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UNIVERSIDADE ESTADUAL DE SANTA CRUZ
ROBERTO PAZOS RIBEIRO
SÃO JOÃO DA BAHIA: Uma estratégia de folkmarketing voltada para o turismo.
ILHÉUS - BAHIA 2010
ROBERTO PAZOS RIBEIRO
R484 Ribeiro, Roberto Pazos. São João da Bahia: uma estratégia de folkmarke- ting voltada para o turismo / Roberto Pazos Ribeiro. – Ilhéus, BA: UESC, 2010. xiii, 107f. : il. Orientadora: Janete Ruiz de Macedo. Dissertação (Mestrado) – Universidade Estadual de Santa Cruz, Programa de Pós - Graduação em Cultura e Turismo. Inclui bibliografia.
1. Turismo cultural - Bahia. 2. Cultura popular. 3. Festas juninas. 4. Marketing cultural. I. Título. CDD 338.479181
SÃO JOÃO DA BAHIA: Uma estratégia de folkmarketing voltada para o turismo.
Dissertação apresentada para obtenção do título de mestre em Cultura e Turismo, à Universidade Estadual de Santa Cruz – UESC. Área de Concentração: Memória, identidade e representações culturais: Orientadora: Janete Ruiz de Macedo Co-Orientador: Marcelo Pires de Oliveira
ILHÉUS - BAHIA
2010
SÃO JOÃO DA BAHIA: Uma estratégia de folkmarketing voltada para o turismo.
Dissertação apresentada para obtenção do título de mestre em Cultura e Turismo, à Universidade Estadual de Santa Cruz – UESC. Área de Concentração: Memória, identidade e representações culturais Orientadora: Janete Ruiz de Macedo Co-Orientador: Marcelo Pires de Oliveira
Ilhéus-BA, 30/08/2010
__________________________________________ Profa. Dra. Janete Ruiz de Macedo
UESC/DFCH Orientadora
__________________________________________ Prof. Dr. Marcelo Pires de Oliveira
UESC/DLA Co-Orientador
__________________________________________ Prof. Dr. Severino Alve de Lucena Filho
UFPB Parecerista
A minha mãe Célia, a quem devo aquilo que sou e tudo o que consegui e venha a
conseguir nessa vida.
A meus irmãos Maurício e André, e a meus sobrinhos Lucas e Ana Cecília,
simplesmente por existirem.
AGRADECIMENTOS A DEUS, que nunca me deixou desistir, sendo força e vontade quando eu já não
mais acreditava.
Ao Orixás: Nanã, Salubá! Xango, Kawo Kabiesile! Ogum, Ògún Iye!
Aos meus pais, Célia e Roberto, por terem me mostrado a importância de, antes de
mais nada, ser um homem de honra, caráter e justo. Que me ensinaram valores
morais que dinheiro nenhum no mundo pode comprar. E que sempre confiaram e
investiram em mim.
Aos meus irmãos, Maurício e André. Pelos momentos compartilhados. Pelas
brincadeiras da infância, pelas farras da adolescência, por cada segundo que
estivemos juntos e pela compreensão nas vezes em que estive ausente.
Aos meus sobrinhos, Lucas e Ana Cecília. Pequenas estrelas na constelação da
minha vida. Pelo sorriso transparente e sincero que me motiva a cada dia. Vocês
são a minha vida.
A minha madrinha, Aida Piva, que escreveu o ―Abstract‖ deste trabalho. E a todos da
minha família que de uma maneira ou de outra ajudaram na construção do que sou
hoje.
A minha orientadora, Janete Ruiz de Macêdo, por todo o conhecimento transmitido.
Pela confiança, paciência e tolerância com este orientando desorientado. Agradeço
também os ―puxões de orelha‖, fundamentais nesse percurso.
A Marcelo Pires de Oliveira, meu coorientador, mas antes de mais nada AMIGO.
Parceiro velho de guerra, de farras, de viagens... O melhor piloto de rally que eu
conheci. ―Santa enrascada, Batman!‖
A Marlúcia Mendes da Rocha, minha ―Mãe Malu‖. Um agradecimento mais que
especial. Por ter me adotado desde a graduação, por ter me recebido em sua casa,
em sua vida, em sua família. Pelo conforto intelectual, emocional e espiritual. Não
existem palavras para representar o carinho e a gratidão que tenho por você.
A Ju, Aninha e Jorginho. Por, tão carinhosamente, terem recebido este invasor em
sua casa. Por terem me permitido roubar-lhes parte do precioso tempo da mãe e avó
de vocês, dividindo-a generosamente comigo.
A minha namorada, Mirela Alves (EDA), pela paciência, compreensão e suporte. Por
ter aguentado a minha ausência e a minha impaciência. Sei que não foi fácil para
você também. Te adoro!
Aos meus amigos Napoleão Argolo, Erika Cotrim, Vicente Pedreira, Rodrigo
Linhares, Christiano Midlej, Marcelo Santana, Wilfredo Lessa, Aloísio (Lula) Soares
Lopes, Victor Barreto, Marcelo Weber e Emiron Gouveia e muitos outros cujos
nomes são aqui suprimidos. Amizade não precisa de explicação.
Aos professores do mestrado em Cultura e Turismo da UESC, pelo conhecimento
compartilhado, pelo aprendizado, por entenderem que às vezes é complicado estar
presente na sala.
Ao colegiado e funcionários do mestrado em Cultura e Turismo da UESC.
A todos meus colegas de mestrado, por cada momento compartilhado dentro e fora
da sala de aula. Pelas palavras de incentivo. Pelos momentos (de alegria e
desespero) e textos compartilhados.
Luciane Costa, colega desde a graduação e Saul Edgardo Sanchez Mendez Filho, o
@gorebahia, grande mestre dos filmes de horror/terror/gore/sexploitation e tudo o
mais que sangre e cause pavor. Além de colegas, grandes amigos. Acreditem, sem
a imensa contribuição de vocês eu certamente não teria conseguido.
Aos meus alunos da Comunicação Social - RTV (UESC). Pela compreensão, pela
paciência, pelos conhecimentos multiplicados.
IX
SÃO JOÃO DA BAHIA: Uma estratégia de folkmarketing voltada para o turismo.
Autor: Roberto Pazos Ribeiro
Orientadora: Janete Ruiz de Macedo
Co-Orientador: Marcelo Pires de Oliveira
RESUMO
O presente trabalho objetiva analisar, através da campanha publicitária da Bahiatursa para o ano de 2010, mais especificamente o site www.saojoaobahia.com.br, de que maneira os meios de comunicação de massa se apropriam das manifestações e expressões da cultura popular, em suas ações de publicidade, com o propósito de atingir um público consumidor específico para o seu produto (neste caso o turismo), utilizando-se, para tanto, dos estudos no campo da folkcomunicação e mais especificamente do folkmarketing bem como as ferramentas da ―análise de conteúdo‖, com o intuito de identificar os elementos representativos da comunicação das classes populares presentes, como também apontar também ausências percebidas ao longo da pesquisa.
Palavras-chave: Cultura popular; Festejos juninos; Folkmarketing; Turismo.
X
SÃO JOÃO DA BAHIA: Uma estratégia de folkmarketing voltada para o turismo.
Author: Roberto Pazos Ribeiro
Adviser: Janete Ruiz de Macedo
Co-Adviser: Marcelo Pires de Oliveira
ABSTRACT
The purpose of this work is to analyze, through Bahiatursa’s advertisement campaign for the
year 2010, mainly the site www.saojoaobahia.com.br, how the media gain access to mass
demonstrations and expressions of popular culture in their advertisements, in order to reach a
specific consumer audience for their product (in this case tourism). Whether it is by means of
studies in the field of folkcommunication, more specifically folkmarketing, or as “content
analysis” in order to identify the elements representing the interaction of the current
predominant caste, as well as point out absences perceived throughout the research.
Key words: Popular culture or folk culture; June celebrations; Folkmarketing; Tourism
XI
LISTA DE GRÁFICOS
1. Gráfico 1: Fluxo de turistas Brasil e Bahia em 2008.........................................................................................................
71
XII
LISTA DE TABELAS
1. Tabela 1: Principais Motivações para o deslocamento turístico ............... 72
2. Tabela 2: Principal fator de influência na escolha do destino turístico ......................................................................................................
72
3. Tabela 3: Principal veículo de influência na escolha do destino …...........
72
XIII
LISTA DE FIGURAS
1. Figura 1: Home Page do site www.saojoaobahia.com.br …........................................
74
2. Figura 2: Home Page do site www.saojoaobahia.com.br …........................................
75
3. Figura 3: Home Page do site www.saojoaobahia.com.br …........................................
75
4. Figura 4: Home Page do site www.saojoaobahia.com.br …........................................
76
5. Figura 5: Sub-seção ―Lendas‖ do site www.saojoaobahia.com.br …...........................
81
6. Figura 6: Sub-seção ―Danças‖ do site www.saojoaobahia.com.br …..........................
85
7. Figura 7: Sub-seção ―Curiosidades‖ do site www.saojoaobahia.com.br …..................
86
8. Figura 8: Sub-seção ―Santos Juninos‖ do site www.saojoaobahia.com.br ….............
88
9. Figura 9: Sub-seção ―Simpatias‖ do site www.saojoaobahia.com.br …......................
89
10. Figura 10: Sub-seção ―Comidas Típicas‖ do site www.saojoaobahia.com.br …..........
91
11. Figura 11: Receita de ―Aluá‖ do site www.saojoaobahia.com.br …............................. 92
12. Figura 12: Receita de ―Beiju‖ do site www.saojoaobahia.com.br …............................ 93
13.
Figura 13: Imagem de fundo do site http://www.saojoaobahia.com.br/ …...................
95
14.
Figura 14: Fogueira de junina .....................................................................................
95
15.
Figura 15: Bandeirolas …............................................................................................
96
16.
Figura 16: Quadrilha Junina …....................................................................................
97
17.
Figura 17: Intrudo representando personagens do ―casamento na roça‖ …...............
97
18.
Figura 18: Bolo de tapioca ….......................................................................................
98
19.
Figura 19: Logotipo do site …......................................................................................
98
20.
Figura 20: Menu de acesso às seções do site ….........................................................
98
XIV
SUMÁRIO
RESUMO........................................................................................................
VIII
ABSTRACT....................................................................................................
IX
INTRODUÇÃO............................................................................................... 14
1. ENTENDENDO “CULTURA”........................................................................
18
1.1 – Cultura, Cultura Popular e FolkComunicação …......................................................................................
18
2. ENTENDENDO TURISMO …........................................................................
37
2.1 – Turismo e Publicidade...................................................................
37
2.2 – Turismo e Tecnologia....................................................................
48
2.3 – Turismo Cultural ….......................................................................
51
2.4 – Turismo de Eventos ….................................................................. 58
3.
SÃO JOÃO DA BAHIA …............................................................................. 62
2.1 – A Festa …...................................................................................... 62
2.2 – A Maior Festa Regional do Brasil …............................................. 70
2.3 – O Método …..................................................................................
78
CONSIDERAÇÕES FINAIS ......................................................................... 100
REFERÊNCIAS.............................................................................................. 103
INTRODUÇÃO
Com o advento da globalização, as mudanças no mundo têm sido muito
dinâmicas, seja na esfera econômica, política e/ou social. Como argumenta Hsiao
(2004, p. 63), ―a partir do final dos anos 80, a globalização transformou-se
gradualmente em ponto central de atenção das ciências sociais, surgindo como
um poderoso conceito paradigmático para explicar muitas transformações
econômicas, sociais e culturais‖. Concomitantemente a todo este processo de
transformações, faz-se necessário compreender que a cultura também é afetada
e alterada pela globalização. ―A globalização oferece formas alternativas de
administrar a vida cotidiana, e altera o contexto de construção do significado e
interpretação para a maioria dos indivíduos nas localidades afetadas por ela‖
(HSIAO, 2004, p. 63). Em suma, a globalização abrange mudanças tanto no
cotidiano das pessoas quanto no sentido de como a vida é interpretada. Essas
mudanças envolvem os diversos aspectos que compõem o ser humano, como as
maneiras de se expressar e as formas de comunicação.
A Bahia tornou-se conhecida mundialmente por suas diversas
manifestações culturais, com destaque para as vertentes culturais de matriz
africana (candomblé e capoeira, por exemplo) e, mais recentemente, as atenções
têm se voltado para o carnaval. Entende-se que tal ação pretende aproximar mais
a Bahia da imagem que normalmente é tida como marcante da identidade
nordestina, entendendo-se aqui o Nordeste tomado pelo seu caráter rural,
sertanejo, ―tradicionalista‖ e ―popular‖.
Para tratar da cultura de um modo geral é preciso de início saber que se
está lidando com um termo esquivo, com muitas definições e repleto de duplo
sentido. Segundo Hall (2006) para tratar o termo ―cultura popular‖, as dificuldades
podem ser ainda maiores. ―Tenho quase tanta dificuldade com o termo ―popular‖
quanto tenho com ―cultura‖. Quando os dois termos são colocados juntos, as
dificuldades podem se tornar tremendas‖. (HALL, 2006, p. 231)
16 1
6
Este trabalho trata de um estudo inicial sobre o folkmarketing na Bahia,
buscando identificar e compreender de que maneira a campanha publicitária da
Bahiatursa para o ano de 2010, intitulada ―São João da Bahia‖, apropria-se dos
elementos da cultura popular, lançando mão das estratégias do folkmarketing,
com o objetivo de fomentar o turismo durante os festejos juninos na Bahia.
Especificamente se buscou analisar os elementos folkmidiáticos presentes nos
materiais promocionais (site1) a campanha ―São João da Bahia‖; entender de que
maneira a Cultura Popular (festejos juninos) é retratada na mídia de massa, e;
analisar a utilização de manifestações da cultura popular como atrativos turísticos
na Bahia.
O referencial teórico baseia-se principalmente nos estudos de Luiz Beltrão
sobre o processo folkcomunicacional, entendido como ―intercâmbio de
informações e manifestações de opiniões, idéias e atitudes de massa, através de
agentes e meios ligados direta ou indiretamente ao folclore‖ (Beltrão, 2001). Da
mesma idéia comunga Joseph Luyten que define a folkcomunicação como sendo
a ―comunicação através de sistemas folclóricos. E por folclóricos entendemos,
com Luís Câmara Cascudo, cultura do popular, tornado normativo por tradição‖.
(LUYTEN, 1988, p. 8)
Dentro dos estudos da folkcomunicação há um termo denominado folkmídia,
que segundo Luyten (2002) é um campo da comunicação que se propõe a
investigar a presença de elementos da cultura popular na mídia de massa e
analisar a maneira como são utilizados. Lucena Filho (2007) aborda um outro
campo nos estudos da folkcomunicação, o folkmarketing cujas ações ―comportam
objetivos bem definidos, além da elaboração de estratégias adequadas à situação
local, porém sintonizada com as transformações da sociedade industrial.‖
(LUCENA FILHO, 2007, p. 85).
A partir disso, busca-se entender a relação entre o ―tradicional‖ da cultura
popular e as modificações sofridas por esta no processo de globalização, e a
forma como os media se apropriam destes elementos com o objetivo de atingir
um determinado público através de estratégias organizacionais de marketing.
1 Apesar de terem sido usados outros suportes comunicacionais na campanha, optou-se por utilizar
como recorte desta pesquisa apenas o material publicado no site. Uma vez que se apresenta como um
material mais completo e segundo dados de pesquisa encomendada pela própria Bahiatursa, a Internet
mostrou-se disparadamente o veículo que mais influenciou os turistas.
17 1
7
Tratando-se da festa junina como objeto principal, devemos levar em
consideração também o fato de que são as redes de significações geradas em tal
evento que alimentam o processo de folkmarketing adotado pelas organizações
na tentativa de uma identificação com o público alvo ―falando a linguagem que
eles querem ouvir, e mostrando as imagens que eles querem ver, fazendo assim,
com que elas sejam percebidas segundo um semântica de valoração das culturas
locais.
A pesquisa utiliza o método indutivo, partindo da análise de um caso em
particular [folkmarketing nas ações da Bahiatursa], para um entendimento maior
do folkmarketing como ação de fomento do turismo cultural, ainda se apropria do
método semiótico por se tratar também de uma análise de conteúdo das peças
utilizadas na campanha em questão. Quanto ao nível, esta pesquisa
caracteriza-se como exploratória, pois pesquisas desta natureza, como explica Gil
(1994, p. 44), ―habitualmente envolvem levantamento bibliográfico e documental,
entrevistas não padronizadas e estudos de caso‖.
Os métodos a serem utilizados nesta pesquisa se configuram em
bibliográfico, pois como explicam Cervo & Bervian ―procura explicar um problema
a partir de referências teóricas publicadas em documentos‖ (1983, p. 55), e
também documental, que segundo Gil ―assemelha-se muito à pesquisa
bibliográfica. A única diferença entre ambas está na natureza da fonte‖ (1994, p.
73).
Serão estudadas as teorias da folkcomunicação, do folkmarketing e do
turismo cultural e de eventos de maneira a se compreender como os agentes do
turismo se apropriam das manifestações culturais, ressignificam seus valores e os
adaptam para atender seus interesses de mercado.
A pesquisa documental servirá para fornecer material de análise das
campanhas empreendidas pela Bahiatursa com o objetivo de fomentar o
incremento dos deslocamentos turísticos pelo interior da Bahia na época dos
festejos juninos.
Como métodos complementares e auxiliares têm-se, respectivamente, a
investigação histórica, buscando apresentar as origens dos festejos juninos e a
sua configuração tal como temos hoje no Brasil e, principalmente, no Nordeste, e
18 1
8
a análise de conteúdo, visando um melhor entendimento dos elementos
folkcomunicacionais e folclóricos presentes nos materiais analisados.
O primeiro capítulo apresenta e discute os conceitos de Cultura, Cultura
Popular, Folclore e Folkcomunicação, apontando as formas dialógicas do
conceito. No segundo capítulo são abordados os conceitos relativos ao Turismo
enfocando principalmente em Turismo Cultural e Turismo de Eventos. No último
capítulo é apresentado um histórico das Festas Juninas, assim como a sua
caracterização culminando com a análise do site www.saojoaobahia.com.br para
o ano de 2010.
19 1
9
1 ENTENDENDO “CULTURA”
1.1 Cultura, Cultura Popular e Folkcomunicação
Pensar cultura é lidar com um termo extremamente esquivo e polêmico, dado a sua evidente ambiguidade. O termo ―cultura‖ (muito próximo da maneira como se entende hoje) surge, no final do século XIX, resultado da discussão gerada em torno de dois conceitos fundamentais: O conceito francês de ―civilização‖ e o conceito alemão de ―Kultur‖. Para Cuche (2002) o uso do termo cultura, na língua francesa, do século das Luzes, tem um papel decisivo na invenção do conceito atual de cultura. O sentido da palavra cultura atravessa, ao longo dos séculos, profundas mudanças conceituais, indo inicialmente de cultura como estado (sendo utilizada, por exemplo, para designar uma parcela de terra cultivada) para um pensamento de cultura como ação (o fato de se cultivar a terra), fazendo posteriormente o caminho inverso; da ação (instruir) para o estado (do indivíduo que ―tem cultura‖), sendo este último consagrado no fim do século XVIII.
Surge aqui uma oposição (fundamental para os pensadores Iluministas) entre ―natureza‖ e ―cultura‖. Ao que se define para estes pensadores o entendimento de cultura como ―a soma dos saberes acumulados e transmitidos pela humanidade, considerada como totalidade, ao longo de sua história‖ (CUCHE, 2002, p. 21) Desta maneira, o termo ―cultura‖ se aproxima muito da palavra ―civilização‖. O conceito francês de ―civilização‖ estava associado, principalmente, às realizações materiais de um povo e que segundo Cuche (2002) representa os progressos coletivos e seria para os filósofos reformistas ―o processo que arranca a humanidade da ignorância e da irracionalidade [...] A civilização é então definida como o processo de melhorias das instituições, da legislação e da educação‖ (CUCHE, 2002, p.22). Do outro lado tem-se o conceito alemão de “Kultur”, usado para representar os aspectos espirituais de uma comunidade. Portanto ―tudo que é autêntico e que contribui para o enriquecimento intelectual e espiritual será considerado como vindo da cultura‖ (CUCHE, 2002, p. 25)
Mas afinal, o que é cultura? Pode-se perceber que, como todos os outros termos que fazem parte da esfera das ciências humanas, o termo cultura sofre de uma polissemia crônica. Em outras palavras, é possível encontrar, em autores e textos sobre o assunto, uma diversidade muito grande de sentidos, que tornam difícil entender unitariamente o conceito de cultura. Nas ciências humanas, existem muitos termos que sofrem do mesmo mal polissêmico e, vários deles,
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0
estão mesmo profundamente relacionados ao universo da cultura: mito, símbolo, ritual, linguagem, língua, código(s), imaginário, cultura de massas, entre outros.
Para Geertz
O conceito de cultura [...] denota um padrão de significados transmitido historicamente, incorporado em símbolos, um sistema de concepções herdadas expressas em formas simbólicas por meio dos quais os homens comunicam, perpetuam e desenvolvem seu conhecimento e suas atividades em relação à vida. [...] (1989, p. 103-104)
Isso porque as ciências humanas, ao contrário das ciências exatas e as da natureza, ditas ―duras‖, têm como objeto de estudo o homem. Eis aí um objeto muito difícil de descrever, pois como se sabe, o homem é uma criatura mutável, instável, multifacetada, bastante diferente das realidades exatas e formalizadas da matemática, por exemplo. O homem não pode ser definido com uma fórmula exata e abstrata, não pode ser ―matematizado‖ ou ―cientifizado‖ de modo absoluto, e aí está a grande frustração das ciências humanas em relação às ciências exatas. O que se começa aqui é uma maneira\de buscar uma variedade de definições e compará-las, de modo a encontrar, nessa diversidade, elementos que se repetem e que permitem, assim, definir um conjunto de pressupostos básicos e comuns.
Segundo Cuche, foi o pensador britânico Edward Tylor, quem, em 1871, no seu livro Primitive Culture, apresentou a primeira definição etnológica de cultura. Para o referido autor
cultura e civilização, tomadas em seu sentido etnológico mais vasto, são um conjunto complexo que inclui o conhecimento, as crenças, a arte, a moral, o direito, os costumes e as outras capacidades ou hábitos adquiridos pelo homem enquanto membro da sociedade.(TYLOR apud CUCHE, 2002, p.35)
Desta maneira Tylor, aponta o caráter de aprendizado da cultura, em
oposição ao pensamento de que a cultura pudesse ser transmitida como uma
herança genética. Tal teoria foi vencida pela comprovação de que a cultura
constitui-se de um processo complexo que envolve uma relação de ensino e
aprendizagem, modelos e repetições.
Resumindo, o comportamento dos indivíduos depende de um aprendizado, de um processo que chamamos de endoculturação. Um menino e uma menina agem diferentemente não em função de seus hormônios, mas em decorrência de uma educação diferenciada.‖ (LARAIA, 2005, p.9)
Segundo Oliveira (2007), essa percepção da cultura como sendo algo que
é aprendido, somada ao fato de que aspectos geográficos, climáticos e genéticos
são incapazes de gerar semelhanças culturais entre grupos humanos distintos,
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1
que indicam que cada sociedade tem a capacidade de construir um sistema
cultural particular, baseado em regras e mecanismos próprios.
A segunda definição de cultura vem de um texto célebre chamado Notes
Towards a Definition of Culture (1948), nele, o escritor inglês T. S. Eliot afirmou
que a palavra ―cultura‖ pode ter três sentidos básicos, dependendo de associá-la
ou a um indivíduo, ou a um grupo ou classe, ou a uma sociedade inteira. Esses
três níveis seriam englobados um pelo outro e dependentes um do outro.
