TATIANA CAVALCANTE BOLOGNANI · 2007-12-19 · 2. BOLOGNANI, Tatiana Cavalcante Deficientes...

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CENTRO UNIVERSITÁRIO - UNIFMU CURSO DE DIREITO “DEFICIENTES FÍSICOS: PRINCIPAIS ASPECTOS JURÍDICOS E ACESSIBILIDADE AO MERCADO DE TRABALHO” TATIANA CAVALCANTE BOLOGNANI R.A:462.085-4 Turma:3109A Fone:5678-4662 E-mail: [email protected] São Paulo, SP 2006

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CENTRO UNIVERSITÁRIO - UNIFMU

CURSO DE DIREITO

“DEFICIENTES FÍSICOS: PRINCIPAIS ASPECTOS JURÍDICOS E ACESSIBILIDADE AO MERCADO DE TRABALHO”

TATIANA CAVALCANTE BOLOGNANI R.A:462.085-4 Turma:3109A

Fone:5678-4662 E-mail: [email protected]

São Paulo, SP

2006

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TATIANA CAVALCANTE BOLOGNANI

“DEFICIENTES FÍSICOS: PRINCIPAIS ASPECTOS JURÍDICOS E ACESSIBILIDADE AO MERCADO DE TRABALHO”

Monografia apresentada à disciplina de

Direitos Humanos, do Curso de Ciências

Jurídicas, sob a orientação do Profº Antonio

Rulli Junior

São Paulo, SP 2006

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BOLOGNANI, Tatiana Cavalcante Deficientes físicos: Principais aspectos jurídicos e acessibilidade ao mercado de trabalho/Tatiana Vasconcelos.São Paulo:UniFMU,2006 Introdução/1. Conceito “Pessoa Portadora de Deficiência Física”/2..Breve Histórico de qual era o tratamento aos Deficientes Físicos no decorrer da História /3.Normas Internacionais/4 Normas Nacionais/Conclusão.

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TATIANA CAVALCANTE BOLOGNANI

“DEFICIENTES FÍSICOS: PRINCIPAIS ASPECTOS JURÍDICOS E ACESSIBILIDADE AO MERCADO DE TRABALHO”

Monografia apresentada á disciplina de Direitos Humanos, do Curso de Ciências Jurídicas, da Uni FMU, sob a orientação do Profº Antonio Rulli Junior. Defendido e aprovado, em......., de...... 2006, pela Banca Examinadora constituída pelos professores:

Data da aprovação: ____/____/____ Média: _______ Banca Examinadora:

Profº Orientador

Prof. Argüidor _______________________________________________________________ Prof. Argüidor

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Dedicatória:

Dedico esse Trabalho de Conclusão de Curso a duas pessoas muito especiais em minha vida que não me deixaram esmorecer em nenhum momento , mesmo diante das maiores dificuldades que poderia encontrar ao decorrer do curso, agradeço pelas palavras de apoio, incentivo e principalmente por me ensinarem a enfrentar os desafios do dia-a dia sempre de cabeça erguida, com pessoas como os meus pais ,Sônia Regina e Eduardo, ao meu lado a vida fica mais simples e mais alegre de ser vivida.

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AGRADECIMENTOS

A conclusão de um curso de graduação é apenas

um passo no desenvolvimento pessoal e criativo.

Aumentar a nossa criatividade significa abrir novas

oportunidades o que é fundamental para enfrentar os

desafios de nosso tempo. Um tempo em que a única

constante é a "mudança".

Agradeço aos professores do curso de Direito que

foram responsáveis pela minha formação.

Aos meus familiares que sempre me apoiaram.

Ao professor e orientador Dr. Antonio Rulli Junior pela sua grande dedicação e conhecimento não só

na realização desta monografia, mas também em

projetos de pesquisa, assessoria, e pela minha

formação profissional.

Enfim, a todos que me apoiaram durante este cinco

anos de convivência.

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O que as vitórias têm de ruim é que elas não são definitivas. O que as derrotas têm de bom é que elas não são definitivas. SARAMAGO

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SUMÁRIO INTRODUÇÃO 9 1. CONCEITO "PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA FISICA” 11 2. BREVE HISTÓRICO SOBRE O TRATAMENTO DISPENSADO AOS DEFICIENTES NO DECORRER DA HISTÓRIA 13 3. NORMAS INTERNACIONAIS 18 4. NORMAS NACIONAIS 21 4.1. Direito de Acessibilidade 22 4.2. Acessibilidade ao Judiciário 24 4.3. Direito a Assistência Social 28 4.4. Direito à Educação 32 4.5. Direito à Saúde 33 4.6. Direito à isenção de alguns impostos 33 4.7. Acessibilidade ao Mercado de Trabalho 36 CONCLUSÃO 42 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS 43

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INTRODUÇÃO

A Organização das Nações Unidas calcula que a população

deficiente em países com as características sócio-econômicas do Brasil é 10% da

população global. Assim, cerca de 15 milhões de brasileiros portam algum tipo de

deficiência, mental, física ou sensorial. Nem estatísticas oficiais temos. E se

juntarmos a esse número os estudos que dizem que 12% da população vivem com

até meio salário-mínimo, teremos em torno de dois milhões de deficientes

sobrevivendo com essa renda familiar.

A Nação brasileira mantém cerca de dois milhões de brasileiros

presos em suas deficiências, sem as mínimas condições de respeito ao ser

humano. Cegos sem bengalas, amputados sem muletas, paraplégicos sem

cadeiras de rodas, surdos sem comunicação, deficientes mentais isolados, todos

vivendo no fundo do nosso quintal, no nosso quarto dos fundos, como se o mundo

já não vivesse as grandes perspectivas de integração do deficiente.

Temos um grande campo de concentração escondido na

inconsciência generalizada. É preciso denunciar que o campo existe e que só

poderemos viver uma democracia quando a guerra for vencida, quando houver em

nosso país consciência da existência de 15 milhões de brasileiros portadores de

deficiência com os mesmos direitos e deveres de todos nós.

Antes de qualquer avanço nesse campo, uma posição importante a

ser conquistada é a transformação do que hoje muitos acreditam ser um problema

menor, um problema do outro, em uma preocupação da sociedade. As minorias

estão encontrando seu espaço entre as reivindicações de cidadania e é preciso

fazer reconhecer a questão do deficiente como uma questão social. Porque ela é

mais do que um, problema de educação especial, de reabilitação física ou

profissional, de inserção no mercado de trabalho. É mais do que a atitude de

discriminação e preconceito que grande parte dos deficientes sente diariamente. A

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questão da deficiência em nosso país é uma questão de democracia e direitos, é

uma questão de cidadania, é uma questão social.

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1. CONCEITO “PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA FÍSICA”

O termo "deficiência" significa uma restrição física, mental ou

sensorial, de natureza permanente ou transitória, que limita a capacidade de

exercer uma ou mais atividades essenciais na vida diária, causada ou agravada

pelo ambiente econômico e social. O termo "discriminação contra as pessoas

portadoras de deficiência" significa toda diferenciação, exclusão ou restrição

baseada em deficiência, antecedente de deficiência, conseqüência de deficiência

anterior ou percepção de deficiência presente ou passada, que tenha o efeito ou

propósito de impedir ou anular o reconhecimento, gozo ou exercício por parte das

pessoas portadoras de deficiência de seus direitos humanos e suas liberdades

fundamentais.

