UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS CENTRO DE EDUCAÇÃO E CIÊNCIAS HUMANAS
GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA
CONDIÇÕES DE TRABALHO RELACIONADAS A PRAZER E SOFRIMENTO DOS TRABALHADORES NO ÂMBITO DE
COOPERATIVAS POPULARES
Lia Botta Riani Costa
São Carlos 2005
UNIVERSIDADE FEDERAL DE SÃO CARLOS CENTRO DE EDUCAÇÃO E CIÊNCIAS HUMANAS
GRADUAÇÃO EM PSICOLOGIA
CONDIÇÕES DE TRABALHO RELACIONADAS A PRAZER E SOFRIMENTO DOS TRABALHADORES NO ÂMBITO DE
COOPERATIVAS POPULARES
Lia Botta Riani Costa
Monografia apresentada como parte das exigências para obtenção do título de Bacharel em Psicologia, sob orientação da Profa Dra Ana Lucia Cortegoso.
São Carlos
2005
Aos meus pais, exemplos de amor e dedicação, pelos valores que me passaram, pelo incentivo e pela liberdade.
Aos meus quatro irmãos, pelo
companheirismo e pela energia. À Ana Lucia, pela disposição,
pela paciência e pelos ensinamentos. Aos meus amigos, pela
motivação e pela alegria.
Sumário
Resumo............................................................................................................................................
Capítulo 1. Prazer e sofrimento no trabalho em empreendimentos solidários:
conhecimento disponível e lacunas a preencher........................................................................1
Prazer e sofrimento no trabalho.........................................................................................1 A organização do trabalho no Capitalismo........................................................................5 Breve histórico das organizações de trabalho capitalistas.................................................7 Economia solidária: um novo modo de organização.........................................................9 A economia solidária no Brasil........................................................................................13 Sobre as cooperativas.......................................................................................................14
Capítulo 2. Caracterizando sofrimento e prazer no trabalho: aspectos metodológicos......18
Participantes......................................................................................................................18 Informações a obter..........................................................................................................18 Fontes de informações utilizadas......................................................................................20 Material.............................................................................................................................20
Procedimentos para coleta de dados.................................................................................20 Contato inicial com os participantes e caracterização do empreendimento....................................................................................................20
Entrevistas.............................................................................................................21 Análise de documentos ................................................................................25
Análise dos dados.............................................................................................................26 Capítulo 3. Fatores relacionados a prazer e sofrimento no trabalho de participantes de
empreendimentos solidários: o caso de uma cooperativa de limpeza....................................27
Capítulo 4. Prazer e sofrimento no trabalho em empreendimentos solidários: contingências complexas controlando comportamentos individuais e práticas culturais...44 Participação dos membros nas decisões da cooperativa...................................................44 Inexistência de patrão.......................................................................................................49 Papel da diretoria..............................................................................................................50 Importância das assembléias............................................................................................51 Relevância de diferentes aspectos do trabalho.................................................................51 Situação de trabalho ideal para as entrevistadas...............................................................53 Motivos que levam as cooperadas a executarem suas funções........................................56 Indicações de prazer e sofrimento pelas cooperadas........................................................57 Características do empreendimento que deveriam ser alteradas, de acordo com as opiniões das entrevistadas............................................................................................................59 Expectativas: o que as entrevistadas imaginam que os demais membros esperam delas e o que elas esperam deles..............................................................................................................60 Regras como fundamentos dos relatos.............................................................................62 Referências Bibliográficas........................................................................................................65
Índice de quadros, tabelas e figuras Quadro 1- Distribuição da ocorrência ou não de menções aos participantes do estudo como líderes do grupo..................................................................................................................18
Quadro 2- Questões da entrevista com os participantes e informações que acessaram...23
Quadro 3- Distribuição das respostas das entrevistadas em relação ao papel da diretoria do empreendimento......................................................................................................................29 Quadro 4- Categorias de respostas dadas pelas diretoras e por outros membros sobre a possibilidade de participação nas tomadas de decisão.................................................................30 Quadro 5- Categorias de respostas dadas pelas diretoras e por outros membros para a questão 12, sobre a necessidade ou não de haver assembléias.....................................................30 Quadro 6- Categorias das respostas que justificam o julgamento das diretoras e dos outros membros sobre o fato de não haver um patrão no empreendimento.................................31 Quadro 7- Categorias de respostas dadas pelas diretoras e por outros membros referentes a características da cooperativa que deveriam ser alteradas.........................................................36
Quadro 8- Categorias de respostas referentes a diretoria e referentes a todos os membros sobre o que os entrevistados acham que é esperado do seu trabalho...........................................36 Quadro 9- Respostas das diretoras e dos outros membros a respeito das expectativas que têm dos trabalhos dos demais.......................................................................................................37 Quadro 10- Relatos das cooperadas sobre o horário ideal de trabalho.............................38 Quadro 11- Relatos das cooperadas sobre a divisão de tarefas ideal...............................38 Quadro 12- Relatos das cooperadas sobre o ambiente de trabalho ideal..........................39 Quadro 13- Relatos das cooperadas sobre a responsabilidade ideal para se ter no trabalho.........................................................................................................................................40 Quadro 14- Relatos das cooperadas sobre a remuneração ideal.......................................41 Quadro 15- Relatos das cooperadas sobre o como os relacionamentos pessoais devem ser no trabalho....................................................................................................................................42 Quadro 16- Relatos das cooperadas sobre como deveria ser a divisão ideal de trabalho.43 Tabela 1- Respostas relativas ao julgamento das entrevistadas sobre o fato de não terem patrão............................................................................................................................................31
Tabela 2- Freqüência das respostas encontradas sobre as razões que levam as entrevistadas a executarem suas tarefas.................................................................................32 Tabela 3- Categorias citadas pelas entrevistadas quanto a características do trabalho relacionadas a prazer e sofrimento.........................................................................................34
Figura 1- Distribuição de número de entrevistadas que colocaram cada um dos aspectos do trabalho avaliados em primeiro lugar......................................................................................27 Figura 2- Número de entrevistadas que colocaram cada alternativa em quarto lugar......27
Apêndices Apêndice 1- Roteiro da entrevista inicial para caracterização do empreendimento Apêndice 2- Roteiro da entrevista com os cooperados participantes do estudo Apêndice 3- Termo de compromisso do pesquisador Apêndice 4- Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
Resumo
São muitas as características da organização do trabalho que estão relacionadas a prazer
e sofrimento dos trabalhadores. Todos os aspectos que caracterizam as condições em que os
trabalhadores atuam, como distribuição de tarefas, tipos de relações estabelecidas, tomadas de
decisões, forma como o trabalho é controlado, esclarecimento do significado do trabalho, entre
outros, juntos contribuem para que o trabalhador participe ativamente, cumpra seu dever,
procure inovar e buscar contribuições, sinta-se motivado (ou os respectivos inversos,
dependendo da situação), o que irá influenciar o modo como interage e se relaciona nos vários
ambientes de que faz parte. Mudanças na maneira de organizar o trabalho têm sido
implementadas tanto para garantir o bem-estar do trabalhador quanto para maximizar a
produção do empreendimento. As pesquisas existentes na área focam principalmente empresas
tradicionais, enquanto a presente pretende investigar as situações em que trabalhadores de
empreendimentos fundamentados na economia solidária estão atuando, já que os princípios que
guiam tais empreendimentos possivelmente proporcionem experiências diferentes daquelas que
os trabalhadores de empresas capitalistas vivem. Neste sentido, o presente estudo tem como
objetivo geral pesquisar quais seriam os fatores relacionados a prazer e sofrimento no trabalho
neste tipo de empreendimento. Os meios para obtenção das informações acerca das condições
em que trabalham os cooperados serão a realização de entrevistas com os cooperados, a
observação de reuniões e de momentos de execução das tarefas e a análise de documentos. Tais
dados permitirão a identificação da forma como os trabalhadores estão organizados e o
reconhecimento de indicativos de prazer e sofrimento nestas pessoas, decorrendo daí a produção
de conhecimento a respeito da problemática abordada.
Palavras-chave: organização do trabalho, prazer e sofrimento do trabalhador,
empreendimento solidário, cooperativas populares.
Capítulo 1
Prazer e sofrimento no trabalho em empreendimentos solidários: conhecimento disponível
e lacunas a preencher
Prazer e sofrimento no trabalho
Diante da constatação de que uma grande quantidade de pessoas sofre no trabalho
devido a fatores relacionados à sua organização, e tendo em vista que uma reorganização
poderia proporcionar vivências mais prazerosas, o tema sofrimento e prazer no trabalho adquire
importância e é alvo de preocupação e interesse.
As condições de vida e de trabalho têm sido objeto de estudo por parte de historiadores,
sociólogos, cientistas políticos, antropólogos, psicólogos, entre outros. E mais especificamente,
a relação entre saúde (física e psicológica) e trabalho, tem sido objeto de investigação de
profissionais, como psicólogos organizacionais.
Podemos nos confrontar com duas proposições contraditórias sobre o mesmo fato
humano: é milenar a afirmação de que o trabalho adoece, como também o é a de que ele serve
para proporcionar a cura de inúmeras doenças (Medeiros, 2002). Seligman-Silva indica que o
trabalho pode significar satisfação e desenvolvimento de potenciais pessoais e coletivos,
constituindo situações de bem-estar e vitalidade, como pode estar estreitamente ligado ao
desenvolvimento de transtornos que se expressam em termos psicossociais, psicossomáticos ou
até mesmo psiquiátricos (Medeiros, 2002). Assim, o significado do trabalho pode ser
relacionado a um valor positivo: possibilidade de realização, de satisfação, de crescimento, além
de sustento à família. Mas em várias situações o trabalho acaba sendo fonte de cansaço físico e
mental, de fadiga, angústia, medo e depressão. No entanto, a percepção de desgaste depende das
diferenças marcadas pela história pessoal, personalidade e situação presente de cada um.
Em termos teóricos, a organização do trabalho pode ser definida como a divisão do
trabalho, derivando o conteúdo das tarefas e a divisão de homens representados nos tipos de
comando, responsabilidades e relações com hierarquia e pares (Dejours, 1987; citado por
Mendes, 1996). Para Dejours, é a organização do trabalho que é a responsável pelo sofrimento
mental (Medeiros, 2002).
O desenvolvimento das concepções teóricas sobre prazer-sofrimento e organização do
trabalho tem duas etapas distintas e complementares. Num primeiro momento, o sofrimento é
classificado em patológico e criativo. O patológico gera sentimentos de insatisfação, tédio e
ansiedade, enquanto o criativo é a transformação do patológico, através da ressonância
simbólica, que permite a negociação do desejo do trabalhador com a realidade do trabalho.
O sofrimento patológico se expressa num sentimento do trabalhador de indignidade,
inutilidade, desqualificação e vivência depressiva, todos relacionados com a significação e
reconhecimento do trabalho para si mesmo e para os outros, bem como com o conteúdo
significativo da tarefa, relações com hierarquia e coletivo de trabalhadores.
O sofrimento, então, é visto como uma vivência subjetiva que surge da discrepância
entre uma situação ideal e uma situação presente. Esta discrepância geralmente está associada à
história de vida do sujeito.
O prazer é visto como um processo de sublimação vinculado à escolha profissional e ao
sofrimento criativo, que é transformado caso haja flexibilidade em relação a divisão de trabalho
e de homens. Caso contrário, quando existe rigidez na organização do trabalho, o sofrimento
tende a permanecer, levando o trabalhador a elaborar mecanismos de defesas psicológicas
individuais ou coletivos para manter seu equilíbrio psíquico e evitar descompensações
psicopatológicas ou psicossomáticas.
A forma de expressão desse sofrimento não é necessariamente racional e consciente,
podendo se manifestar pela desmotivação e deteriorização do clima das relações sociais,
transformando-se numa vivência penosa para o sujeito, mascarada pelas estratégias defensivas
(Jayet, 1994; citado por Mendes, 1996). Por isso, uma das formas de investigação do sofrimento
é entender a dinâmica entre a percepção do sofrimento pelo trabalhador e seu mascaramento
pelas defesas.
Num segundo momento, o prazer-sofrimento é estudado em função da forma como os
homens se engajam na dinâmica de construção e evolução da organização do trabalho, onde os
esforços dos trabalhadores são dirigidos à utilização da inteligência astuciosa, para elaboração e
construção de opinião sobre as arbitrariedades, contradições, regras e dificuldades no trabalho, e
ao debate de opiniões e deliberações, que visam acompanhar as decisões e mudanças relativas à
organização do trabalho (Dejours, 1993; citado por Mendes, 1996). As opiniões são resultantes
da experiência pessoal no trabalho, da interpretação das prescrições, valores, obrigações morais,
preferências e personalidade.
Em uma pesquisa realizada por Mendes (1996) em uma empresa pública de
telecomunicações, foram encontrados alguns fatores relacionados ao sofrimento.
• Divisão do trabalho e conteúdo da tarefa:
Foi detectada a presença de fatores relacionados ao sofrimento, como a
despersonalização em relação ao produto, quando os sujeitos comentam que não vêem
resultados no seu trabalho. Além de frustrações causadas pelo adormecimento intelectual, foi
observado ainda que, à medida que não existe oportunidade para pensar a prática de trabalho,
ocorre dissociação entre planejamento e execução. O sentimento de desvalorização pode ser
conseqüência do conflito gerado pela discrepância entre as estratégias utilizadas pela empresa
para alcançar seus objetivos, e as aspirações de realização profissional. As vivências de prazer
foram observadas nos relatos em que existe uma correspondência entre trabalho prescrito e o
real.
• Relações com hierarquia e com pares:
Parece que o sofrimento predomina quando a margem de liberdade é restrita. Muitas
vezes, estas restrições estão relacionadas ao poder político, ao controle de informações e à falta
de participação nas decisões, reforçada pelo individualismo entre os colegas, o que pode ter
como resultado um sentimento de impotência diante da estrutura organizacional. De acordo com
as interpretações da fala, os sujeitos nem sempre expressam diretamente o sofrimento causado
pelo trabalho, especialmente pela fragilização das relações com os pares. Os relatos demonstram
que o espaço público de discussão é inexistente. Isto quer dizer que a cooperação, confiança e
estabelecimento de regras comuns não ocorrem no grupo pesquisado. Essas verbalizações
permitem apontar para a não existência de um coletivo de trabalho, havendo um
comprometimento do processo de transformação do sofrimento em prazer.
De acordo com o conjunto das verbalizações, parece que o sofrimento emerge quando os
sujeitos se referem aos princípios tayloristas, como a divisão do trabalho; às tarefas repetitivas,
automatizadas e padronizadas; e às restrições do grau de autonomia técnica e qualificação e da
margem de liberdade, expressa na rigidez e controle hierárquico. As vivências de prazer
ocorrem quando os sujeitos conseguem obter um representação global do processo de trabalho,
participar da elaboração dos procedimentos técnicos na tarefa, especialmente a criatividade.
Pesquisas da área mostram que muitos trabalhadores encaram seu cotidiano como uma
luta permanente, em que precisam assumir atitudes defensivas e se opor às formas de
dominação instauradas no local de trabalho (Pereira, 1979; citado por Silva, 1994). O
sofrimento pode surgir também pelo sentimento de perda de liberdade no trabalho, pela
monotonia, pelo sentimento de impotência, pelo cansaço, pela dificuldade de conciliação entre
trabalho e família, pelo tipo de relação com a chefia, pelo ritmo de trabalho, pela sobrecarga
física e mental, para citar alguns fatores.
Estudos epidemiológicos relativos às doenças no trabalho têm revelado um elevado
índice das que se enquadram na área da Saúde Mental, e que têm como fatores desencadeantes,
sentimentos pessoais tais como angústias e ansiedades, o que é popularmente chamado de
stress. Para Gutierrez e Osterman (citados por Medeiros, 2002), “stress é entendido como o
desequilíbrio do sentimento de bem-estar que vai além dos níveis usuais de tolerância. É o
resultado não somente de fatores de trabalho, mas de falta de equilíbrio entre os fatores de stress
e de apoio que estão presentes no trabalho, na vida social e no terreno pessoal”.
De acordo com Lima (1996), a ergonomia demonstra em suas análises da situação de
trabalho, que os fatores mediatos e imateriais da situação de trabalho (tempo de trabalho,
relações hierárquicas, aspectos organizacionais, etc) são preponderantes sobre os fatores
imediatos (ambiente físico, características fisiológicas ou psicológicas dos trabalhadores, etc).
Assim, enquanto estes fatores imateriais forem considerados como apenas mais um dentre
outros, negando-os como estruturadores de uma situação de trabalho, a compreensão do
adoecimento pelo trabalho e as tentativas de atuação sobre o mesmo não terão efetividade
(Bernardino e Bento, 2002).
Como condições que podem contribuir para originar perturbações, Seligmann-Silva
(1994) aponta uma série delas tais como: tarefas que exigem permanente e intenso controle
emocional, tarefas com grande responsabilidade com vidas humanas, com valores vultuosos ou
com a própria continuidade da produção. Outras situações referidas são a não utilização de
equipamentos de proteção individual por parte dos trabalhadores nos casos de situações que
ameaçam sua integridade física, a estrutura temporal do trabalho – jornadas de trabalho,
organização de turnos, folgas, pausas, pressão de tempo -, a densidade do trabalho- com o
avanço tecnológico aumenta-se o esforço mental -, e o controle no trabalho, que pode gerar
ansiedade, acarretando em tensão e fadiga mental. Além disso, deve-se atentar para as
necessidades psicológicas do trabalhador, tal como a necessidade de reconhecimento social da
situação de trabalho. Assim, a organização do trabalho deve ser analisada em relação a vários
aspectos, como relação entre trabalhadores, importância do trabalho, periculosidade da tarefa,
jornada, turno, folgas, descanso, pausa, exigências cognitivas, controle de produtividade,
possibilidade de autonomia, uso de criatividade, reconhecimento social do trabalho e aspectos
do ambiente de trabalho, para que se tenha um relação multicausal das perturbações
apresentadas pelos trabalhadores.
Dejours salienta que o trabalhador não pode ser considerado como um motor humano,
pois está sempre sofrendo excitações externas e internas que o modificam permanentemente;
não é uma máquina nova que chega ao trabalho, já que possui uma história pessoal “que se
concretiza por uma certa qualidade de suas aspirações, desejos, motivações e necessidades
psicológicas, que integram sua história passada”, fazendo-o único e pessoal. Em função de sua
história, o trabalhador irá dispor de vias de descargas preferenciais (Medeiros, 2002).
A organização do trabalho no Capitalismo
As pesquisas feitas até o momento a respeito de sofrimento e prazer no trabalho tratam
quase que exclusivamente de organizações capitalistas. E estas derivam de teorias do trabalho
como o taylorismo, cujo autor exclui os fatores psicológicos e fisiológicos humanos referentes à
vida social e desconsidera o acúmulo de fadiga e a fadiga nervosa; e o fordismo, que absorveu
as idéias de Taylor para aplicá-las às linhas de produção com o objetivo de intensificar o ritmo
de trabalho (Silva, 1994).
Antes do surgimento do capitalismo, o que existia era a produção simples de
mercadorias, em que os agentes eram os possuidores individuais dos seus meios de produção e
distribuição e portanto também dos produtos de sua atividade, que eles intercambiavam em
mercados. O agente era, neste modo, quase sempre uma família ou um domicílio, cujos
membros trabalhavam em conjunto, usufruindo coletivamente dos resultados de sua atividade.
A agricultura familiar, o artesanato e o pequeno comércio são exemplos de atividades
integrantes deste modo de produção. O capitalismo nega este modo de produção ao separar a
posse e o uso dos meios de produção e distribuição. Esta separação surge mais ou menos
naturalmente do funcionamento dos mercados, em que os vitoriosos no jogo competitivo
acabam por se apoderar dos meios de produção dos derrotados (Singer, 2000).
O capitalismo é um modo de produção em que os meios de produção e de distribuição,
assim como o trabalho, se tornam mercadorias, apropriadas privadamente. Os meios de
produção e distribuição tornam-se capital à medida que se concentram nas mãos duma minoria,
enquanto a maioria se limita à posse de sua capacidade individual de trabalho (Singer, 2000).
Enquanto a existência da força de trabalho como uma mercadoria implica na separação
do trabalhador dos meios de produção, o processo de trabalho reúne-os novamente. No
capitalismo, eles estão reunidos sob condições que são estabelecidas pelo capital e com a
finalidade de perseguir os objetivos do capital, como a valorização, atingida através da
maximização da produção de mais-valia e, tanto quanto possível, da eliminação de todos os
outros objetivos potencialmente conflitantes. Assim, o processo de trabalho capitalista é a
unidade entre os processos de valorização e o processo de trabalho real sob a adequada base de
uma forma específica de organização social da trabalho.
