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Introdução a AntropologiaTexto 1

Técnica do Fichamento

Criado no século XVII, pelo francês Rozier, o fichamento é uma parte importante na organização do resultado da pesquisa. Os registros e a organização dos fichamentos dependerão da capacidade de organização de cada um. Os registros anteriormente eram feitos nas tradicionais folhas pequenas de cartolina pautada. Hoje são feitos na sua maioria em computador. O importante é que estejam bem organizadas para que os dados não se percam. Existem vários tipos de fichamentos, trabalharemos com a demonstração de três destes tipos: o fichamento bibliográfico, o fichamento de citações e o fichamento misto.

1) Fichamento Bibliográfico: é a descrição, com comentários, dos tópicos abordados em uma obra inteira ou parte dela. É importante colocar o campo de estudo no qual se insere o trabalho*, o método e as técnicas de trabalho usado pelo autor**, o resumo com as questões significativas tratadas*** e a conclusão****.

Exemplo:

DIREITO AMBIENTAL (1) Direito Ambiental e Uso da Terra (2)

MILARÉ, Edis. Direito do Ambiente: a gestão ambiental em foco. 5ª edição. São Paulo: Revista dos Tribunais, 2007, 1280 p. (3)Insere-se no campo do Direito Ambiental.* O autor se utiliza de fontes secundárias, coletadas em livros e na legislação; e de fontes primárias, coletadas a partir das entrevistas com autoridades no assunto. A abordagem é descritiva, histórica e crítico-analítica**.

O livro está dividido em capítulos que abordam os aspectos históricos e a evolução do Direito Ambiental no Brasil a partir da década e 70 do século XX; as questões éticas, sociais, políticas e econômicas do Direito Ambiental; a gestão ambiental; o patrimônio ambiental natural, cultural e artificial do país; a Política Nacional do Meio Ambiente (PNMA); os recursos hídricos; a educação ambiental; o Estatuto das Cidades; a biodiversidade brasileira, com seus biomas e, por fim um glossário ambiental que encerra a obra. ***

Em cada capítulo o autor aponta momentos históricos e situações atuais pertinentes ao assunto tratado. Fica evidente que muitos dos problemas ambientais começaram a aparecer no cenário mundial há décadas, além de ter sido motivo para vários encontros, debates, acordos e decisões consensuais entre praticamente todos os países, tornando-se fator primordial para o desenvolvimento dos séculos XX e XXI. A degradação ambiental e suas conseqüências, em nível planetário, originaram estudos e reações no sentido de se conseguir fórmulas e métodos de diminuição dos danos ao ambiente.

Aqui se insere o Direito Ambiental, como uma ciência capaz de interpretar e dirimir direitos do Estado e da pessoa no que diz respeito ao meio ambiente. ****

Observação: neste e nos outros exemplos de fichamento os números entre parênteses representam o que está descrito abaixo:

(1) – Tema ou assunto do trabalho (os fichamentos podem ser organizados por assunto, por autor ou por matéria) (2) – Subdivisão do tema ou assunto (podem existir mais subdivisões, a critério do aluno)(3) – Referência bibliográfica

2) Fichamento de Citações: consiste na reprodução fiel de frases ou sentenças consideradas relevantes. Toda citação deve vir entre aspas, em itálico, após a citação deve constar o número da página de onde foi extraída. A transcrição deve ser textual (incluindo erros de grafia, para os quais deve ser colocado o termo sic, que indica que a referência está feita como no original, ainda que errônea ou singular).

Exemplo:

EDUCAÇÂO (1) Educação Feminina (2)

TELES, Maria Amélia de Almeida. Breve história do feminismo no Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1993. 181 p. Tudo é História, 145

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"Uma das primeiras feministas do Brasil, Nísia Floresta Brasileira Augusta, defendeu a abolição da escravatura, ao lado de propostas como a educação e a emancipação da mulher e a instauração da República." (p. 30)

“Sou neta, sobrinha e irmã de general (...) Aqui nesta casa foi fundada a Camde. Meu irmão, Antônio Mendonça Molina, vinha trabalhando há muito tempo no Serviço Secreto do Exército contra os comunistas. Nesse dia, 12 de junho de 1962, eu tinha reunido aqui alguns vizinhos, 22 famílias ao todo. Era parte de um trabalho meu para a paróquia Nossa Senhora da Paz. Nesse dia o vigário disse assim: ‘Mas a coisa está preta. Isso tudo não adianta nada porque a coisa está muito ruim e eu acho que se as mulheres não se meterem, nós estaremos perdidos. A mulher deve ser obediente. Ela é intuitiva, enquanto o homem é objetivo’.” (p. 45)

"Na Justiça brasileira, é comum os assassinos de mulheres serem absolvidos sob a alegação de defesa de honra." (p. 132)

3) Fichamento Misto: ainda é possível um terceiro tipo no qual se mescla o resumo da obra com suas própria palavras, ilustradas com citações do autor

Exemplo:

EDUCAÇAO (1) Educação Feminina (2)

TELES, Maria Amélia de Almeida. Breve história do feminismo no Brasil. São Paulo: Brasiliense, 1993. 181 p. Tudo é História, 145

Insere-se no campo do estudo da Educação e da Antropologia Social. A autora se utiliza de fontes secundárias, coletadas em livros, revistas e depoimentos. A abordagem é descritiva e analítica. Aborda os aspectos históricos da condição feminina no Brasil a partir do ano 1500 de nossa era e elenca os momentos mais importantes da educação feminina em cada século, como demonstrado a seguir:

"Uma das primeiras feministas do Brasil a lutar pela educação foi Nísia Floresta Brasileira Augusta, que defendeu a abolição da escravatura, ao lado de propostas como a educação e a emancipação da mulher e a instauração da República." (p. 30)

Paralelo a discussão sobre educação a autora também faz uma análise da justiça brasileira em relação aos crimes passionais contra a mulher:

"Na Justiça brasileira, é comum os assassinos de mulheres serem absolvidos sob a alegação de defesa de honra." (p. 132)

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Introdução a AntropologiaTexto 2

Técnica de Estudo

In: PEDRON, Ademar João. Metodologia Científica. Auxiliar do Estudo, da Leitura e da Pesquisa. 28 edição. Brasília: Edição do autor, 1998 (com adaptações)

1. 0 ESTUDO

Nós estudamos para aprender, isto é, para conhecer a realidade que foi pesquisada e que já tem uma explicação plausível (razoável, aceitável, admissível) e, quem sabe, pesquisar para poder descobrir novos horizontes, novas perspectivas no campo de determinada ciência.

Então, “aprender é analisar, assimilar, reter e ser capaz de reproduzir com inteligência.” (Ruiz, 20) ou, como diz Mira y Lopes, (Como estudar e como aprender, p. 30) “Aprender é aumentar o cabedal (a quantidade) de recursos de que dispomos para enfrentar os problemas que nos apresenta a vida cultural”. Eu acrescentaria: aumentar os nossos recursos, que se somarão às nossas experiências, para nos ajudar a enfrentar qualquer problema de nossa vida. Aprender acrescenta ao nosso ser uma qualidade. Essa qualidade pode se tornar cada dia mais perfeita, conforme nosso esforço e nossa boa vontade e o aperfeiçoamento do nosso ser. Estuda-se também para se especializar em uma profissão.

1.1. COMO PLANEJAR O TEMPO DE ESTUDOS?

Todos nós estamos e vivemos ocupados demais para atender tanta coisa importante para o nosso uso. Ora, ao se começar a freqüentar uma Universidade, tem-se a obrigação de achar tempo para estudar. Como a vida de cada um depende de uma série de fatores diferentes para cada pessoa, haverá a necessidade de se achar tempo para poder se dedicar aos estudos. Mesmo que sejam poucos minutos... ou mais tempo.

Lembre-se da responsabilidade social de cada um: de cada mil crianças que fizeram junto conosco a matrícula no primeiro ano do primeiro grau, apenas 3% a 4% (média nacional) chegaram à Universidade. Desses, apenas um ou dois a terminarão. Então cada um de nós está “representando” mais de novecentos colegas que não chegaram aqui, à Universidade. Nossa responsabilidade aumenta muito quando passamos a pensar também nos nossos estudos, nas nossas profissões, nas nossas carreiras, numa perspectiva social. Temos, portanto, que achar tempo para estudar e estudar muito. Para isso precisa-se de uma receita que ajude qualquer pessoa a se programar, e achar o tempo necessário para estudar.

