citados no capítulo anterior.

Mesmo assim, o fornecimento de subsídios pelo sistema não implica no seu

desenho baseado na estratégia da organização, mas apenas algo que poderia

contribuir para a formulação da mesma. Logo, manteria-se a crítica, mesmo que os

subsídios fossem fornecidos.

E como uma conseqüência direta da independência do sistema com relação à

estratégia, já se pode adiantar que dificilmente ele servirá para o aprimoramento da

organização (Coens et Jenkins, 2000).

O problema da falta de interligação com a estratégia da organização é ainda

acentuado se for considerado que não somente a sua falta de definição precisa

prejudica o desenho do sistema de Avaliação de Desempenho, mas também a falta

de uma estratégia específica para as questões de cunho administrativo, descolada

da parte operacional no que tange às questões já levantadas anteriormente e que

trazem limitações para o presente estudo (vide seções 2.6 e 4.5).

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Ademais, esta falta de definição explícita da estratégia prejudica toda a análise

do sistema em si, já que, desde o princípio da constituição do mesmo, não há um

norte pelo qual o pesquisador possa se guiar. Assim, devido a esta falta de âncora

estrutural, a capacidade analítica para se apontar as causas fica prejudicada,

resultando no fato de que elas devam ser consideradas mais como fortes evidências

do que verdades inquestionáveis.

Concluindo, independente dos objetivos, a Avaliação de Desempenho implica

num ambiente de relacionamento entre as pessoas de espontaneidade e confiança

(Bergamini et Beraldo, 1988).

Logo, não bastará adequar os objetivos ou criar os mecanismos ausentes para a

operacionalização dos mesmos, se anteriormente não forem sanadas as questões

apresentadas no capítulo 4 – Transformações Sócio-Culturais da Sociedade e suas

Implicações para o Exército Brasileiro.

5.3 Método de Avaliação

O método de avaliação utilizado deverá ser aquele julgado pela organização

como o mais adequado para auxiliar na consecução dos objetivos do sistema. Ou

ainda, para tal, ela poderá utilizar mais que um método em conjunto.

O Exército utiliza três métodos: vertical, lateral e auto-avaliação. Destes, os dois

últimos só são utilizados durante os cursos de formação e aperfeiçoamento (Brasil,

2001a). Pelo método vertical, entende-se a avaliação somente do subordinado pelo

superior, não ocorrendo a avaliação do superior pelo subordinado.

Desta forma, para efeitos da consecução dos objetivos do sistema, somente o

método vertical deverá ser considerado, já que os mesmos se referem ao

desempenho funcional.

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A utilização deste método pelo Exército é um dos fatores que contribuem para

que os seus objetivos não sejam alcançados. Sendo identificados dois os principais

elementos concorrendo para tal.

Em primeiro lugar, já foi abordado na seção 3.3 – Métodos de Avaliação – que a

maneira organização tratará a avaliação como um todo é determinante para o

sucesso da mesma, mesmo quando da utilização do método, ou conjunto de

métodos, adequado.

Já foi apresentado que, pelas características e dinâmica do poder no Exército

Brasileiro, a Avaliação de Desempenho exerce um papel em certa medida coercitivo,

ou ainda, pode resultar numa má avaliação daqueles que agirem de forma

inovadora.

No primeiro caso, mesmo não dispondo de mecanismos para a medição da

produtividade, pode-se dizer que na medida em que a coação do avaliador inibe o

comportamento inovador, ele estará indo contra os objetivos tanto de

desenvolvimento pessoal, pois, em princípio, pode-se dizer que a inovação está

presente no desenvolvimento, quanto de estímulo de aumento da produtividade, pois

também pode-se dizer que, de alguma forma, a inovação deve resultar em aumento

de produtividade.

No segundo caso, sendo mal avaliado, o seu resultado no sistema de

valorização do Mérito, atrelado ao objetivo da premiação, será pior, o que resultará,

em última instância, na premiação de outros que não os mais merecedores.

Ademais, se a avaliação não é precisa, o conhecimento sobre o indivíduo também

não o será, prejudicando a consecução do objetivo de direcionamento do militar para

o cargo mais adequado.

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O segundo elemento, não totalmente descolado do primeiro, tem também

ligação direta com os objetivos de adequação ao cargo, de desenvolvimento e de

produtividade. Mesmo que se considere como justo o julgamento feito pelo

avaliador, quanto mais completa a visão que se tenha do indivíduo, maiores serão,

em princípio, as possibilidades do mesmo descobrir caminhos para o seu

desenvolvimento, possibilitando também um aumento na produtividade e, para o

Exército, que ele possa melhor adequar o indivíduo ao cargo.

Conseqüentemente, a avaliação feita por outras pessoas que não somente o

superior hierárquico seria altamente recomendado. Sendo que a avaliação 360º

seria o método capaz de proporcionar a melhor visão.

Além disso, agora considerando a presença do viés no julgamento do avaliador,

esta visão mais completa provavelmente seria suficiente para fornecer elementos

que levassem à conclusão da presença do mesmo, contribuindo, desta forma, para

que o objetivo de premiação fosse perfeitamente atingido, além das contribuições já

citadas para a consecução dos demais objetivos.

O argumento fortemente defendido no Exército contra este tipo de avaliação é

que ele iria contra a hierarquia, um dos pilares da instituição militar, já que os

subordinados utilizariam este tipo de avaliação com espírito revanchista.

Douglas (1998) apresenta uma perspectiva de cultura que poderia ser descrita

como um universo de profecias auto-realizáveis. Enquanto não se implanta este

método de avaliação, em conjunto com os treinamentos dados aos indivíduos para

avaliarem, o único tipo de avaliação que os subornidados farão dos superiores será

aquele informal, carregado com forte criticismo e reação advinda dos mecanismos

de dominação existentes.

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Estas avaliações informais, em maior ou menor grau, acabam chegando aos

ouvidos de alguns superiores hierárquicos que, então, acreditam que este

comportamento seria levado para um sistema de avaliação 360º, provovando quebra

da hierarquia.

Com isso, cria-se um ciclo que se auto-alimenta. O medo por parte dos

superiores de que o criticismo seja levado para a avaliação, os leva a argumentar

contra ela. Por outro lado, enquanto ela não existir, manter-se-á a noção da

Avaliação de Desempenho como instrumento de dominação, alimentando a reação e

o criticismo.

Portanto, seria necessário que se quebrasse tal ciclo para que, enfim, um outro

método pudesse ser empregado, trazendo melhores contribuições para que o

sistema atinja seus objetivos.

