Revista Auditar Abril 20151

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auditar Revista UNIÃO DOS AUDITORES FEDERAIS DE CONTROLE EXTERNO ISSN 2179-7471 Nº 04 # Março 2015 Auditor do TCU indutor de boas práticas na administração pública

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Revista Auditar Abril 20151

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  • auditarRevistaUNIO DOS AUDITORES FEDERAIS DE CONTROLE EXTERNO

    ISSN 2179-7471N 04 # Maro 2015

    Auditor do TCUindutor de boas prticasna administrao pblica

  • Revista Auditar

    UMA AFRONTA AO CONTROLE DOS GASTOS

    contempla um dos principais problemas nas contrataes pblicas: a falta de planejamento

    Opinio

    oc j parou para pensar que Va ineficincia na gesto p-blica pode ser to prejudicial para os cofres brasileiros quanto a corrupo? A Copa do Mundo foi uma experincia que deixou bem clara a ausncia de mecanismos le-gais que promovam o planejamento em contrataes pblicas no Brasil. Essa falta de programao resultou em obras atrasadas ou inacabadas, desperdcio de recursos e incalcu-lveis prejuzos populao e imagem do pas. A previso que o conjunto das obras anunciadas para deixar o pas pronto para receber a Copa de 2014 s deve ficar pronto no final de 2017. Trs anos depois do fim do campeonato. 10 anos aps o pas ter sido escolhido para sediar os jogos.

    Para o Auditor Federal de Con-trole Externo Andr Pachioni Baeta, no projetar corretamente as obras

    do mundial de futebol representou o verdadeiro 7X1 contra o Brasil. Foi um festival de roubalheira e de incompetncia. Demonstramos para o mundo inteiro que no estamos aptos a planejar um evento como esse. Houve desperdcio de recursos pblicos com a criao de elefantes brancos e com obras de mobilidade que no ficaram prontas, afirmou.

    Um exemplo disso foi o projeto, orado em mais de R$1,5 bilho, que previa a construo do Veculo Leve sobre Trilhos na capital do pas. Um vago, nos moldes dos que so usa-dos na Europa, chegou a ser exposto no centro de Braslia. Milhares de pessoas foram visitar. Os olhos de-las brilhavam s de imaginar como seria utilizar o tal VLT. O meio de transporte moderno seria o grande legado da Copa para a populao. Mas, depois de investir milhes de reais, o Governo abandonou a obra -

    que apresentou vrias ilegalidades porque no havia mais tempo hbil para a construo das linhas.

    A ausncia de planejamento difi-culta a investigao dos gastos rea-lizados, a verificao da qualidade dos servios executados e deixa pra trs obras no-concludas, em de-teriorao ou malfeitas. E se a essa deficincia legal, no que diz respei-to a exigncia de adequado plane-jamento, forem somadas restries aos mecanismos de fiscalizao e controle?

    A realidade mostra que a legis-lao atual no possui elementos suficientes para incentivar e exigir maior planejamento dos governan-tes na realizao de obras. A solu-o poderia vir com o Projeto de Lei 559/2013, que pretende substituir a Lei de Licitaes (Lei 8666/1993), a do Prego (10.520/2002) e a do Re-

    gime Diferenciado de Contratao (12.462/2011). Mas, apesar de ser fundamental no contexto cultural do Brasil, o planejamento das con-trataes pblicas no foi contem-plado. E pior: o PLS 559/2013 que tramita no Senado prev uma srie de retrocessos, como impedir que o Tribunal de Contas da Unio atue a qualquer momento, ainda que haja indcios de ilegalidade numa licita-o.

    O projeto de lei traz artigos que limitam o poder dos Tribunais de Contas e de outros rgos de controle e enfraquecem a atuao de quem fiscaliza os gastos pblicos .O artigo 93, por exemplo, prev que os editais que forem disponibiliza-dos, previamente abertura da ses-so, por perodo superior a noventa dias, aps a notificao expressa ao rgo de controle, as respectivas licitaes suspensas por inconformidades do editalEsse dispositivo pode impedir a fis-calizao pelos Auditores de Con-trole Externo que, de acordo com a Constituio Federal, tm liberdade para exerc-la a qualquer tempo.

    O PLS 559/2013 tambm pode de-sestimular a participao da popula-o no controle dos gastos pblicos. Se o cidado comum apresentar in-formaes sobre uma fraude numa obra pblica, por exemplo, mas a denncia no se confirmar, ele pode ir parar na cadeia! Num contexto como esse, voc arriscaria denun-ciar uma irregularidade? O artigo 148 do PLS 559/2013 prev deteno de seis meses a dois anos e multa para quem dar causa a investiga-o administrativa ou judicial quan-do sabe improcedente. E a pena pode ser agravada em dois teros se uma licitao ou pr-qualificao for suspensa em razo da denncia.

