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Resumo

! A obra Homo Academicus, escrita em 1984 pelo socilogo Pierre Bourdieu (1930-2002 ) , foi publicada no Brasi l tardiamente, apenas em 2011. Dizemos tardiamente porque a linguagem forjada por Bourdieu em seus textos est muito presente no espao acadmico, e porque essa obra se insere num dos temas que mais o tornou conhecido do pblico brasileiro: o sistema de ensino, suas formas de reproduo social e os interesses acadmicos e polticos nele imbricados.!

Palavras-Chave: campo, ensino, Bourdieu.!

!! A obra Homo Academicus, escrita em 1984 pelo socilogo Pierre Bourdieu (1930-2002), foi publicada no Bra s i l t a rd iamente , apena s em 2011 . Dizemos tardiamente porque a linguagem forjada por Bourdieu em seus textos e s t mui to presente no espao acadmico, e porque essa obra se insere num dos temas que mais o tornou conhecido do pblico brasileiro: o sistema de ensino, suas formas de reproduo social e os interesses acadmicos e polticos nele imbricados.!

! Engajado na produo de uma sociologia crtica, o autor procurou compreender as relaes entre cultura, cincia,

escola, mdia e reproduo social, delineando ao longo de sua trajetria um sistema de explicao sociolgica da dominao social. Entre as obras que circundam esses temas citamos aqui: Les hritiers (1964), A reproduo (1970) - ambas foram escritas com a parceria de Jean-Claude Passeron -, Homo Academicus (1984) e La noblesse d tat (1989). !

! Dentre esses textos foi em Homo Academicus que o autor encarou veemente as regras do seu prprio campo, ou seja, o campo universitrio francs. O livro possui cinco captulos, quatro anexos que conduzem o leitor a base emprica da pesquisa, e um Posfcio. O texto - que se situa contextualmente entre momentos antes, durante e ps Maio de 1968 - penetra nas estruturas do mundo acadmico tentando desnudar conchavos, interesses, conflitos, relaes de fora, crises e

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Denouncing secrets: the bourdesian analysis of the academicals field!Abstract

The Homo Academicus work, written in 1984 by sociologist Pierre Bourdieu (1930-2002), was published in Brazil later in 2011 alone. We say late because language forged by Bourdieu in his texts is very present in the academic space, and why this work is part of a issue which made him known to the Brazilian public: the education system, their social reproduction and academic interests and political interwoven in it. !Keywords: field, education, Bourdieu. !Secretos denunciantes: anlisis bourdieusiana del campo acadmico!Resumen

El trabajo Homo Academicus, escrito en 1984 por el socilogo Pierre Bourdieu (1930-2002), fue publicado en Brasil despus de 2011 solamente. Decimos tarde porque el lenguaje forjado por Bourdieu en sus textos est muy presente en el espacio acadmico, y por qu este trabajo es parte de un tema que lo hizo conocido para el pblico brasileo: el sistema educativo, su reproduccin social y acadmico de los intereses y entretejido en lo poltico. !Palabras claves: campo, educacin, Bourdieu.

Delatando Segredos: a anlise bourdieusiana do campo acadmico Daiane Vaz Machado*

*.Doutoranda do Programa de Ps-Graduao em Histria - UNESP, bolsista FAPESP.

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ruptura de equilbrios. Sem dvida uma tarefa rdua, pois analisar cientificamente o mundo universitrio tomar como objeto uma instituio que socialmente reconhecida como fundada para realizar uma objetivao que pretende a objetividade e a universalidade (BOURDIEU, 2011, p. 289). Denota-se, ento, a complexidade de se analisar uma instituio que dotada de poder simblico no espao social. !