1.2. RECEITA PARA PROGRAMAR O TEMPO DE ESTUDOS:

Toma-se uma folha de papel... na horizontal, escrevem-se todos os dias da semana (inclusive sábados e domingos) Na vertical, escrevem-se todas as horas do dia e coloca-se cada ocupação e o tempo gasto em cada uma delas. Feito isso, procura-se achar tempo para poder se dedicar ao estudo. Ex.: Acordo mais cedo... gasto menos tempo para o desjejum.... diminuo o tempo depois do almoço... antes de me deitar... Então eu deixo esses espaços para poder me dedicar ao estudo. Meus alunos de

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informática preferem chamar essa atitude de planejar o tempo de estudos de AGENDAR = fazer uma agenda do seu tempo para achar momentos para o estudo.

Não se desesperar quando se perder o sono à noite: mentalizar para ir imediatamente estudar e logo o sono vem. Quando se for ao dentista ou ao médico e se tiver que esperar, não se deve pestanejar: leva-se um livro e ponha-se a estudar.

É claro que as horas em que se estiver na Universidade e, pelo menos, as meia hora antes e meia hora depois já devem ser marcadas, em todos os dias de aula. Essa receita vale para todos, sem exceção. Mas para cada um é diferente a sua aplicação. Por isso, é muito importante que cada um faça esse planejamento individual com muita dedicação e resolução de levá-lo realmente para a prática.

1.3. COMO APROVEITAR BEM O TEMPO PLANEJADO?

Não basta descobrir tempo para estudar. O importante é estudar realmente e usar de método adequado para fazer render o tempo planejado. Deve-se usar esse tempo para formar um hábito, um ritmo de estudo. “Aproveitar intensamente o tempo é uma condição para se dar sentido às horas de lazer e desfrutá-las. É preciso que se determine o que estudar em cada horário, de maneira programada, embora se alterem planos em determinadas circunstâncias ou se façam remanejamentos periódicos. Ou ainda, se deixem alguns horários opcionais. Com a programação do que fazer em cada horário, evitam-se vacilações, indecisões, adiamentos; evita-se exatamente a perda de tempo reservado ao estudo, ou sua má utilização. A perseverança no cumprimento do programa é o maior problema.” (Ruiz, 24).

1.3.1. HÁ PORTANTO, QUATRO ATIVIDADES INDISPENSÁVEIS PARA QUEM DE FATO QUER ESTUDAR (O QUE FAZER?)

1.LEITURA PRÉVIA2.REVISÃO IMEDIATA (REVISÃO)

3.REVISÃO GLOBALIZADORA (REVISÃO)4.LEITURA PARALELA

Vejamos cada uma delas e como fazer delas um hábito:

1.3.1.1. CONCEITO DE LEITURA PRÉVIA: faz-se antes de uma aula, de um seminário, de um evento cujo conteúdo discutido mereça ser conhecido antes.

1.3.1.1.1. Toda vez que se vai para uma aula, ou para uma palestra ou para um seminário, é importante que se saiba exatamente o programa a ser tratado.

1.3.1.1.2. Procurar, então, sempre fazer leitura previa desse assunto. Essa leitura será feita em poucos minutos. É apenas uma leitura dinâmica, rápida, para se dar conta do assunto. Isso aumentará o rendimento das horas de aula que o professor utilizará ou se aproveitará melhor da palestra ou do seminário. Aumentará a capacidade de compreensão do assunto.

1.3.1.1.3. Ao fazer essa leitura, anotar rapidamente à margem do texto, os assuntos que exigirão maior compreensão durante a sua exposição, ou de que se tenham dúvidas. Isso regulará a

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atenção porque durante uma aula, dá-se uma atenção normal aos assuntos tratados, e, quando for tratada a parte de que se tinha dúvida, aumenta-se a atenção e aí sim poder-se-á entender aquilo que ficou confuso na leitura prévia. E, se assim mesmo não se conseguir entender, é a hora de se fazer uma pergunta adequada, dentro do assunto de que se está tratando. Nada mais desagradável para o professor que se esforça para atrair a atenção dos alunos, quando alguém faz uma pergunta sobre nota ou anotação de presença ou falta, no meio da explicação de um conteúdo que exige atenção para poder ser entendido...

1.3.1.1.4. Existe também uma vantagem muito grande para quem se habitua a fazer leitura prévia: é que os seus apontamentos são sóbrios, claros e enfocam o essencial.

“Resumindo poderíamos dizer: essa leitura será feita em poucos minutos; determinará melhor rendimento durante as aulas; inteligente distribuição da atenção, ordem, clareza e perfeição nos apontamentos e grande economia de tempo e trabalho nas revisões. Entender isso parece muito fácil: não é tão fácil agir dessa forma sempre. Daí a necessidade de se formar hábito.” (RUIZ, IDEM, 25).

Já tive essa experiência com meus alunos: parece que todos se convencem da necessidade de se fazer leitura prévia. Mas, encontrando-me com eles alguns semestres mais tarde, em outras disciplinas, percebi que a maioria não leva à frente esse costume. É que não formaram hábito de estudo.

1.3.1.2. CONCEITO DE REVISÃO: revisar é recordar, ler de novo, repassar a matéria dada em aula, questionar o assunto estudado em aula e responder claramente às questões apresentadas, ao menos mentalmente.

A revisão se divide em duas modalidades:

1.3.1.2.1. REVISÃO IMEDIATA: é aquela que fazemos da aula anterior, antes da aula subseqüente. É uma revisão que se faz em poucos minutos, porque se acabou de ter o assunto em aula e o esquecimento do que foi dado ainda não se concretizou.

1.3.1.2.2. REVISÃO GLOBALIZADORA: é aquela que se faz após se ter estudado em aula uma ou mais unidades de estudo. Acontece que as aulas segmentam, separam, dividem o assunto em itens e subitens. A revisão globalizadora, também chamada de integradora, vai unificar as partes em um todo, dando uma visão geral do assunto. Só se conhece bem um assunto quando se sabe ter essa visão geral dele. E por isso também que se fazem provas e exames: é um modo pedagógico de exigir que o aluno faça revisões globalizadoras.

1.3.1.3. LEITURA PARALELA: aqui está entendida de dois modos: quando se estuda um assunto, normalmente se têm manual, apostila ou bibliografia indicados pelo professor. Ou se tem outro texto ou outro manual, ao lado, paralelamente aos que se estão sendo usadas. Com isso está se fazendo uma leitura paralela, ou leitura de apoio. Todavia, entenda-se aqui também num outro sentido : é que quando se tem o hábito de fazer diariamente a leitura prévia, a revisão imediata e a revisão globalizadora, normalmente sobrará tempo. Então, pega-se um livro sobre um assunto de interesse, ou seja, algum tema ou alguma ciência em que se quer especializar e vai-se lendo toda vez que sobrar esse tempo. Aprofundando e especializando em alguma coisa de que se gosta ou com que se tenha identificação.

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Poderíamos dar como exemplo o que a televisão nos mostrou em abril de 1993: um aluno da USP, ainda cursando o quarto ou quinto semestre de Biologia, já era o maior colecionador e especialista do mundo em plantas carnívoras. Ao lado dos seus estudos diários, ele tirava tempo para colecionar e pesquisar sobre plantas carnívoras. Pessoalmente, li dezenas e dezenas de livros de Psicologia, e Parapsicologia ao lado dos meus estudos de Filosofia e Teologia. Isso muito me ajudou na vida particular. E um modo de cada um se aprofundar e se especializar num determinado ramo do saber.