Já a incapacidade, é a redução efetiva e acentuada da capacidade

de integração social, com necessidade de equipamentos, adaptações, meios ou

recursos especiais para que a pessoa portadora de deficiência possa receber ou

transmitir informações necessárias ao seu bem-estar pessoal e ao desempenho de

função ou atividade a ser exercida.1

O artigo 4º do referido decreto enumera as categorias em que se

enquadram os portadores de deficiências, quais sejam:

a- Deficiente físico: é o portador de alteração completa ou parcial de um ou

mais segmentos do corpo humano, acarretando o comprometimento da função

física;

b- Deficiente auditivo: o acometido de perda parcial ou total das

possibilidades auditivas sonoras;

1 Decreto nº. 3298 de 20 de dezembro de 1999

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c- Deficiente visual: aquele que possui diminuição da acuidade visual,

redução do campo visual ou ambas as situações;

d- Deficiente mental: aquele cujo funcionamento intelectual é

significativamente inferior à média, sendo esta manifestação presente desde antes

dos dezoito anos de idade e associada a limitações em duas ou mais áreas de

habilidades adaptativas (comunicação, cuidado pessoal, habilidades sociais,

utilização da comunidade, saúde e segurança, habilidades acadêmicas, lazer e

trabalho);

e- Deficiência múltipla: quando ocorrem associações de duas ou mais

deficiências

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2. BREVE HISTÓRICO SOBRE O TRATAMENTO DISPENSADO AOS DEFICIENTES NO DECORRER DA HISTÓRIA

Em muitos aspectos, a vida do portador de deficiência não é

diferente das demais pessoas, possui momentos de alegria e de tristezas, derrotas

e conquistas, em outras palavras, bons e maus momentos, mas se diferenciam em

uma particularidade, são vítimas constantes de preconceitos e discriminações.

Claro que isso não é um fenômeno moderno e também localizado

apenas no Brasil ou países pobres.

Têm-se notícias de que os povos antigos e mesmo os povos

indígenas tinham o costume de tirar a vida do recém nascido com alguma

deficiência física. Isso ocorria com rituais próprios, como enterro da criança viva ou

jogando-a num abismo e outras tantas formas imagináveis de se tirar vida de

alguém.

Infelizmente, os avanços científicos e sociais da humanidade

moderna ainda não foram suficientes para mudar totalmente este quadro de

preconceito.

Certamente, isso se deve a uma visão distorcida por parte de alguns.

Em seus estudos, Arion Sayão Romita2, aponta inúmeros

personagens de destaque da história que possuíam algum tipo de deficiência.

"Além desse personagem da Antigüidade, outros

célebres deficientes físicos apresentavam a

mesma característica:

2 Romita, Arion Sayão. Trabalho do Deficiente: In JTB 17-812, p. 6.

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Byron (1788-1824); poeta inglês, que era

clubfoot, isto é, portador de um pé deformado,

torto.

Toulouse-Lautrec (1864-1901), pintor francês,

sofreu duas quedas de cavalo, o que o deixou

anão e estropiado das pernas.

Milton (1608-1674), poeta e ensaísta inglês,

compôs, entre outras obras, Paradise Lost

(Paraíso Perdido, 1667) sendo deficiente visual,

totalmente cego.

Camões (1524-1580), o maior poeta lírico e épico

da língua portuguesa, perdeu o olho direito numa

batalha contra os mouros em Ceuta, em 1547.

Antonio Feliciano de Castilho (1800-1875), poeta,

prosador, ensaísta e pedagogo português,

padeceu de cegueira desde os seus seis anos."

Além desses, Arion Romita, cita outros tantos personagens

portadores de deficiência da história, entre eles, Miguel de Cervantes, Antonio

Francisco da Costa Lisboa (Aleijadinho), Beethoven etc.

Algumas pessoas, contudo, pensam que os portadores de

deficiência são pessoas infelizes, outros as consideram oprimidas, ou, ainda,

acham que são diferentes, há também aqueles que os imaginam inúteis ou

doentes. Sem falar naqueles que pensam que o portador de deficiência possui

todas essas "qualidades" simultaneamente.

Porém, nada disso é verdade.

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A pessoa portadora de deficiência é uma pessoa capaz, mas que

possui algumas limitações físicas ou mentais3.

Importante ressaltar que a problemática da deficiência acompanha

a humanidade através da sua evolução, uma vez que a circunstância de haver

uma considerável parcela de pessoas portadoras de algum tipo de deficiência

física não é uma situação recente. Pelo contrário, as inúmeras lutas, batalhas,

guerras que norteavam as relações sociais geravam um incrível número de

mutilados, deficientes e pessoas com doenças crônicas, em um tempo em que a

força física prevalecia e tinha o condão de estabelecer a condição de vencedor e

de perdedor.

Nesse contexto, a discriminação ao portador de deficiência é um

dos problemas sociais que acompanham os homens desde os primórdios da

civilização.

Na própria Bíblia, no Antigo Testamento, é possível encontrar

passagens que desprezam a figura do deficiente, o qual simbolizava impureza e

pecado. Por exemplo, no livro do Levítico que trata exclusivamente dos deveres

sacerdotais e da legislação cerimonial, Moisés proclamou aos Israelitas (Lev. 21,

21-23):

Todo o homem da estirpe do sacerdote

Arão, que tiver qualquer deformidade (corporal),

não se aproximará a oferecer hóstias ao Senhor,

nem pães ao seu Deus; comerá, todavia, dos

pães que se oferecem no santuário, contanto,

porém, que não entre do véu para dentro, nem

chegue ao altar, porque tem defeito, e não deve

contaminar o meu santuário.

3 Na realidade, o patrimônio jurídico das pessoas portadoras de deficiência se resume no cumprimento do direito à igualdade, quer apenas cuidando de resguardar a obediência à isonomia de todos diante do texto legal, evitando discriminações, quer colocando as pessoas portadoras de deficiência em situação privilegiada em relação aos demais cidadãos, benefícios perfeitamente justificado e explicado pela própria dificuldade de integração natural desse grupo de pessoas (ARAUJO, Luiz Alberto David. A proteção constitucional das pessoas portadoras de deficiência. Brasília: Coordenadoria Nacional Para Integração da Pessoa Portadora de Deficiência – CORDE, 1994, p. 81).

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De igual modo, em determinados períodos históricos, como na

Roma Antiga, comportamentos discriminatórios são visualizados, 4 na parte que

versava sobre o pátrio poder, o patriarca estava autorizado a matar os filhos

nascidos defeituosos.

Os Gregos, por sua vez, com seu profundo culto ao corpo perfeito

e seu espírito altamente competitivo, conforme Feltrin5 advogavam a tese da

"morte lenta" para os inválidos e idosos, pois entendiam que estas pessoas não

tinham mais qualquer utilidade no meio social, constituindo apenas um incômodo

aos mais jovens.

Na Idade Média, a deficiência foi associada a eventos

sobrenaturais diabólicos, circunstância que conferia conotação extremamente

negativa e humilhante aos deficientes. Conforme Alves6, os portadores de

necessidades especiais eram considerados bruxos ou hereges e,

conseqüentemente, eram mortos, ou então, eram usados como "bobos da corte".

Como também refere Feltrin7, as obras de arte desse período são elucidativas,

uma vez que espíritos reputados malignos, seres lendários e desumanos são,

invariavelmente, representados com desproporções físicas, rostos monstruosos ou

membros contorcidos.

Como se pode inferir, não são recentes as constantes violações

dos direitos humanos que os portadores de deficiência têm sido alvo, culminando

no século XX, com a 2ª Guerra Mundial, quando, conforme dados veiculados pela

revista Veja8, estima-se que mais de três milhões de deficientes físicos tenham

sido mortos de forma sistemática pelos nazistas.

Foi essa tragédia, em nível mundial, que especialmente ensejou a

realização da "Declaração Universal dos Direitos do Homem", em 1948, a fim de

ser uma carta de princípios norteadores das relações sociais, bem como do 4 Moacyr de Oliveira (apud ALVES, 1992), na Lei das XII Tábuas 5 FELTRIN, Beatriz Cecília Dias; LIZARAU, Elizabeth Pinto. Deficiência Física: desafios para o resgate da cidadania. Santa Maria: [s. ed.], 1990. 6 ALVES, Rubens Valtecides. Deficiente Físico: novas dimensões de proteção ao trabalhador. São Paulo: LTr, 1992. 7Op. Cit. 1990, p. 33 8 Revista Veja, 2005, p.134

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relacionamento entre os diversos Estados, conjugando o valor da liberdade ao

valor da igualdade. Circunstância que fomentou uma incipiente mudança de

mentalidade, observada na segunda metade do século XX e que ganha força à

medida que ocorre um maior comprometimento social, ampliando a abrangência

dos chamados “direitos humanos”.

