Prof. Fabricio Estevo da Silva

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Indaial – 2021 ECOLOGIA GERAL E URBANA Prof. Fabricio Estevo da Silva 1 a Edição

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Indaial – 2021

EcologiagEral E Urbana

Prof. Fabricio Estevo da Silva

1a Edição

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Copyright © UNIASSELVI 2021

Elaboração:

Prof. Fabricio Estevo da Silva

Revisão, Diagramação e Produção:

Centro Universitário Leonardo da Vinci – UNIASSELVI

Ficha catalográfica elaborada na fonte pela Biblioteca Dante Alighieri

UNIASSELVI – Indaial.

Impresso por:

S586e

Silva, Fabricio Estevo da Ecologia geral e urbana. / Fabricio Estevo da Silva – Indaial:UNIASSELVI, 2021. 288 p.; il.

ISBN 978-65-5663-943-7 ISBN Digital 978-65-5663-939-0 1. Ecologia. - Brasil. II. Centro Universitário Leonardo da Vinci.

CDD 577

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aprEsEntaçãoEste livro procura apresentar princípios, conceitos e simplificações

acerca dos estudos de ecologia enquanto ciência que busca compreender o mundo real. A ecologia é de interesse prático desde o Início da história da humanidade, ou seja, desde que a espécie humana iniciou o seu processo de utilizador dos recursos naturais. O desafio é aprender a ver o ambiente e a sociedade como um sistema único.

Esperamos que você utilize a obra como um texto básico sobre o tema ecologia. Trata-se de uma compilação das principais literaturas sobre o assunto com especial menção aos trabalhos dos irmãos Howard Thomas Odum e Eugene Pleasants Odum, considerados como os principais expoentes da ecologia moderna por agregaram em seus trabalhos pesquisadores de diversas áreas do conhecimento científico, e responsáveis pela ampla popularização do pensamento holístico nos estudos de ecologia dos ecossistemas. A literatura referência deste nosso trabalho é o livro “Fundamentos de Ecologia” de autoria de Eugene P. Odum e Gary W. Barrett, indicado também para o aprofundamento dos seus estudos sobre ecologia.

O livro está dividido em três unidades. Na Unidade 1, abordaremos os aspectos elementares de ecologia enquanto ciência de relevante importância para a humanidade. As bases conceituais da ciência ecológica serão apresentadas de forma sequencial, a partir do conhecimento do conceito de ecossistema. Em seguida serão abordados os principais componentes funcionais dos sistemas ecológicos, bem como o processamento energético nos ecossistemas.

Em seguida, na Unidade 2, estudaremos os componentes do

ecossistema tais como os ciclos biogeoquímicos que são o movimento dos elementos e compostos inorgânicos, essenciais para a vida, por toda biosfera; além de entender a influência do clima nos ecossistemas, reconhecendo que os padrões globais de temperatura e precipitação são estabelecidos pela variação sazonal na energia da radiação solar; estudaremos como se processa a regeneração dos nutrientes, ou seja, os caminhos e transformações químicas e biológica que os elementos seguem através dos ecossistemas; e concluindo esta unidade, discutiremos os fatores que regulam os ecossistemas.

Por fim, na Unidade 3, aprenderemos sobre as principais unidades da ecologia abordando os aspectos inerentes as interações entre as populações, co-munidades biológicas e como se processa o desenvolvimento do ecossistema.

Bons estudos!

Prof. Fabricio Estevo da Silva

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Você já me conhece das outras disciplinas? Não? É calouro? Enfim, tanto para você que está chegando agora à UNIASSELVI quanto para você que já é veterano, há novidades em nosso material.

Na Educação a Distância, o livro impresso, entregue a todos os acadêmicos desde 2005, é o material base da disciplina. A partir de 2017, nossos livros estão de visual novo, com um formato mais prático, que cabe na bolsa e facilita a leitura.

O conteúdo continua na íntegra, mas a estrutura interna foi aperfeiçoada com nova diagramação no texto, aproveitando ao máximo o espaço da página, o que também contribui para diminuir a extração de árvores para produção de folhas de papel, por exemplo.

Assim, a UNIASSELVI, preocupando-se com o impacto de nossas ações sobre o ambiente, apresenta também este livro no formato digital. Assim, você, acadêmico, tem a possibilidade de estudá-lo com versatilidade nas telas do celular, tablet ou computador. Eu mesmo, UNI, ganhei um novo layout, você me verá frequentemente e surgirei para apresentar dicas de vídeos e outras fontes de conhecimento que complementam o assunto em questão.

Todos esses ajustes foram pensados a partir de relatos que recebemos nas pesquisas institucionais sobre os materiais impressos, para que você, nossa maior prioridade, possa continuar seus estudos com um material de qualidade.

Aproveito o momento para convidá-lo para um bate-papo sobre o Exame Nacional de Desempenho de Estudantes – ENADE. Bons estudos!

NOTA

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Olá, acadêmico! Iniciamos agora mais uma disciplina e com ela um novo conhecimento.

Com o objetivo de enriquecer seu conhecimento, construímos, além do livro que está em suas mãos, uma rica trilha de aprendizagem, por meio dela você terá contato com o vídeo da disciplina, o objeto de aprendizagem, materiais complemen-tares, entre outros, todos pensados e construídos na intenção de auxiliar seu crescimento.

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Conte conosco, estaremos juntos nesta caminhada!

LEMBRETE

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sUmário

UNIDADE 1 — ELEMENTOS DA ECOLOGIA ............................................................................... 1

TÓPICO 1 — PROPÓSITO DA ECOLOGIA .................................................................................... 31 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................... 32 ECOLOGIA: SURGIMENTO E IMPORTÂNCIA ......................................................................... 33 HIERARQUIA DOS NÍVEIS DE ORGANIZAÇÃO .................................................................... 54 O PRINCÍPIO DA PROPRIEDADE EMERGENTE ...................................................................... 75 PROCESSOS DE CONTROLE .......................................................................................................... 86 INTERFACES DA ECOLOGIA ....................................................................................................... 107 MODELOS DE ESTUDOS ............................................................................................................... 10RESUMO DO TÓPICO 1..................................................................................................................... 16AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 17

TÓPICO 2 — SISTEMAS ECOLÓGICOS ....................................................................................... 191 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 192 CONCEITO DE ECOSSISTEMA .................................................................................................... 203 ESTRUTURA TRÓFICA DOS ECOSSISTEMAS ....................................................................... 264 GRADIENTES E ECÓTONOS ........................................................................................................ 275 DIVERSIDADE DO ECOSSISTEMA ............................................................................................ 306 CONTROLE BIOLÓGICO DO AMBIENTE GEOQUÍMICO .................................................. 327 CIBERNÉTICA DOS ECOSSISTEMAS ........................................................................................ 33RESUMO DO TÓPICO 2..................................................................................................................... 37AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 39

TÓPICO 3 — ENERGIA NO ECOSSISTEMA ................................................................................ 411 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 412 AS LEIS TERMODINÂMICAS ....................................................................................................... 413 RADIAÇÃO SOLAR ......................................................................................................................... 454 PRODUTIVIDADE ........................................................................................................................... 465 REPARTIÇÃO DE ENERGIA NAS CADEIAS ALIMENTARES ............................................. 496 QUALIDADE DE ENERGIA: eMergia .......................................................................................... 53LEITURA COMPLEMENTAR ............................................................................................................ 55RESUMO DO TÓPICO 3..................................................................................................................... 60AUTOATIVIDADE .............................................................................................................................. 62

REFERÊNCIAS ...................................................................................................................................... 64

UNIDADE 2 — COMPONENTES DO ECOSSISTEMA .............................................................. 69

TÓPICO 1 — CICLOS BIOGEOQUÍMICOS .................................................................................. 711 INTRODUÇÃO .................................................................................................................................. 712 TRANSFORMAÇÃO DA ENERGIA E A RECICLAGEM DOS ELEMENTOS ................... 723 COMPARTIMENTOS INTERLIGADOS DOS ECOSSISTEMAS .......................................... 734 TIPOS CLÁSSICOS DE CICLOS BIOGEOQUÍMICOS ........................................................... 75

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4.1 O CICLO DA ÁGUA .................................................................................................................... 764.2 O CICLO DO CARBONO ............................................................................................................ 80

4.2.1 A fotossíntese e a respiração .............................................................................................. 804.2.2 A troca oceano-atmosfera ................................................................................................... 804.2.3 A Precipitação de carbonatos ............................................................................................. 814.2.4 As mudanças no ciclo do carbono através do tempo ..................................................... 83

4.3 O CICLO DO NITROGÊNIO ...................................................................................................... 854.3.1 Amonificação ........................................................................................................................ 894.3.2 A nitrificação e a denitrificação .......................................................................................... 894.3.3 A Fixação de nitrogênio ...................................................................................................... 90

4.4 O CICLO DO FÓSFORO .............................................................................................................. 934.5 O CICLO DO ENXOFRE.............................................................................................................. 96

RESUMO DO TÓPICO 1................................................................................................................... 100AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 102

TÓPICO 2 — VARIAÇÕES NO AMBIENTE FÍSICO E A CICLAGEM DE NUTRIENTES ...................................................................................................... 1041 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 1042 PADRÕES GLOBAIS DE TEMPERATURA E PRECIPITAÇÃO ........................................... 104

2.1 CÉLULAS DE HADLEY ............................................................................................................ 1062.2 CONVERGÊNCIA INTERTROPICAL E O CINTURÃO SUBTROPICAL DE ALTA PRESSÃO ...................................................................................... 1072.3 VENTOS DE SUPERFÍCIE E SOMBRAS DE CHUVA .......................................................... 107

3 AS CORRENTES OCEÂNICAS DISTRIBUEM O CALOR E A UMIDADE ................................................................................................................................. 1084 VARIAÇÃO SAZONAL DO CLIMA ........................................................................................... 1095 O CLIMA SUSTENTA FLUTUAÇÕES IRREGULARES ......................................................... 1106 CARACTERÍSTICAS TOPOGRÁFICAS E GEOLÓGICAS .................................................. 1127 O CLIMA E A FORMAÇÃO DOS SOLOS ................................................................................. 113

7.1 INTEMPERISMO ....................................................................................................................... 1147.2 A PODZOLIZAÇÃO OCORRE EM SOLOS ÁCIDOS ........................................................... 1157.3 LATERIZAÇÃO DOS SOLOS ................................................................................................... 116

8 TEMPOS DE RENOVAÇÃO E DE RETENÇÃO ....................................................................... 1179 CICLAGEM DOS ELEMENTOS NÃO ESSENCIAIS .............................................................. 11710 CICLAGEM DE NUTRIENTES NOS TRÓPICOS .................................................................. 11911 CAMINHOS DA RECICLAGEM: O ÍNDICE DE CICLAGEM ........................................... 121

11.1 O ÍNDICE DE CICLAGEM...................................................................................................... 12211.2 RECICLAGEM DE PAPEL ...................................................................................................... 123

RESUMO DO TÓPICO 2................................................................................................................... 124AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 126

TÓPICO 3 — REGENERAÇÃO DOS NUTRIENTES ................................................................. 1291 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 1292 NUTRIENTES NOS ECOSSISTEMAS TERRESTRES NOS AMBIENTES TERRESTRES E AQUÁTICOS .................................................................. 1293 REGENERAÇÃO DOS NUTRIENTES EM ECOSSISTEMAS TERRESTRES .................... 130

3.1 O CLIMA AFETA A TAXA DE REGENERAÇÃO DE NUTRIENTES ................................ 1324 REGENERAÇÃO DOS NUTRIENTES EM ECOSSISTEMAS AQUÁTICOS .................... 133

4.1 A ESTRATIFICAÇÃO TÉRMICA NOS ECOSSISTEMAS AQUÁTICOS ........................... 1344.2 OS NUTRIENTES E A PRODUÇÃO NOS OCEANOS ......................................................... 1364.3 A REGENERAÇÃO DE NUTRIENTES EM ÁGUAS PROFUNDAS .................................. 1364.4 NUTRIENTES EM AMBIENTES ESTUARINOS E MANGUEZAIS ................................... 137

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RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 138AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 140

TÓPICO 4 — FATORES DE REGULAÇÃO NOS ECOSSISTEMAS ....................................... 1431 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 1432 CONCEITO DE FATORES LIMITANTES: A LEI DO MÍNIMO DE LIEBIG ..................... 143

2.1 CONCEITO DOS LIMITES DE TOLERÂNCIA ..................................................................... 1443 COMPENSAÇÃO DE FATOR E ECÓTIPOS ............................................................................. 1474 CONDIÇÕES DE EXISTÊNCIA COMO FATORES REGULATÓRIOS ............................... 1485 OUTROS FATORES FÍSICOS LIMITANTES ............................................................................ 150

5.1 TEMPERATURA ......................................................................................................................... 1505.2 LUZ ............................................................................................................................................... 1515.3 RADIAÇÕES IONIZANTES ..................................................................................................... 1525.4 ÁGUA ........................................................................................................................................... 155

5.4.1 Chuva .................................................................................................................................. 1555.4.2 Umidade .............................................................................................................................. 1565.4.3 Poder de evaporação do ar ............................................................................................... 1565.4.4 Suprimento de água superficial ....................................................................................... 157

5.5 ÁGUA SUBTERRÂNEA ............................................................................................................ 1585.6 AÇÃO CONJUNTA DE TEMPERATURA E UMIDADE ...................................................... 1595.7 GASES ATMOSFÉRICOS ........................................................................................................... 1605.8 MACRONUTRIENTES E MICRONUTRIENTES .................................................................. 1615.9 VENTO E ENCHENTE .............................................................................................................. 163

6 ESTRESSE ANTROPOGÊNICO COMO FATOR LIMITANTE ............................................. 1636.1 POLUIÇÃO DO AR .................................................................................................................... 1656.2 POLUIÇÃO TÉRMICA .............................................................................................................. 1666.3 PESTICIDAS ................................................................................................................................ 166

LEITURA COMPLEMENTAR .......................................................................................................... 168RESUMO DO TÓPICO 4................................................................................................................... 173AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 175

REFERÊNCIAS .................................................................................................................................... 177

UNIDADE 3 — UNIDADES DE ECOLOGIA ............................................................................... 181

TÓPICO 1 — ECOLOGIA DE POPULAÇÕES ............................................................................. 1831 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 1832 PROPRIEDADES DA POPULAÇÃO .......................................................................................... 183

2.1 ÍNDICES DE DENSIDADE ....................................................................................................... 1842.2 DENSIDADE, BIOMASSA E RELAÇÕES TRÓFICAS .......................................................... 184

2.2.1 Metabolismo e tamanho dos indivíduos: lei da potência 3/4 ...................................... 1852.2.2 Energética de escala e a lei dos retornos decrescentes ................................................. 187

2.3 MÉTODOS PARA ESTIMAR DENSIDADES POPULACIONAIS ...................................... 1882.4 NATALIDADE ............................................................................................................................ 1902.5 MORTALIDADE ......................................................................................................................... 1912.6 DISTRIBUIÇÃO ETÁRIA DA POPULAÇÃO ........................................................................ 192

3 CONCEITOS BÁSICOS DE TAXA .............................................................................................. 1944 TAXA INTRÍNSECA DE CRESCIMENTO................................................................................. 1965 CONCEITO DE CAPACIDADE DE SUPORTE ........................................................................ 1986 FLUTUAÇÃO DE POPULAÇÃO E OSCILAÇÕES CÍCLICAS .............................................. 202

6.1 TAXAS EXTRÍNSECAS .............................................................................................................. 2046.2 TAXAS INTRÍNSECAS .............................................................................................................. 204

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6.3 VISÃO GERAL DO CICLO ....................................................................................................... 2077 MECANISMOS DE REGULAÇÃO DA POPULAÇÃO INDEPENDENTE DE DENSIDADE E DEPENDENTES DE DENSIDADE.......................................................... 2078 PADRÕES DE DISPERSÃO .......................................................................................................... 2109 PRINCÍPIO DE AGREGAÇÃO E REFÚGIO ............................................................................. 21210 ÁREA DE AÇÃO E TERRITORIALIDADE.............................................................................. 21411 REPARTIÇÃO E OTIMIZAÇÃO DE ENERGIA: SELEÇÃO “r” SELEÇÃO “K” .................. 21712 GENÉTICA DE POPULAÇÕES .................................................................................................. 222RESUMO DO TÓPICO 1................................................................................................................... 226AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 228

TÓPICO 2 — EOLOGIA DE COMUNIDADES ........................................................................... 2311 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 2312 EOLOGIA DE COMUNIDADES: ASPECTOS GERAIS ......................................................... 2313 CONCEITOS ESTRUTURANTES NO ESTUDO DE COMUNIDADES ............................. 233

3.1 COEVOLUÇÃO .......................................................................................................................... 2343.2 EVOLUÇÃO DA COOPERAÇÃO: SELEÇÃO DE GRUPO ................................................. 2353.3 MEDIDAS DA ESTRUTURA DA COMUNIDADE ............................................................... 2373.4 O TERMO COMUNIDADE TEM RECEBIDO MUITOS SIGNIFICADOS ........................ 2383.5 A COMUNIDADE COMO UMA UNIDADE NATURAL DE ORGANIZAÇÃO ECOLÓGICA ........................................................................................ 2383.6 AS RELAÇÕES DE ALIMENTAÇÃO ORGANIZAM AS COMUNIDADES .................... 2393.7 OS NÍVEIS TRÓFICOS SÃO INFLUENCIADOS DE CIMA PELA PREDAÇÃO DE BAIXO PELA PRODUÇÃO ............................................................. 2403.8 AS ESPÉCIES NAS COMUNIDADES BIOLÓGICAS VARIAM NA ABUNDÂNCIA RELATIVA............................................................................................... 2413.9 NÚMERO DE ESPÉCIES E ÁREA MOSTRADA ................................................................... 2433.10 ÍNDICES DE DIVERSIDADE E A ABUNDÂNCIA RELATIVA ........................................ 244

4 TIPOS DE INTERAÇÕES ENTRE ESPÉCIES ............................................................................ 2455 COMPETIÇÃO INTERESPECÍFICA E COEXISTÊNCIA ....................................................... 2476 INTERAÇÕES POSITIVAS/NEGATIVAS: PREDAÇÃO, HERBIVORIA PARASITISMO E ALELOPATIA .................................................................................................. 2497 INTERAÇÕES POSITIVAS: COMENSALISMO, COOPERAÇÃO E MUTUALISMO ........................................................................................................................... 2518 CONCEITOS DE HABITAT, NICHO ECOLÓGICO É GUIDA ............................................. 2539 DAS POPULAÇÕES E COMUNIDADES AOS ECOSSISTEMAS E PAISAGENS ................ 256RESUMO DO TÓPICO 2................................................................................................................... 258AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 259

TÓPICO 3 — DESENVOLVIMENTO DO ECOSSISTEMA ...................................................... 2611 INTRODUÇÃO ................................................................................................................................ 2612 ESTRATÉGIAS DO DESENVOLVIMENTO DO ECOSSISTEMA ....................................... 2613 A SERE INCLUI TODOS OS ESTÁGIOS DA MUDANÇA SUCESSIONAL ..................... 262

3.1 A SUCESSÃO PRIMÁRIA COMEÇA EM HABITATS RECÉM-FORMADOS .................. 2633.2 A PERTURBAÇÃO INICIA UMA SUCESSÃO SECUNDÁRIA .......................................... 264

4 A SUCESSÃO E AS MUDANÇAS NO AMBIENTE CAUSADAS PELOS COLONIZADORES......................................................................................................................... 265

4.1 FACILITAÇÃO ............................................................................................................................ 2654.2 INIBIÇÃO..................................................................................................................................... 2664.3 TOLERÂNCIA ............................................................................................................................. 266

4.3.1 Aproximando-se do clímax .............................................................................................. 2675 ESPÉCIES SUCESSIONAIS E SUAS ADAPTAÇÕES ............................................................. 268

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6 COMUNIDADES CLÍMAX MANTIDAS POR CONDIÇÕES AMBIENTAIS EXTREMAS............................................................................................................ 2697 CLÍMACES TRANSITÓRIOS E CÍCLICOS .............................................................................. 271LEITURA COMPLEMENTAR .......................................................................................................... 273RESUMO DO TÓPICO 3................................................................................................................... 277AUTOATIVIDADE ............................................................................................................................ 279

REFERÊNCIAS .................................................................................................................................... 281

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UNIDADE 1 —

ELEMENTOS DA ECOLOGIA

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• entender o surgimento e a importância da ecologia como ciência e suas interfaces tanto no campo natural quanto no campo econômico;

• compreender os modelos e conceitos abordados em estudos de sistemas ecológicos e suas estruturas;

• demonstrar como ocorre a transferência e a qualidade da energia em ca-deias e teias alimentares nos diferentes níveis de um ecossistema;

• entender os conceitos de capacidade de suporte e sustentabilidade.

Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade, você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – PROPÓSITO DA ECOLOGIA

TÓPICO 2 – SISTEMAS ECOLÓGICOS

TÓPICO 3 – ENERGIA NO ECOSSISTEMA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.

CHAMADA

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TÓPICO 1 — UNIDADE 1

PROPÓSITO DA ECOLOGIA

1 INTRODUÇÃO

A ecologia, como estudo da Terra, emergiu completamente de suas raízes nas ciências biológicas para se tornar uma disciplina integrativa do ambiente. É o estudo científico do ambiente natural e das relações dos organismos uns com os outros e com as suas redondezas. A rigor, Ecologia é a ciência que estuda as relações dos seres vivos entre si e com seu meio físico. Este, por sua vez, também denominado como elementos abióticos (solo, relevo, recursos hídricos, ar e clima), deve ser entendido como o cenário natural em que os seres vivos se desenvolvem.

Independentemente das conquistas tecnológicas, os humanos sempre dependerão do ambiente natural para suas necessidades diárias, sejam elas de ordem vitais (ar, a água e alimento), ou para fins sociais de recreação, econômicos, entre outros serviços fornecidos pelo meio ambiente.

Nesse sentido, estudaremos, no Tópico 1, o propósito da ecologia: abordaremos, incialmente, o surgimento e importância do estudo da ecologia (subtópico 2); posteriormente veremos como a interação dos organismos com o meio físico se processa através da hierarquia e dos níveis de organização (subtópico 3); a seguir, vamos entender o princípio da propriedade emergente como um subproduto da organização hierárquica dos componentes de um sistema ecológico (subtópico 4); na sequência, serão apresentadas algumas funções básicas que operam em todos os níveis hierárquicos, denominados de processos de controle (subtópico 5); além disso, por se tratar de uma disciplina ampla também quanto aos aspectos social, econômico e cultural, apresentaremos as interfaces da ecologia (subtópico 6); e finalmente vamos conhecer a linguagem e os modelos de estudos mais utilizados na abordagem dos ecossistemas (subtópico 7).

2 ECOLOGIA: SURGIMENTO E IMPORTÂNCIA

O termo ecologia foi cunhado pelo biólogo e médico alemão Ernst Heinrich Haeckel (1834-1919), em sua obra Morfologia dos seres vivos, como proposta de uma disciplina científica, a partir dos radicais gregos oikos (casa ou doméstico) e logos (estudo). Dessa maneira, a ecologia passou a ser definida como “o estudo do ambiente natural, inclusive das relações dos organismos entre si e com seus arredores” (HAECKEL, 1869).

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UNIDADE 1 — ELEMENTOS DA ECOLOGIA

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De forma simplificada, Ecologia é, assim, o “estudo da casa”, compreendida em sentido lato como o local de existência, o entorno, o meio. O estudo da casa ambiental inclui todos os organismos dentro dela e todos os processos funcionais que tornam a casa habitável. Literalmente, então, ecologia é o estudo da “vida em casa”, com ênfase na “totalidade ou padrão de relações entre os organismos e seu ambiente” (ODUM; BARRETT, 2008). É de interesse prático desde o Início da história da humanidade. Na sociedade primitiva, todos os indivíduos necessitavam conhecer seu ambiente, ou seja, entender as forças da natureza, as plantas e animais ao seu redor, para sobreviver.

A ecologia enquanto ciência data do início do ano de 1900, mas somente nas últimas décadas a palavra se tornou parte do vocabulário geral. No início, o campo era claramente dividido em linhas taxonômicas (como ecologia vegetal e ecologia animal), mas os conceitos de comunidade biótica (CLEMENTS; SHELFORD, 1939), de cadeia alimentar (LINDEMAN, 1942), ciclagem de material (HUTCHINSON, 1944), e os estudos sobre lagos interiores (JUDAY, 1940), entre outros, ajudaram a estabelecer a teoria básica de um campo unificado de ecologia geral.

Antes da década 1970, a ecologia era vista como uma subdisciplina da biologia. Aos poucos foi ampliando os limites estritos das Biociências para ganhar novos parâmetros científicos, em intercâmbio com outros saberes teóricos e práticos, de modo que hoje ela comporta especializações interdisciplinares. Surgiram, assim, denominações como: Ecologia Humana, Ecologia Social, Ecologia Urbana e outras.

Todas essas ramificações denotam cada vez mais o papel ativo do ser humano no ordenamento do planeta Terra. Elas tendem a exemplificar melhor o papel consciente do homem em relação tanto aos ambientes naturais e construídos quanto à esfera da vida em sociedade.

O movimento mundial de consciência ambiental eclodiu entre os anos de 1968 e 1970. Nesse período os astronautas tiraram as primeiras fotografias da Terra vista do espaço. Foi a primeira vez que o planeta foi visto de forma inteira e isolado na vastidão do universo. A década de 1970 foi chamada de “década do ambiente”, cujo início ocorreu com o primeiro “Dia da Terra”, em 22 de abril de 1970.

INTERESSANTE

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TÓPICO 1 — PROPÓSITO DA ECOLOGIA

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3 HIERARQUIA DOS NÍVEIS DE ORGANIZAÇÃO

A ecologia moderna propõe o conceito de níveis de organização através de uma hierarquia ecológica, ou seja, uma disposição resultando em uma série classificada. Eles formam uma hierarquia de entidades progressivamente mais complexas. O organismo, a população, a comunidade, o ecossistema e a biosfera representam níveis de organização de estrutura e funcionamento ecológicos (Figura 1). A interação (energia e matéria) dos organismos com o meio físico a cada nível produz sistemas funcionais característicos. Um sistema, contendo os componentes vivos (bióticos) e não vivos (abióticos) constituem biossistemas, abrangendo desde sistemas genéticos (em nível celular e até mesmo molecular), até sistemas ecológicos.

FIGURA 1 – PIRÂMIDE INVERTIDA COM A REPRESENTAÇÃO ESQUEMÁTICA DA HIERARQUIA DOS NÍVEIS DE ORGANIZAÇÃO ECOLÓGICA, PARTINDO DA CÉLULA COMO UNIDADE

PRIMÁRIA ATÉ O NÍVEL HIERÁRQUICO SUPERIOR (ECOSFERA)

FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 5)

A ecologia preocupa-se de forma ampla com os níveis de sistema acima daqueles do organismo. Em ecologia, o termo população, originalmente cunhado para denotar um grupo de pessoas, foi ampliado para incluir grupos de indivíduos de qualquer tipo de organismo. Do mesmo modo, comunidade, no sentido ecológico (algumas vezes designada como “comunidade biótica”), inclui todas as populações que ocupam uma certa área. A comunidade e o ambiente não vivos funcionam juntos, como sistema ecológico ou ecossistema.

A todos os indivíduos de uma espécie de organismos, se denomina população (que é o conjunto de indivíduos de uma mesma espécie, presente em determinado local, em um determinado tempo). Cada ecossistema contém diversas populações. Um ecossistema pode conter uma população de árvores, uma população de tucanos, uma população de gafanhotos, entre outras.

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UNIDADE 1 — ELEMENTOS DA ECOLOGIA

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As partes vivas de um ecossistema são chamadas comunidades, ou seja, o conjunto de populações de diversas espécies que interagem em um determinado local, num determinado período. A comunidade é composta pelas populações de muitas espécies que interagem umas com as outras.

Na Figura 1, o próximo nível na hierarquia ecológica (acima do ecossistema) é a paisagem. Em ecologia, a paisagem é definida como uma “área heterogênea composta de um agregado de ecossistemas em interação que se repetem de maneira similar por toda sua extensão” (FORMAN; GODRON, 1986).

Uma bacia hidrográfica é uma unidade de paisagem conveniente para o estudo e gerenciamento em ampla escala porque geralmente tem limites naturais identificáveis. O bioma é um termo usado para uma grande para um grande sistema regional ou subcontinental caracterizado por um tipo principal de vegetação ou outro aspecto identificador da paisagem, como o bioma da florestal da mata atlântica ou bioma da plataforma continental oceânica.

O sistema biológico maior e mais próximo da autossuficiência é muitas vezes denominado ecosfera, que inclui todos os organismos vivos da Terra interagindo com ambiente físico como um todo para manter um estado pulsante de autoajuste controlado de forma menos rígida. A biosfera inclui todos os organismos vivos e ambientes sobre a crosta da Terra e pode conter ecossistemas de diversos tamanhos como, por exemplo, bosques, campinas, lagos e estepes.

Os aspectos envolvendo população e comunidade serão abordados com maior profundidade nos Tópicos 1 e 2 da Unidade 3. O conceito de estado pulsante será visto mais adiante ainda no Tópico 1 dessa Unidade.

ESTUDOS FUTUROS

Segundo Ahl e Allen (1996), a teoria hierárquica fornece um quadro conveniente para subdividir e examinar situações complexas no campo da ecologia e se configura como uma abordagem holística para entender e lidar com essas situações. A divisão hierárquica, em componentes expõe como cada nível da pirâmide de organização é “integrado” ou interdependentes de outros níveis; Organismo individual, por exemplo, não pode sobreviver muito tempo sem sua população, não mais que o órgão seria capaz de sobreviver por muito tempo como uma unidade isolada do seu organismo. De forma semelhante, a comunidade não pode existir sem a ciclagem de materiais eu fluxo de energia no ecossistema.

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TÓPICO 1 — PROPÓSITO DA ECOLOGIA

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É muito importante enfatizar que as hierarquias da natureza são aninhadas, ou seja, cada nível é constituído de grupos de unidades de níveis inferiores (as comunidades são compostas por populações, que são compostas por grupos de organismos, por exemplo).

O termo holístico é um adjetivo relacionado a holismo. Simplificando, o holismo é um campo da ciência que visa compreender os fenômenos em sua totalidade. Diz respeito ao entendimento de que um sistema não pode ser definido e caracterizado apenas pela soma de suas partes. Quando alguém diz que é preciso ter uma visão holística, portanto, está querendo dizer que você precisa ter uma visão do todo.

NOTA

4 O PRINCÍPIO DA PROPRIEDADE EMERGENTE

Todos os sistemas ecológicos obedecem a um princípio semelhante. Alguns dos mais importantes destes princípios enfocam os atributos físicos e químicos dos sistemas ecológicos, a regulação e função da sua estrutura, e as mudanças evolutivas.

Odum e Barrett (2008), destacam que uma consequência importante da organização hierárquica é que, à medida que os componentes, ou subconjuntos, se combinam para produzir um aglomerado funcional maior (organismo → po-pulação → comunidade), emergem novas propriedades que não estavam presen-tes no nível inferior. Por conseguinte, uma propriedade emergente de um nível ou unidade ecológica não pode ser prevista com base no estudo dos componentes desse nível ou unidade.

De acordo com esses autores, outra forma de expressar o mesmo conceito é a denominada propriedade não redutível, ou seja, uma propriedade do todo não é redutível da soma das propriedades das partes. Argumentam ainda que, embora descobertas em qualquer nível auxiliem no estudo do próximo nível, nunca explicam completamente os fenômenos que ocorre nesse próximo nível, o qual deve ser estudado por si só para completar o panorama.

Por exemplo, quando o hidrogênio e o oxigênio são combinados em uma certa configuração molecular, forma-se a água, um líquido com propriedades completamente diferentes (propriedades emergentes) dos seus componentes gasosos originais. No campo da ecologia, Odum e Barrett (2008) exemplificam a atuação de certas algas e animais celenterados que, ao evoluírem juntos para produzir um coral criam um eficiente mecanismo de ciclagem de nutrientes que permite ao sistema combinado (algas/celenterados) manter uma alta taxa de pro-

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dutividade em águas com teor muito baixo de nutrientes. Dessa forma, a produ-tividade e diversidade dos recifes de coral são propriedades emergentes somente no nível das comunidades dos recifes e que não estão presentes individualmente ao nível de organismo.

Salt (1979) sugeriu uma distinção entre propriedades emergentes, como previamente definida, e propriedades coletivas, que são o somatório dos comportamentos dos componentes. Ambos são propriedades do todo, mas as propriedades coletivas não envolvem características novas ou únicas resultantes do funcionamento da unidade como um todo. As novas propriedades emergem porque os componentes interagem, e não porque a natureza básica dos componentes é modificada. De acordo com este autor, as partes não se “fundem” do modo que se encontram, mas se integram para produzir novas propriedades únicas.

5 PROCESSOS DE CONTROLE

Ao passo que se espera que cada nível na hierarquia ecológica tenha propriedades emergentes e coletivas únicas, existem funções básicas que operam em todos os níveis (ODUM; BARRETT, 2008). O comportamento dos organismos, o desenvolvimento ontogenético, a diversidade biológica, a cadeia energética, evolução das espécies, a integração entre os distintos grupos (organismos, populações, comunidades) e a regulação são chamados de funções transcendentes. Algumas dessas funções (energética, por exemplo) operam do mesmo modo por toda a hierarquia, pois representa a transferência de energia desde os níveis inferiores até os níveis hierárquicos superiores.

Entretanto, outras funções se manifestam de formas distintas nos diferentes níveis, por exemplo, a evolução das espécies por seleção natural, envolve mutações e outras interações genéticas diretas no nível do organismo, e que também podem envolver processos coevolutivos indiretos e de seleção de grupos em níveis mais elevados. Em outras palavras, todas as alterações em nível de organismos implicam, de forma indireta, em alterações nos níveis hierárquicos superiores.

É especialmente importante enfatizar que embora retroalimentação positiva e negativa seja universal, do nível de organismo para baixo o controle é do tipo “ponto de viragem”, pois envolve controles genéticos, hormonais e neurais exatos sobre o crescimento e desenvolvimento, levando ao que é chamado de homeostase (homeostase: é a tendência a resistir a mudanças a fim de manter um ambiente interno estável, relativamente constante).

Como observado no lado direito da Figura 2 não existem controles do tipo ponto de viragem acima do nível de organismo. Assim, o controle por retroalimentação é menos rígido, resultando em estados pulsante em vez de estáveis. O termo homeorese, de origem grega, significa “mantendo o fluxo”, foi sugerido para esse controle pulsante. Em outras palavras, não ocorrem equilíbrios estáticos (tais quais se observa em uma balança de contrapesos), nos níveis de ecossistema e ecosfera, mas existem equilíbrios pulsantes (também pode

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ser chamado de equilíbrio dinâmico), tais como entre a produção e a respiração, ou entre o oxigênio e o dióxido de carbono na atmosfera. Todos os sistemas ecológicos trocam matéria energia com a vizinhança. Quando as entradas e saídas estão equilibradas, disse que o sistema está num estado de equilíbrio dinâmico.

FIGURA 2 – O CONTROLE DO TIPO PONTO DE VIRAGEM NO NÍVEL DE ORGANISMO E ABAIXO E RÍGIDO DEVIDO A HOMEOSTASE. ORGANIZAÇÃO E FUNÇÃO NO NÍVEL DE

POPULAÇÃO E ACIMA SÃO REGULADOS POR UM COMPORTAMENTO MAIS PULSANTE E CAÓTICO, CONTROLADOS POR RETROALIMENTAÇÃO POSITIVA E NEGATIVA (HOMEORESE)

FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 6)

De forma simples, entender a homeostase, significa dizer que as alterações que ocorrem nos organismos e em níveis abaixo (como sistemas de órgãos, órgãos, tecidos e células), são mais difíceis de acontecer porque processos genéticos, hormonais e neurais estão no controle dessas (não) alterações, ou seja, um organismo cresce, se desenvolve e potencialmente atinge determinado tamanho porque há uma “programação” biológica (ponto de viragem) que induz para que isso aconteça.

Por outro lado, as flutuações nos níveis acima dos organismos estão mais sujeitas a influências externas (comportamento pulsante), tais como: alterações no clima, desastres naturais, predação, poluição, entre outros, que são fatores mais determinantes para estabelecer o tamanho e o desenvolvimento destes níveis superiores (“fluxo da natureza” – Homeorese).

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6 INTERFACES DA ECOLOGIA

Para Odum (1983), a ecologia é uma disciplina ampla, com vários níveis e, portanto, pode estabelecer interfaces com disciplinas mais tradicionais, e que tendem a ter foco mais estreito. Uma destas interfaces com grande importância na atualidade é a economia ecológica. Outras áreas que recebem bastante atenção, especialmente na gestão de recursos, são agroecologia, biodiversidade, ecologia da conservação, engenharia ecológica, saúde do ecossistema, ecotoxicologia, ética ambiental e ecologia da restauração.

No entanto, para que um campo de interface se torne uma nova disciplina, algo novo tem de emergir, como um novo conceito ou tecnologia. A esse respeito Daily (1997), e Mooney e Ehrlich (1997) destacam que o conceito de bens e serviços não negociáveis, por exemplo, foi um conceito novo que emergiu da área de economia ecológica, mas que inicialmente nem os ecólogos nem os economistas tradicionais apresentam em seus livros.

O capital natural é definido como os benefícios e serviços fornecidos às sociedades humanas pelos ecossistemas naturais – ou providos “gratuitamente” pelos sistemas naturais não gerenciados. Esses benefícios e serviços incluem a purificação da água e do ar por processos naturais, a decomposição dos detritos, a manutenção da biodiversidade, o controle de insetos e pragas, a polinização de cultivos, a mitigação de enchentes e o fornecimento de beleza natural e recreação, entre outros (DAILY, 1997).

O capital econômico é definido como os bens e serviços prestados pela humanidade ou pela força de trabalho humano, sendo geralmente expresso como produto interno bruto (PIB). O produto interno bruto é o valor monetário total dos bens oferecidos e serviços prestados em um país durante um ano. O capital natural é geralmente quantificado expresso em unidade de energia, ao passo que o capital econômico é expresso em monetárias.

7 MODELOS DE ESTUDOS

A partir desse momento a ecologia será discutida em nível de ecossistema: começaremos pela descrição de versões simplificadas que engloba somente as propriedades e funções mais importantes ou básicas. As versões simplificadas do mundo real são chamadas de modelos, é apropriado introduzir esse conceito aqui. Um modelo (por definição) é a formulação que imita um fenômeno do mundo real e por meio do qual se pode fazer previsões. Na sua forma mais simples, os modelos podem ser verbais ou gráficos. No entanto, para que tenham uma aplicação importante do ponto de vista econômico, por exemplo, os modelos devem ser estatísticos ou matemáticos.

Watt (1963, s.p.), afirmou que: “não precisamos de enormes quantidades de informação sobre muitas variáveis para construir modelos matemáticos reve-ladores”. Apesar de os aspectos matemáticos da modelagem serem um assunto

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para textos avançados, apresentaremos os primeiros passos da construção de um modelo. A modelagem geralmente começa com a construção de um diagrama, ou “modelo gráfico”, que muitas vezes é um diagrama de blocos ou de comparti-mentos, como ilustrado na Figura 3.

FIGURA 3 – DIAGRAMA HIPOTÉTICO/GENÉRICO DE COMPARTIMENTOS E FLUXO DE ENERGIA

FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 12)

São mostrados na figura anterior alguns componentes básicos de interesse primário na modelagem de sistemas ecológicos, onde “E” = fonte de energia (forçante energética); “P1”, “P2”, “P3” = variáveis de estado; “F1” a “F6” = função de interação; “L” = alça de retroalimentação. As propriedades, “P1” e “P2”, interagem, “I”, produzindo ou afetando uma terceira propriedade, “P3” quando o sistema é acionado por uma fonte de energia, “E”. Além disso, estão presentes trajetórias de fluxo, “F”, em que “F1” representa entrada (até “F5”) e, “F6”, representa a saída do sistema.

