A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE - PRODEMA MESTRADO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE MAÍRA BORGONHA A “ARTE DO MAR”: CIÊNCIA DOS PESCADORES DA CAPONGA, LITORAL DO CEARÁ FORTALEZA 2008

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Dissertação de mestrado submetida ao Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente da Universidade Federal do Ceará

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UNIVERSIDADE FEDERAL DO CEARÁ PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EM DESENVOLVIMENTO

E MEIO AMBIENTE - PRODEMA MESTRADO EM DESENVOLVIMENTO E MEIO AMBIENTE

MAÍRA BORGONHA

A “ARTE DO MAR”: CIÊNCIA DOS PESCADORES DA CAPONGA, LITORAL DO CEARÁ

FORTALEZA 2008

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MAÍRA BORGONHA

A “ARTE DO MAR”: CIÊNCIA DOS PESCADORES DA CAPONGA, LITORAL DO CEARÁ

Dissertação apresentada ao Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente da Universidade Federal do Ceará como requisito parcial para obtenção do grau de Mestre em Desenvolvimento e Meio Ambiente Área de concentração: Organização do Espaço e Desenvolvimento Sustentável Orientador Prof. Dr. José Levi Furtado Sampaio

FORTALEZA

2008

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Aos pescadores da Caponga

cujos laços com o mar

povoam minha mente.

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AGRADECIMENTOS

The end. Finale. Fini. Ende. Fim. Escreveu Fernando Pessoa em Mar Português:

“quem quiser passar além do bojador deve passar além da dor”, assim, depois de

mais de três anos entre a idéia e a concretização deste mestrado em chão cearense

e mais 3500 km longe de casa, digo que este ciclo se fecha. Reservo então este

momento, que com palavras transformo em matéria, para agradecer quem encontrei

e quem veio de encontro à minha própria Odisséia.

Agradecer a Prof. Dra. Irles Mayorga, meu primeiro contato e esperança de cursar

mestrado no PRODEMA, que juntamente com sua família me acolheram na minha

chegada ao Ceará.

Ao Prof. Dr. José Levi Furtado Sampaio pela especial orientação, dificultosa por ter

se dado à distância e pela compreensão, diante das minhas limitações, de que as

pessoas refletem os contextos das suas sociedades.

Ao Programa de Pós-Graduação em Desenvolvimento e Meio Ambiente na pessoa

da Prof. Dra. Vládia Pinto Vidal de Oliveira, pelos esforços junto ao mesmo e de

forma destacável ao Paulo e ao Edson pelos auxílios prestados.

Ao Deutscher Akademischer Austauschdienst (DAAD), na pessoa da Dra. Gabriele

Althoff e de Rita Meyer pela bolsa que permitiu meu sustento e o desenvolvimento

de boa parte de minha pesquisa.

À PADI AWARE pelo grant que garantiu alguns importantes passos na

concretização do trabalho.

Aos professores do PRODEMA, principalmente aqueles com quem compartilhei a

sala de aula e que me fizeram avançar um pouco mais diante dos desafios da

sustentabilidade. Sem muitas formalidades: Levi, Manoel Fernandes, Zé Gerardo,

Botelho, Amaro, Marta, Edson, Rogério, Dario, Ogawa, Patrícia e Casemiro.

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Aos Professores Dr. Antonio Jeovah de Andrade Meireles e Dra. Maria do Céu de

Lima que contribuíram para as sugestões e encaminhamentos da pesquisa na minha

qualificação. Ao Professor Jeovah agradeço mais uma vez por fazer parte da banca

que marca o encerramento do trabalho. Também ao Professor Dr. Francisco José

Bezerra Souto, a quem particularmente refiro-me como Franzé, por gentilmente ter

acolhido o convite para participar deste desfecho.

Aos meus queridos colegas de turma, que bravamente aceitaram o desafio da

interdisciplinaridade e dividiram angústias e sofrimento pela busca do diálogo entre

Natureza, Sociedade e Desenvolvimento. Pelos nossos encontros, conversas,

discussões e confraternizações depois das efervescentes aulas no nada prodêmico

HM agradeço: Zacka, Carlinha, Maristela, Diana, Anny, Melca, Simone, Danielle,

Erika, Geo, Elis, Cici, Ewerton e também o Chiquinho.

Aos meus companheiros e colegas das “Etno-coisas” que comigo cultivam a crença

na Ecologia dos homens do mar e seus peixes: Leopoldo Cavaleri Gerhardinger e

Luciana Pinheiro. Ainda a Lu Pinheiro meu imenso agradecimento pelas revisões,

contribuições e força inesgotável nos “etno-textos, etno-tristeza e etno-agonias”.

Ao Professor Dr. José Geraldo Marques agradeço pela felicidade e convicção que

me conferem sua obra.

À Fefis minha grande amiga cearense presente nas agruras que a distância trouxe.

Também aos meninos do mar que me levaram até ela, Fred e Wander.

À minha guarda celestial Nono Carlos, Nona Giulia e Dzadzus João. E minha amada

baczinha Teófila.

Agradeço minha família. Meus adorados Teno e Paulinko pelo legado de que cada

dia traz consigo novas possibilidades. Pelos precedentes de honestidade, fé,

trabalho e dedicação. Por serem os que mais amam, mais torcem, mais cuidam,

rezam e suportam as minhas partidas e chegadas. Amo, aprendo, respeito e admiro

vocês muito e mais a cada dia.

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Meus irmãos Midis, Dídi e Clau. Primeira: pioneira na abertura dos horizontes,

palavra certa e incentivo nas horas de dúvida. A que chegou por último: Pequena

grande centelha de vida, que se espalha linda pelo mundo. Cunhas, irmão que a

vida me deu: ombro, casa e conselho nos retornos.

Aos meus eternos guris Rodrigo e Tomás, meninos lindos que amo e esperança

concreta de harmonia entre seres humanos e natureza.

À família que ganhei: Jack, Baby, Franco e Manu. Pela acolhida familiar, cafezinhos,

torcida, florais e orações. Obrigada!

Ao grande companheiro de vida e de profissão Áthila. Homem-peixe! Meu suporte

na jornada nordestina por vezes mais árida pela distância e pelo desencontro. Pelas

inúmeras idas e vindas, lágrimas e sorrisos, aeroportos, portos, telefonemas e

surpresas que tivemos. Pelo passado e pelo futuro azul a nossa frente! LUM.

Aos meus amigos, inúmeros que deixei pelo Sul e que continuaram fazendo parte da

minha vida, aguardando o meu retorno e o fim do mestrado.

À Martilene e Seu Wilson minha família cearense. Principais incentivos e apoio ao

trabalho na Caponga que suportaram tantas perguntas sobre tantas coisas durante

tanto tempo.

À comunidade da Caponga em especial aos Capongueiros que mantiveram o meu

coração e meus pensamentos acesos em vento “puxador” até que finalmente

chegasse o tempo de soprar vento “macio”.

À Estés, Nichols, Jung, Lacan, Freud e Tânia.

Aos pequenos passos que tenho reaprendido a dar na eminência dos meus 27 anos.

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caponga. Substantivo feminino. Bras. 1. Pequeno lago litorâneo de água doce, formado nos areais. 2. Areal que se alaga com as chuvas, coberto, em geral, por vegetação herbácea, higrófila e baixa.3. Linha de pescar, sem anzol e com uma bola: o pescador atrai o peixe e pega-o à mão. Bater caponga. 1. Bras. Pescar à mão. (FERREIRA, 2004).

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RESUMO

Os pescadores da Caponga entendem a pesca como a prática de sua própria

ciência. Sendo nominada de arte do mar, a atividade é exercida dentro de um

contexto cultural particular, que insere saberes e práticas traçados e construídos

durante as relações dos pescadores no ambiente. O longo histórico da produção

pesqueira de pequena escala no cenário cearense singulariza e influencia a vida da

população local nos aspectos econômico, social, cultural e ecológico. Logo, o

trabalho propõe a descrição dos sistemas de percepção, cognição e uso dos

ecossistemas pelos pescadores artesanais. A escolha da abordagem etnoecológica

justifica-se por não analisar apenas analogias entre as classificações nativas e

científicas, mas traduzir as linguagens em uma verdadeira aproximação e diálogo de

saberes. A coleta de dados da pesquisa ocorreu entre os meses de junho de 2006 a

dezembro de 2007, totalizando 85 dias de campo e dividiu-se basicamente em três

etapas: pré-campo, trabalhos não-regulares e vivência. A proposta metodológica

para a coleta de dados foi gerada na utilização conjunta das técnicas de observação

participante, observação direta, entrevistas e histórias de vida (n=59) e questionários

(n=154). Serviram como recurso adicional a realização de turnês guiadas,

aprendizado vivenciado, testes projetivos e grupos focais. O banco de dados foi

composto por 14h13’52” de registros fonográficos; 25’50” de registros fílmicos e 18

mapas cognitivos. Reforçando o caráter investigativo e exploratório da pesquisa,

buscou-se a integração dos olhares êmico e ético pela adoção da Etnografia

Visual composta por 5183 registros fotográficos selecionados e apresentados em 19

pranchas. Como resultados, o trabalho traz as dificuldades e potencialidades das

abordagens teórica e metodológica enfatizando o caráter prático da construção do

processo de coleta e análise de dados da pesquisa. Caracteriza os pescadores da

Caponga, sob aspectos de seu modo de vida, suas relações, motivações e

projeções enquanto grupo e dentro do escopo da atividade. Aborda a economia da

pesca através do levantamento da cadeia produtiva, da análise do papel dos atores

sociais e da comercialização da produção. Registra saberes, sistemas e artes de

pesca, empregados no contexto local, caracteriza capturas e espécies-alvo.

Apresenta os sistemas de orientação marítima e pesqueira com enfoque à

navegação e marcação e a introdução de novas metodologias e tecnologias de

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pesca. Fazendo uso da Etnoecologia e adotando categorias e conceitos utilizados

pelo grupo em estudo, foi possível observar o funcionamento dos sistemas de

conhecimento em vários níveis, considerando os elementos que fazem parte dele,

os meios porque operam e como se organizam fornecendo bases para a

reconstrução das relações entre os pescadores da Caponga e os recursos naturais.

Palavras-chave: Etnoecologia; pescadores; pesca artesanal; Caponga; Ceará.

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ABSTRACT

Caponga’s artisanal fishermen understand fisheries as the practice of their own

knowledge. Also known as “art of the sea”, fisheries is practiced in a particular

cultural context, which iserts knowledges and practices drafted and built along their

relationships in the environment. The long history of small-scale fisheries production

in the Ceará’s scenario, influences and creates a singularity in locals’ way of life in

the economic, social, cultural and ecological aspects. Moreover, the research

proposes a description of the perception system, cognition and the use of

ecossistems by the artisanal fishermen. The choice of the Ethnoecology approach is

justified since it deals not only with analogies between native and scientific

classifications, but translates the languages in a real close approach and dialogs of

knowledge. Data was collected from July 2006 to December 2007, totalizing 85 days

in the field, divided basically in three main periods: pilot, non-regular visits and 62-

days living in the field. Data collection involved a joint use of the techniques:

participant observation, direct observation, interviews and life-histories (n=59) and

questionnaires (n=154). Additional resources were applied: guided tours,

apprenticeship, projective tests and focal groups. The database was composed by

14h13’52” of phonographic and 25’50” of movie recording and 18 cognitive maps.

Reinforcing the analytical and investigative research character, the emic and ethical

appraisal were included through a Visual Ethnography approach composed by 19

plates selected from 5183 images. As a result, the research brings the difficulties and

potentialities of theorethical and methodological approaches emphasazing the

practice of building a process of collecting and analysis of research data.

Characterizes the fishermen of Caponga, under the aspects of their way of life, their

relationships, motivations, and projections while a group and the purpose of the

activitie. Deals with the economy of fisheries through the understanding of the

productive chain, the analysis of the hole of stakeholders, and the commercialization

of production. Records the knowledge, systems and fisheries artifacts, employed in

the local context, characterizes target-species and catches. Presents the maritime

and fisheries orientation systems, with focus on the navigation and setting of fishery

grounds, and the introduction of new methodologies and fishery technologies. The

use of Ethnoecology and adopting cathegories and concepts used by the studied

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group, it was possible tho observe the operation of the knowledge system in several

levels, considering the elements which are part of it, the operation means and how

they get organized providing basis for the reconstruction of relationships among the

fishermen of Caponga and the natural resources.

Keywords: Etnoecology; fishermen; artisanal fisheries; Caponga; Ceará.

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LISTA DE ILUSTRAÇÕES

FIGURA 1 - Mapa de localização da área de estudo. _____________________ 45!

FIGURA 2 - Quadro das técnicas utilizadas na coleta e registro de dados de acordo com suas finalidades. _______________________________________ 48!

FIGURA 3 - Quadro de público-alvo e finalidade da aplicação dos questionários QI, QII e QIII, respectivamente. _______________________________________ 50!

FIGURA 4 - Distribuição percentual de pescadores da Caponga por faixa etária. Fonte: Pesquisa de campo, 2007. ____________________________________ 62!

FIGURA 5 – Dados da experiência de pesca em décadas dos pescadores na Caponga. Fonte: Pesquisa de campo, 2007. ____________________________ 63!

FIGURA 6 – Local de procedência dos pescadores da Caponga. Fonte: Pesquisa de campo, 2007. __________________________________________ 65!

FIGURA 7 – Local onde os pescadores entrevistados iniciaram-se na atividade da pesca. Fonte: Pesquisa de campo, 2007. ____________________________ 66!

FIGURA 8 – Idade de ingresso na atividade pesqueira na Caponga por faixa etária. Fonte: Pesquisa de campo, 2007. _______________________________ 69!

FIGURA 9 – Diagrama de Venn das representações do “ser pescador” segundo os relatos de meninos na Caponga. Fonte: Pesquisa de campo, 2007. ______ 72!

FIGURA 10 - Catálogo comportamental do fenômeno “ser menino” na Caponga. Adaptação do modelo proposto por Marques (2001a). Fonte: Pesquisa de campo, 2007. __________________________________________ 74!

FIGURA 11 – Razões para continuar na atividade pesqueira. Fonte: Pesquisa de campo, 2007. ___________________________________________________ 76!

FIGURA 12 – Razões para não continuar na atividade pesqueira. Fonte: Pesquisa de campo, 2007. __________________________________________ 77!

FIGURA 13 – Atividades complementares ligada à pesca. Fonte: Pesquisa de campo, 2007. _____________________________________________________ 81!

FIGURA 14 – Fluxo da Cadeia Produtiva de pescado na Caponga. Fonte: Pesquisa de campo, 2007. __________________________________________ 82!

FIGURA 15 - Jangada. Foto: Áthila A. Bertoncini, 2007. _________________ 104!

FIGURA 16- Paquetes. Foto: Áthila A. Bertoncini, 2007. _________________ 104!

FIGURA 17 - Botinho. Foto: Maíra Borgonha, 2007. _____________________ 104!

FIGURA 18 - Croqui de jangada com especificações dos principais elementos. Ilustração: Evanildo Lopes (ilustrador local), 2007. _____________________ 109!

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FIGURA 19 - Croqui de jangada com especificações sobre velame e cabos de hasteamento. Ilustração: Fransquinho Paé, 2007. ______________________ 111!

FIGURA 20 - Esboço jangada com as distintas posições para a pesca de peixes. __________________________________________________________ 127!

FIGURA 21 – Corte da aleta superior atribuído ao proeiro (2). ____________ 129!

FIGURA 22 – Corte da aleta inferior atribuído ao rebique (3). _____________ 129!

Figura 23 – Corte das duas aletas atribuído ao bico de proa (4). __________ 129!

FIGURA 24a – Corte em forma de “V” atribuído aopescador de cinco (5). __ 130!

FIGURA 24b – Corte em forma de “U” atribuído aopescador de cinco (5). __ 130!

FIGURA 25 - Esboço jangada com as distintas posições para a pesca de peixes com rede. _______________________________________________________ 134!

FIGURA 26 - Esboço jangada com as distintas colocações na pesca de manzuá para captura de lagosto. ___________________________________________ 139!

FIGURA 27 – Gráfico dos critérios utilizados pelos pescadores para traçar as melhores condições de pesca. Fonte: Pesquisa de campo, 2007. _________ 141!

FIGURA 28 – Gráfico da duração de uma pescaria em horas por estação. Fonte: Pesquisa de campo, 2007. _________________________________________ 142!

FIGURA 29 – Gráfico da Freqüência de menção e ordem de importância das espécies capturadas no verão. Espécies citadas em primeira ordem (a); em segunda ordem (b); em terceira ordem (c); em quarta ordem (d) e em quinta ordem (e). Fonte: Pesquisa de campo, 2007. __________________________ 143!

FIGURA 30 – Gráfico da freqüência de menção e ordem de importância das espécies capturadas no inverno. Espécies citadas em primeira ordem (a); em segunda ordem (b); em terceira ordem (c); em quarta ordem (d) e em quinta ordem (e). Fonte: Pesquisa de campo, 2007. __________________________ 143!

FIGURA 31 – Gráfico da freqüência de ocorrência das espécies de peixes desembarcadas na praia da Caponga em 36 desembarques amostrados. Fonte: Pesquisa de campo, 2007. _________________________________________ 144!

FIGURA 32 – Matriz de similaridade da ocorrência de espécies observadas no desembarque de peixes da Caponga. Barra escura demonstra as espécies agrupadas. Fonte: Pesquisa de campo, 2007. _________________________ 145!

FIGURA 33 – Recursos utilizados pelos pescadores da Caponga para orientação marítima e pesqueira. Fonte: Pesquisa de campo, 2007. _______ 146!

FIGURA 34 –Tipologia dos principaisventos reconhecidos pelos pescadores da Caponga e correspondência geográfica. Mapa mental. José Valdecir Alves, 2007. (A) Terral; (B) Norte; (C) Nordeste; (D) Largo; (E) Leste e (F) Sul. Fonte: Pesquisa de campo, 2007. _________________________________________ 149!

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FIGURA 35 - Catálogo de classificação dos ventos segundo os pescadores da Caponga. Fonte: Pesquisa de campo, 2007. ___________________________ 150!

FIGURA 36 - Carta celeste com as principais constelações utilizadas como recurso da navegação astronômica na Caponga. Mapa Mental: Francisco Helieudo Silva, 2007. (1) Cruzeirinho; (2) Barca e Leme; (3) Duas Estrelas; (4) Cruzeiro do Sul; (5) Sete-Estrela; (6) Três Reis Magos e (7) Três Marias. Fonte: Pesquisa de campo, 2007. _________________________________________ 157!

FIGURA 37 - Constelações conhecidas pelos pescadores da Caponga e seus equivalentes astronômicos. Fonte: Pesquisa de campo, 2007. ___________ 158!

FIGURA 38 – Em detalhe, as “Três Marias” estrelas pertencentes à constelação de Órion (em traçado menor à esquerda) e os “Três Reis Magos” estrelas possivelmente correspondentes à constelação de Carina (em tamanho maior à direita). Fonte: Pesquisa de campo, 2007. ____________________________ 158!

FIGURA 39 –Em detalhe, as “Duas Estrelas” correspondentes a Alfa e Beta Centauro e ao lado direito o “Cruzeirinho” correspondente ao Cruzeiro do Sul. Fonte: Pesquisa de campo, 2007. ___________________________________ 159!

FIGURA 40–Em detalhe, a “Barca e Leme” correspondente a parte da Ursa Maior (Arado). Fonte: Pesquisa de campo, 2007. _______________________ 159!

FIGURA 41–Em detalhe, o “Sete Estrela” correspondente a Ursa Menor. Fonte: Pesquisa de campo, 2007. _________________________________________ 159!

FIGURA 42 - Atividade de construção dos principais recursos da navegação astronômica na Caponga. Mapa Mental: Francisco Helieudo Silva. Foto Áthila A. Bertoncini, 2007. _______________________________________________ 162!

FIGURA 43 - Atividade de construção do posicionamento de orientação dos principais recursos da navegação astronômica na Caponga. Mapa Mental: Francisco Helieudo Silva. Foto Áthila A. Bertoncini, 2007. _______________ 162!

FIGURA 44 - Em detalhe a Serra de Mataquiri posicionada em frente “ao correr” do porto da Caponga. Foto: Francisco Soares de Souza, 2007. ___________ 165!

FIGURA 45 - Embarcação se aproximando do porto da Caponga. Foto: Francisco Soares de Souza, 2007. ___________________________________ 166!

FIGURA 46 - Localização dos mares tomando como referência o porto da Caponga. Mapa mental. Autor: Francisco Miranda Pereira, 2007. (1) mar da MaiaVermeia; (2) mar das Três Moita; (3) mar do Roçado; (4) mar da Maia; (5) mar da Carnaúba; (6) mar da Aruanã; (7) mar do Batoque ou da Boa Vista; (8) mar do Iguape. Fonte: Pesquisa de campo, 2007. ______________________ 169!

FIGURA 47 - Detalhe da figura 46 mostrando a posição da embarcação durante a captura. Posicionamento dos pescadores: (a) mestre, (b) proeiro e (c) rebique (c) e bico de proa (d). Fonte: Pesquisa de campo, 2007. _________________ 171!

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FIGURA 48 - Mapa mental da localização dos mares tomando como referência o porto da Caponga. Mapa mental. Autor: José Valdecir Alves, 2007. Em vermelho (1) mar da Maia Vermeia; (2) mar das Três Moita; (3) mar do Roçado; (4) mar da Maia; (5) mar da Carnaúba; (6) mar da Aruanã; (7) mar do Batoque ou da Boa Vista; (8) mar do Iguape; (9) mar do Aquiraz. Em amarelo: (1) vento Terral e (2) vento Sueste. __________________________________________ 173!

FIGURA 49 – Quadro da tipologia dos substratos marinhos e especificações. Fonte: Pesquisa de campo, 2007. ___________________________________ 175!

FIGURA 50 - Primeira referência das pescarias feitas pela natureza. Fonte: Pesquisa de campo, 2007. _________________________________________ 177!

FIGURA 51 - Referências complementares que determinam a localização ou propriedade das pescarias. Fonte: Pesquisa de campo, 2007. ____________ 177!

FIGURA 52 - Localização das pescarias tomando como referência o porto da Caponga. Mapa Mental. Autor: João Jairo Pessoa Silva, 2007. (A) Pescarias feitas pela natureza sistema de dormida. (B) Pescarias marcadas do sistema de ir-e-vir. (A1) Péda do Soiza; (A2) Razinho; (A3) Risca do André (A4) Avião. (B1, B2, B3, B4, B5) não identificadas. ___________________________________ 179!

FIGURA 53 - Localização das pescarias feitas pela natureza tomando como referência a linha de costa. Mapa Mental. Autor: Pedro Alves Pereira, 2007. (A) Péda do Inácio, (B) Péda do Soiza e (C) Razinho. ______________________ 180!

FIGURA 54 - Evolução da localização das pescarias feitas com marambaias. Mapa Mental. Autor: Raimundo Odacir Alves, 2007. Em ordem crescente, (1 a 8) marambaias posicionadas de acordo com a distância da costa e cronologia. ________________________________________________________________ 184!

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LISTA DE PRANCHAS

PRANCHA 1 ............................................................................................................. 41!

PRANCHA 2 ............................................................................................................. 43!

PRANCHA 3 ............................................................................................................. 44!

PRANCHA 4 ............................................................................................................. 67!

PRANCHA 5 ............................................................................................................. 68!

PRANCHA 6 ............................................................................................................. 83!

PRANCHA 7 ............................................................................................................. 84!

PRANCHA 8 ............................................................................................................. 94!

PRANCHA 9 ............................................................................................................. 95!

PRANCHA 10 ........................................................................................................... 98!

PRANCHA 11 ........................................................................................................... 99!

PRANCHA 12 ......................................................................................................... 100!

PRANCHA 13 ......................................................................................................... 101!

PRANCHA 14 ......................................................................................................... 117!

PRANCHA 15 ......................................................................................................... 118!

PRANCHA 16 ......................................................................................................... 121!

PRANCHA 17 ......................................................................................................... 136!

PRANCHA 18 ......................................................................................................... 140!

PRANCHA 19 ......................................................................................................... 154!

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO _____________________________________________________ 20 CAPÍTULO 1. O OLHAR DO PESQUISADOR NA BUSCA DA CIÊNCIA DO OUTRO __________________________________________________________ 23 1.1 Bases teóricas da pesquisa ________________________________________ 23 1.1.1 Etnociência: A caminho da interdisciplinaridade ______________________ 23 1.1.2 Etnoecologia “de mesmo” _______________________________________ 29 1.1.3 Reflexões sobre a pesquisa etnoecológica __________________________ 32 1.1.4 Pesca artesanal e conhecimento de pescadores ______________________ 33 1.1.5 Breve panorama da pesca artesanal no Brasil ________________________ 35 1.1.6. Comunidades pesqueiras marítimas cearenses ______________________ 36 1.2 Bases metodológicas e práticas da pesquisa __________________________ 42 1.2.1 Caracterização do litoral cearense _________________________________ 42 1.2.2 A Caponga do peixe ____________________________________________ 45 1.2.3 Coleta de Dados _______________________________________________ 47 1.2.3.1 Técnicas de aquisição de dados _________________________________ 48 1.2.3.2 Técnicas de registro de dados ___________________________________ 57 1.2.4 Análise de dados ______________________________________________ 59 CAPÍTULO 2. A CIÊNCIA DOS PESCADORES DA CAPONGA: ASPECTOS SOCIAIS, ECONÔMICOS E CULTURAIS DA PESCA _____________________ 61 2.1 Os Capongueiros ________________________________________________ 61 2.1.2 Procedência __________________________________________________ 65 2.1.3 Aprendizado e parentesco _______________________________________ 69 2.1.4 Perspectivas __________________________________________________ 76 2.1.5 Transmissão do ofício ___________________________________________ 78 2.1.7 Habilidades ___________________________________________________ 81 2.2 A economia da praia _____________________________________________ 82 2.2.1 Ocupações ligadas à pesca ______________________________________ 85 2.2.1.1 Botadores ___________________________________________________ 85 2.2.1.2 Outras ocupações ____________________________________________ 86 2.2.1.3 Trabalho feminino ____________________________________________ 87 2.2.1.4. Marchantes _________________________________________________ 88 2.3. O sistema de divisão por partes ____________________________________ 90 2.3.1 Destino da produção ____________________________________________ 91 CAPÍTULO 3. A CIÊNCIA DOS PESCADORES DA CAPONGA: SABERES DE PESCA __________________________________________________________ 102 3.1 A “navegação” _________________________________________________ 102 3.1.1 Tripulação ___________________________________________________ 119 3.2 Sistemas de medida ____________________________________________ 120 3.3 Rotina de pesca ________________________________________________ 122 3.4 Sistemas de pesca______________________________________________ 124

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3.4.1 Dormida ____________________________________________________ 125 3.4.2 Ir-e-vir ______________________________________________________ 125 3.5 Artes de pesca _________________________________________________ 126 3.6. Capturas _____________________________________________________ 126 3.6.1 Captura de peixes _____________________________________________ 126 3.6.1.1 Captura de peixes com linha ___________________________________ 131 3.6.1.2 Captura de peixes com rede ___________________________________ 132 3.6.1.3 Captura de peixes com tarrafa _________________________________ 137 3.6.1.4 Captura de peixes com viveiros _________________________________ 137 3.6.2 Captura de lagosto ou lagostim __________________________________ 138 3.7 Calendários de Pesca ___________________________________________ 141 CAPÍTULO 4. A CIÊNCIA DOS PESCADORES DA CAPONGA: ENTRE CÉU, TERRA E MAR – SISTEMAS DE ORIENTAÇÃO MARÍTIMA E PESQUEIRA __ 146 4.1 Sistema de navegação __________________________________________ 147 4.1.2 Os ventos ___________________________________________________ 148 4.1.3 As marés, os rolos de mar e a onda grande _________________________ 152 4.1.4 Os planetas __________________________________________________ 155 4.1.5 Os gases ____________________________________________________ 163 4.2. O sistema de marcação _________________________________________ 164 4.2.1 Os mar _____________________________________________________ 167 4.2.2 Pescarias ___________________________________________________ 173 4.2.2.1 Marambaias ________________________________________________ 181 4.2.2.2 GPS ______________________________________________________ 185

CONSIDERAÇÕES FINAIS _________________________________________ 187

REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS ___________________________________ 189

APÊNDICE A _____________________________________________________ 202

APÊNDICE B _____________________________________________________ 204

APÊNDICE C _____________________________________________________ 206

APÊNDICE D _____________________________________________________ 207

APÊNDICE E _____________________________________________________ 208

ANEXO A ________________________________________________________ 210!

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INTRODUÇÃO

Antropólogo e filósofo belga, Claude Lévi-Strauss (1976) escreveu que o

sábio nunca dialoga com a natureza pura, senão com um estado entre natureza e

cultura, no período da história e civilização a que pertence e os meios materiais que

dispõe.

Por milhares de anos, povos ao redor do mundo têm usado o conhecimento

do seu ambiente para sustentar a si próprios e manter sua identidade cultural

(JOHNSON, 1992). Nesse aspecto, o “saber” converte-se em ponto de condensação

entre simbolismo, realidade e imaginário humanos. Um encontro entre significado,

ação, espaço de co-evolução da biologia e cultura onde são geradas novas utopias

que visam reintegrar a ordem dentro da natureza (LEFF, 2001).

Formas de produção de conhecimento, que determinam modos específicos

de apropriação da natureza, apresentam uma racionalidade própria, baseada em

conjuntos de regras sociais. Por sua vez, as regras envolvem relações de produção,

parentesco, representações simbólicas, mitos, costumes e são destinadas a atingir

objetivos, entre eles, a reprodução social (DIEGUES, 1983; LEFF, 2000).

Os meios de relação, atuação e apropriação dos indivíduos acerca do

ambiente em que vivem são um complexo resultado da conexão entre o sistema de

crenças do indivíduo, sua cosmovisão (kosmus); o conhecimento resultante dos

sistemas cognitivos estabelecidos a partir da leitura ou interpretação do indivíduo,

acumulada em sua experiência de vida (corpus) e a adoção de mecanismos visando

garantir um fluxo ininterrupto de bens, matéria e energia do ecossistema (práxis)

(TOLEDO, 2002).

As populações não urbano-industriais, convivem, nomeiam, classificam e

categorizam complexamente o mundo ao seu redor. Para essas populações a

natureza não é vista como algo totalmente intocado, sendo manipulada e

domesticada. Do mesmo modo, a diversidade da vida não é considerada apenas

recurso, mas um conjunto de seres de valor simbólico (DIEGUES 2000).

A riqueza de conhecimentos das populações locais/tradicionais sobre o meio

ambiente tem possibilitado uma co-evolução, mantendo o equilíbrio entre ambos

(ROUÉ, 2000; CUNHA; ALMEIDA, 2002). A existência do conhecimento endêmico,

que passou a ser vislumbrado pela comunidade científica ocidental recentemente,

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atesta não somente a presença de um vasto reservatório de informações sobre

espécies animais e vegetais, mas também de estratégias efetivas para assegurar o

uso continuado de recursos naturais locais em diversas regiões do mundo (POSEY,

1986; JOHNSON, 1992).

Assim, a Etnoecologia, como campo interdisciplinar de conhecimento que

preconiza o cruzamento das ciências sociais e ambientais, propõe verificar as

potencialidades de percepção de determinadas sociedades frente aos elementos

naturais, valorizando a existência de saberes fora do mundo ocidental.

Considerando como primordiais as pesquisas que investigam a natureza das

relações entre Sociedades e Ecossistemas diversos, este estudo descreve as

relações de convívio e apropriação do meio natural pelos pescadores da localidade

da praia da Caponga, município de Cascavel, Estado do Ceará.

Durante o período da pesquisa, investigou-se o modus vivendi dos

“Capongueiros” - através do levantamento de informações socioeconômicas,

culturais e do reconhecimento dos saberes e práticas que envolvem as atividades de

pesca - à luz da Etnoecologia, na busca do entendimento das categorias de

classificação nativas permeadas pelos elementos bióticos e abióticos ao seu redor.

A dissertação encontra-se estruturada em quatro capítulos. No primeiro

capítulo, apresentam-se as bases teóricas que permearam a pesquisa, e que

tiveram origem na interdisciplinaridade, passando pela escolha da abordagem

etnoecológica. A seguir, as bases práticas apontam as dificuldades e

potencialidades do método na construção do processo de coleta e análise de dados

da pesquisa.

O capítulo dois, por sua vez, traz a caracterização dos pescadores da

Caponga, abordando aspectos do seu modo de vida, suas relações, motivações e

projeções enquanto grupo e dentro do escopo da atividade. Posteriormente,

aspectos econômicos da pesca são descritos através do levantamento da cadeia

produtiva, da análise do papel dos atores sociais e da comercialização da produção

pesqueira.

No terceiro capítulo são apresentados os saberes de pesca por meio da

caracterização dos sistemas e artes de pesca empregadas no contexto local. São

ainda apresentados os calendários de pesca, sistemas de medidas e tipos de

captura.

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22

O quarto capítulo encerra o trabalho, onde importantes aspectos dos sistemas

de orientação marítima e pesqueira são elucidados com enfoque à navegação e

marcação, tratando do papel dos sistemas próprios de conhecimento e uso de

recursos, bem como da adaptação frente à novas metodologias de pesca e à

introdução de tecnologias.

Reforçando o caráter investigativo e exploratório da pesquisa, buscou-se a

integração dos olhares êmico e ético pela adoção da Etnografia Visual. Tais

olhares se encontram dissolvidos em 19 pranchas contendo imagens do cotidiano

pesqueiro e de situações específicas que buscam, como apontado por Samain

(2004, p. 56): “[...] através de fotografias realizadas em momentos e contextos

diferentes [...] despertar e conduzir o leitor/observador à descoberta de uma

dimensão nova e possível do ethos [...]” - e do pathos (MARQUES, 2005) - do

universo da pesca na Caponga.

Por fim, cabe ressaltar e esclarecer que a adoção do termo Ciência para

referir-se ao conjunto de conhecimentos pertencentes aos pescadores da

Caponga - aqui dispostos e abordados - justifica-se para além do entendimento

da pesquisadora, pelo reconhecimento próprio dos mesmos diante das suas

relações com a atividade pesqueira e o ambiente marinho. De forma prática, o

que um dos colaboradores na construção das próximas páginas, afirmou: “Negócio

de jangada é uma ciência. A vida do pescador é uma ciência”.

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CAPÍTULO 1. O OLHAR DO PESQUISADOR NA BUSCA DA CIÊNCIA DO

OUTRO

1.1 Bases teóricas da pesquisa

1.1.1 Etnociência: A caminho da interdisciplinaridade

Os atuais questionamentos epistemológicos, derivados do avanço da crise

ambiental, têm revolvido os modos aprendidos de pensar da racionalidade moderna,

ao expor a insuficiência disciplinar e reivindicar a compreensão da complexidade das

inter-relações situadas na base dos problemas ecológicos (CARVALHO, 2004). Por

conseguinte, a existência de uma relação desequilibrada entre preservação

ambiental e desenvolvimento humano – origem dos sistemas complexos1 - tem

resultado em problemas gestionais dos patrimônios comuns, tanto culturais quanto

naturais, emergindo segundo Sachs (1998), como um desafio de primeira grandeza.

Nesse contexto, a interdisciplinaridade tem se apresentado como veículo de

rompimento do paradigma científico vigente a partir do momento em que propõe a

reformulação das práticas de pesquisa, produzindo resultados direcionados para a

conversão de problemas reais precisos, os quais apresentam estreitos laços com a

realidade (ZANONI, 2000).

No entanto, o fato de realizar pesquisas voltadas a um mesmo campo não

pode ser condição absoluta para adquirir uma articulação interdisciplinar efetiva.

Como apontado por Godard (1997), para que a interdisciplinaridade se manifeste,

faz-se necessária a delimitação de problemas científicos que evitem a simplificação

por junções dos métodos de diferentes áreas, pormenorizando, freqüentemente o

papel da sociedade nas questões ambientais. A partir daí, a problemática focada

1 Para Edgar Morin, precursor do Pensamento Complexo “[...] só podemos conhecer o todo se conhecermos as partes que o compõem” (MORIN, 2000, p. 01). O pensamento complexo é, portanto, essencialmente aquele que trata com a incerteza e consegue conceber a organização. Apto a unir, contratualizar, globalizar, mas ao mesmo tempo a reconhecer o singular, o individual e o concreto. Não se reduz nem à ciência, nem à filosofia, mas permite a comunicação entre elas, servindo-Ihes de ponte. O modo complexo de pensar não tem utilidade somente nos problemas organizacionais, sociais e políticos, pois um pensamento que enfrenta a incerteza pode esclarecer as estratégias no nosso mundo incerto; o pensamento que une pode iluminar uma ética da religação ou da solidariedade. O pensamento da complexidade tem igualmente seus prolongamentos existenciais ao postular a compreensão entre os homens (MORIN, op. cit., p. 21).

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apenas na gestão dos recursos naturais passa a integrar questões de

funcionamento dos sistemas naturais e as dinâmicas das sociedades que os utilizam

(ZANONI, 2000).

A adoção de novos valores e padrões de conduta, em níveis adequados à

capacidade de suporte dos ambientes, passa pela determinação de trajetórias

plurais de desenvolvimento, como defendido por Sachs (1998), através das

interações entre a diversidade biológica e cultural, cabendo à presente geração o

desafio de elaborar a história dos processos de co-evolução da espécie humana e

do planeta.

Diante do axioma do desenvolvimento plural, que remete abertamente à

sustentabilidade, e uma vez tendo ela se tornado uma discussão necessária nos

vários campos do conhecimento, é indispensável ao bom desempenho

interdisciplinar inserir ações concretas sobre a realidade a que revela, buscando

meios de torná-la mais abrangente (MARRONI; ASMUS, 2005). Destarte, também

devem ser levadas em consideração várias dimensões da sustentabilidade que não

somente a ecológica, mas também a social, a econômica, a espacial e a cultural

(SACHS, 1994) 2.

A interpretação das questões socioambientais baseada apenas na visão da

ciência moderna, está à mercê de exercer uma leitura errônea, principalmente nos

procedimentos de manejo dos recursos naturais em meio à populações locais. Uma

abordagem apropriada deve contemplar os aspectos científicos, mas

indubitavelmente aspectos baseados na percepção dos sujeitos, os quais

manipulam o ambiente como recurso, para chegar a conclusões mais próximas da

realidade e da necessidade da sua investigação (BORGONIA, 2005).

