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UNIVERSIDADE FEDERAL DA PARABA
CENTRO DE CINCIAS HUMANAS, LETRAS E ARTES
MESTRADO PROFISSIONAL EM LINGUSTICA E ENSINO
JAILSON DE LUCENA GOMES
O DISCURSO DA (E SOBRE) A HISTRIA: USO DA HISTRIA LOCAL E
REGIONAL NO PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM DE HISTRIA NO
6 ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL II
JOO PESSOA
2015
JAILSON DE LUCENA GOMES
O DISCURSO DA (E SOBRE) A HISTRIA: USO DA HISTRIA LOCAL E
REGIONAL NO PROCESSO DE ENSINO E APRENDIZAGEM DE HISTRIA NO 6
ANO DO ENSINO FUNDAMENTAL II
Dissertao apresentada ao Programa de Ps-Graduao em Lingustica e Ensino da Universidade Federal da Paraba, Campus I, no Curso de Mestrado Profissional em Lingustica e Ensino, como requisito para a obteno do ttulo de mestre.
Orientador: Prof. Dr. Onireves Monteiro de Castro.
JOO PESSOA
2015
G633d Gomes, Jailson de Lucena.
O discurso da (e sobre) a histria: uso da histria local e regional no processo de ensino e aprendizagem de histria no 6 ano do ensino fundamental II / Jailson de Lucena Gomes.-Joo Pessoa, 2015.
108f. Orientador: Onireves Monteiro de Castro Dissertao (Mestrado) - UFPB/CCHLA 1. Lingustica. 2. Lingustica e ensino. 3. Discursos
da/sobre histria. 4. Histria local e regional - ensino e aprendizagem.
UFPB/BC CDU: 801(043)
A Deus, por ter me dado sade fora para
superar as dificuldades.
Aos meus pais, Jos Gomes e Maria do
Socorro.
AGRADECIMENTOS
Primeiramente Deus que me deu sade fora para superar as dificuldades
seguir com dedicao e firmeza na construo desse trabalho, permitindo que tudo
isso acontecesse. Aos meus pais, Jos Gomes e Maria do Socorro pelo amor,
incentivo e apoio incondicional. Aos meus irmos sobrinhos, que, nos momentos
da minha ausncia dedicados ao estudo, sempre fizeram entender que futuro
feito partir da constante dedicao no presente. Agradeo ainda ao meu
orientador, mestre e amigo Onireves Castro, por ter me aceitado como orientando e
contribudo de maneira decisiva para a construo desse trabalho, como tambm
pelo suporte, correes incentivos perante o desafio de desenvolver um trabalho
numa rea diferente da sua. A coordenao, professores, equipe de apoio do
Curso de Ps-Graduao em Lingustica e Ensino da UFPB. Aos alunos da turma do
Mestrado, em especial a Mrcia Cardoso e Rosemare Gomes. A direo e
superviso e coordenao da escola CIEP I, pela compreenso, carinho e amizade.
A todos (as) que, direta ou indiretamente, contriburam para a realizao desta
dissertao.
Todo sistema de educao uma maneira poltica de manter
ou de modificar a apropriao dos discursos, com os saberes e
os poderes que eles trazem consigo.
(Michel Foucault)
RESUMO
Este trabalho apresenta propostas no sentido de tentar contribuir com o processo de ensino e aprendizagem dos educandos do 6 ano do Ensino Fundamental II. Mantemos uma reflexo sobre possibilidades de ensino que ponderem a construo de novas prticas discursivas em torno da disciplina Histria na perspectiva da interdiscursividade. Na construo da pesquisa tentamos uma caracterizao dos estudos do discurso, especialmente da Anlise de Discurso Francesa, com ancoragem terica Orlandi (2002/ 2007), Pcheux (1977/1999), Maingueneau (2014), Brando (2003), Ferreira, (2015), Maldidier (1994), Silva (2003), Gregolin (2004), Althier-Revuz (1982/1990), dentre outros. Na sequncia, para uma descrio analtica do discurso da Histria, enquanto cincia e desenvolvimento so consultados autores como Le Goff (1997), Ttart (2000), Bloch (2001), Nadai (1993), Schmidt (2012), Bittencourt (2011), Abud (2011); fazendo-se ainda essencial a compreenso das propostas e orientaes didticas trazidas nos manuais dos livros didticos: Saber e fazer Histria e Histria: sociedade & cidadania; nos Parmetros Curriculares Nacionais de Histria (PCN) e no Projeto Poltico Pedaggico (PPP) da escola. Em seguida, so apresentados os discursos socialmente cristalizados sobre a Histria com ancoragem em autores como Fonseca (1997), Ori (2006), Albuquerque (2007), Bittencour (2004), Amado (1990), Zamboni (1991) e Neves (2002), demonstrando a importncia do ensino de Histria no Ensino Fundamental, assim como o uso da Histria local e regional como elementos facilitadores no processo de ensino e aprendizagem. A partir dessas consideraes, um questionrio de entrevista semiestruturada foi pensado e aplicado com educadores e educandos do 6 ano, da escola CIEP I Patos/PB e, a partir de ento, foi elaborada uma proposta de interveno, via texto norteador, com objetivo de trazer uma ressignificao discursiva ao ensino da disciplina com o uso da Histria local e regional. Palavras-chave: Discursos da/sobre Histria; Histria local e regional; Ensino aprendizagem.
ABSTRACT
This paper presents proposals to try to contribute to the teaching and learning process of the students of the 6th grade of elementary school II. We maintain a reflection on teaching opportunities to consider the construction of new discursive practices around discipline history from the perspective of interdiscursivity. The construction of research tried a characterization of discourse studies, especially the French Discourse Analysis, with theoretical anchorage Orlandi (2002/ 2007), Pcheux (1977/1999), Maingueneau (2014), Brando (2003), Ferreira, (2015), Maldidier (1994), Silva (2003), Gregolin (2004), Althier-Revuz (1982/1990), among others. Further, for an analytical description of the discourse of history as a science and development are consulted authors such as Le Goff (1997), Ttart (2000), Bloch (2001), Nadai (1993), Schmidt (2012), Bittencourt (2011) , Abud (2011); making himself still essential to understand the proposals and didactic guidelines brought in textbooks textbooks: Know and Do History and History: Society & citizenship; History in the National Curriculum Parameters (PCN) and the Pedagogical Political Project (PPP) school. Then the speeches are presented socially crystallized on the History docks in authors such as Fonseca (1997), Oriya (2006), Albuquerque (2007), Bittencour (2004) Beloved (1990), Zamboni (1991) and Neves (2002 ), demonstrating the importance of history teaching in elementary school, as well as the use of local and regional history as enablers in the process of teaching and learning. From these considerations, a semi-structured interview questionnaire was designed and applied to teachers and students of the 6th year, the PFIC I school - Ducks / PB and from then on we created a proposal for intervention, via guiding text, in order to bring a discursive reframing the discipline of teaching with the use of local and regional history.
Keywords: Addresses / on history; Local and regional history; Teaching and learning.
LISTA DE ABREVIATURAS E SIGLAS
AD Anlise de Discurso
Anpuh Associao Nacional de Professores de Histria
Cades Campanha de Aperfeioamento e Difuso do Ensino Secundrio
FD Formao discursiva
LDB Lei de Diretrizes e Bases
IHGB Instituto Histrico e Geogrfico Brasileiro
Inep Instituto Nacional de Estudos Pedaggicos
PCN Parmetros Curriculares Nacionais
PNLD Plano Nacional do Livro Didtico
PPP Projeto Poltico Pedaggico
SAEB Sistema Nacional de Avaliao de Educao Bsica
SUMRIO
1 INTRODUO .................................................................................................................. 13
METODOLOGIA ................................................................................................................... 16
2 NOO SOBRE DISCURSO E SEUS ELEMENTOS CONSTITUTIVOS .................. 18
2.1 NOES SOBRE FORMAO DISCURSIVA .......................................................... 18
2.2 NOES SOBRE MEMRIA DISCURSIVA .............................................................. 20
2.3 DESENVOLVIMENTO DA ANLISE DE DISCURSO FRANCESA ......................... 22
2.3.1 Perspectiva atual da Anlise de Discurso Francesa ............................................... 25
3 UM DISCURSO DA/PELA HISTRIA: O QUE HISTRIA? ..................................... 29
3.1 Histria do ensino de Histria no Brasil: breve relato................................................. 34
3.1.1 Construo do cdigo disciplinar da Histria no Brasil (1838-1931) ..................... 36
3.1.2 Estabilizao do cdigo disciplinar da Histria (1931-1971) .................................. 39
3.1.3 Cdigo disciplinar da Histria em crise: 1971-1984 ................................................ 42
3.1.4 Restaurao do cdigo disciplinar da Histria: 1984-? ........................................... 43
3.2 ANALISANDO OS MANUAIS DOS LIVROS DIDTICOS DE HISTRIA E OS
INSTITUCIONAIS ................................................................................................................ 44
3.2.1 LD: Saber e fazer Histria: considerando o Manual do professor ......................... 45
3.2.2 LD: Histria: sociedade & cidadania: considerando o Manual do professor ......... 48
3.3 DISCURSO POLTICO EDUCACIONAL INSTITUDO .............................................. 52
3.3.1 Parmetros Curriculares Nacionais de Histria PCN ........................................... 53
3.3.2 Projeto Poltico Pedaggico (PPP): diretrizes curriculares ..................................... 58
4 POR UM DISCURSO SOBRE HISTRIA: a importncia do ensino de Histria nas
escolas .................................................................................................................................. 59
4.1 A IMPORTNCIA DO ENSINO DE HISTRIA LOCAL E REGIONAL ..................... 62
4.2 DISCURSO SOBRE A HISTRIA: ENTREVISTA SEMIESTRUTURADA .............. 65
4.2.1 Anlise das entrevistas .............................................................................................. 66
5 O ESTUDO DA HISTRIA NO 6 ANO: uma proposta de interveno ...................... 78
5.1 TEXTO NORTEADOR DA PROPOSTA ...................................................................... 78
5.1.1 Primeiro momento ...................................................................................................... 80
5.1.2 Segundo momento ..................................................................................................... 82
5.1.3 Terceiro momento....................................................................................................... 87
5.1.4 Quarto momento ......................................................................................................... 91
5.1.5 Quinto momento ......................................................................................................... 93
5.1.6 Sexto momento ........................................................................................................... 94
6 CONSIDERAES FINAIS............................................................................................. 96
REFERNCIAS .................................................................................................................... 99
ANEXOS ............................................................................................................................. 104
ANEXO 01 .......................................................................................................................... 105
ANEXO 02 .......................................................................................................................... 106
13
1 INTRODUO
Este trabalho se insere no contexto das pesquisas em Anlise do
Discurso, cujo objeto de anlise tem a preocupao no conjunto de discursos da
histria e sobre a histria, sobretudo, de cunho instrucional, por abordar questes
prticas para a vivncia escolar com preocupao especfica para o uso
(incluso) da Histria local e regional nas aulas de Histria no 6 ano do Ensino
Fundamental. Tem a preocupao de verificar como os discursos institucionais
propostos pelos Manuais para o ensino de Histria se colocam como
pressupostos para orientao do processo de ensino e aprendizagem e o que
consta nos mesmos que contempla a utilizao das fontes histricas locais e
regionais nessa disciplina.