Trata-se de um modelo funcional simplificado de uma situação ecológica, cujos componentes são: (1º) Uma fonte de energia ou outra função de força externa, “E”; (2º) Propriedades chamadas de variáveis de estado, “P1”, “P2”,… “Pn”; (3º) Caminhos do fluxo, “F1”, “F2”… “Fn”, mostrando onde os fluxos de energia ou as transferências de material conectam propriedades entre si e com forças; (4º) Funções de interação, “I”, em que as forças e as propriedades interagem para modificar ampliar ou controlar os fluxos ou criar novas propriedades “emergentes”; e (5º) alças de retroalimentação, “L”.

A Figura 3 poderia representar um ecossistema de campo natural em que “P1” representa as plantas verdes que convertem a energia do sol, “E”, em alimento. “P2” poderia representar um animal herbívoro que come plantas, e “P3” um animal onívoro que pode comer tanto herbívoros quanto as plantas. A função de interação, “I”, poderia representar situações em que o nível “P3” come tanto “P1” quanto “P2”, em função do que estiver mais disponível, ou que envolver menor gasto energético para obtenção do alimento.

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As alças de retroalimentação são características importantes dos modelos ecológicos porque representam mecanismos de controle, ou seja, mecanismos de reaproveitamento de uma parte da energia gerada e consumida, e que possa ser reciclada ou reaproveitada diretamente por algum componente do sistema, por exemplo, a reciclagem de nutrientes. No caso do exemplo apresentado no diagrama, “L” representa uma alça de retroalimentação que pode ser obtida através da reciclagem dos nutrientes (nitrogênio e fósforo) provenientes do esterco dos animais através das raízes das plantas. A matéria orgânica de origem animal, rica em nutrientes, promove a fertilização natural do solo e propicia o desenvolvimento de novas plantas que servirão de alimento tanto para os herbívoros quanto para os animais onívoros, e assim sucessivamente.

Os modelos de compartimentos podem ser bastante ampliados atribuindo-se funções gerais para cada um dos blocos do diagrama. A Figura 4 ilustra alguns símbolos da linguagem de energia mais difundida dentro da ecologia de sistemas proposta por Haward T. Odum (ODUM; ODUM, 1982; ODUM, 1996).

A linguagem de fluxo de energia é baseada em uma série de módulos que representam processos e funções matemáticas, sendo conectados por linhas representando caminhos de transferência de energia, materiais ou informação. Ainda que estes símbolos tenham sido criados originalmente para fluxo de energia também se aplicam para fluxo de matéria. Como regra geral é permitido construir diagramas com fluxo de energia ou matéria (ou até combinação de ambos), desde que se tenha tornado explicito o que se está diagramando. Essa linguagem utiliza os seguintes símbolos descritos brevemente abaixo (Figura 4):

FIGURA 4 – A SIMBOLOGIA DA LINGUAGEM DE ENERGIA DE H. T. ODUM AMPLAMENTE UTILI-ZADOS NOS DIAGRAMAS DE MODELO EM ESTUDOS DE ECOLOGIA

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FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 14)

A Figura 5 mostra que um determinado módulo pode ser o resultado da combinação de dois ou mais módulos que realizam trabalho, portanto deve incluir um sumidouro de calor. O módulo hexágono (consumidor) é mostrado como uma combinação dos símbolos estoque e interação. Desta maneira o módulo indica que os representantes dessa categoria têm a habilidade de estocar energia e usar a energia estocada para poder se manter realizando trabalho, ou seja, a capacidade de usar sua energia para obter o alimento e usar a energia do alimento para manter o seu metabolismo. O símbolo de consumidor pode ser usado para representar um simples organismo vivo ou um grupo de organismos como uma população, ou uma cidade.

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FIGURA 5 – MÓDULOS FORMADOS PELA COMBINAÇÃO DE OUTROS MÓDULOS

FONTE: Adaptado de Odum (1983)

O módulo do produtor também é uma combinação de outros módulos. Todos os vegetais têm funções de manutenção dos seus metabolismos, como as populações animais também as tem, no entanto, os vegetais possuem mecanismos para capturar a luz do sol e usá-la para produzir compostos de carbono reduzido ricos em energia. Dessa maneira, o símbolo de produtor contém um módulo de manutenção, retroalimentado por um mecanismo receptor de energia pura, o qual está associado ao processo de ciclagem de componentes que ocorre numa estrutura específica denominada de cloroplasto.

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Neste tópico, você aprendeu que:

• Ecologia é o estudo científico do ambiente natural e das relações dos organismos uns com os outros e com as suas redondezas.

• O organismo, a população, a comunidade, o ecossistema e a biosfera representam níveis de organização de estrutura e funcionamento ecológicos. Eles formam uma hierarquia de entidades progressivamente mais complexas.

• Todos os sistemas ecológicos trocam matéria energia com a vizinhança. Quando as entradas e saídas estão equilibradas, disse que o sistema está num estado de equilíbrio dinâmico.

• As alterações que ocorrem nos organismos e em níveis abaixo são do tipo ponto de viragem controladas pela homeostase.

• As flutuações nos níveis acima dos organismos estão mais sujeitas ao comportamento pulsante de influências externas (homeorese).

• As versões simplificadas do mundo real são chamadas de modelos. Por definição, um modelo é a formulação que imita um fenômeno do mundo real e por meio do qual se pode fazer previsões.

• Em ecologia, a modelagem de sistemas geralmente começa com a construção de um diagrama, ou “modelo gráfico”, que muitas vezes é um diagrama de blocos ou de compartimentos.

• A linguagem de fluxo de energia, proposta por H. T. Odum, é baseada em uma série de módulos que representam processos e funções matemáticas conectados por linhas representando caminhos de transferência de energia, materiais ou informação.

• Nos modelos de sistemas, o dinheiro está sempre no sentido contrário ao fluxo da energia.

• Uma parte da energia produzida sempre será perdida através da geração de calor tal qual estabelece segunda lei da termodinâmica.

• Um determinado módulo pode ser o resultado da combinação de dois ou mais módulos que realizam trabalho.

RESUMO DO TÓPICO 1

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1 De forma simplificada, ecologia é o “estudo da casa”, que inclui todos os organismos dentro dela e todos os processos funcionais que tornam a casa habitável. Nesse sentido, a ecologia moderna propõe o conceito de níveis de organização através de uma hierarquia ecológica, ou seja, uma disposição em uma série classificada. Sobre os estudos de ecologia envolvendo classificação hierárquica, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Um sistema, contendo os componentes vivos (bióticos) e não vivos (abióticos) constituem biossistemas.

b) ( ) A ecologia preocupa-se de forma ampla com os níveis de sistema acima daqueles da população.

c) ( ) Uma bacia hidrográfica é uma unidade de ecossistema e pode ser utilizada para estudos em ampla escala devido a ocorrência de limites naturais identificáveis.

d) ( ) A teoria hierárquica se configura como uma abordagem fragmentada das partes de um sistema.

2 Os processos de controle podem ser compreendidos como funções básicas que operam em todos os níveis hierárquicos, porém, de forma distinta em relação aos níveis superior e inferior do nível dos organismos. Com base no enunciado, analise as sentenças a seguir:

I- Variações irregulares e imprevisíveis do clima podem causar grandes mudanças na temperatura e na precipitação e romper com a estrutura de populações ou comunidades biológicas; a esse respeito estamos falando do controle pulsante definido por homeorese.

II- Homeostase é a incapacidade de a resistir a mudanças tornando o ambiente interno instável e, relativamente inconstante.

III- Comportamento, desenvolvimento, diversidade, energética, evolução, integração e a regulação, são chamados de funções transcendentes.

Assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.b) ( ) Somente a sentença II está correta.c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 A ecologia é uma disciplina ampla, com vários níveis e, portanto, pode estabelecer interfaces com disciplinas mais tradicionais, e que tendem a ter foco mais estreito. De acordo essa afirmação, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

AUTOATIVIDADE

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( ) Uma destas interfaces com grande importância na atualidade é a economia ecológica.

( ) O capital econômico geralmente é expresso e quantificado em unidade de energia.

( ) O capital natural é definido como os benefícios e serviços fornecidos às sociedades humanas pelos ecossistemas naturais.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V – F – F.b) ( ) V – F – V.c) ( ) F – V – F.d) ( ) F – F – V.

4 Todos os sistemas ecológicos obedecem a um princípio semelhante. À medida que os componentes, ou subconjuntos, se combinam para produzir um aglomerado funcional maior emergem novas propriedades que não estavam presentes no nível inferior. Disserte sobre o que são as propriedades coletivas.

5 Um modelo é a formulação que imita um fenômeno do mundo real e por meio do qual se pode fazer previsões. A modelagem dos sistemas ecológicos geralmente começa com a construção de um diagrama de blocos ou de compartimentos. Neste contexto, disserte brevemente sobre em que está baseada a linguagem de fluxo de energia de sistemas proposta por Haward T. Odum.

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TÓPICO 2 — UNIDADE 1

SISTEMAS ECOLÓGICOS

1 INTRODUÇÃO

Acadêmico, no Tópico 2 (sistemas ecológicos), abordaremos a ecologia a partir do entendimento de que os organismos vivos e seu ambiente não vivo estão inter-relacionados, interagem uns com os outros e atuam sob a forma de sistemas ecológicos. Os ecossistemas são formações de vida e ambiente e sua compreensão se deu ao longo do século passado.

Todo esse complexo de organismos e ambientes físicos que eles habitam envolvem a ciclagem de energia que resulta em implicações termodinâmicas (capacidade de realização de trabalho). Os modelos gráficos de ecossistema com a linguagem de energia de H. T. Odum demonstram que os ecossistemas não sejam apenas uma unidade geográfica, mas sim um de sistema funcional, com entradas e saídas (de matéria e energia), e fronteiras que podem ser tanto naturais quanto arbitrárias. As “fronteiras” são áreas de transição ambiental (ecótonos), onde entram em contato diferentes comunidades ecológicas, que faz parte de um mesmo ecossistema e suas interações.

A diversidade do ecossistema pode ser definida como diversidade genética, diversidade das espécies, diversidade de habitat e diversidade dos processos funcionais que mantém os sistemas complexos. Segundo a hipótese de Gaia as condições de vida na Terra e toda sua diversidade, não foram fruto de um mero acaso, e sim foram desenvolvidas pelos próprios organismos até o presente.

O Tópico 2 está subdividido da seguinte maneira: (subtópico 2)

abordaremos os estudos que levaram ao entendimento do conceito de ecossistemas; (subtópico 3) veremos a estrutura trófica dos ecossistemas; (subtópico 4) analisaremos os gradientes fronteiriços de um sistema ecológico, também denominados de ecótonos; (subtópico 5) discutiremos algumas caraterísticas que a diversidade nos ecossistemas; (subtópico 6) veremos como ocorre o controle biológico no ambiente geoquímico; e (subtópico 7) vamos estudar o conceito de cibernética dos ecossistemas.

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UNIDADE 1 — ELEMENTOS DA ECOLOGIA

2 CONCEITO DE ECOSSISTEMA

Durante a primeira parte do século XX, diversos novos conceitos surgidos levaram o estudo da ecologia a novas direções. Uma delas foi a percepção de que as relações alimentares reúnem os organismos em uma única entidade funcional. O primeiro entre os proponentes desse novo ponto de vista ecológico, durante os anos 1920, foi o ecólogo inglês Charles Elton. Elton (1927) argumentava que os organismos que viviam no mesmo lugar não apenas apresentavam tolerâncias semelhantes aos fatores físicos no ambiente, mas também integrariam uns com os outros e, o mais importante, o faziam de uma forma sistemática de relações alimentares que chamou de teia alimentar.

Naturalmente, todos os organismos precisam se alimentar de algum modo para que possam ser nutridos, e cada organismo pode servir de alimento para algum outro. No entanto, considerar essas relações alimentares como uma unidade ecológica era uma ideia nova no início do século XX. Uma década mais tarde, o botânico inglês e pioneiro da ecologia vegetal Arthur G. Tansley avançou com a ideia de Elton, ao considerar os animais e plantas, junto com os fatores físicos no seu em torno, como sistemas ecológicos. Tansley (1935) chamou esse novo conceito de ecossistema, e o considerou a unidade fundamental da organização ecológica. Este autor visualizou os componentes biológicos e físicos da natureza juntos, unificados pela dependência dos animais e das plantas em seus ambientes físicos e por suas contribuições para a manutenção das condições e composição do mundo físico.

Entretanto, o primeiro pesquisador que sugeriu que cada sistema pudesse ser descrito por um conjunto de equações que representam trocas de matéria energia entre seus componentes foi Alfred Lotka. Segundo esse autor, essas trocas incluem a assimilação de dióxido de carbono em compostos orgânicos de carbono pelas plantas, o consumo das plantas pelos herbívoros, e o consumo dos animais pelos carnívoros. Lotka (1925) acreditava que o tamanho de um sistema e as taxas de transformações de energia e matéria dentro dele obedeciam a certos princípios termodinâmicos que governam todas as transformações de energia.

Todavia, somente em 1942 um pesquisador chamado Raymond Lindeman trouxe o conceito de ecossistema como um sistema transformador de energia. A estrutura de Lindeman com base em princípios termodinâmicos propostos por Lotka, adotou a noção de Tansley do ecossistema como unidade fundamental na ecologia e o conceito de Elton da teia alimentar, incluindo nutrientes inorgânicos na base, como as mais úteis expressões da estrutura do ecossistema.

Lindeman (1942) visualizou uma pirâmide de energia nos ecossistemas, com menos energia alcançando sucessivamente cada nível tráfico superior. Ele argumentava que a energia é perdida em cada nível por causa do trabalho realizado pelos organismos naquele nível e pela ineficiência das transformações biológicas dessa energia (efeitos da segunda lei da termodinâmica). Desse modo, as plantas assimilam apenas uma porção da energia luminosa disponível. Os

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TÓPICO 2 — SISTEMAS ECOLÓGICOS

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herbívoros assimilam menos ainda dessa energia porque as plantas usam uma fração desta energia incorporada para manter o seu metabolismo e não para converter essa energia em biomassa vegetal, razão pela qual uma porção menor de energia encontra-se indisponível para os herbívoros. O mesmo pode ser dito sobre os consumidores dos herbívoros e sobre cada nível acima que segue na cadeia alimentar.

Entre 1950 e 1968, o biólogo alemão Ludwig von Bertalanffy utilizou a abordagem holística com a necessidade de integrar, sintetizar e interagir teorias anteriores e organizar conhecimentos, elaborou uma teoria interdisciplinar para proporcionar princípios gerais (físicos, biológicos, sociológicos, químicos, entre outros) e modelos gerais para todas as ciências envolvidas, de modo que as descobertas efetuadas em cada uma pudessem ser utilizadas pelas demais. Surgiu assim a “Teoria Geral dos Sistemas”. De forma simples, um sistema é um grupo de partes que estão conectadas e trabalham juntas (BERTALANFFY, 1968). De acordo com Bertalanffy (1950b; 1968), a teoria geral dos sistemas está baseada em três princípios básicos:

a) Expansionismo: todo fenômeno é parte de um fenômeno maior; o desempenho de um sistema depende de como ele se relaciona com o todo; cada fenômeno é constituído por partes que pertencem ao todo; visão holística voltada para o todo, e não aos elementos.

b) Pensamento sintético: cada fenômeno é parte de um sistema maior, explicado em termos do papel que desempenha nesse sistema maior; os órgãos do organismo humano são explicados pelo papel que desempenham no organismo e não pelo comportamento de seus tecidos ou estruturas de uma organização; maior interesse na integração de coisas, e não em sua separação.

c) Teleologia: causa é uma condição necessária, mas nem sempre suficiente para que surja o efeito; relação causa-efeito não é uma relação determinística ou mecanicista, e sim, probalística; estudo do comportamento com finalidade de alcançar objetivos; o comportamento é explicado por aquilo que ele produz ou por aquilo que é seu propósito ou objetivo reproduzir; lógica sistêmica: procura entender as inter-relações entre diversas variáveis a partir de uma visão de um campo dinâmico de forças que atuam entre si; campo dinâmico de forças produz um emergente sistêmico: o todo é diferente de cada uma de suas partes; sistema possui características próprias que podem não existir em cada uma de suas partes integrantes; Sistemas visualizados como entidades globais e funcionais em busca de objetivos e finalidades.

A partir do desenvolvimento de uma teoria geral sobre sistemas é que começou a se desenvolver o palco definitivo e quantitativo da ecologia de ecossistemas, cujos principais precursores e divulgadores são os irmãos Howard e Eugene Odum. Segundo Odum (1953), a ecologia de ecossistemas estabelece que a reciclagem de matéria e o fluxo de energia num ecossistema a ela associado proporcionam a base para a caracterização da estrutura e função daquele ecossistema. A ecologia de ecossistemas proposta por Odum (1953) estabelece que as medidas de assimilação de energia e eficiência energética se tornam as

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UNIDADE 1 — ELEMENTOS DA ECOLOGIA

ferramentas para exploração deste conceito termodinâmico de ecossistema: A energia e as massas dos elementos como o carbono é a “moeda” para comparar a estrutura e funcionamento de diferentes ecossistemas em termos de energia e matéria residentes e transferidas entre plantas, animais, micróbios e os componentes abióticos do ecossistema.

Schäfer (1984), interpretando os conceitos de ecologia de ecossistemas proposto por Odum (1953), esclarece que um ecossistema não é apenas um agrupamento de organismos em um dado ambiente caracterizável, porque o surgimento de restrições anatômicas ou fisiológicas, por exemplo, podem promover a associação por conveniência desses organismos com o ambiente. Argumenta ainda que, para que um agrupamento de organismos se torne um ecossistema é necessário que o volume de trocas internas (interações) seja maior que as trocas periféricas de substâncias, ou seja, um ecossistema é um agregado de espécies que interagem por meio de uma organização mínima, capaz de permitir o armazenamento da energia que flui através de suas fronteiras físicas.

Os ecossistemas são formações de vida e ambiente, caracterizadas por uma certa estabilidade e por circuitos internos de trocas de substâncias (ODUM, 1953). Tudo o que está recobrindo a Terra (coisas vivas e não vivas) interage formando sistemas, também chamados ecossistemas (ou sistemas ecológicos). Portanto, um ecossistema é qualquer unidade que inclui todos os organismos da comunidade biótica em uma dada área interagindo com ambiente físico de modo que um fluxo de energia é direcionado às estruturas bióticas e à ciclagem de materiais entre componentes vivos e não vivos. Um típico ecossistema contém coisas vivas (componentes bióticos) como por exemplo árvores e animais, e coisas não-vivas (componentes abióticos) como substâncias nutrientes e água

O ecossistema é a primeira unidade na hierarquia ecológica (Figura 1, Tó-pico 1, Unidade 1) que é completa, ou seja, que tem todos os componentes (bio-lógicos e físicos) necessários para sua sobrevivência. Assim, é considerada como uma unidade elementar de sistema funcional, com entradas e saídas, e fronteiras que podem ser tanto naturais quanto arbitrárias (ODUM; BARRETT, 2008).

Um modelo gráfico de ecossistema pode consistir em uma “caixa preta” (cujo papel ou função geral no seu conteúdo interno não está especificado), denominado sistema, e que representa a área na qual estamos interessados, bem como duas estruturas chamadas de ambiente de entrada e ambiente de saída (Figura 6). Considerar os ambientes de entrada e saída é importante porque os ecossistemas são sistemas funcionais abertos (ODUM; BARRETT, 2008), ou seja, coisas estão constantemente entrando e saindo e, ainda assim, os ecossistemas mantém suas funções básicas praticamente constantes por longos períodos de tempo.

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TÓPICO 2 — SISTEMAS ECOLÓGICOS

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FIGURA 6 – MODELO DE ECOSSISTEMA, ENFATIZANDO O AMBIENTE EXTERNO, QUE DEVE SER CONSIDERADO PARTE INTEGRAL DO CONCEITO DE ECOSSISTEMA

FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 18)

O limite do sistema pode ser natural ou pode ser arbitrário (o que for conveniente ou de interesse). Em geral, fronteiras naturais, ou fronteiras políticas como os limites das cidades, são fronteiras convenientes, mas os limites também podem ser arbitrários (ODUM, 1983). No modelo, a caixa não é tudo para o ecossistema, porque se fosse um recipiente impenetrável, seu conteúdo vivo não sobreviveria a esse Isolamento por muito tempo. Um ecossistema funcional ou do mundo real deve ter uma entrada e, na maioria dos casos uma forma de exportar a energia e os materiais processados.

Conforme Odum (1983), a extensão dos ambientes de entrada e saída é extremamente alterável e depende de outras variáveis, por exemplo, (1) tamanho do sistema (quanto maior o ecossistema, menos dependente do exterior); (2) intensidade metabólica (quanto maior a taxa metabólica, maior a entrada e saída); (3) equilíbrio autotrófico-heterotrófico (Quanto maior o desequilíbrio entre a relação presa/predador, mais exterioridades para equilibrar); e (4) Estágio de desenvolvimento (sistemas jovens diferem de sistemas maduros). Assim uma grande floresta tem ambientes de entrada saída muito menores que um pequeno rio ou uma cidade.

Agora vamos olhar dentro dessa “caixa preta” (o ecossistema) que está no centro da figura 7, para ver em detalhes como ela está organizada e descobrir o que acontece com todas essas entradas. Para cada módulo do diagrama (Figura 7) atribui-se uma forma distinta quem indica sua função geral de acordo com uma linguagem de energia de H. T. Odum, conforme introduzida no Tópico 1 desta Unidade (Figura 4). A comunidade é representada como uma teia alimentar de produtores “P” (entendidos como produtores primários ou organismos autotróficos) e consumidores “C” (organismos heterotróficos), ligados por fluxos apropriados de energia, ciclos de nutrientes e depósitos “S” (ou estoque). As teias alimentares serão discutidas no Tópico 3 da Unidade 1.

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UNIDADE 1 — ELEMENTOS DA ECOLOGIA

FIGURA 7 – DIAGRAMA FUNCIONAL DE UM COM ÊNFASE NA DINÂMICA INTERNA ENVOLVENDO FLUXO DE ENERGIA E CICLOS DE MATERIAIS (S = DEPÓSITOS/ESTOQUE; P =

PRODUTORES/AUTÓTROFOS; C = CONSUMIDORES/HETERÓTROFOS)

FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 20)

Para Odum e Odum (2000), a energia é uma entrada necessária. Esses autores argumentam que o Sol é a fonte de energia mais importante para ecosfera e sustenta diretamente a maior parte dos ecossistemas naturais da biosfera. No entanto, existem outras fontes de energia que podem ser importantes para muitos ecossistemas, por exemplo, vento, chuva, fluxo de água ou combustíveis fósseis (a principal fonte das cidades modernas). A energia também flui para fora do sistema como o calor e em outras formas transformadas ou processadas, como matéria orgânica (produtos alimentícios e resíduos) e poluentes. Água, ar e nutrientes necessários para a vida, bem como todos os outros tipos de materiais, entram e saem de forma contínua do ecossistema. E, naturalmente, organismos e seus propágulos (sementes e esporos), e outros estágios reprodutivos entram (imigram) ou sai (emigram).

A Figura 8 exemplifica a construção de um modelo levemente complexo de ecossistema aquático em que ocorre uma pescaria comercial, a partir da linguagem de energia. Na área externa (forma circular), então localizados os suprimentos de energia (função forçante), tanto de origem natural, quanto humana (combustíveis, dinheiro). No interior do retângulo, encontram-se os principais componentes do ecossistema em questão e suas interações. Os produtores captam a energia solar e convertem essa energia em matéria orgânica (alimento) juntamente com os nutrientes que estão estocados no ecossistema.

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TÓPICO 2 — SISTEMAS ECOLÓGICOS

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FIGURA 8 – DIAGRAMA MODELO DE ECOSSISTEMA UTILIZANDO SÍMBOLOS DA LINGUAGEM DE COMPARTIMENTOS E FLUXO DE ENERGIA PARA UM AMBIENTE AQUÁTICO EM QUE

OCORRE UMA PESCARIA COMERCIAL

FONTE: Adaptado de Odum (1983)

Os consumidores (no caso, os peixes herbívoros) se beneficiam dessa matéria orgânica para seu desenvolvimento. Ao realizarem a pastagem sobre os produtores, os peixes processam esse alimento de origem vegetal e regeneram nutrientes para o estoque do ambiente através da excreção (retroalimentação).

A ação humana, após todo o esforço do ambiente em produzir os recursos que serão alvo da pescaria, envolve o uso de combustíveis fósseis para realização das capturas e posteriormente a comercialização do pescado, indicado pela seta a direita do retângulo, que representa a exportação do produto da pesca para fora do ambiente natural em direção a um sistema econômico promovido pela venda. O dinheiro utilizado na aquisição deste pescado possibilita a compra de mais combustível para realização de novas pescarias e consequente manutenção da atividade comercial. Nos modelos de sistemas, o dinheiro está sempre no sentido contrário ao fluxo da energia.

Note que em todas as etapas, desde a entrada de energia solar até os produtores, a consequente produção e transferência dessa matéria orgânica para os consumidores até chegar na pesca (interação final), sempre há uma perda de energia potencial (sumidouro). Essa perda de energia significa que uma parte da energia produzida não foi capaz de gerar trabalho e foi perdida através da geração de calor, tal qual estabelece segunda lei da termodinâmica. De acordo com essa lei, nenhum sistema (natural ou artificial) é capaz de aproveitar integralmente 100% da energia a que tem disponível para ser convertida em trabalho, de modo que uma parte sempre será perdida na forma de calor. O sumidouro de energia é representado pela seta e barras na saída do retângulo (parte inferior do modelo).

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UNIDADE 1 — ELEMENTOS DA ECOLOGIA

3 ESTRUTURA TRÓFICA DOS ECOSSISTEMAS

Conforme descrito em Odum e Barrett (2008), do ponto de vista da estrutura trófica (de trophe = “alimentação”), um ecossistema tem duas camadas: (1) um extrato autotrófico (que se auto alimenta) também chamado de “cinturão verde” de plantas e que contém clorofila, em que predominam a fixação de energia luminosa, ou uso de substâncias inorgânicas simples e a construção de substâncias orgânicas complexas; e (2) uma camada inferior que é o extrato heterotrófico (“alimentando-se de outros”) ou cinturão marrom de solos e sedimentos, matéria em degradação, raízes e outros, em que predominam o uso, o rearranjo e a decomposição dos materiais complexos.

Na camada 1, os organismos são capazes de elaborar seu próprio alimento (seres autótrofos) a partir de produtos químicos (nutrientes), utilizando a energia solar; este processo se denomina fotossíntese. As plantas e outros organismos, que fazem os produtos alimentícios, a partir da fotossíntese, são chamadas produtores, como já visto anteriormente. O alimento produzido é utilizado por células vivas para fazer mais células e formar a matéria orgânica. Os produtos orgânicos de organismos vivos são algumas vezes denominados biomassa que é o peso da matéria viva.

Na camada 2, encontram-se os organismos que consomem os produtos elaborados pelos produtores, a estes organismos se denomina consumidores. Os consumidores podem comer plantas (herbívoros), carne (carnívoros), ou assimilar matéria orgânica morta (decompositores, como fungos e bactérias).

Logo que o consumidor digeriu e utilizou este alimento, restam poucos produtos químicos de descarte. Estes produtos de descarte, que são utilizados como fertilizante para plantas, são denominados nutrientes. Quando os consumidores liberam nutrientes que voltam a ser utilizados pelas plantas, nós dizemos que foram reciclados.

A floresta é um exemplo de um típico ecossistema. As árvores e outras plantas produtoras utilizam a energia solar e os nutrientes químicos para elaborar matéria orgânica que é comida pelos consumidores e que devolvem os nutrientes à raiz das plantas.

A classificação ecológica (produtores, fagótrofos, saprófagos – decompositores, entre outros) diz respeito à função, não às espécies em si. Algumas espécies ocupam posições intermediárias, outras podem deslocar seu modo de nutrição de acordo com as circunstâncias ambientais. Os saprófagos, por exemplo, são organismos que se alimentam de matéria orgânica morta. As atividades decompositoras dos saprótrofos liberam nutrientes inorgânicos que são usados pelos produtores; também fornecem alimento para macro consumidores e frequentemente excretam substâncias que inibem ou estimulam outros componentes bióticos do ecossistema.

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A separação dos heterótrofos em grandes e pequenos consumidores é arbitrária, mas, segundo Odum e Barrett (2008), justificada na prática porque esses organismos necessitam de métodos de estudos muito diferentes. Os microconsumidores heterotróficos (bactérias, fungos e outros) são relativamente imóveis (geralmente inseridos no meio que está sendo decomposto), muito pequenos e têm altas taxas de metabolismo e renovação. Sua especialização funcional é mais evidente no aspecto bioquímico que no aspecto morfológico; como consequência, geralmente não se pode determinar seu papel no ecossistema por métodos diretos, como observação visual ou contagem de seus números.

Os organismos designados como macro consumidores obtém sua energia por ingestão heterotrófica de matéria orgânica particulada, em grande parte, de origem animal. Essas formas superiores tendem a ser morfologicamente adaptadas para a busca ativa de alimento ou herbivoria, com desenvolvimento de sistemas de órgãos complexos nas formas superiores.

Os microconsumidores ou saprótrofos têm sido designados como de compositores. No entanto, parece preferível não designar qualquer organismo particular como decompositor, mas considerar a decomposição como um processo envolvendo toda a biota.

4 GRADIENTES E ECÓTONOS

A biosfera é caracterizada por uma série de gradientes, ou zonação, de fatores físicos. São exemplos os gradientes de temperatura desde o Ártico ou a Antártica até os trópicos, e desde o cume da montanha até o vale; gradientes de umidade do úmido para o seco ao longo dos principais sistemas de tempo; e gradientes de profundidade desde a margem até o fundo em corpos de água (ODUM; BARRETT, 2008). As condições ambientais, incluindo os organismos adaptados a essas condições, mudam gradualmente ao longo de um gradiente, mas é frequente ocorrer pontos de mudança abrupta, conhecidos como ecótonos. Um ecótono é criado pela justaposição de diferentes habitats ou tipos de ecossistemas. O conceito pressupõe a existência de interação ativa entre dois ou mais ecossistemas do que resulta em ecótonos tendo propriedades inexistentes em ambos os ecossistemas adjacentes (NAIMAN; DÉCAMPS, 1990). Ecótonos são lugares onde muitas espécies atingem os limites de suas distribuições. Assim, os ecótonos representam as fronteiras entre diferentes comunidades fechadas.

Ecótonos são especialmente relevantes onde diferenças físicas agudas separam comunidades diferentes. Essas diferenças ocorrem na interface entre a maioria dos ambientes terrestres e aquáticos (especialmente marinhos) e onde as formações geológicas subjacentes fazem com que o conteúdo mineral do solo mude repentinamente (ODUM; BARRETT, 2008). Os ecótonos estão frequentemente associados com uma mudança repentina nas propriedades físicas dos habitats

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UNIDADE 1 — ELEMENTOS DA ECOLOGIA

adjacentes. Um ecótono é, portanto, uma região resultante do contato entre dois ou mais ecossistemas fronteiriços. São áreas de transição ambiental, onde entram em contato diferentes comunidades ecológicas, isto é, a totalidade da flora e fauna que faz parte de um mesmo ecossistema e suas interações.

Em tese, o ecótono representa uma faixa variável entre dois habitats adjacentes. Na realidade, esta faixa apresenta, na maior parte das regiões, complexidade espacial razoavelmente grande, na qual dois aspectos importantes devem ser ressaltados: sua sinuosidade e sua resolução, aqui interpretada no sentido de escala (KOLASA; ZALEWSKI, 1995). Ecótonos podem ser zonas abruptas de variação de vegetação no espaço, como ocorre quando as temperaturas de crescem conforme a elevação aumenta a montanha acima. Os ecótonos podem ser também criados por atividades humanas. O desmatamento de florestas tropicais para criar pastos deixa uma fronteira abrupta ao longo da floresta que pode dramaticamente afetar a temperatura, a umidade, a luz e o Vento na fronteira floresta-pasto.

De acordo com MALANSON (1997), dependendo do tipo de ecótono, suas funções básicas incluem: a) servir de habitats para muitas espécies, por isso sua importância para a manutenção da biodiversidade; b) são agentes modificadores de fatores abióticos (vento, luz, temperatura) e locais de elevada produção de matéria orgânica e de ciclagem de nutrientes; c) atuam como acumuladores/exportadores de nutrientes e matéria orgânica; d) agem como barreira ou área de isolamento com ecossistemas vizinhos.

Os ecótonos podem ser examinados sob diferentes prismas, em macro, meso e microescala, e estão sujeitos a distúrbios de variada natureza, amplitude, frequência, duração e intensidade (HENRY, 2003).

Segundo Holland (1988 apud MILAN; MORO, 2016), o ecótono é uma zona de transição entre sistemas ecológicos adjacentes com uma série de características definidas exclusivamente por escalas espaciais e temporais e pela intensidade das interações entre sistemas ecológicos adjacentes. HOLLAND (op. Cit.) considera ainda que regiões de descontinuidade dentro de um ecossistema uniforme podem assumir a função ecológica e as características de ecótonos. A aceitação literal desse ponto de vista amplia extraordinariamente a definição inicial de ecótonos como zonas de transição entre sistemas ecológicos adjacentes, colocando o conceito de ecótonos em escalas muito diversas, desde grandes unidades biogeográficas até micro-habitats.

De acordo com Milan e Moro (2016), apesar da maioria dos autores definirem de forma semelhante um ecótono, algumas conceituações são muito abrangentes, possibilitando diferentes interpretações e permitindo que áreas diferentes sejam tratadas igualmente como ecótonos. Leopold (1933) incluiu na ponderação de ecótono o efeito de borda, ao caracterizar o ecótono por uma quantidade de indivíduos e espécies maior do que nos ecossistemas adjacentes. Da mesma forma, Coulson e Tchakerian (2011) afirmam que ecótono é um

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conceito mais inclusivo do que borda, uma vez que abrange todo o gradiente de transição entre dois ecossistemas. Exemplificam que um campo e uma floresta estão separados por uma linha (borda, edge) e a área sob efeito desta borda, para dentro do campo e para dentro da floresta, por exemplo, constitui o ecótono.

Para Odum e Barrett (2008), Hardt et al. (2013) e Coulson e Tchakerian (2011), as fronteiras antrópicas poderiam ser consideradas ecótonos, levando a uma larga definição do termo. Essa abordagem ecológica, baseada em análises de pequena escala se contrapõem à abordagem ao nível de paisagem, discutida por Forman e Moore (1992). A análise da paisagem permite uma visão mais ampla, em macroescala, integrando e convergindo diferentes conceitos de ambiente. Forman e Moore (1992) propuseram preceitos que incluiriam os limites antrópicos em teorias gerais de limites (fronteiras), classificando ainda a estrutura e função das fronteiras em vários grupos.

Para Cadenasso e Pickett (2000), uma vez que bordas são definidas como limites entre tipos distintos de ambientes (habitat/não habitat ou fragmento natural/matriz antrópica), sua identificação depende de como os fragmentos são definidos dentro da paisagem. A definição de fragmento pode ocorrer em uma ampla noção de escala, variando desde a escala local até continental.

Milan e Moro (2016) alertam que a conceituação dos termos ecótono e borda levam à confrontação entre as diferentes definições adotadas ao longo de décadas. Com relação ao termo ecótono, há um consenso em referir-se ao mesmo como uma zona de transição entre ecossistemas diferentes, escala dependente. O conceito de borda, que surgiu paralelamente ao de ecótono, gerava mais ambiguidade quando os estudos estavam voltados a microescalas. Posteriormente, com análises tomando a paisagem como objeto de estudo, o conceito de borda estabeleceu-se como a delimitação espacial da variação de parâmetros entre ‘ambientes’ diferentes a partir de uma linha limite.

Segundo Milan e Moro (2016), a fronteira, entendida como a linha que coincide com a borda, é um artefato que permite uma série de inferências quantitativas acerca das relações geométricas entre áreas adjacentes. Bordas, ecótonos e fronteiras não são, portanto, sinônimos, e sim aspectos diversos da representação da realidade. Ecótono é um conceito funcional ecológico e borda um conceito espacial geográfico. Um ecótono pode ser estudado unicamente por suas qualidades intrínsecas, enquanto bordas e fronteiras só têm sentido se estudadas em função de suas qualidades extrínsecas. Ou seja, pela variação entre elementos adjacentes, pelos fluxos existentes, ou não, de energia ou matéria, pelo efeito do afastamento espacial gradual a partir de um limite (MILAN; MORO, 2016).

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5 DIVERSIDADE DO ECOSSISTEMA

A diversidade do ecossistema pode ser definida como diversidade genética, diversidade das espécies, diversidade do habitat e diversidade dos processos funcionais que mantém os sistemas complexos (ODUM; BARRETT, 2008). Existem dois componentes da diversidade: (1) o componente “riqueza” ou “variedade”, que pode ser expresso como o número de “tipos” de componentes (espécies, variedades genéticas, categorias de uso da terra e processos bioquímicos) por unidade de espaço; e (2) abundância relativa ou componente de repartição das unidades individuais entre os diferentes tipos. A manutenção de diversidade de moderada a alta é importante não somente para assegurar que todos os nichos-chaves funcionais, estejam operando, mas, especialmente, para manter a redundância e a resiliência no ecossistema, em outras palavras, para precaver-se contra momentos estressantes (como temporais, incêndios, doenças ou mudanças de temperatura), que ocorreram mais cedo ou mais tarde.

Conforme Odum e Barrett (2008), o motivo pelo qual é importante levar em consideração tanto componente abundância relativa como componente riqueza é que dois ecossistemas podem ter a mesma riqueza, mas seria muito diferente porque a repartição dos tipos é diferente. Por exemplo, as comunidades em dois ecossistemas diferentes podem apresentar, cada uma delas, dez espécies, mas uma das comunidades pode ter aproximadamente o mesmo número de indivíduos (digamos, dez indivíduos) em cada espécie (alta uniformidade ou equitatividade), ao passo que, na outra, a maioria dos indivíduos pode pertencer a uma única espécie dominante (baixa uniformidade). A maioria das paisagens naturais tem uniformidade moderada, com algumas poucas espécies comuns (dominantes) em cada nível tráfico ou grupo taxonômico, e numerosas espécies raras. Em geral, as atividades humanas direta ou indireta mente aumentam a dominância e reduzem a uniformidade e a variedade.

Hansky (1982) chamou a atenção para a associação entre a distribuição e abundância. Ele propôs a hipótese de espécies nuclear-satélite para explicar essa relação, notando que as espécies nucleares são comuns e distribuição ampla, já as espécies satélites são raras e locais na distribuição. De acordo com essa hipótese, a distribuição de frequências dos tamanhos das amplitudes deve ter um pico para as espécies nucleares que ocupam grandes áreas, e um segundo pico para as espécies satélites que ocupam amplitudes menores. Alguns dados de fato apresentam essa distribuição bimodal de tamanho de amplitudes (GOTELLI; SIMBERLOFF 1987), mas a maioria dos dados não é consistente com a hipótese nuclear satélite (NEE et al.,1991).

Estatisticamente, a diversidade pode ser quantificada e comparada de dois modos: (1) calculando-se os índices de diversidade baseados na razão entre as partes em relação ao todo, ou ni/N, em que “ni” é o número ou porcentagem dos valores de importância (como números, biomassa, área basal, produtividade)

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e “N” é o total de todos os valores da importância; e (2) construindo perfis gráficos semilog, chamados de curvas de dominância-diversidade, em que o número ou porcentagem de cada componente é lançado em sequência, do mais abundante para o menos abundante. Quanto mais inclinada curva menor a diversidade.

