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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU” PROJETO A VEZ DO MESTRE HIPERATIVIDADE E A INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA NO CONTEXTO ESCOLAR Por: Lany Inácio da Silva Orientador Prof. Ms. Marco A. Larosa Rio de Janeiro 2004

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

HIPERATIVIDADE E A INTERVENÇÃO

PSICOPEDAGÓGICA NO CONTEXTO ESCOLAR

Por: Lany Inácio da Silva

Orientador

Prof. Ms. Marco A. Larosa

Rio de Janeiro

2004

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UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

PÓS-GRADUAÇÃO “LATO SENSU”

PROJETO A VEZ DO MESTRE

HIPERATIVIDADE E A INTERVENÇÃO

PSICOPEDAGÓGICA NO CONTEXTO ESCOLAR

Apresentação de monografia à Universidade Candido

Mendes como condição prévia para a conclusão do

Curso de Pós-Graduação “Lato Sensu” em

Psicopedagogia.

Por: Lany Inácio da Silva

3

AGRADECIMENTOS

Agradeço a Deus por ter me dado forças e por ter me abençoado em

mais uma etapa de minha vida, a todos os familiares, amigos e professores, a

Brígida e a Bárbara pelo incentivo, aos colegas da turma que direta ou

indiretamente me auxiliarem, ao Orientador Larosa que foi extremamente

atencioso, de maneira especial a Roberta e Marilza pelo carinho e dedicação ns

momentos mais difíceis pelos quais passei.

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DEDICATÓRIA

Dedico a minha família em especial a minha mãe e aos meus filhos

Anderson, Fabrício e André Luiz.

“Quando veio a inundação, a enxurrada embateu contra essa casa, e

não conseguiu abalar, porque estava bem edificada sobre a rocha.” (A casa

sobre a rocha e sobre a areia). Lucas, p. 46 a 49

5

METODOLOGIA

A pesquisa foi realizada através de um embasamento bibliográfico

direcionada para a questão da hiperatividade na criança sem especificação da

faixa-etária.

Foi utilizado também como instrumento de estudo um caso clínico,

vivenciado dentro de uma rede particular de ensino, a qual deu-me acesso a

informações relevantes para concretização desse estudo.

O principal objetivo foi analisar a visão de vários autores, para uma

compreensão abrangente e eficaz, em prol da aplicação de um trabalho

psicopedagógico centrado e baseado no respeito e na solidariedade.

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RESUMO

Na hiperatividade, as contribuições da psicopedagogia, com elementos

significativos para aplicação da discussão acerca da responsabilidade, vão

conduzir a educação da criança hiperativa.

Com a aquisição dos conhecimentos psicopedagógicos percebe-se que a

aprendizagem não depende só da prática e das técnicas desenvolvidas pelo

professor, o que faz surgir o seguinte questionamento: quais seriam os

procedimentos e recursos utilizados pelos educadores e profissionais

envolvidos para encaminhar o processo educacional e social da criança que

apresenta o problema ?

A pesquisa do tema proposto tem a intenção de verificar o grau de

aquisição da aprendizagem e de assimilação das atividades propostas para as

crianças hiperativas. Constatar que a participação e a intervenção do

psicopedagogo no acompanhamento e nas atividades pedagógicas constituirão

a alavanca para que a criança com o problema realize as atividades propostas

no mesmo nível dos alunos ditos “normais”.

A abordagem da problemática que envolve a criança hiperativa decorre

da necessidade de olhares atentos por parte de profissionais experientes e

preparados para interagir e encaminhar para o tratamento médico e terapêutico

caso seja necessário. O mais importante é que a equipe pedagógica esteja

ciente de que é essencial um conhecimento mais aprofundado na relação

ensino-aprendizagem e professor-aluno, para que a mesma possa interagir no

processo Educacional e social ao qual o aluno está inserido. “A observação e o

acompanhamento dos casos clínicos sugerem que algumas crianças

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necessitam por vezes de tratamento medicamentoso, pois as drogas são úteis

no tratamento de muitas delas” (Weiss)

Todavia o primordial seria a intervenção do psicopedagogo no

acompanhamento e na orientação aos pedagogos para que a criança possa

desenvolver suas potencialidades.

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SUMÁRIO

INTRODUÇÃO 10

CAPÍTULO I - UM OLHAR CENTRADO NA EDUCAÇÃO 14

1.1 – Função mantenedora da educação 14

1.1.2 – Função socializadora da educação 14

1.1.3 – A função transformadora 14

1.2 – As políticas públicas educacionais 16

1.3 – A representação social do fracasso escolar 18

CAPÍTULO II - HIPERATIVIDADE 19

2.1 – Contribuições teóricas sobre a hiperatividade e

Transtorno de conduta 19

2.2 – Funcionamento cerebral no DDA. O que os DDAs

têm que os outros não tem ? 24

2.3 – Características e sintomas 25

2.4 – Papel e atuação da família 27

2.5 – O papel da escola 31

CAPÍTULO III – PSICOPEDAGOGIA 41

3.1 – Objeto de estudo 41

3.2 – A que se propõe a psicopedagogia 44

3.3 – Representação histórica da psicopedagogia no Brasil 46

3.4 – Participação e formação dos primeiros pedagogos no

Brasil 46

9

CAPÍTULO IV – AS CONTRIBUIÇÕES DA PSICOPEDAGOGIA NA

EDUCAÇÃO DA CRIANÇA HIPERATIVA 49

4.1 – A dificuldade da aprendizagem 49

4.2 – Delineamento do estudo de um caso clínico 51

CONCLUSÃO 58 ANEXOS 60 BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 61 ÍNDICE 62 FOLHA DE AVALIAÇÃO 64

10

INTRODUÇÃO

A abordagem realizada neste trabalho, surgiu da necessidade de um

conhecimento mais aprofundado da relação Ensino-Aprendizagem e Professor-

Aluno pois os mesmos compõem os pilares que sustentam todo o processo

educacional.É realmente substancial ressaltar que são muitas as adversidades

que propiciam o fracasso escolar e o déficit na aprendizagem. E nesse universo

ressaltamos a hiperatividade como mais um entrave nesse contexto.

O propósito da pesquisa realizada foi averiguar qual é o grau de

conhecimento existente quando uma criança apresenta o Distúrbio do Déficit de

Atenção por Hiperatividade (DDAH).

Barkley define como distúrbio biopsicossocial, isto é, há fortes indícios de

fatores genéticos, biológicos, sociais, vivências, que contribuem para a

intensidade dos problemas.

Barkley alegou que o TDAH é um transtorno comportamental real, os

cientistas precisam demonstrar que o Transtorno do déficit de atenção e

hiperatividade é um transtorno real, um problema real e, freqüentemente, um

obstáculo real: que emerge cedo no desenvolvimento de uma criança; é

relativamente difuso ou ocorre em meio a diferentes situações, embora não

necessariamente em todas elas; afeta a capacidade da criança de responder

com sucesso diante das demandas típicas solicitadas para criança de certa

idade; distingue com clareza essas crianças de crianças ditas “normais” ou

daquelas que não têm o transtorno; é relativamente persistente durante o

período de desenvolvimento; não é facilmente explicado por causas puramente

ambientais ou sociais; está relacionado a anormalidades no funcionamento ou

desenvolvimento do cérebro, o que significa que existe uma falha ou um déficit

11

no funcionamento da capacidade mental própria de todos os seres humanos;

está associado a outros fatores biológicos que podem afetar o funcionamento

do cérebro ou seu desenvolvimento (por exemplo: genética, traumas, toxinas,

etc...)

Segundo Fonseca, na área da Educação é comum, ouvir-se falar sobre

hiperatividade. Na realidade, as crianças pequenas apresentam características

de desatenção e excesso de agitação, mas quando estes sinais persistem após

cinco anos, é possível ser um distúrbio chamado de déficit da atenção com

hiperatividade (TDAH).

Para Fábio Guedes todo esse contexto é relevante em seu aspecto geral.

Torna-se oportuno delinear alguns fatores importantes de bloqueio que são

encontrados na criança em fase de desenvolvimento da aprendizagem. Pode-

se ressaltar a falta de habilidade de aprender a ler, para aprender a calcular,

para aprender a escrever para fixar a atenção durante a aula e até mesmo

para relacionar-se com os companheiros. Contudo, essas crianças, embora

apresentem várias dificuldades, não apresentam nenhuma deficiência auditiva,

visual ou mental que as comprometam, a não ser em raras exceções.

Esse problema vem afetando um enorme contingente da nossa

população escolar, que muitas vezes pode ser identificado bem cedo. Ele

pode ser observado no cotidiano da criança pelo seu modo desordenado de

correr de um lado para outro, pela agitação constante de seus movimentos

pelo não cumprimento de ordens, pela dificuldade para concluir pequenas

tarefas domésticas ou trabalhos escolares.

Fica evidenciada a inexistência de informação e conhecimento sobre o

problema da hiperatividade por parte dos responsáveis, bem como a forma de

conduzir a educação da criança hiperativa. Entre os problemas que afetam a

nossa população escolar, o insucesso acadêmico é talvez o mais grave de

12

todos. Isto porque não se trata de um fato limitado a um momento apenas na

vida da criança, mas sim um problema que evolui e repercute negativamente

por toda sua vida. Por esse motivo, o insucesso escolar tem sido alvo de muitas

preocupações para pais e educadores dentro dos mais variados níveis.

Para RODHE & BENCZIC (1999), trata-se de uma questão de saúde

mental que possui características básicas: a desatenção, a agitação (ou

hiperatividade) e a impulsividade. Este transtorno tem um grande impacto na

vida da criança ou adolescente e das pessoas com as quais convive. “Pode

levar a dificuldades emocionais de relacionamentos familiar e social, bem como

a um baixo rendimento escolar.” (RODHE & BENCZIC).

A pesquisa que foi realizada baseia-se nas observações realizadas e nas

afirmativas de autores renomados e também pela análise de RODHE &

BENCZIC, FONSECA, entre outros, e também no contato direto com as

dificuldades da aprendizagem dessas crianças que, muitas vezes, são

chamadas pelos adultos desinformados de crianças “burras”, “preguiçosas”,

“lerdas” e assim por diante. Essas denominações constantemente se revertem

em rótulos que passam a atuar sobre a criança como uma marca indelével por

toda sua existência.

A pesquisa foi realizada com uma abordagem sobre a educação, com um

olhar sobre algumas causas que propiciam o fracasso escolar, ressaltando

entre elas o Distúrbio do Déficit de Atenção por Hiperatividade (DDAH) e as

dificuldades pelas quais passa a criança hiperativa no processo ensino-

aprendizagem.

Dispor também sobre as atividades do psicopedagogo e da sua prática

na sua intervenção no sentido de acompanhar, orientar, encaminhando a

criança com o problema para os profissionais especializados para o tratamento.

Discorrer e evidenciar sobre a intervenção psicopedagógica na problemática da

13

criança hiperativa, com a percepção dos conhecimentos pedagógicos e

psicológicos que proporcionam o desenvolvimento de todo o processo ensino-

aprendizagem.

A última composição conclui o grande valor da pesquisa sobre a

existência de informações e conhecimentos sobre o problema da hiperatividade

por parte dos responsáveis, bem como a forma de conduzir a educação da

criança hiperativa.

