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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES / AVM
PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU
A Sistemática Recursal à Luz do Novo Código de Proc esso Civil.
Vinicius de Vasconcellos Fernandes
ORIENTADOR: Prof. José Roberto
Rio de Janeiro 2017
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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES / AVM
PÓS-GRADUAÇÃO LATO SENSU
Apresentação de monografia à AVM como requisito parcial para obtenção do grau de especialista em Processo Civil. Por: Vinicius de Vasconcellos Fernandes
A Sistemática Recursal à Luz do Novo Código de Proc esso Civil.
Rio de Janeiro 2017
3
AGRADECIMENTOS
Aos amigos e parentes, bem como ao meu
orientador Prof. José Roberto.
4
DEDICATÓRIA
Dedico este trabalho a minha mãe Angela Cristina
e principalmente ao meu filho João Marcello e a
minha esposa Janaina.
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RESUMO
A revisão bibliográfica teve como desiderato mostrar a relevância do estudo da
problemática das alterações do sistema recursal do Novo Código de Processo
Civil no sentido de dar mais celeridade ao processo. Cumpre observar que no
decorrer do presente trabalho foi demonstrada a evolução do sistema recursal
brasileiro, razão pela qual se constatou a existência de inúmeras alterações no
sistema recursal brasileiro ao longo da história no sentido de dar mais
celeridade ao processo civil, sendo uns positivos e outros negativos. Registre-
se, ainda, que no decorrer do trabalho foram ressaltados os princípios
constitucionais do processo civil no âmbito recursal, que são de suma
importância, uma vez que eles constituem-se no elemento diferenciador que
marca os regimes jurídicos. É justamente da análise dos princípios gerais que
informam cada sistema que o operador do direito pode qualificá-lo naquilo que
tem de particular e de comum com os demais ordenamentos jurídicos do
passado ou de outros países. Oportuno se torna dizer que também foi realizada
uma análise do novo sistema recursal e, por via de consequência, foram
destacados os pontos de retrocesso, estagnação e avanço do referido sistema.
Convém salientar a importância do trabalho em tela no sentido de dar ao
operador do direito uma visão ampla do sistema recursal brasileiro, sendo,
portanto, uma base de conhecimento para o entendimento do novo sistema
recursal pátrio.
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METODOLOGIA
O presente trabalho foi desenvolvido através de uma pesquisa
explicativa com o escopo de encontrar as respostas para as questões
norteadoras que motivaram a pesquisa em tela.
Não se pode perder de vista que o método de desenvolvimento do
trabalho foi feito através de uma revisão bibliográfica sobre o objeto de
investigação que foi obtido junto ao acervo da Biblioteca Nacional, revistas
especializadas e Internet.
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SUMÁRIO
INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I
Evolução do Sistema Recursal Brasileiro 11
CAPÍTULO II
Princípios Constitucionais do Processo Civil 21
CAPÍTULO III
Análise do Sistema Recursal à Luz do Novo Código de Processo Civil 32
CONCLUSÃO 38
BIBLIOGRAFIA 39
ÍNDICE 40
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INTRODUÇÃO
Oportuno se torna dizer que o Novo Código de Processo Civil trouxe
para o ordenamento jurídico relevantes alterações no sistema recursal civil em
comparação ao Código de Ritos de 1973.
Importante salientar de plano a alteração na contagem e nos prazos
recursais. Anteriormente, os prazos processuais eram computados de forma
corrida, ou seja, incluíam-se em sua contagem os finais de semana, além de
existirem diferentes prazos para diferentes recursos.
Com o advento do Novo Código de Processo Civil, ocorreu a unificação
dos prazos recursais que deverão ser interpostos dentro do prazo de 15
(quinze) dias, contados de sua publicação, com exceção feita os Embargos de
Declaração que permanecem com prazo para oposição de 5 (cinco) dias.
Em relação à contagem dos prazos, o novo artigo 219 é claro ao apontar
que apenas se computarão os dias úteis. Trata-se, portanto, de importante
modificação, há tempos pretendida pela classe dos advogados.
Registre-se, ainda, que o Novo Código de Processo Civil, simplificou o
sistema recursal, para obtenção de um processo mais célere, econômico e
efetivo, sem gerar qualquer restrição ao direito de defesa, segundo o Novo
Código de Processo Civil serão cabíveis os seguintes recursos:
I) apelação; II) agravo de instrumento; III) agravo interno; IV)
embargos de declaração; V) recurso ordinário; VI) r ecurso especial; VII)
recurso extraordinário; VIII) agravo extraordinário ; e IX) embargos de
divergência.
Assim sendo, verifica-se, portanto, o desmembramento do recurso de
agravo, bem como a supressão de sua modalidade “retida”, este que há
tempos vinha sendo profundamente criticado pela doutrina. Sendo certo que
decisões interlocutórias que não comportarem agravo de instrumento não mais
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serão atacadas pela preclusão, devendo ser suscitadas diretamente em sede
de apelação ou contrarrazões de apelação.
Não se pode perder de vista que, a mais profunda e importante
alteração, recebeu o agravo de instrumento. A partir da vigência do Novo
Código de Processo Civil, o agravo de instrumento passou a ter cabimento
restrito às hipóteses previstas em lei, notadamente no artigo 1.028 do referido
código, espancando as dúvidas advindas da vaga e abstrata letra da lei sobre o
tema constante no Código de Processo Civil de 1973.
O agravo interno e o agravo extraordinário, por sua vez, agora estão
devidamente alocados na categoria de recursos, haja vista que no CPC/73 eles
são encontrados de forma esparsa, especificamente, no §1º do artigo 557, e no
artigo 544, respectivamente, e surgem para dirimir quaisquer dúvidas sobre sua
nomenclatura e cabimento.
Igualmente criticado, e que desaparece do nosso ordenamento jurídico
no NCPC são os embargos infringentes. Alfredo Buzaid, em seu parecer sobre
o tema, resume a opinião da maioria dos juristas que apoiaram a exclusão do
referido recurso, nos seguintes termos: “A existência de um voto vencido
não basta por si só para justificar a criação de ta l recurso; porque, por tal
razão, se devia admitir um segundo recurso de embar gos toda vez que
houvesse mais de um voto vencido; desta forma poder ia arrastar-se a
verificação por largo tempo, vindo o ideal de justi ça a ser sacrificado pelo
desejo de aperfeiçoar a decisão”.
Com efeito, as decisões não unânimes passarão a ter a mesma eficácia
daquelas decididas unanimemente, somente podendo ser reformadas pelo
mesmo órgão prolator da decisão, em caráter excepcional, pela via dos
embargos de declaração.
Diante de todo esse cenário, e após a leitura atenta do Novo Código de
Processo Civil e de sua Exposição de Motivos, é clara a intenção dos
legisladores de simplificar a sistemática recursal, dando uma linguagem mais
didática, inclusive, sepultando dúvidas outrora existentes, e excluindo do
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ordenamento recursos cuja eficácia era discutida por grande parte dos
operadores do direito.
O tema do presente trabalho será abordado em 03 capítulos. O primeiro
deles no qual se fará uma análise da evolução do sistema recursal brasileiro.
No segundo capítulo estudar-se-á a questão dos princípios
constitucionais do processo civil no âmbito recursal.
No terceiro capítulo enfrentar-se-á uma análise do sistema recursal
previsto no Código de Processo Civil de 2015: pontos de retrocesso,
estagnação e avanço.
Basta saber se referidas modificações, de fato, irão reduzir o tempo de
duração do processo, mesmo com a precária estrutura de nosso Poder
Judiciário, sem ferir os princípios do contraditório, bem como da ampla defesa,
ou se isso só será possível com maior divulgação e investimento em câmaras
de conciliação extrajudiciais, o que repassaria a nossos magistrados apenas a
decisão contenciosa em casos extremos.
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CAPÍTULO I
EVOLUÇÃO DO SISTEMA RECURSAL BRASILEIRO
1.1 Breve histórico dos recursos
Oportuno se torna dizer que na primitiva organização social os recursos
não eram conhecidos, uma vez que a justiça era distribuída pelo soberano, o
que ensejava um caráter de irrecorribilidade às suas decisões.
Não obstante esse entendimento, há vestígios da existência de recursos,
mesmo em povos muito antigos, em que já se registrava a prática do duplo
grau de jurisdição. Entre os egípcios existia uma hierarquia judiciária e, por via
de consequência, a diversidade de instâncias e de recursos de uns juízes para
outros.1
Importante salientar que pela indiscutível influência que Roma exercia
sobre a civilização ocidental, sobretudo no mundo jurídico, os estudiosos
insistem em considerar que nossos recursos têm sua origem no direito romano,
mais precisamente na denominada apellatio romana. Esse recurso, em
princípio, era interposto diretamente perante o próprio Imperador, que o
apreciava pessoalmente.