A diversidade de espécies, ou biótica, pode ser dividida em componentes de riqueza e de repartição (Figura 9). O número total de espécies por unidade diária (m2 ou hectare) e o índice de diversidade de Margalef são duas equações simples usadas para calcular a riqueza de espécies. O índice de Shannon (H) (SHANNON; WEAVER, 1949), e o índice de uniformidade de Pielou (PIELOU, 1966) são dois índices frequentemente usados para calcular a repartição das espécies.

O índice de Simpson envolve a soma do quadrado de cada razão de probabilidade ni/N. O incide Simpson varia de 0 a 1, com os valores altos indicando forte dominância e baixa diversidade. O índice de Shannon (H) envolve transformações logarítmicas e é derivado da teoria da informação e representa um tipo de formulação muito usado para analisar a complexidade e o conteúdo de informação de todos os tipos de sistema.

H = - � Pi log Pi

Em que “Pi” é a proporção dos indivíduos pertencentes à i-ésima espécie. Nesse índice, quanto maior o valor (H), mais alta a diversidade.

FIGURA 9 – DIAGRAMA MOSTRANDO AS EQUAÇÕES PARA A MEDIDA DA RIQUEZA DE ESPÉCIES E DA REPARTIÇÃO ENTRE ELAS

FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 41)

Uma vez calculado o valor (H), a uniformidade, “e”, pode ser calculada dividindo-se o log do número de espécies por “H”. O índice de Shannon e também razoavelmente independentemente do tamanho da amostra e tem distribuição normal, contanto que os valores de “N” sejam inteiros (HUTCHESON, 1970), portanto métodos estatísticos rotineiros podem ser usados para testar a significância das diferenças entre as médias. A biomassa ou produtividade, que

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UNIDADE 1 — ELEMENTOS DA ECOLOGIA

frequentemente é mais apropriada ecologicamente, pode ser usada se não se conhece o número de indivíduos por espécie. Em resumo, quanto maior for a dominância de uma espécie (uniformidade; índice de Simpson), menor será a diversidade de espécies (índice de Shannon).

6 CONTROLE BIOLÓGICO DO AMBIENTE GEOQUÍMICO

Os organismos individuais não só se adaptam ao ambiente físico como, por sua ação combinada nos ecossistemas, também adaptam ao ambiente geoquímico a suas necessidades biológicas. O fato de a química da atmosfera, o ambiente físico fortemente tamponado da Terra e a presença de uma diversidade de vida aeróbica serem completamente diferentes das condições em qualquer outro planeta do nosso sistema solar levou a hipótese de Gaia. A hipótese de Gaia considera que os organismos, especialmente os micro-organismos evoluíram com o ambiente físico para proporcionar um sistema de controle intrincado e autorregulatório que mantém as condições favoráveis para vida na Terra (LOVELOCK, 1979).

Há praticamente uma invariabilidade na constituição gasosa da atmosfera terrestre, apesar de todos os organismos efetuarem trocas gasosas com o meio. O ambiente marinho apresenta pH bastante estável, graças a um sistema químico de equilíbrio do íon HCO₃, que envolve trocas gasosas do meio marinho com a atmosfera e a precipitação de organismos.

Outro aspecto é a temperatura da superfície terrestre que, além de amena, possibilita a existência e formação de compostos orgânicos complexos, variabilidade climática bastante estreita quando comparada aos demais planetas do sistema solar (como Marte e Vênus), tanto ao longo do ano quanto geograficamente (LOVELOCK; MARGULIS, 1973).

Tais fatos serviram de evidência para a formulação da hipótese de Gaia (Gaia é o termo grego para deusa da Terra) por Lovelock e Margulis (1973) e Lovelock (1979). Segundo esses autores, as condições da Terra, favoráveis ao desenvolvimento da vida, não foram fruto de um mero acaso, e sim foram cunhadas pelos próprios organismos, principalmente os microrganismos, através da atividade coordenada da vida primitiva até o presente. Em outras palavras, a atmosfera terrestre não desenvolveu sua capacidade de sustentar a vida apenas por interação casual de forças físicas, para a vida evoluir posteriormente, adaptando-se a essas condições. Ao contrário, desde o início os organismos desempenharam um papel principal no desenvolvimento e controle de um ambiente geoquímico favorável para eles mesmos.

Segundo Lovelock e Margulis (1973), a teia da vida de interações entre micro-organismos no planeta funcionaria de maneira unificada, formando um sistema cibernético complexo. No entanto, a hipótese de Gaia ainda não foi comprovada, apesar de existirem evidências como a de rede fel de 1958 de que a razão entre as concentrações de carbono nitrogênio e fósforo no ambiente oceânico

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seriam reguladas em funções das necessidades nutricionais do fitoplâncton. A hipótese de Gaia é difícil de ser comprovada, pois o mecanismo Integrado de controle desta ordem de grandeza abrangeria centenas de processos. A hipótese de Gaia represento planeta como um “superorganismo” trazendo à tona a ideia de um sistema biológico como uma entidade auto-organizada ao nível da biosfera.

7 CIBERNÉTICA DOS ECOSSISTEMAS

Além do fluxo de energia e dos ciclos de material, os ecossistemas são ricos em redes de informação, incluindo fluxos de comunicação físicas e químicas que ligam todas as partes e dirigem ou regulam o sistema como um todo (ODUM; BARRETT, 2008). Portanto, os ecossistemas podem ser considerados cibernéticos (de kybernetes = “piloto” ou “governador”) em sua natureza, mas a cibernética acima dos níveis de organização de organismo é muito diferente daquela no nível de organismo ou de aparelhos de controle mecânico.

As funções de controle na natureza são internas e difusas (sem pontos de ajuste) em vez de externas e especificadas (por ponto de ajustes), como nos aparelhos cibernéticos construídos por humanos. A falta de controle por pontos de ajuste resulta em um estado pulsante em vez de um estado estável. A variância, o grau no qual a estabilidade alcançada, muda amplamente dependendo do rigor do ambiente externo e da eficiência dos controles internos. É útil reconhecer dois tipos de estabilidade: a estabilidade de resistência (capacidade de permanecer “firme” diante do estresse) e a estabilidade de Resiliência (capacidade de se recuperar rapidamente); as duas podem estar relacionadas de modo inverso.

A ciência da cibernética, como fundada por Norbert Wiener, abrange tan-to os controles animados como inanimados. Os mecanismos de retroalimentação mecânicos são frequentemente chamados pelos engenheiros de servo mecanis-mos, ao passo que os biólogos usam a expressão mecanismos homeostáticos para se referir aos sistemas organismo micos. A homeostase (de homeo = “mesmo”, e statis = “permanecer”) no nível de organismo é um conceito conhecido em fisiolo-gia. WIENER (1948), estabelece que nos servomecanismos e nos organismos, um “controlador” mecânico ou anatômico distinto tem um “ponto de ajuste” especí-fico. Por exemplo, no sistema de aquecimento doméstico, o termostato controla o aquecimento; em um animal de sangue quente, um centro específico no cérebro controla a temperatura do corpo; e os genes controlam rigorosamente o cresci-mento e o desenvolvimento de células, órgãos e organismos.

Não existem termostatos ou quimiostatos na natureza; em vez disso, a interação entre os ciclos materiais e fluxos de energia, bem como as retroalimentações de subsistemas em grandes ecossistemas, geram homeorese autocorretiva (rhesis = “fluxo” ou “pulso”). Waddington (1975) cunhou o termo homeorese para denotar a estabilidade ou preservação evolutiva de um fluxo ou processo pulsante de um sistema como um caminho de mudança ao longo do tempo. A meta da homeorese é manter os sistemas alterando-se da mesma maneira como alteravam-se no passado. Mecanismos de controle operando no nível de

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UNIDADE 1 — ELEMENTOS DA ECOLOGIA

ecossistema incluem subsistemas microbianos que regulam a armazenagem e liberação de nutrientes, mecanismos comportamentais e subsistemas predador-empresa, que controlam a densidade populacional, para mencionar apenas alguns exemplos.

Uma dificuldade em perceber o comportamento cibernético no nível de ecossistema é que os componentes nesse nível estão acoplados em rede por meio de vários mensageiros físicos e químicos, que são análogos, mas muito menos visíveis que os sistemas nervosos ou hormonais dos organismos. Simon (1973) destacou que as “energias de ligações” que unem os componentes se tornam mais difusas e mais fracas com o aumento no tamanho do sistema e das escalas temporais. Na escala de ecossistema, essas ligações fracas, mas numerosas, de energia e informação química, foram chamadas de “fios invisíveis da natureza” (ODUM, 1971), e o fenômeno dos organismos respondendo dramaticamente a baixas concentrações de substâncias é mais que apenas uma fraca analogia ao controle hormonal. As causas de baixa energia produzindo efeitos de alta energia são onipresentes nas redes de ecossistemas (ODUM, 1996); por exemplo: insetos minúsculos, conhecidos como Hymenoptera parasita, representa uma porção muito pequena (geralmente menos de 0,1%) do metabolismo total da comunidade de um ecossistema de campo, porém eles podem ter um grande feito controlador no fluxo de energia primária total (produção), por conta do impacto de seu parasitismo sobre insetos herbívoros.

Em um modelo de ecossistema de uma nascente, Patten e Auble (1981) descreveram uma alça de retroalimentação na qual somente 1,4% da entrada de energia para o sistema é retroalimentada para o substrato detrítico das bactérias. Em diagramas de sistema ecológico (Figuras 3, 5, 7 e 8), esse fenômeno é comumente mostrado como uma alça reversa (ou alça de retroalimentação), na qual uma baixa quantidade de energia “a jusante” é retroalimentada para um sistema “a montante”. De acordo com Odum e Barrett (2008), esse tipo de controle amplificado, em virtude de sua posição em uma rede, é extremamente difundido em indicar a intrincada estrutura global de retroalimentação dos ecossistemas. Nas cadeias alimentares, os herbívoros e os parasitas “componentes a jusante” frequentemente aumentam ou promovem o bem-estar de seus hospedeiros (componentes a montante) por meio de um processo de retroalimentação conhecido como retroalimentação por recompensa (DYER et al., 1993; DYER et al., 1995). Ao longo do tempo evolutivo, tais interações estabilizaram ecossistemas, prevenindo herbivoria do tipo “explosão e colapso”, oscilações presa-predador catastróficas, e assim por diante.

Além do controle por retroalimentação, a redundância entre os componentes funcionais também contribui para a estabilidade. Por exemplo, se diversas espécies de autótrofos estão presentes, cada uma com uma amplitude de temperatura operacional diferente, a taxa de fotossíntese da comunidade pode permanecer estável apesar das mudanças na temperatura. Holling (1973), e Hurd e Wolf (1974) sugeriram que as populações e, por inferência, os ecossistemas, apresentam mais que um estado de equilíbrio e frequentemente retornam a um

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TÓPICO 2 — SISTEMAS ECOLÓGICOS

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equilíbrio diferente após uma perturbação. O dióxido de carbono introduzido na atmosfera por atividades humanas é em grande parte, mas não completamente, absorvido pelo sistema carbonado do mar e outros depósitos de carbono, mas conforme entrada aumenta, os novos níveis de equilíbrio na atmosfera são mais altos. Em muitas ocasiões, os controles regulatórios emergem somente depois de um período de ajuste evolutivo. Novos ecossistemas, como um novo tipo de agricultura ou novos arranjos hospedeiro-parasita, tendem a oscilar mais violentamente e têm mais probabilidade de desenvolver superabundância que os sistemas maduros, nos quais os componentes tiveram oportunidade de se ajustarem de maneira conjunta.

Parte da dificuldade em lidar com o conceito de estabilidade é semântica. Uma definição do dicionário do termo estabilidade é, por exemplo, “a propriedade de um corpo que a causa, quando perturbado de uma condição de equilíbrio, para desenvolver forças ou momentos que restauram a condição original”. Isso parece bastante simples, mas, na prática, a estabilidade assume significados diferentes em profissões diferentes (como engenharia, ecologia ou economia), especialmente quando se tenta medi-la e quantificá-la.

Segundo Odum e Barrett (2008), do ponto de vista ecológico podemos estabelecer dois tipos de estabilidade: a estabilidade de resistência indica a capacidade de um ecossistema de resistir as perturbações (distúrbios) e de manter sua estrutura e função intactas. A estabilidade de resiliência indica a capacidade de se recuperar quando o sistema tiver sido rompido por uma perturbação. Crescentes evidências sugerem que esses dois tipos de estabilidade podem ser mutuamente exclusivos; em outras palavras é difícil desenvolver ambos ao mesmo tempo. Assim, caso um ecossistema que apresente resistência ao fogo, devido as suas adaptações, sofrer um incêndio, este ambiente irá se recuperar muito lentamente quando queimar, ou talvez nunca se recupere. Em contraste, ecossistemas cuja vegetação se queima facilmente (baixa estabilidade de resistência), mas se recupera de maneira rápida em alguns anos, apresenta alta estabilidade de resiliência. Em geral, pode se esperar que os ecossistemas em ambientes físicos propícios apresentem mais estabilidade de resistência e menos estabilidade de resiliência, ao passo que oposto é válido em ambientes físicos incertos (ODUM; BARRETT, 2008).

Em resumo, um ecossistema não é equivalente a um organismo; por não estar sob controle genético direto, um ecossistema está em um nível de organização supra organismo, mas não é um superorganismo, nem é parecido com complexo industrial (como uma usina atômica). Tem uma única coisa em comum com os organismos: o comportamento cibernético embutido, embora diferente.

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UNIDADE 1 — ELEMENTOS DA ECOLOGIA

O filósofo e matemático Norbert Wiener criou o termo “cibernética” para designar a ciência do controle, comunicação e cognição. Dos 3 aspectos da cibernética, o avanço das comunicações é o mais claramente visível no quotidiano. Uma resenha sobre o tema pode ser encontrada em: https://estadodaarte.estadao.com.br/a-cibernetica-de-wiener/.

INTERESSANTE

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RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, você aprendeu que:

• Teia alimentar foi o conceito elaborado por Charles Elton que descreveu as comunidades biológicas em termos de suas relações alimentares como um princípio de organização dominante na estrutura da comunidade.

• O termo ecossistema foi desenvolvido e utilizado pela primeira vez por Artur Tansley, para incluir os organismos e todos os fatores abióticos em um habitat.

• O primeiro autor a fornecer uma perspectiva termodinâmica do funcionamento do ecossistema foi Alfred Lotka, mostrando que os movimentos e transformações de massa energia obedecem às leis termodinâmicas.

• A ideia de que o ecossistema funciona como sistema transformador de energia foi popularizada por Raymond Lindeman, em 1942.

• Entre 1950 e 1968, Ludwig von Bertalanffy utilizou a abordagem holística para desenvolver a Teoria Geral dos Sistemas baseada em três princípios básicos: Expansionismo; Pensamento Sintético; e Teleologia.

• A ecologia de ecossistemas, estudada pelos irmãos Howard e Eugene Odum, estabelece que a reciclagem de matéria e o fluxo de energia num ecossistema a ela associado proporcionam a base para a caracterização da estrutura e função daquele ecossistema.

• Do ponto de vista da estrutura trófica, um ecossistema tem duas camadas: (1) um extrato autotrófico (ou produtores) em que os organismos são capazes de elaborar seu próprio alimento a partir de nutrientes e luz solar (fotossíntese); e (2) o extrato heterotrófico alimentando-se dos produtores.

• Embora ecótono seja considerado uma zona de transição entre ecossistemas diferentes, ele não é sinônimo de bordas ou fronteiras. Ecótono é um conceito funcional ecológico e borda é um conceito espacial geográfico.

• A diversidade do ecossistema pode ser definida como diversidade genética, de espécies, de habitats e dos processos funcionais que mantém os sistemas complexos. Quanto maior for a dominância de uma espécie, menor será a diversidade de espécies.

• A hipótese de Gaia desde considera que desde o início os organismos desempenharam um papel principal no desenvolvimento e controle de um ambiente geoquímico favorável para eles mesmos.

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• Os ecossistemas podem ser considerados cibernéticos porque são ricos em redes de informação, incluindo fluxos de comunicação físicas e químicas que ligam todas as partes e dirigem ou regulam o sistema como um todo.

• Do ponto de vista ecológico podemos estabelecer dois tipos de estabilidade: a estabilidade de resistência (capacidade de um ecossistema de resistir as perturbações) e de manter sua estrutura e função intactas. A estabilidade de resiliência indica a capacidade de se recuperar quando o sistema tiver sido rompido por uma perturbação.

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1 A ecologia de ecossistemas estabelece que a reciclagem de matéria e o fluxo de energia num ecossistema a ela associado proporcionam a base para a caracterização da estrutura e função daquele ecossistema. Sobre os estudos de ecologia envolvendo classificação hierárquica, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) A energia e as massas dos elementos como o silício é a “moeda” para comparar a estrutura e funcionamento de diferentes ecossistemas.

b) ( ) A ecologia de ecossistemas estabelece que as medidas de assimilação de energia e eficiência energética se tornam as ferramentas para exploração deste conceito termodinâmico de ecossistema.

c) ( ) O ecossistema é a terceira unidade na hierarquia ecológica que é completa, ou seja, que tem todos os componentes (biológicos e físicos) necessários para sua sobrevivência.

d) ( ) Nem tudo o que está recobrindo a Terra (coisas vivas e não vivas) interage formando sistemas.

2 Do ponto de vista da estrutura trófica, um ecossistema tem duas camadas: (1) um extrato autotrófico (ou produtores) em que os organismos são capazes de elaborar seu próprio alimento a partir de nutrientes e luz solar (fotossíntese); e (2) o extrato heterotrófico alimentando-se dos produtores. Com base no enunciado, analise as sentenças a seguir:

I- A floresta é um exemplo de um típico ecossistema. As árvores e outras plantas produtoras utilizam a energia solar e os nutrientes químicos para elaborar matéria orgânica que é comida pelos consumidores e que devolvem os nutrientes à raiz das plantas.

II- A classificação ecológica (produtores, fagótrofos, saprófagos - decompo-sitores, entre outros) diz respeito à função, não às espécies em si.

III- Os organismos designados como macro consumidores obtém sua energia através do sol.

Assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.b) ( ) Somente a sentença II está correta.c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 As condições ambientais, incluindo os organismos adaptados a essas condições, mudam gradualmente ao longo de um gradiente, mas é frequente ocorrer pontos de mudança abrupta, conhecidos como ecótonos. De acordo essa afirmação, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

AUTOATIVIDADE

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( ) O ecótono é uma zona de transição entre sistemas ecológicos adjacentes. ( ) Ecótonos podem ser zonas abruptas de variação de vegetação no espaço,

como ocorre quando as temperaturas de crescem conforme a elevação aumenta a montanha acima.

( ) Bordas, ecótonos e fronteiras são sinônimos, representam a realidade que divide os ecossistemas.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V – V – F.b) ( ) V – F – V.c) ( ) F – V – F.d) ( ) F – F – V.

4 Os ecossistemas são formações de vida e ambiente, caracterizadas por uma certa estabilidade e por circuitos internos de trocas de substâncias. Disserte sobre por que um ecossistema não é apenas um agrupamento de organismos em um dado ambiente caracterizável?

5 A diversidade do ecossistema pode ser definida como diversidade genética, diversidade das espécies, diversidade do habitat e diversidade dos processos funcionais que mantém os sistemas complexos. Existem dois componentes da diversidade: (1) o componente “riqueza” ou “variedade”; e (2) abundância relativa ou componente de repartição das unidades individuais entre os diferentes tipos. Neste contexto, disserte brevemente sobre por que é importante levar em consideração tanto componente abundância relativa como componente riqueza.

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TÓPICO 3 — UNIDADE 1

ENERGIA NO ECOSSISTEMA

1 INTRODUÇÃO

No Tópico 3, estudaremos e os princípios dos sistemas energéticos, pois a energia é necessária para todos os processos. O fluxo de energia e a eficiência de sua transferência descrevem certos aspectos da estrutura de um ecossistema. A energia entra no ecossistema através da assimilação fotossintética de luz solar pelos autótrofos e através do transporte de matéria orgânica para dentro do sistema a partir de fontes externas. A variação do fluxo de radiação total entre os diferentes extratos do ecossistema, e de um local para o outro na superfície da Terra é enorme, e a distribuição dos organismos individuais responde da mesma forma.

A fotossíntese une quimicamente dois compostos inorgânicos comuns, o dióxido de carbono e a água para formar o açúcar glicose, com a liberação de oxigênio. A energia total assimilada pela fotossíntese é chamada de produção primária bruta. As plantas usam parte dessa energia para sustentar a síntese de compostos biológicos e para se manterem. A energia acumulada nas plantas, e que está disponível para os consumidores, é chamada de produção primária líquida.

A cada transferência de energia para os níveis tróficos seguintes, uma proporção da energia potencial é perdida como o calor. Portanto, quanto mais curta a cadeia alimentar (ou quanto mais próximo o organismo estiver do nível trófico de produtor), maior a energia disponível para essa população. Contudo, enquanto a quantidade de energia declina a cada transferência, aumenta qualidade da energia que é transferida.

Finalmente, o desempenho da energia é apresentado de acordo com as leis termodinâmicas conforme a sequência de relações tróficas pelas quais a energia passa através de um sistema. A energia que flui para dentro dos ecossistemas não pode ser criada nem destruída. Tão pouco pode ser aproveitada ao máximo devido a entropia, que representa a tendência de degradação natural da energia, também conhecida como dispersão energética.

2 AS LEIS TERMODINÂMICAS

A energia inicialmente entra no reino biológico do ecossistema via fotossíntese e produção vegetal, o que proporciona energia para os animais e micro-organismos não fotossintetizadores. A energia é definida como a capacidade de executar trabalho (ODUM; BARRETT, 2008),

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UNIDADE 1 — ELEMENTOS DA ECOLOGIA

O comportamento da energia é descrito pelas seguintes leis: a primeira lei da termodinâmica, ou lei da conservação da energia, estabelece que a energia pode ser transformada de uma forma para outra, mas não pode ser criada nem destruída. A luz, por exemplo, é uma forma de energia: pode ser transformada em trabalho, calor ou energia potencial do alimento, dependendo da situação, mas nenhuma delas pode ser destruída.

A segunda lei da termodinâmica, ou lei da entropia, pode ser exposta de várias maneiras, incluindo a seguinte: nenhum processo envolvendo transformação de energia irá ocorrer espontaneamente, a menos que haja a degradação da energia de uma forma concentrada para uma forma dispersa. Por exemplo, o calor em um objeto quente tenderá, espontaneamente, a se dispersar nos arredores mais frios. A segunda lei da termodinâmica também pode ser exposta da seguinte maneira: nenhuma transformação espontânea da energia (como a luz solar, por exemplo) em energia potencial (protoplasma, por exemplo) é 100% eficiente, porque alguma parte da energia sempre será dispersada sobre a forma de energia térmica não disponível. A entropia é uma medida da energia não disponível resultante das transformações; o termo também é usado como um índice geral da desordem associado à degradação da energia.

De acordo com Odum e Barrett (2008), os organismos, ecossistemas e toda a ecosfera possuem a seguinte característica termodinâmica essencial: podem criar e manter um estado elevado de ordem interna ou uma condição de baixa entropia (uma baixa quantidade de desordem). Obtém-se a baixa entropia ao dissipar de forma contínua e eficiente a energia de alta utilidade (luz ou alimento, por exemplo) em energia de baixa utilidade (calor, por exemplo). No ecossistema, mantém-se a ordem em uma estrutura complexa de biomassa por meio da respiração total da comunidade, que “expulsa a desordem” continuamente. Assim, os ecossistemas e organismos são sistemas termodinâmicos abertos, em estado de não equilíbrio, que trocam energia de modo contínuo e matéria com ambiente para reduzir a entropia interna e aumentar a entropia externa (ficando, assim, em conformidade com as leis da termodinâmica).

A energia que atinge a superfície da Terra como luz é equilibrada pela energia que deixa superfície do planeta como radiação invisível de calor. A essência da vida é a progressão de mudanças, como crescimento autoduplicação e a síntese de complexas combinações de matéria. Sem as transferências de energia que acompanham todas as mudanças não existiriam vida nem sistemas ecológicos.

As relações entre plantas produtoras e animais consumidores, entre predadores e presas, sem mencionar os números e tipos de organismo em um dado ambiente, são limitadas e controladas pelo fluxo de energia de formas concentradas para dispersas. Os sistemas vivos usam parte de sua energia interna disponível para se autorreparar e para “eliminar” as desordens.

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TÓPICO 3 — ENERGIA NO ECOSSISTEMA

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Quando a luz é absorvida por algum objeto, que como resultado se torna mais quente, a energia da luz se transforma em outro tipo de energia: a energia térmica. A energia térmica compreende as vibrações e movimentos das moléculas que compõem um objeto. Absorção diferencial dos raios do sol pela terra e água forma áreas quentes e frias, que resulta no fluxo de ar que pode tocar Moinhos de Vento e executar trabalho, como bombear água contra força da gravidade. Nesse caso, a energia da luz é modificada em energia térmica na superfície da Terra, e depois em energia cinética do movimento do ar, o que completa o trabalho de puxar água. A energia não é destruída pela elevação da água; pelo contrário, ela se torna energia potencial, pois a energia latente inerente a elevação da água pode ser transformada em algum outro tipo de energia ao permitir que a água caía de volta ao seu nível original.

A sequência de relações tróficas pelas quais a energia passa através de um sistema é chamada de cadeia alimentar. Uma cadeia alimentar produz muitos elos (plantas, herbívoros e carnívoros), aos quais, Lindeman (1942) chamou de níveis tróficos (a raiz grega da palavra trófico significa “alimento”). A transferência de energia ao longo da cadeia alimentar de um ecossistema é chamada de fluxo de energia porque, de acordo com a lei da entropia, as transformações da energia são “unidirecionais”, em contraste com o comportamento cíclico da matéria. O alimento resultante da fotossíntese das plantas verdes representa a energia potencial, que modifica em outras formas de energia quando o alimento é usado por organismos. Como o montante de um tipo de energia é sempre equivalente em quantidade (mas não em qualidade) ao outro tipo no qual é transformado, podemos calcular um pelo outro. A energia “consumida” não é realmente gasta. Em vez disso, ela é convertida de um estado de energia de alta qualidade para um estado de baixa qualidade.

A energia é necessária para todos os processos em um ecossistema. A quantidade de energia pode ser medida pelo calor liberado. Existem duas unidades comumente usadas para medir energia. A caloria é a quantidade de calor necessária para elevar a temperatura de um grama de água em um grau na escala Celsius. Uma quilocaloria representa mil calorias. Um corpo humano libera cerca de 2.500 quilocalorias por dia, energia proporcionada pelos alimentos consumidos. Por acordos internacionais, uma unidade de energia diferente se está utilizando com maior frequência, o Joule (J). Uma quilocaloria é equivalente a 4.186,8 joules.

A floresta usa a energia do sol (energia solar) e pequenas quantidades de outras fontes. As fontes energéticas, depósitos e fluxos em um ecossistema florestal estão marcadas no diagrama da floresta na Figura 10 (as quantidades estão em joules).

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UNIDADE 1 — ELEMENTOS DA ECOLOGIA

FIGURA 10 – DIAGRAMA DE PRODUÇÃO FOTOSSINTÉTICA E DO CONSUMO ORGÂNICO NUMA FLORESTA, MOSTRANDO FONTES, FLUXOS DE ENERGIA, SUMIDOURO DE CALOR,

RECICLAGEM E O BALANÇO DE ENTRADAS E SAÍDAS

FONTE: Adaptado de Odum et al. (1987)

O diagrama inclui alguns números elevados. Os números elevados com muitos zeros podem se representar como o produto da parte inicial do número multiplicado por 10 para cada zero.

Por exemplo: 627 000 pode ser representado como: 6,27 .10⁵; ou, pode se usar o seguinte formato nos programas de computação: 6.27 E5, onde E5 (5 ex-ponencial) significa multiplicar 10 * 5. Isto é o mesmo que adicionar 5 zeros. Esta última notação é usada na Figura 10 para indicar o fluxo de joules. Uma boa ma-neira de ver como os materiais, energia ou dinheiro fluem dentro de um sistema, é escrever seus valores nos caminhos do diagrama. Por exemplo, os números nas linhas de fluxo na Figura 10 são as proporções de fluxo de energia por ano.

A primeira é a Lei da Conservação de Energia, a qual declara que a energia não pode ser criada nem destruída. Em nosso caso, significa que a energia que flui para dentro de um sistema é igual à energia adicionada ao depósito mais aquela que flui para fora do sistema. Na Figura 10, os depósitos não estão mudando, a soma das entradas é igual à soma das saídas de energia; os joules de energia que entram no sistema das fontes externas, são iguais aos joules de energia que se dispersam pelo sumidouro.

A segunda lei da termodinâmica trata da transferência de energia para um estado cada vez menos disponível e mais disperso. A segunda lei é a Lei de Dispersão de Energia. Esta lei declara que a disponibilidade para que a energia realize algum trabalho se esgota devido à sua tendência à dispersão (se degrada). A energia também se dispersa dos depósitos de energia. Quando apresentamos o símbolo do sumidouro de calor no último capítulo, dissemos que os sumidouros de calor eram necessários para todos os processos e depósitos. Os sumidouros de calor são necessários devido à segunda lei. Observe os caminhos da dispersão de energia no diagrama da floresta na Figura 10, os joules de energia que fluem pelo

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TÓPICO 3 — ENERGIA NO ECOSSISTEMA

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sumidouro de calor não estão disponíveis para realizar mais trabalho porque a energia se encontra demasiadamente dispersa. A energia que se dispersa é energia utilizada, não é energia desperdiçada; sua saída do sistema é parte inerente e necessária de todos os processos, biológicos ou qualquer outro.

A Terra não está em estado estável de energia, pois a entrada contínua do fluxo de energia do sol mantém enormes potenciais de energia e diferenças de temperatura. No entanto, o processo de buscar o estado estável é responsável pela sucessão de mudanças na energia que constitui o fenômeno natural da Terra. Quando a energia do sol atinge o nosso planeta, tende a ser degradada em energia térmica. Somente uma porção muito pequena (menos de 1%) da energia luminosa absorvida pelas plantas verdes é transformada em energia potencial ou de alimento: a maior parte torna-se calor, que então sai da planta, do ecossistema e da ecosfera.

O restante do mundo biológico obtém sua energia química potencial por meio das substâncias orgânicas produzidas pela fotossíntese das plantas ou da quimiossíntese dos microrganismos. Um animal, por exemplo, pega energia química potencial do alimento e converte grande parte dela em calor a fim de permitir que uma pequena parte da energia se estabeleça como energia potencial química do novo protoplasma. A cada passo da transferência de energia de um organismo para o outro, uma grande parte da energia é degradada na forma de calor. No entanto, a entropia não é de todo negativa. Como a quantidade de energia disponível diminui, a qualidade de energia restante pode ser consideravelmente aumentada.

3 RADIAÇÃO SOLAR

Os organismos que estão na superfície da Terra ou perto dela são constantemente irradiados pela radiação solar e térmica das ondas longas advindas das superfícies do entorno. Ambas contribuem para o ambiente climático (temperatura, evaporação da água, movimento do ar e da água). A radiação solar que atinge a Terra consiste em três componentes: luz visível, e dois componentes invisíveis (ondas curtas ultravioletas e ondas longas infravermelhas). Por causa de sua natureza diluída e dispersa, somente uma fração muito pequena (no máximo 5%) da luz visível pode ser convertida pela fotossíntese em energia muito mais concentrada da matéria orgânica para os componentes bióticos do ecossistema (ODUM; BARRETT, 2008).

A radiação solar que atinge a superfície da Terra é muito alterada ao passar através da atmosfera, cobertura de nuvens, água e vegetação. A variação do fluxo de radiação total entre os diferentes extratos do ecossistema, e de um local para o outro na superfície da Terra é enorme, e a distribuição dos organismos individuais responde da mesma forma. A energia radiante que atinge a superfície da Terra em um dia claro é por volta de 10% ultravioleta, 45% visível e 45% infravermelha.

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UNIDADE 1 — ELEMENTOS DA ECOLOGIA

A radiação visível é menos atenuada ao passar através de densas camadas da atmosfera o que significa que a fotossíntese, que está restrita a faixa do visível, pode continuar em dias nublados e até em uma certa profundidade em águas límpidas.

A radiação térmica, outro componente do ambiente de energia, vem de qualquer superfície ou objeto a uma temperatura acima do zero absoluto. Isso inclui não só o solo, a água e a vegetação, mas também as nuvens, que contribuem com uma parcela substancial de energia de calor irradiada para baixo, em direção aos ecossistemas. Por exemplo, a temperatura em uma noite nublada de inverno geralmente fica mais alta que em uma noite de céu limpo. A água e a biomassa tendem a reduzir as flutuações no ambiente e, assim, tornar as condições menos estressantes para a vida.

Embora o fluxo de radiação total determine as condições de existência para os organismos, a radiação solar direta integrada ao extrato autotrófico é de interesse maior para a produtividade e a ciclagem dos nutrientes dentro do ecossistema. Essa entrada de energia solar aciona todos os sistemas biológicos ecológicos.

Segundo Hurlbert (1984), o destino da energia solar que entrar na biosfera está distribuído da seguinte forma: 30% é energia solar refletida; 46% energia solar e convertida diretamente em calor; 23% da energia solar é direcionada para evaporação e precipitação; 0,2% da energia solar é utilizada para geração de ventos ondas e correntes; e somente 0,8% da radiação solar é utilizada para a fotossíntese. Ou seja, menos de 1% da energia solar é convertido em alimento e outras biomassas. Embora cerca de 70% ou mais dessa energia resulte em calor, evaporação, precipitação, vento e assim por diante, não significa que há perdas energéticas advindas da radiação solar, porque esses fluxos criam uma temperatura tolerável e acionam os sistemas meteorológicos e os ciclos de água necessários para vida na Terra.

4 PRODUTIVIDADE

As plantas, algas e algumas bactérias captam a energia luminosa e a transformam em energia de ligações químicas nos carboidratos. Esse processo é chamado de produção primária e sua taxa é quantificada como produtividade primária. A fotossíntese une quimicamente dois compostos inorgânicos comuns, o dióxido de carbono (CO₂) e a água (H₂O) para formar o açúcar glicose (C₆H₁₂O₆), com a liberação de oxigênio (O₂). O balanço químico total da reação é:

6CO₂ + 6H₂O → C₆H₁₂O6 + 6O₂

A fotossíntese transforma o carbono de um estado oxidado (de baixa energia) para um reduzido (de alta energia) nos carboidratos. Como é realizado o trabalho nos átomos de carbono para aumentar seu nível energético, a fotossíntese exige energia. Essa energia é fornecida pela luz visível. Em termos quantitativos, para cada grama de carbono assimilado, uma planta transfere 39 quilojoule (kJ) de energia da luz do sol em energia química dos carbonos nos carboidratos. Os

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TÓPICO 3 — ENERGIA NO ECOSSISTEMA

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pigmentos que captam a energia da luz para fotossíntese na verdade absorvem apenas uma pequena fração da radiação solar incidente. Além disso, por causa da ineficiência nas muitas etapas bioquímicas da fotossíntese, as plantas assimilam não mais do que 1/3 (geralmente muito menos que isso) da energia luminosa absorvida pelos pigmentos fotossintéticos. O restante é perdido como o calor.

A fotossíntese supre os carboidratos e a energia de que uma planta precisa para construir tecidos e crescer. Reorganizadas e reunidas, as moléculas de glicose se transformam em gorduras, amidos, óleos e celulose. A glicose e outros compostos orgânicos (amidos e óleos, por exemplo, podem ser transportados através da planta ou armazenados como uma fonte de energia para as futuras necessidades. Combinados com o nitrogênio, o fósforo, o enxofre e o magnésio, os carboidratos simples derivados da glicose produzem um conjunto de proteínas, ácidos nucleicos e pigmentos. As plantas não podem crescer a não ser que tenham todos esses materiais de construção básicos. Por exemplo, o pigmento fotossintetizador clorofila contém um átomo de magnésio e, portanto, mesmo quando todos os outros elementos necessários estão presentes em abundância, uma planta que não tenha magnésio suficiente não consegue produzir clorofila, então não é capaz de fazer fotossíntese.

As plantas e os outros autótrofos fotossintetizadores formam a base de todas as cadeias alimentares, sendo então chamados de produtores primários do ecossistema. Os ecólogos estão interessados na taxa de produção primária porque ela determina a energia total disponível para o ecossistema. A energia total assimilada pela fotossíntese é chamada de produção primária bruta. As plantas usam parte dessa energia para sustentar a síntese de compostos biológicos e para se manterem, logo sua biomassa contém substancialmente menos energia do que a total assimilada. A energia acumulada nas plantas, e que está disponível para os consumidores, é chamada de produção primária líquida. A diferença entre a produção primária bruta e a líquida e a energia da respiração, ou seja, a quantidade utilizada pelas plantas para manutenção e biossíntese.

Portanto, a produtividade primária de um sistema ecológico é definida como a taxa a que a energia radiante é convertida em substâncias orgânicas pelas atividades fotossintética e quimiossintética dos organismos produtores (principalmente plantas verdes). Há quatro passos sucessivos no processo de produção como segue:

1. Produtividade primária bruta (PPB): é a taxa total de fotossíntese, incluindo a matéria orgânica consumida na respiração durante o período de medição. Também é conhecida como fotossíntese total.

2. Produtividade primária líquida (PPL): é a taxa de armazenamento da matéria orgânica nos tecidos da planta que excede o uso respiratório, “R”, pelas plantas, durante o período de medição. Também chamada de assimilação líquida. Na prática, a quantidade de respiração da planta é geralmente adicionada a medição da produtividade primária líquida, a fim de estimar a produtividade primária bruta (PPB = PPL + R).

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UNIDADE 1 — ELEMENTOS DA ECOLOGIA

3. Produtividade líquida da comunidade: é a taxa de armazenamento da matéria orgânica não usada pelos e heterótrofos (ou seja, produção primária líquida menos o consumo heterotrófico) durante o período considerado, geralmente a época de crescimento ou um ano.

4. Finalmente, as taxas de armazenamento de energia nos níveis de consumidor são chamadas de produtividade e secundárias. Como os consumidores usam somente materiais alimentares já produzidos e com as devidas perdas respiratórias, e como convertem essa energia alimentar em tecidos diversos por um processo global, a produtividade secundária não deve ser dividida em quantidades brutas e líquidas. O fluxo total de energia nos níveis heterotróficos, que é análogo a produtividade bruta dos autótrofos, deve ser designado como assimilação, não como produção.

Em todas essas definições, o termo “produtividade” e a expressão “taxa de produção” podem ser usados de forma alternada. Mesmo quando o termo produção designar uma quantidade de matéria orgânica acumulada, supõe-se ou subentende-se um fator temporal (por exemplo, um ano na produção de cultivo agrícola). Assim, para evitar confusão, devemos sempre referir o intervalo de tempo. De acordo com a segunda lei da termodinâmica, o fluxo de energia diminui a cada passo por causa da perda de calor que ocorre a cada transferência de energia de uma forma para outra.

Elevadas taxas de produção, em ambos os ecossistemas, natural e agrícola, ocorrem quando os fatores físicos são favoráveis, especialmente quando subsídios de energia (como os fertilizantes) de fora do sistema aumentam o crescimento ou as taxas de reprodução dentro do sistema. Esses subsídios de energia também podem ser o trabalho do vento e da chuva em uma floresta, a energia das marés em um estuário ou de combustíveis fósseis, ou ainda a energia do trabalho animal ou humano usado no cultivo agrícola. Ao avaliar a produtividade de um ecossistema deve-se considerar a natureza e a magnitude não só dos prejuízos energéticos resultante dos estresses climáticos, de colheita, de poluição e outras, que desviam a energia do processo de produção, mas também dos subsídios de energia que aumentam ao reduzir a perda do calor respiratório que é a eliminação da desordem, necessário para manter a estrutura biológica.