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3. NORMAS INTERNACIONAIS

Com o fim das guerras, sempre haviam os problemas relacionados

com os cuidados que os soldados ou civis mutilados necessitavam.

No Brasil, à época da Guerra do Paraguai, fundou-se o Asilo dos

Inválidos da Pátria.

Após a Primeira e a Segunda Guerra Mundial, a Europa teve que

se adaptar e criar sistemas de cotas de reserva de mercado de trabalho para

atender os mutilados de guerra, militares ou não.

Em 1923, a OIT recomendou a aprovação de leis nacionais que

obrigassem as entidades públicas e privadas a empregar certo montante de

portadores de deficiência causada por guerra. Em 1944, na Reunião de Filadélfia,

a OIT aprovou uma recomendação, visando induzir os países membros a

empregar uma quantidade razoável de deficientes não-combatentes.

Aos 20 de dezembro de 1971, a Assembléia das Nações Unidas

proclama a declaração dos Direitos do Deficiente Mental.

A declaração dos Direitos das Pessoas Portadoras de Deficiência,

aprovada pela ONU em 9 de dezembro de 1975, garantiu aos portadores de

deficiência os direitos inerentes à dignidade humana (art. 3º), bem como previu de

que as necessidades especiais seriam consideradas no planejamento econômico e

social (art. 8º).

O ano de 1981 foi proclamado pelas Nações Unidas como

Internacional Year of Disabled Persons (ano internacional das pessoas

deficientes).

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Em 1982, a ONU aprovou o Programa de Ação Mundial para as

Pessoas Deficientes9, a qual tinha como postulado básico, a igualdade de

oportunidades, garantindo a todos o acesso ao sistema geral da sociedade - meio

físico e cultural, a habitação, o transporte, os serviços sociais e de saúde, as

oportunidades de educação e de trabalho, a vida cultural e social, inclusive as

instalações esportivas e de lazer (art. 12).

A Assembléia Geral das Nações Unidas, pela Resolução 37/52,

proclamou a United Nations Decade of Disabled Persons, compreendendo os anos

de 1983 a 1992.

A American with Desabilities Act (Lei dos Deficientes nos Estados

Unidos da América) foi aprovada em 1990 e entrou em vigor em 1992. Enquanto

na Inglaterra, a Lei que trata do tema é de 1995.

A Convenção da OIT n. 159 (1983), referendada pelo Brasil

(decreto n. 129/91), versa sobre a reabilitação e emprego da pessoa portadora de

deficiência.

O Dia do Deficiente (3 de dezembro) só foi instituído pela

Organização das Nações Unidas – ONU em 14 de outubro de 1992.

A Declaração de Salamanca, Espanha, destaca a preocupação

com a educação especial para pessoas portadoras de deficiência (10 de junho de

1994).

Como bem coloca o Prof. José Pastore10:

"Esses instrumentos basearam-se no princípio

segundo o qual os portadores de deficiência são

membros da sociedade e têm o direito de

permanecer nas comunidades e ali receber os

serviços de educação, saúde e emprego como os

demais habitantes."

9 Resolução 37/52, 3.12.82 10 Pastore, José. op. cit., p. 36

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Com a modificação do Tratado de Amsterdã em 1997, esse

passou a servir como recomendação para os países da União Européia, como

instrumento de anti-discriminação e obrigação de facilitar a inserção, permanência

e progresso dos portadores de deficiência no mercado de trabalho.

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4. NORMAS NACIONAIS

Na Constituição brasileira e na legislação existente, a pessoa

portadora de deficiência tem proteção especial. No que tange as garantias

constitucionais, o Brasil possui um sistema legal de proteção bem encadeado.

Um dos objetivos fundamentais da República Federativa é

construir uma sociedade livre, justa e solidária (art. 3º, I, CF), bem como promover

o bem-estar de todos, sem preconceitos de origem, raça, sexo, cor, idade e

quaisquer outras formas de discriminação (art. 3º, IV).

O artigo 7º, XXXI, proíbe qualquer tipo de discriminação no tocante

aos salários e critérios de admissão do trabalhador portador de deficiência.

A Constituição atribui à União, Estados, Municípios e Distrito

Federal a responsabilidade de cuidar da saúde e da assistência pública, da

proteção e garantia das pessoas portadoras de deficiência (art. 23, II).

No que diz respeito à legislação infraconstitucional, a seguir estão

elencadas as leis e decretos que tangem a questão da acessibilidade do deficiente

físico.

- Lei nº. 7.853, de 24 de outubro de 1989, na qual se ressalta os artigos

2°, parágrafo único, inciso V, "a", 3°, 7° e 8°, incisos V e VI, os quais dispõem

sobre a adoção e execução de normas que garantam a funcionalidade das

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edificações e vias públicas, bem como permitam o acesso dos deficientes físicos a

edifícios, a logradouros e aos meios de transporte. Ainda, refere expressamente a

aplicação subsidiária da Lei n° 7.347/85 (Lei da Ação Civil Pública). Por fim, define

como crime punível, com reclusão de um a quatro anos, deixar de cumprir a

execução de ordem judicial expedida na ação civil aludida na Lei em comento.

- Decreto nº. 3.298, de 20 de dezembro de 1999 – Regulamenta a Lei

supra referida. Em síntese, prevê, pormenorizadamente, a questão da

acessibilidade da pessoa portadora de deficiência física ou com mobilidade

reduzida, em lugares públicos ou privada, quando destinados ao uso coletivo.

Também, dispõem sobre terminologias, requisitos mínimos de acessibilidade

exigíveis, aplicação das normas da Associação Brasileira de Normas Técnicas –

ABNT -, entre outras providências previstas no Capítulo IX, artigos 50 a 54.

- Lei nº. 10.098, de 19 de dezembro de 2000 – Promove, especificamente,

a acessibilidade dos deficientes físicos, mediante a supressão de barreiras e de

obstáculos nas vias e espaços públicos, no mobiliário urbano, na construção e

reforma de edifícios e nos meios de transporte e de comunicação. Atinge o âmago

da temática proposta no trabalho, devendo ser observada na íntegra.

4.1. Direito de Acessibilidade

A acessibilidade é a possibilidade e a condição de alcance para

utilização, com segurança e autonomia, dos espaços, mobiliários e equipamentos

urbanos, das edificações, dos transportes e dos sistemas e meios de

comunicação, por pessoa portadora de deficiência ou com mobilidade reduzida.

Hoje o moderno conceito de acessibilidade envolve o ambiente

físico, como as edificações e os transportes e também o acesso aos meios de

comunicação (rádio, televisão ,etc.).

A Constituição Federal de 1988, no seu artigo 227, parágrafo 2º,

estabelece que a lei disponha sobre normas de construção de logradouros e dos

edifícios de uso público e da fabricação de veículos de transporte coletivo, a fim de

garantir o acesso adequado às pessoas portadoras de deficiência.

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A Lei N.º.853/89 juntamente com o Decreto Federal n.º 3.289 de

20 de dezembro de 1999 que a regulamentou. Já a estadual, está na Constituição

Estadual de 1989, art. 224, parágrafo 1º, e também a própria Lei Estadual n.º

11.666 de 9 de dezembro de 1994, que estabelece normas para acesso das

pessoas portadoras de deficiência aos edifícios de uso público.

* A Lei nº. 10.048, de 8/11/2000 , dá prioridade de atendimento às pessoas

portadoras de deficiência.