Em uma ordem hierárquica, a cultura do indivíduo dependerá da cultura do
grupo a que ele pertence e a cultura do grupo, por sua vez, dependerá também
da cultura da sociedade na qual ele está inserido. Assim, o sentido societário de
cultura é o mais importante de todos, mas todos os níveis são inseparáveis e não
deveriam ser pensados isoladamente. Essa divisão tripartite pode levar à
tentação de identificar a cultura no nível individual com aquilo que se refere, na
verdade, à aquisição da Alta Cultura. Ou seja, no sentido individual, cultura teria
um significado educativo, formativo: seria um conjunto de conhecimentos ao qual
se atribui um valor. Diz-se que o indivíduo que as possui seria um homem ―culto‖,
educado, erudito, sensível, etc. (Mais tarde voltar-se-á a essa ideia de cultura
como alta cultura para problematizá-la, para questioná-la). Parece lógico que se
a cultura no nível individual se refere basicamente à educação – um ideal que,
desde os gregos, tem sido fundamental para o homem ocidental, expressando-se
no termo Paideia = pedagogia, pedagogo ou na ideia de formação (o alemão
Bildung).
Cultura vem de ―colere”, que em latim significa ―cultivar‖, daí o sentido de
que a cultura é um ―cultivo do homem‖ - no nível da sociedade teríamos a cultura
no sentido antropológico, portanto como a série de instituições que o homem
(todos os homens e não apenas os ―educados‖) utilizaria para dar sentido ao
mundo que os rodeia. O homem é um animal que produz sentidos e não pode
viver sem eles. Mas, na verdade, Eliott não estava preocupado com o sentido
antropológico do termo. Ele se interessava primordialmente pela noção da cultura
como um valor, como formação.
Aqui se altera a divisão tripartite de Eliott e sugere-se, em vez disso, a
existência de dois sentidos básicos de cultura, que se referem, de maneira
indistinguível e simultânea tanto aos indivíduos quanto aos grupos mais amplos:
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2
1) cultura como ―alta cultura‖, como formação espiritual, intelectual, artística e
moral do homem, e; 2) cultura no sentido antropológico, como uma série de
instituições às quais, em princípio não se pode atribuir valor algum, mas que
servem para dar sentido à natureza.
Alguns teóricos falam ainda hoje na cultura como dividida em quatro
esferas diferentes, apesar de alguns autores tratarem essa divisão como sendo
preconceituosa: 1) Cultura Erudita ou Alta Cultura; 2) Cultura Popular ou Baixa
Cultura; 3) Cultura de Massa; 4) Cultura da Mídia (Oliveira, 2007).
O conceito de Cultura Erudita existe desde a Idade Média e está associado à detenção dos saberes formais (literatura e artes) por parte dos sacerdotes e nobres, castas privilegiadas que tinham acesso à educação. Para Oliveira (2007), a Cultura Erudita estaria associada ao conceito de hegemonia de Gramsci, no qual
a classe hegemônica determina quais são os conteúdos culturais aceitáveis para o conjunto da sociedade e para seu grupo, além de estabelecerem códigos e critérios que facilitam ou dificultam o acesso aos seus bens culturais para pessoas de outras classes. (OLIVEIRA, 2007, p. 26)
É importante compreender, como Oliveira, que as primeiras pesquisas
comparativas sobre cultura, teriam surgido no período áureo do expansionismo
europeu, e desta maneira estaria pautada numa observação mercadológica
voltada para possíveis mercados consumidores para os seus produtos
industrializados. Ainda segundo o autor
A industrialização européia produziu muitos avanços tecnológicos, e a grande produção de bens gerou necessidade de haver um mercado consumidor maior daquele que havia dentro das fronteiras de seus países de origem. Os países colonizadores como Portugal, Espanha, Inglaterra e França, que já possuíam canais de distribuição e mercados cativos, não encontraram dificuldades em vender sua produção industrial. Entretanto, os demais países industrializados, que tiveram uma expansão tardia, precisaram elaborar outras estratégias para conquistar novos mercados. (OLIVEIRA, 2007, p. 23)
Oliveira (2007) ainda afirma que uma dessas estratégias seria a etnografia.
Esse tipo de pesquisa teria sido utilizado com o intuído de traçar um perfil dos
potenciais consumidores, determinando para os industriais europeus quais os
produtos adequados para esses novos mercados, pautados em seus hábitos e
costumes. Levando-se em consideração que estes povos, não-europeus, sempre
foram vistos como atrasados, tecnológica e culturalmente. Para Laraia (2005) este
pensamento deve-se ao fato que
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3
Em outros termos, a mentalidade dominante propõe determinados modelos de comportamento e tudo aquilo que não entra na esfera do conhecimento, do familiar, tudo aquilo que não é diretamente reportável aos próprios valores, aquilo que não parece conforme aos próprios critérios de juízo, tomados como parâmetros universais, é rejeitado. E tal recusa se dá, aplicando-se ao novo as etiquetas de ―pitoresco‖, ―arcaico‖, ―rústico‖, ―descortês‖, ―bárbaro‖, e assim por diante. Termos diversos, mas substancialmente iguais na sua função de reforçar o afastamento entre o que eles designam e quem os pronuncia. (LARAIA, 2005, p. 81)
Por mais que não aparente, o conceito de Cultura popular é conceito
considerado difícil, pois não se restringe apenas à oposição ao conceito da
erudita, mas ―é um processo vivo de manifestações sociais, provenientes das
classes não hegemônicas da sociedade, com a capacidade de atrair, reunir e
entreter uma grande quantidade de pessoas‖ (OLIVEIRA, 2007, p.29). Já Cultura
de massa é um conceito da escola frankfurtiana que ―associam as manifestações
culturais aos grandes aglomerados urbanos, à industrialização da sociedade e ao
crescimento dos meios de comunicação‖ (OLIVEIRA, 2007, p.28).
Desta maneira, para a ―Escola de Frankfurt‖ a cultura de massa é uma categoria de cultura mais simples e superficial, definida pelo consumo em larga escala e pela transformação de bens simbólicos em produtos, e, como tais, com valor de troca e valor de consumo, claramente definidos. (OLIVEIRA, 2002, p.28)
Além desse crescimento dos meios de comunicação um conceito pós-
moderno evidencia uma categoria nova que começa a ser estudada: a Cultura de
mídia. Essa nova divisão relaciona-se com o fenômeno das sociedades dos séc.
XXI que se tornaram conectadas aos veículos de comunicação de massa
informando-se e modificando gostos e preferências.
Atualmente, um fenômeno curioso parece estar acontecendo na cultura: as
quatro esferas estão convergindo, de forma que já não é mais possível, como
antes, separar com precisão uma da outra. Isso é um fenômeno muito
interessante, que demonstra a complexidade da cultura contemporânea. ―Seja de
massa, erudita ou popular, a cultura é sempre uma relação entre a realidade e a
produção do autor‖ (MARTINO, 2005, p.28)
Diante disso, é de fundamental importância compreender a cultura como
um processo em eterna construção e reformulação. Então se começa a pensar
em definições de culturas ligadas ao sentido antropológico sugeridos para a re-
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divisão da proposta tripartide de Elliot.2 Desta maneira, ao longo do tempo as
fronteiras e delimitações que separam as culturas e os povos vão sendo
substituídas por pensamentos que acreditam numa cultura como um organismo
vivo que ao mesmo tempo é capaz de transmitir para outras culturas alguns dos
seus aspectos peculiares e em contra partida apropriar-se de aspectos desta
outra cultura. Isso não significa pensar numa homogeneização da cultura
(principalmente imposta por uma dominação da força do capital ocidental), uma
vez que os aspectos transmitidos são reconfigurados pelas sociedades a fim de
melhor se adequarem aos seus modos de vida. Entende-se aqui como Laraia que
Não resta duvida de que grande parte dos padrões culturais de um dado sistema não foram criados por um processo autóctone, foram copiados de outros sistemas culturais. A esses empréstimos culturais a antropologia denomina difusão. Os antropólogos estão convencidos de que, sem a difusão, não seria possível o grande desenvolvimento atual da humanidade (2005, p. 105)
Boa parte dessa difusão da cultura pode ser atribuída aos processos ligados a indústria cultural, ao qual está submetida à sociedade atual (sociedade da informação e do consumo) como ilustra Manuel da Silva
A característica da actual revolução cultural reside no seu âmbito e na sua escala global, no seu poderoso impacto, no seu carácter democrático e popular. Muitas actividades deslocam-se para ambientes virtuais onde as transformações se dão a uma velocidade que ultrapassa a escala humana. É aqui que as revoluções na cultura a nível global têm grande impacto nos modos como as pessoas vivem, no sentido que dão às suas vidas, sobre as suas aspirações para o futuro – sobre a sua cultura, enfim. [...] A cultura global alimenta-se das culturas locais para as converter num outro produto cultural para o mercado mundial. Por isso provoca reacções como a do ―nacionalismo cultural‖ reafirmando o respeito pela tradição e herança cultural, que são respostas culturais conservadoras contra as forças da globalização cultural. Para o bem ou para o mal a cultura é hoje um dos mais dinâmicos - e mais imprevisíveis- elementos de mudança histórica do novo milénio. Não surpreende por isso que as lutas pelo poder político assumam cada vez mais um carácter simbólico e discursivo, em vez de físico e compulsivo, e que a própria política assuma cada vez mais a forma de ― política cultural‖ (SILVA, 2002, p. 4).
Para o antropólogo Geertz, a cultura é
um mecanismo de controle – planos, receitas, regras, instruções [...]- para governar o comportamento [...] o homem é precisamente o animal mais desesperadamente dependente de tais mecanismos de controle, extragenéticos, fora da pele, de tais programas culturais, para ordenar seu comportamento (GEERTZ, 1989, p.56)
2 Ver p.10
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Pode-se pensar também a cultura como sendo
Linguagem, costumes, instituições, códigos, instrumentos, técnicas, conceitos, crenças… (Leslie White)
A criação de uma ordem simbólica da linguagem, do trabalho, do espaço e do tempo. Os símbolos surgem tanto para representar quanto para interpretar a realidade, dando-lhe sentido pela presença humana… (Marilena Chauí)
Um sistema de sistemas de signos em que o significado de um significante se torna por sua vez o significante de outro significado, independentemente do fato de estes serem palavras, objetos, mercadorias, idéias, valores, sentimentos, gestos e comportamentos. A semiótica torna-se assim a forma científica da antropologia cultural. (Umberto Eco)
Ora, de todas essas definições alguns elementos são comuns. A cultura é,
sem dúvida, um conjunto de mecanismos que possibilitam governar o
comportamento do homem, como diz Geertz, mas ainda mais que isso, as
definições de Neiva, White, Chauí e Eco são concordantes, pois veem na cultura
instrumentos para regular também às relações do homem com a natureza. Esses
instrumentos, apesar de receberem nomes diferentes (signos, símbolos, códigos,
instituições, etc) são basicamente os mesmos em todos os autores: o homem cria
cultura ao impor um sentido ao mundo natural.
Vê-se então uma relação importante entre cultura e comunicação. Todo
ato de cultura, como diz Umberto Eco(1979), é um ato de comunicação, pois
envolve o uso de signos, linguagens, códigos, normas. Mas, além disso, também
é comunicação no sentido de ser um instrumento de troca, de intercâmbio entre
os homens e de estabelecimento de um sentido de comunidade entre eles. Ou
seja, a primeira coisa em comum é a capacidade do homem de simbolizar. O
universo dos sentidos, dos valores, das interpretações é próprio, portanto, do
homem, não do mundo natural.
A cultura surge, assim, como o choque do homem com a Natureza. É
possível entender a Natureza como algo que resiste ao homem, a seu desejo de
controlar e elaborar. A cultura aparece para dar sentido àquilo que
aparentemente não tem sentido nem controle. Desse modo, a segunda coisa
comum que aparece nas várias definições é a oposição entre cultura e natureza.
Sahlins acredita que a cultura é
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a organização da experiência e da ação humanas por meios simbólicos. As pessoas, relações e coisas que povoam a existência humana manifestam-se essencialmente como valores e significados - significados que não podem ser determinados a partir de propriedades biológicas ou físicas. (SAHLINS,1997, p. 1)
Considera-se, a princípio, a cultura como a ―ordenação (e desordenação)
do mundo em termos simbólicos [...] uma capacidade singular da espécie
humana‖ (SAHLINS, 1997, p.1) uma vez que os outros animais não são capazes
de racionalizar o significado de determinados símbolos, a exemplo da
incapacidade do macaco de reconhecer água benta, pois a mesma possui as
propriedades químicas idênticas as da água destilada. Pode-se questionar se não
existem também formas de sentido no universo animal, mas é no homem, através
das instituições culturais e da linguagem, que o sentido alcança sua realização
máxima.
Considera-se cultura ainda, como sendo aqueles sistemas entrelaçados de
símbolos significativos, interpretados, nos quais o homem encontra sentido para
os acontecimentos (GEERTZ, 1989). Igualmente como afirma Sahlins (1997,
p.42) estarem ―as culturas desaparecendo enquanto ainda estávamos
aprendendo a percebê-las, para reaparecer logo em seguida de maneira que não
havíamos previsto‖, alguns bens culturais sofreram um processo de metamorfose,
vestindo outras formas e sentidos e são agora reinventados.
A cultura é, de certo modo, o universo do sentido, a passagem do estado
natural, guiado por uma simples relações de causa-efeito, ao estado semiológico,
da linguagem e do sentido. Para Manuel da Silva
Os homens são criadores de sentido e seus intérpretes, sendo os códigos de sentido que dão significado às nossas acções e nos permitem conferir sentido às acções dos outros. Tomados em conjunto constituem a nossa cultura , que hoje em dia está no centro das nossas vidas. (SILVA, 2002, p.4)
Desta forma entende–se que cultura tem estreita relação com o imaginário que, por sua vez, tem a capacidade de possibilitar ao homem o libertar-se do real para poder fingir, reinventar-se e estabelecer contatos e relações entre os seres e os objetos da cultura de maneira a sintetizar ou fundir essas imagens, ou seja, o imaginário apóia-se no real sem negá-lo.
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O imaginário faz parte da representação como tradução mental de uma realidade exterior percebida, mas apenas ocupa uma fração do campo da representação, à medida que ultrapassa um processo mental que vai além da representação intelectual ou cognitiva (LAPLANTINE e TRINDADE, 2003, p.24)
Pertencer a uma cultura significa ter identidade frente ao outro – qualquer –
e, sobretudo, compartilhar, com aqueles pertencentes à mesma cultura, um grau
de igualdade tal que se permita, a cada indivíduo, ser, ao mesmo tempo, livre e
igual.
Em se tratando de vida social, a cultura (significação) está em toda parte. Todas as nossas ações seja na esfera do trabalho, das relações conjugais, da produção econômica ou artística, do sexo, da religião, das formas de dominação e de solidariedade, tudo nas sociedades humanas é constituído segundo os códigos e as convenções simbólicas a que denominamos ―cultura‖ (ARANTES, 1990, p. 34).
Assim, para Arantes, a cultura é um amplo sistema de códigos, que contém dados da identidade de um povo. O que se impõe hoje, a partir da noção contextualizada e relacional da identidade, é garantir que a variedade e a diferença sejam resguardadas, que a cultura, permita que diferentes convivam com suas distintas percepções e expressões. A cultura midiática ou de mídia propicia essa circulação mais fluída e articula de forma mais complexa níveis, gêneros e formas de cultura produzindo o cruzamento e construção de identidades.
Para Martino (2005) a cultura, a partir do século XIX não existe se não considerarmos suas relações com a comunicação, pois são interdependentes e indissociáveis. Segundo ele ―a produção simbólica contemporânea é uma variável de trabalho do conjunto de comunicações‖ (MARTINO, 2005, p.16), já que a mídia controla grande parte dos fluxos de cultura em circulação na sociedade. Pois
as dinâmicas existentes entre a comunicação e cultura são compreendidas como pontos em uma escala de infinitas variáveis, dentro da qual é possível fazer aproximações e estabelecer alguns pontos de contato, nunca determinado a sorte dos elementos culturais, (MARTINO, 2005, p 35)
Se até meados do século XIX, dois tipos de cultura se delineavam nas sociedades ocidentais (a cultura erudita das elites e a cultura popular das classes dominadas), ―ao absorver e digerir, dentro de si, essas duas formas de cultura, a cultura de massas tende a dissolver a polaridade entre o popular e o erudito, anulando suas fronteiras‖ (BALOGH et al, 2002, p.48). Para Stuart Hall apud Martino (2005, p.35), ―dentro da cultura, a marginalidade nunca foi uma espaço tão produtivo quanto é agora‖.
Essa marginalidade pode ser descrita a partir das posturas de MacDonald apud Martino (2005) que divide a cultura em ―alta‖, ―média‖ e ―de massa‖, sendo que as duas últimas são consideradas inferiores à primeira, criando a ilusão de uma ―alta cultura‖ disponível a quem puder pagar por ela. A ―média cultura‖, para
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MacDonald apud Coelho (1988) estaria ligada a uma tentativa de reprodução um tanto mais simplória da ―alta cultura‖, ou seja
[...] a midicult surge como filha bastarda ou subproduto da cultura de massa. Nesse processo ela se diferencia da mascult: a) por tomar emprestado procedimentos da cultura superior, desbastando-os, facilitando-se; b) por usar esses procedimentos, quando eles já são notórios, já foram ―consumidos‖; c) por rearranjá-los, visando à provocação de efeitos fáceis; d) por vendê-los como cultura superior e, por conseguinte, tentar convencer o consumidor de que teve uma experiência com a verdadeira cultura, num processo que tranqüiliza e substitui, em sua mente, outras inquietações e indagações que possa ter. (COELHO, 1988, p. 20)
Ainda para Coelho (1988) a cultura de massa (fruto da revolução industrial e do capitalismo ocidental), tem seus alicerces fincados nos meios de comunicação de massa e está voltada para a criação de uma cultura/produto, perecível e destinada ao consumo das massas. Uma espécie de produto cultural padronizado, destinado ao gosto mediano, onde não se faz necessário questionar o que se consome. ―Uma cultura que não vale mais como algo a ser usado pelo indivíduo ou grupo que a produziu e que funciona, quase exclusivamente, como valor de troca (por dinheiro) para quem a produz‖. (COELHO, 1988, p. 12)
Diferentemente a ―cultura popular‖ refere-se aquilo que, não tendo sido absorvido, apropriado e expropriado pelas classes hegemônicas, é produzido, enquanto manifestação cultural, pela classe popular, de forma que os indivíduos pertencentes a esta classe, se exprimem e se reconhecem mutuamente por meio destas manifestações
marcando a distância e a proximidade com outras manifestações culturais, a apropriação ou a oposição a outras expressões culturais, de um lado, e, de outro, uma estrutura cultural na qual os indivíduos são convidados a participar sob pena de exclusão e invalidação sociais ou de destituição cultural. (CHAUÍ, 1986, p. 40)
O que marca a diferença entre esses dois estratos da cultura, não é apenas uma questão de relação entre emissor/destinatário. É primordialmente pensar em uma estrutura simbólica, capaz de construir uma identidade e um sentimento de pertencimento a um grupo social, no caso da cultura popular, em oposição a uma cultura/produto, delével e perecível, a ser consumida e posteriormente descartada, no caso da cultura de massa. Importante também considerar, como Hall (2003) que uma ―cultura popular‖ prevê uma relação de tensão contínua com a cultura dominante. Ou seja, para pensar uma cultura popular, faz-se necessário ter o seu oposto referencial que é a cultura das elites. Tal definição
considera o domínio das formas e atividades culturais como um campo sempre variável. Em seguida, atenta para as relações que continuamente estruturam esse campo em formações dominantes e subordinadas. Observa o processo pelo qual essas relações de domínio e subordinação são articuladas. Trata-as como um processo: o processo pelo qual algumas coisas são ativamente preferidas para que outras possam ser destronadas. Em seu centro estão as relações de força mutáveis e irregulares que definem o campo da cultura – isto é, a questão da luta cultural e suas muitas formas. Seu principal foco de
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atenção é a relação entre a cultura e as questões da hegemonia. (HALL, 2003, p. 241)
Pode-se pensar então, que, é a negação de determinadas manifestações, por parte da classe hegemônica, que delimita (não exclusivamente) o que é a cultura popular. Contudo, é fundamental observar também a mutabilidade inerente à cultura popular. Já foi dito que a cultura em termos gerais é um organismo vivo e mutável, o que não seria diferente quando se fala de cultura popular. Muitas definições têm surgido ao longo dos últimos anos, boa parte delas, limitadores, reducionistas e preconceituosas a respeito do que de fato quer dizer cultura popular. Entende-se como Oliveira (2007, p. 36) que o conceito de cultura popular é algo muito mais abrangente e que em determinado ponto têm-se cruzado com o conceito de cultura folclórica, o que para o autor ―em muitos momentos fica difícil não tornar as duas definições sinônimas‖.
De acordo Lucena Filho (2007) a UNESCO considera os termos como sendo equivalentes, e para o autor folclore ―é a justaposição de dois termos: folk, que significa povo; e lore, que significa sabedoria.‖ Segundo Brandão (1982) o termo folklore aparece pela primeira vez em uma carta enviada por William John Thoms para a revista Britânica The Atheneum, em 1856. Os primeiros estudos sobre o folclore indicavam que a tal ciência poderia ser incorporado apenas o que estivesse relacionado à literatura oral, num sentido geral o que estivesse ligado ao aspecto oral (―espiritual‖) dos saberes do povo e não aos seus processos de produção e os produtos dele derivados.
Ainda segundo Brandão (1982), a Carta de Folclore Brasileiro ―teria estabelecido pela primeira vez com clareza o que deve ser considerado como folclore:‖
1. O I Congresso Brasileiro de Folclore reconhece o estudo do Folclore como integrante das ciências antropológicas e culturais, condena o preconceito de só considerar folclórico o fato espiritual e aconselha o estudo da vida popular em toda a sua plenitude, quer no aspecto material, quer no aspecto espiritual. 2. Constituem o fato folclórico as maneiras de pensar, sentir e agir de um povo, preservadas pela tradição popular e pela imitação, e que não sejam diretamente influenciadas pelos círculos eruditos e instituições que se dedicam ou à renovação e conservação do patrimônio científico e artístico humano ou à fixação de uma orientação religiosa e filosófica. 3. São também reconhecidas como idôneas as observações levadas a efeito sobre a realidade folclórica, sem fundamento tradicional, bastando que sejam respeitadas as características de fato de aceitação coletiva, ânimo ou não, essencialmente popular. 4. Em face da natureza cultural das pesquisas folclóricas, exigindo que os fatos culturais sejam analisados mediante métodos próprios, aconselha-se, de preferência, o emprego de métodos históricos e culturais no exame e análise do folclore. (BRANDÃO, 1982, p. 31-32)
Hoje se entende por folclore, as formas de manifestação, não só dos saberes, mas de todo a produção cotidiana das classes subalternas de uma sociedade, transmitida de forma, oral ou não, o que inclui neste processo de transmissão a representação simbólica incutida em produtos que derivam das formas de expressão desses saberes. É considerada manifestação folclórica, por exemplo, a técnica empregada na produção de um determinado produto artesanal. Técnica essa transmitida do mestre para o aprendiz.
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Para Lucena (2007) o folclore é construção coletiva e está presente nas mais diversas esferas sociais, enraizado nesta troca simbólica cotidiana, transmitidas pelos mais diversos canais comunicacionais
O folclore só é compreendido quando referido à vida das coletividades. Vive-se no cotidiano mergulhados nas culturas geradas pela família, pelos amigos, pelas instituições públicas e privadas, e pelas relações mais contínuas e íntimas do nosso universo afetivo.
As nações, povos, grupos humanos, famílias, classes profissionais, são dotados de um patrimônio de tradições transmissíveis por várias formas de comunicação, verbal e não verbal, defendido e preservado via costumes. (LUCENA FILHO, 2007, p. 41)
Retoma-se aqui a ideia de Martino (2005) que torna indissociável a cultura dos processos comunicacionais. E para falar de comunicação das classes populares faz-se necessário, antes de qualquer coisa, a delimitação do conceito Folkcomunicação, entendendo a sua origem e qual o seu campo de atuação, bem como o seu objeto de estudo. Desta maneira será possível compreender os conceitos que deste derivam como Folkmídia e Folkmarketing, estabelecendo os parâmetros necessários para sua diferenciação e compreensão ao longo desta pesquisa.