Por último, há uma questão ligada ao método, mas que normalmente não é

abordado, pois está implícito a ele: os avaliadores. Ao se falar em avaliação vertical,

supõe-se a avaliação do subordinado pelo superior. Todavia, no Exército Brasileiro,

não necessariamente aquele que é o superior direto do avaliado procede à

avaliação.

Somente os oficiais de carreira são avaliadores (Brasil, 2001a). Portanto,

sargentos que estejam sob a subordinação direta de outro sargento ou de oficial

temporário, ou os oficiais de carreira que estejam sob a subordinação direta de

oficial temporário, são avaliados por outros oficiais, muitas vezes a chefia imediata à

sua.

Como o avaliador normalmente não trabalha diretamente com o avaliado, sendo

esta a única fonte de informações para se traçar o perfil do mesmo, já se pode supor

que há uma perda no nível da qualidade da avaliação feita.

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É prática usual que o superior direto seja chamado pelo responsável pela

avaliação para prestar as informações necessárias. Entretanto, se for considerado

que não necessariamente a visão de ambos coincida, não é incomum ocorrer do

avaliador deixar com que sua visão sobre o avaliado prevaleça.

Como compete aos comandantes selecionarem os avaliadores (idem), acontece

também casos em que o indivíduo não é avaliado pelo seu superior direto, mesmo

este sendo oficial de carreira. Normalmente isso ocorre quando, de fato, algum

sargento trabalha numa seção administrativa, mas como acontece com todos os

sargentos, ele está também lotado numa companhia de origem, sendo o

comandante desta companhia quem o avalia.

Em todos estes casos, então, além dos elementos que concorrem para que o

método não contribua para a consecução dos objetivos da Avaliação de

Desempenho, a imperfeição da informação sobre o avaliado é potencializada.

5.4 Etapas da Avaliação

Além do método, o exame das etapas da avaliação traz à tona outros elementos

importantes para a compreensão das falhas existentes no sistema de Avaliação de

Desempenho do Exército Brasileiro, reforçando os outros já apresentados.

A freqüência da avaliação é semestral (Brasil, 2001b), ocorrendo em janeiro e

julho de cada ano. Entretanto, em tese, ela deve ser contínua e permanente (Brasil,

2001a).

Para tal, existem os chamados “períodos de observação”, que vão

respectivamente até 30 de dezembro e 30 de junho, com os quinze dias seguintes

destinados ao preenchimento das fichas de avaliação (Brasil, 2001b).

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À rigor, simplificando a descrição, observa-se três etapas distintas no processo

de Avaliação de Desempenho no Exército. Uma primeira constituida do período de

observação, uma segunda constituida do preenchimento das fichas de avaliação e a

terceira que se constitui do recebimento, pelo avaliado, do resultado da avaliação,

chamado “perfil”.

Fazendo um comparativo com as etapas da Avaliação de Desempenho

apresentadas na seção 3.4, já se tornam evidentes alguns dos elementos

importantes citados anteriormente.

O primeiro ponto é que não há um planejamento para o desempenho no

período. Ou seja, não há estabelecimento de metas, indicadores ou controles do

desempenho.

A única coisa que há são os itens constantes da ficha de avaliação, sem que

haja, porém, indicadores que os possibilite medir, caso não ocorra um prévio acordo

entre o avaliador e o avaliado.

Assim, sem a existência destes indicadores, passa a ser extremamente

subjetivo e de difícil qualquer comprovação de aumento de produtividade ou do

próprio desenvolvimento individual.

Além de prejudicar esses dois objetivos, a falta de indicadores precisos para os

itens a serem avaliados invariavelmente criará distorções nas avaliações,

acarretando distorções na classificação dos desempenhos e, em conseqüência,

fazendo com que o objetivo de premiação não seja atingido de forma justa.

E o mais curioso é que na ficha de avaliação de quase todos os oficiais há um

item cujo enunciado é “atinge os resultados estabelecidos pela chefia imediata”

(Brasil, 2001b), sendo que não se observa de maneira geral qualquer chefia

estabelecendo resultados a serem atingidos, com exceção de tarefas específicas às

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149

quais são determinados prazos, ou outras obrigações, mas somente pontuais no

momento em que cada tarefa é passada.

A segunda etapa, que seria a execução, constando dos treinamentos

necessários e da execução das atividades, também apresenta problemas.

Em primeiro lugar, se não há estabelecimento prévio dos indicadores, não há

como se estabelecer quais seriam os treinamentos necessários para que o

desempenho pudesse ocorrer.

Outro ponto importante é que se a falta dos indicadores ocasiona uma distorção

no resultado final da avaliação, tampouco serão confiáveis os resultados das

avaliações anteriores como parâmetros para se determinar qualquer necessidade de

treinamento ou mesmo melhoria de desempenho durante o exercício das atividades.

Seguindo esta mesma trilha, na falta dos indicadores, os indivíduos exercem

suas atividades sem ter nunca a certeza de estarem caminhando na direção certa

com relação à qualidade do seu trabalho. Em outras palavras, não se sabe a que

nível de desempenho na ficha de avaliação corresponde aquele que eles estão

efetivamente realizando.

Este caminhar sem rumo é sensação corrente entre os integrantes do Exército.

O máximo de percepção que se tem quanto ao desempenho é a percepção do

indivíduo quanto a reação da chefia durante o correr do ano, todavia, é raro, se não

inexistente, aquele indivíduo que sabe efetivamente qual a correspondência entre os

valores dos conceitos atribuidos ao desempenho e o real desempenhar das

atividades.

Em resumo, pode-se dizer que a ausência da primeira etapa do processo de

Avaliação de Desempenho comprometerá qualquer probabilidade de sucesso da

Page 151: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

150

segunda etapa. E, como se verá a seguir, se não há parâmetros para o

desempenho, tampouco haverá para avaliá-los.

A terceira etapa é o controle do desempenho, ou a avaliação propriamente dita.

Neste ponto, deveria haver a comparação dos resultados obtidos com os esperados.

Contudo, se não há o estabelecimento de indicadores, de metas, não há base de

comparação. Não havendo base de comparação, o julgamento passa a ser

extremamente subjetivo, independentemente do instrumento de avaliação que venha

a ser utilizado. Pois se o instrumento serve para medir o desempenho, na ausência

de parâmetros de medição, qualquer resultado é possível.

