PROJETO PEDAGÓGICO DE LEITURA 2012 -...

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PROJETO PEDAGÓGICO DE LEITURA 2012 Histórias que moram na gente Macaé 2012 SUBSECRETARIA DE ENSINO FUNDAMENTAL COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA DO ENSINO FUNDAMENTAL COORDENAÇÃO DE ÁREA 6º AO 9º - LÍNGUA PORTUGUESA

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PROJETO PEDAGÓGICO DE LEITURA – 2012

Histórias que moram na gente

Macaé

2012

SUBSECRETARIA DE ENSINO FUNDAMENTAL

COORDENAÇÃO PEDAGÓGICA DO ENSINO FUNDAMENTAL

COORDENAÇÃO DE ÁREA – 6º AO 9º - LÍNGUA PORTUGUESA

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Sumário

Introdução ............................................................................................................. 3

1. O Conto ................................................................................................................. 4

2. Sugestões de Atividades: 6º e 7º anos .................................................................... 7

3. Sugestões de Atividades: 8º e 9º anos .................................................................... 26

4. Sugestões de contos: 6º ano ................................................................................... 40

5. Sugestões de contos: 7º ano .................................................................................... 46

6. Sugestões de contos: 8º ano ................................................................................... 52

7. Sugestões de contos: 9º ano ................................................................................... 60

Conclusão .............................................................................................................. 72

Referências teóricas ............................................................................................... 73

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Introdução

Dando continuidade ao nosso Projeto de Leitura, iniciamos, o terceiro bimestre

com o tema Histórias que moram na gente. Trabalharemos o conto, contemplando os

mais diversos autores da Literatura Brasileira, dos mais clássicos aos mais

contemporâneos.

Como o próprio tema remete, cada um de nós sempre tem uma história para

contar, inspirados em vivências pessoais ou em casos que ouvimos desde criança,

passados de geração a geração. São essas histórias que pretendemos resgatar dos

nossos alunos. O que cada um gostaria de contar?

Da mesma forma que o projeto do segundo bimestre, colocamos, aqui,

sugestões de atividades dividas em dois blocos: 6º e 7º anos / 8º e 9º anos. Essas

atividades permitirão que cada professor possa trabalhar com tranquilidade esse

gênero em sala de aula. Também há sugestões de contos apropriados para cada ano

de escolaridade.

Esperamos lindos frutos!

Boa leitura e bom trabalho!

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1. O conto

Muitos autores afirmam que o gênero conto nasceu antes mesmo da própria arte

literária. Seu surgimento, então, teria ocorrido graças às narrativas orais que os

homens repassavam de geração a geração, mesclando aspectos da sua realidade com

traços imaginários e crenças populares.

Massaud de Moisés(1999) coloca que a partir do século XVI o conto começou a dividir

espaço com o termo “novela”, de origem italiana, mas acaba adquirindo conotação

específica, principalmente a partir do século XIX. A partir de então adquire autonomia

em relação à novela e ao romance. Ganha categoria literária, estrutura diferenciada e

passa a ser amplamente cultivado.

A fim de diferenciar os diversos tipos de narração, utilizamos os conceitos do site

infoescola.com.br:

Romance: em geral é um tipo de texto que possui um núcleo

principal, mas não possui apenas um núcleo. Outras tramas vão se

desenrolando ao longo do tempo em que a trama principal acontece. O

Romance se subdivide em diversos outros tipos: Romance policial,

Romance romântico, etc. É um texto longo, tanto na quantidade de

acontecimentos narrados quanto no tempo em que se desenrola o

enredo.

Novela: muitas vezes confundida em suas características com o

Romance e com o Conto, é um tipo de narrativa menos longa que o

Romance, possui apenas um núcleo, ou em outras palavras, a narrativa

acompanha a trajetória de apenas uma personagem. Em comparação

ao Romance, se utiliza de menos recursos narrativos e em comparação

ao Conto tem maior extensão e uma quantidade maior de personagens.

OBS: A telenovela é um tipo diferente de narrativa. Ela advém dos

folhetins, que em um passado não muito distante eram publicados em

jornais. O Romance provém da história, das narrativas de viagem, é

herdeiro da epopeia. A novela, por sua vez, provém de um conto, de

uma anedota, e tudo nela se encaminha para a conclusão.

Conto: É uma narrativa curta. O tempo em que se passa é reduzido e

contém poucas personagens que existem em função de um núcleo. É o

relato de uma situação que pode acontecer na vida das personagens,

porém não é comum que ocorra com todo mundo. Pode ter um caráter

real ou fantástico da mesma forma que o tempo pode ser cronológico

ou psicológico.

Crônica: por vezes é confundida com o conto. A diferença básica

entre os dois é que a crônica narra fatos do dia a dia, relata o cotidiano

das pessoas, situações que presenciamos e já até prevemos o

desenrolar dos fatos. A crônica também se utiliza da ironia e às vezes

até do sarcasmo. Não necessariamente precisa se passar em um

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intervalo de tempo, quando o tempo é utilizado, é um tempo curto, de

minutos ou horas normalmente.

Fábula: É semelhante a um conto em sua extensão e estrutura

narrativa. O diferencial se dá, principalmente, no objetivo do texto,

que é o de dar algum ensinamento, uma moral. Outra diferença é que

as personagens são animais, mas com características de

comportamento e socialização semelhantes às dos seres humanos.

Parábola: é a versão da fábula com personagens humanas. O objetivo

é o mesmo, o de ensinar algo. Para isso são utilizadas situações do dia

a dia das pessoas.

Apólogo: é semelhante à fábula e à parábola, mas pode se utilizar as

mais diversas e alegóricas personagens: animadas ou inanimadas,

reais ou fantásticas, humanas ou não. Da mesma forma que as outras

duas, ilustra uma lição de sabedoria.

Anedota: é um tipo de texto produzido com o objetivo de motivar o

riso. É geralmente breve e depende de fatores como entonação,

capacidade oratória do intérprete e até representação. Nota-se então

que o gênero se produz na maioria das vezes na linguagem oral, sendo

que pode ocorrer também em linguagem escrita.

Lenda: é uma história fictícia a respeito de personagens ou lugares

reais, sendo assim a realidade dos fatos e a fantasia estão diretamente

ligadas. A lenda é sustentada por meio da oralidade, torna-se

conhecida e só depois é registrada através da escrita. O autor, portanto

é o tempo, o povo e a cultura. Normalmente fala de personagens

conhecidas, santas ou revolucionárias.

Nadia B. Gotlib (1987), inspirada nos estudos de Cortázar (apud Gotlib, 1987), cita três

concepções para a palavra conto: 1. relato de um acontecimento; 2. Narração oral ou

escrita de um acontecimento falso; 3. fábula que se conta às crianças para diverti-las.

O que há de comum é que todas essas concepções consideram o conto como uma

narrativa. Assim:

[...] toda narrativa apresenta: 1. uma sucessão de acontecimentos:há

sempre algo a narrar; 2. de interesse humano: pois é material de

interesse humano , de nós para nós, acerca de nós: “e é em relação

com um projeto humano que os acontecimentos tomam significação

e se organizam em uma série temporal estruturada”; 3. e tudo “na

unidade de uma mesma ação”. No entanto, há vários modos de se

construir esta “unidade de uma mesma ação”, neste “projeto

humano” com uma “sucessão de acontecimentos”. (Gotlib, 1987. p.6)

Quanto à sua relação com o real, o conto, segundo a autora, não remete somente a

acontecimentos reais, ao contrário, apresenta uma diferença tênue entre realidade e

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ficção, podendo um texto desse gênero conter graus de proximidade ou afastamento

em relação ao real, conforme a intencionalidade discursiva do autor.

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Sugestões de Atividades: 6º e 7º

anos

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Sugestão 11

Dados da Aula

O que o aluno poderá aprender com esta aula

Identificar os elementos organizacionais e estruturais dos contos Identificar a finalidade desse gênero textual. Conhecer as práticas sociais de produção e circulação dos contos. Conhecer diferentes tipos de contos

Duração das atividades

4 aulas de 50 minutos

Conhecimentos prévios trabalhados pelo professor com o aluno

Os alunos precisam conhecer alguns elementos que compõem uma narrativa.

Estratégias e recursos da aula

Uma breve definição dos contos e seus diferentes tipos:

Os contos, assim como as lendas, os mitos e as fábulas são tipos de narrativas originárias desde as mais antigas civilizações. Esses povos, através das histórias que contavam, passavam ensinamentos e preservavam sua cultura. Graças à tradição oral e, mais tarde, ao texto impresso, a arte de contar histórias foi passada de geração a geração, constituindo, até os dias de hoje, importantes fontes de informações para entendermos a história das civilizações. Dentro deste contexto é importante perceber o trabalho dos compiladores desse gênero literário que, até então, se mantinha no ideário popular, como: Homero com sua Odisséia (poeta grego – séc. VIII a.C.; Charles Perrault (França – séc. XVIII); os irmãos Grimm (Jacob e Wilhelm – Alemanha - séc. XVIII) e tantos outros, pois, esses escritos, além de preservar a memória histórica de um povo, emocionam, por lidar com o imaginário, divertem, criam suspense, mostram verdades e revelam sentimentos e valores de uma época.

Em cada país, surgiram novas modalidades de contos, regidos de acordo com a época e os movimentos artísticos que este momento histórico-cultural provocou e adquiriram forma literária e estética. Assim, leem-se hoje, contos de amor, de humor, contos fantásticos, de mistério e terror, contos realistas, psicológicos, sombrios, todos com estilos próprios daqueles que os escreveram.

1 Aula adaptada do site http://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html?aula=23180

Fonte: http://www.smec.salvador.ba.gov.br/site/documentos/espaco-virtual/espaco-

cenap/publicacoes/caderno%20de%20Apoio%20a%20pratica%20pedagogica%20contos%20classicos%20mitologicos%20e%20modernos.pdf

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ATIVIDADE 1

Divida a turma em quatro grupos. Para cada grupo, entregue um dos textos a seguir:

Texto 1

A Bela Adormecida

Charles Perrault

Na festa do batismo da tão desejada princesa, foram convidadas 12 fadas e como madrinhas desta ofereceram-lhe como presentes a beleza, o talento musical, a inteligência, entre outros valores apreciados.

No entanto, uma velha fada que foi negligeciada, porque o rei apenas tinha doze pratos de ouro, interrompeu o evento e lançou-lhe como vingança um feitiço cujo resultado seria, ao picar o dedo num fuso, a morte quando a princesa atingisse a idade adulta. Porém restava o presente da 12ª fada. Assim sendo, esta suavizou a morte, transformando o maldição da princesa para cem anos de sono profundo, até que seja despertada pelo primeiro beijo oriundo de um amor verdadeiro.

O rei proibiu imediatamente qualquer tipo de fiação em todo o reino, mas em vão. Quando a princesa contava 15 anos, descobriu uma sala escondida num torreão do castelo onde encontrou uma velha a fiar. Curiosa com o fuso pediu-lhe para a deixar fiar, picando-se nesse mesmo instante. Sentiu então o grande sono que lhe foi destinado e, ao adormecer, todas as criaturas presentes no castelo adormeceram juntamente, sob o novo feitiço da 12ª fada que tinha voltado entretanto. Com o tempo, cresceu uma floresta de urzes em torno do castelo adormecido, isolando-o do mundo exterior e dando uma morte fatal e dolorosa nos espinhos a quem tentasse entrar. Assim muitos príncipes morreram em busca da tal Bela Adormecida cuja beleza era tão falada.

Após cem anos decorridos, um príncipe corajoso enfrentou a floresta de espinhos, mesmo sabendo da morte de outros tantos, e conseguiu entrar no castelo. Quando encontrou o quarto onde a princesa dormia, estremeceu de tal maneira ao ver a sua beleza, que caiu de joelhos diante o seu leito. Ele beijou-a e ela acordou finalmente. Então todos no castelo acordaram e continuaram onde haviam parado à cem anos atrás. O conto termina aqui, na boda do príncipe, com a famosa frase e viveram felizes até ao fim dos seus dias.

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Texto 2

A roupa nova do imperador

Hans Christian Andersen

Um alfaiate pobre, de terras distantes, diz a um determinado rei que poderia fazer uma roupa muito bonita e cara, mas que apenas as pessoas mais inteligentes e astutas poderiam vê-la. O rei, muito vaidoso, gostou da proposta e pediu ao alfaiate que fizesse uma roupa dessas para ele.

O alfaiate recebeu vários baús cheios de riquezas, rolos de linha de ouro, seda e outros materiais raros e exóticos, exigidos por ele para a confecção das roupas. Ele guardou todos os tesouros e ficou em seu tear, fingindo tecer fios invisíveis, que todas as pessoas alegavam ver, para não parecerem estúpidas.

Até que um dia, o rei se cansou de esperar, e ele e seus ministros quiseram ver o progresso do alfaiate. Quando o falso tecelão mostrou a mesa de trabalho vazia, o rei exclamou: "Que lindas vestes! Você fez um trabalho magnífico!", embora não visse nada além de uma simples mesa, pois dizer que nada via seria admitir na frente de seus súditos que não tinha a capacidade necessária para ser rei. Os nobres ao redor soltaram falsos suspiros de admiração pelo trabalho, nenhum deles querendo que achassem que era incompetente ou incapaz. O alfaiate garantiu que as roupas logo estariam completas, e o rei resolveu marcar uma grande parada na cidade para que ele exibisse as vestes especiais. A única pessoa a desmascarar a farsa foi uma criança, que gritou:

-O rei está nu!

O grito é absorvido por todos. O Imperador se encolhe, suspeitando a afirmação é verdadeira, mas se mantém-se orgulhosamente e continua a procissão.

Texto 3

O menino e o padre

Conto regional do Nordeste (autor desconhecido)

Um padre andava pelo sertão, e como estava com muita sede, aproximou-se duma cabana e chamou por alguém de dentro. Veio então lhe atender um menino muito mirrado.

- Bom dia meu filho, você não tem por aí uma aguinha aqui pro padre?

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- Água tem não senhor, aqui só tem um pote cheio de garapa de açúcar! Se o senhor quiser... - disse o menino.

- Serve, vá buscar. - pediu-lhe o padre.

E o menino trouxe a garapa dentro de uma cabaça. O padre bebeu bastante e o menino ofereceu mais. Meio desconfiado, mas como estava com muita sede o padre aceitou. Depois de beber, o padre curioso perguntou ao menino:

- Me diga uma coisa, sua mãe não vai brigar com você por causa dessa garapa?

- Briga não senhor. Ela não quer mais essa garapa, porque tinha uma barata morta dentro do pote.

Surpreso e revoltado, o padre atira a cabaça no chão e esta se quebra em mil pedaços. E furioso ele exclama:

-Moleque danado, por que não me avisou antes?

O menino olhou desesperado para o padre, e então disse em tom de lamento:

- Agora sim eu vou levar uma surra das grandes; o senhor acaba de quebrar a cabacinha de vovó fazer xixi dentro!

Texto 4

O Assalto

Carlos Drumond de Andrade

A casa luxuosa no Leblon é guardada por um molosso de feia catadura, que dorme de olhos abertos, ou talvez nem durma, de tão vigilante. Por isso, a família vive tranquila, e nunca se teve notícia de assalto a residência tão protegida.

Até a semana passada. Na noite de quinta-feira, um homem conseguiu abrir o pesado portão de ferro e penetrar no jardim. Ia fazer o mesmo com a porta da casa, quando o cachorro, que muito de astúcia o deixara chegar até lá, para acender-lhe o clarão de esperança e depois arrancar-lhe toda ilusão, avançou contra ele, abocanhando-lhe a perna esquerda. O ladrão quis sacar do revólver, mas não teve tempo para isto. Caindo ao chão, sob as patas do inimigo, suplicou-lhe com os olhos que o deixasse viver, e com a boca prometeu que nunca mais tentaria assaltar aquela casa. Falou em voz baixa, para não despertar os moradores, temendo que se agravasse a situação. O animal pareceu compreender a súplica do ladrão, e deixou-o sair em estado deplorável.