Segundo Lucena Filho (2007)
a palavra comunicação tem sua origem no latim comunis, e comunicare significa tornar comum, compartilhar, trocar, comungar, buscar entendimento, partilhar, transmitir estímulos, intercambiar idéias, sentimentos, informações e significados. A palavra folk significa povo. A junção dos dois termos, folk + comunicação = folkcomunicação significa, em termos abrangentes, uma comunicação em âmbito popular. (2007, p. 53)
Desta forma, entende-se a Folkcomunicação como sendo estudo dos agentes
e meios populares de informação de fatos e expressão de ideias. (MARQUES DE
MELO, 2007)
O precursor e criador desta teoria é o professor, pesquisador e jornalista
pernambucano Luiz Beltrão, que a partir dos estudos realizados inicialmente para
um artigo sobre ex-votos como veículo jornalístico, publicado na revista
―Comunicação & Problemas‖ em 1965, e posteriormente para sua tese de
doutoramento em 1967, compreendeu que existiam outras formas de comunicar
além daquelas provenientes da elite, através da grande mídia. Tais
―comunicações‖ se davam através de manifestações culturais populares, tratadas
como folclore.
O objeto de pesquisa dessa nova disciplina encontra-se na fronteira entre o Folclore (resgate e interpretação da-cultura popular) e a Comunicação de
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Massa (difusão industrial de símbolos, através de meios mecânicos ou eletrônicos, destinados a audiências amplas, anónimas e heterogéneas). Se o Folclore compreende formas interpessoais ou grupais de manifestação cultural protagonizadas pelas classes subalternas, a Folkcomunicação caracteriza-se pela utilização de mecanismos artesanais de difusão simbólica para expressar em linguagem popular mensagens previamente veiculadas pela indústria cultural.(MELO, 2007, p. 21, grifo do autor)
Assim, Folkcomunicação é ―o processo de intercâmbio de informações e
manifestações de opiniões, idéias e atitudes de massa, através de agentes e
meios ligados direta ou indiretamente ao folclore‖ (Beltrão, 2001). Da mesma ideia
comunga Joseph Luyten que define a folkcomunicação como sendo a
―comunicação através de sistemas folclóricos. E por folclóricos entendemos, com
Luís Câmara Cascudo, cultura do popular, tornado normativo por tradição‖.
(LUYTEN, 1988, p. 8)
É importante considerar, como Holhfeldt que
[...] a folkcomunicação não é, pois, o estudo da cultura popular ou do folclore [...]. A folkcomunicação é o estudo dos procedimentos comunicacionais pelos quais as manifestações da cultura popular e do folclore se expandem, se sociabilizam, convivem com outras cadeias comunicacionais, sofrem modificações por influência da comunicação industrializada ou se modificam quando apropriadas por tais complexos. (HOLHFELDT, 2002, P.25)
Beltrão dá continuidade a suas pesquisas observando de que maneira os
agentes ―subalternos‖ de comunicação se apropriavam das informações obtidas
através dos veículos de comunicação de massa, para posteriormente transformá-
las e retransmiti-las. Por este motivo a teoria da folkcomunicação dedica-se,
prioritariamente, aos grupos marginalizados dos processos hegemônicos.
Segundo Marque de Melo, citado por Lucena Filho (2007)
Beltrão constatou que nos processos modernos de comunicação massiva coexistiam, no espaço brasileiro-nordestino, com fenômenos de comunicação pré-moderna; eram reminiscências do período medieval-europeu, transportadas pelos colonizadores lusitanos e historicamente aculturadas, aparentemente uma espécie de continuum simbólico; tais veículos de comunicação popular, ou de folkcomunicação, como ele preferiu denominar, mesmo primitivos ou artesanais, atuavam como retransmissores ou decodificadores de mensagens desencadeadas pela indústria da comunicação de massa (jornais, revistas, rádio, televisão)
Desta forma Beltrão chama a atenção de que os grupos populares
possuem sistemas próprios de comunicação, que operam de maneira diferente,
contudo interligados aos meios consagrados de comunicação. Dentro desta rede
de comunicação cotidiana, agindo como intermediário, encontra-se o agente
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comunicador do sistema de folkcomunicação. Sendo este aquele que ―goza de
certo prestígio no seu grupo de referência‖, e o que tem maior acesso a outras
fontes de informação, como os meios massivos e diferentes grupos. Esse ―agente
comunicador folk‖ (como define Beltrão) opera um papel fundamental de
mediação entre a mídia massiva e o receptor local, agindo de forma a reorganizar
a narrativa midiática, dando a esta maior credibilidade e um melhor entendimento.
(TRIGUEIRO, 2008)
Este agente comunicador folk, por sua vez, aproxima-se do que Luyten
(1988) define como ―Líder de Opinião‖, no que diz respeito ao importante papel de
conferir credibilidade às informações recebidas pelas classes populares, além de
―traduzi-las‖ em uma linguagem que seja melhor compreendida, uma vez que,
sem que haja essa compreensão, o processo comunicacional apresenta-se
incompleto. Esse comunicador folk apropria-se então dos conteúdos e formas dos
bens midiáticos para desenvolver estratégias comunicacionais, visando atingir
maior audiência para seus produtos culturais.
No processo da folkcomunicação, a mensagem é estruturada artesanalmente, veiculada horizontalmente e dirigida a uma determinada audiência, constituída, na sua maioria, por membros de um mesmo grupo de referência de interconhecidos. Ou seja, a mensagem do sistema de folkcomunicação é dirigida a um determinado mundo, enquanto a mensagem dos meios de comunicação de massa é planetária; está ao alcance de uma grande audiência. (TRIGUEIRO, 2008, p. 35)
Estudos posteriores, realizados por pesquisadores que se debruçaram sobre
e se aprofundaram nas pesquisa iniciais de Beltrão, entendem que o processo
comunicacional não apenas trata da recodificação das mensagens da cultura de
massa, mas também o que se apresenta no caminho inverso, interpretando de que
maneira a industria cultural se apropria dos bens da cultura popular.
A folkcomunicação adiquire cada vez mais importância pela sua natureza de instância mediadora entre cultura de massa e cultura popular, protagonizando fluxos bidirecionais e sedimentando processos de hibridação simbólica simbólica. Ela representa inegavelmente uma estratégia contra-hegemônica das classes subalternas. (MARQUES DE MELO, 2006, p. 145)
É de fundamental importância compreender que quando se fala em
folkcomunicação se está falando em formas de comunicação popular, ou seja, a
maneira pela qual essas classes populares (subalternas e não hegemônicas) se
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expressam com relação à situações do cotidiano, apresentam sua opinião com
relação à determinada situação política ou social e ou, até mesmo,
personalidades locais ou globais. Luyten (1988) divide em quatro as formas de
comunicação popular mais diretamente relacionadas ao processo
folkcomunicacional. Sendo elas: Apresentação Oral (anedotas, provérbios,
contos, cantorias), Apresentação Escrita (Literatura de cordel, pasquins, dísticos
de caminhão, latrinália, outros), Apresentação Gestual (mamulengo, bumba-meu-
boi, malhação de Judas, etc) e Apresentação Plástica (ex-votos, cerâmica,
carrancas e artesanato em geral). Da mesma maneira, José Marques de Melo,
em um artigo publicado em 2005, intitulado ―Gêneros e formatos
folkcomunicacionais: uma aproximação taxionômica‖ propõe uma reestruturação
na divisão dos gêneros folkcomunicacionais. Para Marques de Melo (2006) essa
divisão configurar-se-ia da seguinte maneira: Folkcomunicação Oral;
Folkcomunicação Musical; Folkcomunicação Gráfica; Folkcomunicação Icônica e
Folkcomunicação Cinética. Dentro destes gêneros diversos formatos podem ser
encontrados.
Folkcomunicação Oral: Aboio; adivinhação; anedota; apelido; bendito;
boato; cantiga de mendigo; cantoria; conto de fada; conversa fiada; conchavo;
fofoca, glosa; gíria; lenda; palavrão; parlenda; pregão; provérbio; trova.
Folkcomunicação Musical: Baião; canção de ninar; canto de bebida;
canto de trabalho; chimarrete; choro; chula; dobrado; embolada; lundu; moda de
viola; romance; samba de breque; toada.
Folkcomunicação Gráfica: Abaixo assinado; adesivo; almanaque de
cordel; almanaque de farmácia; carta anônima; carta devota; cartaz de mercearia;
correio sentimental; epitáfio; flâmula; folhinha; grafito de banheiro/latrina; legenda
de caminhão; literatura de cordel; literatura mediúnica; oração milagrosa; pasquim
em verso; pichação de parede; pintura mediúnica; santinho de propaganda;
volantes publicitários; xilogravura popular.
Folkcomunicação Icônica: Adornos pessoais; enfeites domésticos;
amuletos; boneco de barro; brinquedo artesanal; ex-voto; figura de enfeite;
presépio.
Folkcomunicação Cinética: Afoxé; amarelinha; aniversário natalício;
baianá; batuque; bodas; bloco carnavalesco; bumba-meu-boi; caboclinho; caiapó;
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candomblé; capoeira; catira; cavalhada; chá-de-bebê; chá-de-cozinha; chegança;
ciranda; circo mambembe; coco-de-roda; comício político; congada; cururu; dança
de Moçambique; despedida-de-solteiro; escola de samba; fandango; folia de reis;
forró; frevo; funk carioca; gincana; guerreiro; jogo do bicho; jongo; maracatu;
marujada; paradas cívicas; pastoril natalino; peladas de várzea; procissão;
quermesse; rap paulista; rodeio crioulo; quadrilha; queima de Judas; reisado;
romaria; taieira; ticumbi; troça; trote de calouros; vaquejada; velório; xaxado.
Com o advento da globalização e os avanços tecnológicos, principalmente
no campo das tecnologias da informação e telecomunicações, há uma
reconfiguração no papel do agente comunicador folk. Este já não aparece mais no
processo folkcomunicacional como um mediador entre os meios de comunicação
massivos e os receptores subalternos. Já não se considera mais esse receptor
sem capacidade de decodificar ou assimilar o grande fluxo de informações. Se
antes o papel deste agente era o de retransmissor e decodificador da mensagem,
com um maior acesso da população aos meios de comunicação como rádio,
televisão, celular, Internet, já não se faz mais necessário essa intermediação, ao
menos não da maneira como havia sido anteriormente concebida.
Agora com a globalização na sociedade midiatizada, as redes de comunicação chegam a quase todos os recantos da terra, em tempo real, e a noção de distância toma outro sentido. As interações interpessoais, face a face, das redes de comunicação cotidiana – folkcomunicacional – na sociedade midiatizada, são imbricadas nas interações midiáticas, uma sobrepondo a outra no processo de hibridização da diversidade cultural. (TRIGUEIRO, 2008, p.51)
Vê-se aqui uma maior aproximação entre o local e o global. Um sistema de
troca e realimentação cultural, onde o local passa a ter acesso e absorver do
global, da mesma forma que o global passa a se apropriar dos elementos
constituintes da cultura local, recodificando-os, ao mesmo tempo em que age de
maneira a preservar esses elementos.
Marques de Melo (2006) chama a atenção para a forma como a ―cultura de
massas‖ de meio século atrás, se apropriava da ―cultura popular‖ convertendo,
―símbolos e imagens enraizados nas tradições nacionais dos países
hegemônicos‖ em mercadorias para as multidões planetárias. O que, para o autor,
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fez do folclore midiático da sociedade pós-industrial ―um mosaico de signos
procedentes de diferentes geografias nacionais ou regionais‖.
Por isso mesmo, os espaços ocupados pelas tradições populares na agenda midiática contemporânea correspondem a iniciativas destinadas a preservar identidades culturais ameaçadas de extermínio ou estagnação, quando confinadas em territórios pretensamente inexpugnáveis. Mas funcionam também como alavancas para a renovação dos modos de agir, pensar e sentir de grupos ou nações que, empurrados conjunturalmente para o isolamento mundial, refluem à incorporação de novidades.‖ (MARQUES DE MELO, 2006, p. 141)
A tal apropriação dos elementos constitutivos das culturas populares e as
suas manifestações dá-se o nome de folkmidia. O surgimento e delineamento de
tal conceito, bem como o conceito de folkmarketing (que será discutido mais
adiante mais adiante), foram possíveis a partir de aprofundamentos nos estudos
iniciados por Luiz Beltrão sobre o processo folkcomunicacional. De acordo com
Luyten (2002) folkmidia é o campo da comunicação que se propõe a investigar a
presença de elementos da cultura popular na mídia de massa e analisar a
maneira como são utilizados. D‘Almeida (2002) simplifica dizendo que ―cabe ao
pesquisador interessado na Folkmídia identificar como os sujeitos das mass
media (re)interpretam e utilizam elemento da comunicação popular.‖
Outra categoria identificada no processo folkcomunicacional é o
folkmarketing, termo cunhado pelo pesquisador Severino Alves de Lucena Filho
no livro ―Azulão da Bandepe: uma estratégia de comunicação organizacional‖
publicado em 1998. De acordo com o autor o folkmarketing se configura como
uma modalidade da comunicação organizacional integrada, e está diretamente
relacionado à apropriação dos elementos referentes à manifestações da Cultura
Popular / Folclore, por meio dos agentes mercadológicos, para a elaboração de
estratégias de marketing com o intuito de vender produtos, ideias, imagens
institucionais, eventos folclóricos e/ou também com a intenção de fomentar o
turismo, entendendo a prática do turismo como uma espécie de produto a ser
consumido, como será apresentado mais adiante em um outro capítulo deste
trabalho.
Segundo Lucena Filho (2007)
O termo Folk = povo, ajuntado à palavra marketing [...], resulta na expressão folkmarketing que, segundo uma visão genérica, significa o conjunto de apropriações das culturas populares com objetivos
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comunicacionais, para visibilizar produtos e serviços de uma organização para os seus públicos-alvo. (LUCENA FILHO, 2007, p. 85)
Ainda para o autor, as ações do tipo folkmarketing, ―comportam objetivos
bem definidos, além da elaboração de estratégias adequadas à situação local,
porém sintonizada com as transformações da sociedade industrial.‖ (LUCENA
FILHO, 2007, p. 85)
Neste cenário, grandes empresas que são parceiras/gestoras ou
patrocinadoras de eventos culturais, criam suas estratégias pautadas em
elementos identitários regionais e locais de modo a aproximar-se do seu público
específico, promovendo uma maior identificação e sentimento de pertença,
através da valorização das tradições e saberes locais como afirma Lucena Filho
(2007).
A ação comunicacional do folkmarketing é uma estratégia integrada aos processos culturais da região. Para o seu desenvolvimento, é necessário que as marcas dos saberes da cultura popular sejam mobilizadas em apropriações e refuncionalização, para geração de discursos folkcomunicacionais dirigidos ao contexto da sociedade massiva. (LUCENA FILHO, 2007, p. 87 e 88)
Trata-se, portanto, de entender a relação entre o ―tradicional‖ da cultura
popular e as modificações sofridas por esta no processo de globalização, e a
forma como os media se apropriam destes elementos com o objetivo de atingir
um determinado público através de estratégias organizacionais de marketing.
Desta forma há uma ressignificação do tradicional na cultura popular, que é
apropriada e recodificada pelos meios de comunicação de massa, da mesma
maneira que, em via contrária, essa representação é reabsorvida e serve para
renovar a própria tradição dessas culturas populares.
37 3
7
2 ENTENDENDO TURISMO
2.1 Turismo e Publicidade
Nos últimos anos, acompanha-se um inegável e constante crescimento do
setor turístico em todos os lugares do mundo. Não obstante, pode-se também
observar uma crescente preocupação das pesquisas acadêmicas em entender o
que vem a ser o fenômeno turístico e suas implicações para o cotidiano do
homem, tanto no que diz respeito ao aspecto econômico, como também no
âmbito sócio-cultural e político. Diversos estudos têm sido realizados,
empreendendo esforços no sentido de uma melhor compreensão deste conceito
ainda tão esquivo.
Cooper (et al. 2001) afirma haver grande dificuldade em se delimitar um
conceito único para ―turismo‖, haja vista o seu caráter multifacetado e
multidisciplinar. Contudo, segundo a OMT, é de fundamental importância pensar
em definições que se aproximem, seguindo alguns critérios em comum,
apresentando uma definição que é tida pela grande maioria dos autores como
sendo a mais aceita mundialmente. Segundo Goeldner (et al 2002, pg.24), a OMT
adota a seguinte definição ―o turismo inclui as atividades de deslocamento e
permanência em locais fora do seu ambiente de residência, por período inferior a
um ano consecutivo, por razões de lazer, negócios ou outros propósitos‖.
Seguindo o mesmo pensamento, Cooper (2001, p. 36) reforça que ―a
importância econômica da indústria turística e seu impacto sobre economias,
ambientes e sociedades são suficientes para que o tema mereça consideração
acadêmica‖. Destaca também que apesar dessa dificuldade de conceituação, o
que mostra a complexidade do tema e aponta para uma certa maturidade das
pesquisas na área, a busca constante por uma definição do turismo não só ajuda
a dar credibilidade ao tema no âmbito acadêmico, como serve de norte para
mediação e legislação. É fundamental ainda não se deixar levar pela crença no
turismo como uma espécie de ―fórmula mágica‖.
Como afirma Goeldner (et al 2002, p.36), ―não há dúvida de que o turismo
propicia benefícios, mas não é perfeito. [...] Chegamos à conclusão de que o
turismo não é nem uma bênção, nem uma praga, nem veneno, nem panacéia. Ele
38 3
8
pode trazer muitos benefícios, mas também, problemas sociais.‖ Da mesma ideia
comunga Avila (in AVILA, 2009), apesar de destacar uma comprovada
importância do turismo para o desenvolvimento de diversos destinos que as
pessoas podem tomar ao redor do mundo, o autor defende que tais números não
podem ser interpretados olhando-se exclusivamente para os benefícios que
representam, uma vez que estudos mostram que o turismo nem sempre é
interessante para a comunidade receptora.
É crescente a quantidade de estudos que enfatizam o potencial da atividade turística, no Brasil, e no mundo, como promotor do desenvolvimento e redentor de desigualdades sociais. Entretanto, na prática, o turismo tem provocado significativos impactos econômicos, ambientais e socioculturais negativos, agravando, muitas vezes, o quadro social pré-existente. (AVILA in AVILA, 2009, p.17)
Desta maneira, é mister considerar também o lado negativo do turismo,
compreender que se faz necessário um cuidadoso planejamento, focado tanto
nos interesses do turista, como dos governos, mas principalmente da comunidade
anfitriã.
Para alguns autores, como é o caso de Ouriques (2005), o turismo pode se
apresentar sob uma máscara aparente e tênue de desenvolvimento, varrendo
para debaixo do tapete graves problemas. Uma espécie de ―lobo em pele de
cordeiro‖. Em seu livro ―A produção do turismo: fetichismo e dependência‖,
Ouriques propõe uma discussão sobre as questões históricas, sócio-econômicas
e culturais, diretamente relacionadas ao turismo como, uma ―suposta‖ geração de
emprego e renda, exploração de mão-de-obra barata, trabalho infantil, prostituição
e a espetacularização da cultura, principalmente no que diz respeito à maneira
como tal prática se configura no Brasil.
Chama a atenção a forma contundente com que Ouriques trata essa
―verdade‖ envolta na maquiagem do desenvolvimento associado ao turismo, tanto
a nível global, como especificamente no caso ―Brasil‖, traçando ao longo de toda
a sua obra um perfil de uma nação que se configura e se re-configura sob a ótica
da exploração colonial. Se por um lado mudam-se os instrumentos da exploração,
por outro permanece a relação de ―servidão‖ para com as necessidades das
metrópoles. Desta maneira, o autor se coloca em oposição a uma grande corrente
do pensamento que acredita que ―na contribuição para a economia global, o
39 3
9
turismo não tem rival‖ (NAISBITT, 1994). O turismo surgiria assim como uma
fórmula mágica da geração de emprego e renda, como a melhor saída econômica
para países subdesenvolvidos ou em desenvolvimento.
Contudo como pudemos observar no trabalho de Ouriques, há algo mais
por trás dos números relacionados à geração de emprego e renda no turismo.
Temos que levar em consideração a qualidade desses postos de trabalho e suas
implicações sociais. Seguindo por essa linha, o autor vai identificando a
problemática do turismo e as características relacionadas a essa prática, que
trabalham na perpetuação do sistema colonial servindo aos propósitos do
capitalismo, pautado no que o autor chama de ―mais-valia absoluta‖. Assim, as
ideias de Ouriques propõem-nos uma reflexão a respeito de qual é o real papel,
social, econômico e político do turismo, principalmente no caso brasileiro.
Apesar disto pode-se entender como Cooper (2001, p36)
as organizações internacionais apóiam o turismo por sua contribuição à paz mundial, pelos benefícios da mesclagem de povos e culturas, pelas vantagens econômicas que podem advir e pelo fato de que o turismo é uma indústria relativamente limpa .
De acordo com Barretto (1995, p.43) ―o conceito de turismo surge no
século XVII, na Inglaterra, referido a um tipo especial de viagem‖. Tendo, a raiz
tour, sido documentada em 1760, com origem na língua francesa e tendo como
significado ―volta‖. Da mesma ideia comunga Moesch (2002). A autora afirma que
a primeira aparição da palavra turismo foi em 1800, no Pequeno Dicionário de
Inglês Oxford. De clara procedência latina, representa o sentido de ir e retornar ao
ponto de partida. ―A idéia de giro, de viagem circular, de volta ao ponto de partida,
se deduz, claramente, de raiz comum, que origina tornus e tornare.‖ (MOESCH,
2002, p.10). Barreto (1995) destaca ainda a importância de estabelecer uma clara
diferença entre os conceitos de viagem, que significa apenas deslocamento e de
turismo relacionado à existência de toda uma estrutura jurídico-administrativa.
Bem como diferenciar viagens de outro tipo de deslocamento, como por exemplo,
a migração. Conforme Barreto (1995) viajar prevê necessariamente voltar.
Para Ignarra (2003) faz-se necessário um entendimento histórico da origem
do turismo para uma melhor compreensão dos conceitos atuais. Segundo o autor
40 4
0
O fenômeno turístico está relacionado com as viagens, a visita a um local diverso do da residência das pessoas. Assim, em termos históricos, ele teve início quando o homem deixou de ser sedentário e passou a viajar, principalmente motivado pela necessidade de comércio com outros povos. (IGNARRA, 2003, p.2)
Desta forma, o autor entende como coerente considerar que turismo de
negócios antecede o de lazer, uma vez que mesmo as grandes viagens
exploratórias que visavam reconhecimento de campo, ocupação e posterior
exploração, tinham como motivo principal o fator econômico. O que para o autor
significa que ―o turismo de aventura data de milênios antes de Cristo.‖ (IGNARRA,
2003, p.2)
Seguindo a mesma linha de raciocínio, o autor apresenta que o turismo
religioso, de saúde e de esportes, também tem registro em um passado distante,
de onde se pode prematuramente inferir que o hábito de viajar, por diversos
motivos, seria um fenômeno antigo na história da humanidade. Existem diversas
teorias para o surgimento do turismo. Para De la Torre (apud BARRETTO, 1995),
o turismo tem início com as viagens dos gregos para assistirem os jogos
olímpicos no século VIII a.C., já para McIntosh (apud IGNARRA, 2003) o turismo
surge provavelmente com os antigos babilônios em 4.000 a.C., com a invenção
do dinheiro e a necessidade de sua expansão comercial. Ainda de acordo com
Ignarra (2003) uma espécie de turismo cultural já era praticado tendo como
destino o Egito e seus monumentos, no ano de 3.000 a.C. Também o turismo com
finalidade comercial praticado pelos fenícios, motivados pela escassez de terras
produtivas em sua região, o que ocorreu a mais de mil anos antes de Cristo.
Gregos e romanos da mesma maneira eram adeptos das viagens, fosse com fins
históricos, culturais, esportivos, de saúde ou comerciais, contudo Barretto (1995)
chama a atenção de que tais viagens podem ser consideradas antecedentes
remotos do turismo, mas que não podem ser comparadas ao entendimento
contemporâneo desta ciência.