    Reviso legal enfraquece a fiscalizao e nao

    PBLICOS

    Revista Auditar

  • De olho nos impactos da possvel aprovao do PLS 559/2013, a Revista Auditar promoveu um debate com Auditores do Tribunal de Contas da Unio com vasta experincia e conhecimento na rea de licitaes e contratos. No bate-papo, Frederico Jlio Goepfert Junior Andr Pachioni Baeta Walisson Alan Correia de Almeida

    apontaram os principais problemas e riscos da reviso legal proposta, alm das modificaes que deveriam estar presentes no projeto de lei.

    Contratao integral e obras de menor qualidade

    Andr Baeta: O PLS incorpora a contratao integral, em que as obras so licitadas com o an-teprojeto de engenharia. Isso quer dizer que a empresa as-sume a responsabilidade pelo projeto bsico. Como o preo da contratao fixo e voc deixa o construtor elaborar o projeto e definir o que vai fa-zer, ele tende a optar por uma obra insatisfatria e de menor qualidade. O VLT de Cuiab um exemplo emblemtico. O construtor foi alterando as so-lues, como diminuir o cum-primento dos viadutos, e a obra est cheia de patologias. A administrao pode estar colocando a raposa pra tomar conta do galinheiro.

    O prego presencial restringe a competitividade

    Frederico Goepfert: Umas das questes preocupantes auto-rizar os rgos a contratarem por prego presencial, o que um retrocesso. O prego pre-sencial em detrimento do eletrnico diminui a compe-tividade, restringe o certame e

    possibilita o direcionamento da licitao, abrindo a porta para conluio, para perda de eficincia e de economicidade. Walisson Correia: O Tribunal de Contas da Unio j tem uma jurisprudncia muito firme, no sentido de no permitir mais o prego presencial. Atualmente, o prego realizado preferen-cialmente na forma eletrnica. E, para fazer de forma presen-cial, tem que haver justificati-va.

    Falta destaque ao planejamento

    Frederico Goepfert: A grande crtica que existe em relao Lei 8.666/93 que no h um destaque muito claro da fase de planejamento da licitao. E isso fundamental porque, se a licitao comea errada, com planejamento mal feito, com uma identificao do ob-jeto que no seja clara, as fases seguintes podem ficar compro-metidas. E essa nova proposta de lei tambm no resolve a questo. Ento a nova legisla-o precisa trazer tambm a responsabilidade da rea de-mandante. Andr Baeta: No Brasil, pri-meiro toma-se a deciso de fa-zer uma obra e s a que se planeja. Depois que as cons-trutoras so contratadas, co-mum descobrir que a obra no vivel, que no h necessida-

    de ou recurso suficiente. Por isso, temos uma quantidade enorme de obras inacabadas no pas. Ento, a questo do planejamento deveria ter des-taque na legislao.

    O texto confuso e burocrtico

    Andr Baeta: O PLS 559/2013 no tem uma boa tcnica le-gislativa. No bem escrito e est com o dobro do tamanho da Lei 8.666/1993, que j co-nhecida por ser burocrtica. Ele no d celeridade s con-trataes. O projeto tambm tenta reunir muitos interesses diversos e cria um apanhado de normas que no esto muito harmnicas entre si.Frederico Goepfert: 559/2013 est enorme e muito desarmnico. O ideal talvez seria apenas melhorar um ou outro ponto, o que vem sendo feito inclusive com a ajuda do TCU.Walisson Correia: larmente no sou contra um cdigo extenso, desde que ele seja bom, desde que haja uma boa tcnica legislativa.

    Olhar dos Auditores

    Revista Auditar

  • A viso da Auditar

    Aditivos a contratos em desacordo com a Jurisprudncia

    O projeto admi-te a compensao dos acrsc-imos contratuais com os preos de servios. O TCU tem outro entendimento. Para o Tribunal, se voc assinou um contrato de R$ 100 e voc suprimiu R$ 80, por exemplo, voc s poderia acrescer R$ 25. Ao final, o va-lor mximo seria R$ 105. E o PLS 559/2013 est propondo acabar com essa regra. Isso d ensejo a uma srie de irregula-ridades, como jogo de planilha em que a empresa suprime os itens baratos do objeto licitado e aumenta os que esto mais caros. Essa mudana tambm d ensejo alterao do objeto do contrato.

    Limitar a atuao dos Controles Externo e Social perigoso

    Frederico Goepfert: Aqui no Brasil, atualmente, no exis-te uma barreira temporal. So vantagens em relao a ou-

    tros pases o livre acesso dos licitantes em qualquer fase do processo e o poder do TCU de atuar a qualquer momento. Essa barreira imposta pelo PLS 559/2013, em que o Tribunal fica impedido de atuar depois de um determinado prazo, prejudicial e muito perigosa.Walisson Correia: Tem um ou-tro dispositivo l no captulo de sanes que prev priso e multa para o cidado que fizer uma denncia considerada ca-luniosa. um aspecto negativo que afasta a possibilidade de controle social.