No jardim ficou um pedaço da calça. No dia seguinte, a empregada não entendeu bem por que uma voz. Pelo telefone, disse que era da Saúde Pública e indagou se o cão era vacinado. Nesse momento o cão estava junto da doméstica, e abanou o rabo, afirmativamente.

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Peça que os alunos leiam o texto silenciosamente e que depois o discutam com os colegas do grupo. Certifique-se de que os alunos compreenderam a história. Podem ser feitas perguntas factuais para ver se o texto foi entendido. Em seguida, peça que os cada grupo conte a história que leram para o restante da sala. Eles não deverão ler, mas relatar a narrativa para a turma.

Após terem relatado a história para os colegas, pergunte se eles percebem semelhanças entre os textos. Leve os alunos a perceberem algumas características comuns, como por exemplo: todos os textos estão contando uma história; têm personagens e narrador; espaço e tempo; estão organizados em parágrafos; são relativamente curtos; possuem início, meio e fim. Ajude-os também a perceber diferenças entre os textos: a temática não é igual, alguns usam de recursos mágicos (texto 1), outros têm uma história engraçada (texto 3) ou uma história mais próxima do real (texto4).

Pergunte para os alunos se eles têm alguma ideia sobre qual é o nome de textos como o que eles acabaram de ler. Em função da experiência com alguns desses gêneros, os alunos poderão dizer que esses textos são contos. Com base nas diferenças e semelhanças percebidas pelos alunos, construam coletivamente uma definição de contos. Nessa definição, deixem claro que o conto é uma narrativa (conta uma história) com personagens diversos, de temática variada e que, em geral, é curta se comparada a outros textos narrativos (como romances e novelas).

ATIVIDADE 2

Apresente para os alunos as seguintes classificações de contos:

Contos de fadas: narrativa curta na qual o herói ou heroína tem de enfrentar grandes obstáculos antes de triunfar contra o mal. Caracteristicamente envolvem algum tipo de magia, metamorfose ou encantamento. (Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Contos_de_fadas)

Contos maravilhosos: lidam com uma temática social: o herói (ou anti-herói), que é uma pessoa de origem humilde ou que passa por grandes privações, triunfa ao conquistar riqueza e poder. (Fonte: http://pt.wikipedia.org/wiki/Contos_maravilhosos)

Contos populares: Fruto da oralidade e do espírito inventivo. Criado, narrado e ouvido pelo povo. Transmitido de gerações a gerações. É testemunha de usos, costumes, ideias, práticas, saberes, decisões e julgamentos. Têm por característica o humorismo e as situações imprevistas, morais e/ou materiais. (Fonte: http://www.jangadabrasil.com.br/revista/setembro82/apresentacao.asp)

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Contos modernos: É um tipo de narrativa não muito longa (história curta de fatos fictícios) em que o narrador se detém num momento especial, ou seja, a ação se concentra em um único ponto de interesse um conflito maior vivido pelos personagens. Normalmente, contam histórias voltadas para o cotidiano (Fonte: http://www.smec.salvador.ba.gov.br/site/documentos/espaco-virtual/espaco-

cenap/publicacoes/caderno%20de%20Apoio%20a%20pratica%20pedagogica%20contos%20classicos%20mitologicos%20e%20modernos.pdf)

A partir das definições acima, peça que os alunos classifiquem os textos lidos na aula anterior e que justifiquem suas respostas. Pergunte se eles conhecem outros contos que se encaixam nas classificações estabelecidas acima. Explique que há outros tipos de contos e outras classificações (contos etiológicos, contos africanos, contos de terror, contos de humor etc.).

ATIVIDADE 3

Peça que um aluno leia o primeiro parágrafo dos textos trabalhados. Pergunte para eles: do que trata o primeiro parágrafo de todos os quatro textos? Espera-se que os alunos percebam que no primeiro parágrafo, ocorre a apresentação dos personagens e do ambiente em que se dá a história. Peça que eles falem das características dos personagens e do espaço em que se passa a narrativa de cada um dos textos. Explique que, em geral, nos diferentes tipos de conto o primeiro parágrafo nos apresenta ao cenário e aos personagens.

Pergunte aos alunos: depois que os personagens são apresentados, o que acontece no conto? Os alunos devem ser levados a perceber que uma situação problemática é apresentada no texto. Essa situação será responsável pelo desenrolar da história. Peça que eles identifiquem qual o conflito que se estabelece no primeiro conto.

Após a apresentação do problema e o desenrolar da história, existe, em geral, um clímax, ou seja, o ponto máximo de tensão da história, quando o conflito chega a seu máximo. A partir desse clímax, a história caminha para o desfecho. Explore esses elementos nos diferentes textos, para que os alunos possam se familiarizar com a estrutura presente no conto (apresentação dos personagens, conflito, desenvolvimento da história, clímax e desfecho). Esses elementos serão importantes para a atividade de produção.

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ATIVIDADE 4

Agora que os alunos já compreenderam a estrutura do conto, promova uma atividade de reescrita em sala de aula. A reescrita consiste em recontar por escrito uma história já conhecida, com suas palavras, enriquecendo-a ou suprimindo alguns detalhes, conforme o interesse e o objetivo dos autores. Essa atividade pode ser realizada coletivamente, em grupos menores ou individualmente. O professor pode propor a reescrita do texto “A Bela Adormecida” ou “A roupa nova do rei” que provavelmente são mais conhecidos pelos alunos. Explique que a reescrita não consiste em copiar o texto, mas em usar a mesma história, contando-a com suas palavras, acrescentando ou retirando elementos, colocando diálogos, descrevendo melhor os cenários, sem mudar a essência do que é narrado. Durante o processo de reescrita, o professor deve auxiliar os alunos a seguirem a sequência estudada anteriormente. Estimule os alunos a revisarem os textos, verificando a coerência e a correção gramatical e ortográfica.

Após a produção, os alunos devem ler os seus contos em sala. Os colegas avaliam para ver se o conto seguiu a sequência previamente estabelecida.

Recursos Complementares

Para saber mais sobre contos e seu trabalho em sala de aula, sugere-se a leitura dos textos presentes nos sites:

http://www.smec.salvador.ba.gov.br/site/documentos/espaco-virtual/espaco-cenap/publicacoes/caderno%20de%20Apoio%20a%20pratica%20pedagogica%20contos%20classicos%20mitologicos%20e%20modernos.pdf

http://revistaescola.abril.com.br/lingua-portuguesa/alfabetizacao-inicial/reescrita-historias-conhecidas-431580.shtml

Avaliação

O professor pode avaliar a compreensão de textos por parte dos alunos com base no realizado na primeira atividade. Pode também avaliar a participação e o envolvimento dos estudantes em todos os momentos. A última atividade constitui-se em um momento interessante para avaliar se os alunos compreenderam a estrutura que compõem um conto.

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Sugestão 22

Dados da Aula

O que o aluno poderá aprender com esta aula

- Identificar os elementos organizacionais e estruturais dos contos populares e suas especificidades.

- Conhecer a cultura brasileira.

Duração das atividades

5 aulas de 50 minutos

Conhecimentos prévios trabalhados pelo professor com o aluno

Alguns conhecimentos prévios podem auxiliar no trabalho com os textos a serem apresentados, como: elementos da narrativa, contos, cultura popular, literatura oral.

Estratégias e recursos da aula

ATIVIDADE 1:

Iniciar a aula conversando com os alunos sobre os contos populares. Para a realização de tal atividade, o professor pode se basear no texto abaixo:

É impossível precisar quando surgiu o primeiro conto popular. Os registros escritos mais antigos datam de cerca de 3200 a. C. Mas muito antes disso, o homem já contava histórias .

Acredita-se que, no começo, o homem falava de seus acontecimentos cotidianos. Ao mesmo tempo, observava os fenômenos naturais, o ambiente em que vivia e perguntava-se sobre suas origens e seu papel no universo. Criava suas próprias respostas, muitas vezes recorrendo à imaginação para explicar aquilo que sua razão não podia compreender. Suas interpretações, então, adquiriam voz em forma de narrativas. E o homem contava suas histórias para os outros homens, que as ouviam e reinterpretavam, muitas vezes adaptando-as à sua realidade, transformando-as. E as contavam a outros homens. O ciclo se repetia e as histórias espalhavam-se por toda a parte.

Fruto da oralidade e do espírito inventivo. Criado, narrado e ouvido pelo povo. Transmitido de gerações a gerações. O conto popular é testemunha de usos, costumes, ideias, práticas, saberes, decisões e julgamentos. Carrega em si informações históricas, antropológicas,

2 Aula adaptada do site http://revistaescola.abril.com.br/fundamental-2/festa-babette-aproxime-garotada-contos-

clarice-lispector-639087.shtml

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sociológicas, linguísticas e psicológicas, despertando o interesse de todas as ciências humanas.

Porém, mais do que somente objeto de estudo, as histórias populares encantam, divertem, fazem sonhar, pensar, refletir. Aguçam a imaginação, trazem recordações, despertam a curiosidade e motivam a criação. São vivas.

Fonte: Disponível em: <http://www.jangadabrasil.com.br/revista/setembro82/apresentacao.asp>. Acessado em 11 maio 2010.

O professor pode se basear também nos artigos disponíveis no link a seguir:

http://www.tvebrasil.com.br/salto/boletins2006/cr/index.htm

Após a discussão, o professor pode pedir que os alunos contem algum conto popular de que se lembrem. É interessante que o professor também pesquise com antecedência e possa contar em sala, para seus alunos, algum conto popular que circule oralmente em sua cidade ou região.

ATIVIDADE 2:

Colocar para os alunos escutarem a contação da história “O macaco e a velha”, que está disponível no seguinte endereço:

http://www.youtube.com/watch?v=Ti2xNtOoIUE&feature=related

O MACACO E A VELHA

Havia uma velha, muito velha, chamada Marocas. Ela possuía um lindo bananal. Mas a coitadinha da velha comia poucas bananas, pois havia um macaco que lhe roubava todas.

Um dia, Marocas, cansada de ser roubada, teve uma ideia. Comprou no armazém vários quilos de alcatrão e com ele fez um boneco. Colocou-o num grande tabuleiro e o levou para o meio do bananal, pensando em dar uma lição no macaco.

Logo que Marocas voltou para casa, lá veio o macaco Simão de mansinho. Quando avistou o boneco, zangou-se pensando que ele lhe roubava as bananas.

O macaco, muito zangado, deu-lhe uns sopapos, ficando com a mão grudada no alcatrão. Deu-lhe um pontapé. Ficou preso no boneco também o seu pé. O macaco deu, então, uma cabeçada e ficou todinho grudado.

Marocas, saindo do barraco, pegou o chicote e surrou o macaco e só parou, quando Simão, dando três pulos, desgrudou-se do alcatrão e fugiu.

Certa manhã, Simão teve uma ideia para se vingar da velha Marocas. Ele entrou numa pele de leão que encontrou na floresta. Pulou o muro da casa da velha e escondeu-se no bananal.

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Quando a velha apareceu, Simão soltou um urro terrível e deu-lhe um bote. A

velha gritou e tentou fugir, mas, naquele alvoroço, caiu bem no fundo do poço que havia no quintal.

O macaco, vendo o perigo que ela corria, ficou muito triste, pois queria assustá-la, mas não matá-la. Saiu bem rápido de dentro da pele e, olhando em volta, subiu num pé de jamelão, pegou num galho bem grosso e espichou bem o rabo até o fundo do poço.

Os gritos chamaram a atenção dos vizinhos que, chegando ao bananal, surpreenderam-se com a cena.

O macaco fazendo força, trazendo Marocas dependurada no seu rabo. Depois desse dia, as coisas mudaram. Marocas e o macaco ficaram amigos. Era uma beleza! Ela, em vez de pancadas, dava-lhe bananas e doces.

CAPPELLI, Alba; DIAS, Dora. O macaco e a velha. Coleção Lua de papel. FTD. *Adaptado: Reforma Ortográfica.

Após a contação da história, conversar com os alunos sobre os principais fatos da narrativa, por meio de perguntas como:

- Onde se passa a história?

- Quem são as personagens principais?

- O que a velha pediu para o macaco?

- O que o macaco fez após o pedido da velha?

- Qual foi a reação da velha?

- Qual foi a estratégia que a velha inventou para se vingar do macaco?

- O macaco ficou caiu na armadilha? Como?

- Quem ajudou a velha a preparar o macaco para assar?

- O que aconteceu com o macaco enquanto a cozinheira o preparava?

- O que aconteceu com a velha depois que comeu todo o macaco?

- Por que o macaco não queria sair de dentro da velha?

- Ele saiu? De que maneira?

- A vingança da velha deu certo?

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Após verificar se os alunos compreenderam o conto, discutir também com eles os elementos da fantasia presentes na história. O macaco, mesmo picado, temperado, já na barriga da velha, continuava falando.

ATIVIDADE 3:

Pedir que os alunos pesquisem com seus familiares ou vizinhos contos populares que fazem parte da cultura de sua região. Após a pesquisa, em uma outra aula, pedir que contem para os colegas as narrativas que eles ouviram. Provavelmente alguns trarão o mesmo conto. O professor pode aproveitar a oportunidade e conversar com sua turma sobre as variações que os contos sofrem ao longo de tempo, ao passarem de boca a boca, de geração a geração.

ATIVIDADE 4:

Após a narrativa oral dos contos, pedir aos alunos para escreverem o texto. Como muitos contos populares trabalham com diálogos, certificar-se de que os alunos saibam utilizar as notações linguísticas necessárias (dois pontos, travessão ou aspas...). Após a escrita o professor pode revisar os textos e, se necessário, fazer apontamentos para uma reescrita, até se chegar a uma versão final.

ATIVIDADE 5:

Organizar um pequeno livro contendo a versão final dos contos trazidos pelos alunos. Pedir que cada um ilustre seu conto, para compor o livro.

Recursos Complementares

O professor que quiser aprofundar um pouco mais no tema contos populares pode ler os seguintes endereços eletrônicos: http://www.jangadabrasil.com.br/indice/edicoes/edicao82.asp

Avaliação

O professor deve avaliar os alunos durante todo o processo de ensino e de aprendizagem e,

caso perceba que eles não estão compreendendo a atividade, deve adaptá-la. Entretanto, para

uma avaliação mais efetiva, o professor pode formar uma roda com seus alunos e avaliar

coletivamente todo o processo por meio de perguntas como: Qual conto vocês já haviam

escutado? Quais passaram a conhecer? O que os contos populares nos ensinam? O que vocês

conseguiram aprender com as atividades? Tal procedimento permite que o professor reflita

sobre sua prática e que os alunos se auto-avaliem, refletindo sobre o próprio desempenho e

aprendam a identificar o que aprenderam e a corrigir erros e equívocos. É interessante que

essa atividade avaliativa seja realizada após todas as aulas.

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Sugestão 33

Dados da Aula

O que o aluno poderá aprender com esta aula

Identificar os personagens principais da história.

Reconhecer a estrutura textual de um conto.

Recontar o conto com suas próprias palavras.

Reescrever o conto com suas palavras, ainda que não de forma convencional.

Identificar início, meio e fim de um conto.

Duração das atividades

3 aulas de 50 minutos

Estratégias e recursos da aula

1ª aula:

a) Convidar os alunos a ouvir um conto escrito há muitos anos, por dois escritores que são considerados os "pais das histórias", os Irmãos Grimm. Esse conto é a primeira história de sua coleção.

