RESOLUÇÃO DE HIPÓTESES PRÁTICAS DE DIREITO COMERCIAL-1 (1)

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1 | P ágina RESOLUÇÃO DE HIPÓTESES PRÁTICAS DE DIREITO COMERCIAL PARTE I CASOS PRÁTICOS SOBRE A NOÇÃO E FONTES DO DTO COMERCIAL 1. Partindo da noção tradicional do Direito Comercial como o «direito do comércio», identifique quais as actividades, de entre as actividades a seguir apresentadas, que cabem na acepção de comércio indicando se o sentido da sua comercialidade é económico ou jurídico. a) A decide vender os produtos obtidos na exploração da sua propriedade rural. RESOLUÇÃO o NOÇÃO COMÉRCIO EM SENTIDO ECONÓMICO corresponde à actividade de intermediação entre a produção e o consumo. Então, (a) EXPLORAÇÃO DUMA PROPRIEDADE RURAL enquanto actividade enquadrada no sector primário, não pode ser abrangida neste conceito económico e restrito do comércio que apenas engloba uma parte do sector terciário de interposição de trocas. Mas se (b) ACTIVIDADE DE VENDA DOS PRODUTOS OBTIDOS POR VIA DESSA EXPLORAÇÃO já cabe no conceito de comércio (s. económico) porque media a produção e o consumo. o NOÇÃO COMÉRCIO EM SENTIDO JURÍDICO corresponde ao conjunto de actividades económicas a que num dado país e num certo momento se aplicam as leis comerciais. No art. 230º§1 e no 464º/2 e 4 CCOM, exclui-se a aplicação da lei comercial aos agricultores, por isso, não se trata de comércio em sentido jurídico. b) B dedica-se ao transporte escolar de crianças. RESOLUÇÃO o NOÇÃO COMÉRCIO EM SENTIDO ECONÓMICO corresponde à actividade de intermediação entre a produção e o consumo. Então, não se trata de comércio em sentido económico porque o transporte escolar não corresponde a uma actividade de interposição de trocas. o NOÇÃO COMÉRCIO EM SENTIDO JURÍDICO corresponde ao conjunto de actividades económicas a que num dado país e num certo momento se aplicam as leis comerciais. Por força do art. 230º§7 e 366º CCOM aqui aplicáveis, já que as empresas de transporte realizam uma actividade de prestação de serviços, são consideradas empresas e as leis comerciais são-lhes aplicáveis. c) C dedica-se à pesca. RESOLUÇÃO é comércio em sentido jurídico porque o Decreto-Lei n.º 20677, de 28 de Dezembro de 1931, sujeita a pesca à lei comercial. Mas já não o é em sentido económico porque não é uma actividade de intermediação ente a oferta e a procura, não se enquadrando no sector terciário (mas ao invés, no sector primário). d) D e E celebram um contrato de compra e venda de um quadro, que D tinha recebido de herança, destinado a decorar a sala da casa nova de E. A respectiva dívida foi titulada numa letra de câmbio emitida por D e aceite por E. RESOLUÇÃO o ACTO DE COMPRA E VENDA não é um havido como comércio em sentido económico porque não é uma actividade reiterada e profissional, nem tão pouco em sentido jurídico porque no caso não é feita para revenda (464º ss.).

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RESOLUÇÃO DE HIPÓTESES PRÁTICAS DE DIREITO COMERCIAL

PARTE I – CASOS PRÁTICOS SOBRE A NOÇÃO E FONTES DO DTO COMERCIAL

1. Partindo da noção tradicional do Direito Comercial como o «direito do comércio», identifique quais as actividades, de entre as actividades a seguir

apresentadas, que cabem na acepção de comércio indicando se o sentido da sua comercialidade é económico ou jurídico.

a) A decide vender os produtos obtidos na exploração da sua propriedade rural.

RESOLUÇÃO

o NOÇÃO COMÉRCIO EM SENTIDO ECONÓMICO – corresponde à actividade de intermediação entre a

produção e o consumo. Então, (a) EXPLORAÇÃO DUMA PROPRIEDADE RURAL – enquanto actividade

enquadrada no sector primário, não pode ser abrangida neste conceito económico e restrito do comércio que

apenas engloba uma parte do sector terciário de interposição de trocas. Mas se (b) ACTIVIDADE DE VENDA

DOS PRODUTOS OBTIDOS POR VIA DESSA EXPLORAÇÃO – já cabe no conceito de comércio (s. económico)

porque media a produção e o consumo.

o NOÇÃO COMÉRCIO EM SENTIDO JURÍDICO – corresponde ao conjunto de actividades económicas a que

num dado país e num certo momento se aplicam as leis comerciais. No art. 230º§1 e no 464º/2 e 4 CCOM,

exclui-se a aplicação da lei comercial aos agricultores, por isso, não se trata de comércio em sentido jurídico.

b) B dedica-se ao transporte escolar de crianças.

RESOLUÇÃO

o NOÇÃO COMÉRCIO EM SENTIDO ECONÓMICO – corresponde à actividade de intermediação entre a

produção e o consumo. Então, não se trata de comércio em sentido económico porque o transporte escolar não

corresponde a uma actividade de interposição de trocas.

o NOÇÃO COMÉRCIO EM SENTIDO JURÍDICO – corresponde ao conjunto de actividades económicas a que

num dado país e num certo momento se aplicam as leis comerciais. Por força do art. 230º§7 e 366º CCOM aqui

aplicáveis, já que as empresas de transporte realizam uma actividade de prestação de serviços, são

consideradas empresas e as leis comerciais são-lhes aplicáveis.

c) C dedica-se à pesca.

RESOLUÇÃO – é comércio em sentido jurídico porque o Decreto-Lei n.º 20677, de 28 de Dezembro de 1931, sujeita a

pesca à lei comercial. Mas já não o é em sentido económico porque não é uma actividade de intermediação ente a oferta

e a procura, não se enquadrando no sector terciário (mas ao invés, no sector primário).

d) D e E celebram um contrato de compra e venda de um quadro, que D tinha recebido de herança, destinado a decorar a sala da

casa nova de E. A respectiva dívida foi titulada numa letra de câmbio emitida por D e aceite por E.

RESOLUÇÃO

o ACTO DE COMPRA E VENDA – não é um havido como comércio em sentido económico porque não é uma

actividade reiterada e profissional, nem tão pouco em sentido jurídico porque no caso não é feita para

revenda (464º ss.).

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o SAQUE DA LETRA DE CÂMBIO – é um acto de comércio em si mesmo, um acto formalmente comercial,

independentemente da circunstância dos seus sujeitos ou do seu objecto serem mercantis (2º LULL) pelo que é

comércio em sentido jurídico.

e) F dedica-se ao artesanato enquanto sua irmã G explora uma fábrica de sapatos.

RESOLUÇÃO

o ARTESANATO – não pode ser comércio em sentido jurídico (v. 460º§1 e 464º/3), nem em sentido económico

(uma vez que se enquadra no sector secundário, onde não há interposição de trocas).

o EXLORAÇÃO DUMA FÁBRICA DE SAPATOS – é uma actividade de transformação que se enquadra no

conceito de comércio em sentido jurídico (230º§1), ainda que não económico (porque transformar não é

intermediar oferta e procura – enquadra-se no sector secundário).

2. A sociedade X e o Banco Y celebraram um contrato de mútuo em que aquela é mutuária e este mutuante. Este contrato previa para a

hipótese de falta de pagamento das prestações do capital e dos juros nas datas definidas para o respectivo cumprimento o segu inte: «no

caso de mora no pagamento de qualquer prestação de capital e/ou juros, incidirá sobre o montante dessa prestação, e durante o tempo em

que a mora se verificar, para além do juro fixado no contrato, uma sobretaxa de 2% ao ano. O agravamento da taxa de juro em r azão da

mora incidirá, porém, sobre todo o montante em dívida do empréstimo». X entrou em mora quanto a certas prestações de capital e de

juros. Consequentemente Y enviou-lhe um desenvolvimento da sua conta em que se verifica anatocismo, ou seja, são capitalizados juros

que passam a vencer juros. Atento o disposto no art. 560º C.Civ., poderia o Banco Y capitalizar os juros e lançar juros sobre esses juros?