* A Lei nº. 10.098, de 19-12-2000, estabelece normas gerais e critérios básicos

para promoção de acessibilidade das pessoas portadoras de deficiência ou com

mobilidade reduzida, entre outras providências. Trata-se de regulamento

específico, no âmbito federal, sobre o assunto.

O que muitas vezes dificulta o exercício do seu direito é que ou a

lei não existe ou não foi ainda regulamentada, tornando-se dificultada sua

implementação. Mas, o cidadão deve procurar o Promotor de Justiça de sua

cidade ou um advogado e denunciar a falta de acessibilidade.

Caso o portador de deficiência seja comprovadamente carente,

ele tem direito ao passe livre no sistema de transporte coletivo interestadual, nos

termos da Lei Federal n.º 8.899 de 29 de junho de 1994. Ele deve dirigir-se à

rodoviária para conseguir o passe, mas, havendo qualquer tipo de dificuldade no

exercício do seu direito, deve procurar o Ministério Público Federal.

Apesar da Lei Estadual n.º 10.419, de 17 de janeiro de 1991

garantir esse direito, o Tribunal de Justiça do Estado de Minas Gerais, em decisão

de março/2000, entendeu que as pessoas portadoras de deficiência têm direito a

gratuidade do transporte somente na área urbana, negando tal direito no âmbito

intermunicipal.

Segundo o art. 3º, inciso IX, da Lei Estadual n.º 11.666/94, é

assegurado nos edifícios de uso público, como auditórios, anfiteatros e salas de

reunião e espetáculos, o direito a local para cadeira de rodas, e, quando for o

caso, a equipamentos de tradução simultânea, para não haver prejuízo da

visibilidade e locomoção. (Minas Gerais).

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Segundo art. 2º da Lei Estadual n.º 11.048 de 18 de janeiro de

1993 serão reservados preferencialmente às pessoas portadoras de deficiência

física permanente 10% (dez por cento) das unidades habitacionais, construídas

pelos programas de construção de habitações populares financiados pelo Poder

Público. (Minas Gerais).

4.2. Acessibilidade ao Judiciário

São inúmeras as leis que buscam regulamentar os direitos da

pessoa portadora de deficiência. Tais leis não se apresentam como um todo

harmonioso, dificultando a sua aplicação, uma vez que regulamentam a matéria

leis esparsas, na esfera federal, estadual e municipal, além de decretos

regulamentares, portarias e resoluções específicas para cada tipo de deficiência.

O certo é que, dentro deste complexo de proteção legal, merece

análise o contido nas Constituições, bem como nas leis nº 7.853 de 24 de outubro

de 1989, Decreto n.º 3.298 de 20 de dezembro de 1999 e a Lei n.º 10.098 de 19

de dezembro de 2000, que de forma mais efetiva tratam dos direitos dos

portadores de deficiência e sua inclusão.

A sociedade como um todo e, antes disso, as próprias pessoas em

situação especial, iniciam um processo de conscientização da necessidade da

proteção e do respeito aos direitos coletivos e difusos, num movimento chamado

por Séguin11:

"... microdesvitimização, privilegiando a análise

de situações específicas e individualizadas de

vitimização, adotando comportamentos de ações

afirmativas em prol das minorias e dos grupos

vulneráveis".

Essa consciência crítica é muito importante, uma vez que através

de uma observação rápida e superficial da infra-estrutura das cidades brasileiras,

em especial, do Estado do Rio Grande do Sul, percebe-se que as conquistas

legais não têm refletido na real situação urbana. O Poder Público não tem se

11 SÉGUIN, Elida. Minorias e grupos vulneráveis: uma abordagem jurídica. Rio de Janeiro: Forense, 2002.p.25

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mostrado solícito à efetivação de políticas públicas consistentes, de modo a

atender as necessidades das pessoas portadoras de deficiência física.

Nesse sentido, não se pode obstar o exercício da cidadania de

uma parcela considerável da população, bem como relativizar sua dignidade e

independência, por tempo indefinido, até que a Administração, considerada em

suas três esferas, se organize e desenvolva mecanismos que proporcionem o

efetivo cumprimento das leis vigentes.

Por isso que se propõe a utilização da via judicial para compelir o

Poder Executivo a implementar as medidas necessárias, a fim de conferir agilidade

à prestação estatal, e mais que isso, iniciar o processo de modernização e

democratização das vias públicas e locais de acesso ao público, minimizando a

dicotomia verificada entre a teoria e a realidade urbana de nosso país.

Bobbio12 (1992, p. 67) já asseverava que:

“Num discurso geral sobre os direitos do homem,

deve-se ter a preocupação inicial de manter a

distinção entre teoria e prática, ou melhor, deve-

se ter em mente, antes de mais nada, que teoria

e prática percorrem duas estradas diversas e a

velocidades muito desiguais. Quero dizer que,

nestes últimos anos falou-se e continua a se falar

de direitos do homem, entre eruditos, filósofos,

juristas, sociólogos e políticos, muito mais do que

se conseguiu fazer até agora pra que eles sejam

reconhecidos e protegidos efetivamente, ou seja,

para transformar aspirações (nobres, mas

vagas), exigências (justas, mas débeis), em

direitos propriamente ditos (isto é, no sentido e

que os juristas falam de "direito").

A Lei n.º 7.853 de 24 de outubro de 1989, estabeleceu o apoio à

pessoa portadora de deficiência, sua integração social, a tutela jurisdicional de

12 BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Traduzido por Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 1992.p.67

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interesses coletivos e difusos dessas pessoas, disciplinou a atuação do Ministério

Público e definiu crimes. Objetivou esta lei, assegurar as pessoas portadoras de

deficiência o pleno exercício de seus direitos básicos, principalmente no que diz

respeito à saúde, educação, ao trabalho, lazer, à previdência social, ao amparo à

infância e maternidade.

A partir desta Lei, foi atribuída, de forma específica ao Ministério

Público à defesa dos interesses das pessoas portadoras de deficiência, com a

possibilidade de se ingressar com ação civil pública e instaurar inquérito civil.

Também foram especificados os crimes quanto ao preconceito em relação ao

portador de deficiência e reestruturado a Coordenadoria Nacional para a Pessoa

Portadora de Deficiência - CORDE.

Da mesma forma que o portador de deficiência foi ignorado na

nossa legislação constitucional, que somente veio a contemplá-lo com a emenda

n.º 01 à Constituição de 1967, também verificou-se tal situação junto ao Ministério

Público, até certo ponto justificável, em razão de sua vocação penal. No entanto, a

partir do momento em que o Ministério Público foi ganhando novas atribuições,

principalmente na área dos direitos difusos e coletivos, surgiu a preocupação com

a pessoa portadora de deficiência, mesmo diante da ausência de mecanismo legal

de proteção.

No artigo intitulado “O Deficiente e o Ministério Público”, o

eminente doutrinador Hugo Nigro Mazzilli13, no início de 1988, já defendia a

atuação do Promotor de Justiça nesta área, como decorrência do princípio da

igualdade, tendo como fundamento legal para a intervenção o disposto no artigo

82, III do Código de Processo Civil, que tratava do “zelo de um interesse público

evidenciado pela qualidade de uma das partes”, bem como a criação de uma

Coordenadoria, nos moldes das existentes na época para o consumidor, meio

ambiente, acidentes do trabalho.

Esclarece o citado autor:

13 Revista Justitia:Ministério Público, Janeiro/Março de 1988,vol.141-p.55/68

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“No campo interventivo, assim, é perfeitamente

compatível que o Ministério Público, ampliando

seu campo de atuação dentro do próprio

ordenamento jurídico ainda em vigor, possa

encaminhar-se para a atuação protetiva das

pessoas que ostentem qualquer forma de grave

deficiência, seja intelectual, motora, sensorial,

funcional, orgânica, de personalidade, social ou

meramente decorrente de fatores outros, como a

idade avançada. A tanto o legitima o artigo 82,

inciso III do CPC.