! Se a inteno do autor na obra foi demolir o Homo academicus, classificador entre os classificadores, nas suas prprias classificaes (BOURDIEU, 2011, p. 287), ou seja, delatar os segredos da sua classe, este no seria Um livro para queimar?. Esse o ttulo do primeiro captulo, nele o autor trata das implicaes epistemolgicas e ticas de se analisar o campo universitrio. O olhar sociolgico precisa estar sob vigilncia epistemolgica e o analista deve distanciar-se, mas sem perder os benefcios da familiaridade, assumindo o risco de possveis reducionismos ao interpretar o mundo social no qual participa. Dito isso, cabe antes de seguirmos apresentado o texto nos deter em alguns conceitos da sociologia bourdieusiana que so chaves interpretativas para o estudo do mundo acadmico francs.!

! Bourdieu fundamenta sua sociologia na filosofia da cincia, ou relacional, em que concebe primazia s relaes, e na filosofia da ao, s vezes chamada de disposicional, !

[...] que atualiza as potencialidades inscritas nos corpos dos agentes e na estrutura das situaes nas quais eles atuam ou, mais precisamente, em sua relao. Essa filosofia condensada em um pequeno nmero de conceitos fundamentais habitus, campo, capital e que tem como ponto central a relao, de mo dupla, entre as estruturas objetivas (dos campos sociais) e as estruturas incorporadas (do habitus) (BOURDIEU, 1996, p. 10, grifo do autor).!

! Em termos analticos, o campo permite pensar o funcionamento de uma sociedade intelectual, artstica, literria, cientfica, poltica, etc., e pode ser entendido como um espao marcado por relaes de fora, interesses e estratgias (SILVA, 2002, p. 120), em que os agentes que nele se encontram envolvidos se enfrentam com meios e fins diferenciados. Essa noo pressupe a anlise do habitus, estruturas mentais adquiridas e incorporadas atravs da herana cultural e da formao educacional (SILVA, 2002, p. 119). O habitus vincula um conjunto de indivduos entre si por uma afinidade de estilo, essa unidade pressupe princpios geradores de prticas distintas, distinguindo-se o agente pelas suas escolhas, bens e aes; e distintivas, pois diferencia o agente de outros modos de vida.!

! Segundo Bourdieu, distino de fato diferena, separao, trao distintivo, resumindo, propriedade relacional que s existe em relao a outras particularidades (BOURDIEU, 1996, p. 18, grifo do autor). No estudo das prticas de distino, o autor tambm utiliza termos da economia, como quando trata dos princpios de diferenciao: capital econmico, social, cultural e simblico. !

! Essas noes-chave aparecem fortemente no segundo captulo, quando o autor analisa O conflito das faculdades. Bourdieu demonstra que existe uma hierarquia social das faculdades e dentro delas das diferentes disciplinas. Para tanto, ele faz uma prosopografia dos professores trabalhando com dados estatsticos gerados a partir de indicadores pertinentes, tais como: capital econmico e social herdado; determinantes escolares; capital de poder universitrio; capital de poder cientfico; capital de prestgio cientfico; capital de notoriedade intelectual; capital de poder poltico e econmico; disposies polticas em sentido amplo. Com grficos de Anlise de correspondncias, o autor procura evidenciar a relao existente entre o capital herdado, a distribuio dos agentes nas

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faculdades e as posies que ocupam na hierarquia institucional. A anlise explora a oposio existente no interior das faculdades de Medicina e Direito e de Letras e Cincias Humanas, e explicita como o campo universitrio francs organizava-se de acordo com dois princpios de hierarquizao antagnicos: a hierarquia social segundo o capital herdado e o capital econmico e poltico atualmente detido se ope hierarquia especfica, propriamente cultural, segundo o capital de autoridade cientfica ou de notoriedade interna (BOURDIEU, 2011, p.78).!