A produção primária é sensível a variações na luz e na temperatura. Para plantas que crescem em plena luz do sol, os níveis de luminosidade geralmente excedem o ponto de saturação de seus pigmentos fotossintetizadores; portanto, a taxa fotossintética destas plantas geralmente não é restringida pela disponibilida-de de luz. Para plantas que crescem na sombra ou em grandes profundidades em sistemas aquáticos, no entanto, a taxa de fotossíntese geralmente é limitada pela luminosidade. Além disso, as folhas nem sempre operam à sua taxa fotossintética máxima possível. A cobertura de nuvens, o sombreamento por outras folhas ou plantas e baixos níveis de luminosidade de manhã cedo e à tardinha mantém a taxa fotossintética abaixo de seu máximo.

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TÓPICO 3 — ENERGIA NO ECOSSISTEMA

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A eficiência fotossintética é a porcentagem de energia na luz do sol que é convertida para produção primária durante a estação de crescimento. Essa medida proporciona um índice útil das taxas da produção primária sob condições naturais. Quando a água e os nutrientes não limitam severamente a produção vegetal, eficiência fotossintética de um ecossistema como um todo varia entre 1% e 2%. O restante dessa energia luminosa é refletido ou convertida em calor.

A taxa de fotossíntese geralmente aumenta com a elevação da temperatura pelo menos até determinado ponto. A temperatura ótima para fotossíntese varia de acordo com a temperatura prevalecente do ambiente (desde cerca de 16 °C em muitas espécies temperadas chegando até 38 °C em espécies tropicais). A produção líquida depende da taxa de respiração tanto quanto da taxa de fotossíntese, e a respiração geralmente aumenta com o incremento da temperatura foliar. Desse modo, a produção líquida, e, portanto, a assimilação líquida de CO2 pode realmente diminuir com aumento da temperatura.

A combinação favorável de grande insolação, temperatura quente, precipitação abundante e grande quantidade de nutrientes em algumas partes dos trópicos úmidos resulta na maior produtividade terrestre do planeta. Em ecossistemas temperados e árticos, as baixas temperaturas e as longas noites de inverno reduzem a produção. Dentro de uma determinada faixa de latitude, onde a luz não varia sensivelmente de uma localidade para outra, a produção líquida está diretamente relacionada à temperatura e à precipitação anual. Acima de um determinado limite de disponibilidade de água, a produção líquida aumenta em 0,4 g de matéria seca por quilograma de água nos desertos quentes e em 1,1 g por quilograma em pradarias de gramíneas rasteiras e desertos frios. Desse modo, uma dada quantidade de água sustenta quase três vezes a mais produção de plantas em climas mais frios do que em climas mais quentes dentro de uma faixa latitudinal.

A produção da vegetação terrestre é máxima nos trópicos úmidos e mínima nos habitats de tundra e deserto. Os ecossistemas brejosos e paludosos, que ocupam a interface entre os habitats terrestres e aquáticos, podem produzir tanta biomassa anualmente quanto as florestas tropicais, por causa da contínua disponibilidade de água e da rápida regeneração de nutrientes nos sedimentos lodosos em volta das raízes das plantas.

5 REPARTIÇÃO DE ENERGIA NAS CADEIAS ALIMENTARES

A transferência de energia alimentar de sua fonte nos autótrofo os (plantas), por meio de uma série de organismos que consomem e são consumidos, é chamada de cadeia alimentar. A produção primária das plantas, algas e algumas bactérias forma a base das cadeias alimentares ecológicas. Animais, fungos e a maioria dos microrganismos obtém sua energia e a maior parte de seus nutrientes das plantas ou animais, ou dos restos mortais deles. Esses organismos, entretanto, possuem um papel duplo como produtores e consumidores de alimentos. Esses papéis dão ao ecossistema uma estrutura trófica que é determinada pelas teias alimentares através das quais a energia flui e os nutrientes circulam.

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UNIDADE 1 — ELEMENTOS DA ECOLOGIA

A cada transferência, uma proporção (frequentemente de até 80% ou 90%) da energia potencial é perdida como o calor. Portanto, quanto mais curta a cadeia alimentar (ou quanto mais próximo o organismo estiver do nível trófico de produtor), maior a energia disponível para essa população. Contudo, enquanto a quantidade de energia declina a cada transferência, aumenta qualidade ou a concentração da energia que é transferida.

As cadeias alimentares são de dois tipos básicos: (1) cadeia alimentar de pastejo, que, iniciando em uma base de plantas verdes, segue para os herbívoros pastejadores (organismos que comem células ou tecidos de plantas vivas) e então para os carnívoros (que se alimentam de animais); e (2) cadeia alimentar de detritos, que segue da matéria orgânica não viva para microrganismos e, em seguida, para organismos que se alimentam de detritos (detritívoros) e seus predadores. As cadeias alimentares não são sequências isoladas elas estão interligadas. O padrão de interconexões é geralmente denominado de teia alimentar.

Em comunidades naturais complexas, os organismos cuja nutrição é obtida do sol e com o mesmo número de passos são considerados pertencentes ao mesmo nível tráfico. Assim, as plantas verdes ocupam o primeiro nível (nível trófico produtor), os que se alimentam de plantas (herbívoros) ocupam o segundo nível (nível trófico de consumidor primário), e os carnívoros primários ocupam o terceiro nível (o nível trófico de consumidor secundário), e os carnívoros secundários ocupam o quarto nível (o nível trófico de consumidor terciário). Essa classificação trófica é relativa à função e não à espécie propriamente dita. Uma população de espécie em particular pode ocupar um ou mais níveis tróficos de acordo com a fonte de energia realmente assimilada.

Conforme Lindeman (1942) destacou, a quantidade de energia que alcan-ça cada nível trófico depende da produção primária líquida na base da cadeia alimentar e das eficiências das transferências de energia em cada nível trófico acima. As plantas utilizam entre 15% e 70% da energia luminosa assimilada pela fotossíntese para manutenção, tornando, portanto, essa fração indisponível para os consumidores. Os herbívoros e carnívoros são mais ativos do que as plantas e gastam correspondentemente mais de sua energia assimilada para manutenção. Como resultado, a produção de cada nível trófico é tipicamente apenas de 5% a 20% daquela do nível inferior. Os ecólogos se referem à percentagem de energia transferida de um nível trófico para o outro como eficiência ecológica ou eficiên-cia da cadeia alimentar. Para entender por que as eficiências ecológicas são de apenas 5 a 20% precisamos examinar como os organismos fazem uso da energia que consomem.

A despeito de sua fonte alimentar, um organismo utiliza energia do alimento para se manter, como combustível para suas atividades e para crescer e se reproduzir. Uma vez ingerida, a energia do alimento segue diversas vias através do organismo. Para começar, muitos componentes do alimento não são facilmente digeríveis: pelos, apenas, exoesqueletos de insetos, cartilagens e ossos, em alimentos de origem animal, assim como celulose e lignina, em alimentos

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TÓPICO 3 — ENERGIA NO ECOSSISTEMA

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de origem vegetal. Essas substâncias podem ser eliminadas (via fecal ou regurgitadas) e a energia que elas contêm é chamada de energia egestada. Aquilo que um organismo digere e absorve constitui sua energia assimilada. A fração dessa energia assimilada utilizada para atender as necessidades metabólicas, cuja maior parte escapa do organismo como o calor, compõem a energia respirada.

Os animais excretam outras partes, geralmente menores, da energia assimilada na parte de resíduos orgânicos nitrogenados (principalmente amônia, ureia ou ácido úrico), produzidos quando a dieta contém nitrogênio em excesso; a esta se denomina energia excretada. A energia assimilada retida pelo organismo se torna disponível para a síntese de novas biomassa (produção), através do crescimento e reprodução, que então pode ser consumida pelos animais que se alimentam no nível trófico seguinte. Desse modo, os vários componentes do balanço de energia de um organismo estão conectados uns aos outros nas seguintes relações: (energia ingerida - energia registrada = energia assimilada); e (energia assimilada - respiração - excreção = produção).

A eficiência ecológica total da cadeia alimentar começa pela eficiência com a qual os organismos assimilam o alimento que consomem. A eficiência de assimilação é a razão entre a assimilação e a ingestão, geralmente expressa como uma percentagem. O valor energético das plantas para seus consumidores depende de sua qualidade alimentar, ou seja, de quanta celulose, lignina e outros materiais não digeríveis elas contêm. Os herbívoros assimilam cerca de 80% das energias das sementes e de 60% a 70% da vegetação jovem. A maioria dos pastejadores (elefantes, gato, gafanhotos) extraem de 30 a 40% da energia de seus alimentos.

Os alimentos de origem animal são mais facilmente digeridos do que os de origem vegetal. As eficiências de assimilação de espécies predadoras variam de 60% a 90%. Presas vertebradas são digeridas mais eficientemente do que insetos, porque os exoesqueletos indigestos dos insetos constituem uma fração maior do corpo do que os pelos, penas, escamas dos vertebrados. As eficiências de assimilação de insetívoros variam entre 70% e 80%.

Cada organismo cresce e produz filhotes. A biomassa que ele acrescenta desse modo representa a produção do organismo e também potencialmente alimento para outros organismos. A razão entre a energia contida nessa produção e a energia total assimilada é chamada de eficiência de produção líquida, e é geralmente expressa como uma percentagem. Animais ativos de sangue quente apresentam eficiências de produção líquida baixas: a das aves é inferior a 1% e as dos pequenos mamíferos com altas taxas reprodutivas varia até 6%. Esses organismos utilizam a maior parte da energia assimilada para manter o equilíbrio salino, fazer sangue circular, produzir calor para a termorregulação e se movimentar. Por outro lado, animais sedentários de sangue frio, particularmente espécies aquáticas, direcionam até 75% de energia assimilada para o crescimento e reprodução.

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UNIDADE 1 — ELEMENTOS DA ECOLOGIA

A eficiência de produção pode se basear na energia total ingerida em vez de na energia assimilada. Nesse caso, ela é chamada de eficiência de produção bruta, que é produto da eficiência de assimilação pela eficiência de produção líquida. A eficiência de produção bruta representa a eficiência energética total da produção de biomassa dentro de um nível trófico. A eficiência de produção bruta de animais terrestres de sangue quente raramente excede 5%, e a de algumas aves e grandes mamíferos é menor que 1%. Para os insetos, essa eficiência variar dentro de um intervalo de 5% a 15% e para alguns animais aquáticos esse de 30%. Portanto os animais mais ativos possuem as eficiências de produção líquida mais baixas.

Além disso, a energia atravessa o ecossistema em velocidades diferentes. As eficiências ecológicas descrevem que a proporção da energia assimilada pelas plantas acaba alcançando cada nível trófico superior de um ecossistema. A taxa de transferência de energia entre os níveis tróficos ou, inversamente, seu tempo de residência em cada nível trófico, proporciona um segundo índice da dinâmica energética de um ecossistema. Para uma dada a taxa de produção, o tempo de residência da energia e o armazenamento de energia na biomassa viva e detritos estão diretamente relacionados: quanto maior o tempo maior acumulação de energia.

O tempo médio de residência de energia em um determinado nível trófico é igual a energia armazenada dividida pela taxa em que a energia é convertida em biomassa. As plantas nas florestas tropicais úmidas produzem matéria seca a uma taxa média de 1,8 kg por m² por ano e possuem uma biomassa viva a média de 42 kg por m². Inserindo esses valores na equação obtemos 23 anos (42 ÷ 1,8) como o tempo de residência médio da biomassa nas plantas.

As razões de acumulação da biomassa para os produtores primários podem variar desde mais de 20 anos em ambientes florestais terrestres até menos de 20 dias em comunidades aquáticas de base fitoplanctônica. Em todos os ecossistemas, no entanto, alguma energia permanece durante um longo tempo, e alguma desaparece rapidamente. Por exemplo, os comedores de folhas e de raízes consomem boa parte da energia assimilada pelas árvores de florestas durante o ano de sua produção, parte dela poucos dias antes de ter sido assimilada pela vegetação. A energia acumulada na celulose e na lignina nos troncos das árvores, por outro lado, pode não ser reciclada por séculos.

O fluxo de energia e a eficiência de sua transferência descrevem certos aspectos da estrutura de um ecossistema: o número de níveis tróficos, a importância relativa de detritívoros e herbívoros, os valores de equilíbrio de biomassa e detritos acumulados e taxas de troca de matéria orgânica. A importância dessas medidas para compreensão do funcionamento do ecossistema foi defendida por Lindeman (1942), que constituiu o primeiro balanço energético para uma comunidade biológica inteira. O balanço energético total do ecossistema reflete o equilíbrio entre créditos e débitos, exatamente como numa conta bancária. O ecossistema ganha energia através da assimilação fotossintética de luz pelos

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autótrofos e através do transporte de matéria orgânica para dentro do sistema a partir de fontes externas. Materiais orgânicos produzidos fora do sistema são chamadas de entradas ou alóctones; a fotossíntese que ocorre dentro do sistema é chamada de produção autóctones.

6 QUALIDADE DE ENERGIA: eMergia

A energia tem qualidade e quantidade. Nem todas as calorias (ou qualquer outra unidade de quantidade de energia que se empregue) são iguais, tais quantidades iguais de formas diferentes de energia variam amplamente em potencial de trabalho. As formas concentradas de energia, como combustíveis fósseis, têm uma qualidade muito mais alta que as formas mais dispersas de energia, como a luz do sol. Podemos expressar a qualidade de energia ou concentração quanto a quantidade de um tipo de energia (como a luz solar) necessária para desenvolver a mesma quantidade de outro tipo (como o petróleo). O termo eMergia (com M maiúsculo) foi proposto para essa medida. A eMergia pode ser definida, de modo geral, como a soma da energia disponível já usada direta ou indiretamente para criar um serviço ou produto. Ao comparar as fontes de energia de uso direto pela humanidade, deve-se considerar a qualidade e a quantidade de energia disponível, bem como, sempre que possível, equiparar a qualidade da fonte com a qualidade do uso.

A medida de que a energia é transferida para cada nível trófico seguinte, a qualidade da energia aumenta ao passo que a quantidade diminui nas cadeias alimentares e em outras sequências de transferência de energia. A importância da concentração de energia ou o fator qualidade ainda ser pouco difundida se deve ao fato de, apesar de haver numerosos termos para a quantidade de energia (como calorias, joules e watts), não existem termos para qualidade de energia no uso geral.

Odum (1971) propôs o termo a energia incorporada (embodied energy), como uma medida de qualidade que foi rebatizada como eMergia. A eMergia foi definida como todas as energias disponíveis já usadas direta ou indiretamente, para criar um serviço ou produto (ODUM, 1906). Assim, se mil calorias de luz solar forem necessárias para produzir uma caloria de alimento pelas plantas, a transformação (ou transformidade) será mil calorias solar para uma caloria de alimento e, portanto, a eMergia do alimento é de mil calorias de energia solar. A eMergia pode ser considerada a “memória da energia”, pois é calculada adicionando se todas as energias transformadas para produzir o produto ou serviço final. Para efeito comparativo, todas as energias contributivas deveriam ser do mesmo tipo e, evidentemente, expressas nas mesmas unidades quantitativas. Sob outro ponto de vista, a qualidade da energia é medida pela distância a termodinâmica em relação ao sol. Se o componente de melhor nível (alimento, por exemplo) estiver disponível ou não para um consumidor, depende da qualidade do recurso.

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UNIDADE 1 — ELEMENTOS DA ECOLOGIA

Segundo Odum (1971), para a energia solar fazer o trabalho que hoje é realizado pelo petróleo, ela deve ter seu nível melhorado em milhares de vezes. Em outras palavras, a luz solar (altamente dispersa) não faria funcionar um automóvel ou uma geladeira a menos que fosse concentrada no mesmo nível da gasolina ou da eletricidade. A energia solar pode ser usada diretamente, sem melhoria de seu nível, para realização de tarefas de baixa qualidade, como aquecimento domiciliar. Equiparar a qualidade da fonte do uso reduziria o atual desperdício de combustíveis fósseis e daria mais tempo às sociedades para mudar para outra possível fonte de energia concentrada. Em outras palavras, o petróleo deveria ser reservado para fazer funcionar maquinário, não queimado em fornos para aquecer uma casa quando o sol poderia fazer pelo menos parte deste trabalho.

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LEITURA COMPLEMENTAR

PRODUÇÃO E PRINCÍPIO DA MÁXIMA POTÊNCIA

H.T. Odum, E.C. Odum, M.T. Brown,D. LaHart, C. Bersok,

J. Sendzimir, Graeme B. Scott, David Scienceman & Nikki Meith

1 INTRODUÇÃO

Produção é o processo pelo qual dois ou mais insumos são combinados para formar um novo produto. Por exemplo, nutrientes do solo, água, dióxido de carbono e luz solar são combinados para formar matéria orgânica durante a fotossíntese. Geralmente, produção industrial envolve o uso de energia, trabalho, capital e matéria prima para formar produtos industrializados. Na figura a seguir se ilustra o processo de produção. Observe o símbolo de interação em questão, no qual entram insumos e saem produtos. Sempre que este símbolo é usado, significa que esse processo de produção está ocorrendo.

FIGURA 1 – PROCESSO DE PRODUÇÃO COM DOIS INSUMOS QUE SE INTERATUAM

FONTE: Odum et al. (1987)

Durante o processo de produção, cada entrada de insumos leva energia de diferentes tipos e qualidades. Enquanto ocorre a produção, essas energias são transformadas em uma nova forma. Parte dela é degradada e perdida através de calor. Transformações de energia como essa ocorrem durante processos de produção e são denominadas trabalho.

2 PRODUÇÃO BRUTA E LÍQUIDA

Onde há um processo de produção seguido de um processo de consumo – como na fotossíntese e respiração de plantas – devemos distinguir entre produção e produção menos sua correspondente respiração. Na Figura 1, produção bruta é a taxa real de produção de matéria orgânica. Produção bruta é o fluxo que sai do

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símbolo de interação (5 gramas por dia, neste caso). Produção líquida é a produção realmente observada quando produção e algo de respiração ocorrem ao mesmo tempo. Na Figura 1, a taxa bruta de produção de biomassa é 5 gramas por dia e a taxa de respiração é 3 gramas por dia. A produção líquida é igual a produção bruta menos a respiração. Portanto, a produção líquida é 2 gramas por dia.

FIGURA 2 – PRODUÇÃO BRUTA E LÍQUIDA. P, PRODUÇÃO; R, RESPIRAÇÃO

FONTE: Odum et al. (1987)

Em sistemas mais complexos, como na floresta, onde existem várias etapas de produção e consumo, há mais de um tipo de produção líquida. Por exemplo, produção líquida de madeira, produção líquida de serrapilheira etc.

A produção líquida também depende do tempo em que é medida. Por exemplo, à noite muitas plantas consomem a maior parte daquilo que produziram durante o dia. Sua produção líquida durante o dia é grande, mas sua produção líquida, incluindo a respiração de noite, é muito pequena. Se considerássemos a produção líquida durante um ano inteiro, seria muito pequena ou então zero.

3 FATORES LIMITANTES

A maioria dos processos de produção ocorrem rapidamente quando os insumos estão disponíveis em grandes quantidades. Contudo, a velocidade de uma reação é determinada pelo reativo/ componente menos disponível. Este reativo é chamado fator limitante. Por exemplo, a luz é necessária para a fotossíntese, portanto este processo se torna mais lento e se detêm durante a noite; a luz do sol é o fator limitante que controla esse processo.

Na Figura 3, ainda aumentando o abastecimento de nutrientes, não aumentará a produção. Este é um exemplo de um fator limitante externo; está fora do sistema.

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FIGURA 3 – O SOL É O FATOR LIMITANTE NO PROCESSO DE FOTOSSÍNTESE

FONTE: Odum et al. (1987)

Na Figura 2, aumentando a luz, os nutrientes se tornam limitantes porque eles ficam retidos na matéria formada e não se reciclam rápido. Este é um exemplo de fator limitante interno; limita porque a reciclagem não é suficientemente rápida.

Na Figura 4, estão graficados vários valores de produção em função dos nutrientes. Conforme aumentam os nutrientes, a taxa de produção aumenta. Apesar disso, conforme a luz se torna limitante, a taxa de produção reduz seu aumento. Este é um gráfico típico de fatores limitantes. Esta curva também ilustra a lei do retorno decrescente em economia.

FIGURA 4 – GRÁFICO DA TAXA DE PRODUÇÃO (P) DO PROCESSO DA FIGURA 3, CONFORME OS NUTRIENTES AUMENTAM E A LUZ SE TORNA LIMITANTE

FONTE: Odum et al. (1987)

4 O PRINCÍPIO DA MÁXIMA POTÊNCIA

O Princípio da Máxima Potência indica porque certos modelos de organização de sistemas sobrevivem e outros não. O princípio explica por que sistemas de êxito possuem redes de organização parecidos. Um projeto que teve êxito é aquele que sobreviveu à prova do tempo. O princípio diz que: Esquemas de sistemas que sobrevivem são aqueles organizados de tal modo, que trazem energia para si o mais rápido possível e utilizam essa energia para se retroalimentar e trazer mais energia.

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Outro modo de expressar este princípio é: Há sobrevivência no planejamento do sistema mais adaptado; que é aquele que pode extrair para si o máximo de potência, usando-a para satisfazer suas outras necessidades.

Os esquemas de sistemas que maximizam o poder de transformar energia em produtos de alta qualidade são aqueles que retroalimentam para ajudar a ganhar mais energia, e a usam o mais eficientemente possível sem que o processo reduza o ritmo de sua atividade. Diagramas de ecossistemas em capítulos anteriores têm exemplos de retroalimentação que aumentam o processo de produção.

Os sistemas que maximizam a potência também são sistemas que retroalimentam a um sistema maior, do qual fazem parte. Por exemplo, as espécies em um ecossistema estão organizadas para ser parcialmente responsáveis pelo uso de todo o sistema de energia. Em sistemas grandes, como a floresta, uma árvore usa energia solar para que suas folhas aumentem em tamanho e em número, e possam captar mais energia do sol. O processo da árvore auxilia o sistema da floresta, produzindo nutrientes, construindo um microclima estável, reciclando nutrientes e proporcionando comida aos animais. Assim, a árvore maximiza ambos: sua própria potência e a potência de um sistema maior ao qual pertence.

Para maximizar a potência em uma atividade econômica, recursos locais são usados e modificados por recursos adicionais. Por exemplo, consideremos uma fazenda na qual a safra é plantada na melhor época do ano. Os melhores fertilizantes são utilizados e quando a safra for colhida, as pessoas a comprarão. Esta fazenda produzirá suficiente retorno financeiro para que o fazendeiro viva bem, mantenha o solo e repita o processo ano a ano. Ele também poderá expandir seu sistema comprando fazendas menos eficientes. A exitosa administração da fazenda sobreviverá e será copiada por outros fazendeiros. Devido a que seu trabalho ajuda a incrementar o consumo da energia de toda a economia, este comportamento é sustentado pela economia e sobrevive.

Durante o tempo de abastecimento abundante de energia, maximizar o crescimento, maximiza a potência. Assim, durante as etapas iniciais da sequência, as comunidades incrementam sua biomassa rapidamente.

Quando o abastecimento de energia é estável, máxima potência significa menos competição e um aumento na diversidade e eficiência. Como os recursos energéticos que se tornam limitantes, o desenvolvimento da eficiência através da diversidade maximiza a potência útil. Em uma floresta madura, cada organismo tem seu nicho e há pouca competição. Os organismos tendem a cooperar entre si em lugar de competir. Em um sistema econômico maduro a cooperação também é mais comum que a competição. É de esperar, então, que quando os combustíveis fósseis estejam acabando e os países corram atrás de fontes alternativas de energia, a tendência de expansão e crescimento entre eles irá diminuir. As relações entre as nações serão, então, mais pacíficas.

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FONTE: ODUM, H. T. et al. Ambiente, Avaliação Energética, Economia, Micro-computadores, e Políticas Públicas. Programa de Economia Ecológica, Phelps Lab, Universidade da Florida, Gainesville, Julho de 1987. Tradutores e adaptadores da versão para Internet em português: Laboratório de Engenharia Ecológica e Informática Aplicada (LEIA). Disponível em: http://www.unicamp.br/fea/ortega/eco/index.htm. Acesso em: 1° jul. 2021.

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RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico, você aprendeu que:

• A energia é definida como a capacidade de executar trabalho e entra no ecossistema via fotossíntese e produção vegetal.

• A primeira lei da termodinâmica, ou lei da conservação da energia, estabelece que a energia pode ser transformada de uma forma para outra, mas não pode ser criada nem destruída.

• A segunda lei da termodinâmica estabelece que nenhuma transformação da energia é 100% eficiente, porque alguma parte da energia sempre será dispersada sobre a forma de calor não disponível.

• Os ecossistemas e organismos são sistemas termodinâmicos abertos, em estado de não equilíbrio, que trocam energia de modo contínuo e matéria com ambiente para reduzir a entropia interna e aumentar a entropia externa.

• A entrada de energia solar aciona todos os sistemas biológicos ecológicos.

• A variação do fluxo de radiação solar entre os diferentes extratos do ecossistema, e de um local para o outro na superfície da Terra é enorme, e a distribuição dos organismos individuais responde da mesma forma.

• Menos de 1% da energia solar é convertido em alimento e outras biomassas.

• As plantas assimilam não mais do que 1/3 da energia luminosa absorvida pelos pigmentos fotossintéticos.

• As plantas e os outros autótrofos fotossintetizadores formam a base de todas as cadeias alimentares, sendo então chamados de produtores primários do ecossistema.

• A produtividade primária de um sistema ecológico é definida como a taxa em que a energia radiante é convertida em substâncias orgânicas pelas atividades dos organismos produtores.

• A produção primária é sensível a variações na luz e na temperatura de modo que taxa de fotossíntese geralmente aumenta com a elevação da temperatura, pelo menos até determinado ponto.

• A produção primária das plantas, algas e algumas bactérias forma a base das cadeias alimentares ecológicas.

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• A quantidade de energia que alcança cada nível trófico depende da produção primária líquida na base da cadeia alimentar e das eficiências das transferências de energia em cada nível trófico acima.

• A cada transferência de nível trófico, uma proporção da energia potencial é perdida como o calor.

• A eficiência ecológica total da cadeia alimentar começa pela eficiência com a qual os organismos assimilam o alimento que consomem.

• A energia atravessa o ecossistema em velocidades diferentes. A energia acumulada na celulose e na lignina nos troncos das árvores pode não ser reciclada por séculos.

• A energia tem quantidade (calorias, joules e watts) e qualidade (eMergia).

• eMergia pode ser definida como a soma da energia disponível já usada direta ou indiretamente para criar um serviço ou produto.

• A luz solar é altamente dispersa para fazer funcionar um automóvel e outros serviços mais complexos sem que seja concentrada no mesmo nível da gasolina ou da eletricidade.

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1 A energia inicialmente entra no reino biológico do ecossistema via fotossíntese e produção vegetal, o que proporciona energia para os animais e micro-organismos não fotossintetizadores. Sobre as características termodinâmicas dos ecossistemas, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Os ecossistemas e organismos são sistemas termodinâmicos fechados, em estado de equilíbrio e sem trocas de energia.

b) ( ) A cada passo da transferência de energia de um organismo para o outro, uma nova parte da energia é criada, conforme a primeira lei da termodinâmica.

c) ( ) A Terra não está em estado estável de energia, pois a entrada contínua do fluxo de energia do sol mantém enormes potenciais de energia e diferenças de temperatura.

d) ( ) De acordo com a lei da entropia, as transformações da energia são “multidirecionais”, semelhantes ao comportamento cíclico da matéria.

2 Os organismos que estão na superfície da Terra ou perto dela são constantemente irradiados pela radiação solar e térmica das ondas longas advindas das superfícies do entorno. A energia radiante que atinge a superfície da Terra em um dia claro é por volta de 10% ultravioleta, 45% visível e 45% infravermelha. Com base no enunciado, analise as sentenças a seguir:

I- A radiação solar que atinge a superfície da Terra não sofre qualquer alteração ao passar através da atmosfera, poeiras ou gases.

II- Praticamente 100% da energia solar é convertido em alimento e outras biomassas.

III- A radiação solar que atinge a Terra consiste de três componentes: luz visível, e dois componentes invisíveis (ondas curtas ultravioletas e ondas longas infravermelhas).

Assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.b) ( ) Somente a sentença II está correta.c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 As plantas, algas e algumas bactérias captam a energia luminosa e a transformam em energia de ligações químicas. Este processo é chamado de produção primária e sua taxa é quantificada como produtividade primária. De acordo essa afirmação, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

AUTOATIVIDADE

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( ) A produção primária independe de variações na luz e na temperatura. ( ) As plantas e os outros autótrofos fotossintetizadores formam a base

de todas as cadeias alimentares, sendo então chamados de produtores primários do ecossistema.

( ) devido à grande quantidade de nutrientes, a maior produtividade terrestre do planeta está localizada nas regiões temperadas e nos polos.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V – V – F.b) ( ) V – F – V.c) ( ) F – V – F.d) ( ) F – F – V.

4 A produtividade primária de um ecossistema é definida como a taxa a que a energia radiante é convertida em substâncias orgânicas pelas atividades fotossintética e quimiossintética dos organismos produtores (principalmente plantas verdes). Disserte sobre a eficiência fotossintética e quanto ela pode variar.

5 A quantidade de energia que alcança cada nível trófico depende da produção primária líquida na base da cadeia alimentar e das eficiências das transferências de energia em cada nível trófico acima. Neste contexto, disserte brevemente sobre o fluxo de energia e a eficiência de sua transferência (balanço energético).

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UNIDADE 2 —

COMPONENTES DO ECOSSISTEMA

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• estudar o comportamento e o movimento dos principais elementos constituintes da matéria entre os compartimentos vivos e não vivos do ambiente;

• demonstrar que as variações no ambiente físico e a ciclagem de nutrientes são a base da diversidade dos componentes biológicos dos ecossistemas;

• entender que energia e matéria são dois componentes essenciais dos ecos-sistemas, entretanto, o primeiro é apena consumido dentro dos sistemas biológicos, enquanto o segundo pode ser reciclado e até regenerado;

• compreender como ocorre a regulação natural do ambiente para a correta gestão e uso eficiente dos recursos naturais.

Esta unidade está dividida em quatro tópicos. No decorrer da unidade você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – CICLOS BIOGEOQUÍMICOS

TÓPICO 2 – VARIAÇÕES NO AMBIENTE FÍSICO E A CICLAGEM DE NUTRIENTES

TÓPICO 3 – REGENERAÇÃO DOS NUTRIENTES NOS AMBIENTES TERRESTRES E AQUÁTICOS

TÓPICO 4 – FATORES DE REGULÇÃO NOS ECOSSISTEMAS

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Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.

CHAMADA

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UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

Os elementos químicos, incluindo todos os elementos essenciais para a vida, diferentemente da energia, tendem a circular na biosfera em caminhos característicos permanecendo dentro do ecossistema, onde continuamente circulam entre os organismos e o ambiente físico. Esses caminhos são conhecidos como ciclos biogeoquímicos.

Os materiais usados para formar um composto biológico se originam nas rochas da crosta ou na atmosfera terrestre, mas dentro do ecossistema eles são reutilizados seguidas vezes pelas plantas, animais e micróbios antes de serem perdidos em sedimentos, cursos de água ou escapar para atmosfera como os gases. Embora toda energia assimilada pelas plantas verdes seja energia “nova” recebida de fora do ecossistema, a maioria dos materiais nutritivos assimilados pelas plantas já foi utilizada antes. A amônia absorvida do solo pelas raízes poderia ter sido lixiviada de folhas em decomposição no solo da floresta no mesmo dia. O dióxido de carbono assimilado por uma planta verde poderia ter sido produzido recentemente pela respiração animal, vegetal ou microbiana.

O movimento dos elementos e compostos inorgânicos essenciais para a vida pode ser convenientemente designado de ciclagem dos nutrientes. Cada ciclo de nutriente também pode ser convenientemente dividido em dois compartimentos ou estoques: (1) estoque reservatório, um componente grande, de movimento lento e, em geral, não biológico; e (2) estoque lábio ou de ciclagem, uma porção menor, porém mais ativa, que faz permuta (move-se nos dois sentidos) rapidamente entre os organismos e seu ambiente imediato.

Muitos elementos têm múltiplos estoques reservatórios e alguns (como o nitrogênio) têm múltiplos estoque lábeis. Do ponto de vista da ecosfera, os ciclos biogeoquímicos se enquadram em dois grupos básicos: (1) tipos gasosos, nos quais o reservatório está na atmosfera ou na hidrosfera (oceano); e (2) tipos sedimentares, nos quais o reservatório está na crosta terrestre. A dissipação de alguma forma de energia é sempre necessária para acionar os ciclos de materiais.

TÓPICO 1 —

CICLOS BIOGEOQUÍMICOS

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UNIDADE 2 — COMPONENTES DO ECOSSISTEMA

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2 TRANSFORMAÇÃO DA ENERGIA E A RECICLAGEM DOS ELEMENTOS

Os organismos ajudam a transportar os elementos através dos seus ciclos dentro do ecossistema sempre que executam transformações químicas necessárias para realizar seus processos de vida (ODUM, 1968). As transformações que incorporam formas inorgânicas de elementos nas moléculas de plantas, animais e micróbios são denominadas de processos assimilativos. Um exemplo de uma transformação assimilativa de um elemento é a fotossíntese, na qual as plantas usam energia para mudar uma forma inorgânica de carbono (dióxido de carbono) numa forma orgânica de carbono encontrada nos carboidratos. Na reciclagem geral do carbono, a fotossíntese é equilibrada pela respiração, um processo desassimilativo complementar que envolve a transformação de carbono orgânico de volta à uma forma inorgânica, acompanhada pela liberação de energia.

Nem todas as transformações dos elementos no ecossistema são biologicamente mediadas, nem todas envolvem assimilação líquida ou liberação de quantidades úteis de energia (ODUM; ODUM, 2000). Muitas reações químicas acontecem no ar, no solo e na água. Algumas delas, como a intemperização do leito rochoso, liberam certos elementos (potássio, fósforo e silício, por exemplo) dos compostos na rocha e os tornam disponíveis para o ecossistema. Tempestade de raios produzem pequenas quantidades de nitrogênio reduzido (amônia, NH3) a partir do nitrogênio molecular (N2) e do vapor de água (H2O) na atmosfera, a qual as plantas e os micróbios podem assimilar. Estas reações podem ter-se envolvido na origem da vida propriamente dita. Outros processos químicos e físicos, como a sedimentação de carbonato de cálcio nos oceanos, removem elementos da circulação e os incorporam nas rochas na crosta da Terra, onde podem permanecer em tocados por milênios.

A maioria das transformações de energia biológica estão associadas com a oxidação e a redução bioquímica do carbono, do oxigênio, do nitrogênio e do enxofre. Em química geral, um átomo é oxidado quando ele cede elétrons, e é reduzido quando ele aceita elétrons. Num certo sentido, os elétrons transportam com eles a porção do conteúdo energético de um átomo. Nas transformações biológicas, uma oxidação libertadora de energia é acompanhada com uma redução consumidora de energia, e a energia se transfere dos reagentes numa transformação para os produtos da outra. Tais transformações em paralelo são possíveis somente quando o lado da oxidação libera pelo menos tanta energia quanto o lado da redução possa consumir. As mudanças de energia associadas com várias transformações variam amplamente dependendo dos compostos envolvidos e do número de elétrons trocados. Está na natureza do mundo físico que a energia de duas transformações raramente é igual (ODUM; BARRETT, 2008). A energia suprida por uma reação de oxidação em excesso àquela demandada por uma reação de redução comparável não pode ser usada, e é perdida na forma de calor (ODUM; ODUM, 2000). Esses desequilíbrios são responsáveis pela ineficiência termodinâmica dos processos da vida.

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TÓPICO 1 — CICLOS BIOGEOQUÍMICOS

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Um acoplamento típico de transformações poderia envolver a oxidação do carbono num carboidrato (glicose, por exemplo), que libera energia, e a redução do nitrogênio-nitrato em nitrogênio-amônia (que forma os blocos de construção das proteínas), o que consome energia. Isto, como muitas transformações bioquímicas, conecta uma transformação liberadora de energia com a assimilação de um elemento (nitrogênio, neste caso, exigida para o crescimento e a reprodução). Nos animais, essas transformações bioquímicas são também usadas para manter um ambiente celular e para efetuar o movimento. Algumas destas transformações envolvem muitos passos intermediários conectados junto com uma via bioquímica. As plantas executam entrada inicial de energia no ecossistema por uma redução assimilativa de carbono na qual a luz, em vez de um processo desassimilativo acoplado, serve como fonte de energia. Uma parte da energia escapa dos sistemas biológicos em cada transformação subsequente. A troca de elementos entre as partes vivas e não-vivas do ecossistema é assim conectada com o fluxo de energia pelo acoplamento da parte desassimilativa de um ciclo com a parte assimilativa de outro.

3 COMPARTIMENTOS INTERLIGADOS DOS ECOSSISTEMAS

A cada transformação bioquímica, um ou mais elementos são mudados de uma forma em outra. Cada forma de um elemento em um ecossistema pode ser pensada como um compartimento separado, do qual os átomos se movimentam conforme os processos físicos e biológicos os transformam. Para Odum e Odum (2000), o ecossistema inteiro pode ser pensado como um conjunto de compartimentos entre os quais os elementos circulam (Figura 1). Por exemplo, a fotossíntese transporta carbono do compartimento de carbono inorgânico para o compartimento de formas orgânicas de carbono (assimilação); a respiração o leva de volta para o compartimento inorgânico (desassimilação). Estes modelos de compartimentos de ecossistemas podem ser organizados hierarquicamente, tendo subcompartimentos dentro de compartimentos (ODUM; ODUM, 2000). O compartimento de carbono inorgânico inclui o dióxido de carbono tanto atmosférico quanto dissolvido na água, os íons carbonato e bicarbonato dissolvidos na água, e o carbonato de cálcio, na maioria das vezes e como um precipitado na coluna de água e nos sedimentos. O compartimento de carbono orgânico também tem muitos subcompartimentos: autótrofos, animais, microrganismos e detritos. Como os organismos se alimentam uns dos outros, eles transportam carbono entre estes subcompartimentos.

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UNIDADE 2 — COMPONENTES DO ECOSSISTEMA

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FIGURA 1 – MODELO GERAL DE COMPARTIMENTOS NO ECOSSISTEMA

FONTE: Ricklefs (2009, p. 136)

De acordo com a Figura 1, em cada compartimento, podemos reconhecer subcompartimentos; por exemplo, o compartimento que representa as formas orgânicas disponíveis de nutrientes é ainda mais subdivido em compartimentos ocupados por autótrofos, animais, detritos e micróbios. O movimento dos elementos dentro e entre os compartimentos frequentemente envolve energia. A fotossíntese adiciona energia ao carbono, que podemos interpretar como subindo de elevador para o segundo andar de uma casa. Ao descer pela “escada” da respiração, o carbono libera esta energia química armazenada, que um organismo pode então usar para outros propósitos.

