UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE FURG … · À minha amiga Berenice Vahl Vaniel pelos momentos...

180
UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE FURG PROGRAMA DE PÓS-GRADUAÇÃO EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS: QUÍMICA DA VIDA E SAÚDE DOUTORADO EM EDUCAÇÃO EM CIÊNCIAS Ivane Almeida Duvoisin Rio Grande 2013.

Transcript of UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE FURG … · À minha amiga Berenice Vahl Vaniel pelos momentos...

  • UNIVERSIDADE FEDERAL DO RIO GRANDE

    FURG

    PROGRAMA DE PS-GRADUAO

    EDUCAO EM CINCIAS: QUMICA DA

    VIDA E SADE

    DOUTORADO EM EDUCAO EM CINCIAS

    Ivane Almeida Duvoisin

    Rio Grande

    2013.

  • IVANE ALMEIDA DUVOISIN

    VIRTUALIZAES E ATUALIZAES EM REDES DE

    CONVERSAO SOBRE O CURRCULO DE UM CURSO

    ON-LINE DE LICENCIATURA EM CINCIAS

    Tese apresentada no Programa de Ps-

    Graduao Educao em Cincias: Qumica

    da Vida e Sade, da Universidade Federal do

    Rio Grande, como requisito para obteno do

    ttulo de Doutor em Educao em Cincias.

    Linha de Pesquisa:

    Educao Cientfica: as tecnologias

    educativas no processo da aprendizagem

    Orientadora: Prof. Dr. Dbora Pereira

    Laurino

    Co-orientadora: Prof. Dr. Maria do Carmo

    Galiazzi

    Rio Grande

    2013.

  • IVANE ALMEIDA DUVOISIN

    VIRTUALIZAES E ATUALIZAES EM REDES DE

    CONVERSAO SOBRE O CURRCULO DE UM CURSO ON-LINE

    DE LICENCIATURA EM CINCIAS:

    Tese aprovada como requisito parcial para a obteno do ttulo

    de Doutora em Educao em Cincias, pelo Programa de Ps-

    Graduao em Educao em Cincias: Qumica da Vida e da

    Sade, da Universidade Federal do Rio Grande FURG.

    BANCA EXAMINADORA

    _______________________________________________________________________ Profa. Dra. Dbora Pereira Laurino Universidade Federal do Rio Grande (Orientadora)

    _______________________________________________________________________ Profa. Dra. Maria do Carmo Galiazzi Universidade Federal do Rio Grande (Coorientadora)

    _______________________________________________________________________ Profa. Dra. Edma de Oliveira Santos Universidade Estadual do Rio de Janeiro

    _______________________________________________________________________________

    Profa. Dra Nize Maria Campos Pellanda Universidade de Santa Cruz do Sul

    _______________________________________________________________________

    Profa. Dra. Maria Aparecida Viggiani Bicudo Universidade Estadual de So Paulo

    _______________________________________________________________________ Profa. Dra. Sheyla Costa Rodrigues Universidade Federal do Rio Grande

  • AGRADECIMENTOS

    A Vida e a natureza, pela energia da minha alma e inspirao dos meus pensamentos!

    Agradeo a oportunidade que a vida me proporcionou de poder viver num pedao de

    paraso aqui na terra meu querido e amado Stio Beija-Flor dos Pampas, minha fonte

    inspirativa.

    In memrium ao meu pai Dinarte, por sempre ter acreditado no meu potencial e por ter

    sempre me incentivado e me ensinado o valor da razo e do conhecimento. A minha me

    Lacy, por me mostrar o valor da emoo, do amor; exemplo vivo de fora e resilincia.

    Ao meu esposo Antnio Carlos e aos meus filhos Aline e Lauro Allan, pela compreenso

    da ausncia.

    Ao meu irmo Idcio Nunes Almeida. Obrigada mano, pelo amigo e companheiro que s;

    por saberes reconhecer, mesmo a distncia, os momentos que necessito de socorro. Tua

    escuta atenta me d segurana e alvio aos momentos de tenso. Obrigada, por me socorrer

    nos momentos mais difceis, sem tua ajuda no teria chegado onde cheguei.

    minha amiga Berenice Vahl Vaniel pelos momentos de estudo, pelas leituras em

    conjunto, pelas discusses acadmicas, pelo incentivo.

    Aos meus amigos Leandro de Oliveira Branco e Laurence Marafante Branco, pela

    pacincia em meus momentos de crise e pelo apoio to importante nessas horas.

    Aos colegas que fazem parte das minhas Redes de Conversao: dos Grupos de pesquisa

    CEAMECIM e EaDTEC .

    Em especial, aos colegas participantes da Rede Proponente (RP) e da Rede de professores-

    estudantes da Ps-graduao Educao em Cincias (REPGEC), muito obrigada pelo

    linguajear e emocionar que se estabeleceu durante a convivncia nas redes de conversao,

    sem a qual esta tese nunca teria se concretizado.

  • Ao Cludio Bellato, diretor-presidente da Bellato Ambiental, pela leitura atenta e s

    crticas valiosas que ajudaram a qualificar o meu trabalho.

    s professoras Edmea de Oliveira Santos e Sheyla da Costa Rodrigues, pelas orientaes

    durante a qualificao, cujas sugestes de novas leituras foram fundamentais para o rumo

    da navegao.

    In Memrium, ao mestre, colega e amigo, professor Roque Moraes a quem devo minha

    insero na pesquisa qualitativa. Agradeo ao legado da ATD cuja metodologia tanto me

    auxiliou neste trabalho.

    s minhas queridas orientadoras, Dbora Pereira Laurino e Maria do Carmo Galiazzi, pela

    escuta sempre atenta, pelo incentivo e por possibilitar espaos de convivncia ricos em

    diversidade. Em nossa convivncia tenho aprendido o que a atitude coinspiradora.

    A toda a equipe do Programa de Ps-Graduao Educao em Cincias: Qumica da Vida e

    da Sade, pela oportunidade de qualificao profissional.

  • RESUMO

    Este trabalho resultado de uma pesquisa de doutorado, desenvolvida no Programa de Ps-

    Graduao Educao em Cincias: Qumica da Vida e da Sade - PPGEC, da Universidade Federal

    do Rio Grande FURG, na linha de pesquisa Educao cientfica: as tecnologias educativas no

    processo da aprendizagem. Situa-se essa pesquisa no caminho explicativo da objetividade entre

    parnteses, a qual, segundo Maturana (2009), caracteriza-se pela ausncia de verdade absoluta e de

    verdade relativa, bem como pela existncia de muitas verdades diferentes em domnios distintos.

    Trata-se de uma pesquisa de cunho qualitativo, cujo objetivo no a generalizao nem a busca de

    leis ou princpios, mas a compreenso particular do que se estuda, ou seja, o foco da ateno

    desloca-se da generalizao para o especfico, o peculiar, o individual, almejando sempre a

    compreenso do fenmeno estudado. A pesquisa busca identificar e analisar as virtualizaes e as

    atualizaes emergentes das Redes de Conversao que foram se constituindo no processo de

    discusso e elaborao do currculo do curso on-line de licenciatura em cincias da FURG. Para

    tanto, foi necessrio explicar e compreender os fenmenos do linguajear e do emocionar nas redes

    de conversao: Rede Proponente (RP) e Rede de Estudantes-professores da Ps-Graduao

    Educao em Cincias (REPGEC), que se formaram no esforo de conversar sobre o currculo que

    geravam. Apostou-se no potencial do linguajear e do emocionar das redes conversao por

    considerar que o conversar promove o deslocar-se no tempo, por intermdio do relembrar fatos

    vividos e o pensar em novas solues para problemticas identificadas; nesse sentido, o atuar e

    vivenciar coletivo se tornam indispensveis. Perseguiram-se trs questionamentos: 1. Quais so os

    complexos problemticos e os ns de tendncias ou de foras que acompanham os processos de

    formao de professores e os currculos dos cursos on-Line? 2. Quais problemticas e solues, o

    linguajear e o emocionar dos participantes das Redes de Conversao revelou? 3. Qual desenho

    curricular melhor se adequa aos currculos mveis, caractersticos da modalidade on-line? O

    referencial terico balizador e cujas conversaes, em sua pluralidade, ajudaram a tramar a rede

    conceitual que sustenta essa tese foram: as teorias da Biologia do Conhecer, de Maturana e Varela

    e o conceito de Inteligncia Coletiva, de Lvy e o dialogo com Marques no que tange formao

    docente. Assume-se o potencial formativo das redes de conversao de Maturana, o conceito de

    educao on-line cunhado por Santos e, para a superao dos currculos prescritivos, o campo

    fecundo dos currculos em ao abordado por Macedo. O corpus da pesquisa foi produzido nas

    gravaes das reunies da RP e dos encontros da REPGEC. Utilizou-se a Anlise Textual

    Discursiva ATD, como ferramenta de anlise associada ao software N-Nivo. Do processo de

    anlise e sntese identificaram-se duas problemticas para formao docente, categorias emergentes

    que passaram a ser denominados vetores de potencializao: Fragmentao do conhecimento e

    isolamento das reas: questo cultural; e Distanciamento da instncia formadora e da escola:

    espao-tempo na educao on-line quem forma quem? As solues inventivas para superar as

  • problemticas identificadas foi atualizando sucessivamente o currculo, esse movimento

    denominou-se Fluzz Currculo. O desenvolvimento e a anlise da pesquisa evidenciou o potencial

    das redes de conversao para os processos de virtualizao e de atualizao na elaborao dos

    currculos e possibilitou o desenho de uma mandala curricular considerada mais ajustada aos

    currculos da educao on-line.

    Palavras Chaves: Atualizaes e virtualizaes. Biologia do Conhecer, Educao on-line. Fluzz

    currculo. Redes de Conversao.