O crescimento sem precedente dos conhecimentos em nossa época têm

tornado legítima a questão da adaptação das mentalidades à diversidade de saberes

(NICOLESCU, 1999). A contestação entre a visão do homem comum e a do

cientista, explicada por critérios reducionistas é muito freqüentemente objeto de erro,

2 Sustentabilidade social para construção de uma sociedade do ser, baseada na distribuição igualitária do ter; sustentabilidade econômica para reavaliação e incorporação de fatores sociais e ambientais integrados aos indicadores atuais; sustentabilidade ecológica para manutenção da utilização da natureza (baseada no princípio da precaução); sustentabilidade espacial promovendo melhorias na distribuição da ocupação humana e das atividades produtivas e por fim a sustentabilidade cultural implicando no respeito à diversidade de tradições, pensamentos e estilos de vida locais (SACHS, 1994).

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levando à visão de mundo do acaso e das relações mecânicas (FRAGOSO

GUIMARÃES, 1998). Como apontado por Diegues:

De um lado, está o saber acumulado das populações tradicionais sobre os ciclos naturais, a reprodução e a migração da fauna, a influência da Lua nas atividades de corte da madeira, da pesca, sobre os sistemas de manejo dos recursos naturais, as proibições do exercício de atividades em certas áreas ou períodos do ano, tendo em vista a conservação das espécies. De outro lado, está o conhecimento científico, oriundo das ciências exatas que não apenas desconhece, mas despreza o conhecimento tradicionalmente acumulado. Em lugar da Etnociência, instala-se o poder da Ciência Moderna, com seus modelos ecossistêmicos, com a admiração “moderna” dos recursos naturais, com a noção de capacidade de suporte baseada em informações científicas (na maioria das vezes insuficientes). (DIEGUES, 2001, pg. 69).

Adicionalmente, argumenta-se a indivisibilidade entre elementos de origem

cultural e de origem natural. Lévi-Strauss (1976) afirma que não existe diálogo com a

natureza pura senão com um determinado estado de relação com a Cultura, definida

pelo período histórico onde se insere, seu grupo e os meios materiais que dispõe.

Trabalhos científicos de conservação e manejo da natureza podem

apresentar sérias falhas ao não considerarem a intervenção das comunidades locais

(LANGLEY, 2006). A título de exemplo, a Biologia da Conservação - que prega a

conservação de toda diversidade biológica - enfatiza o desenvolvimento de métodos

de manejo e de áreas para preservação de espécies, mas exclui as populações

humanas do contexto ignorando o fato de que a biodiversidade, em grande parte,

pode ser resultado do manejo das populações tradicionais/ locais.

As variáveis socioculturais têm sido deixadas de fora das pesquisas

conservacionistas pela complexidade da análise da atuação humana dentro dos

ecossistemas (DIEGUES 2000a). No caso da proposição de uma nova ciência da

conservação seria condição sine qua non a síntese entre conhecimento científico e

tradicional (DIEGUES, op. cit.), reconhecendo as outras formas igualmente racionais

de perceber a biodiversidade além das tidas atualmente pela ciência moderna.

Assim, apresenta-se a Etnociência, chamada por Geertz de “Análise

Componencial ou Antropologia Cognitiva” (1989, pg. 21), que tem por escopo

interrogar o funcionamento dos sistemas de saberes e construir um novo objeto

científico interdisciplinar, articulando conhecimentos de diferentes disciplinas bem

como processos materiais e simbólicos, de forma a auxiliar na construção de uma

racionalidade ambiental, ajustando consistências teóricas com estratégias práticas

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(LEFF, 2001). Nos últimos tempos, a Etnociência têm-se convertido em uma

ferramenta teórica indispensável na reconstrução das relações Sociedade-Natureza,

sendo ponto de partida na implantação de práticas mais eficazes de usufruto dos

ecossistemas naturais sob o princípio de sustentabilidade ecológica e

aproveitamento da produtividade primária (LEFF, 2000).

A Etnociência pode ser considerada um dos enfoques que mais tem

contribuído para o estudo do conhecimento das populações tradicionais/ locais,

tentando descobrir a lógica sobre o conhecimento humano do mundo natural, as

taxonomias e as classificações totais (DIEGUES, 2001).

A pesquisa etnocientífica lida constantemente com interpretações de

indivíduos pertencentes a grupos culturalmente distintos, atuando sob outro conjunto

de valores, crenças, regras e visões de mundo, onde características distintivas não

poderiam apenas ser evidenciadas pelas limitações do meio ambiente (LARAIA,

1996). Somente através de uma boa interpretação seria possível chegar ao cerne do

que se propõe interpretar como proposto por Geertz (1989), exibindo assim a

relevância da Cultura.

A apropriação científica dos saberes tradicionais/locais pelas Etnociências

não trata apenas de analisar as analogias entre as classificações nativas e

científicas. De acordo com Leff (2001) ela ocupa-se da tradução de linguagens, a

qual acarreta no nivelamento da densidade simbólica e de sentidos presentes na

designação cultural da natureza3. Assim, as Etnociências devem interrogar o

funcionamento dos sistemas em vários níveis de análise levando em consideração o

que incluem; as formas de operação e organização dos saberes dentro da Cultura; o

saber sobre os saberes tradicionais proposto como objeto de estudo e por fim o

saber epistemológico focando nos elementos teóricos e nos métodos para adquirir

os saberes (LEFF, 2000).

A Etnociência pode ser entendida ainda como “[...] uma cartografia da ciência

do outro, construída a partir do referencial da academia.” (CAMPOS, 2003, pg.71)

propondo a assimilação do conhecimento tradicional/ local pelas ciências modernas

e vice-versa, criando métodos de pesquisa para impulsionar estratégias de

etnoecodesenvolvimento com sentido em contextos culturais próprios, construídos a

3 Não é suficiente conhecer os propósitos das Etnociências, mas questionar se o objeto de estudo, bem como os métodos, permitem superar o caráter meramente descritivo e enunciativo, além de explicar de forma consistente sistemas taxonômicos de classificação e técnicas de uso da Natureza (LEFF, 2001).

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partir dos valores e saberes das comunidades locais assentadas em territórios de

biodiversidade (LEFF, 2000).

Sobre a origem, trajetória e raízes epistemológicas, Marques (2002) revela

que o que hoje se entende por Etnociência emergiu de um campo de cruzamento de

saberes, e que permanece em evolução através do diálogo entre as Ciências

Humanas e Sociais. A Etnociência se concretizou na Antropologia Estrutural por

volta de 1940. Posteriormente, despontou pelo Movimento da Nova Etnografia e

consagrou-se pelo termo folk4. Mais recentemente (final 1980 e início 1990), com os

esforços de pesquisadores da IUCN (The World Conservation Union), surgiu a

vertente disciplinar denominada Traditional Ecological Knowledge (TEK), ou

Conhecimento Ecológico Tradicional (CET) 5. (JOHNSON, 1992; ROUÉ, 2000;

DIEGUES, 2000; MARQUES, op. cit.).

Com o interesse pelo estudo das interfaces Sociedade-Natureza, a

Etnobiologia 6 - derivação precursora da Etnociência – tem buscado entender como

o mundo é percebido, conhecido, mas principalmente classificado por diversas

culturas humanas. Seu maior enfoque reside no entendimento do papel da biologia

dos organismos no sistema de crenças e adaptação do homem aos ambientes, com

ênfase nas categorias e conceitos utilizados pelos povos em estudo (POSEY, 1983;

BEGOSSI, 1993; DIEGUES, 2000a).

A Etnobiologia abriga visões distintas onde por um lado estão os

ideacionistas, os quais acreditam que o conhecimento local é motivado de maneira

cognitiva e a estrutura e a ordem sobre o mundo biológico independem do valor que

ele possui. Por outro, estão os utilitaristas que atribuem às formas de classificação o

ajuste das populações humanas no ambiente nomeando-o segundo utilidades

práticas (ADAMS, 2000). Em relação ao ideacionismo, Lévi-Strauss (1962) foi quem

4 “O qual designava sistemas de classificação desenvolvidos pelos próprios membros da comunidade“ (LARAIA, 1986, p. 62.). 5 O TEK vem sendo amplamente classificado como Ecologia “Folk”; Etnoecologia; Conhecimento Local, Tradicional ou Ambiental e Conhecimento Indígena entre outros (JOHNSON, 1992), não existindo um acordo unânime na aplicação destes termos, sendo o termo Conhecimento Ecológico Tradicional mais aceito (JOHNSON, op. cit.; LANGLEY, 2006). No entanto, se estabelece uma fundamental diferença entre o conhecimento tradicional e o conhecimento local. O primeiro é cumulativo, dinâmico e adaptativo à mudanças, atribuído a sociedades com continuidade histórica no uso de recurso de determinados ambientes. Já o conhecimento local (LEK) não apresenta caráter histórico e multigeracional, sendo um corpo de conhecimento recente, não tradicional, mas que também apresenta informações e idéias sobre recursos e sobre suas formas de uso. (BERKES, 1999; BERKES et al., 2006). 6 A Etnobiologia teve como “pai” o antropólogo - fundador do Estruturalismo – Claude Lévi-Strauss, ao analisar em seus trabalhos os sistemas de classificação populares, comparando-os com os científicos (BEGOSSI, 1993).

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se referiu primeiro à existência de uma Ciência do Concreto, ou ainda o designado

Pensamento Selvagem, defendendo a idéia de que os saberes de certas populações

humanas sobre a natureza, não estariam estritamente baseadas em utilidades

práticas.

O conhecimento tradicional/local não seria, portanto, apenas transmitido de

geração a geração, mas envolveria por um lado pesquisa, experimentação,

observação e, por outro, raciocínio, especulação e intuição. Também, de acordo

com Cunha e Almeida (2002) suporia prática constante e a troca de informações

sobre formas de pensar, investigar, inovar, tanto quanto os conhecimentos e práticas

estabelecidos. A seguir Lévi-Strauss reforça a idéia de que o conhecimento

tradicional/local está vinculado a outras esferas:

Pode-se objetar que uma tal ciência não deve absolutamente ser eficaz no plano prático. Mas, justamente, seu objeto primeiro não é de ordem prática. Ela antes corresponde a exigências intelectuais ao invés de satisfazer às necessidades. (LÉVI-STRAUSS, 1962, pg. 24).

É certo que as práticas e verdades culturais comandam a observação e a

experimentação, mas ao aceitar que a observação seja posta a serviço de certas

práticas não se deve conjeturar que se reduza a elas. O saber tradicional/local,

como colocado por Cunha e Almeida (op. cit.), não se encontra creditado apenas a

uma racionalidade econômica, existindo sim, um excesso de conhecimento pelo

prazer de saber, pelo gosto do detalhe e pela tentativa de ordenar o mundo de forma

intelectualmente satisfatória. No processo de análise, tal fato implica em distinguir

conhecimentos de caráter simbólico de conhecimentos de caráter científico, sem

classificar as práticas humanas de acordo com um critério utilitarista e funcional

(ROUÉ, 2000).

Os sistemas dos conhecimentos tradicionais e modernos se constituem

mediante diferentes ordens de racionalidade, as quais organizam diversos sistemas

de saberes (LEFF, 2000). O conhecimento tradicional/local não responde às

mesmas requisições intelectuais, não sendo necessariamente eficaz no plano

prático comparado às ciências ocidentais (ROUÉ, op. cit.). Assim, a proposição no

uso dos termos êmico e ético faz referência às distinções entre a ciência praticada

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pela academia e a ciência praticada por certas sociedades respectivamente7 (ROUÉ,

2000; DIEGUES 2000; MARQUES, 2001b). Tais termos

(...) explicariam com uma visão externa, as categorias semânticas, os conhecimentos e a visão do mundo indígena8, no âmbito de uma dada sociedade e, por conseguinte, de certa organização social - a única que permite compreender, com uma visão interna, como natureza e cultura se articulam (ROUÉ, 2000, pg. 70). (grifos nossos)

Foi a partir de cruzamentos básicos (antropológico/biológico) que a

Etnociência estendeu-se para abordagens e técnicas de outras disciplinas como a

Biologia (Ecologia; Zoologia; Botânica; Taxonomia e Sistemática); Antropologia

(Cultural; Ecológica; Cognitiva); Psicologia (Social; Clínica; Cognitiva); Pedologia;

Agronomia; Economia; Lingüística; Geografia; História; Farmacologia e Matemática

(MARQUES, 2002), constituindo uma diversidade de termos para designar as

relações Sociedade-Natureza (ROUÉ, op. cit).

1.1.2 Etnoecologia “de mesmo” 9

Diante da insatisfação sobre o caráter classificatório empregado nas

pesquisas etnobiológicas - o qual excluía a integração entre processos intelectuais e

práticas das sociedades investigadas - foi que a Etnociência tomou novos

direcionamentos. A associação das disciplinas etnológicas com a Ecologia, segundo

Leff, (2001), por exemplo, passou a explicar condições naturais de produção e

regeneração da natureza e o processo cultural de aproveitamento de recursos do

meio.

Para Roué (2000) tanto a Etnociência, que acentua os aspectos cognitivos,

quanto a Ecologia Cultural, centrada em paradigmas de adaptação, foram

7 Derivados dos verbetes fonêmica e fonética (ver POSEY, 1992). 8 É importante explicar aqui o uso freqüente da palavra indígena, que deriva do verbete inglês indigenous, a qual significa algo originário, endêmico ou próprio de um lugar. A tradução para o português não deve ter a denotação de indígena apenas nas referências às populações com tal atributo (índios). 9 Ao utilizar a expressão “Etnoecologia de mesmo” se faz referenciando José Geraldo Marques, em mini-curso conduzido pelo mesmo denominado “Etnoecologia: construção teórica, busca metodológica e postura ética”, realizado pelo NUPAUB-USP, em abril de 2005, quando foi perguntado sobre o que seria Etnoecologia “mesmo”.

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contemporâneas da Etnoecologia, influenciando-a pelos ideais de Desenvolvimento

Sustentável.

O advento da utilização da Etnoecologia, de acordo com Toledo (1992),

passou a abrir possibilidades de estender o foco do campo de pesquisa,

incorporando o conhecimento tradicional/local aplicado aos componentes bióticos e

também abióticos. Assim, ao fazer Etnoecologia, o pesquisador buscaria

compreender as tramas que envolvem os seres humanos no ambiente e o ambiente

por ele mesmo, para captar as necessidades imediatas da sobrevivência

(MARQUES, 2001a; pg. 136). Do mesmo modo, ao passo que a Etnoecologia

permite o exercício da interdisciplinaridade em nível individual, torna o pesquisador

capaz de perceber, compreender e atuar dentro da dinâmica da complexidade.

Concebida como produto do cruzamento de disciplinas, a Etnoecologia vai

além da ciência, ao incluir elementos do cânone científico e não excluir as

subjetividades humanas no entendimento e reconhecimento dos sistemas naturais.

E, apesar das nuances entre o cientificismo de algumas sociedades e o cientificismo

acadêmico, os intelectuais nativos utilizam elementos de raciocínio, de lógica formal,

praticando, como dito por Marques (2001b), uma atividade científica. “Não se trata

de uma ciência pura, mas conjuntos de saberes úteis que atuam na reconstrução

das conexões entre a coletividade e a natureza na perspectiva de um

Desenvolvimento Sustentável”. (LEFF, 2000; pg. 111).

Ademais, sob o aspecto teórico, se afirma ser a Etnoecologia baseada na

investigação dos sistemas de percepção, crença, cognição, comportamento e uso

entre ecossistemas e populações humanas (POSEY, 1986; TOLEDO, 1992;

BERKES, 1993; NAZAREA, 1999; MARQUES, 2002) 10, 11, 12, 13, 14.

10 [...] a percepção indígena das divisões naturais no mundo biológico bem como as relações vegetal-animal-humanas dentro de cada uma das divisões (POSEY, 1986, p. 97). 11 É uma abordagem interdisciplinar que explora como a natureza é vista por grupos humanos através de uma tela (through a screen) de crenças, conhecimentos e como os seres humanos utilizam, manejam e se apropriam dos recursos naturais (TOLEDO, 1992, p.6). 12 Um corpo cumulativo de conhecimento, prática e crença que se desenvolve a partir de um processo adaptativo e é legado através das gerações por transmissão cultural, sobre as relações dos seres vivos (incluindo humanos) entre si e com o ambiente (BERKES, 1993). 13 [...] é a investigação dos sistemas de percepção, cognição e uso do ambiente natural, com ênfase no papel da cognição em moldar comportamentos. (NAZAREA, 1999, p. 8-9). 14 [...] constitui um campo de pesquisa transdisciplinar, o qual estuda os pensamentos (conhecimentos e crenças), sentimentos e comportamentos que intermedeiam as interações entre as populações humanas que os possuem e os demais elementos dos ecossistemas que as incluem, bem como os impactos ambientais daí decorrentes (MARQUES, 2002, p. 16).

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O conhecimento tradicional e seus análogos - conhecimento indígena,

conhecimento local e conhecimento etnoecológico (BERKES, 1999) - são estudados

pela Etnoecologia (MARQUES, 2001a; pg.49) como um “corpo” e um “sistema” de

compreensões que surge através do tempo, a partir de uma variedade de

experiências e observações individuais e compartilhadas, mediadas pela Cultura,

considerando fatores ambientais, características comportamentais e a dinâmica

ecológica (DAVIS; WAGNER, 2003).

Na premissa do conhecimento tradicional transmitir-se entre gerações, reside

uma visão ingênua e ambígua, que separa modernidade de tradição, folclorizando

povos e práticas (BERKES, 1993; ROUÉ, 2000). Uma das mais verossímeis provas

da não obsolescência do conhecimento tradicional habita na própria Cultura, que

constitui em um processo altamente dinâmico, resultado tanto do próprio sistema

cultural como do contato de um sistema cultural com outro (LARAIA, 1986).

Em geral, na investigação do conhecimento tradicional/local há um forte apelo

à identificação de práticas que remetam ao manejo dos recursos utilizados pelas

populações (ROUÉ, op. cit.), além do interesse cognitivo dos saberes sobre a

natureza, para a utilidade desses saberes.

Porém, a visão de que as populações tradicionais/locais apenas desenvolvem

atividades ambientalmente corretas investindo-se de conservacionismo nato pode

ser inexata. Os povos tradicionais nem sempre estiveram em harmonia com a

natureza, tendo também utilizado os recursos de forma abusiva. Mas, apesar dos

danos causados por certas práticas tradicionais não há razão para não gerar

interesse pelo imenso saber existente (ROUÉ, op. cit), até mesmo para que se

possa verificar sua funcionalidade.

Os sistemas de produção pertencentes às culturas tradicionais, segundo

Toledo (1992), mostram-se mais adequados ecologicamente do que os sistemas

modernos, orientados exclusivamente para a produção e para o mercado. Além

disso, as sociedades tradicionais requerem alta diversidade de recursos naturais e

continuam existindo porque desenvolveram práticas culturais as quais mantém a

biodiversidade dos seus ambientes (SARKAR, 1998 apud MARQUES, 2001b).

Page 33: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

32

1.1.3 Reflexões sobre a pesquisa etnoecológica

De acordo com Roué (2000), em crítica aos praticantes pouco criteriosos da

Etnoecologia, o estudo dos saberes do “outro” sobre a natureza é um exercício

difícil, que explica melhor a transformação das relações com a natureza na

sociedade do observador, do que a sociedade observada. Assim, é de grande

importância que na escolha pela prática etnoecológica tenha-se em mente a

presença de restrições, dificuldades e críticas ao uso do conhecimento

tradicional/local.

As “etno-x” ou as “etno-coisas” 15 - como explica CAMPOS (2002) -

enfatizaram demasiadamente os aspectos lingüísticos e taxonômicos deixando a

diversidade e a dinâmica das relações dos seres humanos com a natureza em

segundo plano podendo produzir um recorte enganoso e parcial da realidade16.

Ainda, a investigaçao corre o risco de transformar-se em uma prática de

etnocentrismo que idealiza os saberes exóticos dos grupos e tenta extrair princípios

filosóficos para aplicá-los fora de seu contexto original, distorcendo as informações e

subordinando as questões de manejo tradicional (ROUÉ, op. cit.; LANGLEY, 2006).

Como outros desafios à pratica etnoecológica, cita-se reportar o

conhecimento de transmissão oral antes que desapareça; documentá-lo de forma

apropriada e conseguir comensurabilidade entre resultados bem como superar a

ausência de investimentos em educação para a manutenção dos conhecimentos. No

entanto, o desafio maior reside na falta de preparo dos pesquisadores para realizar a

coleta de dados utilizando técnicas das Ciências Sociais, gerando dificuldade de

tradução das idéias, visões de mundo e conceitos de uma para outra cultura

(JOHNSON, 1992; LANGLEY, op. cit.). Sob o aspecto, Marques (2005) critica o

estereótipo do pesquisador que visa uma postura catequizante em campo,

convertendo-se em sério problema, uma vez que distorce a descoberta do

conhecimento com a pregação de conceitos ecológicos e conservacionistas

recebidos na academia.

15 Essa proposição (que se refere a um aspecto depreciativo) foi mencionada por Renato Silvano em relato de experiência vivida durante conferência sobre Etnoictiologia em Campinas, junho de 2008. 16 Vale ressaltar que o autor critica a utilização do prefixo “etno” para designar a ciência das populações não ocidentalizadas defendendo a utilização da “Etnografia de Saberes, Técnicas e Práticas” não desqualificando os outros tipos de saberes (CAMPOS, 2002).

Page 34: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

33

Nos aspectos positivos da prática etnoecológica residem as semelhanças

entre conhecimento tradicional/local e científico. Tais similaridades advêm da

observação sistemática da natureza baseada em detalhados conjuntos de

informações empíricas dos fenômenos naturais, das relações entre seus

componentes e do poder de predição/interpretação dentro de um contexto cultural

particular (BALIK ; COX, 1996 apud DIEGUES, 2000a; KIMMERER, 2002).

Adicionalmente, as observações no Conhecimento Ecológico Local (CEL)

tendem a ser qualitativas, criando uma base de dados diacrônica enquanto as

observações científicas são realizadas muitas vezes, por um número reduzido de

profissionais, de forma quantitativa e sincrônica. As diferenças estendem-se para

além disso, uma vez que o conhecimento tradicional/local está arraigado no contexto

social e espiritual da Cultura (KIMMERER, op.cit.).

É importante ressaltar que o conhecimento tradicional/local apresenta

fundamental importância para adquirir dados em áreas não estudadas e que não

apresentem dados históricos. É capaz de revelar descobertas científicas, obter

opiniões locais sobre modelos espaço-temporais dos recursos e seu uso, promover

o nivelamento do conhecimento entre atores e o engajamento dos colaboradores

(especialistas) na coleta e uso do conhecimento transpondo as posturas rígidas das

disciplinas e realizando uma leitura de mundo estando efetivamente nele

(LANGLEY, 2006; CAMPOS, 2001).

1.1.4 Pesca artesanal e conhecimento de pescadores

Tendo em vista a dependência, muitas vezes exclusiva, dos recursos

marinhos para subsistência, a estreita relação entre pescadores e ambiente natural

permite que construam através de experiências, necessidades e observações um

conhecimento detalhado das condições do ambiente e interações ecológicas do

local onde se vive (DAVIS; WAGNER, 2003). O conhecimento pesqueiro, passado

de geração para geração, influencia período e localização das capturas não se

limitando aos aspectos econômicos, dinâmicas sociais e a cultura local. Também

contempla as variações interanuais, sazonais, lunares e alimentares no

comportamento e movimentos dos organismos marinhos (JOHANNES, 2000; NOAA

FISHERIES, 2004).

Page 35: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

34

É no seu cotidiano, na lida diária com o mar, que o pescador dá continuidade

a um ciclo de incorporação, inovação e transmissão de conhecimentos. Experimenta

novas tecnologias adequando-as aos seus usos; relaciona os eventos climáticos aos

ciclos biológicos das espécies; prevê acontecimentos futuros pela observação cíclica

e atenta do meio; teoriza sobre os fenômenos que ocorrem a sua volta e utiliza as

provisões vindas da natureza das quais depende.

Pesquisas têm demonstrado que o saber tradicional/local é uma fonte

importante de informações para a elaboração de estratégias apropriadas para o

manejo de fauna e para o desenvolvimento sustentável da pesca local e regional

(SEIXAS; BEGOSSI, 2001). Fomentando o argumento, Diegues e Sales (1988)

apontam para a natureza das relações entre o homem e o ecossistema como

fornecedora de subsídios importantes para a conservação e manejo, além do

entendimento da organização social e econômica das populações que habitam as

áreas costeiras.

Devido à insuficiência de informações sobre questões biológicas e

socioeconômicas da pesca, a partir da década de 1980, houve um significativo

aumento no número de trabalhos científicos realizados com comunidades de

pescadores artesanais no Brasil. No entanto, apesar de ser fonte importante de

informação, os trabalhos não ofereciam informações detalhadas sobre a pesca

artesanal local/regional. Simultaneamente estudos sobre Etnoictiologia também

despontaram e conhecimentos tradicionais sobre hábitos alimentares e reprodutivos,

técnicas de manejo e organização tradicional da pesca, mostraram-se fundamentais

para os planos de manejo participativo e uso sustentável dos recursos pesqueiros.

(VASCONCELLOS et al., 2007, p. 17).

A cultura tradicional existente nas comunidades pesqueiras marítimas, como

jangadeiros e caiçaras, ao longo da costa brasileira torna-se muitas vezes razão da

manutenção da diversidade ecológica (DIEGUES, 1988). Estudos de grande

importância para o manejo e a conservação dos ecossistemas marinhos vêm

surgindo, reforçando a idéia das relações entre conhecimento e ação nas

populações e seus ambientes (DIEGUES, 2001). Destacam-se para efeito do

presente, avanços em pesquisas no país sobre Ecologia Humana (BEGOSSI, 1993,

2006), Etnoictiologia (MARQUES, 1995, BEGOSSI, 2001; SILVANO, 2001); gestão

pesqueira e manejo participativo (SEIXAS, 2004) e Etnoconservação (MARQUES,

1995; DIEGUES, 2000).

Page 36: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

35

Os esforços na investigação dos saberes de comunidades pesqueiras

litorâneas não são recentes. No Nordeste, Forman (1967) realizou estudos sobre a

conservação dos recursos pesqueiros e Cordell (1974) sobre modos de apropriação

territorial marítima. Ainda na década de 1970, Maranhão (1975) descreveu os

sistemas de identificação, classificação e nomenclatura de peixes utilizada pelos

pescadores de Icaraí, litoral do Ceará.

Trabalhos que investigaram o conhecimento local de comunidades de

pescadores artesanais marinhos no Brasil e merecem destaque foram realizados por

Rêgo (1994), Costa-Neto (1998), Mourão (2000), Hanazaki (2002), Moura (2002),

Souto (2004) e Pinheiro (2008) ressaltando a importância da participação dos

saberes locais no conhecimento, conservação, gestão e manejo de recursos

pesqueiros.

1.1.5 Breve panorama da pesca artesanal no Brasil

O Brasil produziu no ano de 2005 o equivalente a 1.009.075,0 toneladas de

pescado. Do montante, foram oriundas da pesca extrativa marinha 507.858,5

toneladas, sendo somente a pesca artesanal responsável por 51,4% de tal produção

(IBAMA, 2006).

O aumento significativo na representatividade da pesca artesanal para a

produção pesqueira nacional desencadeou-se por volta da década de 1980, quando

a sobreexplotação de recursos e o colapso de importantes modalidades de pesca

passou a atingir o setor industrial ressaltando o dinamismo da pesca artesanal

(VASCONCELLOS et al., 2007).

De acordo com o Registro Geral da Pesca (RGP), sistema de

recadastramento produzido pela Secretaria Especial de Aqüicultura e Pesca

(SEAP/PR), existem no Brasil atualmente 516.909 pescadores profissionais

registrados, incluindo pescadores artesanais ou industriais, marítimos e continentais

(SEAP, 200817). Tendo em vista a informalidade do setor, acredita-se que as

informações estatísticas estejam subestimadas e que exista um número de 538.000

pescadores artesanais marítimos aproximadamente (VASCONCELLOS et al., 2007).

17 Dados não publicados.

Page 37: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

36

Atualmente encontra-se na literatura uma ampla diversidade de conceitos que

propõe definir a atividade de pesca artesanal. Tais conjeturas se encontram

relacionados à diferentes abordagens, variando principalmente de acordo com a

finalidade a que se prestam18. Dessa forma, ressalta-se algumas particularidades

que caracterizam a atividade produtiva artesanal como o fato de ser exercida por

pescadores autônomos que atuam sozinhos ou em parcerias, diretamente na

captura; o uso de instrumentos relativamente simples e embarcações com propulsão

natural ou equipadas com motores de baixa potência; o produto da pesca destinado

predominantemente aos mercados locais; a remuneração seguindo o sistema

tradicional de divisão da produção em partes, sendo a pesca a principal, senão a

sua única fonte de renda (LEROY; CÉSAR, 1988; DIEGUES, 1988, 1993;

MALDONADO, 1991).

1.1.6. Comunidades pesqueiras marítimas cearenses

No século XVI as terras cearenses encontravam-se povoadas por indígenas e

sob domínio da coroa portuguesa. Já no século XVII, apesar da resistência, os

índios foram sendo exterminados, sitiados, escravizados ou expulsos da maioria das

terras costeiras. Posteriormente, com o abandono das atividades econômicas como

o cultivo de cana-de-açúcar, pecuária e algodão, inúmeras comunidades litorâneas e

marítimas foram formadas vivendo da pesca, da produção artesanal de utensílios e

vestimentas, da pequena agricultura e do extrativismo (TUPINAMBÁ, 1999;

TERRAMAR, s/d).

Atualmente, muitas comunidades litorâneas cearenses que tem na pesca o

principal meio de produção e relevância socioeconômica e cultural, ainda

desenvolvem atividades complementares as quais contribuem à conformação do seu

18 A Instrução Normativa (IN) Nº 3, de 12 de maio de 2004, implantada pela SEAP no ano de 2003, dispõe sobre operacionalização do RGP supracitado, e classifica o pescador profissional artesanal como sendo “[...] aquele que, com meios de produção próprios, exerce sua atividade de forma autônoma, individualmente ou em regime de economia familiar ou, ainda, com auxilio eventual de outros parceiros, sem vínculo empregatício”. (SEAP, 2007). No entanto, a definição de pesca artesanal extrapola o conceito e exige que se observe continuamente a estreita relação com a realidade com a qual se refere: os métodos, técnicas e materiais utilizados; os sistemas de produção, distribuição e a escala em que ocorrem; fatores ambientais e localização geográfica, mas também a forte implicação vinculada às relações humano-ambientais, ou seja, como os atores sociais estão envolvidos na utilização dos recursos naturais (LAGO, 1961; ALTMAYER, 1999; WAHRLICH 1999; MEDEIROS, 2002; BORGONIA, 2005).

Page 38: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

37

particular modo de vida, caracterizando-as pela explotação de recursos naturais e

pelas relações construídas na terra, no mar e na interface terra/mar (LIMA, 2002).

Grande parte da população cearense habita os municípios costeiros (60%)

estando a maioria - aproximadamente 1.700.000 pessoas -, concentrada na região

metropolitana de Fortaleza “[...] indicando a velocidade do crescimento da cidade [...]

(SAMPAIO, 2002, p. 127) enquanto algumas áreas litorâneas permanecem ainda

pouco habitadas (SILVA, 2003). Nessas áreas as comunidades representam um

modelo de ocupação do espaço baseado essencialmente na pesca criando

verdadeiras comunidades marítimas (DANTAS, 2002).

Os processos de uso e ocupação do litoral cearense pelas comunidades

tradicionais estenderam-se até o final da década de 1960. A partir da década de

1970 as comunidades passaram a sofrer um intenso processo de transformação do

espaço motivado pela “descoberta do litoral” ou ainda “dos paraísos cearenses”. Em

meados da década de 1980 muitas comunidades tradicionais passaram a enfrentar

problemas como a tomada do espaço pela construção de obras públicas e privadas

nas praias (LIMA, op. cit.) e posteriormente

[...] os anos 90 no estado do Ceará marcam uma expansão da sociedade urbano-industrial, na qual urbanização industrialização e turismo interpenetram-se. Constituem assim, uma nova configuração sócio-espacial, onde se potencializa uma maior ocupação da zona litorânea. (TUPINAMBÁ, 1999, p. 53).

No presente cenário, a apropriação desmedida do espaço litorâneo, o turismo

em massa, o recuo da linha de costa, a pesca ilegal e em grande escala de lagosta

feita com auxílio do compressor e a falta de incentivos governamentais para a

fiscalização da atividade tem atormentado as comunidades tradicionais presentes no

litoral cearense (LIMA, op. cit.; AMARAL, 2002; TERRAMAR, 2003).

A quebra dos setores industrial e de média escala em virtude dos altos custos

e baixa produtividade, ampliados pela crise no setor lagosteiro, deram projeção à

pesca artesanal marinha e estuarina do Ceará que passou a responder, em 2005,

por 54,7% (18.421,4 toneladas) da produção de pescado desembarcada do estado

(IBAMA, 2006). A atividade artesanal emprega 17 mil pescadores, distribuídos em

aproximadamente 110 comunidades pesqueiras, 19 Colônias de pesca ao longo dos

21 municípios litorâneos (TUPINAMBÁ, 1999; IBAMA, op. cit.; VASCONCELLOS et

al., 2007).

Page 39: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

38

Diante de um sistema de produção historicamente opressivo, os pescadores

cearenses foram pioneiros na luta por direitos trabalhistas e melhores condições de

vida. Em 1881, Chico da Matilde negou que se embarcassem escravos no porto do

Ceará ganhando o título de “Dragão do Mar”. Depois, os quatro épicos raids de

jangada: Em 1941 Jacaré, Tatá, Manuel Preto e Jerônimo - imortalizados por Orson

Welles em seu inacabado filme “It’s all true19” - , embarcaram rumo ao Rio de

Janeiro e ao encontro com Getúlio Vargas virando heróis nacionais. Mais tarde, em

1951, Jerônimo liderou uma embarcação até Porto Alegre e em 1954 com destino à

Argentina. Em 1967 outro raid de se dirigira rumo à Santos e finalmente em 1972 à

Ilhabela no pedido que permitiu o benefício da aposentadoria aos pescadores junto

ao então presidente Garrastazzu Médici.

Daqueles dias até hoje, a luta da classe trabalhista continua muito presente

no cotidiano pesqueiro. Sob forma organizada atuam os Movimentos Sociais como é

o caso do Fórum dos Pescadores e Pescadoras do Litoral Cearense (FPPLC);

Fórum em Defesa da Zona Costeira do Ceará (FDZCC); Conselho Pastoral dos

Pescadores (CPP); Movimento Nacional dos Pescadores (MONAPE) e Movimento

Estadual dos Pescadores do Ceará (MOPECE). Particularmente, destaca-se o

trabalho do CPP e do MONAPE que desde a década de 1970 no Norte e Nordeste

do Brasil têm-se mobilizado para promover o empoderamento das comunidades

pesqueiras litorâneas contra a força controladora, o clientelismo e o paternalismo

das colônias de pesca e eleger representantes legítimos que representem os

interesses dos pescadores (LIMA, 2002, VASCONCELLOS et al., 2007).

Recentemente o Instituto Terramar, através do papel de promotor do Fórum

do Litoral Leste do Ceará, busca alcançar a gestão compartilhada da lagosta como

recurso pesqueiro e a solução de conflitos gerados pela pesca de compressor; pela

expansão urbana e turística desenfreada (VASCONCELLOS et al., op. cit.) e pela

carcinocultura. O Instituto trabalha em parceria com os Movimentos Sociais da Zona

Costeira cearense, e tem como missão contribuir para o desenvolvimento humano e

para a sustentabilidade sócio-ambiental fortalecendo a autonomia dos grupos

organizados e a identidade cultural das comunidades (TERRAMAR, 2008) 20.

Tendo em vista a relevante importância das comunidades litorâneas

cearenses, diversos aspectos têm sido exaustivamente estudados. Esforços têm

19 WELLES, Orson. It’s all true. Paramount. 1993 [1941]. 20 Documento disponível no site: http://www.terramar.org.br/oktiva.net/1320/secao/6461.

Page 40: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

39

sido dirigidos para além de verificar a dinâmica das frotas e quantificar o volume e a

importância da produção pesqueira por eles fornecida, em prol de avaliar as

relações estabelecidas entre os pescadores e seu ambiente.

Nesse sentido, Tupinambá (1999) analisou a perspectiva de manutenção da

sustentabilidade da comunidade da Prainha do Canto Verde em Beberibe -

comunidade pioneira na substituição da jangada pelos catamarãs - frente ao

momento transitório de prática pura da pesca artesanal para a entrada da atividade

turística e as implicações decorrentes nas estruturas internas da comunidade.

Ainda sob a ótica da sustentabilidade, Amorim (2006) investigou os diversos

impactos, inclusive ambientais e sociais, que o turismo tem ocasionado em Canoa

Quebrada, Município de Aracati e Costa (2003) pesquisou as várias competências

da sustentabilidade local caracterizando aspectos socioeconômicos e

oceanográficos da praia de Ponta Grossa, Município de Icapuí.

A dinâmica das atividades produtivas, estratégias, articulações sociais e

culturais, bem como conflitos e resistência presentes na realidade das comunidades

de Prainha do Canto Verde, Redonda e Batoque foram abordados por Lima (2002).

Fatos históricos e políticos de grande importância da pesca cearense no cenário

nacional ocorridos entre as décadas de 1940-50 foram desvendados por Abreu

(2007) tendo como pano de fundo o raid da jangada de São Pedro e o Estado Novo.

Frente às problemáticas emergenciais de sobreexplotação de recursos,

desenvolvimento descontrolado da carcinocultura, privatização da terra, aumento da

atividade turística e desarticulação de políticas do momento atual, Silva (2003)

propôs um modelo de desenvolvimento baseado na difusão do serviço público de

extensão pesqueira propondo um ajuste para o que chamou de “novo mundo litoral”

(SILVA, op. cit., p.80).

