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LFG – CONSTITUCIONAL – Aula 08– Prof. Marcelo Novelino – Intensivo I – 15/05/2009 Qual é a diferença principal deste método para o método tópico-problemático? É que no método hermenêutico-concretizador há uma primazia da norma sobre o problema. Essa questão foi cobrada na prova de procurador federal (Cespe) e o problema dizia justamente o contrário, dizia que no método hermenêutico- concretizador, o problema tinha uma primazia sobre a norma. O problema tem primazia sobre a norma no tópico-problemático, onde vimos que o intérprete parte do problema para a norma. A crítica feita a este método é a feita a todos os métodos concretistas. A crítica se baseia em dois aspectos: Quebra da unidade e enfraquecimento da força normativa da Constituição. A partir do momento que partem dessa idéia de concretização isso pode gerar uma quebra da unidade constitucional e enfraquecer a sua força normativa, por considerar alguns elementos além do texto normativo. 5. MÉTODO NORMATIVO-ESTRUTURANTE – Friedrich Müller É um método semelhante ao anterior. A premissa da qual ele parte é a mesma premissa dos métodos concretistas. Segundo ele, nós não devemos falar em interpretação, mas em concretização da norma jurídica. A norma ela não é apenas interpretada. A interpretação é apenas uma das etapas do processo de interpretação da norma. É uma idéia que muitos constitucionalistas adotam: na verdade não há que se falar apenas em interpretação, mas em concretização. Como vocês vão assimilar o conteúdo deste método para não confundi-lo com os demais métodos? A idéia que vocês devem ter é a seguinte: Nós vimos que concretização nada mais é do que a aplicação da norma abstrata ao caso concreto. Concretizar a norma é pegar a norma abstrata e aplicá-la no caso concreto. Ele é chamado de normativo estruturante porque estabelece etapas, estabelece estruturas, para que essa norma abstrata seja concretizada. Estabelece estrutura de concretização da norma jurídica. Ele menciona, por exemplo, como primeiro processo na etapa de concretização, a utilização dos elementos metodológicos. 1. Elementos metodológicos – São os métodos de interpretação e os princípios interpretativos. Então, é como eu disse, a interpretação é apenas uma das etapas 11

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Qual é a diferença principal deste método para o método tópico-problemático? É que no método hermenêutico-concretizador há uma primazia da norma sobre o problema. Essa questão foi cobrada na prova de procurador federal (Cespe) e o problema dizia justamente o contrário, dizia que no método hermenêutico-concretizador, o problema tinha uma primazia sobre a norma. O problema tem primazia sobre a norma no tópico-problemático, onde vimos que o intérprete parte do problema para a norma.

A crítica feita a este método é a feita a todos os métodos concretistas. A crítica se baseia em dois aspectos: Quebra da unidade e enfraquecimento da força normativa da Constituição. A partir do momento que partem dessa idéia de concretização isso pode gerar uma quebra da unidade constitucional e enfraquecer a sua força normativa, por considerar alguns elementos além do texto normativo.

5. MÉTODO NORMATIVO-ESTRUTURANTE – Friedrich Müller

É um método semelhante ao anterior. A premissa da qual ele parte é a mesma premissa dos métodos concretistas. Segundo ele, nós não devemos falar em interpretação, mas em concretização da norma jurídica. A norma ela não é apenas interpretada. A interpretação é apenas uma das etapas do processo de interpretação da norma. É uma idéia que muitos constitucionalistas adotam: na verdade não há que se falar apenas em interpretação, mas em concretização.

Como vocês vão assimilar o conteúdo deste método para não confundi-lo com os demais métodos? A idéia que vocês devem ter é a seguinte: Nós vimos que concretização nada mais é do que a aplicação da norma abstrata ao caso concreto. Concretizar a norma é pegar a norma abstrata e aplicá-la no caso concreto. Ele é chamado de normativo estruturante porque estabelece etapas, estabelece estruturas, para que essa norma abstrata seja concretizada. Estabelece estrutura de concretização da norma jurídica. Ele menciona, por exemplo, como primeiro processo na etapa de concretização, a utilização dos elementos metodológicos.

1. Elementos metodológicos – São os métodos de interpretação e os princípios interpretativos. Então, é como eu disse, a interpretação é apenas uma das etapas de interpretação da norma. Nessa estrutura, feita por Friedrich Müller, a interpretação seria a primeira etapa. A norma vai ser concretizada inicialmente através de elementos metodológicos.

2. Elementos dogmáticos – Também importantes na concretização da norma. Esses elementos são extraídos da doutrina e da jurisprudência. A fundamentação de uma decisão faz várias referências à doutrina, à decisões judiciais anteriores. Essa doutrina e essa jurisprudência usada na fundamentação são elementos para a concretização da norma jurídica. Ajuda o jurista na hora de concretizar a norma, de aplicar o direito ao caso concreto.

3. Elementos teóricos – Por exemplo, a concepção de direito pós-positivista (aproximação do direito moral, normatividade dos princípios ) é elemento teórico importantíssimo na hora de se concretizar uma norma jurídica. Imagine vocês, três juízes: um jusnaturalista, um positivista e um pós-positivista. Cada um dos três vê o direito de uma forma diferente e essa concepção filosófica do direito vai influenciar na concretização.

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4. Política constitucional – O elemento de política constitucional leva em consideração as repercussões da decisão, que tipo de consequencias aquela decisão terá. É uma preocupação que deve estar presente sempre na aplicação da norma jurídica. O juiz, o tribunal, principalmente o STF, que é o guardião da CF, quando vai dar uma decisão, ele se preocupa bastante com as conseqüências daquela decisão, politicamente falando. Em alguns casos mais até do que os aspectos jurídicos. Há preocupação de a decisão do STF estar de acordo com a opinião pública. Essa é uma preocupação recorrente dentro do STF. É claro que isso vai influenciar a decisão do STF. Em alguns casos, não deveria, mas é o que acaba acontecendo.

Há duas distinções feitas por Friedrich Müller quanto ao tema e que merecem atenção:

1ª Distinção: Programa Normativo e Domínio Normativa

Programa Normativo, segundo ele, compreende, tanto o texto da norma, quanto a norma propriamente dita.