14

CAPÍTULO 1

UM OLHAR CENTRADO NA EDUCAÇÃO

A abordagem realizada acerca da educação dedica um olhar sobre sua

importância. Descrevendo as dificuldades e os entraves que impedem o

desenvolvimento do processo educativo, mobilizando os profissionais

envolvidos nesse processo.

1.1– Função mantenedora da educação

A função que mantém a Educação reproduz em cada indivíduo ações

possíveis que garantem a continuidade da cultura humana, pois é através do

ensino-aprendizagem que existe uma transmissão de aquisições culturais em

uma civilização.

1.1.2 – Função socializadora da educação A função que socializa a educação está presente onde se utiliza a

linguagem do aluno, sua casa, que modifica o indivíduo em sujeito. Dessa

maneira, a realidade educacional, não ensina como falar ou cumprimentar, ou

seja, ela ensina maneira de ações regulamentadas pelas normas de manejo de

classe, a sintaxe e os códigos gesticulosos da comunicação. A medida em que

isso ocorre, obtém-se a transformação do indivíduo num sujeito social,

identificando-se como o grupo que ele interage.

15

Essa função permite uma continuidade funcional do homem, garante

também a sobrevivência específica dentro da nossa sociedade onde, ela

assume o controle e a reserva cognoscível nos objetivando à conservação e à

representação, às limitações que o poder destina a cada classe social, ou seja,

à realização de um projeto sócio-econômico.

1.1.3 - A função transformadora

Nesta função, em contra partida, o sistema produz no “indivíduo”

mudanças emotivas procurando analisar compensações para que ele se

mantenha estável, portanto, ela se implanta na consciência de maneira

crescente.

Perpassando um caráter complexo da função educativa, o aprendizado

ocorre numa instância alienante e como possibilidade libertadora, dessa

maneira o sujeito que não aprende não realiza nenhuma função social da

educação.

A educação como processo sistemático centraliza seus objetivos no

educando para serem atendidas as necessidades e aspirações pessoais e

coletivas. Segundo Freire, “Não há uma forma única nem um único modelo de

educação. A educação existe em cada categoria de sujeitos de um povo; ela

existe em cada povo ou entre povos que se encontram”. Ela é a base de uma

sociedade democrática, pois o mundo do educador não está dividido em

pessoas educadas e não educadas, superiores e inferiores, pois é um processo

para fazer com que o indivíduo atualize suas potencialidades; ou é o inverso,

um processo através do qual a sociedade leva o indivíduo a domesticar as

mesmas potencialidades.

16

É necessária hoje uma nova forma de fazer educação para a realidade

brasileira, especialmente nas Escolas de Educação Pedagógica que devem

assumir o compromisso de articulação do seu trabalho com as exigências

dessa nova escola, pois a transformação social é um processo histórico onde

indivíduo e objetivo estão atrelados dialeticamente, sem que um ou outro possa

ser absoluto. Contudo, a mudança da sociedade só é possível através da

consciência e integração pela educação.

“É inviável compreender a Educação como uma prática autônoma ou neutra, onde o educador não é um agente neutro nem mesmo manipulador, mas sim quem assume sua opção política sendo coerente com ela e sua prática, com sua posição crítica.” (FREIRE).

1.2 – As políticas públicas educacionais

As políticas Públicas Educacionais, para atenuar a não aprendizagem

nas escolas como uma das causas do fracasso escolar, realizaram mudanças a

partir de uma visão abrangente e de modo mais objetivo, mais contextualizado,

a uma resposta para a queixa escolar.

Para atenuar esse quadro, autoridades competentes e responsáveis pela

melhoria da educação em nosso país passaram a pensar em inúmeras

alternativas que diminuíssem os altos índices de retenção nas séries iniciais do

primeiro grau. Uma dessas alternativas foi a instituição da nova Lei das

Diretrizes e Bases da Educação Nacional (LDB) em 1996, sendo a aprovação,

hoje implantada em grande parte do país nas redes municipais e estaduais de

ensino, onde o aluno só pode ficar retido pela primeira vez, no final do terceiro

ano do primeiro ciclo, antiga segunda série, ou retido por faltas.

A outra alternativa, foi a criação das classes de aceleração que atendem

crianças que têm em média de 9 (nove) a 14 (quatorze), sendo em sua maioria

17

repetentes que não assimilaram e não conseguiram ser alfabetizados, com o

objetivo de auxiliá-los nas dificuldades da aprendizagem, fazendo com que eles

possam acelerar seus estudos.

A autora Jaqueline Moel formula alguns questionamentos como: será que

essas reformas estão tendo resultados positivos? Estariam essas reformas

contribuindo para o sucesso de nossos alunos? Basta acelerar a aprendizagem

ou é preciso garantir de fato a aprendizagem e a permanência do aluno na

escola?Após essas reflexões a respeito do fracasso escolar destacam-se as

afirmações da autora Jaqueline Moel sobre o fracasso escolar, onde ela indaga

a respeito de quem fracassa realmente, o aluno ou a escola.

“Desconstruir esse olhar, questionar a temática do fracasso escolar, indagar quem é mesmo que fracassa ou tem sucesso, é o que pretendemos discutir. Temos clareza de que a matéria reveste-se de grande complexidade, porquanto envolve determinantes ligados a raízes econômicas, sociológicas, biológicas, pedagógicas e psicossociais do desempenho escolar.” (Moel, 2002 p.28)

Para Sant’anna é relevante um olhar atento quanto aos objetivos

educacionais; isso se confirma com as afirmações da autora que reforça a

importância dos objetivos.“ A determinação dos objetivos é, talvez, o processo

mais importante de quantos estão implicados na educação.” (p.55)

Além dos objetivos serem traçados de acordo com a turma que se irá

trabalhar levando em conta os conhecimentos prévios dos alunos, é preciso que

a todo momento eles sejam revistos, é preciso também que o professor avalie

cada aluno tendo em vista a proximidade do alcance dos objetivos, sem que

haja comparações entre os educandos, pois certamente cada um se

desenvolverá ao seu tempo.

18

Alguns conceitos pesquisados a respeito do conceito de fracasso escolar

na visão de alguns autores : “Fracasso escolar é ver o nosso aluno chegar ao

final do ano sem aprender nada” (I.M.C.). “Para mim, fracasso escolar é quando

o professor utiliza os recursos que lhes são possíveis e mesmo assim, o aluno

não consegue atingir os objetivos”. (T.S.O.)

1.3 – A Representação Social do Fracasso Escolar

Segundo Patto, a representação social do fracasso sinaliza sempre o

mau êxito do aluno, a dificuldade do aluno, a não aprendizagem do aluno.

Nunca o professor, nunca a equipe pedagógica, nunca o sistema. Sendo esses

alunos em sua maioria socialmente desprivilegiados, são sempre eles

rotulados, tidos como incapazes. A respeito disso, temos a citação de uma

especialista em fracasso escolar, autora de obras consagradas sobre o tema:

“Essa maneira indiciosa e cruel de tecer o fracasso aparece com nitidez nas

histórias de reprovação escolar”. (Patto 1999, p.05)

Nelas, não é só a perversidade do processo que a autora revela; é a

crueldade com a qual o fracasso é tecido. Dentre toda a problemática que

envolve a educação, é relevante ressaltar o problema do Distúrbio do Déficit de

Atenção por Hiperatividade. Despertando o interesse para a realização da

pesquisa acerca das dificuldades porque passa a criança hiperativa no

processo ensino-aprendizagem.

Conclui-se que os problemas comportamentais acompanhados das

dificuldades da aprendizagem e do conseqüente fracasso escolar foram

compreendidos como empecilhos da criança e como sendo os causadores das

angústias, sofrimentos e frustrações aos responsáveis.

19

CAPÍTULO 2

HIPERATIVIDADE

Toda problemática do Distúrbio de Déficit de Atenção/Hiperatividade

(DDAH) interfere na habilidade da pessoa de manter a atenção, especialmente

em tarefas repetitivas, de controlar adequadamente as emoções e o nível de

atividade, de enfrentar conseqüências consistentemente e, talvez, o mais

importante, na habilidade de controle e inibição. Inibição refere-se à capacidade

de evitar a expressão de forças poderosas que levam a agir sob o domínio do

impulso, de modo a permitir que haja tempo para o autocontrole. As pessoas

com DDAH até podem saber o que deve ser feito, mas não conseguem fazer

aquilo que sabem devido à inabilidade de realmente poder parar e pensar antes

de reagir, não importando o ambiente ou a tarefa.

As características do DDAH aparecem bem cedo para a maioria das

pessoas, logo na primeira infância. O distúrbio é caracterizado por

comportamentos crônicos, com duração de no mínimo 6 meses, que se

instalam definitivamente antes dos 7 anos.

“O transtorno de Déficit de Atenção/Hiperatividade (TDAH), é um transtorno de desenvolvimento do auto-controle que consiste em problemas com os períodos de atenção, com o controle do impulso e com o nível de atividade. Esses problemas são refletidos em prejuízos na vontade da criança ou em sua capacidade de controlar o seu próprio comportamento relativo à passagem do tempo – em ter em mente futuros objetivos e conseqüências. Não se trata apenas de um estado temporário que será superado, de uma fase probatória, porém, normal da infância, causado por falta de disciplina ou controle parental, assim como não é o sinal de algum tipo de ‘maldade’ da criança”. (Barkley, 2002, p.35.)

20

2.1 - Contribuições teóricas sobre a Hiperatividade e Transtorno de

Conduta

O problema do Distúrbio do Déficit de Atenção por Hiperatividade

(DDAH) tem sido examinado dentro dos mais diversos enfoques pela

neurologia, pela psiquiatria, pela psicologia e outras áreas. Por isso, vem

surgindo ao longo do tempo inúmeros rótulos para a sua designação, tais como:

lesão cerebral, lesão cerebral mínima, distúrbio do sistema nervoso central,

disfunção cerebral mínima, etc.

Em 1902, George Frederick Still realizou uma série de palestras, Still

falou sobre crianças que eram agressivas, desafiadoras, resistentes à

disciplina, excessivamente emotivas e passionais, mostraram pouca “inibição à

sua vontade”, tinham dificuldade de seguir regras e eram desatentas,

hiperativas, propensas a acidentes e ameaçadoras a outras crianças devido a

atitudes hostis. De acordo com Still, essas crianças tinham um defeito maior e

crônico no controle moral”.

Numerosos estudos descrevem crianças com “Distúrbio de

Comportamento Pós-Encefalite”, em que eram destacados prejuízos na

atenção, regulação e atividade física e controle dos impulsos. Em 1934, Kahn e

Conhn publicaram um artigo no famoso The New England Journal Of Medicine,

onde afirmaram haver uma base biológica nessas alterações comportamentais,

baseadas em um estudo com as mesmas vítimas de epidemia de encefalite de

Von Economo.

Em detrimento desta correlação feita entre a encefalite e uma possível

“deficiência moral” criou-se assim o termo “cérebro danificado ou lesionado”

para descrever tais crianças. O reconhecimento que muitas dessas crianças,

embora diferentes de seus pares etários (outras crianças na mesma faixa de

21

idade), apresentavam-se muito espertas e inteligentes para serem portadoras

de uma lesão cerebral de qualquer extensão; ao pesquisar o período da

infância até a adolescência, houve também a tentativa de se relacionar o

problema a fatores psicológico genéticos como má formação do feto na

gestação herança poligência (trauma na ocasião do parto), essas afirmativas

não tiveram êxito, pois as crianças com características diferenciadas sem

comprometimento neurológico, não havendo relação a esses acontecimentos

como se pensava anteriormente. Como essa definição não teve sustentação,

SATRAUSS em 1947 define como “Lesão Cerebral Mínima”, que terminou por

se tornar popularmente conhecido e completamente disseminado, apesar de

não haver lesão cerebral óbvia, ou pelo menos nenhuma que pudesse ser

evidenciada por um teste ou exame médico objetivo. Esse termo foi

posteriormente mudado para Disfunção Cerebral Mínima por falta de evidências

diretas e objetivas que pudessem constatar a presença de lesões cerebrais.