Trata-se de viagens, seja por prazer, de comércio, de descoberta, realizadas apenas por uma parte da sociedade: os homens livres – as relações de produção capitalista da sociedade industrial que caracterizam o turismo atual não estavam presentes porque os serviços eram prestados pelo braço escravo. Do ponto de vista motivacional, porém, pode-se dizer que as pessoas estavam movidas pelos mesmos
41 4
1
objetivos que hoje caracterizam o turismo de lazer. (BARRETTO, 1995, p. 44-45)
Ainda de acordo com a autora, os romanos teriam sido o primeiro povo a
viajar por lazer. Registros apontam viagens para a praia e até mesmo spas.
Barretto chama a atenção também para as viagens de cunho religioso, como por
exemplo, as peregrinações, ocorridas entre os séculos II e X, para Jerusalém,
Roma e a tumba de Santiago de Compostela. De acordo com a autora, Aymeric
Picaud, peregrino francês, publicou uma coleção de volumes com a história do
apóstolo Santiago, que continha um roteiro de como chegar à tumba partindo da
França. O que seria o primeiro guia turístico impresso da história. No mesmo
período tem-se registro também de viagens para assistir a apresentações
circenses, o que pela autora é considerado turismo de eventos. Ainda nessa
época tem-se registro de viagens de grupos (cruzadas), técnicas de
acampamento e até mesmo com a finalidade de intercâmbio cultural.
Com o fim da idade média e o advento do capitalismo comercial, as viagens foram se propagando. Criaram-se extensas vias de circulação de comerciantes ao longo do território europeu, primórdios das auto-estradas hoje existentes. No entroncamento dessas vias surgiram as grandes feiras de troca de mercadorias. Tratava-se, pois, do início das feiras que atualmente provocam grande fluxo de turismo no mundo todo. (IGNARRA, 2003, p.4)
É importante ressaltar que para alguns autores é justamente com o
advento do capitalismo, na Idade Moderna, que nasce o turismo. Como é o caso
de Moesch que afirma que ―o turismo nasceu e se desenvolveu com o
capitalismo. A cada avanço capitalista, há um avanço do turismo.‖ (MOESCH,
2002, p.9).
De fato, não se pode ignorar as mudanças sofridas no modo de vida da
sociedade a partir do modo de produção capitalista. Desenvolvimento industrial,
aumento da riqueza, mudanças no processo educacional são, entre outros,
motivos que levaram o homem moderno a despertar o interesse por outras
culturas, por outras formas de ser e viver. Assim como afirma Braverman (1987,
p.231) o capitalismo ―transformou toda a sociedade num gigantesco mercado‖.
Colocando o indivíduo, a família e as necessidades sociais a serviço do capital. O
―mercado‖ passa a ser a grande referência para o indivíduo em quase todos os
42 4
2
setores da vida em sociedade. ―Com o tempo, não apenas as necessidades
materiais e de serviço, mas também os padrões emocionais de vida, são
canalizados através do mercado.‖ (BRAVERMAN, 1987, p.235) Há uma drástica
mudança na relação do indivíduo com o tempo livre. Este se torna deveras
escasso para aquele, e ganha uma importância potencializada. Faz-se necessário
o tempo livre e as formas de melhor usufruir deste tempo em prol do bem-estar
desse indivíduo. O tempo de trabalho passa a ser tratado como um tempo
desperdiçado e o tempo livre cada vez mais desejado e valorizado. Segundo
Braverman (1987) para preencher o vazio das horas livres, criado pelo modelo
social vigente,
o preenchimento do tempo ocioso também se torna dependente do mercado, que inventa continuamente divertimentos passivos, entretenimentos, e espetáculos que se ajustam às restritas circunstâncias da cidade e são oferecidos como sucedâneos da própria vida.( BRAVERMAN, 1987, p237)
Desta forma, o turismo se apresenta como uma ótima alternativa para o
preenchimento desta lacuna. É a otimização do tempo livre para o lazer, além de
proporcionar experiências ímpares e uma rica troca cultural.
É nesse contexto que o indivíduo da Idade Moderna desenvolve um gosto
maior pelas viagens com o intuito de usufruir da sua capacidade educacional e de
troca de bens materiais e imateriais como é o caso da cultura. No que tange ao
desenvolvimento comercial, a necessidade de ampliação do seu espectro de
abrangência funciona também como mola propulsora para o turismo, haja vista
que roteiros marítimos são somados pelos comerciantes às antigas rotas
terrestres, a fim de ampliar o seu negócio. Para Ignarra (2003), as grandes
navegações dos séculos XV e XVI seriam precursoras dos grandes cruzeiros
marítimos da atualidade. Ainda de acordo com o autor, a segunda etapa do
desenvolvimento do turismo inicia-se com a era das ferrovias. Nesta época
surgem os agentes e operadores turísticos, desenvolvendo novas formas de
marketing turístico como ―viagens previamente organizadas, pacotes turísticos,
cartazes e folhetos.‖ (IGNARRA, 2003, p. 5) Desta maneira, segundo os
historiadores, ter-se-ia como precursores da atividade de agenciamento de
viagens turísticas, os ingleses Tomas Cook e Thomas Bennet.
Uma outra etapa do desenvolvimento do turismo acontece
concomitantemente às duas grandes guerras mundiais, tal fator seria resultante
43 4
3
da construção de estradas e do desenvolvimento do transporte por vias aéreas,
tendo seu ponto máximo ao final da Segunda Guerra Mundial, somando-se aqui o
surgimento de um enorme avanço tecnológico, industrial e econômico em
determinados países. Soma-se a todos esses fatores os avanços também na área
das comunicações.
O advento da televisão, em particular, contribuiu para a promoção da variedade dos atrativos dos países estrangeiros. Durante esse período, a classe média dos países industrializados teve acesso à compra de automóveis, o que modificou substancialmente o seu estilo de vida. (IGNARRA, 2003, p. 6)
Mais adiante neste capítulo, será tratado, mais a fundo, a importância e o
papel, não só da televisão, mas dos media em geral, principalmente das mídias
digitais e redes sociais, na divulgação do turismo e dos destinos turísticos.
No Brasil, a atividade turística confunde-se com o momento do próprio
descobrimento e com o do processo de colonização. Os primeiros navegantes
portugueses que aqui chegaram, de certa maneira, praticavam o turismo de
aventura, ainda que o interesse motivador tenha sido a expansão do comércio
marítimo. Posteriormente, com a implantação das Capitanias Hereditárias3 e do
Governo-Geral, surgiu o turismo de negócios, bem como viagens com o objetivo
de intercâmbio cultural. Num terceiro momento, o turismo de aventura, realizado
internamente, apresenta-se por meio do movimento das Entradas e Bandeiras4.
Ainda em conformidade com o pensamento de Ignarra (2003), teria sido uma
expedição do naturalista alemão, Von Humboldt, o primeiro registro de turismo
ecológico no Brasil. Com a transferência da corte portuguesa para a colônia, tem-
se início a hotelaria no Brasil. Posteriormente, registra-se, principalmente no Rio
de Janeiro, um grande avanço na área de transportes e hotelaria. Contudo, de
acordo com Ignarra
3 Entre os anos de 1534 e 1536, o rei de Portugal D. João III dividiu a terra brasileira em faixas, que
partiam do litoral até a linha imaginária do Tratado de Tordesilhas. Tais faixas de terras, conhecidas como Capitanias Hereditárias, foram doadas para nobres e pessoas de confiança do rei. Estas pessoas, chamadas de donatários, tinham a função de administrar, colonizar, proteger e desenvolver a região. Cabia também a eles combater os índios de tribos que resistiam à ocupação do território. Em troca destes serviços, além das terras, os donatários recebiam algumas regalias, como a permissão de explorar as riquezas minerais e
vegetais da região. 4 Expedições organizadas para explorar o interior com o propósito de procurar riquezas minerais, tais
como ouro, prata e pedras preciosas. Objetivavam também caçar e apresar índios para escravizá-los.
44 4
4
Apenas em 1968 o governo brasileiro criou os primeiros instrumentos de regulamentação da atividade com formação do Conselho Nacional de Turismo (CNTUR), do Fundo Geral de Turismo (Fungetur) e do Instituto Brasileiro de Turismo (Embratur). (IGNARRA, 2003, p. 08)
As constantes mudanças, atualmente, impostas pela globalização e o
desenvolvimento tecnológico às cidades, bem como a transição do emprego, dos
setores tradicionais, para áreas cada vez mais alternativas, obrigam a que se
descubram novas vocações para o trato do espaço urbano. Por outro lado, há
uma grande necessidade de captar recursos e investimentos, de gerar emprego e
riqueza, bem como reanimar a economia local e revitalizar a cidade, o que propõe
um novo desafio, sobretudo na intensidade com que se exprime, que é o da
competitividade.
Uma solução comum no sentido de criação das novas vocações e atrativos
nas cidades tem sido a aposta em atividades culturais e lúdicas, visando uma
maior valorização do legado cultural local, bem como um implemento no setor
turístico. Nesse sentido tem-se feito um enorme empreendimento, visando esforço
de reconfiguração dos espaços, muitas vezes através de uma renovação da
paisagem local ou até mesmo através da construção de museus e outros espaços
que possam atrair turistas e visitantes, ou ainda, com a realização de eventos e a
revitalização e dinamização da vida cultural.
Nesse sentido, não se pode negligenciar a importância dos meios de
comunicação de massa e das estratégias de comunicação empregadas com o
intuito de divulgar e ―vender‖ um determinado destino turístico. Deve-se destacar
a importância das campanhas publicitárias, fortes aliadas do local no espaço
global. Faz-se importante também, diante da velocidade de mudança não só dos
aparatos tecnológicos, como também do comportamento do público diante dos
mesmos, pensar as novas tecnologias da informação e as suas mais diversas
utilizações, compreendendo o fenômeno das redes sócias e a maneira como a
Internet reconfigura o entendimento humano de tempo e espaço.
Neste ponto faz-se necessário, diante da importância dos media para a
divulgação dos destinos turísticos, entendendo o turismo como uma indústria,
apreender um pouco melhor os conceitos de publicidade e propaganda.
Segundo Sant‘Anna (1998, p.75)
45 4
5
publicidade [...] designa a qualidade do que é público. Significa o ato de vulgarizar, de tornar público um fato, uma idéia. Propaganda é definida como a propagação de princípios e teorias. [...] Seria então a
propagação de doutrinas religiosas ou princípios de algum partido.
Embora, além de Sant‘Anna, outros autores também costumem
estabelecer diferenças entre esses dois termos, para este trabalho será levado
em consideração o conceito adotado por Perez e Bairon (2002), que os toma por
sinônimos, conceito, admitido pelo próprio Sant‘Anna, que reconhece que a
diferença entre os dois termos é uma linha tênue, e que por muitas vezes estes
podem ser tratados como similares, o que facilitará o entendimento do conceito.
Com relação ao surgimento e à necessidade da propaganda, pode-se dizer
que ―para que a propaganda tenha algum sentido, pelo menos um segmento da
população terá que viver acima do nível de subsistência.‖ (VESTERGAARD &
SCHRØDER, 1994, p.3)
Isso porque a propaganda só passa a ter função como diferencial
competitivo, entre dois ou mais produtos, quando existe um mercado potencial,
onde há poder de compra e se faz necessário atingir esta demanda,
estabelecendo diferenças entre produtos, que a priori parecem idênticos, ou ainda
no caso de ―bens desnecessários‖ criando nos clientes o desejo de adquiri-los.
Para Vestergaard e Schrøder (1994) a verdadeira expansão da
propaganda se dá quando, no final do século XIX, há um crescimento significativo
da produção em massa, gerando uma subdemanda em relação à superprodução.
A partir deste momento, a propaganda muda de fisionomia passando a ter um
caráter predominantemente persuasivo. Até então, a propaganda tinha por
característica ser descritiva, embora Baudrillard (1992) chame a atenção para as
primeiras propagandas de poções milagrosas que, apesar de descritivas, eram
extremamente tendenciosas.
Com a sociedade pós-industrial, de fato, o caráter racional da publicidade revelou-se não só do ponto de vista econômico das mercadorias de venda, mas também daquelas tendências culturais e comportamentais mais sutis que ela consegue representar, sintetizar e, também, antecipar. (CANEVACCI, 2001, p.154)
Com essa mudança do perfil da produção impulsionada pelo
desenvolvimento tecnológico, a publicidade se vê obrigada a reformular-se,
partindo para uma estratégia onde, aparentemente, vale tudo para conquistar o
46 4
6
cliente. ―Ninguém desejará adquirir um produto que não lhe pareça ter valor de
uso.‖ (VESTERGAARD & SCHRØDER, 1994, p.7). Para o vendedor o importante
é que seu produto pareça ter algum valor para o seu cliente, levando-o a adquiri-
lo, mesmo que seja um ―falso valor de uso‖. ―Quanto mais atraente o produto,
mais as pessoas desejarão adquiri-lo e menor será o intervalo entre a data em
que ele sai da fábrica e aquela em que é vendido‖ (VESTERGAARD &
SCHRØDER, 1994, p.7)
A relação que se mantém hoje com os objetos é do tipo lúdico e não
utilitário; os objetos e as coisas têm muito mais valor de troca do que valor de uso.
Os produtos não são vistos pela sua real utilidade ou inutilidade, mas pelas
ilusões que eles proporcionam.
[...] jamais se consome um objeto por ele mesmo ou por seu valor de uso, mas em razão de seu ―valor de troca signo‖, isto é, em razão do prestígio, do status, da posição social que confere. [...] A sedução funciona cada vez menos pela solicitude, pela atenção calorosa, pela gratificação, e cada vez mais pelo lúdico, pela teatralidade hollywoodiana, pela gratitude superlativa. [...] A sedução provém da suspensão das leis do real e do racional, da retirada da seriedade da vida, do festival de artifícios. [...] Nada igual a publicidade: ao invés da coerção minuciosa, a comunicação; no lugar da rigidez regulamentar, a sedução; no lugar do adestramento mecânico, o divertimento lúdico. (LIPOVETSKY, 1989, P.171-188)
Guyot apresenta a publicidade como grande consumidora de
ferramentas teóricas que lhe permitam analisar e compreender o indivíduo em suas relações com seus próprios desejos e motivações, em suas interações com os outros indivíduos da sociedade, em sua
percepção da mídia e de seus modos de representação. (GUYOT apud JOLY, 1996, p.69 – 70)
Se, teoricamente, ―a publicidade tem como tarefa informar as
características deste ou daquele produto e promover a sua venda‖
(BAUDRILLARD, 1992, p.291), longe disso, apresenta-se como uma importante
ferramenta de persuasão com a finalidade de induzir ao consumo. ―Da
informação, a publicidade passou à persuasão, depois à ―persuasão clandestina‖,
visando agora a um consumo dirigido.‖ (BAUDRILLARD, 1992, p. 291) Esta
persuasão está pautada no consenso social, na necessidade humana de conviver
em grupo.
Segundo a escala das necessidades de Masllow, além das necessidades
básicas (alimentação, vestuário, moradia) existem necessidades que estariam em
47 4
7
um nível secundário, que seriam as necessidades de satisfação sócio-cultural. O
que mais chama a atenção neste ponto é que essas necessidades são
deslocadas do individual para o coletivo, servindo depois para destacar o
indivíduo do resto do grupo.
A publicidade não se fia na espontaneidade das necessidades individuais, prefere controlá-las pelo funcionamento do coletivo e pela cristalização da consciência sobre esse coletivo puro [...] Paradoxalmente somos induzidos a comprar em nome de todo mundo, por solidariedade reflexa, um objeto sobre o qual a nossa primeira providência será usá-lo para nos diferenciar-nos dos outros. A nostalgia coletiva serve para alimentar a concorrência individual.(BAUDRILLARD, 1992, p.298)
Neste ponto, a publicidade transcende seu objetivo primordial de informar a
respeito do produto e vendê-lo, passando a agir como meio formador de
consenso social. Segundo Marcondes Filho (1988) além da persuasão voltada à
venda a publicidade desenvolve uma função muito mais profunda na sociedade.
Ela se apresenta como meio difusor de padrões estéticos, comportamentais e
físicos.
[...] a publicidade não disfarça a apresentação das normas. Não é indireta nem discreta. Ela é quem determina os tipos estéticos a serem seguidos. [...] Em primeiro lugar, ela vende, define, idealiza os modelos estéticos, sexuais e comportamentais. (MARCONDES FILHO,1988, p.77)
O autor afirma ainda que, ao mesmo tempo em que a publicidade induz ao
consumo é o veículo dos valores e desejos da cultura que a consome. Há muito,
ela deixou de ser uma forma de comunicação que busca informar a alguém sobre
um determinado produto, ela é parte da cultura que busca cumprir seu novo e
ampliado papel. Até porque, o processo de produção capitalista aparta o ser
humano de sua participação nas diversas etapas de confecção do produto e, por
conseguinte, da atribuição de significado. Os produtos – mercadorias –
destituídos de significação ficam à deriva, precisando de atribuição de sentido.
Para que o capitalismo pudesse prosperar, não só como regime
econômico, mas como ideologia, criou-se a necessidade de que os consumidores
acreditassem nos produtos, não bastava simplesmente consumi-los. Era de
fundamental importância que por meio do consumo se aderisse ao projeto de
felicidade futura proposto pela publicidade a eles. Objetos vários e mercadorias,
48 4
8
de maneira geral, passam a ter significados impostos por seus produtores via
publicidade
―Enquanto o volume das despesas publicitárias apresenta um aumento
constante, ela não cessa de invadir novos espaços.‖ (LIPOVETSKY, 1989, p.185)
Parece não haver limites para o poder de penetração da publicidade. Cada
nova mídia descoberta logo se apresenta como um suporte eficiente para a
publicidade e é, automaticamente, invadida por anúncios, nas suas mais diversas
formas, diretos ou subliminares, implícitos ou explícitos.
―A publicidade entra no museu, organizam-se exposições retrospectivas de
cartazes, distribuem-se prêmios de qualidade, é vendida em cartões postais [...] a
publicidade cobiça a arte e o cinema, põe-se a sonhar em abarcar a história.‖
(LIPOVETSKY, 1989, p.185).
Desta mesma forma, as imagens publicitárias, estabelecem esse diálogo
com o receptor, mas ao invés de uma contemplação permanente, esperam como
resposta o consumo do produto anunciado, uma adaptação aos padrões por ela
representados, a aceitação do modelo padrão de cidadão e atitude perante a
sociedade, imposto pela mídia. ―A publicidade trabalha com ―modelos‖, modelos
de beleza, de sensualidade, de elegância, de cor, de jeito de falar, de andar, de
se alimentar, de namorar, enfim modelos para todas as situações‖ (MARCONDES
FILHO, 1988, p.79)
2.2 Turismo e Tecnologia
Vive-se hoje, em realidade, numa cibercultura, conforme explica o autor
francês Pierre Lévy (1999). Uma cultura que está sendo cada vez mais informada
pela máquina, pelo computador, pelo cibernético, pelas virtualidades. Ainda para
Levy nossa cultura se caracteriza por ser uma tecnocultura, ou seja, uma cultura
que não pode mais ser entendida de forma separada da tecnologia. Nossas vidas
são moldadas e construídas pelas tecnologias, especialmente as tecnologias da
comunicação.
Trata-se de uma cultura onde a relação homem-máquina torna-se cada
vez mais forte e onde a tendência parece ser a integração dos dois. Cibernética,
49 4
9
a ligação do cérebro ao computador, os mundos virtuais, tudo isso parece indicar
uma fusão do humano com o maquinal, até mesmo no nível do corpo. Os filmes
de David Cronemberg (Videodrome, eXistenZ) mostram essa idéia muito bem.
Isso também pode ser visto claramente no filme Matrix, onde as máquinas
dependem da energia do corpo humano para sobreviver.
Assim sendo não se pode negligenciar a importância dos mass media e
das técnicas a estes relacionadas para o desenvolvimento do setor turístico, bem
como a divulgação de um destino em específico.
Como afirma Goeldner (et al 2002, p. 194) ―Os meios de comunicação de
massa são importantes no desenvolvimento do turismo. Seja como meio de atrair
turistas, seja para informá-los e entretê-los depois de sua chegada.‖ Estudos
apontam para um grande aumento da demanda turística. Demanda esta que
Cooper (et al 2001) acredita ter se tornado cada vez mais sofisticada. Para
abarcar uma fatia destes turistas, pode-se prevê que os destinos turísticos
precisarão cada vez mais lançar mão de estratégias de marketing e ferramentas
de comunicação que lhes possibilitem tanto uma customização do seu produto,
adequando o mesmo às necessidades dos turistas, como uma boa divulgação e
distribuição frente a este crescente público consumidor em potencial. Para o
autor, as tecnologias da informação foram responsáveis por uma ―segunda
revolução industrial‖, revolução esta que ―tem tido um grande impacto sobre a
competitividade das empresas de turismo e sobre as destinações no mundo todo.‖
(COOPER et al 2001, p. 457) e continua ―a atividade turística depende de boa
disseminação de informações e da distribuição eficaz do produto‖. (COOPER et al
2001, p. 457)
Observando-se tal importância e o papel dos mass media é que,
provavelmente, foi pensada a campanha da Bahiatursa para o São João da
Bahia. Spot de rádio, VT para televisão e site na grande rede, além de outras
mídias.
Não se pode ignorar, em tempos de globalização, a capacidade de
penetração da televisão levando-se em consideração desde a sua popularização
pós II Guerra Mundial, até os dias de hoje, quando é possível ver barracos de
madeira nos morros, ostentando em seus telhados, antenas parabólicas. No
Brasil e no mundo, em todas as classes sociais, nas localidades mais distantes
50 5
0
dos grandes centros urbanos, inclusive em zonas rurais, a televisão tem chegado.
A televisão, que inicialmente surge como sucessora do rádio, devido ao seu
caráter múltiplo (áudio e vídeo), atinge proporções de importância, ocupando
lugar de destaque na sociedade, em dado momento fazendo até mesmo parte do
processo familiar. Pessoas passam a se reunir em torno deste aparato
tecnológico para desfrutar de momentos singulares, e não apenas membros de
uma única família, vizinhos que antes se reuniam ao redor da fogueira para contar
―causos‖, passam a se reunir diante da televisão para ouvir e ver as histórias ali
exibidas. Aos poucos as notícias de terras longínquas começam a invadir as
casas através dos raios catódicos dos tubos de televisão, o contato com outras
culturas passa então a modificar o modo de pensar a própria cultura.
A televisão ganhou mais força com o uso de satélites e do sistema de
microondas o que permitiu uma cobertura de todo o território brasileiro com a
transmissão de programas nacionais e internacionais.
Ferramenta fundamental para os tempos de hoje, a Internet, tem sua
criação e desenvolvimento, segundo Castells (2003), de um fusão entre a
estratégia militar, cooperação científica, iniciativa tecnológica e inovação
contracultural. Para o autor, a Internet tem origem em um projeto da ARPA
(Agência de Projetos de Pesquisa Avançada), do Departamento de Defesa
americano, com o objetivo de preservar informações em caso de possíveis
ataques militares, descentralizando o armazenamento de tais informações. A este
projeto juntou-se a comunidade científica americana inicialmente com a
participação das Universidades da Califórnia em Los Angeles e Santa Bárbara, da
Universidade de Utah e do Stanford Research Institute. A partir deste ponto, a
Internet começa a ser utilizada não apenas com fins militares, mas também a se
popularizar e se disseminar cada vez mais em diferentes esferas da sociedade
acadêmica e posteriormente atingindo o público em geral. Segundo Briggs e
Burke (2004, p. 310) ―o grande avanço aconteceu entre setembro de 1993 e
março de 1994, quando uma rede até então dedicada à pesquisa acadêmica se
tornou a rede de redes, aberta a todos.‖ Em paralelos estudos eram
desenvolvidos com o intuito de facilitar e otimizar cada vez mais o tráfego de
dados nas redes. Investimentos foram realizados no desenvolvimento de
tecnologias mais eficientes. Com um crescimento a uma velocidade
51 5
1
absurdamente rápida, no que diz respeito a recursos tecnológicos e lógicos e de
uma mutabilidade quase que instantânea entre os seus usuários a Internet torna-
se hoje uma ferramenta de comunicação eficaz e indispensável. Richards (in
CAMARGO & CRUZ, 2009) aponta dados de uma pesquisa da ATLAS
enfatizando a crescente importância da Internet para o setor turístico, como fonte
de coleta de informações e meio de estabelecer contato, e destaca o alto uso
deste recurso principalmente pelos jovens.