Cabe lembrar que com o passar do tempo, o poder de revisão, até então
atribuído apenas ao Imperador, foi delegado a magistrados por ele nomeados.
Saliente-se que nesse segundo momento era permitido que um par do
magistrado, que proferiu a sentença, de igual hierarquia ou superior a ele,
suspendesse os efeitos desta.
Mais adiante, já no império, surge uma nova instituição – a provocatio -,
um recurso que permitia à parte supostamente lesada por uma sentença
invocar a autoridade de um juiz necessariamente superior que, ao revisar a
decisão, poderia mantê-la ou reformá-la. Assim, a antiga apellatio desapareceu
e se deu à provocatio a denominação de apellatio. A nova modalidade recursal
tinha o escopo de manter ou reformar a decisão recorrida por meio de um novo
julgamento.
No entanto, com a queda do império Romano, em decorrência da
invasão dos bárbaros, desapareceu do sistema recursal até então conhecido,
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pois as lides passaram a ser solucionadas por meio de assembleias, em
instância única.
Registre-se, ainda, que o período feudal não se conheceu a
possibilidade de interposição de recursos, uma vez que todas as decisões
eram proferidas pelo senhor feudal, que presidia a assembleia geral. Sendo ele
a autoridade máxima, razão pela qual tais decisões eram irrecorríveis.
1.2 O Regulamento 737
É de verificar-se no que tange ao direito português, sempre foi admitida
a recorribilidade das decisões judiciais. Em princípio, os recursos foram
regulamentados por lei geral e, em um segundo momento, sistematizados
pelas Ordenações Afonsinas, Manoelinas e Filipinas.
Convém ressaltar que no Brasil, primeiramente, vigoraram as referidas
Ordenações, que continuaram válidas mesmo após a proclamação da
independência.
Costuma-se dizer, todavia, que o Regulamento 737, de 25 de novembro
de 1850, foi o primeiro instituto processual puramente brasileiro. Na parte
recursal eram admitidos os embargos de declaração, a apelação, o recurso de
revista e os agravos.
Registre-se que em relação aos embargos declaratórios, previa o art.
641: “Os embargos de declaração só terão lugar, quando houver na sentença
alguma obscuridade, ambiguidade ou contradição, ou quanto se tiver omitido
algum ponto sobre que devia haver condenação”.
Cabe ressaltar que havia previsão expressa de efeito modificativo: “Art.
663. Estes embargos podem ser modificativos ou infringentes do julgado; nelles
poderá allegar-se qualquer nullidade nos termos do Cap. I, Tit. II das
nullidades, e quanto á matéria de facto só poderão ser offerecidos sendo
acompanhados de prova litteral incontinenti. Além dos referidos embargos,
serão ainda admissíveis os de restituição”.
A previsão a respeito do cabimento da apelação era a seguinte: “Art.
646. Tem logar a appellação para a Relação do districto nas causas que
1 MENDONÇA LIMA, Alcides de. Sistema de normas gerais dos recursos cíveis. Rio de Janeiro: Freitas Bastos, 1963. P. 13.
13
excederem de 200$ (art. 26 do Título único), quando a sentença fôr definitiva
ou tiver força definitiva”. Não deixa de ser um embrião do princípio da
correspondência.
Em relação aos efeitos, dispunha o art. 652: “Os effeitos da appellação
serão suspensivos e devolutivos, ou , ou devolutivos sómente: o suspensivo
compete ás acções ordinárias, e aos embargos oppostos na execução, ou pelo
executado ou por terceiro, sendo julgados provados; o efeito devolutivo
compete em geral a todas as sentenças proferidas nas demais acções
commerciaes”.
Salto aos olhos o fato de que 164 anos depois, durante a tramitação do
CPC/2015 no Congresso, ainda se trave interessante debate a respeito dos
efeitos com os quais a apelação dever ser recebida.
Ainda, o recurso de revista vinha regulado a partir do art. 665: “Art. 665.
O recurso de revista poderá ser interposto para o Supremo Tribunal de Justiça
das sentenças proferidas nas Relações, se o valor exceder de 2:00$ (art. 26,
Título único), ainda que se não tenham oppostos os embargos do art. 663”.
“Art. 666. A interposição da revista nas causas commerciaes, a remessa
dos autos e o julgamento no Supremo Tribunal serão regulados pelo mesmo
modo que nas causas cíveis”.
“Art. 667. O Supremo Tribunal de Justiça só concederá revista por
nullidade do processo, ou por nulidade da sentença nos termos declarados no
Tit. II, Cap. I das nullidades”.
Por fim, no que se refere aos agravos, havia um rol taxativo de decisões,
sentenças e despachos, prevendo suas hipóteses de cabimento. Esse modelo
foi repedido o Código de Processo Civil de 1939, afastado no CPC de 1973
(que adotou a ampla recorribilidade das interlocutórias) e agora retorno no
CPC/2015.
Assinale, ainda, que o Regulamento 737, considerado por alguns um
monumento legislativo e por outros um verdadeiro atestado de ignorância dos
juristas da época, foi sucedido pelos códigos de processo estaduais da
Primeira República, muitos deles meras reproduções – ao menos na
substância, senão na forma – daquele instrumento.
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1.3 O Código de Processo Civil de 1939
O Código de Processo Civil de 1939, resultante de um esboço elaborado
por Pedro Batista Martins e apresentado ao então Ministro da Justiça Francisco
Campos, teve o propósito de superar problemas intimamente ligados à tradição
lusitana das Ordenações. Também foi uma tentativa de unificar os códigos
estaduais.
Sobre o tema, Francisco Campos comenta que “a publicação do
anteprojeto, inspirado nos princípios da oralidade da concentração e de cuja
elaboração se incumbiu, por solicitação deste Ministério, o meu amigo e
brilhante advogado Pedro Baptista Martins, provocou de todo o país sugestões
da maior valia. E adeptos do sistema cresceram de número, principalmente
entre aquêles que de perto sentem a necessidade de uma reforma de fundo da
nossa antiquada legislação processual. O anteprojeto foi largamente discutido
e, advogados, juízes, institutos e associações remeteram ao Ministério cerca
de quatro mil sugestões, todas minuciosamente examinadas e muitas incluídas
entre as emendas sofridas pelo texto”.2
Registre-se que em matéria de recursos, foram abolidos os dos
despachos interlocutórios. Tais recursos concorriam para tumultuar o processo,
prolongá-lo e estabelecer confusão no seu curso. Fundavam-se, na sua
generalidade, em matéria de caráter meramente processual, e só se
justificariam em um sistema de processo concebido de maneira rígida ou
hierática, como tendo por única finalidade a estreita observância das suas
regras técnicas, sem atenção ao seu mérito e à sua finalidade.
Quando comparado aos códigos estaduais, o CPC de 1939, embora
padecesse de inúmeros defeitos, significou uma tentativa de modernização,
extremamente importante como Projeto, embora, na prática, de êxito apenas
parcial.3
Posta assim a questão, é de se dizer que o referido Código não logrou
êxito no sentido de simplificar o sistema processual, já que verificada desde o
século anterior em diversos sistemas processuais, mantendo nove recursos
2 CAMPOS, Francisco. Projeto do Código de Processo Civil (1939), item “A elaboração do Projeto” da Exposição de Motivos. 3 BARBOSA MOREIRA, José Carlos. Os novos rumos do processo civil brasileiro. Revista de Processo. São Paulo, v. 78, p. 133-144, abr./jun. 1995. p. 133.
15
diferentes: apelação, agravo de instrumento, agravo de petição, agravo no auto
do processo, embargos de nulidade e infringentes do julgado (inclusive os de
alçada), embargos de declaração, recurso de revista, recurso extraordinário e
carta testemunhal.
O sistema recursal de 1939 era demasiadamente confuso, podendo ser
sintetizado da seguinte maneira: para impugnação de sentença de mérito
previa a apelação; da sentença terminativa cabia agravo de petição; de certas
decisões interlocutórias cabia o agravo de instrumento; de outras também
interlocutórias cabia agravo no auto do processo; e as que não fossem
agraváveis por um destas duas modalidades eram irrecorríveis.