As formas que constituem a base da subordinação real são: trabalho assalariado
(trabalhadores sem nenhum acesso aos meios de subsistência exceto através da venda da força
de trabalho); meios de produção sob a forma de mercadorias; meios de subsistência sob a forma
de mercadorias; o produto sob a forma de mercadorias. As formas de coerção nos modos pré-
capitalistas de produção eram diretamente políticas e sociais. Na fase de transição, a compulsão
assume pela primeira vez uma forma econômica – a compulsão para vender a força de trabalho,
para sobreviver. Este poder econômico do capital sobre o trabalho possibilita ao capital, embora
dependendo de métodos e meios de produção inalterados, coagir o trabalhador a um grau de
intensidade, duração e continuidade de produção (Mepham, 1976).
A valorização é o objetivo da gerência capitalista. A maquinofatura é a base material que
permite ao capital tomar o poder sobre o processo de trabalho e, a partir daí, traduzir este
objetivo num sistema de relações concretas de produção. Ela permite ao capital projetar o
processo de trabalho de modo a obter ao máximo grau possível, com base num nível de
desenvolvimento dado, as seguintes características: velocidade na execução das tarefas;
intensificação na execução das tarefas; precisão, previsibilidade e qualidade máximas nas
transformações a serem efetuadas no objeto de trabalho; continuidade na produção; trabalho
barato e funções de trabalho tais que o trabalhador seja facilmente substituível; economia de
matéria-prima. O poder que tem o capital para perseguir estes objetivos é, em parte, o poder do
capital para selecionar, projetar ou desenvolver a maquinaria e outros aspectos da tecnologia
envolvida no processo de trabalho. O capital também tem, e deve ter, o poder para projetar e
operar a organização social da produção dentro da empresa. Deve assim organizar não apenas as
máquinas e sua integração, mas também um sistema de relações de poder, cuja função última
consiste em definir e fazer valer a disciplina do processo de trabalho. Além disso, deve
organizar um processo de produção, difusão e processamento da informação, que é um
pressuposto do funcionamento correto dos sistemas de máquinas e de disciplina.
As três características básicas da organização capitalista do processo de trabalho são: (a)
a divisão entre trabalho intelectual e trabalho manual; (b) o controle hierárquico; (c)
fragmentação/ desqualificação do trabalho.
(a) A divisão entre trabalho intelectual e trabalho manual
A divisão entre concepção e execução é imanente ao processo de trabalho capitalista, e
nesse sentido pode-se falar de uma imanente divisão entre trabalho intelectual e trabalho
manual. Constitui um aspecto do monopólio que o capital tem sobre o conhecimento e o poder
de projetar sistemas de produção. Só por meio da posse e da reprodução desse monopólio pode
o capital impor seus objetivos. Vista sob essa ótica, a divisão não tem nada a ver com a divisão
entre funções mentais e físicas do organismo humano, tomadas num sentido puramente abstrato
- o trabalho humano envolve percepção e pensamento, da mesma forma que todo trabalho
mental envolve alguma atividade corporal. Claramente, portanto, do ponto de vista da teoria do
processo de trabalho capitalista, a divisão importante é aquela entre os que produzem ou
aplicam o conhecimento científico e tecnológico no projeto de sistemas de produção e na
resolução cotidiana dos problemas envolvidos na operação do sistema e aqueles cuja relação
com o sistema de produção é calculada, padronizada e especificada previamente pelo capital,
com o objetivo de produzir um produto que seja previamente conhecido com precisão.
(b) Hierarquia
Esta é imanente ao processo de trabalho capitalista em virtude de sua natureza
inerentemente antagônica. A disciplina é essencial, de forma que o capital possa alocar tarefas,
impor velocidades e intensificações, punir a má qualidade, e assim por diante. O capital é
forçado a tratar o trabalhador de forma subjetiva, isto é, no interesse da eficiência é forçado a
levar em consideração a especificidade do trabalhador, distinguindo-o da máquina. Mas é
também forçado a manter sua relação com o trabalhador dentro de limites rígidos – limites
definidos pelo contrato salarial na esfera da troca e pelo objetivo da valorização na esfera da
produção. O que é essencial à hierarquia capitalista é que é o capital que, ao final das contas, dá
as regras no interior do processo de trabalho.
(c ) Fragmentação/ Desqualificação
A desqualificação é inerente ao processo de trabalho capitalista porque o capital deve
visar ter funções de trabalho que sejam rotinas calculáveis, padronizáveis, porque este trabalho
deve ser executado à velocidade máxima e com o mínimo de porosidade e porque o capital quer
força de trabalho que seja barata e facilmente substituível.
Breve histórico das organizações de trabalho capitalistas
Diante da necessidade de aumentar a produção e diminuir o custo dos produtos, surge o
modelo de produção de massa nos Estados Unidos, no início do século XX. Taylor introduz a
Organização Científica do Trabalho, defendendo a existência de um modo ótimo para a
realização do trabalho, definido e padronizado através do estudo de tempos e movimentos, que
elimina a variabilidade e iniciativa individual através da imposição de um método e tempo
padrão de execução (Fleury e Vargas, 1994, citados por Bernardino e Bento, 2002). Os
trabalhadores são selecionados cientificamente e mais um princípio é estabelecido: a cisão entre
planejamento e execução - a gerência “conhece” o trabalho, sendo responsável pelo
planejamento e controle do mesmo, manipulando idéias e informações sem contato direto com o
real. Foi a intercambialidade das peças, a possibilidade de ajusta-las entre si, que primeiro
permitiu uma diminuição significativa no tempo de montagem dos produtos; a linha de
montagem móvel acentuou essa diminuição, determinando ciclos de trabalho ainda mais curtos,
com o trabalhador parado, fazendo movimentos repetidos e em ritmo acelerado, determinados
pela máquina (Womack, 1992, citado por Bernardino e Bento, 2002).
O trabalho na produção em massa caracteriza-se, enfim, pelo ritmo intenso, utilizado na
realização de tarefas simples e extremamente repetitivas e pela baixa exigência cognitiva
(devido à cisão entre planejamento e execução). Verifica-se, então, sofrimento físico, pelo
esforço músculo-esquelético exigido; mental, pela pouca utilização das potencialidades
cognitivas; e psíquico, em resposta à alta exigência de produtividade.
Ohno, o principal mentor da Escola Japonesa, coloca que o Fordismo é a técnica
indicada para a economia de custos de fabricação para mercados em expansão de produtos
idênticos, ao passo que o sistema Toyota seria a técnica de produção a custos baixos para
mercados estagnados e economias de crescimento lento, ou ainda para mercados em expansão,
de produtos variados e diferenciados (Coriat, 1993; citado por Bernardino e Bento, 2002). Essas
últimas eram características do mercado japonês após a Segunda Guerra Mundial. Esse fato
associado às condições históricas e sociais do país (crise determinando demissão e posterior
estabilização dos funcionários que ficaram empregados; governo japonês proibindo
investimentos externos no setor automobilístico, etc), permitiram o desenvolvimento da
Produção Enxuta (Womack, 1992; citado por Bernardino e Bento, 2002). A produção enxuta,
atendendo às necessidades de maior flexbilização da produção, determina mudanças em
diferentes frentes. A base tecnológica se automatiza. Modificam-se as relações de trabalho, as
atividades passam a ser realizadas em grupo, exigindo multifuncionalidade e menor
hierarquização. Preconiza-se a participação dos trabalhadores para a melhoria da produção. As
relações entre empresas dentro de uma mesma cadeia tornam-se mais próximas e complexas.
Um dos principais aspectos que caracterizam a produção enxuta é o controle da produção,
determinado por dois princípios básicos, o JIT (Just In Time) e o TQC (Total Quality Control),
que buscam alta qualidade e produtividade, negando-se a possibilidade de ineficiência e
desperdício. Essa nova forma de organização permite e estimula que os problemas venham à
tona, para discuti-los e solucioná-los. O perfil da mão-de-obra se modifica, deixando de ser
mera repetidora de movimentos simples, passando a ser responsável por um maior número de
atividades (relacionadas à produção e ao controle de qualidade), necessitando de qualificação,
iniciativa e motivação constante.
É importante ressaltar, também, que na esfera das empresas, as questões sobre
adoecimento se colocam, mas com algumas diferenças em relação à esfera da Saúde: as
considerações de que as condições de trabalho que vão além da tolerância humana normal
podem afetar seriamente os trabalhadores, acarretando danos em sua saúde física e mental,
acarretam também uma elevação nos custos da produção da empresa, e fazem com que diversos
especialistas passem a estudar maneiras de se baixar os custos relativos às perdas de pessoal e
de produção, identificando fatores que contribuem para o adoecimento, e incrementando
medidas de intervenções preventivas no trabalho. Além disso, a maior ou menor satisfação com
a tarefa, comunhão com a proposta e a identificação com o método de realização, são elementos
importantes que também interferem no processo de trabalho (Medeiros, 2002).
Entretanto, apesar do avanço representado pela adoção de sistemas produtivos mais
flexíveis, o sofrimento no trabalho, causador de adoecimento, incapacitação e danos sociais,
continua presente; mas este perfil de sofrimento tem características diferentes em relação à
produção em massa. No modelo da produção enxuta, a relação atividade/trabalhador tem maior
possibilidade de trazer satisfação do que no trabalho taylorizado. O trabalho em grupo, a maior
autonomia para sua realização, a variedade de atividades desenvolvidas durante a jornada de
trabalho, a possibilidade de compreensão e responsabilização pelo bom andamento do processo
produtivo, as oportunidades e importância da qualificação profissional, nos apresentam um
sistema produtivo onde possivelmente trabalhar traz mais satisfação do que sobrecarga e
sofrimento.
Economia solidária: um novo modo de organização
Tendo em vista que estas mudanças (trazidas pela reestruturação produtiva) beneficiam
o trabalhador, é aceitável supor que nas empresas em que se propõem uma administração
autogestionária, as relações proporcionadas neste tipo de empreendimento têm mais chance de
satisfazer seus membros do que aquelas existentes em empresas tradicionais que impõem um
determinado ritmo aos trabalhadores.
A economia solidária surge como modo de produção e distribuição alternativo ao
capitalismo, criado e recriado periodicamente pelos que se encontram (ou temem ficar)
marginalizados do mercado de trabalho, já que o aproveitamento incompleto da capacidade de
trabalho do proletariado (o que Marx chamou de “exército industrial de reserva”) é
característica do capitalismo. A economia solidária casa o princípio da unidade entre posse e
uso dos meios de produção e distribuição com o princípio da socialização desses meios.
Para compreender a lógica da economia solidária é fundamental considerar a crítica
operária e socialista ao capitalismo. O que ela condena no capitalismo é antes de tudo a ditadura
do capital na empresa, o poder ilimitado que o direito de propriedade proporciona ao dono dos
meios de produção (Singer, 2000). Isso faz com que qualquer trabalhador deva obediência
irrestrita às ordens emanadas do dono, que todo fruto do trabalho coletivo seja propriedade do
capitalista e que o trabalhador só faça juz ao salário previsto contratualmente e aos seus direitos
legais.
A crítica ao capitalismo prossegue ao considerar os seus efeitos extra-empresa: a
crescente desigualdade entre a classe capitalista, cuja riqueza aumenta coma acumulação do
capital, e a classe trabalhadora, cujos ganhos são apenas suficientes para reproduzir sua força de
trabalho cotidianamente e produzir nova força de trabalho – os seus descendentes – que
substituirão os trabalhadores aposentados e os sustentarão mediante suas contribuições
previdenciárias (Singer, 2000).
Os resultados históricos do projeto em construção de economia solidária podem ser
sintetizados do seguinte modo: 1. homens e mulheres vitimados pelo capital organizam-se como
produtores associados tendo em vista não só ganhar a vida mas reintegrar-se à divisão social do
trabalho em condições de competir com as empresas capitalistas; 2. pequenos produtores de
mercadorias, do campo e da cidade, se associam para comprar e vender em conjunto, visando
economias de escala, e passam eventualmente a criar empresas de produção socializada, de
propriedade deles; 3. assalariados se associam para adquirir em conjunto bens e serviços de
consumo, visando ganhos de escala e melhor qualidade de vida; 4. pequenos produtores e
assalariados se associam para reunir suas poupanças em fundos rotativos que lhe permitem
obter empréstimos a juros baixos e eventualmente financiar empreendimentos solidários; 5. os
mesmos criam também associações mútuas de seguros, cooperativas de habitação etc (Singer,
2000).
Há indiscutivelmente forte afinidade entre as classes trabalhadoras e os princípios que
regem a economia solidária. Fica em aberto a questão se esta afinidade se deve ao cálculo
probabilístico que mostra à maioria dos trabalhadores que suas chances de ascender à classe
dominante são mínimas ou se o anticapitalismo da maioria dos trabalhadores decorre de sua
consciência de classe, adquirida com a prática da luta de classes ao longo da vida (Singer,
2000).
Toda empresa solidária é ao mesmo tempo uma associação comunitária. Quem se
associa a ela não faz um contrato de trabalho mas entra numa união em que o seu destino
individual se funde com os de seus companheiros. Por isso, o processo de aprendizado coletivo
que vai viabilizar a empresa começa antes mesmo que ela venha funcionar. Na sua gestação, os
futuros sócios interagem, fazem cursos de cooperativismo ou similares e de preparação
profissional e se estruturam politicamente ao elaborar o estatuto da empresa. Assim, quando
a empresa solidária começa a funcionar, os sócios já têm certa prática em autogestão, embora
lhes falte, possivelmente, toda competência específica para operar no ramo de negócios
escolhido.
Numa empresa autogestionária, a propriedade pertence a um coletivo composto por
associados que são, ao mesmo tempo, proprietários e trabalhadores. Cada associado detém um
número de cotas-partes da empresa, e essas cotas são baseadas no padrão de rendimento da
classe trabalhadora.
As principais mudanças introduzidas pelas empresas autogestionárias no processo de
trabalho dizem respeito à divisão de tarefas, às cadências e, em geral, ao que na empresa
capitalista corresponde ao controle do trabalho – que no sistema autogestionário é denominado
regulação do trabalho (Vieitez e Dal Ri, 2001).
Os quatro temas sobre os quais a regulação incide são: a divisão do trabalho fabril em
funções intelectuais e manuais, o parcelamento minucioso das funções, o ritmo e análise do
processo de trabalho. No que diz respeito à divisão do trabalho, há uma significativa alteração
na tradicional bipartição da fábrica em setor com funções de execução e setor com funções de
direção, pois os associados são ao mesmo tempo os trabalhadores e os dirigentes da
organização. A quebra do sistema de funções especializadas e fixas remete a quatro itens:
desenvolvimento profissional – há liberdade para que os trabalhadores aprendam novas funções
se assim o desejarem; flexibilização da disposição funcional dos trabalhadores – em caso de
necessidade, o associado deve assumir outras funções dentro da empresa; polivalência –
medidas são tomadas para propiciar novos aprendizados e a mudança de funções; e rodízio de
funções. Isso ocorre como decorrência da existência de valores de identidade coletiva em
formação, da necessidade de otimizar a utilização de um quadro fixo e estável de associados e
do interesse na qualificação dos associados.
A estrutura de poder que emerge nessas organizações expressa, por um lado, a situação
de classe dos trabalhadores e, por outro, a negação do sistema de classes. O capital foi
suprimido no âmbito da empresa. Os trabalhadores encontram-se em condições de igualdade,
uns com os outros, frente à ausência de propriedade, riqueza ou poder, o que se expressa no
plano subjetivo como uma aspiração à integração igualitária e democrática no novo
empreendimento. Essa igualdade se encontra expressa formalmente na assembléia geral do
coletivo dos trabalhadores, fórum no qual engendra-se a empresa autogestionária e no qual
todos têm o direito de se expressar e deliberar livremente. A assembléia geral é o espaço
primordial para o exercício da gestão, é o próprio trabalhador coletivo no pleno exercício de
suas funções autogestionárias (Vieitez e Dal Ri, 2001).
Um dos princípios de organização das empresas autogestionárias é a constituição de
empresa, ou seja, um conjunto de ordenamentos que define e norteia os principais aspectos da
sua vida. Essa constituição aparece na forma de estatutos que regem as relações estabelecidas
(Vieitez e Dal Ri, 2001).
Como bases de sustentação à economia solidária é necessário garantir fontes de
financiamento, redes de comercialização, assessoria técnico-científica, formação continuada dos
trabalhadores e apoio institucional e legal por parte das autoridades governamentais. O que
debilita o desenvolvimento da economia solidária é que a maior parte de suas unidades atuam
isoladamente em mercados dominados por empresas capitalistas, com pouco ou nenhum acesso
a crédito, a redes de comercialização, à assessoria tecnológica etc. A construção dum setor
integrado de empresas e instituições que se regem pelos princípios da economia solidária é
condição essencial para evitar a degeneração ou até mesmo a falência. A construção da
competência nos princípios da solidariedade é perfeitamente possível desde que cada
empreendimento possa se financiar, abastecer-se, escoar sua produção, aperfeiçoar-se
tecnologicamente e educar seus membros em intercâmbio com outros empreendimentos
solidários. Em relação ao apoio do governo, o desenvolvimento da economia solidária e sua
integração num setor pode se dar de baixo para cima, por iniciativa das próprias empresas e
instituições de apoio, sem interferência direta de autoridades governamentais. Esta alternativa
parece preferível sobretudo para preservar a autenticidade das organizações solidárias, quer da
sua democracia interna e da sua autonomia externa (Singer, 2000).
A adequação dos produtos ao mercado, a competitividade dos preços, as características
dos mercados consumidores, a estabilidade dos produtos nesses mercados e as políticas de
vendas são indicadores que incidem no desempenho das empresas em curto prazo. Além disso,
os relacionamentos das empresas autogestionárias com os vários sujeitos que atuam nos
mercados de produtos e serviços também devem ser considerados.
A economia solidária no Brasil
A economia solidária no Brasil resulta de movimentos sociais que reagem à crise de
desemprego em massa, que tem seu início em 1981 e se agrava com a abertura do mercado
interno à importações, a partir de 1990. Em 1991, tem início o apoio de assessores sindicais a
operários que conseguem se apossar da massa falida da empresa que antes os empregava,
formando uma cooperativa de produção, que retoma as operações e assim “salva” os postos de
trabalho até então ameaçados de fechamento. Três anos depois, diversas empresa
autogestionárias fundam a Associação Nacional de Trabalhadores em Empresas
Autogestionárias e de Participação Acionária (Anteag). Outro movimento que luta contra a
exclusão é o Movimento dos Trabalhadores Rurais Sem Terra (MST), que se empenha na
organização de moradores do campo e mais tarde também de cidades, que desejam se integrar à
economia mediante a obtenção de terra mantida improdutiva em latifúndios (Singer,2000).
Como decorrência do grande movimento de Ação da Cidadania contra a Fome, a Miséria e pela
Vida, que mobilizou milhões de pessoas entre 1992 e 1994, surgiram também as Incubadoras
Tecnológicas de Cooperativas Populares (ITCP), que pertencem a universidades e se dedicam à
organização da população mais pobre em cooperativas de produção ou de trabalho, às quais dão
pleno apoio administrativo, jurídico-legal e ideológico na formação política, entre outros.
Outras entidades importantes de apoio à economia solidária são a Agência de Desenvolvimento
Solidário (ADS), da grande central sindical CUT, em parceria com a Unitrabalho e o Dieese, o
Departamento Intersindical de Estudos Estatísticos, Sociais e Econômicos, que assessora todos
os sindicatos brasileiros há mais de quarenta anos (Singer, 2000).
O intenso crescimento das cooperativas e associações de produção autogestionárias está
indubitavelmente associada ao desemprego e à precarização do trabalho, que está excluindo
milhões do mercado formal de trabalho. Mas a economia solidária está longe de ser uma reação
espontânea de pessoas atingidas pela crise. A idéia de se juntar e organizar uma atividade
econômica coletiva, à base de participação igualitária nas decisões e no capital é levada para os
trabalhadores por meio de entidades , como a Anteag, o MST, as ITCP e a ADS, que estão
reinventando a economia solidária na atual conjuntura brasileira (Singer, 2000).
Com o objetivo de gerar trabalho e renda por meio da economia solidária, os
trabalhadores mostram enorme dedicação e disposição de suportar sacrifícios, sendo este
empenho recompensado pela oportunidade de resgate da cidadania, já que podem experimentar
em suas vidas o gozo de direitos iguais para todos, o prazer de poderem se exprimir livremente
e de serem escutados e o orgulho de perceber que suas opiniões são respeitadas e pesam no
destino do coletivo. Assim , é possível considerar a organização de empreendimentos solidários
o início de revoluções locais, que mudam o relacionamento entre os cooperados e destes com a
família, vizinhos, autoridades públicas, religiosas, intelectuais etc. Trata-se de revoluções tanto
no nível individual como no social. Esse caráter revolucionário da economia solidária abre-lhe a
perspectiva de superar a condição de mero paliativo contra o desemprego e a exclusão (Singer,
2000).
Sobre as cooperativas
O surgimento das primeiras cooperativas está registrado no início do século XIX,
especialmente na Alemanha e na Inglaterra. Mas através de uma pesquisa histórica, como feita
por Rech (2000), observa-se que tipos semelhantes de organização apareceram muito antes
disso, como por exemplo os grêmios do antigo Egito, os orglonas e tiasas na Grécia, os incas e
os astecas na América; que tinham formas expressivas de solidariedade e cooperação no
trabalho e na vida em geral. Mas foi no século XIX que as cooperativas se organizaram no
modelo atual.