RESOLUÇÃO

o ANATOCISMO – em princípio a capitalização não seria possível, acarretando como consequência a nulidade por

violação de normas imperativas (294º e 560º/1 CC) porque (a) CAPITALIZAÇÃO DOS JUROS já havido sido feita a priori,

quando o art. 560º/1 CC só admite que tal seja feito convencionalmente após o vencimento dos mesmos; o (b) art.

560º/2 CC estipula que os juros só serão capitalizáveis após o período mínimo de um ano, que não parece ser uma

condição aqui observada; e a (c) sobretaxa de 2% poderia no caso concreto configurar uma situação de juro usurário

(559º-A CC).

o CASO SUB IUDICE – contudo a prática do anatocismo nestes termos pode ser possível e legitima caso tenhamos em

linha de conta que o art. 560º/3 admite que, por força dos usos comerciais (prática reiterada de capitalização de juros no

sector bancário, e os usos mercantis de facto – podem ser fonte derivada de direito se as leis ou as partes as

convocarem) e as regras do comércio (v. 5º/6 DL n.º 334/78 de 17 de Novembro, que prevê a possibilidade de

capitalização no período de 3 meses, e a susceptibilidade de acrescer aqueles 2% consta do nº7 do ar t. 5 do mesmo DL).

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PARTE II – CASOS PRÁTICOS SOBRE ACTOS DO COMÉRCIO

Diga se os seguintes negócios devem ser qualificados como actos de comércio. Em caso afirmativo, proceda à sua classificação segundo as

categorias estudadas.

a) Contrato de compra e venda de um prédio urbano composto de vários apartamentos que o comprador, funcionário público

reformado, destina a arrendamento, sendo o vendedor uma sociedade que o construiu para vender.

Enquanto o vendedor é uma empresa comercial (230º§6), logo é comerciante (13º/1), o comprador é um particular, que não

exerce profissionalmente o comércio (é funcionário público e nem podia ser comerciante visto já estar reformado). O acto não

é uma compra e venda comercial porque não é feita para venda nem para aluguer (463º) mas, é subjectivamente comercial

para uma das partes (2º/2ª parte) – trata-se portanto de um acto subjectivamente comercial misto, que se pode tornar num

acto comercial puro, por força da analogia legis, com que todas concordam, logo, não repugna considerar esta operação.

b) Contrato para o fabrico de uma mobília para a residência de um professor, sendo fabricante um marceneiro que utiliza dois

empregados na sua oficina.

O acto não é subjectivamente comercial para nenhuma das partes – trata-se de facto de um acto civil.

c) Contrato de trabalho celebrado entre A, na qualidade de trabalhador, e B, na qualidade de entidade patronal, cuja actividade consiste

na construção de estradas, portos e caminhos-de-ferro.

O Contrato de trabalho não é, pelo menos à primeira vista, um AC, mas o Tribunal Relação de Coimbra já o classificou como

tal quando o patrão é comerciante (interpretação enunciativa do 230º§6) – trata-se portanto de um acto subjectivamente

comercial (2º/2ª parte) porque é um acto praticado por um comerciante conexo à sua actividade comercial – para ENGRÁCIA

ANTUNES é em concreto é um acto subjectivamente comercial misto (em relação apenas uma das partes).

d) Contrato de compra e venda de um imóvel rústico, sendo o vendedor um agricultor que nele vem exercendo a sua actividade agrícola

e o comprador uma sociedade comercial que o destina à construção de um edifício para armazenagem dos produtos que fabrica.

COMPRA E VENDA (463º) - não é mercantil porque não se destina a revenda; contudo, o acto é subjectivamente comercial –

misto (relativo a uma das partes) – em relação ao comprador porque está conexionado com a actividade mercantil (2º/2ª p).

e) Contrato de compra e venda de um imóvel rústico de que é proprietário um agricultor que nele vem exercendo a sua actividad e

agrícola; o comprador destina o prédio à exploração de uma pedreira, actividade a que se dedica profissionalmente.

A exploração de uma pedreira não é comercial (230º) e também o vendedor não é comerciante – acto civil.

f) Compra e venda de um automóvel em segunda mão, sendo vendedor um estudante e comprador um comerciante.

O vendedor não é comerciante, nada nos diz que comprou para revenda, logo seria venda civil; mas era comercial do lado do

comprador, a presunção pode ser elidida (uso pessoal). Quanto À natureza pura/mista depende da perspectiva adoptada.

g) Contrato de doação de um quadro pertencente a uma sociedade comercial a favor de uma fundação com fins culturais.

Há um comerciante que é a sociedade comercial (13º/2). A fundação não é um comerciante (14º/2), tal como a doação não é

um AC (mas não por não ser lucrativo) – NOTE-SE embora só venha regulada no CC, não é essa a interpretação que se atende (“à

natureza exclusivamente civil”; 2º/2ª parte), porque, na verdade, ela pode estar ligada ao desenvolvim ento de actividades

comerciais, podendo ser indirectamente lucrativa – é um AC porque o seu acto é comerciante e nenhuma circunstância

impeditiva do art. 2º/2ª parte se verifica. O art. 6º/1 CSC diz-nos que só há capacidades para actos lucrativos mas, o 6º/2

CSC prevê liberalidades que promovem indirectamente a sociedade. Portanto, em causa está um ASC misto.

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h) Por ocasião do Carnaval, A e B, donos de uma empresa transitária, adquiriram, numa agência de viagens do Porto, bilhetes de avião

para o Brasil.

A AGÊNCIA DE VIAGENS é AC porque é comerciante (230º§3, aplicação analógica e extensiva); a EMPRESA pode ser ou não

um acto comercial porque não sabemos se foi para uso pessoal, só se não for é que o acto é comercial pelo 2º/2ªparte. Logo,

pelo menos é um acto comercial misto, pode ou não ser puro.

i) A, empresário agrícola, comprou uma máquina debulhadora a C, o qual se dedica à venda de máquinas agrícolas.

É um acto comercial misto (em relação a C, mas já não pode sê-lo por parte do agricultor).

j) A, dono de um “stand” de automóveis usados, adquiriu a B um magnífico “Buick” de colecção, tendo subscrito uma letra em favor

deste para pagamento do preço.

A subscrição da letra é um AC formal (2º, 1ª parte), mas o caso não foi um AC porque foi dado um uso pessoal pela natureza

civil (2º, 2ª parte).

k) A, esteticista, casada com B, comprou em 1 de Julho de 2007 à sociedade C um laser especial para o seu instituto de beleza, nada

tendo pago até hoje. Poderá a dívida ser cobrada? Em caso afirmativo, que bens responderão por esta dívida e qual a taxa de juro

aplicável?

As esteticistas para efeitos de DCOM devem ser havidas como artesãs e não como comerciantes (v. 230º/1). Em causa está

uma sociedade civil pelo que a compra do laser é um acto civil (≠ comercial) e, como tal, ap licam-se as regras do CC quanto

ao incumprimento do contrato.

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PARTE III – CASOS PRÁTICOS SOBRE OS SUJEITOS JURÍDICO-COMERCIAIS

Diga se os intervenientes nas seguintes relações jurídicas podem ser qualificados como comerciantes:

1. António é proprietário de uma loja de tecidos e de pronto-a-vestir. Desenvolve a sua actividade com a colaboração de alguns

empregados e da mulher, com quem é casado no regime da comunhão de adquiridos.

António é comerciante (463º) e sua loja de tecidos e pronto-a-vestir tem de facto personalidade jurídica. Muito embora, a

comunidade conjugal não tenha personalidade jurídica, os cônjuges casados no regime da comunhão de adquiridos são co -

titulares de uma empresa comercial quando esta se trata de um bem comum (presume -se que quando ambas administram a

empresa, ambos fazem daquele comércio profissão), mas mesmo no caso em que a empresa só seja gerida por um deles , pode

o outro praticar actos de administração ordinária (v. 1678º e 1681º CC; ex: C/V aos fornecedores, pagar dívidas cobrar

dívidas) e além disso admite-se, por via do art. 1691º/1-d e do 1695º do CC, a responsabilidade comum do casal por dívidas

contraídas por qualquer um deles no exercício de actividade comercial.