Para esses nômades globais, a tecnologia é uma interface com a cultura que estão visitando, tanto quanto uma janela para as culturas que possam querer visitar. Novos amigos são feitos por meio da internet, os quais podem prover informações sobre seu próximo destino ou mesmo uma cama na chegada. Endereços eletrônicos colecionados de companheiros de viagem tornam-se provisão de capital cultural a ser empregado no futuro. Esse fenômeno está também sendo reconhecido pelas operadoras de turismo, que às vezes tentam vender viagens como meio de construir redes sociais para apoiar viagem futura. (RICHARDS in CAMARGO & CRUZ, 2009, p.41)
A internet, hoje, também possui uma grande responsabilidade no que diz
respeito ao avanço da tecnologia da comunicação permitindo que a globalização
também faça parte do contexto cultural de um povo.
2.3 Turismo Cultural
Entende-se com Richards (in CAMARGO & CRUZ, 2009, p. 25) que ―o
turismo cultural tem sido, nos últimos tempos considerado o setor de maior
crescimento no turismo global.‖ Entretanto faz-se necessário uma melhor
compreensão do que vem a ser o turismo cultural, qual o perfil do turista cultural e
o que tal prática representa em termos de desenvolvimento e prejuízo para as
comunidades receptoras. Entende-se como sendo de suma importância para
qualquer estudo nesta área traçar conceitos claros e objetivos, uma vez que
estamos tratando de dois termos extremamente vastos em definição. Segundo o
autor justamente por entender a dificuldade em lidar com conceitos extremamente
vastos
a OMT propôs uma definição mais ―estreita‖, a qual abarcava movimentos de pessoas em busca de motivações essencialmente culturais, tais como excursões de estudo, teatralizações e excursões
52 5
2
culturais, visitas a localidades e monumentos, viagens para estudar a natureza, folclore ou arte e peregrinações. O aspecto central nessa definição é que o turismo cultural envolve ―essencialmente motivações culturais. (RICHARDS in CAMARGO & CRUZ, 2009, p.26)
Assim sendo estariam aqui excluídos aqueles que, visitando uma
destinação com outra finalidade, se deparasse com manifestações culturais de
qualquer natureza. O que o mesmo chama de ―turistas culturais por acidente‖.
De acordo com Avila
Diversos destinos, apesar de suas potencialidades, não conseguem promover adequadamente o turismo cultural. No Brasil, ainda não existe a consciência do que cultura e turismo podem representar para o desenvolvimento, ou, se existe, até o momento pouco foi feito para colher benefícios que supostamente se possa obter. (in AVILA 2009, p. 18)
Um dos fatores mais importantes a ser observado, quando se pensa nas
engrenagens que movimentam a máquina da indústria turística é a ―motivação‖ do
turista. Todos os esforços primordiais passam por despertar no turista potencial a
intenção de viajar, de conhecer um determinado destino. Para Goeldner (et. al.
2002, p. 151) ―Pode-se dizer que os atrativos são as razões pelos quais as
pessoas viajam. Nesse caso, os atrativos são o mais importante componente do
sistema turístico.‖ Os atrativos são de diversas naturezas , e muitas vezes uma
combinação desses atrativos é o que define a motivação de um turista em
escolher um determinado destino.
Goldner (et al 2002, p.151) reforça que ―sem eles [os atrativos turísticos]
levando os turistas para os destinos, haveria pouca necessidade dos outros
serviços turísticos, como transportes, hospedagem, alimentação, distribuição e
assim por diante.‖ Para o autor a indústria turística é muito mais que apenas
atender essas necessidades ―físicas‖. No grande complexo, estão também
envolvidos um contato com culturas plurais e a troca de experiências entre os
indivíduos. Explica que para tanto é necessário ao setor turístico um
aprimoramento dos meios através dos quais uma localidade se apresenta. Desta
maneira, entende-se que, mesmo não sendo o único atrativo de uma localidade, a
cultura tem, por sua vez, uma importância significativa para um destino. Para
Goeldner
O turismo cultural cobre todos os aspectos através dos quais as pessoas aprendem sobre as formas de vida e pensamento umas das outras. O turismo, assim, é um importante meio para promover relações culturais e cooperação intercultural. Por outro lado, o desenvolvimento
53 5
3
de fatores culturais dentro de uma nação é um meio de aprimorar recursos para atrair visitantes. (et al 2002, p.151)
Conforme Selwyn (1996 apud Peralta 2003, p.88) ―[…] o que faz com que
um destino turístico seja atractivo é o facto de se pensar que tem uma
característica especial, um ‗espírito de lugar‘ especial […]‖ De acordo com Peralta
(2003), MacCannell (1976), propõe o entendimento do turista moderno como um
―estruturalista‖ arquetípico, dessa maneira poder-se-ia entender o turista como
alguém motivado pelo desejo de recuperar uma essência mitológica perdida no
passado, devorada pela modernidade.
O turista procura recapturar os totens de um tempo e de um mundo que idealiza como míticos, aos quais ele já não pertence. Um tempo e um mundo pré-modernos, cuja autenticidade deriva da sociabilidade dos seus residentes, imaginados pelo turista para refazer a perda dos referentes simbólicos que a modernidade lhe legou. Move-se, em suma, em busca do ―outro autêntico‖, procurando encontrar nesse processo o ―eu autêntico‖ que existe na imaginação do turista. Se esse ―outro autêntico‖ não existe, ou se existe de forma difusa, há que, senão ―inventá-lo‖, pelo menos recriá-lo. (PERALTA, 2003, p. 89),
Peralta continua afirmando que, em se considerando verídica a
argumentação de MacCannell (1976), apesar das críticas sofridas por parte de
Cohen (1988) poder-se-ia afirmar que, a atual tendência dos turistas de se
deslocarem cada vez mais em sentido aos destinos de caráter cultural, se deve a
um sentimento de ―nostalgia por um passado autêntico‖.
―O turista que procura os destinos culturais fá-lo pelo carácter simbólico
das ―imagens‖ e ―objectos‖ do passado que lhe são oferecidos, que representam
um mundo definitivamente perdido e irrepetível.‖ (Peralta, 2003, p.89). A autora
afirma ainda que pelas razões aqui discutidas os destinos culturais estariam entre
os destinos mais ―autênticos e com um valor sagrado mais elevado‖ (Peralta,
2003, p.89).
De acordo com Barretto (1995) faz-se necessário delimitar de maneira
clara o conceito de ―Turismo Cultural‖, evitando visões reducionistas como, por
exemplo, as correntes de pensamento que relacionam tal prática turística à ―alta
cultura‖ (conceito já discutido no capítulo anterior) ou até mesmo ao folclore, que
muitas vezes é exibido de maneira espetacularizada. Ainda para a autora o
―turismo cultural seria aquele que tem como objetivo conhecer os bens materiais e
imateriais produzidos pelo homem.‖ (BARRETTO, 1995, p.21). Por essas razões,
54 5
4
entende-se que o turismo cultural, como atrativo principal ou exclusivo, ou ainda
mesmo como atrativo complementar, apresenta-se com uma crescente
importância para a indústria turística.
A explosão de sentidos e significados numa determinada cultura, num certo
nível de amadurecimento, entendida como gradualismo, não como evolucionismo,
é uma das chaves para se compreender a semiótica da cultura postada pelo
pensador russo Yuri Lotman5. Trata-se de buscar em que medida a cultura pode
apresentar um saturamento das funções do ponto de vista dos significados ou da
produção de sentidos, resultando disso numa explosão- criação de novos
significados para as culturas ou em hibernação dos elementos dessa cultura. É
preciso pensar nas mediações ou relações nas quais a semiótica da cultura vai
estabelecer pontos de contato para a possibilidade de compreensão dos diversos
significados da cultura. Não se trata de buscar uma causalidade, mas de entender
o que é previsível ou não previsível.
Segundo Lotman(1996), as manifestações culturais, por excelência,
estabelecem processos geradores de múltiplos significados. Ainda para o autor,
os historiadores tendem a tratar melhor das culturas enquanto gradualismos, do
que buscar, na relação entre as culturas, mudanças significativas. Nesse
momento, entra o conceito de cultura como texto.
Entender a cultura como um texto que se entretece a partir da
multiplicidade de signos, como algo relacional, interna e externamente, buscando
marcas no texto, em que se pode perceber os movimentos, a língua, noções de
pertença, proximidade e estranhamento que vão tratar o texto como cultura como
possibilidade de leitura e interpretações diversas, nas mediações. Lotman
entende que o ―sujeito cultural, ao criar novos textos no processo de choque com
o ‗outro‘, deixa de ser ele mesmo‖, ao mesmo tempo em que ―a cultura é um
sistema que se auto-organiza, no nível meta-estrutural. Ela se descreve a si
mesma como algo previsto e rigorosamente organizado.‖ (LOTMAN: p74,75)
A cultura, portanto, está sempre mediada pela linguagem, define-se pelo
significado que elas acumulam e pela reelaboração desses significados, por suas
5 � Yuri Lotman (1922-1993), semioticista da Escola de Tartú, Estônia.
55 5
5
funções, entre elas, a ideologia. Os símbolos, como mecanismos da memória da
cultura, podem transportar textos, sujeitos e outras informações semióticas de
uma cultura a outra. Assim, cultura é texto e também memória. Esta última seria
uma característica da semiosfera, pois transportaria um conjunto de signos e
significados entre as culturas. Esses contornos da cultura seriam dadas pelas
fronteiras, filtros que marcam contornos, estabelecem mediações, tais como;
centro/periferia e ainda tornam possível a auto-compreensão a partir da descrição
que fazem os símbolos nas culturas. Os símbolos acabam atuando como
mensageiros de outras culturas, como lugar de recordação dos fundamentos das
culturas, podendo tornar-se mediadores entre diferentes esferas de semiose6,
entre a sincronia do texto e a memória da cultura. Entendendo memória como
textos produzidos e produzindo significados, e cultura como memória desses
textos. A memória da cultura garante ao mesmo tempo a unidade dos textos e
sua diversificação.
Para Lotman, a memória cultural se opõe ao tempo, no sentido de finitude,
mas conserva o passado como algo que existe. O autor diz que
os sentidos na memória da cultura não ‗se conservam‘, mas crescem Os textos que formam a ‗memória comum‘ de uma coletividade cultural, não somente servem de meio de esclarecimento dos textos que circulam no corte sincrônico contemporâneo da cultura, mas também geram novos textos. (LOTMAN, p160)
O turismo cultural é recente, mas vem crescendo bastante, pois sua
característica é permitir mudanças nas motivações das viagens e no olhar do
visitante em relação aos roteiros, por essa razão vem se consolidando no Brasil e
o estado da Bahia é um excelente celeiro de produção cultural, palco para tal
prática.
O turismo cultural vem ocupando o terceiro lugar nas preferências dos
visitantes no Brasil, perdendo somente para a prática moderna do Ecoturismo e
do turismo de aventuras que, atualmente, tem crescido bastante.
Nas cidades históricas brasileiras, o turismo cultural ancora-se em um
trabalho de conscientização sobre a importância de se preservar o patrimônio
material e imaterial dos espaços visitados para se desenvolver, o que vai
6 Produção de sentido, de significado
56 5
6
contribuir bastante para que se crie um novo olhar, permitindo que gerações
conheçam a história passada da vivência das comunidades.
Aliado a isso propõe que políticas de interpretação do Patrimônio sejam
aplicadas com eficiência nas localidades, onde é possível praticar o Turismo
Cultural, assegurando que a conservação e a preservação aconteçam por parte
dos visitantes e moradores.
É necessário que as comunidades locais compreendam a importância de
se conservar seu patrimônio cultural. Nenhum valor haverá em tombar e preservar
um patrimônio se não houver o estabelecimento, dentro da comunidade, da
consciência sobre a importância do ato da preservação e da conservação pelo
bem das gerações que estão por vir, uma vez que os verdadeiros proprietários
dos bens culturais são as comunidades locais, porque são elas que comungam e
sensibilizam o viver cultural e o sentimento de pertença.
Aqui, entende-se ―Patrimônio Cultural‖
como a representação simbólica das identidades dos grupos humanos, isto é, um emblema da comunidade que reforça identidades, promove solidariedade, cria limites sociais, encobre diferenças internas e conflitos e constrói imagens da comunidade (CRUCES apud PEREZ, 2009, p.140).
É importante também compreender que ―patrimônio‖ está relacionado a
todos os bens que são herdados, ―bens mobiliários e imobiliários, capitais e
outros.‖ (PEREZ, 2009, p. 140). Desta forma o autor explica que por vezes
patrimônio cultural é tomado por patrimônio e relacionado a tudo que pode ser
herdado do passado. Em meio a essa confusão insurge o discurso exagerado da
recuperação patrimonial, criando uma imagem estática diante do processo
dinâmico que caracteriza a cultura.
O património cultural tende a ter um sentido público, comunitário e de identificação colectiva alargada. Pelo contrário, o património, ainda que às vezes se empregue no sentido de património cultural, tem um sentido mais restrito, familiar e individual, fazendo mais referência ao contexto privado e particular. (PEREZ, 2009, p. 141)
Nesse sentido, uma boa alternativa para a preservação dos bens culturais
é investir num processo educacional que vislumbre a conscientização da
sociedade sobre o real valor do patrimônio cultural e a sua conservação como um
57 5
7
passo fundamental para a preservação dos bens e tal atitude fortalecerá
sobremaneira o desenvolvimento do Turismo Cultural nas cidades de maneira
geral.
O turismo tem em si certa contradição, porque ao mesmo tempo em que
cria uma mentalidade preservacionista dos bens culturais é também responsável
por boa parte da degradação de muitos locais. Na verdade, o turismo cultural
assim como o ecoturismo acabou por firmar maior preocupação com a
conservação e preservação dos bens considerados culturais e é com base nisto
que busca motivar os visitantes a se interessarem pelas questões culturais.
O Ministério do Turismo determina que:
Turismo Cultural compreende as atividades turísticas relacionadas à
vivência do conjunto de elementos significativos do patrimônio histórico e
cultural e dos eventos culturais, valorizando e promovendo os bens
materiais e imateriais da cultura.
O turismo cultural possibilita nos visitantes a motivação de enriquecimento
por meio da cultura, seja através do conhecimento histórico dos lugares visitados
ou do prazer da contemplação e percepção dos significados dos patrimônios ou
das manifestações populares das localidades.
Como já visto, entende-se o turismo num contexto geral como sendo uma
alternativa viável para compensar o declínio de outras atividades, haja vista sua
grande potencialidade em geração de recursos econômicos e movimentação de
diversos setores da sociedade. No nordeste do Brasil, por exemplo, uma das
manifestações mais visitada e estimulada é a Festa de São João, verdadeiro
inventário cultural do viver e fazer nordestino. Desta maneira é importante pensar
o ―São João da Bahia‖ como uma interessante alternativa, uma vez que
prioritariamente os maiores produtos turísticos baianos são ―sol e praia‖ e
carnaval, e por se tratar de uma época que não favorece o turismo de ―sol e
praia‖, acabou-se criando uma alternativa de turismo cultural para o inverno.
Pensar uma saída que ainda assim movimente o turista no Estado, ainda
mais no sentido do interior, por natureza já desfavorecido na alta estação do
verão, pode ser uma interessante saída econômica, e também sócio-cultural, uma
vez que se trata de uma festa fortemente enraizada na cultura popular. Para
58 5
8
tanto é fundamental identificar os elementos que representem a ―autêntica‖ cultura
dos possíveis destinos de São João, bem como as alternativas no que se refere a
eventos.
2.4 Turismo de Eventos Quando se fala em ―São João da Bahia‖, não se pode ignorar que,
concomitantemente ao Turismo Cultural, pode-se também observar um forte
desenvolvimento do ―Turismo de Eventos‖, uma vez que se entende que grande
parte dos turistas e visitantes que se deslocam para os destinos turísticos
envolvidos nesse processo, são motivados pelos grandes eventos promovidos
tanto pela iniciativa privada como pelos órgãos de administração pública das
referidas localidades. Dessa forma observa-se que os eventos são uma prática
frequente da sociedade moderna e já se tornaram parte integrante do meio
cultural desta. Os eventos estão entre os segmentos que mais crescem no
turismo a nível mundial.
Por ―Eventos‖, entende-se como Canton que
Evento é a soma de ações previamente planejadas com objetivo de alcançar resultados definidos junto ao seu público-alvo […] O evento, pelo próprio significado da palavra, é todo fato ou acontecimento, espontâneo ou organizado, ocorrido na sociedade, que sob o ponto de vista do profissional pressupõe planejamento e organização. Canton (1998, p. 102)
Ainda conforme a autora, os eventos são vistos como uma forma de
atrativos de visitantes e influenciam no aumento de gastos médios por turistas, e
também no período de permanência dos mesmos. Para Canton, os eventos
funcionam também na construção da imagem de um determinado destino turístico
criando um perfil e posicionando-os no mercado. Segundo Goeldner ―os festivais
e os eventos são uma parte importante do setor turístico. Eles podem servir como
uma ferramenta poderosa para atrair visitantes fora da temporada e criar uma
imagem, divulgando a região.‖ (GOELDNER et al 2002, pg.162) Desta maneira
os eventos apresentam-se como ferramentas importantes no que se refere ao
combate à sazonalidade turística, uma vez que, ao contrário do turismo de ―praia
59 5
9
e sol‖, o Turismo de Eventos independe da estação, podendo ocorrer em diversos
períodos do ano.
Entende-se como Brito e Fontes (apud CEZARIO, s/d, p.1) que
o turismo de eventos é um segmento do turismo que cuida de vários tipos de eventos que se realizam dentro de um universo amplo e diversificado, refletindo o esforço mercadológico das diversas áreas da saúde, cultural, econômica, jurídica, artística, esportiva e comercial. O evento proporciona ao grupo a troca de informações, a atualização, a tecnologia, o debate de novas proposições, o lançamento de um produto contribuindo para a geração e o fortalecimento das relações sociais, industriais, culturais e comerciais, ao mesmo tempo em que são gerados fluxos de deslocamento e visitação.
Observa-se, nos dias atuais, uma maior preocupação das empresas em
associar suas marcar a grandes eventos como festivais de música, dança, teatro
e outros, criando desta forma uma maior aproximação com o seu público e
transmitindo mensagens mercadológicas, por meio do entretenimento e do lazer,
pois nesses momentos, as pessoas vivenciam experiências e são sensibilizadas
de forma atraente e inusitada.
Tais eventos, sejam eles realizados a nível local, regional, nacional, ou até
mesmo internacional, podem promover o chamado Turismo de Eventos, uma vez
que se pode observar o deslocamento de indivíduos interessados nas atrações
dos mesmos. Desta forma, acompanha-se um crescimento significativo deste
setor da indústria do turismo, haja visto uma forte tendência no aumento da
produção de eventos, o que faz aumentar o deslocamento de pessoas para
participarem dos mesmo. Em se tratando do São João da Bahia, é crescente o
número de eventos produzidos todos os anos, bem como pode-se também notar
um aproveitamento do ―São Pedro‖ como uma possibilidade de se estender o
período festivo no início da ―baixa-estação‖.
Assim sendo pode-se observar a inserção de novas tendências na área de
turismo de eventos, voltadas para todos os segmentos, inclusive para produções
de eventos com foco mercadológico, para o público jovem, e carregadas de uma
forte carga de apelo aos elementos da cultura popular, como no caso específico
do São João. Contudo Nóbrega (s/d) defende a ideia de que, na sociedade
contemporânea, o comportamento dos indivíduos, no que diz respeito ao
divertimento e lazer, pouco ou nada tem a ver com uma motivação de base
cultural, um dos elementos primordiais deste comportamento, estaria relacionado
60 6
0
às interferências externas, ―principalmente as enunciadas pela mídia.‖ Desta
maneira, a autora acredita que ao decidir por um determinado destino turístico, a
pessoas estaria retomando, só que de maneira concreta, a lugares que já viu
através dos meios de comunicação.
Para Mafesoli (1998, apud Nobrega, s/d, p.2) ―os públicos dos shows
artísticos, espetáculos esportivos e festas são formados independentemente de
qualquer identificação cultural entre os expectadores, os quais se reúnem apenas
por terem vontade de ―estar junto‖, de participar de grandes manifestações.‖
Ainda para Nóbrega (s/d) o principal atrativo da celebrações festivas,
estaria relacionado à sua capacidade de reunir multidões. Tal entendimento teria
levado até mesmo às manifestações de cunho religioso a uma forçada
urbanização ―em moldes de mega eventos com emprego de tecnologia, padrões
de consumo, exploração comercial e investimento promocional empresarial e
político partidário.‖ Aqui se enquadram os festejos juninos no ―São João da Bahia‖
que, muito embora ainda preserve, nas pequenas localidades, uma grande
influência do ―tradicional‖, enfrenta uma descaracterização e modernização, tendo
em muitas localidades, os mega eventos como carro chefe. As padronizadas
festas de camisa, com atrações nacionais que, por muitas vezes sequer, tem o
forró como parte do seu repertório, as excursões ―bate e volta‖, que levam o
visitante direto ao local do evento e depois de volta ao local de origem, são
exemplos claros dessa mudança no sentido inicial de tais festejos. O cunho
religioso aqui ou foi relegado a segundo plano ou ainda abandonado por
completo.
Segundo Canton (in: Rejowski 2003, p. 295)
antigamente quando não havia televisão e outros meios de massa, as pessoas buscavam as festas, quase sempre ligadas, a motivos religiosos, desde as comemorações litúrgicas, procissões, quermesses, até as festas que pareciam e, na verdade, eram pagãs, mas que cumpriam uma função religiosa, como o carnaval.
Conforme a autora, a separação do festivo e do religioso se dá a partir da
Revolução Industrial e Pós-industrial, contudo, as festas mantém forte vínculo
ainda com o lazer, tornando-se o maior atrativo do lazer extra-doméstico.
Com o desenvolvimento do setor de eventos, há também um aumento
significativo na concorrência entre os destinos turísticos. É inegável a importância
61 6
1
de se criar uma boa imagem do destino, bem como uma boa estratégia de
comunicação na divulgação de tais destinos, de forma a atingir e ―conquistar‖ um
maior número de possíveis visitantes. Segundo Gandara (in: REJOWSKI 2003) a
facilidade de acesso a informações sobre um determinado destino, tem sido fator
decisivo para os potenciais turistas no momento da escolha de uma localidade.
Nesse ponto a Internet tem tido um papel crucial. Para o autor,
somente por meio da escolha dos canais de comunicação adequados às tipologias de demanda desejadas é possível rentabilizar ao máximo os investimentos em ações comunicativas, já que as expectativas geradas nos turistas podem ser efetivamente respondidas pelos destinos turísticos.(GANDARA in: REJOWSKI 2003, p.164
Ao que parece, os eventos são, ao mesmo tempo, atrativos (festas que
levam um público específico a um determinado destino) e também importante
ferramenta de comunicação que influi na imagem dos destinos turísticos.
62 6
2
3 SÃO JOÃO DA BAHIA
―As festas permitem descobrir oscilações entre uma visão alegre e uma leitura soturna da vida.‖ Roberto DaMatta
3.1 A FESTA
Inicialmente faz-se necessário pensar que as festas, de maneira geral,
ocupam lugar de importância no modo de vida de uma sociedade. Segundo Freud
―Uma festa é um excesso permitido, ou melhor, obrigatório, a ruptura solene de
uma proibição‖ (apud AMARAL, 2001, p. 17) Para Amaral, como veremos a
seguir, também no caso do objeto desta pesquisa, há uma forte relação entre os
ritos religiosos e as festas, aparentemente, de natureza profana.
toda festa, mesmo quando puramente laica em suas origens, tem certas características de cerimônia religiosa, pois, em todos os casos ela tem por efeito aproximar os indivíduos, colocar em movimento as massas e suscitar assim um estado de efervescência, às vezes mesmo de delírio, que não é desprovido de parentesco com o estado religioso.[...] (DURKHEIM apud AMARAL, 2001, p. 12)
Desta maneira, Amaral (2001, p.13) acredita que são características
principais e comuns a todo tipo de festa: ―(1) — a superação das distâncias entre
os indivíduos, (2) — a produção de um estado de ―efervescência coletiva‖ e (3) —
a transgressão das normas coletivas‖. Para a autora, a partir do entendimento
que, no ―divertimento em grupo‖, bem como nos ritos religiosos, há uma
substituição do indivíduo pelo coletivo, pode-se afirmar que as festas populares
têm um papel fundamental de manutenção da ordem social, servindo para
―reavivar os ―laços sociais‖ que correm, sempre, o risco de se desfazerem‖.