1.4 O Código de Processo Civil de 1973
Oportuno se torna dizer que ao editar o Código de Processo Civil de
1973, o legislador pátrio teve a pretensão de implementar uma alteração radical
no regime até então vigente no país, e que era responsável por gerar uma
grande quantidade de impugnações das decisões judiciais. Nesse sentido, o
novo diploma processual civil teve o seu mérito de simplificar o confuso sistema
recursal do CPC de 1939, o qual, em inúmeras situações, deixava incerteza de
qual seria o recurso cabível, tão complicada era a sua sistematização.
Segundo Alfredo Buzaid, “na tarefa de uniformizar a teoria geral dos
recursos, foi preciso não só refundi-los, atendendo a razões práticas, mas até
suprimir alguns, cuja manutenção não mais se explica à luz da ciência”.4
Aboliram-se, assim, o recurso de revista, os embargos de nulidade, além dos
agravos de petição e no auto do processo.
Não se pode perder de vista que o critério utilizado funda-se na natureza
do provimento jurisdicional, devendo o recurso corresponder à índole da
decisão. Assim sendo, a apelação passou a ser admissível somente de
sentenças (sejam de mérito ou não) e agravo de todas as decisões
interlocutórias.
Registre-se que na Exposição de Motivos do Código de Processo Civil
de 1973, Alfredo Buzaid adota expressamente o princípio da correspondência:
“Diversamente do Código vigente {de 1939}, o Projeto simplifica o sistema de
recursos. Concede apelação só de sentença; de todas as decisões
4 BUZAID, Alfredo. Projeto do Código de Processo Civil (1972), item 28 da Exposição de Motivos.
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interlocutórias, agravo de instrumento”. Segundo ele, “o critério que distingue
os dois recursos é simples. Se o juiz põe termo ao processo, cabe apelação.
Não importa indagar se decidiu ou não o mérito. A condição do recurso é que
tenha havido julgamento final do processo. Cabe agravo de instrumento de
toda a decisão, proferida no curso do processo, pela qual o juiz resolve questão
incidente”.5 Assim foi concebido o nosso sistema recursal.
Com o advento do Código de Buzaid, o ordenamento processual,
sobretudo o sistema de recursos, avançou significativamente, tanto no aspecto
científico quanto no processo no aspecto prático. Desta forma, estava posto o
sistema recursal (originário) do Código de Processo Civil de 1973.
1.5 O sistema recursal do Código de Processo Civil de 1973 e suas
reformas
Importante salientar que, apesar do grande avanço do sistema recursal
do Código de Processo Civil de 1973 em relação ao diploma anterior, mais
precisamente a partir do advento da Constituição da República Federativa do
Brasil de 1988, o CPC revogado sofreu inúmeras alterações por meio das
chamadas minirreformas. Em última análise, o que se está fazendo é a revisão
dos institutos processuais com os olhos da Constituição Federal de 1988,
dando-se, assim, uma nova visão ao Código Buzaid.
Registre-se que muitas das novas alterações implementadas pelas
seguidas reformas ocorreram exatamente na parte destinada aos recursos,
frequentemente rotulados como uma das causas da morosidade do processo
civil brasileiro. Todas as alterações ocorridas tiveram como desiderato acelerar
o julgamento dos recursos nos tribunais. E foi esse intuito das cinco etapas da
reforma (1990, 1994-1995, 1998, 2001 e 2004-2008), que tiveram o escopo de
remover os obstáculos à efetividade do acesso à justiça.
No que tange aos recursos, assevera Cândido Rangel Dinamarco, o
advento da Constituição Federal de 1988 trouxe quatro novidades de grande
importância para o sistema recursal, quais sejam: “a criação do Superior
Tribunal de Justiça, a instituição do Recurso Especial, a ampliação do
cabimento do recurso ordinário constitucional (para abranger todos os
5 BUZAID, Alfredo. Projeto do Código de Processo Civil (1972), item 33 da Exposição de Motivos.
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acórdãos denegatórios de writs pelos tribunais em único grau de jurisdição) e a
supressão da competência do Supremo Tribunal Federal para ditar normas
restritivas à admissibilidade do recurso extraordinário”.6
Cumpre observar que, diante das inovações trazidas pela nova
Constituição da República, houve a necessidade de sistematizar os processos
da competência dos dois Tribunais Superiores, razão pela qual foi editada a Lei
8.038, de 28 de maio de 1990, conhecida com Lei de Recursos, justamente
para instituir normas procedimentais para os processos que tramitam perante o
STF e o recém-criado STJ. O legislador ordinário aproveitou o ensejo e fez
alterações pontuais no Código de Processo Civil, principalmente no que diz
respeito aos recursos extraordinário e especial, sendo, portanto, a primeira
etapa da reforma recursal.
Não se pode perder de vista que quatro anos depois sobreveio a
segunda etapa da reforma, consubstanciada em duas leis: um de dezembro de
1994 e outra de novembro de 1995.
Convém ressaltar que a Lei 8.950, de 13 de dezembro de 1994, deu
novo contorno ao sistema recursal pátrio, corrigindo, assim, imperfeições de
cunho técnico constantes na redação original do CPC e agilizando alguns
procedimentos, ao unificar os prazos recursais, estabelecer o preparo imediato,
fundir o regime de embargos de declaração (que até então era bipartido) e
restaurar os recursos ordinário, extraordinário e especial – para suscitar
apenas as alterações consideradas mais significativas.
Assinale, ainda, que a Lei 9.139, de 30 de novembro de 1995, com a
introdução do novo regime de agravo, alterou de forma substancial a estrutura
e disciplina procedimental deste recurso, contemplando, assim, a segunda
etapa da reforma recursal.
Athos Gusmão Carneiro constata que, “realmente, o rito instituído pelo
CPC de 73 para o agravo de instrumento conspirava profundamente, como
notório aos advogados militantes, contra os ideais de simplicidade, de
celeridade e de eficiência do processo”. 7
6 DINAMARCO, Cândido Rangel. A reforma do Código de Processo Civil. 4 ed. São Paulo: Malheiros, 1999. P.215. 7 CARNEIRO, Athos Gusmão. O novo rito do agravo de instrumento. Revista Jurídica, Porto Alegre, v. 28, p.23-24, dez. 1995. P. 23.
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Registre-se que, a terceira etapa da reforma recursal, consubstanciada
na Lei 9.756, de 17 de dezembro de 1988, veio confirmar uma tendência
progressiva de transferir para o relator atribuições judicantes, tradicionalmente
reservadas ao órgão colegiado.
Com efeito, assumiu grande relevância no sistema o recurso de agravo
interno.
Inadequado seria esquecer a Lei 10.352 que foi editada em 26 de
dezembro de 2001, sendo certo que a referida lei tinha o escopo de tornar a
prestação jurisdicional mais ágil e eficiente.
Dois foram os objetivos da quarta etapa da reforma. O primeiro deles foi
introduzir algumas novidades, como a possibilidade de supressão de grau de
jurisdição presente no art. 513, parágrafo 3º, que permite o julgamento do
mérito da causa pelo tribunal na apreciação de apelação interposta contra
sentença meramente terminativa (CPC, art. 267). O outro escopo foi o de
reparar algumas imperfeições apresentadas na segunda e terceira etapas,
como a que resultou na divergência, tanto na doutrina quanto na jurisprudência,
acerca da aplicação do art. 526 do CPC. É o que a doutrina denominou de
“reforma da reforma”.
Já a quinta etapa da reforma (2004-2008) teve início com o advento da
Emenda Constitucional 45, de 30 de dezembro de 2004, conhecida com a
“Reforma do Poder Judiciário”, que, entre outras novidades, instituiu a súmula
vinculante e o requisito da repercussão geral no recurso extraordinário, sendo
certo que algumas das leis que sucederam e complementaram essa última
etapa da reforma tiveram o escopo de regular os institutos por ela instituídos.
É necessário pontuar, em apertada síntese, as seguintes leis ordinárias:
A Lei 11.187, de 19 de outubro de 2005, ao conferir nova disciplina ao
cabimento dos agravos retido e de instrumento, instituiu o que se pode chamar
de novíssimo regime de agravo.
As Leis 11.232/2005 e 11.382/2006 deram nova roupagem ao processo
execução. Essas leis trouxeram relevantes inovações para o modelo
processual civil brasileiro. Inicialmente, foram aperfeiçoados os mecanismos de
cumprimento de sentenças; em seguida, foi reformada a execução dos títulos
extrajudiciais. Como consequência o regime recursal em sede de execução
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também restou significativamente alterado, seja quanto ao recebimento dos
recursos, seja quanto aos efeitos em que estes são recebidos.