  • ABSTRAT

    This work is the result of a PhD research, developed at the Graduate Program in Sciences Education:

    Chemistry of Life and Health- PPGEC, Federal University of Rio Grande - FURG in scientific research line

    of scientific Education: educational technology in the learning process. This research is located in the

    explanatory way of objectivity in parentheses, which, according to Maturana (2009), is characterized by the

    absence of absolute truth and relative truth, as well as the existence of many different truths in distinct

    domains. This is a qualitative research whose goal is not to generalize the search nor the laws location or

    principles, but the particular understanding of what is studied, that is, the focus of attention moves from

    generalization to specific, peculiar, individual, always aiming to understand the studied phenomenon. The

    research seeks to identify and analyze emerging virtualization and updates Network Conversation that were

    formed in the process of discussion and elaboration of the FURGs course curriculum online of sciences

    degree. For this, it was necessary to explain and understand the phenomena of linguaging and emotioning in

    the conversations networks: Proponent Network (PN) and Network Student-teachers of Graduate Sciences

    Education (NSTGSE), which formed in the effort to talk about the curriculum they generated. It was betted

    on the potential and the emotioning of linguaging networks conversation considering that the talking

    promotes dislocate in time through to recall livings facts and thinking of new solutions to identified

    problems, in this sense, act and collective experience become indispensable. It was pursuing three questions:

    1. what are the complex and problematic nodes of tendencies or forces that go along with the processes of

    teacher training and curriculum onLine courses? 2. What problems and solutions the linguaging and the

    emotioning of participating in the Conversation Networks revealed? 3. What curriculum design best suited

    with mobile, characteristic of the online modality? he theoretical referential tagger and whose conversations,

    in its plurality, helped devise the conceptual network which support that thesis, were the theories of Biology

    of Cognition, by Maturana and Varela and the concept of Collective Intelligence, by Levy and dialogue with

    the Marques wiyh which have relation to teacher training. It is assumed the potential formative of networks

    of conversation from Maturana, the concept of online education coined by Santos and, to overcome the

    prescriptive curricula, the fertile area of the curriculum in action approached by Macedo. The research corpus

    was produced on recordings from meetings with the PN and NSTGSE. We used the Discursive Textual

    Analysis - DTA, as an analysis tool associated with the N-Nivo software. From the process of analysis and

    synthesis was identified two issues for teacher education, emerging categories which were named

    potentiation vectors: Fragmentation of knowledge and isolation areas: cultural issue, and distancing from

    instance of forming and from the school: space-time in education, who is teaching who online? The inventive

    solutions to overcome the problems identified was successively updating the curriculum, this movement was

    called Fluzz Curriculum. The development and analysis of this research showed the potential of conversation

    networks for the virtualization and update processes in preparing curriculums and enabled the design of a

    curricular mandala considered more suited to the curriculums of on lines education.

    Keywords: Updates and virtualization. Biology of cognition. On-line education, Fluzz curriculum.

    Conversation Network.

  • LISTA DE FIGURAS

    Figura 01. Estrutura da SEaD...............................................,............................................ .36

    Figura 02. Ambiente virtual de aprendizagem da disciplina currculo e formao de

    professores em cincias e matemtica na plataforma Moodle.............................................54

    Figura 03. Rede de professores-estudantes do PPGEC constituindo grupos para ao no

    currculo............................................................................................................................... 59

    Figura 04. Caldeiro de ideias................................................................................................. 63

    Figura 05. Recorte da Planilha 1 Excel contendo palavras-chaves e Unidades de

    significados da RP............................................................................................................... 65

    Figura 06. Recorte da Planilha 2 Excel contendo as unidades de significado da ATD na

    RP.........................................................................................................................................65

    Figura 07. Mapa Semntico produzido pelo NVivo...........................................................71

    Figura08: Os tree Nodes do NVivo....................................................................................72

    Figura 09. Organizao da disciplina currculo e formao de professores de cincias e

    matemtica na plataforma Moodle.....................................................................................91

    Figura 10. Ambiente virtual criado na plataforma Moodle para que os professores da RP

    fossem registrando as diversas atualizaes no currculo do curso......................................93

    Figura 11. Mandala curricular proposta com base no conversar da RP ...........................131

    Figura 12. Mandala para desenho de curso inspirada nas conversaes da RP e

    REPGEC.............................................................................................................................132

  • LISTA DE QUADROS

    Quadro 1. Sntese da Avaliao do Curso de Cincias vigente em 1994 ..........................25

    Quadro 2. Codinomes dos participantes da rede proponente .............................................50

    Quadro 3. Codinomes dos participantes da rede dos professores-estudantes do PPGEC...55

    Quadro 4. Recorte da Planilha Excel com as categorias iniciais emergentes ....................66

    Quadro 5 Recorte da anlise e sntese das conversaes na 2. reunio da RP..................68

    Quadro 6. Categorias e Unidades de significados mveis..................................................69

    Quadro 7. Primeiro esboo da estrutura e dos princpios para o curso on-line de

    licenciatura em cincias e matemtica.................................................................................94

    Quadro 8. Primeira proposta de ementa para os cotidianos delineados na PPC e

    disponibilizado no ambiente Moodle.................................................................................106

    Quadro 9. Primeira matriz curricular virtualizada na RP .................................................112

    Quadro 10. Currculo atualizado na RP ...........................................................................115

    Quadro 11. Ementa da disciplina de cincias 1 com base em contedos estruturadores. 116

    Quadro 12. Ementa da disciplina ecossistema 1 ..............................................................118

    Quadro 13. Recorte da matriz curricular provisria ........................................................121

    Quadro 14 Matriz curricular encaminhada ao MEC ........................................................126

  • LISTA DE SIGLAS

    ABNT: Associao Brasileira de Normas Tcnicas

    ACOMECIM: Ao Conjunta Melhoria do Ensino de Cincias e Matemtica no RS

    AIM: Articulated Instructional Media Project

    AMEII: Ambientes Educacionais Interativos Informatizados

    AMPED: Associao Nacional de Ps-Graduao e Pesquisa em Educao

    ATD: Anlise Textual Discursiva

    AVA: Ambientes Virtuais de Aprendizagem

    BRASILEAD: Primeiro Consrcio Brasileiro para impulso EAD

    CAPES: Coordenao e Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior

    CCCI: Comisso de Curso de Cincias

    CEAMECIM: Centro de Educao Ambiental em Cincias e Matemtica

    CFE: Conselho Federal de Educao do Brasil

    CFOP: Centro de Formao e Orientao Pedaggica

    COEPE/FURG: Conselho de Ensino, Pesquisa e Extenso da Universidade Federal do Rio

    Grande

    ComCur: Comisso de Curso

    CONSED: Conselho de Secretrios de Educao

    CRUB: Conselho de Reitores das Universidades Brasileiras

    DCMB: Departamento de Cincias Morfobiolgicas

    DMAT: Departamento de Matemtica

    DFIS: Departamento de Fsica

    DQ: Departamento de Qumica

    EaD: Educao a Distncia

    EaDTeC: Educao a Distncia e Tecnologia

    ESCUNA: Escola, Comunidade e Universidade

    FURG: Universidade Federal do Rio Grande

    INEP: Instituto Nacional de Estudos e Pesquisas Educacionais

    LDB: Lei de Diretrizes e Bases da Educao

    MC: Ministrio das Comunicaes

    MEC: Ministrio da Educao, da Cultura e do Desporto

    MIRAR: (Mediar, Investigar, Refletir e Aprender) Coletivo de Professores pertencentes

    ao Ceamecim

  • PA: Projeto de Aprendizagem

    PADCT: Programa de Apoio ao Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico do Ministrio

    da Educao

    PCNs: Parmetros Curriculares Nacionais

    PP: Projeto Pedaggico

    PPGEC: Programa de Ps-Graduao Educao em Cincias: Qumica da Vida e da Sade

    PROA: Curso de Ps-Graduao Lato Sensu: Especializao em Tecnologias da

    Informao e Comunicao na Promoo da Aprendizagem

    PROLIC: Programa de Pr-Licenciatura

    REUNI: Plano de Reestruturao e Expanso das Universidades Federais

    RP: Rede Proponente

    REGESD: Rede Gacha de Ensino Superior a Distncia

    REPGEC: Rede dos Estudantes do Programa de Ps-Graduao Educao em Cincias:

    Qumica da Vida e da Sade

    RPA: Rede de Professores Atuantes

    SPEC: Subprograma Educao para a Cincia

    SEAD/FURG: Secretaria de Educao a Distncia da Universidade Federal do Rio Grande

    SESU/MEC: Secretaria de Ensino Superior do Ministrio da Educao

    SINAED: Sistema Nacional de Educao a Distncia

    SINRED: Sistema Nacional de Rede Educativa

    SUPGRAD: Superintendncia de Graduao

    TIC: Tecnologias da Informao e da Comunicao

    TDIC: Tecnologias Digitais da Informao e da Comunicao

    UA: Unidades de Aprendizagem

    UAB: Universidade Aberta do Brasil

    UFRGS: Universidade Federal do Rio Grande do Sul

    UMA: University of Mid-America

    UNDIME: Unio dos Dirigentes Municipais de Educao

    UNIREDE: Logomarca do Protocolo de Intenes para a criao da Universidade Virtual

    Pblica do Brasil

    UNISC: Universidade de Santa Cruz do Sul

  • SUMRIO

    1. A NAVEGAO: tecendo a rede ........................................................14

    2. GALXIA VIVNCIAS: resgatando a histria.................................20

    2.1 Minha trajetria com a formao docente............................................................20

    2.2 Histrico das licenciaturas em cincias na FURG...............................................24

    2.3 Histrico da educao a distncia na FURG.......................................................30

    3. GALXIA TELESCPIO: ajustando as lentes.................................38

    3.1 Currculo: uma construo cultural .....................................................................40

    3.2 Linguajear e emocionar em redes de conversao...............................................44

    3.3 Vetores de transformao, virtualizaes e atualizaes.................................... 46

    4. GALXIA VIAGEM: delineando a trajetria....................................52

    4.1 Redes de conversao constituindo o conversar sobre o curso on-line de

    licenciatura em cincias........................................................................................53

    4.2 A Anlise Textual Discursiva como ferramenta para identificar e compreender o

    processo da emergncia dos vetores de potencializao......................................66

    5. GALXIA CAMPO POTENCIALIZADOR: tecendo o currculo ...78

    5.1 Fragmentao e isolamento das reas: uma questo cultural...............................79

    5.2 Distanciamento da instncia formadora e da escola: espao-tempo na educao

    on-line: quem forma quem?..................................................................................87

    5.3 Fluzz Currculo: a movimentao do currculo...................................................98

    6. O DESEMBARQUE: atualizando as redes de significao............. 133

    7. LENTES TELESCPICAS: Referncias...........................................139

    ANEXOS 146

  • 14

    Tempo. Espao. Ao. Forma. Constituintes de uma trama

    tecida na experincia de tempo e de espao

    vivida no corpo prprio imbricam-se

    na formao/ao da Rede. nessa experincia,

    situada, corprea, que se estabelece um nvel espacial.

    Maria Aparecida Viggiani Bicudo

    1. A NAVEGAO: TECENDO A REDE

    Estamos vivenciando um momento histrico de transformaes profundas em

    todos os setores da sociedade, impulsionadas pelas descobertas cientficas, notadamente no

    campo da fsica, das cincias da cognio, das tecnologias digitais da informao e

    comunicao (TDIC)1 e pela popularizao da Internet. So mudanas que vm

    modificando nossas vises de mundo e, consequentemente, impulsionando as instituies

    escolares a reverem suas concepes pedaggicas, seus mtodos, seus currculos e sua

    organizao. Tais mudanas so tensionadas pela inrcia do sistema em atualizar suas

    estruturas e modos de gesto; pela morosidade no atualizar a legislao educacional

    vigente, bem como pela formao inadequada dos professores (o que Lvy denomina de

    coeres).