Apresentar uma imagem referente ao conto, disponível em:

http://upload.wikimedia.org/wikipedia/commons/6/67/Crane_frog4.jpg

3 Sugestão adaptada do site http://portaldoprofessor.mec.gov.br/.

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c) Caso a escola não tenha o livro "O Rei Sapo", dos Irmãos Grimm, a professora poderá acessá-la através do link: http://www.qdivertido.com.br/verconto.php?codigo=3 .

Há muito tempo, quando os desejos funcionavam, vivia um rei que tinha filhas muito belas. A mais jovem era tão linda que o sol, que já viu muito, ficava atônito sempre que iluminava seu rosto. Perto do castelo do rei havia um bosque grande e escuro no qual havia um lagoa sob uma velha árvore. Quando o dia era quente, a princesinha ia ao bosque e se sentava junto à fonte. Quando se aborrecia, pegava sua bola de ouro, a jogava alto e recolhia. Essa bola era seu brinquedo favorito.

Porém aconteceu que uma das vezes que a princesa jogou a bola, esta não caiu em sua mão, mas sim no solo, rodando e caindo direto na água. A princesa viu como ia desaparecendo na lagoa, que era profunda, tanto que não se via o fundo. Então começou a chorar, mais e mais forte, e não se consolava e tanto se lamentava, que alguém lhe diz:

- Que te aflige princesa? Choras tanto que até as pedras sentiriam pena.

Olhou o lugar de onde vinha a voz e viu um sapo colocando sua enorme e feia cabeça fora da água.

- Ah, és tu, sapo - disse - Estou chorando por minha bola de ouro que caiu na lagoa.

- Calma, não chores - disse o sapo - Posso ajudar-te, porém, que me darás se te devolver a bola?

- O que quiseres, querido sapo. - disse ela - Minhas roupas, minhas pérolas, minhas joias, a coroa de ouro que levo.

O sapo disse:

- Não me interessam tuas roupas, tuas pérolas, nem tuas joias, nem a coroa. Porém me prometes deixar-me ser teu companheiro e brincar contigo, sentar a teu lado na mesa, comer em teu pratinho de ouro, beber de teu copinho e dormir em tua cama; se me prometes isto eu descerei e trarei tua bola de ouro.

- Oh, sim- disse ela - Te prometo tudo o que quiseres, porém devolve minha bola.

Mas pensou:

- Fala como um tolo. Tudo o que faz é sentar-se na água com outros sapos e coachar. Não pode ser companheiro de um ser humano.

O sapo, uma vez recebida a promessa, meteu a cabeça na água e mergulhou. Pouco depois voltou nadando com a bola na boca, e a lançou na grama. A princesinha estava encantada de ver seu precioso brinquedo outra vez, colheu-a e saiu correndo com ela.

- Espera, espera - disse o sapo. -Leva-me. Não posso correr tanto como tu.

Mas de nada serviu coachar atrás dela tão forte quanto pôde. Ela não o escutou e correu para casa, esquecendo o pobre sapo, que se viu obrigado a voltar à lagoa outra vez.

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No dia seguinte, quando ela sentou à mesa com o rei e toda a corte, estava comendo em seu pratinho de ouro e algo veio arrastando-se, splash, splish, splash pela escada de mármore. Quando chegou ao alto, chamou à porta e gritou:

- Princesa, jovem princesa, abre a porta.

Ela correu para ver quem estava lá fora. Quando abriu a porta, o sapo sentou-se diante dela e a princesa bateu a porta. Com pressa, tornou a sentar, mas estava muito assustada. O rei se deu conta de que seu coração batia violentamente e disse:

- Minha filha, por que estás assustada? Há um gigante aí fora que te quer levar?

- Ah não, - respondeu ela - não é um gigante, senão um sapo.

- O que quer o sapo de ti?

- Ah querido pai, estava jogando no bosque, junto à lagoa, quando minha bola de ouro caiu na água. Como gritei muito, o sapo a devolveu, e porque insistiu muito, prometi-lhe que seria meu companheiro, porém nunca pensei que seria capaz de sair da água.

Entretanto o sapo chamou à porta outra vez e gritou:

- Princesa, jovem princesa, abre a porta. Não lembras que me disseste na lagoa?

Então o rei disse:

- Aquilo que prometeste, deves cumprir. Deixa-o entrar.

Ela abriu a porta, o sapo saltou e a seguiu até sua cadeira. Sentou-se e gritou:

- Sobe-me contigo.

Ela o ignorou até que o rei lhe ordenou. Uma vez que o sapo estava na cadeira, quis sentar na mesa. Quando subiu, disse:

- Aproxima teu pratinho de ouro porque devemos comer juntos.

Ela o fez, porém se via que não de boa vontade. O sapo aproveitou para comer, porém ela enjoava a cada bocado. Em seguida disse o sapo:

- Comi e estou satisfeito, mas estou cansado. Leva-me ao quarto, prepara tua caminha de seda e nós dois vamos dormir.

A princesa começou a chorar porque não gostava da ideia de que o sapo ia dormir na sua preciosa e limpa caminha. Porém o rei se aborreceu e disse:

- Não devias desprezar àquele que te ajudou quando tinhas problemas. Assim, ela pegou o sapo com dois dedos, e o levou para cima e o deixou num canto. Porém, quando estava na cama o sapo se arrastou até ela e disse:

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- Estou cansado, eu também quero dormir, sobe-me senão conto a teu pai.

A princesa ficou então muito aborrecida. Pegou o sapo e o jogou contra a parede.

- Cale-se, bicho odioso! - disse ela.

Porém, quando caiu ao chão não era um sapo, e sim um príncipe com preciosos olhos. Por desejo de seu pai ele era seu companheiro e marido. Ele contou como havia sido encantado por uma bruxa malvada e que ninguém poderia livrá-lo do feitiço exceto ela. Também disse que no dia seguinte iriam todos juntos ao seu reino.

Foram dormir e na manhã seguinte, quando o sol os despertou, chegou uma carruagem puxada por 8 cavalos brancos com plumas de avestruz na cabeça. Estavam enfeitados com correntes de ouro. Atrás estava o jovem escudeiro do rei, Enrique. Enrique havia sido tão desgraçado quando seu senhor foi convertido em sapo que colocou três faixas de ferro rodeando seu coração, para se acaso estalasse de pesar e tristeza. A carruagem ia levar o jovem rei a seu reino. Enrique os ajudou a entrar e subiu atrás de novo, cheio de alegria pela libertação, e quando já chegavam a fazer uma parte do caminho, o filho do rei escutou um ruído atrás de si como se algo tivesse quebrado. Assim, deu a volta e gritou:

- Enrique, o carro está se rompendo.

- Não amo, não é o carro. É uma faixa de meu coração, a coloquei por causa da minha grande dor quando eras sapo e prisioneiro do feitiço.

Duas vezes mais, enquanto estavam no caminho, algo fez ruído e cada vez o filho do rei pensou que o carro estava rompendo, porém eram apenas as faixas que estavam se desprendendo do coração de Enrique, porque seu senhor estava livre e era feliz.

c) Convidar os alunos a fazer a leitura dramatizada da história. Os alunos poderão ser sorteados, cada um representando um personagem: narrador, princesa, sapo, rei, Enrique.

2ª aula:

Recordar o conto lido na aula anterior, pedindo que um aluno comece a contar com suas próprias palavras, garantindo que os outros alunos continuem a história da parte que o colega parou.

A professora escreverá no quadro ou entregará folhas xerocopiadas para os alunos responderem às perguntas relacionadas à estrutura do conto:

1) Identifique no Conto:

a) No início do conto:

o cenário a personagem

b) No meio do conto:

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a complicação

c) No final do conto:

a solução do problema os elementos mágicos

2) Identifique as expressões que determinam o começo de cada parte do conto:

a) do início:

b) do meio:

c) do fim:

Os alunos serão convidados a apresentar suas respostas oralmente. A professora fará as

intervenções que forem necessárias, podendo anotar a resposta de um aluno no quadro.

3ª aula

a) Identificar as personagens principais do conto.

b) Propor aos alunos a reescrita do conto "O príncipe sapo". Os alunos deverão escrever com suas próprias palavras.

A professora poderá orientar a escrita através de uma Agenda de Produção de Texto, indicando perguntas que poderão ajudar os alunos a construírem sua história. A professora anotará no quadro as perguntas, esclarecendo que são apenas dicas para que o texto fique completo. Exemplo de uma agenda:

Quem era a personagem principal da história? Onde ela estava? O que aconteceu com o seu brinquedo favorito? Quem apareceu oferecendo ajuda? O que a princesa prometeu? O sapo cumpriu a sua promessa? E a princesa? O que o sapo fez para que a princesa cumprisse sua promessa? O que o rei fez ao saber da história da princesa? O que aconteceu com o sapo quando a princesa o jogou na parede?

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O que aconteceu com a princesa e o sapo no final da história?

c) Quando os alunos terminarem a escrita, a professora fará a correção.

Alguns alunos poderão ler sua história para os colegas.

Os trabalhos poderão ser colocados no mural ou a professora poderá convidar os alunos a montar um livro sobre o conto escrito.

Recursos Complementares

Uma versão bem diferente da história dos Irmãos Grimm está disponível em: http://www.nead.unama.br/site/bibdigital/pdf/oliteraria/600.pdf

Avaliação

Verificar se os alunos foram capazes de identificar as personagens principais da história, fazendo a leitura dramatizada com as falas de cada personagem.

Avaliar se identificaram a estrutura do conto, preenchendo o quadro com os dados do início, meio e fim da história.

Verificar se foram capazes de recontar o conto oralmente e de escrevê-lo com suas próprias palavras, de forma clara, completa e coerente.

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Sugestões de Atividades: 8º e 9º

anos

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Sugestão 14

Dados da Aula

O que o aluno poderá aprender com esta aula

I) analisar aspectos estruturais do conto lido: foco na ação narrativa; linguagem ágil e concisa; presença de personagens anônimos.

II) relacionar as escolhas/estratégias narrativas ao tema ou proposta do conto.

III) refletir sobre o tema da violência na narrativa contemporânea.

Duração das atividades

2 aulas

Conhecimentos prévios trabalhados pelo professor com o aluno

O professor deve retomar o que já foi trabalhado sobre a estrutura de narrativas. Esse conhecimento poderá auxiliar os alunos na análise da organização peculiar desse conto de Dalton Trevisan. Sugerimos consultar a aula "O conto de Machado de Assis: a carteira", que apresenta uma descrição estrutural de narrativas canônicas.

Estratégias e recursos da aula

Atividade 1- Leitura do conto “Uma vela para Dario”

Organizados em grupos, os alunos leem o texto.

Uma vela para Dario

Dalton Trevisan

Dario vinha apressado, guarda-chuva no braço esquerdo e, assim que dobrou a esquina, diminuiu o passo até parar, encostando-se à parede de uma casa. Por ela escorregando,

sentou-se na calçada, ainda úmida de chuva, e descansou na pedra o cachimbo.

Dois ou três passantes rodearam-no e indagaram se não se sentia bem. Dario abriu a boca, moveu os lábios, não se ouviu resposta. O senhor gordo, de branco, sugeriu que devia sofrer de ataque.

Ele reclinou-se mais um pouco, estendido agora na calçada, e o cachimbo tinha apagado. O rapaz de bigode pediu aos outros que se afastassem e o deixassem respirar. Abriu-lhe o paletó, o colarinho, a gravata e a cinta. Quando lhe retiraram os sapatos, Dario roncou feio e bolhas de espuma surgiram no canto da boca.

4 Sugestão adaptada do site http://portaldoprofessor.mec.gov.br/.

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Cada pessoa que chegava erguia-se na ponta dos pés, embora não o pudesse ver. Os

moradores da rua conversavam de uma porta à outra, as crianças foram despertadas e de pijama acudiram à janela. O senhor gordo repetia que Dario sentara-se na calçada, soprando ainda a fumaça do cachimbo e encostando o guarda-chuva na parede. Mas não se via guarda-chuva ou cachimbo ao seu lado.

A velhinha de cabeça grisalha gritou que ele estava morrendo. Um grupo o arrastou para o táxi da esquina. Já no carro a metade do corpo, protestou o motorista: quem pagaria a corrida? Concordaram chamar a ambulância. Dario conduzido de volta e recostado á parede - não tinha os sapatos nem o alfinete de pérola na gravata.

Alguém informou da farmácia na outra rua. Não carregaram Dario além da esquina; a farmácia no fim do quarteirão e, além do mais, muito pesado. Foi largado na porta de uma peixaria. Enxame de moscas lhe cobriu o rosto, sem que fizesse um gesto para espantá-las.

Ocupado o café próximo pelas pessoas que vieram apreciar o incidente e, agora, comendo e

bebendo, gozavam as delicias da noite. Dario ficou torto como o deixaram, no degrau da peixaria, sem o relógio de pulso.

Um terceiro sugeriu que lhe examinassem os papéis, retirados - com vários objetos - de seus bolsos e alinhados sobre a camisa branca. Ficaram sabendo do nome, idade; sinal de nascença. O endereço na carteira era de outra cidade.

Registrou-se correria de mais de duzentos curiosos que, a essa hora, ocupavam toda a rua e as calçadas: era a polícia. O carro negro investiu a multidão. Várias pessoas tropeçaram no corpo de Dario, que foi pisoteado dezessete vezes.

O guarda aproximou-se do cadáver e não pôde identificá-lo — os bolsos vazios. Restava a aliança de ouro na mão esquerda, que ele próprio quando vivo - só podia destacar umedecida com sabonete. Ficou decidido que o caso era com o rabecão.

A última boca repetiu — Ele morreu, ele morreu. A gente começou a se dispersar. Dario levara duas horas para morrer, ninguém acreditou que estivesse no fim. Agora, aos que podiam vê-lo, tinha todo o ar de um defunto.

Um senhor piedoso despiu o paletó de Dario para lhe sustentar a cabeça. Cruzou as suas mãos no peito. Não pôde fechar os olhos nem a boca, onde a espuma tinha desaparecido.

Apenas um homem morto e a multidão se espalhou, as mesas do café ficaram vazias. Na janela alguns moradores com almofadas para descansar os cotovelos.

Um menino de cor e descalço veio com uma vela, que acendeu ao lado do cadáver. Parecia morto há muitos anos, quase o retrato de um morto desbotado pela chuva. Fecharam-se uma a uma as janelas e, três horas depois, lá estava Dario à espera do rabecão. A cabeça agora na pedra, sem o paletó, e o dedo sem a aliança. A vela tinha queimado até a metade e apagou-se às primeiras gotas da chuva, que voltava a cair.

Texto extraído do livro "Vinte Contos Menores", Editora Record – Rio de Janeiro, 1979, pág. 20.

Atividade 2 - Estudo dirigido

Os alunos vão discutir o texto em pequenos grupos, a partir das questões abaixo, que apontam para elementos e estratégias da narrativa.

1. De que trata o texto de Dalton Trevisan? O que o título do texto nos sugere?

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2. Recupere alguns elementos dessa narrativa:

Onde ocorrem os fatos narrados? Quando ocorrem? Quem é Dario? Descreva esse personagem a partir das informações do texto. Quem são os demais personagens da narrativa? Como esses personagens reagem ao drama de Dario?

3. Quando tem início o conflito da narrativa?

4. Que tipo de narrador temos nesse conto?

Atividade 3- Apresentação dos trabalhos do grupo

O professor vai conduzir essa atividade a partir do trabalho dos grupos, apontando para estratégias narrativas importantes.