Através de uma metodologia participativa Almeida (2002) sugeriu a escolha

de indicadores de qualidade de vida como organização, educação, saúde,

alimentação, moradia, energia, saneamento básico, segurança, transporte, cultura,

lazer e pesca para que avaliar a manutenção e reprodução social e cultural da

comunidade de Prainha do Canto Verde, Município de Beberibe.

Uma ampla caracterização da pesca e da captura, bem como da ictiofauna

abordando aspectos da ecologia das espécies foi produzida por Castro e Silva

(2004) em cinco localidades do litoral cearense. Já Nascimento (2006), focando em

uma problemática específica, avaliou as pescarias e o efeito atrator do uso de

Page 41: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

40

marambaias para lagostas além dos impactos na produtividade e captura do

estoque, seriamente em declínio.

A ocupação e exploração irregular dos espaços litorâneos cearenses

revelando impactos socioambientais e a caracterização dos perfis de turistas,

moradores e empreendedores em Porto das Dunas, Aquiraz foram abordados por

Rios (2006). Adicionalmente, o trabalho de Abreu (2005) investigou as formas de

apropriação histórica do espaço urbano da Praia do Futuro em Fortaleza

evidenciando o estrangulamento dos espaços de pesca e a marginalização da

atividade. Corroborando com as observações, Frosch (2004) verificou a exclusão

social proveniente dos projetos de modernização voltados para o turismo do projeto

da via litorânea Costa Oeste em Fortaleza.

Finalmente, no que tange o conhecimento de pescadores artesanais de

comunidades pesqueiras marítimas no Ceará, Silva (2006) apresenta os saberes

sobre pesca, agricultura e arte da comunidade de Caetanos de Cima, em Amontada

e as relações dos mesmos com a sustentabilidade local.

Page 42: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

41

PRANCHA 1

Page 43: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

42

1.2 Bases metodológicas e práticas da pesquisa

1.2.1 Caracterização do litoral cearense

O litoral do Estado do Ceará, com 573 km de extensão, representa 8,5% do

litoral brasileiro (TUPINAMBÁ, 1999; SILVA, 2003, AQUASIS, 2003; IBAMA, 2006).

A Zona Costeira do Estado caracteriza-se pela presença de uma grande variedade

de ambientes, na qual estão inseridas como principais unidades geoambientais:

planície litorânea, campos de dunas móveis, espelhos d’água lacustres e planícies

ribeirinhas, planícies fluvio-marinhas, planícies aluviais das bacias litorâneas,

falésias e entorno imediato, tabuleiros pré-litorâneos, maciços residuais, sertões

circundantes e plataforma continental (AQUASIS, op. cit; TERRAMAR, 2004).

Ainda, no que tange à caracterização da cobertura vegetal, podem ser

encontradas no litoral do Ceará, vegetação de dunas, restingas, manguezais e

apicuns (na desembocadura de rios, riachos e ao longo de toda a costa), matas de

tabuleiro, carnaubais, caatinga, cerrado bem como vastas regiões com plantações

de cajueiros e coqueiros (AQUASIS, op. cit.; IBAMA/CEPENE, 2004).

A Zona Costeira cearense apresenta variações sazonais significativas em

seus fatores climáticos, caracterizadas pelos regimes de chuvas e ventos Alísios de

Nordeste que determinam dois períodos marcantes ao longo do ano. O primeiro

semestre apresenta 90% das precipitações anuais e a partir do segundo semestre,

as chuvas tornam-se escassas e a insolação intensa, fortes ventos Alísios

potencializam a taxa de evaporação e a dinâmica costeira, influenciando no

transporte de sedimentos, na navegabilidade e na transparência do mar (AQUASIS,

op. cit.).

Page 44: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

43

PRANCHA 2

Page 45: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

44

PRANCHA 3

Page 46: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

45

1.2.2 A Caponga do peixe

Localizado no litoral centro-leste ou Costa do Sol Nascente, distando 57

quilômetros de Fortaleza, capital do Ceará, o Município de Cascavel apresenta uma

população de 64.256 habitantes (IBGE, 2006). Limita-se ao Norte com Aquiraz e

Pindoretama; ao Sul com Ocara; a Leste com Beberibe e a Oeste com Pacajus,

Horizonte e Chorinho e divide-se em seis distritos entre eles o da Caponga

(AMARAL, 2002).

O distrito de Caponga está localizado a 11 km da sede do município, via CE

253, e abrange três localidades: Águas Belas, Balbino e Caponga área escolhida

para estudo (FIGURA 1).

FIGURA 1 - Mapa de localização da área de estudo.

Page 47: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

46

A localidade de Caponga (4°2'32"S 38°11'50"W) é considerada o local de

maior adensamento populacional no litoral cascavelense, responsável por 60% da

ocupação do mesmo (PINHEIRO apud AMARAL, op. cit.).

O nome Caponga, inserido na realidade local, refere-se às áreas alagadas

que são encontradas nas adjacências. No entanto, a designação Caponga do Peixe

decorre da existência de outra localidade nas proximidades também denominada

Caponga a qual foi atribuído o título de Caponga de Dentro.

A Caponga do Peixe é habitada, em sua maioria, por pescadores e familiares

que sobrevivem direta ou indiretamente da pesca. Configura-se como uma área

intensamente ocupada por habitações de segunda residência e com um comércio

local incipiente. Não existe na localidade sistema de escoamento de esgoto e água

encanada que é obtida através de poços artesianos. A coleta de lixo é realizada

precariamente. Quatro escolas públicas e uma particular (ensino fundamental e

médio) atendem a população. A localidade possui posto de saúde que presta

serviços apenas durante os dias úteis da semana. Não há serviços bancários. Foi

registrada grande dependência de bens e serviços de Cascavel. O acesso de

Caponga à sede do município é feito através de ônibus e com maior freqüência

através das conduções (carros particulares que transportam passageiros).

A produção pesqueira de pequena escala de Caponga é considerada uma

das três maiores do litoral leste (IBAMA, op. cit.) e a praia é tida como um dos oito

principais portos de desembarque de pescado no Ceará (IBAMA, 2006). A economia

da localidade de Caponga é baseada principalmente na produção de pescado e no

turismo, sendo o último a mais recente alternativa de emprego e renda

(KOBAYASHI, 2000; CASTRO E SILVA, 2004).

A frota pesqueira da praia da Caponga é constituída em sua maioria por

pequenas embarcações de madeira, de propulsão a vela e com baixa autonomia de

mar (KOBAYASHI, op. cit.) caracterizando a atividade substancialmente como de

pequena escala.

Os pescadores da praia da Caponga são muito versáteis, utilizando diversas

artes de pesca para captura de diversas espécies de peixes e lagosta. A

comercialização de toda a produção é realizada na praia e o consumo do pescado

ocorre em nível regional (KOBAYASHI, op. cit).

As características que evidenciam a a) baixa tecnologia empregada; b) a

importância no desembarque de pescado para o Estado; c) a produção em pequena

Page 48: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

47

escala e d) a comercialização regional foram fundamentais na decisão pela praia da

Caponga como local de estudo.

1.2.3 Coleta de Dados

A coleta de dados da pesquisa ocorreu entre os meses de junho de 2006 a

dezembro de 2007, totalizando 85 dias de campo e dividiu-se basicamente em três

etapas: a) etapa I: pré-campo (02 dias); b) etapa II: trabalhos não-regulares (21 dias)

e c) etapa III: vivência (62 dias).

A etapa I teve basicamente o intuito de reconhecer a área de estudo,

averiguar e definir a viabilidade do desenvolvimento da proposta. Fundamentada em

um roteiro simples e abordagem meramente exploratória, as impressões foram

registradas em diário de campo. No momento, buscou-se a aproximação de pessoas

através de conversas informais na tentativa de identificar atores/colaboradores.

Posteriormente à etapa I, a etapa II envolveu 11 visitas não-regulares à

localidade, totalizando 21 dias em campo. Durante o período foram priorizados os

testes e ajustes das técnicas de coleta de dados, descritas a seguir, e da abordagem

dos informantes. Adicionalmente, com auxílio de um guia cultural nativo (ver

MARQUES, 1991) foram acompanhados momentos da rotina de pesca; do dia-a-dia

da comunidade; reuniões e momentos de planejamento e articulação e por fim

indicados os primeiros colaboradores e realizadas as primeiras entrevistas livres.

Apesar do aparecimento dos primeiros resultados com as visitas não-

regulares, a necessidade de acompanhar a dinâmica pesqueira e sócio-cultural local

trouxe a proposta de buscar maior aproximação dos pescadores. Assim, visando

garantir qualidade nas informações adquiridas, estreitar as relações com a

comunidade e eliminar problemas de logística diversos, a pesquisadora fixou

residência na localidade escolhida dando origem a uma nova fase.

Na etapa III, em 62 dias vividos na Caponga, foi proposto realizar a

observação participante (ver MALINOWSKI, 1984) sendo foi possível acompanhar

com maior proximidade o cotidiano local e realizar a coleta de dados.

Page 49: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

48

1.2.3.1 Técnicas de aquisição de dados

A proposta metodológica para a coleta de dados êmicos foi embasada na

utilização das técnicas de observação participante, observação direta, entrevistas,

questionários e histórias de vida. Além disso, serviram como recurso adicional a

realização de turnês guiadas, aprendizado vivenciado, testes projetivos e grupos

focais.

Vale ressaltar que apesar da heurística familiar ao contexto da pesquisa

etnoecológica - para efeito do trabalho - a combinação apresentada teve um caráter,

sobretudo, experimental diligenciando avaliar fragilidades e potencialidades do

método. Ao passo que a pesquisa em Etnoecologia não oferece metodologia

definida, mas resultados de experiências, permitiu à pesquisadora construir, de

acordo com a abordagem escolhida, o arranjo que considerasse adequado (FIGURA

2).

Técnicas de Coleta Técnicas de Registro Observação participante Diário de campo, registros fotográficos e

filmográficos, croquis Entrevistas Registro fonográfico, mapas cognitivos Questionários Registro impresso Observações diretas Diário de campo, registros fotográficos e

filmográficos Turnês guiadas Diário de campo e registros fotográficos Aprendizado vivenciado Diário de campo Histórias de vida Registro fonográfico Testes projetivos Diário de campo, registro fonográfico Grupos focais Registro fonográfico FIGURA 2 - Quadro das técnicas utilizadas na coleta e registro de dados de acordo com suas finalidades.

Observação participante e observação direta

Dando seqüência ao caráter experimental da pesquisa e tendo em mente o

pressuposto de que “o campo apresenta suas próprias regras”, a observação

participante e a observação direta foram bases fundamentais no direcionamento da

pesquisa, permeando todo o procedimento de coleta de dados. As observações

diretas, assim como a observação participante, tiveram grande relevância na

compreensão do modo de vida dos pescadores da praia da Caponga, mas

Page 50: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

49

principalmente com as relações que estabelecem entre si, o ambiente onde vivem e

onde desenvolvem relações de trabalho.

A observação participante é uma técnica amiúde utilizada no escopo das

pesquisas etnoecológicas. Derivada das Ciências Sociais exige que o pesquisador

desenvolva certas habilidades entregando-se ao cotidiano dos pesquisados. Através

da observação participante dificuldades são elucidadas em um processo de

aprender-fazendo, que permite compreender o sentido das referências culturais

(VIETLER, 2002).

Voltada para a descrição de problemáticas previamente definidas (na prática,

os sistemas de conhecimento utilizados pelos pescadores da Caponga) a

observação participante direciona os sentidos do pesquisador para elementos que

possam relacionar-se ao objeto de estudo: o ambiente, comportamento das

pessoas, do grupo, linguagem, relacionamentos e o tempo em que ocorrem os

processos observados (VÍCTORA, 2000).

A observação participante traz consigo a dualidade do pesquisador estar ao

mesmo tempo distante e próximo do evento observado (VÍCTORA, op. cit.). “Estar

aqui” a partir do referencial da Ciência Ocidental, refletindo e analisando o outro

diferente de si próprio e “estar lá” na observação com esses “outros”, nos vários

momentos do trabalho de campo, na complexa relação de estranhamento e

familiaridade (CAMPOS, 2002).

Direcionada principalmente à compreender a dinâmica pesqueira, a

observação direta envolveu o acompanhamento da rotina de pesca: desembarques,

saídas para o mar, compra e venda de pescado e identificação de atores sociais

envolvidos. Durante a etapa III do campo, 36 desembarques foram monitorados com

o intuito de avaliar qualitativamente a captura. Adicionalmente, o monitoramento dos

desembarques permitiu adquirir familiaridade com a terminologia pesqueira

empregada, bem como o conhecimento dos vernáculos utilizados na identificação

das espécies capturadas.

Durante o período de vivência na praia da Caponga as observações foram

constantemente justapostas aos relatos dos colaboradores permitindo averiguar a

veracidade dos mesmos e adicionar novos fatos, descobertas e entendimentos à

observação. Essa comparação busca evitar as falsas impressões do pesquisador,

geradas pela projeção cultural da obviedade (ilusão da transparência), insistência ou

obtenção inadequada de informações. Ainda, como “[...] nem sempre o que é falado

Page 51: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

50

(palavra) é o que é feito (ação) e é o que é pensado (pensamento)” (VIETLER, 2002;

p. 23) o colaborador, ou informante nativo, pode fornecer falsos elementos como um

artifício privativo.

Questionários

Três questionários distintos foram gerados no próprio campo e aplicados na

etapa III (FIGURA 3). O primeiro (QI Apêndice A), dirigido à população de

pescadores artesanais ativos, teve como intuito definir o seu perfil através da

obtenção de informações sociais, econômicas e da percepção sobre a atividade e o

exercício da profissão no local. O questionário dois (QII Apêndice B) foi destinado

aos proprietários de embarcações visando obter dados sobre a frota, equipamentos,

tripulação, tempo de pesca, espécies capturadas, divisão e destino da produção

pesqueira. Já o questionário três (QIII Apêndice C) foi reservado aos atravessadores

ou chamados marchantes, para caracterizar relações existentes na cadeia produtiva

e comercialização do pescado. Todos os questionários foram parcialmente

estruturados contendo perguntas objetivas e discursivas.

A definição do plano amostral para a aplicação de questionários na população

ativa de trabalhadores da pesca apresentou-se como o maior desafio para garantir a

qualidade e confiabilidade das informações.

Questionário Público-alvo Finalidade

QI Pescadores artesanais profissionais ativos na pesca

Cadastro de informações socioeconômicas e percepção dos pescadores

QII Pescadores e não pescadores proprietários de embarcação

Cadastro de embarcações e da atividade pesqueira

QIII Marchantes Caracterização da cadeia produtiva e comercialização do pescado

FIGURA 3 - Quadro de público-alvo e finalidade da aplicação dos questionários QI, QII e QIII, respectivamente.

A busca pela determinação do tamanho da amostra, suficientemente

representativa, foi permeada por restrições como a inexistência de bases estatísticas

precisas apurando o número total de pescadores profissionais artesanais para a

Page 52: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

51

localidade e a já citada informalidade do setor, dificultando em muito a definição do

tamanho da população de pescadores.

Os dados cadastrais do RGP não puderam ser utilizados, pois se referem ao

registro de pescadores por Município, agrupando três localidades de pesca

(Caponga, Balbino e Águas Belas), superestimando a realidade da Caponga. Dados

de registro da UNIPESCA foram cogitados, mas dos aproximadamente 159

associados, certo número não está envolvido diretamente ou não reside na

localidade. Na Colônia de Pesca Z-10 obteve-se a informação de 347 pescadores

filiados, mas há ressalvas do número incluir sócios já falecidos e aposentados.

Decidiu-se então, utilizar como estimativa o número de pescadores que solicitaram o

benefício do seguro-desemprego referente à captura de lagostas.

De acordo com o Instituto de Desenvolvimento do Trabalho (IDT), no ano de

2007, foram realizados 342 requerimentos de seguro-desemprego provenientes dos

pescadores afiliados à Colônia de Pesca Z-10 de Caponga (ANEXO A). Assim,

pressupondo o tamanho da população de pescadores (N=342), o tamanho da

amostra foi calculado assumindo um erro menor de 10% 21. A amostragem com os

pescadores da população ativa da pesca configurou-se como não probabilística,

sendo realizada sem norma (a esmo) com 103 indivíduos.

Ainda, QI exerceu papel fundamental na determinação dos informantes-

especialistas. Ao final de cada aplicação solicitava-se que os pescadores indicassem

novos pescadores os quais considerassem bons conhecedores, ou com boa

experiência em determinados assuntos, a fim de identificar os especialistas nativos.

As indicações dirigiram-se aos seis principais temas de interesse da pesquisa: 1)

assuntos sobre pesca (captura de peixes, lagostas e outras pescas); 2) assuntos

sobre marcação e orientação marítima (pesqueiros e sistemas de navegação); 3)

assuntos sobre equipamentos e tecnologias (confecção de redes, manzuás, velas,

embarcações, etc.); 4) histórias sobre pesca (como era a pesca no passado,

situações ocorridas) e 5) histórias sobre a Caponga.

Para QII a amostragem foi intencional dirigindo-se aos pescadores artesanais

profissionais e também proprietários de embarcação não-pescadores. O número de 21 Utilizando a fórmula proposta por Barbetta (1999):

Onde N= tamanho da população; n= tamanho da amostra e n0 = aproximação do tamanho da amostra.

Page 53: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

52

questionários aplicados foi estimado pela determinação do número de embarcações.

Através de um senso fotográfico 110 embarcações foram registradas e cadastradas

perfazendo o universo amostral de 51 entrevistas, assumindo um erro de 10%

(cálculo idem a QI).

Os questionários foram aplicados por duas jovens (17 e 18 anos) moradoras

da localidade e filhas de pescadores, juntamente com o auxílio da pesquisadora e de

uma das colaboradoras locais.

As similaridades no vocabulário utilizado e o fato de terem um referencial

conhecido pelos pescadores (parentesco) conferiram confiabilidade ao processo

auxiliando na contribuição à aceitação dos questionários.

As pesquisadoras nativas foram orientadas quanto ao procedimento de

permissão do registro das informações e contribuíram constantemente na

adequação das perguntas, trazendo importantes melhorias aos procedimentos. A

aplicação foi realizada em sistema de campanha até atingir o número determinado

de questionários. Como forma de retribuição e incentivo as coletoras foram

remuneradas pela jornada de trabalho.

Entrevistas

Importante recurso na coleta do discurso dos informantes e com grande

funcionalidade na obtenção de dados êmicos, as entrevistas permitem explorar um

vasto horizonte do conhecimento tradicional/local.

A aplicação de entrevistas requer uma grande parcela de sensibilidade por

parte do pesquisador, que deve buscar a pergunta culturalmente adequada (visando

responder suas hipóteses de pesquisa) e saber em qual contexto e momento certo

deve fazê-la.

Assim, a existência de etiquetas culturais entre os habitantes da Caponga foi

investigada, explorada e abordada previamente e durante o período de realização

das entrevistas. A busca por expressões, costumes e vocabulário específico - que

deveriam ou não ser utilizados - auxiliaram imensamente no estabelecimento de

boas relações entre entrevistador-entrevistado.

No entanto, tendo em vista as diferenças culturais citam-se três casos de

aprendizado em particular: O primeiro aconteceu sucessivas vezes até que se

Page 54: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

53

compreendesse o significado das palavras navegação e pescaria no contexto local.

O segundo caso refere-se à uma expressão utilizada pela pesquisadora no intuito de

agradecer por certas ofertas (“Não se incomode”) soando como desdém. E, no

terceiro caso, um ditado popular falado pela pesquisadora (“Promessa não é dívida”)

contestado por informantes.

Além disso, dentre os procedimentos adotados no decorrer de uma atividade

de entrevista, destacaram-se as dificuldade na apresentação e esclarecimento dos

objetivos da entrevista. Apesar da pesquisadora cumprir o ritual de referências

apresentando-se como estudante (ocupação), que tinha vindo do Sul (procedência)

e que procurava estudar a pesca e o conhecimento de pesca dos pescadores da

Caponga (objetivo), as tentativas de explicar as finalidades pareceram

demasiadamente “vagas”. Muitos colaboradores não entendiam “para quê” servia a

pesquisa. De tal modo, foi assim revelada a importância da terceira descoberta de

etiqueta em campo: “Promessa é dívida” e não era possível prometer melhoria das

condições atuais dos pescadores de forma prática.

Com a preocupação de obter o consentimento dos colaboradores antes de

cada entrevista solicitava-se permissão para gravação dos discursos. Outros fatores

importantes para o andamento do processo de entrevista foram verificar a

disposição do informante na colaboração; estabeler contato prévio para determinar

local e hora do encontro; conhecer e utilizar as regras “locais” de etiqueta – sendo

algumas já citadas -, além de outras descobertas.

Os melhores momentos para conseguir realizar as entrevistas equivaleram às

primeiras horas da manhã (entre 06h00min e 09h00min) com aqueles que não

estivessem saindo para o mar e ao final do dia (entre 16h00min e 18h00min) quando

voltavam à praia para conversar e verificar as embarcações ou estavam em suas

casas descansando.

Inicialmente algumas entrevistas abertas foram realizadas, como mencionado,

e as demais seguiram estruturação parcial, onde de acordo com Vietler (2003)

elementos são seguidos à risca enquanto outros vão sendo definidos conforme seu

andamento, buscando focar o diálogo para as questões investigadas.

Muitas vezes, no entanto, a situação inverte-se e o questionado pode passar

a fazer perguntas, tomando o lugar do pesquisador, o qual se entrega ao guia

cultural - às “mãos do timoneiro” - em busca das categorias nativas. Assim, que

situação reflete a opção pela abordagem êmica, reforça os preceitos etnocientíficos

Page 55: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

54

(MARQUES, 1995) e ”[...] transforma situações de entrevista em interlocuções entre

especialistas de ambos os lados.” (CAMPOS, 2002, p. 49).

No total, foram entrevistados durante a pesquisa, 36 colaboradores,

apontados como especialistas, resultando em um total de 59 relatos entre

entrevistas, histórias de vida e grupos focais.

Histórias de vida

Pela história de vida, se capta o processo de memória e reflexão crítica do ser

humano sobre suas vivências adquiridas em condições sociais altamente

específicas. Quanto mais o informante fala por si mesmo mais se depara com sua

própria visão e inserção de mundo, bem como das transformações nele contidas

(VIETLER, 2003).

As histórias de vida foram realizadas com 15 pescadores antigos, ou elders,

com mais de 50 anos de idade, em sua maioria aposentados da atividade, que

apresentaram maior tempo e vínculo com a pesca, mas que possuem ainda forte

legitimidade perante a comunidade. A história de vida pode ser considerada um

“mapa no tempo", onde o entrevistado discorre sobre os acontecimentos de seus

tempos passados traçando uma conexão com o presente (o “que era” e o “que é’),

transmitindo por sua trajetória cotidiana importantes elementos sobre a evolução da

atividade e da vida do grupo.

Grupos focais

A inclusão da técnica deu-se pela facilidade com que os atores foram

encontrados realizando atividades em grupo, além de muitas vezes durante a

atividade de entrevistas, espontaneamente inserirem seus relatos, enriquecendo o

contexto da discussão.

Tais relatos, quando ocorrem em conjunto, se complementam com

informações adicionais, fatos que fogem à memória, ou entram em controvérsia com

outras opiniões até que se encontre algum ponto convergente de informação que

passe a refletir a “verdade” naquela situação.

Page 56: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

55

Aprendizado vivenciado e turnês guiadas

O aprendizado vivenciado e as turnês guiadas ocorreram sem planejamento

prévio sendo considerado um produto do próprio campo. Com exceção do

acompanhamento da atividade de pesca e da reconstituição da pesca nas antigas

jangadas de piúba, as situações restantes ocorreram de forma fortuita, captando

importantes efemeridades.

Testes projetivos

Os testes projetivos, amplamente empregados na coleta de dados sobre

classificação e identificação de espécies (ver BEGOSSI 2001: MARQUES 2001a;

COSTA-NETO; MARQUES, 2001) consistiram na tentativa de conhecer os critérios e

meios utilizados pelos pescadores da Caponga para estabelecer relações entre

características comuns, ou similaridades entre as espécies, que definissem assim

sua particular etnotaxonomia. Os testes projetivos foram aplicados durante as

entrevistas sobre conhecimento das espécies sendo utilizados 37 registros

fotográficos produzidos durante o monitoramento dos desembarques.

Pesquisas documentais

Adicionalmente às técnicas supracitadas foram realizadas consultas

documentais que compreenderam além do levantamento bibliográfico para

fundamentação teórica, consultas à Legislação Ambiental e Pesqueira, pareceres de

pesquisadores envolvidos em trabalhos referentes à área de estudo bem como as

produções estatísticas dos órgãos governamentais (regional/nacional).

Critérios sobre escolha de informantes-especialistas

Como citado anteriormente, as entrevistas foram obtidas através da

identificação de intelectuais nativos, os considerados informantes-especialistas ou

informantes-chave. O mapeamento de especialistas foi fundamentado no uso da

Page 57: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

56

técnica de redes sociais (NEIS, 1999; MARQUES, 1995) mais conhecida como

método de bola-de-neve ou snowball sampling (BAILEY, 1982).

O método de redes sociais se configura na identificação e reconhecimento

dos principais peritos em determinados assuntos através da indicação por outros

membros do grupo do qual fazem parte e que o reconhecem como tal.

Apesar de não ser possível identificar previamente um número exato de

especialistas (n amostral) e realizar uma amostragem intencional, os especialistas

freqüentemente se auto-reconhecem e obtém o reconhecimento pelo grupo, o que

por si só valida a representatividade da amostra (MARQUES, 1991).

Assim, como primeiro passo, foi realizada a busca investigativa através de

uma série de entrevistas casuais, abertas, procurando referências sobre possíveis

informantes conhecedores dos assuntos de interesse (seguidos continuamente por

exemplos) ou ainda as pessoas que “mais sabem” a respeito, elaborando a seguir,

uma relação de prováveis especialistas.

Ainda, a indicação de especialistas proveniente da aplicação de questionários

serviu como importante reforço para a determinação dos mesmos legitimando as

indicações.

A partir do mapeamento, os especialistas indicados eram contatados e

entrevistados de acordo com os temas propostos. Mais além, novas confirmações e

novas referências eram solicitadas aos entrevistados buscando identificar - por

critérios comparativos - relevância na experiência prática do especialista

mencionado e consistência no conteúdo das informações.

É importante destacar que além dos informantes especialistas procurou-se

ouvir outros indivíduos ou “aqueles que nunca são ouvidos”, de forma a testar a

hierarquia da credibilidade (GOLDENBERG, 1999). Os relatos foram obtidos através

de entrevistas livres e usualmente registrados em diário de campo.

As falas dos informantes foram coletadas, sincrônica e também

diacronicamente (JOHANNES, 1981), buscando repetir questionamentos a

especialistas já entrevistados de modo a verificar as informações fornecidas.

As abordagens atingiram além de pescadores e ex-pescadores vários

estratos da comunidade, como mulheres esposas de pescadores, idosos, jovens

aprendizes da profissão e outros atores inseridos dentro da cadeia produtiva da

pesca.

Page 58: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

57

1.2.3.2 Técnicas de registro de dados

As informações coletadas foram documentadas através de registros

fotográficos, fonográficos, vídeos, representações gráficas e diários de campo.

Vale ressaltar que o material coletado proveniente das entrevistas foi obtido e

utilizado mediante a permissão prévia dos entrevistados. Nos questionários a

permissão foi registrada por escrito e, nas entrevistas, gravada antes da concessão

das informações. Nos registros fotográficos e filmográficos procurou-se requisitar a

autorização verbalmente.

As entrevistas e história de vida foram transcritas in totum, documentadas

com o auxílio de um gravador portátil Sony MZ-NF810 e registrados em minidiscos

de áudio digital (MD) totalizando 14h13’52” de gravação.

Diário de campo

Abre-se espaço aqui para mencionar as particularidades que o diário de

campo pode conter e a sua importante representação na análise dos discursos dos

informantes. De acordo com Vietler (2003) a importância do diário de campo está

nas impressões subjetivas sobre fenômenos desconhecidos e instituições sob forma

de insights que podem ou não confirmar previsões baseadas em teorias científicas.

No diário de campo foram registradas observações, fatos, contatos, fragmentos de

conversas e outras informações surgidas, mas principalmente, tomando-o como um

diário ao pé-da-letra (MALINOWSKI, 1984; MARQUES, 2005), a rotina de campo de

ambos: pesquisandos e pesquisadora.

Mapas cognitivos e croquis

Solicitados geralmente após as entrevistas - sob critério de maios relevância

de informações e aplicados mediante permissão dos informantes -, 18 mapas

cognitivos e croquis tiveram por finalidade obter a representação espacial de pontos

de pesca, referenciais de orientação, identificar equipamentos de pesca, bem como

a auxiliar no mapeamento dos territórios marítimo e terrestre.

Page 59: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

58

Apesar de esbarrar em dificuldades de aplicação como a indisponibilidade dos

informantes para realizar a representação 22, os mapas mentais são de extrema

utilidade na formulação e confirmação de hipóteses para obtenção de inventário de

recursos ambientais (BARROS, 1997).

Os mapas cognitivos constituem uma tentativa de “captar com os olhos de

quem vê”, ou seja, experimentar a importância e a relevância do olhar êmico. Como

apontado por Niemeyer (1998), as escalas seguidas na cosntruçao dos mapas

mentais não são as geográficas, mas de uma cartografia simbólica, com

representações próprias, fornecem apoio gráfico a um processo lógico de orientação

espacial, repleto de significações e simbolismos.

Etnografia Visual

Buscando confrontar o registro verbal e traduzir o que muitas vezes as

palavras não conseguem mostrar (SAMAIN, 2004), o cotidiano pesqueiro e os

eventos que permeiam a vida dos moradores da Caponga foram captados através

de registros fotográficos e filmográficos. A representação dinâmica de cenas

cotidianas e de atores particularmente importantes no contexto da pesquisa foi

obtida através de uma câmera portátil Canon Powershot S3IS (6.0 Megapixel

640X480 30 f/s) resultando em 57 registros fílmicos totalizando 25’50” gravados.

Desembarques; registro de espécies; momentos de chegada e partida para o

mar; técnicas utilizadas; atores sociais envolvidos; colaboradores; atividade de

pesca; aprendizado vivenciado; turnês guiadas; caracterização da localidade e

senso de embarcações foram documentados através de 5.183 registros fotográficos

explorando a importância da imagem como ferramenta de aquisição de dados e

intrumento de análise na pesquisa.

Para imagens da atividade de pesca (captura) foram utilizadas duas câmeras

descartáveis analógicas filme 35mm: Fujifilm Quicksnap Super (Flash/ Superia ISO

800 27 poses) e Kodak (Flash/ Ultramax ISO 400 27 poses). As demais fotografias

foram geradas utilizando as câmeras digitais Canon EOS 20D (8.0 Megapixel flash

580EX, lentes Canon 17-85mm IS USM, Canon 100mm macro, Canon 10-22mm,

Canon 60mm macro e Canon 70-200mm 2.8 IS USM) e Canon Powershot S3IS (6.0

22 Informantes podem muitas vezes envergonhar-se por não apresentarem habilidades como desenho e escrita (BORGONIA, 2005).

Page 60: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

59

Megapixel e lente 36 - 432mm). As imagens obtidas são de autoria de Áthila

Bertoncini Andrade (fotógrafo), Francisco Soares de Souza (guia cultural local) e

Maíra Borgonha (créditos das pranchas APÊNDICE D). A composição das pranchas

é de autoria de Áthila Andrade Bertoncini e Maíra Borgonha.

É importante elucidar que a experiência pelas veredas da Etnografia Visual foi

incitada pelos resultados obtidos nos trabalhos de Alves (2004), Souto (2004) e

Pinheiro (2008), a partir do olhar das relações estabelecidas entre o ser humano e o

ambiente no contexto da captura do caranguejo em Vitória (ES), da pesca e da

mariscagem em Acupe, Santo Amaro (BA) e da pesca de arrastão no litoral do

Paraná respectivamente.

Quanto à disposição das pranchas fotográficas esta foi orientada

experimentalmente pelos modelos seqüencial e estrutural de Gregory Bateson e

Margaret Mead em seu original “Balinese Character: a photographic analysis” (New

York: New York Academy of Sciences, 1942), apresentadas durante a releitura da

obra feita por Etienne Samain (SAMAIN, 2004).

Igualmente, procurou-se incorporar as seqüências apresentadas nas

pranchas ao contexto do trabalho escrito de forma a orientar para o tema em

questão sem com isso influenciar demasiadamente o olhar do leitor/expectador.

1.2.4 Análise de dados

Os dados obtidos foram analisados qualitativamente através da união das

diversas competências individuais (MARQUES, 1991) tendência que, de acordo com

o autor, vem sendo seguida nos trabalhos etnocientíficos. A sistematização dos

dados, como um todo, procurou seguir os quadros de referência propostos por

Johannes (1993) dividindo-se entre quadros de referência taxonômicos, espaciais,

temporais e sociais, embora não tenha sido abordado aqui com profundidade o

quadro taxonômico.

O conhecimento etnoecológico e o conhecimento científico foram combinados

através da análise conexiva proposta pela Etnoecologia Abrangente de Marques

(2001a), mesmo que não tenha sido explícita dentro de cada uma das

categorizações propostas pelo autor. As espécies de peixes foram identificadas

através de análise taxonômica por Áthila Bertoncini Andrade e as diversas formas de

Page 61: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

60

classificação dos mesmos enquadrados na análise componencial (RYAN;

BERNARD, 2000)

Apesar dos questionamentos pela opção da análise qualitativa, Marques

(2002) enfatiza que o qualitativismo não implica na ausência de rigor científico. Uma

vez em campo, se lida com que o indivíduo deseja revelar, o que deseja ocultar e a

imagem que projeta de si mesmo e dos outros, sendo importante o direcionamento

perceptivo diante dos fatos. A análise exige, adicionalmente, a interpretação de

comportamento não verbal dos informantes, pois se considera que a omissão/não

revelação de informação também constitui um tipo de informação.

Ainda, na tentativa de obter dados qualitativamente confiáveis, optou-se em

utilizar como critério metodológico a referência cruzada (VIETLER, 2002) que prediz

a análise através de comparação de mais de uma técnica de coleta. A aplicação do

critério permitiu que a confrontação das técnicas escolhidas atuasse de forma

complementar na avaliação da confiabilidade das informações obtidas.

Page 62: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

61

CAPÍTULO 2. A CIÊNCIA DOS PESCADORES DA CAPONGA: ASPECTOS

SOCIAIS, ECONÔMICOS E CULTURAIS DA PESCA

2.1 Os Capongueiros

Capongueiros é a forma como são conhecidos os pescadores da Caponga. A

utilização de um termo em referência aos pescadores confere aos mesmos a

particularidade de serem identificados de forma exclusiva. A utilização de

identidades singulares entre pescadores no Ceará foi fato também observado por

Tupinambá (1999):

É abundante nas comunidades litorâneas referencias a estas identidades quando encontramos os Mundauzeiros (Mundaú-Trairí), Guajiruzeiros, (Guajiru-Trairí), Redondeiros (Redonda - Icapuí), Prainheiros (Prainha do Canto Verde - Beberibe), Sucatingueiros (Barra da Sucatinga - Beberibe), Canoeiros (Canoa Quebrada - Aracati), Batoqueiros (Batoque - Aquiraz), Pecenheiros (Pecém - São Gonçalo do Amarante). Cada um deles com um perfil nítido que nos fala de seus valores, estilos de vida, hábitos... (TUPINAMBÁ, op. cit., p. 51).

A autora, ao reproduzir parte do relato de um colaborador, deixa evidente que

as identidades explícitas ocorrem mais pelo reconhecimento entre grupos – ou seja,

entre relações extratribais – do que a eles próprios em suas relações intratribais. O

fato também foi verificado no contexto da vida dos pescadores da Caponga onde o

uso da designação Capongueiros foi percebido em referência à comparação entre

aspectos da pesca/saberes/modos de vida dos pescadores da lacalidade em relação

aos pescadores de Balbino, os Balbineiros, conseqüentemente. Registra-se assim a

utilização das duas designações – Capongueiros e Balbineiros – ao contexto da

identidade dos grupos pesqueiros do Ceará.

2.1.1 Faixa etária e experiência de pesca

A pesca na praia da Caponga é uma ocupação predominantemente

masculina, sem participação direta de mulheres na captura e comercialização do

pescado, exceto no processamento em casos específicos. É exercida por homens

jovens, adultos, inclusive idosos. Uma ampla faixa etária de pescadores foi

Page 63: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

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Page 64: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

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Page 65: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

64

A perda da acuidade visual entre os pescadores mais velhos implicando na

perda do conhecimento tradicional foi documentada por Diegues (2000b) entre os

pescadores da localidade de Galinhos (RN) e também verificada por Grando (2003)

na Praia do Forte (BA) onde a exposição excessiva aos reflexos solares e ao sal

resulta na perda das marcações dos pesqueiros.

Pescadores com idade superior a 60 anos representaram 12% do total de

entrevistados. De acordo com o que versa a legislação previdenciária 23, da mesma

forma que o trabalhador rural, o pescador artesanal pode requerer a aposentadoria

ao completar 60 anos. No entanto, os pescadores enfrentam uma série de

dificuldades quanto à comprovação do exercício da atividade, do número de

contribuições e do tempo de pesca como meio de requerer o benefício.

Segundo os mesmos, é possível obter a aposentadoria através de uma

declaração fornecida pela Colônia de Pesca, comprovando a situação de pescador

como contribuinte. Contudo, reclamações sobre os meios de obtenção e a

verossimilhança dos beneficiários são frequentes. De acordo com os pescadores,

pessoas na localidade, entre elas mulheres, são aposentadas sem nunca terem

exercido a profissão 24.

Situação bastante recorrente, é que tendo ingressado na pesca antes da

maioridade, haja um déficit representativo de comprovação na carreira, obrigando-os

a exceder o período de trabalho necessário. Não conseguindo comprovar o tempo

de atuação profissional exigido, os pescadores passaram a desenvolver atividades

paralelas visando obter o benefício, enquanto outros ainda aposentaram-se por

invalidez:

Pesquei até 1989, não consegui me aposentar como um pescador porque quando chegou a hora de se aposentar estava com a carteira assinada como zelador. Fui aposentado por invalidez. (José Marcelino de Medeiros, Zeca, mais de 70 anos).

!

