Qualidade de vida de indivíduos submetidos à reabilitação vestibular

download Qualidade de vida de indivíduos submetidos à reabilitação vestibular

of 8

Transcript of Qualidade de vida de indivíduos submetidos à reabilitação vestibular

Braz J Otorhinolaryngol. 2009;75(3):387-94.

ARTIGO ORIGINAL ORIGINAL ARTICLE

Qualidade de vida de indivduos submetidos reabilitao vestibularOlvia Helena Gomes Patatas1, Cristina Freitas Ganana2, Fernando Freitas Ganana3

Quality of life of individuals submitted to vestibular rehabilitationPalavras-chave: qualidade de vida, reabilitao, tontura, vertigem. Keywords: quality of life, rehabilitation, dizziness, vertigo.

Resumo / Summary

esordens do equilbrio comprometem atividades sociais, familiares e profissionais. A reabilitao vestibular pode reduzir o impacto dessas desordens na qualidade de vida dos indivduos vertiginosos. Objetivo: Verificar a influncia da reabilitao vestibular sobre a qualidade de vida dos indivduos, correlacionando-a com gnero, idade, resultado da vectoeletronistagmografia computadorizada e presena de vertigem. Forma de Estudo: Retrospectivo. Material e Mtodo: Vinte e dois indivduos foram submetidos reabilitao vestibular personalizada e ao Dizziness Handicap Inventory - DHI brasileiro - pr e ps-reabilitao vestibular. Os resultados desse questionrio foram correlacionados com as variveis gnero, idade, avaliao vestibular e presena de tontura do tipo vertigem. Resultados: Todos os escores do DHI diminuram significantemente aps reabilitao vestibular. No houve diferena entre gneros; adultos e idosos; sndromes vestibulares perifricas Irritativas, Deficitrias e exames Normais; e presena ou no de vertigem. Concluso: Todos os indivduos obtiveram melhora na qualidade de vida aps a reabilitao vestibular personalizada.

D

B

alance disorders affect social, family and professional activities. Vestibular rehabilitation can reduce the impact of these disorders on the quality of life of individuals with vertigo. Aim: to study the influence of vestibular rehabilitation on the quality of life of individuals, correlating it with gender, age, results from computerized vectoelectronystagmography and vertigo. Study type: Retrospective. Materials and Methods: Twenty-two individuals were submitted to customized vestibular rehabilitation and the Brazilian Dizziness Handicap Inventory - DHI before and after vestibular rehabilitation. Results from this questionnaire were correlated with gender, age, vestibular assessment and the presence of vertigo. Results: all the DHI scores reduced significantly after vestibular rehabilitation. There were no differences among genders; adults and elderly patients; irritative peripheral vestibular syndromes; deficiency syndromes and normal exams; the presence or absence of vertigo. Conclusion: all the individuals had improvements in their quality of life after customized vestibular rehabilitation.

2

1 Especializao em Distrbios da Com. Humana, Mestranda Programa Dist. da Com. Humana UNIFESP. Doutora em Cincias pelo Programa de ps-graduao dos Distrbios da Comunicao Humana da UNIFESP-EPM, Professor Adjunto Substituto da disciplina Distrbios da Audio da Graduao em Fonoaudiologia da UNIFESP-EPM. 3 Doutor em Otorrinolaringologia. Professor Adjunto, Responsvel pelo Setor de Reabilitao Vestibular da Disciplina de Otoneurologia da UNIFESP-EPM. Professor colaborador do Programa de Mestrado em Reabilitao Vestibular e Incluso Social da UNIBAN. Universidade Federal de So Paulo - Escola Paulista de Medicina. Endereo para correspondncia: Olvia Helena Gomes Patatas - Rua Bom Jesus de Terra Preta 62 Terra Preta Mairipor SP 07600-000. Este artigo foi submetido no SGP (Sistema de Gesto de Publicaes) da BJORL em 1 de janeiro de 2008. cod 5655 Artigo aceito em 8 de janeiro de 2008.

BRAZILIAN JOURNAL OF OTORHINOLARYNGOLOGY 75 (3) MAIO/JUNHO 2009 http://www.rborl.org.br / e-mail: [email protected]