Os elementos circulam rapidamente entre estes compartimentos de ecos-sistemas e muito mais lentamente entre outros. O movimento de um elemento entre os organismos vivos e as formas inorgânicas ocorre em períodos que va-riam de uns poucos minutos até vidas inteiras de organismos, ou sua existência subsequente como detritos orgânicos (ODUM; ODUM, 1982). Tanto as formas orgânicas quanto as inorgânicas dos elementos ocasionalmente deixam a rápida circulação que ocorre nos ecossistemas para compartimentos que não estão pron-tamente acessíveis para os agentes de transformação. Por exemplo, o carvão, o óleo e a turfa contêm grande quantidade de carbono orgânico que foi removido da circulação nos ecossistemas, muitas vezes por muitos milhões de anos. O car-bono inorgânico é tirado de circulação nos ecossistemas aquáticos pela precipita-ção do carbonato de cálcio, que forma camadas espessas de sedimentos marinhos que podem no fim se transformar em calcário. Essas formas de carbono são re-tornadas para os compartimentos de circulação rápida nos ecossistemas somente pelos lentos processos geológicos do vulcanismo, do surgimento e da erosão.

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TÓPICO 1 — CICLOS BIOGEOQUÍMICOS

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4 TIPOS CLÁSSICOS DE CICLOS BIOGEOQUÍMICOS

Em ecologia é essencial estudar não apenas organismos e suas relações com o ambiente, mas também um ambiente não vivo básico em relação aos organismos. As duas divisões do ecossistema (biótica e abiótica) evoluem e influenciam o comportamento entre si. Dos elementos que ocorrem na natureza, sabe se que entre 30 e 40 são exigidos pelos organismos vivos (elementos essenciais). Alguns elementos, como o carbono, hidrogênio, oxigênio e nitrogênio, são necessários em grandes quantidades; outros, em pequenos ou até minúsculas. Seja qual for a quantidade necessária, os elementos essenciais exibem ciclos biogeoquímicos definidos. Os elementos não essenciais (elementos não exigidos para vida), apesar de menos ligados aos organismos, também circulam e frequentemente fluem com os elementos essenciais, pelo ciclo da água, ou porque tem afinidade química com eles.

Bio refere-se a organismos vivos e geo refere-se a terra. A geoquímica está interessada na composição química da Terra e na troca de elementos entre diferentes partes da crosta terrestre, bem como em sua atmosfera e oceanos, rios e outros corpos d’água. O conceito de geoquímica é atribuído ao russo Polynov (1937) e é definido como o papel dos elementos químicos na síntese e decomposição de todos os tipos de materiais, com ênfase especial no intemperismo. A biogeoquímica, teve relevância reconhecida nas monografias de Hutchinson (1944, 1948, 1950), as quais envolvem o estudo da troca de materiais entre os componentes vivos e não vivos da ecosfera (VERNADSKIJ, 1998). Fortescue (1980) revisou a geoquímica de uma perspectiva ecológica e holística em termos de geoquímica da paisagem. Os resumos dos artigos chave no desenvolvimento do campo da biogeoquímica são apresentadas por Butcher et al. (1992) e Schlensinger (1997).

É importante enfatizar que alguma forma de energia deve ser gasta para reciclar os materiais (fato para ser lembrado quando se trata da crescente necessidade humana de reciclar água, metais, papéis e outros materiais). Dessa forma, a ciência da ecologia humana (estudo do impacto da humanidade sobre os sistemas naturais e sua integração com eles) tornou-se um componente vital na gestão de sistemas naturais e construídos pelo homem. Os elementos na natureza quase nunca estão distribuídos de forma homogênea nem estão presentes na mesma composição química em todo ecossistema.

O ser humano necessita utilizar os 40 elementos essenciais além de elementos sintéticos. A humanidade acelerou a circulação de muitos materiais de modo que processos autorreguladores que tendem manter a homeorese estão oprimidos, ao passo que os ciclos de nutrientes tendem a se tornar imperfeitos ou acíclicos, resultando na situação paradoxal de “muito pouco aqui em excesso ali”. Por exemplo, os seres humanos exploram e processam as rochas fosfatados com tamanho descuido, que passam a ocorrer altos níveis de poluição perto de mim nas Indústrias de fosfato. Então, com a mesma perspicaz miopia, os seres humanos aumentam a entrada de fertilizantes nos sistemas agrícolas pouco considerando o inevitável aumento no escoamento superficial, o que estressa os cursos de água e reduz a sua qualidade.

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UNIDADE 2 — COMPONENTES DO ECOSSISTEMA

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A poluição foi frequentemente definida como recursos extraviados. O objetivo da conservação dos recursos naturais no sentido mais amplo é fazer que os processos acíclicos se tornem mais cíclicos. O conceito de reciclagem deve, cada vez mais, tornar-se uma meta importante da sociedade. A reciclagem da água é um bom começo, pois seu ciclo hidrológico puder ser mantido e reparado, existem melhores chances de controle dos nutrientes que se movimentam com a água.

O ciclo do nitrogênio é um exemplo de ciclo do tipo gasoso muito com-plexo e bem tamponado; o ciclo do fósforo é um exemplo do tipo sedimentar mais simples, menos bem tamponado e regulado. Esses dois elementos muitas vezes são fatores importantes, que limitam ou controlam a abundância de orga-nismos. Atualmente, a superfertilização com esses dois elementos vem criando graves efeitos adversos em escala global.

O ciclo do enxofre foi escolhido para ilustrar: (1) as conexões entre o ar, a água e a crosta terrestre, porque existem ciclagens ativas dentro e entre cada um desses estoques; (2) o papel-chave desempenhado por microrganismos; e (3) as complicações causadas pela poluição industrial do ar. O ciclo do carbono e o ciclo hidrológico são cruciais para vida e vem sendo afetados cada vez mais pelas atividades humanas.

4.1 O CICLO DA ÁGUA

A Terra difere de outros planetas do sistema solar por ter uma grande quantidade de água, a maioria em forma líquida, que sustenta toda a vida no planeta. O ciclo da água, ou ciclo hidrológico, está ligado ao movimento e à troca de água nos seus diferentes estados físicos, que ocorre na hidrosfera. Envolve o movimento da água nos oceanos (o maior reservatório) por evaporação para atmosfera (o menor reservatório) e, posteriormente, pela precipitação (chuva) de volta para superfície da Terra, com infiltração e escoamento nos continentes e eventual retorno aos oceanos. Parte da chuva volta para o ar por evaporação e transpiração da vegetação. Este movimento permanente deve-se ao Sol, que fornece a energia para elevar a água da superfície terrestre para a atmosfera (evaporação). Cerca de 1/3 da incidência de energia solar está envolvido na condução do ciclo da água. A gravidade faz com que a água condensada precipite de volta para a superfície do planeta e que circule através da rede hidrológica agrupada em rios, até atingir os oceanos pelo escoamento superficial, ou se infiltre nos solos e nas rochas, através dos seus poros, fissuras e fraturas (escoamento subterrâneo). Nem toda a água precipitada alcança a superfície terrestre, já que uma parte, na sua queda, pode ser interceptada pela vegetação e volta a evaporar-se.

O movimento da água (fluxo) também varia de lugar para lugar, e vem sendo cada vez mais afetado pelas atividades humanas. Ainda que hoje a quantidade global de água na terra seja igual à da era glacial, a quantidade

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TÓPICO 1 — CICLOS BIOGEOQUÍMICOS

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congelada variou muito ao longo do tempo geológico. A quantidade de água e a velocidade com que ela circula nas diferentes fases do ciclo hidrológico são influenciadas por diversos fatores como, por exemplo, a cobertura vegetal, altitude, topografia, temperatura, tipo de solo e geologia.

Dois aspectos do ciclo hidrológico devem ser enfatizados: (1) evapora

mais água do oceano do que retorna a ele por meio da chuva no continente e vice-versa. Em outras palavras, uma parte considerável das chuvas que sustentam os ecossistemas terrestres, incluindo a maioria da produção de alimentos, vem da água evaporada do mar; (2) as atividades humanas tendem a alterar o índice pluviométrico (por exemplo, pela pavimentação do solo, abertura e represamento de rios, compactação do solos agrícolas e desmatamento), o que reduz a recarga do importante compartimento da água subterrânea (o terceiro maior reservatório global de água), que contém cerca de 13 vezes mais água que toda água doce os lagos, rios e solos. Os maiores depósitos de água subterrânea são os aquíferos que são camadas porosas subterrâneas, frequentemente de rocha calcária, areia ou cascalho, confinados por rochas ou argilas impenetráveis que retêm a água como um tanque amplo.

A água proporciona o modelo físico de reciclagem de elementos no ecossistema. A água está envolvida quimicamente na fotossíntese, mas são a evaporação, a transpiração e a precipitação que dirigem a maior parte do movimento da água através dos ecossistemas terrestres. Estes processos físicos, contudo, acoplam o movimento da água com as transformações de energia. Assim, o ciclo hidrológico global ilustra muitas características básicas dos ciclos dos elementos.

A energia da luz absorvida pela água executa o trabalho da evaporação. O vapor de água tem uma energia potencial, que é a energia de separação das moléculas individuais de água umas das outras. Quando o vapor de água atmosférico se condensa para formar nuvens, as moléculas de água se agregam e a energia potencial no vapor de água é liberada como calor, que finalmente escapa da Terra na forma de radiação de ondas longas. De um ponto de vista termodinâmico, a evaporação e a condensação se assemelham à fotossíntese e à respiração.

O total de água na biosfera é de cerca de 1,4 bilhões de quilômetros cúbicos ou 1.400.000 × 10¹⁸ g. É difícil lidar com um número tão grande. 10¹⁸ g de água é 1 bilhão de vezes 1 bilhão ou um quatrilhão de gramas. Cada metro cúbico contém 10⁶ g, ou 1000 kg (1 tonelada métrica, t) de água, e assim 10¹⁸ g é 1 trilhão (10¹²) de toneladas métricas, isso é uma teratonelada (Tt). Números da ordem de 10¹⁸ geralmente são reservados para astronomia, mas usaremos teratoneladas como uma unidade de água global para trabalhar com poucos números zeros.

A Tabela 1 mostra que as calotas polares e as geleiras das montanhas constituem o segundo maior estoque reservatório de água. Por causa do derretimento das bolsas de gelo globais, o nível do mar aumentou gradativamente

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UNIDADE 2 — COMPONENTES DO ECOSSISTEMA

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durante o século passado. Cerca da metade desse aumento se deve a expansão térmica, pois a água mais quente ocupa mais espaço que a água muito fria ou o gelo. Esse pequeno, porém, perceptível aumento no nível do mar é o sinal mais evidente da tendência de aquecimento global.

TABELA 1 – ESTOQUES GLOBAIS DE ÁGUA NO PLANETA TERRA

FONTE: Adaptada de Odum e Barrett (2008)

1 teraton (Teratonelada, Tt) = 1000 gigatons (Gigatoneladas, GT); 1 gigaton = 1.000 megatons (Megatonelada, Mt); 1 megaton = 1.000 quilotons (Quilotoneladas, Qt); Portanto, 1 teraton = 1.000.000 megatons ou 1.000.000.000 quilotons. Isso é 50 milhões de vezes mais poderoso do que a bomba de Nagasaki.

INTERESSANTE

Mais de 97% da água na biosfera se encontra nos oceanos. Sobre a superfície da Terra, a precipitação (111 Tt/ano, que é 22% do total global) excede a evaporação e a transpiração (71 Tt/ano; 16% do total global). Sobre os oceanos, a evaporação excede a precipitação por uma quantidade semelhante. Muito da água que evapora da superfície nos oceanos é transportada pelos ventos para os continentes, onde é recapturada como precipitação sobre a terra. Este fluxo líquido de vapor de água atmosférico do oceano para a terra (40 Tt/ano) é equilibrado pelo escoamento da terra através dos rios de volta para as bacias oceânicas.

A evaporação determina quão rápido a água se move através da biosfera. Absorção de energia radiante pela água líquida para criar vapor de água se acopla com uma fonte de energia para o ciclo hidrológico. Podemos calcular a energia que dirige o ciclo hidrológico global multiplicando o peso total de água evaporada

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TÓPICO 1 — CICLOS BIOGEOQUÍMICOS

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(456 Tt/ano) pela energia exigida para evaporar 1 g de água (2,24 kj). O produto, aproximadamente 10²¹ kj por ano (cerca de 32 bilhões de megawatts), representa cerca de 1/4 da energia total da radiação do Sol que atinge a Terra. A condensação de vapor de água para formar precipitação libera a mesma quantidade de energia como calor. A evaporação e a precipitação estão intimamente ligadas porque a atmosfera tem uma capacidade limitada de reter vapor de água; qualquer aumento na evaporação de água para atmosfera cria um excesso de vapor e causa um igual aumento de precipitação.

A quantidade de vapor de água na atmosfera em qualquer tempo corresponde a uma média de cerca de 25 mm de água espalhada uniformemente sobre a superfície da Terra. Uma média de 650 mm de chuva ou neve cai a cada ano (o fluxo de água), que é 26 vezes a quantidade média de vapor de água. Assim, o conteúdo estacionário de água na atmosfera (o compartimento atmosférico) substitui a si mesmo 26 vezes a cada ano em média (inversamente, a água tem um tempo de residência médio na atmosfera de 1/26 de um ano, ou 2 semanas). Os solos, os rios, os lagos e oceanos contêm mais de 100.000 vezes a água que existe na atmosfera. Contudo, os fluxos através de ambos os compartimentos são os mesmos, em virtude de a evaporação equilibrar a precipitação. Assim, o tempo de residência médio da água na sua forma líquida na superfície terrestre (cerca de 2.800 anos) é cerca de 100.000 vezes maior do que o tempo de residência na atmosfera.

As árvores da floresta absorvem grandes quantidades de água pelas raízes, e a conduz através dos troncos, para as folhas, e a expulsa mediante poros microscópicos nas folhas, em forma de vapor. Essa saída de água se chama transpiração. A quantidade de água que flui através das árvores pelo processo de transpiração é muito maior que a pequena quantidade de água usada na fotossíntese. Parte da água da chuva se evapora antes de alcançar o solo. A soma da transpiração e da evaporação é chamada evapotranspiração. A Figura 2 mostra os fluxos e depósitos de água em um metro quadrado de um ecossistema florestal. Pouca água é armazenada (em depósito) comparada com a quantidade que flui através de todos os sistemas (chuva, lixiviação e transpiração).

FIGURA 2 – DIAGRAMA DO CICLO DA ÁGUA: DEPÓSITOS E FLUXOS DE ÁGUA NO ECOSSISTEMA FLORESTAL (GRAMAS DE ÁGUA/M2/ANO)

FONTE: Adaptada de Odum et al. (1987)

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4.2 O CICLO DO CARBONO

O ciclo do carbono está intimamente relacionado ao fluxo de energia através da biosfera. O ciclo do carbono se assemelha ao ciclo hidrológico no sentido de que a energia do Sol proporciona a sua força motriz. Em nível global, os ciclos do carbono e da água são ciclos biogeoquímicos muito importantes, pois o carbono é um elemento básico da vida e a água é essencial para toda a vida. Ambos os ciclos são caracterizados por pequenos, porém muito ativos estoques reservatórios atmosféricos, que além de vulneráveis às perturbações produzidas pelo homem, podem modificar o tempo meteorológico e o clima, de forma afetar muito a vida no planeta.

O ciclo do carbono é muito mais complexo, contudo, devido as várias reações químicas do carbono (RILEY, 1944). Três desses processos fazem o carbono circular através dos ecossistemas aquáticos e terrestres: (1) reações assimilativas e desassimilativas de carbono, principalmente na fotossíntese e na respiração; (2) troca de dióxido de carbono entre a atmosfera e os oceanos; e (3) sedimentação de carbonatos.

4.2.1 A fotossíntese e a respiração

A fotossíntese e a respiração são as grandes reações transformadores de energia da vida. Aproximadamente 85 bilhões de toneladas métricas (85 × 10¹⁵ g) de carbono entram nessas reações em todo o mundo a cada ano (1.000.000.000 de toneladas métricas igual uma gigatonelada, Gt). Durante a fotossíntese, o carbono ganha elétrons e é reduzido. O ganho de elétrons é acompanhado por um ganho na energia química. Uma quantidade equivalente de energia é liberada pela respiração, que resulta numa perda de elétrons e numa perda de energia química.

Embora seja difícil estimar o carbono total na matéria orgânica dentro da biosfera, ele provavelmente atinge algo como 2.650 Gt, incluindo tanto os organismos vivos como os detritos orgânicos e os sedimentos. Assim, considerando que 85 GT de carbono são assimiladas pela fotossíntese a cada ano, o tempo de residência médio do carbono em moléculas biológicas é aproximadamente de 2.650 Gt ÷ 85 Gt por ano, o que é igual a 31 anos.

4.2.2 A troca oceano-atmosfera

A segunda classe de processos de reciclagem de carbono envolve a troca física de dióxido de carbono entre a atmosfera e os oceanos, lagos e correntes de água. O dióxido de carbono se dissolve prontamente na água; os oceanos contêm cerca de 50 vezes mais CO² do que a atmosfera. A troca através da fronteira ar-água conecta os ciclos de carbono dos ecossistemas terrestres e aquáticos. O oceano é um repositório importante para o dióxido de carbono produzido pela queima

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de combustíveis fósseis. Conforme o conteúdo de CO² da atmosfera aumenta, a taxa de solução do CO² no oceano também aumenta, reduzindo assim a taxa de aumento de CO² na atmosfera abaixo da qual ela poderia estar na ausência da troca ar-água.

Do carbono total na atmosfera na forma de dióxido de carbono (640 Gt), aproximadamente 35 Gt são assimiladas pelas plantas terrestres e 84 Gt se dissolvem nos oceanos e em outras superfícies líquidas, a cada ano. A respiração e o escape de dióxido de carbono dissolvido da água para atmosfera substituem estas quantidades. No total, o tempo de residência médio do carbono na atmosfera é de cerca de cinco anos. Por causa deste tempo de residência curto, a quantidade de dióxido de carbono na atmosfera é muito sensível à taxa de produção de CO², aumentando muito proximamente em paralelo com a queima de combustíveis fósseis. Por volta de 1990, a queima de combustíveis fósseis contribuía com cerca de 6 Gt de carbono anualmente, equivalente a quase 1% do dióxido de carbono atmosférico total e 1/6 da assimilação total de carbono pelas plantas terrestres.

4.2.3 A Precipitação de carbonatos

A terceira classe de processos de reciclagem de carbono ocorre somente em sistemas aquáticos. Ele envolve a dissolução de compostos carbonados na água e sua precipitação (deposição) como sedimentos, particularmente calcário e dolomita. Numa escala global, a dissolução e a precipitação aproximadamente se equilibram entre si, embora certas condições que favorecem a precipitação tenham levado à deposição de extensas camadas de sedimentos de carbonato de cálcio no passado. A dissolução e a deposição nos sistemas aquáticos ocorrem cerca de 100 vezes mais lentamente do que a assimilação e desassimilação por sistemas biológicos. Assim, a troca entre sedimentos e a coluna de água é relativamente pouco importante para reciclagem de curto prazo do carbono no ecossistema. Localmente e por longos períodos, contudo, ela pode assumir uma importância muito maior; a maioria do carbono dos ecossistemas está aprisionada nas rochas sedimentares.

Quando o dióxido de carbono se dissolve na água ele forma ácido carbônico:

CO₂ + H₂O → H₂CO₃.

Que rapidamente se dissocia em hidrogênio, bicarbonato e íons carbonato:

H₂CO₃ → H+ + HCO₃- → 2H⁺ + CO₃²- .

O cálcio, quando presente, também se equilibra com os íons carbonato para formar o carbonato de cálcio:

Ca²+ + CO₃²- CaCO₃

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O carbonato de cálcio tem baixa solubilidade sobre a maioria das condições, e rapidamente se precipita da coluna de água para formar sedimentos. Esta sedimentação efetivamente remove carbono dos sistemas aquáticos, mas a taxa de remoção é menor que 1% da reciclagem anual de carbono nestes ecossistemas, e essa quantidade é somada de volta para a entrada dos rios, que são naturalmente um tanto ácidos e tendem a dissolver os sedimentos calcários (carbonatos).

A dissolução e a dissociação podem ser afetadas localmente pelas atividades dos organismos. No sistema marinho, sob condições de PH aproximadamente neutras, o carbonato e o bicarbonato estão em equilíbrio químico:

CaCO₃ (insolúvel) + H₂O + CO₂ Ca²+ + 2 HCO₃- (solúvel).

A assimilação de CO2 via fotossíntese pelas algas e plantas aquáticas muda o equilíbrio para a esquerda, resultando na formação e precipitação de carbonato de cálcio. Muitas algas excretam este carbonato de cálcio para água circundante, mas algas construtoras de recife e algas coralinas o incorporam em suas estruturas corporais duras. No sistema como um todo, quando a fotossíntese excede a respiração (assim como faz durante os blooms algais) o cálcio tende a se precipitar para fora do sistema.

A produção de carbonatos no mar também forma de dióxido de carbono como subproduto, como segue:

Ca+2HCO₃ → CaCO₃ + H₂O+ CO₂

Em função da redução no pH resultante do movimento dessa reação para direita, apenas 0,6 mol de CO₂ por mol de carbonato é realmente liberado nas águas do mar (e, em última instância, na atmosfera). Os recifes de corais e outros organismos calcificantes são uma fonte, não o sumidouro de CO₂. O mar desempenha um importante papel no sequestro do carbono (contém 40 atmosferas de carbono, sob a forma de bicarbonato e carbono orgânico dissolvido – COD), que funcionam como importantes reservas de carbono. Portanto, o mar é um eficiente tamponador de CO₂ atmosférico, pois ele e a atmosfera equilibram-se entre si. Provavelmente, esse é o mecanismo de controle básico do CO₂ atmosférico. Qualquer aumento maior futuro na queima de combustíveis fósseis, bem como as futuras reduções da capacidade dos cinturões verdes em remover o CO₂, certamente resultarão em aumento contínuo do conteúdo de CO₂ da atmosfera.

Somadas ao CO2, duas outras formas de carbono estão presentes em pequenas quantidades na atmosfera: monóxido de carbono (CO), aproximadamente 0,1 ppm, e metano (CH₄), cerca de 1,6 ppm. Tanto o CO como o CH₄ surgem da decomposição incompleta ou anaeróbica da matéria orgânica; na atmosfera, ambos são oxidados para CO₂. Uma quantidade de CO₂ igual formada por decomposição natural é injetada no ar pela queima incompleta dos combustíveis fósseis, especialmente nos escapamentos dos automóveis. O monóxido de carbono (CO), um veneno mortal para o ser humano, não é uma

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ameaça global, mas está se tornando um preocupante poluente das áreas urbanas quando o ar fica estagnado. As concentrações de CO acima de 100 ppm não são incomuns em áreas de intenso tráfego de automóveis (um estresse que pode resultar em doenças circulatórias e respiratórias).

O metano (CH₄) é um gás incolor inflamável produzido de forma natural pela decomposição de matéria orgânica por bactérias anaeróbicas, especialmente em pântanos de água doce, campos de arroz inundados e no trato digestivo de ruminantes (como gado) e cupins. É também um importante componente do gás natural, portanto, as perturbações geoquímicas associadas às minerações e perfurações de combustíveis fósseis resultam na liberação de metano. Embora seja hoje um componente muito pequeno da atmosfera (2 ppm, comparado aos 370 ppm de CO₂), a concentração de metano dobrou durante o século passado, na maioria das vezes por conta das atividades do ser humano, como aterros sanitários e o uso de combustíveis fósseis. O metano é um gás de efeito estufa que, se comparado molecularmente, absorve 25 vezes mais calor que o CO₂. O tempo de residência na atmosfera é de cerca de nove anos, comparado aos seis anos do CO₂. Em épocas passadas, a concentração de metano na atmosfera foi mais alta que a atual. O metano tem potencial para aumentar sua contribuição para o aquecimento global. Um dos reais perigos do aquecimento global contínuo seria a ocorrência de outra “explosão de metano” causada pelo derretimento dos hidratos metano no permafrost ou no assoalho do mar, e que já está começando a acontecer na Sibéria e no Alaska (THOMAS et al., 2002).

4.2.4 As mudanças no ciclo do carbono através do tempo

Os geólogos podem estimar as quantidades de carbono removidas da atmosfera pela matéria orgânica enterrada e pela precipitação de carbonatos em sedimentos marinhos, assim como quando estes sedimentos foram formados. Dessa informação, podem estimar a concentração original de dióxido de carbono na atmosfera e sua mudança através do tempo.

Estas estimativas indicam que durante a primeira parte da era paleozoica, grosseiramente 550-400 milhões de anos antes do presente a atmosfera reteve cerca de 15 a 20 vezes mais dióxido de carbono do que no presente. Essa quantidade decresceu rapidamente no início do período Devoniano, cerca de 400 milhões de anos antes do presente, e caiu para aproximadamente seus níveis atuais 300 milhões de anos antes do presente. Este declínio foi iniciado por um aumento agudo na taxa de intemperização dos ambientes terrestres, após o desenvolvimento de florestas na terra e pela deposição de grandes acúmulos de sedimentos orgânicos que formavam a maior parte dos leitos de carvão terrestres. Em direção ao fim da era paleozoica, cerca de 250 milhões de anos antes do presente, a concentração de CO₂ na atmosfera novamente aumentou para cerca de cinco vezes o seu nível atual, permanecendo alta por aproximadamente 100 milhões de anos durante o início da era Mesozoica, e vem declinando continuamente desde então.

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O início das eras Paleozoica e Mesozoica foram verdadeiramente tempos de efeito estufa. As temperaturas médias por toda a Terra eram altas, e a vida tropical floresceu até mesmo nas altas latitudes. O declínio do CO₂ no Devoniano estabeleceu o estágio para climas mais frios e glaciações extensas e, no fim da Era Mesozoica, muito semelhantes àquelas que a Terra experimentou durante o último milhão de anos. O atual aumento no CO₂ atmosférico, preocupante como ele é, não trará a Terra às condições quentes dos tempos primitivos, pelo menos não em breve. A maior parte do carbono “geológico” tirado da atmosfera primitiva da Terra está ligado aos sedimentos calcários. Este carbono é retornado para atmosfera muito lentamente conforme o calcário é conduzido abaixo das bordas das plataformas continentais, os carbonatos são transformados em dióxido de carbono sob o intenso calor e pressão no fundo da terra e o dióxido de carbono é finalmente liberado em erupções vulcânicas.

Durante a segunda metade do século XX, a concentração de CO₂ na atmosfera aumentou de forma significativa, assim como outros gases de efeito estufa que refletem o calor solar de volta para a terra. O depósito atmosférico de carbono é muito pequeno, se comparado com a quantidade de carbono presente no oceano, em combustíveis fósseis e outros depósitos da litosfera. A queima de combustíveis fósseis, aliada a agricultura e ao desmatamento, vem contribuindo para o aumento contínuo de CO₂ na atmosfera. A perda líquida CO₂ (adição de mais CO₂ na atmosfera do que é removido) na agricultura intensifica esse processo porque o CO₂ fixado por cultivos (muitos deles ativos apenas uma parte do ano) não compensa o CO₂ liberado do solo, especialmente em consequência de frequentes aragens.

A remoção de florestas pode liberar o carbono armazenado nas matas recentemente queimadas, ao que se segue, com a exposição do solo (se a terra for usada para agricultura ou desenvolvimento urbano) ocorre a liberação de carbono por meio de oxidação de húmus. Em comparação, as florestas jovens de crescimento rápido são sumidouros de carbono, portanto, o reflorestamento em larga escala pode reduzir a taxa de aquecimento global, associado ao aumento atmosférico de CO₂.

Antes de 1850 (ou seja, antes da revolução industrial), a concentração de CO₂ na atmosfera era da ordem de 280 ppm. Durante os últimos 150 anos, o CO₂ atmosférico aumentou para mais de 370 ppm. Esse aumento levou a preocupação com o efeito estufa. O efeito estufa é o aquecimento do clima na Terra atribuído ao aumento da concentração de CO₂ e de outros poluentes gasosos da atmosfera. Esses gases de efeito estufa (metano, ozônio, óxido nitroso e clorofluorcarbonos) absorvem a radiação infravermelha emitida pelo aquecimento solar da Terra e refletem a maior parte dessa energia térmica de volta para a Terra, resultando no aquecimento global.

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A rápida oxidação do húmus e a liberação de CO₂ gasoso, normalmente retido no solo, têm efeitos mais sutis, inclusive na ciclagem de outros nutrientes. Os agrônomos hoje reconhecem que devem adicionar minerais-traço aos fertilizantes para manter o rendimento em várias áreas, porque os agrossistemas não regeneram esses nutrientes tão bem como os sistemas naturais.

Em termos ecológicos, os fluxos entre os estoques reservatórios e os esto-ques permutáveis de muitos elementos estão sendo alterados pela atual em inge-rência da paisagem. Existem práticas que podem ser utilizadas para compensar, por exemplo, a promoção de treinamento e prática no plantio direto para a con-servação das lavouras, que reduz o escoamento erosão do solo. Se o ser humano reconhecer o que aconteceu e aprender a compensar, tais mudanças não precisam ser prejudiciais. Recorde como atmosfera da Terra chegou a ter esses conteúdos baixos de CO₂ e altos de O₂ a exemplo do que estabelece a hipótese de Gaia.

4.3 O CICLO DO NITROGÊNIO

O nitrogênio assume muitos estados de oxidação no seu ciclo nos ecossistemas. A fonte em última instância de nitrogênio para vida está no nitrogênio molecular (N₂) na atmosfera. Essa forma de nitrogênio se dissolve com alguma extensão na água, mas está ausente da rocha nativa. Descargas elétricas convertem algum nitrogênio molecular em formas, como a amônia, que as plantas podem usar, mas a maior parte entra nas vias biológicas do ciclo do nitrogênio (figura 3) através de sua assimilação por certos microrganismos em um processo denominado fixação de nitrogênio. Embora esta via (N₂ → NH₃) constitua somente uma pequena fração do fluxo de nitrogênio anual terrestre, a maioria do nitrogênio reciclado biologicamente pode ser rastreado de volta até a fixação do nitrogênio. O estado mais reduzido do átomo do nitrogênio tem o maior potencial de energia química. Uma vez no reino biológico, o nitrogênio segue vias mais complicadas do que aquelas do carbono, porque mais formas oxidadas e reduzidas são possíveis para usar átomos de nitrogênio.

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FIGURA 3 – DIAGRAMA ESQUEMÁTICO DAS TRANSFORMAÇÕES DE COMPOSTOS NO CICLO DO NITROGÊNIO

FONTE: Ricklefs (2009, p. 142)

O elemento químico nitrogênio é essencial para todas as formas de vida e seus produtos. É um dos elementos necessários para fazer proteínas (músculos em carnes, nervos, cabelos, tendões, pele, penas, seda, leite, queijo, sementes e nozes, enzimas), e estruturas genéticas.

78% do ar é composto por gás nitrogênio, mas a maioria dos organismos não podem utilizá-lo nesta forma. O nitrogênio em seu estado gasoso pode converter-se em formas utilizáveis (nitratos, nitritos e amônia) por processos especiais que necessitam de energia. Por exemplo, os processos industriais usam combustíveis para converter o gás nitrogênio para fertilizantes nitrogenados para fazendas. A energia nos relâmpagos converte o nitrogênio em nitratos na chuva. As plantas, algas e bactérias que podem fazer isto são chamadas fixadoras de nitrogênio. Algumas plantas e árvores possuem nódulos que fixam o nitrogênio usando açúcar que é transportado desde as folhas como fonte de energia. As algas azul-esverdeadas podem fixar o nitrogênio usando a luz solar. Algumas bactérias podem fixar o nitrogênio usando matéria orgânica como fonte de energia.

A Figura 4 expõe com mais detalhes a circularidade dos fluxos de nutrientes e os tipos de microrganismos exigidos para troca básica entre os organismos e o ambiente. O nitrogênio do protoplasma é decomposto de formas orgânicas para inorgânicas por uma série de bactérias de compositores, cada uma delas especializadas em uma parte específica do ciclo. Parte do nitrogênio transforma-se em amônia e nitrato, as formas mais rapidamente utilizadas pelas plantas verdes. A atmosfera é composta de aproximadamente 78% de nitrogênio, é o maior reservatório e a válvula de segurança do sistema. O nitrogênio está continuamente penetrando na atmosfera pela ação de bactérias denitrificantes, e sempre voltando ao ciclo por meio da ação de microrganismos fixadores de nitrogênio (biofixação), bem como pela ação de faíscas e outras fixações físicas.

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As etapas, das proteínas até os nitratos, fornecem energia para o organismo pela completa degradação, ao passo que as etapas de retorno exigem energia de outras fontes, tais como matéria orgânica ou luz solar. Por exemplo, as bactérias quimiossintetizantes Nitrossomonas (que converte amônia em nitrito) e Nitrobacter (que converte nitrito em nitrato) obtém energia da degradação da matéria orgânica, ao passo que as bactérias denitrificantes e fixadoras de nitrogênio requerem energia de outras fontes para completar a suas respectivas transformações.

FIGURA 4 – CIRCULAÇÃO DO NITROÊNIO ENTRE ORGANISMOS E O AMBIENTE, APRESENTANDO OS MICRORGANISMOS RESPONSÁVEIS POR ETAPAS-CHAVE

FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 145)

Existe também um ciclo curto, mas importante, do nitrogênio na biosfera viva, na qual os organismos heterotróficos degradam as proteínas por meio de enzimas e excretam o nitrogênio incidente sobre a forma de ureia, ácido úrico ou amônia. As bactérias especializadas adquirem energia para seu sustento oxidando amônio para nitrito e o nitrito para nitrato. Todas as três formas (amônia, nitrito e nitrato) podem ser usadas como fontes básicas de nitrogênio pelas plantas. As plantas que utilizam o nitrato precisam produzir enzimas para convertê-las de volta em amônia, pois, do ponto de vista das plantas, o nitrato é uma fonte mais cara em termos de energia do que o amônio. Dessa forma, a maioria das plantas utilizará preferencialmente a amônia quando esse estiver disponível.

No oceano, a fixação de nitrogênio pela bactéria verde Trichodesmium é limitada pelo ferro. Como resultado, a fixação de nitrogênio é sazonal e controlada pelo padrão de queda de partículas de poeira provenientes dos desertos do Saara e de Gobi sobre o mar (e das ressurgências ou fontes costeiras).

A fixação de nitrogênio por cianobactérias pode ocorrer em formas de vida livre ou em formas simbióticas com fungos, como em certos líquens, musgos, samambaias, e ao menos com uma planta com sementes. As frondes

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das samambaias aquáticas flutuantes Azolla contêm pequenos poros preenchidos com Anabaena simbiótica, que fixa ativamente o nitrogênio. Por séculos, essas samambaias desempenharam um papel importante no cultivo de arroz inundado no Oriente. Antes do plantio das plântulas de arroz os campos inundados das plantações são cobertos por samambaias aquáticos que fixam nitrogênio suficiente para prover o cultivo de arroz enquanto este matura.

A chave para biofixação é a enzima nitrogenase, que catalisa a quebra de N₂ (Figura 4). Essa enzima também pode reduzir acetileno a etileno e, assim, fornece uma maneira conveniente de medir a fixação de nitrogênio em nódulos, solos, a água ou qualquer lugar suspeito de estar ocorrendo a fixação. O método de redução de acetileno, em conjunto com uso de traçador isotópico ¥¹⁵N, revelou que a capacidade de fixar nitrogênio é bastante difundida entre os microrganismos fotossintetizantes, quimiossintetizantes e heterotróficos. Existe até evidências de que os microrganismos crescem em folhas e epífitas em florestas tropicais úmidas, fixando apreciáveis quantidades de nitrogênio atmosférico, e parte disso poderia ser utilizada pelas próprias árvores. Em resumo, há indícios de que a fixação biológica de nitrogênio caminhe tanto para o extrato autotrófico como heterotrófico do ecossistema, e tanto nas zonas aeróbicas como nas anaeróbicas dos solos e sedimentos aquáticos.

A fixação de nitrogênio é um processo particularmente caro em termos de energia, pois é necessária muita energia para quebrar a tripla ligação molecular de N₂ (N≡N) de forma que possa ser convertida (com adição do hidrogênio da água) em duas moléculas de amônia (NH₃). Para biofixação por bactérias do nódulo de leguminosas são necessárias em torno de 10 g de glicose (cerca de 40 kcal), proveniente de fotossintato da planta, para fixar 1 g de nitrogênio (10% de eficiência). Os fixadores de nitrogênio de vida livre são menos eficientes e podem requerer até 10 g de glicose para fixar 1 g de nitrogênio (1% de eficiência). De modo semelhante, é necessário o dispêndio de muita energia de combustíveis fósseis na fixação industrial, motivo pelo qual os fertilizantes nitrogenados, comparado em peso, é mais caro que a maioria dos outros fertilizantes.

Em resumo, somente os procariotes (microrganismos primitivos) podem converter biologicamente o gás nitrogênio inútil em formas de nitrogênio exigidas para construir e manter células vivas. Quando esses microrganismos formam parcerias mutuamente benéficas com plantas superiores, aumenta muito a fixação de nitrogênio. A planta fornece um ambiente estável (os nódulos da raiz ou uma cavidade na folha), que protege os micróbios do excesso de O₂ (que inibe a fixação de N₂) e os supre com energia de alta qualidade. Em troca, a planta obtém o suprimento de nitrogênio fixado prontamente assimilável. Essa cooperação para benefício mútuo (uma estratégia de sobrevivência muito comum nos sistemas naturais) poderia ser imitada pelos sistemas feitos pelo homem. Os fixadores de nitrogênio trabalham com mais intensidade quando o suprimento de nitrogênio no seu ambiente é baixo; adicionar fertilizante nitrogenado à plantação de leguminosas encerra a biofixação.

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4.3.1 Amonificação

Inicialmente, o nitrogênio reduzido (orgânico) é encontrado nas proteí-nas. As plantas obtêm nitrogênio do solo, ou como amônia ou como nitrato, que elas devem então reduzir para uma forma orgânica. Deste ponto, o primeiro pas-so no ciclo do nitrogênio é a amonificação. A amonificação envolve a decompo-sição de proteínas em seus componentes aminoácidos por hidrólise e a oxidação do carbono naqueles aminoácidos. Isso resulta na produção de amônia (NH₃). A amonificação é executada por todos os organismos. Embora o carbono seja oxida-do, liberando energia, o átomo de nitrogênio propriamente dito não é oxidado, e assim sua energia potencial não muda durante a amonificação.

4.3.2 A nitrificação e a denitrificação

A nitrificação envolve a oxidação do nitrogênio, primeiro de amônia para nitrito (NO₂⁻), depois de nitrito para nitrato (NO₃⁻), durante o qual os átomos de nitrogênio são destituídos de seis elétrons, e em seguida de mais dois de seus elétrons. Estes passos de oxidação liberam muito da energia química potencial do nitrogênio orgânico. Cada passo é executado somente por bactérias especializadas: NH₃ → NO₂⁻ por Nitrosomonas no solo e por Nitrosococcus nos sistemas marinhos; NO₂⁻ → NO₃⁻ por Nitrobacter no solo e Nitrococcus nos oceanos. A via total para a nitrificação é:

NH3 NO2- NO3-

Devido a ambas as partes da nitrificação serem oxidações, elas podem ocorrer somente na presença de agentes oxidantes poderosos, tais como o oxigênio molecular que podem agir como receptores de elétrons. Contudo, em solos e sedimentos anaeróbicos alagados, em alguns fundos de água, deplecionados de oxigênio, o nitrato e o nitrito estão mais oxidados do que o ambiente circundante, e eles próprios podem agir como receptores de elétrons (oxidantes). Sob tais condições, as reações de redução são termodinamicamente favoráveis, e o nitrogênio pode ser reduzido a óxido nítrico (NO):

NO₃⁻ → NO₂⁻ → NO

Esta reação, chamada de denitrificação, é executada por bactérias como as Pseudomonas denitraficans. A denitrificação é importante para a decomposição de matéria orgânica em solos e sedimentos deplecionados de oxigênio, mas ela também resulta na perda de nitrogênio do solo porque alguns óxidos nítricos escapam como gás. Reações químicas adicionais sobre condições redutores anaeróbias no solo e na água podem produzir nitrogênio molecular, com a consequente perda de nitrogênio da circulação biológica geral:

NO → N₂O → N₂

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A denitrificação pode ser uma grande causa da baixa disponibilidade do nitrogênio em sistemas marinhos. Quando restos orgânicos de plantas e animais afundam para as profundezas dos oceanos, a sua oxidação por bactérias em águas profundas e sedimentos do fundo frequentemente é executada anaerobicamente, usando o nitrato como oxidante. Isso resulta na conversão de nitrato em nitrito nos gases dissolvidos NO e N₂, que não podem ser utilizados pelas algas.