No campo da propositura da ação civil pública,

além das já tradicionais iniciativas nessa área,

como ocorre na interdição e noutras medidas de

proteção a incapazes, a recente Lei n.º 7347 de

24 de julho de 1985 conferiu ao Ministério

Público legitimidade para propor ação civil

pública na defesa de alguns interesses difusos.

Ora, dentro da interpretação mais larga que

temos preconizado, é desejável que o conceito

de consumidor seja visto de forma abrangente,

para alcançar hipóteses como a de iniciativa de

ações visando à defesa dos direitos dos

deficientes físicos na aplicação de leis como as

que dispõem sobre lugares especiais em ônibus,

aquisição de veículos adaptados, acesso ao

ensino, etc.”.

Assim sendo, a partir da Emenda Constitucional n° 45/2004 a

competência para o processo e julgamento das causas relativas a direitos

humanos é da Justiça Federal, a qual está prevista no art. 109, inciso V-A,

observado o disposto no parágrafo 5° do mesmo artigo.

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Frisamos ainda, que as questões suscitadas constituem uma

incipiente tentativa de colocar em prática um verdadeiro Estado Democrático de

Direito, com ampla participação social, no qual a "democracia" se destaque como a

realização de valores para a otimização da convivência humana.

4.3. Direito à Assistência Social

A seguridade social é um conjunto de ações estatais que

compreende a proteção dos direitos relativos à saúde, previdência e assistência

social (art. 194 da Carta Constitucional). Funda-se no princípio da solidariedade,

pelos quais aqueles indivíduos detentores de maiores riquezas devem auxiliar os

menos abastados. Essa a premissa mestra que deve guiar qualquer iniciativa no

sentido de organizar políticas no campo da seguridade social.

Com relação aos Portadores de Deficiência Física, alguns aspectos

chamam a atenção e diferenciam o tratamento da questão:

1) o direito à habilitação e reabilitação profissional;

2) o direito à renda mensal vitalícia.

3) o enfoque diferenciado da tutela previdenciária,

O artigo 203 da Constituição Federal trouxe duas importantes

novidades a respeito da questão. Nos incisos IV e V ficou estabelecido que:

"Art. 203. A assistência social será prestada a quem dela necessitar,

independentemente da contribuição à seguridade social, e tem por objetivos:

I a III - (omissis)

IV - a habilitação e reabilitação das pessoas portadoras de deficiência e a

promoção de sua integração à vida comunitária;

V - a garantia de um salário mínimo de benefício mensal à pessoa portadora de

deficiência e ao idoso que comprovem não possuir meios de prover à própria

manutenção ou de tê-la provida por sua família, conforme dispuser a lei.”

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Quanto à habilitação e reabilitação das Pessoas Portadoras de

Deficiência e a promoção de sua integração à vida comunitária, houve importante

progresso, tendo em vista que, anteriormente, apenas os segurados da

previdência - ou seja, aqueles que contribuíam para o sistema - possuíam tal

direito. Com a nova ordem constitucional, o direito se estendeu a toda e qualquer

Pessoa Portadora de Deficiência, como um direito de natureza assistencial e não

mais exclusivamente previdenciária.

A Lei n. 8.742, de 07.12.93 Lei Orgânica da Assistência Social -

(LOAS), silenciou a respeito do tema, no que podemos concluir pela aplicação, à

matéria, das disposições análogas contidas na lei de benefícios da previdência

social, que traz os seguintes preceitos:

“ Art. 89. A habilitação e a reabilitação profissional e social deverão

proporcionar ao beneficiário incapacitado parcial ou totalmente para o trabalho, e

às pessoas portadoras de deficiência, os meios para a (re)educação e de

(re)adaptação profissional e social indicados para participar do mercado de

trabalho e do contexto em que vive.

Parágrafo único. A reabilitação profissional compreende:

a) o fornecimento de aparelho de prótese, órtese e instrumentos de auxílio

para locomoção quando a perda ou redução da capacidade funcional puder ser

atenuada por seu uso e dos equipamentos necessários à habilitação e reabilitação

social e profissional;

b) a reparação ou a substituição dos aparelhos mencionados no inciso

anterior, desgastados pelo uso normal ou por ocorrência estranha à vontade do

beneficiário;

c) o transporte do acidentado do trabalho, quando necessário.

Art. 90. A prestação de que trata o artigo anterior é devida em caráter

obrigatório aos segurados, inclusive aposentados e, na medida das possibilidades

do órgão da Previdência Social, aos seus dependentes.

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Art. 91. Será concedido, no caso de habilitação e reabilitação profissional,

auxílio para tratamento ou exame fora do domicílio do beneficiário, conforme

dispuser o Regulamento.

Art. 92. Concluído o processo de habilitação ou reabilitação social e

profissional, a Previdência Social emitirá certificado individual, indicando as

atividades que poderão ser exercidas pelo beneficiário, nada impedindo que este

exerça outra atividade para a qual se capacitar.”

Assim, considerando o disposto no artigo 89, em seu parágrafo

único, que define o que compreende o benefício de reabilitação profissional,

parece-nos que o benefício tenha um alcance muito mais amplo. A reabilitação,

não se resume à concessão de aparelhos e transporte para a PPD; além disso, ela

deve englobar um conjunto de providências aptas à re-introdução da pessoa no

mercado de trabalho e do contexto em que vive. E isso passa, sem dúvida, por um

programa de educação, conscientização e preparação da PPD quanto à nova

realidade a ser enfrentada.

Ressalte-se que a restrição contida no artigo 90 supra transcrito,

que prevê como beneficiários apenas os segurados e dependentes, não se aplica

ao caso, tendo em vista a norma constitucional é clara ao ditar que "a assistência

social será prestada a quem dela necessitar, independentemente de contribuição".

Então, o benefício de habilitação e reabilitação de PPD, arrolado entre o conjunto

de ações assistenciais, é obrigatório para com todos que dele necessitarem,

independente da qualidade de segurado ou não da previdência.

No tocante à renda mensal vitalícia, tornou-se ela um direito de

toda "pessoa portadora de deficiência e ao idoso com 70 anos ou mais, desde que

comprovem não possuir meios de prover a própria manutenção e nem de tê-la

provida por sua família". Representou, também, um importante avanço de nossa

nova ordem constitucional. Porém, um tímido avanço, devido aos exagerados

requisitos e à parca renda concedida.

Posicionamento da Jurisprudência:

“Portador de Deficiência. Benefício

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Previdenciário. Direito Assegurado pela Constituição Federal

Não seria razoável que o autor, portador de

deficiência mental e despossuído de meios para

viver, esperasse sete anos para receber um

direito previsto constitucionalmente.

A "omissão" do Estado-legislador não pode trazer

tamanho prejuízo aos cidadãos, eis que a

Constituição Federal já lhes garantiu o direito de

percepção, preenchidos os requisitos básicos

que a própria Carta elencou, do benefício

mensal.

Ademais, o Estado Moderno, politicamente

organizado, encontra seu fundamento de

existência e de validade no direito que a ele foi

concedido, em detrimento de parte dos direitos

individuais, de poder sobrepor-se a estes com o

escopo de amenizar as diferenças naturais

existentes entre os homens, a fim de que direitos

básicos como a vida e a liberdade ficassem

resguardados de possíveis afrontas decorrentes

destas condições, inerente ao homem, de

diferenças naturais . ” 14

Todavia, o INSS vem respondendo em demandas aforadas por

PPD, sendo, inclusive, responsabilizado pelo pagamento das despesas relativas

aos benefícios. Quanto ao benefício de renda mensal vitalícia, a questão já foi por

demais discutida em nossos pretórios, tendo o Superior Tribunal de Justiça

uniformizado o entendimento a respeito da matéria, no sentido de que o INSS é

parte legítima para figurar no pólo passivo das referidas demandas junto com a

14 17ª Vara Federal de São Paulo – Ação Ordinária – Processo n. 93.0022137-0 – Juíza Federal Renata Andrade Lotufo Cerqueira).