A classe médica entendeu o problema como uma entidade clínica

passível de um tratamento medicamentoso, difundindo-se o uso de drogas

estimulantes e calmantes na tentativa de “curar”. Em 1937, Charles Bradley

realizou uma descoberta acidental, as anfetaminas (medicamentos estimulantes

do sistema nervoso central) ajudavam crianças, hiperativas a se concentrarem

melhor. Ele observou que muitas crianças, especialmente aquelas que eram

hiperativas e/ou impulsivas, com o uso de anfetaminas, apresentavam

significativa redução em seus comportamentos tão “perturbadores”. Foi uma

descoberta contrária à lógica que acabou por levar ao surgimento do conceito

de efeito paradoxal (efeito contrário ao esperado com o uso de determinada

medicação). Essa corrente acreditava que as crianças que apresentassem

características da hiperatividade estariam propensas, na fase da adolescência,

a comportarem-se de maneira anti-sociais, fazendo uso do álcool e drogas, com

essas interpretações. O termo hiperatividade infantil foi usado por Laufer em

1957 e por Estella Chess em 1960. Laufer acreditava que a síndrome seria uma

22

patologia exclusiva de crianças de sexo masculino e teria a sua remissão ao

longo do crescimento natural do indivíduo.

Já Stella Chess isolou o sintoma da hiperatividade de qualquer noção de

lesão cerebral. Chess encarava os sintomas como parte de uma “hiperatividade

fisiológica”, cujas causas estariam enraizadas mais na biologia (genética

individual do que no meio ambiente como causador da lesão). Daí o termo

“Síndrome da Criança Hiperativa”.

Reação hipercinética da infância foi o termo usado pela Associação de

Psiquiatria Americana (APA) ao publicar o manual Diagnóstico e Estatístico de

desordens mentais (DSM – II), em 1968.

Em 1973, o Dr. Bem Freingold apresenta à Associação Médica

Americana vários estudos que estabeleciam uma ligação entre determinados

alimentos e aditivos químicos e o comportamento e a habilidade de

aprendizagem de certos indivíduos. Essa teoria ganhou a simpatia de uma

grande parcela da população americana, mas não foi bem aceita pela

comunidade médica dominante da época. Assim ampliou-se a percepção dessa

síndrome comportamental de destaque especial ao déficit de atenção, que era

supervalorizado anteriormente.

Surge uma nova concepção em 1976. Nesse ano, Gabriel Weiss

mostrou, através de estudos realizados a longo prazo, que quando as crianças

atingem a adolescência, a hiperatividade pode diminuir; entretanto, os

problemas de atenção e impulsividade tendem a persistir. O consenso anterior

tratava a síndrome como uma alteração exclusiva da infância e que, de alguma

forma, “desapareceria” na adolescência e na vida adulta.

Essa foi uma contribuição decisiva para que esse tipo de funcionamento

cerebral fosse reconhecido na população adulta. A forma adulta foi oficialmente

23

reconhecida em 1980, com a publicação do DSM – III pela Associação

Americana de Psiquiatria, que trouxe mudanças importantes em diversos

aspectos: desvinculou a nomeação da síndrome de seus aspectos estiológicos

(fatores causais) e deu destaque aos aspectos clínicos (sintomas); enfatizou a

questão aditiva como sintoma nuclear da alteração; identificou a forma adulta,

na época nomeada de “tipo residual” e renomeou a Síndrome de Distúrbio do

Déficit de Atenção (DDA).

Durante toda a década de 1980, centenas de estudos foram publicados

sobre o assunto, fazendo do DDA, pelo menos nos Estados Unidos a alteração

comportamental infantil mais estudada.

Em 1944, a Associação Americana de Psiquiatria publicou o DSM – IV

(Manual Diagnóstico e Estatístico de Transtornos Mentais da Associação

Americana de Psiquiatria, adotado também no Brasil como padrão para

definição de doenças). Nessa atualização, a classificação do DDA era dividida

em subtipos básicos e em uma combinação de ambos: Déficit de atenção: DA,

desatento, Déficit de atenção: DA/C, em que sintomas desatentos e de

hiperatividade/impulsividade estão presentes no mesmo grau de intensidade,

DA/HI , predominantemente hiperativo impulsivo.

Atualmente, o DSM – IV é um consenso quando se fala em diagnóstico

de DDA. Isso ocorre por conta de três aspectos básicos oficializados

destacados nessa classificação: 1) os sinais e sintomas listados são os

mesmos para crianças, adolescentes e adultos, com adequada ressalva de

serem menos intensos nas fases mais amadurecidas da vida do indivíduo; 2) o

reconhecimento do subtipo predominantemente desatento. Um fato que pode

ajudar a reverter a situação de subdiagnóstico em relação às mulheres, já que

entre elas predominam os sintomas de desatenção em detrimento dos sintomas

de hiperatividade e impulsividade; 3) destaque das dificuldades pessoais

24

causadas pelos sintomas de DDA no contexto familiar, profissional-acadêmico

ou social da vida de cada indivíduo.

Às crianças são imputados rótulos pejorativos como: “pestinhas”, “mal-

educadas”, “rebeldes”, “agressivas”, “sonhadoras”, “cabeça-de-vento”, entre

outros. Aos adultos também são atribuídos rótulos, não menos pejorativos, tais

como: “explosivos”, “aéreos”, “brigões”, “egoístas”, entre outros.

2.2 - Funcionamento Cerebral no DDA. O que os DDAs têm que os outros

não têm?

O cérebro humano, como se sabe, é composto por duas partes grandes

chamadas de hemisfério direito e hemisfério esquerdo, separados por uma

estrutura neurológica chamada corpo calos, que seria uma espécie de ponte,

tornando possível a comunicação entre os dois lados cerebrais.

Desde os primeiros estudos realizados, partir da seção do corpo caloso,

analisando assim o funcionamento em separado dos dois hemisférios, até as

pesquisas atuais sobre o cérebro como um todo funcional, a partir da integração

harmoniosa dos dois lados, os cientistas vêm esclarecendo cada vez mais as

funções que cabem, preferencialmente, a cada um dos hemisférios e a

participação de ambos na manutenção da eficácia cerebral.

O hemisfério direito apresenta algumas capacidades que levam a

conceituá-lo como o hemisfério do contexto, ou seja, ele possibilita se ter uma

visão do mundo. Já o hemisfério esquerdo oferece uma visão mais detalhista.

Hoje, no entanto, a história começa a mudar de maneira radical. O

interesse pelo lado frontal nunca foi tão grande como agora, e pesquisas o

apontam como a “estrela” maior do comportamento humano. Pode-se dizer que

25

o lobo frontal é o portal da mente humana e, como tal, é o grande maestro do

comportamento de cada um de nós.

Em 1990, Alan Zametkin (do National Institute of Mental Health)

constatou que havia uma “ciranda” bioquímica diferente nos cérebros de

pessoas DDAs. Seus estudos abriram as portas para um entendimento mais

acertado, científico e, principalmente, justo, para milhares de pessoas que, ao

contrário de serem corretamente identificados e tratados, eram “discriminados”

pela desinformação do comportamento DDA. Através de um exame chamado

PET-SCAN. Ele observou uma redução na captação de glicose radicativa no

cérebro das pessoas. Sabendo-se que a glicose (açúcar vindo dos alimentos) é

a principal fonte de energia das células cerebrais, tem-se que a redução de seu

aproveitamento significa uma diminuição na atividade energética dos cérebros

DDAs. O dado mais importante nesse estudo foi a constatação de que a

redução metabólica era maior na região frontal do cérebro – a parte do cérebro

a que os leigos chamam de “fronte”. Considerando-se que o lobo frontal é o

grande “filtro” inibidor do cérebro humano, pode-se entender que muito dos

sintomas DDAs surgem por uma redução parcial do lobo frontal em bloquear e

filtrar estímulos ou respostas impróprias vindas das diversas partes do cérebro

com o objetivo de elaborar uma ação apropriada no comportamento humano.

2.3 - Características e sintomas

Existem três tipos de transtornos do déficit de atenção e hiperatividade:

combinada, que apresenta características hiperativa e desatentas; e

predominantemente hiperativo impulsivo, que apresenta mais características

hipertativas; predominantemente desatento, que apresenta mais características

desatentas.

26

As pessoas com DDA/H apresentam várias características em seu

comportamento como: com freqüência têm dificuldade para organizar tarefas e

atividades, com freqüência parecem não escutar quando lhe dirigem a palavra;

com freqüência têm dificuldade para manter a atenção em tarefas ou atividades

lúdicas; freqüentemente deixam de prestar atenção a detalhes ou cometem

erros por descuido em atividades escolares, de trabalhos ou outros; com

freqüência apresentam esquecimento em atividades diárias; com freqüência

não seguem instruções e não terminam seus deveres escolares, tarefas

domésticas ou deveres profissionais (não devido a comportamento de oposição

ou incapacidade de compreender instruções).

Na hiperatividade as características são: freqüentemente agitam as mãos

ou os pés e se remexem na cadeira; freqüentemente correm em demasia, em

situações nas quais isto é inapropriado (em adolescentes e adultos, pode estar

limitado a sensações subjetivas de inquietação); freqüentemente falam em

demasia; freqüentemente abandonam suas cadeiras em sala de aula ou outras

situações nas quais se espera que permaneçam sentados; freqüentemente

falam demais.

Na impulsividade as características são: com freqüência têm dificuldade

para aguardar a vez; freqüentemente interrompem ou se metem em assuntos

de outros (por exemplo: intrometer-se em conversas ou brincadeiras).

Alguns sintomas de hiperatividade-impulsividade ou desatenção que

causaram prejuízo estavam presentes antes dos sete anos de idade; algum

prejuízo pelos sintomas está presente em dois ou mais contextos (por exemplo:

na escola, no trabalho e em casa). Deve haver claras evidências de prejuízo

clinicamente significativo no funcionamento social, acadêmico ou ocupacional.

27

2.4 – Papel e atuação da família

“Programas de treinamento para pais de crianças com

TDAH freqüentemente começam com ampla divulgação de informação. Existe uma grande quantidade de livros, vídeos e fitas disponíveis com dados a respeito do transtorno em si e de estratégias efetivas que podem ser usadas por familiares. A lista que segue revê de estratégias que podem ajudar aos pais de crianças portadoras de TDAH”. (Goldstein, 1998)

Segundo Goldstein, a priore, aprender o que é TDAH, os pais devem

compreender que, para poder controlar em casa o comportamento resultante do

TDAH, é preciso ter um conhecimento correto do distúrbio e suas complicações.

Incapacidade de compreensão versus rebeldia. Os pais devem

desenvolver a capacidade de distinguir entre problemas que resultam de

incapacidade e problemas que resultam da recusa ativa em obedecer ordens.

Os primeiros devem ser tratados através da educação e desenvolvimento

de habilidades. Os outros são resolvidos de maneira satisfatória através de

manipulação das conseqüências.