Em relação à sua esposa, tendo em conta o exposto, não podemos afirmar com clareza a sua qualidade de comerciante.

2. Admita que António e sua mulher deixam de trabalhar na loja e nomeiam gerente um dos seus empregados (Bernardo) a quem

conferem plenos poderes de gestão.

Os GERENTES são todos aqueles que se acham propostos para tratar do comércio no lugar de outrem (o que se trata aqui!) –

conf. 248º e 253º CCOM. Sabendo que os gerentes negoceiam em nome dos seus proponentes (250º CCOM), e para a doutrina

maioritária os gerentes embora actuem por conta própria, agem em nome de outrem, não sendo por isso havido como

comerciantes.

O MANDATO é o NJ através do qual os proponentes conferem voluntariamente poderes ao gerente; ele presume-se geral,

compreendendo assim todos os actos necessários ao exercício do comércio para o qual o gerente foi destacado (249º).

3. Suponha que Bernardo, para aumentar os seus rendimentos, decide vender aos Domingos na feira local peças de roupa que adquire a

um fabricante têxtil.

Em causa está a PROIBIÇAO DE CONCORRENCIA DO GERENTE (253º CCOM) segundo o qual, nenhum gerente pode praticar,

por conta própria (o que me parece ser o caso!) comércio do mesmo género ou espécie, salvo com a expressa autorização do

proponente, sob pena de ter de indemnizar os danos e as perdas que o proponente possa eventualmente sofrer com aquela

operação ou pode o proponente reclamar para si os respectivos actos. Todavia, Bernardo assume-se como um comerciante

(2º, 7º, 230º/2 CCOM) e aos Domingos pratica actos de comércio.

4. A e B constituíram uma sociedade comercial com o objectivo de explorarem uma fábrica de calçado. Antes mesmo de procederem ao

registo dessa sociedade comercial, adquirem um lote de peles proveniente da Turquia.

A SOCIEDADE COMERCIAL (1º/2 CSC) é havida, fruto do disposto no art. 13º§1º, como comerciante. As SC gozam de

personalidade jurídica e existem como tais a partir do registo definitivo

5. A Lar-Jovem Cooperativa Habitacional tem por objecto social principal a construção ou a sua promoção e a aquisição de fogo s para

habitação dos seus membros e a gestão, reparação, manutenção ou remodelação dos mesmos.

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6. C, reformada, com a ajuda de duas estudantes universitárias hospedadas em sua casa, dedica-se ao fabrico de compotas que vende no

supermercado local e de bolos que vende sob encomenda. Para esse efeito, contratou com D o fornecimento regular dos ingredientes

necessários por ele produzidos na sua quinta.

7. Doroteia, professora do ensino básico num colégio particular, dedica-se também à venda de produtos cosméticos de uma conhecida

marca internacional da qual detém a representação exclusiva no distrito onde lecciona.

8. A e B, esteticistas, constituíram uma sociedade de modo a exercerem em conjunto essa actividade profissional. Para o efeito

arrendaram um espaço, contrataram mais duas auxiliares e adquiriram os instrumentos necessários para os tratamentos de beleza.

9. A, casado com B, é dono de um supermercado. No dia 1 de Outubro de 2007, comprou um lote de 10 mil acções de uma sociedade de

venda por grosso de produtos alimentares, tendo para o efeito contraído dois empréstimos: um de €5.000 junto do Banco X e outro de

igual montante junto de C, amigo de A. Supondo que A não pagou os empréstimos na data do vencimento, diga que bens podem

responder por tais dívidas.

10. Cecília, casada com Jorge, é dona de uma ourivesaria. Em 1 de Outubro de 2007, encomendou a um dos seus fornecedores, Lino, um

serviço de chá, para oferecer à sua melhor amiga, e um faqueiro, também em prata, para a sua casa. Admitindo que a dívida ain da

continua hoje por saldar, diga que bens poderá Lino agredir para satisfazer o seu crédito.

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PARTE IV – CASOS PRÁTICOS SOBRE OS BENS JURÍDICO-COMERCIAIS

1. A, comerciante, explora um estabelecimento de pronto a vestir na Rua de Passos Manuel que funciona em imóvel arrendado.

Querendo retirar-se da actividade comercial, decide doar o estabelecimento ao seu sobrinho B. Este último, continuando a utilizar a

firma de A, com muito prestígio no meio comercial, opta imediatamente por transformar o estabelecimento numa loja de música.

Pronuncie-se sobre a validade do trespasse do estabelecimento, os direitos do senhorio, e a transmissão da firma.

O TRESPASSE (NJ abstracto) de um estabelecimento comercial vem regulado no art. 1112º CC e ele constitui um negócio

protótipo de transmissão directa (inter vivos) e a título definitivo da propriedade da empresa, ie, daquele estabelecimento

comercial (no caso: pronto-a-vestir), sendo indiferente a natureza gratuita ou onerosa do mesmo (no caso: a transmissão

operou por via da doação). O trespasse é um negócio formal pelo que tem de revestir forma escrita, sob pena de nulidade.

Em RELAÇÃO AOS DTOS DO SENHORIO importa desde logo referir que este não pode impedir a transmissão do dto de

arrendamento (de A para B) que se transmite sem o consentimento/acordo do senhorio que, todavia, tem o (a) dto de ser

informado desta mesma operação (424º e ss., 1112º/1-b e 1109º/2 CC), sob pena de, no caso senhorio não ter sido informado ou

de não ter sido informado no prazo devido (resulta do art. 1109º CC), a cessão da posição de arrendatário não lhe ser

oponível, podendo com isso resolver o contrato nos termos do art. 1059º/2 e 1112º/5 CC. Além do dto a ser tempestivamente

informado, o senhorio, por força do art. 1112º/4 CC, goza ainda do (b) dto de preferência no trespasse (no caso, pq feito por

doação, não seria admissível).

Quanto à TRANSMISSÃO DA FIRMA, estabelece o art. 44º do Reg. Nacional das Pessoas Colectivas que «O adquirente, por

qualquer título entre vivos, de um estabelecimento comercial pode aditar à sua própria firma a menção de haver sucedido na

firma do anterior titular do estabelecimento, se esse titular o autorizar, por escrito», todavia, é certo que não se pode

«adquirir uma firma sem ser a do estabelecimento a que esta se acha ligada». Além disso, o contrato deve consagrar

expressamente um conjunto de elementos para que a transmissão opere validamente, sabendo que, à partida, o nome e a

insígnia do estabelecimento fazem parte do âmbito natural de entrega (v. 31º/4 e 5 CPI).

PROBLEMA: estamos perante uma situação de falso trespasse (1112º/1-a CC)? No caso, porque nada indicia o conluio entre

trespassante/trespassário, ie, que o antigo comerciante tinha conhecimento da reserva mental do trespassário, presume-se a

boa fé do primeiro, e uma vez não sendo justo penaliza-lo, deve permanecer válido o trespasse.

2. A, comerciante de electrodomésticos e mobiliário, vendeu a B o estabelecimento comercial de que era titular e que estava instalado no

r/c de um prédio de que o mesmo A era proprietário. A venda englobava também o direito de propriedade sobre o local. As chaves do

estabelecimento deveriam ser entregues a B quinze dias após a formalização do contrato por escritura pública. Contudo, nessa data,

quando B abriu a porta do estabelecimento, verificou, surpreendido, que não se encontravam no seu interior nem electrodomésticos

nem mobiliário para revenda. A apenas lhe tinha deixado as prateleiras e as mesas utilizadas por ele e pelos seus empregados. Teria B,

com a compra do estabelecimento, adquirido os electrodomésticos e o mobiliário que se encontravam no local para revenda, no

momento da outorga da escritura pública?