Domínio Normativo, segundo ele, está relacionado à realidade social conformada pela norma. É a realidade social tratada pela norma jurídica, à qual a norma se refere.

Ele faz essa distinção e diz que na interpretação, na concretização da Constituição, o intérprete deve considerar não apenas o programa normativo (que é o texto e a norma propriamente dita), e também o domínio normativo, ou seja, deve considerar, além do texto da norma, a realidade social que está sendo tratada.

2ª Distinção: Texto e Norma

Não é uma distinção feita só por ele.

Texto – é apenas a forma de exteriorização da norma – quando vocês lê, por exemplo que a “República Federativa do Brasil, formada pela união indissolúvel dos Estados, dos Municípios e do DF, constitui-se em Estado Democrático de Direito”, isso é o texto da norma. A norma em si é o mandamento que está contido dentro daquele texto. A partir do momento que vocês interpreta esse texto é que vocês reconhece a norma ali contida.

Norma – é o resultado da interpretação do texto. Há vários autores que dizem que a norma só surgem após a interpretação. Antes disso não dá para saber qual é á norma.

Qual seria a função do texto, já que a norma é o mandamento ali contido. A função do texto consiste, basicamente, em limitar e dirigir a atuação do intérprete para qual o sentido a norma está apontando. Então o texto tem função diretiva e limitativa. É importante saber isso porque facilita o entendimento das limitações constitucionais. Uma limitação, para ser legítima, tem que ser conformada pelo texto da norma. A gente não pode ignorar o que fala o texto.

Crítica ao método normativo-estruturante – Este é um método concretista e a crítica feita a ele é a mesma feita aos demais métodos concretistas: quebra da unidade e enfraquecimento da força normativa.

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Esse quinto, é o último método clássico de interpretação. Aqui no Brasil, Paulo Bonavides acrescenta um sexto método a esse grupo de métodos, um sexto método que, a meu ver, não é método propriamente dito porque ele não traz nenhum critério específico de interpretação. Ele se refere mais ao sujeito da interpretação, àquele que vai fazer a interpretação constitucional, mas eu já vi algumas cobrando como se fosse método mesmo, como faz Paulo Bonavides. Então, nós vamos incluir, junto com esses cinco métodos tradicionais, um sexto método de interpretação constitucional.

6. MÉTODO CONCRETISTA DA CONSTITUIÇÃO ABERTA – Peter Häberle

Este método concretista é atribuído a um autor alemão chamado Peter Härbele. Ele tem uma obra muito conhecida, chamada “Hermenêutica Constitucional” onde ele fala da 'Sociedade Aberta dos Intérpretes da Constituição'.

Observem que est e livro foi traduzido para o Português pelo Ministro Gilmar Mendes, daí vocês podem imaginar como a doutrina de Peter Häberle influencia a doutrina de Gilmar Mendes e influencia os seus votos no STF.

A idéia básica do livro é a seguinte: Peter Häberle disse que a interpretação constitucional não pode ser atribuída apenas a um círculo fechado de intérpretes, como defende Konrad Hess. Segundo ele, são legítimos intérpretes da Constituição todos aqueles que vivem na realidade constitucional. Ele propõe uma abertura da interpretação constitucional para todas as pessoas.

“A interpretação constitucional não deve se restringir apenas a um círculo fechado de intérpretes. Todo aquele que vive uma realidade constitucional deve ser considerado um legítimo intérprete (ou, pelo menos, um pré-intérprete).”

Peter Häberle não nega que a palavra definitiva é dada pela corte constitucional. No entanto, existem casos que sequer chegam ao Judiciário, em que a Constituição é aplicada sem a necessidade de intervenção do judiciário. Então ele diz que ainda que a corte dê a palavra final, todos os que vivem em sociedade são legítimos intérpretes da CF. Todos os destinatários da norma constitucional são intérpretes.

Por que ele entende que todo mundo é legítimo intérprete da Constituição? De que premissa ele parte? Peter Häberle vai dizer o seguinte: se a Constituição se dirige não só aos poderes públicos, mas também aos particulares que estão obrigados a obedecer a Constituição, como eles podem obedecer à Constituição se, antes interpretá-la? Sem antes saber qual é o comando contido na Constituição? Nesse sentido, se eu vivo a Constituição, eu tenho que interpretá-la e, por isso, sou um legítimo intérprete.

Um outro ponto fundamental dentro da teoria do Peter Häberle é a idéia de democracia. Ele traz para a interpretação constitucional a idéia de democracia. Häberle diz o seguinte: a democracia deve estar presente não apenas em momentos anteriores de elaboração da lei (representantes legítimos eleitos para elaboração das leis), mas deve estar presente também no momento posterior, depois que a lei é feita, no momento de interpretar a lei. Ele traz a idéia de democracia para dentro da interpretação. A interpretação deve ser democrática, aberta. É a democratização da interpretação constitucional.

Qual é a aplicação prática que nós temos dessa abertura da interpretação constitucional no controle de constitucionalidade brasileiro? O amicus curiae. Ele foi trazido para o controle concentrado, pela Lei 9868/99 a partir dessa idéia. A partir da idéia de que a interpretação

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constitucional deve ser aberta, deve ser democratizada. Além do amicus curiae, a realização de audiências públicas também é uma abertura porque se dá oportunidade à sociedade de manifestarem o seu entendimento sobre esse assunto.

Crítica ao método concretista da constituição aberta: “O alargamento excessivo do círculo de intérpretes pode causar a quebra da unidade e o enfraquecimento da força normativa.” que, afinal é a mesma crítica feita aos métodos concretistas.

Hoje fechamos a primeira parte da hermenêutica constitucional relativa aos métodos específicos de interpretação.

Agora, vamos sair do direito alemão e ingressar no direito norteamericano. Vamos estudar duas posturas que são muito discutidas nos Estados Unidos e que sempre são objeto de questões, principalmente em provas do Cespe.

INTERPRETATIVISMO E NAO-INTERPRETATIVISMO

O Cespe já cobrou algumas vezes essa distinção, que é uma discussão que existe há algum tempo na doutrina norteamericana.