Dar instruções positivas – Pois devem cuidar para que seus pedidos

sejam feitos de maneira positiva ao invés de negativa. Uma indicação positiva

mostra para a criança o que deve começar a ser feito e evita o que ela focalize

em parar o que está fazendo.

Recompensar – Os pais devem recompensar amplamente o

comportamento adequado. Crianças com TDAH exigem respostas imediatas,

freqüentes, previsíveis e coerentemente aplicadas ao seu comportamento.

Quando a criança consegue completar uma tarefa ou realiza alguma coisa

28

corretamente, deve ser recompensada socialmente ou com algo tangível mais

freqüentemente que o normal.

Escolher as batalhas – Os pais deveriam escolher quando e como gastar

suas energias numa batalha, sempre reforçando o positivo, aplicando

conseqüências imediatas para comportamentos que não podem ser ignorados e

usando o sistema de créditos ou pontos. É essencial que os pais estejam

sempre um passo à frente.

Usar técnicas de “custo de resposta” - Os pais devem entender bem o

que seja “custo de resposta”, uma técnica de punição em que se perde o que

ganhou.

Planejar adequadamente – Os pais devem aprender a reagir aos limites

de seu filho de maneira positiva e ativa. Aceitar o diagnóstico de TDAH significa

aceitar a necessidade de fazer modificações no ambiente da criança. A rotina

deve ser consistente e raramente variar. As regras devem ser dadas de

maneira clara e concisa. Atividade e situações em que já ocorram problemas

devem ser evitadas ou cuidadosamente planejadas.

Punir adequadamente – Os pais devem compreender que a punição

sozinha não irá reduzir os sintomas de TDAH. Punir deve ser uma atitude

diretamente relacionada apenas a um comportamento declaradamente

desobediente. No entanto, a punição só terá modificação no comportamento

para a criança com TDAH se acompanhada de uma estratégia de controle.

Construir ilhas de competência – O que realmente importa para o

sucesso dessa criança na vida é o que existe de certo com ela e não o que está

errado. Cada vez mais, a área da saúde mental focaliza seu trabalho em

aumentar os pontos fortes em vez de tentar diminuir os pontos fracos. Uma das

melhores maneiras de criar pontos fortes é uma boa relação dos pais com os

29

filhos. “A família bem estruturada, bem orientada vai se reconstruindo aos

poucos”.

Referindo-se ao conhecimento que os pais têm dos filhos, Almy (1959)

afirma que:

“Nenhuma outra pessoa conhece tanto uma criança como seus próprios pais. O conhecimento familiar se inicia desde o momento do nascimento da criança e até antes, e inclui as horas em que ela acorda e dorme. Os pais conhecem os defeitos e as qualidades dos filhos.” (p. 206).

Embora se acorde com a afirmação de que os pais conheçam muito bem

seus filhos, no caso presente, isso não basta. É preciso conhecer também o

que acontece com a criança, o que está interferindo para que determinada

manifestação ocorra. Do contrário, esses pais podem julgar erradamente uma

atitude de seus filhos, ou não aceitar certos comportamentos demonstrados.

Nesse contexto, a que estamos nos referindo, nem sempre é favorável à

criança, os lares são estáveis, muitas mães incorporam a responsabilidade do

sustento da família, determinando seu afastamento da casa e da criança por um

tempo mais prolongado. Isto para Novaes (1975) é fator de prejuízo para

criança em certos casos, pois:

“... a ausência ou afastamento da figura materna pode gerar angústias, sentimento de abandono e solidão, vivenciadas tão intensamente a ponto de prejudicar o desenvolvimento afetivo-emocional da criança.” (p.49)

Todos sabem que a família é o primeiro agente socializador do indivíduo

e é também, conforme “Elkin (1980), “o mais crucial”, pois:

30

“é na família que a criança forma suas primeiras ligações emocionais. É também na família que encontrará seus primeiros modelos e que provavelmente desenvolverá a base das experiências subseqüentes.” (p. 182)

E é baseado na certeza de que a criança absorve os problemas

emocionais da família que: Jenkins (1969) citado por Fleming (1988), lembra

que “as crianças hiperativas precisam viver em lares estáveis, com muita

compreensão paterna” (p. 184) e esta condição, não foi encontrada no caso

clínico mencionado no presente trabalho.

Contudo, não é possível discutir essa questão sem falar especificamente

no comportamento exibido por alguns pais. Estudos revelam que se os pais

são estáveis e frustrados em suas relações conjugais e se não houver o afeto

ou aceitação consistente dentro da família, provavelmente se refletirá na

criança.

Segundo Glant (1989), a visão que a família tem da criança com o

Transtorno do Déficit da Atenção e Hiperatividade, em formação, já se

apresenta, segundo o que foi captado, como uma prévia do que será a visão de

seu mundo circundante futuro. A família percebe sua diferença e já se

preocupa, com uma possível inadaptação. Isso deixa margem para que se

pense na realidade a ser vivenciada por essa criança que desde cedo encontra

dificuldade para adequar-se à estrutura social e seguir seus padrões. Pois a

diferença (ou desvio) começa a ser notada nas “relações diretas ou primárias”,

ou seja, na família, que possui suas próprias concepções de mundo, às quais a

criança precisa se integrar.

“É por meio do relacionamento familiar que o indivíduo desde os primeiros tempos de vida, começa a aprender até que ponto ele é um ser aceitável no mundo, que tipo de concessões e ajuste necessita fazer, assim como a qualidade das relações humanas que encontrará mais tarde, ao entrar em contato com

31

o mundo social complexo fora do âmbito familiar – as relações sociais secundárias ou indiretas – a criança terá novos ajustes a fazer, que serão maiores ou menores dependendo do grau de conformidade de sua própria família.” (ps.15 e 16).

2.5 – O papel da Escola

A escola é o espaço democrático, onde o professor é um mediador, um

orientador, um cooperador de todo o processo ensino-aprendizagem,

sobretudo, um construtor na formação do cidadão. Pois ensinar não é transferir

conhecimento. É criar as possibilidades para a sua construção.

A escola é gestora de conhecimento, com projeto eco-político-pedagógico,

isto é, um projeto ético, para uma escola inovadora, construtora de sentidos e

ligada no mundo.

A capacidade de inovar é essencial na educação e esta depende da

autonomia do estabelecimento de ensino, tanto na gestão dos recursos quanto

na gestão da própria escola e da construção do seu projeto pedagógico.

Cabe a escola inserir-se no movimento global de renovação cultural.

Aproveitar-se de toda a riqueza de informações disponibilizadas pelas novas

tecnologias, na sociedade da informação a escola deve servir de bússola para

navegar nesse mar de conhecimento, oferecendo uma informação geral, na

direção de uma educação integral.

A escola reflete o deslocamento do foco do “ensino” que se transfere

para a “aprendizagem”. Seu centro passa a ser a criança, em vez do professor

e o processo da elaboração ativa do conhecimento, no lugar da acumulação da

informação pronta.

32

Para Visca, J. 1991, a aprendizagem é um processo dialético, que

envolve a reestruturação do campo subjetivo a partir da presença de um objeto

externo e pressupõe tanto as mudanças dos esquemas do indivíduo, quanto a

possibilidade de transformação da realidade, o que Piaget (1983) denominou de

processos de assimilação e acomodação (...). Quanto ao problema da

aprendizagem, este é considerado como sintoma que expressa e possui uma

mensagem. O não aprender tem uma função tão integradora quanto o

aprender;e estruturado e estruturante, na articulação de um tipo de vínculo

estabelecido entre família e criança, que tende a ser reproduzido na escola.

Embora Piaget não tenha formulado nenhuma proposta a estudos, os

aspectos psicossociais do desenvolvimento, aqueles conhecimentos que a

criança recebe do exterior, por transmissão familiar, escolar, educativa em

geral, suas idéias acerca do desenvolvimento infantil têm influenciado as

chamadas propostas ativas de ensino, servindo como fundamento para uma

série de procedimentos metodológicos adotados pelos professores.

Em certos aspectos essenciais da inteligência e da afetividade, a

aprendizagem está de acordo com a perspectiva e com o domínio da

Epistemologia convergente. Esta consiste, predominantemente, em uma atitude

que tenta integrar os aportes das Escolas de Genebra, Psicanalítica e de

Psicologia social. De acordo com esta posição, construção que depende dos

aspectos energético e estrutural que implica em uma tematização.

Visca concebe a aprendizagem como uma construção intrapsíquica, com

continuidade genética e diferenças evolutivas, resultantes das pré-condições

energético-estruturais do sujeito e das circunstâncias do meio.

Para ele, existem quatro níveis de aprendizagem que se estendem desde

o nascimento até a morte. O primeiro nível denomina-se proto-aprendizagem e

caracteriza-se pelas primeiras interações da criança com a mãe. O segundo

33

nível, a dêutero-aprendizagem, refere-se a um interjogo de relações entre a

criança e os objetivos que rodeiam e o ambiente mais próximo. O terceiro nível,

denominado aprendizagem assistemática e o quarto, aprendizagem

sistemática, são representados respectivamente pelas interações do indivíduo

com a comunidade em geral e com as instituições educativas.

A instituição educacional abrange toda comunidade escolar, e um enorme

contingente da nossa população escolar apresentam o problema do Distúrbio

do Déficit de Atenção por Hiperatividade ( DDAH).

Torna-se oportuno delinear alguns fatores importantes de bloqueio que

são encontrados na criança em fase de desenvolvimento da aprendizagem.

Pode-se ressaltar a falta de habilidade para aprender a ler, para aprender a

calcular, para aprender a escrever, para fixar a atenção durante a aula e até

mesmo para relacionar-se com os companheiros.

Tais crianças fracassam na escola, e comumente são chamadas pelos

adultos de crianças “burras”, “preguiçosas”, “lerdas”, e assim por diante. Essas

denominações, por serem empregadas constantemente, se revertem em rótulos

que acompanham a criança por toda sua existência.

Contudo, essas crianças, embora apresentem várias dificuldades, não

apresentam nenhuma deficiência auditiva, visual ou mental que as comprometa,

a não ser em raras exceções.

Esse problema vem afetando um enorme contingente de nossa população

escolar, que muitas vezes pode ser identificado bem cedo. Ele pode ser

observado no cotidiano da criança pelo seu modo desordenado de correr de um

lado para o outro, pela agitação constante de seus movimentos, pelo não

cumprimento de ordens, pela dificuldade para concluir pequenas tarefas

domésticas ou tarefas escolares e, por uma série de outras manifestações.

34

É fácil observar uma criança que murmura, canta, tagarela o tempo todo,

que move a cabeça, o tronco, faz caretas, tamborila os dedos e não consegue

concentrar sua atenção em um objetivo.

É importante ressaltar que esse distúrbio pode ocorrer nas mais diversas

situações, como no dia-a-dia do convívio familiar, nas atividades em classe ou

situações sociais. Algumas dessas crianças podem demonstrar sinais do

problema mais significativamente em uma situação do que em outra como, por

exemplo, mais quando estão em sala de aula do que em casa, ou vice-versa.

Quando estão recebendo reforço freqüente ou um controle rigoroso, estas

crianças podem apresentar sinais bastante insignificantes do distúrbio ou de

ausência dos mesmos. É possível citar a criança quando examinada em um

consultório médico ou interagindo com um “videogame”, tão tranqüilamente que

surpreende a quem a observa. Por outro lado, essas crianças em alguns

momentos, podem dar a impressão de que não ouvem o que as pessoas falam

com elas. Contudo, se submetidas a uma audiometria não é constatada

nenhuma deficiência auditiva nas mesmas, a não ser em casos esporádicos.