Trata-se de um trabalho desenvolvido: i) com instrumentais
quantificados (como os manuais que fundamentam o ensino de Histria propostos
pelos rgos competentes e os que acompanham os livros didticos da disciplina
acerca do uso da Histria local e regional) e, a partir da anlise dos dados, ii)
pesquisa qualitativa, com vista a interpretao de impresses de educandos e
professores de Histria do 6 ano, do Ensino Fundamental II da Escola CIEP I
Centro Integrado de Educao de Patos (Dr. Jos Genuno/Napoleo Nbrega),
municpio de Patos, PB.
A proposta considera, no que expe Ferro (1983), ao ponderar que a
histria construda por uma dada sociedade, acerca dela mesma e de seus pares,
guarda forte relao com a histria ensinada em sala de aula, momento inicial da
formao social-histrica dos indivduos. A histria ensinada muda consoante s
transformaes do saber e das ideologias dominantes. Mais de perto, tais
mudanas so pautadas pelas alteraes da funo da histria na sociedade
(FERRO, 1983, p. 11).
A partir desse pressuposto e da proposta de desenvolvimento do
trabalho, entendemos ser necessrio conhecimentos e reflexes acerca da
caracterizao da anlise (de discurso) pcheutiana. Dessa maneira,
determinados aspectos, descritos por Charaudeau (2014), so relevantes para o
presente trabalho, tais como: i) orientao; constituir-se como uma forma de ao;
14
ii) interatividade; essencialmente contextualizado; assumido; e iii)
interdiscursividade.
Entre as categorias supracitados, a interdiscursividade encontra-se
como o ncleo da anlise (discursiva), visto que marca a presena e a
importncia de mltiplos discursos para se compreender um determinado
fenmeno discursivo pronunciado por um sujeito num dado contexto. O que
demonstra a importncia deste trabalho para a investigao de teias discursivas,
das quais encontramos a histria enquanto cincia, enquanto um saber que
ensinado nas escolas e a sua ocorrncia nas formaes discursivas dos
educandos (e educadores).
O saber histrico vivenciado nas escolas fruto de toda uma evoluo
scio-histrica e cultural da humanidade, assinalado, muitas vezes, pelo
atendimento s necessidades de pessoas ou grupos sociais dominantes. E
nessas condies surgiram grandes nomes e feitos que receberam inmeros
mritos pelas suas descobertas, conquistas e prticas polticas. Diante desse
contexto, foram criados discursos em torno da disciplina que produziram efeitos e
receberem influncias de modo a serem resinificados at os dias atuais.
A compreenso dos discursos que so construdos em torno da
Histria, no decorrer de sua constituio como disciplina curricular e sua
implicao na sala de aula, esta agrupada a uma anlise do discurso de um grupo
de educandos e professores em suas prticas dirias com a disciplina, podero
ser reveladores dos motivos que levam tantas pessoas a acreditarem que a
disciplina de Histria trabalha somente com a observao do passado.
A partir desse aspecto enxergamos a possibilidade de trazer uma nova
exterioridade discursiva ao ensino da Histria para o 6 ano do Ensino
Fundamental. Isso partindo da ressignificao discursiva dos educandos quanto
aos discursos cristalizados socialmente na memria discursiva, e, seguindo em
direo construo de novos discursos, que, por sua vez, implicaro novas
prticas e aes em relao disciplina de Histria.
Nessas condies, o presente trabalho pretende desenvolver uma
proposta de suporte para o ensino da Histria, a partir de uma ressignificao
discursiva da disciplina na prtica em sala de aula com a constituio de novas
prticas, buscando identificar os mltiplos discursos da Histria em suas mais
15
diversas acepes, como tambm os mltiplos discursos sobre a disciplina
apresentados por educandos e professores do Ensino Fundamental e, por tal,
compreender a formao desses discursos e seu reflexo no momento de
aprender Histria.
A construo da proposta de interveno foi precedida por algumas
etapas de delimitao terica, anlises e reflexes. O primeiro momento
desenvolveu-se a partir de uma caracterizao dos estudos do discurso, sua
evoluo e incidncia sobre a Anlise de Discurso Francesa - teoria de base que
fundamentar as anlises discursivas - com ancoragem terica em Orlandi (2002/
2007), Pcheux (1977/1999), Maingueneau (2014) Brando (2003), Ferreira,
(2015), Maldidier (1994), Silva (2003), Gregolin (2004), Althier-Revuz (1982/1990).
Demarcado o campo da Anlise de Discurso Francesa, a pesquisa
parte para uma descrio analtica do discurso da Histria enquanto cincia e
desenvolvimento na histria a partir de autores como Le Goff (1997), Ttart
(2000), Bloch (2001), Nadai (1993), Schmidt (2012), Bittencourt (2011), Abud
(2011); essencial a compreenso das propostas e orientaes didticas
trazidas: a) nos Manuais dos livros didticos: Saber e fazer Histria e Histria:
sociedade & cidadania, utilizados na escola; b) como tambm dos Parmetros
Curriculares Nacionais de Histria (PCN) que um documento oficial que norteia
as prticas de ensino aprendizagem e que serviro como base para a delimitao
do contedo a ser desenvolvido na proposta; c) igualmente do Projeto Poltico
Pedaggico (PPP) da escola.
No terceiro momento, so discutidas as possveis origens de alguns
discursos difundidos e cristalizados sobre a Histria com base em Fonseca
(1997), Ori (2006), Albuquerque (2007), Bittencour (2004), Amado (1990),
Zamboni (1991), Neves (2002).
Para atestar esses discursos sobre a Histria acerca desse terceiro
momento, desenvolvida uma entrevista semiestrutura que busca analisar os
discursos apresentados pelos educandos e professores. Como consequncia a
essa anlise, tem-se o desenvolvimento de uma proposta de ensino que aborda a
questo relativa ao trabalho com a Histria local e regional.
16
METODOLOGIA
O trabalho tem uma peculiaridade terico-analtica e prtica. No que se
refere ao princpio terico/analtico, debruou-se sobre o conjunto de discursos
prprios da Histria, tais quais esto manifestados nos livros usados para a
instruo de Histria e nos referenciais nacionais para o mesmo fim.
Compreendemos que existe um discurso estabelecido que determina o que seja
a Histria, um componente curricular e, para o qual, igualmente existem
elementos historicamente normatizados.
Por seu turno, sobre a Histria existem discursos, no institudos como
nos manuais, mas nas proposies dos sujeitos que recebem e repassam os
componentes estabelecidos para a instruo em termos de Histria. Tais
discursos de cunho imperativo (da e sobre a Histria), em se tratando de
questes prticas para nossa vivncia escolar, devero ser considerados para o
que pretendemos propor em se tradando do paradigma da Histria Regional e da
Histria Local como includas nos currculos escolares. importante esclarecer
que os modos de proceder de tais incluses serviu para a discusso posterior e,
consequentemente, elaborao de material instrucional especial para a finalidade
pretendida.
A partir da proposta metodolgica, o trabalho foi estruturado com uma
reviso da bibliografia que foi dividida em trs eixos. O primeiro abordar uma
fundamentao terica sobra a Anlise do Discurso (linha francesa), que constitui
o aporte terico de base para as anlises pretendidas. J o segundo, discorrer
sobre o discurso da Histria, a partir de demonstrao terica, que a descreve e
caracteriza enquanto cincia, considerando a importncia do seu saber, origens e
desenvolvimento. Por tal, so considerados Le Goff (1997), Ttart (2000), Bloch
(2001), Nadai (1993), Schmidt (2012), Bittencourt (2011), Abud (2011). Nessa
ocasio ser elencado o discurso da Histria e sua abordagem nos Parmetros
Curriculares Nacionais de Histria (PCN) e nos Livros Didticos utilizados pelos
alunos do 6 ano, do Ensino Fundamental da escola CIEP I (Centro Integrado de
Educao de Patos Jos Genuno e Napoleo Nbrega). Levando em
considerao que foi feito, parcialmente, um estudo descritivo e analtico do
contedo de tais documentos norteadores do ensino da Histria face o terceiro
17
ciclo e direcionado para o tratamento o ensino de Histria local e regional no 6
ano do Ensino Fundamental.
A organizao do corpus foi feita a partir da identificao de discursos
da Histria como postos nos Livros Didticos do 6 ano do Ensino Fundamental:
Saber e Fazer Histria e Histria sociedade & cidadania; e os demais
instrumentos de instruo escolares, que foram marcados, transcritos ou
digitalizados para o confronto com os referenciais da teoria de base (Anlise de
Discurso).
De um modo geral, a anlise dos dados ser desenvolvida a partir da
identificao dos discursos presentes no corpus e sua estruturao qualitativa,
desenvolvida a partir dos dados obtidos luz do arcabouo terico explicitado na
justificativa, e de contribuies a serem feitas pelo pesquisador proponente deste
projeto.
Por fim, o material documentado, bem como as respectivas anlises
sero organizadas em material textual de pesquisa e compor o componente
textual do estudo que se pretende construir sobre o tema, especialmente
escolhido, lembrando no ser a nica abordagem sobre o assunto, mas a possvel
em se tratando do estudo aqui pretendido: elaborao de material instrucional
para a incluso de temas regionais e locais no estudo de Histria no 6 ano do
Ensino Fundamental II do CIEP I Centro Integrado de Educao de Patos/PB
Jos Genuno e Napoleo Nbrega.
18
2 NOO SOBRE DISCURSO E SEUS ELEMENTOS CONSTITUTIVOS
Devido polissemia do termo discurso, na nossa sociedade,
encontramos vrias concepes para defini-lo. Na linguagem quotidiana, o
discurso entendido como uma mensagem. Trata-se do ato verbal de se dirigir a
um pblico, com o objetivo de comunicar ou expor algo, mas tambm de
persuadir.
Para as Cincias Sociais e para a Lingustica, o discurso uma forma
de linguagem verbal (conversao no seu contexto social, poltico ou cultural). J
a Antropologia e a Etnografia entendem o discurso como um evento de
comunicao. A filosofia, por sua vez, considera o discurso como sendo um
sistema social de pensamento ou de ideias.