1.4. AS AULAS: O MAIOR E O MELHOR TEMPO DE ESTUDO

Para a maioria dos estudantes, as aulas são o maior tempo de estudo de que podem dispor. É que muitos estudantes têm que trabalhar para sobreviver e não lhes sobra muito tempo para o estudo individual. Há então, necessidade de planejar-se bem o tempo para se estudar. O aluno possui quase que diariamente, o tempo das aulas como o seu melhor tempo. Por quê? Por vários motivos:

1. Tem a presença do professor que pode ajudá-lo, tirando-lhe as dúvidas e explicitando o conteúdo de modo sistemático.

2. A presença dos colegas, que têm uma experiência de vida inigualável: cada um é único. Essas experiências são mostradas através das respostas, das opiniões manifestadas, dos pontos de vista discordantes de outros colegas, o que obriga a todos a repensar os assuntos.

3. O conteúdo é dado de modo sistemático e uma coisa vai servindo de embasamento para a outra, conforme as normas da didática.

4. 0 tempo é contínuo para se estudar e não se tem a obrigação de se atender ao telefone, assistir a programas de TV, ouvir gritos de crianças e outras coisas que poderiam atrapalhar a concentração e a compreensão dos assuntos.

Aqui é a hora de se falar um pouco do aluno como causa principal do seu próprio aprendizado. Considero genial a passagem em que João Alvaro Ruiz faz a comparação entre a planta, o enfermo e o aluno. Ele diz: “Quem dá frutos é a árvore sob a ação do agricultor. Quem sara é o doente, sob a ação do médico, (e ate diria: contra o médico, muitas vezes). Quem aprende é o aluno, sob a ação do professor. É que a planta, o enfermo e o aluno têm um princípio intrínseco, ativo, operante capaz de produzir os efeitos da frutificação, da cura e da aprendizagem. A ação do agricultor, do médico e do professor tem caráter de causa eficiente auxiliar, coadjuvante. Mas quem dá frutos, ou não, é a árvore. Quem sara, ou não, é o próprio organismo. Quem aprende, ou não, é o aluno” (Ruiz, idem, p. 28).

E por isso que o aluno não deve transferir aos outros, ou às circunstâncias externas a responsabilidade sobre seus êxitos ou fracassos nos estudos. Sabe-se que o aluno já é propriamente um autodidata, isto é, é ele quem estuda e aprende sozinho na Universidade (auxiliado pelo professor e colegas). Por isso, ele deve assumir a responsabilidade de seu curso e de sua carreira na vida. Deve adotar uma forma correta de conduta em seus estudos, isto é, aprender o método científico para estudar, ler e pesquisar e usá-lo em todos os momentos: fazer dele um hábito. Deve disciplinar sua mente à luz de diretrizes já fartamente confirmadas pela experiência. Deve firmar hábitos adequados ao seu propósito de crescimento cultural. Deve desenvolver espírito crítico e de discernimento, saber distinguir as coisas com clareza cada vez maior. E, principalmente, deve aprender a raciocinar segundo os padrões de correção lógica.

SÁBIA É A AFIRMATIVA: “um aluno, menos dotado, quando ajudado por um bom método, pode apresentar em seus estudos, resultados melhores do que os alcançados por outros colegas mais

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dotados, que conduzam sem método seus estudos.” (LAHR, C. Manual de Filosofia. 6.ed. Porto: Apostolado da Imprensa, 1952. p. 352).

O aluno, que chega à Universidade, perceberá uma diferença muito grande com o que ele estava acostumado no segundo grau: é que agora ele é ou deve ser tratado como adulto, daí a necessidade de ser ou de se tomar adulto mesmo. Ele perceberá que houve muitas circunstâncias modificadas: maior liberdade, não se proíbe fumar... Não precisa, geralmente, usar uniforme... Ele pode chegar atrasado ou se ausentar da aula, responsabilizando-se por assumir as consequências disso. Mas, a maior mudança que ele vai ver é o espírito científico, a necessidade de se provar tudo o que é falado e o espírito crítico de que deve estar possuído o universitário. Talvez, mais de oitenta por cento dos nossos conhecimentos sejam vulgares, comuns, aprendidos na experiência do dia-a-dia. Aqui, na Universidade, exige-se que todos esses conhecimentos sejam testados e comprovados para assumirem uma atitude ou uma comprovação científica. Deve-se saber, também, que na Universidade o professor é um orientador; que não dará o assunto mastigado, como se dá papinha na boca da criança, mas indicará onde estão os ingredientes e indicando o roteiro, a receita, para que o próprio aluno faça sua alimentação intelectual. Aqui, na Universidade, não vale o que dizem alunos do ensino médio (já ouvi centena de vezes): “Eu não estudo. Presto atenção na aula e sempre me dou bem nos estudos (nas provas)”. É que aqui o aluno já é um autodidata: isto é, estuda e pesquisa sozinho, auxiliado pelo professor e pelos colegas.

Na hora de trabalhar, estar concentrado no trabalho. Na hora de se divertir, estar concentrado na diversão. Se, no momento da diversão, houver preocupação com o trabalho ou com o estudo, nem se trabalha, nem se estuda e nem se diverte. Na Universidade, portanto, é preciso uma atitude de concentração, de muita dedicação e de interesse pelo que se está fazendo. Na Universidade, procurar participar do diretório acadêmico, do grupo de teatro, coral, conjunto musical, grupo artístico, grupo de retórica ou qualquer coisa que venha a complementar a formação acadêmica.

1.5. A IMPORTÂNCIA DO PROFESSOR

• o mestre é necessário para ensinar como aprender = método• o mestre é necessário para justificar por que aprender e por que estudar isso antes daquilo =didática• o mestre é necessário para organizar e ordenar o que aprender = planejamento de ensino• o mestre é necessário para a seleção de recursos, de instrumentos adequados ao trabalho do estudante, bem como para iluminar com sua ciência objetos que a mente do aluno não veria fora desta luz = metodologia• o mestre é necessário como mediador entre o programa e o aluno = explicitador• a vantagem do mestre é que ele já conhece o caminho certo e os desvios perigosos nos conteúdos da ciência = orientador

1.6. COMO APROVEITAR BEM O TEMPO DAS AULAS

Já se viu que, para a maioria dos estudantes, o maior tempo de estudo de que dispõe, é o tempo das aulas. Então, como aproveitá-lo e o que fazer antes, durante e depois das aulas?

1.6.1. O QUE FAZER ANTES DAS AULAS:

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1. fazer leitura prévia do assunto que será tratado em aula;2. ter o programa da disciplina que se vai cursar ou se está cursando;3. ter à mão um bom dicionário;4. ter um caderno de anotações, e

5. possuir todo material adequado para o estudo das disciplinas escolhidas no semestre. Como é difícil exigir do aluno que compre os livros ou apostilas que serão utilizados em aula! Ha sempre desculpas, que para o aluno são absolutamente verdadeiras e nem se discutem, mas é imprescindível ter as ferramentas adequadas para o estudo.

1.6.2. O QUE FAZER DURANTE AS AULAS:

1. PARA PODER APROVEITAR BEM AS AULAS É NECESSÁRIO FREQUENTA-LAS: parece que o Brasil é o único país do mundo que admite, em lei, o abono de 25% de falta às aulas, para que uma disciplina possa ter valor de aprovação diante do Conselho Nacional de Educação. Todos acreditam que um aluno de Universidade só falte às aulas por motivo justo. Mesmo que isso possa acontecer, há necessidade de certas cautelas: o mais rápido possível, informar-se com os cole-gas sobre o conteúdo dado, trabalhos marcados, provas marcadas ou qualquer outra informação que possa ajudar o bom desempenho do aluno. Nada mais desagradável do que o aluno que chega no dia da prova e diz ao professor: Nossa, professor, e prova hoje?! E sinal de pouco interesse nas aulas...

2. PONTUALIDADE ÀS AULAS: o aluno que chega atrasado às aulas, mesmo por motivos justos, atrapalha muito o bom andamento das mesmas. Se for necessário chegar atrasado, que se entre silenciosamente, e, sem chamar a atenção de ninguém, ir imediatamente para o seu lugar. Normalmente, o professor da alguns minutos de tolerância e depois começa o trabalho do dia, dando orientações sobre o bom andamento das tarefas. Ora, o aluno que chega depois das orientações não saberá como trabalhar. Isso o prejudica muito.