    As questes apontadas vinham me inquietando desde 2002, quando me envolvi

    com a Educao a Distncia (EaD), por conta da coordenao do Curso de Extenso para

    professores, A TV na Escola e os Desafios de Hoje. Foram muitos os desafios e os

    entraves para superar o engessamento da estrutura e a legislao existente na poca, e

    ainda para manter a flexibilidade e a rapidez na conduo do processo de um curso dessa

    natureza. Aposentei-me em 2005, porm, nunca me afastei da universidade: continuei

    1 Tecnologias digitalizadas que possibilitam a articulao de diversas mdias e a edio de maneira no linear

    com computadores, possibilitando as manipulaes de imagens e rompendo com a lgica de produo

    centralizada.

  • 15

    envolvida com os cursos a distncia e coparticipando do grupo de pesquisa Educao a

    Distncia e Tecnologia (EaDTec).2

    As universidades, especialmente as pblicas, cada vez mais foram sendo

    requisitadas para atenderem uma demanda por formao tecnolgica e superior3 em todos

    os mbitos do conhecimento. Apesar das resistncias EaD, as universidades pblicas

    federais foram se engajando pelos estmulos que iam ocorrendo por meio de

    financiamentos para as pesquisas e para a ampliao de oferta de novos cursos. As

    alteraes nas polticas pblicas, desde a Lei das Diretrizes e Bases da Educao (LDB

    9394/96), com a insero da EaD no artigo 80, as regulamentaes subsequentes que

    possibilitaram o desenvolvimento de uma poltica nacional de educao a distncia e, mais

    recentemente, o Programa de Apoio ao Plano de Reestruturao e Expanso das

    Universidades Federais (REUNI), lanado pelo governo federal, tambm contribuem para

    a ampliao da modalidade de ensino em questo.

    A Universidade Federal do Rio Grande FURG, a exemplo de outras instituies

    pblicas federais, ciente do seu compromisso social, tem adotado uma poltica de

    ampliao e oferta de cursos, tanto na modalidade presencial quanto a distncia. A FURG

    tem procurado atender a demanda social tambm dos municpios circunvizinhos, no

    sentido de responder as necessidades e ansiedades da populao; contudo, atenta para que

    o crescimento exacerbado e desordenado no coloque em risco a qualidade da formao.

    Sem sombra de dvida, a EaD democratiza a educao, pois minimiza os

    empecilhos da educao presencial, quais sejam, aqueles causados pelo isolamento e/ou

    distanciamento geogrfico das grandes cidades, onde se concentram os centros formadores;

    o insuficiente nmero de vagas; a incompatibilidade de horrios, bem como a

    impossibilidade de muitos para conciliar trabalho e estudo. As novas tecnologias digitais

    possibilitam superar a maioria desses entraves.

    A cultura da educao presencial criou razes to profundas que at hoje muitas

    pessoas consideram a EaD uma educao de segunda classe, baseadas somente no fato da

    no presencialidade, como se esta fosse garantia de mediao pedaggica. Muitos ainda

    no tm noo das mudanas que as tecnologias digitais em rede vm proporcionando, das

    2 Educao a Distncia e Tecnologias (EaDTEC)

    http://dRP.cnpq.br/buscaoperacional/detalhegrupo.jsp?grupo=01677087BM39FY 3 Esta demanda ocorre pelo contingente de estudantes que se formam no ensino mdio e desejam ingressar no

    ensino superior, cujas vagas ofertadas esto aqum do necessrio.

    http://dgp.cnpq.br/buscaoperacional/detalhegrupo.jsp?grupo=01677087BM39FY

  • 16

    possibilidades de presencialidade pelos dilogos sncronos4 e assncronos

    5, capazes de

    suplantarem as distncias e favorecerem a mediao. Nesse sentido, para demarcar um

    novo paradigma para a EaD, Santos (2005) desenvolveu a noo de educao on-line, que

    elimina a dicotomia entre educao presencial e a distncia, pois, em tempos de

    cibercultura, estar geograficamente disperso no significa estar distante. Cibercultura,

    segundo Lvy (1999), a cultura cunhada pelas relaes sociais que ocorrem no

    ciberespao, nas redes sociais, nas comunidades de aprendizagem, ou seja, a cultura da

    construo coletiva, mediada pelas tecnologias digitais.

    No ano de 2009, alguns municpios solicitaram FURG cursos de formao e

    qualificao para professores da educao bsica em cincias e matemtica. Foi quando

    um grupo de professores da Secretaria de Educao a Distncia SEaD e do Centro de

    Educao Ambiental em Cincias e Matemtica CEAMECIM, com o qual estou

    implicada, comeou a pensar na possibilidade de ofertar um curso de licenciatura em

    cincias e matemtica a distncia6, cuja finalidade formar professores para atuarem nos

    anos finais do ensino fundamental, devendo ser lanado em 2013. Naquele momento,

    convivamos com o conflito da dicotomia entre educao presencial e a distncia. Foi ao

    problematizar as duas modalidades que nos apropriamos do conceito de educao on-line e

    consideramos adequado assumi-lo.

    Senti o desejo de acompanhar o processo de discusso e deciso sobre os

    princpios do curso e a elaborao do projeto pedaggico (PP). Estava ingressando no

    doutorado e, como sempre estive envolvida com os cursos de formao de professores

    tanto de cincias quanto de matemtica, decidi escrever o meu projeto de pesquisa, que

    consiste em investigar o conversar nas redes de conversao7, as quais, por sua vez, foram

    se constituindo para a elaborao do projeto do curso. Pensar no referido curso parecia-me

    interessante, pois, a meu ver, os parmetros a serem considerados para cursos nessa

    modalidade deveriam superar alguns pressupostos dos cursos presenciais, como o caso da

    4 Dilogos sncronos so aqueles que ocorrem em tempo real, isto , os interlocutores encontram-se ligados

    simultaneamente em rede e utilizam recursos que permitem registrar e acompanhar todas as trocas que

    estejam ocorrendo. 5 Dilogos assncronos so aqueles em que os interlocutores comunicam-se sem estabelecerem ligao direta.

    A interao no intermediada por recursos que permitem a eles acompanharem o que os outros desejam

    comunicar, no momento exato em que a comunicao emitida. 6 Quando iniciamos o debate sobre o currculo do curso, pretendia-se habilitar professores tanto de cincias

    quanto de matemtica para atuarem no ensino fundamental; por questes legais, acabamos optando por um

    curso que habilita somente em cincias naturais. 7 Inicialmente foi se constituindo a RP (Rede Proponente), que dialogou durante o ano de 2009 e props um

    desenho provisrio de currculo, que foi sendo modificado por outra rede (REPGEC), formada pelos

    estudantes-professores do PPGEC.

  • 17

    organizao por pr-requisitos, baseada numa concepo linear de cincia. No mnimo,

    tratava-se de uma oportunidade mpar para se revisar inclusive os currculos que, em geral,

    so constitudos por grades curriculares engessadas e fragmentadas.

    Os estudos sobre currculo mostram que a relao entre ele e a teoria curricular

    alienada, uma vez que as teorias curriculares predominantes so prescritivas, ou seja,

    prticas idealizadas. No necessitamos mais de teorias sobre prescries curriculares, mas

    de prticas-teorias-prticas, isto , de estudos e de teorias acerca da elaborao e da

    aplicao de currculo. Precisamos de uma teoria de contexto, de ao. Conforme afirma

    Macedo (2012), atos de currculo e, segundo Varela (2003), teoria em ao (enao) e

    nessa perspectiva que me coloco enquanto pesquisadora implicada.

    Durante o exerccio da minha profisso, vivenciei vrias reformulaes de cursos

    de cincias e de matemtica na modalidade presencial. Instigava-me pensar num curso on-

    line e, nesse contexto, eram muitos os questionamentos: como propor currculos mais

    dinmicos, capazes de acompanhar o rpido fluir desses cursos? De que forma lidar com o

    distanciamento dos estudantes, principalmente nos estgios e nas atividades experimentais?

    Como fazer para que os currculos acompanhem as mudanas velozes dos saberes e das

    informaes? De que modo superar a distncia8 para uma aprendizagem que se pretende

    dialgica? As questes citadas me inquietavam e me mobilizaram para querer investigar o

    processo de elaborao do PP e do currculo. Pressentia que a maneira prescritiva9 como se

    elaboravam os currculos no era adequada, mas no sabia bem como lidar com as

    questes em foco.

    Assim, fomos constituindo redes de conversao, e a primeira delas denominamos

    Rede Proponente (RP), posteriormente ampliada pela participao dos professores-

    estudantes do Programa de Ps-Graduao Educao em Cincias: Qumica da Vida e da

    Sade, a qual intitulamos Rede de Professores-Estudantes do Programa de Ps-Graduao

    Educao em Cincias (REPGEC). A trama da rede no se esgotou aqui: ela continua se

    ampliando e se ramificando a cada movimento, no sentido de colocar o curso em ao. Isso

    porque, de acordo com Macedo (2012), o currculo nunca est pronto; ele est

    constantemente sendo alterado por aqueles que, em ato, executam-no.

    8 Neste momento do meu processo, ainda no conhecia o conceito de educao on-line e convivia com o

    conflito da dicotomia entre educao presencial e a distncia; foi ao problematizar ambas as modalidades

    que me apropriei do conceito de educao on-line, superando a dicotomia. 9 O prescritivo aqui se refere aos currculos elaborados em gabinetes, pelos coordenadores pedaggicos, com

    pouco ou nenhum envolvimento dos professores do curso.

  • 18

    Minha pesquisa consiste em explicar e compreender os fenmenos do linguajear10

    e do emocionar11

    nas redes de conversao RP e REPGEC, que se constituram no esforo

    de conversar sobre o currculo que gervamos. O referencial terico com quem

    conversamos e cujas conversaes, em sua pluralidade, ajudaram a tramar a rede foram as

    teorias da Biologia do Conhecer, de Maturana e Varela (2005), e de Inteligncia Coletiva,

    de Lvy (2007). Assumimos o potencial formativo das redes de conversao (Maturana,

    2006 e 2008), o conceito de educao on-line (Santos, 2005) e, para a superao dos

    currculos prescritivos, o campo fecundo dos currculos em ao (Macedo, 2011 e 2012).

    No que tange formao docente, dialogamos com Marques (1996 e 2003).