A Lei 11.276, de 7 de fevereiro de 2006, criou a súmula impeditiva de
recursos e a possibilidade de saneamento das nulidades processuais em sede
recursal.
A Lei 11.341, de 7 de agosto de 2006, alterou o parágrafo único do art.
541 do CPC para admitir as decisões disponíveis em mídia eletrônica (inclusive
na internet), entre as suscetíveis de prova de divergência jurisprudencial para
fins de cabimento do recurso especial.
A Lei 11.417, de 19 de dezembro de 2006, disciplinou a edição, a
revisão e o cancelamento de enunciado de súmula vinculante pelo Supremo
Tribunal Federal.
A Lei 11.418, também de 19 de dezembro de 2006, regulamentou a
repercussão geral no recurso extraordinário, nova condição de admissibilidade
deste recurso, instituída pela EC 45/2004.
A Lei 11.672, de 8 de maio de 2008, por sua vez, estabeleceu o
procedimento para o julgamento de recursos especiais repetitivos no âmbito do
Superior Tribunal de Justiça.
É de ser relevado que essas seguidas alterações, que aos poucos foram
implementadas no sistema processual civil, geraram debates emblemáticos na
doutrina e na jurisprudência, deixando perplexa parte da comunidade jurídica
brasileira.
Com o advento da Constituição da República Federativa do Brasil de
1988 e das seguidas reformas no CPC, o sistema originário foi bastante
alterado, podendo-se até afirmar que já estava em vigor um novo sistema
recursal, considerado o primitivo do Código de Buzaid de 1973, com novas
premissas e novos objetivos.
1.6 O sistema recursal que antecedeu o Código de Processo Civil de 2015
Importante salientar que o Brasil dispõe nos dias de hoje um sistema
recursal muito mais lógico, científico, coerente e aparelhado para responder de
uma forma mais efetiva os anseios da sociedade contemporânea, quando
comparado aos sistemas anteriormente implementados.
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Tenha-se presente que um dos problemas mais sérios que se
apresentam ao legislador pátrio consiste na estruturação racional de um
sistema recursal, segundo Arruda Alvim, os princípios da celeridade e do
contraditório, de modo que: (a) se propicie recurso de toda e qualquer decisão
que cause prejuízo grave; (b) não se multipliquem desnecessariamente os tipos
de recurso; (c) a escolha ou a eleição dos recursos não seja tecnicamente
difícil, pois do contrário criar-se-ia uma casuística complicadora e nefasta no
que se refere à escolha do recurso e à sua própria admissibilidade; (d) não se
prolongue indeterminadamente o processo (sentença final) e nem que se
esgalhe o processo por meio dos recursos das decisões interlocutórias, sob
pena de, pelo mesmo motivo, eternizaram-se os feitos.
Em outra linguagem, o sistema processual dever ser funcional,
ensejando a mais pronta solução possível para o litígio (no que depender dos
recursos), sem prejudicar a possibilidade de revisão das questões decididas, o
que diz com a ampla garantia do contraditório, também em nível recursal.8
Posta assim a questão é de ser relevado que os estudiosos de processo
civil e os operadores do direito em geral veem-se diante de um verdadeiro
paradoxo, pois o modelo processual pátrio é moderno, mas, em alguns casos,
a Justiça é extremamente lenta. Noutro giro, em que pesem as críticas
formuladas contra as recentes reformas legislativas, não se pode negar que o
sistema processual vigente logrou alcançar êxito no que tange ao
reconhecimento da comunidade jurídica nacional e estrangeira, notadamente a
italiana.
Em decorrência da lentidão da justiça brasileira, o sistema recursal
tronou-se alvo natural e preferido dos críticos, que invariavelmente o atacam
com o argumento de que há recursos demais, o que é no mínimo discutível.
Registre-se que a dificuldade de diminuir o número de recursos é
qualquer modificação que se proponha, justamente para agilizar o andamento
dos processos nos tribunais, não raro, é rotulada de inconstitucional.
8 ARRUDA ALVIM, José Manoel de. Anotações sobre a teoria geral dos recursos. In: NERY JUNIOR, Nelson; ARRUDA ALVIM WAMBIER, Teresa (coord.). Aspectos polêmicos e atuais dos recursos cíveis de acordo com a Lei 9.756/98. V. São Paulo: RT, p. 52-95, 1999. P.65.
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CAPÍTULO II
PRINCÍPIOS CONSTITUCIONAIS DO PROCESSO CIVIL
NO ÂMBITO RECURSAL
É de ser relavado que o direito de cada povo é o reflexo de sua cultura e de
sua tradição, uma vez que para a ciência jurídica não deve haver regaras
indiferentes à realidade humana, ao contrário das regras que compõem as
ciências exatas, razão pela qual o direito é uma ciência pautada em valores
que cada povo estabelece padrões mínimos à convivência em sociedade.
Registre-se que para aplicar o direito aos conflitos sociais, este se vale
da existência de normas. Sendo o direito uma ciência, parte-se da premissa de
que o ordenamento jurídico não se resume em normas positivadas, mas de um
corpo de normas e conceitos que visa a proporcionar certeza e coerência ao
direito, deixando claro que tais conceitos consubstanciam-se em princípios.
Assim sendo, os princípios fundamentais constituem-se no elemento
diferenciador que marca os regimes jurídicos. É justamente da análise dos
princípios gerais que informam cada sistema que o operador do direito pode
qualificá-lo naquilo que tem de particular e de comum com os demais
ordenamentos jurídicos do passado ou de outros países.
Convém ressaltar que fazendo uma brevíssima síntese do histórico dos
princípios, estes, no período jusnaturalista do direito, não passavam de
recomendações éticas inspiradas nas leis divinas, razão pela qual não tinham
importância alguma. Já no período positivista, em que havia a prevalência
absoluta da lei (ordinária), os princípios mantiveram sua importância diminuída,
porque para terem validade precisavam estar expressos na lei. No período pós-
positivista, no entanto, a partir de 1950, os princípios ganham status
constitucional. Chegam ao texto da Constituição, implícita ou explicitamente,
recebendo uma carga normatividade que nunca tiveram, embora continuassem
a trazer consigo o caráter de recomendação ética.
Registre-se que os princípios, ao lado das regras, são normas jurídicas
e, por via de consequência, exercem papéis diferenciados dentro do sistema
normativo. As regras, por descreverem fatos hipotéticos, possuem a nítida
função de regular, direta ou indiretamente, as relações jurídicas que se
22
enquadrem nas molduras típicas por elas descritas, o que não ocorre com os
princípios, que são normas gerais dentro do ordenamento.
Com efeito, torna-se de suma importância fixarem-se critérios de
incidência dos princípios, de modo a não torná-los como direitos absolutos,
oponíveis a tudo e a todos, pois tal irrestringibilidade não se coaduna com o
Estado de Direito nem atende ao interesse público.
Mister se faz ressaltar que havendo conflitos de regras, ao menos uma
deve ser considerada inválida, gerando antinomia, ou seja, situação de
incompatibilidade entre normas do ordenamento, devendo uma excluir a outra.
Por outro lado, havendo colisão entre dois princípios, pode haver a supremacia
de um em detrimento de outro, dependendo da circunstância, permanecendo,
entretanto, os dois no sistema com igual validade. Afinal, os princípios
coexistem, permitindo o balanceamento de valores, conforme seu peso em
determinada situação e ponderação com outros conflitantes.
É na função de aperfeiçoar a lei, com se vê, que os princípios assumem
importância inestimável, porquanto são eles, muito frequentemente, o caminho
mais seguro tanto para preencher lacunas dos dispositivos legais, como
também, e principalmente, para chegar, à interpretação mais fiel dos textos
expressos da lei, ao espírito do ordenamento jurídico e ao objetivo visado pelo
legislador. 9
Não se pode perder de vista que nada do que se acaba de suscitar
significa que o operador do direito deixe de aplicar a lei em detrimento dos
princípios. Em se tratando do direito processual civil brasileiro, o CPC deve ser
aplicado à luz da Constituição Federal, e não simplesmente afastado, sendo
certo que não se pode banalizar a aplicação dos princípios, supervalorizando-
os, sob pena de desencadear um processo de princípios, o que colocaria em
risco a segurança do sistema.
2.1.2 Os princípios do processo na Constituição Federal
Oportuno se torna dizer que a maior parte do elenco de princípios que
fundamentam o direito constitucional processual está insculpida nos incisos do
9 THEODORO JÚNIOR, Humberto, Princípios gerais do direito processual civil. Revista de Processo, São Paulo, v. 23, p. 173-191, jul./set. 1981. p. 175.
