XV ENCONTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS DO NORTE E ... e da agricultura familiar e identificando elementos...
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XV ENCONTRO DE CIÊNCIAS SOCIAIS DO NORTE E NORDESTE e PRÉ-ALAS BRASIL. 04 a 07 de setembro de 2012, UFPI, Teresina-PI.
Grupo de Trabalho: Socioantropologia marítima e pesqueira no norte e nordeste - GT22
Quilombagem pesqueira do Vale do Guaporé: Organização e resistência
Josenildo de Souza e Silva – UNIR – [email protected] Jussara Goncalves Souza e Silva – UNIR – [email protected]
Clodoaldo de Oliveira Freitas – UNIR – [email protected] Greice Leite de Freitas – UNIR – [email protected]
Quilombagem pesqueira do Vale do Guaporé: Organização e resistência
Resumo:
O estudo analisa como se constitui a produção e organização do trabalho camponês e dos pescadores, considerando os processos históricos, princípios agroecológicos e a sustentabilidade nas comunidades de remanescentes quilombolas do Vale do Guaporé/RO. A investigação privilegiou o pluralismo epistemológico, associando a observação, entrevistas, relato de vida e oficinas participativas. Apontou um trabalho mútuo e solidário; resistência quanto as tecnologias insustentáveis para pesca e agricultura; necessidade de resgatar a identidade afro brasileira; luta pelo reconhecimento quilombola e posse da terra; ausência de políticas públicas; e a presença do saber manejar sustentavelmente a agricultura, pesca e recursos naturais, os quais se constituem nas principais formas de resistência simbólica do grupo neocabano da floresta.
Palavras chaves: quilombolas, pesca artesanal, agricultura, trabalho.
1. Introdução
A construção da identidade brasileira tem grande influência africana, os
negros ensinaram muito de seus costumes, sobretudo força e resistência. A
matriz africana de nossa história, segundo Ribeiro (2000) influenciou a
culinária, a dança, o gingado da capoeira, a religiosidade e outros elementos
importantes da nossa cultura.
No estado de Rondônia, por exemplo, a presença africana, portuguesa,
indígena e boliviana pode ser observada em características físicas e cultural.
No início do século XVIII os portugueses ocuparam o Vale do Guaporé, para
fins de desenvolver a mineração e assegurar a ocupação militar para proteção
da colônia castelhana (Bolívia).
Quando os portugueses se retiraram deste trecho, deixaram um grupo
de negros que, aliados a indígenas e bolivianos foram responsáveis pela
organização do estado de Rondônia e a região do Guaporé ficou marcada pela
resistência ao regime de escravidão de diferentes formas e pela formação de
vários quilombos, como afirma Teixeira (2010, p. 84), “(...) os negros do
Guaporé empreenderam fugas para os sertões ermos do próprio rio, na
capitania de Mato Grosso, dando origem a inúmeros quilombos.” tais como, o
quilombo Mutuca, Pindaituba, Joaquim Telles, Joaquim Félix e Quariterê que
depois chamou-se piolho.
Esses quilombos eram mais visíveis e foram destruídos após muitas
investidas das bandeiras, outros quilombos mais afastados nunca foram
tocados (TEIXEIRA; FONSECA; ANGENOT, 2010). Os sobreviventes foram
espalhados ao longo do vale do Guaporé, deixados junto a decadência da
colonização que “sobre os escombros e ruínas desse mesmo sistema, (...)
construíram novas formas de viver e de saber.” (p. 93)
Remanescentes desses primeiros povoados trazem em seu percurso
cultural um conhecimento africano, indígena e boliviano, pois os quilombos
eram assim constituídos, numa mistura física e cultural onde os saberes da
terra, o manejo dos recursos naturais para fins de agricultura, pesca e saberes
medicinais, artes dos índios e bolivianos e a língua portuguesa que os negros
de Angola e Bissau ensinavam, mesclaram-se na construção de um povo de
vários saberes.
As comunidades que foram sendo formadas a partir da inserção do
negro no Guaporé, ao longo dos séculos XVIII e XX, foram caracterizadas por
comunidades rurais, vivendo da agricultura de subsistência, pesca artesanal e
caça. Hoje existem doze comunidades negras no Vale do Guaporé, sendo as
mais conhecidas a de Santa Fé, Pedras negras, Forte Príncipe da Beira, Santo
Antônio do Guaporé, Comunidade de Jesus.
Essas comunidades vivem isoladas há mais de 200 anos com muitos
conflitos territoriais, onde força militar, latifundiários e órgãos do governo se
aliam para apagar a presença negra nesta região. Entre outros grupos
ribeirinhos, os descendentes dos quilombos, sentem a necessidade de lutar por
um espaço que vivem há mais de 200 anos.