A questão 2 remete a elementos de orientação da narrativa – onde, quando, quem, como. É importante observar que as informações relativas a esses elementos são vagas, imprecisas: os personagens não têm nome; a cidade é uma cidade qualquer. Esses personagens “anônimos”, desconhecidos, podem indicar a solidão do homem moderno, incapaz de se solidarizar com o outro. A cidade também anônima do conto poderia representar nossa modernidade apressada, fria e violenta. É importante que, ao comentar as respostas dos alunos, o professor estimule-os a voltar ao texto buscando as pistas que indicam a indiferença, o oportunismo e a omissão dos transeuntes à situação dramática vivida por Dario.

A questão 3 chama a atenção para a forma como se estrutura a narrativa: um texto curto, conciso, “enxuto”, que se inicia com a complicação e segue focado na ação da narrativa, com poucas informações que orientem o leitor. Proponha que os alunos comparem essa estrutura àquela do conto de Machado de Assis, com um longo trecho de orientação interrompendo a ação narrativa do conto.

A questão 4 aponta para a objetividade com que o drama de Dario é narrado, uma estratégia que causa impacto no leitor, pois o narrador coloca-o frente à cena dramática sem guiar seu julgamento.

Atividade 4 – diálogo entre textos

Os alunos vão comparar textos: o conto lido com a música "De frente pro crime", de João Bosco e Aldir Blanc, buscando semelhanças entre esses discursos, que “sacodem” leitores e ouvintes, apontando para a indiferença ao sofrimento do outro, para a violência das nossas cidades.

Acesse o texto e a música aqui: http://letras.kboing.com.br/joao-bosco/de-frente-pro-crime/

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De frente pro crime

João Bosco

Tá lá o corpo Estendido no chão Em vez de rosto uma foto De um gol Em vez de reza Uma praga de alguém E um silêncio Servindo de amém...

O bar mais perto Depressa lotou Malandro junto Com trabalhador Um homem subiu Na mesa do bar E fez discurso Prá vereador...

Veio o camelô Vender! Anel, cordão Perfume barato Baiana

Prá fazer Pastel E um bom churrasco De gato Quatro horas da manhã Baixou o santo Na porta bandeira E a moçada resolveu Parar, e então...

Tá lá o corpo Estendido no chão Em vez de rosto uma foto De um gol Em vez de reza Uma praga de alguém E um silêncio Servindo de amém...

Sem pressa foi cada um Pro seu lado Pensando numa mulher Ou no time

Olhei o corpo no chão E fechei Minha janela De frente pro crime...

Veio o camelô Vender! Anel, cordão Perfume barato Baiana Prá fazer Pastel E um bom churrasco De gato Quatro horas da manhã Baixou o santo Na porta bandeira E a moçada resolveu Parar, e então...(2x)

Tá lá o corpo Estendido no chão...

Recursos Complementares

Vídeo Causos da Literatura, um curta-conto que narra o texto “Uma vela para Dario”. Os alunos devem ouvir a narração dessa história e e avaliar seu efeito.O ritmo da leitura. a entonação dada ao texto são adequados aos seus propósitos comunicativos?

Acesse o vídeo em http://www.youtube.com/watch?v=1qrh5qpaj2o

Avaliação

O professor deverá considerar, para avaliação, os trabalhos dos grupos e a participação dos alunos na aula, ao apresentarem suas leituras.

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Sugestão 25

A luva

Chegou a hora do início da função. A um sinal do rei, abriu-se a porta da primeira jaula, da qual

saiu, majestoso, um feroz leão africano e, sacudindo a juba dourada, deitou-se na areia, preguiçoso.

Abriu-se a segunda jaula, liberando um terrível tigre de Bengala, que encarou o leão com olhos

ameaçadores e deitou-se também, tenso, como quem prepara um bote mortal. Em seguida, abriu-se a

terceira jaula, da qual saltaram, quais enormes gatos negros, duas panteras de dentes arreganhados,

deitando-se agachados e aumentando a tensão do ambiente.

Fez-se um silêncio no público: todos aguardavam ansiosos um pavoroso embate mortal entre os

quatro monstros felinos... E neste momento, como que sem querer, a donzela Cunegundes deixou cair,

do alto do balcão, sua branca luva, bem no centro da arena, entre as quatro feras assustadoras. E

dirigindo-se com um sorriso irônico ao seu cavaleiro adorador, falou, afetada:

"Cavaleiro Delorges, se de fato me amais como viveis repetindo, provai-o, indo buscar e me

devolver a minha luva."

O cavaleiro Delorges não respondeu nada e sem titubear, desceu rápido do balcão e com passos

decididos pisou na arena, entre as fauces hiantes e as presas arreganhadas das quatro feras. Calmo e

firme ele apanhou a luva, e sem olhar para trás e sem apressar o passo, voltou para o balcão, sob os

sussurros de espanto e admiração de todo o público presente.

5 Aula adaptada do site http://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html?aula=23180

Foi nos tempos distantes do amor

cortês. No reino medieval do rei Franz era

dia de festa, e o ponto alto das festividades

era a exibição de feras selvagens, trazidas de

terras distantes, na arena do grande castelo.

Em volta da arena erguiam-se as

arquibancadas, encimadas por altos balcões

onde brilhavam os nobres da corte, ao lado

das belas damas faiscantes de joias. Entre

elas se destacava a donzela Cunegundes, tão

rica e formosa quanto orgulhosa, e de pé ao

seu lado estava o seu apaixonado adorador,

o jovem cavaleiro Delorges, cujo amor ela

desdenhava, distante e fria.

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A donzela Cunegundes estendeu a mão num gesto faceiro para receber a luva e com um sorriso

cheio de promessas, falou:

"Ganhaste a minha gratidão, cavaleiro Delorges."

Mas em vez de entregar-lhe a luva, o cavaleiro Delorges atirou-a no belo rosto da dama cruel e

orgulhosa: "Dispenso a vossa gratidão, senhora!", ele disse.

E voltando-lhe as costas, o cavaleiro Delorges foi embora para sempre.

Desvende os segredos de um bom texto

Analisando os recursos utilizados por Tatiana Belinky, você pode ensinar a turma a controlar melhor os efeitos que pretende causar nos leitores

Que texto bonito! É o que vem à cabeça do leitor que chega à última linha do conto de Tatiana Belinky. Que segredos tem um escritor para criar este efeito de magia? Serão poderes especiais conferidos a poucos privilegiados? Claro que não. Seguindo a proposta de aula elaborada por Heloisa Cerri Ramos, consultora pedagógica de NOVA ESCOLA, é possível mostrar aos alunos os recursos da língua para criar efeitos e, assim, montar uma bela narrativa. E, na sequência, convidá-los a criar, eles mesmos, uma história.

Comece pedindo à turma que imagine o que acontecerá num conto que tem como título A Luva. Dê tempo para que todos falem. Peça que observem as ilustrações, especialmente as cores e os traçados. Que sensação eles provocam? O ilustrador quis transmitir a ideia de leveza? De tempos antigos? As indagações são um exercício para que todos aprendam a ler imagens, uma competência importante, que deve ser desenvolvida desde cedo. Depois, faça a leitura em voz alta, com expressividade, colocando entonação especial nas palavras. Esses momentos costumam ser mágicos, tanto para o professor quanto para os estudantes. Peça que eles também leiam, desta vez sozinhos, em silêncio, cada um saboreando as palavras a seu modo. Pergunte quem gostaria de ler, em voz alta, para todos os colegas, na aula seguinte. Enfatize que leitura em público exige preparação e ensaio. Como próximo passo, analise com a classe as atitudes dos protagonistas, a donzela Cunegundes e o cavaleiro Delorges. Peça que opinem e justifiquem suas ideias, num exercício de argumentação. Pergunte que nome atribuiriam às atitudes da moça: orgulho, soberba, vaidade, tirania... Aproveite para discutir o comportamento humano. Lembre a turma que há um gênero literário que apresenta formas de conduta humana representadas por animais — a fábula —, e faça a seguinte pergunta: Cunegundes poderia ser comparada ao pavão da fábula "O Corvo e o Pavão" ?

Língua Portuguesa

Tema: Recursos da língua para produzir efeitos desejados

Recontado de um poema de Schiller por Tatiana Belinky. Ilustrado por Maria Eliana Delarissa. Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/fundamental-1/luva-634346.shtml> Acesso em 10 de junho de 2012.

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Objetivo: Produzir um texto, fazendo escolhas linguísticas intencionais

Como chegar lá: Ensina-se a ler e a escrever lendo e analisando bons textos

Dica: Tenha um acervo de bons textos, não só narrativos, como modelos para ensinar diferentes gêneros: notícias, poemas, cartas, editoriais, propagandas etc. Faça com antecedência a leiturae análise do material que você vai levar aos alunos. Ponha-se no lugar deles. Assim, você sentirá mais segurança para orientar os passos da classe.

Análise do texto

A segunda parte da aula começa com a análise dos recursos da escrita empregados pela autora. É um texto narrativo clássico, com a situação inicial harmônica, introdução de um conflito que interfere nela, desenvolvimento e solução desse conflito. Para iniciar o estudo, pergunte aos alunos que sensações e impressões eles tiveram ao ler o conto: de medo, de leveza, de ternura, de alegria, de tempos antigos. Provavelmente eles dirão que a história passa a imagem de antiguidade, de leveza...

Diga a eles que essas impressões resultam de escolhas linguísticas. Peça-lhes que observem essas opções no parágrafo inicial. Quais são os substantivos desse trecho? Ensine-os a percebê-los, bem como os seus caracterizadores. Que adjetivos ou expressões adjetivas estão relacionados aos substantivos? À medida que forem falando, escreva no quadro-negro. Faça-os observar que as escolhas remetem a imagens antigas: tempos distantes, amor cortês, reino medieval, grande castelo, por exemplo. Leveza, delicadeza, beleza e ternura vêm de frases como "belas damas faiscantes de joias", "donzela formosa", "apaixonado adorador". Passe em seguida para os tempos verbais. O primeiro parágrafo inicia-se com o pretérito perfeito do indicativo (foi). Já para os verbos seguintes foi escolhido o modo imperfeito do indicativo: era, erguiam, brilhavam, destacava, estava, desdenhava. Peça aos alunos que comparem o uso das formas de passado. Leve-os a perceber que o imperfeito dá ideia de algo que não se concluiu, que acontecia com frequência. É o tempo verbal adequado para falar de ações que costumavam acontecer numa época remota. Pergunte por que esse tempo verbal foi escolhido. E o dos parágrafos seguintes? A predominância é do pretérito perfeito. Nesses trechos é contado o que aconteceu um dia à Cunegundes e Delorges. Trata-se, portanto, de algo já concluído.

A sensação de época antiga também está presente na linguagem do diálogo entre a donzela e o cavaleiro. Pergunte o que mais chama a atenção nessa linguagem. Provavelmente dirão que são as formas verbais da 2ª pessoa do plural (amais, viveis, provai-o, ganhastes), forma de tratamento atualmente em desuso. Enfatize que o uso de recursos como substantivos e adjetivos que remetem à época antiga, tempos verbais, o pronome "vós" e a própria ilustração são intencionais.

Hora de escrever

A seguir, proponha uma produção de texto que faça uso consciente e intencional dos recursos linguísticos estudados com o conto A Luva. Peça que cada aluno escreva uma história que se passe nos dias de hoje, mas na qual as personagens tenham o mesmo comportamento da donzela e do cavaleiro. A escolha de substantivos, adjetivos e caracterizadores do substantivo,

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do tempo verbal, da forma de tratamento e da ilustração vai depender do efeito que cada um tentará produzir.

Embora seja elaborado para turmas de 3º e 4º ciclos, é possível adaptar esse trabalho para o início do Ensino Fundamental e para a Educação Infantil. A partir do título e das ilustrações, pergunte-lhes sobre o que deverá ser a história. A seguir, leia o texto. Converse sobre a época, as personagens, que opinião as crianças têm sobre a atitude da donzela; pergunte como reagiriam, se fossem o cavaleiro.

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Sugestão 36

Dados da Aula

O que o aluno poderá aprender com esta aula

Utilizar elementos da perigrafia dos contos e Clarice Lispector (título e outros presentes no material a ser utilizado) para construir uma interpretação.

Selecionar e analisar contos de Clarice Lispector.

Produzir esquetes teatrais dos contos de Clarice Lispector, fazendo as adaptações necessárias quanto o espaço, tempo e ação da narrativa para a atualidade.

Utilizar os elementos que compõem um texto teatral nas esquetes a serem elaboradas: introdução ou apresentação, complicação, clímax e desfecho.

Duração das atividades

4 aulas geminadas (1 hora e 40 minutos cada) - 5 horas/aula ou 360 minutos

Conhecimentos prévios trabalhados pelo professor com o aluno

É importante que os alunos conheçam:

. as características de um conto.

. os elementos que constituem um texto teatral e sua estruturação, tais como: introdução ou apresentação, complicação, clímax e desfecho.

. características do discurso direto e a construção dos diálogos, das rubricas, próprios do texto teatral.

. a obra literária de Clarice Lispector, principalmente, os contos.

Estratégias e recursos da aula

Aula 1

6 Aula adaptada do site http://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html?aula=23180

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Professor, c onverse com seus alunos sobre esquetes teatrais. Pergunte a eles se as conhecem, se já assistiram a alguma.

Apresente a eles um vídeo de uma esquete teatral. Peça que, ao assistirem, observem as características básicas desse gênero.

Disponível em,: http://www.barbixas.com.br/video_coiso.html. Acesso em 18 de julho de 2012.

Ouça os alunos e liste, no quadro de giz, as características que notaram no vídeo da esquete teatral. Convide um professor de teatro para auxiliar os alunos, explicando melhor uma esquete teatral. Seria enriquecedor se ele apresentasse uma esquete para os alunos.

Depois, apresente aos alunos o conceito de uma esquete teatral e suas características. Compare com as informações que os alunos deram anteriormente. Está disponível em:

http://brigadeiroschorcht.com.br/projlinguagens.htm

http://pt.wikipedia.org/wiki/Sketch

Convide seus alunos a elaborarem esquetes. Aproveite esse momento para que os alunos conheçam a obra de Clarice Lispector. Há vários contos que poderiam ser adaptados para esse gênero.

Leve-os à biblioteca da escola. Divida-os em grupos. Peça que cada grupo escolha um conto de Clarice Lispector. Você, professor, pode fornecer a eles uma lista de sugestões. Há um site que disponibiliza vários títulos. Ei-lo:

http://contosdocovil.wordpress.com/2008/05/12/contos-de-clarice-lispector/

Destaco os seguintes contos para a adaptação:

1. Uma galinha 2. Felicidade Clandestina 3. Feliz aniversário 4. O segredo

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5. Laços de Família

Aula 2

Professor,

Após a escolha do conto, divida novamente a turma em grupos, para que os alunos possam fazer uma leitura mais aprofundada do conto. Peça que destaquem o conflito principal, as personagens e suas características, o envolvimento de cada um na história e a evolução de suas ações.

Não se esqueça de enfatizar dois aspectos importantes de uma esquete: o caráter cômico ou dramático. Os alunos, ao escreverem as respectivas adaptações dos contos, devem optar pela comicidade ou pelo drama em suas representações.

Feita essa análise, promova uma "mesa redonda" em sala de aula, para a verificação da leitura dos contos. Assim, todos os alunos conhecerão as histórias escolhidas pelos grupos, além de cada grupo apresentar a escolha feita de como farão a adaptação, quer seja pelo lado cômico, quer seja pelo lado dramático.

Aula 3

Professor,

É o momento da adaptação dos contos de Clarice Lispector em esquetes teatrais. Oriente seus alunos na elaboração. Destaque que o texto deve conter diálogos, rubricas - também chamadas “Indicações de cena”-, além de transformar o conto em uma peça de teatro de curta duração.