    Na condio de pesquisadora implicada, sentia-me como uma viajante, delineando

    o caminho ao caminhar, pois considero que, numa pesquisa, o caminho percorrido se d

    em virtude dos caminhos e das trajetrias anteriores, os quais constituem aqueles que se

    aventuram pelo campo da pesquisa. Foi assim que me senti: navegando na incerteza, numa

    viagem constituda por caminhos e trajetrias delineados pelo meu racionar e emocionar12

    e pelos dos navegadores que comigo embarcaram nesse conversar.

    Era preciso uma forma de registrar os caminhos e as trajetrias percorridas, que

    foram se constituindo ao navegar. Assim, optei pela utilizao da ideia da rede, por

    consider-la a forma mais adequada de mapear a navegao experimentada. Segundo

    Musso (2004), a noo de rede perpassa todas as disciplinas, sendo que, nas cincias

    sociais, ela define sistemas de relaes (redes sociais) ou modos de organizao.

    Utilizamos a noo de rede tanto para definir o sistema de relaes sociais

    estabelecido nas redes de conversao quanto para organizar a tese na forma de um mapa

    de navegao intergalctica, que se configura em formato de rede. Diferentemente da

    navegao terrestre ou martima, que possuem muitos mapas e portos para orientar a

    navegao, a viagem intergalctica um lanar-se em um universo desconhecido; no

    10

    Maturana (2002b) utiliza o termo linguajear ou linguajar para enfatizar o carter de atividade, de

    comportamento, de coordenaes de coordenaes de aes e no como um sistema de operao com

    smbolos abstratos. 11

    As emoes so disposies corporais dinmicas que especificam os domnios de aes nos quais os

    animais, em geral, e ns, seres humanos, em particular, operamos num instante. (MATURANA, 2006, p.

    129) Emocionar o fluxo de um domnio de aes a outro na dinmica do viver. Ao existir na linguagem,

    movemo-nos de um domnio de aes a outro no fluxo do linguajear, num entrelaamento consensual

    contnuo de coordenaes de coordenaes de comportamentos e emoes, ao qual chamamos conversar.

    (MATURANA, 2011, p.262). 12

    Para Maturana (1999), o que constitui o nosso viver humano o entrelaamento razo e emoo, j que

    todo o sistema racional tem um fundamento emocional. O racional se constitui nas coerncias operacionais

    dos sistemas argumentativos que construmos na linguagem, a fim de defender e justificar nossas aes.

  • 19

    mximo temos alguns indicadores mapeados por alguns telescpios lanados no espao,

    mas os mapas vo sendo constitudos ao longo da navegao.

    A trama da rede, produzida pela viagem intergalctica, constituda por pontos

    (ns) que permitem o acesso a alguns domnios que denominei galxias. A viagem inicia

    com A Navegao: tecendo a rede, onde contextualizo a presente investigao e oriento o

    navegador-leitor sobre o navegar e a compreenso do contexto e da problemtica que

    geraram a pesquisa ora apresentada.

    A primeira galxia, intitulada Vivncias: resgatando a histria, comporta o

    registro e a reflexo do histrico profissional vivenciado por mim at o momento da

    pesquisa, bem como as vivncias da instituio e de alguns participantes da RP com a EaD

    e a formao de professores de cincias. Na Galxia Telescpio: ajustando as lentes, o

    leitor encontra o sistema conceitual que proponho para a compreenso dos fenmenos do

    linguajear e do emocionar nas redes de conversao, estabelecidas pelo coletivo de

    professores, o que virtualiza e atualiza sucessivamente o currculo. Na Galxia Viagem:

    delineando a trajetria, apresento o fenmeno a explicar, a constituio das redes de

    conversao, as questes e os objetivos da pesquisa e a descrio detalhada da metodologia

    utilizada, os quais foram se ajustando no prprio caminho de atuao.

    A Galxia Campo Potencializador: tecendo o currculo a estao onde

    descrevo, explico e problematizo cada um dos vetores potencializadores13

    resultantes do

    conversar nas redes, constituindo um campo potencializador tanto para a formao docente

    quanto para o fluzz14

    currculo. As virtualizaes e as atualizaes que foram constituindo

    o fluzz currculo tambm so aqui apresentadas.

    Durante o caminho, senti a emoo de reencontrar a minha histria, de

    compreender o processo dos colegas que comigo navegavam e de descobrir o novo, que

    emergia conforme procurava compreender e narrar a trajetria da pesquisa a partir da

    anlise das redes de conversao. Partilho tal emoo com aqueles que agora embarcam

    nesta viagem.

    13

    Vetores de Potencializao: conceito cunhado por mim, pesquisadora, para dar visibilidade s foras

    resultantes dos processos de virtualizao que impulsionaram a criatividade e a inventividade nas redes de

    conversao. 14

    Utilizo essa nomenclatura definida por Augusto de Franco para denotar o currculo que se modifica

    continuamente no movimento do linguajear das redes de conversao.

  • 20

    Nossa experincia est indelevelmente atrelada

    nossa estrutura, (...) quando examinarmos mais de

    perto como chegamos a conhecer esse mundo,

    descobriremos sempre que no podemos separar

    nossa histria das aes biolgicas e sociais a

    partir das quais ele aparece para ns.

    Humberto Maturana

    2. GALXIA VIVNCIAS: RESGATANDO A HISTRIA

    As minhas vivncias, tramadas com as ideias dos autores e com quem dialogo,

    forneceram a lente com a qual percebo os processos do linguajear e do emocionar nas

    redes de conversao, constitudas em torno da elaborao do currculo do curso on-line de

    licenciatura em cincias, foco desta pesquisa. Para melhor compreenso da minha

    trajetria, subdividi este captulo em trs itens: no primeiro, (2.1), relato algumas das

    minhas experincias com formao de professores na universidade durante meus trinta

    anos de exerccio profissional; no item 2.2, resgato o histrico das reformulaes

    curriculares dos cursos de licenciatura de cincias na FURG; e, no 2.3, conto minha

    trajetria com a EaD nessa mesma universidade. Embora os aspectos citados possam

    parecer distintos, a articulao deles relevante, j que propor um currculo para formar

    professores na modalidade on-line exige conhecimento e vivncia na rea.

    Minha trajetria com a formao docente

    Meu interesse em investigar a formao de professores na constituio de um

    currculo de curso on-line de licenciatura em cincias tem relao com a minha histria

    profissional. Desde o incio da minha carreira, enquanto professora universitria, estive

    envolvida com a formao de professores de matemtica, fsica, qumica e biologia.

    Minha atuao profissional junto ao Centro de Educao Ambiental Cincias e Matemtica

    (CEAMECIM) desde 1995, possibilitou e ainda possibilita dilogos e aes permanentes

    com estudantes e educadores de diferentes reas do conhecimento cientfico.

  • 21

    Por conta desses trabalhos, participei da rede Ao Conjunta Melhoria do

    Ensino de Cincias e Matemtica no RS (ACOMECIM)15

    , programa financiado pelo

    SPEC/PADCT/CAPES16

    . Nos encontros do ACOMECIM, eram debatidas as pesquisas e

    produes resultantes das aes educativas das diversas universidades envolvidas, e

    discutidas as diretrizes para o ensino de cincias.

    Apesar da suspenso desse programa por parte da CAPES, os estudos e as

    pesquisas resultantes da ao da rede ACOMECIM frutificaram; os laos entre os

    professores das universidades foram estreitados e foi possvel dar continuidade s aes

    conjuntas. Alm disso, as experincias promovidas na rede proporcionaram que

    repensssemos teorias a respeito da prtica docente, da aprendizagem, do conceito de

    conhecimento escolar, com consequentes implicaes em nossas propostas metodolgicas.

    Deste processo resultaram metodologias (situaes de estudos, unidades de aprendizagem,

    projetos de aprendizagem, resoluo de problemas) cujos princpios se assemelhavam, mas

    em que as formas de atuar dos professores de cada instituio envolvida eram singulares.

    Durante esses anos, participei ativamente das aes e dos encontros do grupo

    Mirar17

    , nos quais dialogvamos com professores em formao permanente e com

    licenciandos das cincias. Nesse grupo, continuamos a estudar, praticar e apostar em

    metodologias alternativas para superar o ensino descontextualizado e fragmentado da

    cincia18

    .

    Outra vivncia profissional que me constituiu foi minha atuao como

    Superintendente de Apoio Pedaggico19

    , na Pr-Reitoria de Graduao da FURG (1998-

    2000). Nela, tive a oportunidade de participar, como representante da instituio, do

    Conselho da Universidade Virtual Pblica do Brasil (UNIREDE)20

    . Assim, pude

    acompanhar o processo histrico-poltico da ampliao dos cursos a distncia no Brasil,

    bem como o embate pedaggico e epistemolgico inerentes a essa modalidade de ensino.

    15

    A rede ACOMECIM manteve-se enquanto houve financiamento do SPEC/ PADCT, at o ano de 1996. 16

    SPEC/PADCT: Subprograma Educao para a Cincia, implementado e administrado pela Coordenao e

    Aperfeioamento de Pessoal de Nvel Superior (CAPES), no interior do Programa de Apoio ao

    Desenvolvimento Cientfico e Tecnolgico (PADCT) do Ministrio da Educao e Cultura (MEC). 17

    Mirar (Mediar; Investigar; Refletir; Aprender e Renovar): coletivo de professores existente no CEAMECIM desde 1995. 18

    Cincia, aqui, refere-se s cincias naturais (fsica, qumica e biologia) ministradas no ensino fundamental. 19

    A superintendente de apoio pedaggico tinha como funes assessorar as coordenaes dos cursos nas

    reformas curriculares e nas implementaes de propostas pedaggicas; emitir parecer sobre as propostas

    curriculares para ser encaminhado aos conselhos superiores, bem como subsidiar as discusses e os debates

    acerca das polticas pblicas para a educao e da legislao educacional. 20

    Em 1999, foi assinado o protocolo de intenes para a criao da Universidade Virtual Pblica do Brasil,

    com a logomarca UniRede, cujo propsito era promover uma universidade em rede, num esforo conjunto

    para democratizar o acesso ao ensino superior em nosso pas. A Unirede foi criada oficialmente em 6 de

    janeiro de 2000. Representei a FURG em todas as etapas de implantao do consrcio.

  • 22

    Apesar da intencionalidade de universalizar o acesso ao ensino pblico universitrio e de

    contribuir para o aprimoramento do processo de ensino-aprendizagem nas reas de

    educao, cincia, tecnologia, arte e cultura, em todos os seus nveis, a educao a

    distncia era criticada por aqueles pesquisadores que acreditam em uma educao

    construda no dilogo e no coletivo. A crtica era embasada em argumentos como a falta de

    interatividade e nos princpios epistemolgicos que norteavam suas aes, consideradas

    tecnicistas.