É nesse contexto de conflitos territoriais, de (re)construção ou afirmação
de identidade, de saberes ambientais preservados que se insere a nossa
pesquisa entendendo que a partir da formação dos quilombos os negros
exercitaram seus saberes em relação à natureza com autonomia e liberdade,
tiveram a oportunidade de tirar da terra e dos rios o seu sustento longe do
tronco e chicote da burguesia agroindustrial. Hoje as comunidades quilombolas
continuam resistindo as técnicas da insustentabilidade contida na produção e
na forma de trabalho, na pesca artesanal e agricultura familiar, contrariando as
regras do capital.
As comunidades de Santa Fé e Forte Príncipe da Beira da Beira que é
uma das mais expressivas para entender o processo dos quilombos na região,
são sujeitos dessa pesquisa. Esses grupos são essencialmente rurais,
formados por camponeses, vivem do extrativismo, da agricultura de base
familiar e da pesca artesanal.
O trabalho em pauta busca analisar a sustentabilidade do manejo dos
recursos naturais e práticas culturais quando da produção da pesca e
agricultura. Sendo assim a nossa discussão se relaciona às diversas
populações quilombolas pesqueiras tradicionais ribeirinhas do Guaporé, seus
critérios de sustentabilidade, de produção e reprodução de trabalho, os
impactos sobre seus complexos culturais e processos de relação homem,
natureza e sociedade. Nossa pretensão é com os debates gerados pela
pesquisa com essas comunidades, a partir de seus discursos e cotidiano,
contribuir na discussão sobre suas atuais lutas que aqui chamamos de
neocabanagem.
Esta pesquisa tem o objetivo de compreender a resistência quilombola
na produção e organização do trabalho da pesca e da agricultura, construindo
o perfil dos pescadores e agricultores quilombolas, analisando o trabalho da
pesca e da agricultura familiar e identificando elementos culturais afro
brasileiros na vida cotidiana e nas relações de trabalho.
2. Quilombolas do Brasil
A escravidão na historiografia brasileira teve diferentes narrativas, conta-
nos Gomes (2006) que a partir da década de 1930 o debate girava em torno
das relações patriarcais entre senhores e escravos, nesse debate encontramos
as obras de Gilberto Freire evidenciando os aspectos positivos do sistema
escravista, as diversas relações antropológicas que senhores e escravos
mantinham, desde a pseudo proteção até os encontros íntimos com as negras
da senzala.
Nas décadas de 1960 e 1970, continua Gomes (2006) a dizer que esse
cativeiro “brando” e de relações patriarcais fora contestado e nasce uma
abordagem evidenciando o protesto escravo em todas as suas formas,
negando sua passividade e submissão e apontando a violência e crueldade do
senhor.
E é nesse contexto que o quilombo aparece como resistência e rebeldia,
o sistema escravista era o protagonista da história e o aquilombado
representava tão somente o rebelde e não o sujeito de transformações
históricas e sociais. A coisificação do cativo pelo seu senhor, permanece no
discurso da história, o fugido resiste ao sistema, mas ele não conta sua
história, a narrativa é centrada na reação e não nas ações do negro dentro de
seu contexto histórico.
Mais tarde, o quilombo é visto por dentro, as contradições econômicas,
as trocas mercantis entre aquilombados e senhores de escravo foram
evidenciadas, entretanto o quilombo ainda era visto como marginal (REIS,
1996). Não eram as relações cotidianas do quilombo que interessava contar,
mas as relações que esta população marginalizada estreitava com a sociedade
escravista que tinha palco na narrativa da história.
A história muito recente é que vem trazendo a complexidade do sistema
e das formações de quilombos analisando os sujeitos do momento histórico:
senhores e escravos, as relações complexas no cotidiano do sistema
escravista. Podemos citar os estudos de Price (1992, 2003); Hobsbawn (1988)
que analisam do ponto de vista antropológico as relações no Brasil e em outros
países, vistas a partir da visão do negro.
Os quilombos como universo complexo de investigação, continuam
sendo investigados. No estudo de Gomes (2006, p.22) sobre os quilombolas do
Rio de Janeiro ele analisa as transformações históricas no regime escravista a
partir dos quilombos e das comunidades de senzalas. Dessa forma
descortinam os conflitos, as contradições, as sociabilidades, enfim a ação do
aquilombado transformando os mundos da escravidão.
Esses quilombos que se estruturaram como umas das estratégias de
resistência ao sistema escravocrata vivenciaram como protagonistas muitas
histórias, ampliando as concepções de liberdade e escravidão, continuam
presentes em todo o Brasil, de norte a sul, pois comunidades remanescentes
desses antigos quilombos, comunidades livres, fazem parte do cenário atual da
história.
Hoje essas comunidades estão inseridas no debate sobre igualdade de
direitos, as pesquisas estão em torno da territorialidade, ao direito a terra
(CHAGAS, 2001; SANTOS, 2007) a preservação cultural e ao pertencimento
sócio econômico brasileiro e ao direito a coletividade (DORIA E JUNIOR,
1996). O negro remanescente dos quilombos se apresenta contando o seu
presente, suas lutas como um cidadão brasileiro de deveres e direitos.