Os chamados socialistas utópicos entendiam a cooperativa como um dos caminhos para
uma nova ordem econômica e social. No entanto, nos países onde se intentou implantar uma
experiência socialista, o papel das cooperativas, mesmo que tenham exercido uma importante
atividade na organização dos camponeses, sempre foi interpretado como instrumento
complementar aos planos de coletivização governamental e não como iniciativa autônoma dos
trabalhadores.
Já os liberais e os fisiocratas capitalistas entendiam as cooperativas como corretivo dos
defeitos do sistema capitalista. Neste caso, a cooperativa viria atenuar as características
egoísticas e concentradoras de capital do sistema vigente. Pó isso é que nas primeiras
experiências de cooperativa foi apresentada a proposta de eliminação do lucro e o fim da
concorrência interna e a simplificação da repartição dos ganhos.
No Brasil, a preocupação dos poderes públicos em intervir nas cooperativas manifestou-
se em 1932 com a primeira lei básica específica do cooperativismo e tinha como objetivo
enfrentar, pela diversificação agrícola, as quebras provocadas pelos problemas com o comércio
internacional do café.
A cooperativa é uma iniciativa autônoma de pessoas, caracterizada por possuir dupla
natureza, já que é simultaneamente uma entidade social (um grupo organizado de pessoas) e
uma unidade econômica (uma empresa financiada, administrada e controlada
comunitariamente), tendo como objetivo principal de ser utilizada diretamente pelos associados
como meio para prover bens e serviços que necessitam e que não conseguem obter
individualmente em condições semelhantes.
Os princípios cooperativistas são:
• Livre acesso e adesão voluntária,
• Controle, organização e gestão democrática,
• Participação econômica dos seus associados,
• Autonomia e independência,
• Educação, capacitação e informação,
• Cooperação entre as cooperativas e
• Compromisso com a comunidade.
O costume e a própria tradição cooperativista, visando preservar o princípio da
democracia, procuram garantir mecanismos de gestão participativa, como: conselho de
administração e assembléia geral, e determinação de que cada sócio tenha apenas um voto.
Uma das primeiras atividades educativas da cooperativa deve ser a busca da conciliação
dos interesses individuais com o bem comum, procurando meios para que todos os sócios
tenham condições plenas de participação – onde as pessoas se sintam integrantes autônomos da
cooperativa; e suas sugestões, críticas, intervenções sejam ouvidas e levadas em conta.
Numa cooperativa não se pode assumir uma postura de subordinado, mas é necessário se
envolver, participar e se esforçar para que a cooperativa siga em frente. Para isso, é necessário
que as pessoas que vão participar da cooperativa assumam a sua posição de donos, sujeitos do
empreendimento e não de meros participantes. A questão de ser dono pode ser vista como
problemática se pensarmos que é necessário que haja uma superação de uma situação até então
existente, que haja necessidade de haver uma mudança de mentalidade.
Um grande problema relacionado às cooperativas é o fato de que a absorção da idéia
cooperativista pelo sistema capitalista inviabilizou as possibilidades da cooperação total e as
cooperativas capitularam quase sempre ao predomínio do capital e acabaram por pender muito
mais em direção a empresas com características profundamente comerciais e pouco se
importando com os interesses dos trabalhadores. Além disso, a permanente pressão e a
necessidade de enfrentamento da concorrência provocaram dificuldades de relacionamento no
conjunto do movimento cooperativista desencadeando, em determinados momentos, verdadeiras
lutas para a conquista e manutenção de espaços comerciais e mercados, colocando cada uma
isolada na luta pela própria sobrevivência. Outro problema se refere à questão do lucro, já que,
mesmo tendo o nome de sobras, nem sempre o espírito inicial de não buscá-lo se mantém nas
operações de compras, vendas e retorno aos sócios. Finalmente, nas relações internas, na
estrutura das cooperativas ocorreram problemas com promoções pessoais à custa de outros,
criando disparidades de capitalização e concentração de poder, além de sérios arranhões na
democracia.
A empresa autogestionária, apesar de eliminar algumas determinações que originam os
conflitos ligados às relações de trabalho capitalista, preservam elementos fundamentais do
trabalho alienado em seu atual estágio de desenvolvimento. Desse modo, conflitos decorrentes
da alienação do trabalho, modificados em sua substância e manifestação fenomênica, não
apenas subsistem nas empresas autogestionárias como ainda constituem um dos eixos sobre o
qual ela se move (Vieitez e Dal Ri, 2001).
As empresas autogestionárias alteraram pouco os processos de trabalho oriundos das
empresas capitalistas, particularmente no que tange às relações dos trabalhadores com as
máquinas e equipamentos, tecnologias de produção e materiais objetos de transformação. Como
conseqüência desse fato, as condições dos trabalhadores das empresas autogestionárias
mantêm-se próximas às das demais empresas no que se refere especificamente a esse tema
(Vieitez e Dal Ri, 2001). Essa situação dos trabalhadores no processo de trabalho encontra-se
em contradição tanto com a estrutura geral das relações de trabalho, quanto com os propósitos
democráticos declarados das empresas autogestionárias. No entanto, as dificuldades para mudar
a organização do processo de trabalho são evidentes: as máquinas, equipamentos e tecnologias
de produção utilizadas determinam, em grande parte, a organização do processo de trabalho. As
empresas autogestionárias não podem modificar a concepção do sistema de máquinas e
equipamentos, pois a mudança desses implementos depende de forças sociais que transcendem
a simples vontade e a possibilidade das organizações.
Um outro fator diz respeito à real adesão ou não dos associados aos princípios solidários,
já que isto poderá influenciar no seu engajamento. As experiências serão, provavelmente,
vivenciadas de maneiras diversas, de acordo com o ideal que leva a pessoa a participar do
empreendimento.
As dificuldades e desafios encontrados pelos membros das cooperativas em relação ao
tipo de tarefa realizado, às relações de trabalho estabelecidas, ao duplo papel - de ser ao mesmo
tempo proprietário e trabalhador – e em relação à mudança de mentalidade necessária ao tornar-
se dono (e não mais subordinado) também devem influenciar suas vivências de prazer e
sofrimento.
Admite-se que este “novo” tipo de organização do trabalho proporcione experiências
que possam estar relacionadas ao sofrimento do trabalhador, e disso decorre a necessidade e
importância, tanto científica quanto social, de se investigar essas relações.
O presente estudo teve como objetivo principal analisar as condições de trabalho de uma
determinada cooperativa com o intuito de revelar possíveis fontes de sofrimento e prazer para os
cooperados. A hipótese era a de que as diferenças entre as condições de trabalho em empresas
capitalistas e as organizações cooperativas proporcionem diferentes vivências de prazer e
sofrimento. Como objetivo específico, pretendeu-se verificar o modo de conciliação entre
execução e administração do trabalho pelos cooperados. O fato de que aos membros é
determinada mais uma função, a de participar das assembléias para tomadas de decisões em
grupo, pode proporcionar tanto prazer (pelos sentimentos positivos relacionados a essa função),
quanto sofrimento (proporcionado por sentimentos negativos em relação a mais uma
incumbência). O propósito foi identificar quais seriam esses sentimentos (positivos e negativos)
relacionados ao papel de membro de uma cooperativa (ao menos desta cooperativa estudada).
Assim, procurou-se investigar como se dá a organização de determinada cooperativa,
como se dá a adesão aos princípios solidários, sob controle de quê os cooperados atuam, quais
as dificuldades encontradas pelos cooperados, e, por fim, caracterizar possíveis fontes de prazer
e sofrimento nesse tipo de empreendimento (cooperativas populares, especificamente) através
da busca por indicativos nos relatos das pessoas.
Capítulo 2
Caracterizando sofrimento e prazer no trabalho: aspectos metodológicos
Participantes
Os participantes da pesquisa foram membros de uma cooperativa que presta serviços de
limpeza, localizada na cidade de São Carlos. A escolha dos membros do empreendimento que
iriam participar da pesquisa como entrevistados foi baseada em alguns critérios. Primeiramente,
foram selecionados os membros que já haviam participado como diretores e os que eram
diretores atualmente - 4 membros. Em seguida, mais quatro membros foram selecionados de
acordo com os resultados de uma pesquisa sobre liderança realizada no mesmo empreendimento
que solicitava aos entrevistados que apontassem pessoas que se destacavam por serem líderes,
mesmo que não formalmente, no grupo. No Quadro 1 são apresentadas as indicações ou não de
participantes do grupo como líderes na pesquisa citada. Os outros seis entrevistados foram
escolhidos aleatoriamente, na tentativa de que a amostra pudesse ser representativa da
cooperativa. Todos os participantes precisaram ter aceitado, anteriormente, colaborar com a
pesquisa, e tiveram que assinar o Termo de Consentimento Livre e Esclarecido.
Entrevistada Citada? Laura Sim Daniela Sim Célia Sim Lúcia Sim Marilene Não Flávia Sim Melina Não Raquel Não Maria Não Rosina Não Rebeca Não Ana Sim Sandra Sim Denise Sim
Quadro 1: Distribuição da ocorrência ou não de menções aos participantes do estudo como líderes do grupo. Os nomes dos participantes são fictícios.
Informações a obter
A coleta de dados foi guiada pela pergunta: Quais são as fontes de prazer e sofrimento
decorrentes da forma como o trabalho está organizado na cooperativa popular? Ou: Quais são as
condições de trabalho relacionadas a prazer e sofrimento no âmbito das cooperativas?
Assim, houve necessidade de definir quais eram as características relacionadas às
diferentes variáveis: forma de organização do trabalho (condições de trabalho) e experiências de
prazer e sofrimento dos cooperados (indicativos de prazer e sofrimento no trabalho).
Condições de trabalho existentes na cooperativa:
• Tipo de relações estabelecidas,
• Esquema de horário,
• Tratamento diante de faltas e atrasos,
• Divisão de tarefas,
• Organização da diretoria,
• Processo de tomada de decisões,
• Freqüência das Assembléias,
• Participação nas assembléias,
• Atividades existentes na cooperativa (atividades previstas e atividades
desenvolvidas),
• Fato de os cooperados não terem patrão,
• Fato de terem múltiplo papel dentro da cooperativa (administrar e executar as
tarefas),
• Fato de terem que fazer reunião para tomar decisões,
• Primeiro contato com os princípios solidários,
• Opinião dos cooperados a respeito de tais princípios,
• Incorporação de tais princípios,
• Engajamento dos membros no empreendimento,
• Conhecimento sobre o significado de seu trabalho por parte dos trabalhadores,
• Entendimento por parte dos trabalhadores da importância do seu trabalho e do
seu papel dentro deste processo.
Em relação às experiências de prazer e sofrimento dos cooperados, as características
observadas estão presentes na forma como cada trabalhador lida com o seu trabalho. Assim, os
pesquisadores estiveram em busca de indicativos de prazer e sofrimento nas pessoas.
• Queixas em relação ao trabalho e aspectos que mais agradam em seu trabalho
(indicações de satisfação-insatisfação aos vários aspectos do trabalho),
• Freqüência com que realiza as atividades,
• Grau de qualidade do trabalho,
• Tipo de atividade desempenhada,
• Sob controle de quê atua (pessoa trabalha apenas quando alguém lhe ordena ou
toma iniciativas independentemente dessa supervisão?),
• Presença de inovação e busca por contribuições,
• Relacionamento com companheiros de trabalho,
• Características atribuídas à pessoa pelos seus companheiros de trabalho,
• Participação nas Assembléias,
• Tipo de participação nas tomadas de decisão.
Fontes de informações utilizadas
Para a realização da coleta de dados foram utilizadas as seguintes fontes:
• fala dos cooperados a respeito de seu trabalho e
• documentos e atas de reuniões.
Material
O material necessário para a realização da coleta de dados consistiu em:
• material para impressão dos termos de consentimento e dos protocolos de
registro: computador, impressora, papel;
• caderneta para anotações e
• fichas a serem utilizadas na análise dos documentos, para que informações
relevantes fossem registradas.
Procedimentos para coleta de dados
Contato inicial com os participantes e caracterização do empreendimento
Anteriormente à coleta dos dados os pesquisadores tiveram um contato inicial com os
cooperados1. Isso aconteceu por meio de visitas aos locais de trabalho e aos locais em que as
assembléias eram realizadas nos quais a pesquisa foi explicada aos cooperados e estes e os
pesquisadores conversaram sobre este e outros assuntos, com o intuito de “quebrar o gelo”.
1 Esse contato inicial tem por finalidade estabelecer uma relação transparente e proveitosa entre os pesquisadores e os participantes.
Após esta fase de adaptação, a coleta de dados foi iniciada.
Este contato permitiu aos pesquisadores obter informações a respeito do que investigar
(cada empreendimento tem características peculiares às quais deve-se estar atento). Neste
contato foi realizada uma primeira entrevista com uma das diretoras do empreendimento para
que os pesquisadores entrassem em contato com a organização e funcionamento da cooperativa.
Procurou-se saber:
• os tipos de relações estabelecidas,
• os esquemas de horários,
• a ocorrência e as medidas tomadas diante de faltas e atrasos,
• quais as atividades desenvolvidas pela cooperativa,
• como estão divididas as tarefas entre os membros,
• como se dá a estruturação da diretoria e como ocorre a escolha da diretoria,
• como se dão as tomadas de decisão, (aproveitar para perguntar se todas as
decisões devem ser tomadas em assembléias e de que maneira isto ocorre)
• a freqüência com que as assembléias ocorrem, (aproveitar para saber se há
obrigatoriedade de participação e como o múltiplo o papel está estabelecido)
• como ocorre a introdução dos membros aos princípios solidários.
Entrevistas
A realização de entrevistas com os cooperados foi a fonte de informações mais
importante utilizada para a coleta de dados. Foram realizadas entrevistas semi-estruturadas,
realizadas no próprio ambiente de trabalho ou na sede da cooperativa, e as investigações
voltaram-se à descoberta das opiniões das pessoas sobre quais seriam as possíveis fontes de
prazer e sofrimento naquela cooperativa2.
Após a entrevista inicial (Apêndice 1) a respeito da organização e funcionamento da
cooperativa, foram realizadas entrevistas individuais com os participantes da pesquisa
(Apêndice 2), que assinaram um termo de consentimento livre e esclarecido preparado pelos
pesquisadores. Estas entrevistas procuraram acessar as opiniões individuais a respeito das
2 Sem deixar de levar em consideração que através desse meio serão obtidas informações a respeito das interpretações individuais relacionadas à organização do trabalho, estas serão oportunidades de desenvolver a análise sob o ponto de vista dos entrevistados. Além disso, pelo fato de estarem participando da pesquisa colegas de trabalho, durante a entrevista o entrevistado estará sendo questionado a respeito dos comportamentos de seus companheiros de jornada; pois desta forma poderão decorrer análises sobre como determinada pessoa lida com o trabalho visto de um foco diferente do dela própria.
características da organização e do funcionamento do empreendimento em que trabalham (estas
características foram abordadas e descobertas na entrevista inicial).
Assim, as informações obtidas desta forma foram:
• motivos que levaram a pessoa a fazer parte do empreendimento,
• horários de trabalho,
• tarefas pelas quais é responsável,
• visão do papel da diretoria e avaliação a respeito da centralização ou
descentralização do poder,
• participação nas tomadas de decisão e avaliação da oportunidade de participar
deste processo,
• freqüência com que vai às assembléias, participação nelas e modo como avalia
esta oportunidade,
• avaliação do fato de não ter patrão (questionamento a respeito de como julga este
fato neste empreendimento – se de fato há descentralização, sobre a mudança de
mentalidade – verificar se a pessoa havia trabalhado anteriormente em empresas
tradicionais e como ela lida com esta diferença e sobre a responsabilidade do
duplo papel – mais responsabilidade ou sobrecarga),
• primeiro contato com os princípios solidários (como ocorreu e qual a avaliação
do processo),
• opinião a respeito dos princípios solidários (facilidade de segui-los e como isso
ocorre neste empreendimento),
• incorporação de tais princípios, (relacionar esta resposta com a pergunta anterior
a respeito do motivo que levou a pessoa a entrar na cooperativa – se foi por
ideais solidários ou não)
• engajamento no empreendimento
• conhecimento sobre o significado de seu trabalho,
• entendimento da importância de seu trabalho e de seu papel dentro do processo.
(Questões mais voltadas para os indicativos de prazer-sofrimento no trabalho)
• aspectos que mais valoriza no trabalho,
• características do empreendimento que mais agradam a pessoa,
• queixas em relação ao trabalho,
• Freqüência com que realiza as atividades,
• Grau de qualidade do trabalho (verificar também como a pessoa acha que seus
colegas de trabalho e o líder da equipe avaliam seu trabalho),
• Sob controle de quê atua (pessoa trabalha em função de ordens ou procura ser
independente dessa supervisão?),
• Presença de inovação e busca por contribuições,
• Relacionamento com companheiros de trabalho,
• Características atribuídas à pessoa pelos seus companheiros de trabalho (existirá
uma lista determinando a que membro os comentários estarão sendo destinados).
O Quadro 2 mostra as questões que conduziram as entrevistas com os participantes e as
informações obtidas através delas.
Questões Informações obtidas Quais são suas experiências profissionais anteriores? Experiência profissional
Por que decidiu participar da cooperativa? Motivos pelos quais ingressaram no
empreendimento
Quais eram suas expectativas em relação à
cooperativa antes de seu ingresso?
O que o entrevistado esperava do trabalho na
cooperativa antes de inicia-lo
Atualmente você tem outra ocupação além da
cooperativa? Se sim, qual e por quê?
Relevância do trabalho na cooperativa para a pessoa
Em relação à atividade desenvolvida por você na
cooperativa, esta é uma atividade para a qual você
havia se preparado anteriormente?
Experiência do entrevistado em relação à atividade
exercida na cooperativa
Você gosta de realizar esta atividade? Gosto do entrevistado em relação à atividade
Qual é a função da sua tarefa para o andamento da
cooperativa? Com o que seu trabalho contribui para
este andamento?
Avaliação que o entrevistado faz de sua função na
cooperativa e relevância que atribui à mesma
Qual é seu horário de trabalho? O que você
acha dele?
Avaliação do entrevistado em relação ao seu horário
de trabalho
Como você avalia o papel da diretoria? As funções
são divididas com o restante dos membros
(centralização ou descentralização)? Se sim, como
isto é feito?
Avaliação que o entrevistado faz a respeito da
diretoria do empreendiemnto
Você participa das tomadas de decisão? Como isto
acontece?
Modo como as decisões são tomadas e avaliação do
entrevistado a respeito disso
O que você acha de poder participar? Avaliação do entrevistado sobre a oportunidade de
participar das decisões
Quando você acha que precisa e quando acha que é
desnecessário chamar assembléia para tomar
decisões? Acontece de serem chamadas assembléias
para situações que você considera desnecessárias? E
o que você pensa sobre isso?
Avaliação do entrevistado sobre decisões que
necessitam ser decididas em assembléias
Você costuma freqüentar as assembléias? E durante
a reunião você tem o costume de dar suas opiniões,
de falar quando acha que algo deve ser mudado na
cooperativa?
Freqüência com que o entrevistado vai às
assembléias e modo como se comporta nelas
O que você acha de não ter um patrão? Avaliação do entrevistado a respeito do fato de não
existir um patrão no empreendimento
Você sabe quais são os conceitos da economia
solidária? Se sim, quando você teve o primeiro
contato com eles?
Conhecimento do entrevistado sobre os conceitos da
economia solidária e ocasiões em que teve contato
com eles
O que você acha deles? É fácil segui-los, agir de
acordo com eles?
Avaliação do entrevistado a respeito dos conceitos
da economia solidária
Em relação à faltas, com que freqüência você
costuma faltar do seu trabalho? Por que motivos
você falta?
Freqüência de faltas do entrevistado e razões pelas
quais elas ocorrem
E o que acontece quando você falta: o trabalho fica
acumulado, alguém o substitui, você é punido?
Providências tomadas diante do absenteísmo
Como você acha que seus colegas de trabalho e o
líder avaliam seu trabalho?
Como o entrevistado imagina que os outros
membros do empreendimento avaliam seu trabalho
Qual seria a razão pela qual você executa sua tarefa? Razões que motivam o entrevistador a trabalhar
Você acha melhor fazer por si ou gosta quando
alguém lhe orienta sobre o que fazer? Por quê?
Preferência do entrevistado a respeito de trabalhar
por si ou ser orientado
Como você avalia suas relações com seus colegas de
trabalho? Existem desentendimentos? E quando
existe, como normalmente vocês resolvem?
Avaliação do entrevistado a respeito do
relacionamento entre ele e os outros membros e
forma como os desentendimentos são resolvidos
Vocês costumam trocar informações e conversar
sobre aspectos do trabalho? E sobre outros assuntos,
fora do trabalho, vocês costumam conversar? Em
que momento?
Tipo de relacionamento estabelecido entre o
entrevistado e seus colegas de trablho
Do que você mais gosta do trabalho na cooperativa?