Reserve tempo entre esta aula e a próxima para que os alunos possam trocar os textos entre si, redigir diferentes versões de sua escrita, até que tenham o que consideram o texto ideal e final.

Aula 4

Professor,

Para a apresentação das esquetes elaboradas pelos alunos, promova em sua escola, um festival de esquetes teatrais. Uma semana destinada às apresentações. Cada dia reservado a uma esquete. Os próprios alunos, com a ajuda do professor da área de Artes, poderiam criar os convites e as filipetas, pequenos folhetos para a divulgação do evento.

O evento promoveria a divulgação dos contos de Clarice Lispector, mesmo que adaptados em esquetes. Certamente, fomentaria o desejo dos expectadores a conhecerem os originais.

É importante registrar as apresentações, fotografando e filmando. Todos os registros poderiam estar disponibilizados em um blog que os alunos poderiam criar, com seu auxílio. O blog, além

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de divulgar o trabalho com as esquetes, poderia ser utilizado para a divulgação dos futuros projetos a serem desenvolvidos pela turma.

Eis uma aula publicada no Portal do Professor sobre a criação de um blog literário: http://portaldoprofessor.mec.gov.br/fichaTecnicaAula.html?aula=9804

Recursos Complementares

Eis algumas sugestões de links que enriquecerão o seu trabalho, professor:

http://blogdivertudo.blogspot.com/2010/02/como-fazer-uma-peca-de-teatro-pra.html (Acesso em 29/07/2010) - Sobre a elaboração de uma peça teatral

https://www.blogger.com/start?hl=pt-BR (Acesso em 17/06/2010) - Como criar um Blog

Avaliação

As produções escritas darão a você, professor, a oportunidade para avaliar a utilização do repertório linguístico para a construção coerente dos textos solicitados, a partir das falas dos colegas, observando-se as características de uma esquete teatral e se os alunos estão empregando corretamente as regras ortográficas e gramaticais de acordo com seu ano escolar.

Observe se alunos que solicitavam sua ajuda constantemente para produzirem textos apresentaram avanço de autonomia na produção textual ou a um domínio específico: ortografia, pontuação...

Por último, você pode avaliar a atuação de cada um, dando atenção tanto à performance teatral desempenhada, como, especialmente, aos recursos para a encenação das histórias empregados por cada grupo. É importante lembrar que todos os alunos devem, de alguma forma, estar envolvidos nas propostas, mesmo ocupando papéis secundários ou atuando como contra-regras, sonoplastas, de forma a serem avaliados por igual.

Não se esqueça, professor, de dar voz aos alunos e às outras turmas para avaliar e apontar os aprendizados efetivos que tiveram, fazer proposições em relação à melhoria de sua expressão escrita e de leitura. Seu olhar é importante, mas não deve ser o único.

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Sugestões de Contos: 6º ano

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O dicionário de formas Ângela Lago

Ilustração: Patricia Lima. Foto: Eduardo Delfim

Era uma vez eu, Zé Sorveteiro, que me apaixonei por uma princesa que acabara de chegar do outro

lado da Terra. Bolei para ela um dicionário de quatro palavras: bola, quadrado, retângulo, triângulo.

Japonês se escreve com desenhos. Com desenhos a princesa aprenderia português!

Não demorou, ela estava arrasando. Ia até meu carrinho e pedia, desenhando no ar:

- Triângulo-bola.

Sorvete na casquinha! O dicionário funcionava às maravilhas.

Eu? Mandava bilhetes. Desenhava um quadrado com um triângulo em cima e escrevia: casa!!!

Caprichava nos pontos de exclamação. Casa!!! Casa!!! Fácil de entender: casa comigo.

Mas toda princesa tem uma fera para encontrar bilhetes. Uma hora a fera mandou me chamar.

Aí eu transformei ponto de exclamação em sinal de aguaceiro:

- Um traço com um pingo é chuva. Três - !!! - muita chuva. Casa, chuva, chuva, chuva. Estou só

avisando… Cuidado com goteiras.

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Acabei subindo e limpando as calhas do telhado do futuro sogro e as de cada um de seus amigos e

parentes.

Hoje, 60 anos depois, repito, valeu a pena. E lá vou eu apanhar uns triângulos vermelhos para a minha

rainha arrumar no triângulo do retângulo do quadrado da frente. Perfeito. Daqui a pouco a jarra da

mesa da sala estará toda perfumada com os… Como é mesmo? Vá lá! Com os triângulos vermelhos.

(Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/fundamental-1/dicionario-formas-634239.shtml> Acesso em: 10 de junho de 2012.)

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Acontece para quem acredita Edy Lima

Ilustração: Joana Lira

Era um jovem pescador muito pobre, que vivia sozinho numa praia distante. Tinha um pequeno

barco em que saía à noite para pescar e, no dia seguinte, vendia os peixes no povoado mais próximo.

Certa vez uma onda enorme tragou o barquinho, mas, na manhã seguinte, acordou em sua cabana

miserável e viu que tudo era como sempre tinha sido. Veio à sua lembrança uma bela moça que o

socorrera em meio às águas e o carregara para seu palácio no fundo do mar. Nesse momento, riu de si

mesmo e disse alto:

- Você sonhou com a Mãe D’Água. Foi só. Levantou-se para ir tomar água, sua garganta queimava de sede. Quando ergueu a caneca para beber viu um anel brilhando em seu dedo. - Que é isso? De repente se lembrou de uma cerimônia em que ele recebera aquele anel, no palácio no fundo do mar. Uma coisa dessas não podia ter acontecido. Mas o anel continuava um mistério.

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Em seguida sentiu uma dúvida terrível: e se estivesse morto? O jeito era se olhar no espelho, pois ouvira contar que fantasmas não refletem imagem. Claro que era tão pobre que nem tinha espelho em casa. E se quando fosse vender o peixe no povoado, se olhasse no espelho da barbearia? Será que tinha pescado alguma coisa? Só se lembrava daquela onda gigante que engolira seu barco. Correu até a praia e não viu o barco. Quem estava lá era a linda moça que o salvara na hora do naufrágio. Ela sorriu e disse: - Você não quis ficar na minha casa, vim morar na sua, afinal agora somos casados. Disse isso e estendeu a mão para ele. Ele viu então que ela usava um anel igual ao que brilhava em seu dedo. Respondeu: - Venha. Caminharam abraçados e, ao chegarem ao lugar onde ficava a cabana, ela não existia mais. Lá, agora, erguia-se um palácio e havia gente entrando e saindo. A moça disse: - É o meu povo das águas. De repente, ele notou que estava vestido com roupas luxuosas em vez dos trapos de antes. Sem dúvida a Mãe D´ Água o escolhera para marido e não havia força humana que pudesse mudar isso. Viveram felizes por algum tempo. Mas, se ele não tinha gostado de morar no palácio no fundo do mar, ela começou a se cansar de viver em terra firme. Ficava horas diante do mar rodeada por seu povo das águas. O palácio permanecia abandonado. Ninguém cuidava de nada, tudo era deixado na maior desordem. Um dia ele pronunciou as palavras fatais que ela o proibira de dizer em qualquer circunstância. - Arrenego o povo do mar!

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Era o que todos esperavam para voltar às profundezas do oceano. Suas palavras valeram como sinal para a debandada. A moça e todos os serviçais foram cantando para dentro do mar e sumiram nas águas. O pescador olhou para si mesmo e viu que suas roupas de luxo também tinham sumido. Estava outra vez vestido de trapos. Quando voltou para casa, só encontrou o casebre de antes, não havia nem rastro de algum palácio. Ao entardecer, sentiu saudades da Mãe D´Água e foi até a beira da praia. Lá estava seu velho barquinho, antes desaparecido. O pescador entrou nele e tomou o rumo do quebra-mar. De repente uma grande onda o envolveu e seu pensamento foi: - Será que tudo vai acontecer de novo?

Conto de Edy Lima, ilustrado por Joana Lira

(Disponível em:< http://revistaescola.abril.com.br/fundamental-1/acontece-quem-acredita-634302.shtml> . Acesso em 10 de junho de 2012.)

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Sugestões de Contos: 7º ano

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Se Eu Fosse Esqueleto

Ricardo Azevedo

- Na moral! Cadê a grana? Se eu fosse esqueleto, entrava no banco e gritava: bu! Bastaria um simples bu e aquela bandidagem ia cair dura no chão, com as calças molhadas de úmido pavor. O gerente e os clientes do banco iam agradecer e até me abraçar, só um pouco, mas tenho certeza de que iam. Se eu fosse caveira, de repente vai ver que eu ia ser considerado um grande herói. Fora isso, um esqueleto perambulando na rua em plena luz do dia causaria uma baita confusão. O povo correndo sem saber para onde, sirenes gemendo, gente que nunca rezou rezando, o Exército batendo em retirada, aquele mundaréu desesperado e eu lá, todo contente, assobiando na calçada. Um repórter de TV, segurando o microfone, até podia chegar para me entrevistar: - Quem é você? E eu: - Sou um esqueleto. E o repórter: - O senhor fugiu do cemitério? Aí eu fingia que era surdo: - Ser mistério?

Se eu fosse esqueleto não ia poder tomar água nem suco

porque ia vazar tudo e molhar a casa inteira.

Tirando isso, ia acordar e pular da cama feliz como um

passarinho.

É que ser uma caveira de verdade deve ser muito

divertido.

Por exemplo. Faz de conta que um banco está sendo

assaltado. Aqueles bandidões nojentões, mauzões, armados

até os dentões, berrando:

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E o repórter, de novo, mais alto: - O senhor fugiu do cemitério? - Assumiu no magistério? - Cemitério! - Fala sério? Quem? Aí o repórter perdia a paciência: - O senhor é surdo? E eu: - Claro que sou! Não está vendo que não tenho nem orelha? Se eu fosse esqueleto talvez me levassem para a aula de Biologia de alguma escola. Já imagino eu lá parado e o professor tentando me explicar osso por osso, dente por dente, dizendo que os esqueletos são uma espécie de estrutura que segura nossas carnes, órgãos, nervos e músculos. Fico pensando nas perguntas e nos comentários dos alunos: - Como ele se chamava? - É macho ou fêmea? - Quantos anos ele tem? - Tem ou tinha? - Magrinho, não? - O cara sabia ler ou era analfabeto? - E a família dele? - Era rico ou pobre? - O coitado está rindo de quê? E ainda: - Professor, ele era careca? Enquanto isso, eu lá, no meio da aula, com aquela cara de caveira, sem falar nada para não assustar os alunos e matar o professor do coração.

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Uma coisa é certa. Deve ser muito bom ser esqueleto quando chega o Carnaval. Aí a gente nem precisa se fantasiar. Pode sair de casa numa boa, cair no samba, virar folião e seguir pela rua dançando, brincando e sacudindo os ossos. Parece mentira, mas, no Carnaval, porque é tudo brincadeira, a gente sempre acaba sendo do jeito que a gente é de verdade. Se eu fosse esqueleto, quando chegasse o Carnaval, ia sair cantando: Quando eu morrer Não quero choro nem vela Quero uma fita amarela Gravada com o nome dela Todo mundo sabe que o maior amigo do homem é o cachorro. O que a maioria infelizmente desconhece e a ciência moderna esqueceu de pesquisar é que o pior inimigo do esqueleto late, morde, abana o rabo, carrega pulgas e aprecia fazer xixi no poste. E se eu fosse esqueleto e por acaso um vira-lata me visse na rua, corresse atrás de mim e fugisse com algum osso dos meus?

(Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/fundamental-1/se-eu-fosse-esqueleto-689874.shtml> Acesso em 10 de

junho de 2012)

Ricardo Azevedo, autor deste conto, é escritor e ilustrador. Já escreveu mais de 100 livros para crianças

e jovens, entre eles Trezentos Parafusos a Menos (Ed. Companhia das Letrinhas) e Contos de Espanto e

Alumbramento (Ed. Scipione). É ganhador de vários prêmios, entre eles o Jabuti, que venceu cinco

vezes.

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Um problema difícil Pedro Bandeira*

Procurou o guarda do quarteirão, um sujeito muito amigo que já era conhecido de todos e costumava

sempre dar uma paradinha para aceitar um cafezinho oferecido por algum dos moradores.

O guarda ouviu com a maior das atenções. Correu depois para a delegacia e expôs ao delegado tudo o

que estava acontecendo.

O delegado balançou a cabeça, concordando. Sim, alguma coisa precisava ser feita, e logo! Na mesma

hora, o delegado passou a mão no telefone e ligou para um vereador, que costumava sensibilizar-se

com os problemas da comunidade.

Do outro lado da linha, o vereador ouviu sem interromper um só instante. Foi para a prefeitura e pediu

uma audiência ao prefeito. Contou tudo, tintim por tintim. O prefeito ouviu todos os tintins e foi

procurar um deputado estadual do mesmo partido para contar o que havia.

O deputado estadual não era desses políticos que só se lembram dos problemas da comunidade na hora

de pedir votos. Ligou para um deputado federal, pedindo uma providência urgente. O deputado federal

ligou para o governador do estado, que interrompeu uma conferência para ouvi-lo.

O problema era mesmo grave, e o governador voou até Brasília para pedir uma audiência ao ministro.

O ministro ouviu tudinho e, como já tinha reunião marcada com o presidente, aproveitou e relatou-lhe o

Era um problema dos grandes. A

turminha reuniu-se para discuti-lo e Xexéu

voltou para casa preocupado. Por mais que

pensas se, não atinava com uma solução.

Afinal, o que poderia ele fazer para resolver

aquilo? Era apenas um menino!

Xexéu decidiu falar com o pai e explicar

direitinho o que estava acontecendo. O pai

ouviu calado, muito sério, compreendendo a

gravidade da questão. Depois que o garoto

saiu da sala, o pai pensou um longo tempo.

Era mesmo preciso enfrentar o problema. Não

estava em suas mãos, porém, resolver um

caso tão difícil.

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problema.

O presidente compreendeu a gravidade da situação e convocou uma reunião ministerial. O assunto foi

debatido e, depois de ouvir todos os argumentos, o presidente baixou um decreto para resolver a

questão de uma vez por todas.

Aliviado, o ministro procurou o governador e contou-lhe a solução. O governador então ligou para o

deputado federal, que ficou muito satisfeito. Falou com o deputado estadual, que, na mesma hora,

contou tudo para o prefeito. O prefeito mandou chamar o vereador e mostrou-lhe que a solução já tinha

sido encontrada.

O vereador foi até a delegacia e disse a providência ao delegado. O delegado, contente com aquilo,

chamou o guarda e expôs a solução do problema. O guarda, na mesma hora, voltou para a casa do pai

do Xexéu e, depois de aceitar um café, relatou-lhe satisfeito que o problema estava resolvido.

O pai do Xexéu ficou alegríssimo e chamou o filho.

Depois de ouvir tudo, o menino arregalou os olhos:

- Aquele problema? Ora, papai, a gente já resolveu há muito tempo!

(Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/fundamental-1/problema-dificil-689865.shtml> Acesso em: 10 de junho de 2012.)

*Pedro Bandeira, autor deste conto, é escritor. Ganhou o Prêmio Jabuti na categoria

Melhor Livro Infantil em 1986 com O Fantástico Mistério de Feiurinha (Ed. FTD).

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Sugestões de Contos: 8º ano

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O primeiro beijo Clarice Lispector

Ilustração Ana Raquel

Ficar às vezes quieto, sem quase pensar, e apenas sentir - era tão bom. A concentração no sentir era

difícil no meio da balbúrdia dos companheiros.

E mesmo a sede começara: brincar com a turma, falar bem alto, mais alto que o barulho do

motor, rir, gritar, pensar, sentir, puxa vida! como deixava a garganta seca.