23
art. 5º da Constituição da República Federativa do Brasil de 1988, inserido no
Título II Dos direitos e garantias fundamentais, o que demonstra a sua
importância dentro do ordenamento jurídico brasileiro.
Registre-se que o direito constitucional processual surge como um novo
enfoque de se vislumbrar o processo. Desde então, qualquer análise do
processo que ignore essa perspectiva estará incompleta, sendo certo que esse
novo momento requer, num primeiro momento, mudanças não apenas de
mentalidade, mas também de postura dos operadores do direito, no sentido de
se habituar à interpretação e aplicação das (novas) normas, partindo das
disposições contidas nos textos constitucionais. Num segundo momento, há de
existir uma compreensão de que os instrumentos processuais são instituídos
para efetivarem essas garantias constitucionais, no sentido de produzirem
resultados perquiridos pelas reformas processuais.
É de ser relevado que os princípios constitucionais do processo,
conforme entendimento da corrente majoritária, são consubstanciados nos
princípios do devido processo legal, da isonomia, da ampla defesa e do
contraditório, do juiz natural, do duplo grau de jurisdição, da inafastabilidade do
controle jurisdicional, da publicidade, da efetividade, bem como no princípio da
motivação das decisões judiciais.
Indubitável é que do conjunto de disposições do art. 5º e 93 da
Constituição da Republica Federativa do Brasil de 1988 emerge o “garantismo”
como um dogma fundamental do direito pátrio solenemente proclamado no
mais alto nível formativo.
Em fim, os princípios constituem-se em fontes basilares para qualquer
ramo do direito, influindo tanto em sua formação como em sua aplicação. No
que tange ao direito processual civil não poderia ser diferente, uma vez que os
princípios estão presentes em dois instantes primordiais na sua formação, bem
como na aplicação de suas normas.
2.2 Os princípios constitucionais do processo no âmbito recursal e o due
process of Law
É de verificar-se que o devido processo legal é uma garantia do cidadão
constitucionalmente prevista em benefício de todos os cidadãos, assegurando
tanto o exercício do direito de acesso á justiça como o desenvolvimento
24
processual de acordo com normas previamente estabelecidas, sendo, portanto,
uma forma de afastar a onipotência e a arbitrariedade do Estado, que detém o
monopólio da jurisdição.
Como se pode inferir, o princípio do due process of Law está inserido
num contexto mais amplo: o das garantias constitucionais do processo. E,
como tal, está expressamente previsto na Constituição Federal, no art. 5º, LIV,
cuja redação preceitua que “ninguém será privado da liberdade ou de seus
bens sem o devido processo legal”.
Registre-se que, muito embora até a Constituição Federal de 1988, não
tenha havido referência ao devido processo legal, inúmeros autores
consideravam um princípio implícito. Ada Pelegrini Grinover já defendia sua
incidência no ordenamento jurídico pátrio, em 1975, ainda sob a égide da Carta
de 1967, que, o direito brasileiro era informado por dois grandes princípios
constitucionais: o direito à tutela jurisdicional (direito de ação) e o devido
processo legal. E definia: “destes decorrem postulados como a instrução
contraditória, o direito de defesa, assistência judiciária, o duplo grau de
jurisdição, a publicidade das audiências e outros”. 10
Diante do explano, pode-se concluir que, sem receio de errar, que na
base de todos os princípios processuais está o devido processo legal. Com
efeito, dele decorrem alguns postulados básicos para o sistema democrático,
tais como o do julgamento por um juiz natural, o da instrução contraditória com
a entrega da prestação jurisdicional dentro de um lapso temporal razoável.
É bem verdade que, os princípios não têm incidência absoluta, sendo
certo que há traço distintivo entre regras e princípios: enquanto o conflito de
regras resulta em uma antinomia, resolvendo-se através da perda de validade
de uma delas, a colisão entre princípios resulta apenas no privilégio de um,
sem que isso implique na perda de validade do outro.
É preciso salientar que o princípio do processo legal enseja diversos
conflitos entre outros que dele decorrem, o que causa certa confusão por parte
da doutrina quando trata da inconstitucionalidade de determinados dispositivos
10 GRINOVER, Ada Pellegrini. Os princípios constitucionais e o Código de Processo Civil. São Paulo: Bushatsky, 1975. p. 11.
25
do Código de Processo Civil, principalmente no que tange àqueles alterados
pelas recentes reformas processuais na seara recursal.
2.3 Princípio da isonomia
Importante salientar que o caput do art. 5º da Constituição Federal
estabelece que todos são iguais perante a lei. O princípio da isonomia foi
expressamente abraçado no campo da legislação processual civil
infraconstitucional, especificamente no art. 139, I, do CPC/2015, o qual
preceitua que o juiz dirigirá o processo, competindo-lhe assegurar às partes
igualdade de tratamento. Com efeito, o referido dispositivo teve recepção
integral em face do novo texto constitucional.
Deve-se salientar que o Código de Processo Civil trata desse princípio,
especialmente, tendo em vista a ótica da igualdade formal.
Não se pode perder de vista de que quando se fala da aplicação do
princípio da isonomia no âmbito recursal vem à baila a discussão acerca do
reexame necessário. O instituto da remessa ex officio consulta precipuamente
o interesse do Estado, quando sucumbente, para que a lide seja reavaliada por
um colegiado e expurgadas imprecisões ou excessos danosos ao interesse
público, sendo certo que esse interesse público gera para a Fazenda Pública
no âmbito processual-recursal algumas prerrogativas, como o prazo em dobro
para se manifestar e a remessa necessária.
2.4 Princípio da ampla defesa
A ampla defesa não é uma generosidade concedida pelo Estado ao
cidadão, mas um interesse público. Além disso, o direito de defender-se é
essencial a qualquer cidadão que deve ser tutelado pelo Estado democrático. A
defesa plena é uma garantia constitucional e, por via de consequência, está
expressa no inciso LV do art. 5º, cuja redação é a seguinte: “aos litigantes, em
processo judicial ou administrativo, e aos acusados em geral são assegurados
o contraditório e a ampla defesa, com os meios e recursos a ela inerentes”.
Entretanto, ampla defesa não significa recorribilidade infinita das
decisões. Registre-se que ao legislador infraconstitucional é permitido vedar a
recorribilidade de determinadas decisões, sem ensejar a violação do princípio
da ampla defesa. Por exemplo, o recurso especial não foi colocado à
disposição dos jurisdicionados que optem por ajuizar suas demandas nos
26
juizados especiais. Ora, quando o litigante opta pelo procedimento x ou y, ele
está ciente das regras processuais, portanto, não há que se falar na incidência
do fator surpresa.
2.5 Princípio do Contraditório
Bom é dizer que o princípio do contraditório insere-se dentro da ampla
defesa. Quase que com ela se confunde integralmente, na medida em que uma
defesa não pode ser senão contraditória. O contraditório é a exteriorização da
própria defesa, sendo certo que a todo ato produzido caberá igual direito da
outra parte de opor ou dar a versão que lhe convenha, ou ainda de fornecer
uma interpretação jurídica diversa daquela feita pelo autor.
O juiz, face ao seu dever de imparcialidade, coloca-se entre as partes,
mas de forma equidistante a elas, quando ouve uma, necessariamente deve
ouvir a outra. Assim, deve-se dar aos litigantes a possibilidade de expor suas
razões de apresentar as suas provas, de influir sobre o convencimento do juiz.
Registre-se que, somente pela porção de parcialidade das partes, uma
apresentando a tese e a outra a antítese, é que o juiz pode fazer a síntese.
Este procedimento seria estabelecer o contraditório entre as partes, ou seja,
impor a bilateralidade da audiência, uma vez que a possibilidade de reação de
qualquer dos litigantes em relação à pretensão do outro, depende sempre da
ciência do ato praticado.
Com efeito, o princípio do contraditório pode ser visto, também, como a
perfeita combinação entre o princípio da ampla defesa e o princípio da
igualdade das partes. Portanto, o contraditório deve ser respeitado em todas as
instâncias do processo, inclusive a recursal.
2.6 Princípio do juiz natural
O chamado princípio do juiz natural encontra-se consagrado na
generalidade das Constituições ocidentais, tendo grande relevância para a
garantia do Estado de Direito. No Brasil o princípio está expresso em dois
incisos do art. 5º da Constituição Federal, os quais estabelecem que “não
haverá juízo ou tribunal de exceção” (XXXVII) e que “ninguém será processado
senão pela autoridade competente” (LIII).