Quais são as coisas que te dão mais prazer?
Características do trabalho na cooperativa que estão
relacionados a prazer para o entrevistado
Quais são as coisas que te causam mais sofrimento
no trabalho na cooperativa?
Características do trabalho na cooperativa que estão
relacionadas a sofrimento para o entrevistado
Analise algumas características do empreendimento. Avaliação do entrevistado a respeito de
características do trabalho na cooperativa
Você acha que existem coisas que precisariam ser
alteradas na cooperativa? O que? E por que?
Opinião do entrevistado a respeito de características
da cooperativa que deveriam ser mudadas
O que você acha que existe de diferença entre o
trabalho na cooperativa e o trabalho como
empregada?
Opinião do entrevistado a respeito de diferenças
entre o trabalho na cooperativa e o trabalho em
organizações tradicionais do trabalho
Você teria preferência por um emprego com carteira
assinada para fazer as mesmas coisas que faz na
cooperativa? Por que?
Preferência do entrevistado entre trabalhar como
cooperado ou trabalhar como empregada
O que você acha que as pessoas esperam de você na
cooperativa? Por que?
Opinião do entrevistado a respeito das expectativas
de outras pessoas sobre o seu trabalho
O que você espera de seus companheiros de trabalho
na cooperativa? Explique.
Expectativas do entrevistado a respeito do trabalho
dos outros membros do empreendimento
Se você pudesse escolher só uma coisa em grande
quantidade na sua situação de trabalho, e as outras
todas fossem médias, qual escolheria: a)
remuneração, b) prazer no que faz, c) relação com as
outras pessoas, d) participação nas decisões sobre o
trabalho
Relevância de aspectos do trabalho como
reforçadores para o entrevistado
Imagine uma situação ideal de trabalho (horários,
divisão de tarefas, ambiente de trabalho,
responsabilidades, remuneração, relacionamento
entre as pessoas, hierarquia). Como ela seria?
Opinião do entrevistado a respeito de características
de uma situação ideal de trabalho
Quadro 2: Questões da entrevista com os participantes e informações que acessaram.
Análise de documentos
A análise de documentos e de atas foi uma fonte adicional de informações, através da
qual foi possível ter acesso à forma como o trabalho está organizado, ao histórico daquele
empreendimento e à participação dos diferentes membros; na dependência de como estas atas
são construídas.
O que observar:
• Histórico do empreendimento,
• Aspectos da organização do empreendimento,
• Características do trabalho desenvolvido pelo empreendimento,
• Modo como são tratados os trabalhadores,
• Freqüência dos membros nas assembléias,
• Assuntos abordados com mais freqüência,
• Tomadas de decisões,
• Participação das pessoas na discussão.
Análise dos dados
As informações obtidas por meio das entrevistas foram organizadas nas folhas de
registros e o pesquisador encarregado da análise fez anotações e comentários relevantes para a
posterior análise qualitativa das falas dos cooperados.
A partir das fichas de registro em que estavam contidas as informações obtidas através
da investigação dos documentos, a análise foi realizada também de acordo com as
características pré-definidas para cada variável presente no estudo.
Apenas uma das 33 questões presentes na entrevista já era categorizada, e a análise da
questão (32) foi realizada através das categorias pré-definidas pelos pesquisadores. Foram
analisadas as freqüências com que cada uma das quatro alternativas apresentada obteve nas
quatro posições de prioridade: 1º lugar, 2º lugar, 3º lugar e 4º lugar. Primeiramente os dados
foram tabulados, e depois representados em forma de gráficos, tabelas e quadros.
Todas as outras questões eram apresentadas de forma não categorizada, e por isso a
primeira fase de análise destas questões foi estabelecer categorias de respostas de acordo com as
falas das cooperadas entrevistadas. Após esta fase, os dados foram organizados e representados
através de tabelas e quadros.
Capítulo 3
Fatores relacionados a prazer e sofrimento no trabalho de participantes de
empreendimentos solidários: o caso de uma cooperativa de limpeza
São apresentados, a seguir, dados relativos a alguns dos relatos obtidos junto aos
participantes do estudo, selecionados dentre as informações coletadas nas entrevistas.
A distribuição das respostas dadas pelas entrevistadas em relação à relevância de
características de seu trabalho aparece nas Figuras 1 e 2, que mostram as indicações de cada
característica para o primeiro e para o último lugar, respectivamente.
0
1
2
3
4
5
6
7
8
a b c d
nº indicações
Figura 1: Distribuição de número de entrevistadas que colocaram cada um
dos aspectos do trabalho avaliados em primeiro lugar.
0
1
2
3
4
5
6
a b c d
nº indicações
Figura 2: Número de entrevistadas que colocaram cada alternativa em
quarto lugar.
A Figura 1 mostra as indicações ao primeiro lugar para cada um dos aspectos do
trabalho abordados. O aspecto do trabalho indicado como mais relevante por oito dos catorze
entrevistados - 71% do total - foi “relação com outras pessoas”. O aspecto “remuneração”
obteve apenas uma indicação ao primeiro lugar; “prazer no que faz” obteve três indicações;
“relação com as outras pessoas” obteve oito indicações; e “participação nas decisões” obteve
três indicações.
Na Figura 2 pode-se observar que os aspectos “remuneração” e “prazer no que faz”
obtiveram três indicações para o quarto lugar cada um e “relação com as outras pessoas” obteve
apenas uma indicação. A “participação nas decisões sobre o trabalho” apresentou maior número
de indicações para o quarto lugar, tendo sido apontada na última posição por seis das catorze
entrevistadas.
Em relação à avaliação e ao julgamento que cada cooperada entrevistada fazia do papel
da diretoria do empreendimento, as respostas dadas pelas diretoras e as respostas dadas pelas
cooperadas entrevistadas que não participam da diretoria serão apresentadas separadamente.
Essa distribuição aparece representada no Quadro 3, no qual aparecem os relatos de cada
representante desses dois grupos, acerca de seu próprio subgrupo e do outro subgrupo
considerado.
Dos relatos obtidos, 86% são referentes ao grupo das diretoras, e o restante é referente
ao grupo das cooperadas que não participam da diretoria. Esses relatos estão separados,
também, de acordo com o tipo de julgamento da característica abordada: positivo ou negativo.
A maior parte das respostas apresentadas (aproximadamente 67%, sendo 13% referentes aos
relatos das diretoras e 54% referentes aos relatos das demais cooperadas) era de caráter
negativo, em que as entrevistadas se queixavam dos comportamentos das pessoas de seu próprio
grupo ou do outro grupo.
A quem se refere a informação/valor
Informações de membros da diretoria
Informações de não participantes da diretoria
Diretoras, de caráter positivo
“Tem que ter diretoria senão fica bagunçado.”, “É muito importante porque tem muita coisa para resolver.”
“A diretoria administra, arruma outros contratos pra gente que está desempregada. É bom.” “O papel é cuidar dos documentos, procurar mais emprego, fazer pagamento. A diretoria na tem tanto poder, tem assembléia.”, “A diretoria organiza. Elas estão levando a cooperativa para frente. Está dando resultados.”, “A cooperativa cresceu muito e expandiu em todas as áreas: assembléias estão melhores, tem mais diálogo, têm mais contratos, tem a sede, dá para conversar com todo mundo, o fundo cresceu. Elas estão sempre querendo que cresça. Acho muito interessante o trabalho da diretoria.”, “Em relação ao pagamento, eu concordo. Elas são muito justas.”,
Diretoras, de caráter negativo
“To um pouco cansada, to carregada. Tem hora que estressa, viu?”.
“Os problemas são resolvidos só entre elas.”, “O trabalho da diretoria está médio. Coitadas, elas estão se esforçando muito para dar médio. Mas é complicado, é muita responsabilidade, muita coisa pra resolver.”, “Elas decidem sempre sozinhas. Não decidem com o grupo todo. Eu acho ruim.”, “Eu achava que a diretoria precisava estar passando tudo para a gente, mas não é.”, “Acho bom, mas poderia melhorar. A divisão das tarefas, porque elas ficam super atarefadas.”, “Nós temos assembléia. Não pode ficar só entre as três da diretoria.”, “O trabalho delas é bom, tirando algumas falhas: não passam o que acontece para os cooperados, não admitem quando estão erradas. São falhas que têm que ser corrigidas.”, “Nem tudo o que é decidido em assembléia é cumprido.”, “Todos os problemas tinham que ir para assembléia.”, “Tem que passar para todo mundo.”, “Todo mundo tem que decidir.”.
Sobre outros membros, de caráter negativo
“Os outros membros se acomodam, não querem participar. Querem trabalhar e ganhar seu dinheiro.”, “Os cooperados deixam para a diretoria resolver tudo. Isso a gente quer mudar.”.
“A diretoria fica super atarefada enquanto tem outras cooperadas que poderiam ajudar.”.
Quadro 3: Distribuição das respostas das entrevistadas, em relação ao papel da diretoria do empreendimento.
O Quadro 4 apresenta as categorias de respostas estabelecidas de acordo com as opiniões
das cooperadas entrevistadas sobre a possibilidade de participarem das tomadas de decisão do
empreendimento, e as respostas das diretoras aparecem separadas das respostas das cooperadas
que não fazem parte da diretoria.
Para diretoras Para outros membros 1) dividir responsabilidades 2) diminuir a sobrecarga
1) importância de serem colocados diferentes pontos de vista 2) sentimento positivo decorrente de contribuir 3) fato de todos terem acesso às informações 4) diminuição de reclamações decorrente da oportunidade de debater
Quadro 4: Categorias de respostas dadas pelas diretoras e por outros membros sobre a possibilidade de participação nas tomadas de decisão.
As informações obtidas através dos relatos das diretoras dizem respeito à divisão de
responsabilidade e à diminuição da sobrecarga. Os demais membros se referem à importância
do contato com diferentes pontos de vista, ao sentimento positivo decorrente da oportunidade de
contribuição, ao fato de todos os membros terem acesso às informações e à diminuição de
reclamações, visto que há possibilidade de debater as decisões.
As categorias de respostas obtidas a respeito da necessidade ou não de haver assembléias
para tomar decisões sobre diferentes assuntos aparecem no Quadro 5, no qual as respostas das
diretoras e dos outros membros também aparecem representadas separadamente.
Para diretoras Para outros membros 1) nada é resolvido sem assembléia 2) função da diretoria é fazer cumprir regras
1) necessidade de resolver todos os assuntos em assembléias 2) alguns assuntos de pouca importância não precisam ser discutidos em assembléia 3) necessidade de os membros terem acesso às informações
Quadro 5: Categorias de respostas dadas pelas diretoras e por outros membros para a questão 12, sobre a necessidade ou não de haver assembléias.
Dentre as respostas, algumas se referem ao papel da diretoria, outras se referem a
conseqüências do fato de haver assembléia e outras se referem à necessidade de a característica
de um empreendimento solidário de realizar assembléias para tomar as decisões ser respeitada.
Em relação ao fato de não existir um “patrão” no empreendimento, as respostas das
cooperadas entrevistadas foram analisadas de duas formas. A primeira análise pretendeu
verificar o julgamento das cooperadas entrevistadas sobre o fato de não terem um patrão, e a
Tabela 1 mostra as categorias e as freqüências de respostas encontradas: bom, complicado, não
há diferença, importante, interessante, estranho e fonte de dor de cabeça.
Categorias de julgamento Freqüência Bom 6 Meio complicado 3 Não há diferença 2 Importante 1 Interessante 1 Estranho 1 Fonte de “dor de cabeça” 1 Tabela 1: Respostas relativas ao julgamento das entrevistadas sobre o fato de não terem patrão.
A segunda análise realizada objetivou verificar as conseqüências decorrentes do fato de
não haver um patrão no empreendimento, na opinião das entrevistadas, e as categorias de dados
obtidas foram separadas em respostas de diretoras e respostas de membros que não fazem parte
da diretoria, e aparecem representadas no Quadro 6.
Para diretoras Para outros membros Relatos de caráter positivo: 1) “Importante”: possibilidade de conhecer diferentes opiniões, aumenta responsabilidade do grupo; 2)”Bom”: aumenta autonomia e responsabilidade; Relatos de caráter negativo: 3) “Meio complicado”: membros chamam diretoras de “chefe”, membros acham que as diretoras apenas mandam e não fazem nada
Relatos de caráter positivo: 1) “Interessante, bom”: desenvolvimento de responsabilidade para o grupo; 2)”Bom”: possibilidade de aprendizagem, responsabilidade para o grupo, fato de não haver cobrança; Relatos de caráter negativo: 3) “Não interfere em nada”: de qualquer maneira há alguém com autoridade, necessidade de haver assembléias, importância de haver alguém para organizar o serviço, autonomia e liberdade; 4) “estranho”: ruim não ter vínculo empregatício, necessidade de haver alguém à frente do negócio; 5) “Um pouco complicado”: necessidade de alguém chamar a atenção, liberdade; 6) “Fonte de dor de cabeça”: possibilita falta de compromisso das pessoas
Quadro 6: Categorias das respostas que justificam o julgamento das diretoras e dos outros membros sobre o fato de não haver um patrão no empreendimento.
Seis das 14 entrevistadas disseram que achavam “bom” não terem patrão. Diferentes
justificativas foram utilizadas, como o aumento de responsabilidade, a possibilidade de
aprendizagem, o fato de não haver cobrança e o fato de a responsabilidade estar dividida entre o
grupo.
Três entrevistadas disseram que trabalhar sem ter patrão é “meio complicado”. Dessas
três, uma é diretora, e justifica seu julgamento dizendo que os outros membros acham que as
diretoras apenas mandam e não fazem nada, e que eles não têm autonomia, visto que não estão
acostumados a trabalharem sem patrão. A segunda entrevistada que respondeu que achava “um
pouco complicado” não ter patrão justificou sua resposta dizendo que “é bom ter alguém para
chamar a atenção e melhorar cada vez mais”. A terceira pessoa que julgou o fato de não ter
patrão como “um pouquinho complicado”, apesar de ter feito tal julgamento, disse em seguida
apenas aspectos positivos decorrentes deste fato, como a liberdade e o fato de não ter que se
submeter a patrão mal-humorado.
Das duas entrevistadas que disseram que não faz diferença não haver patrão, uma delas
relatou que “de um jeito ou de outro, tem alguém que manda”. A outra entrevistada que disse
não haver diferença, distinguiu um tipo do outro (“Porque com patrão, você é mandado pela
pessoa, e sem patrão, é você e seu serviço.”), mas disse que o serviço é o mesmo.
A pessoa que disse ser importante não haver patrão, justificou sua resposta dizendo que
isso “traz responsabilidade” e possibilita o contato com “diferentes opiniões”. A entrevistada
que julgou o fato como interessante, disse que as pessoas “ganham mais responsabilidade”. A
entrevistada que julgou o fato como estranho, disse: “Sem patrão é estranho porque tem que ser
registrado. E deveria ter um patrão para estar à frente da cooperativa na hora da disputa com a
concorrência.”
As informações a respeito das razões que levam as cooperadas entrevistadas a
executarem suas tarefas foram categorizadas e estão representadas na Tabela 2, de acordo com a
freqüência em que apareceram.
Categorias encontradas Freqüência (número de citações) Comprometimento com o grupo 5 Compromisso, auto-controle 4 Oportunidade de aprendizagem 3 Garantia do trabalho 2 Gosto pela atividade 1 Oportunidade de escolha 1 Compreensão, empatia 1 Hábito 1 Evitação de intervenções de outras pessoas
1
Auto-conhecimento 1 Necessidade financeira 1 Tabela 2: Freqüência das respostas encontradas sobre as razões que levam as entrevistadas a executarem suas tarefas.
A resposta que apareceu com maior freqüência (cinco cooperadas citaram), foi
“comprometimento com o grupo”, em que as cooperadas diziam se preocuparem em fazer sua
parte do trabalho do grupo e com a imagem da cooperativa. “Compromisso e auto-controle” foi
a resposta que apresentou a segunda maior freqüência (quatro citações), e as cooperadas diziam
que faziam seu trabalho porque sabiam o que tinha que ser feito e, portanto, faziam. Em terceiro
lugar, apareceu a resposta “oportunidade de aprendizagem”, com três citações, em relação à
qual as cooperadas diziam que faziam suas tarefas porque assim tinham a oportunidade de
aprender. Duas cooperadas disseram que faziam suas tarefas e cumpriam seus deveres para
garantir seu trabalho, sendo que trabalhar é importante e necessário. Outras respostas foram
dadas por apenas uma pessoa: gosto pela atividade, oportunidade de escolha, compreensão e
empatia, hábito, evitação de intervenções de outras pessoas, auto-conhecimento e necessidade
financeira.
As características do trabalho na cooperativa relacionadas a prazer e sofrimento, de
acordo com os relatos das cooperadas entrevistadas, aparecem representadas na Tabela 3, que
mostra as categorias encontradas, as referências de prazer e sofrimento e as freqüências em que
foram indicadas.
A primeira categoria, “oportunidade de trabalho na comunidade”, foi citada por duas
entrevistadas, sendo que uma delas indicou o fato de a cooperativa proporcionar oportunidade
para as pessoas da comunidade trabalharem e, a outra, o fato de a cooperativa empregar pessoas
sem fazer discriminação e sem pedir experiência anterior.
A segunda categoria, “relação com pessoas dos locais de trabalho”, foi citada por quatro
entrevistadas. Três delas indicaram aspectos positivos, que seriam indicativos de prazer, sendo
que duas falaram que gostavam de “lidar com pessoas” e a outra disse que gostava de se
comunicar com os usuários da sala de apoio em que trabalhava. A quarta pessoa, que abordou
um aspecto negativo, disse que se sentia humilhada quando era maltratada pelos usuários do
serviço.
A categoria “relações entre membros” foi citada por sete entrevistadas, sendo duas
citações relacionadas a prazer - amizade e colaboração entre os membros-, e cinco citações
relacionadas a sofrimento - fofoca, discriminação, discussões, desentendimentos e “más
línguas”.
categoria Indicativo de prazer Número de indicações
Indicativo de sofrimento
Número de indicações
oportunidade de trabalho na comunidade
- fato de a cooperativa proporcionar serviço para pessoas da comunidade - fato de facilitar a entrada de pessoas por não discriminar e não pedir experiência
2 0
relação com pessoas dos locais de trabalho
- comunicação com professores e alunos, usuários dos serviços da sala de apoio - lidar com pessoas
3 mal trato por parte dos usuários do serviço
1
relações entre membros
- amizade - colaboração 2 - fofoca - discriminação - discussões - desentendimentos - más línguas
5
oportunidade de trabalho para a pessoa
- fato de ter emprego 2 0
remuneração - dinheiro recebido - salário é o que compensa - tranqüilidade de chegar ao fim do mês e receber, e ser independente financeiramente - dinheiro recebido e economizado
4 0
participação no processo decisório
oportunidade de participar das assembléias
1 - concentração do processo decisório - não cumprimento das decisões das assembléias
2
atividades específicas do trabalho
lidar com pessoas 3 - misturar produtos de limpeza - carregar retroprojetores
2
vínculo empregatício
0 - fato de o trabalho não ser registrado
1
fazer cumprir normas
0 - intermediar e resolver discussões e aplicar advertências
1
liberdade - fato de ter liberdade no trabalho
1 0
gosta de tudo - tudo na cooperativa agrada - nada causa sofrimento - não ter que ficar em casa
4 0
Tabela 3: Categorias citadas pelas entrevistadas quanto a características do trabalho relacionadas a prazer e sofrimento.
Duas entrevistadas responderam que o fato de estarem empregadas era o que mais lhes
agradava, e a resposta foi categorizada como “oportunidade de trabalho para a pessoa”. Quatro
entrevistadas tiveram suas respostas incluídas na categoria “remuneração”. Uma disse que o que
mais gostava era o fato de receber dinheiro (além de poder participar das assembléias), outra
disse que o que estava “compensando” era o “salário”, a terceira disse que o melhor era “saber
que você vai chegar no fim do mês e ter seu salário na mão e não ter que ficar implorando para
as pessoas”, e a última disse “meu dinheirinho, eu emprego bem ele”.
A categoria “participação no processo decisório” foi citada por três pessoas. Uma delas
relatou o aspecto positivo, dizendo que gostava de ter a oportunidade de participar das
assembléias. Duas entrevistadas abordaram o aspecto negativo, sendo que uma delas colocou
que o processo decisório é concentrado (“não gosto quando as coisas são resolvidas só entre
duas pessoas”), e outra ressaltou o não cumprimento das decisões tomadas em assembléia (“não
cumprir as coisas que são determinadas”).
Cinco entrevistadas falaram de atividades específicas do trabalho. Três disseram que
gostavam de “lidar com pessoas”, colocando o aspecto positivo de sua tarefa. As outras duas
abordaram aspectos do trabalho que as fazem sofrer: misturar produtos de limpeza e carregar
retroprojetores.
Uma entrevistada disse que o que lhe causava sofrimento era o fato de, na cooperativa,
não haver vínculo empregatício (“Não ser registrada. É o que me faz pensar em sair da
cooperativa”). Uma das entrevistadas teve sua resposta categorizada como “fazer cumprir
normas”, visto que era uma diretora que colocou que não gostava de ter que “resolver as
discussões e quando tem que dar uma dura, uma advertência”.