O NJ em apreço é o TRESPASSE. Ele vem regulado no art. 1112º CC e constitui um negócio protótipo de transmissão directa

(inter vivos) e a título definitivo e imediato da propriedade da empresa, ie, daquele estabelecimento comercial (no caso: de

electrodomésticos e mobiliário), sendo indiferente a natureza gratuita ou onerosa do mesmo (no caso: a transmissão operou

por via da C/V). O trespasse é um negócio formal pelo que tem de revestir forma escrita, sob pena de nulidade.

Como qualificar o MOBILIÁRIO E OS ELECTRODOMÉSTICOS? No caso de se tratar de elementos que se enquadram no âmbito

de entrega mínimo, porque a falta destes elementos implica a inexistência do trespasse já que a sua transmissão é necessária e

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suficiente então a falta dos mesmos implica a inexistência do trespasse (constituindo assim situação de falso trespasse); no

caso de os considerarmos elementos de âmbito natural eles transmitir-se-iam naturalmente com o trespasse,

independentemente de convenção das partes nesse sentido.

3. A sociedade «Decor – Decoração de Interiores, Lda.», pertencente em quotas iguais aos sócios gerentes A e B, tem uma rede de

estabelecimentos de venda ao público nas principais cidades do país. A sociedade, em Janeiro de 2003, vendeu a C o estabelecimento

situado no Porto, na Rua de Santa Catarina. Em Maio de 2003, A abre, a dois quarteirões de distância, na Rua Sá da Bandeira, um

estabelecimento destinado ao comércio de artigos de decoração.

a. C, incomodado com a situação, interpela A para ele mudar o ramo do negócio, ao que este responde negativamente afirmando

não ter sido ele o trespassante do estabelecimento, mas sim a sociedade «Decor, Lda.». Comente a situação descrita .

O TRESPASSE (NJ abstracto) de um estabelecimento comercial vem regulado no art. 1112º CC e ele constitui um

negócio protótipo de transmissão directa (inter vivos) e a título definitivo da propriedade da empresa, ie, daquele

estabelecimento comercial, sendo indiferente a natureza gratuita ou onerosa do mesmo. Como o trespasse é um

negócio formal, ele tem de revestir forma escrita, sob pena de nulidade.

No caso o trespassante seria a sociedade Decor e o trespassário o indivíduo C.

A OBRIGAÇÃO DE NÃO CONCORRÊNCIA é a ob. a cargo do trespassante (no caso: a sociedade Decor) que consiste no

dever de este não exercer actividade económica concorrente ou análoga àquela que trespassou e de modo a que possa

afectar a capacidade fruitiva do trespassante. Esta é uma cláusula que se pode considerar implícita no contrato,

contudo há que se ultrapassar o estrito domínio da titularidade formal para que possamos imputar esta ob. aos sócios

da empresa, suscitando assim o problema da desconsideração da personalidade jurídica da empresa (ie, saber se os

dtos e as ob. da sociedade podem ser imputados aos seus sócios?) até porque estamos perante uma ob. de entrega e o

alienante, nomeadamente, os seus representantes, têm a ob. de entrega da coisa alienada acrescida da ob. de

assegurar o gozo pacífico desta. Todavia, a própria ob. de não concorrência está sujeita a certos limites – (a)

temporais, em virtude da proximidade temporal e (b) espaciais, em virtude da proximidade espacial. No caso sub

iudice, passaram-se apenas 4 meses e o novo estabelecimento situa-se a dois quarteirões de distância pelo que me

parece procedente afirmar-se a violação desta cláusula de garantia, caso considerássemos estendíveis as ob. aos sócios

da sociedade comercial.

b. A solução seria diferente caso, em vez da transmissão do estabelecimento, tivesse ocorrido uma mera transmissão da quota de

A a C?

Ainda assim há uma transferência substancial do estabelecimento comercial e por isso admite-se a ob. de não

concorrência no caso de transmissão de participações. Assim sendo, e contra a posição do prof. COUTINHO DE

ABREU, que sustenta a sua posição no objecto do NJ que é diferente no caso da transmissão da quota, admite -se que a

ob. de garantia recai ainda sobre o A.

4. A, casado com B no regime de comunhão de adquiridos, constituiu em 1994 um E.I.R.L. cujo objecto é a indústria hoteleira. O capital é

de 100 000 €, integralmente realizado no momento da outorga da escritura: 10% em dinheiro e o resto com um restaurante que é

propriedade de A.

a. Os fornecedores do E.I.R.L. poderão, em caso de necessidade, penhorar os bens comuns de A e B para satisfazer os seus

créditos?

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ESTABELECIMENTO INDIVIDUAL DE RESPONSABILIDADE LIMITADA (v. DL 248/86) – é um património autónomo

que, no caso, se encontra ao serviço de um comerciante – aquele que exerce uma actividade comercial (v. 13º CCOM). O

EIRL tem de ser constituído por uma pessoa física, sabendo que uma pessoa só pode ser titular de um único EIRL.

REGIME DO EIRL (3º DL) – o EIRL tem de ter um (a) capital mínimo de 5000€ (no caso é de 100 000€); que (b) tem de

ser realizado em numerário (no caso: 10 000€) ou em coisas (no caso: restaurante de A) susceptíveis de penhora (no

caso: admite-se, em pp., a penhora), sabendo que a parte em numerário não pode ser inferior a ²/3 do capital mínimo

(então ²/3 de 5 000€ ≈ 3333,3€; no caso: 10 000€).

CERNE DO REGIME JURIDICO OU A AUTONOMIA PATRIMONIAL DO EIRL (10º e 11º DL) – o património do EIRL

responde apenas pelas dívidas relativas ao seu património, sabendo que os demais bens do seu titular não respondem

pelas dívidas do EIRL – ideia de que «os bens do EIRL respondem apenas e só pelas dívidas do mesmo». Todavia, o

legislador previu no art. 10º/2 DL que, no caso de o titular do EIRL tornar-se insolvente o património pessoal do seu

titular não fica necessariamente a salvo, caso os credores (no caso: os fornecedores) provem que «não foi respeitado o

pp. da autonomia patrimonial na gestão do estabelecimento, admitindo-se com isto que os credores possam recorrer à

penhora de bens pessoais do titular do EIRL. Aqui também importa referir os art. 1691º/1-d (quanto às dívidas que

responsabilizam ambos os cônjuges: se contraídas no exercício de actividade comercial, em proveito comum), 1695º

(quanto aos bens que respondem pelas dívidas de ambos os cônjuges: os bens comuns do casal).

b. Admita que A contraiu uma dívida para pagar as despesas de uma intervenção cirúrgica a que teve de submeter -se em uma

clínica privada. Poderá o titular da clínica penhorar o E.I.R.L. para satisfazer o seu crédito?

CERNE DO REGIME JURIDICO OU A AUTONOMIA PATRIMONIAL DO EIRL (10º e 11º DL) – o património do EIRL

responde apenas pelas dívidas relativas ao seu património, sabendo que os demais bens do seu titular não respondem

pelas dívidas do EIRL – ideia de que «os bens do EIRL respondem apenas e só pelas dívidas do mesmo». Todavia, o

legislador previu no art. 22º DL 248/86 a admissibilidade da penhora do EIRL conquanto se faça prova da

insuficiência dos restantes bens pessoais do credor (pq a dívida é pessoal e não é uma dívida própria do EIRL).

Importa referir ainda que quando a lei fala de penhora do EIRL ela não admite a penhora de bens específicos do

estabelecimento, mas antes do próprio estabelecimento como um todo (e com isto o legislador foi insensato pq seria

mais acertado a admissibilidade da penhora de apenas de alguns bens do EIRL no caso de dívidas pequenas, como se

presume ser o caso!).