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União Federal. No mesmo sentido se posicionou o TRF da 4ª Região, através da

edição da Súmula de nº. 6115

4.4. Direito a Educação

O Estado tem o dever de garantir o atendimento educacional

especializado aos portadores de deficiência (art. 208 da C.F.) e criar programas de

prevenção e atendimento especializado para os portadores de deficiência física,

sensorial ou mental, bem como a integração social do adolescente portador de

deficiência, mediante o treinamento para o trabalho e a convivência, e a facilitação

do acesso aos bens e serviços coletivos, com a eliminação de preconceitos e

obstáculos arquitetônicos (art. 227 da C.F.).

Muitas Constituições Estaduais e Leis Orgânicas dos Municípios

também trazem em seu bojo questões relacionadas aos portadores de deficiência.

A Lei ordinária n. 7.853/89 criou a Coordenadoria Nacional para

Integração das Pessoas Portadoras de Deficiência (CORDE) e assegurou às

pessoas portadoras de deficiência o pleno exercício de seus direitos básicos,

inclusive dos direitos à educação, à saúde, ao trabalho, ao lazer, à previdência

social, ao amparo à infância e à maternidade, e de outros que, decorrentes da

Constituição e das leis, propiciem seu bem-estar pessoal, social e econômico (art.

2º).

Como qualquer cidadão, a pessoa com deficiência tem direito à

educação pública e gratuita assegurada por lei, preferencialmente na rede regular

de ensino e, se for o caso, a educação adaptada às suas necessidades em

escolas especiais, conforme estabelecido nos artigos 58 e seguintes da Lei

Federal n.º 9.394, de 20 de dezembro de 1996, art. 24 do Decreto n.º 3.289/99 e

art. 2º da Lei nº 7.853/89.

15 A União e o INSS são litisconsortes passivos necessários nas ações em que seja postulado o benefício assistencial previsto no art. 20 da Lei 8.742/93, não sendo caso de delegação de jurisdição federal. DJ (Seção 2) de 27-05-99, p. 290

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O art. 59, inciso IV, da Lei Federal n.º 9.394/96, e o art.28, do

Decreto n.º 3.298/99, asseguram o seu acesso à educação especial para o

trabalho, tanto em instituição pública quanto privada, que lhe proporcione efetiva

integração na vida em sociedade. Nesse caso, as instituições são obrigadas a

oferecer cursos de formação profissional de nível básico, condicionando a

matrícula do portador de deficiência à sua capacidade de aproveitamento e não ao

seu nível de escolaridade. Ainda deverão oferecer serviços de apoio

especializados para atender às peculiaridades da pessoa portadora, como

adaptação de material pedagógico, equipamento e currículo; capacitação de

professores, instrutores e profissionais especializados; adequação dos recursos

físicos, como eliminação de barreiras ambientais.

4.5. Direito a Saúde

A leitura do art. 198 da Constituição Federal deve sempre ser feita

em consonância com a segunda parte do art. 196 e com o art. 200. O art. 198

estatui que todas as ações e serviços públicos de saúde constituem um único

sistema. Aqui temos o SUS. E esse sistema tem como atribuição garantir ao

cidadão o acesso às ações e serviços públicos de saúde (segunda parte do art.

196), conforme campo demarcado pelo art. 200 e leis específicas.

O art. 200 define em que campo deve o SUS atuar. As atribuições

ali relacionadas não são taxativas ou exaustivas. Outras poderão existir, na forma da lei. E as atribuições ali elencadas dependem, também, de lei para a sua

exeqüibilidade.

4.6. Direito a Isenção de alguns Impostos IPI

• Instrução Normativa 375/2003 - Disciplina a aquisição de automóveis com

isenção do Imposto sobre Produtos Industrializados (IPI), por pessoas

portadoras de deficiência física, visual, mental severa ou profunda, ou

autistas.

• Lei 10.754/2003 - Altera a Lei nº 8.989, de 24 de fevereiro de 1995 que

"dispõe sobre a isenção do Imposto Sobre Produtos Industrializados - IPI,

na aquisição de automóveis para utilização no transporte autônomo de

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passageiros, bem como por pessoas portadoras de deficiência física e aos

destinados ao transporte escolar, e dá outras providências" e dá outras

providências.

O benefício poderá ser utilizado uma vez a cada 03 (três) anos,

sem limites do número de aquisições.

IOF

São isentas do IOF as operações financeiras para aquisição de

automóveis de passageiros de fabricação nacional de até 127 HP de potência

bruta para deficientes físicos. Atestadas pelo Departamento de Trânsito onde

residirem em caráter permanente, cujo laudo de perícia médica especifique o tipo

defeito físico e a total incapacidade para o requerente dirigir veículos

convencionais.

A Isenção do IOF poderá ser utilizada uma única vez.

ICMS

• DECRETO Nº 45.583, DE 27 DE DEZEMBRO 2.000

Artigo 10 - Ficam ratificados os Convênios ICMS-77/00, 78/00, 84/00, 85/00, 86/00,

89/00, 95/00 e 101/00, celebrados em Teresina, PI, no dia 15 de dezembro de

2000, publicados na Seção 1, páginas 5 a 9 e 11 do Diário Oficial da União de 21

de dezembro de 2000.

O Convênio ICMS-84/0O dá nova redação à cláusula sexta do Convênio

ICMS-35/99, que isenta as saídas de veículos destinados a pessoas portadoras de

deficiência física impossibilitadas de dirigirem veículo comum, para estender o

benefício aos pedidos protocolados até 31 de maio de 2002 e desde que a saída

do veículo ocorra até 31 de julho de 2002.

• DECRETO 45.644 DE 26 DE JANEIRO DE 2.001

"Caput" do artigo 19 do Anexo I:

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"Artigo 19 - (DEFICIENTE FÍSICO - VEÍCULO AUTOMOTOR) - Saída interna ou

interestadual de veículo automotor novo, com até 127 HP de potência bruta (SAE),

que se destinar o uso exclusivo do adquirente paraplégico ou portador de

deficiência física impossibilitado de utilizar modelos comuns, excluído o acessório

opcional que não seja equipamento original do veículo (Convênio ICMS-35/99,

com alteração dos Convênios ICMS-71/99, cláusula segunda, ICMS-29/00 e ICMS-

85/00)”.

IPVA

• IMPOSTO SOBRE PROPRIEDADE DE VEÍCULOS AUTOMOTORES-IPVA

LEI 12.513 DE 29/12/2003.

VII – veículo de fabricação nacional ou nacionalizada, de propriedade de pessoas

com deficiências físicas ou, a partir de 01 de janeiro de 2004, visual, mental severa

ou profunda, ou autista, ou cuja posse a mencionada pessoa detenha em

decorrência de contrato de arrendamento mercantil – “leasing”, observando-se,

quando ao mencionado benefício:(NR)

a) estende-se a veículo cuja propriedade ou posse, nos termos definidos neste

inciso, seja de entidade que tenha como objetivo principal o trabalho com pessoas

com deficiências físicas ou, a partir de 01 de janeiro de 2004, visual, mental severa

ou profunda, ou autista.

IR

• Lei nº 7.713, 22/12/1988 – Isenção de Imposto de Renda

A Lei 7713/98 estabelece isenções sobre os proventos de

aposentadoria, pensão ou reforma, desde que motivadas por acidente em serviço,

e os recebidos pelos portadores de moléstia profissional, tuberculose ativa,

alienação mental, esclerose múltipla, neoplasia maligna, cegueira, hanseníase,

paralisia irreversível e incapacitante, cardiopatia grave, doença de Parkinson,

espondiloartrose anquilosante, nefropatia grave, estados avançados da doença de

Paget (osteíte deformante), contaminação por radiação, síndrome da

imunodeficiência adquirida (Aids), mesmo que a doença tenha sido contraída

depois da aposentadoria ou da reforma.