Hoje eu tá aposentado por a Prefeitura. Tem mais de vinte ianos, com a idade de 50 ianos já parei. Pesquei mais ou menos trinta e cinco ianos. Aí peguei um trabalho da Prefeitura aqui aí tou eu aposentado pela Prefeitura. Não tive direito de pescador não. Tou encostado por a Prefeitura. (João Camilo da Silva, Jotinha, 70 anos).

23 Ver inciso II do § 7º do Artigo 201 da Constituição Federal e Artigos 11 inciso VII 39, I, 48, § 1º. e § 2º; 142 e 143, da Lei No. 8.213/91. 24 Como exemplo, em apenas um dos questionários foi apontado a participação direta de mulheres na pesca, no entanto, o fato não corrobora com as demais informações obtidas nem com as observações de campo.

Page 66: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

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Page 68: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

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Page 69: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

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Page 71: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

70

fundamentais para dispensar os cuidados parentais e sustentar-se à custa do

próprio trabalho.

Corroborando com a afirmativa, em 55% dos casos os pescadores apontaram

como principais motivações para o exercício da atividade a falta de alternativas

profissionais: “Era a única profissão que tinha no lugar”; “Não tinha outro trabalho”;

“Não tinha outra opção”; “Quando eu cheguei na Caponga não tinha minha profissão

então recorri à pesca”. E, em segunda instância, a necessidade financeira: “Eu perdi

meus pais cedo, não tinha outra forma de sobreviver”; “As condições obrigaram a ir

para o mar para buscar o sustento”.

Em contraste ao aspecto da obrigatoriedade, 29% responderam estar na

profissão por escolha própria e gostar da atividade que exercem: “Foi a única coisa

que eu me interessei”; “Vontade minha mesmo”; “Foi a profissão que eu escolhi”.

Ainda, outras razões foram citadas como a entrada na pesca pela influência

de precedentes familiares: “Meu pai me levava pra pescar na risca e pegar peixe”;

“Segui o caminho do meu pai”. A experimentação, ou seja, a vontade de vivenciar a

pesca: “Fui a primeira vez, gostei e não quis parar”. A autonomia proporcionada pela

atividade: “Não sou obrigado a ninguém”. E, por fim, o prognóstico à ser pescador

nominado por Souto (2004) de sina: “Todo rapaz da praia quando vai chegando de

oito, dez anos o destino dele é pescar”.

O ingresso prematuro na atividade pesqueira da Caponga evidencia as

características da busca pela independência (dispensa dos cuidados parentais) e a

necessidade do trabalho como recurso de garantir sua própria sobrevivência

derivada, por exemplo, da ausência de estrutura familiar:

Eu comecei a pescar com idade de dez anos, a idade de doze anos já pescava de mestre nessas embarcações. Já marcava as pescarias com os meus olhos mesmo, já levava, já trazia. Eu fiquei trabalhando para cuidar de meus irmãos. (Jose Valdecir Alves).

Mas, indiscutivelmente, por concretizar a experiência da pesca marítima:

A minha família, os meus irmão, tudo era pescador. Nós era cinco irmão, só tinha um que não era. Eu aprendi com eles. Saí um dia de casa fugido dos meus pais, que meus pais não queria. Tinha doze iano aí saí fugido pra ir pro mar mais um irmão meu. Aí fui, gostei, aí fiquei pescando. (Pedro Alves Pereira, Pedro Américo, 69 anos).

Page 72: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

71

Me lembro não que eu fugi! Fui fugido do meu pai para ir pro mar. Também quando encaiei ele não fez questão não. Pesquei por vontade mesmo [...] eu mais meus irmão. Meu pai também era um homem muito do pescador e nós vivemos a vida. (Chico Grilo, 99 anos).

Nos relatos é possível detectar os conflitos familiares como elemento motor,

indutor do ingresso na atividade pesqueira, caracterizando a inserção na pesca

como uma questão de satisfação e desejo pessoal de liberdade, autonomia:

O meu irmão dizia que eu não fizesse aquilo não, não caísse na besteira de ir para o mar que eu não voltava mais. (Raimundo Miciú, 78 anos).

Outro fato observado por Marques (2001a) é a entrada na pesca como causa

da evasão escolar. Igualmente na Caponga, a incompatibilidade entre os calendários

letivo e pesqueiro propicia o domínio da arte da pesca, em detrimento aos estudos,

fazendo com que os meninos abandonem a escola.

Atualmente, o aprendizado na arte do mar continua tendo seu início logo cedo

na infância dos garotos. Durante o período de campo, através de observações e de

abordagens aos meninos25 - que costumavam acompanhar as atividades de pesca

dos adultos e pescar no Riacho Caponga - observou-se a unanimidade na opção

pela pesca enquanto escolha profissional.

Crianças do sexo feminino não foram observadas fazendo parte do contexto

das brincadeiras, nem das atividades relatadas a seguir. No entanto, tal fato não

exclui a possibilidade de também elas, partilharem o desejo de inserirem-se no

universo da pesca

Os meninos, com idades aproximadamente entre 6 e 12 anos, possuem

habilidades para navegação com pequenos paquetes, para lanceio da tarrafa, redes

de arrasto e para a mariscagem. Divertem-se aprendendo a nadar no rio e sempre

estão envolvidos nas atividades da praia, acompanhando a rotina de pesca.

A expectativa pela concretização da experiência de pesca no mar é

evidenciada nas representações coletadas durantes as conversas entre a

pesquisadora e os meninos. Para eles ser pescador está relacionado com as

impressões obtidas no conhecimento dos mais velhos, mas apenas sob um aspecto

positivo, contrapondo, por vezes, aquelas impressões dos pescadores adultos que

25 Ao utilizar a palavra “menino”, tendo em vista o significado ambivalente tanto para o gênero masculino como feminino em alguns locais no Nordeste, por exemplo, aqui refere-se apenas à crianças no gênero masculino.

Page 73: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

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Page 74: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

73

Marques (2001a; p. 187) fala que “a vivência da meninice também aproveita

as possibilidades ecossistêmicas, facilitadoras das possibilidades lúdicas”, onde é

possível dizer que os meninos da Caponga utilizam e interagem com elementos

bióticos e abióticos, explorando várias feições do ambiente costeiro. No riacho

Caponga e na sua desembocadura é onde fazem arrasto para capturar camarão,

jogam tarrafa para capturar peixes, aprendem a nadar, fazem regatas com os

paquetinhos, mariscam e nas áreas adjacentes, mais à montante, jogam futebol na

estação seca.

No rio dá carapeba, moreia, caranguejo, siri, sauna, coípe, carapau, tainha, soia, buzo, picholeta, maria-farinha e ostra. Também dá bague e camarão... (Grupo focal, 09/12/2007)

A pesca com redes de arrasto, e em alguns casos de tarrafa, é feita em locais

marcados como apontado pelos meninos: “Nesse canto aí tem um monte”; “Prá

acolá, pra cima tem uma ruma”; “Tem ali na faxina”. Os garotos também seguem

ritmos correspondentes com as marés ou horários do dia para realizar a captura: “Eu

acho mais bom pescar de manhã”. É possível pressupor que o fato evidencia a

formação do conhecimento pesqueiro já na infância através da observação atenta do

ambiente correspondendo com práticas como as mencionadas.

Para brincar nas dunas, os meninos constroem pequenas pranchas servindo-

se de refugos de madeira para escorregar de cima para baixo e também fazem a

coleta do murici (Byrsonima crassifolia) na estação do verão.

Mas é no ambiente praial que acontecem as participações diretas no cotidiano

da pesca verdadeira. Os garotos aventuram-se de paquetinho nas ondas, tomam

banho de mar, tentam conseguir funções durante o preparo ou a saída das

embarcações e acompanham o desembarque do pescado em busca de conseguir

peixes, eviscerá-los para depois levá-los para suas casas. Na preparação para a

vida adulta, reproduzem em escala própria o cotidiano pesqueiro adquirindo

conhecimento e também suprindo necessidades que garantam a sua sobrevivência

(FIGURA 10).

Page 75: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

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Page 76: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

75

Meu nome é João Lotero da Silva, setenta e dois anos nascido e criado na Caponga. De família de pescador, irmãos pescadores, tios pescadores, só viviam da pesca. Peguei a pescar com dez ano de idade com um tio. (João Lotero da Silva, Joãozinho, 72 anos).

A minha história é que eu comecei a pescar de bote de remo de botinho sozinho. Aqui mais o meu pai, sozinho, pertinho dele né? Comecei com quinze ano de idade. (João Camilo da Silva).

A predominância dos laços parentais reflete-se tanto na transferência do

conhecimento quanto no desenvolvimento e organização da pesca durante a divisão

do trabalho e dos rendimentos, ambas características que serão abordadas mais

adiante. De acordo com os relatos e observações de campo é possível afirmar que o

conhecimento entre os pescadores da Caponga transmite-se através de recursos

verbais (explicação), e não-verbais (demonstração), que são incorporados na

observação e aplicados por repetição, fazendo da memória, como apontado por

Toledo (1992), o componente mais importante de transmissão de saberes.

Como visto nos relatos a seguir, o acompanhamento das atividades dos mais

velhos conduz ao fornecimento de parte dos elementos que vão compor os sistemas

cognitivos (corpus) e influenciarão os modos como os futuros pescadores se

apropriarão e interagirão com o ecossistema (práxis):

Comecei a pescar com cinco anos de idade. A gente vai crescendo mudando mais, ficando maior e vai para o mar, quando a gente é pequenininho assim, a gente não tem aquela força de arriar assim. Aí o pai vai ensinando a gente a uma rede para fazer, puxar uma poita, botar água numa vela, colocar uma fateixa, que a gente afundeia. Toda vida a gente vivia do mar. (Eudes Miranda da Silva, Eudinho, 61 anos, grifos nossos).

[...] foi o meu primo que aprendeu com o pai dele, que também fazia, mas morreram, vendo aquele trabalho eu fui encostando perto dele vendo como era aquele negócio, me enfiava. Eu tinha dezoito anos ia para a praia de manhã, pegava a maré toda seca, trabalhava enquanto podia, das sete às uma tirando dez, doze pedras por dia. (Luiz Alves Anastácio, Toco, 56 anos, grifos nossos).

!

Comecei a pescar com dez anos meu pai me levando eu pro mar, em paquete de piúba, nós ia pescar peixinho nas risca, as risca é aí, nas pescaria, elas tem os nome essas pescaria vou até passar os nome pra você, ele já sabia aí ele levava nós e explicava essa é pescaria tal, tudinho ele explicava [...] (Francisco Miranda Pereira, Fransquinho Carapitanga, 63 anos, grifos nossos).

Page 77: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

2.1.4

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Page 79: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

78

E lá (no Pará) a distância é muito grande. Muito grande essa distância. Muitas vezes eles saem, muitas vezes eles vão pescar, ele sai de quarenta e seis graus longitude e para pescar em quarenta e nove graus e, então fica muito distante. Praticamente é como pescar no Hemisfério Norte. Pescar para pegar os peixes, eu acho muito puxado assim (Francisco Helieudo Silva, Helinho, 39 anos).

Saiu eu mais dois colegas meus, fomos trabalhar nessa pesca de sardinha, lá em Santa Catarina, só com a roupa do corpo, no inverno. (Francisco Soares de Souza, Wilson, 52 anos).

Os pescadores também contaram suas experiências nas frotas artesanais de

outras praias do Ceará (maior freqüência para o Mucuripe, Pernambuquinho,

Balbino e Morro Branco), retornando ou se instalando definitivamente na Caponga.

Sobre o aspecto da prática de pesca no contexto exterior ao lugar de origem,

seja ela apenas fora da localidade ou noutro canto de mundo como dito pelos

pescadores da Caponga,Simone Maldonado relatou que “a incursão a outras pesca

e outros mares, faz parte da experiência de mundo e da construção do fazer

pesqueiro no contexto simples” (MALDONADO, 1993, pg. 186) evidenciando a

experiência individual de estranhamento de outras condições de trabalho e relações

sociais na vida de pescadores artesanais.

2.1.5 Transmissão do ofício

A respeito da intenção de transmitir o ofício, 58% dos pescadores não

manifestam o desejo de que os filhos se tornem pescadores. Pescadores que

afirmaram desejar passar seus conhecimentos adiante somaram 39% e ainda 3%

colocaram a escolha nas mãos dos próprios filhos.

Entre aqueles que não desejam passar a profissão adiante, 68% atribui o

motivo aos elevados riscos do exercício da profissão. Outros desejam uma profissão

melhor aos filhos (13%); preferem que os filhos estudem (11%); são contra, mas

mesmo assim os filhos pescam (5%); ou tem filhos do gênero feminino (3%).

A ausência de um plano de carreira e aposentadoria prevista não tem incitado

o ingresso de novos profissionais na pesca. A falta de segurança e a precariedade

das condições de trabalho tampouco sugerem benefícios. Portanto, não somente a

continuidade da atividade se encontra ameaçada, mas com ela um arsenal de

conhecimentos e práticas próprios da localidade.

Page 80: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

79

Para aqueles que manifestaram a intenção de passar os conhecimentos, 41%

o faz com o desejo de que a atividade não se acabe; 23% como forma de manter a

tradição familiar; 20% porque consideram a pesca uma profissão importante e 16%

porque a consideram a principal alternativa econômica na localidade.

Quando perguntados sobre as atividades que os filhos desenvolvem apenas

26% dos pescadores afirmaram ter filhos trabalhando na pesca, confirmando a falta

de incentivos interna e externa ao grupo para o ingresso na pesca local. Os

pescadores que tem filhos envolvidos na atividade pesqueira apontaram como

razões para que os filhos tenham seguido a profissão, a falta de alternativas

profissionais na localidade (12%); a possibilidade de dar continuidade da profissão

herdada dos pais (28%), mas em maior parte (60%), o desejo em exercer a

profissão.

Apesar dos baixos números apresentados, o cenário quanto à entrada na

atividade motivada pelo gosto à profissão, registrada para pescadores mais antigos,

parece dar continuidade à pesca local.

Em relação aos filhos dos pescadores não envolvidos com a pesca a maioria

o faz devido aos riscos que oferece a profissão, a falta de identificação com a pesca

ou de aptidões necessárias para a prática da atividade. Além disso, em certos

casos, os próprios pais não permitem que os filhos pesquem.

Page 81: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

80

2.1.6 Fonte de renda

A maioria absoluta dos pescadores da Caponga (90%) dedica-se

exclusivamente à pesca sem disposição para desenvolver tarefas que não sejam

vinculadas diretamente à atividade. Apenas 12% dos pescadores responderam ter

desenvolvido em algum momento da sua vida profissional atividades como

agricultura, comércio, pesca industrial, construção, caseiro e metalurgia.

Os serviços ligados à construção e ao trabalho em segundas residências

servem à uma demanda por mão-de-obra local tendo em vista o contingente de

novas construções e casas de forasteiros, como muitos pescadores se referem,

presentes na localidade e adjacências (Águas Belas e Balbino).

De acordo com Silva (2003), foi a partir da década de 1970, que o litoral

cearense começou a sentir os processos desordenados de ocupação provenientes

do turismo. Nesse sentido Sampaio (2002) e Amorim (2006) abordaram a

transformação estrutural do trabalho, no contexto da modernização do Ceará,

proveniente da atividade turística, a qual cria novas oportunidades de geração de

emprego e renda, deslocando os trabalhadores de outros setores da economia.

As chamadas segundas residências empregam trabalhadores locais,

pescadores e familiares, que sazonalmente ou definitivamente abandonam a

atividade. No entanto, questões envolvendo a redução da beleza cênica têm tornado

a praia da Caponga um local pouco atrativo sendo possível observar um significativo

número das referidas residências sendo postas à venda.

A pesca foi apontada em 89% dos questionários como a principal fonte de

renda das famílias dos pescadores. E, ao contrário de algumas comunidades

litorâneas do Ceará, a participação dos pescadores na agricultura é praticamente

nula. Como os pescadores que afirmaram ter trabalhado na lavoura não são nativos,

é possível que se insiram em um contexto diferenciado de costumes e de modelo

produtivo daquele local.

As unidades familiares são constituídas de até cinco pessoas (61%) e mais de

cinco pessoas (entre 5 e 10) em 39% dos casos. Correlacionado os valores

absolutos de dependentes e moradores por residência concluiu-se que 84,5% dos

familiares dependem diretamente da renda proveniente da pesca.

Page 82: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

2.1.7

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Page 84: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

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Page 85: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

84

PRANCHA 7

Page 86: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

85

2.2.1 Ocupações ligadas à pesca

2.2.1.1 Botadores

O número de botadores que auxiliam na colocação e retirada de uma jangada

do mar é bastante flexível. A maior presença de botadores está sempre associada

às embarcações que estejam voltadas à captura de peixes – certeza de receber

retribuição pelo trabalho – pois a lagosta é repassada diretamente ao marchante.

Trabalham como botadores na Caponga em torno de 25 homens, tendo o mais velho

35 anos de atividade.

Rolar a embarcação sobre paus da estiva, suportados pelos rolos,

confeccionados com madeira de cajueiro (Anacardium occidentale) e jatobá

(Hymenaea courbaril) é um trabalho braçal extenuante que exige movimentos

compassados, seguindo um comando de voz que sincroniza o empurrão. Botar uma

jangada pra riba leva não menos de trinta minutos podendo ultrapassar a marca

caso a embarcação encalhe em maré baixa.

O pagamento dos botadores pode ser feito de duas formas: dinheiro ou

produção. A primeira ocorre quando a pescaria é farta e quando são capturados de

peixes de maior valor. No entanto, em grande parte das vezes, o botador ou rolador,

é remunerado com peixes, sinalizando a parca captura. Em caso de receber o

pagamento em peixes o próprio se encarrega de vendê-los.

O rolador só é remunerado, seja com peixe ou dinheiro, se houver produção.

O dono da jangada paga quatro botadores, sendo os botadores adicionais pagos

pelos pescadores. O número de botadores que exceder a soma é considerado com

ajuda podendo ou não receber gratificação. O pagamento gira em torno de

aproximadamente 10% do lucro obtido pelo proprietário da embarcação. Por

exemplo, se tirando as despesas com a pescaria ele obtiver R$ 100,00 o botador

ganhará R$ 10,00, respectivamente.

Os botadores chegam pela manhã cedo na praia e alguns deles acumulam as

funções de carregador de equipamentos, consertador de peixe, aguador de

embarcação.

A sobreposição de tarefas ocorre de acordo com a ambição, experiência,

habilidades e confiança depositada nos botadores pelo dono da embarcação.

Page 87: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

86

Botadores freqüentemente auxiliam na negociação da captura, ou a negociam

livremente para o dono ou mestre da embarcação e são responsáveis por organizar

os amontoados de peixe visando melhorar a apresentação para o comprador. Um

bom trabalho desempenhado é certeza de continuar-se na praia.

Há uma grande solicitação por botadores quando várias jangadas chegam

aos diferentes portos simultaneamente, fazendo-os correr entre os mesmos ou

dividir-se em grupos menores para atender todas as embarcações.

O motivo de tornar-se um botador, geralmente está relacionado com a falta de

aptidões para enfrentar a vida no mar como lembrado por Seu Raimundo Miciú,

pescador: “É preciso se acostumar com o mar. O mar não é pra todos”. Apesar do

emncionado alguns botadores possuem inclusive registro de pesca.

Os botadores, à semelhança dos pescadores, seguem uma hierarquia

baseada na experiência, onde os mais antigos são melhor remunerados em relação

aos menos experientes.

2.2.1.2 Outras ocupações

Na rede de trabalho diretamente desempenhada na praia, somam-se aos

botadores as funções de aguador e carregador, sendo que as mesmas podem

sobrepor-se. Pela manhã cedo, logo no início da tarde e ao final do dia, os

aguadores vão à praia para banhar as embarcações expostas ao tempo. O

ressecamento da madeira provoca avarias nas estruturas sendo necessário mantê-

las úmidas e cobertas com palha de coqueiro. Com o auxílio de baldes o aguador vai

trazendo água do mar e molhando uma a uma as embarcações pelas quais é

responsável. Seu trabalho é remunerado com pescado.

Além de molhar as jangadas, ao final do dia, o aguador, e muitas vezes o

dono da embarcação, se responsabilizam por içar as velas das embarcações

evitando assim que a umidade danifique a panagem26 exposta à maresia.

Nota-se na praia o uso freqüente de carrinhos de mão, com a finalidade de

levar para ou da embarcação equipamentos, suprimentos e pescado. Assim, os

carregadores são os responsáveis por transportar as barras de gelo necessárias à

conservação da produção; retirar o pescado após o arremate e conduzi-lo ao

26 Velame.

Page 88: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

87

barracão; levar mantimentos e equipamentos da casa do proprietário à sua

embarcação e, posteriormente, fazer o caminho inverso.

2.2.1.3 Trabalho feminino

Indiretamente e de muitas formas, o trabalho feminino se relaciona com a vida

da pesca na Caponga. Na década de 1950, a localidade vivenciou tempos

abastados quando a lagosta tornou-se o principal item da produção pesqueira no

Estado do Ceará. Era das “cabeças” de lagosta e da mariscagem que as mulheres

garantiam parte do sustento e renda familiar:

Pesquei de siri, camarão, caranguejo, aonde tinha eu ia. Além das pedras você pode ir arriar o jereré que onde tiver você pega siri. De noite eu cansei de ir para riba daquelas pedras no mar e o meu irmão, com um lampião, e ele com uma tarrafa, que vinha uma roda tantos lagostozinhos todos deste tamanho, pegava botava no fogo um tacho e fervia. Eu me criei desse jeito minha filha. (Maria Catita, 71 anos).

Atualmente, passados os chamados tempos de fartura, com o declínio da

captura da lagosta e o desaparecimento da mariscagem, um segmento

particularmente importante assegura a participação feminina na cadeia produtiva

pesqueira. Sendo a pesca e as atividades diretamente ligadas a ela, essencialmente

masculinas (produção, beneficiamento e venda), o trabalho feminino continua

através de um sistema de trocas que envolve jovens, adultas e idosas.

O fornecimento de frutas, preferencialmente mangas; o “tempero” que vai ser

levado ao mar para dar sabor ao pirão com peixe; a tapioca e a goma de mandioca,

primeira refeição na ida para o mar; novas velas ou remendos naquelas danificadas

são todos serviços providos pelo trabalho feminino.

As frutas são trazidas das localidades próximas por mulheres que não

possuem familiares vinculados à pesca. São oferecidas no centro de comércio ou

em meio ao leilão que acontece no momento do desembarque do pescado. Por não

apresentarem relações de parentesco com pessoas ligadas à atividade e

pertencerem a uma realidade diferente da vivida pela comunidade, essas

Page 89: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

88

mulheres27, transitam com maior liberdade entre o universo masculino da pesca,

acompanhando atentas as movimentações da praia e dos desembarques onde

estão presentes a maioria das vezes. Em uma junção mútua de interesses, os

pescadores garantem a diversificação da “quimanga” 28 e as mulheres conseguem o

peixe, fonte de proteínas que não obteriam por outros meios.

O tempero, composto um combinado de condimentos, assim como a tapioca

e a goma são feitos por mulheres da própria comunidade, geralmente nos espaços

de suas casas e procurados pelos pescadores.

As costureiras, que também residem na Caponga e trabalham em suas casas

ou na praia, fazem à mão o conserto e a confecção das velas. Fato notável é que

entre os pescadores apenas figuras masculinas foram lembradas na etapa de

confecção. A idéia de hierarquia diferenciada no trabalho entre homens e mulheres

confere às costureiras um título complementar, não como aquelas que concebem o

design das velas, mas que realizam as etapas de finalização.

2.2.1.4. Marchantes

Aproximadamente 12 marchantes atuam na comercialização do pescado

produzido na Caponga. Dentre esses, cinco responderam aos questionários, sendo

que todos afirmaram ter iniciado a atividade na própria Caponga e apresentaram 17,

20, 31 e 48 anos de experiência no ramo, com exceção ao que foi pescador durante

20 anos e é marchante há seis.

As atividades dos marchantes concentram-se principalmente na

comercialização e ocasionalmente no beneficiamento do pescado. As unidades de

produção dos marchantes são principalmente individuais, mas também em regime

familiar ou de parceria.

A origem fundamental do pescado comercializado é artesanal local não

havendo comercialização de pescado de procedência industrial. Entretanto, dois

marchantes relataram distribuir pescado artesanal de origem externa (Camocim)

para suprir a demanda quando há falta de produto interno.

27 Foi possível perceber, através de relatos fortuitos de pescadores e esposas, que algumas das mulheres mantêm relações sexuais e/ou afetivas com os mesmos, ocasionando, em casos, desconforto, discriminação e desconfiança em relação a elas. 28 Grupo de alimentos levados para o mar, no passado armazenado (principalmente a farinha) dentro de uma cabaça e, mais recentemente, dentro de bóias sinalizadoras encontradas à deriva.

Page 90: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

89

O pescado produzido na Caponga é consumido internamente além de

abastecer os mercados de Cascavel, Pindoretama, Fortaleza e Aracati. Na Caponga

o pescado supre a demanda de restaurantes, principalmente das barracas de praia,

sendo comercializado livremente e também repassado no barracão (mercado). A

feira semanal de Cascavel, que ocorre aos sábados, é o principal destino da

produção de peixes local, enquanto as lagostas seguem diretamente para a

Empresa de Comércio de Pescados Aracatiense (COMPESCAL), em Aracati para

serem exportadas.

O pescado é comercializado resfriado, congelado, in natura, eviscerado,

fileteado, em postas ou inteiro. A estocagem é feita diretamente no gelo, com menor

uso em freezers, não sendo reportado o uso de câmaras frigoríficas. O transporte é

realizado principalmente em veículos de passeio, a pé com auxílio dos carrinhos de

mão e as lagostas transportadas em furgão.

Nos procedimentos de beneficiamento e distribuição estão envolvidos, com

cada atravessador, uma média de seis pessoas, que não possuem vínculo

empregatício formal e são remuneradas por produtividade.

De acordo com os marchantes entrevistados, semanalmente são

comercializados entre 250 a 1000 kg de peixes e entre 50 a 60 kg de lagostas. No

entanto, durante o verão, a comercialização de peixes sofre diminuição na oferta

para aproximadamente 200 kg por semana. Fortes ventos presentes na estação

fazem com que os pescadores diminuam a freqüência das saídas para o mar não

conseguindo suprir a demanda por pescado.

Para estipular o preço da produção, pescadores e marchantes utilizam a

categorização baseada na valoração das espécies - do maior pra o menor valor -

que designa os peixes como sendo de primeira, segunda e terceira. Os critérios

estão fundamentados principalmente no porte e na palatabilidade.

Os marchantes possuem fornecedores fixos. O número de fornecedores

variou amplamente, sendo reportados entre dois a 18 fornecedores por marchante

para peixes, totalizando 43 jangadas envolvidas. Apenas dois marchantes são

proprietários de embarcações realizando a comercialização de produto próprio.

Ainda, de acordo com a estimativa do marchante responsável pela compra de

lagostas, 30 embarcações e 70 pessoas entre pescadores, carregadores,

evisceradores estão envolvidos com as atividades.

Page 91: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

90

Os tipos de pescado mais vendido são os peixes de primeira, com preferência

para os vermelhos (família Lutjanidae); o sirigado (Mycteroperca bonaci) a cavala

(Scomberomorus cavala) e o bijupirá (Rachycentron canadum). Segundo os

marchantes peixes de pequeno porte não possuem bom comércio, pois não se

conservam por muito tempo.

Para os marchantes as vantagens de comercializar pescado na Caponga são

principalmente a oferta contínua de pescado e o valor recebido com o repasse.

Como desvantagens destacaram a desvalorização de produtos como a arraia

(Dasyatis spp.); o excessivo número de marchantes; o “fracasso” da pesca durante o

inverno com as chuvas e, com maior ênfase, a dificuldade de negociação com os

pescadores.

2.3. O sistema de divisão por partes

A divisão da produção pesqueira é feita através do sistema de partes

nominado pelos pescadores de meio-a-meio, onde metade da produção pertence ao

proprietário da embarcação e a outra metade aos pescadores, seus subordinados. O

sistema de partes é uma forma de parceria desenvolvida principalmente no setor

primário e é comumente observado em outras praias do Ceará e regiões do litoral

brasileiro.

A meiação opera da seguinte forma: Se forem produzidos R$ 100,00 de

pescado, R$ 50,00 pertencem ao dono da embarcação e os outros R$ 50,00 serão

divididos igualitariamente entre um determinado número de pescadores. Nota-se, no

entanto, que pequenas variações operam dentro do sistema de partes realizado na

Caponga.

Ao proprietário cabe arcar com as despesas básicas que garantam a saída da

jangada para o mar como alimentação, equipamentos e também o fornecimento de

certos “agrados” aos pescadores (cigarros, tabaco, maconha, etc.). Os Pescadores,

em contrapartida, entram com o trabalho e dividem despesas de botadores, gelo,

água e tempero (quando quiserem), através da produção obtida.

Na chamada pesca de linha junta, o pescador e o proprietário da embarcação

dividem em partes iguais a produção. No caso de uma pescaria familiar com pai e

filho dividindo a embarcação, foi observado que a partilha pode ser tanto feita meio-

Page 92: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

91

a-meio: “Se vender R$100,00, R$ 50,00 fica para o dono da embarcação e R$ 50,00

pros pescadores que são filhos dele”; quanto dividindo despesas e os lucros

igualmente entre ambos: “Meia-a-meia, pois somos da mesma família aí é melhor

pra nós”. Sendo pescador, o proprietário da embarcação entra da divisão das

metades recebendo, além do seu direito como proprietário, a parte que lhe cabe

como pescador.

Alguns proprietários fornecem gratificações aos pescadores que giram em

torno de 5% a 10% acrescido ao valor da metade: “Se vender R$100,00, R$40,00 é

da embarcação e R$60,00 divide entre os pescadores”; “A metade é do dono, 55%

aos pescadores, dividido por três, e 45% para o dono”; “Se ele ajudar, R$250,00

dividido por quatro, mas sempre dá um pouco a mais aos três”.

Apesar da vigência de um sistema arbitrário de partilha, corroborada pelas

observações de campo, não é possível afirmar que a meação - dentro do contexto

da Caponga - seja uma forma injusta de remuneração.

Em muitas situações, com exceção do proprietário da embarcação ser

marchante ou não ser pescador, há uma notável solidariedade entre a classe na

divisão de lucros e também de prejuízos. Sob tal aspecto, Maldonado (1994)

enfatiza a importância da igualdade e da cooperação voluntária dos homens do mar

onde o sentido de cooperação é construído com a proximidade e com os desafios

que enfrentam na prática da atividade pesqueira.

Portanto, quando os pescadores não obtêm sucesso nas pescarias, quando

estão impossibilitados de pescar por doenças ou outras razões são prontamente

auxiliados pelos companheiros sem distinção entre casta de donos ou empregados.

2.3.1 Destino da produção

Na Caponga, os pescadores dirigem a produção a cinco diferentes destinos.

Além do atravessador, para onde os pescadores afirmaram vender 47% da

produção, é vendida na praia diretamente ao consumidor (29%); beneficiada pelos

próprios pescadores (6%); consumida (12%) e distribuída em forma de doação (6%).

No entanto, quanto à preferência pela venda da produção, quase dois terços

dos pescadores (63%) afirmaram vender aos marchantes; 29% diretamente na praia

e 8% a quem oferecer o melhor preço (tanto para marchantes quanto direta). A

Page 93: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

92

possível razão do resultado é o fato dos marchantes estabelecerem uma relação

com os pescadores que ultrapassa a simples compra do pescado. Em muitos casos,

os marchantes financiam equipamentos de pesca (principalmente manzuás),

concedem empréstimos, adiantamentos (vale) e compram seguramente a maioria da

produção dos pescadores, subordinando-os aos seus meios de produção.

Relatos e observações de descarte de espécies foram nulos sugerindo que os

peixes não apreciados sejam rejeitados logo após a captura ainda no mar.

O tubarão também, tem uma classe de tubarão, um tal de anequim, que ninguém come não porque derrete [...] a carne dele se desmancha só em água, fica só o coro. Aí a gente joga no mato, não dá pra trazer não que não presta!

^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^^! É que nem a arraia também, a arraia, tem a qualidade de arraia- anequim, ocê pega ela bota pá riba da jangada quando é com um pedaço, ela ta só o coro. Aí não presta. É grande ela cresce grande, cresce de 60, 80 quilo! (Raimundo Miciú).

!

!

Restos de peixe como as espinhas são reutilizadas para isca e o couro de

espécies como o cangulo (Balistes spp.) para produzir remédios e objetos de

vestuário. Corroborando com a idéia do baixo descarte, verificou-se o extremo

aproveitamento de partes do pescado como rabo e fato, equivalentes às vísceras e

gônadas, negociados entre botadores e pedintes.

Na Caponga opera um importante sistema de manutenção de redes sociais

caracterizado pela distribuição de pescado não remunerada, sob forma de doação,

reforçando a solidariedade entre a classe. As doações não se configuram em

quinhão, pois não são contribuições obrigatórias.

Se você encalhar do mar, a sua pescaria é a do alto. Aí, você tira trinta peixes para comer: a guaiúba, a sapuruna preta, mariquita tudo o que você dá para eles é daqueles. Aí se você for para o mar e você pegar só cavala, em comparação, se você tirar quatro cavala [...] aí eu tenho duas, aí as pessoas que tiver na praia os mesmos peixes que você vai comer você dá a ele. Se for guaiúba, do mesmo jeito. Tudo o é uma coisa só. [...] Se você encalhar do mar e você tirar quatro cioba para você comer, você é o dono do paquete, quatro peixes para comer, dois é seu e dois é meu se aqueles dois se interessar do mesmo peixe que eu levo para meu amigo. Não tem esse negócio de dizer por que ele quem pediu um eu vou dar do mais ruim não. Do que eu levo, ele leva também. (José Valdecir Alves, grifo nosso).

!

!

Page 94: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

93

O comer naquela época era peixe, o pescador dava porque também não fazia falta dar um peixe, só não dava quem era ruim demais. Uma vez eu fui pedir um peixe a um pescador ele rasgou minha mão com esse peixe ele tomou os peixe das minhas mãos. (Anastácio).

As redes de solidariedade firmam-se através de laços de amizade,

preferência e principalmente parentesco de tal modo que as relações estabelecidas

entre pescadores podem incluir, mas também excluir, de acordo com seus

interesses:

Nos últimos tempos eu vim aqui na praia e só quem pode me dar um peixinho é meus irmãos [...] Como eu não possuo mais embarcação eles vão dizer:- O rapaz, ele não tem mais nada vamos desprezar ele! Pronto! Acabou-se! Mas se qualquer amigo meu pescando [...] se eu for pegar e ele for uma pessoa que eu considero, porque cada um tem os seus, tem umas pessoas que você gosta mais dos outros. Até para um irmão seu tem quatro, cinco irmãos você:- Rapaz eu gosto mais daquele! É que nem aqui na praia. Você tem aquelas pessoas. Se eu tocar cinco peixes e um pescador amigo meu tiver ali na praia:- Tá aí: Leve cinco! Como esse [...] que passou aqui neste instante. Se eu levar dois peixes eu dou um a ele. (José Valdecir Alves, grifo nosso).

No meu dia de casamento civil com ele veio amanhecer carregado de pargo, eu levei cada pargo deste tamanho pro juiz de lá que fez nosso casamento. (Guida, 70 anos).

Não obstante, foram lembrados momentos no passado onde o quinhão havia

sido instituído durante a construção da igreja e posteriormente do cemitério da

localidade, requerendo a participação de todos os pescadores. A doação também é

movida pela caridade e pelas crenças e práticas cristãs:

Se você pescar numa embarcação sua e você quiser levar o peixe melhor que você tiver você leva, você dá um peixe a um amigo seu, não faz menos. Às vezes você tira oito, nove peixes para dar a uma pessoa que está lá. Deus é que lhe dá! (Jose Valdecir Alves).

!

Eu pedia na praia que arrumava que rogava quando era de tarde cheio desse urú, que é aquele que bota nas costas. Ia na praia e enchia de cabeça de isca, o pescador fazia as isca, eu pedia eles me levava. Ia pra Cascavel pedindo mais minha mãe, todo mundo dava. (Maria Catita).

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PRANCHA 8

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95

PRANCHA 9

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96

2.3.2 A feira

A feira, também chamada de leilão, é o momento do desembarque de

pescado quando é comercializada a produção.

O ritual da feira segue usualmente procedimentos definidos: Ao final do

encalhe e posicionamento das jangadas são retirados os mantimentos e

equipamentos de pesca. A seguir é aberta a caixa de peixe. Retirar os peixes de

dentro da caixa de isopor cabe ao mestre e ao proeiro. Posicionados em lados

opostos da caixa térmica ambos vão separando-os em rumas, dispostas no chão e

no convés da embarcação, de acordo com a produção de cada pescador.

O leilão, descrito por Kobayashi (2000), é um momento bastante atribulado.

Pescadores, marchantes e compradores diversos, aposentados, turistas, banhistas,

botadores, carregadores, crianças, adultos, curiosos, mulheres e homens juntam-se

em um local comum para verificar o resultado da pescaria.

Cada pescador negocia abertamente sua produção e os peixes são

comercializados individualmente ou nos montes, designados preferencialmente de

rumas. O peso é mensurado com apurada precisão de ambos, pescador e

comprador, no sistema denominado oio (olho), ou seja, calculado da observação

empírica de tamanho e peso.

Apesar das incontáveis solicitações, as negociações têm início, na maioria

das vezes, somente após o fim da separarão dos peixes. Nas negociações com o

marchante, o pescador inicia a barganha cotando o pescado em torno de 30% acima

do preço de mercado. Pela astúcia do marchante, o valor proposto pode reduzir-se a

um terço do valor inicial solicitado.

O marchante tem prioridade na ordem de venda e a negociação é bastante

rápida. Quando diversas jangadas estaso em leilão, os marchantes transitam entre

as mesmas comprando e incumbindo os carregadores do transporte do produto

adquirido até o barracão.

Dificilmente há acordo satisfatório entre pescador e marchante sendo que o

primeiro geralmente sente-se prejudicado. O pagamento é feito em espécie

(dinheiro) no momento do arremate. Caso a negociação pareça excessivamente

desvantajosa ao pescador recorre-se então à verificação através da medição em

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97

balança no barracão para que nenhuma das partes saia perdendo e a negociação

seja equilibrada.