1. INTERPRETATIVISMO

Postura mais conservadora. Há outras denominações que são dadas ao interpretativismo: originalismo, textualismo e preservacionismo.

O que é essa corrente? O interpretativismo é uma corrente mais conservadora porque parte da seguinte idéia? A constituição é feita por representantes do povo, da soberania popular. O juiz, então, quando vai aplicar a Constituição, deve tentar descobrir a vontade original daquele que criou a Constituição (que será a vontade da soberania popular). O povo é o titular do poder constituinte, então não é o juiz que deve atribuir à Constituição, mas deve descobrir qual é o sentido que o povo quis atribuir àquela constituição quando ela foi elaborada.

Premissas do Interpretativismo:

1ª Premissa: “Respeito absoluto ao texto da Constituição (daí textualismo) e a vontade do constituinte originário.” Ele deve respeitar o texto e a vontade do constituinte originário.

2ª Premissa: “Limitação ao conteúdo da Constituição.” o juiz tem a função apenas de aplicar a Constituição e não de modificá-la, sob pena de ir de encontro à soberania popular.

3ª Premissa: “Existe uma única resposta correta.” Aquela idéia de discricionariedade, que está presente na obra de alguns positivistas como Kelsen, por exemplo, de que existe discricionariedade na interpretação, de que o intérprete não estaria limitado, mas que poderia conferir vários sentidos possíveis à norma, é combatida pelo interpretativismo. Isso porque para o interpretativismo só haveria uma única resposta correta que é aquela que corresponde à vontade do constituinte originário. Qualquer outra interpretação seria equivocada.

Essa é uma postura bastante conservadora. Imaginem essas respostas no contexto norteamericano em que a Constituição tem mais de 200 anos. É uma questão muito importante. A segunda corrente, que é progressista é o não-interpretativismo.

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2. NÃO-INTERPRETATIVISMO

É uma corrente progressista. Essa corrente tem um pressuposto bem interessante:

Pressuposto do não-interpretativismo: “Cada geração tem o direito de viver a Constituição ao seu modo.” O raciocínio é o oposto ao dos interpretativistas (que dizem que se o juiz dá interpretação diferente do constituinte originário, estará violando a soberania popular). Já para os não-interpretativistas uma determinada geração não pode impor às gerações futuras a sua vontade. Para aquela geração que fez a Constituição há 200 anos, não pode impor à geração atual aquilo que, na época, ela achava que eram os valores importantes. E quem vai fazer a adaptação dos valores da sociedade à Constituição atual? Quem faz isso, são os tribunais, o Judiciário. Para os não-interpretativistas, o Judiciário teria o dever de desenvolver e evoluir o texto constitucional. É ele que vai adaptar o texto aos valores atuais da sociedade. Observem que essa idéia de desenvolvimento, de evolução do texto pelo Judiciário está diretamente ligada a uma idéia que tem sido bastante discutida no Brasil que é a idéia do ativismo judicial. A corrente não-interpretativista está diretamente ligada ao ativismo judicial.

*O Ativismo Judicial

O que significa o ativismo judicial? Ativismo judicial significa uma postura mais ativa do Judiciário na implementação de direitos. E por que isso acontece no Brasil hoje? O Ministro Lewandowsky, por exemplo, deu uma entrevista onde fala que o STF hoje assumiu um novo protagonismo. Em determinadas questões acaba adentrando no caso do legislador. Celso de Mello tem uma decisão que diz que o ativismo é necessário quando os poderes públicos se omitem ou retardam a implementação de direitos constitucionais.

A questão do ativismo, seja ele judicial, seja ele legislativo, está diretamente ligada à essa atuação dos poderes dentro da Separação dos Poderes. Conrado Libere (USP), em sua tese de doutorado trata muito bem disso: Quando o poder se aproxima de quem é socialmente afetado, ele se fortalece e passa a ter maior legitimidade. A medida que o poder se afasta do que é socialmente aceitável, ele acaba tendo sua legitimidade corroída e se encolhe.

Eu fiz uma pesquisa recentemente e teve um dado bastante elucidador. Há 36 líderes no Congresso. 1/3 desses líderes de bancada respondem a IPL ou a processo penal perante o STF. De todos os parlamentares, 25% respondem a IPL ou a processo penal perante o STF. Hoje há um déficit de legitimidade no Legislativo. A população não confia nos parlamentares. E aliada a essa falta de legitimidade ainda há omissão deliberada, como o direito de greve dos servidores, que não foi regulamentado até hoje e vários outros exemplos. Nosso Legislativo é fraco, a ponto de alguns afirmarem que é o pior Legislativo que tivemos até hoje. Por isso, o ativismo do STF e dos outros tribunais é consequência direta do enfraquecimento do Legislativo. É o que acontece na separação dos Poderes, quando um é mais fraco, o outro acaba ocupando o espaço.

Essa tese de Conrado Libere é muito interessante porque ele chega à conclusão de que no jogo da separação dos Poderes, não devemos analisar a questão apenas a priori. Ele fala que a legitimidade da atuação dos poderes deve ser analisada tanto abstratamente, a priori, quanto no caso concreto. O poder que dá decisões mais legítimas, moralmente mais aceitáveis deve ter um espaço maior. Então, vocês analisa os resultados: Os Poderes que produzem respostas mais legitimas, mais corretas do ponto de vista moral, deve ter um espaço maior.

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Essa questão do ativismo judicial deve ser vista de forma relativa. Em determinados momentos,é bom o Judiciário ter uma postura ativa. Em outros, nem tanto. Em alguns casos esse ativismo pode não ser a melhor opção.

Aqui fechamos a segunda parte da hermenêutica. Agora vamos estudar os princípios interpretativos que das três partes, é a mais cobrada.

III – PRINCÍPIOS INTERPRETATIVOS ou PRINCÍPIOS INSTRUMENTAIS ou POSTULADOS NORMATIVOS

Para falarmos em princípios interpretativos (princípio da interpretação conforme a constituição, princípio da unidade, princípio da força normativa...), primeiro é necessário estudar a distinção entre princípios materiais, princípios instrumentais e regras. Isso tem sido cobrado, inclusive, em primeira etapa. O Cespe faz muito isso.