Também, em certas ocasiões, essas crianças se mostram atabalhoadas,

respondendo a perguntas que não foram completamente formuladas, dando a

impressão de que seu interlocutor, ou ainda que não conseguem aguardar

nada, por tempo nenhum. Esse sinal de impaciência ocorre também quando

não conseguem esperar sua vez nas tarefas de grupo e se projetam falando

muito ou interrompendo outras crianças durante certos trabalhos em que lhes

são recomendadas permanecer em silêncio.

Alguns pesquisadores acrescentam que além de todas essas

características, a criança pode apresentar: “baixa auto-estima, humor labial,

baixa tolerância às frustrações e temperamento impulsivo”.

35

É possível observar em algumas delas, a encoprese e a enurese funcional.

Contudo, essas características variam em função da idade e da individualidade

de cada uma.

Esse distúrbio é considerado pelos pesquisadores do American Psychiatric

(1989) como pertencente ao grupo dos “distúrbios de comportamento

disruptivo” (que é diferente dos chamados “distúrbios de conduta”) ficando

definido como uma alteração do comportamento que apresenta, na metade dos

casos, sintomas iniciados antes dos quatro anos de idade, e com maior

incidência em crianças do sexo masculino.

Na fase pré-escolar, quase sempre não é reconhecido pelas pessoas da

convivência da criança, pais e outros familiares, que não se dão conta do

problema, em muitos casos. Contudo, chegam até a perceber diferenças sendo

comum ouvir-se caracteriza-las com crianças que têm “o motor ligado” ou com

se diz comumente, aqueles que têm o “bicho-carpinteiro”.

Na escola, quando há ocorrência do fenômeno, além dos distúrbios

motores, a criança apresenta problemas na aprendizagem relacionados a

defeitos lingüísticos entre os quais incapacidade de leitura, dificuldade para

elaborar redação, dificuldade de ortografia, distúrbio de memória, inadequação

da imagem auditiva e visual, bem como padrões diferentes de comportamento.

Sabe-se que é muito comum, a criança com comportamento diferenciado,

encontrar na escola um ambiente favorável. Ela luta contra a intolerância de

colegas e professores. Mas, como lembra Visca (1991):

“Compete à escola proporcionar as oportunidades para um bom começo, ou seja, para um bom embasamento entre a criança que chega à escola com adultos e as outras crianças que aí estão. Desse bom relacionamento inicial vai depender a integração da criança no grupo social escolar e vai também depender de sua maior ou menor adaptação ao novo tipo de

36

vida, o gostar ou não da escola e, por extensão, gostar ou não de estudar”. (p.214)

E a professora nesta fase inicial, tem um papel importante na condução

da aprendizagem e na adaptação dos primeiros momentos da vida escolar do

aluno.

Quando a criança está se relacionando com o grupo de crianças na

escola, mostra-se diferente das demais. Nas atividades propostas não

consegue seguir as regras dos jogos e brincadeiras, nem ouvir com atenção os

outros. Com isso, interrompe, não aguarda a vez, fala demais, atrapalha. Por

essa razão, cria confusão com os colegas que, em muitos casos, passam a

rejeitá-la.

Os professores percebem também as diferenças entre essa criança e os

demais alunos, incomodam-se com ela e a caracterizam muito

inapropriadamente como “garoto endiabrado” , aquele “pestinha que não pára”,

aquele “danadinho que não aprende nada”, enfim, marcas registrada para todo

período escolar e quem sabe, para toda a vida.

Dessa forma, interagindo em classe, essas crianças provocam

constantes queixas de seus professores. Isso não surpreende, uma vez que

com agitação demonstrada a criança induz a dispersão da atenção dos demais

alunos, dificultando o andamento do ensino e impossibilitando tanto seu próprio

rendimento escolar, como de seus colegas. A preocupação com a condição

acadêmica dessa criança, é cada vez mais crescente, pois não há dúvidas de

que representa um sério problema ao seu desenvolvimento.

Para a criança com hiperatividade, ouvir o professor com atenção ou fazer

algum trabalho doméstico, pode tornar-se tarefa difícil de ser cumprida.

37

Quando a criança que apresenta o distúrbio atinge a adolescência, a

tendência é que haja uma diminuição da sua instabilidade motora. Seus

movimentos passam a ser menos agitados porém sua capacidade de responder

e a impulsividade continuam a ser problemas sérios. Esses adolescentes não

serão capazes de controlar seus impulsos em certas situações que requerem

cuidado, atenção, concentração e planejamento organizado. Isto porque,

apresentam incapacidade acentuada para “parar, olhar e ouvir”.

Quando se tornam adultos, podem se transformar em indivíduos

irrequietos, brincalhões, barulhentos e muito animados. Embora alguns possam

superar as dificuldades de aprendizagem e chegar até a universidade, outros

interrompem os estudos e se isolam, chegando mesmo a ter um

comportamento anti-social.

Em relação aos problemas residuais de aprendizagem, resultam em baixo

rendimento acadêmico que persiste por toda a vida dessas pessoas e

esclarecem ainda que, pela longa história de inadaptação social dos mesmos

poderá ocorrer depressão, sentimento de desesperança e falta de auto-estima

na idade adulta.

“Para lidar com uma criança com TDAH, antes de mais nada, o professor precisa conhecer o transtorno e saber diferencia-lo de ‘má-educação’, ‘indolência’ ou ‘preguiça’”. Paulo Matos, 2001, p. 93.

Para Paulo Mattos, professor da Universidade Federal do Rio de Janeiro, a

criança tem pouca atenção, e com freqüência comete erros em trabalhos

escolares e provas por puro descuido. Examinando a prova que ela mesma fez,

a criança é capaz de apontar os próprios erros e até se aborrecer por ter

38

cometido erros tão tolos. Ou a professora se espantar com os erros cometidos

em matéria que a criança comprovadamente conhece. É comum perder a

atenção no que o professor está falando, e ficar pensando em coisas bem

distantes das aulas. Diz-se que “voa” ou “viaja” nesses momentos. Essa mesma

perda constante de concentração é que dificulta a leitura de um livro

recomendado pela escola. Com freqüência precisa voltar a ler do início da

página pois é como se tivesse dado um branco no momento em que estava

lendo um trecho.

“Um grupo considerável de neurocientistas tem se dedicado ao estudo das relações entre o cérebro e a linguagem com certa ênfase no estudo do funcionamento cerebral durante o processo de leitura e de aprendizagem da língua escrita. Outro grupo tem se dedicado ao estudo da memória, principalmente das relações entre a memória e aprendizagem. Entre estes, muitos também se ocupam da consciência. Contrariamente ao que poderia se supor, não se trata aqui de um corpo de pesquisa na área estritamente biológica ou médica. Vários neurocientistas têm apontado para o fato de que o desenvolvimento do cérebro e o seu funcionamento são funções de fatores de ordem cultural, e de organização social, do trabalho e das atividades de lazer. Segundo alguns neurocientistas, o cérebro se forma na dinâmica cotidiana das reações do indivíduo ao meio, idéia defendida décadas atrás por Wallon, por quem o processo de desenvolvimento humano é função do contexto”. Euvira Souza, pg.7, 1998.

Para entender o que acontece quando uma criança não aprende a ler e a

escrever é preciso considerar, principalmente, que a escrita é um produto da

evolução histórico-cultural da humanidade, é um sistema organizado e,

portanto, para dominá-lo, a pessoa precisa compreender sua organização.

Sendo a escrita uma prática de cultura, vários fatores de ordem cultural

participam do processo de aprendizagem da escrita. Do ponto de vista do

sujeito que aprende, sendo o desenvolvimento humano de natureza biológica e

cultural, os períodos do desenvolvimento humano determinam diferentes formas

39

de abordar o ensino da escrita. Além disso, sabemos hoje que, do ponto de

vista biológico, há uma grande complexidade na forma como o cérebro

processa a linguagem, com áreas de especialização para as diferentes

dimensões da linguagem.

A partir do exposto, quando uma criança não está aprendendo a ler ou a

escrever, ou ambos, é preciso considerar a escrita como um sistema que é

manifestado pela capacidade humana de simbolizar; o educando, seu período

de desenvolvimento por ela oferecido; o conhecimento, o momento histórico em

que ocorre o ensino-aprendizagem; a cultura e a prática pedagógica,

principalmente a dinâmica dos processos que acontecem na sala de aula.

Paulo Mattos considera a sala de aula, o centro cultural da escola, dessa

forma, uma sala de aula eficiente para crianças desatentas deve ser organizada

e estruturada. A estrutura supõe regras claras, um programa previsível e

carteiras separadas. Os prêmios devem ser coerentes e freqüentes. Um

programa de reforço baseado em ganho e perda deve ser parte integral do

trabalho de classe. A avaliação do professor deve ser freqüente e imediata.

Interrupções e pequenos incidentes têm menores conseqüências se ignorados.

O material didático deve estar adequado à habilidade da criança. Estratégias

cognitivas que facilitam a auto-correção, assim como melhoram o

comportamento nas tarefas, devem ser ensinadas. As tarefas devem variar,

mas continuar sendo interessantes para os alunos. Os horários de transição,

bem como os intervalos e reuniões especiais, devem ser supervisionados. Pais

e professores devem manter uma comunicação freqüente. Os professores

também precisam estar atentos à qualidade de reforço negativo do seu

comportamento. As expectativas devem ser adequadas ao nível de habilidade

da criança e devem-se estar preparado para mudanças.

Os professores devem ter conhecimento do conflito incompetência X

desobediência, e aprender a discriminar entre os dois tipos de problema. É

40

eficientemente no ambiente da sala de aula de uma criança com TDAH. Essas

intervenções minimizam o impacto negativo do temperamento da criança. Um

segundo repertório de intervenção deve ser desenvolvido para educar e

melhorar as habilidades deficientes da criança com TDAH.

Segundo Visca (1991), o processo de aprendizagem transcende a

estrutura cognitiva porque requer a efetivação do objetivo e transcende,

também, a afetividade visto que implica na utilização de operações cognitivas;

sem esquecer o que se pode denominar de tematização, ou conteúdo adquirido

mediante cognitivo-afetivos postos em jogo. É comum observar como sujeitos

que têm alcançado um mesmo nível intelectual e fazem uso semelhante de sua

afetividade, por permanecerem a diferentes culturas, meios sociais ou grupos

familiares, apresentavam tematizações significativamente distintas. Isso deriva

simplesmente do fato de que cada contexto oferece diferentes crenças,

conhecimentos, atitudes e habilidades.

Em suma, toda problemática que envolve a criança hiperativa na aquisição

da aprendizagem requer uma atenção especial dos profissionais envolvidos

especificamente – professores, pedagogos e psicopedagogos numa inter-

relação afetiva onde a criança seja o centro de toda atenção dispensada por

esses profissionais.

41

CAPÍTULO 3

PSICOPEDAGOGIA

3.1 – Objeto de estudo

A fundamentação teórica que segue, se dá acerca do papel da

psicopedagogia no processo da aprendizagem. Com o objetivo de sanar as

dificuldades como elemento facilitador nesse processo, assim como também,

desenvolver seu processo histórico.