Para entender a constituio do discurso em seus sentidos, incidimos
consideraes pertinentes ao conceito de discurso interligado ao de texto e
contexto. Seguindo o raciocnio de Orlandi (2002), entendemos que o discurso
viabilizado pela linguagem em interao, ou seja, efeito de sentidos entre
locutores. O contexto constitutivo da significao do que se diz e o discurso
lugar social. Nessa perspectiva, ponderamos o texto como unidade de Anlise do
Discurso, sendo de extenso, uma simples palavra at um conjunto de
enunciados. O que o define o fato de que o discurso uma unidade de
significao em relao uma situao. Sendo o texto um espao-tempo,
sociopoltico e cultural, um espao simblico, no fechado em si mesmo, tem
relao intrnseca com o contexto. E de acordo com as condies de produo, a
noo de contexto histrico deve ser considerada (Cf. ORLANDI, 2002, p. 21).
2.1 NOES SOBRE FORMAO DISCURSIVA
Pcheux (1990) e Robin (1977), assim como Foucault (2008), atravs
da Arqueologia do Saber entraram em contato com o conceito de Formao
Discursiva, reconfigurando luz do materialismo histrico, produzindo, nos
estudos sobre o discurso, uma mudana, em relao a sua concepo. No se
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pode mais ver o discurso fora das condies histricas de produo, visto que, o
lao que liga as significaes de um texto s suas condies sociohistricas, no
secundrio, mas constitutivo das prprias significaes (PCHEUX et all, 2008,
p.06), dados precisam ser analisados levando em considerao que se inscrevem
no cerne de determinadas condies de produo que so definidas em relao
histria das formaes sociais.
Para Pcheux (1997), a Formao Discursiva, doravante FD, est
fortemente relacionada com a noo de formao ideolgica, pelo menos no seu
incio, conseguinte da leitura feita dos "Aparelhos Ideolgicos do Estado" de
Althusser, quando explica o seu estreito lao com o marxismo. De tal modo,
Pcheux resume da seguinte maneira:
Chamaremos, ento, formao discursiva aquilo que, em uma formao ideolgica dada, isto , a partir de uma posio dada em uma conjuntura dada, determinada pelo estado da luta de classes, determina "o que pode e o que deve ser dito" (articulado sob a forma de uma alocuo, de um sermo, de um panfleto, de uma exposio, de um programa, etc.) (PCHEUX, 1997, p. 160).
O que indica que a ideologia materializada por meio dos discursos e
articulada por sujeitos. Veja-se que ao afirmar que as palavras, expresses,
proposies, etc., recebem seu sentido da formao discursiva na qual so
produzidas, que
diremos que os indivduos so interpelados em sujeitos-falantes (em sujeitos de seu discurso) pelas formaes discursivas que representam na linguagem as formaes ideolgicas que lhes so correspondentes (Op. cit. 160-161).
Diante do seguinte passagem, "S h ideologia pelo sujeito e para
sujeitos" (Op. cit. p. 149), para corroborar a ideia expressa acima, que Pcheux
conseguiu formular a ideia de que o sujeito interpelado pela ideologia que o
constitui. Ao assim dizer, expressa a ideia do assujeitamento; revelando que, ao
enunciar, todo sujeito fala a partir de uma FD e, dessa maneira, baliza uma
posio de sujeito, constituindo assim uma identidade enunciativa. citao
Conforme Maingueneau (2014), o posicionamento num dado campo
discursivo define mais precisamente uma identidade enunciativa forte: (discurso
do partido comunista de tal perodo, por exemplo), pode ser entendido como um
20
lugar de produo discursiva bem definido (MAINGUENEAU, 2014, p. 392).
Diante disso, consideramos que essa identidade que o sujeito conserva com a FD
no permite uma estabilidade cristalizada. Dessa maneira, Pcheux observa que,
em um segundo momento, diante da trajetria da Anlise do Discurso, uma FD
no um espao estrutural fechado, visto que peculiarmente invadida por
elementos que vm de outras FD, repetindo-se nela e fornecem suas evidncias
discursivas fundamentais, como por exemplo, sob a forma de pr-construdos e
de "discursos transversos" (PCHEUX, apud MAINGUENEAU, 2014, p. 241).
Com base nessa ancoragem que se coloca a ideia de interdiscurso,
que permite ao sujeito consolidar o seu discurso, o que marca a exterioridade, o
lugar anterior determinante do prprio discurso. Assim, o sujeito no s
materializa a ideologia como tambm o responsvel por ajustar os sentidos.
Contudo, esse ajuste no deriva da pura transparncia da linguagem. Isso ocorre
por que a ideologia cria a iluso no sujeito de que ele a fonte do seu dizer,
origem do sentido. Como afirma Pcheux:
o sentido de uma palavra, de uma expresso, de uma proposio, etc., no existe em si mesmo (isto , em sua relao transparente com a literalidade do significado) mas, ao contrrio, determinado pelas posies ideolgicas que esto em jogo no processo scio-histrico no qual as palavras, expresses e proposies so produzidas (isto , reproduzidas) (PCHEUX, 1997, p. 160).
2.2 NOES SOBRE MEMRIA DISCURSIVA
Ao nos debruarmos sobre o conceito de memria discursiva
compreenderemos recorrncia de enunciados, separando e elegendo aquilo
que, dentro de uma reserva histrica especfica, pode surgir e, assim, ser
atualizado no discurso ou rejeitado em um novo contexto discursivo, o que tem
capacidade de produzir efeitos peculiares. Para Maingueneau:
Fala-se, por vezes, de memria discursiva para explicar o aumento progressivo dos saberes compartilhados pelos interlocutores no decorrer de uma troca. Isso passa de maneira privilegiada pela anfora (MAINGUENEUA, 2014, p. 325).
21
Diante disso, no que corrobora a incluso de construes idealmente
como inerentes Histria, o sujeito histrico, sua memria etc.
Contudo, esta memria advm e reflete a sucesso dos efeitos de
sentido, como ressalta Orlandi (2007):
A memria, por sua vez, tem suas caractersticas, quando pensada em relao ao discurso. Este definido como aquilo que fala antes, em outro lugar, independentemente. Ou seja, o que chamamos de memria discursiva: o saber discursivo que torna possvel todo dizer e que retorna sob a forma do preconstrudo, o j dito que est na base do dizvel (ORLANDI, 2007, p. 31).
importante observar na proposta de Pcheux (1999), quando ressalta
que nos discursos no vamos encontrar transparncia, mas opacidade e um
determinado mutismo. No entanto, devemos tentar marginalizar as significaes
e, assim, procurar sentidos em construo na opacidade do discurso. Dessa
maneira, no estaramos agenciando a re-significncia da significao, visto que
isso no reverencia meramente a uma rejeio ao abandono do semntico, no
entanto idealizada no contexto terico-metodolgico da AD.
Podemos afirmar, por assim dizer, que as significaes, de tal modo
marginalizadas, o que ocorre tambm com a marginalizao da noo de sentido
literal, compem, a partir da sua formatao, em termos situacionais e temporais,
como parte componente da memria discursiva.
Adentrando os postulados da AD Francesa, observa-se que cada
sujeito, na produo de um discurso, estabelece uma relao do seu discurso em
consonncia com o interdiscurso ou memria discursiva, ou seja, com tudo aquilo
que, de fato, j foi dito. Para Pcheux (1999):
Tocamos aqui um dos pontos de encontro com a questo da memria como estruturao de materialidade complexa, estendida em uma dialtica da repetio e da regularizao: a memria discursiva seria aquilo que, face a um texto que surge como acontecimento a ler, vem restabelecer os implcitos (quer dizer, mais tecnicamente, os pr-construdos, elementos citados e relatados, discursos-transversos, etc.) de que sua leitura necessita: a condio do legvel em relao ao prprio legvel (PCHEUX, p. 52, 1999).
A naturalidade com que isso vai acontecer mostra que independe do
falante ter conscincia ou no dessa operao discursiva. Assim, o sujeito no seu
22
discurso fala uma voz sem nome, admiravelmente cortada e levada ao sabor da
ideologia e do inconsciente. Dessa maneira, a AD postula que esse saber, que
no pode ser ensinado, lana expressivas e importantes implicaes nos
discursos produzidos.
A possibilidade de toda formao discursiva lanar e operar
formulaes feitas e enunciadas anteriormente nasce justamente com a memria
discursiva. Por assim dizer, a memria discursiva que permite na infinita rede de
formulaes (que j existem no intradiscurso de uma dada formao discursiva) a
apario, a rejeio ou a modificao de enunciados que pertencem a formaes
discursivas posicionadas historicamente.
Diante disso o discurso assinala para o futuro e sustentado por outros
discursos, de tal modo que so as posies que produzem os sentidos. E assim,
a memria discursiva conjecturada em um dado momento scio-histrico e,
permitindo que o sujeito migre de uma situao emprica para uma posio
discursiva.
2.3 DESENVOLVIMENTO DA ANLISE DE DISCURSO FRANCESA
A anlise do discurso uma rea constitutivamente multidisciplinar,
desenvolvida a partir da dcada de 1960 com contribuies de vrias cincias.
Esta abordagem considera o discurso de diversas formas: como uma estrutura
verbal, um evento comunicativo cultural, uma forma de interao, um sentido,
uma representao mental ou um signo, por exemplo.
Na primeira metade do sculo XX, como observa Brando (2003, p. 1),
a lingustica viveu um perodo de entusiasmo, quando exerceu o papel de cincia
piloto das cincias humanas, fornecendo a partir do modelo fonolgico, uma
espcie de passaporte para as cincias humanas. Contudo, era determinada
pelos padres cartesianos e encontrava-se fechada no entendimento
estruturalista, colocando as opes saussurianas em questo e revendo-se aquilo
que havia sido posto de lado, especialmente o que se considerou como
pertencente ao domnio da fala. Havia uma inquietao diante da necessidade de
reintroduzir a questo do histrico.
23
Ainda, segundo Brando (2003), os estudos lingusticos foram, durante
muito tempo, delimitados pela problemtica colocada pela oposio lngua/fala
que estabeleceu uma lingustica da lngua. Prontamente se reconheceu que
uma lingustica imanente que se limitava ao estudo interno da lngua no dava
conta do seu objeto (BRANDO, 2003, p. 2). Reconhecendo a dualidade
constitutiva da linguagem, isto , do seu carter ao mesmo tempo formal e
atravessado por entradas subjetivas, sociais e histricas provoca um
deslocamento nos estudos lingusticos e, estudiosos incidem a buscar uma
compreenso do fenmeno da linguagem no mais centrada apenas na lngua,
cujo sistema ideologicamente neutro, mas num nvel tambm situado fora do
estritamente lingustico.