Assim, acredita-se que ―as festas seriam uma força no sentido contrário ao da
dissolução social‖. (AMARAL, 2001, p.13) Entende-se aqui, como Durkheim e
Amaral que as festas funcionam como uma ―válvula de escape‖, onde o indivíduo
se liberta da tensão do trabalho cotidiano, atingindo um estado onde ―sua
imaginação está mais à vontade‖. (DURKHEIM apud AMARAL 2001, p.13) Ao que
se conclui, com a autora, que, a função social do divertimento (pressuposto da
festa) é ―reabastecer‖ o indivíduo para o retorno à ―vida séria‖. Acredita-se ainda
63 6
3
que a energia gerada pela aglomeração de indivíduos é redistribuída para todos
os participantes.
Desta maneira, compreende-se a importância social das festas, como
instrumento de transformação do individual em coletivo, fundamental processo
mantenedor de uma relativa ordem social e, como afirma Bataille, ―a fusão da vida
humana. Ela é para a coisa e o indivíduo o cadinho onde as distensões se fundem
ao calor intenso da vida íntima‖ (apud AMARAL, 2001, p.14)
É mister observar as diversas mudanças sofridas nas festas ao longo do
tempo. Alguns autores chegam a teorizar sobre uma possível ―decadência‖ das
festas, frente aos processos envolvidos nos modos de produção capitalista e ao
crescimento industrial. Contudo, para Amaral, ao contrário do que apontam
estudos feitos por autores estrangeiros em relação às culturas de países do
terceiro mundo, tal decadência não pode ser observada na sociedade brasileira.
Apesar de alguns autores brasileiros levantarem questionamentos quanto às
mudanças sofridas nas festas, como o empobrecimento atribuído à ausência das
elites nas ditas festas populares na primeira metade do século XX,
Atualmente, contudo, as festas crescem em todos os sentidos (luxo e participação, por exemplo) e as ―elites‖ voltam a elas, sendo comum vê-las nos carnavais e forrós. Mas é preciso notar, também, o enriquecimento de outras, que foram adquirindo muito em símbolos e riqueza com o passar do tempo, como é o caso da maior festa brasileira, o Carnaval, o Círio de Nazaré, no Pará ou o São João nordestino. (AMARAL, 2001, p.15)
Realizadas em todas as regiões do Brasil, as festas juninas representam
uma das manifestações culturais mais importantes do País. Embora sejam
comemoradas em todo o Brasil, na região Nordeste as festas adquirem uma
expressão ainda maior. Em conformidade com Amaral (2001), acredita-se que os
festejos juninos no nordeste ganham um importância até mesmo maior que as
comemorações do Natal, principal festa cristã. Devido às grandes secas nessa
região, no mês de junho, além de se prestar homenagens aos três santos
católicos: São João, São Pedro e Santo Antônio, para o homem do campo, é
também o momento de agradecer pelas chuvas, tão importantes para a
plantação. De acordo com Lucena Filho(2007, p.19) ―no nordeste do Brasil as
festas juninas sempre estiveram associadas ao mundo rural‖. Essa característica
64 6
4
rural pode ser observada nos mais diversos aspectos da festa, como a vestimenta
dos dançarinos de quadrilha, a decoração das ruas com bandeirolas, em alguns
lugares é possível encontrar também palha de bananeira decorando postes, além
da presença da fogueira, entre outros elementos.
Severino Lucena Filho afirma que nesta época, comemora-se
principalmente
a colheita do milho, cuja plantação coincide, mais ou menos, com o dia 19 de março, no qual o catolicismo homenageia a São José e se estende até o final do mês de julho, quando os católicos homenageiam Ana, esposa de Joaquim, pais de Maria, mãe de Jesus. (Lucena Filho, 2007, p.19)
Segundo o estudioso de cultura popular Arnold Van Gennep (1949), São
João é um santo cristão, no entanto, as características de seus festejos são
pagãs e profanas. Isso porque, como afirma Amaral (2001), acredita-se que
estas festas têm origens no século XII, na região da França, com a celebração dos solstícios de verão (dia mais longo do ano, 22 ou 23 de junho), vésperas do início das colheitas. No hemisfério sul, na mesma época, acontece o solstício de inverno (noite mais longa do ano). Como aconteceu com outras festas de origem pagã, estas também foram adquirindo um sentido religioso introduzido pelo cristianismo, e trazido pela igreja católica ao Novo Mundo. A comemoração das festas juninas é certamente herança portuguesa no Brasil, acrescida ainda dos costumes franceses que a elas se mesclaram na Europa.(AMARAL, 2001, p. 66)
O Vaticano, no século VI, instituiu o dia 24 de junho para a comemoração
do nascimento de João Batista primo e padrinho de batismo de Jesus Cristo,
contudo, como já visto anteriormente, os europeus há algum tempo já celebravam
a entrada do solstício, com grandes fogueiras, que faziam parte de rituais de
fertilidade e abundância do pós-colheita. Nestas festas havia sacrifício animal com
o objetivo de agradar aos deuses e receber, das forças da natureza, saúde, paz e,
sobretudo, prosperidade e ofereciam ainda cereais para afastar os demônios da
esterilidade, da estiagem e da peste agrícola. Observa-se aqui um processo de
hibridização, onde manifestações originalmente profanas fundem-se à
celebrações sacras cristãs. Desse modo, o que antes era uma festa da tradição
pagã, relacionada ao plantio e colheita, foi incorporado ao calendário oficial
católico, passando a ser visto também como uma comemoração sagrada da igreja
católica, na qual se homenageiam basicamente três santos: no dia 13 de junho, a
festa é para Santo Antônio; no dia 24, para São João; e no dia 29, para São
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5
Pedro. É importante também observar que tal tradição festiva transladada para a
colônia (Brasil), pelos viajantes portugueses, molda-se aos indígenas e aos
escravos africanos recém-chegados na terra, sofrendo adaptações e
modificações derivadas dos modos de vida desses povos, seus costumes e
crenças. Estas influências podem ser percebidas nas danças, nas matérias-
primas dos pratos considerados típicos e em diversos outros aspectos. A partir de
1808, com a vinda da Família real para o Brasil, as festas juninas passaram a
receber também forte influência dos quinze mil aristocratas que vieram fazer suas
vidas na colônia.
A primeira das festas do ciclo junino é a de Santo Antônio, o santo
casamenteiro, comemorada no dia 13 de junho. Não por coincidência, a véspera
(dia 12 de junho) foi escolhida no Brasil para ser a data comemorativa do dia dos
namorados. Para Amaral (2001), assim como São João, o culto a Santo Antônio é
uma herança portuguesa. Segundo a autora, Santo Antônio nasceu em Lisboa
sendo um dos santos mais cultuados tanto em Portugal quanto no Brasil-Colônia.
Inicialmente tido como um santo militar, acredita-se que seu nome tinha enorme
força e era fundamental nas guerras. O culto a Santo Antônio já não é mais
relacionado ao militarismo, ele , atualmente é tido como santo como casamenteiro
e deparador de coisas perdidas.
A crença de que Santo Antônio se ―devidamente‖ invocado, perturbado com pedidos de todo tipo e até mesmo ―torturado‖, arranja casamento mesmo para a mais sem graça das moças é muito difundida, e é esta a qualidade mais prezada do santo durante as festas juninas. São João também já teve estas funções, e também São Gonçalo (que continua sendo invocado com esta finalidade através de danças, no interior do Brasil)(AMARAL, 2001, p.67)
―Mas o anjo lhe disse: Zacarias, não temas, porque a tua oração foi ouvida,
e Isabel, tua mulher, dará à luz um filho, e lhe porás o nome de João. E terás
prazer e alegria, e muitos se alegrarão no seu nascimento...‖ (Lucas 1, 13-14)
A segunda data a ser comemorada é o dia 23 de junho, na qual se presta
homenagens a São João. Filho de Zacarias e Isabel, prima de Maria, João Batista
era primo em segundo grau de Jesus e batizou-o nas águas do rio Jordão.
Então veio Jesus da Galiléia ter com João, junto do Jordão, para ser batizado por ele. Mas João opunha-se-lhe, dizendo: Eu careço de ser batizado por ti, e vens tu a mim? Jesus, porém, respondendo, disse-lhe:
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6
Deixa por agora, porque assim nos convém cumprir toda a justiça. Então ele o permitiu. (Mateus 3, 13-15)
Quando São João foi concebido, seus pais encontravam-se em idade
avançada, e acreditava-se que não mais poderiam ter filhos. O seu nascimento é
narrado pela bíblia como uma graça de Deus anunciada por um anjo ao seu pai
Zacarias. ―Disse então Zacarias ao anjo: Como saberei isto? pois eu já sou velho,
e minha mulher avançada em idade. E, respondendo o anjo, disse-lhe: Eu sou
Gabriel, que assisto diante de Deus, e fui enviado a falar-te e dar-te estas alegres
novas.‖ (Lucas 1, 18-19) Desta forma São João é também festejado como santo
da fertilidade.
Uma das primeiras festas, meio populares, meio de igreja de que nos falam as crônicas coloniais do Brasil é a de São João já com fogueiras e danças. Pois as funções deste popularíssimo santo são afrodisíacas; e ao seu culto se ligam até praticas e cantigas sensuais. É o santo casamenteiro por excelência. (FREIRE apud AMARAL, 2001, p. 67)
No dia 29 de junho, rendem-se homenagens a São Pedro. Simão, filho de
Jonas, tinha por ofício a pesca e foi discípulo de Jesus.
E, quando acabou de falar, disse a Simão: Faze-te ao mar alto, e lançai as vossas redes para pescar. E, respondendo Simão, disse-lhe: Mestre, havendo trabalhado toda a noite, nada apanhamos; mas, sobre a tua palavra, lançarei a rede. E, fazendo assim, colheram uma grande quantidade de peixes, e rompia-se-lhes a rede. E fizeram sinal aos companheiros que estavam no outro barco, para que os fossem ajudar. E foram, e encheram ambos os barcos, de maneira tal que quase iam a pique. E vendo isto Simão Pedro, prostrou-se aos pés de Jesus, dizendo: Senhor, ausenta-te de mim, que sou um homem pecador. Pois que o espanto se apoderara dele, e de todos os que com ele estavam, por causa da pesca de peixe que haviam feito. E, de igual modo, também de Tiago e João, filhos de Zebedeu, que eram companheiros de Simão. E disse Jesus a Simão: Não temas; de agora em diante serás pescador de homens.(Lucas 5, 4-10)
São Pedro é conhecido como o santo protetor dos pescadores e das
viúvas, guardião das chuvas e porteiro do céu. Por Jesus lhe foi dada a
incumbência de fundar a Igreja e reunir os fiéis depois de sua morte. Foi também
o primeiro Papa. São Pedro é o santo da justiça, o provedor, o legislador. No
sincretismo, com as crenças do candomblé, São Pedro corresponde Xangô.
67 6
7
O estudioso Rossini Tavares de Lima, fundador da Escola de Folclore do
Museu de Folclore de São Paulo, diz que a festa junina é importante porque
precede à colheita, apoia-se no ritmo de vida campesina.
Em nossa opinião, a vigília e o dia de São João tornaram-se ímãs de
vários traços e complexos culturais, usando o termo empregado por
Roger Bastide, pelo simples fato de que se situam em um dos períodos
fastos e nefastos, que os romanos dispuseram no seu calendário, o que
corresponde, em nossos dias, ao calendário de Marrocos, ao ano lunar
ou muçulmano e ao ano berbere, e que se caracterizam pelas virtudes
mágicas, benéficas e maléficas, idênticas na cultura espontânea
européia às da vigília de Primeiro de Maio. E a não ser o caráter mágico
que é específico do período, a maioria dos seus traços e complexos
derivam dos ciclos de Carnaval, da Páscoa e de maio, aliados a um
catolicismo do tipo popular, folclórico. (LIMA, 1971, p.70)
São João, no Brasil, é festa de família, caseira e doméstica. É o momento
propício para a reunião dos parentes e amigos em torno da ideia de celebrar
fertilidade da colheita. Outro aspecto interessante é que possui uma função social
sexual bem definida. Ao se analisar o histórico das festas juninas, pode-se notar
que todas as energias convergem para que as moças, desejosas de se casarem,
consigam realizar seus intentos, ou seja, conseguir um pretendente e concretizar
o sonho do tão ansiado casamento. Tal culto ao matrimônio encontra-se
intrinsecamente ligado ao culto à fertilidade anteriormente praticado pelos povos
pagãos, servindo como uma forma de ressignificação dos mesmo. De acordo com
Amaral
Segundo Gilberto Freire a escassez de portugueses na colônia, sublinhou o valor do casamento ou mesmo da procriação (com ou sem o casamento), o que tornou populares os santos padroeiros do amor, da fertilidade, das uniões, e instaurou uma grande tolerância para com toda espécie de reunião que resultasse no aumento da população no Brasil. Estes interesses abafaram não apenas os preconceitos morais como os escrúpulos católicos de ortodoxia. Assim, os grandes santos nacionais tornaram-se, à época, aqueles aos quais a imaginação popular atribuía milagrosa intervenção capaz de aproximar os sexos, fecundar mulheres, proteger a maternidade, como Santo Antônio, São João, São Pedro, o Menino Jesus, N. Sra do Bom Parto etc.(AMARAL, 2001, p. 67)
Apesar de fazerem parte de ritos comemorativos relacionados à Igreja
Católica, os festejos juninos, misturam cada vez mais o sagrado ao profano, seja
na figura do feiticismo e crendices populares, seja nas festas de camisa com
shows de grandes bandas. Desta maneira, entende-se as festas juninas, com
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8
relação ao turismo, como tendo uma grande diversidade de atrativos turísticos.
Estão relacionados aqui os elementos culturais, como apresentações de
quadrilhas, culinária, bem como os eventos, com grandes shows em praça pública
e em clubes fechados.
Nesse universo de imensa riqueza cultura e potencial econômico, surge
―São João da Bahia – A Maior Festa Regional do Brasil‖. Uma iniciativa do
Governo do Estado da Bahia, Secretária de Cultura do Estado da Bahia e
Bahiatursa. Entende-se que tal ação tem importante função de fomentar o turismo
durante este período, considerado como baixa estação na Bahia, estado tão
conhecido pelas suas belezas naturais, que favorecem o turismo de Sol e Praia,
além do Carnaval.
Além do aspecto festivo, de trazer alegria para o povo de uma determinada
região, e do seu papel social, as festas juninas têm um importante papel
econômico. Muitos turistas visitam cidades nordestinas para acompanhar os
festejos. Hotéis, agências de turismo, empresas de transporte,estabelecimentos
comerciais, produtores de eventos e diversos outros setores da industria turística
aumentam os lucros e geram empregos nestas cidades, aumenta também a
oportunidade do comercio informal com as barraquinhas de comidas e bebidas,
venda de fogos, dentre outros. Embora a maior parte desses turistas sejam
baianos, é possível encontrar também turistas e visitantes de outros estados
brasileiros, e até mesmo turistas estrangeiros como europeus, asiáticos e norte-
americanos que chegam ao Brasil para acompanhar de perto estas festas.
Vale ressaltar também o valor comunicacional das festas de uma maneira
geral, e a sua capacidade de funcionar como mediação. Conforme Amaral (2001,
p.22) ―Sendo uma linguagem [...] a festa não só é um fenômeno social, como
constitui, simultaneamente, um fundamento de comunicação, uma das
expressões mais completas e ―perfeitas‖ das utopias humanas de igualdade,
liberdade e fraternidade.‖ E afirma ainda que
No Brasil diversos autores têm, freqüentemente, tratado a festa como linguagem e percebido seus elementos como termos de comunicação, que qualificam, atribuem sentido e movimento e pedem resposta sem se deterem, contudo, no aspecto das diferentes mediações presentes na festa. De qualquer modo, a festa, para os autores brasileiros [...], é sempre positiva, seletiva e edificante, mais que destruidora..(AMARAL, 2001, p.22)
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9
Amaral (2001, p. 26) ressalta que, desde o período inicial da colonização
do brasileira, as festas realizam importante papel de mediação simbólica
―constituindo uma linguagem em que diferentes povos podiam se comunicar‖.
Funcionando como ―síntese das mediações‖, em especial no que se refere à
relação entre natureza e cultura, as festas serviram também como agentes
facilitadores da transposição de um modelo europeu para a colônia.
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0
3.2 A Maior Festa Regional do Brasil ―São João da Bahia – A Maior Festa Regional do Brasil‖ é uma ação de
marketing da Empresa de Turismo da Bahia S/A (Bahiatursa) envolvendo os mais
diversos veículos de comunicação de massa (televisão, rádio, outdoor, impressos e
Internet). Empresa de economia mista vinculada à Secretaria de Turismo, a
Bahiatursa é responsável pela divulgação e promoção turística da Bahia, no Brasil e
no exterior. Atuando de acordo com as políticas públicas do Governo Federal –
Plano Nacional do Turismo – e do Governo do Estado, a Bahiatursa exerce um
papel fundamental na atração e ampliação do fluxo turístico regional, nacional e
internacional. (BAHIATURSA –
http://www.bahiatursa.ba.gov.br/site/apresentacao.htm – acessado 30/07/2010).
Com o objetivo de aferir os números do turismo na Bahia, a Bahiatursa, em
junho de 2008, contratou a Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas – FIPE,
afim de obter informações que pudessem servir de base comparativa entre o dados
da Bahia com os de outros estados da Federação. Segundo resultados
apresentados no site da própria Bahiatursa, a pesquisa teve duração de exatamente
um ano e teve por objetivos:
caracterizar e dimensionar o turismo doméstico e internacional no estado, identificando os seguintes elementos: contagem do fluxo turístico, perfil sócio-econômico dos viajantes, gastos dos viajantes, avaliações dos mesmos sobre as áreas e / ou eventos visitados, taxa de ocupação dos meios de hospedagem das localidades pesquisadas. (http://www.bahiatursa.ba.gov.br/site/ - acessado 30/07/2010)
Ainda conforme resultados publicados
as pesquisas foram realizadas no período de alta, média e baixa estações nos 22 principais portões de entrada do estado (receptivo tradicional) e nos municípios marcados fortemente pelas festas juninas, carnavalescas e religiosas. As localidades foram selecionadas com base na capacidade hoteleira, no apelo natural, cultural e/ou econômica, além do seu reconhecido potencial turístico.
Segundo os números divulgados dessa pesquisa, o fluxo global de turistas
para o o estado da Bahia foi de 9.052.000 (nove milhões e cinquenta dois mil) no
ano de 2008. O fluxo nacional/local representa 94,3% do total, ou seja 8.538.000
(oito milhões quinhentos e trinta e oito mil) turistas da própria Bahia e de outros
estados. O fluxo nacional de turistas (oriundos de outros estados) representa 47,8%
do total do fluxo doméstico. O que quer dizer 4.081.164 (quatro milhões, oitenta e
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1
um mil e cento e sessenta e quatro) turistas procedentes de outros estados. A maior
parte dos turistas que visitaram a Bahia em 2008, ainda é de turistas locais, 52,2%,
o que em números absolutos representa que 4.456.836 (quatro milhões,
quatrocentos e cinquenta e seis mil, oitocentos e trinta e seis) turistas são baianos,
deslocando-se pelo próprio estado.
De acordo com a FIPE, o fluxo internacional de turista representou 5,7% do
total, ou seja, 514.000 (quinhentos e catorze mil) turistas estrangeiros visitaram a
Bahia nesse período.
Gráfico 1 - Fluxo de turistas Brasil e Bahia em 2008
Fonte: Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas
Ainda segundo a FIPE, o perfil deste turista é, em sua grande maioria, entre
25 e 31 anos (24,7%), com o ensino médio completo (46,2%), assalariado (37,2%),
viajam sozinhos (32,5%) com permanência de um ou dois pernoites (31,4%),
deslocam-se por meio de ônibus de linha (35,2%) e hospedam-se em casa de
parentes (42,4%).
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2
Os principais motivos de viagem são:
Motivação Total (%)
Lazer 46,8
Negócios / Trabalho 23,2
Visita a amigos e parentes 21,1
Festas juninas 16,7
Saúde 4,5
Intercâmbio / Estudos 2,2
Congressos / Feiras / Convenções
1,4
Outros 0,7
Tabela 1- Principais Motivações para o deslocamento turístico
Fonte: Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas
Principal fator de influência na escolha do destino:
Fator Total (%)
Comentários de amigos e parentes
45
Já conhecia o local / evento 39,1
Propaganda 7,2
Agência de Viagens 3,5
Outros 5,2
Tabela 2 - Principal fator de influência na escolha do destino turístico
Fonte: Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas
Principal Veículo de Influência, se Propaganda:
Veículo / ambiente
Total (%)
Internet 50
Revista 21,1
Televisão 15,5
Folheto 4,4
Outdoor 2,6
Jornal 2,3
Rádio 1,4
Cartaz ou pôster 0,2
Outros 2,5
Tabela 3 - Principal Veículo de influência na escolha do destino
73 7
3
Fonte: Fundação Instituto de Pesquisas Econômicas
Observa-se que, as festas juninas estão em quarto lugar nas motivações de
viagem (16,7%), que publicidade é a terceira colocada em fator de influência (7,2%)
e, dos meios de comunicação utilizados nas ações publicitárias, a Internet ocupa
disparada o lugar de principal veículo de influência (50%). Diante dos dados
apresentados optou-se neste trabalho por focar no site (www.saojoaobahia.com.br)
como recorte da pesquisa, em detrimento dos demais meios de comunicação.
Com o objetivo de facilitar o entendimento do objeto aqui proposto, num
primeiro momento, será feita uma breve apresentação do mapa do site
―www.saojoaobahia.com.br‖ dividindo a sua estrutura, inicialmente, em três vieses
bem distintos que merecem destaque dentro da estrutura geral: 1 – Cultura, 2 –
Eventos e 3 – Turismo.
O viés “Cultura” abrange informações referentes ao universo folclórico do São João
como lendas, simpatias, jogos e comidas típicas; “Eventos” apresenta informações,
notícias e fotos sobre festas e shows realizados nos diversos municípios; por fim
“Turismo”, que abrange as informações referentes ao processo turístico, mapas,
distâncias rodoviárias, histórico dos destinos, informações sobre hospedagem e
operadoras de turismo, entre outras.
Fazendo uma detalhada análise da Home Page do site pode-se encontrar
diversos elementos icônicos que remetem ao universo junino. A página é construída
sobre uma imagem de Fundo (background) que remete a um tecido rústico tipo ―juta‖
ou ―linhagem‖, em um tom amarronzado, ―encardido‖. O título do site aparece no
topo da página no formato de um pedaço de tábua velha e carcomida com o nome
da festa ―São João da Bahia – A Maior Festa Regional do Brasil‖ como se tivesse
sido gravado com ferro quente. Abaixo um banner com imagens que se alternam
constantemente, por exemplo: Fotografia de um grupo de quadrilha vestido a
caráter, ou bonecos desfilando numa rua enfeitada com bandeirolas. Ainda
preservando o padrão de tábuas há uma barra de navegação do site com os links
para ―Home‖, ―A Festa‖, ―Programação‖, ―Notícias‖, ―Imprensa‖, ―Fotos‖ e ―Contato‖ e
também um campo para busca de informações dentro do próprio site. Logo depois
um banner de notícias com imagens que mudam em formato slideshow, abordando
as notícias do que de mais importante aconteceu durante o evento. (figura 01)
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4
Figura 1 – Home Page do site www.saojoaobahia.com.br
O restante da homepage é bastante simples. Fundo branco com informações
digitadas em preto, vermelho ou tons de cinza. Aparecem ainda 3 banners em
formato de pedaços de madeira. O primeiro traz escrito ―São João 2010 –
Transmissão ao vivo‖, neste observa-se uma mistura do rústico com o moderno pois
aparece sobre a placa de madeira a imagem de uma televisão estilizada e futurista.