A conseqüência direta é que, além da distorção natural presente no resultado da

avaliação, será reforçada a idéia de que esta é um instrumento de subjugação (vide

seção 4.5), ficando os avaliados à mercê da boa vontade do avaliador. Como então,

estimular a produtividade e o desenvolvimento pessoal se o indivíduo não percebe

reflexo disso na avaliação?

A última etapa seria da ação corretiva, na qual se buscaria corrigir os desvios

verificados. Mais uma vez, a falta da definição de parâmetros implicará na ignorância

do que deverá ser corrigido e em que medida tal correção deverá se dar.

De qualquer maneira, esta etapa é iniciada com o feedback dado ao avaliado

sobre o seu desempenho. No Exército, oficialmente o feedback que existe é

somente a entrega ao avaliado do seu perfil, ou seja, do resultado quantificado de

sua avaliação. É facultado aos avaliadores mostrar a ficha de avaliação aos

avaliados (Brasil, 2001a). Tal ocorrência não somente é pouco freqüente, como

também se resume a uma explanação por parte do avaliador sobre o desempenho

do avaliado, não havendo, na quase totalidade dos casos, possibilidade de diálogo

ou alteração da avaliação feita.

Page 152: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

151

O papel do feedback para a posterior melhoria do desempenho individual é de

fundamental importância. Entretanto, a realização da entrevista de avaliação não é

prática no Exército. Na maioria dos casos, o único feedback de que dispõem é o

valor numérico da avaliação recebida, tanto glogal, quanto por item.

Assim como os indivíduos não sabem o que de desempenho real corresponde

aos valores dos conceitos avaliados, a quase totalidade considera que o simples

valor numérico não dá subsídios para que se possa saber como melhorar o

desempenho.

Isto, em conjunção com o fato da freqüência do feedback ser semestral, faz com

que o avaliado passe seis meses sem saber como melhorar seu desempenho

passado, nem sabendo como está desempenhando suas atividades no presente. O

que se revela como uma forte incongruência ao se prescrever a avaliação como

sendo contínua.

Finalizando, mesmo se houvesse a presença da entrevista de avaliação, com o

diálogo entre o avaliador e o avaliado sobre o desempenho deste, o tipo de relação

hierárquica e com todos os atributos da dinâmica de poder e dominação já

apresentados, impossibilitariam a comunicação de se dar da forma necessária para

que o feedback cumprisse o seu papel de ponto de partida para o aperfeiçoamento

do indivíduo no Exército.

5.5 O Instrumento de Avaliação

O maior alimentador de dados para o sistema de Avaliação de Desempenho é a

ficha de avaliação preenchida, o instrumento de avaliação utilizado pelo Exército.

Cujo resultado, também, tem o maior peso para o sistema de Valorização do Mérito

(Brasil, 2003a).

Page 153: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

152

Em linhas gerais, o instrumento utilizado pode ser classificado como sendo de

Escala Gráfica, a despeito do mesmo ser um pouco diferente do instrumento

tradicionalmente conhecido como tal.

Ele é composto de duas partes: uma constando “atributos da área afetiva” e

outro referente ao “desempenho funcional” (Brasil, 2001b).

Na parte relativa aos “atributos da área afetiva”, caberá ao avaliador escolher

oito, de uma relação de quarenta e dois, que “mais se evidenciam no avaliado”

(idem).

Já na parte relativa ao desempenho funcional, há uma relação de oito

“Proposições Funcionais”, aos quais caberá ao avaliador atribuir graus que variem

de um a cinco, intervalados de um décimo (idem). Estas proposições são diferentes

dependendo da formação do militar, do seu nível hierárquico e da natureza do cargo

ocupado.

Já pela simples descrição do instrumento utilizado, considerando-se os aspectos

positivos e negativos que um instrumento de Escala Gráfica possui (vide seção 3.5 –

Os Instrumentos de Avaliação), já se pode dizer que os aspectos positivos deste

instrumento também se encontram presente no utilizado, com exceção da visão

gráfica e global dos fatores de avaliação envolvido, pois a ficha não é uma tabela de

dupla entrada.

Com relação aos aspectos negativos, porém, ele os mantém, só que

apresentando maior subjetividade, o que aumenta as dúvidas quanto as gradações

utilizadas, grande reducionsimo no processo (apenas oito proposições para definir

todo o desempenho) e o valor numérico, aliado à maior subjetividade, torna o

feedback de pouca validade para o avaliado. Por outro lado, ele apresenta uma

Page 154: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

153

predisposição para a redução do efeito tendência central, já que a ficha não é uma

tabela.

O instrumento de avaliação não existe no vácuo. Ele serve ao método de

avaliação adotado pela organização, como também se insere na etapa de controle

do processo de Avaliação de Desempenho.

Desta forma, como o instrumento é um meio, a partir do momento em que foram

identificados problemas tanto no método, quanto nas etapas do sistema adotado

pelo Exército Brasileiro, fatalmente os problemas se repetirão no instrumento. Mas

antes que tal repetição seja interpretada como a mesma ocorrência em dupla

freqüência, cabe ressaltar que, quando dela, o que ocorre realmente é a

potencialização da deficiência identificada. Por exemplo, se a falta do

estabelecimento de indicadores de desempenho faz com que a avaliação seja

subjetiva e o instrumento também possui a característica da subjetividade, logo, esta

subjetividade será muito mais forte, sendo alimentada em duplicidade no sistema.

Além da subjetividade, que provocará distorções no resultado da avaliação,

prejudicando a consecução dos objetivos de premiação, podutividade e

desenvolvimento, o instrumento utilizado traz outros problemas para a sistema.

O valor numérico, bem como a dúvida quanto à gradação, dificulta o

entendimento por parte do avaliado, dificultando o seu desenvolvimento, com

ligações também para o próprio aumento da produtividade.

O reduzido número de proposições também vai nesse sentido. Afinal de contas,

o reducionismo, por si só, já dificulta a identificação de ações concretas que o

avaliado precisa tomar para melhorar o seu desempenho.

Page 155: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

154

O objetivo principal da parte relativa aos “atributos da área afetiva” é o, a partir

da identificação das características mais marcantes o avaliado, possibilitar que o

mesmo seja alocado num cargo mais adequado.

No que pese tal objetivo, não obstante a contribuição que tal identificação dá à

consecução dele, esta parte, por si só, não é suficiente. Pois como não há uma

política de treinamento para os indivíduos de forma a melhor os habilitarem a

desempenhar os cargos que ocupam, tampouco novos cargos, também seria

importante o conhecimento mais profundo sobre o desempenho funcional para

possibilitar uma melhor adequação das pessoas aos cargos, o que não é possível

devido ao reducionismo com o qual é caracterizada a parte relativa aos

“desempenho funcional”.