3. LEVAR O MATERIAL ADEQUADO À AULA: o aluno que, depois de trabalhar pela manhã, ou até o dia todo, vem para a Universidade, já chega com dificuldade de se concentrar nas explicações e nos trabalhos de aula. Se ele ainda não traz o material adequado: livro, apostila, caderno, achará muita dificuldade no trabalho acadêmico e não conseguirá se concentrar adequadamente. Para o professor é intolerável estar explicitando um conteúdo e o aluno estar conversando com os colegas ao lado e não ter sequer o texto para acompanhar a explicação. Ou, pior ainda, quem sabe, estar folheando revistas ou jornais...

4. GUARDAR SILÊNCIO INTERIOR PARA NÃO ATRAPALHAR A SI MESMO, E SILÊNCIO EXTERIOR PARA NAO ATRAPALHAR AOS OUTROS: o problema da concentração no que se está fazendo. O silêncio exterior cria o clima adequado para o bom desempenho das aulas. E o silêncio interior cria o clima de concentração para que o aluno possa tirar proveito das explicitações e entender o que está lendo. Para determinadas disciplinas, o silêncio é uma condição “sine qua non”, quer dizer, uma condição indispensável, sem a qual não é possível realizar a ação da aprendizagem.

Por exemplo: O método do estudo da Filosofia é a reflexão. Ora, é impossível fazer uma reflexão conversando... cochichando... contando piadas... no meio de um trabalho de Filosofia. Daí a necessidade do silêncio exterior e interior. “Não é fácil manter-se em ritmo de trabalho, de dedicação e concentração diante de uma classe barulhenta e de alunos conversadores. Querem que uma aula seja boa? Comecem por oferecer ao professor condições materiais de trabalho. Quando reina silêncio

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exterior e interior, quando a fantasia repousa e a boca se fecha, o espírito se abre e a inteligência atua em melhores condições.” (Ruiz, idem, 30). Siga, nesse ponto, as palavras de Confúcio: Ouvir, assimilar e praticar. Eu acrescentaria: Ouvir, fazer um julgamento adequado, assimilar e praticar.

5. PARTICIPAÇÃO ATIVA ÀS AULAS: quando existe o clima indicado e atitude favorável ao trabalho, o aluno acompanha a exposição do professor, participa ativamente dos debates, toma apontamentos e, principalmente, não deixa sem esclarecimento nenhum ponto obscuro ou duvidoso. Um dos objetivos mais importantes da Universidade e das aulas é tirar as dúvidas que o aluno tenha dos conteúdos das diversas disciplinas que esteja cursando. Mas, se esta dúvida for de apenas um aluno, é melhor que se pergunte ao professor em particular. E até muito bom que existam alunos que fazem as tais perguntas “ingênuas”, “perguntas infantis”, porque normalmente são as perguntas que a grande maioria gostaria de fazer e não tem coragem. Pergunta libertadora! Aí se dá oportunidade ao professor de explicar os conteúdos em cima das dúvidas dos alunos. Isso ajuda muito a exposição didática do professor. Há que se ter cuidado, porque existem professores que não gostam muito de ficar respondendo a perguntas. É que eles ficam com medo de não saber a resposta na hora e passar vergonha, por isso, às vezes, tomam-se agressivos com os alunos. Conheci um professor que dizia: não respondo a perguntas em que se usam gírias... ou erros de português! Aí os alunos ficavam com medo... e não perguntavam. E a insegurança do professor?. Acredito que devam ser colocados para lecionar no primeiro semestre da Universidade, professores que tenham essa habi lidade de permitir e até incentivar o aluno iniciante, a fazer todo tipo de perguntas necessárias para uma boa introdução aos estudos académicos.

6. CLIMA CORDIAL ENTRE PROFESSOR E ALUNOS. ENTRE ALUNOS E ALUNOS: “Professor e alunos devem empenhar-se no sentido de manter um clima cordial de relacionamento. O trabalho em sala de aula é cansativo, tanto para os alunos como para os professores. Além disso, o peso normal do trabalho ficará agravado, e chegará, por vezes, a se tomar insuportável se não houver cordialidade. Quando se instalam e se avolumam certas barreiras de desafeto mútuo, a aula toma-se desgastante ao extremo. Trabalhar com aluno atento, empenhado, participante e cordial causa uma satisfação íntima, que, de certa forma, diminui ou compensa o peso do trabalho Os alunos beneficiar-se-ão, porque um professor animado com sua classe produz muito mais: esse aspecto concorre também para o crescimento da cordialidade. Neste sentido, podemos dizer que cada classe tem a aula que merece” (Ruiz, ‘dem, 31).

Mas, e se surgir algum problema entre alunos e professor? É claro que tudo isso deve ser tratado como pessoas adultas: com respeito, com elegância, com maturidade. Não se deve fugir desses problemas, mas também não fazer dele um “bicho de sete cabeças”:

1. O representante da turma poderá conversar com o professor e expor o problema que a turma, porventura, esteja vivendo.

2. A segunda instância poderá ser a exposição clara e objetiva do problema ao chefe do departamento a que a disciplina esteja ligada. O coordenador poderá falar com o professor e com a classe, se assim julgar conveniente.

3. O assunto poderá chegar ao diretor pedagógico, ao Reitor ou até ao Secretário de Educação ou ao Senhor Ministro da Educação, dependendo da gravidade. Porém, o mais importante é não ignorar as instâncias: levar o assunto direto ao Reitor da Universidade, por exemplo. Normalmente, o problema é resolvido dentro da própria classe, num diálogo franco e respeitoso. A experiência tem me mostrado que um diálogo franco, honesto e comedido entre professor e alunos ou seu representante não só resolve os problemas mas estreita os laços de respeito e de cordialidade entre eles.

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1.6.3. O QUE FAZER DEPOIS DA AULA?

Já se falou desse assunto: fazer revisão imediata... e quando for terminada qualquer unidade, fazer revisão globalizadora. Não se esquecer de fazer, também, leituras paralelas para se aperfeiçoar no assunto.

1.7. COMO APROVEITAR BEM O TEMPO EM REUNIÕES DE GRUPO:

1.7.1. CONCEITO DE TRABALHO DE GRUPO: trabalho de grupo e uma reunião de dois ou mais membros geralmente de seis a oito, que se reúnem para trocar experiências, estabelecendo uma empatia um com o outro, para procurar entender as opiniões dos colegas, no mesmo sentido em que foram colocadas.

1.8. MÉTODO DE ESTUDO INDIVIDUAL

Com vimos, é muito recomendável o estudo e a pesquisa em equipe. Acontece que se tem, também, a necessidade de saber estudar individualmente, porque somos nós que temos que aprender, nós é que prestaremos concurso, nós é que temos que sair à procura de emprego.

“A eficiência do método depende de quem o aplica, então não adianta esperar por um milagre: não há método de estudo capaz de servir a todas as pessoas com o mesmo grau de eficiência, nem método que evite todo esforço de quem estuda. Segundo os especialistas mais categorizados estudar é praticar uma ação. Ora, toda ação requer esforço por parte de quem a pratica. Portanto, até mesmo o método de estudo mais eficiente requer esforço e persistência na sua aplicação. E isso é especialmente verdade quando o interessado começa a aplicá-lo, ou seja, começa a aprender a aprender”. (GALLIANO, idem, p. 66).

Clifford Morgan e James Deese em seu livro: Como estudar apresentam um método muito interessante: eles dizem que a Universidade de OHIO propôs a seguinte fórmula, condensada aqui para resolver os problemas de estudos dos acadêmicos:

1- SURVEY 2- QUESTION 3- READ 4- RECITE 5- REVIEW

1. Survey = pesquisa: selecionar aquilo que se vai ler ou conhecer bem, o livro ou o texto que se usará para ter dele uma visão global.

2. Question = pergunta: antes de começar a leitura, fazer perguntas sobre o assunto que se vai estudar:

1. De que trata este livro?2. O que eu já sei sobre esse assunto?3. Que utilidade tem isso para mim?4. Como posso usá-lo nos meus estudos e na minha vida?