Enquanto os peixes de primeira, que têm venda garantida, são negociados

por peça e vão direto para o barracão, as rumas, compostas por peixes de segunda

e terceira, variam muito em quantidade e valor de negociação. Foram observadas

inúmeras composições de rumas com preços e tamanhos diversos não sendo

possível estabelecer uma relação direta entre quantidade e valor.

Depois da venda de maior parte da produção é que os pescadores decidem a

quem vão doar uma parte de seus peixes. Homens, mulheres e idosos sempre estão

à espera. Os peixes comumente oferecidos são aqueles de terceira com baixo ou

nenhum valor comercial. Com os pescadores mais velhos, aposentados da

atividade, foi observada certa etiqueta que consiste em deixá-los “escolher” alguns

peixes da ruma. Outras vezes ainda, peixes foram oferecidos pelo próprio pescador

que separa as rumas.

Os peixes dados ou vendidos são usualmente eviscerados na praia e com

grande freqüência em cima dos rolos e na proa das embarcações ao redor.

As rumas de peixe, especificamente as que ficam no convés, em cima da

tampa do quartel, guardados na caixa de gelo, atrás dos espeques e ainda dentro da

maumita 29 são os peixes que os pescadores tiram para sua alimentação.

29 Equivalente à marmita, tem duplo sentido podendo referir-se à panela de alumínio onde é preparado o alimento ou ao alimento preparado nas refeições no mar.

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PRANCHA 10

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PRANCHA 11

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PRANCHA 13

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102

CAPÍTULO 3. A CIÊNCIA DOS PESCADORES DA CAPONGA: SABERES DE

PESCA

3.1 A “navegação”

O motor é a vela e o combustível é o vento. (Seu Wilson).

Atribui-se à Câmara Cascudo a autoria da principal obra etnográfica da

“instituição” jangada no Brasil.

Em ensaio escrito na década de 1950, intitulado Jangadas – Uma pesquisa

etnográfica o autor discorre não somente sobre aspectos históricos falando da

origem na Ásia à chegada ao Brasil, trazida pelos portugueses e/ou da

simultaneidade tecnológica da piperi ou igarapeba amazônicas, mas dos diversos

aspectos evolutivos, da modificação na morfologia e na estrutura, nos materiais, os

equipamentos, as pescarias (CASCUDO, 2002). Fala também do pescador

nordestino, seu sofrimento, sua lida, inclui uma breve antologia de significados e

poesia justificando a menção de obra completa.

Instrumento de idílio, a jangada continua a ser a embarcação de pesca

simples mais utilizada no litoral cearense. O melhor e mais detalhado estudo cabe à

Nearco Barroso Guedes de Araújo em seu original Jangadas (ARAÚJO, 1995).

Segundo Klink (2006), o livro é obra preciosa, ao passo que analisa formas, estuda

eficiência e performance hidrodinâmica da jangada cearense30.

Versando Dorival Caymmi que diz que “o pescador tem dois amor, um bem na

terra, um bem no mar” 31, acrescenta-se que há ainda o bem entre mundos que é a

sua jangada. Aquela que o leva de terra para o mar e de volta o traz do mar à terra.

Diz-se de modo especial para o Capongueiro, tendo em vista o modo como batiza,

reverencia, mantém, zela, protege e usa sua jangada.

Na Caponga, o termo “navegação” apresenta duplo sentido podendo fazer

referência, com menor uso, à arte de conduzir uma embarcação entre pontos: “Mas

esses outros peixes e todas as navegação trás da terra todos esses eu conheço”.

Mas principalmente, e com maior ênfase, a “navegação” é sinônimo da embarcação

30 A genialidade da jangada é tamanha a ponto de ser utilizada pelo próprio navegador como modelo de construção para sua embarcação, o Paratii 2. 31 O bem do mar. Dorival Caymmi. Álbum “Canções Praieiras”. Odeon. 1954.

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103

utilizada nas operações de pesca: “Pescar numa navegação de piúba, era como

pescar num paquete deste aqui, numa jangada dessa”. Portanto, o uso do termo

navegação quando empregado com o sentido êmico, ou seja, com o sentido adotado

pelos pescadores da Caponga, terá a fonte destacada em itálico.

Das 110 navegações registradas mediante censo fotográfico, 48% possuem

nomes próprios de pessoas. Dessas, apenas 37% são nomes femininos,

desconsiderando uma possível relação entre seu emprego e a “boa sorte” na pesca,

verificado previamente pela autora em localidades da região Sul do país

(BORGONIA; WAHRLICH, 2003) 32.

As referências religiosas a santos católicos, em sua maioria personagens

bíblicos, apologias e entidades pagãs estão presentes em 29% das navegações (ex:

Deus me Proteja; Rainha do Mar; São Francisco, etc.) fato que remete à forte

religiosidade dos pescadores. Em menor número estão referências a animais,

personalidades ou fatos históricos, planetas ou fenômenos astronômicos, lugares e

expressões (23%).

Os Capongueiros utilizam três tipos de navegações denominadas jangadas

(FIGURA 15), paquetes (FIGURA 16) e paquetes menores conhecidos por botinhos

(FIGURA 17).

Não foram registradas na localidade quaisquer navegações de propulsão a

motor. Os paquetes constituíram 51% do total levantado, seguidos pelas jangadas

com 43,1% e por fim os botinhos com 5,9%.

32 Em alguns locais no Estado de Santa Catarina, o batismo de uma embarcação e uso de objetos femininos é tido como sinônimo de boa sorte e repelente de mau agouro.

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FIGU

FIGU

FIGU

URA 15 - Jan

URA 16- Paq

URA 17 - Bot

gada. Foto:

uetes. Foto:

inho. Foto: M

Áthila A. Ber

Áthila A. Be

Maíra Borgon

rtoncini, 2007

rtoncini, 200!

nha, 2007.

7.

7.

1104

Page 106: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

105

As navegações estão divididas entre os três portos da praia (porto de Cima,

porto de Baixo e porto do Meio) sendo que 43,1% encalham no porto de Cima;

17,6% no porto do Meio, 37,3% no porto de Baixo e 2% nas localidades adjacentes

(Batoque e Balbino) ou próximas à desembocadura do Riacho Caponga. O maior

número de embarcações alocadas no porto de Cima é atribuído aos crescentes

processos erosivos que a praia da Caponga vem sofrendo. A dinâmica costeira da

praia vem sendo estudada e acompanhada com proximidade por Meireles (2006).

Atualmente a faixa de praia encontra-se artificializada pela presença de espigões (gabiões) e muros de rocha. [...] a continuidade dos processos energéticos provenientes das ondas e marés está promovendo a degradação das estruturas de controle erosivo e de equipamentos públicos. Verificou-se que os danos ambientais foram associados diretamente às atividades de pesca tradicional, como por exemplo, a supressão do porto das jangadas e inexistência de área adequada para as atividades de manuseio e conservação das embarcações. (MEIRELES, 2006, p. 22).

Durante o período das atividades de campo (maio de 2006 a dezembro de

2007) foi possível acompanhar o “desaparecimento” do porto do Meio provocado

pela intensificação dos processos erosivos. Observou-se, em marés de sizígia, a

necessidade dos pescadores em amarrar as navegações do porto de cima junto aos

arames dos gabiões ou colocá-las em cima do calçadão para que não fossem

levadas pela força das ondas, reforçando a gravidade do problema. Apesar do porto

do Meio não mais abrigar embarcações, os pescadores continuaram citando o

mesmo como local de aporte.

Nesse aspecto, a separação dos portos não apresenta apenas importância

física, mas também social implicando diretamente na divisão do grupo e na mudança

das suas relações:

A separação dos portos, aquele contato diariamente que a gente tinha hoje não existe mais. Mas não quer dizer que a gente queira mal, foi a natureza que separou, porque fez o trabalho de derrubar então não queria que tivesse todo mundo ali. Mas não tem inimizade não. Depois que o porto se separou não se sabe mais notícia de ninguém. Quem vai para um não vai para os outros. Até pela facilidade de se locomover para casa, ruim é por causa do gelo e do barracão. (Francisco Soares de Souza).

No que diz respeito à idade da frota, do total amostrado, constatou-se que a

construção da navegação mais antiga data de 1975 e da mais nova de 2007. Apesar

de haver uma navegação com mais de 30 anos na ativa, a frota pode ser

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106

considerada bastante recente, uma vez que mais da metade (55%) foi construída a

partir do ano de 2000. Todas as navegações são tipo tauba não sendo mais

reportado o uso de jangadas de piúba no local.

Quanto tempo dessa formosura?Até uns 40 anos. Aí apareceu aquela jangada de tauba.Que essa jangada que tem hoje em dia que a gente leva as coisa, aí foi outra vida. Pesquei muito tempo em jangada de tauba.Tive de me virar de jangada de tauba. A jangada de tauba que foi aparecer aqui foi um homem do Iguape que ia para o Norte buscar navegação de piúba - que é essa que tou lhe falando - aí ele viu uma jangada por lá, e trouxe por nome até “Piaba” o nome da jangada. A primeira jangada. Aí foram formando a jangada de tauba e foram acabando com essa jangada de piúba. E formando só a de tauba e essa de isopor. Duas jangadas que usa aqui agora a de tauba e de isopor. (João Lotero da Silva).

A maioria das navegações (82%) foi erguida na própria localidade.

Embarcações restantes (18%) foram produzidas nas localidades de Balbino e

Pratiús (Cascavel), Morro Branco (Beberibe), Pontal de Maceió (Fortim) e Praia do

Mucuripe (Fortaleza).

Entre uma série de critérios que diferenciam as navegações entre si, os quais

serão esmiuçados adiante, dos mais importantes refere-se ao quesito tamanho, que

corresponde ao comprimento entre as extremidades proa-popa das embarcações.

Assim, em uma escala que vai do maior ao menor tamanho, classificam-se primeiro

as jangadas, seguidas dos paquetes e por fim dos botinhos.

Para as embarcações definidas como jangada as medidas de comprimento

citadas variaram entre 24 palmos (5,28m) a 33 palmos (7,30m). Já para os

paquetes, as medidas variaram entre os 14 palmos (3,08m) e os 24 palmos. Dos

botinhos, que constituem a minoria da frota (n=3) foi estimado o comprimento de 15

palmos (3,30m).

De acordo com os dados é possível supor que o limite entre jangadas e

paquetes seja estabelecido aproximadamente entre os 24 palmos de comprimento.

Entretanto, não foi registrado limite consensual entre paquetes e botinhos, havendo

sobreposição das categorias de acordo com os critérios apresentados.

Embora as informações sobre tamanho das embarcações difiram daquelas

descritas por Kobayashi (2000), (jangadas acima de 5,9m, paquetes entre 4,5m e

5,9m e botinhos entre 3,0m e 4,0m) não se considera as variações significativas

reforçando a validade das informações fornecidas pelos entrevistados.

Page 108: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

107

As diferenças entre as navegações também estão presentes na configuração

estrutural. Apesar das três classificações - jangada, paquete e bote - apresentarem

em comum a construção em madeira, o casco chato e a ausência de quilha

(KOBAYASHI, 2000), os botinhos são empregados nas pescarias próximas da praia

e não utilizam velas sendo conduzidos apenas por uma “folha” de remo.

O casco das jangadas e paquetes de tauba, assim chamados em distinção às

antigas jangadas de paus de piúba, possui cavername exposto, o qual serve de

porão para alimentos e materiais, mas principalmente, como mencionado por

Kobayashi (op. cit.), de abrigo e dormitório aos pescadores. O casco dos botinhos e

de alguns paquetes não possui porão, sendo preenchido por isopor para auxiliar a

flutuação.

Jangadas e paquetes permitem um suplemento adicional para armazenar o

pescado chamado de caixa de peixe que consiste em um caixote de isopor revestido

de sarrafos de madeira espaçados. A caixa de peixe mede 1,0 de altura e 0,6m de

largura para as embarcações menores e 1,2m de altura por 0,8m de largura para as

maiores. É removível e fica posicionada em frente aos espeques.

Quatorze pessoas foram relacionadas aos processos de construção e reparo

de navegações na localidade, segundo os dados dos questionários. Entretanto, um

deles já é falecido e apenas três carpinteiros navais, ou carpinas como preferem

chamar os pescadores, foram confirmados reforçando a preocupação aparente entre

os pescadores - também registrada por Kobayashi (op. cit.) - com a descontinuidade

da arte.

Várias das navegações da localidade foram feitas pelas mãos de artesãos já

falecidos como previamente exemplificado. Os carpinas que continuam na ativa

estão envelhecendo e existe pouco interesse no aprendizado pelos mais jovens

(dando continuidade à profissão de construtor foi citado apenas um rapaz, sobrinho

de um dos carpinas).

O valor das embarcações foi estimado - para as jangadas – entre R$2.000,00

a R$10.000,00; para paquetes entre R$200,00 e R$3.000,00 e para botinhos entre

R$1.000,00 e R$2.000,00. Sobre a capacidade de carga, as jangadas podem

comportar uma média de 531,37 kg de pescado (valor máx. de 1000 kg); paquetes

em média 414 kg (máx. de 1000 kg) e botinhos até 283 kg de pescado.

Os cascos das navegações são construídos na maioria de madeira vinda do

Pará, como o louro ou “loro”, (Ocotea sp.) e o pitiá (Aspidosperma sp.). Em alguns

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108

casos utiliza-se a maçaranduba (Manilkara sp.) presente na região. O “loro” é

destinado à cobertura e o pitiá para a construção do cavername e das bordas do

casco.

A mastreação, que apresenta particularidades na constituição, utiliza maior

variedade de madeiras no arranjo. Os entrevistados citaram um total de 16

vernáculos que se referem às plantas utilizadas como base para a constituição da

mastreação: cajueiro (Anacardium occidentale); carrapateira-do-norte (espécie não

identificada); causador (espécie não identificada); sipaúba (Thiloa glaucocarpa)

envira/embira branca (Apeiba tibourbou); maçaranduba (Manilkara sp.); madeira-do-

norte; mangue (Conocarpus erectus); matá-matá (espécie não identificada); pau-

branco (Auxema oncocalix); pau-d’arco (Tabebuia sp.); pau-ferro (Caesalpinia

ferrea); pitiá (Aspidosperma sp.); pitombeira (Talisia esculenta); tamanqueira

(espécie não identificada) e vera-de-caçador (espécie não identificada).

Sobre a equivalência entre nomes científicos e vernaculares das plantas

citadas se faz ressalvas à sua fidedigna correspondência uma vez que são fruto de

correspondências com a literatura especializada. A identificação taxonômica das

espécies vegetais, não obstante sua importância, não pode ser realizada sendo a

coleta e identificação previstas para um momento posterior.

Das plantas citadas, pau-d’árco, envira, pitiá, matá-matá e pau-do-norte

seriam especificamente utilizadas para constituição do pau do mastro. Pitiá,

tamanqueira, carrapateira-do-norte, mangue e madeira-do-norte seriam utilizadas

para compor a tranca. Por fim, o cajueiro seria utilizado, especificamente, na

constituição da mão da tranca e do banco de velas.

A jangada33 (FIGURA 18) é uma embarcação que compreende componentes

complexos, exigindo composição assaz. Sua singularidade em relação a outras

embarcações utilizadas no litoral brasileiro é veementemente reconhecida pelos

próprios pescadores (“Para o sul esse tipo de embarcação praticamente não

existe”), pois, como destacado por Francisco Soares de Souza em entrevista: “Uma

jangada se divide em muitas peças”. Assim, de forma concisa, seguindo a ordem de

importância e classificação mencionada pelos pescadores se descreve a seguir as

principais partes de uma jangada.

33 Aqui se trata jangada como termo genérico pela configuração visual quase semelhante aos paquetes e botinhos.

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109

FIGURA 18 - Croqui de jangada com especificações dos principais elementos. Ilustração: Evanildo Lopes (ilustrador local), 2007.

Começando pela popa, a parte traseira, dois calçadores (1) - tiras de forma

cilíndrica semelhante a tornos – estão dispostos um em cada lateral e amparados,

juntamente com o banco de governo, pelas tamancas ou samancas (tiras fixadas no

chão do convés). Sua função é servir de amparo para amarrar os cabos que

estendem a vela, nos diferentes posicionamentos da mesma.

O banco de governo (2) consiste em um banco fixo de onde o mestre governa

o leme dando direcionamento à navegação. Os espeques (3) são a estrutura

composta por três tiras de madeira dispostas verticalmente transpassadas por outra

tira chamada de travessa. A segunda tira consiste na forquilha, em que a tranca fica

apoiada quando descansa. Nos espeques descansam os cabrestos (amarras)

usados como contrapeso pelos pescadores durante a navegação. Nos espeques

também são pendurados o cabo da poita e os equipamentos de pesca (anzóis,

carretilha, etc.).

A escotilha (5) dá entrada para o quartel, lugar de repouso dos pescadores,

onde estão armazenados equipamentos, alimentos e pertences pessoais. A bolina

Page 111: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

110

(6) por sua vez, está localizada entre a escotilha e o banco de vela, introduzida

apropriadamente em um calço, que direciona e sustenta a embarcação no mar.

O banco de vela (7) constitui o sustentáculo que suporta o mastro (8).

Composto por pernas, cabrestos e carlinga (peça de madeira com cinco

perfurações) que seguram o mastro em diferentes posições.

O governo ou leme é móvel e retrátil (9) e fica encaixado à cana de leme

(bastão também móvel) que o mestre conduz. Além disso, há a tranca que mantém

a vela principal aberta (10); as velas (11), principal mecanismo propulsor das

jangadas; o casco achatado (12) e na parte inferior da traseira do casco, o patião

(13), que dá suporte ao leme.

Tratando especificamente da mastreação, o mastro compõe-se por uma série

de pequenas emendas nominadas tocos, presos um ao outro por amarrações feitas

com fios de náilon, que conferem ao mesmo a arqueação necessária. As emendas

são nomeadas individualmente e o número total de tocos utilizados depende

diretamente do tamanho da vela necessária a movimentar a navegação, podendo

variar entre oito a nove.

O mastro é a sustentabilidade total de todos eles (tocos). Segura os outros. Eles se dividem em topo do mastro, segunda emenda, meio de emenda e ponta da emenda. Você não pode colocar um pau só que nunca dá certo. O primeiro toco vai de acordo com a estabilidade do mastro, segundo toco não pode ser igual ao primeiro, precisa ser mais brando, no meio da emenda deve ser mais fino que o toco. A emenda, o último pauzinho deve ser fino para dar toda a volta da vela. (Francisco Soares de Souza).

Além do mastro, a tranca (que equivale a retranca dos veleiros

convencionais), é a verga que fica apoiada no mastro formando um ângulo de 90o e

mantém, como já mencionado, a vela principal aberta. É dividida em duas partes:

tranca e mão-da-tranca, que é o gancho de encaixe entre tranca e mastro.

Sobre a composição das velas, três especialistas foram entrevistados os

quais forneceram informações, além de croquis, de modo a auxiliar o entendimento

sobre o corte, entralhe e disposição das velas.

Como mencionado anteriormente, duas velas triangulares compõe o velame

das jangadas (FIGURA 19): a vela auxiliar denominada de estai (2), e uma vela

maior com função de vela principal (1).

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111

FIGURA 19 - Croqui de jangada com especificações sobre velame e cabos de hasteamento. Ilustração: Fransquinho Paé, 2007.

O estai assemelha-se a um triangulo retângulo tendo seu funcionamento

relativamente simples, uma vez que é içado posteriormente à saída da praia, já

vencida a arrebentação, ou na volta, com a função de ajudar no direcionamento da

navegação.

Estai é o seguinte: ele é mais diferente um pouco. Ele tem acorda de cima e acorda debaixo. O estai tem três cordas em roda dela. Aqui (a vela principal) depois de cortada vai ser colocada no mastro depois coloca tranca para espichar ela. Aqui (no estais) não, só na corda.Duas braça. Aqui (aponta um lado) é uma, e aqui (aponta outro lado) dá uma e meia. Sempre tem uma menor. (Fransquinho Paé, mais de 50 anos).

As dimensões para a confecção da vela principal são definidas de acordo com

o tamanho da embarcação a que se destina. E, ainda que não tenha sido possível

estabelecer uma relação entre as proporções (comprimento versus largura) dos

Page 113: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

112

lados da vela, é possível verificar que à medida que a vela aumenta, a largura sofre

menor aumento quanto ao comprimento:

A vela, a vela é o seguinte: cada tamanho da jangada é um tipo de vela né! Que começa essa jangada de isopor, o tamanho dela é três metro, ela dá dez metro de pano, pra por numa vela, é bem facinha de fazer que é pequenininha. Agora uma jangada que tem seis metro, já é 25 metro de pano que pega, aí é seis braça da corda, com seis e meia por riba, e por baixo é só quatro. O tamanho da vela é esse. O paquetinho aqui pequeno: é três braça, por três e meia, e por baixo é só dois e meia. (João Camilo da Silva).

A vela triangular, também chamada de vela latina (CASCUDO, 2002), é

composta por um número variável de cortes de tecido grosseiro de algodão cru

justapostos, o chamado “algodãozinho” que custa em média R$ 5,00 o metro. A

durabilidade de uma vela de algodãozinho é de no máximo um ano e a escolha pela

continuidade no uso do pano de algodão, historicamente empregado na confecção

das velas (ver CASCUDO, op. cit.), em lugar da substituição do mesmo pelo tergal

(copolímero do ácido tereftálico com etilenoglicol) justifica-se da seguinte maneira:

O pano é algodãozinho né? É o que tem aqui pra nós é algodãozinho. Já usaram aqui o tregal, mas não aprovaram não. No Mucuripe foi aprovada essa vela. Por quê? Porque lá dorme no mar a jangada fica embruiada todo o tempo lá. O algodãozinho não agüenta embruiá. Tem que abrir todo dia a modo de enxugar o pano. O tregal é mais fino, e ele gosta da iágua. E o algodãozinho tem que butar pra enxugar, senão apodrece. (João Camilo da Silva).

Os panos de algodãozinho, que originalmente tem largura de 1,4m, são cortados em

alturas e unidos em três a quatro faixas longitudinais de acordo com o tamanho da

vela solicitado:

Dois pano, do jeito que ele vem na peça, primeiro estira um depois bota outra. Tem gente que pega quatro pano e tem gente que pega três, dependendo do tamanho da jangada. Com seis braça de vela pega três, tem umas que é seis e meio aí já pega quatro pano. (João Camilo da Silva).

Sendo o algodãozinho o material que confere maior resistência aos ventos

devido à maior espessura, no caso da Caponga, o processo de emenda é explicado

a seguir:

Page 114: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

113

Olha a gente para fazer uma vela, [...] corta o primeiro pano. Aí pega a outra ponta do pano. Quando aquela daí tiver em cima aí coloca aí pra baixo, pra dar certo. Aí com o outro pano. Aí corta lá em cima ele de novo, pega a outra ponta do outro pano de lá, e coloca aqui em baixo que é pra, aí quando chega o derradeiro pano a gente corta. Quando pega vai com as guia e a gente emenda um pano com o outro e vai pontiando. (Raimundo Odacir Alves).

Apesar da vela principal não ser retrátil, há também a possibilidade de

diminuir a área vélica:

Não tem a tranca né? A gente imediatamente a gente pega [...] a jangada pela aquela tranca e dá assim umas volta no punho. Pronto! (Fransquinho Paé).

A armação das velas fica por conta de três cabos (ver FIGURA 19), as

“cordas”, utilizados para coordenar a movimentação das mesmas: carregadera (3),

ligeira (4) e escota (5). O entralhe das velas chamado de palomba é feito com

cordame de náilon multifilamento encerado com cera de abelha para garantir um

melhor deslize. As extremidades das três margens da vela são nomeadas

distintamente recebendo a denominação de guina (6), mura (7) e punho (8):

A gente chama assim o punho é isso aqui. Essa parte aqui a gente chama assim o punho. Que a gente chama é o punho da vela aqui. Aqui se chama a guina, muito importante isso né, muito importante! Em cima é a guina, aqui embaixo é o punho, e essa parte aqui chama-se mura, a mura. Guina, mura e punho. (Fransquinho Paé).

As velas utilizadas para a atividade de pesca apresentam diferenças na

confecção em relação às velas utilizadas para as regatas. As últimas devem tornar a

jangada mais veloz e, consequentemente, mais competitiva:

A gente já tem aquela experiência já sabe aquelas velas que vai dar certo. A não ser que numa regata, a gente faz maior. Então numa corrida, esse paquete aqui tá pescando, com quatro braças e meia de mastro se eu for colocar ele para uma regata, eu vou botar cinco braças de mastro que eu vou disputar uma corrida né? Para pegar mais vento e mais velocidade. Aqui uma vela normal para ele pescar. Regata você sabe só um dia né?Aí fica assim mesmo. (Fransquinho Paé).

Expressando a importância que as regatas têm na vida dos pescadores,

competições realizadas em Águas Belas, Balbino ou Barra da Sucatinga, são

Page 115: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

114

momentos bastante apreciados onde os mesmos vão apresentar técnicas e

demonstrar habilidades. Nos dias que antecedem as regatas há grande

movimentação na praia para troca de velas, pintura de embarcações e treinos.

As navegações são “puxadas para cima”, ou seja, são tiradas da atividade

para reparo aproximadamente entre os meses maio a dezembro, período do verão,

em virtude da chegada dos ventos. O espaço de tempo entre cada “geral”, como é

chamado o reparo, é feito entre um e seis meses (69%); a cada 12 meses (27%) ou

mais de 24 meses (4%).

A duração da “geral” varia muito em função do tipo de conserto a ser

realizado. Reparos simples como amarrações e troca ou arranjo de pequenas peças

podem ser aplicados no mesmo dia. A pintura do casco, por exemplo, que não

requer o uso de tintas anti-incrustantes ou “envenenadas” como são chamadas no

meio pesqueiro, leva em torno de três dias para ser concluída.

A maioria dos pequenos reparos, assim como a calafetagem, é feita pelos

próprios pescadores. O calafeto, qualidade de pasta produzida com estopa

embebida em cal viva e óleo de mamona, leva em torno de sete dias para ficar

pronto e apresenta uma durabilidade de aproximadamente cinco anos. Já a reforma

completa onde há trocas e reparos estruturais mais apurados pode durar em média

30 dias.

Sobre o uso de equipamentos eletrônicos, 23% dos pescadores que

responderam aos questionários afirmaram utilizar equipamentos que auxiliem o

deslocamento da navegação. Em todos os casos o aparelho citado foi o GPS

(Global Positioning System). É interessante notar que durante seu período de campo

em 1999, Kobayashi (2000) ainda não havia registrado o uso de equipamentos

eletrônicos de posicionamento por satélite, o que caracteriza o advento do uso e a

incorporação de uma nova tecnologia no contexto da pesca local.

Quanto ao uso de equipamentos de comunicação a bordo, 100% dos

entrevistados afirmou não utilizar nenhum equipamento de comunicação com terra

ou mesmo com as outras embarcações.

Entre os principais motivos do não uso de equipamentos, a ausência de

condições financeiras para adquirir equipamentos: “Não tenho condições de

comprar”, foi a razão mais citada (58%). A falta de utilidade atribuída aos

equipamentos: “Não tem precisão, pois pesco de ir-e-vir”, apareceu na seqüência

com 21% das respostas. Falta de estrutura da embarcação para proceder com a

Page 116: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

115

instalação bem como ausência de proteção dos equipamentos a bordo: “Não tem

como usar rádio”; “Celular molha” apareceu em 10% das respostas. Falta de suporte

(tecnologia) acessível às condições dos pescadores: “Não tem rede de celular”;

“Celular não pega em alto-mar” teve 8% das respostas e, em menor

representatividade, a resignação diante da condição presente: “Não uso, mas

deveria para se garantir” com 3%.

Sobre o uso de equipamentos de proteção e segurança, 82% afirmaram que a

tripulação utiliza o equipamento básico durante as atividades de pesca. Os 12%

restantes alegaram ter equipamentos, mas não utilizá-los. Porém, mesmo com a

maioria das respostas afirmativas alguns pescadores declararam fazer uso de

equipamento apenas no início da captura ou em situações adversas como a

presença de ventos fortes e tormentas.

Dos equipamentos de segurança listados, o colete salva-vidas aparece em

primeiro lugar (65%) seguido pela bóia (27%), lampião (6%) e 2% para lanterna.

Equipamentos de proteção individual (EPI) como luvas, botas, óculos para proteção

não tiveram presença e uso reportados.

É interessante notar que ao serem questionados sobre quais recursos

garantiriam a segurança a bordo, os pescadores que não fazem uso de nenhum tipo

de equipamento disseram que se amarram nos cabrestos ou que podem nadar em

condição de perigo. Outros alegaram que não consideram a possibilidade de risco

na atividade: “Não tem perigo porque a navegação é pequena”, ou ainda atribuem à

uma força superior o poder de protegê-los no mar: “Só Deus”.

Alternativas que visam o aumento da segurança dos pescadores têm sido

testadas e implementadas no Estado do Ceará desde o ano de 2005:

O Instituto Terramar e Fórum dos pescadores apresentam os primeiros barcos tipo catamarã para pesca, construído no estaleiro escola da Prainha do Canto Verde. O catamarã com 8 metros de cumprimento [sic] leva 120 covos tipo cangalhas e é economicamente viável para pesca de lagosta, peixe, pesquisa e turismo. Com o custo de operação de 10% de um barco a motor os catamarã´s [sic] são candidato [sic] redução da frota sem uso de energias renováveis. Energia solar garante o uso de rádio, luz e tecnologia como GPS e sonda, além de garantir conforto de viagem e trabalho e segurança (TERRAMAR, s/d) 34.

34 Documento disponível no site: www.terramar.org.br/oktiva.net/anexo/32971. Acesso em 11/06/2007.

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116

A falta de meios de comunicação e do uso de equipamentos de segurança a

bordo, apesar de corriqueiros e de longos precedentes, demandam soluções pois

implicam em riscos e dificuldades adicionais à vida dos pescadores. A exemplo dos

catamarãs da Prainha do Canto Verde, novas alternativas devem ser viabilizadas

permitindo que os pescadores dêem continuidade à suas atividades de forma segura

e que possam ser mantidas dentro das suas condições de sustentabilidade.

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PRANCHA 14

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119

3.1.1 Tripulação

O universo relacional protagonizado pelos pescadores apresenta uma série

de nuanças que refletem diretamente a organização da pesca. A maioria dos

proprietários de embarcação abordados são pescadores (81%) e do total de

proprietários (pescadores e não pescadores), 74% afirmaram dispor de tripulação

fixa, contando sempre com os mesmos pescadores para constituir a equipe durante

seguidas viagens de pesca.

Os critérios utilizados para a seleção dos tripulantes geralmente se dão

através do parentesco (filhos, irmãos, sobrinhos) e da afinidade (amigos,

conhecidos). Relações de associações e parentesco também foram estudadas por

George Zarur em uma vila no sul dos Estados Unidos chamada por ele de Mullet

Springs (ZARUR, 1983) onde a pesca é dominada por pequenos núcleos familiares.

No caso da Caponga, proprietários relataram enormes dificuldades em formar

a tripulação. Quando não existem indivíduos suficientes que preencham os

requisitos (consangüinidade ou simpatia), proprietários ou mestres recrutam

pescadores disponíveis ou que solicitem embarcar. Assim, o critério de necessidade

ultrapassa tanto a preferência quanto os laços familiares.

A tripulação é composta de um a cinco pescadores, sendo mais habitual

contar com até quatro tripulantes (59%), característica das pescarias que demandam

mais de 24 horas. Já as pescarias de retorno diário costumam sair com apenas dois

tripulantes (24%). Embarcações com cinco e três tripulantes são menos freqüentes e

foram citadas em 7% e 10% dos casos, respectivamente.

Sobre esse aspecto, Kobayashi (2000) aponta a substituição das

embarcações de maior porte, - no caso jangadas - por paquetes visando superar as

dificuldades no recrutamento da tripulação. Em seu trabalho o autor também

observou a “[...] tendência gradual de substituição das embarcações maiores

(jangadas) por embarcações menores (paquetes), devido ao menor custo de

manutenção, e por exigir uma tripulação menor.” (KOBAYASHI, 2000, p. 03).

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120

3.2 Sistemas de medida

As principais unidades de medida de comprimento utilizadas pelos

pescadores da Caponga - também comuns em outros locais do litoral cearense e

brasileiro - são as braças. As braças equivalem a distância dos braços abertos em

cruz, de uma extremidade a outra das palmas das mãos e correspondem entre 1,5-

1,7 metros. Além da braça utiliza-se o palmo, medida da extremidade do dedo médio

à extremidade do dedão de uma das mãos que equivale consensual e precisamente

a 0,22 metros.

Outra medida, relatada aqui pelo seu freqüente uso na demonstração do

comprimento de peixes, lagostas e outras e medidas de pequeno porte é o cúbito.

Aparentemente não recebe tal nome, mas está sempre associada à expressão

“deste tamanho” e é mensurada pelos dedos indicadores e polegares estendidos em

“L”. Quando o tamanho do exemplo que se dá ultrapassa a medida do indicador ao

polegar, se estende ao antebraço - até o cotovelo - limitado pelo indicador do braço

oposto.

Como unidade de medida de peso os pescadores utilizam o quilo, mensurado

de forma empírica pelos sentidos. Através da visão pelo método conhecido como

oio, citado no segundo capítulo, o pescador sente o peso com as mãos ou muitas

vezes apenas observa o pescado de onde tira a estimativa de seu peso. Sobre o uso

do método é preciso comentar a eficiência espantosa da precisão sendo o erro

estimado freqüentemente baixo.

A medida usada para atribuir valor ao número de peixes é a ruma. A ruma,

como unidade de medida de quantidade, é dimensionada e calculada pelo oio e

pode variar de acordo com a composição das espécies, tamanho e valor das

mesmas.

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121

PRANCHA 16

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122

3.3 Rotina de pesca

Diariamente a lida dos Capongueiros consiste em preparar a embarcação,

sair para o mar, retornar - no mesmo dia ou nos dias que se seguem -, desembarcar

e negociar o pescado, consertar equipamentos e navegações, procurar tripulação ou

jangada que “dê um canto”, prever as condições da próxima viagem, conversar com

os companheiros, jogar dominó ao final do dia adentrando a noite, dividir as

experiências e acontecimentos com os mais velhos e no dia seguinte recomeçar.

A quaisquer olhos a rotina descrita acima parece comum nas centenas de

comunidades pesqueiras Brasil afora. Contudo, assim como na Caponga, cada

localidade compõe sistemas singulares que, influenciados pela dinâmica ambiental e

sociocultural local, permeiam o modo de vida e as relações de trabalho do pescador.

Na praia, ao longo do dia e da semana, os esforços dos pescadores se

repetem compassadamente em ritmos que se determinam e se adaptam aos

humores do tempo e aos interesses econômicos.

A manhã, marcada pelas saídas/chegadas do mar e pelo desembarque de

pescado, é o período mais agitado no dia. Durante toda a manhã é possível ver

carregadores transportando gelo e materiais; pescadores se direcionando às

embarcações que os aguardam sobre os rolos com bolsas de pertences pessoais e

sacolas contendo a quimanga, além de proprietários acompanhando todos

preparativos.

As navegações que voltarão no mesmo dia saem cedo. A movimentação na

praia começa por volta das 04h00min da manhã e caso não retornem no mesmo dia

vão para o mar geralmente entre 07h00min e 09h00min. À tarde por volta das

15h00min saem as embarcações que voltarão no início da noite.

No final do dia, ainda há pescadores na praia dedicados ao conserto ou ajuste

das jangadas e a abrir os fechar os panos das velas, para protegê-las do vento.

Alguns pescadores e ex-pescadores começam a aparecer e sentam-se nos bancos

próximos a praia. Nessa conjuntura que se dá a previsão para a próxima pescaria.

Caso o vento esteja brando, a saída para o dia seguinte é confirmada, mas se o

vento estiver puxador será feita nova aferição logo cedo no dia seguinte.

Os pescadores guardam os domingos de forma que a grande maioria não sai

para o mar. No entanto, em casos de uma pescaria ter se estendido por falta de

produção podem desembarcar e vender o pescado mesmo nesse dia.

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123

Sobre as exceções na rotina de pesca, cita-se o dia de finados em que os

pescadores de crenças mais fervorosas não saem para pescar por temer o

aparecimento de visagens:

Pois é difícil um ir pro mar no dia de finados. Aí encaiam de manhã. Vão no outro e encaiam de manhã porque diz que vêem muita visagem. Via as jangada que desapareciam, via as jangadas que antigamente os pessoal morriam. Aparecia, antigamente aparecia agora a gente não vê mais, mas meu pai cansou de ver no mar. Jangada vinha pertinho com os pescador e tudo, quando dava fé desaparecia. É tudo visagem. (Maria José Miranda Pereira, 59 anos).

Os pescadores guardam a sexta-feira que precede os festejos da Páscoa e o

dia de São Pedro, padroeiro dos pescadores. Segundo os mesmos, as datas são

comemoradas atualmente de forma modesta tendo em vista às comemorações em

épocas passadas com procissão, seguida de regatas e festejos e no caso da sexta-

feira da paixão com recato:

Pelo menos na semana santa a gente tinha a obrigação de cumprir o jejum que ninguém comia carne, hoje não. Hoje o camarada toma banho, penteia o cabelo, fazem tudo que é de ruim. Naquele tempo quando era quinta-feira maior [...] casal que vivesse junto se separava só se juntava depois que passasse a quaresma. Hoje se ajunta é mais. Não se tomava banho que minha mãe dizia que virava porco. Sexta-feira santa, não se bebia café doce, não se chupava cana, porque amargava. Tudo isso era superstição que nossos pais tinha. (Nonato Pacatuba).

Fator notável é o de ser a quinta-feira santa um dos dias que há o maior

número de encalhe de embarcações no ano e a possibilidade de haver um maior

volume de pescado desembarcado. É também o dia que uma grande quantidade de

pessoas de outras localidades vem para a Caponga em busca da chamada

“esmola”, ou seja, da doação de peixes.

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124

3.4 Sistemas de pesca

Aspectos dos sistemas de pesca já foram descritos anteriormente para a

Caponga por Kobayashi (2000) e Castro e Silva (2004). Os autores consideraram

três sistemas operados pelos pescadores na localidade: ir-e-vir, dormida e alto.