5. A, sociedade por quotas, em 2000, tomou de arrendamento a B, pessoa individual, o r/c e a cave de um edifício de que este é

proprietário, estipulando-se no contrato que o local arrendado se destinava a armazém de géneros alimentícios e bebidas. Por cessão

de quotas realizada em Janeiro de 2002, os sócios da sociedade A cederam a totalidade do capital à sociedade C, grossista de géneros

alimentícios e bebidas. A partir dessa data, A cessou a sua actividade comercial e os seus trabalhadores passaram a ser pagos por C.

Também a partir daquela data, o estabelecimento instalado no r/c e cave foi integrado na exploração comercial de C, que passou a

pagar as rendas em nome de A. B, senhorio, invocando o art. 1112.º, nº 4 Cod. Civil, pede ao tribunal o reconhecimento do direito de

preferência. Terá razão?

O TRESPASSE (NJ abstracto) de um estabelecimento comercial vem regulado no art. 1112º CC e ele constitui um negócio

protótipo de transmissão directa (inter vivos) e a título definitivo da propriedade da empresa, ie, daquele estabelecimento

comercial, sendo indiferente a natureza gratuita ou onerosa do mesmo. Como o trespasse é um negócio formal, ele tem de

revestir forma escrita, sob pena de nulidade.

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10 | P á g i n a

Como qualificarmos o CONTRATO DE ARRENDAMENTO DO IMÓVEL? Hoje discute-se na doutrina admissibilidade dos

contratos negociais (com os quais a empresa se encontra envolvida) como elementos integrados no âmbito natural da entrega (ie,

aqueles elementos que, no silêncio das partes, se presumem transmitidos com o trespasse). De facto, para a doutrina

dominante, e com fundamento nos art. 424º do CC, exige-se o consentimento dos contraentes cedidos, presumindo-se o

consentimento do cedente e do cessionário. Todavia discordo e, partilhando a posição do docente ENGRÁCIA ANTUNES, até

para facilitar a circulação das empresas no comércio jurídico, defendo a aplicação analógica de outras disposições (ex: 85º CT

que no caso até releva na medida em que os trabalhadores de A, depois da cessão, passaram a ser pagos por C) que admitem

a transmissão directa do contrato.

Em RELAÇÃO AOS DTOS DO SENHORIO importa desde logo referir que este não pode impedir a transmissão do dto de

arrendamento (de A para C) que se transmite sem o consentimento/acordo do senhorio que, todavia, tem o (a) dto de ser

informado desta mesma operação (424º e ss., 1112º/1-b e 1109º/2 CC), sob pena de, no caso senhorio não ter sido informado ou

de não ter sido informado no prazo devido (resulta do art. 1109º CC), a cessão da posição de arrendatário não lhe ser

oponível, podendo com isso resolver o contrato nos termos do art. 1059º/2 e 1112º/5 CC. Além do dto a ser tempe stivamente

informado, o senhorio, por força do art. 1112º/4 CC, goza ainda do (b) dto de preferência no trespasse.

Em causa está a LOCAÇÃO do estabelecimento comercial (v. art. 1109º CC) que é o negócio oneroso mediante o qual se cede a

exploração do estabelecimento comercial, todavia, ao contrário do trespasse, esta é uma transmissão temporária do dto de

propriedade pelo que o locatário dispõe apenas de poderes de gozo ou de simples fruição. Embora não se exija a observância

de forma, à semelhança do trespasse, deve obedecer a forma escrita (v. 1112º/3). No caso, o cedente/locador seria A e C seria

o cessionário/locatário. A consideração do estabelecimento como uma realidade organizativa implica a manutenção do

contrato de arrendamento anterior

6. A, comerciante em nome individual, casado com B no regime de comunhão de adquiridos, é titular de um estabelecimento comercial

de venda por grosso de produtos têxteis. No âmbito da exploração deste estabelecimento tinha celebrado com C, empresário de fiação

têxtil, um contrato de fornecimento de diversos produtos. Entretanto, A aliena a D o seu estabelecimento comercial e a sua firma,

retirando-se da vida comercial. Neste momento, restava a C, como última fase de execução do contrato celebrado com A, fornecer uma

determinada quantidade de uma fibra especial, ao preço unitário de 15 000 euros. C realiza o fornecimento do material, mas A recusa-

se a proceder ao pagamento, alegando já não ser o titular do estabelecimento. Igualmente, D, entretanto interpelado por C, recusa

efectuar o pagamento, invocando, por seu turno, não ter sido parte no contrato. “Quid iuris”?

O TRESPASSE (NJ abstracto) de um estabelecimento comercial vem regulado no art. 1112º CC e ele constitui um negócio

protótipo de transmissão directa (inter vivos) e a título definitivo da propriedade da empresa, ie, daquele estabelecimento

comercial (no caso: EC de venda por grosso de produtos têxteis), sendo indiferente a natureza gratuita ou onerosa do mesmo

(no caso: a transmissão operou por via da C/V). O trespasse é um negócio formal pelo que tem de revestir forma escrita, sob

pena de nulidade.

Quanto à TRANSMISSÃO DA FIRMA, estabelece o art. 44º do Reg. Nacional das Pessoas Colectivas que «O adquirente, por

qualquer título entre vivos, de um estabelecimento comercial pode aditar à sua própria firma a menção de haver sucedido na

firma do anterior titular do estabelecimento, se esse titular o autorizar, por escrito», todavia, é certo que não se pode

«adquirir uma firma sem ser a do estabelecimento a que esta se acha ligada». Além disso, o contrato deve consagrar

expressamente um conjunto de elementos para que a transmissão opere validamente, sabendo que, à partida, o nome e a

insígnia do estabelecimento fazem parte do âmbito natural de entrega (v. 31º/4 e 5 CPI).

Page 11: RESOLUÇÃO DE HIPÓTESES PRÁTICAS DE DIREITO COMERCIAL-1 (1)

11 | P á g i n a

Como qualificar o CONTRATO DE FORNECIMENTO? De acordo com a posição dominante na doutrina, os contratos negociais

(com os quais a empresa se encontra envolvida) não são elementos integrados no âmbito natural da entrega (ie, aqueles elementos

que, no silêncio das partes, se presumem transmitidos com o trespasse), porque, e com fundamento nos art. 424º e ss. do CC,

exige-se o consentimento do(s) contraente(s) cedido(s), presumindo-se o consentimento do cedente e do cessionário. Todavia

discordo e, partilhando a posição do docente ENGRÁCIA ANTUNES, até para facilitar a circulação das empresas no comércio

jurídico, defendo a aplicação analógica de outras disposições (ex: 85º CT , 95º/8 da Lei do Contrato de Seguro…) que admitem

a transmissão directa do contrato.

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12 | P á g i n a

PARTE V – CASOS PRÁTICOS SOBRE OS SINAIS DISTINTIVOS DO COMÉRCIO

I. Anacleto Verbo e o irmão Belisário fundaram uma sociedade destinada à edição de livros. Essa sociedade adoptou como firma o apelido dos seus

fundadores (“VERBO, Lda.”). A sociedade conheceu posteriormente uma enorme expansão, tendo o seu capital aumentado, ao longo dos anos, com

participações de outras pessoas e entidades. Belisário veio entretanto a falecer e Anacleto acabou por se tornar um sócio min oritário. Em

determinada altura, suscitou-se um litígio entre este e os sócios maioritários. Anacleto decidiu então retirar-se da sociedade e proibir esta de continuar a

usar o seu apelido. A sociedade opõe-se, alegando que se tornou conhecida no meio comercial pela utilização dessa firma e que a alteração da mesma

prejudicaria gravemente a sua projecção comercial. QUID IURIS?

FIRMA – sinal nominativo (ie, só composto por palavras) identificativo e individualizador dos empresários (concepção subjectiva

acolhida pela doutrina maioritária) que dispõe assim de um direito de uso exclusivo e oponível erga omnes (valor absoluto da firma – v.