As perguntas nos ajudam a aprender, pois nos fazem pensar naquilo que queremos saber acerca do que estamos lendo ou estudando. A pessoa que pergunta é uma pessoa que tem objetivo: objetivo de vida e objetivo de propósitos (sabe o que quer). “É possível que não tenha respostas cabais sobre o assunto, mas o que importa aqui é a busca que você efetua na memória, o esforço que exerce para reviver noções ou conhecimentos já adquiridos sobre o assunto. Durante alguns minutos

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de reflexão, procurando achar as devidas respostas, você já está estudando, embora ainda não perceba”. (GALLIANO, idem, 66).

3. Read = leia: é o momento de se fazer uma leitura rápida de todo o texto, ou de todo o livro; não é necessário, neste primeiro momento, entrar em detalhes. Procurar captar a idéia geral, ou o plano da obra. Fazer uma relação entre o que se acabou de ler e o que se sabe sobre o assunto. Aqui é a hora de se conhecer melhor o autor e seu método. Terminada essa fase, passar para uma leitura refletida sobre o texto: já não se trata de fazer uma leitura passiva, mas de ler com objetivo de estabelecer um plano do que se está estudando. Para isso, assinalar os pontos mais importantes, as idéias-chave do texto. Ler de tal modo que se consiga fazer no final uma síntese de tudo o que se leu. Se o livro lhe parece de valor, não hesite em sistematizar o processo de trabalho e utilize fichas para arquivar o que leu (fichamentos). Nas fichas, faça breves transcrições dos pontos mais importantes (sem esquecer de anotar as páginas de onde foram tiradas), anote seus esquemas do que leu, e também suas próprias conclusões.

4. Recite = recite: o trabalho não deve acabar com a leitura do último capítulo. Depois de lido e anotado todo o texto se deve rever as fichas ou anotações. De preferência fazer isso em voz alta = recitar o que aprendeu na leitura.

5. Review = reveja: terminada a parte de recitar o texto em voz alta, rever rapidamente todo o contexto.

6. Comente e discuta o que leu com outras pessoas, de preferência com pessoas que tenham estudado o mesmo tema. Morgan e Deese nunca falam em decorar o texto, mas de assimilar e absorver o conteúdo do que se leu: compreender as idéias do autor, saber relacioná-las com outras idéias e chegar a uma conclusão pessoal, honesta e verdadeira, sobre o que se estudou. Usando esse método, o estudo se tornará mais eficiente e vai-se começara gostar de estudar. Estudar não é um sofrimento, urna dificuldade! Estudar é alegria! E ser criativo! É estar por dentro das coisas! É ser consciente no pensar e no agir.

Boas leituras!!!!

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INTRODUÇÃO À ANTROPOLOGIA

TEXTO 3

RITOS CORPORAIS ENTRE OS NACIREMA

Horace Miner1

O antropólogo está tão familiarizado com a diversidade das formas de comportamento que os povos apresentam em situações semelhantes, que é incapaz de surpreender-se mesmo em face dos costumes mais exóticos. De fato, se nem todas as combinações logicamente possíveis de comportamento foram ainda descobertas, o antropólogo bem pode conjeturar que elas devam existir em algum grupo ainda não descrito.

Deste ponto de vista, as crenças e práticas mágicas dos Nacirema apresentam aspectos tão inusitados que parece apropriado descrevê-los como exemplo dos extremos a que pode chegar o comportamento humano. Foi o Professor Linton, em 1936, o primeiro a chamar a atenção dos antropólogos para os rituais dos Nacirema, mas a cultura desse povo permanece insuficientemente compreendida até hoje.

Trata-se de um grupo norte-americano que vive no território entre os Cree do Canadá, os Yaqui e os Tarahumare do México, e os Carib e Arawak das Antilhas. Pouco se sabe sobre sua origem, embora a tradição relate que vieram do leste. Conforme a mitologia dos Nacirema, um herói cultural, Notgnihsaw, deu origem  à sua nação; ele é, por outro lado, conhecido por duas façanhas de força: ter atirado um colar de conchas, usado pelos Nacirema como dinheiro através do rio Po-To-Mac e ter derrubado uma cerejeira na qual residiria o Espírito da Verdade.

A cultura Nacirema caracteriza-se por uma economia de mercado altamente desenvolvida, que evolui em um rico habitat. Apesar do povo dedicar muito do seu tempo às atividades econômicas, uma grande parte dos frutos deste trabalho e uma considerável porção do dia são dispensados  em atividades rituais. O foco destas atividades é o corpo humano, cuja aparência e saúde surgem como o interesse dominante no ethos deste povo. Embora tal tipo de interesse não seja, por certo, raro, seus aspectos cerimoniais e a filosofia a eles associadas são singulares.

A crença fundamental subjacente a todo o sistema parece ser a de que o corpo humano é repugnante e que sua tendência natural  é para a debilidade e a doença. Encarcerado em tal corpo, a única esperança do homem é desviar estas características através do uso das poderosas influências do ritual e do cerimonial. Cada moradia tem um ou mais santuários devotados a este propósito. Os indivíduos mais poderosos desta sociedade têm muitos santuários em suas casas e, de fato, a alusão  à opulência de uma casa, muito freqüentemente, é feita em termos do número de tais centros rituais que possua. Muitas casas são construções de madeira, toscamente pintadas, mas as câmeras de culto das mais ricas têm paredes de pedra. As famílias mais pobres imitam as ricas, aplicando placas de cerâmica  às paredes de seu santuário.

Embora cada família tenha pelo menos um de tais santuários, os rituais a eles associados não são cerimônias familiares, mas sim cerimônias privadas e secretas. Os ritos, normalmente, são discutidos apenas com as crianças e, neste caso, somente durante o período em que estão sendo iniciadas em seus mistérios. Eu pude, contudo, estabelecer contato suficiente com os nativos para examinar estes santuários e obter descrições dos rituais.

O ponto focal do santuário é uma caixa ou cofre embutido na parede. Neste cofre são guardados os inúmeros encantamentos e poções mágicas sem os quais nenhum nativo acredita que poderia viver. Tais preparados são conseguidos através de uma serie de profissionais especializados, os mais poderosos dos quais são os médicos-feiticeiros, cujo auxilio deve ser recompensado com dádivas substanciais. Contudo, os médicos-feiticeiros não fornecem a seus clientes as poções de cura; somente decidem quais devem ser seus ingredientes e então os escrevem em sua linguagem antiga e secreta. Esta escrita é entendida apenas pelos médicos-feiticeiros e pelos ervatários, os quais, em troca de outra dadiva, providenciam o encantamento necessário. Os Nacirema não se desfazem do encantamento após seu uso, mas os colocam na caixa-de-encantamento do santuário

1 In: A.K. Rooney e P.L. de Vore (orgs) YOU AND THE OTHERS - Readings in Introductory Anthropology. Cambridge, Erlich, 1976

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doméstico. Como tais substâncias mágicas são especificas para certas doenças e as doenças do povo, reais ou imaginárias, são muitas, a caixa-de-encantamentos está geralmente a ponto de transbordar. Os pacotes mágicos são tão numerosos que as pessoas esquecem quais são suas finalidades e temem usá-los de novo. Embora os nativos sejam muito vagos quanto a este aspecto, só podemos concluir que aquilo que os leva a conservar todas as velhas substâncias é a idéia de que sua presença na caixa-de-encantamentos, em frente à qual são efetuados os ritos corporais, irá, de alguma forma, proteger o adorador.

Abaixo da caixa-de-encantamentos existe uma pequena pia batismal. Todos os dias cada membro da família, um após o outro, entra no  santuário, inclina sua fronte ante a caixa-de-encantamentos, mistura diferentes tipos de águas sagradas na pia batismal e procede a um breve rito de ablução. As  águas sagradas vêm do Templo da Água da comunidade, onde os sacerdotes executam elaboradas cerimônias para tornar o líquido ritualmente puro.

Na hierarquia dos mágicos profissionais, logo abaixo dos médicos-feiticeiros no que diz respeito ao prestígio, estão os especialistas cuja designação pode ser traduzida por "sagrados-homens-da-boca". Os Nacirema têm um horror quase que patológico, e ao mesmo tempo fascinação, pela cavidade bucal, cujo estado acreditam ter uma influência sobre todas as relações sociais. Acreditam que, se  não fosse pelos rituais bucais seus dentes cairiam, seus amigos os abandonariam e seus namorados os rejeitariam. Acreditam também na  existência de uma forte relação entre as características orais e as morais: Existe, por exemplo, uma ablução ritual da boca para  as crianças que se supõe aprimorar sua fibra moral.