Postulado Normativo vs. Princípio vs. Regra segundo HUMBERTO ÁVILA

Postulado Normativo – “São normas de segundo grau que estabelecem a estrutura de aplicação de outras normas.” Esta definição de Humberto Ávila corresponde ao que Luís Roberto Barroso e Ana Paula Barcelos chamam de princípios instrumentais.

Por que Humberto Ávila chama o postulado normativo de norma de segundo grau? O postulado normativo não é um princípio que vocês vai aplicar ao caso concreto para resolver diretamente esse caso concreto. O postulado normativo vai ser usado para aplicação de princípios e regras, que são as normas de primeiro grau. Para serem aplicadas, vocês usa como critério o postulado normativo, que é a norma de segundo grau. O princípio da unidade da constituição é usado para interpretar direitos e deveres atribuídos pela Constituição. Eles não estão no texto constitucional. São estudados pela doutrina e pela jurisprudência.

Princípios - “São normas que estabelecem fins a serem buscados pelos poderes públicos.” Essa definição de princípios que ele dá, corresponde aos princípios materiais mencionados por Luis Roberto Barroso. Por exemplo: princípio do direito à privacidade, princípio da moralidade administrativa, princípios da liberdade. São princípios que o Estado deve sempre perseguir, são aplicados diretamente. Como vocês os aplica? Usando os postulados normativos que são os critérios de interpretação (privacidade, liberdade, moralidade administrativa).

Regras - “São normas imediatamente descritivas de: a) comportamentos devidos ou, b) atributivas de poder.” Tanto princípios quanto regras são considerados normas. Só que os princípios são normas que estabelecem um fim e as normas são descritivas de conduta ou atributivas de poder. Exemplo de regra (prescreve imediatamente uma certa conduta): após 3 anos de efetivo exercício, o servidor púbico é estável. Já o direito à privacidade não prescreve uma conduta imediata. Estabelece um fim que é o de proteger o direito à privacidade do indivíduo.

As outras definições que veremos são baseadas no Robert Alexy e Dworkin são definições bastante usadas no Brasil tanto em prova de concurso quanto pela jurisprudência, mais do que as definições de Humberto Ávila.

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Postulado Normativo vs. Princípio vs. Regra segundo ALEXY e DWORKIN

Princípios – “São 'mandamentos de otimização', ou seja, normas que estabelecem que algo seja cumprido na maior medida possível, de acordo com as possibilidades fáticas e jurídicas existentes.”

Regras – “Segundo Dworkin, regras obedecem à lógica de tudo ou nada.” o princípio, como é lógica de otimização obedece à lógica do mais ou menos. Vc aplica o princípio mais ou menos dependendo da situação concreta. O que vem agora não é de Dworkin: “Regras são mandamentos de definição, ou seja, são normas que ordenam que algo seja cumprido na medida exata de suas prescrições.” Esse é um conceito interessante para ser comparado com princípio. A regra obedece a uma lógica diversa da do princípio.

Vejamos o seguinte caso: Aposentadoria compulsória para o servidor público aos 70 anos é uma regra. Ninguém pondera sobre se ele deve ou não continuar trabalhando aos 70. já o princípio não se pode aplicar de forma automática, caso contrário não não haveria TV ou revista falando nada de ninguém em nome do princípio da privacidade. Analisa-se a situação fática e as circunstâncias jurídicas, para perceber quais são os outros princípios envolvidos na questão. Exemplo: Linha Direta – Trata de casos ainda sem solução: a liberdade de informação (foto do suspeito) e o interesse da sociedade justificam a restrição ao direito de privacidade. Linha Direta Justiça – o crime é de grande repercussão, o réu já havia sido condenado, preso e já estava em liberdade. Nesse caso, o direito à privacidade é maior do que a liberdade de informação (que não é atual e relevante). Doca Street ajuizou ação e ganhou indenização. Guilherme de Pádua fez o mesmo (a exibição do programa afetaria seu direito de reinserção social).

Isso tudo mostra que a forma de aplicação de princípios e regras é diferente. A regra, de forma geral, é aplicada através de um procedimento conhecido como subsunção. A norma jurídica é aplicada através de uma subsunção lógica aplicação da premissa maior (norma) à premissa menor (caso concreto). Subsunção lógica: Aplicação da norma ao caso concreto. Ocorreu a hipótese, vocês aplica a regra.

Princípios não são aplicados por subsunção. O procedimento de aplicação dos princípios é outro: é através da ponderação que aplico princípios. Vou ponderar para ver que princípio tem peso maior no caso concreto. Exemplo do dono de editora nazista no Sul. Nesse hc impetrado no STF, ele alegava que judeu não era raça e que não poderia ser considerado racismo. O STF analisou isso entendeu que era crime de racismo e, portanto, imprescritível. Gilmar Mendes e Marco Aurélio colocam, de um lado a liberdade de expressão e do outro o principio da dignidade do povo judeu. Os dois partem da mesma ponderação, dos mesmos princípios e ambos usam o princípio da proporcionalidade nessa ponderação. O curioso é que apesar de ambos terem partido da mesma premissa, Gilmar chega à conclusão de que a proteção à dignidade do povo judeu é um bem maior e de que, portanto, ele deveria ser condenado. Já Marco Aurélio chega à conclusão de que a liberdade de expressão tem interesse maior e ele não deveria ser condenado.

Por essa razão a ponderação é muito criticada. Habermas, por exemplo, que é um dos maiores críticos da ponderação, fala que a utilização da ponderação pode conduzir a um subjetivismo ou a um ? Judicial. O intérprete, com a ponderação, chega ao resultado que quiser.

(Fim da 1ª parte da aula)

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1º Postulado(interpretação da Lei):PRINCÍPIO DA INTERPRETAÇÃO CONFORME A CONSTITUIÇÃO

Esse primeiro postulado não é utilizado para interpretar a Constituição, mas para interpretar as leis a partir da Constituição.