Continuam lutando para se fazer presentes na história, por reconhecimento de
sua importância na sociabilidade e formação cultural do povo e do espaço
brasileiro.
A partir de um direito constitucional, presente no Art. 68 da Constituição
da República que afirma “Aos remanescentes das comunidades de quilombos
que estejam ocupando suas terras é reconhecida a propriedade definitiva,
devendo o Estado emitir-lhes os títulos respectivos”. Abriu-se um leque de
pesquisas sobre quem é esse remanescente, como caracterizá-lo, onde vive. A
discussão envolve várias áreas do saber como a sociologia, a antropologia e o
Direito. Nessa direção encontramos os estudos de Arruti (1997); Doria e Junior
(1996) e Andrade e Treccani (1999).
A conjuntura temática tem aquecido o debate, abrangendo questões
inerentes a saúde, educação, cultura e políticas públicas. De forma dialética se
faz presentes nos discursos de igualdade, de diferenças, de estereótipos, de
inclusão socioeconômica e cultural, ao todo a problematização colocou na
pauta atual os aspectos do cotidiano quilombola na leitura da ciência.
3. O vale do Guaporé
A região no extremo oeste do Brasil que margeia o Rio Guaporé é
denominada de Vale do Guaporé, essa região desde a colonização se
constituiu um ambiente de muita riqueza. A mineração as margens direita do
Guaporé era responsável pela fortaleza econômica da capitania de Mato
Grosso. Essa região também era fronteiriça e, portanto se formou também um
aparato militar para proteger a colônia portuguesa das vizinhas castelhanas.
Todo trabalho era realizado por mão de obra escrava, embora a
escravidão fosse demasiadamente dispendiosa os negros africanos eram
maioria na região, pois eram os pilares do projeto de colonização.
Todas as atividades mercantis e militares, exceto as de liderança, eram
desenvolvidas pela força escrava como afirma Teixeira e Amaral (2010),
A posse de escravos no vale do Guaporé esteve sempre relacionada aos padrões de ocupação do espaço fronteiriço, através da construção do aparato administrativo e militar, de uso da terra para formação de lavouras de subsistência e,
principalmente, através da mineração, base de toda exploração mercantilista do Mato Grosso e do Guaporé durante o período colonial (p 63)
Durante a segunda metade do século XVIII a fuga de escravos e a
construção de quilombos ao longo da floresta se tornaram comuns, segundo
Teixeira e Amaral (2010) os negros foragidos rompiam as fronteiras e eram
acobertados pela vizinha castelhana em troca de informações militares, dando
a essa fuga um caráter político.
Os quilombos eram formados nas regiões mais altas do Guaporé, ou as
margens dos rios mais escondidos e protegidos pela vasta floresta, regiões de
difícil acesso para os colonos, tanto no aspecto geográfico quanto na
ocorrência das doenças tropicais, tal como afirma Teixeira e Amaral (2010) “à
proximidade fronteiriça, os enormes alagadiços que dificultavam as manobras
das bandeiras de captura e o vazio colonial na região.” (p. 119)
Esses quilombos eram formados pelos negros fugidos, por nativos das
colônias castelhanas e por índios brasileiros que juntos mesclavam-se
fisicamente e culturalmente. Essa mistura deu aos quilombos do Guaporé uma
característica singular de costumes africanos e indígenas, sincretismo religioso,
manejo dos recursos naturais, defesas das doenças tropicais, conhecimento
dos caminhos e perigos da floresta.
Hoje na configuração social do estado de Rondônia existem, no Vale do
Guaporé, 12 comunidades identificadas como remanescentes de quilombo.
Porém, apenas a comunidade de Jesus pertencente ao município de São
Miguel do Guaporé possui o título de comunidade quilombola expedido pelo
INCRA em 25 de agosto de 20101.
Essas comunidades são rurais e esses sujeitos vivem como
camponeses, sobrevivem da pesca artesanal e da agricultura familiar,
reinventam seus fazeres com base nas tradições de seus ancestrais. Sua
forma de fazer agricultura persiste sob a pressão da miséria, da exclusão das
políticas públicas e da inexistência de seu direito a terra.
1 Títulos expedidos a comunidades quilombolas do Brasil, quadro completo disponível no site.
http://www.incra.gov.br/portal/arquivos/institucional/quilombolas/titulos_expedidos.pdf).
4. As comunidades de Santa Fé e Forte Príncipe da Beira
Para compreender essas duas comunidades, buscamos o contexto a
que elas se inserem desde a época colonial, a formação de quilombos e suas
atuais lutas.
Na escassez de trabalhos científicos e publicações ficamos restritos as
valiosas pesquisas do Grupo de Estudos e Pesquisas Interdisciplinares Afro-
Amazônico/GEPIAA da Universidade Federal de Rondônia. Autores como
Teixeira, Fonseca e Angenot (2010); Teixeira e Amaral (2010); foram nossa
fonte para compreensão da composição dessas comunidades no vale do
Guaporé, bem como os conflitos vividos atualmente. Portanto, segue em linhas
gerais o que esse grupo de estudos pesquisou sobre essas comunidades.