A psicopedagogia constitui-se muito recentemente como a área definida

de estudo do processo de aprender e de investigação das dificuldades

apresentadas pelo educando, enquanto sujeito e objeto desse processo.

Hoje, ela já conquistou um espaço próprio, afirmador de sua autonomia. A

cada momento novas direções, em horizontalidade e verticalidade, abram-se

aos que se interessam pela psicopedagogia.

O objeto de estudo da psicopedagogia é a aprendizagem como

mecanismo que a espécie humana desenvolveu para se adaptar ao meio; pela

complexidade desse mecanismo, a psicopedagogia configura-se como um

campo de investigação multidisciplinar cercando-se de bases orgânicas,

psicológicas e sociais. Alguns Psicopedagogos brasileiros definem o objeto de

estudo da psicopedagogia segundo suas experiências de atuação na área do

desenvolvimento metodológico.

42

“O objeto central de estudo da psicopedagogia está se estruturando em torno do processo de aprendizagem humana: seus padrões evolutivos normais e patológicos – bem com o a influência do meio (família, escola sociedade) no seu desenvolvimento”. KIGUEL, (1991, p 24)

De acordo com Neves, a psicopedagogia estuda o ato de aprender e

ensinar, levando sempre em conta as realidades internas e externas da

aprendizagem, tomadas em conjunto. E mais, procurando estudar a construção

do conhecimento em toda a sua complexidade, procurando colocar em pé a

igualdade, os aspectos cognitivos, afetivos e sociais que lhe estão implícitos.

(1991, p.12)

Segundo Scoz, “a psicopedagogia estuda o processo de aprendizagem e

suas dificuldades, e numa ação profissional deve englobar vários campos do

conhecimento, integrando-os e sintetizando-os”. (1992, p.2)

Para Scoz, o objeto de estudo da psicopedagogia deve ser entendido a

partir de dois enfoques: preventivo e terapêutico. O enfoque preventivo

considera o objeto de estudo da psicopedagogia o ser humano em

desenvolvimento, enquanto educável. Seu objeto de estudo é a pessoa a ser

educada, seus processos de desenvolvimento e as alterações de tais

processos. Focaliza a possibilidade do aprender, num sentido amplo. Não deve

se restringir a uma só agência como a escola, mas ir também à família e à

comunidade. Poderá esclarecer, de forma mais ou menos sistemática, a

professores, pais e administradores sobre as características das diferentes

etapas do desenvolvimento, sobre o progresso nos processos de

aprendizagem, sobre as condições psicodinâmicas da aprendizagem. O

enfoque terapêutico considera o objeto de estudo da psicopedagogia a

identificação, análise, elaboração de uma metodologia de diagnóstico e

tratamento das dificuldades de aprendizagem. (1985, p.13)

43

Essas considerações em relação ao objeto do estudo da psicopedagogia

sugerem que há um consenso quanto ao fato de que ela deve ocupar-se em

estudar a aprendizagem humana, porém é uma ilusão pensar que tal consenso

conduza a todos a um único caminho. O tema da aprendizagem apresenta

tamanha complexidade que tem a dimensão da própria natureza humana e

caberia um outro ensaio para tratá-lo. É importante, no entanto, ressaltar que a

concepção de aprendizagem é resultado de uma visão de homem, e é em

razão desta que acontece a práxis psicopedagógica.

Dos profissionais brasileiros supracitados, podemos verificar que o tema

da aprendizagem ocupa-os e preocupa-os, sendo os problemas desse processo

(de aprendizagem) a causa e a razão da psicopedagogia.

Segundo Jorge Visca, a psicopedagogia, que inicialmente foi uma ação

subsidiária da medicina e da psicologia, perfilou-se como um conhecimento

independente e complementar, possuída de um objeto de estudo – o processo

de aprendizagem – e de recursos diagnósticos, corretores e preventivos

próprios. (1987) Para FROMM, “Conhecer significa penetrar através da

superfície, a fim de chegar às raízes e, por conseguinte, às causas; conhecer

significa “ver” a realidade em sua nudez.”

A resposta ao grande problema do fracasso escolar surge, no Brasil, a

psicopedagogia como campo do conhecimento sobre a gênese da

aprendizagem na articulação entre o cognitivo e o psíquico.

De início, o objeto de estudo da psicopedagogia eram os sintomas das

dificuldades de aprendizagem e o objetivo era remediar esses sintomas.

Depois, quando se começa a considerar os sintomas como valores relativos,

seu objeto passa a ser o processo de aprendizagem e seu objetivo remediar ou

refazer um processo em todos os seus aspectos, passando a ser percebida

como um saber independente. O trabalho psicopedagógico se dá entre o ser

44

em processo de construção do conhecimento e o psicopedagogo. Se de um

lado a sociedade alcançou avanços tecnológicos, de outro causou uma

gradativa perda de identidade do ser humano como sujeito da história.

O conhecimento filosófico sugere que elaborar o próprio conhecimento da

realidade é tornar-se sujeito do próprio pensamento. Formar uma consciência

crítica e um processo reflexivo cujo objetivo é uma concepção de mundo mais

articulada, produzindo no sujeito a necessidade de produção de novos

conhecimentos.

“Somos o que somos porque fomos historicamente produzidos. Somos seres históricos materializados por marcas emocionais, afetivas, econômicas, sociais, culturais, religiosas e políticos, recebidos pelo ambiente exterior, pelo grupo social no qual estamos inseridos”. (Pereira, p. 107)

Assumir uma maneira crítica de pensar compreende, também, o

conhecimento e a ação do sujeito, ou seja, o conhecimento é um processo de

construção histórica.

Na prática pedagógica, não é possível construir uma consciência crítica

sem o auto-conhecimento. Esse auto-conhecimento resgata a história de vida, o

que possibilita ao sujeito a elaboração de questões emocionais conflituosas que

podem provocar alguns distúrbios de aprendizagem.

3.2 – A que se propõe a Psicopedagogia

Para Rubstein, num primeiro momento a psicopedagogia esteve voltada

para a busca e o desenvolvimento de metodologias que melhor atendessem

aos portadores de dificuldades, tendo como objetivo fazer a reeducação ou a

45

remediação e dessa forma promover o desaparecimento do sintoma. E, ainda, a

partir do momento em que o foco da atenção passa a ser a compreensão do

processo de aprendizagem e a relação que o aprendiz estabelece com a

mesma, o objeto da psicopedagogia passa a ser mais abrangente: a

metodologia é apenas um aspecto no processo terapêutico, e o principal

objetivo é a investigação de estiologia da dificuldade de aprendizagem bem

como a compreensão do processamento da aprendizagem considerando todas

as variáveis que intervêm neste processo. (1992, p.103)

Segundo Scoz (1990), a psicopedagogia no Brasil é a área que estuda e

lida com o processo de aprendizagem e suas dificuldades e, numa ação

profissional, deve englobar vários campos do conhecimento, integrando-os e

sintetizando-os.

A formação, se dá no nosso país, pressupõe vantagens e desvantagens.

O fato da nossa formação em Psicopedagogia envolver diversificados

profissionais, acentua, diferentemente do que ocorre na Argentina, o caráter

interdisciplinar desta área de estudo. De outro, em razão exatamente da

presença de profissionais diversos, o psicopedagogo enfrenta dificuldades em

construir uma identidade própria.

Avaliando as dificuldades impostas pela complexidade do próprio objeto

de estudo da psicopedagogia, a sua recente existência enquanto área de

estudos, as suas origens teóricas, e a questão da formação no Brasil, existe

uma busca de uma identidade tornando-se um processo árduo. Entretanto, os

profissionais brasileiros envolvidos nessa busca estão mobilizados por um

grande desejo de contribuir para tal processo permanente de construção.

46

3.3 – Representação Histórica da Psicopedagogia no Brasil

Na história da psicopedagogia no Brasil e na Argentina, destacam-se

alguns pontos comuns: a atividade prática iniciou-se antes da criação dos

cursos nos dois países; em ambos os países a prática surgiu da necessidade

de contribuir na questão do “fracasso escolar”; inicialmente, o exercício

psicopedagógico apresentava um caráter reeducativo, assumindo ao longo do

tempo um enfoque terapêutico; a psicopedagogia nasce com o objetivo de um

trabalho na clínica e vai ampliando a sua área de atuação até a instituição

escolar, ou seja, vai da propriedade curativa à preventiva; encontra terreno fértil

nesses dois países, em função da demanda que lhe deu origem.

Considere-se o fato de que as práticas no Brasil têm referencial teórico

fortemente marcado por influências Argentinas. O que difere na forma de

atuação dos brasileiros em relação aos argentinos são decorrentes, das

condições de formação. No Brasil, psicopedagogia é especialização, curso de

aperfeiçoamento. Já na formação em nível de graduação, com duração de

cinco anos, como ocorre na Argentina, proporcionando um conhecimento mais

sólido da matéria, do saber psicopedagógico e, consequentemente, uma prática

mais consistente.

Para Anastasi, a prática é a forma de diagnóstico psicopedagógico. Aos

Argentinos é facultado o uso de testes que, no Brasil, são considerados de usos

exclusivo do psicólogo, assunto que já causou muita polêmica entre brasileiros,

pois é uma preocupação do Conselho Federal de Psicologia (CFP).

3.4 – Participação e Formação dos primeiros Psicopedagogos no Brasil

Os primeiros Psicopedagogos eram profissionais da educação, sensíveis,

idealistas, que queriam ajudar na reintegração daqueles à margem. Os

47

profissionais buscavam compreender as razões do não aprender a partir de

explicações sobre a natureza do desenvolvimento orgânico, em muitos casos

as dificuldades eram associadas à questão da maturidade psico-neurológica.

Para compreender melhor as questões das dificuldades de aprendizagem,

buscavam-se respostas através dos estudos de Psicologia, Neurologia,

psicomotricidade, porém, a ênfase estava numa prática, nas técnicas que

melhor atendessem às necessidades que tinham por objetivo reeducar, isto é,

educar novamente através de um método mais eficaz, específico para o aluno

que apresentasse lentidão, ou alguma inaptidão.

Para formar profissionais que atendessem às crianças com fracasso

escolar, surgiram primeiramente no Brasil cursos de curta duração os quais

ofereciam subsídios para atender aspectos específicos como àqueles

relacionados como a psicomotricidade; linguagem e raciocínio. Esses cursos

eram ministrados por profissionais brasileiros com experiência no atendimento

de crianças com dificuldades escolares ou por profissionais estrangeiros

especialmente convidados do Cone Sul.

Posteriormente, foram sendo formados cursos de longa duração, de

especialização, que objetivam, além de oferecer recurso para o trabalho, buscar

uma compreensão mais global do fenômeno da aprendizagem e das suas

dificuldades.

Na década de 1970, já havia movimento científico e acadêmico em Porto

alegre, para a capacitação de profissionais que atendessem as pessoas com os

chamado “distúrbio de aprendizagem”. Tratava-se do curso que chamava-se

Psicopedagogia Terapêutica. Cursos desse tipo ocorreram, primeiramente, nas

cidades de Porto Alegre, Rio de Janeiro e São Paulo.

48

O fato de que, a partir da criação do órgão de classe, a Psicopedagogia

ganhou força, corpo e penetração nos meios acadêmicos e reconhecimento

público e oficial. Hoje existem várias prefeituras contratando profissionais que

tenham especialização em Psicopedagogia.

A construção da identidade da psicopedagogia vem com o tempo, com a

maturidade, com a experiência dos profissionais, com a produção acadêmica,

com a discussão, com a polêmica sadia, e, principalmente com a consciência

profissional advinda de uma agremiação forte é única.