Para tentar superar esse impasse entre lngua/fala, procurou-se
elaborar uma nova teoria e, nesse percurso a maior parte das metodologias
continuaram presas a essa dicotomia, por acreditar que a problemtica pudesse
ser revolvida deslocando a questo para o polo da fala. Essas tentativas iniciais
para a elaborao de uma teoria do discurso sofriam da ausncia de definio de
seu objeto, resultante de uma referncia implcita ou explcita aos termos fala e
diacronia e, consequentemente, muitos modos de conceber o discurso.
Encontramos o primeiro modelo em um artigo de Harris (1952), citado
por Mainguenau, em que Haris entendia a anlise do discurso como a extenso
dos procedimentos distribucionais a unidades transfrsticas (MAINGUENAU,
2014, p. 43).
Segundo Brando (2003), a histria da Anlise do Discurso recebe
uma grande contribuio no ano de 1952, quando foi publicada a obra de Harris
sob o ttulo Anlise do Discurso. Assim a anlise dos enunciados, constituda na
configurao harrisiana,
[...] se apresenta como uma tentativa para elaborar um procedimento formal de anlise dos segmentos superiores frase, permitindo levar em conta relaes transfrsticas que podem ser observadas nos textos. Prope-se aplicar o mtodo da anlise distribucional praticado pela lingustica descritiva ao nvel da frase. Embora a obra de Harris possa ser considerada o marco inicial da anlise do discurso, ela se coloca ainda como simples extenso da lingstica. O procedimento analtico no visava a buscar o sentido do texto, excluindo qualquer reflexo sobre a significao e as consideraes scio histricas de produo,
24
que vo distinguir e marcar posteriormente a Anlise do Discurso de orientao francesa (BRANDO, 2003, p. 2).
O segundo modelo, da teoria da Enunciao, permitiu a elaborao de
um conceito que possibilitasse colocar, em relao lngua e fala, e constituiu a
tentativa mais importante para ultrapassar os limites da lingustica da lngua. Visto
que foi, como afirma Mainguenau:
A anlise de discurso no tem por objetivo nem a organizao textual em si mesma, nem a situao de comunicao, mas deve pensar o dispositivo de enunciao que associa uma organizao textual e um lugar social determinados (MAINGUENAU, 2014, p. 44).
As muitas tentativas dentro do modelo da teoria da Enunciao no
conseguiram superar uma lingustica restrita lngua, dessa forma, no atingiram
seu objetivo o de constituir um objeto realmente novo, o discurso. A esse respeito,
os estudos continuaram presos dicotomia saussuriana, considerando a questo
do discursivo fala, com exceo da histria, concebendo o sujeito de forma
idealizada, na sua unicidade e homogeneidade, como fonte criadora, origem do
sentido, sentido entendido como transparncia.
Brando (2003) cita Maldidier (1994), quando ressalta que nos anos
60, perodo do surgimento do estruturalismo triunfante, o projeto de Anlise do
Discurso est surgindo e, nesse quadro a lingustica promovida a cincia piloto.
Havia a emergncia de uma disciplina que mais tarde passaria a ser denominada
Anlise do Discurso (doravante AD) de linha francesa, centrada nas atuaes de
Jean Dubois e Michel Pcheux (MALDIDIER apud BRANDO, 2003, p. 5).
Na circunstncia terica em que a Frana encontrava-se nos anos
1968-70, momento em que surge o sentimento dos limites e do relativo
esgotamento do estruturalismo, nasce a AD, presidida pela lingustica e pelo
marxismo, tendo inscrito no seu projeto um objetivo poltico: usar a arma
cientfica da lingustica como um novo meio para abordar a poltica (Op. cite. p.
5). E, nos fins dos anos 70, a AD da primeira fase estava, de certa forma,
materializada nos trabalhos de pesquisa, em estudos concretos que lhe conferiam
realidade.
Considerado o ano de 1969, como o ponto de partida da AD, quando
foi publicada a obra de Michel Pcheux, que tinha como ttulo Anlise Automtica
25
do Discurso (AAD), igualmente pelo lanamento da revista Langages organizada
por Dubois, voltada para a contenda do sujeito homogneo, uno e dono do seu
dizer, sujeito esse defendido pelos seguidores da corrente estruturalista.
Ao edificar seus objetos discursivos, a AD procurou trabalh-los a partir
das orientaes de Pcheux, levando em considerao uma trplice tenso, entre
(1) a historicidade, (2) a interdiscursividade e (3) (novamente Saussure) a
sistematicidade da lngua. Um resumo do ensaio da AD de definio do seu
campo. Desse modo, os espaos discursivos das transformaes do sentido o
que vai, predominantemente, determinar o campo da AD, esquivando-se de
qualquer princpio constitudo a priori, de um trabalho do sentido sobre o sentido,
tomados no relanar indefinido das interpretaes (PCHEUX,1990, p.51).
A AD surge na esperana de interveno, de uma ao
transformadora, a partir de um prisma poltico, o qual segundo Ferreira (2015),
vai:
Abrir um campo de questes no interior da prpria lingustica, operando um sensvel deslocamento de terreno na rea, sobretudo nos conceitos de lngua, historicidade e sujeito, deixado margem pelas correntes em voga na poca (FERREIRA, 2015, p. 14)
2.3.1 Perspectiva atual da Anlise de Discurso Francesa
A primeira fase da AD estava, de certa forma, concretizada nos fins dos
anos 1970, a partir dos seus trabalhos de pesquisa e nos estudos palpveis que a
tornava real. Nesse quadro, a AD buscou construir um objeto, procurando ao
mesmo tempo aparelhos operatrios para trabalh-lo.
Aps 1975, tem incio uma segunda fase da AD. A abertura dessa nova
fase marcada pelas imprecises e incertezas que giram em torno de dois
perodos. Como aponta Maldidier (1994):
No campo da lingstica, a chegada tardia mas massiva, da pragmtica, da filosofia da linguagem , da anlise da conversao, a crise das lingsticas formais e o sucesso da lingstica da enunciao, a recepo de Bakhtin-Volochinov. Essa agitao traz referncias novas, abre possibilidades de recursos, favorece a emergncia de objetos novos (MALDIDIER, 1994, p.181).
26
Diante da acentuada crise do marxismo, no segundo perodo, entre
1978 e 1989, se delineia um novo inverno poltico. Em S h causa daquilo que
falha ou o inverno poltico francs: incio de uma retificao, Pcheux (1997)
reconhece que:
Intervir no Marxismo sobre a questo da ideologia, levantando questes sobre sua relao com a Psicanlise e com a Lingstica, ipso facto, mexer com uma espcie de Trplice Aliana terica que, na Frana ao menos, se configurou sob os nomes de Althusser, Lacan e Saussure no decorrer dos anos 60. Como se sabe o destino dessa Trplice Aliana , hoje mais do que nunca, extremamente problemtico, e at mesmo as partes do pacto so objetos de um verdadeiro bate-boca terico e poltico em que tudo se abre novamente a questionamentos (PCHEUX, 1997, p. 293).
Essa Trplice Aliana terica que se configurou na Frana, na dcada
de 1960, a partir de nomes como Althusser, Lacan e Saussure, com o objetivo de
articular entre si o campo do Marxismo, da Psicanlise e da Lingustica,
problemtico.
O trabalho de Marandin (1979) nessa fase assinala para uma nova
maneira de trabalhar em Anlise do Discurso. Sua contribuio inicial faz
referncia ao deslocamento da noo de Formao Discursiva (FD) com
elementos das formaes ideolgicas, integrada teoria do discurso, para o
campo onde Foucault havia formulado: o campo de saberes discursivos. Esse
retorno permite a reorientao da anlise para a particularidade do acontecimento
discursivo. J Deleuze passa a questionar repetio, observando a necessidade
de pensar o intradiscurso como lugar heterogneo de rupturas. Dessa maneira a
noo de heterogeneidade colocada nesse trabalho para fazer oscilao com a
noo de intradiscurso, o conceito terico de fio do discurso, na analogia com o
interdiscurso, e fazendo surgir questo da discursividade (Cf. SILVA, 2003).
Somente no ano de 1980, com a realizao do Colquio Matrialits
Discursives, o qual segundo Maldidier (2003), marca o incio da terceira poca da
AD. Nesse momento, os conceitos bakhtinianos recebem, de fato, o seu lugar na
Teoria do Discurso. Contudo, acredita-se que a entrada de Bakthin na AD se deu
no segundo momento, visto que ao conjuntura que aparelha as suas condies
dar incio a se configurar nesse perodo.
27
No segundo momento da AD inicia-se o movimento em direo
heterogeneidade, ao Outro [...] (GREGOLIN, 2004, p. 62). Nesse momento o
conceito de interdiscurso ganha cada vez mais notoriedade nos trabalhos que
estavam sendo realizados com anlise de corpus, isso gerava problemas tericos
e prticos para os analistas do discurso. Assim podemos ressaltar que os
primeiros trabalhos que contribuem para fortalecer esse conceito foram, como
indica Maldidier (2003), as teses de Marandin (1978) e Courtine (1981), que
pregavam a obrigao de apreender a relao do intradiscurso com o
interdiscurso, criticando os trabalhos anteriores.
Observa-se que essa discusso gira em torno da problemtica da
ausncia de fronteiras entre um interior e um exterior do discurso, como
presena-ausncia do outro no mesmo sentido. Com relao a isso, retoma-se s
noes de fragmento de um discurso e inconsistncia de uma FD (Courtine);
discurso do outro no mesmo (Authier); irredutibilidade da lngua no discurso de
um sistema conceptual (Rey); domnio ideolgico como efeito do interdiscurso no
intradiscurso (Courtine e Marandin) (PCHEUX apud SILVA, p. 6. s/d).
A Llingustica comea a defender o pressuposto de que os discursos
so heterogneos e no homogneos partir da tese de Bakthin, que ressalta que
os discursos so formados por outros discursos anteriores a eles, como tambm
que h vozes diversas que se orquestram nesse discurso. Lembrando que essa
homogeneidade tratada nas anlises anteriores pode ser entendida como apenas
um efeito, uma dissimulao.