    Minha experincia efetiva com EaD ocorreu quando coordenei o curso de

    extenso A TV na Escola e os Desafios de Hoje para professores do Rio Grande do Sul

    (2000-2001). Naquela poca, o curso era desenvolvido por meio de cadernos impressos e

    CD-ROM, os quais eram enviados via correio aos cursistas das mais diversas regies do

    estado. Tratava-se de um modelo transmissivo, informativo e pouco interativo, oriundo da

    EaD tradicional, que nasceu e se desenvolveu com o avano das tecnologias unidirecionais.

    Embora nos esforssemos para propiciar interatividade, atravs da abertura de espaos de

    dilogo por meio de um ambiente virtual de aprendizagem (AVA), criado para

    comunicao via Internet, na tentativa de superar esse modelo, eram pouqussimos os

    professores que possuam conexo com a rede, o que tornava a interatividade restrita aos

    encontros presenciais ou aos telefonemas, encarecendo o processo. Isso evidencia o quanto

    o suporte tcnico fundamental para uma educao on-line e o cuidado e a sensibilidade

    que devemos ter ao elaborar um curso de tal natureza; muitas vezes teremos que ainda

    optar por recursos da educao a distncia tradicional, por falta de acesso Internet nas

    regies onde se atua.

    Durante 2002 e 2003, investiguei a ao de professores em formao continuada

    na modalidade semipresencial, o que resultou na minha dissertao de mestrado A

    Educao Ambiental na Rede Telemtica. Neste momento, vivenciei pela primeira vez, in

    loco, a interao dos professores-cursistas, tendo como mediador um ambiente virtual de

    aprendizagem AMEII21

    , criado para potencializar os projetos de aprendizagem. Uma

    das evidncias dessa pesquisa foi a constatao de que os professores tinham conscincia

    das suas limitaes, da necessidade de apropriao tecnolgica e das mudanas necessrias

    sua prtica, a fim de promover aes integradas de planejamento, execuo e avaliao,

    mas no sabiam como realiz-las, pois se sentiam desamparados e despreparados.

    Posteriormente, fui aluna de um curso para formao de tutores de EaD, oferecido

    pela Universidade de Santa Cruz UNISC, j que precisava experienciar essa modalidade 21

    Ambientes Educacionais Interativos Informatizados.

  • 23

    de ensino, enquanto aluna, para compreender como ser estudante em tal condio. A

    experincia foi rica, uma vez que no me senti abandonada e nem solitria, ao contrrio do

    que eu ouvia falar que poderia acontecer. Isso porque a proposta pedaggica do curso

    apostava na interatividade entre os professores e os tutores, mediada pelas tecnologias

    digitais na plataforma Moodle. Foi ento que confirmei empiricamente minhas hipteses

    acerca das possibilidades das tecnologias digitais para o ensino on-line, quais sejam, a de

    interatividade, de trabalho compartilhado, de simulao das atividades experimentais e do

    potencial para a leitura e para a escrita colaborativa.

    Em 2005, atuei como tutora do curso PROA22

    , oferecido pela UFRGS aos

    professores de ensino fundamental e mdio dos estados do Rio Grande do Sul (RS) e de

    Santa Catarina (SC). Ser tutora nessa modalidade de ensino permitiu-me aprender e

    conhecer outros ambientes e objetos de aprendizagem, bem como perceber o quanto o

    papel mediador do professor-tutor importante para a aprendizagem e a permanncia dos

    estudantes no curso.

    Outra vivncia que merece destaque na minha trajetria foi o projeto ESCUNA23

    ,

    em que trabalhei com a formao de professores para o uso das tecnologias digitais em sala

    de aula. No seu mbito, atuei como professora e orientadora no curso de especializao

    Tecnologias da Informao e Comunicao na Educao, cujas primeiras ofertas deram-

    se na modalidade presencial, mas, posteriormente, o curso migrou para a modalidade on-

    line.

    O meu histrico profissional de envolvimento com cursos de formao de

    professores, nos projetos do CEAMECIM e na EaD, concedeu-me suporte para investigar

    o processo de elaborao da proposta curricular do curso on-line de licenciatura em

    cincias, a fim de identificar as virtualizaes e as atualizaes que a rede de conversaes

    opera.

    medida que a investigao transcorria, focava-me na dinmica das redes de

    conversao que iam se estabelecendo para problematizar a proposta curricular. Desse

    modo, busquei entender a evoluo da EaD, a formao de professores nessa modalidade

    22

    Curso de Ps-Graduao Lato Sensu: Especializao em Tecnologias da Informao e Comunicao na

    Promoo da Aprendizagem. 23

    ESCUNA (Escola-Comunidade-Universidade): foi um projeto da Fundao Universidade Federal do Rio

    Grande (FURG) em parceria com a Prefeitura Municipal do Rio Grande, cuja proposta residia na insero da

    metodologia de projetos de aprendizagem no currculo escolar da rede municipal de ensino de Rio Grande,

    potencializados pelas tecnologias digitais. O projeto envolveu 33 escolas, cerca de 16 mil alunos, 1.200

    professores e 50 mil pessoas da comunidade.

  • 24

    de ensino e as teorizaes envolvendo o currculo, com o intuito de encontrar os ns

    problemticos, com vistas a identificar as solues inventivas que os participantes da RP e

    REPGEC propunham para o currculo e, tambm, compreender a experincia vivida.

    No prximo item, resgato a histria da EaD e as reformulaes dos cursos de

    licenciatura de cincias da FURG. O resgate promovido pode auxiliar na compreenso do

    quanto cada um de ns, pesquisadores proponentes da reforma atual, foi influenciado por

    parte de nosso envolvimento prvio com tais atividades.

    2.2. Histrico das licenciaturas em cincias na FURG

    Tanto os cursos de licenciatura de cincias e de estudos sociais24

    quanto o de

    matemtica iniciaram entre 1966 e 1968, respectivamente, no mbito da Faculdade de

    Filosofia, Cincias e Letras25

    do Rio Grande, que at essa data estava vinculada

    Universidade Catlica de Pelotas. At 1968 era admitido, em nosso pas, o funcionamento

    de cursos superiores em forma de escolas isoladas.26

    Naquela poca, j havia um

    movimento de aglutinao dos cursos superiores em unidades maiores. No ano seguinte,

    com a reforma universitria, foi que o governo oficializou o funcionamento da

    Universidade do Rio Grande, pelo Decreto-lei 774. Assim, em 30 de setembro de 1969, a

    Faculdade Catlica de Filosofia passou a pertencer Fundao Universidade do Rio

    Grande (FURG), o que possibilitou, posteriormente, o seu carter pblico. Em 1973, a

    estrutura da FURG foi modificada, passando a conter cinco centros: Centro de Cincias

    Exatas e Tecnolgicas; Centro de Cincias Humanas e Sociais; Centro de Letras e Artes;

    Centro de Cincias do Mar e Centro de Cincias Biolgicas e da Sade. Esta estrutura

    obedecia aos preceitos da Lei n. 5540, da Reforma Universitria, tendo como

    consequncias a adoo do sistema de matrcula por disciplina e o surgimento dos

    colegiados de coordenao didtico-pedaggica dos cursos de graduao, que receberam a

    denominao de comisses de curso. O curso de cincias, licenciatura de curta durao,

    aglutinava biologia, fsica, qumica e matemtica27

    e era coordenado pela Comisso de

    Curso de Cincias. Em 1977, a estrutura da universidade transformou-se em

    24

    Eles foram autorizados pelo Decreto n. 61.617, de 23 de junho de 1967, e reconhecidos pelo parecer n.

    2473, da Secretaria de Ensino Superior SESU/MEC. 25

    As Faculdades de Filosofia, Cincias e Letras, e a de Direito pertenciam Universidade Catlica de

    Pelotas (UCPEL) at 1968. 26

    Tal fato possibilitou a oficializao da Faculdade Catlica de Filosofia de Rio Grande pelo Presidente

    Arthur da Costa e Silva, atravs do Decreto n. 61617, de 3 de novembro de 1967. 27

    O curso de cincias foi reconhecido pelo Decreto n. 73.818, de 12 de maro de 1974.

  • 25

    departamentos28

    e, consequentemente, em 22/09/1978, a matemtica desvinculou-se do

    curso de cincias, e passou a pertencer ao departamento de matemtica DMAT e o curso

    de cincias ficou vinculado ao departamento de cincias morfobiolgicas DCMB,

    passando a denominar-se curso de cincias licenciatura de 1. grau habilitaes qumica,

    fsica e biologia.

    Em 1980, foi autorizada a converso do curso de cincias licenciatura de 1. grau

    em curso de cincias e licenciatura plena29

    , com habilitaes em qumica e biologia. Em

    1990, os cursos de licenciatura foram reformulados, a fim de habilitarem, tambm, para o

    segundo grau30

    . A carga-horria deles foi ampliada, com vistas a abarcar os contedos

    requeridos para a formao de professores, cuja finalidade voltava-se atuao nos dois

    nveis: primeiro e segundo graus.

    Nessa poca, no Brasil, a maioria dos cursos de licenciatura em cincias havia se

    transformado em bacharelados e licenciaturas em reas especficas (fsica, qumica,

    biologia ou matemtica). Isso ocorreu para acompanhar um movimento internacional,

    baseado no modelo de gesto fabril originrio da Revoluo Industrial. Esse movimento

    teve incio em maio de 1978, quando o Conselho Federal de Educao do Brasil (CFE)

    decidiu reativar as licenciaturas especficas em qumica, fsica e biologia.

    A FURG resistia s influncias de fragmentao da licenciatura em cincias;

    porm, passados quase vinte anos, quando j se iniciava, no Brasil e em nvel

    internacional, um movimento contrrio fragmentao, a FURG passou por um processo

    inverso, instituindo uma comisso para avaliar o curso de cincias e estudar uma nova

    proposta de organizao do mesmo. A tendncia era a de criar as licenciaturas nas reas

    especficas vinculadas aos bacharelados. Para tanto, a comisso de curso de cincias

    (ComCur), em reunio do dia 08 de maio de 1994, apontou uma srie de problemticas no

    curso, as quais precisavam ser superadas, conforme se pode verificar no quadro a seguir,

    contendo a sntese da avaliao realizada:

    Quadro1: Sntese da avaliao do curso de cincias da FURG, vigente em 1994.

    1. O esquema de licenciatura com habilitaes pressupe uma integrao dos contedos de Biologia, Fsica e Qumica, o que no est ocorrendo.