Para Scoz, a Psicopedagogia em sua perspectiva atual, reconhece os

efeitos nocivos da rotulação ou da patologização dos problemas da

aprendizagem; o fenômeno educativo, em sua totalidade, percebe que a

rotulação também induz, com freqüência, a um poder arbitrário e a uma

proposta de trabalho ineficaz, que reforça ou agrava as limitações dos alunos,

distanciando-os, cada vez mais, da chance de permanecerem no ensino

regular.

A Psicopedagogia também sabe que os problemas educacionais muitas

vezes são decorrências da organização e forma de desenvolvimento social.

49

CAPÍTULO 4

AS CONTRIBUIÇÕES DA PSICOPEDAGOGIA NA

EDUCAÇÃO DA CRIANÇA HIPERATIVA

Esta pesquisa foi desenvolvida com a finalidade de apresentar, avaliar e

ampliar fundamentos e estratégias de intervenção psicopedagógica em

dificuldades de aprendizagem presentes nas crianças com o Distúrbio do Déficit

da Atenção por Hiperatividade, DDA/H.

4.1 – A dificuldade da aprendizagem

A dificuldade de expressão escrita nas mais diversas tarefas acadêmicas

por parte de alunos universitários oriundos das instituições de ensino superior

da rede particular podendo ser evidenciado através de crescentes queixas de

professores e supervisores de estágio, bem como próprios alunos que admitem

suas dificuldades neste aspecto, ano a ano.

A acentuada queda na qualidade do ensino, não permite que se negue

que muitas das origens dessas dificuldades nos leva a um histórico escolar

cujos trópicos são cumulativos: estimulação geral empobrecida na primeira

infância; deficiência no processo de alfabetização; estratégias e tarefas que

tornam o ato de ler e escrever destituídos de qualquer tipo de prazer; a total

descontinuidade dos programas e conteúdos desenvolvidos nas diversas

séries; formas de avaliação que pouco estimulam a produção de textos;

eventualmente episódios “traumático” com professores (que vão da simples

indiferença à ridicularização e humilhação), entre outros.

50

Assim, de um lado estão os professores queixando-se da deficiência de

repertório prévio e do desempenho de seus alunos, e de outro, o esforço dos

estudantes através da tentativa e erro para superar essas dificuldades.

“O tema fracasso-sucesso está posto pela realidade social com toda premência. No nosso entender o que resulta pouco atraente não é o tema, que continua desafiante, mas a forma de encontra-lo. O que continua preocupante não é apenas a teimosia com que se repetem por décadas os mesmos índices de reprovação mas também a teimosia em continuarmos fazendo as mesmas análises clínicas e individuais como se estivéssemos diante de uma epidemia, uma doença crônica que se impõe a nossa competência profissional e à nossa ousadia pedagógica.” (MOEL, 2002, p. 12)

A capacidade ou habilidade de se expressar por escrito é construída a

partir de uma base que envolve uma série de outras habilidades e que inclui

uma rede bastante complexa de experiência vivida pelo estudante. Qualquer

que seja a operacionalização que se faça do que se constitui a deficiência em

expressar-se por escrito, constata-se que esta capacidade ou habilidade que

envolve, por outro lado, a reestruturação de processos meta cognitivos e

funções cognitivas complexas e intrincadas, vinculadas à esfera do

funcionamento afetivo-emocional de diversos níveis de complexidade e

qualitativamente variáveis. Implica em intervenções planejadas e

especificamente direcionadas a estes objetivos, o que constitui um dos eixos do

trabalho psicopedagógico.

Sem negar a problemática em questão, o caráter mais do que urgente da

revisão do ensino, o engajamento na luta das entidades de classe, exigindo

reformas estruturais constantes na educação.

51

4.2 – Delineamento do Estudo de um caso clínico

O acompanhamento foi realizado, em uma instituição particular, onde a

observação realizada foi de suma importância, pois permitiu o

acompanhamento e o contato com uma criança que apresentava sintomas

indicadores de uma criança hiperativa. Com a observação em sala de aula foi

possível perceber os entraves que interferem no ensino-aprendizagem.

A direção e a equipe pedagógica da instituição escolar permitiram o

contato com o professor regente e os alunos em uma turma de alfabetização.

Na observação da turma, a atenção foi dirigida para a agitação do aluno P. R.

de seis (06) anos de idade. Foi questionado à professora sobre o seu

comportamento; ela relatou que o menino veio transferido de outro

estabelecimento escolar, onde não foi possível o entrosamento do mesmo com

a sua professora e colegas da turma.

Devido ao modo dele agir agressivamente, e pela não concentração onde

ele envolvia o restante da turma, a equipe pedagógica do estabelecimento

escolar atual, marcou encontro com sua mãe, do qual participei. Em seu relato

a mesma colocou que aos oito(8) meses de vida, P. R. havia sofrido um

desmaio que durou poucos segundos, e que isso repetiu por mais algumas

vezes sem que ela o tivesse levado ao médico. Encerrou-se a reunião com a

recomendação para que a mãe o levasse ao médico e retornasse na próxima

semana para um novo encontro com a equipe pedagógica.

Dias depois, a mãe de P. R. voltou a nos procurar relatando que no último

final de semana o menino havia tido outro desmaio com a durabilidade mais

prolongada; receosa, ela encaminhou o menino a uma clínica próxima de sua

casa, onde o plantonista o deixou em observação e não conseguindo descobrir

52

a causa, pediu que ele fosse encaminhado a uma orientação mais minuciosa –

digo, a um neurologista.

Segundo a descrição da mãe, primeiramente ela conversou com a

neurologista sobre o menino relatando todo o seu histórico. Contou à médica

que engravidara sem um planejamento e seu namorado não quis reconhecer o

filho, sendo preciso a realização de um exame de DNA para confirmação da

paternidade; mesmo assim, o menino só foi registrado por exigência da avó

paterna. P. R. sabia quem era seu pai, mas tinha pouco contato com ele.

Continuou relatando sua conversa com a médica dizendo que o pai do menino

havia morrido em um acidente de carro, e disse que P. R. recebeu a notícia um

pouco assustado piorando sua agitação na escola.

Em seguida, a neurologista conversou com P. R. realizando algumas

perguntas; colocou uma seqüência de letras alfabéticas pedindo que ele fizesse

a leitura. Percebeu que antes do término da pergunta o menino já estava

respondendo; quanto à seqüência do alfabeto, ele só iniciava a resposta, pois

sua atenção estava voltada em outra coisa, não conseguindo fazer com que ele

ficasse atento à conversa. Encerrada a consulta a médica prescreveu o

medicamento Ritalina de 10 mg por 30 (trinta) dias, para ser ministrado no

horário em que o menino fosse para a escola. Enviou através da mãe, um

encaminhamento para o acompanhamento com um psicólogo, uma

fonoaudióloga, relatando o diagnóstico obtido através dos testes e da conversa

que realizou com P. R..

A médica constatou que P. R. é uma criança com característica de DDA/H

e traços de dislexo e dislalia. Solicitou à professora e à equipe pedagógica a

observação quanto à resposta ao medicamento, e enviou também uma escala

de comportamento infantil. Tal escala é composta por um tabela em que há um

questionário para observação das respostas com grau de intensidade, como:

nenhum, pouco, razoável e muito.

53

O que foi observado no comportamento de P. R.? Ele não conseguia ficar

sentado por muito tempo, era muito irrequieto e superativo; muito desatento e

facilmente distraível; tinha muita dificuldade de esperar sua vez;

freqüentemente respondia a uma pergunta antes que a mesma fosse

completada; demonstrava dificuldade em se fixar em uma brincadeira ou jogo;

estava sempre mudando de atividade; apresentava dificuldade em brincar

quieto; constantemente perdia objetos e brinquedos; ele não realizava

atividades sem considerar o perigo e as possíveis conseqüências.

Na dislexia as situações se fundamentam nos processos de leitura, no

reconhecimento das palavras atuando somente em uma das vias utilizadas para

a leitura.

Percebeu-se que P. R. trocava alguns fonemas ou não os pronunciava,

exemplo: a palavra “clara”, ele pronunciava “cara” , retirando a letra “l”, ou no

caso da palavra “cravo”, ele pronunciava “cavo”, suprimindo a letra “r”.

Observou-se que quando realizava-se uma pergunta, ele ouvia, mas não

conseguia assimilar e ficava perguntando várias vezes a mesma pergunta.

Feitas essas observações, constatou-se que P. R. tinha o comportamento

hiperativo. Procurou-se diversificar e aumentar suas atividades através de

jogos, preenchendo todo seu tempo livre. Trabalhou-se com ele os fonemas e

encontros consonantais logo após a introdução das sessões com a

fonoaudióloga. Observou-se uma sensível mudança de comportamento. A

atividade em que se pôde constatar com mais clareza a mudança de suas

atitudes foi quando sua turma foi levada a uma oficina de leitura e tecnologia,

com feira de livros, brincadeiras, a presença de personagens do sítio do Pica-

pau Amarelo e contadores de histórias.

54

Conclui-se que o acompanhamento e as observações realizadas em sala

de aula com o aluno P. R., permitiram a percepção das dificuldades

encontradas em sua aprendizagem.

No caso específico pode-se concluir que, o aluno P. R. tanto na primeira

escola, que culminou com sua transferência, quanto na escola atual, teve

dificuldades de interação em virtude da inexperiência dos professores e demais

profissionais que o orientavam, tendo em vista a problemática do aluno.

Foi preciso que os sintomas se agravassem para que o menino fosse

encaminhado e assistido por profissionais experientes e preparados para tal

situação; a intervenção da médica, quando enviou uma tabela com uma

seqüência de observações para o professor regente, a fim de que o mesmo

realizasse tais observações, para que o menino pudesse receber o diagnóstico

e o tratamento para tal situação, possibilitou um tratamento mais adequado.

Quanto ao medicamento ministrado, só foi aconselhável devido ao quadro

avançado dos sintomas, e ficou claro que a inexperiência da professora e da

equipe pedagógica de ambas as escolas em detectar os sintomas proporcionou

o avanço do quadro em que se encontrava o menino. Observou-se que o

medicamento ministrado fez com que a agitação e a inquietude diminuíssem.

Somente após isso, foi possível a realização das atividades diversificadas e

direcionadas a observar as mudanças no comportamento, no avanço e na

percepção que P.R. apresentava nas atividades propostas, pronunciando os

fonemas que anteriormente eram suprimidos, por exemplo. Em sua participação

no evento Salão da Leitura e Tecnologia o mostrou-se atento e concentrado até

quando participava das diversas histórias dos clássicos infantis no evento; foi

fundamental, pois tornou possível verificar sua melhora de imediato de forma

clara e convicta.

55

O mais importante nesta atividade foi a observação e o acompanhamento

com intervenção em um caso clínico onde se pôde perceber o quanto é

necessário o embasamento, o estar ciente de que o educador precisa aprimorar

seus conhecimentos e intensificar sua prática junto à equipe pedagógica, para

aprofundar-se na relação ensino-aprendizagem e professor-aluno.