Para entendermos o princípio da interpretação conforme é preciso entender a declaração de nulidade sem redução de texto. É interessante comentarmos sobre dois outros princípios que são premissas para a o entendimento do princípio da interpretação conforme:

Princípio da Supremacia da Constituição

Esse princípio diz que a CF é norma suprema e que, portanto os atos dos poderes públicos só serão válidos se estiverem de acordo com a Constituição. Nós estudamos isso no controle de constitucionalidade na parte de hierarquia de normas.

“Por ser a Constituição a norma suprema, os atos dos Poderes Públicos só serão válidos se estiverem em conformidade com ela.”

A consequencia dessa supremacia constitucional é que vai determinar, tanto a forma de elaboração de leis e atos normativos, quanto o conteúdo dessas leis e atos normativos. As leis e atos dos poderes públicos só serão válidos a partir do momento que obedecerem a forma e o conteúdo estabelecido na Constituição.

Importante: Quando estudamos controle de constitucionalidade, vimos que a supremacia relevante para fins de controle de constitucionalidade é a supremacia formal ou a supremacia material? A supremacia relevante para fins de controle de constitucionalidade é a supremacia formal da Constituição, que decorre da rigidez constitucional. Somente quando a Constituição é rígida ela possui a supremacia formal. Então, para que se possa analisar se o ato tem a forma e o conteúdo determinados pela Constituição, ela tem que ser uma constituição rígida, tem que ter supremacia formal.

Princípio da Presunção de Constitucionalidade das Leis

A presunção de constitucionalidade parte da seguinte premissa: Se a Constituição é a norma suprema, significa que os poderes públicos (Legislativo, Executivo e Judiciário) retiram suas competências da Constituição. Se os poderes públicos retiram suas competências da Constituição, presume-se que eles agiram de acordo com ela.

Essa presunção é apenas uma presunção relativa, que admite prova em contrário (daí admitir-se o controle de constitucionalidade). Se não existisse essa presunção de constitucionalidade não haveria imperatividade. Para que a norma seja imperativa, ou seja, para que todos a obedeçam, é preciso haver essa presunção. Enquanto você não provar que ela é incompatível com a Constituição, ela é obrigatória e tem que ser observada.

Essa presunção de constitucionalidade é reforçada por um controle preventivo de constitucionalidade das leis que nós já estudamos. Nós vimos, quanto ao momento, que o controle preventivo é feito, no caso das leis, pelo Legislativo e pelo Executivo, podendo, excepcionalmente, ser feito até pelo Poder Judiciário. Através de que órgão o Poder Legislativo faz o controle preventivo de Constitucionalidade? Através da CCJ, Comissão de Constituição e

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Justiça. No Caso do Congresso Nacional, como são duas Casas, há dois controles, um na CCJ da Câmara, outro na CCJ do Senado.

Depois de passar pelo controle legislativo, o Executivo também exerce o controle que é feito através do veto jurídico. Se o Chefe do Executivo considerar a norma inconstitucional, a vetará através do veto jurídico.

E pode haver a hipótese de o Judiciário excepcionalmente analisar, mandado de segurança impetrado por parlamentar quando não for observador o devido processo legislativo.

Se há presunção de constitucionalidade das leis, havendo dúvida sobre a constitucionalidade, ela deve ser declarada constitucional ou inconstitucional? Na dúvida, a lei deve ser declarada constitucional.

Feitos esses esclarecimentos, vamos trabalhar com o princípio da interpretação conforme.

O princípio da interpretação conforme é um princípio que só deve ser utilizado diante das chamadas normas polissêmicas ou plurissignificativas. Norma polissêmica ou plurissignificativa é aquela que tem mais de um significado possível. Vamos imaginar uma norma que tenha três interpretações possíveis. A é compatível com a Constituição, a B e a C são incompatíveis. Quando existe uma presunção de que essa norma é constitucional, eu devo ficar com aquela interpretação que seja conforma a constituição porque, dessa forma, eu mantenho a norma no ordenamento jurídico. Eu não a retiro do ordenamento.

Exemplo: uma lei criou um novo imposto que passa a ser exigido imediatamente. O contribuinte recorre ao Judiciário alegando violação ao princípio da anterioridade. O Judiciário pode manter a lei, dizendo que a lei é constitucional, desde que o imposto seja cobrado no exercício financeiro seguinte. A lei foi mantida no ordenamento jurídico, só que a interpretação atribuída a ela foi uma interpretação compatível com a Constituição. Nós já falamos da interpretação conforme quando estudamos a declaração de nulidade sem redução de texto. Segundo o Supremo, a declaração de nulidade sem redução de texto e a interpretação conforme são equivalentes.

Existem dois limites para que a interpretação conforme possa ser usada pelo Judiciário:

1º Limite : Clareza do texto legal – Se o texto da norma é claro, significa que não é polissêmico. Se for claro é um texto unívoco. Em sendo assim, ele será interpretado naquele único sentido possível. Se é um texto unívoco, não vou fazer uma interpretação conforme. Eu vou interpretar naquele único sentido possível. A clareza do texto é o primeiro limite à interpretação conforme.

2º Limite : Vontade do legislador – Esse é bastante questionado. Segundo a doutrina,a vontade do legislador, que fez a lei, não pode ser substituída pela do juiz a pretexto de conformar essa lei à Constituição. Se a lei é inconstitucional, não pode dar a ela um novo sentido. Se a finalidade da lei é inconstitucional, ele deve fazer essa declaração.

A corrente que defende que o intérprete deve buscar a vontade do legislador é conhecida como corrente subjetivista (busca a vontade do sujeito que faz a lei). A vontade do legislador é chamada de mens legislatoris. A corrente subjetivista busca a mens legislatoris. Existe uma outra corrente, que é a objetivista. A corrente objetivista busca, ano a vontade do legislador, do sujeito, mas a vontade da própria lei, que é chamada de mens legis.

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Através desse princípio se faz o que a doutrina chama de filtragem constitucional. Luis Roberto Barroso usa bastante esse termo. Filtragem porque vocês filtra a lei na Constituição antes ou na hora de interpretá-la. “Filtragem constitucional nada mais é do que uma interpretação da lei à luz da Constituição”. Como a Constituição é o fundamento de validade da lei, para interpretar a lei adequadamente, vocês tem que passar essa lei pelo filtro constitucional, de acordo com os valores do seu fundamento de validade, que são os valores consagrados na Constituição. A partir do momento que vocês faz essa interpretação da lei conforme a Constituição, vocês faz a chamada filtragem constitucional, vocês filtra da lei o sentido que realmente ela deve ter.

Vamos agora tratar dos princípios de interpretação especificamente da Constituição, ou seja, os princípios que você vai utilizar para interpretar o texto constitucional e não o texto infraconstitucional. Este catálogo de princípios que veremos foi desenvolvido pelo Konrad Hesse (autor do método hermenêutico concretizador, força normativa da Constituição) e por Friedrich Müller (autor do método normativo estruturante). Esses foram os principais responsáveis pelos desenvolvimento desse catálogo de princípios, que devem ser estudados dentro dos postulados normativos ou princípios instrumentais. Só que são princípios de interpretação da constituição.

2º Postulado (interpretação da Constituição):PRINCÍPIO DA UNIDADE DA CONSTITUIÇÃO

É considerado o princípio de interpretação mais importante pelo Tribunal Federal Constitucional da Alemanha.

Vocês vão reparar, pela definição que eu vou dar deste princípio, que o princípio da unidade, nada mais é do que uma especificação da interpretação sistemática que vocês já conhecem. O procedimento que esse princípio impõe é um procedimento semelhante ao da interpretação sistemática.

OBS.: Todos os conceitos que eu passarei a dar, são os conceitos de Canotilho, que são justamente aqueles cobrados pelo Cespe. Usa exatamente os conceitos que ele dá. Todo mundo reproduz.

Conceito: “O princípio da unidade da Constituição impõe ao intérprete a harmonização das tensões e conflitos entre normas constitucionais.”

A CF de uma sociedade democrática, pluralista não é fruto de um grande consenso, ela pode ser fruto de pequenos pactos, pequenos consensos. Isso porque cada um tenta fazer valer a sua ideologia. São muitos representantes em debate por diversos interesses. A CF, por isso, é uma colcha de retalhos originada desses pequenos pactos. Um exemplo muito comum de tensão e conflito de normas da Constituição é o direito de propriedade e a função social da sociedade. O direito de propriedade é norma típica do Estado liberal e a função social da propriedade é norma típica de um Estado social. Como compatibilizar isso? Eu posso dizer que uma é inconstitucional em face da outra? Não. Cabe ao intérprete fazer essa composição.

JAS quando interpreta esses dispositivos diz que o direito de propriedade só é garantido uma vez que ela atenda à sua função social. Já Daniel Sarmento faz uma interpretação diferente que, a meu ver é a mais correta: “mesmo que a propriedade não cumpra sua função social, o direito de propriedade continua a ser garantido pela constituição. Ninguém pode ser privado do seu direito de propriedade, mesmo que ele não cumpra sua função social. A diferença é que a

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propriedade que cumpre sua função social tem uma proteção maior do que aquela que não cumpre. SE a propriedade cumpre a função social, não pode ser desapropriada para fins de reforma agrária. Se ela não cumpre, pode. Para ela, a proteção vai ser menor. Essa harmonização é a doutrina e a jurisprudência que têm que fazer.

Principal finalidade do princípio da unidade – esse princípio afasta uma tese defendida na década de 50, de que haveria hierarquia entre normas da Constituição. Foi questão de prova da magistratura/MG: “Qual princípio afasta a hierarquia entre normas da Constituição?” é o princípio da unidade. Essa tese da hierarquia é aquela tese trabalhada por um autor alemão chamado Otto Bachof. Ele tem um livro clássico, chamado Normas Constitucionais Inconstitucionais onde ele discute essa questão. Ele menciona várias possibilidades havidas no controle alemão. Ele comenta as hipóteses nas quais uma norma, mesmo decorrente do poder constituinte originário poderia ser em constitucional em face de outra. Essa tese foi afastada pelo princípio da unidade. Duas normas originárias tem que ser harmonizadas. No Brasil a tese do Otto Bachof já foi discutida no STF duas vezes. O Partido Social Cristão propôs uma ADI a 4097 pedindo que uma norma originária da CF (inelegibilidade dos analfabetos) fosse considerada inconstitucional pelo Supremo por violar o princípio da igualdade, do sufrágio universal que, segundo o PSC seriam princípios superiores a essa norma e, dentro dessa hierarquia, deveria ser considerada inconstitucional. O relator extinguiu sem exame do mérito sob o argumento da impossibilidade jurídica do pedido, eis que norma originária da Constituição não pode ser objeto de controle (nem chegou a ir a plenário. Ele próprio, relator, extinguiu).

3º Postulado (interpretação da Constituição):PRINCÍPIO DO EFEITO INTEGRADOR

Esse princípio é tão parecido com o princípio da unidade que alguns autores nem fazem essa separação. Há autores que colocam esse princípio dentro do princípio da unidade. Nos o separamos porque às vezes são cobrados separadamente.

Vimos que o método científico-espiritual é também chamado de método integrativo porque vê a Constituição como principal elemento do processo de integração da comunidade.

“O princípio do efeito integrador parte do pressuposto de que a Constituição é o principal elemento do processo de integração comunitário.”

Conceito: “Nas resoluções de problemas jurídico-constitucionais deve ser dada primazia aos critérios que favoreçam a integração política e social.”

Na hora de interpretar a Constituição deve sempre se buscar um efeito integrador, um efeito que a Constituição seja vista como um todo e não como normas isoladas. Está muito próximo do princípio da unidade. Na verdade, fala quase a mesma coisa.

4º Postulado (interpretação da Constituição):PRINCÍPIO DA CONCORDÂNCIA PRÁTICA ou HARMONIZAÇÃO

O conteúdo deste princípio também é muito parecido com o conteúdo do princípio da unidade porque ele também busca uma harmonização entre as normas da Constituição. A diferença é que o princípio da unidade é usado quando se tem um conflito abstrato de normas. Por exemplo, no caso do direito de propriedade e da sua função social, abstratamente essas duas

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normas tem uma zona de contato. Tratam de um assunto comum. Abstratamente, o intérprete tem que resolver a tensão entre elas.

O princípio da concordância prática ou harmonização também é usado na hipótese de conflito, só que é um conflito específico que ocorre diante do caso concreto. A concordância prática é usada para um conflito no caso concreto. Por exemplo: liberdade de informação e direito à privacidade, abstratamente não tratam do mesmo assunto, não são conflitantes entre si. Tratam de matérias diferentes, abstratamente não há tensão entre eles. Mas no caso concreto é possível haver o direito à privacidade (de não exibir a reportagem) apontando para um lado, e o direito de informação (exibir a reportagem) apontando para outro lado . Quando vocês tem esse conflito no caso concreto, o nome técnico,específico que se dá a ele é a chamada colisão de direitos ou colisão de princípios. Quando se tem conflito no caso concreto vocês tem uma colisão. Para resolver isso, é preciso fazer a ponderação para saber qual dos princípios tem o peso maior. Ao fazer essa ponderação, o princípio da concordância prática tem que ser utilizado.

“Diante da colisão de direitos, o intérprete deverá combinar e coordenar os bens jurídicos em conflito realizando uma redução proporcional de cada um deles.”

Observem que o critério que vai ser usado nessa ponderação, nessa harmonização é o princípio da proporcionalidade, já que a redução será proporcional.

Há dois bens jurídicos consagrados na constituição e o intérprete não pode sacrificar um em detrimento do outro. Ele tem que harmonizá-los. Vai fazer isso reduzindo, de forma proporcional, o âmbito de alcance de cada um deles. Vai reduzir o alcance da liberdade de informação e o alcance do direito à privacidade. Exemplo: A reportagem esconde o rosto das crianças e adolescentes usuários de drogas. Quando isso não é possível, afasta-se um em detrimento do outro, como no caso do Guilherme de Pádua. Deixar de exibir o programa sem colocar o nome dele não iria adiantar nada, pois todos saberiam, mesmo assim, de quem se tratava. Se for possível, o ideal é a concordância prática, a redução proporcional de cada um dos princípios, o não-sacrifício de um detrimento de outro.

5º Postulado (interpretação da Constituição):PRINCÍPIO DA RELATIVIDADE ou COLIDÊNCIA DAS LIBERDADES PÚBLICAS

Ele é objeto de muitas críticas. Às vezes as pessoas não entendem bem. O princípio da relatividade tem a função de permitir que as liberdades públicas possam conviver entre si. Para que as pessoas possam ter liberdade, é necessário que essas liberdades encontrem limites, restrições. Para que os direitos consagrados na Constituição possam conviver entre si, têm que ser limitados, não podem ser absolutos.

Definição: “Não existem princípios absolutos pois todos encontram limites em outros princípios também consagrados na Constituição.”

Se nós tivéssemos um princípio absoluto, ele sempre teria que prevalecer em face de outros princípios. Isso geraria um problema muito sério para a cedência recíproca dos princípios. Para que os princípios possam conviver, é preciso haver a cedência recíproca. Se não houver cedência, não há como resolver esse caso concreto.

Exemplo de cedência recíproca: Há autores que dizem que o princípio da dignidade da pessoa humana é absoluto. Partir dessa idéia é dizer que ele sempre prevalecerá, que sempre será

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aplicado integralmente, jamais sendo afastado. Situação concreta: A ADPF 54: não realização do aborto no caso de anencefalia. Um dos argumentos usados pelos favoráveis: princípio da dignidade da pessoa humana da mãe. Argumento usado pelos que condenam o aborto de feto anencefálico: dignidade da pessoa humana do feto (seria violado se o aborto fosse permitido). É um problema que envolve outros direitos, mas que envolve também a dignidade do feto e da mãe. Se vocês disser que a dignidade é um conflito absoluto, não haveria como resolver esse conflito. Para haver cedência recíproca, um dos dois vai ter que ser relativizado.

Proibição de trabalho escravo. Isso não é um princípio. É uma regra que protege o princípio da dignidade da pessoa humana. O constituinte concretizou esse princípio em uma regra. De igual forma, a tortura. É regra que concretiza a dignidade da pessoa humana.

O STF fala que a proibição de extradição de brasileiro nato é um direito absoluto garantido pela Constituição. Isso não é princípio. É regra regulamentada pela Constituição.

A regra é mandamento de definição. Tem aplicação automática. Prevê uma hipótese e essa hipótese é aplicada integralmente. Quando falamos da relatividade estamos nos referindo aos princípios, estes, sim, relativos pra que seja possível ponderá-los.

6º Postulado (interpretação da Constituição):PRINCÍPIO DA FORÇA NORMATIVA

O princípio da força normativa já foi comentado. Quando tratamos dos efeitos transcendentes dos motivos determinantes, ou da transcendência dos motivos, vimos que não apenas o dispositivo da decisão é vinculante, mas também a sua fundamentação. É na fundamentação que o STF faz a interpretação da Constituição. Quando ele é o guardião da Constituição, cabe a ele dar a última palavra. Interpretações divergentes enfraquecem a força normativa da Constituição. O princípio da força normativa está presente na questão dos efeitos transcendentes.

Outro caso de utilização desse princípio. Quando falamos da objetivação do controle de constitucionalidade. Aquela extensão dos efeitos do controle concentrado ao controle difuso, do processo objetivo ao processo subjetivo. Por que tem ocorrido essa extensão dos efeitos do controle concentrado para o controle difuso? Porque o STF é o guardião da CF e dá a última palavra, sendo que interpretações divergentes enfraquecem a força normativa da Constituição.

Relativização da coisa julgada, no direito constitucional tem um fundamento diferente do processo civil. Ela no direito constitucional parte da seguinte premissa? OSTF é o guardião da CF e, sendo guardião, cabe a ele dar a última palavra sobre como a CF ser interpretada. So que até ele se manifestar, passam-se vários anos. Às vezes três, quatro, cinco anos. E antes período, várias decisões judiciais já transitaram em julgado às vezes com uma interpretação judicial diferente. Então, vamos supor que o Supremo tenha dado a determinada questão interpretação A e várias decisões judiciais, já transitadas em julgado tenham dado a interpretação B à Constituição.

Exemplo concreto: foi feita uma lei aumentando percentual de certos benefícios (pensão por morte) pagos pelo INSS de 80% para 100%, sobre o salário que a pessoa recebia como segurado. As pessoas que já recebiam o benefício antes da lei ajuizaram ação pedindo que o Judiciário estendesse o aumento também para elas. Até o Supremo decidir essa questão, passaram-se alguns anos e várias decisões foram tomadas. O STF entendeu que o princípio da irretroatividade não permite que vocês apliquem esse aumento aos benefícios conceitos

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anteriormente. Só vale, pois, para benefícios anteriores à lei. O que aconteceu com relações a essas decisões contrárias a esse entendimento e que transitaram em julgado? Decisões que interpretaram a constituição de forma distinta do STF. O STF tem admitido, nesses casos, o cabimento de ação rescisória no prazo de dois anos para que essa decisão fosse reformada e adaptada ao entendimento do Supremo. Há autores, como Humberto Theodoro que, mesmo após o prazo de dois anos, isso seria possível. Mas eu acho que isso é ferir a segurança jurídica. Para que haja segurança e força normativa, dois anos devem ser respeitados.

Nesse exemplo que eu mencionei, não foi necessário nem o ajuizamento de ação rescisória. Os Procuradores Federais em atuação junto ao INSS, tendo em conta que essa decisão do STF foi proferida em controle difuso, fizeram uma petição apontando a inexigibilidade do título judicial, dizendo que aquela decisão judicial era incompatível com o entendimento do Supremo e as Turmas Recursais dos JEF's entenderam que aquelas decisões não deveriam ser cumpridas. Não precisou nem de ação rescisória. E o argumento foi justamente esse: força normativa da Constituição. Isso, na prática, tem a sua utilizada. Se vocês conhecer bem a teoria, a prática vocês tira de letra. Mas se você conhece a prática e não conhece a teoria, não.

Definição: “Na interpretação constitucional, deve ser dada preferência às soluções densificadoras de suas normas que as tornem mais eficazes e permanentes”.

Densificar é concretizar. Muito cuidado porque há provas como as do Cespe, por exemplo, que usam o conceito de um princípio e mencionam outro princípio com o nome diferente. Então, cuidado para não ficar só decorando. Tem que entender.

7º Postulado (interpretação da Constituição):PRINCÍPIO DA MÁXIMA EFETIVIDADE

Há quem não desmembre esse princípio do princípio da força normativa. Mas vamos tratá-los separadamente porque tem campos de atuação distintos.

A diferença entre os dois princípios é o campo de abrangência. O princípio da força normativa se refere a toda CF. Já o da máxima efetividade se refere especificamente os direitos fundamentais. A definição é a mesma. Pode usar o mesmo conceito para a força normativa e usar na máxima efetividade. A definição é idêntica. Só que a máxima efetividade se refere especificamente aos direitos fundamentais. Ela vai dizer: na interpretação constitucional, na interpretação dos direitos fundamentais deve se dar preferência à solução que os torne mais eficazes e permanentes.

Então, força normativa é um princípio que se refere a toda CF. A máxima efetividade é um princípio que se refere aos direitos fundamentais. Esse princípio é mais um apelo, para que vocês interprete a constituição de modo a conseguir a maior efetividade possível.

De onde esse princípio é retirado especificamente para os direitos fundamentais? Parte da doutrina brasileira poder ser abstraído do art. 5º, § 1º que diz que as normas definidoras dos direitos e garantias fundamentais têm aplicação imediata. Segundo alguns autores, ali estaria consagrado o princípio da máxima efetividade.

Com relação a esse princípio, eu queria aproveitar para fazer uma distinção importante para compreender a classificação das normas constitucionais. Daí saber a diferença entre vigência, eficácia, efetividade, etc... Não existe uma unanimidade na doutrina. Aqui é só abrindo um parêntesis dentro da máxima efetividade.

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EXISTÊNCIA JURÍDICA – Existente é a norma feita por uma autoridade aparentemente competente para tal. Se o congresso nacional cria uma lei, se o presidente edita uma MP, ainda que essas normas sejam inconstitucionais, são existentes, tem existência jurídica válida porque foi feita por autoridade competente, tendo, inclusive, presunção de constitucionalidade. A existência da norma no plano jurídico é conhecida como vigência. Quando se fala em vigência, é aquela norma que tem existência dentro do mundo jurídico. A vigências não se confundem com a eficácia.

EFICÁCIA JURÍDICA – Eficácia jurídica é a aptidão da norma para ser aplicada aos casos concretos (eficácia positiva) ou para invalidar normas que lhe são contrárias (eficácia negativa). Esses dois conceitos (eficácia positiva e eficácia negativa) são muito importantes quando estudarmos normas de eficácia limitada (veremos que têm eficácia geralmente negativa). A norma que tem eficácia é aquela que está apta a produzir os efeitos que lhe são próprios. Então, por exemplo, uma lei que cria um imposto tem vigência, mas não tem eficácia porque só produz seus efeitos no exercício financeiro seguinte.

EFETIVIDADE OU EFICÁCIA SOCIAL – A eficácia propriamente dita é a jurídica. A efetividade é a efetividade social. A norma tem efetividade quando cumpre a função para a qual foi criada. Ela atinge aquele resultado almejado por ela. Se a gente fosse usar um termo vulgar, seria dizer que al ei que tem efetividade, é a lei que pega. A lei que não pega é a que tem efetividade (está apta a produzir seus efeitos), mas não produz efeitos. O princípio aqui não é do da máxima eficácia, porque eficácia toda norma constitucional tem. O princípio aqui é o da máxima efetividade. A norma deve ser interpretada num sentido de que cumpra sua finalidade, sua função.

VALIDADE – Quando se fala que uma norma é válida ou não, vocês faz uma comparação entre a norma superior e a norma inferior. Uma norma inferior só será válida se for feita de acordo com o seu fundamento de validade. Se for feita de acordo com uma norma superior a ela. Quando se fala de inconstitucionalidade é no âmbito da validade. É inválida porque não é feita de acordo com o seu fundamento de validade, que é a norma superior.

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