387

INTRODUO O equilbrio corporal, capacidade de manter-se ereto ou executar movimentos com o corpo, sem oscilaes ou quedas, fundamental para adotar e manter posturas, alm de realizar movimentos com harmonia e conforto fsico e mental. Distrbios que comprometam essa capacidade podem gerar manifestaes clnicas importantes como o desequilbrio, desvio da marcha, instabilidade, sensao de flutuao, quedas, entre outros, sendo a vertigem a queixa mais comum.1,2 Diversos autores relataram que a intensidade, a durao e a prevalncia das manifestaes clnicas que acompanham as vestibulopatias frequentemente comprometem as atividades sociais, familiares e profissionais e trazem prejuzos fsicos, financeiros e psicolgicos, como a perda da autoconfiana, depresso e frustrao, alm de tambm provocar a diminuio da concentrao e do rendimento, ocasionando a piora da Qualidade de Vida.1,3-5 Visando avaliar a Qualidade de Vida (QV) ou a capacidade funcional dos pacientes, vrios instrumentos tm sido propostos e utilizados. Entre eles, merece destaque o Dizziness Handicap Inventory (DHI), elaborado e validado por e Jacobson e Newman6, o qual avalia a autopercepo dos efeitos incapacitantes impostos pela tontura. Tal instrumento foi traduzido e culturalmente adaptado por Castro et al.7, DHI brasileiro. Acredita-se que a avaliao da QV pode ser utilizada na prtica diria para mensurar a contribuio do manejo clnico na diminuio do impacto das doenas crnicas no dia-a-dia do paciente.8,9 Uma das opes atualmente bastante utilizada para o tratamento do paciente vertiginoso a Reabilitao Vestibular (RV), a qual visa diminuir a tontura e a instabilidade corporal e tem se mostrado importante e efetiva estratgia no tratamento do paciente com desordens do equilbrio corporal, melhorando a competncia e o bem-estar na realizao de atividades do dia-a-dia e proporcionando uma acentuada melhora na qualidade de vida.1,3,4,9-14 Acredita-se que o sucesso da RV pode ser influenciado por alguns fatores como idade do paciente, voluntariedade quanto prtica dos exerccios, estado emocional, medicamentos e presena de doenas do sistema nervoso central que possam comprometer as estruturas relacionadas neuroplasticidade do sistema vestibular.4 A anlise dos resultados dos programas de RV importante. Uma maneira eficaz de se mensurar o sucesso da interveno nas doenas crnicas seria a utilizao sistemtica de instrumentos de avaliao da QV, como o DHI, antes, durante e aps o perodo de tratamento. A literatura refere que o DHI seria um bom instrumento para avaliao, acompanhamento e reavaliao do sucesso da reabilitao. No entanto, ainda existem poucos estudos relacionados qualidade de vida de indivduos com desordens vestibulares.

Sabendo-se da importncia da RV na terapia otoneurolgica comprovada pela literatura pertinente e do grande nmero de pacientes que se queixam de tonturas e outros sintomas associados, este trabalho tem por objetivo verificar a influncia da RV sobre a Qualidade de Vida dos indivduos, correlacionando as variveis analisadas no DHI com aspectos como gnero, idade, concluso vectoeletronistagmografia computadorizada e presena ou no de vertigem. MATERIAL E MTODO Este projeto foi analisado e aprovado pelo Comit de tica em Pesquisa sob o no 0304/05. Foram analisados os pronturios de 22 pacientes atendidos no Ambulatrio da Disciplina de Otoneurologia e submetidos reabilitao vestibular nos anos de 2002 a 2005. A amostra foi constituda por 13 homens (59%), com idades entre 16 e 87 anos, mdia de 59,2 anos; e nove mulheres (41%), com idades entre 36 e 77 anos, mdia de 56,3 anos. Todos os pacientes foram submetidos anamnese, avaliao otorrinolaringolgica, audiolgica, com audiometria tonal e vocal, imitanciometria e exame vestibular com a Vectonistagmografia Digital, antes de ser iniciada a Reabilitao Vestibular (RV). Os pacientes apresentavam queixas de tontura e hiptese diagnstica de sndrome vestibular perifrica crnica (tontura h mais de 3 meses). Esses indivduos responderam ao DHI brasileiro7 - Dizziness Handicap Inventory - no incio e no final do processo teraputico. Este questionrio composto por vinte e cinco questes com as seguintes opes de respostas: sim, no ou s vezes. Para cada resposta afirmativa foram atribudos quatro pontos, para cada negativa, zero ponto e para cada resposta s vezes, contou-se dois pontos. O escore mximo de cem pontos, sendo que quanto maior a pontuao, maior a interferncia da tontura na QV do paciente. Trs aspectos so analisados separadamente, sendo que a soma dos escores destes ao final nos d o escore total. Assim, existem 7 questes que avaliam os aspectos fsicos, 9, os aspectos emocionais e 9, os funcionais (Anexo I). Estes aspectos tm um envolvimento importante na qualidade de vida dos indivduos vertiginosos.7,8 A RV foi constituda de exerccios escolhidos de forma personalizada, de acordo com as queixas apresentadas pelo paciente, quadro clnico e achados vestibulometria. Os exerccios propostos inicialmente poderiam ser modificados de acordo com a evoluo do quadro durante a terapia, com a melhora ou no dos sintomas vestibulares. Os exerccios utilizados foram retirados primordialmente dos protocolos: de Cawthorne15, Cooksey16, Protocolos de Herdman - Exerccios para incrementar a estabilizao da postura esttica e dinmica, para Incrementar Adaptao

BRAZILIAN JOURNAL OF OTORHINOLARYNGOLOGY 75 (3) MAIO/JUNHO 2009 http://www.rborl.org.br / e-mail: [email protected]

388

ANEXO I: Questionrio de incapacitao causado pela tontura/DHI brasileiro Identificao do Paciente Nome:_______________________________________Idade (anos):______Data de Nascimento:_____/_____/_____ Endereo: __________________________________________________________________________________ Telefones:_______________________HD:_________________________________________________ DHI SIM ASPECTO QUESTES (4) Fsico Emocional Funcional Fsico Funcional Funcional Funcional Fsico Emocional Emocional Fsico Funcional Fsico Funcional Emocional Funcional Fsico Emocional Funcional Emocional Emocional Emocional Emocional Funcional Fsico 1. Olhar para cima piora o seu quadro de tontura? 2. Por causa da sua doena, voc se sente frustrado? 3. Por causa da sua doena, voc restringe suas viagens tursticas ou trabalho? 4. Caminhar ao longo dos corredores de um supermercado piora seu quadro clnico? 5. Por causa do seu problema, voc tem dificuldade para deitar-se na cama ou levantar-se dela? 6. A sua doena restringe sua participao em atividades sociais, como sair para jantar, ir ao cinema, danar ou ir a festas? 7. Por causa da sua doena, voc tem dificuldade para ler? 8. Atividades de esporte ou limpeza domstica pioram seu quadro clnico? 9. Por causa da sua doena, voc tem medo de sair de casa sem algum acompanhante? 10. Por causa da sua doena, voc se sente desconfortvel (envergonhado) na frente dos outros? 11. Movimentos rpidos da cabea pioram seu estado clnico? 12. Por causa da sua doena, voc evita lugares altos? 13. Mudar de posio na cama, quando deitado (a), piora seu quadro clnico? 14. Por causa da sua doena, torna-se difcil realizar atividades domsticas mais vigorosas? 15. Por causa da sua doena, voc tem medo de que pessoas pensem que voc est embriagado? 16. Por causa da sua doena, difcil para voc andar desacompanhado? 17. Caminhar na calada piora o seu quadro clnico? 18. Por causa da sua doena, sua concentrao fica prejudicada? 19. Por causa da sua doena, voc tem dificuldade para andar no escuro? 20. Por causa da sua doena, voc tem medo de ficar em casa desacompanhado (a)? 21. Por causa da sua doena, voc se sente prejudicado? 22. Por causa da sua doena, voc j teve problemas de relacionamento com amigos ou familiares? 23. Por causa da sua doena, voc fica deprimido? 24. A sua doena interfere nas suas atividades profissionais? 25. Debruar-se piora seu quadro clnico? RESPOSTAS S VEZES PONTUAO (2) (0) NO

ESCORE Subescala fsica:___________pontos Subescala funcional:________pontos Subescala emocional:_______pontos TOTAL: ________pontos

BRAZILIAN JOURNAL OF OTORHINOLARYNGOLOGY 75 (3) MAIO/JUNHO 2009 http://www.rborl.org.br / e-mail: [email protected]

389

Vestibular e Estratgias Alternativas para Incrementar a Estabilizao do Olhar17; Exerccios de Davis e OLeary18; Exerccios da Associazione Otologi Ospedalieri19. A reabilitao foi administrada uma vez por semana, na clnica, por fonoaudiloga treinada, sendo os pacientes instrudos a realizar os exerccios em casa, duas ou trs vezes ao dia, por no mnimo 6 semanas. Porm, dependendo da evoluo do paciente ou de fatores no-relacionados diretamente ao tratamento, os pacientes, eventualmente, realizaram um nmero maior ou menor de sesses. Foi calculada a mdia aritmtica dos escores obtidos pelos pacientes aplicao do DHI brasileiro, quanto aos aspectos fsico, emocional e funcional e quanto ao escore total antes da RV, sendo subtrada da mdia dos escores obtidos depois da RV, para se obter um valor indicativo do grau de melhora percebida pelos pacientes. Assim, quanto maior o valor dessa diferena pr e ps-RV, maior a melhora na qualidade de vida proporcionada pela RV. Essa diferena pr e ps-RV foi analisada em relao s variveis gnero, idade, resultado da vectoeletronistagmografia computadorizada, presena de tontura do tipo vertigem. Para este trabalho foram utilizados os testes no paramtricos de Wilcoxon, Mann-Whitney, Kruskal-Wallis, Correlao de Spearman e Teste de Correlao. Na complementao da analise descritiva, fizemos uso da tcnica de Intervalo de Confiana para mdia. Os valores de comparao estatisticamente significante (p