Ao longo do Rio Guaporé e seus afluentes muitas comunidades negras
forjaram-se como comunidades rurais que estavam ligadas ao: extrativismo de
poaia, borracha, castanha e pescado ou para uma agricultura de subsistência
que teve na mandioca seu mais expressivo produto, muito embora outros
produtos como acana-de-açúcar, o café, algodão, frutas, além de milho e feijão
tenham sido relevantes e, mesmo, servido como excedentes comercializáveis
em alguns momentos da vida dessas populações.(TEIXEIRA e FONSECA,
2010, p. 113)
A comunidade de Santa Fé está povoada por negros de várias
localidades do vale do Guaporé, especialmente de Vila Bela da Santíssima
Trindade do Mato Grosso, segundo Teixeira e Fonseca (2010, p114) “Santa Fé
surgiu a partir de um núcleo povoador constituído por, aproximadamente, 20
indivíduos, dos quais 08 eram homens adultos”.
No município de São Luis de Cáceres havia uma usina de açúcar que
após a libertação e emancipação dos escravos, 100 pessoas foram
emancipadas e libertadas e se dirigiram para Vila Bela da Santíssima Trindade,
e daí dispersaram-se nas pequenas localidades que existiam na região, assim
12 adultos e 08 crianças foram para Santa Fé trabalhar junto aos peruanos na
pesquisa de ouro. Santa Fé também se tornou reduto dos caucheiros2 e suas
famílias, no início do século XX.
2 Caucho (Castilloa ulei), é uma árvore amazônica, que se extraí um látex para fabricar borracha, embora
sem a mesma qualidade do Hevea (seringueira).
O povoado de Santa Fé entrou em decadência por ocasião do
povoamento do Porto Costa Marques pela comissão fiscalizadora liderada pelo
Engenheiro Esperidião da Costa Marques e pela crise da borracha. Porém o
povoamento negro da comunidade sobreviveu da agricultura de subsistência, a
venda de pequenos excedentes, da produção extrativista possível e oportuna,
da pesca e da caça.
A localidade de Santa Fé já foi palco de conflitos entre moradores e
proprietários rurais, os antigos moradores tiveram o apoio da igreja católica que
agiu em se favor. Hoje Santa Fé é um pequeno núcleo negro, provenientes de
famílias de extrativistas e pequenos agricultores e pescadores. A comunidade é
reconhecida como remanescente de quilombo pela Fundação Palmares e suas
terras encontram-se em processo de estudo para demarcação pelo INCRA.
A comunidade do Forte Príncipe da Beira está ligada a construção do
forte no século XVIII na construção do Real Forte Príncipe da Beira para a
proteção fronteiriça da colônia. Trabalharam mais de 360 escravos, muitos
desses escravos eram cedidos por fazendeiros da região, então durante a
construção muitos fugiram.
A localidade do Forte Príncipe da Beira era uma comunidade de civis e
militares com 715 moradores, inclusive membros da Companhia dos Homens
Pretos e Mulatos. A localidade possuía hortas, pomares, pequena criação de
gado e posto fiscal. Contudo a insalubridade ambiental era um fator
determinante para o despovoamento do lugar. A epidemia de varíola, malária,
febres catarrais e maculo, prejudicaram a saúde de moradores dizimando
muitos e contribuindo para o despovoamento da região, restando apenas a
população negra fugida ou abandonada. Só a partir da década de 1930 o forte
foi reativado.
A Comunidade de Remanescentes de Quilombo do Real Forte Príncipe
da Beira é reconhecida e registrada pela Fundação Cultural Palmares em 2004
como Comunidade Vale do Guaporé, é hoje considerada uma das mais
importantes populações quilombolas de Rondônia pela sua expressividade.
Pertencente ao município de Costa Marques, a comunidade esteve vinculada a
economia extrativista da borracha, poaia, castanha e à agricultura de sustento
de mandioca, além da pesca e da caça.
5. Os remanescentes quilombolas e a sustentabilidade, o papel da
agricultura e da pesca
O reconhecimento da etnicidade e da territorialidade é uma das
principais lutas dos povos remanescentes de quilombos, esse direito de
assegurar identidade é avaliado considerando uma série de elementos sócio-
antropológicos.
Nesse sentido, foi se construindo um conceito de remanescentes que
pudesse conferir as comunidades negras e pobres tal título. O principal
elemento pra concessão do direito é o auto-reconhecimento, a identidade
étnica, cultural e territorial, assim são consideradas comunidades quilombolas
as comunidades:
Cujos habitantes descendem diretamente de quilombolas, de grupos de escravos fugidos, e mesmo de libertos e negros livres a eles articulados (...) 1) ancianidade da ocupação e manutenção da memória coletiva circunscrita no espaço que deu origem à história da comunidade; 2) pela ritualização das práticas culturais permanentemente reelaboradas que lhes dão caráter identitário e 3) pela ligação com a terra utilizando-a na agricultura e preservação do meio ambiente” (EXALTAÇÃO & GOMES, 2001, p. 15).