    2. As disciplinas de Iniciao Biologia, Iniciao Qumica e Iniciao Fsica, da primeira srie, no propiciam uma base de conhecimentos das trs reas cientficas,

    28

    Estatuto aprovado pela Portaria Ministerial n. 325, de 24 de abril de 1978. 29

    Autorizado pela portaria n. 488, de 18/09/1980. 30

    Na poca, os atuais ensinos fundamental e mdio denominavam-se, respectivamente, ensino de primeiro

    grau e ensino de segundo grau.

  • 26

    3. no atendendo ao necessrio para a formao do professor de Cincias a nvel do Primeiro Grau.

    4. Uma dificuldade adicional a no lotao da Iniciao Biologia em nenhum Departamento. Anualmente a Comcur de Cincias tem grande dificuldade em

    conseguir professor(es) para essa disciplina.

    5. H um excesso de disciplinas pedaggicas, algumas de eficcia duvidosa e s vezes de superposio de atividades ou contedos. Neste caso pode-se citar as disciplinas:

    Seminrios de Ensino e Pesquisa em Ensino de Cincias e Projetos de Ensino de

    Cincias, ambas da quarta srie.

    6. Dependncia, do curso, em relao a um grande nmero de Departamentos uma outra fonte de dificuldades na gerncia do mesmo.

    7. O tipo de formao que o curso prope inviabiliza a possibilidade de seus graduados ingressarem em ps-graduao nas reas de Biologia, Qumica e Fsica.

    8. Na raiz de todos estes problemas, esto os fatos: a) desvalorizao deste profissional...b) o tipo de formao que ele deveria possuir est na contramo de

    uma tendncia irreversvel de especializao dos conhecimentos. A grosso modo,

    quem sabe Biologia no sabe Fsica, quem sabe Fsica no sabe Qumica..., as

    consequncias disso so visveis na qualidade do ensino de Cincias em nosso pas.

    (processo de Reformulao do Curso de Cincias Lic. 1. e 2. Graus Fsica

    3116.002183/95-59. p.1)

    Informaes constantes do processo de reformulao do curso arquivado na Pr-Reitoria de

    Graduao.

    A proposta apresentada em reunio pelo coordenador do curso era de uma

    reformulao mais ampla do curso de cincias, para tentar padroniz-lo com os demais

    cursos do pas. A proposio era de extinguir o curso de cincias e implantar as

    licenciaturas especficas juntamente com os bacharelados em fsica; em biologia e em

    qumica. Tal debate foi tenso e com ideias discrepantes em relao a fragmentar as

    cincias, sem a possibilidade de negociao entre os representantes da ComCur. Assim,

    naquele momento, optou-se por aprofundar o estudo com uma maior articulao nos

    respectivos departamentos, atravs dos representantes na ComCur de cincias.

    A ComCur de cincias reuniu-se novamente em 29/05/1995, para debater as

    propostas encaminhadas pelo departamento de cincias morfobiolgicas (DCMB) e pelo de

    fsica (DFIS). O departamento de qumica (DQ) no apresentou qualquer proposio, por

    acreditar na filosofia31

    que norteava o curso naquela poca e tambm porque tinha investido

    em contratao de professores para suprir as necessidades especficas da formao de

    professores em cincias. Portanto, o DQ discordava da criao de um curso de licenciatura

    e bacharelado em qumica e da extino do curso de cincias.

    31

    O curso de cincias, at aquele momento, tinha como foco a formao de professores com uma viso

    ampliada dos fenmenos da natureza. Procurava-se trabalhar o fenmeno para a compreenso do todo,

    integrando fsica, biologia e qumica.

  • 27

    Apesar das discordncias, a ComCur de cincias encaminhou ao COEPE duas

    propostas de reformulao: uma propunha a reviso da estrutura vigente do curso, de modo

    que se mantivesse a habilitao para o ensino fundamental e transformasse-o em

    licenciatura plena, para dar conta do aprofundamento dos conceitos necessrios a esse

    nvel de ensino; a outra proposio, por seu turno, recomendava a extino do curso

    vigente e a criao de trs novos: licenciatura e bacharelado em biologia, licenciatura e

    bacharelado em fsica e licenciatura e bacharelado em qumica.

    Consta em ata de reunio da ComCur de cincias, ocorrida em 29/05/1995, o

    estranhamento do coordenador do curso diante do posicionamento do DQ. Isso porque o

    professor considerava que a avaliao feita pela comisso sinalizava deficincias no curso

    vigente, as quais correspondiam a argumentos suficientes para que se propusesse a

    separao dos cursos. Os professores de qumica no concordavam, por no acreditar que,

    para superar as dificuldades apontadas, fosse necessrio fragmentar o curso de cincias.

    Assim, os representantes do DQ sustentaram o posicionamento de manter o curso atual,

    mas indicaram mudanas para solucionar as falhas apontadas no relatrio e se

    comprometeram a encaminhar ComCur de cincias um posicionamento oficial do

    colegiado do curso de qumica acerca de tal questo (Ata 180/95).

    Posteriormente, foi aprovada a proposta encaminhada pelo grupo de fsica, de um

    curso de licenciatura e bacharelado em fsica, com a finalidade de habilitar professores

    para o segundo grau, como tambm a proposta encaminhada pelo grupo de biologia, de um

    curso de licenciatura e bacharelado em biologia para habilitar professores para atuar no

    primeiro e segundo graus. O curso de licenciatura em cincias foi mantido

    provisoriamente, at a apresentao da proposta do departamento de qumica. No dia

    05/06/1995, a ComCur de cincias voltou a tratar da reformulao do curso (Ata 181/95),

    sendo que os representantes do DQ mantiveram o posicionamento contrrio extino do

    curso vigente.

    O departamento de fsica aprovou, por unanimidade, em 08/06/1995, a criao de

    dois novos cursos: curso de cincias biolgicas, bacharelado e licenciatura plena e o curso

    de bacharelado e licenciatura segundo grau em fsica, em substituio ao curso de cincias

    licenciatura primeiro e segundo graus (Ata 327/95).

    Em 13/06/1995, o departamento de qumica enviou ofcio (OF.075/95) Sub-

    reitora de Ensino e Pesquisa, o qual ratificava o posicionamento dos professores

    representantes na ComCur: Entendemos que as justificativas, as premissas que

    embasaram a formao do Curso de Cincias e seus objetivos, continuam vlidos, e

  • 28

    sugerimos a continuidade do curso com estudos para o seu aprimoramento. No havendo,

    portanto, a inteno de criarmos os cursos de bacharelado e licenciatura em qumica.

    A rearticulao do curso de biologia ocorreu em meio a negociaes conflituosas e

    no consensuais, o que promoveu uma tomada de deciso pela chefe do departamento de

    geocincias, ad referendum do colegiado, de aprovar a transformao do antigo curso de

    cincias em curso de bacharelado e licenciatura em cincias biolgicas habilitao

    primeiro e segundo graus.

    Foi encaminhado, pela ComCur de cincias, o Processo n. 23116.001385/95-38, de

    alterao curricular do curso de cincias. Este previa a criao de dois novos cursos:

    licenciatura e bacharelado em biologia habilitaes para o primeiro e segundo graus,

    licenciatura e bacharelado em fsica habilitao segundo grau, e a manuteno do curso

    de cincias habilitao primeiro grau e segundo graus. Os conflitos e as opinies

    contraditrias evidenciaram-se mais uma vez no ofcio encaminhado pela superintendente

    de graduao ao presidente do Conselho de Ensino, Pesquisa e Extenso (COEPE):

    Identificamos uma situao muito difcil, pois a ComCur de Cincias decidiu pela

    reformulao nos moldes j citados e somente o grupo da rea de Qumica no encaminhou

    proposta (OF.SUPGRAD - n. 063/95).

    A aprovao apertada da proposta (quatro votos a favor e trs contra), na comisso

    de curso de cincias, e o voto contrrio no relatrio da Cmara do COEPE so indcios

    contundentes da luta de foras que se estabeleceu. Consta do relatrio da Cmara:

    1) Que o Departamento de Cincias Morfobiolgicas aprovou em parte a

    proposta de reformulao; o Departamento de Educao e Cincias do

    Comportamento (DECC) manifesta-se contrrio reformulao. 2) Que a

    proposta fere os princpios filosficos da FURG (RES. 014/87) e a

    deliberao (37/90) do COEPE. 3) A contrariedade ao parecer 292/62 de

    um dos conselheiros do COEPE sobre formao pedaggica nas

    licenciaturas que destaca: A Licenciatura um grau apenas equivalente

    ao Bacharelado, e no igual a este mais a didtica como acontece no

    conhecido esquema 3+1. Ademais, por todos os ttulos

    desaconselhvel separar o como ensinar do que ensinar. A didtica

    no um moulin qui tourne en vide; a arte de ensinar alguma coisa a

    algum. 4) A contrariedade ao parecer 81/65 sobre Licenciatura de

    Primeiro Grau e as implicaes no processo de gesto, por parte de outro

    Conselheiro (OF.SUPGRAD n. 063/95)

    Aps a anlise dos argumentos citados, a cmara que avaliou o processo

    desaprovou a proposta e recomendou que fossem tomadas as medidas administrativas

    necessrias para resolver as falhas apontadas na avaliao do curso. Apesar do parecer da

    relatora representante da cmara no COEPE, a proposio foi aprovada em reunio do

  • 29

    referido Conselho, no dia 14/07/1995, conforme consta na Ata n. 274/95 e na Deliberao

    n. 034/95, do COEPE.

    Na Ata n. 281/95, de 14/11/1995, constam aprovadas as seguintes reformulaes:

    O curso de licenciatura plena em cincias de primeiro e segundo graus habilitao

    biologia, passou a ser curso de cincias biolgicas licenciatura e bacharelado (Processo

    n. 23116.002182/95-96); o curso de cincias licenciatura segundo grau habilitao fsica,

    transformou-se em curso de fsica licenciatura e bacharelado (Processo n

    23116.002183/95-96). Manteve-se em suspenso a reformulao do curso de cincias

    licenciaturas de primeiro e segundo graus habilitao qumica, aprovada em 20/11/1995,

    conforme Ata n. 282/95 (Processo n 23116.006390/95-55).

    O jogo de foras que se estabelecia estava em torno do desejo de muitos professores

    de criar os bacharelados especficos, o que fragilizava ainda mais as licenciaturas que,

    historicamente, vinham sendo desprestigiadas e delegadas a um segundo plano. Dessa

    maneira, acirrava-se a disputa entre licenciatura e bacharelado, reforada, ento, pela

    fragmentao da cincia. A luta de foras pendia para a fragmentao, pois o prprio

    parecer do COEPE evidenciava a despreocupao com a licenciatura no novo curso.