O outro banner traz a inscrição twitter, referindo-se à moderna rede social. E por fim
―últimas atualizações‖ encabeçando a seção que trata das modificações ocorridas
nas programações.
Há também o vídeo publicitário da campanha e um link para o perfil
―http://www.flickr.com/photos/turismobahia/” onde são postadas fotos, não só do São
João, mas dos mais variados eventos turísticos da Secretaria do Turismo do
Governo de Estado da Bahia (Figura 2).
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5
Figura 2 – Home Page do site www.saojoaobahia.com.br
Por fim tem-se o link para outras três seções. ―Arraiá da Capitá‖ que traz
informações sobre a programação na capital do estado. Aqui tem destaque o nome
dado a esta festa que remete à forma de falar do ―matuto‖ do homem da roça;
―Comidas Típicas‖, seção dedicada à tradição culinária junina; e curiosidades que
traz elementos da cultura popular como por exemplo ―simpatias‖. Há também o
número do ―Disque Bahia Turismo‖, um sistema de informações por telefone ao
turista que oferece atendimento em três idiomas: Português, Inglês e Espanhol
(Figura 3).
Figura 3 – Home Page do site www.saojoaobahia.com.br
76 7
6
Duas seções merecem destaque no site: ―A Festa‖ e ―Programação‖. Dentro
da seção ―A Festa‖ encontram-se, se não todas, a grande maioria das informações
relacionadas à categoria “Cultura”, distribuídas nas páginas: ―História‖, ―Lendas‖,
―Comidas Típicas‖, ―Danças‖, ―Santos Juninos‖, ―Curiosidades‖, Bate-volta‖
e―Simpatias‖. Na seção “Programação” há uma lista com todos os
municípios baianos que fizeram parte do projeto ―São João da Bahia‖, com um breve
histórico da cidade, informações de como chegar a estas localidades a partir da
capital do estado, por terra, via aérea ou marítima. Quais as atrações (data e
horário). Dicas de onde se hospedar como o nome do estabelecimento, telefone e
endereço. Até mesmo a localização de cada município no sistema Google Maps7. Há
também uma barra de links de redes sociais como orkut e twitter, e um espaço para
que a pessoas pudessem se manifestar deixando comentários. (Figura 4)
Informações relacionadas à categoria “Turismo”.
Figura 4 – Home Page do site www.saojoaobahia.com.br
É de fundamental importância observar que as informações de como chegar aos
destinos é sempre a partir da capital para o interior.
―Via terrestre: Sair de Salvador pela BR-324 e seguir direto até a BR-101 com
destino a Itabuna, de onde pode seguir pela BA-262 até Ilhéus […] Via aérea: Sair
de Salvador com destino a Ilhéus em voos diretos pelas empresas [...]‖
(http://www.saojoaobahia.com.br/programacao/ilheus/ , grifo nosso).
7 - Serviço gratuito de pesquisa e visualização de mapas e imagens de satélite da Terra.
Disponível na web, fornecido e desenvolvido pela empresa norte americana Google - http://maps.google.com.br/
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7
Acredita-se que esta constatação serve para reforçar a hipótese de que um
dos objetivos principais desta campanha é o de direcionar o turismo para o interior
do estado nesta época do ano. Como já visto anteriormente, o inverno é considerado
baixa estação turística na Bahia, estado que tem como principais atrativos turístico
―praia e sol‖ e o carnaval.
78 7
8
3.3 – O MÉTODO A análise de conteúdo tem sido muito utilizada nas ciências sociais e
humanas como história, psicologia, ciências políticas, jornalismo e até mesmo no
campo da saúde. Para Bauer (2002, p. 190) ―A análise de conteúdo é apenas um
método de análise de texto desenvolvido dentro das ciências sociais empíricas.‖
Embora o método da análise de conteúdo seja adotado mais comumente para tratar
dados de pesquisa qualitativa, alguns autores consideram que, a análise de
conteúdo possui elementos tanto da abordagem qualitativa quanto quantitativa.
Desta maneira, Bauer (2002, p.190) destaca que ―considerável atenção está sendo
dada aos ―tipos‖, ―qualidades‖, e ―distinções‖ no texto antes de que qualquer
quantificação seja feita‖.
Desta forma, apesar de apresentar uma categorização dos elementos
peculiares da cultura popular presentes no objeto aqui pesquisado, buscar-se-á
neste trabalho de pesquisa, prioritariamente focar nas questões qualitativas da
análise. Contudo, antes de definirmos as etapas desta por meio das quais será
realizada a análise, é mister uma conceituação e breve contextualização histórica do
surgimento da metodologia em questão. Para Bardin (1977) o método de análise de
conteúdo engloba a explicitação, sistematização e expressão do conteúdo de uma
determinada mensagem, tendo como objetivo realizar deduções lógicas e
fundamentadas sobre o mesmo (Quem emitiu a mensagem, em que contexto e
quais os efeitos pretendidos). Ou seja, a análise de conteúdo constitui
um conjunto de técnicas de análise de comunicação visando a obter, por procedimentos, sistemáticos e objetivos de descrição do conteúdo das mensagens, indicadores (quantitativos ou não) que permitam a inferência de conhecimentos relativos às condições de produção/recepção (variáveis inferidas) destas mensagens (BARDIN, 1977, p.42)
Em suma, a análise de conteúdo consiste basicamente de três fases: 1) A
pré-análise; 2) A exploração do material; 3) O tratamento dos resultados, inferência
e a interpretação. A pré-análise trata da organização dos dados. Para Bardin (1977,
p. 95) ―corresponde a um período de intuições, mas, tem por objectivo tornar
operacionais e sistematizar as ideias iniciais, de maneira a conduzir um esquema
preciso de desenvolvimento das operações sucessivas, num plano de análise.‖ A
segunda etapa trata da exploração do material para a autora esta fase depende
diretamente da precisão com que foi executada a fase anterior. Desta maneira,
79 7
9
Bardin acredita ser esta uma etapa capaz de resolver-se mecanicamente. ―Esta fase
longa e fastidiosa, consiste essencialmente de operações de codificação, desconto
ou enumeração, em função de regras previamente formuladas‖. (BARDIN, 1997,
p.101) E por fim a terceira etapa que consiste do tratamento dos resultados brutos
de maneira a transformá-los em informação relevante. ―O analista, tendo à sua
disposição resultados significativos e fiéis, pode então propor inferências e adiantar
interpretações a propósito dos objectivos previstos, ou que digam respeito a outras
descobertas inesperadas‖. (BARDIN, 1977, p101)
A fim de encontrar resultados satisfatórios para a pesquisa aqui proposta
usar-se-á como recurso analítico a análise categorial temática conforme indica
Bardin (1977).
Para Bardin (1977, p. 118) ― a categorização, é um processo de tipo
estruturalista e comporta duas etapas‖. Num primeiro momento buscar-se-á fazer um
inventário dos elementos intrinsecamente ligados ao universo folclórico do São João.
Numa segunda etapa os elementos serão divididos respeitando regras que visam
objetivar o tratamento dos dados, buscando uma maior organização da mensagem.
Neste processo, torna-se fundamental considerar algumas qualidades, a saber, que
delimitam, segundo a autora, um conjunto de boas categorias. A exclusão mútua
define que cada elemento não pode existir em mais de uma categoria. Essa
qualidade depende intrinsecamente da homogeneidade que determina que um único
critério de classificação deve governar a organização categorial. É importante ainda
observar a pertinência na qual uma categoria deve estar em consonância com o
material de análise escolhido bem como com o aporte teórico. A objectividade e a
fidelidade estão relacionadas à clareza e precisão na definição das categorias. E
por fim, mas não menos importante, a produtividade que relaciona-se com a
capacidade das categorias de produzirem resultados férteis (BARDIN, 1977, p.120)
Após um minucioso trabalho de identificação realizado no inventário do objeto
proposto (site www.saojoaobahia.com.br para o ano de 2010) e observando-se o
que se entende como manifestações da cultura popular e folkcomunicação, com o
respaldo teórico até aqui utilizado, decidiu-se pelas seguintes categorias, das quais,
três aproximam-se da reestruturação na divisão dos gêneros folkcomunicacionais
proposta Marques de Melo (2006), além de outras duas categorias que se fizeram
necessárias para melhor atender os objetivos desta pesquisa:
1º Tema – Folkcomunicação Oral – Suporte da comunicação é a oralidade
80 8
0
2º Tema – Folkcomunicação Cinética – O suporte da comunicação é o
movimento.
3º Tema – Folkcomunicação Devocional – Os elementos analisados estão
ligados à religiosidade e crença.
4º Tema- Folkcomunicação Culinária – Os elementos analisados estão ligados
à culinária típica junina.
5º Tema – Folkcomunicação Icônica – O suporte da comunicação é a imagem.
81 8
1
Categoria 1 – Folkcomunicação Oral
Encaixam-se nessa categoria todas as manifestações populares relacionadas
à oralidade, tais como: aboio; adivinhação; anedota; apelido; bendito; boato; cantiga
de mendigo; cantoria; conto de fada; conversa fiada; conchavo; fofoca, glosa; gíria;
lenda; palavrão; parlenda; pregão; provérbio; trova. (MARQUES DE MELO, 2006)
Entende-se como Câmara Cascudo (2006) que a oralidade é um dos
aspectos constituintes fundamentais do folclore. Contudo não se deve excluir do rol
de manifestações folclóricas qualquer que seja a manifestação que tenha, ao longo
do tempo, tido seu registro e ou transmissão em outro suporte como a escrita ou as
mídias audiovisuais. Como afirma Marconi (1992, p.13) ―embora, na maioria dos
casos, o fato folclórico seja conservado e mantido, legado ou transmitidos oralmente,
a transmissão e conservação escritas não lhe a condição de folclore‖.
Dentro da seção ―A Festa‖, já vista anteriormente como sendo a seção
centralizadora das questões culturais, há a sub-seção ―Lendas‖, que apesar de estar
no plural, apresenta apenas uma lenda, a da fogueira de São João. (Figura 05)
Figura 5 – Sub-seção ―Lendas‖ do site www.saojoaobahia.com.br
A fogueira é um dos símbolos mais fortes dos festejos juninos. De acordo com
o próprio site, ―o culto ao fogo ocupa lugar de destaque nas religiões dos povos indo-
europeus‖ (http://www.saojoaobahia.com.br/a-festa/lendas/) Como já dito
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2
anteriormente, os festejos juninos foram trazidos para o Brasil pelos povos europeus
e aqui se enraizaram na nossa cultura, bem como os elementos de alta carga
simbólica que o compõe. Desta maneira
As fogueiras fazem parte das tradições juninas, iluminando e aquecendo as noites frias do mês de junho. Cada santo, porém, tem a sua fogueira especial: na de Santo Antônio, a fogueira deve ter a base quadrada, conhecida também como chiqueirinho. Na de São João, a base deve ser redonda, o que dá à fogueira um formato cônico. Na de São Pedro a base deve ser triangular. (http://www.saojoaobahia.com.br/a-festa/lendas/)
Em conformidade com as ideias de Renato Almeida citado por Marconi (1992)
e Pinto (2005) uma lenda é uma forma de narrativa que gira em torno de um fato
real, com uma explicação ou interpretação de uma figura, situação ou acontecimento
histórico e que adquire, através da fantasia, uma certa carga mística, o sobrenatural,
elementos irreais e até inverossímeis. Ainda para Pinto(2005), as lendas podem ser
de quatro tipos básicos separados de acordo com a temática a que está relacionada:
Histórica, Etimológica, Geográfica ou Religiosa.
Para Câmara Cascudo
A lenda é um elemento de fixação. Determina um valor local. Explica um
hábito ou uma romaria religiosa. Iguais em várias partes do Mundo,
semelhantes há dezenas de séculos, diferem em pormenores, e essa
diferenciação caracteriza, sinalando o típico, imobilizando-a num ponto certo
da terra. Sem que o documento histórico garanta veracidade, o povo
ressuscita o passado, indicando as passagens, mostrando, como
referências indiscutíveis para a verificação racionalista, os lugares onde o
fato ocorreu. (CÂMARA CASCUDO, 2006, p. 52 – 53)
Desta forma, as lendas se fazem vivas e têm, na crença do povo, a sua
confirmação de veracidade. São passadas através das gerações e por elas aceitas,
enraizando-se na cultura local. Da mesma maneira, a reprodução das práticas
associadas a uma determinada lenda tem fundamental importância na inserção dos
indivíduos no processo cultural. Para os locais, a transmissão da tradição, para os
turistas a completude do espetáculo. ― Há sempre duas histórias: a verdadeira e a
lendária. Muitas vezes uma se intromete na outra de tal forma que é difícil deslindar,
tal a vivacidade da tradição popular.‖ (PINTO 2005, p.66) O imaginário popular
brasileiro é recheado de lendas, mitos e crendices das mais variadas. No que se
refere ao São João, não poderia ser diferente. Desta maneira, acredita-se que
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3
muitas outras lendas que foram, intencionalmente ou não, suprimidas poderiam
estar presente de maneira a enriquecer esta seção do site. Como exemplo temos a
―Lenda do milho‖ e a ―Lenda da Mandioca‖ duas das principais matérias-primas da
culinária junina; a ―Lenda de Santo Antônio‖ e ―Lenda da flor-de-São-Soão‖
relacionadas a dois dos três santos homenageados nesta época do ano. Diversos
autores escreveram sobre as lendas como é o caso de Cascudo (2006, 1988), Pinto
(2005), Araújo (1967), dentre outros. Observa-se também a ausência de referências
musicais no site. Entende-se que caberia aqui também uma seção dedicada aos
ritmos e cantorias tradicionais do São João.
Categoria 2 - Folkcomunicação Cinética
Esta categoria relaciona as formas de comunicação popular cujo suporte é o
gestual, o movimento como: afoxé; amarelinha; aniversário natalício; baianá;
batuque; bodas; bloco carnavalesco; bumba-meu-boi; caboclinho; caiapó;
candomblé; capoeira; catira; cavalhada; chá-de-bebê; chá-de-cozinha; chegança;
ciranda; circo mambembe; coco-de-roda; comício político; congada; cururu; dança
de Moçambique; despedida-de-solteiro; escola de samba; fandango; folia de reis;
forró; frevo; funk carioca; gincana; guerreiro; jogo do bicho; jongo; maracatu;
marujada; paradas cívicas; pastoril natalino; peladas de várzea; procissão;
quermesse; rap paulista; rodeio crioulo; quadrilha; queima de Judas; reisado;
romaria; taieira; ticumbi; troça; trote de calouros; vaquejada; velório; xaxado
(MARQUES DE MELO, 2006), dentre outras.
Neste contexto, entende-se o corpo como ferramenta fundamental desta
forma de comunicação. Segundo Couto (2000, p. 31), ―existem fortes características
culturais locais preponderantes na composição do jeito de ser do baiano que
englobam suas celebrações diárias e o culto ao corpo.‖ Temos assim o discurso da
linguagem corporal inserido no contexto das manifestações populares locais.
Duas sub-seções trazem elementos ligados as manifestações do corpo
―Danças‖ e ―Curiosidades‖. A primeira como o próprio nome já diz, relaciona-se à
dança, à apresentação rítmica corporal. Esta sub-seção traz um breve histórico das
quadrilhas e trinta e dois ―comandos‖ considerados pelo site como os mais usados
em uma quadrilha junina. (Figura 6)
Para Pinto
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4
a dança pode ser designada como a arte que se despe de implementos para se exprimir. É unicamente corpo, a que se dá movimento rítmico. Nesse elemento se imprime a pujança da mente e da vitalidade da alma, quando então o ritmo dinâmico sobrepuja, não raro, o ritmo corpóreo e o musical.(PINTO 2005, p.117 – 118)
As quadrilhas são uma dança, inicialmente de salão, de origem francesa,
dançada por casais que são comandados por um marcador, tais ―comandos‖ trazem
grande influência da língua francesa. Quase todos os passos coreográficos da
quadrilha ainda preserva na sua denominação resquícios da língua francesa; são
nomes abrasileirados do galicismo. Com o tempo, as quadrilhas foram, cada vez
mais, se popularizando, deixando os salões e ganhando as ruas, os bairros
populares, enraizando-se pelo interior dos estados brasileiros, transformando-se em
folguedos coreográficos de cortejo. Elas existem, basicamente, nas festas juninas
ou em comemorações festivas variadas no meio rural.
Historicamente, as quadrilhas funcionam como uma manifestação popular em
agradecimento aos santos pela boa colheita, por isso mesmo estão intrinsecamente
ligadas à vida do homem no campo, desta forma, os movimentos adotados pelas
quadrilhas são uma representação dos elementos do cotidiano dos indivíduos e da
vida simples da roça. Além dos passos da dança, o vestuário é uma marca
importante nas quadrilhas. Para os homens, geralmente, botas de couro de cano
curto, camisas xadrez, calças jeans com remendos coloridos costurados, em alguns
casos pode-se usar um lenço colorido no pescoço, paletó ―surrado‖, normalmente
muito grande. Para as mulheres, vestidos bem compridos, até os pés, de cintura
bem marcada, com gola alta e mangas fofas, botinas de salto e penteados ou
chapéu, sempre enfeitados com flores. Além da dança, é comum que haja uma
encenação do ―casamento na roça‖. Ainda há outros personagens que participam da
encenação da festa: os noivos, delegado, vigário, juiz, escrivão, padrinhos e os pais.
O casamento pode ocorrer antes, durante ou depois da quadrilha. Como visto
anteriormente, há uma forte relação do matrimônio, nesta época, com os antigos
costumes pagãos de culto à fertilidade, e uma forte carga conotativa de
sexualidade. É também característica marcante que o casamento seja realizado à
força, com o noivo sendo obrigado a casar, muitas vezes para reparar o ―mal‖ que
fez à moça. Geralmente, o noivo recusa-se a casar e por essa razão é comum que
seja escoltado pelo pai da moça ou pelo delegado. Tudo isso executado sempre de
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5
maneira muito bem-humorada e histriônica. Alguns do elementos diferem de uma
região para outra, ou vão se modificando e atualizando com o passar dos anos.
A quadrilha é portanto uma tradição retransmitida e reconfigurada ao longo
dos tempos, com novos ―comandos‖ sendo inseridos. Ao que se compreende como
Mendes, dada a natureza simbólica do homem, que
a continuidade desta tradição envolve transformações constantes que re-significam o seu valor cultural. O processo de transformação vital da tradição está vinculado à corporeidade de quem faz a tradição, isto é, à dimensão simbólica e cultural do corpo, modelada por diversos tipos de interação social. (MENDES et.al. 2005, p. 32)
Figura 6 – Sub-seção ―Danças‖ do site www.saojoaobahia.com.br
Neste contexto é importante ressaltar que
a presença das danças profanas nas festas religiosas surge como resquício da catequese jesuítica. A Igreja permitia que os índios e os negros dançassem, pois a dança era considerada uma maneira de agradar a Deus (Davi dançou para Jeová). Depois do Concílio de Trento (1545 – 1563)
8,
estas danças se tornaram um dos elementos mais enriquecedores e
ornamentais acrescidos ao culto católico. O poder da festa e dança era tão
efetivo que mesmo as danças e músicas dos escravos, consideradas inferiores e não civilizadas, eram permitidas nos dias festivos, o que acabou facilitando a permanência da religiosidade africana no Brasil, uma vez que esta é intimamente ligada às festas para a incorporação e dança dos orixás. (AMARAL, 2001, p.29)
8 - Convocado pelo Papa Paulo III para assegurar a unidade da fé e a disciplina eclesiástica,
no contexto da Reforma da Igreja Católica e a reação à divisão então vivida na Europa devido à Reforma Protestante, razão pela qual é denominado como Concílio da Contra-Reforma.
86 8
6
A sub-seção ―Curiosidades‖ faz uma apresentação de alguns ―jogos de
terreiro‖ praticados durante os festejos de São João: pau-de-sebo, catar amendoim,
corrida de funis, corrida do saci, corrida de sacos, corrida de três pés e ovo na
colher. (Figura 7)
Figura 7 – Sub-seção “Curiosidades” do site www.saojoaobahia.com.br
Para Edvaldo Couto (2000), o corpo humano representa muito mais do que
uma simples estrutura biológica, é construção cultural e tem muito a dizer sobre
cada indivíduo. Eficiente ferramenta de , o corpo fala nos mais simples gestos. ―O
corpo além de ser um escravo relapso, é deveras um delator.‖ (GAIARSA, 1993,
p.18) O gesto, as expressões, o corpo que revela os segredos mais íntimos. ―[...] o
corpo fala tanto quanto a palavra.‖ (GAIARSA, 1993, p.14)
Categoria 3 - Folkcomunicação Devocional – Os elementos analisados estão
ligados à religiosidade e crença.
Nesta categoria serão abordados os elementos que representam o sagrado
nos festejos juninos, bem como aquilo que está ligado à ―crendice popular‖, o que
não é sagrado, mas pertence ao universo da crença, da fé, daquilo que é místico.
Duas sub-seções apresentam informações que se enquadram nesta categoria, a
saber: ―Santos Juninos‖ e ―Simpatias‖.
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7
Desde os tempos da colonização, há uma forte presença do catolicismo no
Brasil. Sabe-se que o catolicismo era a religião oficial de Portugal e, claro, da
colônia. A Igreja Católica tornou-se onipresente, cobrindo, passo a passo, toda a
expansão territorial do país. Assim, além de religião oficial, enraizou-se
profundamente no cotidiano do povo.
Apesar de haver uma grande carga religiosa em torno dos festejos de São
João, é importante observar como Reeber (2002, p.8) que, parte da sociedade não
possui ou ainda, é contra, qualquer tipo de manifestação religiosa. ―Além disso, a
experiência religiosa, por apresentar-se como uma questão de foro íntimo –
individual ou coletivo -, comporta aspectos quantificáveis, inacessíveis à observação
científica.‖
Já foi dito anteriormente que, os festejos juninos, surgem pagãos e são,
posteriormente, hibridizados com os festejos católicos. Assim, três santos passam a
ser festejados nesta época: Santo Antônio, no dia 13 de junho; São João, no dia 24
de junho; e São Pedro no dia 29 de junho.
Na sub-seção ―Santos Juninos‖ há um breve histórico sobre cada um dos três
santos, apresentando os homenageados da época. Aqueles a quem devem ser
dirigidos os pedidos. Santo Antônio ―festejado no dia 13 de junho, o religioso
português nasceu em Lisboa, em agosto de 1195, batizado com o nome de
Fernando de Bulhões.‖; São João ―Primo em segundo grau de Jesus, segundo a
Bíblia, São João batizou-o nas águas do rio Jordão.‖; São Pedro, ―conhecido como
o santo dos pescadores e das viúvas, guardião das chuvas e porteiro do céu.‖ Há
também uma oração específica, endereçada a cada um dos santos. (Fig. 8)
Oração a Santo Antônio: ―Santo Antônio, pelos vossos milagres, pelas palavras que a Jesus faláveis, pela defesa do vosso pai, tenho um pedido a fazer. Abrandai a ira do mar, o sopro do vento, o negrume da noite, a chama abrasadora do Sol, a frialdade da Lua, a voracidade das feras, o horror dos desertos. Depois de tudo isso, abrandai o que de mais empedernido existe sobre a Terra: o coração dos homens. Oh, meu milagroso Santo Antônio, fazei com que aquele por quem meu coração chama ouça minha voz. E, ouvindo-a, vá aos pés de Deus Nosso Senhor comigo, vosso (a) humilde devoto (a). Amém‖. (http://www.saojoaobahia.com.br/a-festa/santos-juninos/)
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Figura 8 – Sub-seção “Santos Juninos” do site www.saojoaobahia.com.br
Na sub-seção ―Simpatias‖ são apresentadas quinze receitas de simpatias:
―Quem será?‖ ; ―Será que vou me casar?‖ ; ―Magia no papel‖; ―Jovem ou velho?‖; ―O
poder do carvão I‖; ―O poder do carvão II‖; ―Reconciliação‖; ―Para ter seu amor de
volta‖; ―Para conhecer alguém especial‖; ―Para quem está só e quer companhia‖;
―Para quem só ―fica‖ e quer compromisso‖; ―Para descobrir quem é seu amor‖; ―Para
confortar seu coração‖; ―Procura-se um namorado‖.(Figura 9)
Simpatia é uma tipo de ritual no qual, solicita-se a poderes ―ocultos‖ para que
se satisfaça uma vontade ou necessidade do solicitante, ou de alguém em nome do
qual o solicitante pede. A simpatia consiste em um conjunto de atos e palavras
preestabelecias, realizadas por qualquer pessoa. O solicitante deve reproduzir o
ritual sem lhe acrescentar ou alterar nada, a não ser nomes das pessoas que devem
ser beneficiadas com aquele pedido.