E nem sombra de água. O jeito era juntar saliva, e foi o que fez. Depois de reunida na boca

ardente engulia-a lentamente, outra vez e mais outra. Era morna, porém, a saliva, e não tirava a sede.

Uma sede enorme maior do que ele próprio, que lhe tomava agora o corpo todo.

A brisa fina, antes tão boa, agora ao sol do meio-dia tornara-se quente e árida e ao penetrar pelo

nariz secava ainda mais a pouca saliva que pacientemente juntava.

E se fechasse as narinas e respirasse um pouco menos daquele vento de deserto? Tentou por

instantes mas logo sufocava. O jeito era mesmo esperar, esperar. Talvez minutos apenas, talvez horas,

enquanto sua sede era de anos.

Os dois mais murmuravam que

conversavam: havia pouco iniciara-se o namoro

e ambos andavam tontos, era o amor. Amor com

o que vem junto: ciúme.

- Está bem, acredito que sou a sua primeira

namorada, fico feliz com isso. Mas me diga a

verdade, só a verdade: você nunca beijou uma

mulher antes de me beijar? Ele foi simples:

- Sim, já beijei antes uma mulher.

-Quem era ela? - perguntou com dor.

Ele tentou contar toscamente, não sabia

como dizer.

O ônibus da excursão subia lentamente a

serra. Ele, um dos garotos no meio da garotada

em algazarra, deixava a brisa fresca bater-lhe no

rosto e entrar-lhe pelos cabelos com dedos

longos, finos e sem peso como os de uma mãe.

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Não sabia como e por que mas agora se sentia mais perto da água, pressentia-a mais próxima, e

seus olhos saltavam para fora da janela procurando a estrada, penetrando entre os arbustos,

espreitando, farejando.

O instinto animal dentro dele não errara: na curva inesperada da estrada, entre arbustos estava...

o chafariz de onde brotava num filete a água sonhada. O ônibus parou, todos estavam com sede mas ele

conseguiu ser o primeiro a chegar ao chafariz de pedra, antes de todos.

De olhos fechados entreabriu os lábios e colou-os ferozmente ao orifício de onde jorrava a água. O

primeiro gole fresco desceu, escorrendo pelo peito até a barriga. Era a vida voltando, e com esta

encharcou todo o seu interior arenoso até se saciar. Agora podia abrir os olhos.

Abriu-os e viu bem junto de sua cara dois olhos de estátua fitando-o e viu que era a estátua de

uma mulher e que era da boca da mulher que saía a água. Lembrou-se de que realmente ao primeiro

gole sentira nos lábios um contato gélido, mais frio do que a água.

E soube então que havia colado sua boca na boca da estátua da mulher de pedra. A vida havia

jorrado dessa boca, de uma boca para outra.

Intuitivamente, confuso na sua inocência, sentia intrigado: mas não é de uma mulher que sai o

líquido vivificador, o líquido germinador da vida... Olhou a estátua nua.

Ele a havia beijado.

Sofreu um tremor que não se via por fora e que se iniciou bem dentro dele e tomou-lhe o corpo

todo estourando pelo rosto em brasa viva. Deu um passo para trás ou para frente, nem sabia mais o que

fazia. Perturbado, atônito, percebeu que uma parte de seu corpo, sempre antes relaxada, estava agora

com uma tensão agressiva, e isso nunca lhe tinha acontecido.

Estava de pé, docemente agressivo, sozinho no meio dos outros, de coração batendo fundo,

espaçado, sentindo o mundo se transformar. A vida era inteiramente nova, era outra, descoberta com

sobressalto. Perplexo, num equilíbrio frágil.

Até que, vinda da profundeza de seu ser, jorrou de uma fonte oculta nele a verdade. Que logo o

encheu de susto e logo também de um orgulho antes jamais sentido: ele...

Ele se tornara homem.

(Disponível em: < http://revistaescola.abril.com.br/fundamental-2/primeiro-beijo-634373.shtml> Acesso em 10 de junho de 2012).

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Miss Corisco

Ilustração Marcelo Gomes

Respeitamos o segredo (escreveu o jornal), pois naturalmente encobria uma linda história de amor.

Depois perguntaram: Qual o seu maior desejo? Respondeu: Sempre ver o Brasil na vanguarda de todos

os empreendimentos. Resposta admirável (comentou O Cachoeirense) que revela em Miss Corisco uma

patriota digna de emparelhar com Clara Camarão, Anita Garibaldi, Dona Margarida de Barros e outras

heroínas da nacionalidade. Finalmente perguntaram: O que pensa do amor? Respondeu: O amor, na

minha fraca opinião, é uma coisa incompreensível mas que governa o mundo. Palavras (acentuou o

órgão) que encerram uma profunda filosofia muito de admirar atentos o sexo e a juventude da

encantadora Miss.

Aí deu uma entrevista para o O Cachoeirense. Perguntaram: Qual a maior emoção de sua vida?

Respondeu: Três: minha primeira comunhão, uma fita do Rodolfo Valentino que eu vi na capital do meu

querido Estado e... não conto porque é segredo. Respeitamos o segredo (escreveu o jornal), pois

naturalmente encobria uma linda história de amor. Depois perguntaram: Qual o seu maior desejo?

Respondeu: Sempre ver o Brasil na vanguarda de todos os empreendimentos. Resposta admirável

(comentou O Cachoeirense) que revela em Miss Corisco uma patriota digna de emparelhar com Clara

Embora alguns nacionalistas

teimassem em chamá-la de senhorita, o título

oficial era Miss Corisco. Dez casas no bairro

tomavam conta da igreja pobre que primeiro

nem caixa de esmolas tinha. Depois

compraram uma caixa. Mas nunca viu um

tostão porque o dinheiro que havia se gastou

todo com ela. Miss Corisco foi eleita pelo

sistema de exclusão. A filha do Bentinho era

sardenta. A irmã do João tinha um defeito nas

cadeiras. Logo de saída a Conceição se impôs:

foi aclamada Miss Corisco.

Aí deu uma entrevista para o O

Cachoeirense. Perguntaram: Qual a maior

emoção de sua vida? Respondeu: Três: minha

primeira comunhão, uma fita do Rodolfo

Valentino que eu vi na capital do meu querido

Estado e... não conto porque é segredo.

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Camarão, Anita Garibaldi, Dona Margarida de Barros e outras heroínas da nacionalidade. Finalmente

perguntaram: O que pensa do amor? Respondeu: O amor, na minha fraca opinião, é uma coisa

incompreensível mas que governa o mundo. Palavras (acentuou o órgão) que encerram uma profunda

filosofia muito de admirar atentos o sexo e a juventude da encantadora Miss.

Miss Corisco foi retratada em várias posições: com um cachorrinho no colo, apanhando rosas no

jardim, as costas das mãos sustentando o queixo. Deu também um autógrafo. Papel cor-de-rosa de

bordas douradas, risquinhos de lápis para sair bem direitinho e as letras se equilibrando neles. O

cunhado ditou. Os representantes do O Cachoeirense se retiraram. Miss Corisco foi varrer a cozinha

como era de sua obrigação todos os dias inclusive domingos e feriados e na manhã seguinte tomou a

jardineira em companhia do irmão casado para comparecer na cidade perante o júri estadual.

O Cine-Teatro Esmeralda estourava de tão cheio. No palco atrás do júri a Corporação Musical C.

Gomes-G. Puccini tocava dobrados. De minuto em minuto a assistência entusiasmada erguia vivas ao

Brasil e à raça. As candidatas desfilaram vestidas com apurado gosto. Os juízes eram cinco: um

brasileiro, dois italianos, um filho de italiano e um português. Predominava neles o espírito nacionalista.

Queriam escolher um tipo bem brasileiro. O doutor Noé Cavalheiro desenhou em dois traços incisivos o

tipo-padrão: boca grande e olhos ternos. Miss Corisco foi eleita Miss Paraíba do Sul por quatro votos.

Ouviu então o primeiro discurso que foi proferido com emoção que lhe embargava a voz e lenço

de seda na mão, pelo doutor Noé Cavalheiro, segundo promotor público. Principiou este fazendo o

elogio da beleza notadamente da beleza feminina. Falou do culto que na antiga Grécia se votava à

formosura física. Acentuou depois a desvantagem de uma mens sana desde que não seja num corpore

sano. Disse que a beleza da mulher se tem provocado guerras e catástrofes tem também mais de uma

vez contribuído para o progresso geral dos povos, citando vários exemplos históricos. Prosseguiu

afirmando que o Brasil deveu muito do amor que lhe dedicou D. Pedro I à influência benéfica da

Marquesa de Santos. Referiu-se à competência do júri, à sua isenção de ânimo e confessou que a única

nota dissonante tinha sido ele orador, o que provocou os protestos unânimes da assistência. Perorando

entoou um hino inflamado à peregrina formosura de Miss Corisco. Disse então: Unindo à beleza clássica

da Vênus de Milo a sedução estonteante da lendária rainha de Nínive, Miss Paraíba do Sul, maior do que

Beatriz e mais feliz do que Natércia, conquistou o coração de toda uma região! A Pátria não é somente,

como soem pensar certos espíritos imbuídos de materialismo, ou a lei que garante a propriedade

privada! A Pátria é mais alguma coisa, alguma coisa de sublime e divino! A Pátria é a estrela que nos

contempla do céu e a mulher que nos santifica o lar! A Pátria sois vós, Miss Paraíba do Sul, são os vossos

olhos onde se espelham todas as forças viris da nacionalidade! Para nós, patriotas, conscientes e eternos

enamorados da Beleza, Miss Paraíba do Sul é neste momento o Brasil! (Aplausos prolongados. O orador

é vivamente cumprimentado. Vozes sinceras gritam: Bis! Bis!)

Um a um os membros do júri beijaram as mãozinhas róseas e espirituais de Miss Paraíba do Sul

enquanto a Corporação Musical C. Gomes-G. Puccini, sob a regência do maestro Pietro Zaccagna,

atacava vigorosamente a imortal protofonia do Guarani.

Muito vermelha e batendo com ar ingênuo as pálpebras aveludadas, Miss Paraíba do Sul

concedeu então as primeiras entrevistas. Externou sua opinião sobre a futura sucessão presidencial, a

cultura da laranja, a questão religiosa no México, Mussolini, padre Cícero, a estabilização cambial, Victor

Hugo, Coelho Neto, os perfumes nacionais, a sentença que absolveu Febrônio, o diabo. No Grande Hotel

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Mundial era uma romaria de manhã à noite. Muito afável, Miss Paraíba do Sul recebia toda a gente com

um encantador sorriso brincando nos lábios purpurinos. O camareiro do apartamento chegou a declarar

quando entrevistado por um jornalista: É de uma amabilidade extraordinária. Recebe todos. Quem bate

no quarto entra. Mas o irmão, pelo sim, pelo não, caiu de bofetadas em cima do camareiro. O caso foi

parar na polícia onde o prestígio de Miss Paraíba do Sul conseguiu arranjar tudo do melhor modo

possível.

Puseram à sua disposição um automóvel fechado, uma máquina de escrever portátil e um

binóculo de corridas. Todos os dias choviam os presentes. O futuroso arquiteto Barros Jandaia pôs

gratuitamente seus serviços profissionais às ordens de Miss Paraíba do Sul. O cabeleireiro não lhe quis

cobrar nada e ainda por cima lhe deu vinte vales dando direito a outras tantas lavagens com Pixavon. A

Livraria Cosmopolita ofereceu um rico exemplar do Paraíso Perdido. E assim por diante.

Miss Paraíba do Sul foi recebida em audiência especial pelo presidente do Estado, respondeu

com muita graça às perguntas de S. Exa. e distribuiu cigarros Petit Londrinos (ovalados) aos presos da

cadeia pública. Visitou também a Câmara Municipal. Aí foi saudada por um vereador que a comparou à

mimosa violeta dos nossos vergéis que não só atrai pela beleza como prende pelo seu perfume e

conquista pela sua modéstia exemplar.

Foram quinze dias bem cheios. Repletos. Não houve um minuto de folga. Miss Paraíba do Sul

embora delicadamente deixou transparecer que a glória era um fardo pesado demais para seus ombros

frágeis. E seguiu de vagão especial para a capital do país. Todas as cidades do percurso enviavam à

estação o juiz de direito, o promotor, o delegado, o prefeito, o coletor federal e o sacristão da matriz

que se incumbia dos foguetes. O trem apitava, as palmas estalavam com o vivório, o trem seguia. Miss

Paraíba do Sul chegou ao Rio com uma dor de cabeça que não agüentava mesmo.

Começou a torcida brava. Para disfarçar, festas e mais festas. E sonetos na seção livre dos

jornais. E bilhetes de apaixonados anônimos. E baile na torpedeira Paraíba do Sul. E retratos de todo o

jeito nas revistas. E chás com as rivais. E tesouradas gostosas nas rivais. E entrevistas, entrevistas,

entrevistas. Um repórter mais audacioso penetrou no quarto de Miss Paraíba do Sul e tirou uma

fotografia muito original. Com efeito. No dia seguinte o povo carioca abrindo o jornal deu de cara com

um pé de sapato enquadrado pela seguinte nota: Enquanto Miss Paraíba do Sul jantava, conseguimos

penetrar no seu aposento e cometemos a deliciosa maldade de fotografar um perfumado sapatinho que

se encontrava sobre o toucador. Levamos a nossa indiscrição ao ponto de verificarmos o número: era

trinta e três e meio! Para encanto dos nossos leitores publicamos um clichê do sapatinho da nova Maria

Borralheira da Graça e da Beleza.

Coisas assim comovem. Miss Paraíba do Sul deu ao repórter como lembrança o famoso

sapatinho. Mesmo porque (observou muito bem o irmão casado) já estava imprestável com a sola até

fura não fura. Enorme multidão teve a felicidade de vê-lo exposto na redação do jornal. Não houve um

parecer discordante: era de fato um amor de sapatinho.

Enfim vieram as provas do concurso. Miss Paraíba do Sul passeou de roupa de banho para os

velhos do júri apreciarem bem as formas dela e submeteu-se ao exame antropométrico no Museu

Nacional. Sua ficha foi discutida nas sociedades científicas, empolgou a imprensa, provocou

desinteligências entre pessoas que se davam desde

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os bancos escolares. Tudo inútil porém. Miss Paraíba do Sul não foi considerada a mais digna de

representar o Brasil no torneio de Galveston.

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Ilustração Marcelo Gomes

Foi consagrada a Miss Pindorama, a Miss Terra de Santa Cruz, a Miss Simpatia Verde-Amarela.

Todos reconheceram que a vitória moral lhe pertencia. Era um consolo.

De volta à capital do seu Estado, no entanto, ela resolveu mudar de atitude. Criticou duramente

a decisão do júri. Miss Brasil? Uma beleza sem dúvida. Mas beleza impassível. E que vale a formosura

sem a graça? Depois sem gosto algum. Cada vestido que só vendo. Todos de carregação. E era visível

nos seus traços a ascendência estrangeira. O Brasil seria representado em Galveston. A raça brasileira

não. E por aí foi. Nem os organizadores do concurso escaparam. Amáveis, sim. Porém parciais. Um

deles, careca barbado, vivia amolando as candidatas com galanteios muito bobos. Por isso mesmo levou

um dia a sua. Uma das concorrentes lhe perguntou: Por que não corta um pedaço da barba e gruda na

cabeça para fingir de cabelo? Disse isso sim. Como não. Na cara. Como não. E perto de gente. Ora se. Ele

ficou enfiado.

Corisco recebeu de luto na alma a sua Vênus. O pai de Miss Paraíba do Sul sacudiu a cabeça

murmurando: Que injustiça! Que injustiça! Inutilmente ela e o irmão casado falavam na vitória moral, na

simpatia do povo, nos protestos da imprensa. Ela contava: Uma vez quando saía do hotel um popular

me disse que eu era a eleita do coração dos brasileiros! Então, papai, que tal?