! Assim, e j no terceiro captulo, Bourdieu pe em xeque a ideia da meritocracia cientfica que consagra institucionalmente determinados agentes. Segundo o autor, o campo das letras e das cincias humanas se organiza em torno da oposio entre duas espcies de poder: O poder propriamente universitrio controla os instrumentos de reproduo do corpo professoral; e o poder ou autoridade cientfica aquele medido pela direo de uma equipe de pesquisa, pelo nmero de publicaes, citaes, tradues, enfim, pelo prestgio intelectual e cientfico. Esses poderes dividem-se, por exemplo, entre as prprias faculdades, h distines entre aqueles que se formaram e posteriormente ingressaram como profissionais na Sorbonne, no Colgio de Frana ou na Escola dos Altos Estudos. !

! A autoridade dentro das faculdades est ligada a uma lgica de reproduo e conservao do grupo, que pode ser independente do valor cientfico das produes, uma vez que o capital universitrio se obtm e se mantm por meio da ocupao de posies que permitem dominar outras posies e seus ocupantes [...] (BOURDIEU, 2011, p. 115). Com um tom que soa at mesmo agressivo, Bourdieu chama os orientandos de clientes de seus orientadores, pois muitas vezes no so as afinidades intelectuais que predominam na relao entre eles, mas sim as sociais. Estritamente ligada escolha de um orientador poderoso est o sucesso na carreira docente e, consequentemente, a conquista de postos institucionais. O panorama abala-se com as mudanas na estrutura universitria inseridas no contexto da crise de Maio de 1968, tema do captulo seguinte. !

! O crescimento da populao dos estudantes e dos professores subalternos (assistentes e mestres-assistentes), o aumento da influncia de instncias de consagrao externa (como o jornalismo cultural), a criao de Centro de Pesquisa e a emancipao de algumas disciplinas, evidenciam um momento de mudanas morfolgicas no campo. Surge, assim, a crise das geraes universitrias, o confronto quanto aos critrios para admisso e ascenso na carreira. Maio de 1968 francs considerado O momento crtico (nome do ltimo captulo) para a estrutura universitria francesa, pois pe em suspenso a ordem ordinria das sucesses e a experincia ordinria do tempo como presena num futuro j presente (BOURDIEU, 2011, p. 234).!

! Os posicionamentos polticos, as filiaes sindicais, as opinies publicadas durante as jornadas de Maio de 1968, correspondem aos embates das diferentes geraes universitrias e evidenciam que so as posies no campo universitrio que orientam os posicionamentos sobre a poltica em geral e sobre os problemas universitrios (BOURDIEU, 2011, p. 295). Bourdieu compreende a crise universitria como parte da crise geral de Maio de 1968, que , por sua vez, resultado da sincronizao de crises latentes de diferentes campos (BOURDIEU, 2011, p. 233), visto que em distintas esferas contestaram-se as bases do centralismo do poder poltico, econmico e cultural do mundo social francs. !

! Ao finalizar sua anlise, o socilogo avalia que a nova vida estudantil parece ter atrado os mestres contestadores do poder e tambm os professores que se adaptaram as novas condies, sinalizando que se vive no ps-Maio de 1968 uma espcie de nova experimentao social.!

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! Em Homo Academicus, o funcionamento da estrutura universitria delatado, o espao do dilogo, da produo do saber cientfico tambm o lugar em que se encontram e se confrontam interesses polticos e econmicos. Embora a escolha do espao de observao tenha sido o francs, com esta traduo o leitor brasileiro tem em mos uma anlise que pode gui-lo criticamente no estudo da histria das engrenagens do nosso campo acadmico, considerando, claro, as nossas particularidades.!

!Referncias!BOURDIEU, Pierre. Razes prticas: Sobre a teoria da ao. Trad. Mariza Corra. Campinas, SP: Papirus, 1996. !

BOURDIEU, Pierre. Homo academicus. Florianpolis: Editora da UFSC, 2011.!

SILVA, Helenice R. da. Fragmentos da histria intelectual: Entre questionamentos e perspectivas. Campinas, SP: Papirus, 2002.!

!Recebido em: 13/03/2012 Aprovado em: 22/04/2013

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