Em relação a mais um indicativo de prazer, uma entrevistada disse que o que mais
gostava na cooperativa era a “liberdade”. Quatro cooperadas disseram que gostavam de tudo na
cooperativa, sendo que uma respondeu a questão relacionada a prazer dizendo “eu gosto de
tudo”, e as outras três responderam a questão relacionada a sofrimento dizendo que “nada” as
fazia sofrer, sendo que uma delas disse: “odeio ficar em casa, então não quero ir embora”.
As opiniões das cooperadas a respeito de características da cooperativa que precisariam
ser alteradas foram categorizadas e separadas nos blocos de diretoras e de membros que não
fazem parte da diretoria. O Quadro 7 mostra as diferentes categorias de opiniões apresentadas.
As respostas das diretoras eram referentes a mudanças de comportamento dos
cooperados pelo fato de fazerem parte de uma cooperativa, a relações de parentesco
problemáticas e ao interesse dos cooperados pelo crescimento da cooperativa. As respostas dos
outros membros, dentre as quais foram incluídas respostas das diretoras quando estas não
enfocavam essa função especialmente, relataram a necessidade de todas as decisões serem
discutidas em assembléias, de o contrato permitir aumentos salariais, de todos terem direitos
iguais, de todos conhecerem o estatuto do empreendimento, do cumprimento das leis, de as
decisões serem firmes e claras, de todos terem acesso às informações, de haver respeito entre os
cooperados e de as decisões da assembléia serem cumpridas.
Para diretoras Para outros membros 1) membros deveriam mudar comportamentos por estarem em uma cooperativa: guardar os abonos para o fim do ano, preocuparem-se menos com os problemas alheios 2) relações de parentesco problemáticas 3) necessidade de os cooperados terem mais interesse pelo crescimento da cooperativa
1) necessidade de todas as decisões irem para a assembléia 2) necessidade de o contrato permitir aumentos salariais 3) necessidade de todos terem direitos iguais 4) necessidade de todos conhecerem o estatuto 5) necessidade de as leis serem cumpridas 6) necessidade de as decisões serem firmes e claras 7) necessidade de todos terem acesso às informações 8) necessidade de os cooperados respeitarem os demais 9) necessidade de cumprimento das decisões das assembléias
Quadro 7: Categorias de respostas dadas pelas diretoras e por outros membros referentes a características da cooperativa que deveriam ser alteradas.
Os dados a respeito do que os cooperados do empreendimento estudado imaginavam que
as outras pessoas esperavam deles na cooperativa aparecem representados no Quadro 8.
Referências à diretoria Referências a todos 1) outras cooperadas esperam que a diretoria resolva tudo
1) esperam que faça um bom trabalho 2) um espera apoio do outro 3) esperam que realize o trabalho direito para preservar a imagem da cooperativa 4) esperam que trabalhe com responsabilidade 5) esperam que colabore com o crescimento da cooperativa 6) esperam que dê bom exemplo 7) esperam que cumpra deveres e regras 8) família acha que é importante trabalhar 9) família espera retorno financeiro
Quadro 8: Categorias de respostas referentes a diretoria e referentes a todos os membros sobre o que os entrevistados acham que é esperado do seu trabalho.
Em relação à diretoria, os relatos a esse respeito estavam relacionadas ao fato de os
outros membros da cooperativa esperarem da diretoria a resolução de todos os problemas do
empreendimento, de acordo com o ponto de vista delas. Em relação às respostas referentes a
todos os membros, os cooperados relataram que achavam que as pessoas esperavam que eles
fizessem bem o seu trabalho, que pudessem contar com o apoio deles, que preservassem a
imagem da cooperativa fazendo um trabalho de qualidade, que tivessem responsabilidade, que
colaborassem com o crescimento da cooperativa, que dessem bons exemplos para os demais e
que cumprissem seus deveres. Essas respostas dizem respeito aos outros cooperados, mas as
entrevistadas também responderam sobre suas famílias, dizendo que seus familiares achavam
importante elas trabalharem e que esperavam retorno financeiro de seu trabalho.
Informações a respeito das expectativas das cooperadas entrevistadas em relação ao
trabalho dos outros membros do empreendimento aparecem no Quadro 9.
Expectativas em relação à diretoria Expectativas em relação a todos os membros
1) que os cooperados conversem com mais educação e respeito 2) que os cooperados se interessem mais pelo crescimento da cooperativa
1) um espera apoio do outro 2) que façam o trabalho bem feito para preservar a imagem da cooperativa 3) que tenham responsabilidade 4) que sejam amigos e unidos 5) que cumpram deveres e regras 6) que dêem mais valor à cooperativa 7) que trabalhem 8) que melhorem 9) que façam suas funções 10) que colaborem com o crescimento da cooperativa
Quadro 9: Respostas das diretoras e dos outros membros a respeito das expectativas que têm dos trabalhos dos demais.
As diretoras, quando responderam enfocando sua função de diretora, disseram que
esperavam que os outros membros tivessem mais respeito ao conversarem com elas e que
tivessem mais interesse pelo crescimento da cooperativa. As respostas dos outros membros,
dentre as quais aparecem também as respostas das diretoras quando não enfocaram sua função
administrativa, sobre o que esperavam do trabalho de seus pares incluíram: apoio, trabalho com
qualidade para preservar a imagem da cooperativa, responsabilidade, amizade e união,
cumprimento de deveres, maior valorização do empreendimento, realização do trabalho,
aperfeiçoamento e colaboração para o crescimento da cooperativa.
A respeito das opiniões das entrevistadas sobre o que seria, para elas, uma situação de
trabalho ideal , as informações obtidas se referem ao horário de trabalho, à divisão das tarefas,
ao ambiente de trabalho, às responsabilidades, à remuneração, aos relacionamentos pessoais e à
divisão do poder. Em muitas de suas respostas, as cooperadas faziam referências às condições
atuais em que trabalhavam, e os dados aparecem representados através da própria fala das
entrevistadas nos Quadros 10, 11, 12, 13, 14, 15 e 16.
entrevistadas respostas 1 “Não trabalhar de sábado” 2 “De noite eu não gosto. Esse que eu faço é o que gosto: de
dia” 3 “Das 7 às 16 hs. O horário que eu faço é ruim, das 19 às 7hs” 4 “Meu horário está ótimo” 5 “Esse meu das 7 às 16hs” 6 “Das 7 às 17hs. Faço das 11h15min às 15hs e das 17h15min às
21hs” 7 “Das 8 às 16 ou 17hs, com pelo menos uma hora e meia de
almoço. Meu horário é esse, mas o almoço é curto” 8 “Esse que eu faço” 9 “Das 7 às 14hs. Porque eu acostumei no posto, de frentista. Eu
estudo, pra mim seria melhor. Saio às 16h10min, mas preferiria sair mais cedo”
10 “Esse horário que eu faço está bom” 11 “Meu horário é ideal” 12 “Esse que eu escolhi” 13 “O meu horário” 14 “Das 8 às 12hs e das 14 às 17hs. O meu é das 7 às 13hs e das
15h30min às 18hs” Quadro 10: Relatos das cooperadas sobre o horário ideal de trabalho.
entrevistadas respostas 1 “Divisão igual” (diretora) 2 “Como é cooperativa, todo mundo tem que fazer igual, tem
que ser dividido mesmo” (diretora) 3 “Assim como está” 4 “Tem que ser igual. E é” (diretora) 5 “Tudo igual. Cada um tem que ter sua responsabilidade” 6 “Do jeito que é, é igual, está bom” 7 “A divisão está boa. Está ótima” 8 “Tudo igual” 9 “Tem que ser tudo igual” 10 “Tem que ser tudo igual” 11 “É divisão igual” 12 “Todo mundo tem que ter uma tarefa para fazer na
cooperativa. Nem sempre tem.” 13 “Igual por igual” 14 “Distribuir conforme cada lugar. O contratante precisa de tal
coisa... Do jeito que é.” Quadro 11: Relatos das cooperadas sobre a divisão de tarefas ideal.
Em relação ao horário de trabalho, algumas entrevistadas colocaram horários ou dias em
que gostariam de não estar trabalhando, outras se referiram a horários em que estavam
acostumadas a trabalhar e outras disseram que gostavam do horário em que trabalham
ultimamente na cooperativa.
Em relação à divisão das tarefas no trabalho, cujos relatos das cooperadas estão
apresentados no Quadro 11, a grande maioria das entrevistadas abordou a questão da igualdade,
sendo que algumas se referiram ao fato de a cooperativa ter como uma de suas regras a divisão
igualitária, e outras disseram que é importante cada membro ter sua responsabilidade. 42% das
entrevistadas respondeu que a divisão da forma como está sendo feita na cooperativa este
“ótima”, “ideal” ou “boa”. Uma das entrevistadas relatou que é importante que todos tenham
tarefas a cumprir, o que às vezes não acontece na cooperativa.
Entrevistadas Respostas 1 “Na sede da diretoria as portas são ruins e o pó é ruim. É
muito aberto, muito exposto. Tem que ter mais segurança porque os cooperados chegam e entram gritando.” (diretora)
2 “Hoje esse ambiente da sede é bom” (diretora) 3 “Está bom” 4 “Não tem do que reclamar” (diretora) 5 “O ambiente é bom, as pessoas são boas” 6 “Esse aqui está tudo em ordem” 7 “É gostoso assim” 8 “Tem que ser descontraído” 9 “O trabalho da gente é a segunda casa. Tem que ser
descontraído, não muito sério” 10 “Do jeito que está, está bom” 11 “Descontraído” 12 “Tem que ser descontraído, que você se sinta à vontade” 13 “Quem tem seus problemas, que largue em casa. Você tem
que estar com a mesma feição, ninguém tem que aturar seus problemas”
14 “Mais para descontraído. Até porque sou faladeira” Quadro 12: Relatos das cooperadas sobre o ambiente de trabalho ideal.
O Quadro 12 mostra as respostas das entrevistadas sobre o ambiente de trabalho, em que
a maioria das entrevistadas disse que preferia um ambiente descontraído (palavra utilizada pela
entrevistadora para explicar a pergunta). Uma das diretoras colocou que o fato de a sede ser um
lugar muito exposto possibilita abordagens dos outros cooperados; e as outras duas disseram
que o ambiente está “bom”.
Grande parte das entrevistadas disse que o ambiente de trabalho da cooperativa é bom ,
que “assim como está, está bom, ideal”. Quando apresentam justificativas para seus
julgamentos, algumas se referem ao relacionamento entre as pessoas, uma se refere ao fato de o
trabalho ser a segunda casa, outra se refere ao fato de ser importante deixar os problemas
pessoais de lado quando se está trabalhando e outra se refere a uma característica pessoal que é
beneficiada por um ambiente descontraído - ser “faladeira”.
entrevistadas Respostas 1 “Aqui sobrecarrega muito a diretoria. Tem
que ter mais gente interessada.” (diretora) 2 “Sempre tive responsabilidade. Mas se todo
mundo tivesse a responsabilidade que a diretoria tem, estava bom” (diretora)
3 “Mais responsabilidade” 4 “É bom. Quando pega, tem que ir firme”
(diretora) 5 “É bom ensinar os que não sabem para
ensinarem os outros” 6 “Muita. Quanto mais tiver, melhor.” 7 “Que divida com os outros. A gente tem
que ter” 8 “Tem que ter responsabilidade” 9 “Responsabilidade é bom porque ajuda a
gente a crescer” 10 “Todo mundo igual” 11 “Tem que ter responsabilidade igual” 12 “Nos ATs eu na tinha responsabilidade.
Hoje eu tenho, sei das minhas obrigações” 13 “Responsabilidade eu acho uma boa” 14 ---- Quadro 13: Relatos das cooperadas sobre a responsabilidade ideal para se ter no trabalho. A respeito da característica “responsabilidade”, as diretoras disseram que a diretoria tem
muita responsabilidade, colocando que este não é o ideal, por sobrecarrega-las. Uma delas diz
que seria bom se todos tivessem a responsabilidade como as diretoras. As outras cooperadas
referiram-se à importância de se ter responsabilidade e ao fato de quanto mais responsabilidade
tiver, melhor é. Uma delas relata que é bom ensinar os outros membros, outra diz que
responsabilidade “ajuda a crescer”, outras dizem que todas devem ter responsabilidade igual e
outra diz que é responsável por saber das suas obrigações.
entrevistadas respostas 1 “Agora está pouquíssimo. Tem INSS, passe... Os contratos
têm que ser mais elaborados para ter ajustes anuais de salário” 2 “Estamos dando preço muito mais baixo que as outras
empresas. Se pudesse ser um pouco mais... As coisas sobem.” 3 “Está bom” 4 “Está bom” 5 “Que desse para a escola da minha filha, para pagar as contas,
as compras...” 6 “Que desse para fazer o pedido e pagar as contas. Não dá nem
pra fazer o pedido, e tem as contas...” 7 “Eu estou economizando.Acho que deveria ser um pouco
mais. Mas para mim, no momento, está bom” 8 “Para poder sobreviver e que possa proporcionar momentos de
lazer. Não só trabalhar e comer...” 9 “Poder me sustentar e sobrar um pouco. Dar pelo menos pra
gente viver.” 10 “Pagar tudo o que deve. O que tem está suficiente” 11 “O que eu tenho. Que dê para me manter.” 12 “Não quero comprar tudo, mas pelo menos ter uma vida
estável” 13 “Comprar mais coisas para mim, para os meus filhos, arrumar
minha casa, quando precisar gastar com remédio...” 14 “Pelo menos R$ 650,00. Meu dinheiro, eu invisto nas minhas
filhas. E quanto mais, melhor pra investir.” Quadro 14: Relatos das cooperadas sobre a remuneração ideal. Sobre a remuneração, em relação à quantidade recebida atualmente, algumas disseram
que o valor está baixo e outras disseram que a quantidade está boa. Uma diz que o dinheiro
ultimamente está “pouquíssimo”, outra diz que o valor está mais baixo que em outras empresas,
outra diz que “não dá nem para fazer o pedido”, outra diz que acha que “deveria ser um pouco
mais”. Uma diretora fala sobre o contrato da cooperativa, que deveria ser reelaborado para
permitir ajustes anuais de salário e preço do serviço. De outro lado, duas entrevistadas disseram
que o salário está bom, mas sem apresentar justificativas; uma diz que para ela, no momento,
está bom; outra diz que o que tem está suficiente e ressalta a importância de pagar o que se
deve; outra diz que o que tem, “dá para sobreviver”.
Em relação aos gastos que têm, as entrevistadas se referiram a gastos com compras, com
a escola dos filhos, com as contas, com a saúde, com dívidas.
entrevistadas Respostas 1 “Falar mais com calma, não gritar. Os cooperados gostam
de ameaçar.” (diretora) 2 “As pessoas deveriam ter mais tolerância.” (diretora) 3 “Bom” 4 “Ótimo” 5 “Aqui no AT está bom. O mais sincero possível” 6 “Tem que se dar bem. O melhor possível.” 7 “Têm que ser amigos. E com pessoas de fora da
cooperativa que trabalham no posto, também” 8 “Um ambiente de respeito” 9 “Tem que ser bom, senão não vai. Senão fica um clima
tenso, um não vai querer ajudar o outro, e assim não dá. Precisa do outro.”
10 “Tem que se dar bem. Senão não tem trabalho e ninguém concorda com nada”
11 “Tem que ser bom” 12 “União e colaboração” 13 “No meu trabalho, a gente se dá super bem. O que tem que
falar, você fala aqui.” 14 “Procurar fazer o possível para ser um relacionamento
bom. É difícil trabalhar com clima pesado.” Quadro 15: Relatos das cooperadas sobre o como os relacionamentos pessoais devem ser no trabalho. Sobre os “relacionamentos pessoais”, as diretoras apresentaram respostas que se
referiam a queixas sobre o modo como são tratadas pelos outros membros, destacando a
necessidade de os membros falarem com mais calma e terem mais tolerância. Os demais
membros responderam dizendo que é importante que o relacionamento entre as pessoas seja o
melhor possível, que deve haver respeito, que se o relacionamento não for bom, “não dá”.
Algumas cooperadas disseram que o relacionamento que têm com as pessoas no trabalho atual
está “bom”, “ótimo”.
Finalmente, em relação à divisão de poder no trabalho, a maioria das entrevistadas disse
que a divisão deve ser igualitária. Nesta questão, mais uma vez as diretoras reclamam da
sobrecarga que têm, cobrando maior colaboração por parte dos demais. Uma das diretoras diz
que, por não terem patrão, os cooperados devem fazer o que for necessário. Outra diz que o
poder tem que ser dividido, que os cooperados devem tomar as decisões, porque “a diretoria não
é patrão”. Grande parte das demais cooperadas diz achar que a divisão de poder deve ser igual
entre os membros. Uma diz que acha que deve haver participação de todos, outra diz que em
uma cooperativa tem que ser tudo igual, outra diz que as pessoas com maior experiência
deveriam ter um certo poder dentro da cooperativa, outra diz que a presidente deveria passar as
decisões de forma firme, outra diz que não se pode deixar o poder subir à cabeça, outra diz que
problemas sérios devem ser divididos, outra fala que seria interessante todos poderem passar
nos postos de trabalho para orientar e outra diz que “ninguém manda em ninguém”.
entrevistadas respostas 1 “Não ter patrão é bom, mas os cooperados
têm que fazer também. Eles querem que a diretoria faça tudo por eles.” (diretora)
2 “Tem que ser dividido, porque a diretoria não é patrão. Os cooperados podem tomar decisões.” (diretora)
3 “Deveria ter participação de todos” 4 “Acho que não tem que ter divisão. Tem
que ser tudo igual.” 5 “Tudo igual. Cooperativa tem que ser tudo
igual. Poder não leva a nada.” 6 “As pessoas que têm mais experiência
deveriam ter uma carta branca para poder chamar a atenção. Tem coisa que acontece que a gente não pode falar. A diretoria teria este poder. Se a diretoria não dá a liberdade de os mais velhos do posto dizerem o que acham, de poder chamar o grupo para uma reunião com a diretoria para resolver...”
7 “A presidente tem que ter firmeza no que falar. O que é certo, é certo. O que é errado, é errado. Dividir é melhor.”
8 “Dá para dividir. Porque às vezes o poder sobe à cabeça e as pessoas acham que podem mandar.”
9 “Na cooperativa, não sei se é assim mesmo, mas é a presidente que toma algumas decisões e outras leva para a assembléia. O ideal é ser tudo igual. Problemas sérios, teria que dividir.”
10 “Tudo igual” 11 “Tem que ser tudo igual” 12 “O poder tem que ser dividido. No caso de
patrão, ele chega e te chama. Mas é legal qualquer pessoa poder passar nos postos de trabalho para ver como está e orientar outras pessoas.”
13 “Ninguém manda em ninguém. Esses tempos discuti com a D e com a L (diretoras) sobre isso.”
14 “Acho que tem que ser igual” Quadro 16: Relatos das cooperadas sobre como deveria ser a divisão ideal de trabalho.
Capítulo 4
Prazer e sofrimento no trabalho em empreendimentos solidários: contingências complexas
controlando comportamentos individuais e práticas culturais
O presente estudo teve por objetivo caracterizar aspectos do trabalho relacionados a
prazer e sofrimento para indivíduos que fazem parte de empreendimentos solidários, e foi
desenvolvido em uma cooperativa de trabalho. A pergunta que conduziu tal estudo foi se as
fontes de prazer e sofrimento percebidas pelos cooperados participantes seriam diferentes das
fontes de prazer e sofrimento que costumam ser encontradas em empreendimentos capitalistas.
Estudos anteriores sugerem que uma importante fonte de sofrimento indicada por trabalhadores
desse tipo de organização tradicional do trabalho é o fato de não haver possibilidade de
participação nas decisões (Mendes, 1996) o que, teoricamente, não existiria nas cooperativas,
que são empreendimentos organizados em torno de princípios, dentre os quais destaca-se a
autogestão e a participação igualitária e democrática dos membros, independentemente de sua
participação financeira no empreendimento. Em cooperativas reais, os trabalhadores são,
também, os donos- ou controladores - dos bens e do capital (Veiga e Fonseca, 2001).