27
Portanto, consubstancia-se este princípio em dupla garantia que opera
articuladamente: (a) a vedação dos tribunais de exceção e (b) a garantia de
julgamento por autoridade competente.
Convém ressaltar que apenas são juízos ou tribunais, aqueles
constitucionalmente previstos, ou, então, os que estejam previstos a partir e
com raiz no texto constitucional. Por outro lado, é necessário que os
integrantes do Poder Judiciário (juízes) tenha ingressado na magistratura de
uma forma igualmente legítima, ou seja, na forma da Constituição e das leis
regulamentadoras desta, sob pena de serem reputados juízes incompetentes.
2.7 Princípio do duplo grau de jurisdição
Oportuno se torna dizer que de maneira geral, o homem, em sua
essência, não se conforma com a decisão que lhe seja contrária, não só nas
relações familiares, no trabalho, como também nas decisões judiciais. Desde
os tempos remotos, as partes procuraram a reforma das decisões dos
julgadores, nas hipóteses de não aceitação de seus anseios.
Na verdade, desde que começou a ser aplicada a justiça, os cidadãos
procuraram, sempre, uma autoridade maior que atendesse às suas
reivindicações, e as decisões dos primeiros julgadores foram colocadas em
dúvida, no que tange a sua validade e exatidão.
Registre-se que o instituto do recurso, portanto, vem sempre
correlacionado com a ideia de duplo grau, o qual consagra a possibilidade de
revisão dos pronunciamentos jurisdicionais por órgãos, em regra,
hierarquicamente superiores aos que os proferiram como garantia de boa
solução. A justificação política deste princípio, acredita a doutrina, tem
invocado a maior probabilidade de acerto decorrente da sujeição das decisões
a reexame, além de evitar a possibilidade de haver abuso de poder por parte
do juiz.
Registre-se que discussões doutrinárias à parte, no Brasil, hoje não há
garantia do duplo grau de jurisdição, mas mera previsão. Na verdade, a
Constituição da República limitou-se apenas a mencionar a existência de
tribunais, conferindo-lhes competência recursal. A Carta de 1988 não garante o
duplo juízo ilimitadamente, como fez a do Império, de 1824, podendo o
legislador infraconstitucional, dessa forma limitar o direito de recurso em
28
algumas hipóteses. Assim sendo, não se tem por inconstitucional o dispositivo
legal que determinar, em certos casos, a supressão do duplo grau, que é regra
vigente no sistema recursal brasileiro.
É de ser relevado que nem por isso o duplo grau de jurisdição perdeu o
status de princípio constitucional. Não obstante inexista texto expresso na
Constituição Federal, a doutrina sustenta que o princípio do duplo grau de
jurisdição está inserido em nosso sistema constitucional, em decorrência do
princípio do due process of Law (CF, art. 5º, LIV) a reapreciação da quaestio
através de recurso, conforme a legislação infraconstitucional, ou seja, através
do devido processo legal.
Convém salientar que outra previsão implícita decorre do fato de a Carta
Magna ter mencionado a existência de tribunais, conferindo-lhes a competência
de julgar causas originariamente e em grau de recurso. Porém, a aplicação
desse princípio, como se viu, não é ilimitada.
Assim sendo, acredita-se que tal princípio, no sistema do Código de
Processo Civil, esteja reduzido à garantia de um julgamento colegiado nos
tribunais. E nenhuma das reformas que antecedeu o CPC/2015 retirou tal
direito dos litigantes, que permanece absolutamente intacto em nosso sistema,
por conta do recurso do agravo interno.
2.8 Princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional
Oportuno se torna dizer que quando o Estado retirou do particular o
direito de fazer justiça privada ou com as próprias mãos (autotela), deu-lhe, em
troca, o direito-poder de acionar um dos órgãos do Estado, quase sempre, o
Poder Judiciário, no sentido de solucionar os conflitos existentes na sociedade.
Registre-se que a decisão judicial não pode impedir o direito de ação
(=recurso), sob pena de afronta ao princípio constitucional da inafastabilidade
do controle jurisdicional, expresso no art. 5º, XXXV, da Carta Magna de 1988:
“a lei não excluirá da apreciação do Poder Judiciário lesão ou ameaça a
direito”.
Importante salientar que o regramento constitucional está de forma
unânime na doutrina, que consagra o referido princípio, o qual contém em si a
base normativa do direito de ação (direito subjetivo público exercido contra o
Estado) que detém o monopólio da jurisdição. Por esse princípio, só a
29
Constituição Federal pode, válida e expressamente, excluir da apreciação
judicial qualquer lesão de direito coletivo ou individual.
Não é por outra razão que o Supremo Tribunal Federal interpreta como
inconstitucional a recusa de prestação jurisdicional, pelo Poder Judiciário, que
lhe foi regularmente pleiteada, porquanto a indeclinabilidade é um dos
princípios que informam a jurisdição. 11
É de ser relevado também que não merece guarida as medidas que
impedem acesso dos jurisdicionados às vias extraordinárias recursais, como no
caso do tribunal que se nega a decidir questão previamente suscitada pelos
litigantes ou se nega a fazer constar no acórdão fatos os quais as partes
reputem importantes. No entanto, no sistema que antecedeu o CPC/2015 não
era incomum o tribunal, a despeito da oposição de embargos declaratórios
prequestionadores, rejeitá-los sob o argumento da inexistência de vício de
omissão e/ou de que o Poder Judiciário não é órgão de consulta.
2.9 Princípio da publicidade
Importante salientar que faz parte da essência do processo a sua
publicidade. Por isso, verificação desse princípio deve dar-se numa ampla
perspectiva: a investigação deve ser da publicidade do processo e não apenas
no processo.
Não há dúvida de que o ato praticado em público inspira mais confiança
do que o ato praticado às escondidas. A publicidade garante mais confiança e
respeito aos atos processuais, além de viabilizar a fiscalização da sociedade
sobre as atividades dos juízes. 12
Nesse sentido, necessário se faz suscitar as palavras de Arruda Alvim,
“a publicidade é garantia para o povo de uma justiça ‘justa’, que nada tem a
esconder; e, por outro lado, é também garantia para a própria Magistratura
diante do mesmo povo, pois agindo publicamente permite a verificação de seus
atos”. 13
Nessa esteira, prevê a Constituição Federal de 1988 que “todos os
julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão públicos” (art. 93, IX), sendo
11 RTJ 99/794. 12 PORTANOVA, Rui. Princípios do processo civil. 3. Ed. Porto Alegre: Livraria do advogado, 1999. p. 167-168.
30
que “a lei poderá restringir a publicidade dos atos processuais quando a defesa
de intimidade ou o interesse social o exigirem” (art. 5º, LX).
Assim sendo, pode-se inferir que no Brasil, por regra, o processo é
publico. Mas, este princípio (como os demais) não tem incidência absoluta. A
própria Constituição faz referência aos casos em que a lei admitirá o sigilo e a
realização de atos processuais em segredo de justiça.
Com relação aos recursos, a garantia da publicidade não significa a
exigência da efetiva presença do público ou dos meios de comunicação a todos
os atos do processo, mas se traduz, por exemplo, na possibilidade de as partes
– elas mesmas ou através de seus advogados – acompanharem os
julgamentos nos tribunais.
2.10 Princípio da motivação das decisões judiciais
É de verificar-se que outra garantia consagrada na Constituição Federal
de 1988 é a da motivação das decisões judiciais, sendo certo que a
fundamentação é uma garantia político-constitucional, própria do Estado
Democrático de Direito, que corresponde à vocação democrática do poder de
julgar.
Não se pode perder de vista que o art. 93, IX, da Constituição Federal
dispõe que “todos os julgamentos dos órgãos do Poder Judiciário serão
públicos, e fundamentadas todas as decisões, sob pena de nulidade”,
revelando, assim, a importância do constituinte dispensou a este princípio, eis
que, usualmente, os preceitos constitucionais não trazem em seu bojo a norma
sancionadora.
Com efeito, a ausência de fundamentação adequada constitui-se em
vício de extrema gravidade, a ponto do constituinte, abandonado a técnica
legislativa, prescrever no bojo constitucional a pena de nulidade. Como se
constata as decisões judiciais têm como pressuposto de validade a
fundamentação.
Convém ressaltar que fundamentar significa dar as razões, de fato e de
direito, pelas quais se justifica a procedência ou improcedência do pedido.