O debate sobre a conquista desse direito e a categorização desse grupo
tem sido acirrado, diversos autores têm discutido sobre os limites e as
possibilidades de reconhecimento, problematizando os estereótipos, entre
outros aspectos contraditórios da definição dessa categoria.
Andrade e Tuccani (1999) apontam a inter-relação da dimensão histórica
e a condição social para ser considerado na categorização de comunidade
remanescente, em outras palavras, o antes escravo e agora camponês livre,
independente de sua condição anterior como aquilombado, fugido, negociado,
abandonado, deve ter o direito a terra em que vivem seus descendentes. Neste
caso, a ligação com a história quilombola é restituída enquanto vínculo
sociocultural e histórico com um tipo e qualidade de organização social, mais
do que um estrito traçado datado de ligações lineares com o passado.
Para Chagas (2001) há diferentes formas de julgar o espaço territorial
como comunidade de remanescentes,
(...) o atributo de resistência, que até então tem deixado as comunidades excessivamente reféns do Modelo Palmarino, pode ser acessado por outros canais como a religiosidade, o parentesco e o trabalho familiar na terra, considerados
igualmente formas contundentes de lutar por um lugar social no horizonte da liberdade.
Autores como Figueiredo e Lima (2010) fazem uma análise sobre a
dimensão socioambiental do quilombo dos palmares; refletindo sobre a
importância da sustentabilidade como elemento marcante desses grupos,
concluem que as comunidades que possuem esse título são,
preferencialmente, rurais a ligação com a natureza, no uso da agricultura ou da
pesca e preservação do meio ambiente, assumem relevância nas discussões
sobre sustentabilidade.
5.1. Agricultura
As politicas públicas agrícolas brasileiras têm focado suas ações na
agricultura industrial e com isso vem contribuindo com as externalidades que
seguem alterando as dinâmicas da natureza. A base da sustentação energética
desse modelo modernizante são os recursos naturais, os quais estão sendo
esgotada a nível superior ao de capacidade de carga, de suporte desses
agroecossistemas, evidenciando autofagia, insustentabilidade e
comprometendo a vida no planeta.
Vejamos o exemplo da agricultura no Brasil, de uma forma global, desde
a revolução industrial, ela tem se prestado à reprodução e acúmulo de capitais,
mas a tecnologia que cumpre objetivos individuais e particulares não tem
satisfeito as necessidades coletivas e futuras, nem mesmo as necessidades
mais imediatas do setor agrícola, a exemplo das políticas públicas voltadas
para a agricultura familiar, que não tem conseguido resolver a questão mais
básica e fundamental da suficiência alimentar da população do campo.
O processo, fruto da agricultura modernizante e do desenvolvimento
econômico via exclusiva do aumento da produtividade de produtos, bens e
serviços, que sempre estabeleceu uma lógica mercantil, não incorporando
valores, culturas e saberes do campo como importante para o desenvolvimento
rural. Nesse sentido podemos afirmar que a atividade agrícola,
(...) gira exclusivamente em torno da produção de mercadorias agrícolas. Toma o lugar dos sistemas de saberes locais que vêem a agricultura como a produção de diversas safras com insumos internos, substituindo essa diversidade por monoculturas de variedades estrangeiras que precisam de insumo industrial externo. (SHIVA, 2003, p.79)
Paralelamente, como parte desse processo, o latifúndio via monocultura
seguiu avançando na homogeneização das tecnologias e acumulação de
riquezas, depredando a biodiversidade e o patrimônio imaterial da humanidade,
os ecossistemas e a cultura popular tradicional dos camponeses.
5.3. A pesca
A pesca artesanal mundial vive uma crise geográfica, ecológica e
econômica, os apetrechos de pesca se transformaram em super equipamentos
que varrem os oceanos, mares e rios, capturando recursos pesqueiros de
forma insustentável. O conceito de pesca inesgotável ainda perdura, as
políticas públicas, em sua grande maioria, se mostram desenvolvimentistas, o
estado se apresenta como intermediário dos interesses da expansão do capital,
tais fatos tem provocado erosão social das culturas tradicionais dos pescadores
artesanais e pouco tem contribuído com a sustentabilidade da pesca.
A produção pesqueira (pesca e aquicultura) mundial somou 142 milhões
de toneladas das quais 115 se destinaram ao consumo. (FAO, 2010). A
Amazônia tem contribuído significativamente com a pesca, o Guaporé
Brasileiro envolve os Municípios de Pimenteiras, Costa Marques e São
Francisco, nos quais os pescadores e quilombolas estão agrupados as colônias
Z3, Z4 e Z10.
Desde janeiro de 2010 o Projeto Peixe-Vivo e o subprojeto
Quilombagem pesqueira do Guaporé vêm acompanhando a estatística
pesqueira, levantando dados da produção por espécie, embarcações,
equipamentos de pesca, técnicas utilizadas, manejo, áreas de reprodução e de
pesca, processo de agregação de valores e comercialização do pescado. O
quadro 1 – detalha a análise de 2010.