Participação dos membros nas decisões da cooperativa
Uma queixa apresentada por uma das diretoras entrevistadas é o fato de ela ter que
intervir nas brigas e fazer com que todos os membros cumpram as normas da cooperativa. Essas
brigas, indicadas como sendo freqüentes, são fonte de sofrimento para as diretoras, e,
provavelmente para todos os outros membros também, visto que citam desentendimentos,
discussões e fofocas como características relacionadas a sofrimento no trabalho. A queixa de
uma diretora aponta uma outra característica: a dificuldade de os cooperados incorporarem as
normas da cooperativa e se comportarem de acordo com elas. Isso, com certeza, colabora para
que a cooperativa permaneça distante do ideal buscado pela economia solidária, e fortalece a
cultura existente no empreendimento estudado. Esta cultura, de acordo com os relatos das
entrevistadas, parece ser uma cultura de resolver desentendimentos em forma de brigas, em que
as diretoras são muitas vezes abordadas de forma agressiva. Essa é uma fonte de sofrimento
indicada por muitas cooperadas em diversos momentos das entrevistas realizadas. As diretoras
queixam-se da forma como são tratadas pelos demais membros, e uma delas, inclusive, relata
que o espaço físico da sede da diretoria deveria ser modificado para que impossibilitasse as
abordagens agressivas por parte deles. As diretoras indicam, ao falarem de aspectos da
cooperativa que deveriam ser alterados, que os cooperados deveriam conversar com elas com
“mais respeito e calma”, o que aponta para esta mesma característica abordada. No entanto, não
se pode desprezar a possibilidade de que a informação não corresponda a fatos reais, ou mesmo
parcialmente reais, já que são relatos das cooperadas.
Os relatos das cooperadas entrevistadas sugerem que, na cooperativa estudada, a divisão
igualitária do poder é algo dificilmente aplicável, e que o processo decisório, apesar da
existência das assembléias, fica concentrado nas mãos dos diretores do empreendimento. Essa
característica pôde ser observada tanto nos relatos das próprias diretoras, que se queixam da
sobrecarga, quanto nos relatos das demais cooperadas entrevistadas, que relatam que deveriam
participar mais. No entanto, pelo fato de essas informações terem sido obtidas através da fala
das cooperadas, é necessário que se tome cuidado com conclusões e generalizações, e, além
disso, é necessário considerar que o que as cooperadas relatam é que a diretoria concentra
tarefas e informações, mas não relatam diretamente que há concentração de poder.
Além de sugerir certa concentração de poder na cooperativa, os relatos das entrevistadas
indicaram que as ocasiões definidas para que as decisões sejam tomadas em conjunto - as
assembléias - são, algumas vezes, tulmutuadas, o que agrava tal situação. De acordo com a
diretora entrevistada na fase de caracterização do empreendimento estudado, os membros
podem faltar das assembléias apenas três vezes durante o ano, sendo que elas são mensais.
Nessas reuniões, as cooperadas indicam que é freqüente que as discussões sobre os assuntos
abordados sejam transformadas em brigas, em que as pessoas falam em tom de voz alto e
utilizam palavras ofensivas. A pesquisadora, durante o período de coleta de dados para a
pesquisa, teve oportunidade de observar uma assembléia, a primeira reunião geral depois de
terem entrado para o empreendimento um número de pessoas igual ao que havia anteriormente,
dobrando o número de cooperados. Por este fato, e também pelo tipo de assunto abordado na
reunião, a pesquisadora presenciou situações como as descritas pelas entrevistadas: pessoas
falando em tom de voz alto e ofendendo os demais. Entretanto, não se pode generalizar tal
observação, pois aquele era um momento muito particular pelo qual a cooperativa estava
passando. E, apesar de os relatos das entrevistadas concordarem com tal observação, eles não
podem ser relacionados diretamente com o que ocorre na realidade.
Em nenhum momento as cooperadas entrevistadas, nem diretoras nem as demais,
citaram ocasiões de decisões conjuntas fora das assembléias, o que provavelmente implica em
os membros relacionarem diretamente decisões conjuntas e brigas (decisões conjuntas = brigas).
Esta relação não é, necessariamente, feita por cooperados de diferentes empreendimentos
solidários, mas é algo que parece existir nesta cooperativa, o que pode acarretar em fontes de
sofrimento para os cooperados. Intervenções nesse sentido poderiam abordar formas de esta
participação de todos os membros ser mais produtiva, sendo realizada de uma forma que todos
tivessem a oportunidade de opinar, sem que os diferentes pontos de vista se tornassem estopins
para brigas. Essas alternativas poderiam ser pensadas no âmbito da cooperativa como um todo,
e implantadas para que inúmeras fontes de sofrimento fossem extintas. No entanto, antes de
concluir que a oportunidade de participação eficaz estaria relacionada a prazer para os
cooperados, seria adequado considerar que muito freqüentemente aparecem evidências de as
pessoas se esquivarem de tomar decisões, a menos que os resultados destas decisões interessem
muito diretamente a elas.
Tentativas no sentido de criar oportunidades de participação de todos, além das
assembléias, têm sido feitas, embora os resultados tenham sido, por enquanto, pouco
significativos, de acordo com uma representante da incubadora que presta orientação à
cooperativa estudada. Exemplos de novas estratégias são: destacar uma pessoa a mais, a ser
paga pela cooperativa, para dividir tarefas administrativas; mobilizar uma comissão, formada
em assembléia, para acompanhamento da compra da sede; retomar tarefas assumidas por
pessoas e que foram interrompidas, etc. Estas iniciativas procuram aumentar a participação dos
membros, além de desvincular as tomadas de decisões conjuntas dos momentos de assembléias,
exclusivamente.
A reflexão a respeito de formas mais eficazes de participação depende de uma análise
anterior, em relação ao fato de o julgamento sobre a importância de diferentes temas ser algo
pessoal, particular; visto que uma pessoa pode considerar importante ser discutido
conjuntamente um assunto em relação ao qual outra pessoa acha desnecessária a participação de
todos. Para exemplificar tal diversidade, em seu relato, uma cooperada descreve que os assuntos
importantes são os relacionados às trocas de postos de trabalho e às decisões sobre a
continuidade ou não de membros que cometeram erros. Para outros membros, os assuntos
importantes podem ser outros.
Uma das características do empreendimento estudado que pode estar relacionada à
dificuldade dos membros de comportarem-se de acordo com os princípios da economia solidária
é o fato de duas das três diretoras terem deixado de trabalhar em postos de serviço para ficarem
apenas com as funções administrativas. Suas funções ficaram sendo a de visitar os locais de
trabalho com determinada freqüência, e a de realizar atividades de busca de trabalho, contato
com contratantes, aquisição de produtos etc, além de passarem um tempo na sede da
cooperativa, executando outras tarefas de administração do empreendimento. A respeito desse
fato, os dados encontrados mostram que os relatos da diretora que continua trabalhando em
postos de serviço são mais parecidos com os relatos das cooperadas que não fazem parte da
diretoria do que com os das outras duas diretoras, visto que ela quase não se refere às suas
funções de diretora, e comenta os mesmos aspectos relatados pelas demais cooperadas sobre os
diversos assuntos abordados. Apesar de esse movimento de duas das três diretoras terem
passado a fazer apenas funções da diretoria ter seus fundamentos, isso pode contribuir com certa
divisão do poder, visto que os cooperados podem não ver a cooperativa como um
empreendimento em que os todos estão em um mesmo patamar. Isso está estritamente
relacionado às queixas, tanto de diretoras quanto dos demais membros, a respeito da falta de
participação.
Em diversos momentos, as diretoras apresentaram queixas em relação à sobrecarga de
sua função, colocando a necessidade da colaboração dos outros cooperados; enquanto, de outro
lado, os cooperados que não fazem parte da diretoria indicaram que a diretoria deveria dividir
suas funções entre todos os cooperados. Isso sugere a seguinte conclusão: se as diretoras
sentem-se sobrecarregadas e os outros membros acham que elas deveriam dividir suas funções
com eles, tudo parece estar resolvido. Entretanto, isso que parece ser um par perfeito, na
realidade não é. Talvez os cooperados que não fazem parte da diretoria não tenham realmente
interesse em participar mais, ou até têm interesse, mas estão acomodados na situação em que se
encontram. Para exemplificar tal falta de iniciativa de envolvimento em atividades
administrativas por parte dos cooperados, informações obtidas através do contato com
representantes da incubadora mostram que, durante o ano em que a pesquisa foi realizada, as
pessoas foram convidadas para participarem de atividades como formulação de regimento
interno, elaboração e execução de curso de cooperativismo, apoio à contabilidade, substituição
da diretoria no plantão da sede, desenvolvimento de habilidades de uso de computador, entre
outras. Apenas em alguns poucos casos, e com algumas poucas pessoas, esta inserção
ultrapassou o “concordar em participar”, uma vez que a maioria destas pessoas simplesmente
não aparecia nos momentos marcados.
Afinal, a tarefa de administrar a cooperativa é árdua, e os cooperados podem dizer que
gostariam de participar mais, simplesmente por saberem que esta é uma regra da cooperativa.
Entretanto, caso eles realmente tenham vontade de participar mais, então seria possível pensar
em alternativas para que isso seja praticado na cooperativa. Se a sobrecarga é uma fonte de
sofrimento para as diretoras e a falta de oportunidade de participação o é para os outros
membros, então uma resolução nesse sentido seria algo que minimizaria o sofrimento dos
trabalhadores desse empreendimento no geral.
Apesar de ter aparecido diversas vezes durante as entrevistas, o aspecto “oportunidade
de participação” foi indicado em último lugar por seis das catorze entrevistas ao falarem a
respeito da relevância de alguns aspectos do trabalho, quando comparando este aspecto com
“remuneração”, “prazer no que faz” e “relação entre os membros”. Isso pode ter acontecido
porque, apesar de ser um aspecto importante, a “oportunidade de participação” seja menos
relevante do que os outros três aspectos abordados. No entanto, diante de tantas queixas a
respeito desse aspecto em outros momentos das entrevistas, percebe-se a relevância que tem; e a
combinação desses dois tipos de dados pode parecer contraditória. O que provavelmente tenha
acontecido é que as cooperadas entrevistadas não descreveram bem o que as fazia sofrer quando
isto era perguntado para elas diretamente; mas descreveram indiretamente suas fontes de
sofrimento quando conversaram sobre as características do empreendimento. Estas informações,
obtidas de forma indireta, são muito importante de serem consideradas, pois podem demonstrar
os reais sentimentos das entrevistadas, e isto aponta para a relevância do aspecto “oportunidade
de participação”. Além do mais, é importante considerar as diferenças existentes entre o que é
relatado e o que é vivido na realidade. Entretanto, de um outro ponto de vista, o fato de as
cooperadas indicarem a falta de oportunidade de participação como queixa pode decorrer do
fato de que, em uma cooperativa, uma das regras é a participação de todos e a decisão coletiva,
sendo esta uma norma que deveria ser respeitada. As cooperadas relatam que isto muitas vezes
não é obedecido, mas não necessariamente tenham interesse em participar realmente das
decisões. Esta falta de interesse pode ser conseqüência da não incorporação dos princípios
solidários por parte dos cooperados.
Para finalizar este tópico, algo de extrema importância para a análise realizada é o fato
de as queixas, pelo menos parte delas, relacionadas ao processo de tomada de decisão, podem
ter mais a ver com o fato de as decisões tomadas desagradarem a pessoa do que com o fato de
não haver oportunidade de participação. Isso porque é relativamente comum que a análise das
situações, a partir das quais são tomadas decisões na cooperativa, seja feita, pelo menos por
algumas pessoas, considerando o próprio interesse envolvido; e o conflito de interesses está
presente quando as decisões atingem diretamente as pessoas ou seus familiares. Desta forma,
certos interesses são contrariados a partir de decisões que são tomadas coletivamente. Isto
costuma desencadear “campanhas” de descrédito em relação a quem tem que implementar a
decisão e tentativas de reverter decisões coletivas a partir de “conchavos” fora das assembléias,
de acordo com uma representante da incubadora. Esta é uma situação complexa, e essa
complexidade é aumentada pelo fato de a pesquisa trabalhar com relatos verbais, tanto da
diretoria quanto dos membros. Assim, qualquer tipo de conclusão só pode ser anunciada como
uma possibilidade explicativa, e não como um fato.
Inexistência de patrão
O primeiro ponto observado a partir das informações obtidas a respeito da inexistência
de um patrão formal na cooperativa é que as pessoas estão acostumadas a trabalharem para um
patrão e têm dificuldade quando não há uma pessoa nesta posição, e este ponto se refere ao
aprendizado que as pessoas tiveram em organizações do trabalho tradicionais. Entretanto, como
na maioria dos casos as pessoas da cooperativa não tiveram, anteriormente, experiências com
situações de trabalho assalariado, dados obtidos através das entrevistas e do contato com
representantes da incubadora; o próprio contexto social de desigualdade e privação, bem como
reforços derivados de comportamentos competitivos em um contexto de recursos escassos,
podem ser suficientes para produzirem tais comportamentos.
Uma das entrevistadas, ao falar sobre o fato de não ter patrão, refere-se à inexistência de
vínculo empregatício. Esta é uma das características de um empreendimento baseado na
economia solidária e, ao se referir a este aspecto, a cooperada estava falando sobre as
características de um trabalho organizado de forma diferente do que a maioria da população está
acostumada. Isso, mais uma vez, mostra a confusão que algumas pessoas podem fazer entre as
características de empreendimentos solidários e as características de organizações tradicionais.
Um segundo ponto diz respeito ao fato de alguns membros dizerem que mesmo não
havendo um patrão na cooperativa, sempre há uma pessoa que assume uma posição de
comando, podendo esta ser o chefe do posto de trabalho que contrata o serviço da cooperativa
ou alguns membros do próprio empreendimento. Neste momento cabe ressaltar que o fato de
não haver uma pessoa com um cargo formal de patrão do empreendimento não garante que não
haja uma divisão hierárquica. Inclusive, de acordo com a fala de uma das diretoras, os
cooperados acabam denominando as diretoras de “chefes”, agindo como se isso fosse verdade.
Dessa forma, o trabalho de administração pode acabar realmente por acumular nas mãos dos
membros da diretoria, o que provoca uma divisão de poderes na cooperativa.
Muitos membros colocam que o fato de não haver patrão no empreendimento possibilita
que todos participem das decisões, e que isto aumenta a responsabilidade do grupo. Parece
haver um sentimento positivo em relação a isso, pois os membros parecem sentir-se mais
autônomos e importantes. Por outro lado, outros membros colocam que a falta de patrão permite
que algumas pessoas ajam descompromissadamente em relação à cooperativa pelo fato de não
haver uma autoridade para cobrar-lhes. No entanto, mesmo não havendo esta função
formalmente estabelecida no empreendimento, pode haver pessoas a quem os cooperados
devem se reportar, de acordo com algumas cooperadas. Além disso, existe a cobrança dos pares,
que muitas vezes passa despercebida, mas que influencia muito o comportamento dos
trabalhadores. Esta “pressão horizontal” provavelmente existe na cooperativa, o que é
confirmado por respostas do tipo “faço pela imagem da cooperativa”, “faço para o grupo não ter
problema”, “faço porque tenho a minha parte do trabalho em grupo”, entre outras.
A necessidade de compromisso é algo que deve ser abordado com os cooperados a partir
do momento que ingressam na cooperativa, já que esta é uma forma diferente de organizar o
trabalho, necessitando, portanto, de atitudes e comportamentos diferentes das pessoas.
Papel da diretoria
Em relação ao papel da diretoria, as opiniões das diretoras a respeito de seu próprio
trabalho são geralmente relacionadas à sobrecarga. Quando falam sobre os outros membros, elas
normalmente se queixam da falta de interesse destes em colaborarem mais com o trabalho da
diretoria. Os membros que não fazem parte da diretoria na maioria das vezes se queixam da
falta de participação deles nas decisões tomadas pela diretoria. A discussão levantada sobre a
conciliação desses dois pontos de vista cabe ser desenvolvida novamente neste momento, já que
os dois lados se queixam da falta de participação.
Já foram citadas algumas tentativas realizadas na cooperativa, no sentido de criar
oportunidades de participação de todos e de desvincular as tomadas de decisões conjuntas dos
momentos de assembléias, exclusivamente. Muitas vezes as assembléias são vistas de forma
negativa pelos membros, visto que em muitas ocasiões estas discussões transformam-se em
brigas, e se estes forem os únicos momentos em que os membros têm oportunidade de
participar, eles poderiam acabar por relacionar diretamente decisões conjuntas com brigas.
Ainda a respeito do papel da diretoria do empreendimento, uma entrevistada, ao dizer
que os outros cooperados deveriam colaborar mais com a diretoria, colocou a responsabilidade
da participação para eles próprios e não para os diretores, dizendo que “a diretoria fica super
atarefada enquanto tem outras cooperadas que poderiam ajudar”. Essa cooperada toca num
ponto importante da análise: a divisão do poder não depende somente da diretoria dar
oportunidade para os outros, mas depende também de os outros mostrarem interesse e
colaborarem. Apesar disso, tem havido, na cooperativa estudada, de acordo com a representante
da incubadora, investimentos no sentido de envolver as pessoas, embora os resultados tenham
sido sofríveis até o momento. A qualidade das condições que estão sendo criadas vale ser
questionada, e, além disso, cabe ressaltar que a diretoria tem muitas coisas para cuidar, o que
dificulta que ela se dedique muito a “caçar”, convencer e garantir a manutenção das pessoas nas
atividades.
Importância das assembléias
A assembléia é um momento que a cooperativa reserva para que todos possam expor
suas idéias e para que as decisões sejam compartilhadas, e alguns membros se queixam de que
muitas decisões importantes não são levadas para a assembléia. A dificuldade é de se definir o
que é importante e o que não é importante, já que este julgamento é pessoal. Seria necessário
estabelecer a importância de cada assunto e definir quais deles deveriam ir para decisão coletiva
e quais não, ou seja, seria necessário diferenciar níveis de decisão. Por exemplo: podem existir
decisões que são relativas a questões de execução daquilo que é decidido em assembléia e que
devem ser tomadas no dia a dia, sendo necessário definir se essas decisões cabem aos
responsáveis pela diretoria tomarem ou se devem ir para a assembléia também.
Sobre os relatos das cooperadas entrevistadas a respeito das assembléias, é interessante
notar que nos relatos das diretoras, os verbos aparecem no presente (“nada é decidido só entre a
gente”, “as decisões são votadas em assembléia”), enquanto muitos dos outros membros usam
condicionais (“teria que ser com todo mundo”, “tinha que saber e discutir as decisões”, “todos
os assuntos deveriam ser decididos em assembléia”). Os verbos no presente dão a impressão de
que as regras são cumpridas e os verbos no pretérito dão a idéia contrária. Mas em ambos os
casos, os relatos aparecem na forma de regras cumpridas ou não cumpridas na cooperativa.
Relevância de diferentes aspectos do trabalho
Em relação aos aspectos do trabalho que mais reforçavam as cooperadas entrevistadas,
“o bom relacionamento entre as pessoas” foi um aspecto apontado por diferentes entrevistadas,
em diferentes momentos, como relevante. Algumas comentaram que, se as pessoas não se dão
bem, fica difícil fazer o trabalho e mais difícil ainda este ser eficiente. Essas citações podem ser
baseadas em regras, como “trabalho bem feito é aquele que é feito com felicidade” ou
“trabalhador feliz trabalha mais”, que podem ter sido ouvidas pelas cooperadas tanto em seu
ambiente de trabalho quanto em outras ocasiões. É importante considerar, portanto, que as
respostas das cooperadas podem estar embasadas em regras, e não em experiências que tenham
realmente vivido. Ou seja, quando elas têm seus relatos fundamentados em regras, podem estar
falando a respeito de algo que não experenciam em seu dia-a-dia, mas que ouviram de outros, e
acabam repetindo. Caso os relatos das cooperadas sejam realmente baseados em regras que não
são vividas por elas, a análise que leva em consideração tal fato sugere que a situação de
trabalho que vivem pode ser diferente da que relatam. Por outro lado, caso seus relatos sejam
baseadas em fatos que experenciam em suas vidas diárias, então eles são mais condizentes com
a realidade. Intervenções com o objetivo de provocar mudanças na cooperativa, dependem desta
informação para serem programadas e implementadas.
Em relação ao “relacionamento interpessoal”, algumas cooperadas disseram que um
grande problema da cooperativa são as discussões e brigas entre os cooperados, indicados como
fontes de sofrimento para as entrevistadas. Algumas vezes esta queixa aparecia acompanhada de
um comentário de melhora nos tempos atuais, o que sugere a existência de tentativas para que a
cooperativa se desenvolva. Esse tipo de relato, sim, pode ser baseado em experiências vividas,
já que se refere a mudanças que ocorreram no empreendimento. No entanto, deve ser
considerado que os relatos são pontos de vista das entrevistadas, e que as experiências de cada
uma podem ser diferentes.
Em relação à “remuneração”, este foi um aspecto que apareceu como sendo de muita
importância. Algumas cooperadas, quando questionadas sobre o salário da cooperativa,
reclamaram do valor deste e do fato de o contrato não permitir aumento salarial. Algumas
disseram que o salário deve ser suficiente para a sobrevivência da família e outras disseram que
seria interessante se sobrasse dinheiro também para o lazer. É interessante observar que o relato
de cada cooperada em relação ao aspecto “remuneração” depende do papel que ocupa na
família: se mora sozinha, se mora com os pais e usa o dinheiro para gastos pessoais, se tem
filhos para sustentar, se sua renda é complementar ou a única da casa. Sendo assim, as
necessidades variam muito.