Com a aquisição dos conhecimentos psicológicos, percebe-se que a

aprendizagem não depende só da prática e das técnicas desenvolvidas pelo

professor, mas do somatório dos conhecimentos pedagógicos e psicológicos,

pois essa busca é que permite o desenvolvimento de todo o processo ensino-

aprendizagem. “Ai de nos educadores, se deixarmos de sonhar sonhos

possíveis”. (O educador : vida e morte)

O psicopedagogo é o profissional indicado para intervir no processo de

aprendizagem, para minimizar suas dificuldades; na observação e intervenção

no caso clínico descrito. Com os conhecimentos adquiridos acerca da função do

Psicopedagogo, foi possível perceber que nos tempos atuais, as crianças não

brincam mais; primeiro, por falta de tempo, e segundo, por falta de espaço.

Muito cedo a criança vai à escola, à aula de computação, à aula de inglês, para

não ficar fora do mercado. Quando há tempo para brincar, a brincadeira

preferida é no computador, num vídeo-game, isolado das pessoas, sem

interação. A participação dos pais nas brincadeiras não existe praticamente.

Não há tempo a perder, é preciso trabalhar, trabalhar muito, para poder suprir

todas as necessidades dos filhos. E dessa forma as crianças deixam de brincar,

de interagir com outras crianças e principalmente, de interagir com os pais.

Vygotsky (1988), Piaget (1990) e Winnicotti (1975) abordam o jogo como

estratégia cognitiva para comprovar a melhora na aprendizagem.

Piaget e Vygotsky consideram o jogo essencial para a educação,

principalmente na educação infantil. O grande interesse por jogos e

56

brincadeiras a partir da utilização do lúdico faz com que haja uma ruptura na

resistência à leitura, permitindo que o aluno passe a desenvolver tal prática;

como exemplo disso a leitura das regras dos jogos, sua compreensão e

respeito por elas.

Assim, entende-se que o jogo e a brincadeira são estratégias cognitivas

importantes para crianças com dificuldade de aprendizagem.

É importante destacar o papel lúdico na Psicopedagogia, tanto clínica

quanto institucional, como elemento facilitador da aprendizagem da criança com

DDAH. No entanto, não se deve esperar que os professores eduquem o

trabalho com essas crianças sem ajuda. É necessário um diagnóstico adequado

para os alunos portadores de DDAH; um tratamento médico é crucial para

permitir a permanência deles na escola. Os problemas sociais e

comportamentais que eles freqüentemente apresentam pedem a orientação da

escola, que pode ajudar de várias maneiras na modificação do comportamento.

A saída da sala para uma atividade paralela, a resolução de problemas, o

treinamento em hábitos sociais e as técnicas de relaxamento para o controle da

raiva até que o aluno volte ao seu estado normal na volta ao estado normal são

algumas das formas de ajudar nesse processo. É necessário cooperação e

trabalho em conjunto com a participação dos pais. Conduzir a criança para a

equipe pedagógica ou serviço de orientação, com a observação de membros da

equipe em sala de aula e em outros ambientes da escola. “Não sei como

preparar o educador. Talvez isso não seja nem necessário, nem possível...É

necessário acordá-lo.” (Conversas com que gosta de ensinar – pág.29)

É fundamental ressaltar a importância da participação do Psicopedagogo

nas sessões com a criança, pois o mesmo possui conhecimento e aprendizado

para intervir. Sua participação é substancial, para a equipe pedagógica e

professores, numa retomada de consciência a respeito de sua atuação com o

educando; já que o contato desses profissionais com a criança hiperativa tem

57

se mostrado desastroso e calcado em preconceitos e discriminações. “(...) as

gaivotas que desprezam a perfeição por amor ao movimento não chegam à

parte alguma, devagar. As que ignoram o movimento por amor a perfeição

chegam a toda parte, instantaneamente.” (Fernão Capelo Gaivota)

Tanto a mediação realizada pelo professor em sala de aula, interagindo

com o educando, tecendo um olhar para o indivíduo que é único, no desejo de

sanar todas as dificuldades sem rotular o aluno hiperativo, quanto à intervenção

Psicopedagógica, tanto clínica quanto institucional, realizada com o aluno

DDAH, no sentido de orientar os pais e encaminhar o aluno para uma avaliação

neurológica e fonoaudióloga são fundamentais para o desenvolvimento da

aprendizagem da criança.

Impõe-se uma avaliação cuidadosa nos casos suspeitos de DDAH, tipo

desatento, face à necessidade de se diferencia-los dos casos silenciosos de

ansiedade e depressão, uma vez que essas condições também são capazes de

comprometer a atenção e o esforço. A investigação criteriosa pretenderá

identificar a presença ou não do distúrbio do aprendizado.

É fato importante que em toda participação que envolve o “professor”, o

“psicopedagogo” e a “família” precisa ser realizada com competência e amor.

“(...) toda vocação nasce de um grande amor, de uma grande esperança.”

(Conversas com quem gosta de ensinar).

58

CONCLUSÃO

Acreditar na Educação como um processo contínuo e recíproco, sabendo

do grande desafio para o Psicopedagogo na tarefa de proporcionar e orientar

em meio a este complexo estrutural que é a aprendizagem no propósito da

mudança de comportamento, é comprometer-se de todo com esta

transformação na busca do verdadeiro sentido do porquê se faz.

A pesquisa realizada confere a oportunidade do confronto da teoria

adquirida com a prática vivenciada. E quando há o confronto com diversas

experiências é possível interpretá-las; e, considerando que a Educação é o

constante processo de busca e mudança, o trabalho se torna ainda mais

estimulante e enriquecedor.

O psicopedagogo tem uma tarefa muito difícil: a de concretizar a

realidade, com toda uma série de divergências que irá enfrentar e confrontar.

Mas esse será o desafio, transformar comportamentos através da consciência

crítica do que fazer, criar responsabilidades e não se esconder e enfrentar

porque só assim pode-se conseguir mudanças .

O confronto com a realidade aponta a prática de profissionais

despreparados e distanciados da problemática que envolve a criança com o

distúrbio do déficit da atenção por hiperatividade (DDAH). É preciso despertá-

los para a tarefa de quem tem ousadia, competência e consciência crítica; para

tarefa que se aprende com o convívio no processo educacional, em função

daqueles que realmente estão engajados na socialização do saber que

transforma a sociedade brasileira num Brasil onde impere a Justiça.

Os familiares vivem em constante dilema, com a complexidade do

fenômeno. Portanto, urge a necessidade de se ajudar a esses familiares a

59

enfrentar seu desafio. E isso só poderá ser feito através de projetos e

programas bem estruturados e apropriados, para sua orientação. E esses

projetos deverão ser desenvolvidos por equipes interdisciplinares compostas

por profissionais competentes nas áreas de educação, medicina, psicologia,

serviço social e outras afins.

É preciso ainda que esses pais sejam “consumidores bem informados”,

conhecedores de tudo que se sabe sobre esses problemas.

Com efeito, a consideração final é que o desafio não é apenas para os

pais ou responsáveis diretos pela criança hiperativa, mas para todos que se

interessam por sua formação educacional e social; pois sabe-se que um criança

bem orientada, terá mais chances de uma vida futura melhor, e quem sabe

mais feliz em nossa sociedade.

“Precisamos assumir o desafio de educar o homem para desenvolver o instinto da águia. A águia é o animal que voa acima das montanhas , que desenvolve seus sentidos e habilidade, que aguça, olhos e competência para ultrapassar os perigos, alcançando vôo acima deles.” (Lições do Príncipe e outras lições – pág. 110)

60

ANEXOS

61

BIBLIOGRAFIA

ALMY, M., Como Estudar a Criança, São Paulo: Fundo da Cultura, 1959. BAQUERO, Ricardo. Vigotsky e a aprendizagem escolar. Tradução: Ernane F. da Fonseca Rosa. Porto Alegre:Artes Médicas, 1998. BARKLEY, Russel, O Transtorno do Déficit da Atenção / hiperatividade (TDAH): guia completo e autorizado para os pais, professores e profissionais da saúde. Porto Alegre: Artmed, 2002. FREIRE, Paulo. Pedagogia do Oprimido. São Paulo: Paes & Terra, 1974. GOLDSTEIN, S & GOLDSTEIN, M. Hiperatividade – Como desenvolver a capacidade de atenção da criança. São Paulo: Papirus, 2002. HALLOWELL, E. & RATEY, G, Tendências à Distração. Rio de Janeiro: Rocco, 1999. MOLL, Jaqueline - Para além do fracasso escolar. NOVAES, M. H. Psicologia Escolar. Petrópolis: Vozes, 1970. PATTO, Maria H.S. A produção do fracasso escolar. São Paulo: Casa do Psicólogo, 1999. PIAGET, Jean. (1956). Psicologia da Inteligência. Rio de Janeiro. Ed. Fundo de Cultura Brasil – Portugal. SANT’ANNA, Flávia M. Planejamento de ensino e avaliação. Porto Alegre: Sagra Luzato, 1990. VISCA, J. Psicopedagogia: Novas Contribuições. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 1991. VYGOTSKY, L.S. (1991). Pensamento e Linguagem. São Paulo: Martins Fontes São Paulo; Papirus, 2002. WEISS, M. L.L. “Considerações sobre a instrumentação do psicopedagogo no diagnóstico”. IN: SCOZ, B. et all (org). Psicopedagogia: o caráter interdisciplinar na formação e atuação profissional. Porto Alegre: Artes Médicas, 1990.

62

ÍNDICE

FOLHA DE ROSTO 2

AGRADECIMENTO 3

DEDICATÓRIA 4

RESUMO 5

METODOLOGIA 7

SUMÁRIO 9

INTRODUÇÃO 10

CAPÍTULO I - UM OLHAR CENTRADO NA EDUCAÇÃO 14

1.1 – Função mantenedora da educação 14

1.1.2 – Função socializadora da educação 14

1.1.3 – A função transformadora 15

1.2 – As políticas públicas educacionais 16

1.3 – A representação social do fracasso escolar 18

CAPÍTULO II - HIPERATIVIDADE 19

2.1 – Contribuições teóricas sobre a hiperatividade e

Transtorno de conduta 19

2.2 – Funcionamento cerebral no DDA. O que os DDAs

têm que os outros não tem ? 24

2.3 – Características e sintomas 25

2.4 – Papel e atuação da família 27

2.5 – O papel da escola 31

63

CAPÍTULO III – PSICOPEDAGOGIA 41

3.1 – Objeto de estudo 41

3.2 – A que se propõe a psicopedagogia 44

3.3 – Representação histórica da psicopedagogia no Brasil 46

3.4 – Participação e formação dos primeiros pedagogos no

Brasil 46

CAPÍTULO IV – AS CONTRIBUIÇÕES DA PSICOPEDAGOGIA NA

EDUCAÇÃO DA CRIANÇA HIPERATIVA 49

4.1 – A dificuldade da aprendizagem 49

4.2 – Delineamento do estudo de um caso clínico 51

CONCLUSÃO 58 ANEXOS 60 BIBLIOGRAFIA CONSULTADA 61 ÍNDICE 62 FOLHA DE AVALIAÇÃO 64

64

FOLHA DE AVALIAÇÃO

Nome da Instituição: UCAM – UNIVERSIDADE CANDIDO MENDES

Título da Monografia: HIPERATIVIDADE E A INTERVENÇÃO PSICOPEDAGÓGICA

NO CONTEXTO ESCOLAR

Autor: LANY INÁCIO DA SILVA

Orientador: Prof. Ms. Marco A. Larosa

Data da entrega: 03/04/2004

Avaliado por: Conceito:

Avaliado por: Conceito:

Avaliado por: Conceito:

Conceito Final: