Resenha Diaspora

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RESENHA CRÍTICA Hall, Stuart. A identidade cultural na pós modernidade/ tradução Tomaz Tadeu da Silva, Guacira Lopes Louro-11. Ed.- Rio de janeiro: DP&A, 2006. 1-Algo acerca do autor Stuart Hall nasceu em 3 de fevereiro de 1932 em Kingston, Jamaica. É um teó- rico cultural que trabalhou no Reino Unido. Ele contribuiu com obras chave pa- ra os estudos da cultura e dos meios de comunicação, assim como para o de- bate político. Trabalhou na Universidade de Birmingham e tornou-se o perso- nagem principal do Birmingham Center for Cultural Studies. Entre 1979 e 1997, Hall foi professor na Open University. Seu trabalho é centrado principalmente nas questões de hegemonia e de estudos culturais a partir de uma posição pós-gramsciana. Hall concebe o uso da linguagem como determinado por uma moldura de poderes, instituições, política e economia. Essa visão apresenta as pessoas como “produtores” e “consumidores” de cultura ao mesmo tempo. Ou- tras obras: Da Diáspora: Identidade e Mediações Culturais Questões de identidade cultural 2-Perspectiva teórica da obra Dentro dos Estudos Culturais, o livro analisa a crise na pós-modernidade, to- mando como centrais as mudanças estruturais que fragmentam e desconstrói as identidades culturais de classe, etnia, raça, nacionalidade e gênero. 3- As idéias centrais da Obra Se até no século XX tínhamos uma sociedade moderna sólida por conta das paisagens culturais de classe, gênero, sexualidade, etnia, raça e nacionalidade, traçados por esta mesma sociedade, fornecendo-nos igualmente sólidas locali- zações como indivíduo social. No final daquele tempo as paisagens culturais começaram a se fragmentar e modificar, transformando também nossas identi- dades pessoais, abalando a ideia que temos de nós mesmos como sujeitos integrados. A essa perda de um “sentido de si mesmo” estável, o autor deno- mina deslocamento ou descentração do sujeito. A descentração dos indivíduos tanto de seu lugar no mundo social e cultural quanto de si mesmo, constitui uma “crise de identidade” para o indivíduo. Es- ses processos de mudança tomados em conjunto, representam um processo de transformação e nos leva a perguntar se não é a própria modernidade que está sendo transformada. Distinguem-se três concepções de identidades:

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RESENHA CRÍTICA Hall, Stuart. A identidade cultural na pós – modernidade/ tradução Tomaz Tadeu da Silva, Guacira Lopes Louro-11. Ed.- Rio de janeiro: DP&A, 2006. 1-Algo acerca do autor Stuart Hall nasceu em 3 de fevereiro de 1932 em Kingston, Jamaica. É um teó-rico cultural que trabalhou no Reino Unido. Ele contribuiu com obras chave pa-ra os estudos da cultura e dos meios de comunicação, assim como para o de-bate político. Trabalhou na Universidade de Birmingham e tornou-se o perso-nagem principal do Birmingham Center for Cultural Studies. Entre 1979 e 1997, Hall foi professor na Open University. Seu trabalho é centrado principalmente nas questões de hegemonia e de estudos culturais a partir de uma posição pós-gramsciana. Hall concebe o uso da linguagem como determinado por uma moldura de poderes, instituições, política e economia. Essa visão apresenta as pessoas como “produtores” e “consumidores” de cultura ao mesmo tempo. Ou-tras obras:

Da Diáspora: Identidade e Mediações Culturais

Questões de identidade cultural

2-Perspectiva teórica da obra

Dentro dos Estudos Culturais, o livro analisa a crise na pós-modernidade, to-mando como centrais as mudanças estruturais que fragmentam e desconstrói as identidades culturais de classe, etnia, raça, nacionalidade e gênero.

3- As idéias centrais da Obra

Se até no século XX tínhamos uma sociedade moderna sólida por conta das paisagens culturais de classe, gênero, sexualidade, etnia, raça e nacionalidade, traçados por esta mesma sociedade, fornecendo-nos igualmente sólidas locali-zações como indivíduo social. No final daquele tempo as paisagens culturais começaram a se fragmentar e modificar, transformando também nossas identi-dades pessoais, abalando a ideia que temos de nós mesmos como sujeitos integrados. A essa perda de um “sentido de si mesmo” estável, o autor deno-mina deslocamento ou descentração do sujeito.

A descentração dos indivíduos tanto de seu lugar no mundo social e cultural quanto de si mesmo, constitui uma “crise de identidade” para o indivíduo. Es-ses processos de mudança tomados em conjunto, representam um processo de transformação e nos leva a perguntar se não é a própria modernidade que está sendo transformada.

Distinguem-se três concepções de identidades:

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a) Sujeito do Iluminismo- baseado numa concepção de pessoa humana como um indivíduo totalmente centrado, unificado, e de ação cujo centro consistia num núcleo interior, que emergia deste o nascimento e ao longo de toda sua vida, permanecendo totalmente o mesmo.

b) Sujeito Sociológico- reflete a complexidade do mundo moderno e a consci-ência de que este núcleo moderno não era autônomo e auto-suficiente, mas isto era formado na relação com outras pessoas importantes para ele.

c) Sujeito pós-moderno- a identidade torna-se uma celebração móvel, formada e transformada continuamente em relação às formas pelas quais somos repre-sentados ou interpelados nos sistemas culturais que nos rodeiam.

A globalização é outro aspecto da questão da identidade que está relacionada ao caráter da mudança da modernidade. As sociedades modernas são consti-tuídas em mudanças constantes, rápidas e permanentes, e isto a diferencia da sociedade tradicional. Nesta sociedade moderna, não há nenhum centro, ne-nhum princípio articulador ou organizador único e não se desenvolvem de a-cordo com o desdobramento de uma única causa ou lei. Ela está constante-mente sendo descentrada por forças fora de si mesmas.

As transformações associadas à modernidade tardia, diz Hall, libertaram o indi-víduo de seus apoios estáveis nas tradições e nas estruturas. Antes se acredi-tava que estas eram divinamente estabelecidas; não estavam, portanto, sujei-tas a mudanças fundamentais.

À medida que as sociedades modernas se tornavam mais complexas elas ad-quiriam uma força mais coletiva e social. O indivíduo passou a ser visto como mais localizado e definido no interior de grandes estruturas e formações sus-tentadoras da sociedade.

O que aconteceu à concepção do sujeito moderno, na modernidade tardia não foi simplesmente sua degradação, mas seu deslocamento. O descentramento final do sujeito cartesiano ocorreu por conta de cinco grandes avanços na teo-ria social e nas ciências humanas: Tradições do pensamento marxista; desco-berta do inconsciente por Freud; Trabalhos do lingüista estrutural Ferdinand de Saussure; Trabalho de Michel Foucault (poder disciplinar); Impacto do feminis-mo.

As culturas nacionais se constituem em uma das principais fontes de identida-de cultural. Pensamos neste tipo de cultura como se fosse parte de nossa natu-reza essencial. Porém as identidades nacionais não são coisas com as quais nascemos, mas são formadas e transformadas no interior das representações. Em vez de pensar as culturas nacionais como unificadas, deveríamos pensá-la como constituindo um dispositivo discursivo que representa a diferença como unidade ou identidade. Elas são atravessadas por profundas divisões e dife-renças internas, sendo unificadas apenas através do exercício de diferentes formas de poder cultural. As identidades nacionais não subordinam todas as outras formas de diferenças e não estão livres do jogo de poder, de divisões e contradições internas, de lealdades e de diferença sobrepostas.

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Alguns teóricos culturais argumentam que a tendência em direção a uma maior interdependência global está levando ao colapso de todas as identidades cultu-rais fortes e está produzindo uma fragmentação de códigos culturais, uma mul-tiplicidade de estilos, uma ênfase no efêmero, no flutuante, no impermanente, na diferença e no pluralismo cultural.

Quando mais a vida social se torna mediada pelo mercado global de estilos, lugares e imagens, pelas viagens internacionais, pelas imagens da mídia e pe-los sistemas de comunicação globalmente interligados, mais as identidades se tornam desvinculadas, de tempos, lugares histórias e tradições específicas.

No interior do discurso do consumismo global, as diferenças e as distinções culturais, que até então definiam a identidades, ficam reduzidas a uma espécie de língua franca internacional ou de moeda global, em termos das quais todas as tradições específicas e todas as diferentes identidades podem ser traduzi-das. Este fenômeno é conhecido como “homogeneização cultural”.

Ao lado da tendência em direção à homogeneização global, há também uma fascinação com a diferença e com a mercatilização da etnia e da alteridade. Há juntamente com o impacto global um novo interesse pelo local, produzindo no-vas identificações globais e novas identificações locais.

A globalização está tendo efeitos em toda parte, incluindo o Ocidente, e a “peri-feria” também está vivendo seu efeito pluralizador, embora num ritmo mais len-to e desigual.

A tendência em direção à “homogeneização global” tem seu paralelo num po-deroso revival da etnia, algumas vezes de variedades mais híbridas ou simbóli-cas, mas também frequentemente das variedades exclusivas ou essencialistas.

4- Conclusão

Com uma linguagem objetiva e esclarecedora, Stuart Hall explora algumas questões sobre a identidade cultural na modernidade tardia apresentando uma afirmação de que as identidades modernas estão sendo descentradas, trans-formando as identidades pessoais, abalando a ideia que temos de nós mesmos como sujeitos integrados e promovendo uma “crise de identidade”.

A apresentação de um sujeito pós-moderno, com uma identidade formada e transformada continuamente em relação às formas pelas quais são represen-tados nos sistemas culturais que os rodeiam, mostra a necessidade de adapta-ção deste sujeito em uma sociedade que influi e é influenciada pela globaliza-ção libertando-se de seus apoios estáveis nas tradições e nas estruturas, des-locando as identidades culturais nacionais.

O autor mostra o efeito contestador e deslocador da globalização nas identi-dades centradas e fechadas de uma cultura nacional. Esse efeito verdadeira-

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mente pluralizante altera as identidades fixas, tornando-as menos fixas, plurais, mais políticas e diversas.

É nesse movimento/deslocamento que emerge a concepção de culturas híbri-das (entre a tradição e a tradução) como um dos diversos tipos de identidades destes tempos de modernidade tardia.

Nas palavras do autor: "a globalização não parece estar produzindo nem o tri-unfo do global nem a persistência, em sua velha forma nacionalista, do local. Os deslocamentos ou os desvios da globalização mostram-se, afinal, mais va-riados e mais contraditórios do que sugerem seus protagonistas ou seus opo-nentes" (p.97).

Este livro é um convite ao debate do movimento/deslocamento produzido pela globalização nas identidades culturais na modernidade tardia/pós-modernidade. Neste sentido, a concepção "descentramento do sujeito" ganha sentido, pois diante desses intensos fluxos produzidos/introduzidos nas paisa-gens culturais, estas se fragmentam/pluralizam e com elas e a partir delas tam-bém o sujeito.

A noção de híbridos culturais pode em muito contribuir com a educação tor-nando todos os envolvidos com ela mais abertos aos fenômenos plurais e di-versos que se manifestam nos respectivos saberes/fazeres dos sujeitos indivi-duais e coletivos tanto dentro da escola como na sociedade em que ela está inserida. O livro nos leva a rever nossas formas culturais e nossa capacidade de interpretação do mundo pós-moderno.