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Os pagamentos relativos à instrução do deficiente físico ou mental,

como cursos e escolas especiais, não se enquadram como despesas com

educação e sim como instrução médica. Desta forma, como não existe limite de

dedução para despesas médicas, as despesas com o dependente deficiente físico

ou mental poderão ser declaradas integralmente da base de cálculo do seu

imposto, aumentando assim suas chances de restituição.

4.7. Acessibilidade ao Mercado de Trabalho

A Lei n. 7.853/89 também prevê a adoção de legislação específica

que discipline reserva de mercado de trabalho aos portadores de deficiência física

(art. 2º, III, d) e a proteção dos seus interesses coletivos ou difusos por ações civis

públicas que poderão ser propostas pelo Ministério Público, União, Estados,

Municípios e Distrito Federal, por associações constituídas há mais de um ano, por

autarquia, empresa pública, fundação ou sociedade de economia mista que inclua,

entre suas finalidades institucionais, a proteção de pessoa portadora de deficiência

(art. 3º).

Negar a alguém emprego ou trabalho, sem justa causa e por

motivo derivado de sua deficiência, constitui crime, punível com reclusão de um a

quatro anos e multa (art. 8º, II).

O Decreto n. 914/93, o qual instituiu a Política Nacional para a

Integração da Pessoa portadora de Deficiência, tem como uma de suas diretrizes

(art. 5º),

"Promover medidas que visem a criação de

empregos que privilegiem atividades econômicas

de absorção de mão-de-obra de pessoas

portadoras de deficiência, assim como

proporcionar ao portador de deficiência

qualificação e incorporação no mercado de

trabalho".

No que se refere às relações de trabalho, a Portaria n. 772, de

26.8.99, do Ministério do Trabalho, permite a contratação de pessoa deficiente,

sem a caracterização de emprego com o tomador de serviços, quando:

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a) realizada com a intermediação de entidade sem fins lucrativos, de natureza

filantrópica e de comprovada idoneidade, que tenha por objeto assistir o portador

de deficiência;

b) a entidade assistencial intermediadora comprove a regular contratação de

portadores de deficiência nos moldes da Consolidação das Leis Trabalhistas;

c) o trabalho destinar-se a fins terapêuticos, desenvolvimento da capacidade

laborativa reduzida devido a deficiência, ou inserção da pessoa portadora de

deficiência no mercado de trabalho e d) igualdade de condições com os demais

trabalhadores, quando os portadores de deficiência estiverem inseridos no

processo produtivo da empresa (art. 1º).

O trabalho prestado pela pessoa portadora de deficiência física

poderá ocorrer no âmbito da entidade que prestar assistência ou da empresa que

para o mesmo fim celebrar convênio ou contrato com a entidade assistencial (art.

1º, §1º).

Na prática a questão não é tão simples, pois em alguns casos

essa forma de contratação poderá ensejar fraude a direitos trabalhistas, como

ocorre com outros tipos de empregados. Nesses casos, a solução passa pela

aplicação do Enunciado n. 331,16 do Tribunal Superior do Trabalho.

No âmbito da União, é assegurado o direito da pessoa portadora

de deficiência se inscrever em concurso público para provimento de cargos cujas

atribuições lhe sejam compatíveis e reservados até 20% das vagas oferecidas no

concurso (art. 5º, § 2º, Lei n. 8.112/90).

Para uma melhor ilustração:

16 I - A contratação de trabalhadores por empresa interposta é ilegal, formando-se o vínculo diretamente com o tomador dos serviços, salvo no caso de trabalho temporário (Lei nº 6.019, de 03-01-74). II - A contratação irregular de trabalhador, através de empresa interposta, não gera vínculo de emprego com os órgãos da Administração Pública Direta, Indireta ou Fundacional (Art. 37, II, da Constituição da República). III - Não forma vínculo de emprego com o tomador a contratação de serviços de vigilância (Lei nº 7.102, de 20-06-1983), de conservação e limpeza, bem como a de serviços especializados ligados à atividade-meio do tomador, desde que inexistente a pessoalidade e a subordinação direta. IV - O inadimplemento das obrigações trabalhistas, por parte do empregador, implica a responsabilidade subsidiária do tomador dos serviços, quanto àquelas obrigações, inclusive quanto aos órgãos da administração direta, das autarquias, das fundações públicas, das empresas públicas e das sociedades de economia mista, desde que hajam participado da relação processual e constem também do título executivo judicial (art. 71 da Lei nº 8.666, de 21.06.1993). (Alterado pela Res. 96/2000, DJ 18.09.2000

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“ MANDADO DE SEGURANÇA MSG307392 DF17 ADMINISTRATIVO. CONCURSO PÚBLICO. EXAME PSICOTÉCNICO. CARREIRA POLICIAL CIVIL DO DISTRITO FEDERAL. CANDIDATO APROVADO. RESULTADO HOMOLOGADO. OBEDIÊNCIA À ORDEM DE CLASSIFICAÇÃO. SÚMULA NÚMERO 15, DO EXCELSO SUPREMO TRIBUNAL FEDERAL. Segurança concedida. O

pretenso insuperável obstáculo do exame

psicotécnico de resultado irrecorrível afronta o

princípio da impessoalidade garantido pela

constituição. Somente a doença mental capaz de

retirar da pessoa a capacidade de entendimento e

autodeterminação, pode torná-la inabilitada para o

exercício de cargo público, porque mesmo o

portador de deficiência física pode ser admitido no

serviço público e adaptado para o exercício de

certas funções. preterindo o impetrante com a

escusa de reserva de vaga no ato de nomeação,

descumpriu a autoridade o enunciado da súmula

número 15, do excelso Supremo Tribunal Federal.”

Além disso, o Poder Executivo Federal estabelecerá, na forma da

lei e ouvido o Conselho Nacional de Seguridade Social, mecanismos de estímulo

às empresas que utilizem empregados de deficiência física, sensorial ou mental,

com desvio do padrão médio (art. 22, § 4º, Lei n. 8.212/91).

A Lei n. 8.213/91, em seu artigo 93, estabeleceu cotas

compulsórias de vagas a serem respeitadas pelas empresas do setor privado com

mais de cem empregados, observando proporção:

I – de 100 a 200 empregados, 2%;

II – de 201 a 500, 3%;

17 Acórdão nº 63818. 23/03/1993-Orgão Julgador:Conselho Especial.Relator:Lécio Resende, Publicação DJU:26/05/1993.p.20017

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III – de 501 a 1000, 4%;

IV – 1001 ou mais, 5%.

Acrescente-se que a dispensa do empregado deficiente18 ou

reabilitado19 somente pode ocorrer após a contratação de substituto de condição

semelhante. Trata-se de uma garantia no emprego e não uma forma de

estabilidade.

A Jurisprudência tem-se manifestado a respeito:

“AGRAVO DE INSTRUMENTO. RECURSO DE REVISTA. DEFICIENTE FÍSICO. FALTA DE PROVA DE QUE SUA ADMISSÃO SE DESTINAVA A PREENCHER QUOTA DA EMPRESA. DEMISSÃO VIABILIDADE. A ratio

legis do § 1º do art. 93 da Lei nº 8.213/91 é de

que a demissão do funcionário que ocupava vaga

compreendida na quota destinada a empregado

deficiente, só será legítima se comprovado que a

empresa admitiu outra pessoa portadora de

deficiência, para ocupar mesma a vaga. O que a

lei preconiza é que o empregador mantenha

preenchidas as vagas destinadas aos deficientes,

sem garantir estabilidade pessoal a este ou

18 Consideram-se pessoas portadoras de deficiência, habilitadas, aquelas que não vinculadas ao RGPS que tenham se submetido ao processo de habilitação profissional desenvolvido pelo INSS ou por entidades reconhecidas legalmente para este fim (art. 1º, § 2º, Portaria n. 4.677/98, do Ministério da Previdência e Assistência Social).Considera-se pessoa portadora de deficiência habilitada aquela que conclui curso de educação profissional de nível básico, técnico ou tecnológico, ou curso superior, com certificado ou diplomação expedida por instituição pública ou privada, legalmente credenciada pelo Ministério da Educação ou órgão equivalente, ou aquela com certificado de conclusão de processo de habilitação ou reabilitação profissional fornecido pelo INSS (art. 36, § 2º, Portaria n. 4.677/98, do Ministério da Previdência e Assistência Social).Considera-se, também, pessoa portadora de deficiência habilitada aquela que, não tendo se submetido a processo de habilitação ou reabilitação, esteja capacitada para o exercício da função (art. 36, § 3º, Portaria n. 4.677/98, do Ministério da Previdência e Assistência Social).