Authier-Revuz, ao analisar esse dialogismo caracterstico de todo
discurso, sob o ponto de vista do discurso, assegura que as vozes que dialogam
nesse quadro so das formaes discursivas marcadas que competem entre si no
jogo ideolgico (AUTHIER-REVUR, 1982). Essa concepo se incorpora a de
Courtine (1981), no momento em que afirma que as formaes discursivas no
so fechadas, visto que so fronteiras que se arrastam. Por assim dizer, o
interdiscurso o conjunto dos discursos em afinidade, que vem de diferentes
formaes discursivas e compem a matria da qual se formam os discursos
variados. Assim, os discursos so heterogneos, devido ao fato de serem
constitudos de diversos discursos.
28
A noo de polifonia de Bakhtin, no cerne da Teoria do Discurso, foi
deslocada para a de heterogeneidade discursiva e o discurso polifnico comea a
ser tratado como heterogneo. Ainda, segundo a noo de polifonia no discurso
se fazem ouvir diferentes vozes. E, com relao noo de heterogeneidade, as
diferentes posies-sujeitos, gravadas em formaes discursivas contrrias so
elementos constitutivos do discurso.
Authier-Revuz interpreta os conceitos bakhtinianos do ponto de vista da
AD, como tambm da Psicanlise lacaniana. Segundo essa mesma autora, o
discurso de um sujeito constitudo pelos discursos que lhe antecederam,
contudo esses discursos so do Outro, da ordem simblica, e no dos sujeitos
enquanto indivduos empricos, visto que:
[...] sempre sob as palavras, outras palavras so ditas: a estrutura material da lngua que permite que, na linearidade de uma cadeia (discursiva), se faa escutar a polifonia no intencional de todo discurso (AUTHIER-REVUZ, 1990, p. 28).
A concepo de sujeito de Authier-Revuz e da AD diferente da que
Bakhtin trabalha, visto se ampara a partir da ideia de um sujeito inconsciente,
cindido e assujeitado pela ideologia.
29
3 UM DISCURSO DA/PELA HISTRIA: O QUE HISTRIA?
Partindo do pressuposto de que a Histria tem uma histria, como
observa Hildesheimer (1994, p. 11), e da necessidade de se entender que existe
um discurso prprio e inerente mesma, o qual no novo e nem de fcil
compreenso, que trazemos um breve relato sobre esse discurso da Histria.
Nessa conjuntura, comeamos a destacar uma das formas mais
utilizadas para dividir a evoluo do "Processus" histrico, que se d em trs
fases distintas: a primeira fase, denominada de Pr-cientfica, engloba as
historiografias Grega, Romana, Crist-medieval e Renascentista; a segunda, fase
de transio, se destacam a historiografia Racionalista ou Iluminista e a
historiografia Liberal e Romntica e, por fim, a terceira fase, conhecida como
cientfica, onde encontramos o Positivismo, o Historicismo, o Materialismo
Histrico, no sculo XIX, e a escola dos "ANNALES"1 e a Nova Histria2, em
pleno sculo XX; mas afinal, o que histria?
A tentativa de esclarecer ou responder a esse questionamento
motivou-nos a dialogar com as vrias definies e concepes sobre o que
histria. Dessa forma, procuramos observar e discutir o olhar de vrios tericos
acerca do tema. Podemos concordar que normalmente costuma-se considerar
que funo da Histria estudar o passado. Acrescentando a isso, devemos
conhecer o passado para no errarmos no presente e construirmos um futuro
melhor. um dos muitos discursos tidos como prprios da Histria.
Para Jaques Le Goff (1997), o nascimento da cincia histrica na
Antiguidade, teve sua principal representao com Herdoto que considerado o
pai da histria, ressaltando que,
1 A criao da revista dos Annales resulta da dupla mutao que perturbou tanto a situao mundial no ps-
1914-1918, quanto o campo das cincias sociais. Alis, encontraremos essa dupla influncia na origem de
cada inflexo notvel ocorrida na evoluo do discurso dos Annales. Como disse Benedetto Croce: Toda
histria histria contempornea (Cf. DOSSE, 1994, p. 21).
2 A expresso a Nova Histria mais conhecida na Frana. La nouvelle histoire o ttulo de uma coleo de
ensaios editada pelo renomado medievalista francs Jacques Le Goff (Cf. BURKE, 1992, p. 09).
30
a cincia histrica se define em relao a uma realidade que no nem construda nem observada como na matemtica, nas cincias da natureza e nas cincias da vida, mas sobre a qual se "indaga", se "testemunha". [...] Assim, histria comeou como um relato, a narrao daquele que pode dizer "Eu vi, senti". Este aspecto da histria-relato, da histria-testemunho, jamais deixou de estar presente no desenvolvimento da cincia histrica. Paradoxalmente, hoje se assiste crtica deste tipo de histria pela vontade de colocar a explicao no lugar da narrao, mas tambm, ao mesmo tempo, presencia-se o renascimento da histria-testemunho atravs do "retorno do evento' (Nora) ligado aos novos media, ao surgimento de jornalistas entre os historiadores e ao desenvolvimento da "histria imediata" (LE GOFF, 1997, p. 09).
Em pleno sculo V a.C., que Herdoto de Halicarnasso fez, pela
primeira vez, uma tentativa de investigao do passado, procurando eliminar o
mximo os aspectos mitolgicos que eram constantes nos relatos. Dessa forma, a
histria pr-se a repudiar o estudo das coisas divinas e comea a preocupar-se
com as coisas humanas. Herdoto buscou alm desse fator, estabelecer uma
causalidade3 ente os fatos histricos e os motivos que os determinavam. Ao levar
em considerao que esse fator de importncia e considerarmos que essa
forma de atuao, este aspecto, no e inata ao pensamento grego. Assim afirma
Ttart (2000), com relao ao ttulo da sua obra, da qual,
[...] revela sua evoluo em relao aos loggrafos. Pois, esta significa investigao, pesquisa, informao. Reconstruindo acontecimentos atravs de depoimentos escritos e orais, inaugurando a tradio da histria factual detalhada (TTART, 2000, p. 13).
Ainda segundo Ttart (2000), a tentativa de Herdoto a de querer
reconstruir a histria para que o tempo no apague os trabalhos de outros
homens, levando em considerao que as grandes aes realizadas seja pelos
gregos, seja pelos brbaros, no caiam no esquecimento. Assim, recusou o
helenocentrismo e destacou a necessidade de conhecimento do outro,
construindo por assim dizer um lugar diferencial para a histria em que eleva
posio de saber patrimonial e universalista (TTART, 2000, p.14).
3 s.f. Filosofia. Condio segundo a qual uma causa produz um efeito.
Princpio de causalidade, relao necessria entre a causa e o efeito. (Enuncia-se: "Todo fato tem uma
causa, e as mesmas causas produzem, nas mesmas condies, os mesmos efeitos."). Cf.
http://www.dicio.com.br/causalidade
31
Encontramos, alm de Herdoto, outros personagens importantes na
historiografia grega, dos quais podemos destacar: Tucdides e Polbio. Com
Tucdides encontramos a importncia pelo rigor que coloca na seleo dos
testemunhos,
aperfeioa um enfoque que favorece o amadurecimento do gnero histrico. Atravs da preponderncia da cadeia factual e causal criticando as fontes, restabelecendo os fatos, organizando-os e analisando-os (Op. cite. p. 15).
Com Polbio, faz-se a transio da tradio historiogrfica para os
Romanos, destacando-se especialmente de entre estes, Tito Lvio e Tcito.
Contudo, faltou claridade historiografia romana e em termos concretos pouco
evoluiu se levarmos em considerao os helnicos.
[...] encara a histria como um exerccio rigoroso de interpretao do passado. Por preocupao com a exatido e por desprezo pelos compilaes simples, Polbio considera que toda boa histria s pode sair de uma memria viva: ou seja, para ele o essencial ter vivido os acontecimentos que descreve. Para isso utiliza sua prpria experincia e os depoimentos dos exilados que encontra em Roma (Op. cite. p. 17).
Na sua histria de Roma, Tito Lvio ainda vislumbra a introduo de
algum mtodo na investigao dos fatos, enquanto com Tcito e a sua
perspectiva pedaggica, encontramos um relato contaminado de parcialidade e
preconceitos. Podemos afirmar, numa anlise geral, que a historiografia greco-
romana se caracteriza por um sentido pragmtico, didtico e principalmente pelo
surgimento de um esprito de exaltao nacional. A Histria com Herdoto e
Tucdides apresentava caractersticas regionalistas e com os seus seguidores
assumia uma perspectiva universal.
Ressaltamos que o trabalho do historiador, seja na pesquisa ou no
ensino no estabelecer verdades absolutas, definitivas e acabadas. O prprio
significado da palavra histria, segundo sua etimologia, refere-se viso do
histor, aquele que v, indicando a fragilidade para a iluso to difundida de que
o historiador registra verdades absolutas (LE GOFF, 1990, p. 17). A esse respeito,
Jaques Le Goff procurou investigar o sentido original da palavra Histria e
registrou que:
32
A palavra histria (em todas as lnguas romnicas e em ingls) vem do grego antigo histoire (...). Esta forma deriva da raiz indo-europia wid-, weid 'ver'. Da o snscrito vettas 'testemunha' e o grego histor 'testemunha' no sentido de 'aquele que v'. Esta concepo da viso como fonte essencial de conhecimento leva-nos idia que histor 'aquele que v' tambm aquele que sabe; historein em grego antigo 'procurar saber', 'informar-se'. Historie significa pois "procurar". este o sentido da palavra em Herdoto, no incio das suas Histrias, que so "investigaes", "procuras" [cf. Benveniste, 1969, t. II, pp. 173-74; Hartog, 1980]. (LE GOFF, 1990, p. 17).
Ainda segundo Le Goff (1990), encontramos nas lnguas romnicas e
em outras o termo 'histria' exprime dois ou mais consideraes diferentes. Tais
como: esta procura das aes realizadas pelos homens (Herdoto) que se
esfora por se constituir em cincia, a cincia histrica; e, em seguida, observa
que o objeto de procura o que os homens realizaram. O autor ainda coloca a
definio de outro terico, Paul Veyne, onde o mesmo ressalta que a histria
quer uma srie de acontecimentos, quer a narrao desta srie de
acontecimentos (VEYNE apud LEGOFF, 1997, p. 19). E dessa maneira observa
que a histria pode ter ainda um terceiro sentido, o de narrao. Verdadeira ou
falsa, a histria uma narrao com base na realidade histrica ou puramente
imaginria pode ser uma narrao histrica ou uma fbula.
Recorrendo aos historiadores para entender melhor o papel da Histria
como cincia humana, podemos comear com o historiador ingls Marc Bloch, um
dos principais nomes da rea que considera que o passado no o objeto de
cincia, visto que, o objeto seria o prprio homem, por assim dizer, a Histria
seria a cincia dos homens no tempo (BLOCH, 2001, p. 52).
De tal modo, entendemos que, no centro das preocupaes, est a
questo do tempo (histrico) como conceito fundamental para a rea e essa
perspectiva coloca o homem (no o indivduo, mas a sociedade) no cerne das
preocupaes do historiador. Portanto, o passado, mesmo sendo o componente
fundamental e objeto da anlise histrica, no pode ser considerado como um
modelo para o presente.
Ainda segundo o historiador Marc Bloch, A incompreenso do
presente nasce fatalmente da ignorncia do passado (Op. cite. p. 65).
Ressaltamos que no adianta conhecermos o passado se no sabemos o
presente. Por assim dizer, no se pode perder de vista o compromisso com os
33
problemas e indagaes do tempo presente cujas respostas esto no passado
para um futuro. Dessa forma, o historiador, em seu trabalho de investigao, deve
utilizar o mtodo do duplo movimento: conhecer o passado atravs do presente e
conhecer o presente atravs do passado. A histria, assim como as outras
cincias tem seus mtodos e objetos de estudo. So esses mtodos que
possibilitam a compreenso da realidade, quando se elabora um conhecimento, o
qual est constantemente sendo reavaliado e, proporciona no apenas a reflexo,
mas tambm a ao na vida em sociedade.
A histria aborda uma realidade constituda do passado histrico da
humanidade e que no pode ser diretamente experimentado pelo observador,
sendo por assim dizer um saber perspectivo. Dessa maneira uma cincia que
comporta uma multiplicidade de interpretaes e de perspectiva sobre os
fenmenos estudados pelos historiadores.
Com Auguste Comte so lanadas as bases do Positivismo que, como
afirma Colingwood (1986), sua teoria lanou as bases do Positivismo para a
Histria, a qual seria a aplicao da filosofia s cincias da Natureza, pois,
segundo as suas palavras: os positivistas tentavam fazer da Histria no uma
Filosofia, mas uma Cincia emprica como a Meteorologia (COLINGWOOD,
1986, p, 2).
Constitui-se um mtodo que ainda hoje , na sua essncia, utilizado e
a fim de contradizer a subjetividade romntica, a funo do historiador passa a
traduzir-se na pesquisa dos fatos (pesquisa particularmente cuidada) e na sua
subsequente organizao, fazendo a sua exposio atravs de uma narrativa to
impessoal quanto possvel. Isto porque o rigor do Positivismo no seria, a
exemplo de alguns historiadores como Ranke, Marx e Engels, integralmente
aplicvel s cincias humanas, assiste-se ao nascimento de um movimento
denominado Historicista, quando passa a dedicar grande ateno subjetividade
e a interpretao, embora aproveitando muito do mtodo positivo.
A Histria, uma vez que a exemplo dos positivistas, no deveria ser
interpretada, mas redescoberta, passa a constituir um processo pleno de
subjetividade. De alguma maneira Ranke, quem indica a evoluo da qual se ir
seguir, ao dar grande importncia ao aspecto econmico na evoluo das
sociedades, como ressalta Reis (1996), acerca de Ranke:
34
[...] baseava-se principalmente nos documentos diplomticos para fazer a histria do Estado e de suas relaes exteriores, pois acreditava que as relaes diplomticas determinavam as iniciativas internas do Estado (REIS, 1996, p. 11).
Contudo, essa tendncia s se concretiza com o aparecimento do
Materialismo Histrico de Marx e Engels. Esses tericos defendiam que a
Histria compe, em essncia, uma descrio da luta de classes cuja premissa
ope explorados e exploradores. A economia passa a constituir um aspecto de
importncia central para a evoluo das sociedades, especificamente no que se
refere ao monoplio dos meios de produo (ARAJO, 2015, p. 244).
Marx divide a Histria em cinco grandes fases: Primitivismo;
Escravismo; Feudalismo; Capitalismo; A Ditadura do Proletariado e introduz a
noo de descontinuidade do processo histrico (2015, p. 224). O Homem passa
a ter um papel mais modesto, de tal modo que o estudo das massas tornou-se
mais respeitado. H um aproveitamento da filosofia Hegeliana (Tese-Anttese-
Sntese), contudo, Marx e Engels apenas se apropriaram da dialtica de Hegel a
sua medula racional, e assim, abandonaram o revestimento idealista hegeliano
desenvolvendo a dialtica, puderam dar-lhe a forma cientfica que conhecemos
(2015, p. 245).
Atravs de vrias fontes, tais como: achados arqueolgicos, escritos,
gravaes, entrevistas, entre outros, os historiadores constroem a Histria.
Determinadas abordagens tornam-se mais frequentes em alguns perodos do que
em outros e dessa forma o estudo da Histria acaba apresentando tradies e
modismos. A Histria surgiu juntamente com a escrita, contudo a ideia de se
estudar o passado ou de deixar para a posteridade um registro da memria algo
mais complexo. Tais postulados, conforme nosso entender, constituem um
arcabouo de ideias prprias da Histria e, por tais (tal) um discurso da Histria.
Afinal, importante relatar sobre os ditames do ensino e, especialmente, o ensino
da Histria em termos de Brasil. Ser o nosso objeto de trabalho a seguir.
3.1 Histria do ensino de Histria no Brasil: breve relato
35
Para tentarmos entender a constituio do percurso do ensino de
Histria no Brasil devemos considerar que aps a Independncia, tentou-se criar
uma genealogia da nao, e, para isso, foi elaborada uma histria nacional,
quando tinha como matriz a Europa. Como ressalta Nadai (1993), o ensino de
Histria no Brasil no era diferente do da Histria Universal:
O estudo da Histria do Brasil iniciava-se no primeiro ano e perdura at o sexto e no era diferente do da Histria Universal. Seguia-se a cronologia poltica, partindo das descobertas martimas e geogrficas dos portugueses e espanhis nos sculos XV e XVI e atingia o estudo da idia republicana no Brasil. Seu triunfo em 15 de novembro de 1889 (NADAI, 1993, p. 148).
No decorrer das dcadas de 1930 e 40, por meio de uma poltica
nacionalista e desenvolvimentista, o Estado criou as faculdades de Filosofia no
Brasil, formando professores e educadores, consolidando-se uma produo de
conhecimento cientfico autnomo no Pas. Esse trajeto do ensino de Histria no
Brasil, de acordo com Schmidt, insere-se no conjunto de estudos sobre o campo
da Histria das disciplinas escolares, o que chama a ateno de historiadores,
assim como atestam os trabalhos de Terrise (2001) que assinalam a construo
de um campo especfico de conhecimento, a partir do conceito de referncia
(TERRISE apud SCHMIDT, 2012, p.75).
Com base em Schmidt (2010), a peculiaridade do campo do ensino de
Histria estabelece a necessidade de se analisar a natureza desse conhecimento
e sua relao com as culturas escolares. A historiadora citando Rsen (1994),
demonstra que os trabalhos do pesquisador podem servir como referncia para a
construo de um dilogo entre o ensino da Histria e as perspectivas dessa
cincia, considerando a categoria de cultura histrica.
Para esse autor, cultura histrica pode ser considerada uma categoria de anlise que trata dos fenmenos relacionados ao papel da memria no espao pblico, referindo-se ao (RSEN apud SCHMIDT 2012. p. 77).
O processo de constituio da Histria, como disciplina no Brasil,
aconteceu igual o da Alemanha, o que vem a ser confirmado pela cultura escolar
e pela cultura histrica numa perspectiva relacional e dialtica. De tal modo,
quando aconteceu a institucionalizao e profissionalizao da Histria, a didtica
36
da Histria, os historiadores passaram a dar importncia a sua profisso em
detrimento da questo do ensino aprendizagem de Histria.
A partir de investigaes realizadas em Manuais propostos para os
professores e nas propostas curriculares produzidos no Brasil, foram
sistematizados elementos para constituio de uma periodizao do ensino de
Histria no Brasil, que pode ser dividida da seguinte maneira: a) construo do
cdigo disciplinar da histria no Brasil (1838-1931); b) estabilizao do cdigo
disciplinar da histria (1931-1971); c) cdigo disciplinar da histria em crise (1971-
1984); d) restaurao do cdigo disciplinar da histria (1984-?). Tudo isso veio a
culminar na construo de um cdigo disciplinar da Histria no Brasil, conforme
trataremos no tpico seguinte.
3.1.1 Construo do cdigo disciplinar da Histria no Brasil (1838-1931)
A partir da criao do Colgio D. Pedro II, no Rio de Janeiro, em 1837,
na regncia de Arajo Lima, observa-se que o ensino de Histria passou a ser
obrigatrio no Brasil e sua inspirao foi o modelo francs. Como observa Nadai
(1993):
a Histria da Europa Ocidental fosse apresentada como a verdadeira Histria da Civilizao. A Histria ptria surgia como seu apndice, sem um corpo autnomo e ocupando papel extremamente secundrio. Relagada aos anos finais dos ginsios, com nmero nfimo de aulas, sem uma estrutura prpria, consistia em um repositrio de biografias de homens ilustres, de datas e de batalhas (NADAI, 1993, p. 146).
E como observa Schmidt (2012), no ano seguinte, foi construdo o
cdigo disciplinar da Histria, que tem como marco inicial a construo do Colgio
Dom Pedro II:
A construo do cdigo disciplinar da Histria no Brasil tem como marco institucional fundador o Regulamento de 1838 do Colgio D. Pedro II, que determinou a insero da Histria como contedo no currculo (SCHMIDT, 2012, p. 78).
37
Nessa poca, de acordo com o modelo francs, havia um predomnio
dos estudos literrios que se voltava para um ensino clssico e humanstico e se
destinava aos elementos pertencentes s elites brasileiras. Como ressalta
Mathias (2011) citado por Bittencourt:
A histria ensinada era a histria exclusiva da elite branca, voltada para a Europa e para a mestiagem da raa brasileira. A servio dessa histria punha-se um currculo humanstico, signo da pertena elite. Tematicamente, instrua-se acerca da descoberta do Brasil e do processo de independncia do mesmo. O Estado era o monrquico, base da integridade territorial e fruto de uma grande nao (MATHIAS apud BITTENCOURT, 2011, p. 41).
No mesmo ano foi criado o IHGB4 - Instituto Histrico e Geogrfico
Brasileiro, o que favoreceu para a construo de uma srie de trabalhos que
geraram implicaes para o ensino da Histria nacional. Nadai (1993), em sua
obra que considerada uma referncia para o estudo da Histria do ensino de
Histria no Brasil, considera que esse momento foi marco fundador da Histria
enquanto disciplina no Brasil, como tambm indica alguns matizes que
delinearam o que pode ser considerado como elementos do cdigo disciplinar da
Histria na sociedade brasileira no perodo (NADAI, 1993, p. 146).
O Instituto defendia a tese do Brasil miscigenado, formado por brancos,
negros e indgenas, contudo defendia a superioridade dos brancos sobre as
demais culturas. O Estado era visto como principal agente da Histria brasileira,
4 O Instituto Histrico e Geogrfico Brasileiro nasceu, em 1838, da aspirao de uma entidade que refletisse
a nao brasileira que, no muito antes, conquistara a sua Independncia.
Na Sociedade Auxiliadora da Indstria Nacional hoje, por sucessoras, a Federao das Indstrias do Rio de
Janeiro , os secretrios, cnego Janurio da Cunha Barbosa e marechal Raimundo Jos da Cunha Matos,
apresentaram proposta para a sua criao, concretizada em 21 de outubro daquele ano, em Assembleia
Geral, firmada por 27 fundadores, previamente escolhidos.
Em 167 anos de profcua existncia, tem-se caracterizado por atividades mltiplas, nos terrenos cultural e
cvico, pela reunio de volumoso e significativo acervo bibliogrfico, hemerogrfico, arquivstico,
iconogrfico, cartogrfico e museolgico, disposio do pblico, durante todo o ano, e pela realizao de
conferncias, exposies, cursos, congressos e afins.
Contou com o patronato do imperador d. Pedro II, a quem foi dado o ttulo de Protetor, o qual incentivou e
financiou pesquisas, fez doaes valiosas, cedeu sala no Pao Imperial para sede do Instituto, em seus
passos iniciais, e presidiu mais de 500 sesses.
Os grandes nomes da poltica, das artes, das letras, da magistratura, do magistrio e das atividades
produtivas do pas tm integrado seu Quadro Social. (Cf. http://www.ihgb.org.br/ihgb2.php)
38
ressaltando os principais acontecimentos, como tambm os grandes heris
nacionais.
O processo de constituio da Histria como disciplina escolar arraiga-
se no movimento de construo e consolidao do Estado, a partir da segunda
metade do sculo XIX, quando se sobressaem os choques entre republicanos e
monarquistas e a necessidade de definio de uma identidade nacional. Com a
proclamao da Repblica, no ano de 1889, ficou explicito a importncia da
Histria e, principalmente a Histria do Brasil para a construo de um cidado
nacional, como observa Katia Maria Abud (2011), a produo histrica brasileira
herdou seus elementos constitutivos da historiografia francesa e os adequou
necessidade de construo da identidade nacional brasileira (ABUD, 2011, p.
163).
E, ainda segundo Nadai (1993), nas suas origens, a disciplina de
Histria ocupou em todas as escolas secundrias e primrias do Brasil um lugar
especfico, que se resumiu naquilo que buscou expressar o ideal de nao e de
cidado:
[...] se atentarmos para as questes postas pelos programas, currculos, materiais de ensino e pelas produes didticas, a Histria, enquanto disciplina educativa, ocupou, nas suas origens, [...] em todas as escolas secundrias e primrias (oficiais e particulares) que foram sendo implantadas pelo territrio nacional um lugar especfico, que pode ser sintetizado nas representaes que procuravam expressar as ideias de nao e de cidado embasadas na identidade comum de seus variados grupos tnicos e classes sociais constitutivos da nacionalidade brasileira. (NADAI, 1993, p. 149).
Schmidt observa que a consolidao desse movimento s vai
acontecer com a Revoluo de 1930, no bojo do movimento de defesa da
importncia da educao para a formao do cidado e o desenvolvimento do
pas. Nesse perodo, os educadores brasileiros estavam preocupados com a
propagao da escola, sobretudo a escola pblica, a partir da criao do
Ministrio da Educao e a Reforma Francisco Campos, como tambm com a
formao profissional dos novos mestres e a renovao pedaggica (Cf.
SCHMIDT, 2011, p. 79).
39
3.1.2 Estabilizao do cdigo disciplinar da Histria (1931-1971)
Algumas consideraes apontam para o comeo de um processo de
materializao do cdigo disciplinar da Histria, a partir de 1931. No perodo ps-
Revoluo de 1930, os projetos de reformas educacionais comeam a
institucionalizar-se como a reforma de Francisco Campos, de 1931, como observa
Abud (1993):
Com a Reforma Francisco Campos (Decreto 19.890/31), o ensino secundrio passou a ter dois cursos seriados: o fundamental e o complementar. O curso fundamental tinha por objetivo dar a formao geral ao estudante, com durao de cinco anos. O curso suplementar era obrigatrio para os candidatos aos cursos superiores de Cincias Jurdicas, Medicina, Farmcia e Odontologia, Engenharia e Arquitetura, como tambm para a Faculdade de Cincias e Letras que no existia (ABUD, 1993, p. 165).
Esse decreto 19.890/31 estabelecia a obrigatoriedade de todas as
escolas do Brasil terem sries. E, para isso, o Ministrio da Educao ficaria
encarregado de elaborar os programas de ensino das disciplinas, de modo que
houvesse uma unificao em todo o Brasil.
A esse respeito, vejam:
.
O decreto 19.890/31 impunha a seriao obrigatria para todas as escolas do pas, em todos os estabelecimentos de ensino secundrio, e incumbiam comisses organizadas pelo Ministrio da Educao de elaborar os programas de ensino das disciplinas, que tambm seriam unificados para o Brasil inteiro (Op. cite. p. 165).
A reforma de Francisco Campos, no cenrio ps-revoluo, pode ser
entendida como um fator de unio nacional e nesse contexto a Histria era vista
como a disciplina que transformaria os estudantes em cidados plenos, visto que,
seus programas incorporavam essa viso.
A Histria era tida como a disciplina que, por excelncia, formava os estudantes para o exerccio da cidadania e seus programas incorporaram essa concepo. Concepo que j estava presente nos programas do Pedro II, quer nos de Histria Universal, copiados dos franceses, quer nos de Histria do Brasil, derivados do programa de Joo Ribeiro, vencedor do concurso do Instituto Histrico e Geogrfico Brasileiro (Op. cite. p. 165).
40
As instrues metodolgicas para o ensino de Histria que constavam
na reforma de 1931, no julgamento de Abud (1993), expunham os objetivos e as
tcnicas necessrias para que fossem desenvolvido o programa, assim como as
aparncias da disciplina que deveriam ser realados.
A Histria concebida como um produto acabado, positivo, que tem na escola uma funo pragmtica e utilitria, na medida em que ela serve educao poltica e familiarizao com os problemas que o desenvolvimento impe ao Brasil. Ao atribuir esse carter utilitrio ao ensino de Histria, o legislador de disciplina o ponto de ligao com o corpo ideolgico do movimento getulista, cujo discurso ia na direo da implantao de reformas para superar os arcasmos da sociedade brasileira e para implementar a modernizao no pas, introduzindo-o, finalmente, no sculo XX, ao promover seu desenvolvimento. (Op. Cite. p. 166)
Em 1942, foi elaborada a nova Lei Orgnica do Ensino Secundrio,
tambm conhecida como reforma Gustavo Capanema. Um dos princpios basilar
desta nova lei era determinado pela proposta de autonomia didtica do professor,
defendido por um dos relatores da lei, Jonathas Serrano. Uma das principais
propostas desta lei era dividir cada disciplina a partir dos programas e unidades
didticas. No entanto, essa lei no modificou os aspectos essenciais dos
programas de Histria para o curso ginasial, como demonstra Abud (2011):
As reformas curriculares que sucederam Reforma Campos, entre as quais se destaca, pela sua amplitude, a realizada pelo Ministro da Educao do Estado Novo, Gustavo Capanema, em 1942, no modificaram os aspectos essenciais dos programas de Histria para o curso ginasial: a relao de subalternidade da Histria do Brasil em relao Histria da Europa Ocidental; a permanncia da linha do tempo e da sequncia cronolgica na organizao dos contedos e a predominncia dos contedos de natureza poltica, secundarizados pelos fatos da Histria Econmica (ABUD, 2011. p. 168).
A Portaria n. 1.045/51, da reforma da Escola Secundria brasileira,
tambm centralizou os contedos especficos da Histria, ao destacar, para o
ensino de Histria, a valorizao dos fatos do presente para que deles se partisse
para o passado; como tambm, o desenvolvimento de um ensino intuitivo e
crtico; focalizando os indivduos como expresses do meio social e, sobretudo,
focar no desenvolvimento dos mtodos de fixao, investigao, raciocinativos,
ilustrativos e outros, compreendendo esquemas, formas de representao,
literatura, exame, discusso, igualmente onde os julgamentos de valores eram
41
recomendados. Essa Portaria recorre pedagogia da escola nova observando e
ressaltando a importncia do estudo da histria do passado para a compreenso
do presente (SCHMIDT, 2012, p. 81-82).
Ainda no governo de Getlio Vargas, no seu segundo mandado, a
Diretoria do Ensino Secundrio do Ministrio da educao baixou o decreto n.
34.638, no ano de 1953, criando a Campanha de Aperfeioamento e Difuso da
Escola Secundria, que tinha com principal objetivo elevar o nvel do ensino
secundrio no Brasil. Nas dcadas de 50 e 60 a Cades5 se destacou:
Durante as dcadas de 1950 e 1960 merecem destaque as aes da Cades no que se refere aos cursos de treinamento de professores para a escola secundria, a organizao de simpsio e jornadas para capacitao do pessoal tcnico das escolas e a produo de publicaes destinadas formao de professores, nomeadamente a Revista Escola Secundria, que circulou entre 1957 e 1963 com 19 nmeros (Op. cite. p. 83).
A Revista Escola Secundria, publicou em todos os seus exemplares,
para o ensino de Histria, artigos feitos por professores de Histria que se
destinavam aos professores de Histria.
Concomitantemente com a divulgao pela Cades, de sugestes que
se relacionavam a uma viso da Didtica da Histria, o Inep6 Instituto Nacional
5 A Campanha de Aperfeioamento e Difuso do Ensino Secundrio (CADES) foi criada pelo Presidente
Getlio Vargas em 1953, com o objetivo de difundir e elevar o nvel do ensino secundrio. De acordo com o
Decreto n 34.638, de 14 de novembro de 1953, que a criou, a CADES visava:
a - Tornar a educao secundria mais ajustada aos interesses e possibilidades dos estudantes bem como s
reais condies e necessidades do meio a que a escola serve, conferindo ao ensino secundrio maior
eficcia e sentido social;
b - Possibilitar ao maior nmero de jovens brasileiros acesso escola secundria. Extrado do site:
http://www.fe.ufrj.br/proedes/arquivo/cades.htm
6 O Inep foi criado, por lei, no dia 13 de janeiro de 1937, sendo chamado inicialmente de Instituto Nacional
de Pedagogia. No ano seguinte, o rgo iniciou seus trabalhos de fato, com a publicao do Decreto-Lei n
580, regulamentando a organizao e a estrutura da instituio e modificando sua denominao para
Instituto Nacional de Estudos Pedaggicos. Foi nomeado para o cargo de diretor-geral do rgo o professor
Loureno Filho. Segundo o Decreto-Lei, cabia ao Inep "organizar a documentao relativa histria e ao
estado atual das doutrinas e tcnicas pedaggicas; manter intercmbio com instituies do Pas e do
estrangeiro; promover inquritos e pesquisas; prestar assistncia tcnica aos servios estaduais, municipais
e particulares de educao, ministrando-lhes, mediante consulta ou independentemente dela,
esclarecimentos e solues sobre problemas pedaggicos; divulgar os seus trabalhos". Tambm cabia ao
Inep participar da orientao e seleo profissional dos funcionrios pblicos da Unio. Extrado do site:
http://portal.inep.gov.br/institucional-historia.
http://www.fe.ufrj.br/proedes/arquivo/cades.htm
42
de Estudos Pedaggicos, outro rgo responsvel pela divulgao do Ministrio
da Educao e Cultura, difundia e defendia certas normas para o ensino da
Histria, que eram mais atrelados ao projeto dos Estudos Sociais e, destinavam-
se formao do professor do Ensino Primrio, na perspectiva da educao
complementar (Op. cite. p. 84).
O cdigo disciplinar da Histria no Brasil solidificou-se no bojo das
relaes de poder do estado na configurao da Histria como disciplina
escolar. Relaes percebidas na articulao entre os intelectuais que tinham
experincia no magistrio e de como produzir e divulgar as polticas educacionais
governamentais das dcadas de 1950 e 1960 (CUESTA (1998) apud SCHMIDT,
2012, p. 85). Observa-se que exatamente neste perodo que comea uma crise
no cdigo disciplinar da Histria.
3.1.3 Cdigo disciplinar da Histria em crise: 1971-1984
Podemos inferir, de acordo com o que expressa Leite (1969), que a
partir de 1960, o cdigo disciplinar de Histria tem um princpio de uma crise,
gerada pela progressiva consolidao do ensino de Estudos Sociais no Brasil.
Essa autora ressalta que:
A partir de 1960 vem-se propondo substituir o ensino de Histria e Geografia pelo de Estudos Sociais. No ginsio, as alteraes tm sido mais profundas: reduziu-se a proporo do ensino de Histria Geral, e ampliou-se o de Histria nacional e local. Os Estudos Sociais, introduzidos nos cursos vocacionais e experimentais em 1959, tendem a se alastrar e substituir o ensino autnomo de Histria e Geografia, completando-o com noes de Economia e Sociologia. (LEITE, 1969, p.10).
A lei n 5.692/71, que torna obrigatrio o ensino de Estudos Sociais nas
escolas brasileiras foi promulgada no governo do general Emilio Garrastazu
Medici, no perodo da Ditadura Militar. Obrigatoriedade, que se estendia para as
oitos sries do antigo Primeiro Grau. Logo, o Conselho Federal de Educao,
atravs do Parecer n. 853/71, obrigou o ncleo comum para todos os currculos
do 1 e 2 graus.
43
Entre 1964 e 1984, em pleno Regime Militar, momento esse em que os
professores e profissionais da Histria foram perseguidos e censurados, o ensino
de Estudos Sociais continuava obrigatrio no pas. Um movimento de oposio e
luta pela volta do ensino de Histria nas escolas brasileiras acompanha a
imposio do ensino dos Estudos Sociais, o que vem a configurar um novo
momento na construo do cdigo disciplinar brasileiro.
3.1.4 Restaurao do cdigo disciplinar da Histria: 1984-?
Dois principais acontecimentos marcaram a fase reconstruo do
cdigo da histria: o primeiro faz referncia ao movimento de sada do pas do
perodo da ditadura militar; enquanto o segundo, ao movimento de crtica aos
Estudos Sociais, sugesto que estava em vigor oficialmente na escola
fundamental, desde 1971. Teve participao no movimento educadores e
professores de Histria e, foi sendo principalmente liderado pela Associao
Nacional de Professores de Histria - Anpuh.
Segundo Schmidt apud Bittencourt (2012), aps o trmino da Ditadura
Militar no Brasil, o movimento pela volta do ensino de Histria nas escolas
bsicas cresceu muito. Ainda destaca a existncia, nessa poca, de 23 propostas
curriculares elaboradas por diferentes sistemas estaduais e municipais de
educao que eram discutidas por professores de Histria das escolas pblicas
nos mais diferentes estados brasileiros (SCHMIDT (1998) apud BITTENCOURT,
2012, p. 86).
Como ressalta Schmidt, comentando Rsen (2010), os processos de
aprendizado da Histria necessitam ser pensados para alm de serem
considerados como processos dirigveis e controlveis, visto que, est se
constituindo uma teoria da aprendizagem histrica referenciada em uma cognio
situada na prpria Histria, podendo ocorrer uma fecundao pelas concepes
tericas do aprendizado histrico que carreguem como alvo principal a formao
e o desenvolvimento da conscincia histrica (RSEN apud SCHMIDT, 2012, p.
87).
44
3.2 ANALISANDO OS MANUAIS DOS LIVROS DIDTICOS DE HISTRIA E OS
INSTITUCIONAIS
Trazemos uma abordagem de dois Manuais, presentes nos livros
didticos de Histria do Ensino Fundamental, dentre os textos escolhidos e
usados na escola a partir do PNLD Plano Nacional do Livro Didtico (nos
trinios 2011-2013 e 2014-2016), que foram e esto sendo utilizados pelos
educandos da referida escola, motivos pelos quais foram escolhidos para o
trabalho. Como tambm, apresentamos uma anlise dos PCN Parmetros
Curriculares de Histria: 3 e 4 ciclos do Ensino Fundamental e das Diretrizes
Curriculares e do PPP Projeto Poltico Pedaggico da referida escola, que se
enquadram na proposta selecionada para o trabalho. preciso ressaltar que no
localizamos nesses manuais dos livros didticos possibilidades de se trabalhar
com elementos histricos locais e regionais.
Para o trabalho foram escolhidos dos livros didticos (Saber e Fazer
Histria Histria: sociedade & cidadania): o manual do professor, dois captulos
iniciais e dois finais, visto que no se trata de um estudo de tais manuais, mas um
modo de ilustrar a condio, segundo a qual existe uma tendncia (nos
livros/manuais aqui pesquisados) de usar fatos gerais para a construo da
formao cidad e de atitudes nos educandos que no consideram as formaes
histricas construdas na comunidade, localidade ou regio em que os educandos
se encontram.
O texto mais ilustrativo, do ponto de vista da proposta que
pretendemos formular, do que dos comentrios constatativos sobre a ausncia de
propostas de trabalho nos livros utilizados, com o uso da Histria local e regional
para efeito de instruo. Dando continuidade, seguiremos com a anlise dos
manuais dos livros didticos (LD) e dos Parmetros Curriculares Nacionais de
Histria.
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3.2.1 LD: Saber e fazer Histria: considerando o Manual do professor
Encontramos no manual do professor do livro didtico Saber e fazer
Histria (Cotrim, 2009), usado no trinio 2011-2013, do 6 ano do Ensino
Fundamental, uma concepo de ensino. Essa proposta trabalha com os
contedos formais ao currculo; dos quais compreendem da Pr-Histria at a
Idade Mdia, pontuando aspectos econmicos, polticos, sociais e culturais com
foco na vida pblica, com nfase tambm na vida privada, como assegura Cotrim
(2009):
Nos contedos histricos apresentados nesta obra, so abordados aspectos econmicos, polticos, sociais e culturais, incorporando tanto quanto possvel, diversas contribuies da historiografia e do ensino de Histria. A abordagem tem como foco a vida pblica, embora tambm sejam apresentados aspectos da vida privada de diferentes pocas e sociedades estudadas. Procuramos ainda utilizar fontes histricas variadas, como documentos escritos e iconogrficos, de carter pblico e privado. (COTRIM, 2009, p. 8).
No desenvolvimento desse manual constatamos que o autor considera
pertinente o trabalho com a memria oral:
O trabalho com fontes orais pode levar a bons resultados, envolvendo os alunos em atividades diferentes daquelas normalmente apresentadas em sala de aula. Todos ns conhecemos histrias interessantes que nos foram contadas em famlia ou entre amigos. Essa experincia pode ser aproveitada para ampliar a construo do conhecimento histrico (Op. cit. p.12-13).
Nessa prerrogativa o autor d margem para que o educando possa
trabalhar com pesquisas diversas da Histria, diferentes das apresentadas na
sala de aulas, mas no atenta para a possibilidade de incluso de fatos histricos
da localidade ou da regio das quais os educandos fazem parte.
Seguindo o roteiro desse manual encontramos uma perspectiva nele
que o autor parece demonstrar certa possibilidade de se trabalhar com a Histria
local a partir dos estudos do espao social:
46
Alm de documentos que podem ser analisados na sala de aula, gostaramos de chamar a ateno para a importncia de estudar o espao social (estudo de campo). Visitas ao centro histrico da cidade, ao bairro onde a escola se situa, a museus da regio e, eventualmente, a outras localidades em que se possa fazer um estudo de temas abordados em sala de aula so momentos enriquecedores do aprendizado. O modo como os espaos esto organizados pode nos dizer muito sobre seu presente e passado. Os moradores, a maior ou menor presena de residncias, indstrias, comrcio, servios e agricultura, as reas verdes em contraste com as reas edificadas, os tipos de materiais utilizados na construo, o sistema virio, os meios de transportes disponveis, os nomes dos logradouros, os estilos arquitetnicos e o tamanho das construes, seus uso pblico ou privado, entre outras evidncias podem ser bastantes reveladoras do presente e do passado se estivermos empenhados em decifr-los como tal (Op. cite. p. 14).
No entanto, observamos que nesse manual no determina um modo
mais especfico para a abordagem dos fatos locais ou regionais.
Veja-se que no captulo 1 Histria: reflexo e ao, do livro didtico
Saber e fazer Histria, Cotrim (2009, p. 17), estabeleceu os seguintes objetivos
para o ensino de Histria, a saber: a) Identificar os sentidos da palavra Histria e
suas aplicaes em situaes que, apesar de especficas, esto relacionadas de
forma permanente (fico, memria e conhecimento); b) Compreender os motivos
que levaram os seres humanos a se interessarem pelo estudo do seu passado e
as diferentes formas pelas quais is