4.3.3 A Fixação de nitrogênio

A perda de nitrogênio prontamente disponível para os ecossistemas por denitrificação é contrabalançada pela fixação de nitrogênio. Essa redução assimilativa de nitrogênio é executada por bactérias tais como Azotobacter, que é uma espécie de vida livre; Rhizobium, que ocorre em associação simbiótica com as raízes de algumas leguminosas (membros da família das ervilhas) e de outras plantas; e cianobactérias. A enzima responsável pela fixação de nitrogênio por estes microrganismos (nitrogenase) é desativada pelo oxigênio e funciona eficientemente somente sob concentrações extremamente baixas de oxigênio. Isso explica por que as bactérias Azotobacter, vivendo livremente no solo, apresentam somente uma pequena fração da capacidade fixadora de nitrogênio das bactérias Rhizobium, que são sequestradas nos núcleos relativamente anóxicos dos nódulos radiculares. Nestes nódulos, as células radiculares infectadas por Rhizobium formam estruturas limitadas por membranas chamadas de simbiossomas, dentro das quais as bactérias são mantidas. O oxigênio dentro de um simbiossomas é mantido num nível bem baixo, de modo a não interferir na atividade da nitrogenase. Esse nível de oxigênio limitaria severamente a respiração das células das raízes das plantas, mas é adequado para respiração de Rhizobium. Embora os simbiossomas contenham pouco oxigênio livre, eles de fato têm um suprimento abundante ligado a um tipo especial de hemoglobina. Esta assim chamada hemoglobina de leguminosas tem uma alta afinidade por oxigênio e, portanto, mantém a concentração de oxigênio livre bem baixa enquanto proporciona um contínuo suprimento para respiração.

A fixação de nitrogênio prossegue pela redução do nitrogênio e, portanto, demanda energia, embora não mais do que a conversão de uma quantidade equivalente de nitrato à amônia pelas plantas. A redução de um átomo de nitrogênio molecular em amônia demanda aproximadamente a quantidade de energia liberada pela oxidação de um átomo de carbono orgânico em dióxido de carbono. Os microrganismos fixadores de nitrogênio obtêm a energia e o poder redutor que eles precisam para reduzir o N₂ à NH₃ oxidando açúcares ou outros compostos orgânicos. As bactérias de vida livre precisam obter essas fontes pela metabolização de detritos orgânicos no solo, em sedimentos ou na coluna de água. Suprimentos mais abundantes de energia estão disponíveis para as bactérias Rhizobium que entram em relações simbióticas com plantas, que lhes proporcionam o malato, um carboidrato de quatro carbonos produzido como um produto final da glicose.

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Numa escala global, a fixação do nitrogênio equilibra aproximadamente a produção de N₂ por denitrificação. Estes fluxos têm uma quantidade de cerca de 2% do ciclo total do nitrogênio através do ecossistema. Numa escala local, a fixação de nitrogênio pode assumir uma importância muito maior, especialmente em habitats pobres e nitrogênio. Quando a terra é primeiro exposta à colonização pelas plantas (como, por exemplo, áreas deixadas nuas por glaciares que retrocedem ou fluxos de lava recém-formados) as espécies com capacidades fixadoras de nitrogênio dominam a vegetação colonizadora.

A Figura 5 mostra o ciclo do nitrogênio em um ecossistema terrestre, de acordo com símbolos da linguagem de compartimentos e fluxo de energia de H. T. Odum. Iniciando pelos organismos fixadores de nitrogênio, o nitrogênio passa às plantas, e logo para os animais, seguindo a cadeia alimentar. Nas plantas e nos animais, o nitrogênio se encontra em forma de compostos orgânicos como as proteínas.

FIGURA 5 – DIAGRAMA DO CICLO DO NITROGENIO PARA UM ECOSSISTEMA TERRESTRE (“M” REPRESENTA OS MICRORGANISMOS)

FONTE: Adaptada de Odum et al. (1987)

O nitrogênio retorna para o solo e a água em forma de dejetos animais e pela decomposição de plantas e animais. Várias substâncias de dejetos que contém nitrogênio, como a ureia na urina, são convertidas por bactéria em amônia, nitritos e nitratos; estes são usados novamente pelas plantas para fechar o ciclo. Alguns microrganismos devolvem o nitrogênio à atmosfera como gás nitrogênio. Isto se chama desnitrificação.

É possível projetar geneticamente a formação de nódulos em milho e em outros cultivos de grãos, reduzindo a necessidade de fertilizantes minerais nitrogenados e a poluição resultante, pois esta tende a escoar mais que o nitrogênio fixado organicamente. Várias empresas comerciais de genoma estão trabalhando

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na inclusão de genes da fixação de nitrogênio no milho. Entretanto, haveria um custo para isso, o que reduziria a produtividade, pois parte da energia utilizada para a produção primária, que de outro modo iria para a produção de grãos, seria desviada para sustentar os nódulos, conforme observado anteriormente.

Além disso, alguns efeitos prejudiciais do excesso do nitrogênio têm sido noticiados ao longo das últimas décadas. A produção e utilização de fertilizantes nos cultivos de leguminosas, e a queima de combustíveis fósseis depositam, em escala mundial, aproximadamente 140 ton./ano de nitrogênio novo no solo, na água e no ar (quantidade quase igual as estimativas de nitrogênio fixado de forma natural). O esgoto humano e os excrementos de animais domésticos contribuem com, talvez, a metade desse valor. Muito pouco dessas entradas são reciclados, pois elas escapam para o solo ou cursos de água, ou são misturadas a metais pesados e outras toxinas.

A maioria dos ecossistemas naturais e a maioria das espécies nativas estão adaptadas aos ambientes com baixos teores de nutrientes. O enriquecimento com nitrogênio e outros nutrientes abre as portas para espécies oportunistas do tipo “daninhas”, que estão adaptadas às condições de altos teores de nutrientes. Por exemplo, nos campos naturais em Minnesota e na Califórnia, que tem sido enriquecidos com nitrogênio, quase todas as espécies de plantas nativas foram substituídas por espécies de ervas daninhas exóticas, resultando em biodiversidade reduzida (TILMAN, 1987; 1988). Baseados em extensas evidências de campo, Tilman et al. (1997) previram que a aplicação de nitrogênio provavelmente afetaria os processos do ecossistema. Aplicações anuais de nitrogênio em fertilizantes e esgotos municipais, bem como em comunidades de campo abandonados em Ohio também reduziram significativamente a diversidade vegetal, se comparada aos lotes de controle em bases de longo prazo (BREWER et al., 1994).

Qualquer coisa que seja perniciosa para os ecossistemas naturais eventualmente também se torna prejudicial para os humanos, o que muitas vezes é o caso. O excesso de componentes nitrogenados na água de abastecimento, na comida, e no ar põe a saúde humana em risco. O excesso de nitrato na água de abastecimento também pode ser causado por leguminosas exóticas: por exemplo, a introdução da leguminosa acácia-negra (Leucaena leucocephala), proveniente das Filipinas, após a Segunda Guerra Mundial, envenenou as águas subterrâneas de boa parte de Guam. Em resumo, o enriquecimento por nitrogênio vem reduzindo a biodiversidade e aumentando o número de pragas e doenças no mundo, além de afetar de maneira diversa saúde humana.

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TÓPICO 1 — CICLOS BIOGEOQUÍMICOS

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4.4 O CICLO DO FÓSFORO

Substâncias químicas (nutrientes) são também necessárias para os depósitos e processos de um ecossistema. Um dos nutrientes mais importantes para a construção de organismos é o fósforo. Geralmente o fósforo é mais escasso que outros nutrientes, tais como o nitrogênio e o potássio. Se o sistema florestal não reciclasse o fósforo, este poderia ficar tão escasso, que limitaria o crescimento das plantas da floresta. Da mesma forma, no ambiente marinho a reciclagem do fósforo via ação animal tem importância relativa, mas não preponderante, como veremos a seguir.

O ciclo do fósforo é quimicamente descomplicado e ocorre em menor número de formas químicas. Os ecólogos têm estudado intensamente o papel do fósforo nos ecossistemas porque os organismos demandam este elemento num nível relativamente alto (embora somente cerca de 1/10 daquele do nitrogênio). O fósforo é um grande constituinte dos ácidos nucleicos, das membranas celulares, dos sistemas de transferência de energia, dos ossos e dos dentes. Acredita-se que o fósforo limita a produtividade vegetal em muitos habitats aquáticos. Os influxos de fósforo em muitos rios e lagos na forma de esgoto escoamento superficial de terras cultivadas fertilizadas pode artificialmente estimular a produção em habitats aquáticos, que podem perturbar o equilíbrio dos ecossistemas naturais e alterar a qualidade destes habitats. A poluição por detergentes portadores de fósforo foi um grande contribuinte para este problema até que detergentes alternativos livros de fósforo fossem desenvolvidos.

O ciclo do fósforo tem menos passos do que o ciclo do nitrogênio porque, exceto em muitas poucas transformações microbianas, o fósforo não passa por reações de oxirredução no seu ciclo através dos ecossistemas. As plantas assimilam fósforo como íons fosfato (PO₄³⁻) diretamente do solo ou da água eu incorporam diretamente em compostos orgânicos diversos. Os animais eliminam o excesso de fósforo de suas dietas através da excreção de sais de fosfato pela urina; bactérias fosfatizadoras também convertem o fósforo de nitritos em íons fosfato. O fósforo não entra na atmosfera sob qualquer forma que não seja poeira, e assim o ciclo do fósforo envolve somente solo e compartimentos aquáticos do ecossistema.

A acidez afeta a disponibilidade de fósforo para as plantas. Em solos ácidos o fósforo se liga fortemente a partículas de argila e forma compostos relativamente insolúveis com o ferro e alumínio. Em solos básicos, ele forma outros compostos insolúveis (por exemplo, com calcário). Quando tanto o cálcio quanto o ferro ou alumínio estão presentes sob condições aeróbicas, a concentração mais alta de fosfato dissolvido (isto é, a maior disponibilidade de fósforo) ocorre num pH entre 6 e 7.

Em sistemas aquáticos bem oxigenados, o fósforo prontamente forma compostos insolúveis com ferro ou cálcio e se precipita na coluna de água. Assim, sedimentos marinhos e de água doce agem como repositórios de fósforo, continuamente removendo fósforo precipitado a partir da circulação rápida no

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ecossistema. Os compostos fosfóricos prontamente se dissolvem e entram na coluna de água somente em sedimentos aquáticos deplecionados de oxigênio e em águas de fundo. Sob tais condições, o ferro tende a formar sulfetos solúveis em vez de compostos fosfatados insolúveis.

Como mostrado na Figura 6, o fósforo, um componente necessário do protoplasma, tende a circular com componentes orgânicos na forma de fosfato (PO₄), elemento que é novamente disponibilizado para as plantas. Entretanto, o grande depósito de fósforo não é o ar, mas os depósitos minerais de apatita formados em épocas geológicas passadas (isto é, na litosfera). A poeira atmosférica e aerossóis devolvem, por ano, 5 × 10¹² g de fósforo (não fosfato) ao ambiente terrestre, mas o fosfato volta sempre para o mar, onde parte dele é depositado nos sedimentos rasos e parte se perde nos sedimentos profundos.

FIGURA 6 – DIAGRAMA DO MODELO DO CICLO DO FÓSFORO

FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 151)

As aves marinhas têm papel limitado na devolução de fósforo para o ciclo (observado através depósitos de guano localizados na costa do Peru). Essa transferência de fósforo e outros materiais do mar para o continente por intermédio das aves é contínua (provavelmente na mesma taxa que ocorria no passado), mas esses depósitos de guano têm sido explorados. Embora ninhos de aves em todo lugar produzam concentrações locais de fosfato de ácido úrico, a importância global é limitada. Hoje, resgatamos fosfato das antigas jazidas fossilíferas ricas em ossos, localizadas na Flórida e na Rússia.

Infelizmente, as atividades humanas parecem acelerar a taxa de perda de fósforo, o que diminui esse ciclo. Embora peixes marinhos sejam capturados em abundância, estima-se que apenas cerca de 60.000 toneladas de fósforo por ano retornem ao ciclo dessa maneira, comparadas com um ou dois milhões de toneladas de fosfato que são exploradas e usadas como fertilizante (grande parte é lavada pelas chuvas e perdida). Não existe razão para a preocupação

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imediata com o suprimento para o uso do homem, pois as reservas conhecidas de fosfatos são enormes. No entanto, a mineração e o processamento de fosfato para fertilizantes criam graves problemas de poluição local, como evidenciado na área da baía de Tampa, na Flórida, onde existem grandes depósitos.

Walsh e Steidinger (2001) sugeriram que a mineração de fosfato é, provavelmente, parte da causa das marés vermelhas na Flórida; seria outro fator a poeira do Saara, que fornece ferro para fixação Marinha de N2. A hipótese de Walsh e Steidinger (2001) é que essa poeira do Saara atinge regularmente o Golfo do México, trazendo ferro, o que estimula a floração de Trichodesmium. O nitrogênio fixado dessa forma, mais o fosfato dos depósitos da Flórida, estimulam a floração geral do fitoplâncton. Em seguida, o zooplâncton devora todo o fitoplâncton não tóxico, deixando uma maré vermelha residual de Karenia brevis, que é tóxica. Além disso, o despejo no solo de água servida e esgoto é atualmente tão comum que está se tornando uma nova forma de poluição. O excesso de fosfato dissolvido nos sistemas aquáticos resultantes da crescente entrada por escoamento de materiais urbano industriais e agrícolas é a preocupação do presente. Em última instância, o fósforo terá de ser reciclado em grande escala para evitar falta de alimentos.

De todos os macronutrientes (elementos vitais exigidos em grandes quantidades para vida), o fósforo é o mais escasso em termos de abundância relativa nos depósitos disponíveis na superfície da Terra. Fluxos e depósitos que contém nutrientes ricos em fósforo (P) em um ambiente de floresta estão incluídos na Figura 7. O diagrama mostra a chuva e as rochas como fontes externas de fósforo. Diagramas parecidos podem ser desenhados para cada substância química utilizada nos processos de produção e consumo, tais como o carbono e o oxigênio. Em resumo, os diagramas simbólicos são uma forma de representar os fluxos dentro dos ecossistemas incluindo energia, água e fósforo.

FIGURA 7 – DIAGRAMA DO CICLO DO FÓSFORO PARA O ECOSSISTEMA FLORESTAL (VALORES EM GRAMAS/M2/ANO)

FONTE: Adaptada de Odum et al. (1987)

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O fósforo está presente como fosfatos inorgânicos que as plantas usam para produzir compostos orgânicos necessários para a vida. O fósforo nestes compostos, participa da biomassa que regressa a formas inorgânicas mediante os consumidores, quando eles usam a biomassa como alimento. O fósforo inorgânico liberado se torna parte do depósito de nutrientes no solo. Assim, o fósforo se move em um ciclo como mostra a Figura 7. Parte flui para fora do sistema com as águas que saem pela superfície do solo ou percolam para o lençol freático. Como dito anteriormente, o fósforo não tem fase gasosa em seu ciclo.

Finalmente, a interação de nitrogênio fósforo merece especial atenção. A razão N/P na biomassa média é de cerca de 16 para 1 e, em cursos da água de rios, cerca de 28 para 1. Schindler (1977) relatou experimentos nos quais fertilizantes com razões N/P diferentes foram acrescentadas em um lago. Quando a razão N/P foi reduzida para 5, as cianobactérias fixadoras de nitrogênio dominaram o fitoplâncton e fixaram nitrogênio suficiente para aumentar a razão para valores encontrados em vários lagos naturais. Schindler (1977) apresentou a hipótese de que os ecossistemas de lagos desenvolveram mecanismos naturais para compensar as deficiências em nitrogênio e carbono, mas não a deficiência em fósforo, pois este não apresenta fase gasosa. Assim a produção primária em sistemas de água doce está frequentemente correlacionada com o fósforo disponível.

4.5 O CICLO DO ENXOFRE

O enxofre existe em muitas formas oxidadas e reduzidas. O enxofre é a parte de dois aminoácidos (cisteína e metionina) e é por isso demandado pelas plantas e animais. Todavia, a importância do enxofre no ecossistema vai muito além disso. Como o nitrogênio, o enxofre existe em muitas formas reduzidas e oxidadas, e assim segue vias químicas complexas e afeta o ciclo de outros elementos.

Assim como o nitrato e o fosfato, o sulfato (SO₄) é a principal forma disponível biologicamente que é reduzida pelos autótrofos e incorporada às proteínas, sendo enxofre um componente essencial de certos aminoácidos. A forma mais oxidada do enxofre é o sulfato (SO₄²⁻); as formas mais reduzidas são o sulfeto de hidrogênio (H₂S) e as formas orgânicas de enxofre, como aquelas encontradas nos aminoácidos. Sob condições aeróbicas, a redução assimilativa de enxofre consumidora de energia (SO₄²⁻ → S orgânico) equilibra a oxidação de enxofre orgânico de volta a sulfato, que ocorre ou diretamente ou com o sulfeto (SO₃² ) como um passo intermediário. Esta oxidação ocorre quando os animais excretam o excesso de enxofre orgânico de sua dieta e quando os microrganismos decompõem detritos vegetais e animais.

Sob condições anaeróbicas, como aquelas em sedimentos alagados, sulfatos, como nitratos, podem funcionar como oxidantes. Em tais ambientes redutores, as bactérias de Desulfovibrio e Desulfomonas podem usar a redução de sulfato energeticamente favorável para oxidar o carbono orgânico. O acoplamento destas reações disponibiliza alguma energia para os organismos. O enxofre reduzido pode então ser usado por bactérias fotossintetizadoras para

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assimilar carbono pelas vias análogas a fotossíntese nas plantas verdes. Nesta, as reações o enxofre assume o lugar do átomo de oxigênio na água como um doador de elétrons. Em consequência, o enxofre elemental (S) se acumula, a menos que os sedimentos estejam expostos à aeração o à água oxigenada, em cujo ponto o enxofre pode ser oxidado ainda mais por bactérias químioautotróficas aeróbicas, como Thiobacillus, para sulfeto e sulfato.

O destino do enxofre reduzido produzido sob condições anaeróbicas depende da disponibilidade de íons positivos. Frequentemente, o sulfeto de hidrogênio (H₂S) se forma; ele escapa de sedimentos rasos e solos lodosos como um gás, tendo o cheiro característico de ovos podres. Condições anaeróbicas geralmente favorecem a redução de íons férrico (Fe³⁺) em íon ferroso (Fe²+), que pode se combinar com íons sulfeto para formar sulfeto de ferro (FeS). Por essa razão, os sulfetos estão comumente associados com carvão e depósitos de óleo. Quando estes materiais são expostos à atmosfera em rejeitos de minas ou queimados para energia, o enxofre reduzido se oxida (com ajuda de bactérias Thiobacillus em rejeitos de minas) em sulfato. Esse enxofre oxidado se combina com água para reduzir o ácido sulfúrico (H₂SO₄), que leva a chuva ácida e à drenagem ácida das minas.

O enxofre não é mais requerido pelo ecossistema do que o nitrogênio e fósforo, assim como não é tão limitante para o crescimento de plantas e animais. Apesar disso, o ciclo do enxofre é uma das peças-chave nos padrões gerais de produção e decomposição. Por exemplo, quando sulfetos de ferro são formados nos sedimentos, o fósforo é convertido de modo insolúvel para solúvel, como descrito na Figura 3 e, dessa maneira, entra nos depósitos disponíveis para os organismos vivos. Essa é uma ilustração de como o ciclo de um nutriente regula o ciclo do outro. A recuperação do fósforo como parte do ciclo do enxofre é mais evidenciada nos sedimentos anaeróbicos das zonas alagadas, que também são locais importantes para a reciclagem do nitrogênio e carbono.

A Figura 8 enfatiza o papel-chave desempenhado pelas bactérias de enxofre especializadas, que funcionam como uma “equipe de revezamento” na ciclagem do enxofre no solo, na água doce e nos brejos. Os processos conduzidos via micróbios em zonas anaeróbicas profundas em solos e sedimentos resultam dos movimentos ascendentes de gases de sulfeto de hidrogênio (H₂S) em ecossistemas terrestres e pantanosos. A decomposição das proteínas também leva a produção de sulfeto de hidrogênio. Uma vez na atmosfera, essa fase gasosa é convertida em outras formas principalmente dióxido de enxofre (SO₂), sulfato (SO₄), dióxido de carbono (CO₂) e aerossóis de enxofre (minúsculas partículas flutuantes de SO₄). Os aerossóis de enxofre, diferentemente do CO₂, refletem a luz do sol de volta para o céu, contribuindo para o resfriamento global e para a chuva ácida.

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FIGURA 8 – CICLO DO ENXOFRE EM AMBIENTES AQUÁTICOS, COM ÊNFASE NO PAPEL DOS MICRORGANISMOS

FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 152)

A etapa 1 é a produção primária das plantas. Outros organismos, a maioria microrganismos especializados, conduzem os passos 2 até 7: 2 = decomposição por microrganismos heterotróficos; 3 = excreção animal; 4 e 5 = bactérias de enxofre incolores, verdes e púrpuras; 6 = bactérias anaeróbicas redutoras de enxofre, Desulfovibrio; e 7 = bactérias aeróbicas sulfeto-oxidantes Thiobacillus. O passo 8 representa a conversão de fósforo de uma forma indisponível para uma forma disponível, quando os sulfuretos de ferro são formados, ilustrando como a ciclagem de um elemento vital pode afetar o outro.

Ambos os ciclos, de nitrogênio e enxofre, vêm sendo cada vez mais afetados pela poluição industrial do ar. Os óxidos gasosos de nitrogênio (N₂O e NO₂) e enxofre (SO₂), diferentes de nitratos e sulfatos, são tóxicos em diversos graus. Normalmente, eles são apenas etapas temporárias em seus respectivos ciclos (na maioria dos ambientes estão presentes em concentrações muito baixas). A queima de combustível fóssil, entretanto, aumentou muito a concentração desses óxidos voláteis no ar, em especial nas áreas urbanas e nos arredores de usinas termoelétricas, a ponto de afetar de modo prejudicial importantes componentes bióticos e processos do ecossistema. Quando plantas, peixes, aves ou micróbios são envenenados, os homens também são afetados. Esses óxidos constituem cerca de 1/3 dos poluentes atmosféricos industriais liberados no ar dos Estados Unidos. A aprovação da “Lei do Ar Limpo”, lei federal norte americana (Clean Air Act de 1970, aperfeiçoada em 1990), que estreitou os padrões de emissão, apenas reduziu o levemente os volumes.

As emissões pela queima de carvão e escapamento de automóveis são as principais fontes de SO₂ e SO₄ e, ao lado de outras combustões industriais, são fontes importantes de formas venenosas de nitrogênio. O dióxido de enxofre é prejudicial a fotossíntese, como foi descoberto no começo da década de 1950, quando verduras, árvores frutíferas e florestas apresentaram sinais de estresse na Bahia de Los Angeles. A destruição da vegetação nos arredores de fundições de

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cobre é, em grande parte, causada pelo SO₂. Além disso, tanto os óxidos de enxofre como os óxidos nítricos interagem com o vapor da água para produzir gotículas diluídas dos ácidos sulfúrico e nitroso (H₂SO₄ e H₂NO₃ respectivamente) que caem em forma de chuva ácida, em um desenvolvimento alarmante (LIKENS; BORMANN, 1974a; LIKENS et al., 1996; LIKENS, 2001a).

A chuva ácida tem maior impacto sobre lagos ou córregos, e também sobre solos já ácidos que carecem de tamponadores de pH (como carbonatos, cálcio, sais e outras bases). O aumento da acidez (redução do pH) em alguns lagos de Adirondack tornou os incapazes de manter peixes em suas águas. A chuva ácida também se tornou um problema na Escandinávia e em outras partes do norte da Europa. De várias maneiras, a construção de alta chaminés para usinas termoelétricas a base de queima de carvão (para reduzir a poluição local do ar) agravou o problema, porque quanto mais os óxidos permanecem nas camadas de nuvens, mais ácido é formado. Esso é um típico exemplo de “quebra galho” de curto prazo que produz problemas sérios em longo prazo (precipitações locais transformaram-se em precipitações regionais). A solução e longo prazo é gasificar ou liquefazer o carvão eliminando dessa forma, as emissões.

Os óxidos de nitrogênio também estão ameaçando a qualidade da vida hu-mana. Eles irritam as membranas respiratórias de animais superiores e dos huma-nos. Além disso, reações químicas com os outros poluentes produzem sinergismo (efeito total da interação excede a soma dos efeitos de cada substância individual-mente), o que aumenta o perigo. Por exemplo, na presença de radiação ultravioleta na luz do Sol, o NO₂ reage com hidrocarbonetos não queimados (emitidos em gran-de quantidade pelos automóveis) para produzir os smog fotoquímico, que, além de fazer os olhos lacrimejarem, pode provocar lesões pulmonares.

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Neste tópico, você aprendeu que:

• Diferente da energia, os nutrientes são retidos dentro dos ecossistemas, onde são reciclados entre os componentes físicos e bióticos. Os caminhos que os elementos seguem através dos ecossistemas dependem das transformações químicas e biológicas, as quais dependem elas próprias da química de cada elemento, das condições físicas e químicas do ambiente e dos modos pelos quais cada elemento é usado pelos vários organismos.

• O movimento de energia através dos ecossistemas segue em paralelo com as vias de vários elementos, particularmente com a do carbono, cujas transformações ou demandam ou liberam energia.

• As transformações energéticas em sistemas biológicos acontecem principal-mente no curso das reações de oxidação-redução. Um oxidante é uma subs-tância que prontamente aceita elétrons; um redutor é aquele que prontamen-te doa elétrons. Ao ser reduzido, um átomo ganha energia junto aos elétrons que ele aceita; ao ser oxidado, um átomo libera energia junto com os elétrons que ele cede.

• O ciclo de cada elemento pode ser pensado como um movimento entre compartimentos de ecossistemas. Os grandes compartimentos são organismos vivos, detritos orgânicos, formas inorgânicas prontamente disponíveis e formas orgânicas e inorgânicas indisponíveis, a maior parte aprisionada nos sentimentos.

• O ciclo da água, ou ciclo hidrológico, proporciona uma analogia física para reciclagem de elementos nos ecossistemas. A energia é consumida para evaporar a água porque as moléculas de vapor de água têm um conteúdo energético mais alto do que as moléculas de água líquida. Essa energia é liberada como calor quando o vapor de água se condensa na atmosfera para produzir precipitação.

• Todos os organismos precisam do carbono orgânico como a substância principal da vida. O carbono orgânico é também grande fonte de energia da maioria dos animais e microrganismo. O carbono troca entre formas orgâ-nicas e compartimentos inorgânicos dos ecossistemas por meio da fotossín-tese e da respiração.

• O ciclo do carbono envolve processos não biológicos, como a dissolução de dióxido de carbono em águas superficiais. O dióxido de carbono dissolvido entra num equilíbrio químico com os íons bicarbonato e carbonato, que, na presença de cálcio, tendem a se precipitar e a formar sedimentos. Acumulações espessas destes sedimentos marinhos podem se tornar rocha calcária.

RESUMO DO TÓPICO 1

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• O nitrogênio tem muitas formas reduzidas e oxidadas, e consequentemente segue muitos caminhos através dos ecossistemas. Quantitativamente, a maior parte do nitrogênio segue o ciclo que leva do nitrato, através do nitrogênio orgânico (após assimilação pelas plantas), da amônia, do nitrito (após nitrificação por bactérias) e então de volta a nitrato (após nitrificação adicional). Os últimos dois passos são executados por certas bactérias na presença de oxigênio.

• Sob condições anaeróbicas em solos e sedimentos certas bactérias podem usar nitrato no lugar de oxigênio como um agente oxidante (denitrificação): neste processo, o nitrato leva a nitrito e (por fim) ao nitrogênio molecular (n₂). Esta perda de nitrogênio do ciclo biológico geral é equilibrada pela fixação de nitrogênio por alguns microrganismos.

• As plantas assimilam o fósforo na forma de íons fosfato (po₄³⁻). A disponibilidade de fósforo varia com a acidez e o nível de oxidação do solo ou da água. A energia potencial do átomo de fósforo não muda durante a sua reciclagem através dos ecossistemas.

• O enxofre é um elemento importante em habitats anaeróbicos, onde pode servir como oxidante na forma de sulfato (so₄²⁻) ou como a gente redutor para bactérias fotoautotróficas nas formas de enxofre elemental e sulfeto.

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1 Os elementos químicos, incluindo todos os elementos essenciais para a vida, diferentemente da energia, tendem a circular na biosfera em caminhos característicos permanecendo dentro do ecossistema, onde continuamente circulam entre os organismos e o ambiente físico. Esses caminhos são conhecidos como ciclos biogeoquímicos. Sobre a circulações e os movimentos dos elementos nos ecossistemas, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Os elementos circulam rapidamente entre determinados comparti-mentos de ecossistemas e muito mais lentamente entre outros.

b) ( ) Os elementos circulam sempre com a mesma velocidade entre os compartimentos de ecossistemas.

c) ( ) O movimento dos elementos dentro e entre os compartimentos ocor-rem sem envolver energia.

d) ( ) formas orgânicas e inorgânicas dos elementos estão sempre prontamente acessíveis para os agentes de transformação.

2 Dos elementos que ocorrem na natureza, sabe se que entre 30 e 40 são exigidos pelos organismos vivos (elementos essenciais). Alguns elementos, como o carbono, hidrogênio, oxigênio e nitrogênio, são necessários em grandes quantidades; outros, em pequenos ou até minúsculas. Com base nos estudos de biogeoquímica, analise as sentenças a seguir:

I- A humanidade acelerou a circulação de muitos materiais de modo que processos autorreguladores que tendem manter a homeorese estão opri-midos.

II- Os elementos na natureza sempre estão distribuídos de forma homogênea.III- Os elementos na natureza quase nunca estão presentes na mesma

composição química em todo ecossistema.

Assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.b) ( ) Somente a sentença II está correta.c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 O nitrogênio assume muitos estados de oxidação no seu ciclo nos ecossistemas. A fonte em última instância de nitrogênio para vida está no nitrogênio molecular (N2) na atmosfera. Essa forma de nitrogênio se dissolve com alguma extensão na água, mas está ausente da rocha nativa. De acordo com o ciclo biogeoquímico do nitrogênio, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

AUTOATIVIDADE

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( ) O elemento químico nitrogênio é essencial para todas as formas de vida e seus produtos.

( ) A fixação de nitrogênio é um processo particularmente caro em termos de energia, pois é necessária muita energia para quebrar a tripla ligação molecular de N₂.

( ) A produção e utilização de fertilizantes nitrogenados vem aumentando a biodiversidade e reduzindo o número de pragas e doenças no mundo.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V – F – F.b) ( ) V – V – F.c) ( ) F – V – F.d) ( ) F – F – V.

4 Durante a segunda metade do século XX, a concentração de CO₂ na atmosfera aumentou de forma significativa, assim como outros gases de efeito estufa que refletem o calor solar de volta para a Terra. O depósito atmosférico de carbono é muito pequeno, se comparado com a quantidade de carbono presente no oceano. Disserte sobre como o carbono as atividades humanas contribuem para o aumento de CO₂ atmosférico.

5 A água proporciona o modelo físico de reciclagem de elementos no ecos-sistema. A água está envolvida quimicamente na fotossíntese, mas são a evaporação, a transpiração e a precipitação que dirigem a maior parte do movimento da água através dos ecossistemas terrestres. Neste sentido, dis-serte sobre como estes processos físicos, acoplam o movimento da água com as transformações de energia.

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UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

O ambiente físico varia amplamente ao longo da superfície da Terra. As condições de temperatura, luz, substrato, umidade, salinidade, nutrientes do solo e outros fatores moldaram as distribuições e adaptações das plantas, animais e micróbios. A Terra possui muitas zonas climáticas distintas, cujas extensões são em grande parte determinadas pela intensidade da radiação solar e pela redistribuição do calor e da umidade pelo vento e pelas correntes de água. Nas zonas climáticas, fatores geológicos, como a topografia e a composição da rocha matriz, diferenciam ainda mais o ambiente numa escala espacial mais fina.

O Tópico 2 explora alguns padrões de variação importantes no ambiente físico, que são a base da diversidade dos componentes biológicos dos ecossistemas.

A superfície da Terra, suas águas e a atmosfera sobre ela compõem uma gigantesca máquina de transformação de calor. Os padrões climáticos se originam à medida que a Terra absorve a energia da luz do Sol. Conforme sua superfície varia desde rocha nua até solo florestado, oceano aberto e lagos congelados, sua capacidade em absorver a luz solar também varia, criando desse modo um aquecimento e resfriamento diferencial.

A energia térmica absorvida pela Terra pode acabar sendo reenviada de volta para o espaço após sofrer transformações adicionais que realizam o trabalho de evaporar as águas e causar a circulação da atmosfera e dos oceanos. Todos esses fatores criaram uma grande variedade de condições físicas que, por sua vez, promoveram a diversificação dos ecossistemas.

TÓPICO 2 —

VARIAÇÕES NO AMBIENTE FÍSICO

E A CICLAGEM DE NUTRIENTES

2 PADRÕES GLOBAIS DE TEMPERATURA E PRECIPITAÇÃO

Os padrões globais de temperatura e precipitação são estabelecidos pela energia da radiação solar. O clima da terra tende a ser frio e seco na direção dos polos e quente e úmido na direção do equador terrestre. Embora existam muitas exceções a essa regra geral, o clima exibe padrões amplamente definidos. A causa fundamental da variação global no clima é a intensidade de luz do Sol no equador maior do que nas latitudes mais altas. Essa é uma simples consequência do ângulo do Sol em relação à superfície da Terra em diferentes latitudes. O Sol aquece mais a atmosfera, os oceanos e a terra quando está posicionado diretamente acima, na vertical. Um raio solar se espalha por uma área maior quando o Sol se aproxima

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do horizonte, e também viaja um caminho mais longo através da atmosfera, onde boa parte de sua energia é refletida ou absorvida pela atmosfera e reirradiada para o espaço como o calor. A posição mais alta do Sol a cada dia varia de verticalmente acima das nossas cabeças nos trópicos até próximo ao horizonte nas regiões polares; desse modo, o efeito do aquecimento do Sol diminui do equador para os polos.

Os padrões de mudança na temperatura e na precipitação são tão importantes para os sistemas biológicos como as médias de longo prazo. Os ciclos periódicos no clima seguem ciclos astronômicos: a rotação da Terra sobre seu eixo causa a periodicidade diária; a rotação da lua ao redor da Terra cria os ciclos lunares na amplitude das marés; e a rotação da Terra em torno do Sol traz a mudanças das estações.

O equador terrestre tem uma inclinação de 23,5° em relação ao caminho que a Terra segue em sua órbita em torno do Sol. Portanto, o Hemisfério Norte recebe mais energia solar do que o Hemisfério Sul durante o verão boreal e menos energia durante o inverno boreal. A variação sazonal na temperatura aumenta com a distância a partir do equador, especialmente no Hemisfério Norte, onde existe menos área de oceano para moderar as mudanças de temperatura. Nas altas latitudes do Hemisfério Norte, as médias mensais de temperatura variam cerca de 30 °C, com extremos de mais de 50 °C anualmente. Por exemplo, a 60° N (latitude), o mês mais frio em média é de -12 °C e o mês mais quente em média, 16 °C, uma diferença de 28 °C. As temperaturas médias dos meses mais quentes e mais frios nos trópicos são muito superiores, elas diferem por somente 2 °C ou 3 °C.

A inclinação do eixo da Terra também resulta numa mudança sazonal na área próxima ao equador que recebe a maior quantidade de luz solar. Esta área situa-se no equador solar, que é o paralelo de latitude localizado diretamente sobre o zênite solar. O equador solar alcança 23,5° N e em 21 de junho e 23,5° S em 21 de dezembro.

Boreal refere-se ao hemisfério norte; austral refere-se ao hemisfério sul.

INTERESSANTE

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2.1 CÉLULAS DE HADLEY

O ar aquecido se expande, torna-se menos denso, e tende a subir. À medida que o ar se aquece, sua capacidade de reter vapor de água aumenta, e a evaporação se acelera. A taxa de evaporação de uma superfície molhada quase dobra a cada aumento de 10 °C na temperatura. O calor do Sol aquece uma massa de ar nos trópicos que sobe e finalmente se espalha para o norte e para o sul nas camadas superiores da atmosfera. Este ar é substituído por ar ao nível da superfície vindo de latitudes subtropicais. A massa de ar tropical ascendente se refresca à medida que irradia o calor de volta para o espaço. No momento em que esse ar se desloca para cerca de 30° ao norte e ao sul do equador, ele já se tornou denso o suficiente para descer de volta para a superfície terrestre e se espraiar para o norte e para o sul, completando desse modo uma reciclagem de ar na atmosfera. Esse tipo de padrão de circulação é chamado de célula de Hadley. O ar quente e úmido se eleva nos trópicos, e o ar seco e frio das latitudes subtropicais se move em direção aos trópicos para substituí-lo (Figura 9). A convergência intertropical é o cinturão latitudinal no equador solar dentro do qual os ventos de superfície convergem do norte e do sul.

FIGURA 9 – O AQUECIMENTO DIFERENCIADO DA SUPERFÍCIE TERRESTRE CRIA AS CÉLULAS DE CIRCULAÇÃO ATMOSFÉRICA

FONTE: Ricklefs (2009, p. 72)

Uma célula de Hadley se forma em torno da Terra imediatamente ao norte do equador e outra ao sul, como um par de cinturões gigantes envolvendo o planeta. O ar que desse das células de Hadley tropicais desencadeia células de circulação atmosférica secundárias nas regiões temperadas, as quais circulam na direção oposta (células de Ferrel – Figura 9). A circulação de células de Ferrel em latitudes temperadas (grosso modo entre 30°- 60° ao norte e ao sul do equador) faz com que o ar suba a cerca de 60° N e 60° S, o que por sua vez leva à formação das células de circulação atmosférica polares. Toda essa circulação de ar é movida pelo aquecimento diferencial da atmosfera em relação a latitude.

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As células de circulação atmosférica se ligam umas às outras pelo ar ascendente ou descendente nas extremidades norte ou sul das células. Desse modo, o movimento diário em cada célula circulação atmosférica ajuda a desencadear a circulação das células adjacentes.

2.2 CONVERGÊNCIA INTERTROPICAL E O CINTURÃO SUBTROPICAL DE ALTA PRESSÃO

A região dentro da qual as correntes superficiais de ar dos subtrópicos norte e sul se encontram, perto do equador, e iniciam a subida sobre o aquecimento do Sol é chamada de convergência intertropical. À medida que o ar tropical carregado de umidade sobe e começa a resfriar dentro da área de convergência, a umidade se condensa para formar nuvens e precipitação. Desse modo, os trópicos são úmidos não porque exista mais água nas latitudes tropicais do que em qualquer outro lugar, mas porque a água circula mais rapidamente através da atmosfera tropical. O efeito do aquecimento do Sol faz com que a água evapore e as massas de ar aquecidas subam; o resfriamento do ar, à medida que ele sobe e se expande, causar a precipitação, porque o ar frio possui uma capacidade menor de reter água.