Assim, o ministro, desembargador ou juiz tem necessidade de explicar o
13 ARRUDA ALVIM, José Manoel de. Manual de direito processual civil. V. I. 3. Ed. São Paulo: RT, 1990. p. 99.
31
porquê do seu posicionamento. Não basta que a autoridade jurisdicional
escreva: “ausentes os pressupostos recursais, não conheço o recurso”. A
Constituição inadmite a chamada motivação implícita, ou seja, quando o
julgado não evidencia um raciocínio lógico, direto, explicativo e convincente da
postura adotada.
Registre-se que o fundamento é a garantia da parte contra dois ilícitos
que se possam atribuir ao juiz: o arbítrio e a parcialidade. A decisão deve
indicar sempre os fatos e as circunstâncias que motivaram o convencimento do
magistrado.
Por derradeiro, necessário se faz asseverar que é dever do Poder
Judiciário entregar às partes uma decisão clara, objetiva e devidamente
fundamentada. Se há obscuridade, contradição ou omissão no decisum, o
Estado não cumpriu devidamente o seu dever de entrega da prestação
jurisdicional.
2.11 Prevalência do princípio da efetividade no sistema que antecedeu o
CPC/2015
Importante salientar que a gradativa implementação do novo sistema
recursal civil, que antecedeu o CPC/2015, teve nitidamente como escopo
acelerar o julgamento dos recursos nos tribunais. Era de clareza solar que a
intenção do legislador em tornar a prestação jurisdicional mais ágil e eficiente,
mesmo que, para isso, tivesse que afunilar as vias recursais, o que poderia, em
tese, infringir o direito ao acesso à justiça e à ampla defesa.
Não se pode perder de vista que a efetividade e a segurança jurídica
sempre estarão em embate. E o legislador reformista não esconde o seu fito no
sentido de imprimir uma maior celeridade ao processo civil brasileiro. Os
próprios coordenadores da reforma processual não esconderam a intenção de
contemplar a efetividade do processo em detrimento da segurança jurídica,
desde que assegurados os preceitos do devido processo legal.
Assim sendo, o legislador pátrio encontra-se diante de um conflito de
princípios: de um lado o princípio da segurança jurídica (contraditório, ampla
defesa e duplo grau); do outro, o princípio da efetividade, ambos amparados
pelo devido processo legal.
32
CAPÍTULO III
ANÁLISE DO SISTEMA RECURSAL À LUZ DO NOVO
CÓDIGO DE PROCESSO CIVIL
3.1 O advento do Código de Processo Civil de 2015
Oportuno se torna dizer que em meio às reformas do CPC/1973, no ano
de 2010 uma comissão de juristas designada pela Presidência do Senado
Federal elaborou um anteprojeto de novo Código de Processo Civil, que
posteriormente converteu-se em projeto de lei, foi aprovado naquela Casa e
enviado para Câmara de Deputados. Cinco anos depois o texto, enfim,
aprovado, sancionado pela Presidência da República e publicado dia 16 de
março de 2015. É a Lei 13.105, que instituiu o CPC/2015.
Com relação ao sistema recursal, constatou-se anteriormente que o
ordenamento brasileiro é centralizado, ou seja, os processos convergem para
os Tribunais Superiores. E não há qualquer indício de que se queira ou que
convém mudar tal sistema, que é fruto da história brasileira.
Posta assim a questão, é de se dizer que se o legislador quisesse
realmente atingir a essência do sistema recursal teria de modificar a estrutura
hierárquico-centralizadora do Poder Judiciário e, por via de consequência,
reformar a Constituição Federal de 1988. Mas tal reforma não pôde ser
implementada por meio de um novo Código de Processo Civil (lei ordinária
infraconstitucional).
Dessa forma, o art. 994 do CPC/2015, em relação ao rol taxativo de
recursos, dispõe: “São cabíveis os seguintes recursos: I – apelação; II – agravo
de instrumento; III – agravo interno; IV – embargos de declaração; V – recurso
ordinário; VI – recurso especial; VII – recurso extraordinário; VIII – agravo em
recurso especial ou extraordinário; IX – embargos de divergência”.
Convém ressaltar que os embargos infringentes foram extintos. Por lado
outro, do gênero agravo restaram apenas: (a) agravo de instrumento, (b)
agravo interno, (c) agravo em recurso especial ou extraordinário, sendo
extirpado o agravo retido e o agravo regimental.
33
Não obstante, o Código de Processo Civil de 2015 trouxe muitas
novidades em relação ao sistema recursal. Comparando o texto que o
antecedeu pode-se inferir que em alguns pontos houve retrocesso, outros em
que houve estagnação e muitos em que houve avanço.
3.2 Pontos de retrocesso
Posta assim a questão, é de dizer que o primeiro deles refere-se à
previsão das hipóteses de cabimento do agravo de instrumento em rol taxativo
(art. 1.015), retornando ao sistema existente no CPC de 1939. Com isso, cai a
regra da ampla recorribilidade das interlocutórias prevista no Código de Buzaid.
Porém, a experiência mostra que as restrições às hipóteses de cabimento de
recursos geram novas insatisfações, incentivando a busca por outros meios
processuais de impugnação, como, por exemplo, o resurgimento do mandado
de segurança contra ato judicial.
Registre-se que outro ponto passivo de críticas seria a extinção dos
embargos infringentes. Percebe-se que este recurso foi taxado por alguns
como o grande vilão da demora na entrega jurisdicional. Tal crítica não
procede, uma vez que sua incidência era pequena, sobretudo após o advento
da Lei 10.352/2001, que delimitou significativamente o seu cabimento. Mais
importante é reconhecer que esse remédio recursal cumpre papel de grande
importância no ordenamento jurídico pátrio, qual seja, o de dar sobrevida aos
votos divergentes nos tribunais, arejando, assim, a jurisprudência.
Não obstante, os embargos infringentes foram extintos no Código de
Processo Civil de 2015. Contudo, pior que a simples retirada do recurso, foi a
solução (?) encontrada para a hipótese de julgamento por maioria de votos.
Criou-se uma regra de julgamento bastante peculiar.
Prevê o art. 942: “Quando o resultado da apelação for não unânime, o
julgamento terá prosseguimento em sessão a ser designada com a presença
de outros julgadores, que serão convocados nos termos previamente definidos
no regimento interno, em número suficiente para garantir a possibilidade de
inversão do resultado inicial, assegurado às partes e a eventuais terceiros o
direito de sustentar oralmente suas razões perante os novos julgadores”.
Sendo certo que alguns doutrinadores são partidários no sentido da
manutenção do referido recurso.
34
3.3 Pontos de estagnação
Registre-se que a primeira questão concerne à manutenção do efeito
suspensivo da apelação. É, sem dúvida, a grande decepção do novíssimo
sistema recursal implementado pelo Código de Processo Civil de 2015 (art.
1.012).
Não se pode perder de vista que no ordenamento anterior, a
interposição da apelação prolongava o estado de ineficácia da sentença. Sem
dúvida, era uma das incoerências do sistema processual brasileiro, haja vista
decisões interlocutórias (com cognição sumária) produzirem efeitos de
imediato, enquanto as sentenças (com cognição exauriente), em regra, não
terem eficácia alguma.
Convém ressaltar que o Projeto aprovado pelo Senado havia previsto o
recebimento da apelação apenas no efeito devolutivo. Entretanto, na Câmara o
texto foi alterado, permanecendo tudo como sempre foi, ou seja, manteve-se o
efeito suspensivo do apelo. Infelizmente, perdeu-se aqui grande oportunidade
para avançar e rever o papel dos juízes, a amplitude do princípio do duplo grau
de jurisdição e a (in) eficácia das sentenças.
É de verificar-se outro ponto que diz respeito à sustentação oral no
agravo interno. A sustentação oral é extremamente importante nos julgamentos
colegiados. É cediço que a presença dos advogados no tribunal conduz,
principalmente, a um melhor exame pelos demais componentes do órgão
colegiado.
Posta assim a questão, é necessário suscitar a lição de Delosmar
Mendonça Junior, que nos diz que: “retirar a possibilidade de sustentação oral
é reduzir a participação das partes no processo, em momento fundamental do
desenvolvimento processual; é cercear defesa, por impossibilitar a produção de
alegações para formação da convicção dos julgadores. A decisão sobre o que
deve ser colocado para o tribunal pertence às partes, as quais não podem ficar
à mercê do relator”. 14
Inadequado seria esquecer que a sustentação oral está prevista no
Código de Processo Civil de 2015 (art. 937), cuja redação prevê que “na
14 MENDONÇA JUNIOR, Delosmar. Princípios da ampla defesa e da efetividade no processo civil brasileiro. São Paulo: Malheiros, 2001. p. 105
35
sessão de julgamento, depois da exposição da causa pelo relator, o presidente
dará a palavra, sucessivamente, ao recorrente, ao recorrido e, nos casos de
sua intervenção, ao membro do Ministério Público, pelo prazo improrrogável de
15 (quinze) minutos para cada um, a fim de sustentarem suas razões”.