Quadro 1 – Produção e economia pesqueira do Guaporé em 2010
Colônias Total da Produção em 2010 por Colônia (em Kg)
Projeção do Total da Produção em 2010 por Município (em Kg)
Receita anual
PIMENTEIRAS (Z3)
55.253,00 94.032,64 428.000,00
COSTA MARQUES (Z4)
38.517,00 97.649,28 276.000,00
SÃO FRANCISCO (Z10)
87.062,00 94.032,64 509.000,00
TOTAL 180.832,00 285.714,56 1.213.000,00
Fonte: Projeto Peixe-Vivo, subprojeto Quilombagem pesqueira do Guaporé.
Os dados mostram que a pesca artesanal do Guaporé é de uma
importância socioeconômica sem precedentes, produz divisas para o estado de
Rondônia, gera trabalho para mais de 3 mil pescadores vinculados as colônias
de pescadores da região. Quando de pescadores da região. Quando
ampliamos para a área de influência de Cabixi e Guajará Mirim os números
sobem para mais de 2 milhões de reais produzidos em 2010 oriundos dos
pescadores vinculados as organizações de base. Verificamos que a receita se
amplia para 3,2 milhões de reais quando somadas aos produtores que não são
sócios das colônias, mas possuem carteiras de pescador para exercer a
atividade via Ministério da Pesca e Aquicultura.
6. Metodologia
Optamos por utilizar a abordagem metodológica da pesquisa-ação
participativa, enfocando o pluralismo metodológico, estabelecendo objetivos,
levantando problemas, observando, realizando entrevistas e oficinas
participativas com objetivo de analisar os princípios agroecológicos, autonomia
da organização e contribuir com o resgate da cultura endógena camponesa
quilombola, com destaque para o manejo dos recursos naturais quando da
organização da pesca e agricultura familiar, na perspectiva da sustentabilidade.
No decorrer do trabalho de investigação utilizamos oficinas com
participação dos envolvidos, nas quais utilizamos as chamadas metodologias
participativas, para levantar a problemática de forma coletiva associando aos
dados levantados por outros instrumentos com isso nos aproximar mais do
objeto de estudo.
Para tanto, realizamos entrevistas semi-estruturadas com variáveis
produtivas, socioeconômicas, culturais e ambientais, as quais apoiaram a
análise dos dados, também questionário para verificar o desembarque da
pesca artesanal nos municípios do Guaporé onde os quilombolas e pescadores
se misturam numa identidade única.
A ação plural dos métodos e instrumentos utilizados na pesquisa buscou
apoiar o clamor quilombola, através da problematização do concreto
sociocultural, analisando as relações homem, agricultura, sociedade e
natureza.
7. Campesinato quilombola
Diante das transformações dos dois últimos séculos, a condição
camponesa agregou vários aspectos de natureza contraditória, dada a luta por
autonomia e desenvolvimento no contexto de exploração e marginalização
imposta pela modernidade que estabeleceu uma dinâmica de exclusão,
trazendo o camponês para a cidade, retirando a relação positiva com a
qualidade de vida do campo e da cidade, qualidade dos alimentos e uso
sustentável e eficiente dos recursos naturais.
Nesse sentido, o campesinato retomou seu papel fundamental para
combater a exclusão da modernidade e da insustentabilidade nas discussões
teóricas, sobretudo, nas ressignificações do termo campesinato, (PLOEG,
2008; GUZMÁN, 2009; GOODMAN, 2004).
O campesinato em suas diferentes formas deve assumir lugar nas
discussões científicas, as diferentes perspectivas e soluções que ele oferece
ao presente e ao futuro, as relações e contradições que o caracterizam, devem
estar no cerne das discussões no mundo pós-moderno, uma vez que
enfrentamos uma crise quanto a qualidade e soberania alimentar (PLOEG,
2008).
Para tratar de campesinato, estamos considerando que estrutura
camponesa, do ponto de vista econômico, se define como “acesso estável à
terra (...); trabalho predominantemente familiar (...); economia
fundamentalmente de auto-subsistência (...); e certo grau de autonomia da
gestão das atividades agrícolas (...)” (CARDOSO, 2004, p. 55).
Assim, tratamos da discussão dessa estrutura camponesa e suas
atividades na vida do negro escravo e liberto, pois entendemos como Cardoso
(2004); Gomes (2006) e Ploeg, (2008) que na formação do campesinato latino
americano o escravo contribuiu significativamente, em princípio com suas
atividades agrícolas como escravo e mais tarde como aquilombado.
É importante dizer que as atividades agrícolas e pesqueiras davam ao
negro, ainda na condição de escravo, certa autonomia econômica o que
possibilitava sobrevivência nos ajuntamentos em quilombos. (CARDOSO,
2004).