A massa de ar que se movimenta no alto da atmosfera para o norte e para o sul, afastando-se da convergência intertropical, já perdeu grande parte de sua água via precipitação nos trópicos. Pode ter-se resfriado, esse ar se torna mais denso e começa a descer. Essa massa descendente de ar pesado criar uma alta pressão atmosférica, razão pela qual estas regiões ao norte e ao sul do equador são conhecidas como os cinturões subtropicais de alta pressão. À medida que o ar desse e começa a se aquecer novamente nas latitudes subtropicais, sua capacidade de evaporar e reter a água aumenta. Quando o ar desce ao nível do solo e se espalha para o norte e para o sul, ele retira a umidade da Terra, criando zonas de clima árido centradas nas latitudes de cerca de 30° norte e sul do equador. Todos os grandes desertos do mundo (o Arábico, Saara, Kalahari e Namíbia, na África; ou Atacama, na América do Sul; o Mojave, Sonoran a Chihuahua, na América do Norte; e o deserto Australiano) recaem dentro dos cinturões tropicais de alta pressão.

2.3 VENTOS DE SUPERFÍCIE E SOMBRAS DE CHUVA

A rotação da Terra distorce os fluxos de superfície nas células de circulação atmosféricas porque a velocidade de rotação da Terra perto do equador é mais alta do que nas latitudes superiores. Consequentemente, os fluxos de superfície são deslocados para o oeste nos trópicos, onde o ar se move para longe do equador, e para leste nas latitudes intermediárias, onde o ar se move na direção do equador. Os padrões de vento resultantes, conhecidos como os ventos alísios e correntes de jato, respectivamente (Figura 9), ajudam a distribuir o vapor de água através da atmosfera.

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As posições das massas de terras continentais exercem um efeito secundário no padrão global de precipitação. Em uma dada a latitude qualquer, a chuva cai mais abundantemente no Hemisfério Sul porque os oceanos e lagos cobrem uma proporção maior de sua superfície (81% em comparação a 61% no Hemisfério Norte). A água se evapora mais rapidamente de superfícies expostas de água do que do solo e da vegetação. Pela mesma razão, o interior de um continente geralmente experimenta menos precipitação do que em sua área costeira, simplesmente porque se situa mais longe do principal local de evaporação de água, a superfície do oceano. Além do mais, os climas costeiros (marítimos) variam menos do que os climas interiores (continentais), porque a capacidade de armazenamento de calor das águas do oceano reduz as flutuações de temperatura. Por exemplo, as temperaturas médias mensais mais quentes e mais frias perto da costa do Pacífico dos Estados Unidos em Portland, Oregon, diferem apenas 16 °C. Mais para o interior, essa variação aumenta para 18 °C em Spokane, Washington; 26 °C em Helena, Montana; e 33 °C em Bismarck, Dakota do Norte.

Os padrões globais de ventos interagem com outros aspectos da paisagem para criar precipitação. As montanhas forçam o ar para cima, fazendo com que ele resfrie e perca a sua umidade como precipitação na porção a barlavento de uma cadeia montanhosa. À medida que o ar desse as encostas a sotavento e viaja através das terras baixas além, ele retira a umidade e cria ambientes áridos denominados sombras de chuvas. Os desertos da grande bacia do oeste dos Estados Unidos e o deserto de Gobi da Ásia situam-se em zonas extensas de sombras de chuva de extensas cadeias montanhosas.

Relativamente a um obstáculo, barlavento é o lado de onde vem o vento, o lado que encara o vento; sotavento é o lado para onde o vento vai, ou lado protegido do vento.

INTERESSANTE

3 AS CORRENTES OCEÂNICAS DISTRIBUEM O CALOR E A UMIDADE

As condições físicas dos oceanos, assim como as da atmosfera, são complexas. A variação nas condições marinhas é causada pelos ventos, que impulsionam as grandes correntes de superfície dos oceanos, e pela topografia subjacente da bacia oceânica. Além disso, as correntes profundas são estabelecidas por diferenças na densidade da água do oceano causadas por variações na temperatura e na salinidade. Em grandes bacias oceânicas, a água fria circula na direção dos trópicos ao longo das costas ocidentais dos continentes, e a água quente circula na direção das latitudes temperadas ao longo das costas orientais

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dos continentes. A corrente fria do Peru no Oceano Pacífico oriental, que se move para o norte a partir do Oceano Antártico ao longo das costas do Chile e Peru, criam ambientes frios e secos ao longo da costa oeste da América do Sul, na sombra de chuva das Montanhas Andinas, em toda a extensão até o equador. Como resultado, as costas setentrionais do Chile e do Peru possuem alguns dos desertos mais secos da Terra. Inversamente, a corrente quente do Golfo, originando-se a partir do Golfo do México, transporta um clima ameno para bem longe no norte da Europa ocidental e Ilhas Britânicas.

Qualquer movimento da água para cima no oceano é chamado de ressurgência. A ressurgência ocorre onde quer que correntes superficiais venham a divergir, como no Oceano Pacífico tropical ocidental. Quando as correntes superficiais se movem para longe uma da outra (se afastam na superfície), elas tendem a puxar água (localizada imediatamente abaixo) para cima a partir das camadas inferiores. Fortes zonas de ressurgência também se estabelecem nas costas ocidentais dos continentes onde as correntes de superfície se movem na direção do equador terrestre. Uma consequência curiosa da rotação da Terra é a deflexão dessas correntes para longe das bordas continentais, o que é auxiliado pelos ventos. À medida que essa água se move para longe dos continentes, ela é substituída por água de profundidades maiores. Como as águas profundas tendem a ser ricas em nutrientes, a zonas de ressurgência são frequentemente regiões de alta produtividade biológica. As mais famosas delas sustentam os ricos pesqueiros da Corrente de Benguela, ao longo da costa oeste da África meridional, e da corrente do Peru, ao longo da costa oeste da América do Sul.

4 VARIAÇÃO SAZONAL DO CLIMA

A variação sazonal do clima é causada pelo movimento do zênite solar. Nos trópicos, o movimento sazonal do equador solar para norte e para sul determina a sazonalidade da chuva. A convergência intertropical segue o equador solar, produzindo um cinturão móvel de precipitação. Portanto, a sazonalidade da chuva é mais pronunciada em extensos cinturões latitudinais situados a cerca de 20° ao norte e ao sul da linha do equador.

Mérida, localizada na península de Yucatán, no México, se situa a cerca de 20° ao norte do equador. A convergência intertropical alcança Mérida apenas durante os meses de verão do Hemisfério Norte, que são a estação chuvosa daquela região. Durante o inverno, a convergência intertropical se situa bem ao sul de Mérida, e o clima local passa a estar sob influência do cinturão subtropical de alta pressão. O Rio de Janeiro, na mesma latitude de Mérida, mas ao sul do equador, tem sua estação chuvosa durante o verão do Hemisfério Sul, aproximadamente seis meses depois de Mérida. Perto do equador, em Bogotá, Colômbia, a convergência intertropical está presente duas vezes por ano, no momento dos equinócios, resultando em duas estações chuvosas com picos de chuva em abril e outubro. Desse modo, à medida que as estações mudam, as regiões tropicais estão alternadamente sob a influência da convergência intertropical, que traz chuvas pesadas, e dos cinturões subtropicais de alta pressão, que trazem céus claros.

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O Panamá está situado a 10° N e, assim como Mérida, possui um inverno seco com muitos ventos e um verão úmido e chuvoso. O clima do Panamá é mais úmido no lado norte (Caribe) do istmo (a direção de onde vem os ventos alísios prevalecentes) do que no lado sul (Pacífico); as montanhas interceptam a umidade que vem do lado caribenho e produzem uma sombra de chuva. As terras baixas do Pacífico são tão secas durante os meses de inverno que a maioria das árvores perde suas folhas. Florestas ressecadas e galhos nus contrastam fortemente com a floresta mais tipicamente tropical úmida que floresce durante a estação úmida.

Mais para o norte, fora dos trópicos, os climas passam a estar sob a influência dos ventos ocidentais que sopram nas latitudes intermediárias. Nestas regiões, as temperaturas, assim como a precipitação, variam entre o inverno e o verão. Em algumas regiões temperada (em torno de 30° N), devido às condições geográficas, a estação chuvosa de concentra apenas no verão (Deserto de Chihuahua no México); em outras regiões, o inervo apresenta as maiores precipitações 9sul da Califórnia e o deserto de Mojave); e ainda há regiões que apresentam um padrão combinado de chuvas tanto no verão quanto o inverno (deserto de Sonora).

5 O CLIMA SUSTENTA FLUTUAÇÕES IRREGULARES

A maioria dos aspectos do clima parece imprevisível. Todo mundo sabe que o clima é difícil de prever com muita antecedência. Frequentemente, observamos que um determinado ano foi particularmente mais seco ou mais frio em comparação com outros. As inundações do Vale do Mississipi e a crescente intensidade dos furacões ao longo da costa leste dos Estados Unidos nos últimos anos nos alertam dos caprichos da natureza. Tais condições extremas ocorrem com pouca frequência, mas podem afetar os organismos desproporcionalmente. A rica indústria pesqueira do Peruana se desenvolve com base nos abundantes peixes das águas ricas em nutrientes da Corrente do Peru, assim como fazem algumas das maiores colônias de aves marinhas do mundo. Esta corrente marítima é uma massa de água fria que flui para o norte ao longo da costa oeste da América do Sul e finalmente se desvia para longe da costa no equador, em direção ao arquipélago de Galápagos. A norte desse ponto, águas costeiras tropicais e quentes prevalecem ao longo da costa. A cada ano, uma contracorrente quente, conhecida como El niño (“O menino” em espanhol, um nome que se refere ao menino Jesus, porque este fenômeno surge por volta da época de Natal), se move para sul ao longo da costa na direção do Peru. Em alguns anos, a contracorrente fluí com força e extensão suficientes para forçar a fria Corrente do Peru a se desviar da costa, levando com ela o suprimento alimentar de milhões de aves.

Durante os anos “normais” entre os eventos de El Niño, um vento constante sopra através do Oceano Pacífico central equatorial, vindo de uma área de alta pressão atmosférica centrada no Taiti, para uma área de baixa pressão centrada em Darwin na Austrália. Um evento El Niño parece ser desencadeado por uma reversão das áreas de pressão (a assim chamada Oscilação Sul) e dos ventos que sopram entre elas. Em consequência, as correntes equatoriais que fluem em direção ao oeste param, ou mesmo revertem. A ressurgência na costa

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da América do Sul enfraquece ou cessa, e a água quente (a corrente El Niño) se acumula ao longo da costa da América do Sul. Registros históricos da pressão atmosférica no Taiti em Darwin, e das temperaturas da superfície do mar na costa do Peru revelam pronunciados eventos ENOS (El Niño – Oscilação Sul) a intervalos irregulares de 2 a 10 anos.

Os eventos El Niño são frequentemente seguidos por La Niña, um período de fortes ventos alísios que acentuam as correntes oceânicas normais e a ressurgência, e trazem climas extremos de um tipo diferente do El Niño para boa parte do mundo. La Niña é caracterizada por chuvas fortes em muitas regiões dos trópicos, seca nas regiões temperadas do norte, e um aumento na atividade de furacões no Oceano Atlântico norte.

Os efeitos climáticos e oceanográficos de um evento ENOS se estendem por boa parte do mundo, afetando ecossistemas em áreas tão distantes como a Índia, África do Sul, Brasil e oeste do Canadá. Um evento ENOS recorde de 1982/1983 interrompeu a pesca e destruiu leitos de algas na Califórnia, gerou falhas na reprodução de aves marinhas no Oceano Pacífico central, e resultou em mortandade generalizada de corais no Panamá. A precipitação também foi dramaticamente afetada em muitos ecossistemas terrestres. Os desertos do norte do Chile, normalmente o lugar mais seco da Terra, receberam o seu primeiro registro de chuva ao longo de um século.

O evento ENOS de 1982/1983 chamou atenção do mundo para os efeitos de longo alcance das mudanças oceanográficas e climáticas em muitas partes do mundo. Por exemplo, dados do Zimbabué para o período 1970-1993 mostram variações notáveis na produção de milho. Como se poderia esperar, essas variações na produção estavam correlacionadas com variações na precipitação, porém, mais surpreendentemente, elas também estavam correlacionadas com as temperaturas da superfície do mar no Oceano Pacífico tropical oriental. Esse é um exemplo dos efeitos de longo alcance dos eventos El Niño de 1982/1983 e 1991/1992.

Durante o El Niño de 1991/1992, a precipitação foi tão alta na Grande Bacia do oeste dos Estados Unidos que o escoamento superficial praticamente dobrou o volume de água no Great Salt Lake. Isto reduziu a salinidade do lago das 100 gramas de sal por litro (g/l) usuais (cerca de três vezes a água do mar) para 50 g/l, o que causou mudanças marcantes no ecossistema do lago. A redução na salinidade permitiu que os insetos predadores se deslocassem para as partes mais rasas do lago. Os insetos comeram o “camarão-de-salina” (brine shrimp, Artemia), que se alimenta de algas e normalmente domina o ecossistema. Com as quantidades de Artemia reduzidas, as algas aumentaram dramaticamente, transformando o lago num equivalente aquático de um gramado.

Alguns dos efeitos mais impressionantes dos eventos El Niño são evidentes no arquipélago de Galápagos, cujas ilhas se distribuem pela linha do equador a cerca de 1000 km de distância da costa oeste do Equador (país). O clima de Galápagos é fortemente influenciado pela Corrente do Peru, que traz água fria e

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períodos de extrema seca às ilhas. Quando a Corrente do Peru falha durante o El Niño, a água quente invade o arquipélago, disparando uma drástica deterioração dos estoques pesqueiros de água fria locais e trazendo extraordinárias quantidade de precipitação. Assim, o El Niño leva ao colapso das populações de aves marinhas e leões marinhos que dependem da abundância de peixes. Em terra, às fortes chuvas resultam no crescimento da vegetação e na abundância de insetos e sementes para as populações de aves e répteis que dependem desses alimentos. Esta gangorra entre escassez e abundância possui consequências importantes para a dinâmica populacional evolução dos organismos no arquipélago de Galápagos.

6 CARACTERÍSTICAS TOPOGRÁFICAS E GEOLÓGICAS

Características topográficas e geológicas provocam variações locais no clima. A topografia e a geologia podem modificar o ambiente numa escala local dentro de regiões que, de outro modo, teriam clima uniforme. Em áreas montanhosas, a inclinação da terra e a sua exposição ao sol influenciam a temperatura e o teor de umidade do solo. Os solos em encostas íngremes têm boa drenagem, frequentemente causando estresse de seca para a vegetação da encosta ao mesmo tempo em que a água satura o solo nas terras baixas vizinhas. Em regiões áridas, os córregos das terras baixas e os leitos de rios sazonais podem sustentar florestas ripárias bem desenvolvidas, o que acentua a contrastante desolação do deserto circundante. No Hemisfério Norte, as encostas voltadas para o sul encaram diretamente o Sol, cujo calor e poder de ressecamento limitam a vegetação a formas arbustivas e resistentes à seca (xerófilas). As encostas adjacentes voltadas para o norte permanecem relativamente frias e úmidas e abrigam a vegetação que exige umidade (mésica).

No Hemisfério Sul: no sudeste brasileiro, por exemplo, as encostas voltadas para o norte são as que recebem maior insolação, portanto mais secas, e as voltadas para o sul, menor insolação, portanto mais úmidas.

INTERESSANTE

A temperatura do ar diminui com altitude por cerca de 6 °C a 10 °C para cada aumento de 1.000 m na elevação, dependendo da região. Essa diminuição da temperatura, que é causada pela expansão do ar nas pressões atmosféricas mais baixas em altitudes superiores, é chamada de resfriamento adiabático. Se você subir bastante, mesmo nos trópicos, encontrará temperaturas congelantes e neves eternas. Nos lugares onde a temperatura no nível do mar é em média de 30 °C, temperaturas congelantes são alcançadas a cerca de 5.000 m, ou seja, a altitude aproximada da linha de neve nas montanhas tropicais.

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É o caso do Parque Nacional de Itatiaia, no Rio de Janeiro (estado tipicamente tropical): nas Agulhas Negras, a uma altitude de 2.600 m, ocorrem no inverno, a noite temperaturas abaixo de 0 °C.

INTERESSANTE

Nas latitudes temperadas do Norte, uma queda de 6 °C de temperatura para cada 1.000 m de altitude corresponde a mesma mudança de temperatura encontrada em um aumento de 800 km na latitude. Em muitos aspectos, o clima e a vegetação das altitudes superiores lembram aqueles dos locais ao nível do mar em latitudes mais altas. Todavia, em relação a suas similaridades, os ambientes alpinos geralmente variam menos de estação para estação do que os seus correspondentes de terras baixas em altas latitudes. As temperaturas em ambientes montanhosos tropicais permanecem praticamente constantes, e algumas dessas áreas ficam livres de gelo por todo o ano, o que torna possível para muitas plantas e animais tropicais viver nos ambientes frios encontrados ali.

7 O CLIMA E A FORMAÇÃO DOS SOLOS

O clima e a rocha matriz subjacente determinam a diversificação dos solos. O clima afeta as distribuições de plantas e animais indiretamente através de sua influência no desenvolvimento do solo, que proporciona o substrato no qual as raízes das plantas crescem e muitos animais se enterram. As características do solo determinam sua capacidade para reter água e para tornar disponíveis os minerais necessários para o crescimento das plantas. Desse modo, sua avaliação fornece uma chave para o entendimento das distribuições das espécies vegetais e da produtividade das comunidades biológicas. O solo desafia a elaboração de uma simples definição, mas podemos descrevê-lo como a camada de material alterado quimicamente e biologicamente que recobre a rocha ou outros materiais inalterados na superfície terrestre. Ele inclui minerais derivados da rocha matriz, minerais modificados recém-formados no solo, matéria orgânica fornecida pelas plantas, ar e água dentro dos poros, raízes vivas de plantas, microrganismos, e os grandes vermes e artrópodes que fazem do solo sua casa.

Um corte vertical de solo demostra a ocorrência de camadas distintas em uma seção transversal, que são chamadas de horizontes. Um perfil de solo genérico, e um tanto quanto simplificado, possui quatro grandes divisões, os horizontes (O, A, B e C). O horizonte A tem duas subdivisões A₁ e A₂ (tabela 2). Cinco fatores determinam as características dos solos: clima, material parental (rocha subjacente), vegetação, topografia local e, até certo ponto, idade. Os horizontes do solo revelam uma diminuição da influência dos fatores climáticos e bióticos com o aumento da profundidade.

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TABELA 2 – PERFIL DE SOLO GENÉRICO

FONTE: Ricklefs (2009, p. 84)

Os solos existem em um estado dinâmico, modificando-se à medida que se desenvolvem sobre rochas recentemente expostas. E mesmo depois que atingem propriedades estáveis, permanecem num estado de fluxo constante. A água do solo remove algumas substâncias; outros materiais entraram no solo a partir da vegetação com a precipitação, como a poeira que se deposita, e a partir da rocha subjacente. Quando cai pouca chuva, a rocha matriz se decompõe lentamente e a produção vegetal acrescenta poucos detritos orgânicos ao solo. Desse modo, regiões áridas possuem tipicamente solos mais rasos, com o leito rochoso se estendendo próximo à superfície. Os solos podem nem mesmo chegar a se formar nos lugares onde o leito rochoso decomposto e os detritos são erodidos tão rapidamente quanto se formam.

O desenvolvimento do solo também é pequeno nos depósitos aluviais, onde as camadas de silte depositadas a cada ano pelas enchentes soterram o material mais antigo. A maioria dos solos das zonas temperadas tem profundidades intermediárias, estendendo-se a uma média de aproximadamente 1 m. Por outro lado, a formação do solo avança rapidamente nos trópicos úmidos, onde as alterações químicas da rocha matriz podem se estender a profundidades de até 100 m.

7.1 INTEMPERISMO

O intemperismo é a alteração física e química do material rochoso próximo à superfície da terra. Esta atividade ocorre onde quer que águas superficiais penetrem. O repetido congelamento e derretimento da água nas fendas quebra fisicamente a rocha em pedaços menores expõe uma grande área da sua superfície

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à ação química. Alterações químicas iniciais da rocha ocorrem quando a água dissolve alguns de seus minerais mais solúveis, especialmente o cloreto de sódio (NaCl) e o sulfato de cálcio (CaSO₄). Outros materiais, como os óxidos de titânio, alumínio, ferro e silício, se dissolvem menos prontamente.

O intemperismo do granito exemplifica alguns processos básicos da formação do solo. Os minerais responsáveis pela textura granulosa do granito (feldspato, mica e quarto) consistem em várias combinações de óxido de alumínio, ferro, silício, magnésio, cálcio e potássio, juntamente com outros compostos menos abundantes. A chave para o intemperismo está no deslocamento de certos elementos desses minerais (notavelmente o cálcio, magnésio, sódio e o potássio) por íons hidrogênio, seguido da reorganização dos óxidos remanescentes em novos minerais. Este processo químico proporciona estrutura básica do solo.

Os grãos de feldspato e mica consistem em aluminosilicatos de potássio, magnésio e ferro. Os íons hidrogênio que percolam através do granito deslocam os íons potássio e magnésio, e o ferro, o alumínio e o silício remanescentes formam materiais novos e insolúveis, principalmente partículas de argila. Essas partículas são importantes para a capacidade de retenção de água e de nutrientes dos solos. O quartzo, um tipo de sílica (SiO2), é relativamente insolúvel e, portanto, permanece mais ou menos inalterado no solo como grãos de areia. Diferentes mudanças na composição química, à medida que o granito é intemperizado a partir das rochas para o solo em diferentes regiões climáticas, mostram que eu intemperismo é mais severo sob condições tropicais de alta temperatura e precipitação.

Os íons hidrogênio os envolvidos no intemperismo vêm de duas fontes. Uma delas é o ácido carbônico que se forma quando o dióxido de carbono se dissolve na água das chuvas. Em regiões não afetadas pela poluição ácida, a concentração de íons hidrogênio na água da chuva produz um pH em torno de 5. A outra fonte de íons hidrogênio é a oxidação da matéria orgânica no próprio solo. O metabolismo de carboidratos, por exemplo, produz dióxido de carbono, e a dissociação do ácido carbônico resultante gera íons hidrogênio adicionais. Na floresta de Hubbard Book (New Hampshire) que é uma bacia hidrográfica particularmente bem estudada, esse processo é responsável por cerca de 30% dos íons hidrogênio necessários para o intemperismo do leito rochoso; o restante vem da precipitação. Nos trópicos, no entanto, as fontes internas de íons hidrogênio assume maior importância e podem levar ao intemperismo mais rápido.

7.2 A PODZOLIZAÇÃO OCORRE EM SOLOS ÁCIDOS

Sob condições amenas e temperadas de temperaturas e precipitação, os grãos de areia e partículas de argila resistem ao intemperismo e formam componentes estáveis do solo. Em solos ácidos, no entanto, as partículas de argila que retém nutrientes no solo se decompõem no horizonte A, e seus íons solúveis são transportados para baixo e depositados em horizontes inferiores. Este processo, conhecido como podzolização, reduz a fertilidade das camadas superiores do solo.

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Os solos ácidos ocorrem principalmente em regiões frias, onde árvores aciculadas dominam as florestas. A lenta decomposição microbiana da serapilheira depositada por árvores como os abetos, produzem ácidos orgânicos. Além disso, a chuva geralmente é maior do que a evaporação em regiões de podzolização. Sobre essas condições úmidas, uma vez que a água continuamente se move para baixo através do perfil do solo, pouco material formador de argila é transportado para cima a partir do leito rochoso intemperizado.

Na América do Norte, a podzolização avança ainda mais longe para dentro das florestas de abeto, na região da Nova Inglaterra, na região dos Grandes Lagos e ao longo de uma ampla faixa ao sul e oeste do Canadá.

7.3 LATERIZAÇÃO DOS SOLOS

A laterização ocorre em climas quentes e úmidos. O solo se intemperiza até grandes profundidades nos climas quentes e úmidos de muitas regiões tropicais e subtropicais. Um dos aspectos mais distintos da intemperização sob essas condições é a decomposição das partículas de argila, que resulta na lixiviação da sílica do solo fazendo com que os óxidos de ferro e de alumínio predominem no perfil do solo. Este processo é chamado de laterização, e os óxidos de ferro e alumínio dão aos solos lateríticos sua coloração característica avermelhada. Muito embora a rápida decomposição da matéria orgânica nos solos tropicais contribua para abundância de íons hidrogênio, estes são rapidamente neutralizados pela decomposição dos minerais argilosos; consequentemente, os solos lateríticos geralmente não são ácidos. A laterização é intensificada em certo solos que se desenvolvem sobre material parental deficiente em quartzo (SiO₂) mas rico em ferro e magnésio (basalto, por exemplo); estes solos contêm pouca argila, no início, porque não possuem silício. Independente do material parental, o intemperismo alcança maiores profundidades e o processo de laterização avança mais longe em solos nas baixadas, como os da bacia Amazônica, onde camadas superficiais altamente intemperizadas não são transportadas pela erosão e os perfis de solo são muito antigos.

Uma das consequências da laterização em muitas partes dos trópicos é que a capacidade do solo em reter nutrientes é muito baixa. Sem partículas de argila e húmus para reter nutrientes minerais, eles são rapidamente lixiviados para fora do solo. Nos lugares onde o solo é profundamente intemperizado, novos minerais formados pela decomposição do material parental estão simplesmente distantes demais das camadas superficiais do solo para contribuir para sua fertilidade. Além disso, as fortes precipitações mantêm a água se movimentando para baixo através do perfil do solo, impedindo movimento para cima dos nutrientes. Em geral, quanto mais profundas as fontes básicas de nutrientes na rocha matriz inalterada, mais pobres as camadas da superfície. Solos ricos, entretanto, se desenvolvem, de fato, em muitas regiões tropicais, particularmente em áreas montanhosas onde a erosão continuamente remove as camadas superficiais de solo deplecionadas de nutrientes, em áreas vulcânicas onde o material parental de cinza e lava é frequentemente rico em Nutrientes como o potássio.

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A formação do solo enfatiza o papel do ambiente físico, particularmente o clima, a geologia e as formas de relevo na criação da incrível variedade de ambientes para vida que existem na superfície terrestre e em suas águas.

8 TEMPOS DE RENOVAÇÃO E DE RETENÇÃO

O conceito de taxa de renovação é útil na comparação entre as taxas de troca entre diferentes compartimentos de um ecossistema após o estabelecimento de um equilíbrio pulsante. A taxa de renovação é a fração da quantidade total de uma substância em um compartimento que é liberado (ou que entra) em um dado período de tempo; o tempo de renovação é o seu recíproco (isto é, o tempo necessário para substituir a quantidade da substância igual à sua quantidade no compartimento). Por exemplo, se estão presentes mil unidades no compartimento e dez saem ou entram por hora a taxa de renovação é 10/1.000 (0,01), ou 1% por hora. O tempo de renovação seria, então, 1.000/10 ou cem horas. O tempo de residência, termo utilizado na literatura geoquímica, é um conceito semelhante ao tempo de renovação: refere-se ao tempo que uma dada quantidade de substância permanece no compartimento designado de um sistema.

O fluxo ou a taxa de movimentação de nutrientes para dentro ou para fora dos estoques é mais importante que a quantidade dentro dos estoques, em especial quando se entende como um ecossistema funciona. Por exemplo, Pomeroy (1960, s.p.) comentou que “um fluxo rápido de fosfato é mais importante que a concentração na manutenção de altas taxas de produção orgânica”.

As estimativas de tamanhos e tempos de renovação de reservatórios hídricos nos ciclos globais estão listadas na Tabela 1. Apesar do tempo de renovação tender a ser mais curto nos estoques menores, a relação entre o tamanho e o tempo de renovação do estoque não é linear e dependerá muito da localização do reservatório.

Os avanços na tecnologia de detecção, que possibilitaram medições de quantidades muito pequenas de isótopos tanto radioativos como estáveis de todos os principais elementos biogênicos, estimularam os estudos de ciclagem nos níveis de paisagem, porque esses isótopos podem ser usados como traçadores ou marcadores para acompanhar os movimentos dos materiais.

9 CICLAGEM DOS ELEMENTOS NÃO ESSENCIAIS

Embora os elementos não essenciais possam ter valor pequeno ou não conhecido para um organismo ou espécie, eles frequentemente passam de um lado para o outro entre os organismos e seu ambiente, da mesma maneira como fazem os elementos essenciais. Muitos desses elementos não essenciais estão envolvidos no ciclo sedimentar geral, e alguns encontram o seu caminho para atmosfera. Vários elementos não essenciais concentram-se em certos tecidos, às vezes em função da sua semelhança química com alguns elementos vitais específicos. Os ecólogos

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passaram a se preocupar com a ciclagem desses elementos principalmente porque as atividades humanas envolvem vários elementos não essenciais (ODUM, 1971). De fato, todos nós devemos nos preocupar com o crescente volume dos resíduos tóxicos que são descarregados ou escapam inadvertidamente para o ambiente e contaminam os ciclos básicos dos elementos vitais.

Vários animais marinhos concentram, em seus tecidos, elementos químicos que não podem remover de seus ambientes. O arsênio (um análogo ao fósforo) é um exemplo disso. Determinados organismos transformam o arsênio em uma forma química inerte que permanece armazenada em seus tecidos. Alguns elementos, como o mercúrio, são transferidos por meio da cadeia alimentar. Dessa forma, grandes animais predadores tendem a acumular grandes concentrações do elemento. Esse processo, chamado magnificação biológica (ou biomagnificação), é a razão pela qual alguns peixes, como o peixe espada e o atum, contêm quantidades de mercúrio potencialmente prejudiciais.

A maioria dos elementos não essenciais tem pouco efeito em concentrações encontradas em grande parte dos ecossistemas naturais, provavelmente porque os organismos adaptaram-se à sua presença. Portanto, seu movimento biogeoquímico seria de pouco interesse, a não ser que sejam subprodutos das indústrias de mineração, de manufatura, química e agrícola, que contêm altas concentrações de metais pesados, compostos orgânicos tóxicos e outros materiais potencialmente perigosos, que muitas vezes encontram seus próprios caminhos em direção ao ambiente (ODUM, 1953). A ciclagem de todos os elementos é importante. Até os mais raros podem tornar-se biologicamente preocupantes se tomarem a forma de compostos metálicos tóxicos ou de isótopos radioativos, pois uma pequena quantidade de tais materiais (do ponto de vista biogeoquímico) pode ter um efeito biológico notável.

O estrôncio é um exemplo de elemento que há tempos era praticamente desconhecido, mas que hoje precisa de atenção especial, porque a sua versão radioativa é perigosa para os humanos e outros animais vertebrados. O estrôncio se comporta como o cálcio. Disso resulta que o estrôncio radioativo entrar em contato íntimo com os tecidos produtores de sangue ricos em cálcio dos nossos ossos. Cerca de 7% do total do material sedimentar que flui pelos rios é cálcio. Para cada mil átomos de cálcio, 2,4 átomos de estrôncio se movem para o mar juntamente com o cálcio. Quando o urânio sofre fissão na preparação e teste de armas nucleares e usinas termonucleares, o processo produz estrôncio-90 radioativo como produto residual (apenas mais um de uma série de produtos da fissão que decai com lentidão). O estrôncio-90 é um material relativamente novo acrescentado a biosfera. Ele não existia na natureza antes de o átomo sofrer fissão. Pequenas quantidades de estrôncio radioativos liberadas em precipitações radioativas em testes de armas nucleares e que escapam dos reatores nucleares têm agora acompanhado o cálcio, a água e o solo para o interior das vegetações, animais, alimentos e ossos humanos. A presença de estrôncio-90 nos ossos das pessoas pode ter efeitos carcinogênicos.

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O césio-137 radioativo, outro perigoso produto da fissão, se comporta como o potássio e, consequentemente, circula pela cadeia alimentar. A tundra ártica é um ecossistema sujeito a precipitações radioativas por causa de testes com armas nucleares no passado. A tundra ártica recebeu entrada de materiais radioativos depois da explosão da usina nuclear de Chernobyl, em 1986. Grandes quantidades de produtos de fissão radioativa estão agora armazenadas em tanques em instalações de energia atômica. A falta de conhecimento tecnológico para processar e armazenar esses resíduos com segurança limitou o uso pacífico da energia atômica.

O mercúrio é um outro exemplo de elemento natural que, em função da sua baixa concentração e baixa mobilidade, tinha impacto pequeno sobre a vida antes da era industrial. A mineração e a manufatura mudaram isso e o mercúrio, assim como outros metais pesados (como o cádmio, chumbo, cobre e zinco), são agora graves problemas de poluição (BREWER et al., 1994; BREWER; BARRETT, 1995).

Algumas plantas aquáticas têm a capacidade de sequestrar e armazenar em seus tecidos grandes quantidades de metais pesados tóxicos sem se prejudicar.

INTERESSANTE

10 CICLAGEM DE NUTRIENTES NOS TRÓPICOS

O padrão de ciclagem de nutrientes nos trópicos, especialmente no trópico úmido, é diferente do padrão das zonas temperadas do norte de maneiras relevantes. Em regiões frias, uma grande porção de material orgânico e de nutrientes disponíveis está sempre situada no solo ou sedimento. Nos trópicos, uma porcentagem muito maior está localizada na biomassa e é reciclada rapidamente no interior do sistema, auxiliada por algumas adaptações biológicas para a conservação dos nutrientes, incluindo simbiose mutualística entre microrganismos e plantas. Quando essa evoluída e bem-organizada estrutura biótica é removida (por exemplo, por desmatamento), os nutrientes são rapidamente perdidos por lixiviação, sob condições de altas temperaturas e de chuva intensa, em especial nos locais em que são originalmente pobres em nutrientes. Por isso, segundo ODUM (1971), as estratégias agrícolas das zonas temperadas do norte, que envolvem a monocultura de plantas anuais de vida curta, são inapropriadas para as regiões tropicais. Assim, faz-se necessário uma urgente reavaliação ecológica da agricultura e da gestão ambiental nos trópicos, caso se queira corrigir os erros do passado evitar desastres ecológicos no futuro. Ao mesmo tempo, a rica diversidade genética de espécies e de habitat dos trópicos deve ser preservada. Agricultura itinerante em diversas partes dos trópicos funciona melhor em regiões montanhosas úmidas.

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Quando uma floresta na zona temperada do norte é removida, o solo retém nutrientes e mantém sua estrutura, podendo ser cultivado por agricultura convencional por vários anos, o que envolve lavrar a terra uma ou mais vezes ao ano, bem como o plantio de espécies anuais e aplicação de fertilizantes inorgânicos. Durante o inverno, as temperaturas de congelamento ajudam a retenção de nutrientes e controlam as pragas e os parasitas. Nos trópicos úmidos, entretanto, a remoção da floresta retira a capacidade da terra de reter e reciclar nutrientes (e combater pragas) por conta das altas temperaturas durante o ano todo e dos longos períodos de chuvas lixiviantes. Frequentemente, a produtividade agrícola declina com rapidez e a terra é abandonada, criando um padrão de agricultura itinerante. O controle da comunidade em geral e a ciclagem de nutrientes em particular tendem a ser mais físicos nas zonas temperadas do norte e mais biológicos nos trópicos. Em outras palavras, a maior parte dos estoques de nutrientes em regiões temperadas está no solo e na serapilheira, ao passo que nos trópicos úmidos, os estoques de nutrientes estão na biomassa.

Entretanto, é preciso notar que a agricultura itinerante pode ser sustentada enquanto a densidade populacional humana for baixa (como foi o caso no passado) e rotações de longo prazo forem lentas e contínuas. O problema da agricultura itinerante não é o processo, mas a superpopulação, que torna cada vez mais necessário o desmatamento e não permite intervalos de tempo suficientemente longo para que as áreas se recomponham e sejam desmatadas de novo. Nem todas as agriculturas de latitudes tropicais estão localizadas em florestas pluviais. Por exemplo, pessoas que vivem no Peru, no Equador em Papua-Nova Guiné praticaram agricultura sustentável por séculos (RAPPAPORT, 1968). Essa breve consideração simplifica em demasia a complexidade da situação, mas revela a razão ecológica básica de as áreas tropicais e subtropicais, que sustentam florestas exuberantes ou outra vegetação altamente produtiva, renderem tão pouco sob métodos convencionais de gestão agrícola de região temperada.

Jordan e Herrera (1981) salientaram que o grau em que as florestas tropicais “investem”, por assim dizer, em mecanismos de reciclagem de conservação de nutrientes, depende da geologia e da fertilidade básicas do terreno. Grandes áreas de florestas tropicais (como a maioria do leste e centro da bacia amazônica) estão sobre antigos solos pré-cambrianos altamente lixiviados ou depósitos de areia pobres em nutrientes. Apesar disso, esses locais oligotróficos sustentam florestas exuberantes e produtivas, como as encontradas em locais mais eutróficos (férteis): nas montanhas de Porto Rico e Costa Rica e nos sopés das montanhas andina. As simbioses intrincadas entre os autótrofos e os heterótrofos, envolvendo microrganismos intermediários especiais, são a chave para o sucesso desses ecossistemas de tipo oligotróficos.

Em resumo, os ecossistemas tropicais pobres em nutrientes são capazes de manter alta produtividade sob condições naturais por meio de uma variedade de mecanismos de conservação de nutrientes. Esses mecanismos evolutivos proporcionam a ciclagem mais direta das plantas de volta para as plantas, como que desviando do solo. Quando essas florestas cedem lugar a agricultura

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de grande escala ou a plantações de árvores, esses mecanismos são destruídos e a produtividade declina muito rapidamente, assim como o rendimento das lavouras. Quando as clareiras são abandonadas, a floresta se recupera aos poucos.

O desenvolvimento e testes de plantas agrícolas com micorrizos bem desenvolvidas e sistemas radiculares fixadores de nitrogênio, bem como o uso mais intenso de plantas perenes, são as metas ecologicamente prudentes para as áreas de altas temperaturas e clima tropical. As culturas de arroz são bem-sucedidas nos trópicos por causa de uma característica especial desse antigo tipo de agricultura: a retenção de nutrientes. Os campos inundados de arroz vêm sendo cultivados no mesmo lugar por mais de mil anos nas Filipinas (um recorde de sucesso que poucos sistemas de agricultura convencional em uso atualmente podem reivindicar). Uma certeza é aparente: a agrotecnologia industrializada, como a praticada nas zonas temperadas do norte, não pode ser transferida sem modificações para as regiões tropicais.

11 CAMINHOS DA RECICLAGEM: O ÍNDICE DE CICLAGEM

A biogeoquímica em termos dos caminhos da reciclagem é importante na medida em que a reciclagem de água e de nutrientes é um processo vital em ecos-sistemas e vem se tornando cada vez mais uma importante preocupação para hu-manidade. Cinco principais caminhos da reciclagem podem ser distinguidos: (1) por decomposição microbiana; (2) por excreções animais; (3) por reciclagem dire-ta de planta para planta por simbiontes microbianos; (4) por meios físicos, envol-vendo ações diretas da energia solar; (5) pelo uso de energia combustível, como a fixação industrial de nitrogênio. A reciclagem requer a dissipação de energia de alguma fonte, como matéria orgânica, radiação solar ou combustíveis fósseis. A quantidade relativa de reciclagem em diferentes ecossistemas pode ser com-parada calculando-se um índice de ciclagem baseado na razão entre a soma das quantidades cicladas entre os compartimentos dentro do sistema e o fluxo total.