O ritual do corpo executado diariamente por cada Nacirema inclui  um rito bucal. Apesar de serem tão escrupulosos no cuidado bucal, este rito envolve uma prática que choca o estrangeiro não iniciado, que só pode considerá-lo revoltante. Foi-me relatado que o ritual consiste na inserção de um pequeno feixe de cerdas de porco na boca juntamente com certos pós mágicos, e em movimentá-lo então numa série de gestos altamente formalizados. Além do ritual bucal privado, as pessoas procuram o mencionado sacerdote-da-boca uma ou duas vezes ao ano. Estes profissionais  têm uma impressionante coleção de instrumentos, consistindo de brocas, furadores, sondas e aguilhões. O uso destes objetos no exorcismo dos demônios bucais envolve, para o cliente, uma tortura ritual quase inacreditável.  O sacerdote-da-boca abre a boca do cliente e, usando os instrumentos acima citados, alarga todas as cavidades que a degeneração possa ter produzido nos dentes. Nestas cavidades são colocadas substâncias mágicas. Caso não existam cavidades naturais nos dentes, grandes seções de um ou mais dentes são extirpadas  para que a substância natural possa ser aplicada. Do ponto de vista do cliente, o propósito destas aplicações é tolher a degeneração e  atrair amigos. O caráter extremamente sagrado e tradicional do rito evidencia-se pelo fato de os nativos voltarem ao sacerdote-da-boca ano após ano, não obstante o fato de seus dentes continuarem a degenerar.

Esperemos que quando for realizado um estudo completo dos Nacirema haja um inquérito cuidadoso sobre a estrutura da personalidade destas pessoas, Basta observar o fulgor nos olhos de um sacerdote-da- boca, quando ele enfia um furador num nervo exposto, para se suspeitar que este rito envolve certa dose de sadismo. Se isto puder ser provado, teremos um modelo muito interessante, pois a maioria da população demonstra tendências masoquistas bem definidas.

Foi a estas tendências que o Prof. Linton (1936) se referiu na discussão de uma parte específica dos ritos corporal que é desempenhada apenas por homens. Esta parte do rito envolve raspar e lacerar a superfície da face com um instrumento afiado. Ritos especificamente femininos  têm lugar apenas quatro vezes durante cada mês lunar, mas o que lhes falta em freqüência é compensado em barbaridade. Como parte desta cerimônia, as mulheres usam colocar suas cabeças em pequenos fornos por cerca de uma hora. O aspecto teoricamente interessante é que um povo que parece ser preponderantemente masoquista tenha desenvolvido especialistas sádicos.

Os médicos-feiticeiros têm um templo imponente, ou latipsoh, em cada comunidade de certo porte. As cerimônias mais elaboradas, necessárias para tratar de pacientes muito doentes, só podem ser executadas neste templo. Estas cerimônias envolvem não apenas o taumaturgo, mas um grupo permanente de vestais que, com roupas e toucados específicos, movimentam-se serenamente pelas câmaras do templo.

As cerimonias latipsoh são tão cruéis que é de surpreender que uma boa proporção de nativos realmente doentes que entram no templo se recuperem. Sabe-se que as crianças pequenas, cuja doutrinação ainda é incompleta, resistem  às tentativas de levá-las ao templo, porque "é lá que se vai para morrer". Apesar disto, adultos doentes não apenas querem mas anseiam por sofrer os prolongados rituais de purificação, quando possuem recursos para tanto. Não importa quão doente esteja o suplicante ou quão grave seja a emergência, os guardiões de  muitos templos não admitirão um cliente se ele não puder dar uma  dádiva valiosa para a administração. Mesmo depois de ter-se

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conseguido a admissão, e sobrevivido às cerimônias, os guardiães não permitirão ao neófito abandonar o local se ele não fizer outra doação.

O suplicante que entra no templo é primeiramente despido de todas as suas roupas. Na vida cotidiana o Nacirema evita a exposição de seu corpo e de suas funções naturais. As atividades excretoras e o banho, enquanto parte dos ritos corporais, são realizados apenas no segredo do santuário doméstico. Da perda súbita do segredo do corpo quando da entrada no latipsoh, podem resultar traumas psicológicos. Um homem, cuja própria esposa nunca o viu em um ato excretor, acha-se subitamente nu e auxiliado por uma vestal, enquanto executa suas funções naturais num recipiente sagrado. Este tipo de tratamento cerimonial é necessário porque os excreta são usados por um adivinho para averiguar o curso e a natureza da enfermidade do cliente. Clientes do sexo feminino, por sua vez, têm seus corpos nus submetidos ao escrutínio, manipulação e aguilhadas dos médicos-feiticeiros.

Poucos suplicantes no templo estão suficientemente bons para fazer qualquer coisa além de jazer em duros leitos. As cerimônias diárias, como os ritos do sacerdote-da-boca, envolvem desconforto e tortura. Com precisão ritual as vestais despertam seus miseráveis fardos a cada madrugada e os rolam em seus leitos de dor enquanto executam abluções, com os movimentos formais nos quais estas virgens são altamente treinadas. Em outras horas, elas inserem bastões mágicos na boca do suplicante ou o forçam a engolir substâncias que se supõe serem curativas. De tempos em tempos o médico-feiticeiro vem ver seus clientes e espeta agulhas magicamente tratadas em sua carne. O fato de que estas cerimônias do templo possam não curar, e possam mesmo matar o neófito, não diminui de modo algum a fé das pessoas no médico feiticeiro.

Resta ainda um outro tipo de profissional, conhecido como um "ouvinte". Este "doutor-bruxo" tem o poder de exorcizar os demônios que se alojam nas cabeças das pessoas enfeitiçadas. Os Nacirema acreditam que os pais enfeitiçam seus próprios filhos; particularmente, teme-se que as mães lancem uma maldição sobre as crianças enquanto lhes ensinam os ritos corporais secretos. A contra-magia do doutor bruxo é inusitada por sua carência de ritual. O paciente simplesmente conta ao "ouvinte" todos os seus problemas e temores, principalmente pelas dificuldades iniciais que consegue rememorar. A memória demonstrada pelos Nacirema  nestas sessões de exorcismo é verdadeiramente notável. Não é incomum  um paciente deplorar a rejeição que sentiu, quando bebê, ao ser desmamado, e uns poucos indivíduos reportam a origem de seus problemas aos feitos traumáticos de seu próprio nascimento.

Como conclusão, deve-se fazer referência a certas práticas que têm suas bases na estética nativa, mas que decorrem da aversão profunda ao corpo natural e suas funções. Existem jejuns rituais para tornar magras pessoas gordas, e banquetes cerimoniais para tornar gordas pessoas magras. Outros ritos são usados para tornar maiores os seios das mulheres que os têm pequenos e torná-los menores quando são grandes. A insatisfação geral com o tamanho do seio é simbolizada no fato de a forma ideal estar virtualmente além da escala de variação humana. Umas poucas mulheres, dotadas de um desenvolvimento hipermamário quase inumano, são tão idolatradas que podem levar uma boa vida simplesmente indo de cidade em cidade e permitindo aos embasbacados nativos, em troca de uma taxa, contemplarem-nos.

Já fizemos referência ao fato de que as funções excretoras são ritualizadas, rotinizadas e relegadas ao segredo. As funções naturais de reprodução são, da mesma forma, distorcidas. O intercurso sexual é tabu enquanto assunto, e  é programado enquanto ato. São feitos esforços para evitar a gravidez, pelo uso de substâncias mágicas ou pela limitação do intercurso sexual a certas fases da lua. A concepção é na realidade, pouco freqüente. Quando grávidas as mulheres vestem-se de modo a esconder o estado. O parto tem lugar em segredo, sem amigos ou parentes para ajudar, e a maioria das mulheres não amamenta seus rebentos.