Em poucos casos as cooperadas diziam estar satisfeitas com a remuneração atual, sendo
que as diretoras colocaram que o preço dado pela cooperativa está abaixo do mercado. No
entanto, de acordo com uma pesquisa realizada pela incubadora, a remuneração das pessoas na
cooperativa está acima do que recebem assalariados que realizam trabalhos equivalente em
empresas capitalistas que atuam no mercado, oferecendo serviço terceirizado de limpeza.
Algumas cooperadas, inclusive diretoras, colocaram que os contratos deveriam ser revistos para
que houvesse possibilidade de aumentos anuais. É interessante ressaltar que algumas
cooperadas usaram o termo “salário” quando se referiram à remuneração, apesar de este não ser
um termo utilizado no contexto da economia solidária. O fato de elas usarem tal termo pode ser
indicativo da confusão do sistema de organização cooperativo com o da empresa capitalista.
A remuneração, como reforço artificial generalizado, é um dos mais importantes
motivadores do trabalhador. Por serem de uma população de baixa renda, grande parte das
cooperadas entrevistadas trabalha por necessidade financeira, o que faz com que este seja um
aspecto importante, podendo tornar-se fonte de prazer ou e sofrimento. Muitas das cooperadas,
inclusive, ingressaram na cooperativa por ser esta uma oportunidade de trabalho e por terem
uma fonte de renda.
Nesse ponto, cabe refletir sobre a importância do dinheiro para as pessoas, pois o fato de
a pessoa viver em condições restritas financeiramente não deve ser relacionado com uma maior
preocupação com o dinheiro. Inclusive, pessoas que possuem mais dinheiro podem, às vezes,
preocuparem-se mais com ele do que as que possuem pouco dele.
Ao fazer uma comparação a respeito da dimensão tempo na qual as pessoas se
relacionam com bens materiais, cabe ressaltar que grande parte das pessoas que trabalham na
cooperativa estudada tinha – e terá, se deixar de trabalhar nela – renda zero. A preocupação
dessas pessoas em relação ao dinheiro é, muito freqüentemente, relativa a um período de 24
horas ou menos, e pode ser resumida em: o que vou comer – ou dar de comer – hoje. É o caso
de alguns cooperados que são suplentes. Os que estão trabalhando regularmente, ou seja, com
uma posição em um posto de trabalho, já vivem uma situação em que estão podendo pensar em
um período maior, talvez um mês. Há outros segmentos da população em que o “tempo” de
referência é uma geração, e a preocupação é referente aos bens que passarão para outra geração.
Preocupar-se com dinheiro, nestes diferentes contextos, tem significados variados.
“Prazer no que faz” foi um aspecto que não recebeu destaque como reforçador para as
cooperadas entrevistadas. O fato de os trabalhadores não indicarem tal aspecto como de muita
relevância não deve ser interpretado como indicativo de que as pessoas não priorizam trabalhar
de forma prazerosa. Em primeiro lugar, esse é um aspecto muito distante para a maioria dos
trabalhadores, e por isso pode parecer inacessível para muito deles. Além disso, apesar de não
relatarem o aspecto “prazer no que faz” como sendo de muita importância, as cooperadas
entrevistadas se queixam de muitas experiências por estas serem fontes de sofrimento e indicam
outras experiências como sendo fontes de prazer. O fato de seus relatos apontarem tais
características indica que as cooperadas percebem determinadas vivências como positivas e
outras como negativas, o que mostra a relevância do aspecto “prazer no que faz".
Situação ideal de trabalho para as entrevistadas
Em relação ao horário de trabalho, ele depende do posto em que as cooperadas
trabalham, sendo que, em alguns deles, há possibilidade de escolha. Uma das entrevistadas
indicou que gosta do seu horário porque foi ela quem o escolheu, e essa resposta mostra a
importância de se possibilitar escolhas por parte dos trabalhadores que executarão a tarefa.
Tallvez seja o modo como as pessoas estruturam o seu dia-a-dia, distribuindo as atividades nos
períodos do dia ou nos dias da semana, que fundamente as respostas em relação ao horário de
trabalho. O que pôde ser notado, neste estudo, é que os trabalhadores estruturam o seu dia de
acordo com o horário em que trabalham, distribuindo as demais atividades nos horários
restantes. E é por esse motivo que o item “horário de trabalho” se torna tão importante, visto
que, em algumas situações, pode ser uma fonte de sofrimento para os trabalhadores; quando,
por exemplo, ficam impedidos de praticar atividades que seriam necessárias ou prazerosas por
terem determinado horário ocupado com seu trabalho; ou quando não conseguem conciliar
atividades do trabalho com atividades da casa ou da família.
Sobre a “divisão de tarefas”, a maioria das cooperadas diz que o ideal é que a divisão
seja igualitária, sendo que algumas indicam que a divisão igualitária é regra da cooperativa
(“como é cooperativa, tem que ser tudo igual”) e outras, que é importante cada um ter sua parte
do trabalho a cumprir. Na cooperativa estudada, a divisão das tarefas pode não ser realizada
pelos próprios membros da cooperativa, visto que pode depender do posto de trabalho em que
atuam, da função exercida dentro do posto, do número de cooperadas no posto, do horário em
que trabalham. No entanto, é importante ressaltar que, apesar de alguns aspectos dependerem
das necessidades do contratante, o modo como o trabalho é feito não é definido por ele, mas
pela própria cooperativa.
Ainda sobre a divisão das tarefas, uma das cooperadas entrevistadas indicou a
necessidade de todos os cooperados terem uma parte das tarefas a cumprir, e o contexto das
respostas sugere que ela estava se referindo ao fato de às vezes não haver postos de trabalho
suficientes para que todos os cooperados possam trabalhar, sendo que alguns ficam com cargos
de suplentes.. O que acontece na cooperativa estudada, de acordo com a diretora entrevistada na
fase de caracterização, é que os cooperados são alocados de acordo com a necessidade de
trabalho nos postos, e esta alocação é realizada com base em alguns critérios, como tempo que o
cooperado está na cooperativa e tempo em que está sem trabalho. O que pôde ser notado é que o
fato de não estar alocado em determinado momento é uma fonte de sofrimento para os
trabalhadores desta cooperativa.
A respeito do “ambiente de trabalho”, em muitas das entrevistas houve necessidade de a
pesquisadora explicar para as cooperadas o que pretendia com a pergunta. Durante sua
explicação, usava a dicotomia “descontraído X sério”, o que acabou por influenciar, de certa
maneira, as respostas de algumas entrevistadas, visto que elas responderam com base nesses
conceitos. Sendo assim, em muitas das respostas das entrevistadas apareceu a palavra
“descontraído”. Talvez, se não houvesse intervenção por parte da entrevistadora, elas não
usassem exatamente esta palavra para expressarem como gostariam que fosse o ambiente de
trabalho, mas algumas vezes esta intervenção foi necessária.
Em relação ao ambiente de trabalho, uma das diretoras entrevistadas fala sobre como a
estrutura física do espaço em que fica a sede da cooperativa possibilita abordagens por parte dos
outros cooperados, relato no qual está implícita a queixa de que os cooperados entram na sede
com muita facilidade para discutir com as diretoras, sendo muitas vezes agressivos com elas.
Essa mesma diretora coloca essa mesma queixa em momentos diferentes da entrevista,
reclamando das abordagens agressivas dos cooperados em relação à diretoria. Nesse caso, o que
precisaria ser mudado é o modo como as pessoas estão acostumadas a resolver os problemas na
cooperativa, e não simplesmente o espaço físico. O espaço físico pode facilitar ou não
determinados comportamentos, mas o que ocorre na cooperativa estudada é que os cooperados
já se acostumaram a abordar as diretoras dessa forma, a discutir em tom agressivo nas
assembléias e a brigar uns com os outros. Essa forma de “resolver” os problemas na cooperativa
foi uma das características apontadas como fonte de sofrimento por parte das entrevistadas em
momentos diferentes da entrevista. A “cultura”, ou seja, o modo como as coisas são conduzidas
pelas pessoas neste empreendimento, foi construída durante toda a sua existência, e portanto
não é facilmente alterada. No entanto, existem maneiras de tentar reverter a situação e ensinar as
pessoas, por meio de treinamentos e, principalmente, por meio da apresentação de modelos
adequados diários.
Sobre o aspecto “responsabilidade”, as cooperadas falaram a respeito disso com base em
duas definições para esta palavra: significando comprometimento ou significando tarefas
(responsabilidades = tarefas a serem cumpridas). Talvez tivesse sido melhor que os
pesquisadores utilizassem outra palavra que não causasse tal problema. Ao falarem sobre
“responsabilidade”, as diretoras se queixam da sobrecarga, explicitando cansaço e indicando
que sentem falta da cooperação dos outros cooperados. No entanto, o fato de duas das três
diretoras estarem, no momento, apenas fazendo a função de diretora e não trabalhando em
postos de trabalho, pode criar certa hierarquia no empreendimento, o que pode dificultar que os
cooperados as vejam como cooperados como os outros. Isso remete para o fato de haver ou não
possibilidade de não se criar hierarquia nenhuma dentro dos empreendimentos solidários. Em
alguns momentos, as condições e as necessidades específicas impedem que determinadas regras
sejam seguidas, tornando a prática diferente da teoria.
Os relatos das entrevistadas em relação a “responsabilidade” demonstraram um aspecto
interessante, já que as diretoras indicaram que têm muita responsabilidade, queixando-se da
falta de colaboração das outras; e as outras, que têm menos, colocaram que “é bom” ter bastante
responsabilidade. As pessoas que não têm a responsabilidade de conduzir o empreendimento
provavelmente desconhecem a dificuldade de tal função, e a resposta delas sobre “quanto mais
responsabilidade, melhor” é baseada em uma regra, e não baseada em experiências vividas.
Além disso, há o problema de a palavra ser usada em sentidos diferentes por cada pessoa.
Os relatos a respeito dos “relacionamentos pessoais” foram, algumas vezes, baseados em
regras do tipo “com clima pesado é ruim de trabalhar”. Interessante verificar se essas regras são
incorporadas porque as pessoas já viveram tais condições ou se são apenas ouvidas de outros.
Isso se deve ao fato de as cooperadas compartilharem suas idéias e o grupo formar opiniões
conjuntas, ou ao fato de essas regras serem passadas para todas em algum momento?
Provavelmente essas regras são ouvidas pelas cooperadas não só em seu ambiente de trabalho,
mas também em outras situações do dia-a-dia, por este ser um tema muito abordado na
atualidade.
Motivos que levam as cooperadas a executarem suas funções
Algumas cooperadas entrevistadas colocaram que o que as faz executar suas tarefas é o
comprometimento com o grupo, o que sugere a existência da já citada “cobrança horizontal”.
Tal cobrança parece ser um dos “combustíveis” que movem os trabalhadores de
empreendimentos solidários a cumprirem sues deveres.
Outras cooperadas disseram que é a responsabilidade que as leva a executar sua função,
e, neste caso, o termo foi entendido como sendo “compromisso e auto-controle”, no sentido de
que a pessoa faz porque sabe o que tem que ser feito.
Essas foram as duas respostas que mais apareceram para esta questão, e daí decorre a
importância da “cobrança horizontal” e do compromisso que os cooperados assumem ao iniciar
um trabalho em um empreendimento solidário. Essas são condutas que devem ser incorporadas
por todos os membros de cooperativas desde que ingressam nelas, para que sejam diminuídas as
fontes de sofrimento e aumentadas as de prazer. Nos relatos, tais condutas aparecem como
regras, provavelmente passadas para as cooperadas a partir do momento em que iniciaram seu
trabalho na cooperativa, e é importante analisar se tais regras foram incorporadas por elas,
tornando-se auto-regras, ou não.
Outras respostas citadas por mais de uma entrevistada a respeito das razões que as levam
a executarem suas funções foram: oportunidade de aprendizagem e garantia do trabalho. O fato
de o trabalho proporcionar aprendizado e crescimento para os trabalhadores é apontado como
uma fonte de prazer pelas cooperadas que citaram tal característica, indicando sua importância.
Ao responderem que executam suas tarefas para não perderem o trabalho, algumas cooperadas
mostram que para elas o importante é trabalhar, tanto para se ocuparem quanto para terem uma
fonte de renda. Nestes casos parece que o que as leva a executarem suas tarefas não é nenhuma
característica daquele trabalho específico, mas sim a necessidade ou vontade de trabalhar, ou até
mesmo o fato de estar fora de casa por determinado período do dia.
Ao se referirem às razões que as levam a atuar, as cooperadas dão dicas de
características do trabalho que lhes proporcionam prazer ou sofrimento. Oportunidade de
aprendizagem, possibilidade de escolha, fato de ter trabalho e renda mensal, por exemplo, são
aspectos apontados como fontes de prazer. Ficar sem trabalhar e ser punido por não executar
bem sua tarefa são, ao contrário, aspectos relacionados a sofrimento.
Indicações de prazer e sofrimento pelas entrevistadas
Sobre as características do trabalho que proporcionam prazer ou causam sofrimento nos
cooperados, a categoria mais citada foi “relação entre os membros”, e quando indicada como
fonte de prazer, apareceram relatos a respeito da amizade que existe entre as pessoas e da
colaboração entre as mesmas. Sobre a amizade, é interessante mencionar que muitos dos
membros da cooperativa estudada já se relacionavam antes de ingressar em tal empreendimento,
visto que o grupo formador da cooperativa é um grupo de pessoas de um determinado bairro da
cidade. Assim, algumas relações de amizade já estavam estabelecidas antes de as pessoas
passarem a trabalhar juntas.
Sobre a colaboração, indicada por uma das entrevistadas como fonte de prazer, é
interessante notar que ela toca em um ponto que é justamente algo relatado como fonte de
sofrimento por outros membros em diferentes momentos das entrevistas, ao abordarem a falta
de colaboração. Pode ser que as vivências dos diferentes membros sejam diferentes, e por isso
um pode relatar determinado aspecto como fonte de prazer, e outro, o mesmo aspecto como
fonte de sofrimento. A variável é a mesma, mas os valores desta variável são diferentes, sendo
que em um caso o resultado é prazer, e no outro, sofrimento, tal como já se podia esperar, no
caso desta variável. Ainda sobre essa variação, talvez as vivências não sejam diferentes, mas
sim a forma de olhar para o mesmo aspecto, o que possibilita diferentes interpretações.
Cinco cooperadas citaram características da “relação entre os membros” que são fontes
de sofrimento para elas: fofoca, discriminação, discussões, desentendimentos e más línguas. Em
relação aos desentendimentos, esta foi uma queixa presente em diversos momentos das
entrevistas, quando as cooperadas se referiam às discussões e brigas freqüentes na cooperativa.
Nas assembléias, nas passagens dos membros pela sede da diretoria ou mesmo em encontros
casuais entre membros, muitas vezes as conversas tornam-se discussões conduzidas de forma
agressiva e interminável. Uma das diretoras diz que intermediar estes conflitos é uma fonte de
sofrimento para ela, e muitos membros dizem que a ocorrência destes é causa de sofrimento
para eles. O fato de a “cultura” da cooperativa parecer ser uma cultura de discussões é algo que
deve ser mostrado para todos os membros, para que eles possam refletir sobre sua parcela de
colaboração para que esta forma de relacionar com os demais permaneça.
A respeito de “atividades específicas do trabalho”, três cooperadas disseram ser uma
fonte de prazer ter, dentre as suas atividades, a oportunidade de lidar com pessoas em seus
postos de trabalho. Do lado negativo, uma cooperada indica ser uma fonte de sofrimento ter que
lidar com maus tratos por parte de usuários do serviço que presta. Aqui cabe salientar que
mesmo sendo uma fonte de prazer lidar com pessoas, há ocasiões em que estas pessoas tornam-
se causadoras de sofrimento devido ao modo como tratam as cooperadas. Em relação a
atividades específicas do trabalho que causam sofrimento nas cooperadas, uma delas citou a
atividade de misturar produtos de limpeza e outra citou a atividade de carregar retroprojetores.
Estas são atividades específicas de determinados postos de trabalho, e existe a possibilidade de
esses danos serem minimizados, utilizando-se máscara e luvas no caso da mistura de produtos e
equipamentos que facilitem o transporte de retroprojetores.
Em relação ao aspecto “participação no processo decisório”, já abordado anteriormente,
este apareceu como indicativo de prazer quando ressaltada a oportunidade de participação
existente na cooperativa. Por mais que as decisões conjuntas pareçam não estarem sendo
conduzidas de uma forma ideal, as ocasiões que proporcionam esta oportunidade para os
cooperados são suficientes para que sejam referidas como fontes de prazer, visto que em
organizações capitalistas esta oportunidade simplesmente não existe.
Por outro lado, como indicativos de sofrimento, foram citados a concentração do
processo decisório e o não cumprimento das decisões tomadas nas assembléias. Como muitas
das reclamações das entrevistadas estavam relacionadas à concentração do processo decisório,
e, por outro lado, as diretoras reclamavam da falta de participação dos outros membros e da
sobrecarga da diretoria, pôde-se notar que nenhum dos lados está satisfeito com o modo como
as coisas estão organizadas, e o que parece acontecer é que os cooperados apenas reclamam e a
diretoria não vê alternativas para mudar, ou quando vê, tem dificuldade em conseguir aderência
dos cooperados para coloca-las em prática.
A remuneração foi citada por quatro cooperadas como sendo fonte de prazer. Uma das
entrevistadas diz que o bom é ter seu dinheiro e não ter que ficar implorando pra ninguém,
resposta na qual está implícita a sensação de independência da pessoa como fonte de prazer para
ela.
Uma cooperada entrevistada diz que gosta de trabalhar pelo fato de não ter que ficar em
casa. Neste caso, a cooperada não justifica sua resposta sobre gostar de tudo no trabalho com
alguma característica daquela organização do trabalho específica, mas diz que é bom não estar
em casa, o que pode significar que o trabalho é, para ela, uma fuga de situações aversivas
existentes no seu ambiente familiar.
Características do empreendimento que deveriam ser alteradas, de acordo com as
opiniões das entrevistadas
Os relatos das diretoras a esse respeito referiram-se a comportamentos dos outros
cooperados que deveriam ser mudados: guardarem abono para o final do ano3, preocuparem-se
menos com os problemas alheios, interessarem-se mais pelo crescimento da cooperativa. Além
disso, uma delas indica que as relações de parentesco entre os membros são problemáticas, o
que provavelmente acaba dificultando algumas decisões, provavelmente devido ao conflito de
interesses.
Em relação às respostas dadas pelas outras entrevistadas que não fazem parte da
diretoria, praticamente todos os relatos diziam respeito a cobranças de mudanças de atitudes das
diretoras: necessidade de todas as decisões irem para assembléia, de o contrato permitir
aumentos salariais, de todos terem direitos iguais, de todos conhecerem o estatuto, de as leis
serem cumpridas, de as decisões serem firmes e claras e de todos terem acesso às informações.
Todas estas categorias de respostas são citadas pelas cooperadas de forma que elas parecem
estar cobrando mudanças de atitudes das diretoras para que o trabalho na cooperativa melhore.
Elas parecem não terem “incorporado o ideal cooperativo”, parecem não “estarem na luta” para
que o empreendimento se desenvolva com a participação de todos, apesar de abordarem isso em
diversos momentos das entrevistas. Porque se elas dependem de decisões e atitudes das
diretoras, então não parecem estar querendo participar ativamente destas mudanças.
Em relação ao relato de uma cooperada que indica a necessidade de as decisões das
diretoras serem firmes, isso pode ser entendido como o contrário daquilo de que alguns se
queixam em relação à centralização. Afinal, as diretoras devem ser firmes ou devem dar mais
oportunidade de os demais participarem? Além disso, as duas menções são incompatíveis, ou há
3 Todos os meses os cooperados recebem uma taxa, que é chamada de “abono”, ao invés de receberem uma quantidade maior ao final do ano, que nas organizações tradicionais seria o “décimo terceiro”. O que ocorre é que muitas vezes os cooperados reclamam por não receberem o “décimo terceiro”, e a diretora diz que eles deveriam guardar os abonos durante os meses, sem retira-los, para que ao final do ano tivessem algo parecido com o “décimo terceiro”. No entanto, os cooperados dizem que, pela situação financeira em que vivem, é difícil ter um dinheiro todo mês e conseguir não utiliza-lo.
como uma mesma pessoa considerar que, apesar de permitir participação de todos, a diretora
deve ser firme nas decisões que tomar? Essa segunda interpretação parece menos aceitável.
Expectativas: o que as entrevistadas imaginam que os demais membros esperam
delas e o que elas esperam deles
Em relação ao que os cooperados imaginam que as pessoas esperam deles em relação ao
trabalho na cooperativa, as respostas foram dadas tanto pensando nessas pessoas como a família
do cooperado quanto nas outras pessoas da cooperativa.
As diretoras colocam que os membros da cooperativa delegam toda a tarefa de
administração para a diretoria, apesar do fato de que em uma cooperativa esta tarefa teria que
ser realizada pela coletividade. Elas ressaltam que alguns membros parecem achar que não é
necessário realizar assembléias, mas que tudo poderia ser resolvido apenas entre a diretoria.