33º e 35º CNCP) a empresários concorrentes; sabendo que a adopção da firma é de natureza obrigatória e não facultativa. No ca so, está

em causa uma firma subjectiva tendo em conta que esta é composta pelo apelido dos sócios fundadores (“VERBO; Lda.”), admissív el ao

abrigo do pp. da liberdade de denominação (32º/4 CNPC), conquanto estejam respeitados os limites decorrentes do pp. d a verdade (32º

CNPC), nomeadamente, as firmas devem ser verdadeiras e não induzirem erro sobre a identificação, natureza ou actividade do se u

titular e não podem sugerir actividade diferente da que constitui o objecto social – no caso não parece que a firma enferme de vícios.

SOCIEDADE COMERCIAL – em causa trata-se de uma sociedade destinada à edição de livros (230º§5º), nomeadamente, aplica-se

porque sociedade por quotas, o disposto no art. 202º/1 CSC.

Ora sempre que a pessoa singular cujo nome figure na firma deixe de ser associado, deve tal firma ser alterada no prazo de um ano por

força do art. 32º/5 RNPC, a não ser que o associado que se retire consinta por escrito na continuação da mesma firma – o que não é o

caso!

II. COMENTE AS SEGUINTES HIPÓTESES:

a) Os irmãos Dioclécio e Edmundo, sócios de uma sociedade que explora uma pequena mercearia, pretendem adoptar como firma social

“Dioclésio & Irmão – Hipermercado, Lda.”

FIRMA – sinal nominativo (ie, só composto por palavras) identificativo e individualizador dos empresários (concepção

subjectiva acolhida pela doutrina maioritária) que dispõe assim de um direito de uso exclusivo e oponível erga omnes (valor

absoluto da firma – v. 33º e 35º CNCP) a empresários concorrentes; sabendo que a adopção da firma é de natureza obrigatória e

não facultativa. No caso, está em causa uma firma mista tendo em conta que esta é composta pelo nome próprio de um dos

sócios fundadores e por uma expressão aparentemente relativa à actividade/negócio e tal é admissível ao abrigo do pp. da

liberdade de denominação (32º/4 CNPC), conquanto estejam respeitados os limites decorrentes do pp. da verdade (32º CNPC),

nomeadamente, as firmas devem ser verdadeiras e não induzirem erro sobre a identificação, natureza ou actividade do seu

titular e não podem sugerir actividade diferente da que constitui o objecto social – no caso, a dúvida está relacionada com a

palavra “Hipermercado” que de facto pode potenciar a violação do art. 32º/2 e 3 porque de facto trata -se da exploração de

uma «pequena mercearia» e o hipermercado implica per si uma exploração no mínimo abrangente pelo que no caso penso que

há violação do art. 32º.

b) As irmãs Fremosinda e Generosa, sócias de uma sociedade que explora uma empresa cosmética e solário, pretendem adoptar como f irma

“Obama – Bronzeado Natural, S.A.”

FIRMA – sinal nominativo (ie, só composto por palavras) identificativo e individualizador dos empresários (concepção

subjectiva acolhida pela doutrina maioritária) que dispõe assim de um direito de uso exclusivo e oponível erga omnes (valor

absoluto da firma – v. 33º e 35º CNCP) a empresários concorrentes (firma em causa é uma sociedade anónima); sabendo que a

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adopção da firma é de natureza obrigatória e não facultativa. No caso, está em causa uma firma mista tendo em conta que esta

é composta por um nome próprio mas de nenhum dos sócios fundadores e por uma expressão aparentemente relativa à

actividade/negócio. Ora de facto, são admissíveis, ao abrigo do pp. da liberdade de denominação (32º/4 CNPC), as firmas

mistas, mas desde que respeitados os limites decorrentes do pp. da verdade (32º CNPC), nomeadamente, as firmas devem ser

verdadeiras e não induzirem erro sobre a identificação, natureza ou actividade do seu titular e não podem sugerir actividade

diferente da que constitui o objecto social. No caso em concreto é usado o nome “Obama”, que não equivale a nenhum dos

sócios contra o art. 275º/1 CSC; em relação ao “Bronzeado Natural” de facto parece-me respeitar-se o pp. da verdade.

c) Foram apresentadas junto do INPI os pedidos de registo das seguintes marcas:

i. a forma de uma garrafa como marca de uma aguardente;

MARCA – sinal susceptível de representação gráfica (222º CPI), sabendo que esta pode ser composta por um

conjunto variado de elementos (figurativos, nominativos, sonoros…) conquanto que susceptíveis de representação

gráfica. Em causa está a violação do pp. da autonomia (1 dos pp. conformadores da marca) porque em causa a

garrafa é necessariamente um elemento necessário e funcional do produto, logo viola-se o 223º/b

ii. a expressão “TV” para um novo tipo de televisor;

MARCA – sinal susceptível de representação gráfica (222º CPI), sabendo que esta pode ser composta por um

conjunto variado de elementos (figurativos, nominativos, sonoros…) conquanto que susceptíveis de represen tação

gráfica. Em causa está a violação do pp. da eficácia distintiva pq a marca “TV” trata-se de uma marca genérica

(223º/1-a, c) porque constitui a própria designação do produto.

iii. a expressão “Diesel” para um automóvel;

MARCA – sinal susceptível de representação gráfica (222º CPI), sabendo que esta pode ser composta por um

conjunto variado de elementos (figurativos, nominativos, sonoros…) conquanto que susceptíveis de representação

gráfica. Em causa está a violação do pp. da eficácia distintiva pq a marca “Diesel” trata-se de uma marca descritiva

(223º/1-a, c) porque constitui uma característica própria do produto.

iv. a expressão “Imperial” para uma cerveja;

v. cores da bandeira italiana (vermelho, verde, branco) para artigos de vestuário;

MARCA – sinal susceptível de representação gráfica (222º CPI), sabendo que esta pode ser composta por um

conjunto variado de elementos no caso figurativos (as cores vermelho, verde e branco) conquanto que susceptíveis de

representação gráfica.

vi. a expressão “Bix” para uma esferográfica;

MARCA – sinal susceptível de representação gráfica (222º CPI), sabendo que esta pode ser composta por um

conjunto variado de elementos (figurativos, nominativos, sonoros…) conquanto que susceptíveis de representação

gráfica. Em causa, sob pena de violação do pp. novidade não deve ser admissível pq a marca “Bix” facilmente pode

ser confundida com a marca Bic e porque em causa estão produtos idênticos (esferográficas) conf. 239º/1-a – mas é

duvidoso pq não há identidade total mas uma reprodução aproximada.

III. A empresária Idalete, com muito sucesso no mundo da moda, comercializa as suas peças de colecção debaixo da marca “Lusitanian Fashion”.

Entretanto, foi constituída a sociedade “Portugal Fashion, S.A.”, que apresentou um pedido de registo em seu nome da marca “Lusitanian Fashion”

– ao que Idalete se opôs. Posteriormente, as peças de Idalete foram sendo comercializadas na Europa, verificando -se que alguns distribuidores

estrangeiros revendem tais peças em Portugal – ao que Idalete de novo se opôs. Finalmente, rica e farta de trabalhar, Idalete resolve abandonar a

sua actividade, deixando de utilizar a sua marca. Comente as várias situações descritas.

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PARTE VI – CASOS PRÁTICOS SOBRE OS TÍTULOS DE CRÉDITO

1. A sociedade A, dedicada ao negócio da informática, sacou uma letra de câmbio sobre a sociedade B à ordem do Banco C. Este letra teve

origem num contrato de aquisição de computadores celebrado entre a vendedora A e a compradora B, tendo a última aceite a letra para

pagar o preço respectivo. A letra foi emitida à ordem de C, uma vez que este banco tinha concedido anteriormente um empréstimo a A

destinado a financiar o seu negócio de venda de computadores. Na data do vencimento da letra, quando demandado por C, B recusa-se a

pagar alegando que os computadores vendidos eram defeituosos, pelo que a excepção de não cumpriment o do contrato lhe era oponível.

“Quid juris”?