Indo mais além, mesmo considerando que a formação básica deveria habilitar o

militar ao desempenho dos cargos relativos à sua especialização, é bastante comum

ver oficiais e sargentos mais antigos em funções administrativas sem que tenham

formação para tal, bem como que passaram por um longo período sem ocupar

determinado cargo, mesmo tendo sido o conhecimento com relação ao mesmo

abordado durante a formação. Estas situações requereriam treinamento para melhor

capacitação do indivíduo, o que não existe. (Isso sem considerar os treinamentos

necessários para possibilitar o aperfeiçoamento no desempenho do cargo).

Os problemas do instrumento utilizado não terminam aí. Considerando agora os

critérios que deveriam ser observados para a elaboração do instrumento, ele, além

de suscitar dificuldades para a consecução dos objetivos do sistema, também pode

ser questionado per se.

Com relação a todos os critérios, surge o mesmo problema. A falta de

parâmetros acarreta forte subjetividade da avaliação, potencializada pelas

Page 156: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

155

características do instrumento. Estas, por sua vez, impedem que se possa confiar

que desempenhos semelhantes estejam sendo avaliados de forma semelhante, que

se possa afirmar que desempenhos superiores serão melhor avaliados, que a

diferença entre os desempenhos possam ser discriminados (nisso o reducionismo

contribui fortemente) e que as tendências do avaliador sejam neutralizadas pelo

instrumento.

E, cabe recordar, tudo isso é reforçado também pela questão já citada da

avaliação como ferramenta de subjugação, no qual o instrumento, por ser

amplamente subjetivo, só vem a contribuir.

Por fim, cabe ressaltar um problema que não é do instrumento, mas implica na

sua má utilização, conseqüentemente, influenciando negativamente na consecução

dos objetivos da Avaliação de Desempenho.

Não há no treinamento formal dos avaliadores para desempenharem este papel

no Exército. Encoraja-se a leitura das normas que regem o sistema, mas não há

como atestar que os avaliadores estejam preparados para tal.

A conseqüência mais direta e imediata é que esta falta de preparo contribui para

a ocorrência dos fatores que deterioram a validade do sistema, recordando: o

estereótipo, o efeito de halo, o erro de contraste, de semelhança, de primeira

impressão e os fatores situacionais.

Esta falta de preparo só faz aumentar todos os problemas até aqui identificados,

pois mesmo que o método de avaliação escolhido seja o mais adequado, as etapas

estejam perfeitamente configuradas e o instrumento completamente ajustado para

servir aos objetivos do sistema, se aquilo que o faz funcionar não está preparado, a

qualidade da avaliação fica seriamente comprometida.

Page 157: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

156

5.6 O Sistema de Valorização do Mérito

O Sistema de Valorização do Mérito, apesar de não ser parte integrante direta

do sistema de Avaliação de Desempenho, tem no resultado deste o seu componente

mais importante (Brasil, 2003a). Por este motivo, então, cabe aqui analisá-lo.

Mesmo sendo considerado um sistema a parte, fica a cargo do seu resultado a

consecução do objetivo de premiação proposto pelo sistema de Avaliação de

Desempenho. Isto porque, para efeitos da operacionalização do referido objetivo,

julgou-se necessário agregar outros componentes da profissão militar englobadas

pela noção de mérito para o Exército Brasileiro. São estes (Brasil, 2003b): avaliação

do pessoal, medalhas e condecorações, elogios, cursos realizados, habilitação em

idiomas, trabalhos úteis, atividades essenciais, tempo de serviço em situações

diversas, tempo de instrutor, auxiliar de instrutor ou monitor, comportamento,

concursos e deméritos.

A cada um destes componentes é dado um valor e um peso que, ao final,

totaliza uma pontuação individual, na qual são ordenados os militares dentro dos

universos considerados (Brasil, 2003b) – que não são os mesmos universos

utilizados na Avaliação de Desempenho, mas sim dentro de cada Arma, Quadro ou

Serviço e dentro do nível de formação.

Para efeitos de esclarecimento, tem-se que os trabalhos úteis são aquelas obras

individuais, podendo ser estudos ou propostas de manuais, entre outros, assim

considerados pelo Estado-Maior do Exército; as atividades essenciais são os

resultados do Teste de Avaliação Física e do Teste de Aptidão de Tiro; e o tempo de

serviço em situações diversas diz respeito aos tempos de serviço desempenhados

em regiões específicas no país ou em missões de paz e a chamada vivência

Page 158: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

157

nacional, compreendendo o número de Comandos Militares de Área distintos em

que o militar serviu.

A análise deste sistema, todavia, se dará apenas no que diz respeito ao papel

desempenhado pela Avaliação de Desempenho, bem como dos componentes que

trazem algum tipo de incongruência para ele.

Com relação ao papel desempenhado pela Avaliação de Desempenho, a

implicação é simples e direta. A partir do momento em que se tem um sistema de

avaliação cujo resultado pode ser considerado como impreciso, se não inválido, por

todas as razões já apresentadas, qualquer outro sistema que se utilize deste

resultado como insumo tenderá também a ter resultados imprecisos.

No caso específico do sistema de Valorização do Mérito, no qual é o

componente de maior peso, a conseqüência imediata será um ordenamento que não

necessariamente corresponderá com a realidade em termos mérito individual,

contribuindo para que o objetivo de premiação não seja atingido.

Além da distorção causada pelos resultados do sistema de Avaliação de

Desempenho, o sistema de Valorização do Mérito possui alguns componentes que

atuam como referência circular. Ou seja, componentes que contam pontos para

justamente servir de critério de seleção para acesso a esses mesmos componentes.

A Valorização do Mérito é utilizada como critério de seleção para, entre outras

coisas, outorga de condecorações, matrícula em cursos, movimentações e

nomeação como instrutor, auxiliar de instrutor ou monitor. Por outro lado, estes

também são componentes que a compõem.

Portanto, aqueles que inicialmente são selecionados para qualquer um desses

listados, passam automaticamente a serem os primeiros candidatos para os demais,

e até mesmo para uma nova seleção como instrutor em outra escola, outras

Page 159: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

158

movimentações, entre outros. Ou seja, tirando a primeira seleção no início da

carreira, na qual somente o desempenho no curso de formação, a Avaliação de

Desempenho e os resultados dos testes físico e de tiro contarão, em todas as

demais passará a existir uma distorção em direção dos selecionados

cronologicamente antes.