Mas o velho não se convencia. É. Muito bonito. Realmente. Mas os oitenta e quatro contos foi

outra que abiscoitou. Aí é que está. Os oitenta e quatro contos foi outra que abiscoitou. Injustiça.

Injustiça. O Brasil vai de mal a pior. Mas depois era preciso jurar que não, que o Brasil ia muito bem, que

a vitória moral era mais que suficiente, que dinheiro não faz a felicidade de ninguém porque Miss

Corisco, Miss Paraíba do Sul, Miss Pindorama, Miss Terra de Santa Cruz, Miss Simpatia Verde-Amarela

começava a chorar.

(Disponível em: < http://revistaescola.abril.com.br/fundamental-2/primeiro-beijo-634373.shtml> Acesso em 10 de junho de 2012).

Chorou de verdade. Não se pode negar.

Chorou. Mas isso no hotel. Em público

não perdeu a linha. Era toda sorriso

diante de Miss Brasil. Entrevistada,

declarou que a escolha do júri tinha sido

justa. Admiradores seus protestaram

com energia. Um grupo de estudantes

deitou manifesto a seu favor. Ela sorria

agradecida e dizia coisas amáveis a

respeito de Miss Brasil.

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Sugestões de Contos: 9º ano

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A cartomante Machado de Assis

Ilustração Renato Alarcão

- Não diga isso, Camilo. Se você soubesse como eu tenho andado, por sua causa. Você sabe; já

lhe disse. Não ria de mim, não ria...

Camilo pegou-lhe nas mãos e olhou para ela sério e fixo. Jurou que lhe queria muito, que os seus

sustos pareciam de criança; em todo o caso, quando tivesse algum receio, a melhor cartomante era ele

mesmo. Depois, repreendeu-a; disse-lhe que era imprudente andar por essas casas. Vilela podia sabê-lo,

e depois...

- Qual saber! Tive muita cautela ao entrar na casa.

- Onde é a casa?

- Aqui perto, na rua da Guarda Velha; não passava ninguém nessa ocasião. Descansa; eu não sou

maluca.

Hamlet observa a Horácio que há

mais coisas no céu e na terra do que sonha

a nossa filosofia. Era a mesma explicação

que dava a bela Rita ao moço Camilo,

numa sexta-feira de novembro de 1869,

quando este ria dela por ter ido na véspera

consultar uma cartomante; a diferença é

que o fazia por outras palavras.

- Ria, ria. Os homens são assim; não

acreditam em nada. Pois saiba que fui, e

que ela adivinhou o motivo da consulta,

antes mesmo que eu lhe dissesse o que

era. Apenas começou a botar as cartas,

disse-me: "A senhora gosta de uma

pessoa..." Confessei que sim, e então ela

continuou a botar as cartas, combinou-as e

no fim declarou-me que eu tinha medo de

que você me esquecesse, mas que não era

verdade...

- Errou! - interrompeu Camilo, rindo.

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Camilo riu outra vez.

- Tu crês deveras nessas coisas? - perguntou-lhe.

Foi então que ela, sem saber que traduzia Hamlet em vulgar, disse-lhe que havia muita coisa

misteriosa e verdadeira neste mundo. Se ele não acreditava, paciência; mas o certo é que a cartomante

adivinhara tudo. Que mais? A prova é que ela agora estava tranquila e satisfeita.

Cuido que ele ia falar, mas reprimiu-se. Não queria arrancar-lhe as ilusões. Também ele, em

criança, e ainda depois, foi supersticioso, teve um arsenal inteiro de crendices, que a mãe lhe incutiu e

que aos vinte anos desapareceram. No dia em que deixou cair toda essa vegetação parasita, e ficou só o

tronco da religião, ele, como tivesse recebido da mãe ambos os ensinos, envolveu-os na mesma dúvida

e logo depois em uma só negação total. Camilo não acreditava em nada. Por quê? Não poderia

dizê-lo, não possuía um só argumento; limitava-se a negar tudo. E digo mal, porque negar é ainda

afirmar, e ele não formulava a incredulidade; diante do mistério, contentou-se em levantar os ombros e

foi andando.

Separaram-se contentes, ele ainda mais que ela. Rita estava certa de ser amada; Camilo, não só

o estava, mas via-a estremecer e arriscar-se por ele, correr às cartomantes, e, por mais que a

repreendesse, não podia deixar de sentir-se lisonjeado. A casa do encontro era na antiga rua dos

Barbonos, onde morava uma comprovinciana de Rita. Esta desceu pela rua das Mangueiras, na direção

de Botafogo, onde residia; Camilo desceu pela da Guarda Velha, olhando de passagem para a casa da

cartomante.

Vilela, Camilo e Rita, três nomes, uma aventura, e nenhuma explicação das origens. Vamos a ela.

Os dois primeiros eram amigos de infância. Vilela seguiu a carreira de magistrado. Camilo entrou no

funcionalismo, contra a vontade do pai, que queria vê-lo médico; mas o pai morreu, e Camilo preferiu

não ser nada, até que a mãe lhe arranjou um emprego público. No princípio de 1869, voltou Vilela da

província, onde casara com uma dama formosa e tonta; abandonou a magistratura e veio abrir banca de

advogado. Camilo arranjou-lhe casa para os lados de Botafogo e foi a bordo recebê-lo.

- É o senhor? - exclamou Rita, estendendo-lhe a mão. - Não imagina como meu marido é seu

amigo; falava sempre do senhor.

Camilo e Vilela olharam-se com ternura. Eram amigos deveras. Depois, Camilo confessou de si

para si que a mulher do Vilela não desmentia as cartas do marido. Realmente, era graciosa e viva nos

gestos, olhos cálidos, boca fina e interrogativa. Era um pouco mais velha que ambos: contava trinta

anos, Vilela vinte e nove e Camilo vinte e seis. Entretanto, o porte grave de Vilela fazia-o parecer mais

velho que a mulher, enquanto Camilo era um ingênuo na vida moral e prática. Faltava-lhe tanto a ação

do tempo como os óculos de cristal, que a natureza põe no berço de alguns para adiantar os anos. Nem

experiência nem intuição.

Uniram-se os três. Convivência trouxe intimidade. Pouco depois morreu a mãe de Camilo, e

nesse desastre, que o foi, os dois mostraram-se grandes amigos dele. Vilela cuidou do enterro, dos

sufrágios e do inventário; Rita tratou especialmente do coração, e ninguém o faria melhor.

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Como daí chegaram ao amor, não o soube ele nunca. A verdade é que gostava de passar as

horas ao lado dela; era a sua enfermeira moral, quase uma irmã, mas principalmente era mulher e

bonita. Odor di femina: eis o que ele aspirava nela, e em volta dela, para incorporá-lo em si próprio.

Liam os mesmos livros, iam juntos a teatros e passeios. Camilo ensinou-lhe as damas e o xadrez e

jogavam às noites; ela mal, ele, para lhe ser agradável, pouco menos mal. Até aí as coisas. Agora a ação

da pessoa, os olhos teimosos de Rita, que procuravam muita vez os dele, que os consultavam antes de o

fazer ao marido, as mãos frias, as atitudes insólitas. Um dia, fazendo ele anos, recebeu de Vilela uma

rica bengala de presente, e de Rita apenas um cartão com um vulgar cumprimento a lápis, e foi então

que ele pôde ler no próprio coração; não conseguia arrancar os olhos do bilhetinho. Palavras vulgares;

mas há vulgaridades sublimes ou, pelo menos, deleitosas. A velha caleça de praça, em que pela primeira

vez passeaste com a mulher amada, fechadinhos ambos, vale o carro de Apolo. Assim é o homem, assim

são as coisas que o cercam.

Camilo quis sinceramente fugir, mas já não pôde. Rita, como uma serpente, foi-se acercando

dele, envolveu-o todo, fez-lhe estalar os ossos num espasmo e pingou-lhe o veneno na boca. Ele ficou

atordoado e subjugado. Vexame, sustos, remorsos, desejos, tudo sentiu de mistura; mas a batalha foi

curta e a vitória delirante. Adeus, escrúpulos! Não tardou que o sapato se acomodasse ao pé, e aí foram

ambos, estrada fora, braços dados, pisando folgadamente por cima de ervas e pedregulhos, sem

padecer nada mais que algumas saudades, quando estavam ausentes um do outro. A confiança e estima

de Vilela continuavam a ser as mesmas.

Um dia, porém, recebeu Camilo uma carta anônima, que lhe chamava imoral e pérfido e dizia

que a aventura era sabida de todos. Camilo teve medo e, para desviar as suspeitas, começou a rarear as

visitas à casa de Vilela. Este notou-lhe as ausências. Camilo respondeu que o motivo era uma paixão

frívola de rapaz. Candura gerou astúcia. As ausências prolongaram-se, e as visitas cessaram

inteiramente. Pode ser que entrasse também nisso um pouco de amor-próprio, uma intenção de

diminuir os obséquios do marido, para tornar menos dura a aleivosia do ato.

Foi por esse tempo que Rita, desconfiada e medrosa, correu à cartomante para consultá-la

sobre a verdadeira causa do procedimento de Camilo. Vimos que a cartomante restituiu-lhe a confiança

e que o rapaz repreendeu-a por ter feito o que fez. Correram ainda algumas semanas. Camilo recebeu

mais duas ou três cartas anônimas, tão apaixonadas que não podiam ser advertência da virtude, mas

despeito de algum pretendente; tal foi a opinião de Rita, que, por outras palavras mal compostas,

formulou este pensamento: a virtude é preguiçosa e avara, não gasta tempo nem papel; só o interesse é

ativo e pródigo.

Nem por isso Camilo ficou mais sossegado; temia que o anônimo fosse ter com Vilela, e a

catástrofe viria então sem remédio. Rita concordou que era possível.

- Bem - disse ela -, eu levo os sobrescritos para comparar a letra com a das cartas que lá

aparecerem; se alguma for igual, guardo-a e rasgo-a...

Nenhuma apareceu; mas daí a algum tempo Vilela começou a mostrar-se sombrio, falando

pouco, como desconfiado. Rita deu-se pressa em dizê-lo ao outro, e sobre isso deliberaram. A opinião

dela é que Camilo devia tornar à casa deles, tatear o marido, e pode ser até que lhe ouvisse a

confidência de algum negócio particular. Camilo

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divergia; aparecer depois de tantos meses era confirmar a suspeita ou denúncia. Mais valia

acautelarem-se, sacrificando-se por algumas semanas. Combinaram os meios de se corresponderem,

em caso de necessidade, e separaram-se com lágrimas.

No dia seguinte, estando na repartição, recebeu Camilo este bilhete de Vilela: "Vem já, já, à

nossa casa; preciso falarte sem demora". Era mais de meio-dia. Camilo saiu logo; na rua, advertiu que

teria sido mais natural chamá-lo ao escritório; por que em casa? Tudo indicava matéria especial, e a

letra, fosse realidade ou ilusão, afigurou-se-lhe trêmula. Ele combinou todas essas coisas com a notícia

da véspera.

Ilustração Renato Alarcão

De caminho, lembrou-se de ir a casa; podia achar algum recado de Rita que lhe explicasse tudo. Não

achou nada, nem ninguém. Voltou à rua, e a ideia de estarem descobertos parecia-lhe cada vez mais

verossímil; era natural uma denúncia anônima, até da própria pessoa que o ameaçara antes; podia ser

que Vilela conhecesse agora tudo. A mesma suspensão das suas visitas, sem motivo aparente, apenas

com um pretexto fútil, viria confirmar o resto.

Camilo ia andando inquieto e nervoso. Não relia o bilhete, mas as palavras estavam decoradas,

diante dos olhos, fixas; ou então - o que era ainda pior - eram-lhe murmuradas ao ouvido, com a própria

voz de Vilela. "Vem já, já, à nossa casa; preciso falar-te sem demora." Ditas, assim, pela voz do outro,

tinham um tom de mistério e ameaça. Vem, já, já, para quê? Era perto de uma hora da tarde. A

comoção crescia de minuto a minuto. Tanto imaginou o que se iria passar que chegou a crê-lo e vê-lo.

Positivamente, tinha medo. Entrou a cogitar em ir armado, considerando que, se nada houvesse, nada

perdia, e a precaução era útil. Logo depois rejeitava a ideia, vexado de si mesmo, e seguia, picando o

passo, na direção do largo da Carioca, para entrar num tílburi. Chegou, entrou e mandou seguir a trote

largo.

Quanto antes, melhor", pensou ele; "não posso estar assim..."

Mas o mesmo trote do cavalo veio agravar-lhe a comoção. O tempo voava, e ele não tardaria a

entestar com o perigo. Quase no fim da rua da Guarda Velha, o tílburi teve de parar; a rua estava

atravancada com uma carroça, que caíra.

Camilo, em si mesmo, estimou o obstáculo e esperou. No fim de cinco minutos, reparou que ao

lado, à esquerda, ao pé do tílburi, ficava a casa da cartomante, a quem Rita consultara uma vez, e nunca

- Vem já, já, à nossa casa; preciso falar-te

sem demora - repetia ele com os olhos no papel.

Imaginariamente, viu a ponta da orelha de um

drama, Rita subjugada e lacrimosa, Vilela

indignado, pegando na pena e escrevendo o

bilhete, certo de que ele acudiria, e esperando-o

para matá-lo. Camilo estremeceu, tinha medo:

depois sorriu amarelo, e em todo caso

repugnava-lhe a ideia de recuar, e foi andando.

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ele desejou tanto crer na lição das cartas. Olhou, viu as janelas fechadas, quando todas as outras

estavam abertas e pejadas de curiosos do incidente da rua. Dir-se-ia a morada do indiferente Destino.

Camilo reclinou-se no tílburi para não ver nada. A agitação dele era grande, extraordinária, e do fundo

das camadas morais emergiam alguns fantasmas de outro tempo, as velhas crenças, as superstições

antigas. O cocheiro propôs-lhe voltar a primeira travessa e ir por outro caminho; ele respondeu que não,

que esperasse. E inclinava-se para fitar a casa... Depois fez um gesto incrédulo: era a idéia de ouvir a

cartomante, que lhe passava ao longe, muito longe, com vastas asas cinzentas; desapareceu, reapareceu

e tornou a esvair-se no cérebro; mas daí a pouco moveu outra vez as asas, mais perto, fazendo uns giros

concêntricos... Na rua, gritavam os homens, safando a carroça:

- Anda! Agora! Empurra! Vá! Vá!

Daí a pouco estaria removido o obstáculo. Camilo fechava os olhos, pensava em outras coisas;

mas a voz do marido sussurrava-lhe às orelhas as palavras da carta: "Vem já, já..." E ele via as contorções

do drama e tremia. A casa olhava para ele. As pernas queriam descer e entrar... Camilo achou-se diante

de um longo véu opaco... pensou rapidamente no inexplicável de tantas coisas. A voz da mãe repetia-lhe

uma porção de casos extraordinários, e a mesma frase do príncipe da Dinamarca reboava-lhe dentro:

"Há mais coisas no céu e na terra do que sonha a filosofia..." Que perdia ele se...?