RESOLUÇÃO

o CLASSIFICAÇÃO DO DIREITO DO PORTADOR DUMA LETRA – o direito do portador C é um direito autónomo (17º

LULL) – princípio da autonomia cartular: o direito dos portadores da letra é um direito independente em relação ao dos

demais, no entanto, esta relação de autonomia só vale em relação às relações mediatas e aos portadores de boa fé – no

caso em apreço o sujeito é um portador mediato, porque não é sujeito da relação fundamental, mas encontrar -se-á de

boa ou má fé – Há dolo directo? Há conluio? E na hipótese de não admitirmos o conluio entre as partes, o portador sabe

que ao aceitar a letra estava a impedir que B invocasse as excepções relativas à RJ fundamental?

o ENGRÁCIA ANTUNES – não há conluio, nem consciência de prejudicar o devedor, porque quando o Banco recebe a

letra não estava em condições de conhecer os efeitos uma vez que ainda não tinham ocorrido os factos que podiam

prejudicar B. Em suma, o B teria de pagar a letra ao credor.

2. Na sequência de uma abertura de crédito bancário, o empresário A aceitou uma letra sacada pelo banco B, tendo esta sido assinada por

sacador e aceitante. Suponha as seguintes hipóteses:

a) Uma vez que no momento da emissão da letra ainda não era possível apurar o montante de crédito utilizado por A, sacador e

aceitante acordaram que a quantia cambiária seria inscrita posteriormente em função do “plafond” de crédito utiliza do em data

determinada. “Qui juris”?

RESOLUÇÃO

o IDENTIFICAÇÃO DO PROBLEMA – situação duma letra em branco que, embora não contenha os elementos

obrigatórios elencados no art. 1º LULL, já dispõe da assinatura das partes, da menção letra e de possíveis

acordos de preenchimento futuro da mesma.

o PRODUÇÃO DE EFEITOS – apenas com o preenchimento das menções em falta, retroagindo-se ao momento do

saque (= data de emissão) – conf. art. 10º LULL relativo à admissibilidade do preenchimento das menções em

falta.

b) Antes dessa data, B inscreveu como quantia cambiária o “plafond” até então utilizado por A, tendo endossado a letra a C, que,

na data de vencimento, vem reclamar de A o pagamento da letra.

RESOLUÇÃO

o PREENCHIMENTO DA LETRA EM BRANCO – dá-se em termos contrários ao fixado pelas partes, em violação

do pacto de preenchimento, por isso estamos perante um preenchimento abusivo (10º LULL) pelo que “não

pode ser motivo de imposição ao portador” mediato e de boa fé como de facto se encontra C (não é titular

da RJF e não se encontra de boa fé).

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o DIREITOS – por um lado, (1) C pode exigir a letra ao sacado-aceitante A que não lhe pode opor o mau

preenchimento da letra; por outro lado, (2) A tem o direito de demandar civilmente (âmbito da

responsabilidade civil – 483º ss. CC) e cambiariamente (no caso de ter garantes) por via de regresso (49º

LULL – se o endossante pagou pode pedir a parte aos seus garantes).

3. A “PIZZA e Co, Lda.” adquiriu um restaurante a A. Para saldar a dívida, o gerente daquela sociedade, X, sacou uma letra a favor de A,

indicando como sacado B, um seu fornecedor. Suponha as seguintes hipóteses (independentes entre si):

a) Mesmo antes de X entregar a letra a A, este apropriou-se dela, endossando-a a Z, que ignorava o sucedido.

RESOLUÇÃO

o NASCIMENTO DA RJ CARTULAR – a sua constituição dá-se com a feitura e subscrição do título (teoria da

criação) ou quando se dá a feitura e consequente entrega voluntaria do título ao respectivo portador (teoria d a

emissão)? A teoria perfilhada pelo DOCENTE é a segunda – NOTE-SE aqui não se trata de uma questão de

autonomia porque tal só se coloca quando já existe um direito constituído, esta é uma questão prévia.

b) Para garantir a dívida proveniente da compra de um automóvel, o tomador A endossa a letra com cláusula “sem regresso” ao

vendedor C, que vem a falecer, deixando como único herdeiro o seu filho D. Este, por sua vez, endossa a letra a E com “cláusula

sem despesas”, o qual, na data do respectivo vencimento, vem apresentar a letra, sucessivamente, a B (que recusa pagar por não

ter aceite a letra), a A (que se recusa sem mais a pagar), a D (que recusa pagar com fundamento nas cláusulas apostas na letra), ao

gerente X (que afirma que a letra foi subscrita em nome da sociedade), e à “Pizza” (que alega ter o restaurante, contrariamente ao

acordado, ter sido entregue sem algum equipamento essencial, v.g., mesas, cadeiras, cozinha).

RESOLUÇÃO

o ANÁLISE – no caso sub iudice, o herdeiro (D) assume a posição de C e torna-se endossado – transmissão do

direito via “sucessão mortis causa”.

o DEDUÇÕES À ARGUMENTAÇÃO FEITA – (1) ARGUMENTO DE B – procede, porque por regra, ressalvados os

casos especiais (que para o caso não importam), não há obrigação de aceite. (2) ARGUMENTO DE A – porque se

opôs a uma cláusula sem regresso esta tem como efeito a exoneração do endossante da sua responsabilidade

de aceite e/ou pagamento da letra (15º/1 LULL) e, partindo-se do princípio que no caso, ele se exonerou de

ambas as obrigações então A deixa de ser garante em via de regresso daquela letra. (3) ARGUMENTO DE D –

ele vai (sub)entrar na posição de A porque as letras transmitem-se mortis causa; em relação ao seu argumento,

ele invoca indistintamente a cláusula sem regresso e sem despesas – a ultima dispensa o portador de lavrar

protesto, tornando mais onerosa a letra, a primeira não foi oposta por ele o que coloca o problema do alcance

exoneratório das responsabilidades cambiarias, mas ela só aproveita ao endossante que a opôs, logo, só

aproveita a A e não a B que só pode invocar a outro cláusula (que o prejudica, inclusive). (4) ARGUMENTO DE

X – coloca-se a questão de saber se ele é ou não o sacador da letra? Quando o gerente de uma sociedade deve

referir uma menção (expressa ou tacita) dessa qualidade de gerente (ex: carimbo da firma social – menção

tacita ≠ menção explicita dessa qualidade – expressa) ele não se assume como tal – conf. Ac. 1/2002 de

6/12/01 que nos diz que «a qualidade de membro de órgão social pode ser deduzida de factos concludentes

nos termos do art. 217º CC, mas tais factos têm de resultar da letra e não de uma outra convenção extra -

cartular». (5) ARGUMENTO DA SOCIEDADE “PIZZA” – partindo do pressuposto que não há trespasse ou que

este foi incumprido então a sociedade não seria titular do restaurante, contudo, conf. 17º/2 LULL não podem

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ser opostos ao portador mediato e de boa fé as nulidades e os vícios ligados à RJF de outros sujeitos, portanto,

teria então de pagar a E – o que conta é a posição actual da letra ou do titular do direito cambiário.

4. Para pagamento de um contrato de transporte celebrado entre ambos, o transportador A sacou à sua própria ordem uma letra sobre o

empresário B, que a aceitou. A endossou depois a letra a favor de C, que, preparando-se para a mobilizar de novo, apôs a sua assinatura

no verso da letra. Todavia, a letra viria a ser-lhe furtada por D que, sem nada acrescentar na letra, a transmitiu a E, que ignorava o

sucedido. No vencimento, E protestou a letra por falta de pagamento: contra quem poderá ela exercer os seus direitos cambiários?

RESOLUÇÃO

o MODALIDADE DO SAQUE – art. 3º/1 LULL.

o ANÁLISE – B é sacado e aceitante; há um endosso a C mediante assinatura no verso da letra (verifica-se o requisito de

forma: pressuposto objectivo)

o LETRA – título à ordem, onde o tomador tem de estar sempre identificado, admitindo-se que circule a título ao portador

o LETRA EM BRANCO – no caso a letra foi endossada por C em branco. O que pode fazer o endossado em branco?