No entanto, de acordo com o discurso dos pescadores, apenas dois sistemas

de pesca são operados: ir-e-vir e dormida. Os esclarecimentos são descritos a

seguir:

A diferença do alto para dormida? Bem, é a mesma coisa. Porque para ir, pode ir para qualquer canto, não é necessário você ir para o alto-mar. E a pescaria do alto que eles falam essa é que a pescaria [...] na distância assim de cinquenta, sessenta e poucos quilômetros, lá em alto-mar mesmo. Porque para ir para lá você só vai para lá se for de dormida a não ser para o alto você vai para qualquer canto. Pode ir de rede, pode ir para os cascalhos, pescar cavala e arraia. Então, tem gente que vai de dormida para ir para cavala, mas não vai necessariamente para o alto. (Francisco Helieudo Silva).

A pescaria de ir-e-vir é ir num dia e voltar no mesmo dia tá entendendo? E de durmida é o seguinte: Vamos como hoje e encaia amanhã ou depois. É de dormida né? E de ir-e-vir nós sai hoje e encaia de tardezinha, aí a boquinha da noite, assim é de ir-e-vir né? Pro alto. Nós voltava as vez de madrugada, as vez a primeira cantada do galo, já tava na praia arrumando a jangada pra botar pro mar de ir-e-vir pro alto. Negócio de três hora da madrugada, era quato hora, quando o dia amanhecia nós já tava alto longe.Às vezes quando o sol já tinha saído já tinha sumido de terra por traz isso tudo aqui (Raimundo Miciú).

Tem que pescar de noite, se não pescar de noite não pega nada, é cansada a pescaria de dormida. Tão pescando agora, tão passando de cinco dia no mar, é sofrida.[...] É uma pescaria cansativa de dormida no alto.Agora de ir-e-vir não, é uma pescaria que hoje mesmo vai e hoje mesmo chega. Tem pescador que não gosta da pescaria de ir-e-vir, gosta de dormida, que passa até de cinco dia. Quatro dia, três dia até cinco dia. É assim. (Francisco Miranda Pereira).

A partir das minuciosas explicações fornecidas, consideram-se dois os

sistemas de pesca operados pelos pescadores da Caponga. Considera-se também

que o sistema de dormida permita várias possibilidades: a pescaria para o alto e a

pescaria para outras finalidades, podendo ser a menores profundidades e distâncias

que a anterior.

Para efeito de descrição, a pescaria de dormida diferencia-se da pescaria de

ir-e-vir basicamente pelo tempo de duração, distância da costa, período do dia em

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125

que é realizada, localização dos pesqueiros (chamados de “pescarias”), pelos

sistemas de marcação, variação das espécies-alvo e pelos equipamentos utilizados.

3.4.1 Dormida

No sistema de dormida a pescaria (viagem + captura) dura o período igual ou

superior a um dia completo (24 horas) podendo chegar facilmente aos cinco dias

(120 horas) quando se dirigem ao “alto”. A captura é realizada preferencialmente no

período noturno quando o peixe “sai para comer”. Podem ocorrer em menores

distâncias e profundidades, nos cascalhos (fundos com presença de algas Halimeda

sp.), areia e nas riscas (recifes), entre 12 a 20 braças de profundidade: “Tem canto

que é só areia, outro é cascalho e outro é só pedra que são os recifes de corais”.

Pode acontecer também nos altos, como mencionado, há distâncias de 60 km ou

120 braças de profundidade, até a chamada borda do barranco, ou seja, na divisa

entre a Plataforma Continental e o Talude Oceânico onde ocorrem os aumentos

bruscos de profundidade.

As saídas acontecem mais freqüentemente nas quartas-feiras com retornos

às sextas ou sábados, que são considerados os melhores dias para venda da

produção por causa da chegada do final de semana.

A pesca de dormida é direcionada especificamente para a captura de peixes,

podendo fazer o uso de isca-viva armazenada em galões de plástico vazados. Em

virtude da imprevisibilidade do tempo, como forma de precaução, são levados para

as pescarias de dormida dois tipos de âncoras: o tuaçu e a fateixa.

3.4.2 Ir-e-vir

No sistema de ir-e-vir, as pescarias duram cerca de três a oito horas e são

localizadas relativamente próximas à costa, até entre 12 a 15 braças, não sendo

freqüente a pesca em maiores profundidades e como referencial de orientação os

pescadores utilizam pontos em terra:

Agora, essas aqui, é tudo de ir-e-vir, tudo de ir-e-vir. A gente vai de manhã negócio de quatro hora, negócio de dez, onze do dia, às vezes acontece de passar mais, a gente já vai pra passar em duas ou três pescarias se não dá nada a gente vem simbóra. E acontece de você ir só numa e você passa até

Page 127: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

126

três horas pescando, como eu tenho uma que eu fiz agora que a gente pesca mais nela porque ela é boa de peixe. Toda a vez que a gente vai, ela é uma pescaria mais nova, a gente arruma o dinheiro do feijão (risos). (João Jairo Pessoa Silva)

Voltadas para a captura de peixes e também de lagostas, as pescarias de ir-

e-vir utilizam uma maior diversidade de artes ou apetrechos de pesca. Com a

navegação operando à deriva, apenas a garatéia é utilizada como âncora e os

pescadores saem para a captura geralmente de uma a três vezes na semana.

3.5 Artes de pesca

As artes de pesca presentes na praia e mais freqüentemente citadas pelos

pescadores foram a pesca de manzuá ou gaiolinha para lagosta (39%) e a pesca de

linha para peixes (39%). A seguir vêm o uso da rede de caçoeira para peixes (8%), a

tarrafa (6%) e a pesca com redes para sardinha (rengaio). Outras capturas menos

expressivas foram citadas, como o arrasto para camarões, a pesca de siri além de

moluscos.

Os pescadores em sua maioria dominam mais de uma arte de pesca, no

caso, 65% praticam a pesca da lagosta com manzuá e a pesca de peixes diversos

com linha, seguidos daqueles que pescam com manzuá, linha e caçoeira para

peixes (11%). Em menor quantidade estão os pescadores de “rengaio” (3%), sendo

que o restante domina apenas uma das artes de pesca.

3.6. Capturas

3.6.1 Captura de peixes

Na captura de peixes, as posições de pesca são distribuídas de acordo com a

hierarquia da divisão das ocupações, baseadas na experiência e nas

potencialidades de cada pescador. Assim, na pesca realizada na Caponga, são

reportadas cinco funções específicas que se manifestam nas tarefas realizadas

durante a faina de pesca para peixes e na divisão da produção do pescado: mestre,

proeiro, rebique, bico de proa e pescador de cinco.

Page 128: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

127

Sobre o estabelecimento das funções exercidas por cada um dos tripulantes,

ao mestre cabe governar a embarcação e tomar as principais decisões sobre o

andamento da viagem e da pescaria. O proeiro embrulha o pano da vela, retira o

mastro, o posiciona justaposto à tranca na hora da captura, quebra o gelo e

acondiciona o peixe na caixa de gelo. O rebique mantém a jangada na praia

enquanto os botadores não chegam, puxa a ancora na proa e cozinha. O bico de

proa molha a vela no retorno ao porto. O pescador de cinco, por sua vez, não realiza

atividades além da captura.

A pesca sempre é realizada com a proa voltada para onde o Sol nasce

(Leste) e a popa para onde o Sol de põe (Oeste). Na faina de pesca o mestre,

proeiro e rebique se posicionam à bombordo. O mestre fica entre os espeques e o

banco de vela (1), o proeiro entre o quartel e os espeques (2) e o rebique entre o

banco de vela e o quartel (3). O bico de proa (4) e o pescador de cinco (5) pescam a

boreste, o chamado lado de terra sendo o primeiro entre o banco de vela e o quartel

e o segundo entre os espeques e o banco de governo (FIGURA 20).

Cada qual tem o seu canto. Tem um que pesca ali entre o quartel, não tem um quartelzinho? Entre o quartel e o banco e o outro fica pra cá, do quartel praquela caixa que tem, aquela caixa, e o mestre fica ali entre o espeque e o outro banco e o outro pescador pro lado de terra pesca aqui também entre o banco e o espeque. Agora entre o banco e o quartel é o rebique, e entre o quartel e o espeque é o proeiro e depois do proeiro é o mestre que é entre o espeque e o outro banco. E o pescador pra outra banda pro lado de terra. (João Jairo Pessoa da Silva).

FIGURA 20 - Esboço jangada com as distintas posições para a pesca de peixes.

O pescador de cinco é uma posição pouco freqüente nas pescarias, por ser

menos favorável à pesca: “O pescador de cinco, pesca do lado do mestre voltado

Page 129: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

128

para terra, em um local menos privilegiado, não é canto de boa pescaria”. Assim se

estabelecem as divisões na pesca com base nas habilidades do pescador definidas

pela relevância e número das funções exercidas:

As melhores posições de pesca é o canto de mestre. E a pior é o que pesca de rebique. Porque todo mar só pega na cara (risos). Maior experiência quem tem é o mestre e menos experiência... Rapaz, aqui é pouco quem não tem experiência, mas é o que pesca por canto de terra! O mais ruim é o que tem por lado de terra. Rebola lá por lado de terra que é pra não enganchar com as linhas da gente. Pra não estragar a pescaria! (João Jairo Pessoa da Silva).

No mar, logo após a captura, os peixes são identificados individualmente

através de pequenos cortes nas aletas da nadadeira caudal e na cabeça. O sistema

de identificação por cortes foi reportado por Cascudo entre as décadas de 1930-

1950 acredita-se que seja anterior ao seu registro (ver CASCUDO, 2002). A

estratégia permite a identificação da produção individual dos pescadores em terra,

no momento do desembarque: “Cada qual tem sua posição, marca seu peixe e

quando chega em terra sabe dividir seu peixe”.

O sistema de identificação utilizado pelos pescadores da praia da Caponga

também acontece de acordo com a relevância das posições, e por sua vez, das

funções exercidas pelos tripulantes de uma embarcação de pesca, apontado

anteriormente. O mestre, autoridade maior a bordo, é o único tripulante a não

desferir marcas nos peixes capturados, cabendo a ele o privilégio de trazer os

peixes inteiros. Como dito por Seu Raimundo Miciú: O mestre não marca, é oriudo 35. O proeiro, segundo na escala de importância, corta a aleta superior, a “aba de

cima do rabo” (FIGURA 21), seqüencialmente, o rebique corta a aleta inferior, a

chamada “aba de baixo” (FIGURA 22).

As funções de menor relevância são destinadas aos tripulantes que pescam

do lado de terra. O bico de proa é quem corta as duas aletas, os “dois rabos” ou

“abas” (FIGURA 23) e, finalmente, pescador de cinco marca a parte superior da

cabeça (FIGURAS 24a, 24b). A analogia entre as funções exercidas pelos

pescadores e a determinação dos cortes fica clara diante deste relato:

Pois é, marca o peixe. Com a faca. Pega a faca e marca o rabo. Quando chega aqui no seco que a gente vai separando. O de cima é do proeiro, o

35 Referindo-se a “grandes orelhas”, ou seja, com maior autoridade que os demais.

Page 130: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

129

de baixo é do rebique, a cabeça é quem pesca na popa, e o mestre e o rabo é limpo. Marca na cabeça esse que pesca que perto do mestre, e o proeiro é que marca que o rabo e o rebique marca o de baixo. Se tivessem com cinco pescadores cortava nos dois rabos. É o bico de proa que chamam. (José Valdecir Alves).

FIGURA 21 – Corte da aleta superior atribuído ao proeiro (2).

FIGURA 22 – Corte da aleta inferior atribuído ao rebique (3).

Figura 23 – Corte das duas aletas atribuído ao bico de proa (4).

Para o pescador de cinco especificamente, foram observados dois tipos de

corte, um em forma de “V”e outro em forma de “U”, sendo o último mais utilizado.

Page 131: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

130

FIGURA 24a – Corte em forma de “V” atribuído aopescador de cinco (5).

FIGURA 24b – Corte em forma de “U” atribuído aopescador de cinco (5).

Única exceção à regra de manter o peixe inteiro praticada pelo mestre é o uso

da chamada “linha junta” como estratégia de captura. Na linha junta dois pescadores

que dividem a linha também não marcam os peixes:

É de linha junta. Aí, o que tá marcado é de um dono [...] Tipo assim ó: ele tem dois rabo, né? Porque o peixe ele tem dois rabo. Aí no rabo de baixo, a senhora já marca no rabo de riba, aí o cara já tá sabendo que o meu é no rabo de baixo e o seu é no rabo de riba. Aí bota o seu pra sua banda e o meu pra minha banda. E os dois que a senhora não tem corte de rabo eles dois tão eles dois junto. Eles dois eles pescaram aí junto.Que não marca o peixe. Se pescar eu e a senhora aí eu não vou mandar a senhora marcar, aí bota dentro daquela vasilha tudo junto, aí nós temos de linha junta aí chama de linha junta. (João Jairo Pessoa da Silva).

Page 132: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

131

Na caracterização da pesca para o litoral do Ceará, Castro e Silva (2004)

descreveu uma relação inversa quanto às localizações dos cortes das posições dos

pescadores de rebique e pico de proa aqui apresentadas. Segundo a autora, caberia

ao primeiro cortar as duas aletas da nadadeira caudal e ao segundo a apenas a

aleta inferior. Outra diferença apresentada diz respeito ao pescador de cinco, o qual

desferiria a sua marca na parte inferior da cabeça do peixe, próximo às nadadeiras

peitorais.

Tendo em vista as diferenças apontadas, é suposto que o sistema de

identificação não seja idêntico a todos os grupos pesqueiros do litoral do Ceará,

havendo pequenas variações ou adaptações como a realizada pelos pescadores da

praia da Caponga.

3.6.1.1 Captura de peixes com linha

A diversidade de técnicas de captura com linha empregada pelos pescadores

da Caponga foi reportada por Kobayashi (2000). De acordo com o autor, a mesma

apresenta quatro variações. A linha de ponta (náilon 150 a 200) utiliza apenas um

anzol grande na ponta; a linha de corso é similar a linha de ponta mas não utiliza

chumbada; gué (náilon 100) que utiliza dois anzóis e a vassourinha ou espinhel:

(náilon 60) com 3 a 6 anzóis que emprega ráfia desfiada com efeito atrator.

A ampla variedade empregada quanto à numeração e tamanho de anzóis

também foi reportada no presente trabalho sendo possível confirmá-la através do

relato a seguir:

Nós tem todo tipo de anzol: o número um, o número dois, o número três. O anzol número um é bem grande, o número dois é mais menor que o número um. Agora vem o número três: já mais menor. O número quatro: já mais menor. Vem número cinco: já mais menor. Número oito: já mais menor. Vem número nove: já mais menor. Vem o número dez: já mais menor. Aí vem o doze, treze, quatorze, quinze, dezesseis, dezessete, dezoito e vem o vinte, o mais miudinho de tudinho. (Raimundo Miciú).

Na pesca de linha, os pescadores determinam as espécies-alvo capturadas

em função do tamanho do anzol através de uma relação inversa onde o aumento do

tamanho do peixe capturado implica na diminuição da numeração do mesmo.

Page 133: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

132

O mais miudinho é pra pegar agúia, pra pegar isca, pra pegar sapuruninha, pra gente fazer isca essezinho assim bem miudinho. Aí o número nove é pra pegar guaiúba, cangulo, esses peixe assim e o número cinco pra pegar cavala, dentão, cioba, esses peixe assim. Já o maior pra pegar sirigado esses peixe. (Raimundo Miciú).

A vinte nove braças usa anzol sete a dez. As chumbadas menores cem, cinqüenta gramas, mede dez braça de linha e bota para pegar: cavala sirigado, dentão, cioba pega com anzol número três. (Nonato Pacatuba).

A técnica de captura utilizada pelos pescadores da Caponga procede da

seguinte forma:

O peixe pesca de anzol. A gente pesca com um anzol, pesca com dois, pesca com três, pesca com seis. Os seis anzol é aquele que é para a sardinha. Agora pescar de linha mesmo, pesca mais com dois. A gente segura na mão, segura aí tem uma carreta grande assim que quando a gente não quer mais pescar a gente enrola e quando a gente tá pescando a gente tá puxando ela até o nível da embarcação. Quando a gente termina de pescar, que às vezes não quer mais pescar e que gente quer dormir tem vez que a gente não pode pescar à noite todinha, aí enrola num pau daqueles e guarda ou numa carreta. Aí quando for pescar tira ela de novo. (José Valdecir Alves).

!

Como visto acima, peixes pequenos, entre eles a sardinha e o olhão, são

capturados com maior quantidade de anzóis. Os peixes maiores, que por sua vez

são exclusivamente capturados com linha, são fisgados através de duas linhas

separadas sendo uma delas amarrada na perna do pescador, o chamado chicute, e

outra em um carretel manejado pelas suas mãos.

3.6.1.2 Captura de peixes com rede

Apesar de não ser a principal arte de pesca, o uso de redes é bem difundido

no âmbito da pesca na Caponga dividindo-se em duas modalidades distintas. A

pesca de rengaio ou rengalho, por sua vez, é destinada a capturar exclusivamente

sardinhas tendo sido implementada recentemente (aproximadamente três anos). Já

a pesca de meia água com caçoeira é destinada para outras espécies pelágicas e

também para espécies de fundo: “Muito deles aqui tem rede. Aí tem época que eles

vão de rede. Aí eles pegam bastante garajuba [...] as garajuba-amarela, garajuba-

preta, pega o serra, o bague”.

A rede de caçoeira pode ser utilizada tanto para a captura de lagostas como

para peixes. Apesar da proibição do uso da mesma para fins de pesca de lagosta

Page 134: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

133

com a IN IBAMA 138/06 36, não foi possível avaliar substancialmente o abandono ou

a continuidade no emprego das redes para tal recurso. Sabe-se que a pesca

praticada com o uso da nominada “maldita”, divide as opiniões dos próprios

pescadores e sofre sérias represálias pelos danos que causa:

Quando arreia a rede no cascalho, tem corais que levam décadas para tingir o tamanho normal, tem os que crescem um centímetro por ano! Que são destruídos porque se a caçoeira passar por cima do coral destrói tudo, porque quando se vai puxar a caçoeira se pega um pau para quebrar aquilo tudo, soltá-la o que acaba com a morada da lagosta. Vai levar outras décadas para construir aquilo de novo. (Francisco Helieudo Silva).

De certa forma, a pesca de caçoeira para captura de peixes diversos se

assemelha com a pesca de rengaio diferindo no tamanho da malha utilizada que

para o rengaio é cinco (#5) e para a caçoeira é nove (#9).

Na pesca de caçoeira, à meia água, são utilizados 10 panos de 100 metros

cada um (1.000m), que entralhados reduzem à aproximadamente 30 metros cada,

podendo uma rede completa com entralhe atingir 500-700 metros. Segundo os

pescadores, apesar de entralhados juntos, os panos permanecem separados e são

unidos apenas para a pescaria: “Mas separa, só que quando vai pescar a gente

amarra uma na outra. Que é pra fazer um estirão grande. Um estirão”. Para altura da

rede são utilizadas aproximadamente 28 malhas com aproximadamente 0,05m cada

chegando a atingi 1,5 metros. Cada pano ainda recebe três quilos de chumbo e 40

bóias para flutuação.

Empregada principalmente na pesca de ir-e-vir, a captura com o uso de

caçoeira procede da seguinte forma:

A gente arreia ela por volta de cinco hora, quanto é negócio de sete hora da noite a gente puxa um lanço. Aí arreia de novo, arreia nove hora aí recolhe de manhã, no amanhecer do dia. Mais pra perto de quinze braça mais pra perto a gente pega. A gente usa muito de ir-e-vir, mas os inverno foram fracassando mais os peixes foram se afastando mais aí a gente inventou de caçar de dormida que daí dava melhor que de ir-e-vir, dava melhor. (João Jairo Pessoa Silva).

36 A entrada em vigor da proibição do uso da rede de caçoeira foi postergada seis vezes de 2003 a 2007. Atualmente está em vigor a Instrução Normativa do IBAMA nº 138/06, que proibiu a partir de 1º de janeiro de 2007, a captura de lagostas das espécies Panulirus argus (lagosta vermelha) e P. laevicauda (lagosta verde), com o emprego de redes de espera do tipo caçoeira, mergulho e marambaias.

Page 135: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

134

A pesca de rengaio ocorre diariamente ao anoitecer, exceto aos domingos. As

navegações que participam da captura da sardinha são exclusivamente paquetes e

encalham no porto de Cima. Os pescadores saem para a captura aproximadamente

às 15h30min e retornam às 19h30min, para realizar a venda direta da produção na

praia (FIGURA 25). Levam aproximadamente 01h30min para chegar ao pesqueiro e

00h45min para retornar ao porto. Para a pesca da sardinha são utilizados em média

800m de rede (10 panos de 100 metros cada), corda de entralhe 160Ø, dois quilos

de chumbo cada pano (uma a cada 15 cm), utilizadas 800 bóias e tamanho de

malha cinco (#5).

A metodologia de pesca foi descrita por um dos pioneiros da modalidade na

Caponga:

Joga a garatéia e vai soltando o galão (flutuador). Um vai zingando e outro vai soltando a favor da maré, contra o vento todo o tempo. Captura a sardinha na hora que ela sobre. De dia ela fica comendo, brincando, fazendo festa em riba da água. Pesca a cinco braça de fundura, tem época que ela tá a oito braça. No inverno ela vem mais pra perto. Sardinha é viajante e tem duas qualidade, sardinha cascuda e sardinha verdadeira. Também vem junto a palombeta, serra, garajuba, macaço, pescada, espada, bagre branco (bagre mole), judeu, barbudo, salema e o coró. (José Lopes dos Santos, Acarajé, 50 anos).

A captura com redes de rengaio, apesar de ser direcionada para as

sardinhas, também captura outras espécies como as apontadas pelo colaborador. A

fauna acompanhante (by-catch) apresenta em geral valor inferior e não é escoada

completamente, tendo por fim o consumo pelos pescadores ou a utilização como

isca.

FIGURA 25 - Esboço jangada com as distintas posições para a pesca de peixes com rede.

Page 136: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

135

Quando aportam na praia os pescadores rapidamente dividem-se em

pequenos grupos para fazer a venda das sardinhas. Durante a despesca um dos

pescadores fica encarregado da venda e três de retirar os peixes e colocar a rede de

volta na sacola (saco de ráfia de grandes proporções). No dia seguinte, os

pescadores de sardinha logo pela manhã cedo se reúnem em pequenos grupos para

lavar e consertar as redes ao largo do porto de Cima.

As sardinhas (Opisthonema oglinum) são capturadas exclusivamente no

período que se estende entre julho e fevereiro, pois de acordo com os pescadores,

nos quatro meses seguintes – que correspondem à época das chuvas - não há

produção.

Page 137: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

PRANCHA 17

1136

Page 138: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

137

3.6.1.3 Captura de peixes com tarrafa

A pesca de tarrafa é realizada, em sua maioria, por pescadores aposentados,

amadores e jovens. Os lances são dados ao longo de toda a praia, porém há maior

concentração de pescadores nos beachrocks da ponta leste da praia. A pesca com

tarrafa é realizada nos horários da maré enchente, diariamente, e o produto da

captura é destinado basicamente à subsistência: “Não a gente pega pra gente

mesmo, as vez quando dá pra vender eu vendo. É difícil vender eu levo mais pra

casa”. A prática ocorre tanto no período de verão quanto no inverno com algumas

variações, devido a entrada dos fortes ventos, como descrito a seguir:

Pega sauna, às vez tainha. Ãs vez todos os anos ela dá. Todos os anos nessa época é o mês delas passar. No verão é mais pouco. Agora quem pegou a força do vento bravo: agosto, setembro, outubro, no mês de outubro ele vai dando mais uma entradazinha, e agora nós tamo no mês de outubro, pra dezembro. Essa época de dezembro janeiro, fevereiro, até abril dá mais peixinho, quando a água fica assim clara dá mais mior. (Eudes Miranda da Silva).

O pescador de tarrafa pode ser facilmente reconhecido, pois onde quer que

vá carrega consigo o urú, um cesto confeccionado com cipós levado a tiracolo para

armazenar os peixes:

O urú é pra modo de botar os peixes. Pra não tá fazendo buraco no chão pra tar botando os peixes, a gente chama samburá, urú, aqui quando e gente pegar uns peixe a gente bota ele dentro. Porque o peixe a gente caça ele na costa aí pra baixo, e tem que tem um coisinho pra botar ele dentro. (Eudes Miranda da Silva).

3.6.1.4 Captura de peixes com viveiros

!

Considerada uma prática antiga, empregada na captura de lagostas na

década de 1950, a utilização de viveiros é pouco recorrente nos dias atuais. O

viveiro é constituído com armação de madeira revestida por arames que se

assemelha ao manzuá, porém maior em tamanho, e é exclusivamente destinada à

captura de peixes. Dentre todos os colaboradores entrevistados na pesquisa, o

pescador José Valdecir Alves foi o único a referir-se à pesca com o uso de viveiros:

Page 139: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

138

E não existe mais não, tem mais é só para peixe. Tem aqui na Caponga, nesse mês passado nós cortamos um, era 4 kg de arame, é pouca gente que usa e se viveiro porque a gente coloca só para pegar o peixe. Parum, garajuba, ariacó, só esse peixe que a gente pega mais, ariacó, garajuba e o parum. No viveiro. Coloca agora em cima das pescarias como lhe falei agora [...] eu e meu irmão aí nós voltamos lá e, umas quatro viagens nós pegamos lá um bocado de peixe.

O desuso do viveiro atribuído pela “cisma do peixe” – característica atribuída

aos peixes quando deixam de ser capturados -, a pouca durabilidade e a falta de

praticidade são justificados pelo mesmo:

Aí o peixe foi cismando a nós tiramos ele para outro canto. Agora eles acabou-se. Ninguém está com ele mais no mar não. Esse viveiro ele dura uns três meses quatro meses na água. Não há na água mais não, aí nós já cortemos nós tiremos. Aí como os tempos uns quatro meses ela vai se furando por que é de arame né? Aí ele se acaba, fica só a armação. É pouca gente que usa mais.

Durante o período de campo não foram observados construção, captura, nem

mesmo outras menções ao viveiro, podendo ser indício do abandono da prática.

3.6.2 Captura de lagosto ou lagostim

A atvidade mais rentável economicamente na Caponga é a pesca de

lagostas. Às lagostas, consensualmente, e com grande freqüência os pescadores

atribuem o gênero masculino chamando-as de lagosto ou ainda de lagostim.

A pescaria do lagosto é uma pesca que eu pelo menos eu acho muito bom de pescar ela. É uma pescaria que a gente quando o lagosto tá com vontade de se levantar pra comer, você tando com o material dentro d’água dá muito bem pra você sobreviver. Por o menos, no meu caso como muito me conhece aqui, e eles acham que eu sou um cara que agüenta bem a pescaria, porque eu me dou de bem com ela né, ela é muito boa. José Mauro Alves, Zé Mauro, 58 anos).

Na pesca do lagosto, tendo avistado a pescaria, que é marcada por uma

pequena bóia de isopor ou garrafa pet, recolhe-se a tranca para os espeques e

manobra-se a embarcação a favor do vento. Com a embarcação à deriva, fisga-se o

cabo da bóia com o bicheiro e recolhe-se a fila de manzuás. O mestre continua

comandando as operações e manobrando a embarcação, quando um segundo

Page 140: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

139

pescador na proa recolhe a fila, outro traz os manzuás para bordo e retira a captura

e um último os empilha entre o quartel e os espeques onde repõe as iscas feitas de

cabeças e espinhas de peixe. As posições dos pescadores não são marcadas

durante a captura de lagostos (FIGURA 26).

! FIGURA 26 - Esboço jangada com as distintas colocações na pesca de manzuá para captura de lagosto.

Tendo sido recolhida e iscada, a fila pode ser lançada novamente no mesmo

local ou em novo ponto. Os lagostos capturados são colocados dentro de um saco

de ráfia ou ainda em caixa plástica vazada e amarrada aos espeques. A fauna

acompanhante composta geralmente por moluscos, equinodermatas, e pequenos

peixes pode ser descartada ou trazida para terra, no caso dos polvos, muito

apreciados como alimento e as estrelas-do-mar para decoração.

Lagostos de tamanho inferior, as lagostas “miúdas”, são devolvidos ao mar

dentro dos manzuás. Apesar de ser uma prática questionável, os pescadores

afirmaram que lagostas pequenas são capazes de abandonar o covo por conta

própria.

As filas podem possuir em média oito a 10 manzuás que se dispõe em linha

um após o outro com uma distância de aproximadamente seis braças entre cada.

Um pescador pode ter mais de 10 linhas de manzuás pescando simultaneamente.

Na extremidade inferior da linha é colocada uma garatéia (terceiro tipo de âncora

utilizada) a qual garante que os manzuás fiquem fundeados e na extremidade

superior a bóia permita que a fila seja localizada.

Assim, durante uma faina que dura cerca de três horas, os pescadores

movem-se de marcação para outra, na tarefa de despescar, iscar novamente e

reposicionar as filas de manzuás.

Page 141: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

140

PRANCHA 18

Page 142: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

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Page 144: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

143

FIGURA 29 – Gráfico da Freqüência de menção e ordem de importância das espécies capturadas no verão. Espécies citadas em primeira ordem (a); em segunda ordem (b); em terceira ordem (c); em quarta ordem (d) e em quinta ordem (e). Fonte: Pesquisa de campo, 2007.

FIGURA 30 – Gráfico da freqüência de menção e ordem de importância das espécies capturadas no inverno. Espécies citadas em primeira ordem (a); em segunda ordem (b); em terceira ordem (c); em quarta ordem (d) e em quinta ordem (e). Fonte: Pesquisa de campo, 2007.

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Page 146: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

145

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Adicionalmente, um cluster (usando o índice de Bray-Curtis) foi gerado agrupando

as similaridades da composição das capturas. A análise foi realizada considerando-

se as espécies com mais de 10% de ocorrência (FIGURA 32).

FIGURA 32 – Matriz de similaridade da ocorrência de espécies observadas no desembarque de peixes da Caponga. Barra escura demonstra as espécies agrupadas. Fonte: Pesquisa de campo, 2007.

Dentre as 28 selecionadas, 10 espécies, sendo elas a guaiúba (Ocyurus

chrysurus), dentão (Lutjanus jocu), mariquita (Holocentrus adscencionis), biquara

(Haemulom plumieri), piraúna (Cephalopholis fulva), zambaia-roliça (Tylosurus acus

acus), cioba (Lutjanus analis), moreia pintada (Gymnothorax vicinus), sapuruna preta

(Haemulom melanurum) e o pirá (Malacanthus plumieri) foram responsáveis por

60% da similaridade nos desembarques.

Como análise preliminar da situação da captura é possível dizer que a

escassez dos peixes de primeira, em geral espécies topo de cadeia alimentar, fez

com que o esforço de captura se voltasse para outras espécies usualmente não

capturadas ou de pouca importância econômica. Arraias (Dasyatis spp.), moréias

(Muraena spp.) e outros importantes grupos funcionais como os herbívoros,

representados pelo batata (Sparisoma frondosum) e lancetas (Acanthurus spp.),

vêm suprindo crescentemente o comércio local e garantindo a segurança alimentar

da comunidade.

Page 147: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

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Page 148: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

147

orientação no mar e a marcação das pescarias. Do conjunto de termos citados

maior ênfase foi conferida às constelações (65,8%) e aos chamados pontos de

terra (68,4%).

4.1 Sistema de navegação

Os elementos do sistema de navegação são utilizados de acordo com o

período do dia (noturno e diurno); as “estações” (verão e inverno); condições

climáticas (nublado/encoberto e ensolarado) e o posicionamento da

embarcação (sentido terra-mar/mar-terra):

período do dia: durante o período diurno os pescadores utilizam as

marcações em terra e o posicionamento solar como referência. Já durante a

noite contam com a distribuição das constelações, planetas e satélites e com

os reflexos produzidos pelos denominados gases, fogo ou ainda as luzes,

provocados pela difração e reflexão dos raios luminosos que serão retomados

adiante;

a) estações: nas denominadas “estações” anuais são utilizados como

recurso, no período do verão, a incidência constante dos ventos do

quadrante Nordeste (Alísios) e no inverno as correntes marinhas

evidenciadas pela ondulação do mar;

b) clima: em dias chuvosos ou encobertos são utilizadas como guia as

correntes marinhas e coloração da água e em céu aberto a posição

do Sol, ventos e referenciais de terra;

c) posição: à respeito do posicionamento da navegação, no

deslocamento terra-mar são utilizados como referência pontos em

terra e a medida da profundidade local em braças. Já no

deslocamento mar-terra, além da medida das braças, são também

utilizadas a variação na coloração da água, as marcações de terra,

as constelações, os gases e a direção dos ventos.

Page 149: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

148

4.1.2 Os ventos

“O mar não tem cabelo para segurar não!” (Bengala)

Para prosseguir com a classificação dos ventos desferida pelos

pescadores da Caponga, é preciso antes compreender a diferenciação do

referencial geográfico adotado pelos mesmos. Em correspondência própria, os

pescadores realizam a transferência da orientação geográfica Leste-Oeste que

acompanha boa parte do litoral cearense37 para uma correspondência Sul-

Norte semelhante ao observado em parte do litoral nordeste estendo-se ao sul

do litoral brasileiro.

Portanto, tomando como referência o porto da Caponga, o Leste

geográfico passa a ser entendido como o “lado de baixo”, ou aquele está

voltado para o Sul, e o Oeste geográfico entendido como o “lado de cima”, ou

seja, o Norte.

Pode-se dizer que, intrincado ao modelo direcional dos pescadores,

estão (i) a determinação da rotina de trabalho e do calendário anual de pesca,

(ii) o desenvolvimento da elaborada metodologia de navegação e (iii) a

peculiar nomenclatura da sazonalidade climática.

Um exemplo da particularidade do sistema de orientação geográfica

adotada pelos pescadores pode ser observado no discurso do senhor Pedro

Américo, exímio navegador e conhecedor de ventos na Caponga:

Tem Sul, Leste, Oeste, Nordeste, Sudoeste. Agora mesmo tem esses que só conhecem por o livro, esses ventos. O que eu tou falando aqui são os ventos que o pescador conhece.

Ao contrapor no discurso, os ventos que existem nos livros aos ventos

que o pescador conhece, Pedro Américo reforça a categorização êmica

apropriada ao cotidiano e interesse dos pescadores.

O mapa mental sobre tipologias de ventos (FIGURA, 34), produzido por

José Valdecir Alves nos dá a idéia da particularidade na utilização do

referencial geográfico mencionada. Entende-se que para constituí-lo (o

37 É importante lembrar que tomando como referência a cidade de Fortaleza, o litoral Leste é conhecido por Costa do Sol Nascente e o litoral Oeste por Costa do Sol poente.

Page 150: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

149

referencial) o pescador tome como base a dicotomia entre ambiente marinho e

terrestre. Ou seja, adotando como orientação a terra onde está e o mar à sua

frente, localiza sua realidade à direita como o que existe “abaixo” e sua

realidade à esquerda como o que existe “acima”.

FIGURA 34 –Tipologia dos principaisventos reconhecidos pelos pescadores da Caponga e correspondência geográfica. Mapa mental. José Valdecir Alves, 2007. (A) Terral; (B) Norte; (C) Nordeste; (D) Largo; (E) Leste e (F) Sul. Fonte: Pesquisa de campo, 2007.

A tipologia de ventos é classificada pelos pescadores da Caponga de

acordo com a direção, sazonalidade, navegabilidade e a intensidade (FIGURA

35). Seguindo os critérios mencionados observaram-se as seguintes

terminações:

a) direção: ventos Largo; Sul; Terral (também chamado de Direito, Direitão

ou Oeste); Norte; Leste; Noroeste; Sueste (ou Sudoeste) e Nordeste;

Page 151: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

150

b) sazonalidade: ventos que incidem no inverno, no verão e também ventos

de incidência constante;

c) navegabilidade: ventos bons/ruins para deslocamento da costa para o

mar e ventos bons/ruins para deslocamento de mar para a costa;

d) intensidade: vento calmo e brando denominado macio e vento forte,

árduo, denominado puxador.

Tipos de Vento

Correspondente geográfico

Período de incidência Melhor situação

Largo Norte Dezembro a Fevereiro Mar para terra

Sul Leste Inverno Terra para mar

Terral/ Oeste Sul Todo ano Terra para mar

Norte Noroeste/Oeste Todo inverno Mar para terra

Leste Nordeste Julho a Novembro Terra para mar

Noroeste Sudoeste Inverno Vento parado

Sueste/ Sudoeste Sudeste Inverno Mar para terra

Nordeste Noroeste Inverno Mar para terra

FIGURA 35 - Catálogo de classificação dos ventos segundo os pescadores da Caponga. Fonte: Pesquisa de campo, 2007.

Por vezes, as sinonímias entre os ventos dentro da tipologia dos

pescadores confundem-se entre si e com as direções geográficas o que

dificultou, em muito, o estabelecimento das relações entre os dois sistemas de

nomenclaturas:

Todos o ventos vem na época do inverno. No verão só é o vento Leste, vento Leste é daqui de riba. Que a gente esse Leste é daqui do sul chama de vento sul. O melhor para navegar é esse aí, o vento Nordeste. O mais perigoso é o Leste porque é muito vento a gente chama o Leste e o Sul que a gente chama o vento Sul. (Pedro Américo, grifo nosso).

Apesar do entrecruzamento das categorias foi possível distinguir

claramente a ocorrência de duas principais tipologias de ventos usualmente

referidos: o vento Largo e o vento Leste. Além disso, é unânime entre os

pescadores a afirmativa de que no inverno alternam-se diversas direções de

vento, sendo que no verão, apenas um se mantém predominante.