19 Consideram-se beneficiários reabilitados todos os segurados vinculados ao Regime Geral da Previdência Social (RGPS), submetidos ao processo de reabilitação profissional desenvolvido ou homologado pelo INSS (art. 1º, § 1º, Portaria n. 4.677/98, do Ministério da Previdência e Assistência Social).

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àquele trabalhador. Na hipótese, consignando o

e. Regional que o reclamante foi admitido em

1982, sofreu acidente em 1987, acarretando-lhe

a deficiência física, mas permaneceu no emprego

até 1997, significa que não fora ele admitido na

empresa para preencher a quota obrigatória

destinada aos deficientes físicos, porque na

ocasião do seu ingresso não era portador de

deficiência. Ileso o § 1º do art. 93 da Lei nº

8.213/91, o recurso de revista não merece ser

admitido. Agravo de instrumento não provido"20

"PESSOA PORTADORA DE DEFICIÊNCIA. RESERVA DE MERCADO DE TRABALHO. ART. 93, § 1º, DA LEI 8213/91. A reserva de

mercado de trabalho para as pessoas portadoras

de deficiência, prevista no art. 93, § 1º, da Lei n.º

8213/91, é norma trabalhista, instituidora de

restrição indireta à dispensa do empregado

deficiente, e se descumprida acarreta a nulidade

do ato rescisório, com a reintegração do obreiro e

pagamento de salários vencidos e vincendos, até

que reste comprovada a contratação de

substituto em condição semelhante"21

A deficiência no mercado de trabalho e na sociedade em geral é

disciplinada pelo Decreto nº 3.298/99 do Poder Executivo Federal, a qual

compreende o conjunto de orientações normativas que objetivam assegurar o

pleno exercício dos direitos individuais e sociais das pessoas portadoras de

deficiência (art. 1º), observando os seguintes princípios:

20 TST-4ª T-AIRR nº58562/2002-900-02-00-Rel. Juiz conv. José Antonio Pancotti – j. 27.4.2005-DJ 13.5.2005 21 TRT 3ª R. – 4ª T. RO nº 13902/00 – Rel. Rogério Valle Ferreira – DJMG 19.5.2001 – p.13

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a) desenvolvimento de ação conjunta do Estado e da sociedade

civil, de modo a assegurar a plena integração da pessoa portadora de deficiência

no contexto socioeconômico e cultural;

b) estabelecimento de mecanismos e instrumentos legais e

operacionais que assegurem às pessoas portadoras de deficiência o pleno

exercício de seus direitos básicos que, decorrentes da Constituição e das leis,

propiciam o seu bem-estar pessoal, social e econômico;

c) respeito às pessoas portadoras de deficiência, que devem

receber igualdade de oportunidades na sociedade por reconhecimento dos direitos

que lhes são assegurados, sem privilégios ou paternalismos (art. 5º, I, II e III).

Busca-se a equiparação de oportunidades com a reabilitação

integral do portador de deficiência, formação profissional e qualificação para o

trabalho, escolarização regular e especial e orientação e promoção individual,

familiar e social (art. 15).

Assim, conclui-se que a pequena participação dos portadores de

deficiência no mercado de trabalho e na geração de riquezas para o país não

decorre da falta de um sistema legal protetivo, "mas sim da carência de ações,

estímulos e instituições que viabilizem, de forma concreta, a formação, habilitação,

reabilitação e inserção dos portados de deficiência no mercado de trabalho. As

nações bem-sucedidas nesse campo baseiam o apoio a essas pessoas em um

intrincado tripé, a saber, educação, reabilitação e compensação às empresas por

meio de estímulos e benefícios."

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CONCLUSÃO

Assim, é possível concluir que tivemos muitos avanços legislativos

em nosso país na última década. É possível também constatar, que na prática,

alguns avanços culturais e sociais no trato do problema das Pessoas Portadoras

de Deficiências. Mas todas as conquistas, representam muito pouco na luta pela

integração dessas pessoas na sociedade. Ainda há muito a ser feito, pois milhares

de pessoas continuam à margem da vida, escondidas atrás de dificuldades e

barreiras, que são mínimas e imperceptíveis para alguns, mas que se constituem

em obstáculos intransponíveis nas atividades do seu cotidiano.

Como bem observou a Profª Walküre Lopes Ribeiro da Silva, "o

problema que enfrenta o portador de deficiência não é a ausência de leis. Sob o

ponto de vista da validade temos leis que seriam perfeitamente aplicáveis aos

casos concretos. O grande problema é o da eficácia das normas existentes".

A solução da maioria dos problemas enfrentados, passa por

mudança do ponto de vista sócio-cultural. E, para que esta solução se viabilize, o

engajamento da sociedade civil é fundamental. O desafio, em suma, é de toda a

coletividade. A sociedade precisa se integrar neste processo; deve sim exigir que o

Estado cumpra o seu papel de agente financeiro e regulador; mas deve, também,

participar ativamente, colocando em prática as idéias.

Não basta que tenhamos leis securitárias e trabalhistas, um exemplar sistema de

compensação das desigualdades, de programas de integração da Pessoa

Portadora de Deficiência à comunidade. É preciso que tudo isso seja efetivamente

implementado através da participação ativa da sociedade civil.

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REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS

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BOBBIO, Norberto. A era dos direitos. Traduzido por Carlos Nelson Coutinho. Rio de Janeiro: Campus, 1992.

FERREIRA, Aurélio Buarque de Holanda. Novo dicionário da língua portuguesa. Rio de Janeiro: Nova Fronteira, 2ª edição, 24ª impressão.

JORGE NETO, Francisco Ferreira; CAVALCANTE, Jouberto de Quadros Pessoa. Estudos Dirigidos – Direito do Trabalho. São Paulo: LTr, 1999.

OLIVEIRA, Sebastião Geraldo de. Proteção jurídica ao trabalho dos portadores de deficiência. In: VIANA, Márcio Túlio et allie (coord.). Discriminação. São Paulo: LTR, 2000.

PASTORE, José. Oportunidade de trabalho para portadores de deficiência. São Paulo: LTR, 2000.

ROMITA, Arion Sayão. Trabalho do deficiente: In JTB 17-812.

SÉGUIN, Elida. Minorias e grupos vulneráveis: uma abordagem jurídica. Rio de Janeiro: Forense, 2002

VALTECIDES, Rubens. Deficiente físico – Novas dimensões da proteção ao trabalhador. São Paulo: LTR, 1992.

VILLATORE, Marco Antônio César. O decreto n. 3.298 de 20.12.99 – A pessoa portadora de deficiência no direito do trabalho brasileiro e o tema no direito do trabalho comparado. In: Revista LTR 64-05.

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ARTIGOS CONSULTADOS NA INTERNET

CAVALCANTE, Jouberto de Quadros Pessoa; JORGE NETO, Francisco Ferreira. O portador de deficiência no mercado formal de trabalho . Jus Navigandi, Teresina, ano 5, n. 51, out. 2001. Disponível em: <http://jus2.uol.com.br/doutrina/texto.asp?id=2132>. Acesso em: 18 jul. 2006. D`AMARAL, TEREZA COSTA -Presidente do Instituto Brasileiro de Defesa dos Direitos da Pessoa Portadora de Deficiência e Membro do Grupo de Defesa da Criança.

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