Registre-se que o legislador havia previsto expressamente a
sustentação oral no agravo interno (inciso VII). Entretanto, o dispositivo foi
vetado pela Presidência da República.
Por derradeiro, a Lei 13.256/2016 trouxe de volta o exame de
admissibilidade bipartido dos recursos excepcionais, além de reduzir as
hipóteses de cabimento da reclamação e dos embargos de divergência
previstas no Código de Processo Civil de 2015.
3.4 Pontos de avanço
Indubitável é que o Código de Processo Civil de 2015, no âmbito
recursal, teve como desiderato de evitar as temidas decisões-surpresa,
instituindo o contraditório pleno, a fim de frear a chamada jurisprudência
defensiva, constante utilizada pelos tribunais para inadmitir recursos. É o
conhecido princípio da primazia do mérito recursal.
Registre-se, ainda, o avanço no que se refere à correção de algumas
imperfeições técnicas existente no CPC de 1973. De um lado, teve mérito de
positivar aquilo que a doutrina já defendia há muito tempo, sendo inegável a
tentativa paralisar o crescimento da jurisprudência defensiva. De outro, o
entendimento pretoriano aplicado a alguns recursos também foi positivado.
O CPC/2015 acertou no sentido de retirar do relator o poder de julgar
monocraticamente o mérito do recurso com base na jurisprudência dominante.
A verdade é que em mais de 15 anos (a redação do art. 557 do CPC/1973 é de
1988) doutrina e jurisprudência não conseguiram preencher o referido conceito
vago de forma satisfatória. Não se tem dados suficientes para dizer se
determinado entendimento é dominante ou não nos tribunais. Assim, diante do
mau uso da expressão por parte da magistratura – que utiliza para julgar boa
parte dos recursos sem levá-los ao órgão colegiado – melhor retirá-la do
sistema.
Convém ressaltar, também, o avanço da regra prevista no parágrafo 3º
do art. 941: “O voto vencido será necessariamente declarado e considerado
36
parte integrante do acórdão para todos os fins legais, inclusive de pré-
questionamento”. Sabe-se que muitas vezes a causa decidida ou os fatos que
demonstram a violação a determinado dispositivo legal estão no voto vencido,
mas não no voto vencedor.
Com relação ainda ao prequestionamento, o art. 1.025 do CPC/2015
prevê: “Consideram-se incluídos no acórdão os elementos que o embargante
pleiteou, para fins de pré-questionamento, ainda que os embargos de
declaração sejam inadmitidos ou rejeitados, caso o tribunal superior considere
erro, omissão, contradição ou obscuridade”. Sendo certo que caiu a Súmula
211 do Superior Tribunal de Justiça, prevalecendo a interpretação dada à
Súmula 356 do Supremo Tribunal Federal.
É sobremodo importante assinalar que depois de alguma discussão
doutrinária e jurisprudencial, o CPC/2015 prevê que “a desistência do recurso
não impede a análise de questão cuja repercussão geral já tenha sido
reconhecida e daquela objeto de julgamento de recursos extraordinários ou
especiais repetitivos” (art. 998, parágrafo único). De um lado, fica cristalina a
tendência de objetivação dos recursos excepcionais e, de outro, garante o
direito da parte de desistir do recurso.
Ressalte-se também a unificação do prazo para recorrer (15 dias), com
exceção dos embargos de declaração (5 dias), prevista no parágrafo 5º do art.
1.003 do CPC/2015.
No que tange aos embargos de declaração, há previsão expressa de
seu cabimento contra qualquer decisão judicial nas hipóteses de obscuridade,
contradição, omissão e erro material (art. 1.022), positivando o que os tribunais
já vinham aplicando há algum tempo. Positivou-se também a intimação do
embargado para se manifestar sobre os embargos caso seu eventual
acolhimento implique modificação da decisão embargada (art. 1.023, parágrafo
2º).
Inadequado seria esquecer outra determinação importante está prevista
no parágrafo 5º do art. 1.024: “Se os embargos de declaração forem rejeitados
ou não alterarem a conclusão do julgamento anterior, o recurso interposto pela
outra parte, antes da publicação do julgamento dos embargos de declaração,
37
será processado e julgado independentemente de ratificação”. Com isso, a
Súmula 418 do Superior Tribunal de Justiça está revogada.
O Código de Processo Civil de 2015 prevê, também, a fungibilidade
entre recursos excepcionais quando o recurso especial versar sobre matéria
considerada constitucional pelo Superior Tribunal de Justiça (art. 1.032) ou se o
Supremo Tribunal Federal considerar reflexa a ofensa à Constituição Federal
afirmada no recurso extraordinário (art. 1.033), sendo mais uma inovação que
impede a jurisprudência ofensiva.
Por derradeiro, o instituto da reclamação, os recursos excepcionais
repetitivos e os embargos de divergência foram totalmente remodelados.
38
CONCLUSÃO
O Novo Código de Processo Civil valorizou a advocacia a retirar
distorções provenientes do Código de Processo Civil de 1973 e de sua
interpretação principalmente em relação ao Novo Sistema Recursal, sendo
certo que a essência do Novo Código em relação ao advogado é, no entanto,
muito mais ampla, uma vez que destaca ainda mais a sua nobre função,
essencial, de auxiliar a Justiça e promover a sua administração (CF, artigo
133). O advogado passa atuar como peça importante para prevenção de litígios
nos meios alternativos para solução de conflitos e na contenção da litigiosidade
desenfreada.
É de ser relevado que o Novo Código de Processo Civil, especificamente
o seu sistema recursal, não está isento de críticas, cabendo à doutrina e a
jurisprudência, interpretá-lo e adaptá-lo aos casos concretos, aproveitando os
seus institutos que efetivamente contribuíram para a celeridade e a eficiência
processual, sem afastar os direitos constitucionalmente assegurados.
Por derradeiro, cabe destacar que a Justiça é obra de toda coletividade
e espera-se que o advogado do século XXI contribua para uma mudança de
mentalidade, com a cultura da pacificação prevalecendo sobre a cultura da
sentença. Nesse aspecto particular, o Código de Processo Civil de 2015
expressivamente avançou em território que muito ainda há a percorrer.
39
BIBLIOGRAFIA
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40
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THEODORO JÚNIOR, Humberto, Princípios gerais do direito processual civil. Revista de Processo, São Paulo, v. 23, p. 173-191, jul./set. 1981.
WAMBIER , Teresa Arruda Alvim; CONCEIÇÃO, Maria Lúcia Lins; RIBEIRO,
41
ÍNDICE
FOLHA DE ROSTO 02 AGRADECIMENTOS 03 DEDICATÓRIA 04 RESUMO 05 METODOLOGIA 06 SUMÁRIO 07 INTRODUÇÃO 08
CAPÍTULO I Evolução do Sistema Recursal Brasileiro 11 1.1. Breve histórico dos recursos 11
1.2. O Regulamento 737 12
1.3. O Código de Processo Civil de 1939 14
1.4. O Código de Processo Civil de 1973 15
1.5 . O sistema recursal do Código de Processo Civil de 1973 e suas reformas 16
1.6. O sistema recursal que antecedeu o Código de Processo Civil
de 2015 19
CAPÍTULO II Princípios Constitucionais do Processo Civil 21 2.1.2 Os princípios do processo na Constituição Federal 22 2.2. Os princípios constitucionais do processo no âmbito recursal
e o due process of Law 23
2.3. Princípio da isonomia 25 2.4. Princípio da ampla defesa 25
2.5. Princípio do Contraditório 26
2.6. Princípio do juiz natural 26
2.7. Princípio do duplo grau de jurisdição 27
2.8. Princípio da inafastabilidade do controle jurisdicional 28
2.9. Princípio da publicidade 29
2.10. Princípio da motivação das decisões judiciais 30
2.11. Prevalência do princípio da efetividade no sistema que
antecedeu o CPC/2015 31
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CAPÍTULO III
Análise do Sistema Recursal à Luz do Novo Código de Processo Civil 32 3.1. O advento do Código de Processo Civil de 2015 32 3.2. Pontos de retrocesso 33 3.3. Pontos de estagnação 34 3.4. Pontos de avanço 35 CONCLUSÃO 38 BIBLIOGRAFIA 39
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