O vento Largo, que corresponde geograficamente ao vento do quadrante

Norte, incide durante os meses de novembro/dezembro a fevereiro. É

Page 152: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

151

considerado um vento ameno, sendo também chamado de vento “macio”. A

seguir, no mês de fevereiro passam a incidir os ventos de Norte (Oeste) e

Noroeste (Sudoeste), quando a chuva torna-se um fator que contribui para

“amaciar” o vento. Esse período não é considerado propício à navegação, pois

os ventos, quando muito amenos, podem atrapalhar o cronograma de pesca:

No inverno é o vento Noroeste, Norte, Sueste, é o Largo, todo o tipo de vento tem. O que assopra mais e aqui é o Noroeste e por causa dos ventos chuvoso e no pé daquelas serras sempre esfria mais. Mais é Noroeste aí quando ele troce daqui ele amanhece Norte mais o vento mais daqui. O Noroeste é Terral. Agora, quando o vento aqui é do Norte a gente tem uma experiência por o inverno sendo bom, e o vento Norte [...] só para cá, a gente só entra por acolá, só vai para acolá, assim para acolá, não sai de jeito nenhum. (José Valdecir Alves, grifo nosso).

Quando os vento é Norte, é difícil é muito ruim porque a jangada só quer levar assim pra terra, a popa pra acolá pra terra todo tempo, ela fica assim, a pro pra acolá que o vento é Norte aí fica. Só mais pra terra. O pescador é uma coisa medonha! É uma ciência! No inverno vem o Terral, vem o Norte, vem o Noroeste, vem daqui, o Norte vem do mar, e no verão mais é Leste, o vendo duro. (Francisco Miranda Pereira).

A partir do mês de maio o vento Leste, conhecido como vento puxador,

começa a incidir sendo predominante entre julho e outubro, podendo chegar

até novembro, como ocorrido em 2007, durante o período de campo, meses

que correspondem à incidência dos ventos Alísios de Nordeste. O Leste é um

vento árduo para a atividade de pesca que confere dificuldades à segurança

dos pescadores durante a navegação e a captura:

Agora quem pegou a força do vento bravo, agosto, setembro, outubro, no mês de outubro ele vai dando mais uma entradazinha, e agora nós tamo no mês de outubro, pra dezembro. Agora daqui pra frente os vento vai cessando, mas quando começa mês de junho, julho, agosto, setembro, outubro, novembro. [...] Aí só é o Leste, esse ano foi que deu o Leste, foi o ano que os pescador sofreram mais só deu o Leste, tem muito pescador, que passou muita necessidade aí, por causa dos ventos e não tinha peixe de se pegar. (Eudes Miranda da Silva)

O vento Terral passa a ser sentido com maior predominância a partir de

maio a julho, voltando a soprar em dezembro, associado com as chuvas:

Page 153: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

152

O vento Terral, também é chamado de direitão, e é o vento bom de ir pro mar, senão tiver troça38 e pega um vento largo para voltar. O conhecimento do pescador a gente tem o vento para nos ensinar [...] vamos dizer: esse vento aqui que nós estamos hoje que, esse vento aí e é bom para vim, esse é o vento Nordeste. Que é bom só para vir, e é mais sacrificado para ir ele. (Pedro Alves Pereira).

Os ventos são fenômeno fundamental do imaginário dos Capongueiros e

elementos de sua cosmologia. Muito comumente, frente a incidência dos

ventos Alísios, quando torna-se puxador, há um grande furor entre os

pescadores frente ao perigo da navegação naufragar. Durante o período de

setembro a novembro uma notável apreensão se instaura em muitos

pescadores e episódios de naufrágios são relembrados em diversas ocasiões.

Por tais motivos a grande maioria dos pescadores não se arrisca a sair do

porto em dias de vento forte.

Dentre os naufrágios ocorridos na Caponga, o mais recente foi

reproduzido inúmeras vezes com grande ênfase e apreensão. Trata-se de um

acontecimento bastante trágico envolvendo a morte de três pescadores, entre

eles dois irmãos. A questão levanta outra problemática, pois sendo a pesca

uma atividade de caráter familiar, vários pescadores saem em uma mesma

embarcação com seus irmãos, filhos, pais ou outros parentes, prática que eleva

o risco da perda de familiares.

4.1.3 As marés, os rolos de mar e a onda grande

No entender dos pescadores da Caponga o termo “marés” se refere

tanto aos movimentos de massas d’água impulsionados pela força gravitacional

da Lua e dos ventos, quanto às correntes marinhas propriamente ditas:

“Quando o tempo tá todo encoberto sem ver mar nem céu, por a Lua eu tiro a maré, o que a maré ta fazendo e por a maré eu tiro o vento.” (Pedro Américo). “Quanto mais corre a maré, a água, mais pesada a chumbada”. (Francisco Miranda Pereira).

Quanto às marés, foram descritos pelos pescadores fenômenos

atribuídos tanto à ocorrência de marés meteorológicas quanto de marés

astronômicas. As marés meteorológicas (ação de fenômenos atmosféricos, 38 Manobra de orçar a embarcação.

Page 154: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

153

como ventos, na elevação do nível do mar) seriam evidenciadas principalmente

durante a atividade de pesca, sentida na navegação e na operação dos

equipamentos de pesca:

Então, são essas experiências. Às vezes a gente se pensa pela maré. Também, por a Lua. Tudo é coisa de pescador. Pela maré, você tá fundeado, e então essa maré aí que tá enchendo ela só leva na sua linha acolá. Só vai pegar o peixe para acolá pra terra. Quando ela vai começar a vazar a maré, aí as linhas sai para acolá para o meio do mar, a gente conhece as marés por isso, por as linhas que a gente arreia. São essas coisa. (Pedro Américo).

No caso das marés astronômicas (ação gravitacional dos corpos

celestes sobre a Terra), a Lua provocaria o movimento, ou balanço do mar,

chamado de rolador. A presença do rolador estaria diretamente associada com

o aumento da produção pesqueira principalmente no inverno e em fase de Lua

Nova, também chamada de “escuro”, quando os peixes saem para comer:

O mês de alevantar, de dar o rolador, agente chama o rolador [...] É o mar porque ele fica agitado, a gente chama. Pescador já chama como se fosse o rolador né? Dá o nome de rolador. Aí o peixe alevanta pra comer. Esses mês que é melhor de peixe.No inverno aí tem o período da Lua né? Quando bate essa maré que nós tamo agora de Lua Nova que ela faz escuro, é bom, esse tempo nublado, é bom pra cavala. (Francisco de Assis Filho, Fantiquinho, mais de 40 anos).

Certas vezes quando acontece um balanço de mar, que o mar cresce em Lua Nova, ou Lua Cheia que é quando a maré esta em fase de crescimento, aí os peixes sentem vontade de comer nas duas marés, onde se pega peixe com mais quantidade. Em uma ressaca, um rolo de mar, que os peixes ficam alvoroçados para comer. Com a lagosta [...] quando a lagosta está fraca espera melhorar depois da Lua Nova. No escuro. Enquanto tiver fazendo escuro é bom para a lagosta. (Francisco Helieudo Silva).

As marés, - vistas como correntes marinhas - também são

predominantemente utilizadas durante o inverno, quando as chuvas e a

instabilidade dos ventos dificultam a orientação dos pescadores:

A onda grande também, o vento se ele tiver de cima aqui ele domina ela pra terra, se o vento for do Norte vai chegando a que ele vai dominar também ela , mas sempre ela vai pra terra, a gente tem que utilizar ela também pra se orientar a onda grande. É em época de inverno. Por que aí do jeito que ela ta aí vai correr sempre normal assim no sentido Leste, mas só que quando o vento sopra do Norte aí às vezes ela pode mudar de direção, a gente fica assim, tipo assim, ariado. A gente pensa que tá de um jeito quando na verdade a gente tá de outro. (Francisco Helieudo Silva).

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154

PRANCHA 19

Page 156: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

155

4.1.4 Os planetas

A primeira viagem marítima da qual se tem registro ocorreu há cerca de

4.800 anos e, embora os astros tenham sido usados desde o início das

aventuras do homem no mar, a navegação astronômica, por nós conhecida,

surgiu apenas após o conhecimento dos movimentos dos corpos celestes

(MIGUENS, 2002). Pelos mares, seja nas rotas navegadas para conquista de

novas terras dos anos mil-e-quinhentos, nas caçadas aos grandes cachalotes

do século XVIII, nas expedições científicas – como a realizada por Darwin em

sua viagem a bordo do Beagle e ainda a expedição oceanográfica do

Challenger – do início do século XIX, os astros sempre serviram de referência e

orientação para que tais conquistas se tornassem possíveis.

Nos dias atuais, apesar da crescente expansão da navegação

eletrônica, a navegação astronômica clássica continua difundida no contexto da

pesca simples ou artesanal. De acordo com Campos (1995), as referências

celestes - no contexto céu-terra como definiu - atuam no ambiente

possibilitando formas de organização social, modo de vida e produção. Às

referências são atribuídos e associados substantivos próprios ou comuns que

apresentam forte aspecto simbólico, sagrado e cósmico na vida das

populações locais/tradicionais.

Na Caponga, não obstante, as relações céu-terra - e adicionalmente mar

- refletem-se no sistema de orientação marítima. Durante o dia, mas

principalmente à noite, os astros possuem grande importância na vida dos

pescadores. Sobre o uso da astronomia em populações nativas, Reichel-

Dolmatoff diz que “[...] não é muito envolvida com predição astrológica, mas

sim com o aprendizado de leitura do céu que espelha esse mundo; o céu deve

ser escrutado em todo detalhe porque ele é um mapa e um espelho da

natureza.” (REICHEL-DOLMATOFF, 1982, p.166 apud CAMPOS, 1995).

A navegação astronômica, praticada entre os pescadores da Caponga,

ocorre tanto no período diurnal quanto noturnal. Nove referenciais empregados

como recurso à orientação foram identificados. Entre os referenciais estão

estrelas isoladas (Sol), satélites (Lua), planetas (Vênus), constelações (Ursa

Maior, Ursa Menor, Órion, Centauro, Vela, Cruzeiro do Sul, Carina) presentes

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156

na Via Láctea e constelações próximas (Nuvens de Magalhães) (DELERUE,

1999; RIDPATH, 2006):

a) Sol: estrela de observação diurna, o posicionamento do Sol é utilizado

como orientação principalmente durante o período do verão onde as

condições climáticas permitem que seja mais frequentemente

observado;

b) Lua: sua atração gravitacional atuando na movimentação das águas e

força geradora de marés é utilizada principalmente como determinante

no estabelecimento dos calendários das pescarias;

c) Vênus: o único planeta citado com importância para navegação

crepuscular foi Vênus sob a denominação de Estrela d’Alva;

d) Constelações: as constelações são classificadas e referenciadas

consensualmente pelos pescadores como planetas ou estrelas. O maior

número de referências para a navegação astronômica foi atribuído às

constelações.

A habilidade na observação, orientação, acompanhamento e uso da

dinâmica celeste podem ser observados a seguir:

Em noite de Lua alguns tipos de pesca não prestam, não é todos. Pescaria de peixe é só à noite, pescaria de peixe geralmente não tem Lua. Sem Lua a gente se orienta pelos planetas, as estrelas a gente faz a divisa de um pra outro e sabe o roteiro que a gente vai.

.........................................................................................................................................................

Os planetas vai se colocando no período da noite então você tem que ter uma base de um horário do planeta, na hora que ele ta saindo, por exemplo a Estrela d’Alva ela tá saindo, sete horas da noite meia noite ela vai estar quase no meio do céu, quatro horas da manhã, ela já vai lá, você precisa se basear pela roda que ela tá fazendo. (Francisco Soares de Souza).

.

As correspondências entre os termos vernaculares e os termos

astronômicos das constelações apresentados foram obtidas através da

detalhada descrição dos colaboradores e da análise de cartas celestes

produzidas tanto por informantes quando disponíveis na literatura (DELERUE,

1999; MIGUENS, 2002; RIDPATH, 2006). Assim, na tipologia celeste dos

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157

pescadores da Caponga são reconhecidos: Cruzeiro do Sul; Cruzeirinho; Barca

e Leme; Duas Estrelas; Sete-Estrela; Três Marias; Três Reis Magos e as Duas

Manchas do Sul. Com o propósito de identificar e mapear a orientação celeste

e as estrelas/constelações utilizadas pelos pescadores como recurso à

navegação, uma carta celeste foi produzida por Francisco Helieudo Silva

(FIGURA 36).

FIGURA 36 - Carta celeste com as principais constelações utilizadas como recurso da navegação astronômica na Caponga. Mapa Mental: Francisco Helieudo Silva, 2007. (1) Cruzeirinho; (2) Barca e Leme; (3) Duas Estrelas; (4) Cruzeiro do Sul; (5) Sete-Estrela; (6) Três Reis Magos e (7) Três Marias. Fonte: Pesquisa de campo, 2007.

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160

Podendo ser considerado o principal referencial celeste, o Cruzeiro do

Sul, ou Cruzeirinho como chamado, é a constelação que conduz os pescadores

diretamente para o porto da Caponga. Localizado próximo ao Pólo Sul e

juntamente com as estrelas mais brilhantes da constelação do Centauro (Alfa e

Beta) é recomendada à navegação no Hemisfério Sul, pois suas estrelas são

quase sempre visíveis (MINGUENS, 2002).

É, por exemplo, se nós estamos no mar assim por debaixo do porto, que é o mar da Boa Vista que a gente chama pra cá, a gente tem que correr assim em cima do Cruzeiro do Sul, tá vendo? (Francisco Soares de Souza).

À noite a gente só vinha é por os planeta: Cruzeirinho, é um planeta que tem aqui bem aceso, que até mesmo na história é conhecido o Cruzeiro. Tem o Cruzeiro do Sul e tem o Cruzeirinho, um mais por riba e outro mais por baixo. Tem duas manchas, uma chama Mancha do Sul a pra banda mais de riba e outra mais por debaixo. (Pedro Américo).

A utilização de Alfa e Beta Centauro como referencial de retorno do

porto vizinho, e, portanto seu próprio, bem como a confirmação do

posicionamento é dado no relato a seguir:

Quando a gente está nesse outro mar, no mar do Iguape, aí tem duas estrelas assim. Aí tem essas duas estrelas aqui também, elas ficam ao sul do Cruzeiro do Sul, assim desse lado, entende? Pra vir do mar do Iguape a gente já não tem que correr nesse rumo aqui, tem que correr no rumo dessas duas estrelas. A mancha ela fica ao sul, também ela fica do lado do Cruzeiro do Sul um pouco abaixo. (Francisco Helieudo Silva).

Além disso, diante de algumas incompatibilidades encontradas nos

discursos sobre qual seria cada um dos “cruzeiros” a fala de Francisco

Helieudo Silva estabelece as diferenças, determina o posicionamento e

classifica a importância das duas constelações:

Cruzeirinho, Cruzeiro que eles chamam é esse aqui. Porque tem outro que na verdade é menor. Primeiramente que quase aqui não dá para ver, ele fica assim de lado com esse daqui ele é maior também. Esse seria o cruzeirinho. E o outro é maior. [...] o que é usado como mais medida e referência inclusive como eu falei pra você, aquela manchinha que tinha também [...] Inclusive esse cruzeiro maior ele fica aqui nesse lugar aqui oposto desse aqui, fica a oeste, fica a oeste do Cruzeiro do Sul e esse aqui fica ...Esse aqui ele é maior... Eles

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161

tem a mesma quantidade de estrela. Por isso. (Francisco Helieudo Silva).

Para ir para o mar, o principal referencial dos pescadores é a Barca e

Leme, assim chamado por apresentar tal conformação. Além da barca o Sete

Estrela também é utilizado. Apesar de serem reconhecidas e identificadas, as

Três Marias e Três Reis Magos, são recursos secundários na orientação em

função da proximidade com o zênite celeste.

A Ursa Maior são sete estrelas. Realmente é a barca que a gente chama aqui. Tem também o Sete Estrela, já ouviu falar no Sete Estrela? Daqui dá pra ver fica mais ou menos dessa altura fica dessa altura aqui depois a gente volta [...] Ele tá mais ou menos, assim [...] Olha, deixa eu ver aqui: tem também as Três Maria que são essas três estrelas aí ó! (Francisco Helieudo Silva).

A ciclicidade e a percepção na variação da posição dos “planetas” são

entendidas sazonalmente, sendo os referenciais utilizados com maior

freqüência durante o verão, pelas condições climáticas apropriadas. O

acompanhamento das mudanças pode ser observado no relato a seguir:

A gente tem o cálculo da distância dos planetas porque tem aquele que fica fixo num canto.Tem outros planetas que saem depois da meia noite, sempre a gente está atualizado com eles. Eles não trabalham sempre na mesma posição. A maioria deles muda de seis em seis meses. Sempre a gente tem que tar atento para saber o tipo de mudança que ele tá tendo. (Francisco Soares de Souza).

A posição dos astros em relação à embarcação durante a atividade de

pesca foi reproduzida por Francisco Helieudo Silva em um segundo mapa

mental (FIGURAS 42 e 43):

Page 163: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

162

FIGURA 42 - Atividade de construção dos principais recursos da navegação astronômica na Caponga. Mapa Mental: Francisco Helieudo Silva. Foto Áthila A. Bertoncini, 2007.

FIGURA 43 - Atividade de construção do posicionamento de orientação dos principais recursos da navegação astronômica na Caponga. Mapa Mental: Francisco Helieudo Silva. Foto Áthila A. Bertoncini, 2007.

Page 164: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

163

O mapa mental de Francisco Helieudo Silva (FIGURA 42) é apresentado

logo após a sua conclusão e a seguir interpretado de acordo com o

posicionamento dos elementos desenhados referenciados de acordo com a

sua orientação geográfica (FIGURA 43).

Assim, no centro encontra-se a representação da embarcação com a

orientação da proa voltada para o Leste geográfico indicada por uma seta. À

esquerda da figura, que corresponde ao Sul geográfico, encontram-se

Cruzeirinho (1), Duas Estrelas (3) e Cruzeiro Grande (4). Já a direita da figura,

ao Norte geográfico, estão representados Barca (2), Três Marias (7) e Três

Reis Magos (6), reforçando o fato de que as constelações ao Sul são utilizadas

para voltar ao continente e ao Norte para ir ao mar.

Através do desmembramento do mapa mental de Francisco Helieudo

Silva, as constelações por ele desenhadas foram colocadas em evidência

(através de círculos vermelhos) e contrapostas às simulações de três cartas

celestes reais. Assim, foi possível observar as equivalências entre as

constelações desenhadas e descritas pelos pescadores com respectivas

constelações astronômicas.

4.1.5 Os gases

Os gases, também chamados de luzes ou fogo pelos pescadores,

servem como recurso em auxilio à navegação noturna e sua importância tem

aumentado com o passar do tempo. Os gases são os reflexos produzidos pela

iluminação artificial das cidades que incidem nas nuvens:

Se a noite for enevoada, se as nuvens estiverem baixas, ou chovendo, aí a reflexãoe a difração dos raios multiplicam os tons da luz que chega aos nossos olhos. O céu noturno se transforma, adquire suas várias auras nada naturais: aura esbranquiçada,ou azul bem clara e brilhante, quando as lâmpadas são do tipo fluorescente, ouhalógenas; aura amarelada, quase dourada, quando se usa lâmpadas de sódio. (SEVÁ, 2002, p. 01).

Nas noites em que a Lua ofusca o brilho das estrelas os gases tornam-

se o recurso mais seguro para orientação em direção ao porto:

Page 165: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

164

Tem os gás lá em Fortaleza, no meu tempo só tinha, os planeta, essas manchas que eu estou falando e os gases de Fortaleza que ensina muito a gente a vir para a terra a noite. Esses gases que tem de Fortaleza. Hoje não, hoje já tenho aparelhos, tem os gases da nossa cidade de Cascavel que bota muito longe, então a gente conhece. No meu tempo que eu pescava não tinha isso tinha que ir por a prática. (Pedro Américo).

Os principais reflexos utilizados pelos pescadores da Caponga, como

dito, são os reflexos das luzes artificiais produzidas pela cidade de Fortaleza,

seguidas por Cascavel e depois Morro Branco. Tendo em vista o crescimento e

urbanização das cidades o número de gases observados pelos pescadores tem

aumentado em relação aos últimos 30-40 anos.

4.2. O sistema de marcação

Os pontos de pesca ou pesqueiros, chamados particularmente pelos

capongueiros de pescarias, definem-se com base na distância da costa; na

profundidade; no tipo de relevo e substrato marinho; na cor da água; na

associação de determinadas espécies aos locais escolhidos e ainda na origem

(criadas artificialmente pelos pescadores ou “feitas pela natureza”).

Já o sistema de demarcação das pescarias está fundamentalmente

baseado na chamada marcação tendo como referenciais pontos em terra, e,

mais recentemente o georreferenciamento por satélite com o auxílio de GPS.

Os padrões e o funcionamento dos sistemas de marcação entre os pescadores

nordestinos foram extensivamente estudados e debatidos por Forman (1967,

1970), Cordell (1974, 1989) e também Maldonado (1993).

De forma muito semelhante, os autores observaram em suas pesquisas

que a marcação relaciona-se intensamente com os fatores ambientais e as

relações sociais dentro dos contextos locais. Maldonado (op. cit., p. 108)

aponta a importância da análise dos referenciais em terra para a marcação,

tanto para definir bancos de peixes quanto na navegação. Ainda, segundo a

autora, a observação do uso de pontos em terra seria essencial para o acesso

ao mar e a construção da territorialidade dos pescadores.

Durante a viagem às pescarias, ao passo que se afastam do continente,

uma linha imensa planeia o horizonte quando surgem imponentes as serras, ou

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Pelas serras, serra do Cascavel meio arredondada, ela tem uma grande importância pra gente, aquelas outras serras aquela lá de Maranguape, próxima a Fortaleza. Quando a gente vai entrando mar adentro elas vão se locomovendo também, se a gente descer elas desce se subir ela sobe também. Então a gente marca um ponto “xis” onde tem uma marambaia ou uma bóia de manzuá, a gente bota ela naquela marcação e apruma o ruma e vai prestandoatenção naquela marcação e apruma e quando chega naquele ponto “xis” vai procurar. (Francisco Helieudo Silva).

!

4.2.1 Os mar

Na saída para uma operação de pesca, o mestre decide a direção da

navegação baseado na observação das condições oceanográficas e climáticas

precedentes - principalmente dos ventos - as quais vão permitir ou não que se

desloque a determinados locais de pesca. Assim, verificadas as condições

necessárias e definido o objeto da captura, o mestre poderá direcionar a

embarcação para os locais de pesca desejados.

As áreas de pesca utilizadas são constituídas pela denominação de mar.

Os mares, por sua vez, são identificados pela composição do substrato

marinho e delimitados pela correspondência a um ponto fixo de terra

conectando-se em um amplo sistema.

A classificação de áreas de pesca em mares percebida por Maldonado

(1993), referindo-se à fronteiras marítimas adotadas entre pescadores da

Paraíba, continham diversos pontos de pesca e relacionavam-se para os

mesmos com os tipos de fundo predominantes nas áreas.

A abrangência reportada para as áreas de pesca mais frequentemente

utilizadas pelos pescadores da Caponga limita-se longitudinalmente à Oeste

com Batoque no município de Iguape e à Leste com Morro Branco no município

de Beberibe. Dentro da delimitação suposta, nove mares seriam utilizados

pelos pescadores:

Aqui no nosso correr do porto nós tem um mar que chama mar da Aruanã, esse aí é um alto que tem que a gente pesca. Esses mar nós tem uns pouco de mar que nós pesca: Nós tem o mar do Iguape, tem o mar do Batoque, da Boa Vista [...] aí em cima do Batoque nós tem esse mar da Aruanã. Desse mar da Aruanã nós tem outro mar que chama o mar da Carnaúba, tá entendendo? Desse mar da Carnaúba, nós tem outro mar que chama o mar da Maia. Desse mar da Maia, nós tem outro mar que chama o mar do Roçado. Desse mar do

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168

Roçado, nós tem outro mar que chama mar das Três Moita. Desse mar das Três Moita nós tem outro mar que chama mar da Maia Vermeia, aí tem o mar da Sucatinga, aí já vai pra Morro Branco. Pois sim. Nós tem os mar que nós pesca, tudo é conhecido. Nós sabe qual foi o mar que nós peguemo. Nós sai daqui nós sabe o mar que vamos pegá. (Raimundo Miciú).

No entanto, dirigir-se a um determinado mar não depende apenas da

vontade do mestre, mas diretamente das condições de vento incidentes no

momento da partida:

Os mares que os pescadores pescam dependem do vento. Se o vento é bom para guiar pro mar da Boa Vista vai pescar no mar da Boa Vista. Se voltar para o mar da Caponga vai pescar no mar da Caponga. Para onde o vento botar a embarcação é que vão lá. (Pedro Américo).

Sobre as designações conferidas aos mares, lembrando que o uso dos

termos está vinculado aos referenciais terrestres, o termo maia, segundo os

pescadores, seria denominação para apontar falhas na vegetação (malhas),

sendo o complemento que se segue, como no exemplo, maia Vermeia a

constituição geológica do substrato, argiloso no caso. Os mares do Roçado,

Moita e Carnaúba, por sua vez, fazem menção à vegetação e/ou áreas de

plantio e do Iguape ao local de mesmo nome.

Além das referências apresentadas, observa-se a seguir a descrição

para os mares do Batoque e Caponga bem como os critérios de nomeação

conferidos:

Aqui no nosso correr que nós estamos aqui é o mar da Aruanã. Balbino, Batoque é o mar da Boa Vista, por que a gente chama de mar da Boa Vista? É tem um rio muito grande aí no Batoque que chama Boa Vista. Por o rio aí a gente chama de mar da Boa Vista. Tem mar do Iguape em frente ao Iguape, o mar do Aquiraz, de que por aí vai. O mar do Mucuripe, em frente ao Mucuripe. Os mar ficam em frente aos lugares. Tem pescador que chama de mar da Caponga, o mar da Aruanã, que é o mar da Caponga. (Pedro Américo).

Page 170: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

169

O mar da Aruanã, como dito por Pedro Américo, é o mar da Caponga, e

a nomeação é relacionada à ocorrência de desova de quelônios, no caso a

tartaruga aruanã (Chelonia mydas) 39, como descreve Raimundo Miciú:

Mas não tem quem veja, a tartaruga ela sai do mar pra pôr assim na costa né? Ela só põe na costa né? Ela pôs já na Caponga diversas vez, agora só põe [...] só sai aquela bicha a aruanã [... ].

A divisão dos mares, ilustrada através do mapa mental produzido por

Francisco Miranda Pereira (FIGURA 46), localiza da direita para a esquerda, os

mares considerados como os mais importantes para a pesca local.

!

FIGURA 46 - Localização dos mares tomando como referência o porto da Caponga. Mapa mental. Autor: Francisco Miranda Pereira, 2007. (1) mar da MaiaVermeia; (2) mar das Três Moita; (3) mar do Roçado; (4) mar da Maia; (5) mar da Carnaúba; (6) mar da Aruanã; (7) mar do Batoque ou da Boa Vista; (8) mar do Iguape. Fonte: Pesquisa de campo, 2007.

39 Como forma de corroborar com a informação, no dia 15 de dezembro de 2007 um exemplar da espécie encontrado encalhado na praia por um dos assistentes de marchante foi levado até a pesquisadora com um ferimento profundo na lateral direita do plastrão.

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170

Analisando o mapa produzido por Francisco Miranda Pereira nota-se

que é constituído por dois círculos, um menor inferior e outro maior superior,

sendo o primeiro uma representação do porto da Caponga - o referencial em

terra - e o segundo, de proporções significativamente maiores, a representação

do espaço marítimo com as respectivas áreas de pesca.

Presente no mapa há uma interessante conotação dada por Francisco

Miranda Pereira, corroborada por observações e relatos de diversos

pescadores, em relação à conformação circular apresentada. Ao desenhar o

mar como um grande círculo, tendo em vista a dificuldade da pesquisadora em

compreender seu modelo, foi mais adiante exemplificando: “Quando você tá no

mar assim, você não só vê céu e água? O mar não tá grudado com o céu?

Então ele não faz assim uma bola?”.

Assim, ao desenhar um círculo que continha toda a amplitude da área de

pesca e delimitar um território comum entre os Capongueiros, o Senhor

Francisco Miranda Pereira deu vez ao entendimento de que a “bola” a que se

referiu representaria a conformação angular que delimita céu e mar, utilizando,

como em uma leitura azimutal, um ponto de partida no horizonte em relação a

um ponto de origem, no caso o porto da Caponga, razão por que desenhou os

dois círculos separadamente.

Outro ponto importante no mapa de Francisco Miranda Pereira é o

detalhamento expresso na ilustração, o qual aponta (destacado e ampliado a

seguir na FIGURA 47), o posicionamento de uma navegação durante a

captura. A embarcação, segundo o mesmo, está colocada paralela à linha de

costa, com a proa voltada para o Leste, e com os três pescadores, mestre (a),

proeiro (b) e rebique (c) posicionados pelo chamado “lado de fora” (Norte

geográfico) e o bico de proa (d) pescando pela chamada “banda de terra” (Sul

geográfico) nas suas devidas posições.

Page 172: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

171

!

FIGURA 47 - Detalhe da figura 46 mostrando a posição da embarcação durante a captura. Posicionamento dos pescadores: (a) mestre, (b) proeiro e (c) rebique (c) e bico de proa (d). Fonte: Pesquisa de campo, 2007.

A mesma atividadade de pesca pode percorrer vários mares. A mudança

entre cada mar, no entanto, é percebida pelos pescadores através da alteração

da profundidade conhecida por vão ou canal. Além disso, a troca de substrato

influencia diretamente na composição da captura justificada na fala de

Francisco Miranda Pereira: “No mar liso não tem peixes. No vão não rói peixe.

Vem descendo de popa arrastando quando sente o peixe está em riba das

pedras”.

É em cima das “pedras” que se encontram as espécies de peixes

almejadas. A distinção entre mares, a mudança da profundidade e do substrato

e o desprestígio pelas espécies de fundos arenosos está fundamentada a

seguir:

Tem uma diferença um pro outro né?Pois bem, findou um mar como lá na praia né?Aí faz os vão como nós chama. De lá pra cá, que nem aqui, aí vem o outro. Quando vai levando pra riba desse outro aí a gente conhece. Que aparece peixe que preste né? Lá no mar onde tem chão assim não tem peixe que preste. Valado assim lá no mar não tem peixe que preste. Só peixe inferior né? Traíra, soia, moriongo, anequim, esses inseto 40: siri-guajá, só esses inseto. (Raimundo Miciú).

40 Seu Raimundo Miciú designa como sendo insetos peixes peçonhentos, não utilizados ou que não tenham valor.

Page 173: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

172

O tempo de pesca em cada mar pode variar entre uma a duas horas.

Adicionalmente para a embarcação mover-se de um mar a outro se gasta

aproximadamente uma hora. Durante a faina, o tuaçu é lançado à água para

que a embarcação vá de arrasto41 deslocando-se compassadamente.

Francisco Miranda Pereira também explica como “caçar” a melhor água,

ou seja, como encontrar o local propício à captura com o uso da saçanga (poita

com peso de chumbo preso na extremidade final). E, acrescenta, em sua fala

informações sobre a profundidade em que atuam as navegações:

Vai inté pro alto ele vai praqueles canaizinho. De vinte braça, vinte e uma braça, vinte e duas. Aí por exemplo, aqui seca, aí vai no seco, pouco mais aí muda aí vai afundando. Ai o mestre diz: “Você arreia a poita e fica!”. Ele fica com a chumbada saçangando, assim se rebolando. Quando tá seco ele diz assim: “Tá seco, tá secando mais...”. Dezesseis, dezoito, seca até pra quatorze braça, aí afunda até pra vinte e duas. Quando afunda pra vinte e duas aí é canal. Afundou! Aí ele vai lá arreia aquela amarra onde amarra a poita - chama poita né? [...] Vamos pescá que afundou! Aí vem o peixe vem a guaiúba, vem a cioba, biquara vem a sapuruna preta, tudo vem. Às vez tem, as vez não tem ai vai traíra, aí eles diz assim: “Não tá prestando aqui não tem péda não! Vamos pra outra! Aí manda puxar a poita.

!

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Um segundo mapa mental reforçando a visualização das características

da disposição dos mares, foi produzido por José Valdecir Alves. (FIGURA 48).

O mapa construído por José Valdecir Alves aponta no centro, marcado

por um círculo, o porto da Caponga e saindo dele 11 linhas, sendo nove delas

a correspondência entre os mares citados.

Adicionalmente um novo mar aparece o qual correspondendo ao mar do

Aquiraz (9) fazendo referência ao local de mesmo nome. Sobre a inclusão

deste mar, Siri, acrescentou não ser muito freqüente a pescaria na área, exceto

em situações do pescador ariar-se 42. Além dos mares, o mapa de José

Valdecir Alves correlaciona em uma situação hipotética a incidência dos ventos

denominados pelos pescadores de Terral (1) e Sueste (2) considerados mais

propícios, pela sua direção e intensidade, para alcançar os mares por eles

citados.

41 No sentido da embarcação ir derivando. 42 Perder o rumo da embarcação.

Page 174: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

173

FIGURA 48 - Mapa mental da localização dos mares tomando como referência o porto da Caponga. Mapa mental. Autor: José Valdecir Alves, 2007. Em vermelho (1) mar da Maia Vermeia; (2) mar das Três Moita; (3) mar do Roçado; (4) mar da Maia; (5) mar da Carnaúba; (6) mar da Aruanã; (7) mar do Batoque ou da Boa Vista; (8) mar do Iguape; (9) mar do Aquiraz. Em amarelo: (1) vento Terral e (2) vento Sueste.

4.2.2 Pescarias

Sobre os elementos que definem a localização das pescarias, ou seja,

os pontos de pesca, sete diferentes tipologias para substrato marinho foram

descritas pelos pescadores: seco, alto, cabeço, barranco/parede, risca, canal e

cascalho. O seco equivale aos fundos arenosos; os altos aos cordões recifais;

cabeços pontos de manchas recifais; as paredes são o Talude Continetal e o

chamado beiço sua borda; as riscas também são cordões recifais localizados

mais próximo à costa que os altos; os canais ou valas são fundos de pedra e

cascalho que não apresentam produção e os cascalhos são fundos

inconsolidados de algas calcárias (Halimeda sp.):

Page 175: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

174

Pesca até o beiço do barranco onde pescam pargo, sirigado arabaiana, nas paredes, no oceano tem serras de pedra mais altas que na terra. A gente vai a cerca de 70 km tem aqueles tuaçu, a gente tem que puxar bem muito porque quando chegar no beiço da parede, que quando deixar com aquele cabo arriado, o tuaçu vai enganchar ali e aí vai ter que cortar.

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........................................................................................................................................................

Tem uma pescaria que a gente chama cascalho aí que quando a na época do inverno as jangadas não vão nem para o alto, vão pescar nos cascalho, mas está mais difícil agora. Quando for agora nesse inverno que vem tem que ser o inverno bom, mas até agora aí não tem não (Francisco Helieudo Silva, grifo nosso).

Nós só tem peixe que presta quando vai pra riba do alto que tem pedra, aí que nós chama o alto, nós chama o alto porque é calçado de pedra [...] no mar os altio que nós chama é fechado de pedra que nem acolá. Aí é onde ajunta os peixes nas péda. (Raimundo Miciú, grifo nosso).

Cada praia do Ceará existe uma risca, uma risca é uma tirada de pedra que tem lá em alto mar, é submersa. Conhece que é uma risca pelo peixe que pega, ariacó, guaiuba, moreia, peixes de pedra. Francisco Soares de Souza, grifo nosso).

A risca fica há uma hora, uma hora e meia de viagem, eu acho que era cheio de peixe porque nesse tempo era mais pouca a navegação. Criava aqueles peixe hoje em dia é navegação demais, acabaram com tudo. (Anastácio, grifo nosso).

Os substratos marinhos onde estão localizadas as pescarias são

relacionados diretamente com a distância da costa e profundidade, sendo

cascalhos, riscas e seco localizados nas menores profundidades, entre 4 a 25

braças, e as paredes a 180 braças aproximadamente (FIGURA, 49):

Page 176: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

175

Tipo de fundo Caracterização Relevo/Substrato

equivalente Distância da costa (km)

Profundidade (braça)

Seco “aqui no seco” Fundo arenoso 18 13 -25 Alto /Beirada do alto

“De Morro Branco a Fortaleza é uma água só, é pedra”

Cordão recifal 41 28-33

Cabeço “Pedra onde tem peixe”

Mancha recifal 62 34

Beiço do barranco/ Paredes

“Serras de pedra” Borda do Talude Continental

70 180

Risca Cordão recifal 12 4-13 Canais/ Vão/ Valas

“Pedra e cascalho” 37 21-26

Cascalho É uma área reta Fundos de algas calcárias

até 42 8-19

FIGURA 49 – Quadro da tipologia dos substratos marinhos e especificações. Fonte: Pesquisa de campo, 2007.

Peixes de maior valor comercial (sirigado, garoupa, dentão, pargo, serra,

cavala, avaucora, bonito, etc.) estão associados às maiores distâncias da costa

enquanto outros estão localizados nos cabeços, riscas (biquara, ariacó,

cangulo, lanceta, sapuruna, mariquita, moréias, etc.) e os menos valorosos nos

canais (cação, pacamon, arraia, bague, etc.). Já as lagostas são principalmente

associadas aos cascalhos.

No que diz respeito à diferenciação entre as pescarias feitas pela

natureza e as pescarias marcadas 43 observou-se no discurso dos pescadores

certa tendência ao abandono das primeiras e a substituição pelas últimas.

De fato, das 82 citações de pescarias as quais foram relatadas e

identificadas como sendo agregações naturais de espécies encontradas no

passado, apenas quatro foram mencionadas como sendo utilizadas nos dias

atuais:

Pescaria marcada tem as Pedra do Inácio, tem a Pedra do Souza, tem o Razinho, que são as pescarias mais marcadas que tem. Por fora. Mas agora o aqui por dentro da risca tem muita. Agora lá no alto, no alto a gente pesca pela chumbada. A gente quer ir para cinqüenta braça, a gente mede cinqüenta braça numa linha, e tem uma chumbada de dois quilo, um, cinco quilo e aí vai caçando para pescar aí quando chega a cinqüenta braça aí fundeia por vinte, fundeia por trinta. Na água que quiser pescar. (Anastácio).

43 Marcar aqui tem a conotação utilizada pelos pescadores ao se referirem ao registro das pescarias no GPS e das pescarias feitas pelos pescadores.

Page 177: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

176

Acontece de você, tu ir e achar mas a gente fica mais na que a gente faz tudo é perto por a gente mesmo essas aqui. Só que não é, é essa aqui que é feita por a natureza também que é o “Razinho”, e também que é a “Pedra Do Soiza”, tudo feita pela natureza. (João Jairo Pessoa Silva).