Deu por si na calçada, ao pé da porta; disse ao cocheiro que esperasse, e rápido enfiou pelo

corredor, e subiu a escada. A luz era pouca, os degraus comidos dos pés,

o corrimão pegajoso; mas ele não viu nem sentiu nada. Trepou e bateu. Não aparecendo ninguém, teve

idéia de descer; mas era tarde, a curiosidade fustigava-lhe o sangue, as fontes latejavam-lhe; ele tornou

a bater uma, duas, três pancadas. Veio uma mulher; era a cartomante. Camilo disse que ia consultá-la,

ela fê-lo entrar. Dali subiram ao sótão, por uma escada ainda pior que a primeira e mais escura. Em

cima, havia uma salinha, mal alumiada por uma janela, que dava para o telhado dos fundos. Velhos

trastes, paredes sombrias, um ar de pobreza, que antes aumentava do que destruía o prestígio.

Ilustração Renato Alarcão

- Vejamos primeiro o que é que o traz aqui. O senhor tem um grande susto...

Camilo, maravilhado, fez um gesto afirmativo.

- E quer saber, continuou ela, se lhe acontecerá alguma coisa ou não...

- A mim e a ela - explicou vivamente ele.

A cartomante fê-lo sentar diante da mesa, e

sentou-se do lado oposto, com as costas para a

janela, de maneira que a pouca luz de fora batia

em cheio no rosto de Camilo. Abriu uma gaveta e

tirou um baralho de cartas compridas e

enxovalhadas. Enquanto as baralhava,

rapidamente, olhava para ele, não de rosto, mas

por baixo dos olhos. Era uma mulher de quarenta

anos, italiana, morena e magra, com grandes

olhos sonsos e agudos. Voltou três cartas sobre a

mesa e disse-lhe:

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A cartomante não sorriu; disse-lhe só que esperasse. Rápido pegou outra vez das cartas e

baralhou-as, com os longos dedos finos, de unhas descuradas; baralhou-as bem, transpôs os maços,

uma, duas, três vezes; depois começou a estendê-las. Camilo tinha os olhos nela, curioso e ansioso.

- As cartas dizem-me...

Camilo inclinou-se para beber uma a uma as palavras. Então ela declarou-lhe que não tivesse

medo de nada. Nada aconteceria nem a um nem a outro; ele, o terceiro, ignorava tudo. Não obstante,

era indispensável muita cautela; ferviam invejas e despeitos. Falou-lhe do amor que os ligava, da beleza

de Rita... Camilo estava deslumbrado. A cartomante acabou, recolheu as cartas e fechou-as na gaveta.

- A senhora restituiu-me a paz ao espírito - disse ele estendendo a mão por cima da mesa e

apertando a da cartomante.

Esta levantou-se, rindo.

- Vá - disse ela -; vá, ragazzo innamorato...

E de pé, com o dedo indicador, tocou-lhe na testa. Camilo estremeceu, como se fosse a mão da

própria sibila, e levantou-se também. A cartomante foi à cômoda, sobre a qual estava um prato com

passas, tirou um cacho destas, começou a despencá-las e comê-las, mostrando duas fileiras de dentes

que desmentiam as unhas. Nessa mesma ação comum, a mulher tinha um ar particular. Camilo, ansioso

por sair, não sabia como pagasse; ignorava o preço.

- Passas custam dinheiro - disse ele afinal, tirando a carteira. - Quantas quer mandar buscar?

- Pergunte ao seu coração - respondeu ela.

Camilo tirou uma nota de dez mil-réis e deu-lha. Os olhos da cartomante fuzilaram. O preço

usual era dois mil-réis.

- Vejo bem que o senhor gosta muito dela... E faz bem; ela gosta muito do senhor. Vá, vá

tranquilo. Olhe a escada, é escura; ponha o chapéu...

A cartomante tinha já guardado a nota na algibeira e descia com ele, falando, com um leve

sotaque. Camilo despediu-se dela embaixo e desceu a escada que levava à rua, enquanto a cartomante

alegre com a paga, tornava acima, cantarolando uma barcarola. Camilo achou o tílburi esperando; a rua

estava livre. Entrou e seguiu a trote largo.

Tudo lhe parecia agora melhor, as outras coisas traziam outro aspecto, o céu estava límpido e as

caras joviais. Chegou a rir dos seus receios, que chamou pueris; recordou os termos da carta de Vilela e

reconheceu que eram íntimos e familiares. Onde é que ele lhe descobrira a ameaça? Advertiu também

que eram urgentes e que fizera mal em demorar-se tanto; podia ser algum negócio grave e gravíssimo.

- Vamos, vamos depressa - repetia ele ao cocheiro.

E consigo, para explicar a demora ao amigo, engenhou qualquer coisa; parece que formou

também o plano de aproveitar o incidente para tornar à antiga assiduidade... De volta com os planos,

reboavam-lhe na alma as palavras da cartomante. Em verdade, ela adivinhara o objeto da consulta, o

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estado dele, a existência de um terceiro; por que não adivinharia o resto? O presente que se ignora vale

o futuro. Era assim, lentas e contínuas, que as velhas crenças do rapaz iam tornando ao de cima, e o

mistério empolgava-o com as unhas de ferro. Às vezes queria rir, e ria de si mesmo, algo vexado; mas a

mulher, as cartas, as palavras secas e afirmativas, a exortação: - Vá, vá, ragazzo innamorato; e no fim, ao

longe, a barcarola da despedida, lenta e graciosa, tais eram os elementos recentes, que formavam, com

os antigos, uma fé nova e vivaz.

A verdade é que o coração ia alegre e impaciente, pensando nas horas felizes de outrora e nas

que haviam de vir. Ao passar pela Glória, Camilo olhou para o mar, estendeu os olhos para fora, até

onde a água e o céu dão um abraço infinito, e teve assim uma sensação do futuro, longo, longo,

interminável.

Daí a pouco chegou à casa de Vilela. Apeou-se, empurrou a porta de ferro do jardim e entrou. A

casa estava silenciosa. Subiu os seis degraus de pedra e mal teve tempo de bater, a porta abriu-se e

apareceu-lhe Vilela.

- Desculpa, não pude vir mais cedo; que há?

Vilela não lhe respondeu: tinha as feições decompostas; fez-lhe sinal e foram para uma saleta

interior. Entrando, Camilo não pôde sufocar um grito de terror: ao fundo sobre o canapé, estava Rita

morta e ensanguentada. Vilela pegou-o pela gola e, com dois tiros de revólver, estirou-o morto no chão.

(Disponível em: < http://revistaescola.abril.com.br/fundamental-2/cartomante-634363.shtml> Acesso em 10 de junho de 2012.)

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Carta de um defunto rico

Lima Barreto

Ilustração Alexandre Camanho

Consegui afinal, como desejava o poeta, elevar-me bem longe dos miasmas mórbidos, purificar-me no ar superior - e bebo, como um puro e divino licor, o fogo claro que enche os límpidos espaços.

Não tenho as dificultosas tarefas que, por aí, pela superfície da terra, atazanam a inteligência de tanta gente.

Não me preocupa, por exemplo, saber se devo ir receber o poderoso imperador do Beluchistã com ou sem colarinho; não consulto autoridades constitucionais para autorizar minha mulher a oferecer ou não lugares do seu automóvel a príncipes herdeiros - coisa, aliás, que é sempre agradável às senhoras de uma democracia; não sou obrigado, para obter um título nobiliárquico, de uma problemática monarquia, a andar pelos adelos, catando suspeitas bugigangas, e pedir a literatos das ante-salas palacianas que as proclamem raridades de beleza, a fim de encherem salões de casas

"Meus caros amigos e parentes. Cá

estou no carneiro nº 7..., da 3ª quadra, à

direita, como vocês devem saber, porque

me puseram nele. Este Cemitério de São

João Batista da Lagoa não é dos piores. Para

os vivos, é grave e solene, com o seu severo

fundo de escuro e padrasto granítico. A

escassa verdura verde-negra das

montanhas de roda não diminuiu em nada a

imponência da antiguidade da rocha

dominante nelas. Há certa grandeza

melancólica nisto tudo; mora neste

pequeno vale uma tristeza teimosa que

nem o sol glorioso espanta... Tenho, apesar

do que se possa supor em contrário, uma

grande satisfação; não estou mais preso ao

meu corpo. Ele está no aludido buraco,

unicamente a fim de que vocês tenham um

marco, um sinal palpável para as suas

recordações; mas anda em toda a parte.

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de bailes e emocionarem os ingênuos com recordações de um passado que não devia ser avivado.

Afirmando isto, tenho que dizer as razões. Em primeiro lugar, tais bugigangas não têm, por si, em geral, beleza alguma; e, se a tiveram era emprestada pelas almas dos que se serviram delas. Semelhante beleza só pode ser sentida pelos descendentes dos seus primitivos donos.

Demais, elas perdem todo o interesse, todo o seu valor, tudo o que nelas possa haver de emocional, desde que percam a sua utilidade e desde que sejam retiradas dos seus lugares próprios. Há senhoras belas, no seu interior, com os seus móveis e as costuras; mas que não o são na rua, nas salas de baile e de teatro. O homem e as suas criações precisam, para refulgir, do seu ambiente próprio, penetrado, saturado das dores, dos anseios, das alegrias de sua alma; é com as emanações de sua vitalidade, é com as vibrações misteriosas de sua existência que as coisas se enchem de beleza.

É o sumo de sua vida que empresta beleza às coisas mortais; é a alma do personagem que faz a grandeza do drama, não são os versos, as metáforas, a linguagem em si etc. etc. Estando ela ausente, por incapacidade do ator, o drama não vale nada.

Por isso, sinto-me bem contente de não ser obrigado a caçar, nos belchiores e cafundós domésticos, bugigangas, para agradar futuros e problemáticos imperantes, porque teria que dar a elas alma, tentativa em projeto que, além de inatingível, é supremamente sacrílego.

De resto, para ser completa essa reconstrução do passado ou essa visão dele, não se podia prescindir de certos utensílios de uso secreto e discreto, nem tampouco esquecer determinados instrumentos de tortura e suplício, empregados pelas autoridades e grão-senhores no castigo dos seus escravos.

Há, no passado, muitas coisas que devem ser desprezadas e inteiramente eliminadas, com o correr do tempo, para a felicidade da espécie, a exemplo do que a digestão faz, para a do indivíduo, com certas substâncias dos alimentos que ingerimos.

Mas... estou na cova e não devo relembrar aos viventes coisas dolorosas.

Os mortos não perseguem ninguém e só podem gozar da beatitude da superexistência aqueles que se purificam pelo arrependimento e destroem na sua alma todo o ódio, todo o despeito, todo o rancor.

Os que não conseguem isso - ai deles!

Alonguei-me nessas considerações intempestivas, quando a minha tenção era outra.

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O meu propósito era dizer a vocês que o enterro esteve lindo. Eu posso dizer isto sem vaidade, porque o prazer dele, da sua magnificência, do seu luxo, não é propriamente meu, mas de vocês, e não há mal algum que um vivente tenha um naco de vaidade, mesmo quando é presidente de alguma coisa ou imortal da Academia de

Letras.

Enterro e demais cerimônias fúnebres não interessam ao defunto; elas são feitas por vivos para vivos.

É uma tolice de certos senhores disporem nos seus testamentos como devem ser enterrados. Cada um enterra seu pai como pode - é uma sentença popular, cujo ensinamento deve ser tomado no sentido mais amplo possível, dando aos sobreviventes a responsabilidade total do enterro dos seus parentes e amigos, tanto na forma como no fundo.

O meu, feito por vocês, foi de truz. O carro estava soberbamente agaloado; os cavalos bem paramentados e empenachados; as riquíssimas coroas, além de ricas, eram lindas. Da Haddock Lobo, daquele casarão que ganhei com auxílio das ordens terceiras, das leis, do câmbio e outras fatalidades econômicas e sociais que fazem pobres a maior parte dos sujeitos e a mim me fizeram rico; da porta dele até o portão de São João Batista, o meu enterro foi um deslumbramento. Não havia, na rua, quem não perguntasse quem ia ali.

Triste destino o meu, esse de, nos instantes do meu enterramento, toda uma população de uma vasta cidade querer saber o meu nome e dali a minutos, com a última pá de terra deitada na minha sepultura, vir a ser esquecido, até pelos meus próprios parentes.

Faço esta reflexão somente por fazer, porque, desde muito, havia encontrado, no fundo das coisas humanas, um vazio absoluto.

Essa convicção me veio com as meditações seguidas que me foram provocadas pelo fato de meu filho Carlos, com quem gastei uma fortuna em mestres, a quem formei, a quem coloquei altamente, não saber nada desta vida, até menos do que eu.

Adivinhei isto e fiquei a matutar como que é que ele gozava de tanta consideração fácil e eu apenas merecia uma contrariedade? Eu, que...

Carlos, meu filho, se leres isto, dá o teu ordenado àquele pobre rapaz que te fez as sabatinas por "tuta-e-meia"; e contenta-te com o que herdaste do teu pai e com o que tem tua mulher! Se não fizeres... ai de ti!

Nem o Carlos nem vocês outros, espero, encontrarão nesta última observação matéria para ter queixa de mim. Eu não tenho mais amizade, nem inimizade.

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Os vivos me merecem unicamente piedade; e o que me deu esta situação deliciosa em que estou foi ter sido, às vezes, profundamente bom. Atualmente, sou sempre...

Não seria, portanto, agora que, perto da terra, estou, entretanto, longe dela, que havia de fazer recriminações a meu filho ou tentar desmoralizá-lo. Minha missão, quando me consentem, é fazer bem e aconselhar o arrependimento.

Agradeço a vocês o cuidado que tiveram com o meu enterro; mas, seja-me permitido, caros parentes e amigos, dizer a vocês uma coisa. Tudo estava lindo e rico; mas um cuidado vocês não tiveram. Por que vocês não forneceram librés novas aos cocheiros das caleças, sobretudo, ao do coche, que estava vestido de tal maneira andrajosa que causava dó?

Se vocês tiverem que fazer outro enterro, não se esqueçam de vestir bem os pobres cocheiros, com o que o defunto, caso seja como eu, ficará muito satisfeito. O brilho do cortejo será maior e vocês terão prestado uma obra de caridade.

Era o que eu tinha a dizer a vocês. Não me despeço, pelo simples motivo de que estou sempre junto de vocês. É tudo isto do

José Boaventura da Silva.

N.B. - Residência, segundo a Santa Casa: Cemitério de São João Batista da Lagoa; e segundo a sabedoria universal, em toda a parte. - J.B.S."

Posso garantir que transladei esta carta para aqui sem omissão de uma vírgula.

(Disponível em: <http://revistaescola.abril.com.br/fundamental-2/carta-defunto-rico-634331.shtml> Acesso em: 10 de junho de 2012.)

Glossário:

* Carneiro: 1. Subterrâneo sepulcral. = CRIPTA. 2. Depósito de ossadas exumadas

dos cemitérios. 3. Cemitério.

*de truz!: de arromba, excelente.

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Conclusão

A leitura e produção de textos em sala de aula são responsáveis não apenas para a formação de

alunos capazes de resolver situações intelectuais. Esses meios de aprendizado levam as crianças

a outros níveis de sua própria existência, compreendendo melhor o que é estar e o que é ser no

nosso mundo.

Assim, o trabalho cotidiano de desvendar com os alunos novas formas de pensar e agir é um

ato de crescimento tanto daqueles que esperam aprender conosco, professores, quanto para

nossa formação enquanto cidadãos que interferem diretamente e cotidianamente na vida de

nossos alunos.

Esperamos que este projeto possa auxiliar os responsáveis pela sala de leitura e os professores

da Rede Municipal no trabalho com a leitura.

Abraços,

Equipe da Coordenação de Área de Língua Portuguesa – 6º ao 9º

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Referências Teóricas

BOSI, Alfredo. O conto brasileiro contemporâneo. São Paulo: Cultrix, 1977.

GOTLIB, Nádia Battella. Teoria do Conto. São Paulo: Ática, 1987.

MARIA, Luzia de. O que é conto. São Paulo : Brasiliense, 2004.