Além disso, para os oficiais, os cursos civis que pontuam são apenas aqueles

cursados por oriundos do IME, da EsSEx ou da EsAEx, dentro da sua área de

formação profissional. Para os oriundos de AMAN, só se forem matriculados pelo

Exército. O problema que se identifica aqui só diz respeito aos oficiais de AMAN,

pois há cursos civis relacionados às atividades destes oficiais, mais especificamente

aos do Serviço de Intendência, Quadro de Material Bélico e Arma de Comunicações,

e que não são computados, indo justamente de encontro ao objetivo de

desenvolvimento.

Nesta mesma linha, para o caso dos sargentos, somente a conclusão do Ensino

Médio conta pontos, também não contribuindo para que os mesmos busquem se

desenvolver.

Por fim, cabe a ressalva de que o ordenamento dentro de cada universo ainda é

passível de uma crítica. Como os universos considerados para a Valorização do

Mérito são diferentes daqueles utilizados para a Avaliação de Desempenho, poderá

ocorrer o caso de militares que ocupam cargos de natureza distinta, sendo, portanto,

suas avaliações balizadas por “proposições funcionais” diferentes, mas que, por

pertencerem à mesma Arma, Quadro ou Serviço, terão as suas diferentes

avaliações utilizadas como insumos para ordená-los por mérito.

Em outras palavras, militares que ocupam cargos diferentes, sendo avaliados de

forma distinta, tendo as suas avaliações comparadas. Isso seria o mesmo que

Page 160: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

159

avaliar um piloto de provas pelo tempo em que percorre o circuito, um motorista de

ônibus pela prudência com que conduz o seu veículo e, ao final, querer estabelecer

quem é o melhor deles.

Apesar de normalmente os oficiais e sargentos mais antigos estarem quase

todos ocupando cargos de mesma natureza, com relação aos oficiais e sargentos

mais modernos há uma grande diversidade na natureza dos cargos ocupados, mais

notadamente aos pertencentes ao Serviço de Intendência, Quadro de Material Bélico

e à arma de Comunicações, as formações de AMAN que podem ser consideradas

mais técnicas, mas que também preenchem cargos operacionais.

Concluindo, por tudo o que foi apresentado, o sistema de Valorização do Mérito

surge como uma tentativa de se estabelecer critérios para que o objetivo de

premiação possa ser alcançado, mas acaba sendo vítima das distorções do sistema

de Avaliação de Desempenho e acrescenta ainda outras, não conseguindo, então,

fazer com que aquele objetivo seja atingido de forma precisa.

5.7 O Projeto AVALOP – Avaliação de Oficiais e Praças

Todos os problemas identificados até o agora, apontam para a clara e

inequívoca necessidade de reformulações em todos elementos integrantes do

sistema de Avaliação de Desempenho.

Entretanto, o sistema atualmente em vigor é uma recente reformulação de um

sistema anterior, tendo sido implantado em 2001.

Desta forma, julgou-se pertinente fazer uma breve apresentação deste processo

de mudança, o denominado “Projeto AVALOP”, buscando somente identificar as

razões principais que fizeram com que o sistema atual mantivesse, de maneira

geral, as mesmas falhas que o anterior.

Page 161: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

160

O sistema anterior apresentava uma única diferença: o instrumento utilizado.

Aquele era uma escala gráfica tradicional, composto por uma tabela de dupla

entrada, no qual havia três partes: uma relativa a “pautas comportamentais”,

composta por vinte e um itens; uma relativa a “atributos”, composta por nove itens; e

uma relativa ao “desempenho funcional”, composta por oito itens (Brasil, 2000b).

Para cada um dos itens havia uma gradação variando de um a cinco, em intervalos

de cinco décimos, no qual o avaliador deveria marcar a pontuação que atribuisse ao

avaliado.

As principais diferenças entre os instrumentos se encontram na pontuação para

as pautas comportamentais e atributos, os quais foram agrupados no novo

instrumento na parte dos “atributos da área afetiva”, bem como a parte relativa ao

desempenho “funcional” se diferenciava somente pela escola de formação e nível

hierárquico, ocasionando com que militares de mesma formação e nível hierárquico,

ocupando cargos de naturezas distintas, fosse avaliados pelas mesmas

proposições.

Um exemplo dessa distorção era a avaliação de um oficial subalterno, formado

pela AMAN, ocupando cargo administrativo, na qual constava a proposição “aceita e

adapta-se a situações de privação geral (de alimento, repouso devido, conforto

físico) ou que exijam grandes esforços e/ou resistência física, mantendo sua

eficiência habitual para agir ou decidir “(idem). De antemão já se pode antecipar a

impossibilidade da constatação desta proposição para alguém ocupando cargo

administrativo.

Visando, portanto, corrigir essa e outras falhas, iniciou-se, em 2000, o Projeto

AVALOP, conduzido pelo Centro de Estudos de Pessoal do Exército (CEP),

localizado no Rio de Janeiro.

Page 162: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

161

Inicialmente, o projeto previa o ano de 2000 para coleta de dados acerca da

percepção dos integrantes do Exército quanto à Avaliação de Desempenho e ao

sistema utilizado e da descrição atualizada e pormenorizada das atividades dos

cargos.

Em 2001, previa-se a construção do novo sistema, no qual o instrumento

deveria ser o mais específico possível para cada cargo.

Em 2002, estava previsto o teste do novo instrumento em unidades que seriam

selecionadas para tal, realizando-se os ajustes necessários.

E, finalmente, em 2003 o novo sistema seria implantado.

O primeiro problema enfrentado pelo projeto foi a antecipação de sua conclusão,

com a supressão de etapas importantes.

Por determinação superior, o projeto deveria ser testado já em 2001. Para tal, foi

abandonado o trabalho de descrição dos cargos para fins de avaliação, modificando-

se a concepção do instrumento para as naturezas dos cargos, ao invés da

especificidade deles.

Para determinação das “Proposições Funcionais” que comporiam as fichas,

foram feitas reuniões no CEP, com a participação da equipe do projeto e de oficiais

que serviam naquele Centro e que ocupavam, ou já tinham ocupado, cargos das

diversas naturezas. Nota-se a ausência da presença de sargentos nas reuniões.

Em seguida, o que deveria ser teste, passou a ser implantação em todo o

Exército em 2001, ordem emanada em agosto daquele ano, quando a avaliação,

que até então era anual, tinha o período do preenchimento das fichas prevista para

setembro.

Ou seja, a antecipação do cronograma não somente impediu que o novo

instrumento fosse testado, não adotando o que seria adequado para a configuração

Page 163: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

162

do novo sistema (vide seção 3.4 – Etapas da Avaliação de Desempenho), mas

também fez com que ele não reproduzisse as peculiaridades de cada cargo, bem

como modificou os pontos sobre os quais o desempenho passado seria avaliado a

menos de um mês do preenchimento da ficha. Em outras palavras, como se poderia

esperar um bom julgamento se, por um lado, os avaliados não conheciam aquilo no

que seriam avaliados, tampouco os avaliadores sabiam o que deveriam ter

observado durante o ano? E como se poderia confiar no resultado de um

instrumento que sequer havia sido testado?

Outros problemas também emergem da análise do Projeto AVALOP, cabendo

agora apresentá-los brevemente.

A concepção do projeto se deu unicamente com o objetivo da criação de um

novo instrumento de avaliação. Portanto, partiu-se do pressuposto de que a

configuração do sistema estava adequada.

Einstein (apud Coens et Jenkins, 2000) já coloca que os problemas significativos

enfrentados não podem ser resolvidos ao mesmo nível de pensamento em que se

estava quando foram criados. Desta assertiva, pode-se também concluir que a base

epistemológica sobre a qual se cria o conhecimento para a compreensão de um

assunto se enquadra na noção de nível de pensamento.

Portanto, seria necessário que o projeto, no seu andamento, conseguisse se

livrar das estruturas cognitivas que permeiam o Exército Brasileiro (vide seção 4.5 –

Implicações da Pós-Modernidade para a Gestão no Exército Brasileiro) para poder

propor, inclusive, outros métodos de avaliação que melhor pudessem contribuir para

a consecução dos objetivos do sistema, despido do argumento preconceituoso de

quebra de hierarquia, utilizado para justificar a não adoção de um ou outro método.

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163

Ou ainda, ponderar até mesmo sobre os próprios objetivos do sistema e as etapas

do processo avaliativo.

Desta forma, abandonando a forma causualística sob a qual foi analisada a

questão da Avaliação de Desempenho e reconhecendo o dualismo presente na

essência do conhecimento (Hessen, 1999), como relação sujeito e objeto, o sistema

resultante do projeto provavelmente estaria muito mais coerente com a realidade da

sociedade em que vivem os integrantes do Exército.

Além do mais, ao conduzir a pesquisa, o CEP agiu de forma isolada. Com

exceção da coleta de dados, para a qual foi utilizada amostra estratificada, o Centro

tratou a reformulação do sistema de Avaliação de Desempenho como um fim em si,

talvez crendo que ele, por si só se encaixasse na organização e também talvez

como conseqüência do pensamento cartesiano.

De imediato, já se percebe que não houve a preocupação do realinhamento dos

objetivos da avaliação com os da organização, ou até mesmo, o que talvez fosse o

caso, o levantamento do questionamento acerca da clareza de definição dos

objetivos do Exército, de forma a possibilitar este alinhamento.

Além disso, esta falta de integração durante a reformulação com as demais

unidades, atuou no sentido de reduzir a sua capacidade de gerar as mudanças

necessárias (Kanter, 1985). Em um sentido, pois não foram disponibilizados canais

de comunicação que transpassassem o Exército e que permitissem que outras

unidades ou mesmo pessoas pudessem contribuir no projeto. E em outro, mas não

muito divergente, que vai na direção da dicotomia pensante versus executante,

ocorrendo o distanciamento entre quem reformulou o sistema e quem estava

inserido nele.

Page 165: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

164

A equipe permanente do projeto, composta por psicólogos e um estatístico, é

outro fator problemático. Reconhecendo-se a necessidade da mudança da base

epistemológica para uma nova sobre a qual o projeto deveria ter sido desenvolvido,

também se percebe a necessidade da abertura disciplinar (Chanlat, 1999) para que

o homem, cerne da questão da avaliação, fosse melhor compreendido. Ainda mais

porque não necessariamente os especialistas em comportamento humano, os

psicólogos, sabem exatamente o que vem a ser o certo na questão da avaliação,

pois há outros fatores envolvidos, por eles desconsiderados em suas análises (Beck,

1997a). E um último argumento contra esta composição de equipe vem da noção de

que há um processo social por trás da apropriação de uma idéia (Douglas, 1998), ou

seja, seria necessário considerá-lo ao se pensar em reformulação do sistema de

avaliação, demanda que a formação dos membros da equipe não permitiu constatar.

O último fator identificado é a metodologia utlizada para a coleta de dados. Não

cabe aqui repetir a argumentação apresentada para justificar a escolha da

metodologia utilizada para a realização do presente estudo. No que se refere ao

Projeto AVALOP, então, caberia a utilização do mesmo método, pelas razões já

apresentadas (vide seção 2.5 – Coleta e Análise de Dados).

Cabe aqui a observação de que os aspectos apresentados são inter-

dependentes, na medida em que não se pode precisar com exatidão o quanto um

acaba determinando o outro.

Finalizando, não é surpresa observar que a mudança ocorrida na Avaliação de

Desempenho no Exército, como resultado do Projeto AVALOP, vai perfeitamente ao

encontro da conclusão do estudo de Marques (1994), de que as as mudanças

implementadas simplesmente ocorreram em termos de forma, acarretando na

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165

obtenção dos mesmos resultados e, mais especificamente, na manutenção dos

vícios do sistema anterior.

5.8 Considerações Finais

Ao término da apresentação da Sistemática de Avaliação de Desempenho do

Exército Brasileiro, cabe destacar os pontos mais importantes apresentados e

discutidos, para uma melhor compreensão do todo.

Os objetivos antagônicos do sistema já indicam uma predisposição ao fracasso,

reforçada pela falta de mecanismos para a operacionalização necessária de três

deles.

O método de avaliação utilizado também cumpre este papel, tanto por reforçar a

imagem da avaliação como meio de coação, como pela impossibilidade de se

fornecer uma visão completa do indivíduo.

A falta de algumas etapas, com as deficiências das primeiras impactando nas

demais, resulta em avaliações imprecisas, subjetivas, e na impossibilidade objetiva

de correções futuras de desempenho.

O instrumento utilizado é bastante subjetivo, reducionista e suas gradações são

ambíguas e inexatas, potencializando os problemas já identificados no método e nas

etapas.