Nossa análise da vida ritual dos Nacirema certamente demonstrou ser este povo dominado pela crença na magia. É difícil compreender como tal povo conseguiu sobreviver por tão longo tempo sob a carga que impôs sobre si mesmo. Mas até costumes tão exóticos quanto estes aqui descritos ganham seu real significado quando são encarados sob o ângulo relevado por Malinowski, quando escreveu:

"Olhando de longe e de cima de nossos altos postos de segurança na civilização desenvolvida, é fácil perceber toda a crueza e irrelevância da magia. Mas sem seu poder de orientação, o homem primitivo não poderia ter dominado, como o fêz, suas dificuldades práticas, nem poderia ter avançado aos estágios mais altos da civilização"

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INTRODUÇÃO À ANTROPOLOGIA

Texto 4

1 – Pré-história da Antropologia ( século XIV a XVII)

Heródoto: geógrafo e historiador grego. Nove livros ( História), contando a história das guerras que aconteceram entre o império Persa e as cidades-estado gregas. Estima-se que Heródoto tenha conhecido a Líbia, Assíria, Egito, Cítia ( sul da Rússia ), Lídia ( na Turquia ), Babilônia, Macedônia, Pérsia, Mesopotâmia e vários outros lugares da África e Europa. Em seus livros, para enriquecer a descrição do povo persa, incluiu contos de origem oriental, lendas e tradições folclóricas. Ao longo de suas viagens, Heródoto coletou informações sobre costumes, mitos e histórias dos diversos povos e culturas que conheceu. Considerado por muitos o primeiro relato antropológico.

Gênese da reflexão antropológica: descoberta do Novo Mundo. Seres humanos? Por que tão diferentes? Pelo critério religioso, não humanos.

Viajantes ( Jean de Leri com Viagem a Terra do Brasil, em 1558 ).

Renascimento: novo mundo, novos habitantes, necessidade européia de explicar, elaborar um discurso.

Mau selvagem e bom civilizado: religião, aparência física, hábitos - recusa do estranho e boa consciência de si mesmo e da sociedade.

Bom selvagem e mau civilizado: fascinação pelo estranho, má consciência de si e da sociedade Rousseau, romantismo, estado de natureza e ingenuidade, crítica à Europa medieval e cristã, racionalização, imaginário selvagem. No Brasil, José de Alencar (Iracema, a virgem dos lábios de mel).

2 – História da Antropologia

Século XVIII: racionalismo, modernidade, elaboração de uma ciência do homem, estabelecimento de escolas (positivismo/sociologia), elaboração de conceitos, inclusive o de homem, refexão.

Século XIX: Antropologia como discipllina autônoma, a ciência das sociedades primitivas, colônias na Austrália e Áfica, pesquisadores, desejo de criar uma etnografia ou um catálogo da humanidade, história da evolução cultural - Evolucionismo (primeira escola da Antropologia).

Lewis H. Morgan ( A Sociedade Antiga): documento de referência do Evolucionismo estabelecimento dos estágios de evolução pelos quais passou a humanidade (selvageria/barbárie/civilização), a partir do critério tecnológico. Derivação da Origem das Espécies (Darwin)

Evolucionismo: teoria atualmente desacreditada, forte conteúdo ideológico de justificativa colonizadora, antropologia de “gabinete”, etnocentrismo, desrespeito às diferenças, tentativa de comparar práticas sociais de sociedades diferentes, explicar a universalidade (homem) e a diversidade (sociedades).

Século XX: revolução na disciplina, trabalho de campo, antropólogo coleta seu próprio dado, viver entre o objeto (observação participante), aprender a língua do outro e o significado das ações do outro.

Bronislaw Malinowski: Os argonautas do pacífico ocidental cerca de 1 ano entre os habitantes das ilhas Trobriand (Nova Guiné). Sociedade estudada na totalidade (social, psicológica e biológica), como um organismo vivo (funcionalismo), entrevistas com homens, mulheres, adultos, idosos, estudo a-

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histórico, o Kula. Antropologia se torna a ciência da alteridade. Trabalho de campo + observação participante.

O Kula é um sistema intertribal de trocas existente ainda hoje, envolvendo transações locais em todo o arquipélogo. Colares e braceletes de conchas, oferecidos com um certo intervalo de tempo, percorrem depois um mesmo circuito fechado. Após certo período, os objetos recebidos são repostos em circulação; seu valor reside na continuidade da transmissão. A posse provisória fornece prestígio e ronome.

IINTRODUÇÃONTRODUÇÃO AA A ANTROPOLOGIANTROPOLOGIA

TTEXTOEXTO 5 5

A IMPORTANCIA DA ANTROPOLOGIA SOCIAL PARA COMPREENSÃO DAS DIFERENÇASA IMPORTANCIA DA ANTROPOLOGIA SOCIAL PARA COMPREENSÃO DAS DIFERENÇAS CULTURAIS:CONDIÇÃO DE RESPEITO HUMANOCULTURAIS:CONDIÇÃO DE RESPEITO HUMANO

Claudia Jeanne da Silva Barros

Na aula de Ciências Sociais uma aluna, após ter contato com os primeiros conceitos de Antropologia Social, perguntou-me: “por que a Antropologia não é mais divulgada e valorizada? Ela parece tão importante!”. A partir daí resolvi escrever este artigo divulgando alguns dos conceitos, técnicas, princípios e aplicações dessa ciência. A Antropologia Social é uma Ciência Social ainda pouco conhecida e geralmente associada à Arqueologia (Antropologia Física). Seus conceitos nos ajudam a pensar aquela que é a maior riqueza da condição humana: a capacidade de se diferenciar culturalmente.

Mas vale a pena antes de qualquer coisa perguntar: o que é cultura? Há várias maneiras de responder a esta questão, usaremos duas. Segundo Da Matta (1999), cultura para o senso comum é sinônimo de sofisticação, leituras realizadas, cursos concluídos, visitas a museus, viagens internacionais ou mesmo poliglotismo. Ou seja, equivale a conhecimento formal e erudição. Sem dúvida essa idéia povoa o imaginário coletivo brasileiro e quem nunca ouviu dizer (ou mesmo disse) que “fulano não tem cultura”?

Contudo, a outra maneira de responder a pergunta é conceituando cultura como sendo “toda forma de viver de um grupo social”, na qual se inclui o modo de pensar, morar, festejar, casar, nascer, morrer, produzir, aprender, enfim, inclui a totalidade da vida humana, com suas manifestações de valores e símbolos associados. Cultura é o modo de se expressar de um povo, nas mais variadas formas. Este é o conceito antropológico de cultura.

Esse último conceito fez da Antropologia a ciência que buscou o estranho, o pitoresco, o diferente, durante todo o século XIX e metade do século XX. Quase todos os primeiros antropólogos, durante vários anos estiverem envolvidos com pesquisas junto a sociedades “exóticas”, no caso do Brasil, pesquisas junto às sociedades indígenas. Nossos índios foram o seu primeiro objeto de estudo e hoje em dia há muitos antropólogos fazendo pesquisas etnográficas nestes grupos. Curiosamente, quando questionamos na sala de aula, aos nossos alunos, sobre que grupos sociais gostariam de fazer uma etnografia, cerca de 40% apontam grupos indígenas. Em segundo lugar aparecem as sociedades do Oriente Médio, com todas as curiosidades que o terrorismo internacional impõe. Parece mesmo que a Antropologia instiga a curiosidade pelo diferente!

Na atualidade as preocupações antropológicas estão voltadas também para uma infinidade de objetos, não exatamente pitorescos, mas relacionados diretamente com o cotidiano das sociedades ditas “complexas”. Entre os objetos estão: estudos sobre diferenças étnicas (racismo no Brasil e nos Estados Unidos, guerra entre palestinos e israelenses), questões ambientais, uso e ocupação de terras, papéis e perspectivas de gênero, ação afirmativa2, mídia, festas populares, saúde, memória e patrimônio histórico, economia, educação, política, cotidiano familiar, sistemas de parentesco, corpo, violência urbana, música, cinema, organizações empresariais, marketing, Estado e poder, dentre outros.

2 Trata-se de políticas compensatórias de discriminação, ou de ação afirmativa, que visam compensar membros de grupos sociais atingidos pelos mecanismos de exclusão social, capazes de lhes tirar a eqüidade no acesso às oportunidades.