Mais uma vez, nota-se que as diretoras sentem necessidade de apoio dos outros membros para
as funções administrativas, mesmo que em alguns momentos estes relatem que gostariam de
participar mais intensamente. O questionamento que surge é: a diretoria realmente não cria
oportunidade para os outros participarem ou há falta de interesse dos membros? É possível que
haja uma mescla de ambos, e é importante colocar que esta interpretação não pretende
culpabilizar nem um nem outro. Um trabalho direcionado para ambos os lados da problemática
poderia diminuir esta fonte de conflito e sofrimento, que hoje é muito presente na cooperativa
estudada.
Em relação às respostas dadas pelas demais cooperadas entrevistadas e às respostas
dadas pelas diretoras sem que enfocassem seu papel de diretora, em geral, giraram em torno do
fato de os outros membros esperarem colaboração, tanto para a execução do trabalho em equipe,
quanto para preservar a imagem da cooperativa. A maioria das entrevistadas, ao falar sobre o
que os outros esperam delas, refere-se a um bom trabalho, variando entre preservar a imagem
do empreendimento, dar bom exemplo e colaborar para o crescimento da cooperativa. Neste
momento, mais uma vez, aparece a “cobrança horizontal”, em que os cooperados sentem que
devem colaborar com o grupo. Algumas cooperadas responderam pensando também em suas
famílias, mencionando que seus familiares achavam importante que elas trabalhassem e que se
preocupavam com o retorno financeiro. É importante notar que as cooperadas que mais se
preocupam com o retorno financeiro são aquelas que tem um papel importante como provedoras
da casa, relatando gastos com a educação dos filhos, com remédios, com alimentação.
Cooperadas que não têm sua remuneração como fonte importante de renda da casa parecem
preocuparem-se menos com isso, e como uma delas, que tinha dezoito anos de idade e não tinha
sua renda como importante para a casa, diz “no momento, para mim, o salário está bom”.
Nos relatos a respeito do que as entrevistadas esperavam dos demais cooperados, nota-
se, também, uma preocupação das cooperadas entrevistadas com a imagem do empreendimento
e com o trabalho do grupo. Essa preocupação aparece outras vezes durante as entrevistas, e
pode ter sido “provocada” a partir de cursos a respeito de comportamentos cooperativos e
também durante reuniões em que é cobrada uma postura nesse sentido. Como discutido
anteriormente, para que as pessoas trabalhem em um empreendimento solidário seria importante
que fossem orientadas em relação aos princípios que guiam tal tipo de empreendimento e
mudassem determinadas atitudes com as quais estavam habituados em outros tipos de
organização. Parece que na cooperativa estudada há uma preocupação neste sentido, o que é
revelado pelos relatos das entrevistadas. Entretanto, esse processo de mudança de
comportamento está em fase de desenvolvimento, e este é um dos motivos relacionados aos
problemas encontrados na cooperativa, que podem ser indicativos de sofrimento para os
cooperados.
Novamente, muitas das respostas parecem ser baseadas em regras das entrevistadas, e,
como em muitas vezes as respostas coincidem, provavelmente estas tenham sido regras
passadas ou aprendidas no ambiente da cooperativa, talvez da mesma forma como são
transmitidos os princípios que fundamentam a preocupação dos membros com a imagem da
cooperativa. É importante ressaltar que essa preocupação aparece nos relatos das entrevistadas,
mas não se sabe se os comportamentos delas estão sendo coerentes com esta preocupação, ou
não. Diante das queixas das diretoras sobre a falta de colaboração, essa coerência parece ainda
não existir por completo. Em relação às queixas das diretoras, elas indicam que gostariam que
os cooperados conversassem com elas com mais respeito e calma, visto que muitas vezes elas
são cobradas de forma agressiva por eles. As diretoras também indicam que gostariam que os
cooperados tivessem mais interesse pelo crescimento da cooperativa. A partir desses relatos
pode-se observar que as regras colocadas pelas entrevistadas muitas vezes não estão realmente
relacionadas com comportamentos delas no dia-a-dia da cooperativa. No entanto, o fato de duas
das três diretoras terem abandonado seus postos de trabalho para cuidarem apenas da
administração, pode colaborar para que os demais as vejam como “chefes”, como elas próprias
mencionam, e não se comportem de acordo com as regras de um empreendimento solidário, ou
seja, não mudem seus comportamentos em relação ao trabalho.
Algumas cooperadas, quando falaram sobre suas expectativas em relação aos outros
membros, dizem que esperam simplesmente que os outros trabalhem, enquanto outras se
referem ao crescimento e à imagem da cooperativa, sendo que estas últimas podem estar
relacionadas a regras e à “cobrança horizontal”.
Regras como fundamentos dos relatos
No geral, como já mencionado, muitos dos relatos das cooperadas entrevistadas eram
baseadas em regras, como, por exemplo, quando uma entrevistada diz que “como é cooperativa,
tem que ser tudo igual”. Isso aparece em diferentes momentos das entrevistas, e cabe a
observação de que talvez muitas das respostas das cooperadas tenham sido guiadas por regras, e
não por opiniões delas próprias. De fato, é difícil saber quando uma resposta informa sobre uma
regra que se tornou uma auto-regra para a pessoa ou quando o relato da pessoa descreve uma
regra não incorporada por ela. Ou quando a regra colocada condiz com as contingências a que a
pessoa está exposta na realidade, ou não. As pessoas têm contato com regras durante toda a sua
história de vida, podendo ou não incorpora-las como auto-regras. No caso das regras colocadas
durante as entrevistas, provavelmente elas tenham sido transmitidas para os cooperados com o
objetivo de instruí-los a respeito da forma como uma cooperativa deve ser organizada. Eles
parecem terem absorvido tais instruções. Basta saber se seus comportamentos são coerentes
com elas.
A respeito disso, cabe, mais uma vez, ressaltar a necessidade de os membros de uma
organização baseada na economia solidária mudarem seus comportamentos. Como, até hoje, a
maioria das pessoas teve contato apenas com organizações estruturadas pelo modelo capitalista,
visto que este modelo foi implementado de forma intensa no mundo, e, de outro lado, a
economia solidária é um modelo relativamente novo, que surgiu como resposta às decorrências
do capitalismo, estas pessoas aprenderam a comportar-se de acordo com essa organização do
trabalho, sendo competitivas e acostumando-se com a divisão de poder. Além disso, mesmo que
as pessoas que trabalhem, hoje, em organizações solidárias, não tenham tido experiências com
situação de trabalho assalariado, como já mencionado, o contexto social de desigualdade, bem
como reforços derivados de comportamentos direcionados para a competição podem ser
suficientes para criar um padrão comportamental próprio do capitalismo, qual seja,
individualista e competitivo. Comportar-se de acordo com os ideais solidários depende de
desaprender algumas coisas e aprender outras. Só assim uma cooperativa poderá ser conduzida
de forma realmente solidária: quando seus membros incorporarem o ideal que fundamenta esse
modelo, colocando-o em prática.
A cooperativa estudada é um empreendimento incubado, sendo apoiado por uma
incubadora de cooperativas que tem como objetivo final desincubar os empreendimentos aos
quais presta orientação, de forma a estrutura-los e torna-los auto-gestionáveis. Entretanto, esta
cooperativa, apesar do tempo de incubação, ainda não conseguiu se estruturar de forma que
pudesse ser desincubada, visto que não funciona independente das orientações da incubadora.
Provavelmente, algo que contribui para este adiamento é o fato de os cooperados não se
comportarem do modo como a economia solidária propõe. Como já colocado, a prática é
diferente da teoria por diversos fatores, mas quando se busca um ideal, pode-se chegar a algo
próximo a ele.
Entretanto, de acordo com informações da incubadora, no início da cooperativa, só havia
pessoas em situações precárias de vida, sendo que algumas não tinham sequer documentos que
lhes dessem existência legal. Atualmente, a despeito das tantas adversidades, são 150 pessoas
conseguindo renda, gerando benefícios para pelo menos o dobro de famílias, e tendo dado
muitos passos na direção desejada – ainda que outros tantos possam faltar.
Não há uma receita pronta para a implantação do cooperativismo, apesar de ele existir há
quase dois séculos. Antes de tudo, o cooperativismo é uma filosofia do homem na sociedade em
que vive, um pensamento que procura construir uma nova maneira de processar a economia
baseando-se no trabalho e não no lucro; na ajuda mútua e não na concorrência e competição;
nos valores e necessidades humanas e não na acumulação individual do dinheiro e na
exploração do trabalho de outras mulheres e homens. É a filosofia que procura estruturar um
sistema que propicie o desenvolvimento integral do indivíduo por meio do coletivo (Veiga e
Fonseca, 2001).
Muitas das teorias que embasam a economia solidária pretendem minimizar e até
extinguir problemas encontrados nas organizações capitalistas, estruturando o trabalho de forma
alternativa. Entretanto, com os resultados da presente pesquisa pôde-se observar que, na prática,
os conceitos teóricos são difíceis de serem aplicados. Ao realizar a presente pesquisa, os
pesquisadores puderam notar que muitas das aspirações dos teóricos da economia solidária são
difíceis de serem contempladas no dia-a-dia da cooperativa. Um fator que agrava tal situação é a
diferença existente entre o trabalho com o qual as pessoas estão acostumadas, ou seja, o
trabalho baseado no modelo capitalista, e o trabalho imaginado pela economia solidária. Isso
porque as pessoas, até o momento em que passaram a fazer parte de um empreendimento
solidário, mesmo não tendo tido experiências em empregos tradicionais, podem ter aprendido a
comportar-se de acordo com as regras do capitalismo, modelo que rege a economia e a vida das
pessoas até hoje. Quando iniciam um trabalho solidário, a dificuldade para abandonar aquilo
tudo o que foi aprendido é grande. Sendo assim, é perfeitamente entendível o fato de a prática
ser diferente da teoria no caso de cooperativas. Além disso, a cooperativa estudada é uma
cooperativa popular, organizada pela população de um bairro da periferia da cidade. Grande
parte dos cooperados entrou para trabalhar no empreendimento sem ter conhecimento dos ideais
solidários, e, portanto, sem que a luta pelo cooperativismo fosse o alvo de sua conduta. Eles
apenas encontraram na cooperativa uma oportunidade de trabalharem, e entraram nela para
trabalhar. Além disso, os passos dados pela cooperativa até hoje, são passos importantes da
caminhada realizada pela economia solidária, e impulsionarão novas etapas que conduzirão à
superação das dificuldades encontradas na atualidade.
É importante ressaltar que as informações obtidas pelo presente estudo são originárias de
uma organização em particular, vivendo um momento específico de sua trajetória, sendo,
portanto, um recorte, que impossibilita generalizações, mesmo para dentro do empreendimento.
A presente pesquisa pôde constatar algumas características da organização do trabalho
na cooperativa estudada que são indicativos de prazer e sofrimento, na opinião das cooperadas
entrevistadas. No entanto, visto que a amostra estudada foi pequena e os dados obtidos através
dos relatos das entrevistadas foram parciais, afirmações conclusivas foram impossibilitadas, e
dúvidas a respeito da abrangência de tais informações acabaram por serem despertadas. Um
acompanhamento contínuo da cooperativa poderia, inclusive, contrariar a análise realizada
nessas páginas, já que esta se baseou em dados acanhados e centrados em relatos de pessoas
envolvidas no processo, que, além de tudo, é um processo novo para todos.
Essa constatação sugere a necessidade de novos estudos que possam contribuir para o
desenvolvimento da análise proposta pelo presente estudo, para que possam ser elaboradas
intervenções no sentido de minimizar fontes de sofrimento e maximizar as de prazer, no
ambiente de trabalho.
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APÊNDICES
APÊNDICE 1
Roteiro da entrevista inicial para caracterização do empreendimento
Entrevista inicial
Entrevistador:_________________________________Data:_________________ Entrevistado:_______________________________________________________ Há quanto tempo você trabalha nesta cooperativa? Por qual(is) motivo(s) entrou? Quais funções você já ocupou? 1) Há quanto tempo este empreendimento existe? 2) Como este empreendimento começou? De quem partiu a idéia de começar? 3) Qual é a situação atual do empreendimento (jurídica, financeira, número de membros)? 4) Quais são as tarefas necessárias para o desenvolvimento da atividade da cooperativa? Quais são os cargos ou funções existentes? 5) Como é estruturada a diretoria? 6) Quando há troca de diretoria, como é o processo de escolha? 7) Qual é o esquema de horário (horário de entrada, intervalos, horário de saída) do empreendimento? Existem diferentes turnos? 8) Há faltas e atrasos para o trabalho? Com que freqüência? Quais são as medidas tomadas? 9) Como é feito o pagamento aos membros (esquema de remuneração)? 10) Quando há uma decisão a ser tomada, como se dá este processo de decisão? Há diferentes processos para os diferentes tipos de assunto? 11) Com que freqüência ocorrem assembléias? 12) Quantas e que pessoas participam das assembléias? 13) Há obrigatoriedade de comparecimento nas assembléias? Como isto é exposto aos participantes? E como é feito o controle? 14) Os membros participam de que maneira das discussões e decisões? De que maneira são expostas as idéias? 15) Como ocorrem as assembléias: quem dirige, como acontece a discussão e como se dá a tomada de decisão?
16) Quando há um problema inesperado e há necessidade de uma tomada de decisão imediata, como esta decisão é tomada (depende do tipo de assunto?)?
17) Quando entram membros novos para o empreendimento, como eles são integrados à organização (como são introduzidos aos conceitos da economia solidária, se há treinamento para a função específica que exercerão?)?
APÊNDICE 2
Roteiro da entrevista com os cooperados participantes do estudo
Entrevista
Entrevistador:___________________________________Data:_______________
Entrevistado
Nome
Há quanto tempo está na cooperativa?
Qual é a função que ocupa na cooperativa atualmente?
Já ocupou outras funções? Quais?
Pretende continuar na cooperativa? Por quê?
1) Quais são suas experiências profissionais anteriores?
trabal
ho
época local duraç
ão
Por
que
busco
u
trabal
ho?
Por
que
deixo
u o
trabal
ho?
2) Por que decidiu participar da cooperativa (quais são os motivos que colaboraram
com a decisão: conhecer algum membro, autonomia e independência financeira,
participação nas decisões/ responsabilidades pela cooperativa, igualdade de deveres e
direitos, forma de divisão do trabalho, remuneração do trabalho, gosto pelo trabalho,
necessidade de trabalhar mesmo não gostando do que faz, ideais solidários)?
3) Quais eram suas expectativas em relação à cooperativa antes de seu ingresso, em
relação à:
remuner
ação
condiçõe
s de
trabalho
divisão
das
tarefas
relação
entre os
membro
s
fato de
não ter
patrão
4) Atualmente você tem outra ocupação além da cooperativa? Se sim, qual e por quê?
5) Em relação à atividade desenvolvida por você na cooperativa, esta é uma atividade
para a qual você havia se preparado anteriormente (já trabalhava ou pensava em
trabalhar com isso?)?
6) Você gosta de realizar esta atividade (preferências e aspirações)?
7) Qual é a função da sua tarefa para o andamento da cooperativa? Com o que seu
trabalho contribui para este andamento?
8) Qual é seu horário de trabalho? O que você acha dele?
9) Como você avalia o papel da diretoria? As funções são divididas com o restante dos
membros (centralização ou descentralização)? Se sim, como isto é feito?
10) Você participa das tomadas de decisão? Como isto acontece?
11) O que você acha de poder participar (julgamento: oportunidade ou incumbência)?
12) Quando você acha que precisa e quando acha que é desnecessário chamar
assembléia para tomar decisões? Acontece de serem chamadas assembléias para
situações que você considera desnecessárias? E o que você pensa sobre isso?
13) Você costuma freqüentar as assembléias? E durante a reunião você tem o costume de
dar suas opiniões, de falar quando acha que algo deve ser mudado na cooperativa?
14) O que você acha de não ter um patrão (se sente mais responsável ou perdido,
mudança de mentalidade, responsabilidade do múltiplo papel – mais
responsabilidade ou sobrecarga?)?
15) Você sabe quais são os conceitos da economia solidária (pedir pra dizer alguns)? Se
sim, quando você teve o primeiro contato com eles?
16) O que você acha deles? É fácil segui-los, agir de acordo com eles?
17)Em relação à faltas, com que frequência você costuma faltar do seu trabalho? Por que
motivos você falta?
18) E o que acontece quando você falta: o trabalho fica acumulado, alguém o substitui,
você é punido?
19) Como você acha que seus colegas de trabalho e o líder avaliam seu trabalho?
20) Qual seria a razão pela qual você executa sua tarefa (quais os motivos que o levam a
realizá-la?)?
21) Você acha melhor fazer por si ou gosta quando alguém lhe orienta sobre o que fazer?
Por quê?
22) Como você avalia suas relações com seus colegas de trabalho? Existem
desentendimentos? E quando existe, como normalmente vocês resolvem?
23) Vocês costumam trocar informações e conversar sobre aspectos do trabalho? E sobre
outros assuntos, fora do trabalho, vocês costumam conversar? Em que momento?
24) Do que você mais gosta do trabalho na cooperativa? Quais são as coisas que te dão
mais prazer?
25) Quais são as coisas que te causam mais sofrimento no trabalho na cooperativa?
26)Analise algumas características do empreendimento:
Situaçõe
s de
trabalho
(horário,
divisão
tarefas,
materiai
s,
barulho,
luminosi
dade...)
Ambient
e de
trabalho
(tenso
ou
descontr
aído...)
Relacion
amento
entre as
pessoas
Remune
ração
(valor,
forma de
pagamen
to, época
de
pagamen
to...)
Respons
abilida-
des
(múltipl
o papel)
27)Você acha que existem coisas que precisariam ser alteradas na cooperativa? O que? E
por que?
29) O que você acha que existe de diferença entre o trabalho na cooperativa e o trabalho
como empregada?
30) Você teria preferência por um emprego com carteira assinada para fazer as mesmas
coisas que faz na cooperativa? Por que?
31) O que você acha que as pessoas esperam de você na cooperativa? (sua família, seus
companheiros de trabalho, a diretoria do empreendimento...) Por que?
31) O que você espera de seus companheiros de trabalho na cooperativa? Explique.
32) Se você pudesse escolher só uma coisa em grande quantidade na sua situação de
trabalho, e as outras todas fossem médias, qual escolheria: (fazer hierarquia)
a) remuneração
b) prazer no que faz
c) relação com as outras pessoas
d) participação nas decisões sobre o trabalho
33) Imagine uma situação ideal de trabalho (horários, divisão de tarefas, ambiente de
trabalho, responsabilidades, remuneração, relacionamento entre as pessoas,
hierarquia). Como ela seria?
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Div
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APÊNDICE 3
Termo de compromisso do pesquisador
Termo de Compromisso do Pesquisador
Eu, Ana Lúcia Cortegoso, pesquisadora responsável pelo projeto de pesquisa: “CONDIÇÕES DE TRABALHO RELACIONADAS A PRAZER E SOFRIMENTO DOS TRABALHADORES NO ÂMBITO DE COOPERATIVAS POPULARES” comprometo-me em cumprir os termos da resolução 196/96 do Ministério da Saúde.
Sem mais, subscrevo-me,
______________________________________
Profa. Ana Lúcia Cortegoso
Docente do Departamento de Psicologia
UFSCar
APÊNDICE 4
Termo de consentimento livre e esclarecido
Termo de Consentimento Livre e Esclarecido
Estudo: “ CONDIÇÕES DE TRABALHO RELACIONADAS A PRAZER E SOFRIMENTO
DOS TRABALHADORES NO ÂMBITO DE COOPERATIVAS POPULARES”.
Eu, ___________________________________________, abaixo assinado, declaro que 1) concordo voluntariamente em participar do estudo acima, oferecendo informações que
possibilitem identificar condições de trabalho que possam estar relacionadas a condições de prazer e sofrimento no âmbito de meu trabalho (objetivo), por meio de entrevistas e observações de atividades de trabalho (atividades das quais participarei), inclusive reuniões, desde que haja acordo de todos os participantes;
2) recebi informações detalhadas sobre a natureza e objetivos do estudo e sobre as solicitações
que me serão feitas, conforme indicado no item 1 acima; 3) tenho conhecimento de que sou livre para desistir do estudo a qualquer momento, sem
necessidade de justificar minha decisão. Caso isso ocorra, comprometo-me a avisar os pesquisadores o mais rápido possível.
4) tenho conhecimento de que minha participação é sigilosa, isto é, que meu nome não será
divulgado em qualquer publicação, relatório ou comunicação científica referentes aos resultados da pesquisa. Além disso, eu não tenho direito de restringir de maneira alguma o uso dos resultados obtidos, desde que eu não seja identificado como sujeito do estudo;
5) que disponho de informações para entrar em contato com o pesquisador responsável,
durante o estudo, caso seja necessário. Nome:.................................................................................................Data:............... Assinatura:................................................................................................................
Confirmo ter explicado a natureza, objetivos desse estudo ao voluntário acima.
Nome:.ANA LUCIA CORTEGOSO Assinatura:.................................................. Telefones: (16) 260-8361 (Departamento de Psicologia-UFSCar); (16) 3368-1529 (res)
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