Conferir o disposto no art. 14º LULL: preencher com o seu nome ou de terceiro, remete-la/endossa-la em branco tal e

qual como a recebeu (NOTE-SE o endossado em branco é sempre o ultimo portador, nunca ficando registados os

endossados intermédios).

o PORTADOR LEGÍTIMO – aquele que faça prova do seu direito, mediante a demonstração da serie ininterrupta dos

endossos (16º§1).

o CONCLUSÃO – o B é o devedor principal e se não se sucedesse o que ocorre no caso, este sacador-aceitante teria de

pagar, mesmo na falta do seu garante; mas se o portador da letra sabia ou tinha obrigação de conhecer aquele facto

então os sacadores, em via do regresso, poderiam opor-lhe esta excepção.RESOLUÇÃO

5. Em 1 de Março de 2008, A sacou sobre B e à ordem de C uma letra a seis meses da vista. A letra viria a ser endossada por C a D,

mediante assinatura aposta no rosto da letra, tendo ainda E assinado na face anterior da letra uma declaração nos seguintes termos: “bom

para aval”. Em 1 de Junho de 2008, a letra viria a ser apresentada ao aceite do sacado B, que aceitou pagar apenas metade da quantia

cambiária. Que direitos cambiários assistem ao portador D e como poderá estes exercê-los?

RESOLUÇÃO

o SUJEITOS – no caso em apreço, A é sacador, B sacado e C tomador.

o LETRA – temos uma letra a certo termo de vista (33º LULL) que se vence decorrido o prazo de 6 meses nela previsto,

contado a partir da data do aceite ou protesto (35º LULL) pelo que a letra deveria ser paga até 1/12/2009 (porque

devem ser apresentadas no dia de vencimento ou nos dois dias úteis seguintes, 38º LULL), admitindo-se o pagamento

antes da data de vencimento com o consentimento do portador e por conta do sacado (40º/1 e 2 LULL).

o ENDOSSO – foi feito em branco, sabendo que a assinatura no rosto viola um dos pressupostos objectivos (assinatura no

verso) pelo que este endosso não é valido (13º LULL) porque a declaração não é apropriada e não sendo válida,

considera-se não escrita (12º/1 LULL).

o PAGAMENTO PARCIAL – o sacado pode exigir a quitação ou que se faça menção expressa de tal facto na letra (39º

LULL), podendo o portador da letra exigir a parte cambiária remanescente a qualquer obrigado em via de regresso.

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6. Para garantia de um empréstimo bancário de 50 mil euros, A subscreveu uma livrança em favor de B. Tal documento, todavia, omite

qualquer referência ao vencimento da livrança e ao lugar de pagamento, além de estipular como quantia cartular o valor referido acrescido

de uma cláusula penal. “Quid juris”?

RESOLUÇÃO

o SUJEITOS – o A é subscritor e B tomador.

o LIVRANÇA – não obedece aos requisitos de forma legalmente exigíveis porque falta o requisito da época de pagamento

(75º/3 LULL) – mas esta falta é menor, sendo sanável porque nos termos do art. 76º LULL considera-se «pagável à

vista»; e do lugar de pagamento (75º/4 LULL) – mas tal falta também é relativa na medida em que nos termos do art.

76º LULL se considera o lugar onde foi escrito ou o lugar do domicílio do subscritor.

o CLÁUSULAS PENAIS – são excluídas porque fixam uma obrigação pecuniária eventual, estando dependentes do

incumprimento do aceitante o que tornaria incerta a quantia cambiaria total, contra o disposto no art. 75º/2 LULL, pelo

que o título deve ser havido como inexistente (por falta do pressuposto do art. 75º/2). Mas pode tal título ser exequível

nos termos do art. 46º/1-c CPC? Executando-se portanto a quantia cambiaria certa que já lá se encontra? Ou nega-se? A

jurisprudência devide-se.

7. Em 1 de Outubro de 2009, A celebrou com B um contrato de fornecimento de géneros alimentícios, a realizar em duas tranches, uma

imediata e outra a prazo. Para o efeito, nessa data, A sacou três cheques sobre a conta bancária de que é titular no banco C, que foram

entregues de imediato ao fornecedor B. O primeiro cheque, que não continha o nome do tomador B, foi por este endossado a D mediante

simples assinatura no verso do cheque. O segundo, que indicava B como tomador, foi emitido com data de 15 de Outubro (altura da

realização da segunda tranche de fornecimento): todavia, B resolveu-o apresentar de imediato ao banco, que lho pagou. “Quid juris”?

RESOLUÇÃO

o PRIMEIRO CHEQUE – os endossos serão validos porque a lei o permite no art. 14º/1, 16º e 17º/2 LUC, mas seria

desnecessário para legitimar a posse do segundo portador.

o SEGUNDO CHEQUE – é um título pagável à vista que deve ser apresentado a pagamento pelo portador, num prazo de 8

dias a contar da data de emissão que deve em princípio ser pago pelo sacado (maxime, Banco), embora tal

cumprimento seja voluntario, podendo o sacador do cheque emitir uma contra-ordem (28º e 29º LUC).

Page 18: RESOLUÇÃO DE HIPÓTESES PRÁTICAS DE DIREITO COMERCIAL-1 (1)

18 | P á g i n a

PARTE VII – HIPÓTESES PRÁTICAS DE EXAMES

I.

a) RESOLUÇÃO:

NOÇÃO DE COMÉRCIO – (a) EM SENTIDO ECONÓMICO, equivale à actividade de intermediação de trocas – entre a produção e

o consumo (circulação de bens e serviços) – no caso a venda de perfumes&águasdecolónia é comércio em sentido económico

porque media a produção e o consumo. (b) EM SENTIDO JURÍDICO, trata-se duma empresa comercial porque objectivamente

enquadrável na letra do art. 230º§2 CCOM, praticando de forma reiterada e habitual compras e vendas comerciais (463º).

NOÇÃO DE ACTO DE COMÉRCIO – são actos (objectivamente) comerciais todos os actos praticados por comerciantes ou não

comerciantes, isoladamente ou integrados na actividade mercantil, que se encontrem exclusiva ou simultaneamente regulados

na lei comercial, e ainda todos os outros actos que com um destes possuam concretamente uma analogia substancial (2º/1ª

parte); igualmente são havidos como actos (subjectivamente) comerciais todos aqueles que forem praticados pelos comerciantes,

salvo se actos que (por definição e em abstracto) são insusceptíveis de demonstrarem qualquer conexão com o exercício do

comércio geral e desde que deles não resulte serem alheios ao exercício do comércio do respectivo autor no caso concreto (2º/2ª

parte) – no caso sub iudice, as vendas são objectivamente, mas subjectivamente comerciais.

CLASSIFICAÇÃO DO SUJEITO PIVETE: COMERCIANTE – trata-se duma empresa comercial (13º/2 e 230º§2 CCOM),

nomeadamente, trata-se duma sociedade em nome colectivo (dedução que se retira do prefixo “Lda.” ; 1º/2 CSC) – são

«comerciantes natos» pois são constituídas para a prática de actos comerciais (1º/2 CSC), sabendo que a aquisição do título de

comerciante é consequência automática da obtenção de personalidade jurídica (5º CSC).

REGIME DA SOLIDARIEDADE PASSIVA – (1) NOÇÃO – porque no caso a dívida é comercial porque resulta da prática de actos

objectivos de comércio, existindo uma pluralidade de devedores, a parte credora poderá exigir de qualquer um deles

individualmente a totalidade da prestação em dívida, ficando liberados os restantes perante o credor comu m, sem prejuízo do

direito de regresso daquele que cumpre a prestação (100º + 112º/1 CC) – ideia do “favor creditorii” ou da tutela do crédito do

credor. (2) ALCANCE – a regra é supletiva porque pode valer o regime da conjunção quando as partes assim o tenham

convencionado, sem prejuízo dos casos em que o legislador cominou imperativamente o regime da solidariedade passiva (o

que não parece ser o caso!). (3) REGIME DAS OBRIGAÇÕES COMERCIAIS MISTAS – se unilateralmente comerciais, vale a regra

geral da conjunção para os devedores em relação aos quais o contrato não reveste natureza comercial ( 100º§ÚNICO + 513º CC).