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Várias também são as técnicas de pesquisa usadas pela Antropologia. Entre as mais conhecidas estão: pesquisa documental (coleta de dados restrita a documentos, escritos ou não. Exemplos destes são: diários, autobiografias, relatos de viagens e visitas, arquivos públicos e privados, censos, material cartográfico, fotografias, desenhos, vestuários, canções, entre outros); pesquisa de campo (consiste na observação dos fatos e fenômenos tal como ocorrem, in loco); observação participante (consiste em ouvir, ver, examinar fatos e fenômenos que se deseja estudar, numa situação onde o pesquisador observa os sujeitos dentro de seus próprios ambientes, muitas vezes interagindo com eles. Normalmente ao final de cada dia de trabalho o pesquisador realiza anotações em forma de diário); história de vida (técnica que procura levantar as opiniões dos entrevistados acerca da história da sua vida. O informante reconstrói sua vida até os dias presentes, buscando ressaltar os fatos que mais interessam para a pesquisa).

Além disso, mais dois conceitos importantes para esta ciência. O primeiro deles é o etnocentrismo, significando “uma visão do mundo onde o nosso próprio grupo é tomado como centro de tudo e todos os outros são pensados e sentidos através dos nossos valores, nossos modelos, nossas definições do que é a existência. No plano intelectual, pode ser visto como a dificuldade de pensarmos a diferença; no plano afetivo, como sentimentos de estranheza, medo e hostilidade.” (Rocha, 1984). Aqueles que são diferentes do nosso modo de vida acabam representados pela ótica etnocêntrica e segundo as lógicas de determinados valores hegemônicos e poderosos, na maioria das vezes. Na chamada "civilização ocidental" cujos valores estão intrinsecamente associados ao mundo industrial, capitalista e científico, existem diversos mecanismos de reforço para o seu estilo de vida, por meio de representações negativas do "outro", do diferente.

No convívio social das cidades brasileiras estes valores estão colocados e, a partir deles, classificamos a nós e aos outros, cotidianamente: assim são os estereótipos que fazemos sobre os “ricos” e “pobres”, “inteligentes” e “burros", "nordestinos", "emergentes", "punks", "surfistas", “novos” e "velhos", “gays”, “patricinhas” e “mauricinhos”. Além deste, todos os “... demais ‘outros’ com os quais temos familiaridade .... e um ‘saber’ baseado em formulações ideológicas, que no fundo transforma a diferença pura e simples num juízo de valor perigosamente etnocêntrico”, como afirma Rocha (idem).

O segundo conceito importante, contraponto ao etnocentrismo, é a relativização. Relativizar significa entender as culturas no local e com a lógica com que acontecem. Assim, “quando o significado de um ato é visto não na sua dimensão absoluta mas no contexto em que acontece ... quando compreendemos o ‘outro’ nos seus próprios valores e não nos nossos ... quando vemos que a verdade está mais no olhar que naquilo que é olhado ... quando não transformamos a diferença em hierarquia, em superiores e inferiores ou em bem e mal... estamos relativizando” (Rocha, idem).

Por princípio, a Antropologia tem o objetivo de estabelecer estratégias próprias de conduzir a investigação, enfatizar a busca de explicações e significados das ações humanas, por meio de análises holísticas e, principalmente, relativizar. Esta ciência opta pela “verdade” de que as culturas humanas se equivalem como valor e experiência, não se reduzindo umas às outras. Esta é antes de tudo uma questão política, uma atitude, condição de respeito humano que para alguns antropólogos chega a ser “profissão de fé”.

Este princípio da relativização serve, infinitamente, para pensarmos com mais respeito sobre nossos colegas de trabalho, familiares, negociadores3, executivos, informantes, religiosos e, por que não, nossos alunos. Serve também para que entendamos determinadas lógicas sociais “perversas” mesmo que seja a fim de orientar intervenções políticas (a exemplo da discriminação contra a mulher no regime Talibã, das atitudes terroristas que assustam o mundo no início do século XXI ou mesmo dos ‘pitboys'4).

3 A este respeito vale a seguinte estória: “um executivo da construção civil canadense estava feliz por estar em Paris com sua filha que estudava francês na Sorbonne. Mais feliz estava por ter acabado de negociar um contrato multimilionário com um potentado árabe. O jantar de comemoração estava em andamento. O canadense, como anfitrião, trouxe sua filha. O árabe entendeu tratar-se de um atraente presente. O acordo de negócios terminou, do lado canadense, com ‘os grosseiros avanços sexuais’ feitos pelo árabe em relação à sua filha... Do lado árabe, o negócio acabou com o soco, nada convencional, que o canadense lhe aplicou no queixo.”

4 ‘Pitboys' são quadrilhas formadas por jovens de classe média-alta das grandes cidades brasileiras, que saem na madrugada para espancar outros jovens. Normalmente, as vítimas são rapazes mais fracos e que não estão em grupo.

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Creio que um dos maiores desafios para nós, antropólogos do ensino superior privado, seja fazer a etnografia dos alunos, dos “nossos alunos”, daqueles com os quais convivemos a maior parte do tempo. É possível que nos interesse, de modo abrangente, a descrição de todos os aspectos de suas vidas: onde nasceram, onde moram, em que trabalham, como são suas famílias, que expectativas de vida têm, quais seus valores, seus universos peculiares de símbolos e significados, que vão da língua à religião. Ora, estamos falando de alunos do ensino superior privado, em especial de cursos noturnos.

Hoje, as faculdades particulares respondem por 88% das escolas de ensino superior do país, concentrando 70% das matrículas. Ainda assim o percentual de jovens entre 18 e 24 anos no ensino superior é de 9%, muito abaixo da meta de 30% prevista no Plano Nacional da Educação para 2007 (aprovado pelo Congresso Nacional na forma da Lei 10.172, de janeiro de 2001). Países mais pobres, como Bolívia (22%) e Colômbia (23%), têm situação melhor que a brasileira.5 Estes mesmos dados mostram que as faculdades particulares avançam justamente onde a educação pública não está: as públicas federais têm apenas 25% dos seus alunos matriculados em cursos noturnos, turno em que as particulares têm 67% de seus cursos. A tentativa de ampliar as vagas no noturno encontrou resistência nas universidades públicas: “a principal alegação é de que os cursos noturnos trazem mais despesas, com as quais as universidades públicas e seus orçamentos apertados não têm condições de arcar.” 6

É neste universo que a Antropologia pode realizar a etnografia dos alunos, com estudos de caso e histórias de vida. A ciência se corporificaria dando voz àqueles com os quais trabalhamos cotidianamente. Um relato que ouvi há poucos dias pode ser aqui sintetizado: dez anos atrás Maria (nome fictício) decidiu cursar uma faculdade. Tinha 30 anos, mas havia começado a trabalhar aos 15. Durante as aulas não conseguia acompanhar o raciocínio, atribuiu a dificuldade à falta de maturidade e tempo para ler. Resolveu desistir. Hoje, passados mais de 15 anos, Maria voltou à faculdade, agora se sentindo mais madura e “cobrada” pelas exigências do mercado moderno.

Na minha terra há um ditado que diz que a gente tem que ser “lido ou corrido”, traduzindo: letrado e escolado ou vivido e experimentado. Agora, Maria trás consigo a experiência profissional, de vida e dos anos que foram necessários para entender processos cognitivos que lhe faltavam há 15 anos atrás. Sem dúvida a presença de Maria hoje, nas nossas salas de aula, deve ser relativizada e entendida dentro da lógica social brasileira que exclui pessoas do acesso ao ensino superior, principalmente aquelas que não tiveram chance e oportunidade, próprias das classes sociais mais abastadas.

Bibliografia DA MATTA, Roberto. O que faz o brasil, Brasil? Rio de Janeiro, Rocco. 1999.

ROCHA, Everardo Guimarães. O que é etnocentrismo? São Paulo: Brasiliense. Coleção Primeiros Passos, 1984.

5 http://www2.uol.com.br/aprendiz/guiadeempregos/executivos/noticias/ge091202.htm#1, acesso em 26 de março de 2004

6 http://www2.uol.com.br/aprendiz/guiadeempregos/executivos/noticias/ge091202.htm#1, acesso em 26 de março de 2004

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