    Pesquisas realizadas posteriormente por conta do Subprograma para o Ensino de

    Cincias (SPEC), financiado pelo PADCT/CAPES, confirmaram o equvoco na

    reformulao dos cursos de licenciatura. Tal engano dava-se no sentido de que as

    rearticulaes privilegiavam a superespecializao e a fragmentao das reas de

    conhecimento, com consequente perda da viso orgnica32

    da cincia, to importante para

    que os estudantes do ensino fundamental compreendam os fenmenos estudados.

    Essa disputa entre o que mais importante, se os contedos conceituais culturais ou

    os pedaggicos, uma questo histrica que permeia os cursos de formao de professores

    desde a sua criao, no incio do sculo passado. A organizao e a implantao dos cursos

    de pedagogia e das licenciaturas (1939-1971) trazem a marca do paradigma resultante do

    Decreto-Lei 1190, de 04 de abril de 1939, do modelo que ficou conhecido como esquema

    3+1: trs anos para o estudo das disciplinas especficas (contedos cognitivos) ou "os

    cursos de matrias", na expresso de Ansio Teixeira, e um ano para a formao didtica.

    (Saviani, 2009).Tais questes ainda continuam tencionando a formao de professores,

    conforme podemos perceber nos debates seguintes.

    32

    Viso orgnica no sentido de considerar o fenmeno como um todo e no como a soma das partes. Um

    determinado fenmeno natural envolve aspectos biolgicos, fsicos e qumicos, os quais devem ser

    considerados em suas relaes para que o fenmeno seja compreendido em sua totalidade.

  • 30

    As problemticas historicamente no solucionadas, no que diz respeito aos cursos

    que formam professores para atuar na educao bsica, mobilizaram as discusses e os

    debates em torno da Lei de Diretrizes e Bases da Educao (Lei 9394/96) e dos Parmetros

    Curriculares Nacionais (PCNs). Nesse contexto, foram trazidos tona velhos e novos

    problemas da formao de professores, entre os quais, o despreparo dos professores recm-

    formados para enfrentar uma sala de aula e fazer a transposio didtica dos contedos

    conceituais, vistos de forma fragmentada e desconectada; o modelo de professor

    repassador ou transmissor de informaes existente no imaginrio dos estudantes das

    licenciaturas, o qual se perpetua e se reproduz no exerccio profissional; o esquema (3+1);

    a desvalorizao profissional; a sobrecarga de trabalho e a falta de tempo dos professores

    para se qualificarem.

    Na FURG, a complexa problemtica deixada pelas reformulaes das licenciaturas,

    nas dcadas de 80 e 90, como herana ao ensino de cincias para o nvel fundamental diz

    respeito aos professores de qumica ou de biologia, alguns dos quais atuam com uma viso

    restrita do especialista da rea especfica, sem conseguir dar conta da especificidade desse

    nvel de ensino. Isso ocorre porque os profissionais que atuam nas escolas, dando aula de

    cincias, em sua maioria, so os bilogos, os quais desconhecem os contedos de fsica e

    de qumica, ou so os qumicos, que desconhecem biologia e fsica. Dessa forma, os alunos

    saem do ensino fundamental com uma viso estreita dos conceitos de biologia ou de

    qumica e sem entender o fenmeno fsico, dependendo da formao do profissional que

    nele atua.

    A proposio do curso on-line de licenciatura de cincias tem, como desafio, alm

    da superao de alguns desses ns problemticos recm-apontados (ns que ainda

    continuam tencionando as propostas curriculares dos cursos de formao de professores)

    tambm outros, referentes educao on-line e apontados nesta tese.

    2.3. Histrico da EaD na FURG

    No Brasil, a EaD relativamente recente, em comparao aos Estados Unidos e a

    outros pases da Europa e da sia. Enquanto nos Estados Unidos e na Europa, na dcada

    de 70, ocorreram as primeiras iniciativas de aulas virtuais com o computador e a Internet

    como suportes miditicos, no Brasil, as iniciativas eram de transmisso via rdio, TV ou

    material impresso, e os projetos eram pontuais, relativos a cursos profissionalizantes. Isso

    ocorria pela defasagem tecnolgica e, muitas vezes, por entraves polticos. A oficializao

  • 31

    e a institucionalizao da EaD como possibilidade formal de educao, no Brasil,

    ocorreram na dcada de noventa do sculo XX, com a assinatura do Protocolo de

    Cooperao no. 003/93, entre o Ministrio da Educao e do Desporto (MEC) e o

    Ministrio das Comunicaes (MC), com a participao do Conselho de Reitores das

    Universidades Brasileiras (CRUB), do Conselho de Secretrios Estaduais de Educao

    (CONSED) e da Unio dos Dirigentes Municipais de Educao (UNDIME).

    O Protocolo visava cooperao mtua entre as partes para o desenvolvimento de

    um Sistema Nacional de Educao a Distncia; assim, comprometeu-se o MEC a

    estabelecer, juntamente com o CRUB, um consrcio de universidades, a fim de viabilizar

    tal inteno e desenvolver o Programa de Aprendizagem a Distncia. O programa visava

    educao contnua em nvel avanado e intermedirio e a capacitao dos professores, e

    objetivava implementar a pesquisa. Tal foi o embrio para o nascimento do BRASILEAD

    e para a ampliao dos programas de EaD pela Fundao Radiodifuso Educativa

    (SINRED) e pelas televises e rdios universitrias (BRASIL, 1993). Era o primeiro

    esforo formal por parte do governo na direo da capacitao de professores

    universitrios para o que ainda estaria por vir: uma revoluo na educao por conta das

    tecnologias digitais e das multimdias.

    [...] somente a partir da Lei n. 9.394/96 e regulamentaes posteriores, a

    educao a distncia passou a ser encarada como modalidade aplicvel ao

    sistema educacional brasileiro e no mais como um simples campo

    dedicado aos projetos experimentais ou paliativos emergenciais

    (PRETTO, 2008, p. 678).

    Apesar da defasagem espao-temporal em relao aos pases de primeiro mundo, a

    demora em regulamentar a EaD no Brasil teve algumas vantagens, no que diz respeito aos

    debates em torno das prioridades didtico-pedaggicas, principalmente nas universidades

    pblicas, que resistem educao de massas no modelo tradicional, informacionista.

    Podemos perceber que a EaD permeada por um dilema didtico, resultante do

    conflito de prioridades. Por um lado, a prioridade poltico-educacional da educao de

    massas e, por outro, a inteno didtico-pedaggica. Essa tenso nas polticas curriculares

    da EaD continua at a atualidade.

    Quanto maior a acessibilidade ao material impresso, de rdio e de

    televiso, proporcionada, por exemplo, pelo emprego dos meios de

    massa, tanto maior o nmero de estudantes e tanto mais espordica e

    escassa a interao direta e indireta entre docentes e discentes. Essa

  • 32

    situao, constatvel em grandes Universidades a distncia, criticada

    por muitos especialistas da educao a distncia (PETERS, 2010, p. 34).

    Nessa medida, as concepes de ensino e de aprendizagem configuram-se em

    arena de debates entre aqueles que defendem ou criticam a EaD. Os processos interativos e

    dialgicos so o cerne de tais conflitos e constituem-se em desafios para quem pesquisa e

    atua nessa modalidade educacional.

    O ingresso tardio na EaD promoveu o acesso, por parte dos pesquisadores

    brasileiros, a um cabedal de conhecimentos e pesquisas j realizadas em outros pases, o

    que nos possibilitou escolher de maneira mais consciente as formas interativas, facilitadas

    pelas TDICs. Nesse contexto, a FURG define como poltica adotar a educao on-line, que

    prima pela dialogicidade e que possibilita a constituio da inteligncia coletiva,

    uma inteligncia distribuda por toda a parte, incessantemente valorizada,

    coordenada em tempo real, que resulta em mobilizao efetiva das

    competncias. Acrescentemos nossa definio este complemento

    indispensvel: a base e o objetivo da inteligncia coletiva so o

    reconhecimento e o enriquecimento mtuo das pessoas, e no o culto de

    comunidades fetichizadas ou hipostasiadas. Uma inteligncia distribuda

    por toda a parte (...). Ningum sabe tudo, todos sabem alguma coisa, todo

    o saber est na humanidade (LVY, 2007, p. 28-29).

    Para que tal inteligncia coletiva acontea, preciso que se reconhea o outro

    como legtimo outro na convivncia (MATURANA, 2002b). Ou seja: preciso

    reconhecer o saber do outro, que o outro sabe coisas que eu no sei. Nesse sentido,

    importante estabelecer espaos de convivncia e cooperao em redes de conversao, uma

    fonte possvel de enriquecimento de meus prprios saberes. As concepes de ensino e de

    aprendizagem, s quais muitas instituies brasileiras tm aderido, primam pelos processos

    interativos e dialgicos; embora tambm haja uma tenso pela educao de massas,

    proveniente de uma demanda por ensino superior e tecnolgico. Essa tenso pode ser

    facilmente detectada na fala do nosso ministro da educao, veiculada no peridico O Dia

    e noticiada em Guia On-line de Educao a Distncia:

    "no temos professores disponveis no mercado para atender a demanda.

    Com a educao digital pretendemos dar conta desse grande desafio que

    o Ensino Mdio". As matrias nas quais isso poderia acontecer seriam as

    de Fsica, Qumica, Biologia e Matemtica. (Guia On-line de EaD, 2012)

    Ver na EaD uma forma de suprir a falta de professores, substituindo-os pela

    educao de massa, via utilizao das tecnologias digitais, em vez de valorizar o

    profissional da educao, motivos reais da sua escassez, um grave engano. No h

  • 33

    dvidas de que a necessidade por formao de professores e por qualificao, em todo o

    pas, imensa e a educao on-line pode auxiliar nessa tarefa, mas no para suprir a

    carncia de professores, j que ela no se sustenta sem professores qualificados e bem-

    remunerados. S quem pensa que educao se faz apenas com transmisso de informaes

    e autodidatismo, sem a riqueza dos processos interativos pode defender uma ideia de

    substituio dos professores pela tecnologia.

    Os primeiros registros relativos participao da FURG em alguma instncia

    oficial, no que tange EaD, ocorreram quando, junto a outras universidades brasileiras,

    constituiu-se o consrcio que originou a Universidade Virtual Pblica do Brasil

    UniRede33

    .

    Na poca da criao da UniRede, era visvel a desvantagem da FURG em relao

    a outras universidades que j haviam se aparelhado e qualificado para trabalhar na

    modalidade a distncia na era digital, quando aproveitaram o fomento do MEC atravs do

    Consrcio BRASILEAD. A partir de 2000, a FURG passou a coordenar o curso de

    extenso A TV na Escola e os Desafios de Hoje, no estado do Rio Grande do Sul (2000-

    2002), destinado aos professores da rede pblica da educao bsica, com o objetivo de

    qualific-los para o uso das tecnologias em sala de aula, com prioridades para a televiso e

    o vdeo (tecnologias unidirecionais que serviram para a educao de massas).