Essas atividades são denominadas de protocampesinato que “se refere
às atividades agrícolas realizadas por escravos nas parcelas e no tempo para
trabalhá-las, concedidos no interior das fazendas, e à eventual comercialização
dos excedentes obtidos.” (CARDOSO, 2004 p. 55). O protocampesinato incitou
rebeldia pelo desejo dos escravos em se tornarem camponeses livres.
No Brasil, no estado do Pará, servia para que o escravo comprasse a
liberdade de sua família. Os escravos perceberam a “brecha camponesa” como
saída para reestruturação de uma vida livre e autônoma economicamente.
Nas fugas e formação de quilombos os escravos já conheciam muitos
produtos do lugar, formas de cultivo, bem como os valores financeiros de cada
produto, como e a quem deveriam comercializar. O afastamento geográfico dos
quilombos da América latina com a sociedade escravocrata não significava seu
isolamento quanto à comercialização de seus produtos agrícolas e pesqueiros.
(LINHARES & SILVA, 1981).
No Brasil essa prática aconteceu no Amazonas, a princípio com escravo
indígena e em meados do século XVIII com os escravos africanos, plantavam
para o seu sustento, vendiam o excedente e com esse dinheiro compravam
sua liberdade e a liberdade de sua família. A prática do protocampesinato foi
inserida em vários estados brasileiros como Bahia, Pernambuco, Rio de
Janeiro, entre outros, para que os custos de manter um escravo se tornassem
menos dispendioso, o escravo era responsável pelo seu próprio sustento.
(CARDOSO, 2004).
Assim como foi nesse passado, também ocorre hoje, o resgate e
fortalecimento do campesinato nas comunidades remanescentes quilombolas
trazem novas perspectivas no sentido de promover um debate sobre o
significado do campesinato na sobrevivência dos grupos rurais de
conhecimentos geracionais dos usos sustentáveis dos recursos naturais.
Nas comunidades quilombolas estudadas verificamos que 80% dos
entrevistados atuam na agricultura e pesca, dos quais 53% produzem seus
próprios alimentos, destacam-se: milho, mandioca, feijão arroz, cebola e
produtos de horta. De origem animal, atuam na criação de galinhas, porcos,
peixes (piscicultura), patos, gado leiteiro e abelhas nativas. Os subprodutos da
atividade camponesa quilombola são mel, ovos, leite, queijo, picui (farinha de
peixe), defumados e pescado seco salgado.
Identificamos ainda variados sistemas agroflorestais: extrativistas da
biodiversidade da floresta, onde manejam a natureza para colher sementes,
castanhas, cipós, frutos e flores, que servem de alimentos, artesanato,
utensílios e suporte as tecnologias de bioconstruções que utilizam para edificar
suas casas e os equipamentos de transformação de produtos, como o caso
dos defumadores e secadores de frutas; de inserção agrícola junto a floresta,
basicamente com fruticultura; e os quintais agroecológicos nos quais misturam
a agricultura natural, com hortas medicinais e criação de pequenos animais.
A pesca quilombola é uma mistura do extrativista, camponesa e
artesanal, verificamos que 26% dos entrevistados pescam como complemento
alimentar, que 34% pescam para diversificar sua produção e utiliza a
associação da atividade com agricultura, se aproximando da realidade
camponesa e que 40% exerce a pesca artesanal como principal atividade
produtiva, realizando atividades agrícolas e de serviços apenas no período do
defeso da pesca.
Buscando entender os pescadores do Guaporé Amazônico, buscamos
categoriza-los sem a pretensão de ser definitivo, mas como ponto de partida de
uma primeira interpretação para que possamos avançar e se aproximar cada
vez mais da realidade de estudo, definimos, como: de subsistência ou
extrativista; camponês quilombola e artesanal.
Quadro 2 – Categorização do Pescador Amazônico do Guaporé
Pescador de subsistência ou extrativista
Pescador camponês quilombola
Pescador artesanal
Ribeirinho, extrativista, praticada a pesca para consumo doméstico, escambo e soberania alimentar. Conhecedor da biologia das espécies e dinâmica dos ecossistemas pesqueiros. Associa a pesca as outras atividades extrativistas como coleta de frutos, sementes e outros alimentos da floresta. Utiliza pequenas embarcações que servem para o transporte familiar e atividades produtivas.
Ribeirinho, extrativista e geralmente ligado à agricultura familiar, realiza a pesca como diversificação de sua unidade produtiva, acompanha a sazonalidade da produção das águas. Utiliza o pescado para o consumo doméstico, a família realiza a transformação dos frutos do rio em subprodutos (seco-salgado, farinha, defumados) comercializa os excedentes em mercado de ciclo curto.
Praticada diretamente por pescadores profissionais, de forma autônoma ou no regime coletivo com outros companheiros. Possuidores dos instrumentos de produção (embarcações, artefatos) com autonomia de no máximo 20 dias de pesca. Utiliza o pescado para o consumo familiar e comercializa os excedentes via colônias de pescadores, em casa, atravessadores e nas feiras.