O abandono de agregações naturais de espécies atribuiu-se

principalmente ao chamado “fracasso”, ou seja, à diminuição/fim da ocorrência

das espécies-alvo nos locais. Algumas das pescarias têm seu uso reportado há

muitas décadas e é possível que tal prática esteja associada à sobrepesca.

Tomando por base a lembrança apontada no relato,

Tinha muita pescaria mesmo! Ainda me lembro de uma véia antiga que ainda hoje tem até quando dá fé vão lá e pegam peixe: A Peda do Inácio é aqui da proa da jangada, Peda do Souza, o Razinho. O Razinho é uma pescaria quase que fica onde a Mataquiri se some, é uma pescaria cá de terra dezoito braça de fundura. Mas é uma pescaria grande, pescaria marcada grande, isso nunca se acaba não. Lá o peixe, que pega lá é peixe miúdo, chumbada, biquara, cangulo, sapuruna, agora, peixe grande só pega lá a cavala, alguma garopinha alguma... Garopa e cioba é os peixes que pega, mas esse peixe nunca falta não. (Chico Grilo).

Ainda, sobre as 82 agregações citadas, diversos pescadores afirmaram serem

recursos de uso comum. Assim, a obtenção de tal informação leva a

reconhecer a existência e operação do sistema de livre acesso (HARDIN, 1968;

FEENY et al., 1990) dos recursos provenientes das pescarias feitas pela

natureza:

Ficava sabendo (das pescarias) porque a gente pescava nelas a gente botava os nomes. Para cada pescaria que a gente pescava botava nome. Tinha também as pescarias ensinada pelos outros que a gente procurava saber dos outros.Todas essas pescarias que eu disse, as pescarias que a gente pescava, a gente contava com nome e ainda tem mais. Mas tem muita tem uma certa parte mais medonha de pescarias que a gente tem que no mar, tudo por os o olhos. (José Valdecir Alves, grifo nosso).

A fala de José Valdecir Alves indica que informações sobre as pescarias

– como a descoberta de novos pontos – usualmente eram compartilhadas,

herdadas e também incorporadas entre os pescadores reforçando o aspecto de

bem comum dos recursos pesqueiros na Caponga.

Page 178: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

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Page 179: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

178

Através do sistema de nomeação das pescarias, dois fatores a que se

pretende chamar atenção são (i) a orientação baseada no tipo de fundo e (ii) a

orientação baseada na referência à pontos de terra. Entretanto, apesar de

praticamente metade das referências dadas às pescarias apresentarem

relações com propriedade, ou seja, serem atribuídas ao seu descobridor, vem

sendo compartilhadas de forma comum ao longo do tempo.

Outro fator que merece ser mencionado é a ocorrência de pescarias

compartilhadas concomitante à existência dos chamados segredos de pesca. A

título de exemplo, em conversa com determiando colaborador, este afirmou

possuir aproximadamente 300 pescarias não compartilhadas. Segundo

Maldonado (1994; p. 156):

[...] o segredo assim como a territorialidade e as formas de apropriação que ele propicia, sejam elementos fundamentais à organização da produção e ao modo de ser da sociedade pesqueira, algo produzido pela estrutura social que ao mesmo tempo a sustenta e a reproduz.

Ainda, na identificação feita pelos pescadores foi evidente a

permanência de algumas pescarias comuns. Nesse aspecto, o mapa mental de

João Jairo Pessoa Silva, reproduzido a seguir (FIGURA 52), apresenta Péda

do Soiza, Razinho e Avião (embora seja considerado um naufrágio, não foi

possível encontrar referência do mesmo45) como pescarias comuns utilizadas

tanto nos sistemas de pesca de ir-e-vir e dormida:

Essa aqui são pescaria mais perto. Agora essas aqui é tudo mais fora. Aqui já é do correr de Razinho isso aqui tudo no correr de Razinho. Agora aqui é tudo mais perto aqui. Pelo menos dá o que uns 20 km? Dá não. Tem hora que dá, mas acho que dá assim uns 18, 17 km. Tudo é mais perto.

!

.........................................................................................................................................................

Tem a Peda do Soiza, aqui já vem aqui pro Razinho. Essa aqui já vai também pra Risca do André, aí muda aqui de novo aí já vem pra outra aqui que chama o Avião, tou botando aqui as pescaria que eu pesco! (João Jairo Pessoa Silva).

45 O SINAU (Sistema de Informações de Naufrágios) monitora os naufrágios ao longo da costa brasileira e dispõe um banco de dados com informações sobre 1300 pontos. (http://www.naufragiosdobrasil.com.br/)

Page 180: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

179

Em seu mapa mental, João Jairo Pessoa Silva diferencia claramente as

localizações de agregações naturais (FIGURA 52 A) em relação às agregações

artificiais (FIGURA 52 B) de espécies sendo que as primeiras encontram-se em

distância menor e as últimas em distância maior da costa, respectivamente.

Nota-se que durante a citação a seguir, enquanto reproduzia as

pescarias marcadas, que apesar de fornecer as referências locais João Jairo

não define os nomes das suas pescarias particulares o que supostamente as

configura com o status de segredo:

Aqui já tem outra que foi uma pescaria que nós acertemo agora aqui, essa aqui fica aqui no correr das Águas Belas, essa aqui fica no correr do cais de Cima do porto, essa aqui fica dentro do porto, essa aqui também fica dentro do porto, e essa aqui também fica dentro do porto. Essas quatro aqui tudo dentro do porto. Essa aqui fica pro lado de cima do porto, aqui pega na Águas Bela. (João Jairo Pessoa Silva).

!FIGURA 52 - Localização das pescarias tomando como referência o porto da Caponga. Mapa Mental. Autor: João Jairo Pessoa Silva, 2007. (A) Pescarias feitas pela natureza sistema de dormida. (B) Pescarias marcadas do sistema de ir-e-vir. (A1) Péda do Soiza; (A2) Razinho; (A3) Risca do André (A4) Avião. (B1, B2, B3, B4, B5) não identificadas.

Page 181: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

180

Outro mapa mental, desenhado por Pedro Alves Pereira, corrobora com

a descrição do uso das pescarias feitas pela natureza e reforça a localização

de três pescarias: a Péda do Inácio, a Péda do Soiza e o Razinho (FIGURA

53).

!

!

FIGURA 53 - Localização das pescarias feitas pela natureza tomando como referência a linha de costa. Mapa Mental. Autor: Pedro Alves Pereira, 2007. (A) Péda do Inácio, (B) Péda do Soiza e (C) Razinho.

Ainda, a substituição das agregações naturais por agregações artificiais

é relatada a seguir:

Pelas serras eu me lembro: Risca da Péda Acolá, Péda do Soiza, Péda Debaixo, Perto do Waldemar, as Pedras do Toin, tem as Pedras do Zé Manoel, Risca do André, Risca de Fora, é tudo pescaria que a gente marca o por os olhos da gente, até onde a vista da gente pega a gente marca: Cabeça da Ostra, Maia Velha, tudo a gente marca. Tudo é pescaria e tudo gente marca. Tudo por os olhos. Agora, depois que a gente começou a colocar essas marambaias no mar,

Page 182: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

181

essas pescarias aí a gente não pescou mais não porque não tem mais nada. A gente tá pescando agora nessasmarambaias que a gente bota. (José Valdecir Alves, grifo nosso).

Dessa forma, atribui-se o abandono das práticas usuais e a substituição

das pescarias da natureza à diminuição da captura. Incorpora-se assim a

mudança da tecnologia e das áreas de pesca principalmente com o advento do

uso do GPS e a substituição pelas marambaias:

Porque se acabou-se. Ninguém ligou mais de pescar. Esses tempos a gente pescava nessas pescarias porque não tinha essa outra pescaria de que as marambaias que fazer muito longe a vista da gente não dava. Tem outra pedra chamada das Quatorze, tem a Risca do Cabeço das Quatorze do Mar de Riba, as Pedas no Finado Zinho. Era tudo o que gente marcava por os olhos da gente, tudo pescaria. (José Valdecir Alves).

Uns tinham (segredos), mas era só enquanto alguém acertar o canto da pescaria, que todo mundo pescava. É tanto Maíra, que depois que eu comecei a viver dessas marambaias todo mundo dessas pescarias que chamam “de pedra”, que foram feitas pela natureza mesmo, sabe? Todo mundo abandonou essas pescarias, véia, abandonada. Por causa de que eles só usam essa marambaia. Porque ele tava vendo que a marambaia dele tem futuro. (Raimundo Odacir Alves, Bengala, 42 anos).

4.2.2.1 Marambaias

As marambaias são Recifes Artificiais Marinhos (RAMs) construídos com

a finalidade de atrair espécies de interesse comercial (NASCIMENTO, 2006). O

conceito de recifes artificiais originou-se na virada do século XVIII no Japão,

onde pescadores observaram que as capturas eram maiores em águas que

continham naufrágios e que as capturas diminuíram com o progressivo

desmantelamento das embarcações afundadas (CHOU, 1988).

Apesar de serem utilizados de longa data por pescadores no Brasil, os

RAMs têm sido mais difundidos recentemente através de programas de

pesquisa como, por exemplo, no Rio de Janeiro pelo projeto Recifes Artificiais

de Rio das Ostras, no Paraná pelo Projeto RAM (BRANDINI et al., 2001) e

inclusive na costa cearense, através do Projeto Recifes Artificiais

(CONCEIÇÃO et al., 2007) onde a utilização das estruturas tem o objetivo de

Page 183: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

182

servir como substrato para o desenvolvimento da fauna e flora típicas dos

ambientes recifais e fomentar a pesca.

No contexto da Caponga, as marambaias foram utilizadas inicialmente

para atrair peixes sendo atualmente utilizadas tanto para a atração de lagostas

quanto para agrupamentos de peixes.

Os materiais mais comumente empregados pelos pescadores para a

construção dos recifes artificiais são pedaços de madeira, sucata (carros,

eletrodomésticos) e pneus usados.

Uma marambaia custa em torno de duzentos reais. Se for pagar pessoa para ajudar custa mais e depende também do material. Fiz duas de carcaça de carro velho. Além de comprar na oficina, aluga carro pra trazer, pagar alguém para ajudar, pagar uma jangada para levar, pagar para ajudar a levar, em compensação para peixe é muito bom, dá mais de um tipo de peixe. Guaiuba, arraia, bijupirá, cavala, não todo tempo, mas dá esse tipo de peixe. (Francisco Helieudo Silva).

Na Caponga, o pioneirismo reconhecido entre o uso da marambaia é

atribuído a um pescador local, que, apesar de não ter sido o precursor da

tecnologia, teria sido quem primeiro fomentou a utilização difundindo-a entre os

demais:

A gente pescava nas pescaria que mais assim que Deus butou, feita mesmo. Mas aí as pescaria eram poucas pra gente pescar. Aqui tinha muita. Tinha a Péda do Soiza, tinha a Péda de Baixo, tinha a Péda do Zé Manuel, a gente achava pouca, aí a gente inventemo. Eu pequenininho inventava no rio, aí eu via que tinha peixe, aí eu falei: "Vou inventar no mar!". Aí eu fui e inventei no mar. Aí inventei no mar aí se demo de bem, peixe, aí começou a aparecer lagostim, aí quando eu comecei a fazer aí todo mundo começou a fazer também. (Raimundo Odacir Alves).

De um certo tempo para cá, as pescarias antiga de pedra elas fracassaram muito, veio a melhorar a partir do momento que passoa fazer marambaias, a primeira pessoa foi o Bengala, há uns quinze a dez anos.Começou a dar certo e hoje quase todo mundo tem de quatro a cinco marambaias. (Francisco Helieudo Silva).

Em busca de aumentar a produção com o fracasso das pescarias “feitas

por Deus” ou “pela natureza”, muitos pescadores foram aderindo

constantemente ao uso das marambaias. No entanto, ainda existem

Page 184: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

183

pescadores que não utilizam pescarias artificiais e que não vêem a prática de

forma positiva:

Tudo isso tem as pescaria que nós pescava antigamente. Tudo tem. Não botava, como de primeiro, esses pau que levava pro mar, carro, antigamente não tinha isso e nós tinha o peixe. (Francisco Miranda Pereira).

Toda a qualidade de peixe a gente pegava [...] várias qualidades de peixe. Tudo onde que às vez tinha o lagosta. Inclusive nessas marambaias que eles fazem. Ajunta. Não pesco em marambaia não. Só no cascaio. Marambaia pra mim não presta pra pescar. (José Mauro Alves).

As marambaias também trouxeram outras preocupações, pois com a

atribuição de agregadora de produção, e tendo como antecessor um regime de

livre acesso às pescarias, muitos pescadores passaram a pescar em

marambaias feitas por outros pescadores:

Aí o problema da marambaia, é que era tão bom, que eu tinha mais ou menos na base de umas doze marambaias, só eu. Fiz mais de umas doze marambaias. O mió é que eu fazia e os outros se aproveitavam. Aí eu trabalhava, aí quando tava feito, aí os outros ia lá e pegava o peixe, e pegava o lagostim. Por aí eu fui entrando na minha cabeça que quanto mais eu fazia pra mim, mais era pior, porque, se era só eu a pescar nela, porque se eu tinha dez marambaia, aí eu não podia pescar em todas as dez, porque não dava tempo para pescar. (Raimundo Odacir Alves).

Tem gente que sabe, mas a gente respeita o trabalho um do outro, porque sabe o trabalho que dá para fazer e que você gasta então tem que respeitas o trabalho um do outro, mas por traz tem sempre aquele que às vezes passam pela sua marambaia e pela marcação sabem também [...] As marambaias tem dono, a pescaria tem dono. Pescarias antigas todo mundo conhece. (Francisco Helieudo Silva).

O mapa mental produzido por Raimundo Odacir Alves (FIGURA 54)

mostra a localização das primeiras marambaias produzidas (1, 2, 3, 4) pelo

mesmo e que se localizavam relativamente próximas à costa. No entanto,

segundo o mesmo, com a apropriação das pescarias por outros pescadores as

primeiras marambaias foram abandonadas ou vendidas e novas marambaias

foram construídas em profundidades maiores.

Page 185: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

184

A atual localização dessas pescarias é obtida através do GPS e a

probabilidade de outro pescador que não seja o dono encontrá-la é diminuída

pela ausência visual de referenciais em terra.

FIGURA 54 - Evolução da localização das pescarias feitas com marambaias. Mapa Mental. Autor: Raimundo Odacir Alves, 2007. Em ordem crescente, (1 a 8) marambaias posicionadas de acordo com a distância da costa e cronologia.

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É. Eu butava ela lá, aí deixava uma boinha, aí botava uma marcação uma boinha pra quando eu fosse butar aqui, aí eu butava uma outra boinha ali, aí um chegava lá pra pescar, aí aonde dava peixe, aí todo mundo pescava. Aí de certos tempos pra cá eu comecei a fazer e a botar mais longe lá mais pra longe, marcando ela no GPS, aí lá só quando nós ir pescar eu levo um pescador pra pescar mais eu, aí ele não acerta porque é longe. Dezessete braça. Todas elas. Tenho três com dezessete braças e tenho uma com umas quatorze braças. As mais de perto eu dei tudinho. Tudo. Dei e eu vendi só uma. A negada começaram a pescar aí pediram aí não tinha cara de pau de dizer não, aí eu tive que dar. (Raimundo Odacir Alves).

Quanto ao uso das marambaias como atratores artificiais, Nascimento

(2006) aponta que se devem adotar critérios que eliminem o uso generalizado

de resíduos ou “lixo” nos mares, que podem contaminá-lo e ferir pescadores,

além de integrar o programa a estrutura cênica dos ecossistemas envolvidos.

Apesar do estudo de caso em Icapuí ter demonstrado incremento da

produtividade local em um primeiro momento, impactos negativos surgiram

como a captura de indivíduos juvenis, a redução da biomassa e da pesca local,

desequilibrando o ecossistema ao longo do tempo (NASCIMENTO, op. cit.).

Dessa forma estudos que avaliem a captura através do emprego de

marambaias se fazem necessários para avaliar se as estruturas de fato atuam

no incremento da produtividade da pesca na Caponga.

4.2.2.2 GPS

A introdução do GPS no contexto pesqueiro da Caponga é bastante

recente. O GPS é utilizado quase que com exclusividade na marcação das

pescarias. Os possíveis motivos apontados para a adoção do equipamento

estariam relacionados com o esgotamento das agregações naturais e também

pelo roubo da produção em pescarias marcadas já citados.

Com o auxílio do GPS, as pescarias têm sido alocadas para maiores

profundidades garantindo a exclusividade dos pontos de pesca:

A gente ta afundiado eles passa perto aí eles pega a marcação. Então aquela tá marcada. Agora depois desses aparelhos que tem ai, GPS né? Aí eu fiz uma mais fora que essa aí eles não marcaram ainda mais não. Só pelo aparelho. Eu vou pelo aparelho. (João Jairo Pessoa Silva).

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186

Passamos a usar de uns quatro meses para cá porque antes não tinha de embarcação que usasse. Quem tinha condição de pescar, agora que eu tou pescando com meu irmão e a gente comprou. Mas de primeiro a marcação era só os olhos da gente. (José Valdecir Alves).

Apesar da introdução do GPS, os dois sistemas de marcação tanto por

referencial de terra como o eletrônico são utilizados, sendo o GPS destinado

para as pescarias de maiores profundidades e as marcações utilizadas para as

pescarias mais próximas da costa:

De primeiro marcava as pescaria com uma mata que tem aqui, Mataquiri, serra que sai acolá lá perto do Canindé, e agora nós marcamos por esse GPS quase tudo é marcado. Quem tem hoje GPS não usa mais não. Se perdeu as informação do GPS acabou pescaria. Agora que mais por terra a gente marca por essas serras e por aquelas que acolá agora, o que passou por uma a quatro e cinco horas de viagem é o GPS. Mais para lá tem que marcar tudo de GPS. (José Valdecir Alves).

Acredita-se, á princípio, que o advento do GPS não ponha em risco a

utilização do conhecimento dos pescadores na navegação, nem mesmo na

marcação de suas pescarias através dos pontos de terra, podendo os sistemas

coexistirem sem detrimento às práticas tradicionais. No entanto, como visto por

Marrul Filho (2003) a regulação da utilização dos recursos, redefinida através

da incorporação da lógica de mercado, modifica o conjunto das relações

sociais estabelecendo o individualismo e o utilitarismo, resultando na alteração

de representações e conjuntos de regras tradicionalmente constituídas para a

apropriação dos recursos pesqueiros.

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187

CONSIDERAÇÕES FINAIS

Ir além das análises de componentes e dos sistemas de classificação

nativos na tentativa de compreender – mais que explicar – as relações entre o

“binômio” Sociedade-Natureza tem sido um desafio abarcado pela

Etnoecologia. Para tanto, o praticante necessita inserir-se em diferentes

contextos culturais e sociais abrindo mão muitas vezes de determinados

preceitos acadêmicos.

Realizar uma pesquisa no escopo da Etnoecologia implica em lidar,

resolver ou superar as dificuldades da subjugação em relação à validade e à

importância dos saberes dos pesquisadores nativos. Por outro lado, combater a

mistificação da figura do “bom selvagem” que distorce a realidade dos fatos (e

dos dados) à procura de mecanismos conservadores e mantedores da

“harmonia” e do “equilíbrio ecológico”.

Além disso, exercer a complexidade do método com atenção à

qualitatividade e conviver com a imprevisibilidade tanto do campo como do

objeto de pesquisa é alcançado apenas através das relações com os sujeitos

que detém os saberes.

Abandonar as idéias inicias desta pesquisa - voltadas para o

entendimento dos sistemas ecológico e biológico das espécies-alvo da pesca

na localidade de Caponga - teve como propulsão a ampla gama de

conhecimentos que determinam, orientam, mantém não apenas uma atividade

mas um grupo humano inserido em um ambiente de grande diversidade.

As diferenças culturais que condicionam os seres humanos em

diferentes sociedades e meios trazem além de uma forte demanda pela

adaptação – analogamente ao enigma de Kaspar Hauser – a necessidade de

despir-se de conceitos estabelecidos no âmbito da própria etnografia e da

ciência convencional.

Para pensar, viver, trabalhar e sentir como os Capongueiros - e depois

necessariamente distanciar-se, notoriamente faz-se jus à incursão fundamental

da observação participante na descrição e análise ainda incipiente de um

modelo de apropriação singular da natureza.

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188

O trabalho exposto não teve mais que a pretensão de apresentar alguns

dos importantes aspectos presentes na vida de pesca dos pescadores da

Caponga. Contudo, adiante - pois os laços com a Caponga continuam -, é

mister que sejam abordados com maior aprofundamento e minúcia aspectos

dos sistemas de apropriação de recursos que promovam a mitigação ou

prevenção tanto da conservação de espécies quanto da degradação de

habitats.

Fundamental ferramenta na proposição da gestão de recursos

pesqueiros, o conhecimento histórico e a dinâmica cultural também devem ser

explorados uma vez que o saber dos antigos pescadores se encontra

registrado no banco de dados composto durante a pesquisa.

Igualmente as origens dos mecanismos que atuam além dos sistemas

como os caracteres sobrenatural, comportamental e ainda emocional bem

como as intenções ou ocasionalidades presentes nas práticas dos pescadores

artesanais devem ser analisadas.

Por fim, acrescenta-se que é necessário acompanhar as mudanças no

sistema local de pesca perante a observação do abandono das práticas de

gestão tradicional.

Page 190: A arte do Mar: Ciência dos Pescadores da Caponga, litoral do Ceará

189

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APÊNDICE A

QUESTIONÁRIO PARA CADASTRO DE PESCADOR (A) CAPONGA No. DATA:____/____/________ NOME DO COLETOR(A): _______________________________ TERMO DE CONSENTIMENTO

Estou trabalhando em uma pesquisa com o objetivo de conhecer melhor como vivem os pescadores artesanais da Caponga e como realizam a pesca. Para isto preciso fazer algumas perguntas pessoais. Essas perguntas servem para saber como está a qualidade de vida do pescador e como andam as pescarias. O Senhor(a) não precisa responder nenhuma pergunta que não quiser. As suas respostas honestas a este questionário serão muito importantes para ajudar a conhecer um pouco da história dos pescadores artesanais da Caponga. O Senhor (a) está disposto (a) a participar? (Esclarecer que o estudo não é nenhum tipo de fiscalização do IBAMA/SEAP nem vinculado a Colônia de pesca, associação ou outros). _______________________________________________________ Assinatura do entrevistador (a) certificando que o consentimento Informado foi dado oralmente pelo entrevistado 1. NOME COMPLETO: ________________________________________________________ 2. POSSUI APELIDO? QUAL? __________________________________________________ 3. QUAL A IDADE DO SENHOR (A)? ____________________________________________ 4. ONDE NASCEU?___________________________________________________________ 5. HÁ QUANTO TEMPO PESCA NA CAPONGA? ___________________________________ 6. QUE TIPOS DE MODALIDADE DE PESCA PRATICA? ( ) MANZUÁ ( ) LINHA DE MÃO ( ) CAÇOEIRA ( ) REDE DE ESPERA ( ) ARRASTO ( ) TARRAFA ( ) OUTRAS: 7. COM QUE IDADE COMEÇOU A PESCAR/ QUANTO TEMPO DE PESCA?_________________ 8. SEMPRE TRABALHOU NA PESCA ARTESANAL? ( ) SIM ( ) NÃO SE NÃO: QUE ATIVIDADES DESENVOLVEU? 9. EM QUE LOCAL COMEÇOU A PESCAR? __________________________________________ 10. PORQUE COMEÇOU A PESCAR? 11. PRETENDE CONTINUAR NA PESCA? POR QUÊ? 12. GOSTARIA DE PASSAR O OFÍCIO ADIANTE? POR QUÊ? 13. OS FILHOS CONTINUAM A PROFISSAO? ( ) SIM ( ) NÃO POR QUÊ? 14. É PROPRIETÁRIO DE EMBARCAÇÃO? ( ) SIM ( ) NÃO SE SIM, QUAL (IS)? SE NÃO, EM QUE EMBARCAÇÃO (OES) E COM QUEM TRABALHA? 15. QUANTAS PESSOAS MORAM NA SUA CASA E QUANTAS DEPENDEM DO SEU SUSTENTO? 16. A PESCA É A PRINCIPAL FONTE DE RENDA DA FAMÍLIA?

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( ) SIM ( ) NÃO 17. PARTICIPA DE OUTRA ATIVIDADE LIGADA À PESCA? ( ) SIM ( ) NÃO SE SIM, QUAL? SE NÃO, PRATICA OUTRA ATIVIDADE, QUAL? 18. ALGUMA OUTRA PESSOA DA FAMÍLIA PARTICIPA DA ATIVIDADE DA PESCA? ( ) SIM ( ) NÃO SE SIM, QUEM (PARENTESCO E NOME SE POSSÍVEL)? 19. O QUE O SENHOR MAIS GOSTA EM SER PESCADOR? POR QUÊ? 20. QUAIS AS PRINCIPAIS VANTAGENS DA PESCA NA CAPONGA? 21. QUAIS AS PRINCIPAIS DESVANTAGENS DA PESCA NA CAPONGA? 22. ACHA QUE A PESCA DEVERIA MELHORAR? ( ) SIM ( ) NÃO SE SIM, O QUE DEVERIA MUDAR? SE NÃO, POR QUÊ? 23. QUANTOS PESCADORES TÊM NA CAPONGA APROXIMADAMENTE? _________________ 24. E QUANTAS EMBARCAÇOES? _________________________________________________ PODERIA INDICAR PESCADORES NA COMUNIDADE PARA CONVERSAR SOBRE: OBSERVAÇOES:

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APÊNDICE B

QUESTIONÁRIO CADASTRO DE EMBARCAÇOES E ATIVIDADE DE PESCA NA CAPONGA DATA: ____/____/ _____ COLETOR: ___________________________ No. _______ TERMO DE CONSENTIMENTO

Estou trabalhando em uma pesquisa com o objetivo de conhecer melhor como vivem os pescadores artesanais da Caponga e como realizam a pesca. Essas perguntas servem para

fazer um levantamento das embarcações e da atividade de pesca na Caponga. As suas respostas honestas a este questionário serão muito importantes para ajudar a conhecer um pouco da história dos pescadores artesanais da Caponga. O Senhor (a) está disposto (a) a participar? (Esclarecer que o estudo não é nenhum tipo de fiscalização do IBAMA/SEAP ou

outros). _______________________________________________________ Assinatura do entrevistador (a) certificando que o consentimento Informado foi dado oralmente pelo entrevistado 1. NOME DA EMBARCAÇÃO: __________________________________________________ 2. NOME DO PROPRIETÁRIO: _________________________________________________ 3. O SENHOR PESCA? ( ) SIM ( ) NÃO*** 4. TIPO DE EMBARCAÇÃO: ( ) PAQUETE ( ) JANGADA ( ) BOTINHO ( ) BOTE DE CASCO ( ) OUTRO: ________________________________________________________________ 5. ONDE ENCALHA? ( ) PORTO DE CIMA ( ) PORTO DO MEIO ( ) PORTO DE BAIXO ( ) OUTRO: ________________________________________________________________ 6. LOCAL DE CONSTRUÇÃO: ______________________________________ ANO: ______ 7. TAMANHO DA EMBARCAÇÃO: TAMANHO (palmos/ metros): ___________ LARGURA (palmos/ metros):______________ 8. QUEM CONSTRUIU? _______________________________________________________ 9. VALOR APROXIMADO DA EMBARCAÇÃO: ______________________________________ 10. CAPACIDADE DE CARGA: PESCADO(KG): ________________ EQUIPAMENTO E MANTIMENTOS KG):_______ 11. COM QUANTO TEMPO BOTA PARA CIMA PARA UMA GERAL? ___________________ 12. QUANTO TEMPO DEMORA (APROXIMADAMENTE)? ___________________________ 13. EM QUE ÉPOCA É GERALMENTE FEITO? ( ) NO VERÃO ( ) NO INVERNO 14. QUAL É O MATERIAL DE CONSTRUÇÃO (DESCREVER CADA UMA PAS PARTES)? DO CASCO DA MASTREAÇÃO DAS VELAS *** SE NÃO PESCA O QUESTIONÁRIO TERMINA AQUI. 15. COMO SE ORIENTA NO MAR? 16. USA EQUIPAMENTO(S) PARA AJUDAR NA NAVEGAÇÃO (ELETRÔNICOS OU NÃO)? ( ) SIM ( ) NÃO SE SIM, QUAL (IS)? 17. USA ALGUM TIPO DE EQUIPAMENTO PARA COMUNICAÇAO COM TERRA ? ( ) SIM ( ) NÃO SE SIM, QUAL (IS)? SE NÃO, POR QUÊ?

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18. USA ALGUM TIPO DE EQUIPAMENTO DE SEGURANÇA? ( ) SIM ( ) NÃO SE SIM, QUAL (IS)? SE NÃO, O QUE GARANTE A SEGURANÇA A BORDO? 19. QUAL O NÚMERO DE TRIPULANTES/ PESCADORES NA EMBARCAÇÃO? __________ 20. A TRIPULAÇAO É FIXA? ( ) SIM ( ) NÃO SE NÃO, COMO FORMA A TRIPULAÇAO? 21. QUAL O TIPO de pesca QUE PRATICA? ( ) MANZUÁ ( ) LINHA DE MÃO ( ) CAÇOEIRA ( ) REDE DE ESPERA ( ) OUTRA: 22. COMO É FEITA A DIVISÃO DA PRODUÇÃO/CAPTURA ENTRE PESCADORES? (EXPLICAR) 23. QUANTAS VIAGENS SÀO FEITAS EM UM MÊS (APROXIMADAMENTE) QUANDO ESTÁ NO VERÃO? ________________________ NO INVERNO? _________________________ 24. QUAL A DURAÇÃO EM MÉDIA DE UMA PESCARIA INCLUINDO A VIAGEM (HORAS / DIAS) NO VERÃO? ________________________ NO INVERNO? ________________________ 25. QUANTO TEMPO LEVA A CHEGAR AO PESQUEIRO? (HORAS / DIAS) NO VERÃO? _________________________ NO INVERNO? _______________________ 26. O QUE SE COSTUMA SAIR PARA PESCAR NO VERÃO? 27. O QUE SE COSTUMA SAIR PARA PESCAR NO INVERNO? 28. QUAL É A MELHOR ÉPOCA DE PESCA? ( ) NO VERÃO ( ) NO INVERNO POR QUÊ? 29. QUAL O DESTINO DA PRODUÇÃO? E A PORCENTAGEM? DESTINO PORCENTAGEM DA CAPTURA (%) ( ) BARRACÃO/ ATRAVESSADOR ( ) VENDA NA PRAIA (TURISTAS/OUTROS) ( ) BENEFICIAMENTO PRÓPRIO ( ) CONSUMO PRÓPRIO ( ) DESCARTE ( ) DOAÇÃO OUTROS DESTINOS: 30. A QUEM PREFERE VENDER A PRODUÇÃO? POR QUÊ? OBSERVAÇOES

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APÊNDICE C

CARACTERIZAÇÃO CADEIA PRODUTIVA E COMERCIALIZAÇÃO DO PESCADO – CAPONGA

Data da entrevista:___/___/ 2007 Entrevistado: ___________________________________

1. Nome do estabelecimento e/ou responsável: 2. Ramo de atividade: ( ) Comercialização ( ) Beneficiamento 3. Classificação das unidades de produção: ( ) Individual ( ) Familiar/Parceria ( ) Empresarial 4. Origem do pescado: ( ) Artesanal Local ( ) Artesanal Externa ( ) Industrial 5. Para onde vai o pescado (Municípios/ Região/ Estado/ País) 6. Qual o destino da venda do pescado? ( ) Restaurante ( ) Comércio ( ) Direto consumidor ( ) Repasse Outros: 7. Formas de Beneficiamento: ( ) Resfriado ( )

Congelado ( ) In Natura

( ) Eviscerado

( ) Filetado ( ) Postas

Outros: 7. Como é feita a estocagem/conservação do pescado? ( ) Gelo ( ) Freezer ( ) Câmara Frigorífica Outro: 8. Meio de Transporte ( ) Pé ( ) Bicicleta ( ) Moto ( ) Carro ( ) Utilitário ( ) Caminhonete Outro: 9. Número de pessoas envolvidas Min: ________________ Max: ________________ 10. Vínculo empregatício: ( ) Diarista ( ) Mensalista ( ) Por produção Outro: 11. Qual seria o volume (kg) de pescado comercializado semanalmente? 12. Que tipos de pescado comercializa/ compra? Por quê? 13. Que tipo de pescado que não comercializa/ compra? Por quê? 14. Qual o tipo de pescado que não se encontra mais para comprar? 15. Tem fornecedores fixos? ( ) Sim ( ) Não 16. Se SIM, de que jangadas/ pescadores compra? 17. Quais os tipos de pescado que mais tem venda? 18. Quanto tempo comercializa o pescado? E na Caponga? 19. Quais as vantagens de comprar o pescado na Caponga? 20. Quais as desvantagens de comprar o pescado na Caponga?

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APÊNDICE D

Créditos das Pranchas:

Prancha 1: Colaboradores. Fotos 01, 03, 05, 07, 09, 12, 14, 15, 16, 18, 19 (Áthila Andrade Bertoncini) e 02, 04, 06, 08, 10, 11, 13, 17, 20, 21, 22, 23, 24, 25, 26, 27, 28 (Maíra Borgonha).

Prancha 2: Panorama Caponga . Fotos 01, 02, 03, 04, 05, 06, 07, 08, 09, 10, 12, 13, 14, (Maíra Borgonha) e 11, 15 (Áthila Andrade Bertoncini).

Prancha 3: Caponga. Fotos 01, 02, 03, 04, 05, 06, 07, 08, 09 e 10 (Maíra Borgonha).

Pranchas 4 e 5: Aprendizado. Fotos 04, 05, 11,13 (Maíra Borgonha) e 01, 02, 03, 06, 07, 08, 09, 10, 12, 14, 15 (Áthila Andrade Bertoncini).

Pranchas 6 e 7: Botadores. Fotos 01, 02, 03, 04, 06, 07, 08, 09, 10 (Áthila Andrade Bertoncini) e 05 (Maíra Borgonha).

Prancha 8 e 9: Leilão. Fotos 01, 02, 03, 04, 05, 06, 07, 08, 09, 10, 11, 12, 13, 14, 17, 19, 20, 21, 22, 23, 25, 27 (Áthila Andrade Bertoncini) e 15, 16,18, 24, 26, 28, 29, 30, 31 (Maíra Borgonha).

Pranchas 10 e 11: Ir para o mar. Fotos 10, 17, 18 (Maíra Borgonha) e 11, 12, 13, 14, 15, 16 (Áthila Andrade Bertoncini).

Pranchas 12 e 13: Encalhe. Fotos 01, 02, 03 (Áthila Andrade Bertoncini) e 04, 05, 06, 07, 08 (Maíra Borgonha).

Pranchas 14 e 15: Pesca de Piúba. Fotos 01, 02, 03 (Maíra Borgonha) e 04, 05, 06, 07, 08, 09, 10, 11, 12, 13 (Áthila Andrade Bertoncini).

Prancha 16: Equipamentos. Fotos 01, 02, 03, 07 (Maíra Borgonha) e 04, 05, 06, 08, 09 (Áthila Andrade Bertoncini).

Prancha 17: Pesca de tarrafa. Fotos 01, 02, 03, 04, 05, 06, 07, 08, 09 (Maíra Borgonha).

Prancha 18: Espécies. Fotos 02, 03, 04, 05, 09, 10 (Maíra Borgonha) e 01, 06, 07, 08, 11 (Áthila Andrade Bertoncini).

Prancha 19: Aula de navegação astronômica. Fotos 01, 02, 03, 04, 05, 06 (Áthila Andrade Bertoncini)

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APÊNDICE E

Nome comum Nome Científico Agulha preta Hemiramphus brasiliensis

Arabaiana Seriola dumerili

Ariacó Lutjanus synagris

Arraia verdadeira Dasyatis americana

Bagre branco Arius sp.

Bicuda Sphyraena barracuda

Bijupirá, beijupirá Rachycentron canadum

Biquara Haemulon plumierii

Bonito Euthynnus alletteratus

Budião (redondo) Sparisoma frondosum

Cambuba Haemulon parra

Camurupim Megalops atlanticus

Cangulo Balistes vetula

Cangulo véio Aluterus monoceros

Cangulo preto Balistes capriscus

Caranha Lutjanus cyanopterus

Cavala verdadeira Scomberomorus cavalla

Cavala impingem Acanthocybium solandri

Cioba Lutjanus analis

Dentão Lutjanus jocu

Dourado Coryphaena hippurus

Ferrero Caranx lugubris

Galo Selene setapinnis

Garajuba amarela Carangoides bartholomaei

Garajuba preta Caranx crysos

Garapau Sphyraena sp. Garopa Epinephelus morio

Piramutama preta Dermatolepis inermis

Guaiúba Ocyurus chrysurus

Guaraximbora Caranx latus

Guaxum Elagatis bipinnulata

Lanceta Acanthurus bahianus

Lanceta Acanthurus chirirgus

Mariquita Holocentrus adscensionis

Moréia Muraena pavonina

Moreia pintada Gymnothorax vicinus

Moreia pintadinha Gymnothorax moringa

Moreia verde Gymnothorax funebris

Oião Selar crumenophthalmus

Olho de boi Priacanthus arenatus

Baiacu caixão Acanthostracion polygonius

Pacamon Batrachoides surinamensis

Pargo olho de vidro Lutjanus vivanus

Pargo pincel Paranthias furcifer

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...continuação

Nome comum Nome Científico Parum Chaetodipterus faber

Pena Calamus penna

Piolho de cação Echeneis naucrates

Pirá Malacanthus plumieri

Piraúna Cephalopholis fulva

Porco Canthidermis sufflamen

Sapuruna preta Haemulon melanurum

Sardinha bandeira Opisthonema oglinum

Serra Scomberomorus brasiliensis

Sirigado Mycteroperca bonaci

Soia Bothus ocellatus

Trombeta Fistularia tabacaria

Tubarão lixa Ginglymostoma cirratum

Voador Cypselurus sp. Xira Haemulon aurolineatum

Zambaia roliça Tylosurus acus acus

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ANEXO A

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