Além disso, não se encontram nele os critérios que deveriam ser observados na

sua elaboração, o que também faz com que ele contribua para a ocorrência dos

erros de julgamento que implicam na validade do sistema.

A Valorização do Mérito, além de reverberar os problemas da avaliação de

desempenho, ainda acrescenta outras distorções como a presença de componentes

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166

que atuam como referência circular e a divisão por universos diferentes daqueles

utilizados pela avaliação.

Por fim, o Projeto AVALOP se caracterizou por uma série de problemas. Estes,

que vão desde a antecipação do cronograma, resultando em cortes de etapas

importantes, passando pela metodologia utilizada e chegando à própria base

epistemológica sobre a qual foi construída.

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6 CONCLUSÃO

Ao longo de todo o texto, com o intuito de atingir os objetivos do presente

estudo, buscou-se apresentar os elementos necessários para que uma

compreensão geral do problema fosse conseguida, bem como tudo aquilo julgado

pertinente que teria relação com ele. Com isso, pode-se perceber a real

complexidade e profundidade que o assunto possui, a despeito de qualquer

julgamento prévio que se poderia ter sobre o tema.

Os resultados encontrados na pesquisa são o testemunho não somente da

complexidade e profundidade do tema, mas também um convite para que se

busque, ainda mais, construir o conhecimento acerca de assuntos correlatos que

foram abordados, mas não eram objetivos específicos da pesquisa.

Desta forma, apresenta-se a seguir os principais resultados encontrados,

seguida da conclusão da pesquisa propriamente dita e, por fim, são apresentadas

sugestões de futuros trabalhos que possam aprofundar alguns temas relevantes e

citados neste.

Antes, porém, cabe relembrar as ressaltas apresentadas no início do com

relação aos resultados e às conclusões texto (vide seção 2.6). Por conta das

limitações do estudo e do problema concernente à estratégia (vide seção 5.2), o que

vem apresentado a seguir, de forma eminentemente propositiva, é, em alguns

elementos, mais forte evidência do que causas efetivamente comprovadas. Todavia,

a despeito disso, não deixam de ter o mérito de ao menos apontá-las.

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168

6.1 Principais Resultados Encontrados

Os principais resultados encontrados por esta pesquisa, podem ser classificados

em três grandes grupos: os relativos aos própositos e objetivos; ao tratamento dado

ao elemento humano; e à operacionalização do sistema de Avaliação de

Desempenho.

Assim, de forma breve, estes serão apresentados a seguir, buscando-se

destacar aquilo de mais relevante em cada um grupos.

6.1.1 Resultados Relativos aos Propósitos e Objetivos

Os propósitos e objetivos do sitema de Avaliação de Desempenho do Exército

Brasileiro são claramente identificáveis, constando de forma explícita no documento

que o cria.

Entretanto, eles apresentam uma inadequação interna, ao conjugarem objetivos

de desenvolvimento com objetivos de premiação no mesmo sistema. Se não fosse

pela presença destes dois tipos antagônicos de objetivos, os mesmos estariam em

consonância com o que a literatura prega.

Mesmo assim, eles não apresentam ligação explícita com a estratégica da

organização, tampouco uma ligação implícita consegue ser percebida.

Por último, com exceção do objetivo de premiação, os demais não têm suporte

de mecanismos que possibilitem operacionalizar as ações necessárias para que os

mesmos sejam atingidos, partindo do resultado da Avaliação de Desempenho.

Page 170: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

169

6.1.2 Resultados Relativos ao Tratamento dado ao Elemento Humano

Um paradoxo curioso surge nestes resultados. Por um lado, considerando o

caráter de dominação presente nas relações humanas no Exército, a Avaliação de

Desempenho poderia ser vista como cumpridora do seu papel de auxiliar na

manutenção desta situação, por ser utilizado como mecanismo de coação.

Todavia, ao se considerar os objetivos do sistema, tal premissa deixa de ter

validade e uma situação nova, com um certo grau de complexidade e

interdependências entre as partes, emerge.

O advento da Pós-modernidade traz conseqüências para a gestão das pessoas

nas organizações. Estas conseqüências são sentidas de forma mais drástica em

instituições como o Exército, com características de Instituição Total.

São percebidas diferenças significativas nas formas como os integrantes de

cada grupo existente no Exército são profissionalmente formados. Por conta das

características de cada formação, estas diferenças fazem com que a Pós-

modernidade seja percebida de forma distinta pelos diversos grupos, gerando

tensões ainda maiores do que numa organização civil. Diferença de percepção esta

que vem sendo aumentada ao passo que há um aumento de capital cultural,

principalmente por parte dos sargentos.

A conseqüência direta é uma contestação de tradições, regras e normas, bem

como até mesmo da autoridade de alguns indivíduos em alguns momentos.

Entre vários, um dos mecanismos de defesa da organização, particularmente

utilizado pelos oficiais, principais defensores das tradições, é a utilização da

Avaliação de Desempenho como instrumento de coação, o que é percebido pelos

avaliados.

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170

Com isso, tem-se que o indivíduo, para ser bem avaliado, mantenha a

submissão, evitando inovações fora da norma. Ou ainda, haverá indivíduos que

manterão seu ímpeto inovador, sendo prejudicados em suas avaliações.

Por fim, isso resultará em avaliações com alto grau de distorção, prejudicando a

qualidade das informações que caberia ao sistema de Avaliação de Desempenho

fornecer.

Além disso, não diretamente relacionado ao sistema, mas também com

implicações para ele, tem-se que a restrição ao acesso à informação, fruto da

dicotomia pensante versus executante, traz insatisfação para os integrantes do

Exército e retira deles a possibilidade de maiores ganhos que adviriam da maior

participação.

E também se vislumbra a possibilidade da adoção de uma nova forma de

tratamento, em contradição ao que os estereótipos sobre a profissão militar

normalmente indicariam. Nova forma esta que, em certo grau, estaria relacionada

aos pontos problemáticos da gestão no Exército que prejudicam o sistema de

avaliação.

6.1.3 Resultados Relativos à Operacionalização do Sistema de Avaliação de

Desempenho

O último grupo é aquele que apresenta os resultados de natureza mais técnica

da avaliação propriamente dita. Porém, cabe ressaltar, que estes resultados também

possuem ligação com os demais, muitas vezes potencializando características

negativas já apresentadas.

O método utilizado é somente a avaliação vertical. Método cujo uso isolado é

condenado pela literatura em geral. Ele reforça, desta forma, a utilização da

Page 172: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

171

Avaliação de Desempenho como instrumento de coação, trazendo as

conseqüências citadas anteriormente.

Ele não possibilita uma visão completa do avaliado, pois baseia-se num único

julgamento, sendo prejudicial para a consecução de todos os objetivos. Além disso,

nem sempre quem avalia é o superior direto do avaliado, gerando distorções de

percepção na avaliação.

As etapas constituintes do sistema diferem em forma e conteúdo do que prega a

literatura. Não há a etapa do planejamento do desempenho, o que gera a falta de

indicadores de desempenho a serem atingidos. A conseqüência disso é sentida em

todas as fases posteriores, trazendo, de imediato, grande subjetividade para o

julgamento.

Não há fase de treinamento e a falta de parâmetros resulta em falta de base de

comparação para se perceber a necessidade de treinamentos e também para se

perceber a evolução real do desempenho do indivíduo ao longo do tempo. O que

também resulta no fato dos indivíduos, durante o transcurso de suas atividades, não

terem capacidade de verificarem o nível de seus desempenhos em comparação ao

que será avaliado deles.

Esta mesma falta de parâmetros, ao gerar uma avaliação subjetiva, faz com

que não se possa estabelecer de forma clara a correspondência entre o

desempenho real e o avaliado, reforçando a possibilidade da avaliação ser utilizada

como instrumento de coação.

E o feedback dado aos indivíduos, ocorrendo exclusivamente na forma de índice

numérico, sem a existência da entrevista de avaliação, é insuficiente para fornecer

subsídios para que eles melhorem seus desempenhos.

Page 173: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

172

O instrumento utilizado para a avaliação é uma escala gráfica modificada. Com

relação ao original, ele aumenta a subjetividade, traz maiores dúvidas quanto as

gradações utilizadas, é muito reducionista e apresenta um valor númerico descolado

de parâmetros objetivos. É importante ressaltar que este aumento de subjetividade

potencializa a já inserida no processo por conta do método e das etapas.

O instrumento ainda é elaborado em desacordo com os critérios pregados pela

literatura, bem como contribui para a ocorrência dos fatores que deterioram a

validade da avaliação.

Além disso tudo, cabe ressaltar que as distorções do sistema de avaliação são

levadas para o Sistema de Valorização do Mérito, responsável pela

operacionalização do objetivo da avaliação de premiação, pois este utiliza os

resultados daquele como principal fonte de dados, sendo acrescentadas outras pelo

próprio sistema de Valorização do Mérito, como as referências circulares e a

utilização de universos diferentes daqueles da avaliação.

Finalizando, o Projeto AVALOP, origem do sistema em uso, se caracterizou por

uma série de erros das mais diversas características, desde a base epistemológica

sobre a qual foi desenvolvido, passando pela metodologia utilizada e chegando até

ao corte de etapas.

6.2 Conclusão

Por tudo o que foi apresentado neste trabalho, pode-se inicialmente concluir que

todos os elementos analisados prejudicam a consecução dos objetivos propostos

pelo sistema.

Desde a formulação dos objetivos, sem ligação com os da organização e com a

presença de antagonismo interno entre eles, passando pela carência de etapas,

Page 174: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

173

deficiência do método e do instrumento e chegando até ao tratamento dado ao

elemento humano na gestão no Exército Brasileiro, sucedem-se inúmeras

deficiências dos mais diversos tipos e com as mais diversas implicações.

Estas, por sua vez, concorrem em diversos sentidos para que os objetivos do

sistema não sejam atingidos, sendo necessário um tratamento muito mais amplo e

profundo do que o que foi dado pelo Projeto AVALOP para que um novo sistema

possa efetivamente ter a qualidade necessária.

Assim, pode-se concluir que ao apontar tais deficiências, bem como os aspectos

envolvidos e relacionados com elas, o presente estudo atingiu de forma plena ao

seu objetivo principal, contribuindo não só para o entedimento do tema em si, mas

também descortinando a possibilidade do entendimento de temas com os quais a

Avaliação de Desempenho se inter-relaciona e que podem contribuir para o melhor

entendimento do homem no trabalho.

Como adendo, é interessante observar como as deficiências identificadas no

sistema de Avaliação de Desempenho do Exército Brasileiro convergem com os dos

demais órgãos públicos no que diz respeito aos objetivos. Mas quanto aos métodos

e instrumentos utilizados, os dos demais órgãos carecem de bem menos

deficiências (vide Seção 3.6), mostrando o quanto pior é a realidade do Exército

Brasileiro nestes aspectos.

Finalizando, os resultados e as conclusões do presente estudo encontram forte

convergência com os dos demais trabalhos acadêmicos no assunto (vide Seção

3.7). Isso evidencia o quão longe as organizações brasileiras estão, de maneira

geral, de atingirem o ideal em Avaliação de Desempenho e, particularmente, o

Exército. Portanto, ainda deve ser despendido grande esforço no estudo de tudo

aquilo que a circunda, caso haja a intenção de que, em algum dia, a Avaliação de

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174

Desempenho, deixe de ser um faz-de-conta organizacional e passe a representar

uma prática verdadeira, justa e benéfica para as organizações e seus integrantes.

6.3 Sugestões para Trabalhos Futuros

Esta dissertação não é um fim em si. Do que foi exposto, descortina-se a

possibilidade da realização de novos estudos que objetivem aprofundar vários

pontos abordados neste trabalho. Destes, destaca-se:

- a elaboração de um levantamento da cultura organizacional do Exército

Brasileiro, incluindo as várias subculturas existentes, dentre as quais situam-se as

identificadas no capítulo 4;

- um estudo que possibilite com que as unidades tradicionais mudem as

práticas de suas rotinas para outras nas quais as implicações da Pós-modernidade

gerem menos tensões, para algo no sentido daquele vivido pelas unidades

operacionalmente mais ativas;

- um trabalho de melhor definição da estratégia do Exército, contemplando

inclusive a diferenciação necessária para que os trabalhos de cunho administrativo

sejam abordados especificamente nela;

- um projeto de interligação explícita entre a estratégia do Exército e a

operacionalização desta nos seus mais diversos componentes; e

- o desenvolvimento de um novo Sistema de Avaliação de Desempenho que

vise corrigir as deficiências encontradas no atual.

Obviamente que estas sugestões não esgotam as possibilidades de estudos

abertas por esta pesquisa, quais surgem a cada nova leitura do texto e que deverão

ser postas em prática o tão logo instiguem a curiosidade científica e sejam possíveis.

Page 176: A Avaliação de Desempenho Humano no Exército Brasileiro ...

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