Dos quilombolas entrevistados, verificamos que 91% identificam
mudanças ambientais nos agroecossistemas, destacamos: mudanças
climáticas; destruição da floresta, nascentes e matas ciliares; aumento das
queimadas; poluição industrial e doméstica dos rios; avanço da monocultura da
pecuária; uso de agrotóxicos nas pastagens; avanço da destruição da floresta
pelos madeireiros; presença do turismo de pesca clandestina; e construção de
barragens e hidrelétrica ao longo da calha dos rios Guaporé, Mamoré e
Madeira.
Percebem ainda que essas mudanças trazem perdas, principalmente
quanto a: maior intensidade dos efeitos da seca e enchentes; aumento da
média histórica da temperatura na região; contaminação das águas com
agrotóxicos; perda das áreas de plantação familiar; diminuição dos peixes e
migração dos jovens para outros locais em busca de oportunidades.
Quanto à organização 75 % estão associados às colônias dos
pescadores, a Federação dos Pescadores e Aquicultores de Rondônia –
Fepearo e que 22% estão vinculados às associações quilombolas das
comunidades que pertencem. Verificamos que 40% dos entrevistados já
participaram da direção destas instituições de base, assumindo funções de
presidente, secretário, tesoureiro e conselheiros fiscais.
Os entrevistados consideram que sua participação nas organizações
como muito importante para o fortalecimento, organização, cooperação,
manutenção da associação e das comunidades. Destacam ainda, a
contribuição com a visibilidade quilombola, orientação dos associados sobre o
manejo simples da natureza e principalmente para melhorar a condição dos
pescadores e do negro. Por fim, acreditam que as instituições que fazem parte
e que dão sua contribuição trás benefícios às famílias, aos pescadores e aos
quilombolas.
De uma forma geral, a luta travada pelos camponeses quilombolas do
Guaporé pode ser chamada na contemporaneidade de neocabanagem,
buscam políticas públicas de governança participativa na pesca e na agricultura
de base familiar e ecológica, teimam em ser libertos querem estabelecer
unidades de conservação do povo quilombola da floresta, direito as terras que
vivem historicamente.
Percebemos que o povo quilombola do Guaporé compreendem que os
conflitos socioambientais e culturais que estão vivendo só podem ser
superados com políticas públicas territoriais que garantam a estética
existencial, soberania alimentar, gestão compartilhada dos recursos pesqueiros
e manejo sustentável da floresta.
Apontam a necessidade de pesquisas participativas que possam
abranger estudos e apoiar a construção de políticas públicas: em direito a
posse das terras; sobre a ictiofauna (peixes comerciais, de potencial comercial,
possibilidade para o beneficiamento e de importância ecológica); o zoneamento
dos múltiplos usos do Rio Guaporé (pesca, reprodução, criadouros, navegação,
turismo...); acordos de pesca (áreas, quem pesca, onde, quando...);
cooperação binacional Brasil-Bolívia para gestão compartilhada dos recursos
naturais, pesqueiros e da biodiversidade do Rio Guaporé; gestão compartilhada
pesqueira e agroecológica; edificação da legislação ambiental dos múltiplos
usos do Rio Guaporé; formação de grupo gestor participativo do Guaporé;
incentivo a ampliação das experiências agroecológicas; capacitação, formação
profissional e assessoria técnica para os pescadores, ribeirinhos, quilombolas;
e apoio a comercialização solidária e em rede dos produtos da floresta.
A resistência pela manutenção do modo de vida dos pescadores
quilombolas, do conhecimento patrimonial, dos saberes das ancestralidades e
do pertencimento cultural são as armas desses irredentos, dos que não se
entregam, para continuar a luta, na qual se associa a garantia do direito as
políticas públicas para a pesca artesanal e a agricultura de base familiar, de
identidade quilombola, pesqueira e camponesa em suas múltiplas significações
no Guaporé.
8. Considerações finais
A ausência de políticas públicas da pesca artesanal nessas
comunidades, bem como a falta de assistência técnica e extensão rural que
considere as reais necessidades e escute o camponês quilombola e a
necessidade que esse pescador agricultor sente de construir suas próprias
políticas foram alguns achados de nossa pesquisa que precisam ser
consideradas tanto para futuras pesquisas, quanto para projetos de
intervenção, entretanto a intervenção que precisa ser realizada deve ser junto
com esse sujeito que está distante geograficamente dos grandes centros
urbanos e, portanto tem pouca visibilidade.
A cultura dessas comunidades foi construída com base, principalmente
na raíz africana, indígena e boliviana, entretanto em muitos depoimentos os
entrevistados sentem a necessidade de resgate da sua história.
Devemos dizer que a imersão nesse espaço trouxe pessoalmente
muitos aprendizados que superam os da pesquisa, e outras preocupações,
sobretudo, quanto as questões educacionais e de saúde dessas comunidades.
O que sugere outras pesquisas para dá visibilidade as reais necessidades, bem
como para abrir espaço para seu discurso, seu clamor.
9. Referências bibliográfica
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