    Inicialmente, a FURG contava com o ncleo de informtica para apoio ao

    professor, pertencente ao CEAMECIM34

    , a fim de dar suporte ao curso, a partir de uma

    sala com cinco computadores, interligados em rede intranet. A ampliao do laboratrio,

    com a interligao na Internet, ocorreu para que fosse possvel viabilizar o curso TV na

    Escola e os Desafios de Hoje.

    A falta de espao e de infraestrutura no CEAMECIM para o bom funcionamento

    do curso mobilizou a equipe administrativa da FURG a transferir a coordenao regional

    do curso TV Escola e os Desafios de Hoje para o Centro de Formao e Orientao

    Pedaggica (CFOP). L havia estrutura mais adequada, com sala de TV e vdeos

    educativos, sala com dez computadores on-line, sala para atendimento individual aos 33

    A UniRede foi criada em dezembro de 1999, como um consrcio, com o nome de Universidade Virtual

    Pblica do Brasil. O objetivo desta era iniciar uma luta por uma poltica de estado para a democratizao do

    acesso ao ensino superior pblico gratuito e de qualidade, priorizar o processo colaborativo na produo de

    materiais didticos e ofertar nacionalmente cursos de graduao e ps-graduao. Hoje se configura em uma

    Associao de Universidades Pblicas, sem fins lucrativos, cuja finalidade promover o desenvolvimento

    cientfico e tecnolgico da Educao a Distncia. 34

    O Ncleo de Informtica foi criado no ano 2000, com o objetivo de capacitar professores em formao

    inicial e professores em exerccio no ensino fundamental e mdio para utilizar a Internet como recurso que

    possibilitasse a construo do conhecimento profissional docente; e pesquisar as relaes e implicaes das

    TIC na Educao Ambiental (FURG: 2000, p.16).

  • 34

    professores cursistas, sala de reunies para a equipe pedaggica e secretaria geral. O

    ncleo de informtica do CEAMECIM passou a ser usado pelos bolsistas, professores e

    alunos dos cursos de licenciatura que mantinham vnculo com o centro.

    O curso de extenso A TV na Escola e os Desafios de Hoje foi crucial para que

    a FURG mostrasse seu potencial de articulao entre as reas, tanto internamente, quanto

    em mbito regional. Em 2001, outro marco na FURG foi a criao do grupo de pesquisa

    Educao a Distncia e Tecnologia (EaD-TEC), tanto que a infraestrutura e a equipe que se

    constituiu nesse perodo foram o embrio do que mais tarde tornar-se-ia a Secretaria de

    Educao a Distncia (SEaD) da FURG. Com o incentivo e a vontade poltica dos

    dirigentes da instituio, a FURG permaneceu na coordenao do curso, em suas trs

    edies, de 2000 a 2002, quando o projeto finalizou. Os investimentos e os esforos

    empreendidos na poca produziram frutos: os professores, que haviam sado para se

    qualificar, retornaram FURG e assumiram a coordenao de outras aes demandadas

    pelas polticas pblicas para a EaD, bem como criaram o Grupo de Pesquisa EaD-TEC.

    Muitas dessas polticas foram conquistadas no enfrentamento e no embate, no mbito do

    consrcio UniRede, o que contribuiu de forma efetiva para a atual legislao referente

    EaD.

    Conforme definido no Art. 4 do seu estatuto, a UniRede:

    tem por finalidade promover o desenvolvimento cientfico e tecnolgico

    da Educao a Distncia, e por objetivos: a) desenvolver, mediante

    parcerias com instituies pblicas e privadas, projetos de ensino,

    pesquisa e extenso ligados Educao a Distncia; b) promover estudos

    e pesquisas na rea da Educao a Distncia e suas relaes com a

    sociedade; c) incentivar e realizar atividades de avaliao de estratgias e

    de impactos econmicos e sociais das polticas, programas e projetos

    cientficos e tecnolgicos relacionados Educao a Distncia nas suas

    mais variadas formas; d) difundir informaes, experincias e projetos de

    Educao a Distncia sociedade; e) promover a interlocuo,

    articulao e interao entre os mais variados setores para a proposio

    de polticas pblicas que visem democratizao do acesso educao

    por meio da Educao a Distncia; e f) atuar na melhoria dos programas e

    dos cursos ofertados pelas instituies associadas, no sentido de

    implementar medidas e padres de qualidade em Educao a Distncia

    (UNIREDE, 2011).

    A UniRede tem atuado substancialmente na proposio de polticas pblicas e na

    realizao de estudos que apoiam alguns programas, como o Pr-Licenciatura (PROLIC)35

    35

    O Pr-Licenciatura Programa de Formao Inicial para Professores dos Ensinos Fundamental e Mdio

    se insere no esforo pela melhoria da qualidade do ensino na Educao Bsica e realizado pelo Governo

    Federal, por meio do Ministrio da Educao (MEC), sob a coordenao da Secretaria de Educao Bsica

  • 35

    e o Sistema Universidade Aberta do Brasil (UAB)36

    . A participao de representantes da

    FURG nessa rede trouxe para a instituio avanos nas discusses sobre a EaD e novas

    perspectivas de participao em debates nacionais, o que potencializou e ampliou a

    abrangncia das aes da universidade, alargando as possibilidades de financiamento e a

    capacidade de articulao poltica.

    A concepo inicial do Sistema UAB surgiu nas reunies da UniRede e foi

    definida e implementada pelo MEC. A UAB foi instituda no ano 2006, pelo Decreto 5800,

    no qual constam os seguintes objetivos:

    I - oferecer, prioritariamente, cursos de licenciatura e de formao inicial

    e continuada de professores da educao bsica;

    II - oferecer cursos superiores para capacitao de dirigentes, gestores e

    trabalhadores em educao bsica dos Estados, do Distrito Federal e dos

    Municpios;

    III - oferecer cursos superiores nas diferentes reas do conhecimento;

    IV - ampliar o acesso educao superior pblica;

    V - reduzir as desigualdades de oferta de ensino superior entre as

    diferentes regies do Pas;

    VI - estabelecer amplo sistema nacional de educao superior a distncia;

    VII - fomentar o desenvolvimento institucional para a modalidade de

    educao a distncia, bem como a pesquisa em metodologias inovadoras

    de ensino superior apoiadas em tecnologias de informao e comunicao

    (BRASIL, 2006, p. 4).

    A Universidade Federal do Rio Grande FURG atua ativamente na UniRede, na

    UAB, e no Pr-Licenciatura, por meio da Rede Gacha de Educao a Distncia

    (REGESD)37

    , entre outras aes, tornando evidente sua ampla insero no cenrio nacional

    da modalidade de Educao a Distncia.

    Atualmente, a FURG oferece, no mbito da UAB, dois cursos de graduao

    (pedagogia e administrao de empresas), oito de especializao (Rio Grande do Sul:

    sociedade, poltica e cultura; especializao para professores de matemtica; educao

    (SEB) e da Secretaria de Educao a Distncia (SEED), bem como com o apoio e a participao da

    Secretaria de Educao Especial (SEESP) e da Secretaria de Educao Superior (SESu). 36

    Criada em 2006, a Universidade Aberta do Brasil um sistema integrado por universidades pblicas, o

    qual oferece cursos de nvel superior para camadas da populao que tm dificuldade de acesso formao

    universitria, por meio do uso da metodologia da Educao a Distncia. Atualmente, o sistema coordenado

    pela CAPES. 37

    A Rede Gacha de Ensino Superior a Distncia formada por oito universidades gachas, com o objetivo

    de viabilizar o oferecimento de cursos de graduao em licenciatura, na modalidade a distncia, por meio da

    utilizao e da otimizao de recursos humanos, tecnolgicos e materiais e de contribuir para o

    aprimoramento do processo de ensino, pesquisa e extenso nas reas relacionadas modalidade a distncia

    nessas Instituies de Ensino Superior (IES), tornando-os disponveis por meios iterativos, nos termos da

    legislao em vigor. Os cursos so oferecidos para professores leigos do sistema pblico de ensino, no

    mbito do Programa Pr-Licenciaturas, da Secretaria de Educao a Distncia, do MEC.

  • 36

    ambiental; tecnologias da informao e comunicao na educao; educao em direitos

    humanos; especializao em educao de jovens e adultos; aplicaes para a web e mdias

    na educao), dois de aperfeioamento (educao ambiental; e gnero e diversidade na

    escola), um curso de extenso (formao de professores: mediadores de leitura) e um curso

    de aperfeioamento (produo de material didtico para a diversidade PMDD). Est

    prevista para 2013 a oferta de dois novos cursos de licenciatura: letras: portugus-espanhol

    e cincias. Para uma universidade relativamente jovem, que iniciou as aes de EaD no

    ano de 2000, comportar um total de treze cursos pode ser considerado um avano

    significativo.

    A consolidao da EaD na FURG foi oficializada em 2007, com a criao da

    Secretaria de Educao a Distncia SEaD, cuja sede temporria situou-se no prdio do

    Centro de Formao e Orientao Pedaggica CFOP. Em pouco tempo, com o aumento

    do nmero de acadmicos e de cursos ofertados, o CFOP tornou-se um espao restrito, o

    que motivou a mudana da SEaD, no ano 2010, para um prdio prprio. O fato de o curso

    TV na Escola e os Desafios de Hoje ter iniciado com o grupo do CEAMECIM e parte

    dele constituir o grupo de pesquisa EaD-TEC possibilitou um trabalho heterrquico e

    colaborativo, evidenciado pelo desenho da estrutura da SEaD (Figura 1).

    Fig.1: Estrutura da SEaD38

    38

    Estrutura da SEaD proposta em dezembro de 2010, imagem produzida pelo ncleo de design e

    diagramao.

  • 37

    O organograma transcrito evidencia a dinmica de funcionamento coletivo da

    SEaD, o que j caracteriza a tendncia epistemolgica por uma educao on-line, na

    superao do modelo de EaD tradicional.

    Embora os profissionais que trabalham nessa secretaria, bem como os professores

    atuantes nos cursos tenham procurado preservar a caracterstica do trabalho coletivo, o

    veloz crescimento da modalidade de ensino em questo tende a fragmentar as aes,

    atitude contra a qual tentamos lutar atravs da manuteno do trabalho coletivo e dialgico.

    O volume de trabalho imposto aos professores universitrios, devido ao aumento de vagas

    para estudantes e presso exacerbada por publicao cientfica, tem contribudo para o

    isolamento dos profissionais, que no encontram mais tempo para dialogar.

    Foi um esforo contrrio a