De acordo com Pinto (2005, p. 69) ―as crenças do homem ou são apenas
mitológicas ou reúnem esses elementos que recebem com as religiões. Daí existir
entre nós, ao lado de cultos feiticistas, um folclore católico.‖ Ainda para o autor, é
importante observar a forte influência folclórica no aprendizado católico e a maneira
como o povo reinterpreta o catolicismo e o folcloriza, criando dois aspectos bem
distintos a se considerar:
o que o povo faz na igreja, dentro dos ritos da liturgia, e o que faz fora da igreja tratando os santos a seu modo, rezando à sua maneira, fazendo cultos particulares, , estabelecendo rezas para determinadas finalidades e
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9
estabelecendo CRENDICES inteiramente absurdas e fora, mesmo, dos princípios da religião. A parte folclórica mais interessante é a associação de folguedos folclóricos a festas religiosas, sendo que os dois maiores ciclos de sua apresentação são os de São João e os de Natal. (PINTO, 2005, p.69)
Donde surgem as simpatias e outras manifestações de caráter feiticista
inseridas no contexto do catolicismo. A simpatia transita no terreno do místico, da
magia e lida com forças que extrapolam as leis naturais. Existem simpatias com
diversos objetivos: cura de enfermidades, sucesso profissional, sucesso financeiro,
conquista amorosa entre outras. Contudo das quinze receitas de simpatia
apresentadas no site, 100% são direcionadas às questões amorosas. Conquista,
reconquista, identificação do par, são alguns dos exemplos.
Será que vou me casar?
Na véspera do dia de Santo Antônio pegue um copo branco, novo, e à meia-noite coloque água. Em seguida, quebre um ovo gelado dentro do copo, cuidando para não arrebentar a gema. Deixe o copo no sereno pelo resto da noite. No dia seguinte, antes do nascer do sol, pegue o copo e observe: se estiver coberto por uma névoa branca é sinal que você vai se casar antes do dia de Santo Antônio do ano seguinte. Se
não…(http://www.saojoaobahia.com.br/a-festa/simpatias/)
Figura 9 – Sub-seção ―Simpatias‖ do site www.saojoaobahia.com.br
Durante os festejos juninos as simpatias são, em sua grande maioria,
solicitações direcionadas aos santos, principalmente a Santo Antônio, dado a sua
fama de santo casamenteiro.
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0
É interessante notar que não apenas o dia propriamente dito, dos santos, mas todo o mês é considerado como tempo consagrado a estes santos na região e, principalmente, as vésperas [41], que é quando se realizam os sortilégios e simpatias, a parte mágica da festa, típica do catolicismo popular. Inúmeras adivinhações a respeito dos amores e do futuro (com quem se vai casar, se se é amado ou amada, quantos filhos se vai ter, se se vai morrer jovem ou ganhar dinheiro etc..) são feitas nas vésperas do dia dos santos, em geral de madrugada. (AMARAL, 2001, p.66)
O universo mágico popular tem uma infinidade de preces, orações e simpatias
que visam a conquista do grande amor e a realização do casamento. É importante
observar a preocupação com o matrimônio e a formação da família que está
presente em boa parte dos elementos simbólicos dos festejos juninos, seja como
aqui, no apelo ao divino, seja na representação teatral das quadrilhas. São João e
Santo Antônio parecem, em muitos casos, serem a única esperança de se conseguir
um casamento feliz.
Categoria 4 - Folkcomunicação Culinária – Os elementos analisados estão
ligados à culinária típica junina.
―Realizadas em todas as regiões do Brasil, as festas juninas representam
uma das manifestações culturais mais importantes do País. Uma das principais
características das comemorações são as comidas
típicas.‖(http://www.saojoaobahia.com.br/a-festa/comidas-tipicas/) É de suma
importância observar que, onde há festejos e celebrações também aparecem as
comidas como uma marca identitária de tais manifestações culturais. Nas festas
juninas é comum encontrar um variado cardápio à base de milho, tapioca e raízes,
tais ingredientes são convertidos em deliciosos pratos, salgados e doces, além de
bebidas, alcoólicas ou não, que fazem parte da tradição cultural nordestina. Vale
ressaltar que não foram encontrados registros sobre uma culinária típica originária.
Acredita-se que a presença do milho dá-se ao fato de, os festejos juninos
originarem-se nas comemorações da colheita do solstício europeu, bem como uma
fusão com os costumes indígenas brasileiros e negros de consumirem grãos e
raízes.
Nesta categoria serão estudados os elementos ligados à culinária típica dos
festejos juninos. Na sub-seção ―Comídas Típicas‖(Figura 10) são encontradas
dezesseis receitas dos principais pratos da culinária típica junina. Aluá; Arroz Doce;
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1
Beiju; Bolo de Aipim; Bolo de Amendoim; Bolo de Coco; Bolo de Fubá; Bolo de
Tapioca; Bombocado; Canjica de Milho; Cuscuz de Milho; Doce de Batata Doce;
Munguzá; Pamonha; Quentão; Vinho Quente. (Figs. 11 e 12)
Figura 10 – Sub-seção ―Comidas Típicas‖ do site www.saojoaobahia.com.br
Gastronomia é a arte de cozinhar de modo a proporcionar uma maior
satisfação a quem come. A gastronomia pode ser considerada uma arte das mais
antigas e sua principal matéria prima é os alimentos. Se a ―gastronomia‖ é a arte de
cozinhar, a ―culinária‖ pode ser considerada como relacionada aos processos
socioculturais, envolvendo família, bem como processos comunicacionais. A
culinária típica é considerada como uma legítima representação da identidade
cultural de um povo. Alimentar-se, como já visto, mais que uma necessidade
biológica, é também um gesto social e cultural, carregado de um simbolismo
específico para cada sociedade, cada cultura. Da mesma forma que tem uma função
comunicacional. O que se come, a apresentação do prato, a forma como se come, o
comportamento dos indivíduos à mesa tem muito a dizer sobre uma sociedade.
Da mesma forma a gastronomia, como patrimônio imaterial, atinge
importância social a ponto de influenciar também a industria do turismo, sendo por
vezes fator decisivo na escolha de um determinado destino turístico. Conforme
Schlüter (2009) nos últimos anos foi incorporado ao turismo cultural, a categoria do
turismo gastronômico, que segundo a autora pode ser definido como ―aquele do qual
participam pessoas cujas atividades, comportamento e, inclusive a seleção do
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2
destino estão influenciados pela gastronomia.‖(SCHLÜTER in CAMARGO & CRUZ,
2009, p. 254)
Figura 11 – Receita de ―Aluá‖ do site www.saojoaobahia.com.br
Figura 12 – Receita de ―Beiju‖ do site www.saojoaobahia.com.br
Categoria 5 - Folkcomunicação Icônica – O suporte da comunicação é a
imagem.
Nesta categoria serão estudadas as mensagens icônicas presentes nas
imagens utilizadas para ilustrar o objeto aqui pesquisado.
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3
Desde os mais antigos registros históricos percebe-se que os homens
mantêm uma estreita, e de certa forma mística, relação com a imagem. Em suas
cavernas os homens antigos faziam desenhos de suas caçadas, como se estas
imagens tivessem o poder mágico de aprisionar os animais selvagens.
Túmulos antigos guardavam mais que restos mortais apodrecidos. Valiosas
esculturas, ouro, prata, bronze, mármore, os mais diversos tipos de objetos valiosos
inundavam mausoléus, tumbas e antigas sepulturas, estruturas arquitetônicas
invejáveis.
É uma banalidade verificar que a arte nasce funerária, e renasce apenas morre sob o aguilhão da morte. As honras funerárias relançam, consoante o lugar, a imaginação plástica, as sepulturas dos grandes foram nossos primeiros museus e os próprios defuntos nossos primeiros colecionadores. [...] Para um antigo grego, viver não é respirar, como para nós, mas ver; e morrer é perder a vista. Nós dizemos ―eu último suspiro‖; quanto a eles ―seu último olhar‖. (DEBRAY, 1993, p.22-23)
A imagem garante presença contínua. Uma imortalidade, de certa forma
perversa, visto que é ―presença viva‖ do indivíduo morto. Contudo a imagem tem o
poder de, paradoxalmente, despertar a vida, a imaginação, a atividade cerebral, e
até mesmo outras funções corporais do observador, sendo portanto renascimento,ou
ressurreição. A imagem nasce pela morte como promessa de imortalidade.
Foi, talvez, diante da morte que o homem teve, pela primeira vez, a idéia do sobrenatural e quis esperar para além do que via. A morte foi o primeiro mistério; coloca o homem na pista dos outros mistérios. Ela levou seu pensamento do visível ao invisível, do transitório ao eterno, do humano ao divino. (DEBRAY, 1993, p.29)
Fundamentado nessa ideia da imagem como algo que mexe com o imaginário
do receptor, despertando-lhe sensações, compreende-se a imagem como uma forte
ferramenta na transmissão da mensagem publicitária. Nesse aspecto entende-se
também que, uma determinada imagem é capaz de funcionar, por si só, como um
discurso, no caso específico do objeto aqui estudado, um discurso
folkcomunicacional, comunicando ao receptor aspectos diretamente ligados a
elementos culturais de um determinado grupo. Utiliza-se para tanto o poder
simbólico da imagem na construção de uma mensagem específica. Embora
considere-se que a imagem goza do poder de ―imortalização‖, deve-se entender que
a imortalidade através da imagem se dá pela representação.
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4
Material ou imaterial, visual ou não, natural ou fabricada, uma imagem é antes de mais nada algo que se assemelha a outra coisa. [...] Se ela parece é porque ela não é a própria coisa: sua função é, portanto, evocar, querer dizer outra coisa que não é ela própria, utilizando o processo da semelhança. Se a imagem é percebida como representação, isso quer dizer que a imagem é percebida como signo. [...] se qualquer imagem é representação, isso não implica que ela utilize necessariamente regras de construção. Se essas representações são compreendidas por outras pessoas além das que as fabricam, é porque existe entres elas um mínimo de convenção sociocultural, [...], elas devem boa parcela de sua significação ao seu aspecto de símbolo. (JOLY, 1996, p.38-40)
Essa afirmação concorre para ratificar a afirmação de Eco (1984) que diz que
―o Receptor transforma o Sinal em Mensagem, mas essa Mensagem continua sendo
ainda a forma vazia à qual o Destinatário poderá atribuir significados diferentes
conforme o código que nela aplica.‖
Apesar de toda a intenção injetada na mensagem, na imagem, o receptor
ainda tem uma certa liberdade para interpretá-la de acordo com os códigos que
conhece e ou fazem parte de sua bagagem cultural. ―O destinatário traduz todo o
conteúdo com uma sensibilidade que varia com base naquelas características,
próprias da cada camada de público, que se diferencia de possuir ou não os novos
alfabetos visuais.‖ (CANEVACCI, 2001, p. 156)
No objeto de pesquisa em questão podemos encontra diversas mensagens
icônicas, relacionadas ao universo junino. São imagens que retratam, mesmo que de
maneira bastante sutil, o universo cultural no qual o receptor estar se inserindo. A
princípio identificou-se a imagem de fundo (bg) (Fig. 13), que se mantém padrão em
todo o site. Uma espécie de tecido tipo ―juta‖ ou ―linhagem‖, em um tom
amarronzado, ―encardido‖. Um tecido rústico e barato, que conduz o espectador
para uma imersão no contexto de um grupo de hábitos simples e rurais.
Figura 13 – Imagem de fundo do site http://www.saojoaobahia.com.br/
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Identificou-se também a presença da fogueira (Fig. 14). Relacionadas à
tradição dos povos pagãos que cultuavam o fogo e o sol, as fogueiras tornaram-se
indispensável durante os festejos juninos, aquecendo as frias noites de inverno.
Nas fazendas, sítios, bairro rural, nas aglomerações urbanóides, nas ruas, onde é possível fazer fogueira, aí estará esta presente. Nas casas pobres quando não foi possível catar ou comprar lenha, uma vela acesa no batente da janela e ramas de cana ou outra planta, enfeitam a presença do fogo.(ARAÚJO, 1967 p. 109)
Figura 14 – Fogueira de junina.
Há também as bandeirolas (Fig. 15). Um tipo de decoração bastante
marcante e comum no São João. As bandeirolas normalmente são penduradas na
frente das casa, ou nos postes nas ruas, feitas de papel de seda colorido, revistas e
jornais velhos (interiores) ou de papel celofane ou outro material plástico
(exteriores), e bastante coloridas para expressar alegria. Cortar as bandeirolas
costumava ser uma função das crianças e jovens. ―A alegria não escolhe classe
social, ela invade o coração de todos. Os ricos, para suas fazendas e chácaras
levam os parentes congregando-se ao redor da fogueira grande no pátio enfeitado
de farfalhantes bandeirolas de papel multicoloridas‖ (ARAÚJO, 1967, p. 110) Não
foram encontradas nas fontes consultadas para este trabalho, informações sobra a
origem ou uma função que não a decorativa das bandeirolas.
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6
Figura 15 – Bandeirolas.
Outra imagem encontrada, bastante característica do São João é a das
quadrilhas (Fig. 16), com as suas fantasias coloridas, passos marcados e o típico
―casamento na roça‖ (Fig. 17). ―...há um resto de carnaval no traje dos dançadores
que procuram imitar ou fantasiar-se à moda caipira.‖ (Araújo, 1967, p.193) Não só os
trajes, mas também diversos outros elementos como a presença do intrudo
carnavalesco trazido pelos imigrantes portugueses servem de exemplo do processo
de hibridização sofrido pelos festejos juninos ao longo dos tempos.
Figura 16 – Quadrilha junina.
Figura 17 – Intrudo representando personagens do ―casamento na roça‖.
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7
As comidas típicas também aparecem no site (Fig. 18). Pratos já prontos junto
com sua matéria-prima representando o modo artesanal de preparo dos alimentos,
típico do homem simples do campo, sugere também o clima caseiro e familiar,
característico dos festejos juninos. ―Os mercados, as feiras, as casas comerciais,
ficam regurgitando de gente que vai comprar os preparos para a comezaina
apropriada para o doa do 'senhor São João' [...]‖. (ARAÚJO, 1967,p. 110)
Figura 18 – Bolo de tapioca.
Há ainda algumas placas (Figs. 19 e 20) no site que simulam pedaços de
tábua velha, com informações como se tivessem sido gravadas com ferro quente.
Essas tábuas remetem às cercas e o ambiente rústico das zonas rurais.
Figura 19 – Logotipo do site.
Figura 20 – Menu de acesso às seções do site.
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Apesar de ter-se detectado as imagens aqui citadas, acredita-se que mais
elementos icônicos, referentes ao universo dos popular dos festejos juninos,
poderiam ser explorados na construção do site de maneira a estabelecer uma maior
relação de inserção do espectador no referido contexto por exemplo instrumentos
musicais característicos (Sanfona, zabumba, triangulo), fogos de artifício, balões,
dentre outros. Entende-se que a ausência dos balões pode ser intencional, diante do
risco de incêndios que soltar balões representa, também devido à criminalização
dessa prática, apesar de que em alguns lugares ainda é possível ver balões feitos
de papel de seda coloridos pendurados em meio às bandeirolas.
Acredita-se que de acordo com sua bagagem cultural, o destinatário age na
leitura de uma mensagem imagética, estabelecendo conexões e criando ações
mesmo para uma imagem estática. A imaginação age no entendimento e fruição da
imagem. O receptor transporta-se para dentro das paisagens, interage com
personagens. Nesta relação que estabelece com a imagem o receptor se emociona,
se indigna, se excita, se comove. A catarsis passa pela capacidade de interação que
a imagem tem com o receptor, a capacidade de simulação do real e de identificação
como ―real‖ do destinatário. ―Instrumento de comunicação, divindade, a imagem
assemelha-se ou confunde-se com o que representa.‖ (JOLY, 1996, p.19)
Para Aumont (1995, p.88) ―a parte do espectador é projetiva.‖ Isso quer dizer
que este tem a capacidade de, observando determinada imagem, atribuir-lhe
características que lhe são ausentes, complementá-la. ―o olhar fortuito é então um
mito [...] ao fazer intervir seu saber prévio, o espectador supre portanto o não
representado, as lacunas da representação.‖ (AUMONT, 1995, p. 86) e segue ―O
espectador pode chegar até, em certa medida, a inventar, total ou parcialmente, o
quadro. [...] A imagem é, pois, tanto do ponto de vista de seu autor quanto do ponto
de vista de seu espectador, um fenômeno também ligado a imaginação.‖ (AUMONT,
1995, p.88)
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Considerações Finais
Frente ao que foi apresentado ao longo desta pesquisa, pode-se afirmar
que os festejos juninos, como expressão de uma cultura popular e carregados de
um forte simbolismo, ocupam lugar de destaque no cotidiano do povo nordestino,
e despertam o interesse de um ―público externo‖, de maneira a funcionar como
importante atrativo turístico. Tais elementos simbólicos, presentes nas diversas
formas de expressão popular do São João, funcionam como código
comunicacional, transmitindo aos turistas os costumes, crenças e tradições de um
determinado povo em uma determinada região.
Assim sendo, no que diz respeito ao turismo, os destinos devem, cada vez
mais, buscar aumentar os investimentos em ações direcionadas de marketing,
como a publicidade, a fim de adquirir visibilidade e notoriedade, num mundo
praticamente ―dominado‖ pelos meios de comunicação de massa. Com os
avanços tecnológicos, principalmente o desenvolvimento e o crescente aumento
do acesso à Internet, é cada vez mais importante estar inserido neste universo
virtual, de maneira a atingir um maior público ―real‖, aproveitando-se do processo
de encurtamento das distâncias proporcionado pela grande rede. Diante de uma
concorrência cada vez mais acirrada e da multiplicidade de ofertas e
segmentação dos destinos turísticos, a comunicação torna-se uma ferramenta
cada vez mais necessária e indispensável, capaz de influenciar o turista na
escolha do destino. Isso justifica investimentos cada vez maiores na construção
de uma imagem por parte dos destinos turísticos.
Entende-se que o objeto de pesquisa aqui analisado, o site
http://www.saojoaobahia.com.br/, traz em grande parte do seu conteúdo,
elementos tidos como marcantes da cultura popular relacionados aos festejos
juninos. Tais elementos, como já dito anteriormente, estão carregados
simbolismo, e funcionam também como uma espécie de código comunicacional.
São, por assim dizer, discursos, transmitidos através dos mais variados suportes
(dança, gastronomia, simpatias, atos de devoção), que informam sobre a vida,
costumes e tradições dos agentes populares. Dessa maneira compreende-se que
tais formas de expressão da cultura popular, são o que Beltrão inicialmente
denominou por folkcomunicação.
100
É importante destacar que, o presente estudo, não pretendeu realizar
qualquer análise quantitativa nem avaliar o seu objeto do ponto de vista
estatístico. Como proposto inicialmente, buscou-se uma análise do site,
fundamentada em aprofundado suporte teórico que se entende ser fundamental
para a discussão destas questões. Para tanto utilizou-se a técnica da análise de
conteúdo à luz dos teóricos Bardin (1977), Bauer & Gaskell (2002), Lucena Filho
(1998), Beltrão (2001), dentre tantos outros.
A análise desenvolvida nesta dissertação, prioriza os elementos
relacionados à cultura popular e folkcomunicação, existentes no site. Tal análise
demonstrou que diversos elementos se fazem presente, reforçando um discurso
folkcomunicacional, contribuindo para uma representação da cultura popular, que
pode ser um forte atrativo turístico.
A campanha em questão utiliza-se de dois vieses bem definidos no intuito
de atingir um maior público, aumentando o fluxo turístico na Bahia durante os
festejos juninos: Cultura e Eventos. Acredita-se que, há sim, um forte apelo
cultural na ação publicitária da Bahiatursa, que se apresenta em diversos
momentos, através de recursos imagéticos explorados no layout do site, bem
como através dos temas explorados nas categorias analisadas nesta pesquisa.
Pode-se observar que, num contexto geral, diversas mudanças foram sofridas ao
longo dos anos, no que se refere aos festejos juninos e às manifestações
populares envolvidas nesse processo. Como dito anteriormente trata-se, de
entender a relação entre o ―tradicional‖ da cultura popular e as modificações
sofridas por esta no processo de globalização, bem como a maneira pela qual os
meios de comunicação se apropriam destes elementos, com o objetivo de atingir
um determinado público através de estratégias organizacionais de marketing.
As transformações sofridas pelas manifestações culturais populares têm
muitos aspectos negativos, mas também alguns positivos.
Com seus produtos a indústria cultural pratica o reforço das normas sociais, repetidas a exaustão sem discussão. Em consequência, uma outra função: a de promover o conformismo social. E a esse aspectos centrais do funcionamento da industria cultural viriam somar-se outros, consequência ou subprodutos dos primeiros: a indústria cultural fabrica produtos cuja finalidade é a de serem trocados por moeda, promove a deturpação e degradação do gosto popular; simplifica ao máximo seus produtos, de modo a obter uma atitude sempre passiva do consumidor, assume uma atitude paternalista, dirigindo o consumidor ao invés de colocar-se à sua disposição. (Coelho, 1988, p.26)
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Entende-se que, nesses casos, a mutabilidade da tradição e da cultura é
por certo necessária. É fundamental reconhecer que, se por um lado, os
intelectuais (a ―alta cultura‖) trabalham e interpretam os elementos folclóricos para
adaptá-los à sua visão de mundo, em contrapartida as comunidades populares
também reinterpretam as influências da ―alta cultura‖ e dos meios de
comunicação, reconfigurando a sua própria realidade. Assim, há uma
ressignificação do tradicional na cultura popular, que é apropriada e recodificada
pelos meios de comunicação de massa, da mesma maneira que, em via contrária,
essa representação é reabsorvida e serve para renovar a própria tradição dessas
culturas populares. Esse constante processo de ―reciclagem‖, sempre existiu e vai
continuar existindo nas culturas. Os meios de comunicação de massa podem não
realizar a mais fiel tradução da cultura popular, contudo, isso não significa que
tenham poder, e que seriam responsáveis pela extinção das mesmas.
No que se refere ao Turismo de Eventos, observou-se que o site contém
um vasta quantidade de informações sobre os eventos realizados em todos os
municípios participantes. Separou-se tais informações do viés cultural, uma vez
que se entende que tais eventos não compreendem o bojo das manifestações
culturais (cultura popular) aqui analisadas. De fato, pode-se considerar que boar
parte do site funciona como um verdadeiro ―guia turístico‖, repleto de informações
de suma importância para o turista, como indicações de hospedagem, mapa
rodoviário e contato de operadoras turísticas. Além de oferecer uma central de
atendimento, não só para o turista local, mas também para o turista estrangeiro
(nos idiomas, português, inglês e espanhol). Desta maneira pode-se perceber
uma grande preocupação em atender bem o turista, disponibilizando uma maior
quantidade de informações necessárias possível.
Por fim, acredita-se que esta dissertação, ao revelar a importância
dos processos da comunicação popular, sobretudo sua apropriação pelos meios
de comunicação de massa, principalmente as mídias digitais como a Internet,
possa contribuir para os estudos da folkcomunicação e da cultura popular no
processo turístico, além de servir de referência para aqueles que buscam
informações sobre os assuntos aqui abordados. Entende-se que, esta pesquisa
não se finda aqui, mas pode e deve ser aprofundada em um momento futuro.
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