    Inviabilizar a suspenso cautelar inconstitucional

    Frederico Goepfert: Em uma cautelar, voc tem que anali-sar dois pressupostos: se h indcio de que um direito est sendo afetado e se h perigo em demorar a decidir. Quando voc tem que comparar todas as alternativas possveis antes, como prev o projeto de lei, voc inviabiliza a medida cau-telar. Andr Baeta: Esse artigo in-constitucional pois limita o po-der o TCU e tambm do poder judicirio.

    Walisson Correia: Temos a ple-na convico de que esse artigo no passa por inconstituciona-lidade.

    Punio para quem fiscalizar

    Andr Baeta: O projeto de lei traz limitaes para o prprio gestor pblico na execuo dos seus contratos. Tem um aspec-to muito particular que carac-teriza ato de improbidade ad-ministrativa o fato de o fiscal do contrato por algum motivo reter os pagamentos do presta-dor de servio.

    Nova legislao deve garantir a ordem de pagamentos

    Walisson Correia: O respeito ordem de pagamentos est pre-visto na lei atual. Quem pres-tou o servio primeiro, recebe antes. No projeto de lei, pre-ciso dar maior transparncia cronologia dos pagamentos, o

    Inovaes no

    que no ocorreu.

    contempladas

    Frederico Goepfert: Uma das solues que o PLS deveria buscar um tipo de contrata-o por resultado. No teve muito avano nisso. Como a ideia foi de mera juno das leis atuais, no houve espao para esse tipo de inovao. Andr Baeta: Deveria haver ainda a regulamentao de um cadastro positivo de licitantes. Quando voc recebe um ates-tado de capacidade tcnica por aquele servio executado, no deixa de ser uma qualifi-cao positiva da empresa.Walisson Correia: Aquelas empresas que esto em um nvel de excelncia, que entre-gam sempre no prazo e no extrapolam as regras pr-de-finidas poderiam ter acesso a uma diferenciao. Eu acho isso possvel, plausvel e at desejvel.Frederico Goepfert: Outra questo muito importante a qualificao do pessoal que trabalha com licitao. A gen-te observa que a maioria dos gestores no possui o devido preparo para isso. Esse desco-nhecimento gera, inclusive, o medo do controle. Muitas ve-zes o gestor toma atitudes ex-tremamente retrgradas, em-perrando e burocratizando o processo para se proteger. Mas o interesse pblico fica preju-

    ara a Unio dos Auditores Fe-P

    dicado por conta desse receio.

    derais de Controle Externo, a lei no existe isoladamente,

    pois sua aplicao consolidada, ao longo do tempo, pela jurispru-dncia dos Tribunais e a reflexo dos doutrinadores. Da a preocupao com proposies que podem desco-nsiderar todo o acer-vo de conhecimento j construdo sobre aquisies pblicas, gerando mais con-fuso do que ga-nhos de eficincia. A aplicao da lei, entretanto, deve le-var em conta a exe-cuo de obras com qualidade, a busca de aquisies mais vantajosas para a Administrao e, sobretudo, o que for mais ade-quado para o interesse pblico. O Presidente da Auditar, Leonel Mu-nhoz, garante que existe uma dis-

    ponibilidade permanente por par-te do corpo de Auditores do TCU em contribuir para aperfeioar a legislao vigente. Ns sempre seremos uma referncia de contri-buio, por isso no podemos ser

    alijados da discus-so. Segundo ele, o que mais preo-cupa nessa reviso legal a inteno de coibir a atua-o do Auditor de Controle Externo na fiscalizao da gesto pblica. Existe um vis equivocado de que o Auditor atrapa-lharia o andamen-to de obras e ou-tras contrataes. Isso um grande

    erro. Todos ns aqui temos, como pressuposto, o compromisso com a coisa pblica e com a maior efe-tividade nas aes da Administra-o Pblica, completa.

    Em maio de 2013, o Senado Federal criou uma Comisso Especial para atualizar e modernizar a Lei n 8.666/1993, que institui normas para licitaes e contratos da Administrao pblica. Em dezembro daquele ano, o relatrio final apresentado pela comisso foi transformado no Projeto de Lei do Senado 559/2013, que prev a revogao no apenas da Lei 8.666/93, mas tambm da Lei 10.520/2002 (Lei do Prego) e da Lei 12.462/2011 (Lei do Regime Diferenciado de Contrataes Pblicas). Em maio de 2014, foram aprovados em plenrio dois requerimentos. Um deles previa a tramitao conjunta do PLS 401/2013, que trata do mesmo assunto. O outro solicitava que o projeto fosse apreciado pelas Comisses de Constituio, Justia e Cidadania; de Servios de Infraestrutura; e de Assuntos Econmicos. Atualmente, o processo est na CCJ aguardando a designao de relator. At

    Tramitao do PLS 559/2013

    agora, foram apresentadas 64 emendas ao projeto de lei.

    Ns sempre seremos uma referncia de contribuio, por isso no podemos ser alijados da discusso

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