É apropriado focar na ciclagem de nutrientes na porção biologicamente ativa do ecossistema. Lembre-se de que a mesma abordagem foi usada para energia: a energia total do ambiente foi considerada primeiro e, então, a atenção foi colocada no destino das pequenas frações de energia envolvidas na cadeia alimentar. A discussão sobre a regeneração biológica também é relevante, porque a reciclagem vem se tornando cada vez mais uma meta importante para as sociedades humanas.

Uma rede alimentar microbiana, composta por bactérias, fungos e microrganismos que consomem detritos orgânicos, está presente de maneira um pouco diferente em todos os solos e águas naturais. Tanto a matéria orgânica dissolvida como a particulada no solo e na água são em parte processadas por bactérias, algumas presas às partículas e outras que flutuam livremente na água. As bactérias são ingeridas pelos protozoários, que excretam amônia e fosfato; estes por sua vez, podem ser reutilizados pelas plantas. Essa teia alimentar é frequentemente denominada caminho do detrito ou ciclo dos detritos.

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TÓPICO 2 — VARIAÇÕES NO AMBIENTE FÍSICO E A CICLAGEM DE NUTRIENTES

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As medidas de taxas de renovação indicam que os nutrientes liberados pelos protozoários durante seu tempo de vida são várias vezes a quantidade de nutrientes solúveis liberados por decomposição microbiana de seus corpos após sua morte (POMEROY et al., 1963). Essas excreções incluem compostos orgânicos e inorgânicos dissolvidos de fósforo, nitrogênio e dióxido de carbono, que são diretamente aproveitáveis por produtores sem nenhuma outra degradação química por bactérias.

A reciclagem direta por microrganismos simbiontes, como dinoflagelados em recifes de corais, é supostamente importante em ambientes pobres em nutrientes ou oligotróficos, como nos oceanos. A água, como temos visto, é amplamente reciclada pela ação direta da energia solar e pelos processos de intemperismo e erosão associados aos fluxos de água descendentes que trazem os elementos sedimentares dos reservatórios abióticos para dentro dos ciclos bióticos. O ser humano entra em cena na reciclagem quando gasta energia de combustível para dessalinizar água do mar, produzir fertilizantes ou reciclar o alumínio ou outros metais.

O trabalho de reciclagem executado de maneira mecânica ou física pode fornecer um subsídio de energia para o sistema todo. No planejamento do sistema de descarte de resíduo humano e industrial, é vantajoso incluir entradas de energia mecânica para pulverizar a matéria orgânica e, dessa forma, acelerar a taxa de decomposição. A degradação física pelas atividades de grandes mamíferos pastejadores não confinados também é importante na liberação de nutrientes de partes resistentes do detrito (MACNAUGHTON et al., 1997).

A reciclagem não é um serviço gratuito. Sempre há um custo de energia. Quando a luz do Sol e matéria orgânica são as fontes de energia para o trabalho de reciclagem, os humanos não precisam pagar pelo uso dos serviços prestados pelo capital natural. Uma vez que não são interrompidos ou envenenados, os mecanismos naturais de reciclagem podem fazer a maior parte do trabalho de reciclagem de água e nutrientes. No entanto, os materiais industriais (como os metais pesados) envolvidos em manufatura são um assunto completamente diferente. Sua reciclagem custa combustível e dinheiro, mas existem poucas opções quando as provisões se tornam limitadas ou quando os resíduos põem em risco a saúde humana.

11.1 O ÍNDICE DE CICLAGEM

A ciclagem dentro do ecossistema pode ser definida em relação à proporção dos materiais de entrada que circulam de um compartimento ao outro antes de sair do sistema. A fração reciclada é a soma das quantidades circulada as por meio de cada compartimento, como segue:

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UNIDADE 2 — COMPONENTES DO ECOSSISTEMA

Em que “CI” é o índice de ciclagem, “TSTc” é a parte do fluxo total do sistema reciclado e “TST” é o fluxo total do sistema. O fluxo total é definido como a soma de todas as entradas menos a variação no armazenamento no sistema, se for negativo ou, alternativamente, todas as saídas mais a variação no armazenamento se for positivo.

Finn (1978) calculou o índice de ciclagem para o cálcio na bacia hidrográfica de Hubbard Brook e obteve um valor entre 0,76 e 0,80. Isso significa que cerca de 80% do fluxo total do cálcio é reciclado. Os índices de ciclagem foram até maiores para o potássio e o nitrogênio. Os nutrientes nessa bacia hidrográfica parecem se reciclar na seguinte ordem de eficiência (do CI mais alto para o mais baixo): K > Na > N > Ca > P > Mg > S. Essa ordenação se relaciona com a entrada de cada elemento de fora do sistema, bem como a mobilidade do elemento e os requisitos biológicos da biota. Os índices de ciclagem são geralmente baixos para os elementos não essenciais, como o chumbo, ou para elementos essenciais que são requeridos em pequenas quantidades em relação a sua disponibilidade, como o cobre. Os elementos que as sociedades humanas consideram valiosos, como a platina e ouro, são 90% ou mais reciclados. Como seria de esperar, o índice de ciclagem para energia (fluxo de calorias) é zero, porque como enfatizado anteriormente, por conta da segunda lei da termodinâmica, a energia passa direto pelo sistema e não pode circular.

11.2 RECICLAGEM DE PAPEL

O papel fornece um excelente exemplo de como a reciclagem se desenvolve em sistemas urbanos-indústrias de maneira paralela à reciclagem de materiais importantes em sistemas naturais. A reciclagem nos ecossistemas naturais, como medido pelo índice de ciclagem, aumenta conforme os componentes bióticos do ecossistema se tornam maiores e mais complexos, o que ocorre à medida que os recursos nos ambientes de entrada se tornam escassos, ou ainda conforme os produtos residuais se acumulam no ambiente de saída em detrimento da vida dentro do ecossistema.

Enquanto havia fartura de árvores, fábricas de papéis e terras devolutas para o descarte de papel usado, havia pouco incentivo fluindo pelos sistemas urbano-indústrias para investir em instalações e energia para reciclar o papel. Entretanto, conforme os arredores das cidades vão ficando congestionados, o valor dos terrenos sobe, tornando cada vez mais difícil e caro manter aterros sanitários ou locais para descarte. A pressão vem dos ambientes de entrada, quando suprimentos de madeira para polpa ou as produções das usinas de papel começaram a cair aquém da demanda. Nos dois casos isso foi a causa para considerar a reciclagem. Precisa existir um mercado (as usinas de reciclagem) de jornal e de papelão usados para o sucesso da reciclagem de papel. Tais usinas representam o mecanismo de reciclagem de economia de energia similar às estruturas dissipativas encontradas nos ecossistemas naturais, como as florestas e os recifes de coral.

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RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, você aprendeu que:

• Os padrões globais de temperatura e precipitação resultam de aportes diferen-ciados de radiação solar em diferentes regiões e da redistribuição de energia térmica pelos ventos e correntes oceânicas. Os aspectos relevantes do clima terrestre compreende uma faixa de clima quente e úmido ao longo do equador e faixas de clima seco a cerca de 30° de latitude norte sul.inserir o texto aqui.

• Avaliação no ambiente marinho é determinada em escala global pelas principais correntes oceânicas. Essas correntes redistribuir o calor pela superfície terrestre e afetam em grande parte os climas na terra. Correntes de ressurgência, causadas pelos ventos, pela topografia da bacia oceânica e por variações na densidade da água relacionadas a temperatura e salinidade, traz em água fria e rica em nutrientes para superfície em algumas áreas.

• A sazonalidade dos ambientes terrestres é causada pela progressão anual do equador solar para o norte e para o sul e pelo movimento latitude now de cinturões associados de temperatura, vento e precipitação. Em altas latitudes, assista ações são expressas principalmente como ciclos anuais de temperatura; nos trópicos, a sazonalidade da precipitação é mais pronunciada.

• Variações irregulares e imprevisíveis no clima, como os eventos de e n os, podem causar grandes mudanças na temperatura e na precipitação e romper com a estrutura das comunidades biológicas numa escala global.

• A topografia e a geologia sobrepõem variações locais das condições ambientais aos padrões climáticos mais gerais. As montanhas interceptam a precipitação querendo sombras de chuvas áridas em suas encostas de só está vento. As condições nas altitudes superiores lembram as condições das latitudes superiores.

• As características do solo refletem as influências do leito rochoso subi já senti e do clima e da vegetação acima dele. O intemperismo da rocha matriz resulta na decomposição de alguns dos seus minerais e em sua reconstituição em partículas de argila, que se misturam com detritos orgânicos que entrou no solo a partir da superfície. Esses processos de gradação vertical geralmente resultam em destino dos horizontes de solo.

• Em solos ácidos (pode solicitados) de regiões frias e úmidas da zona temperada e nos solos tropicais profundamente em tem pery exatos (lateral usados), as partículas de argila se decompõem e a fertilidade do solo é bastante reduzida.

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• Os ecossistemas tropicais pobres em nutrientes são capazes de manter alta produtividade sob condições naturais por meio de uma variedade de mecanismos de conservação de nutrientes. Esses mecanismos evolutivos proporcionam a ciclagem mais direta das plantas de volta para as plantas

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1 Os padrões globais de temperatura e precipitação são estabelecidos pela energia da radiação solar. O clima da terra tende a ser frio e seco na direção dos polos e quente e úmido na direção do equador terrestre. Sobre a circulação atmosférica e padrões globais de ventos, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) A região dentro da qual as correntes superficiais de ar dos subtrópicos norte e sul se encontram, perto do equador, e iniciam a subida sobre o aquecimento do Sol é chamada de células de Hadley.

b) ( ) A região dentro da qual as correntes superficiais de ar dos subtrópicos norte e sul se encontram, perto do equador, e iniciam a subida sobre o aquecimento do Sol é chamada de convergência intertropical.

c) ( ) As correntes superficiais de ar dos subtrópicos norte e sul é chamada de células de Ferrel

d) ( ) A região das correntes superficiais de ar dos trópicos é chamada de correntes de jato.

2 A variação nas condições marinhas é causada pelos ventos, que impulsionam as grandes correntes de superfície dos oceanos, e pela topografia subjacente da bacia oceânica. Além disso, as correntes profundas são estabelecidas por diferenças na densidade da água do oceano causadas por variações na temperatura e na salinidade. Com base nos conhecimentos estudados sobre circulação oceânica, analise as sentenças a seguir:

I- A água quente circula na direção do equador ao longo das costas orientais dos continentes.

II- Quando as correntes superficiais se afastam na superfície, elas tendem a puxar água localizada imediatamente abaixo para cima a partir das camadas inferiores, esse fenômeno é conhecido como ressurgência.

III- A rotação da Terra empurra as correntes em direção as bordas continentais, promovendo o empilhamento de água na costa com o auxílio dos ventos.

Assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.b) ( ) Somente a sentença II está correta.c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 Características topográficas e geológicas provocam variações locais no clima. A topografia e a geologia podem modificar o ambiente numa escala local dentro de regiões que, de outro modo, teriam clima uniforme. Com base no exposto, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

AUTOATIVIDADE

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( ) O resfriamento adiabático é atingido a partir de altitudes superiores a 5.000 m, ou seja, a altitude aproximada da linha de neve nas montanhas.

( ) Em áreas montanhosas, a inclinação da terra e a sua exposição ao sol influenciam a temperatura e o teor de umidade do solo.

( ) As temperaturas em ambientes montanhosos tropicais são muito variáveis o que dificulta a sobrevivência de muitas plantas e animais nestas regiões.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V – F – F.b) ( ) V – F – V.c) ( ) F – V – F.d) ( ) F – F – V.

4 O solo desafia a elaboração de uma simples definição, mas podemos descrevê-lo como a camada de material alterado quimicamente e biologicamente que recobre a rocha ou outros materiais inalterados na superfície terrestre. Disserte sobre como se dá o processo de laterização dos solos, como este fenômeno se intensifica e quais as consequências para os solos de regiões tropicais.

5 Estratégias agrícolas das zonas temperadas do norte, que envolvem a monocultura de plantas anuais de vida curta, são inapropriadas para as regiões tropicais. Neste contexto, disserte sobre o padrão de ciclagem de nutrientes nos trópicos e nas zonas temperadas e explique a alta produtividade sob condições naturais dos ecossistemas tropicais.

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UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

Os elementos circulam através dos ecossistemas ao longo de vias traçadas por suas propriedades químicas, que determinam suas reações químicas e bioquímicas na biosfera. Essas reações são modificadas de modo único pelas condições físicas e químicas criadas em cada tipo de ecossistema terrestre e aquático. Como todos os organismos dependem da presença de nutrientes na forma que são usados, a reciclagem e a regeneração de nutrientes são importantes reguladores do funcionamento do ecossistema.

Neste Tópico 3, discutiremos como os processos bioquímicos no solo, na água e no sedimento, influenciam a produtividade do ecossistema e a reciclagem de elementos nele.

Os processos de regeneração de nutrientes são diferentes em sistemas terrestres e aquáticos. Ambos os sistemas apresentam transformações químicas e bioquímicas semelhantes: oxidação de carboidratos, nitrificação e oxidação quimioautotrófica de enxofre, entre muitas outras. Apesar disso, os sistemas terrestres e aquáticos diferem na base material para regeneração de nutrientes.

Em ecossistemas terrestres, a maior parte do metabolismo do ecossistema é aeróbica, e a maioria dos elementos circula através de detritos na superfície do solo, onde as raízes das plantas têm acesso imediato aos nutrientes. Em habitats aquáticos, os sedimentos são a fonte essencial de nutrientes regenerados; estes sedimentos depositados nos fundos de lagos e oceanos são frequentemente originados de lugares afastados com produção primária em águas superficiais.

TÓPICO 3 —

REGENERAÇÃO DOS NUTRIENTES NOS AMBIENTES TERRESTRES

E AQUÁTICOS

2 NUTRIENTES NOS ECOSSISTEMAS TERRESTRES

A regeneração de nutrientes em ecossistemas terrestres ocorre principalmente no solo. Uma importante fonte de novos nutrientes em sistemas terrestres é a formação de solos por intermédio do intemperismo da rocha matriz e de outros materiais parentais. O intemperismo geralmente acontece abaixo das camadas mais profundas do solo, onde é impossível medi-lo diretamente. Contudo, os cientistas do solo podem estimar a taxa de intemperismo indiretamente, medindo a perda líquida de determinados elementos de um sistema. Íons positivos, como o cálcio (Ca²⁺), o potássio (K⁺), o sódio (Na⁺) e o Magnésio (Mg²⁺), são bons candidatos para essas medidas porque se dissolvem prontamente na

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UNIDADE 2 — COMPONENTES DO ECOSSISTEMA

água e deixam o solo através do lençol de água e por fim nas correntes, onde podem ser medidos com facilidade. Quando um solo alcança o equilíbrio, como pode acontecer em áreas não perturbadas, a perda de um elemento do sistema é igual ao fluxo de entrada por intemperismo deste elemento. Além de ganhos de outras fontes, como a precipitação. Desse modo, é possível estimar a entrada do intemperismo é a partir de informações sobre os fluxos de entrada e perda total por precipitação.

Durante os anos de 1960 e 1970 a entrada anual de cálcio na precipitação da bacia hidrográfica de Hubbard Brook, New Hampshire, foi em média de 2 quilogramas por hectare (kg/ha), enquanto a perda de cálcio dissolvido no fluxo dos cursos de água foi de 14 kg/ha. Portanto, a perda líquida do sistema foi de 12 kg/ha. As biomassas vegetais vivas e mortas aumentaram na bacia hidrográfica durante o período de estudo porque a floresta estava se recuperando de um desmatamento anterior. A assimilação líquida de cálcio na vegetação e nos detritos trouxe a remoção total de solo mineral para 21 kg/há/ano. Como o cálcio constitui cerca de 1,4% do peso da rocha matriz da área, atingir esta perda anual teria demandado intemperismo de cerca de 1500 kg (21/0,014) de rocha matriz por hectare, ou aproximadamente 1 mm de profundidade por ano. Análises posteriores do ecossistema da floresta de Hubbard Brook, que este foi um período de alta acidez e rápida lixiviação de íons do solo. Desse modo, o solo não estava em equilíbrio, e as entradas de cálcio através do intemperismo foram muito inferiores do que se pensava anteriormente. Esse exemplo ilustra quão pouco o lento intemperismo da rocha matriz contribui para assimilação anual de nutrientes pela vegetação. A maior parte desses nutrientes se torna disponível para as plantas pela decomposição de detritos e pequenas moléculas orgânicas no perfil do solo. Tipicamente, o intemperismo da rocha matriz proporciona apenas 10% dos nutrientes do solo assimilados pela vegetação a cada ano.

3 REGENERAÇÃO DOS NUTRIENTES EM ECOSSISTEMAS TERRESTRES

A qualidade dos detritos vegetais influencia a taxa de regeneração dos nutrientes. As plantas assimilam os elementos presentes no solo muito mais rapi-damente do que são gerados pelo intemperismo do material parental. Íons como Ca²⁺ (cálcio), Mg²⁺ (magnésio), K⁺ (potássio) e Na⁺ (sódio) não aparecem com des-taque nas transformações bioquímicas, embora sejam necessários para o cresci-mento vegetal. Na grande maioria, as plantas assimilam esses íons com a água, que absorvem em grandes quantidades. Outros importantes nutrientes, como o nitrogênio, o fósforo e o enxofre são geralmente pouco abundantes no material parental. As rochas ígneas (granito e basalto, por exemplo) não contêm nitrogê-nio e possuem apenas 0,3% de fosfato e 0,1% de sulfato em massa. A maioria das rochas sedimentares contém um pouco mais. Portanto, o intemperismo adiciona pouca quantidade desses nutrientes ao solo; os fluxos de entrada através da pre-cipitação e da fixação de nitrogênio também são pequenos. A produção vegetal, portanto, depende da rápida regeneração destes nutrientes a partir dos detritos e de sua retenção nos ecossistemas.

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TÓPICO 3 — REGENERAÇÃO DOS NUTRIENTES

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Os detritos orgânicos estão em toda parte, de modo mais notável nos habitats terrestres, onde as partes das plantas não consumidas pelos herbívoros se acumulam na superfície do solo, juntamente às excretas de animais e outros restos orgânicos. 90% ou mais da biomassa vegetal produzida em habitats florestais passam por estes reservatórios de detritos. Os processos de decaimento decompõem os detritos, liberando os nutrientes que contêm em formas que podem ser reutilizadas pelas plantas.

A decomposição da serapilheira no chão das florestas ocorre de quatro maneiras: (1) lixiviação dos minerais solúveis em compostos orgânicos pequenos pela água; (2) consumo por grandes organismos detritívoros (minhocas, pulgões e outros invertebrados); (3) decomposição dos componentes lenhosos das folhas por fungos; e (4) decomposição de quase tudo por bactérias. Entre 10% e 30% das substâncias nas folhas recentemente caídas se dissolvem em água fria. A lixiviação remove rapidamente a maior parte dos sais, açúcares e aminoácidos da serapilheira, tornando-os disponíveis para os microrganismos do solo e raízes das plantas; carboidratos complexos, como a celulose, e outros compostos orgânicos grandes ficam para trás. Os grandes detritívoros tipicamente assimilam apenas 30% a 45% dessa energia disponível na porção foliar da serapilheira, e até menos da madeira. Eles, contudo, aceleram a decomposição além do que eles próprios extraem porque maceram os detritos vegetais em seus tratos digestivos, e as partículas mais finas de seus rejeitos egestados expõem novas superfícies para alimentação dos fungos e das bactérias.

As folhas de diferentes espécies de árvores se decompõem em velocidades diferentes, dependendo de sua composição. Por exemplo, no leste do Tennessee, durante o primeiro ano após a queda das folhas, a perda de peso das folhas variou de 64% na amoreira até 39% no Carvalho, 32% no bordo de açúcar e 21% na faia norte americana. Os feixes de acículas de pinheiros e outras coníferas também se decompõe lentamente. Estas diferenças entre as espécies dependem em grande parte do teor de lignina das folhas, o que determina sua rigidez. As ligninas são cadeias longas e complexas de moléculas orgânicas. Elas conferem a madeira muitas de suas qualidades estruturais e são ainda mais difíceis de digerir do que a celulose. A taxa de decomposição dos detritos também depende do seu teor de nitrogênio, fósforo e outros nutrientes exigidos pelas bactérias e fungos para seu próprio crescimento. Quanto maior a concentração desses nutrientes, mais rápido os micróbios podem crescer e mais rapidamente eles decompõem os detritos vegetais.

A resistência de alguns tipos de serapilheira à degradação evidencia o papel único dos fungos na regeneração de nutrientes. A maioria dos fungos consiste numa rede de estruturas filiformes chamadas de hifas, que podem penetrar na serapilheira vegetal e nas madeiras onde as bactérias não conseguem chegar. Os familiares cogumelos e orelhas-de-pau são simplesmente estruturas de frutificação produzidas pela massa de hifas no fundo da camada de restos foliares e madeiras. Assim como as bactérias, os fungos secretam enzimas no substrato e absorvem açúcares simples e aminoácidos produzidos por esta

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UNIDADE 2 — COMPONENTES DO ECOSSISTEMA

digestão extracelular. Os fungos diferem das bactérias por serem capazes de digerir celulose (o que apenas umas poucas bactérias, protozoários em sistemas digestivos de térmitas e caracóis também podem fazer) e, especialmente, lignina.

3.1 O CLIMA AFETA A TAXA DE REGENERAÇÃO DE NUTRIENTES

A reciclagem de nutrientes difere em ecossistemas tropicais e temperados por causa dos efeitos dos diferentes climas sobre o intemperismo, as propriedades do solo e a decomposição de detritos. Os solos tropicais tendem a ser profundamente intemperizados e a possuir pouca argila, o que significa que não são bons na retenção de nutrientes. Como consequência, a menos que os nutrientes sejam rapidamente assimilados pelas plantas, eles são carregados para fora do solo. A despeito disso, as florestas tropicais frequentemente apresentam uma produção primária extremamente alta. Essa alta produtividade é sustentada por (1) rápida decomposição de detritos sobre condições quentes e úmidas, (2) rápida assimilação de nutrientes pelas plantas e outros organismos, a partir das camadas superiores do solo, e (3) retenção eficiente de nutrientes pelas plantas. Em ecossistemas tipicamente tropicais, a maior parte dos nutrientes é encontrada na biomassa viva, e não no solo, e os elementos são regenerados e assimilados rapidamente. Este padrão contém implicações importantes para a conservação e agricultura tropicais.

Em extensas regiões nos trópicos com solos antigos e profundamente in-temperizados, o plantio de produtos agrícolas como o milho, em áreas desmata-das, apresenta consequências adversas previsíveis para a fertilidade do solo. A prática de cortar e queimar árvores derrubadas libera muitos nutrientes minerais, que podem sustentar dois ou três anos de crescimento na plantação, mas estes nutrientes são lixiviados rapidamente do solo quando a vegetação natural não está mais presente para assimilá-los. Consequentemente, os níveis de nutrientes minerais no solo caem rapidamente. Além disso à medida que os solos tropicais expostos secam, o movimento da água para cima traz óxido de ferro e de alumí-nio para superfície, onde forma uma substância semelhante ao tijolo chamado de laterita (Tópico 2 – Unidade 2). O escoamento superficial da água sobre a laterita impenetrável acelera a erosão, deplecionando ainda mais os nutrientes e descarregando sedimentos nas águas correntes (assoreamento). A agricultura tradicional de derrubada e queima nesses solos tropicais geralmente alterna dois ou três anos de colheitas com 50 a 100 anos de regeneração da floresta para re-constituir a qualidade do solo. Nos locais em que a densidade populacional não permite mais essa prática, os solos não conseguem ser recompostos naturalmente e se deterioram rapidamente, a menos que sejam utilizados fertilizantes caros e ambientalmente danosos, além de cultivos intensivos.

Uma comparação entre ecossistemas de floresta eliminados para o uso agrícola no Canadá, Brasil e Venezuela demonstra a importância da matéria orgânica na manutenção da fertilidade do solo em condições de agricultura

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TÓPICO 3 — REGENERAÇÃO DOS NUTRIENTES

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intensiva. O teor de carbono de solos não perturbados era de 8,8 kg/m² numa pradaria do Canadá de 3,4 kg/m² na caatinga no Brasil e 5,1 kg/m² numa floresta úmida a venezuelana. Depois de 65 anos de cultivo, o teor de carbono do solo canadense havia reduzido em 51%, o que equivale a um declínio com uma taxa exponencial de 1% por ano. Em contraste, o teor de carbono do solo brasileiro havia diminuído em 40% após seis anos de cultivo (9% ao ano) e o solo venezuelano em 29% depois de três anos de cultivo (11% por ano). Este resultado sugere que os solos cultivados de regiões temperadas retêm matéria orgânica 10 vezes mais tempo que os solos tropicais, e, portanto, proporcionam um estoque mais persistente de nutrientes minerais que pode ser liberado lentamente por decomposição.

Estudos comparativos da dinâmica de nutrientes em florestas temperadas e tropicais ilustram mais ainda suas diferenças. A serapilheira no solo da floresta contém, em média, cerca de 20% da biomassa total de vegetação (incluindo troncos e galhos) e detritos nas florestas temperadas de acículas, 5% nas florestas temperadas de madeiras duras, e apenas 1% a 2% nas florestas tropicais pluviais. A razão entre a serapilheira e a biomassa das folhas vivas fica entre 5-10: 1 em florestas temperadas, mas é menos de 1:1 em florestas tropicais. Do total de carbono orgânico no sistema como um todo, mais de 50% ocorrem no solo e na serapilheira de florestas setentrionais, mas menos que 25% em florestas tropicais pluviais. O resto está na biomassa viva. A serapilheira e outros detritos se decompõem rapidamente nos trópicos e não formam um reservatório de nutrientes tão substancial quanto nas regiões temperadas. Em resumo, nas florestas de regiões temperadas, a maior parte dos nutrientes encontra-se no solo, enquanto nas florestas tropicais os nutrientes estão presentes em grande parte na biomassa viva.

4 REGENERAÇÃO DOS NUTRIENTES EM ECOSSISTEMAS AQUÁTICOS

Em ecossistemas aquáticos, os nutrientes são regenerados lentamente nas camadas profundas de água e sedimentos. Como a maior parte da circulação de elementos acontece em meio aquoso, os processos químicos e bioquímicos envolvidos não diferem de modo marcante entre os meios terrestres e aquáticos. O que se destaca em relação à maioria dos rios, lagos e oceanos é o movimento de nutrientes para dentro das camadas inferiores de água e depósitos de sedimentos bentônicos, a partir dos quais são regenerados e retornam às zonas de produtividade de modo relativamente lento.

Os sedimentos em sistemas aquáticos lembram superficialmente os solos terrestres, mas os papéis dos solos e sedimentos nos processos do ecossistema diferem de duas maneiras importantes. Primeiro, a regeneração de nutrientes a partir dos detritos terrestres acontece perto das raízes das plantas, onde os nutrientes são assimilados. Por outro lado, as algas e plantas aquáticas, assimilam nutrientes da coluna de água nas camadas superiores iluminadas (fóticas),

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UNIDADE 2 — COMPONENTES DO ECOSSISTEMA

frequentemente removidos dos sedimentos do fundo. Segundo, a decomposição de detritos terrestres ocorre, na maior parte, aerobicamente, e, portanto, relativamente rápido. Por outro lado, os sedimentos aquáticos frequentemente se tornam deplecionados de oxigênio, o que retarda bastante a maioria das transformações bioquímicas e modifica os caminhos através dos quais alguns elementos são reciclados.

A manutenção de uma alta produtividade aquática depende da proximi-dade entre os sedimentos de fundo e a zona fótica (zona luminosa) na superfície, ou da existência de algum meio de transporte para trazer os nutrientes regene-rados nos sedimentos de volta para a zona fótica. A produtividade primária dos oceanos apresenta altas taxas de fixação de carbono em mares rasos, tanto nos trópicos (por exemplo, no mar de coral e as águas vizinhas da Indonésia) quanto nas altas latitudes (mar báltico e mar do Japão). Áreas que possuem fortes ressur-gências, como as costas oeste da África e das Américas, também apresentam alta produtividade primária.

A excreção e decomposição microbiana regeneram alguns nutrientes na zona fótica, onde assimilação e a produção acontecem, assim como ocorre nos solos terrestres. Em algumas situações, os elementos podem circular rapidamente através das camadas superficiais produtivas da coluna de água com pouca perda para a sedimentação. Por exemplo, um estudo conduzido em águas profundas no lago da costa oeste da América do Norte mostrou que o fitoplâncton assimila nitrogênio quase tão rapidamente quanto o zooplâncton o excreta, a maior parte na forma de amônia. Aproximadamente metade do nitrogênio presente era assimilado pela fotossíntese diretamente como amônia, e cerca de metade era primeiro nitrificado (NH₄⁺ → NO₃⁻) por bactérias e então assimilado pelo fitoplâncton.

4.1 A ESTRATIFICAÇÃO TÉRMICA NOS ECOSSISTEMAS AQUÁTICOS

A estratificação térmica impede a mistura vertical nos ecossistemas aquáticos. A mistura vertical da água requer muita entrada de energia para acelerar as massas de água e mantê-las em movimentos. Os ventos suprem a maior parte dessa energia, causando misturas turbulentas de águas rasas e correntes de ressurgência ao longo de algumas costas, embora as variações na densidade da água relacionadas à temperatura e salinidade estabeleçam correntes verticais em outros ecossistemas marinhos.

O movimento vertical da água pode ser impedido em sistemas aquáticos quando a luz do Sol aquece a água da superfície, estabelecendo uma termoclina (região que separa águas quentes superficiais de águas geladas do fundo), ou quando a água doce flutua sobre a água salgada mais densa. Esta última situação acontece em estuários, nas bordas do gelo em derretimento e quando a chuva extremamente densa. Outros processos promovem a mistura vertical. Em sistemas marinhos, quando a evaporação excede a entrada de água doce, as camadas

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superficiais de água se tornam mais salinas, portanto, mais densas, e literalmente caem através da água mais leve que está abaixo. Isso também ocorre quando o gelo se forma e o sal é excluído da água cristalizada (em regiões polares). Os lagos de zonas temperadas experimentam a revirada de outono quando suas águas superficiais resfriam, se tornam mais densas e afundam através das camadas mais quentes e menos densas abaixo.

A mistura vertical da água afeta a produção de duas maneiras opostas. Por um lado, a mistura pode trazer águas ricas em nutrientes das profundidades para a zona fótica e, portanto, promover a produção. Por outro lado, a mistura pode transportar fitoplâncton para baixo da zona fótica e assim reduzir a produção. De fato, quando a mistura vertical se estende para além da zona fótica, o fitoplâncton não consegue se manter, muito menos se reproduzir. Sob tais condições, a produção primária pode cessar completamente, resultando na aparente contradição de água rica em nutrientes sem produção primária.

Uma situação típica de muitos lagos e lagoas de zonas temperadas é aquela em que a estratificação térmica durante o verão impede a mistura vertical; então, à medida que a sedimentação remove nutrientes das camadas superficiais, a produção diminui. Os nutrientes podem ser regenerados nas camadas mais profundas de um lago, mas eles não conseguem alcançar a superfície até que a estratificação seja rompida e a mistura vertical chegue com as temperaturas frias do outono.

A estratificação térmica se desenvolve apenas fracamente, tanto, em lagos de altas e baixas latitudes. Em regiões árticas e subárticas, muito pouco calor entra no lago para estabelecer uma termoclina e bloquear as misturas turbulentas. Desse modo, coluna de água tende a se aquecer uniformemente, até o ponto em que a temperatura da água se eleva como um todo. Nos trópicos, a falta de um ciclo sazonal de temperatura pronunciado reduz a definição exata de uma estratificação térmica, porque o Sol e as temperaturas do ar constantemente altas aquecem a água uniformemente até as partes mais profundas do lago.

Em sistemas marinhos, as correntes podem produzir condições mais complexas. Por exemplo, duas massas de água muito diferentes, uma estratificada e a outra não (mais homogênea), podem se encontrar em uma frente, e ali se misturarem para criar excelentes condições para o crescimento de fitoplâncton. Às vezes, na fronteira entre um sistema de águas rasas e um de águas profundas, massas de águas misturadas (profundas) e estratificadas (rasas) se juntam. No lado misturado, os nutrientes podem ser abundantes, mas o fitoplâncton pode não permanecer na zona fótica. No lado estratificado, os nutrientes podem ter sido deplecionados pelas águas superficiais. Nos locais em que os dois sistemas se encontram, uma parte da água misturada carregada de nutrientes pode penetrar na massa de água estratificada, criando condições ideais para produção.

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UNIDADE 2 — COMPONENTES DO ECOSSISTEMA

4.2 OS NUTRIENTES E A PRODUÇÃO NOS OCEANOS

Os nutrientes frequentemente limitam a produção nos oceanos. De modo geral, a produção primária em ecossistemas marinhos está intimamente relacionada com o suprimento de nutrientes, particularmente nitrogênio, nas camadas superficiais de água. Como resultado, os níveis mais altos de produção ocorrem em mares rasos, onde a mistura vertical alcança o fundo em áreas de forte ressurgência. Entretanto, algumas áreas de mar aberto possuem nitrogênio e fósforo em abundância, mas as concentrações de fitoplâncton e a produção primária são baixas. Essas condições sugerem a limitação por outros elementos, principalmente ferro e silício. O ferro é importante componente em muitas vias metabólicas. O silício é o principal material das conchas silicosas das diatomáceas, que são o tipo predominante de fitoplâncton nos oceanos. O silício é perdido na zona fótica, onde as diatomáceas morrem e suas conchas densas descem para o fundo.

As altas densidades de fitoplâncton no Oceano Sul estão associadas com as fontes continentais de nutrientes nas proximidades: a forte produção de plâncton está concentrada nas águas da corrente descendente da Austrália e Nova Zelândia, América do Sul e península Antártica, e sul da África, onde os nutrientes são retirados de sedimentos de águas rasas.

Nem todo o oceano da região sul, entretanto, é igualmente produtivo. As concentrações de nitrogênio e fósforo são altas o suficiente para sustentar altas densidades de fitoplâncton em toda a área. No entanto, o fitoplâncton é escasso em boa parte da região. Essa observação sugere limitação por outros nutrientes. Em particular, a área a oeste da região sul da América do Sul, entre 40°S e 50°S, parece ter pouco silício, provavelmente por ele ter se sedimentado e deixado a água mais rapidamente do que o nitrogênio e o fósforo, através da longa extensão do Pacífico Sul.

4.3 A REGENERAÇÃO DE NUTRIENTES EM ÁGUAS PROFUNDAS

A depleção de oxigênio facilita a regeneração de alguns nutrientes em águas profundas. Durante períodos prolongados de estratificação em lagos de água doce, a respiração bacteriana na camada abaixo da termoclina depleciona o suprimento de oxigênio nesta camada, desde que exista matéria orgânica sufi-ciente para oxidação pelas bactérias. Nessas águas anóxicas (livres de oxigênio) de fundo, a respiração bacteriana continua reduzindo o sulfato em vez do oxigê-nio molecular. Isso resulta no aumento de concentrações de enxofre reduzido, principalmente na forma de sulfeto de hidrogênio.

No ambiente deplecionado de oxigênio dos sedimentos de fundo e nas águas imediatamente acima deles, frequentemente inexiste oxigênio suficiente para que as bactérias nitrifiquem (oxidem) a amônia. Nessas regiões, os nutrientes são regenerados nos sedimentos aquáticos pela decomposição bacteriana da matéria

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TÓPICO 3 — REGENERAÇÃO DOS NUTRIENTES

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orgânica. Condições anaeróbias se desenvolvem abaixo da termoclina porque bactérias consomem oxigênio durante o processo. Além disso, elementos como ferro e o manganês passam de suas formas oxidadas para as reduzidas, o que afeta grandemente sua solubilidade. Em particular, à medida que o íon férrico (Fe₃⁺) é reduzido para ferroso (Fe₂⁺), complexos insolúveis de ferro fosfatados se tornam solúveis, e ambos os elementos tendem a se mover para dentro da coluna de água.

4.4 NUTRIENTES EM AMBIENTES ESTUARINOS E MANGUEZAIS

Um intenso aporte de nutrientes externos e internos torna os estuários e áreas pantanosas salgadas (manguezais) altamente produtivos. Estuários rasos, que são regiões costeiras semifechadas nas embocaduras dos rios, estão entre os ecossistemas mais produtivos da Terra. As áreas pantanosas salinas, que são áreas onde crescem uma vegetação entre os níveis mais altos e mais baixos da maré, também são altamente produtivos, em especial os manguezais das regiões tropicais. A produtividade desses ecossistemas resulta da regeneração rápida e local dos nutrientes e dos insumos externos sob a forma de nutrientes trazidos pelos rios e fluxos das marés.

Os efeitos da alta produção dos estuários e áreas alagadas costeiras se estende aos ecossistemas marinhos, em muitas áreas, através da sua exportação líquida de matéria orgânica. O manguezal exporta quase 10% de sua produção primária bruta, e quase metade de sua produção primária líquida para os ecossistemas marinhos vizinhos, na forma de organismos, detritos particulados e material orgânico dissolvido transportado pelas marés. Devido a sua alta produtividade e ao abrigo que oferecem contra organismos predadores, os manguezais e estuários são importantes áreas de alimentação para larvas e estágios imaturos de muitos peixes e invertebrados que posteriormente completam seus ciclos de vida no mar.

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RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico, você aprendeu que:

• Os ciclos de nutrientes nos ecossistemas terrestres e aquáticos resultam de reações químicas e bioquímicas semelhantes, expressas em ambientes físicos e químicos diferentes.

• A regeneração de nutrientes em ecossistemas terrestres ocorre no solo. O intemperismo da rocha e a consequente liberação de novos nutrientes acontece lentamente se comparado com assimilação de nutrientes do solo pelas plantas. Portanto, a produtividade da vegetação depende da regeneração dos nutrientes da serapilheira e de outros detritos orgânicos.

• Os nutrientes são regenerados a partir da serapilheira pela lixiviação de substâncias solúveis; do consumo por grandes detritívoros; dos fungos que decompõe a celulose e lignina; e da eventual mineralização de fósforo, nitrogênio e enxofre principalmente por bactérias.

• Em muitos climas tropicais, os solos profundamente intemperizados retêm pouco os nutrientes. Nesses ambientes, a regeneração e a assimilação de nutrientes acontecem rapidamente, e a maioria dos nutrientes, especialmente o fósforo, está na vegetação viva. Quando a vegetação desses solos é eliminada para agricultura, eles imediatamente perdem sua fertilidade porque os nutrientes são removidos juntamente com a cobertura vegetal. A matéria orgânica no solo se decompõe rapidamente, e os nutrientes que são liberados e não assimilados são lavados do solo.

• Os sedimentos dos fundos dos lagos e oceanos lembram os solos terrestres, mas diferem deles em dois importantes aspectos: os sedimentos aquáticos são espacialmente removidos dos locais de assimilação de nutrientes pelas plantas aquáticas e algas, e os sedimentos aquáticos frequentemente desenvolvem condições anóxicas (sem oxigênio) que retardam a regeneração de alguns nutrientes.

• A produtividade primária dos sistemas aquáticos é mantida pelo transporte de nutrientes vindos dos sedimentos de fundo para superfície, como ocorre em águas rasas e áreas de ressurgência, pela reciclagem dos nutrientes regenerados dentro da zona fótica e pela importação de nutrientes de outros sistemas.

• A mistura vertical é inibida pela estratificação térmica. A estratificação aumenta a produção aquática ao reter o fitoplâncton dentro da zona fótica, mas diminui a produção na medida em que a sedimentação de detritos carrega nutrientes abaixo da profundidade, onde a luz é suficiente para a fotossíntese.

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• A produtividade primária dos sistemas marinhos é geralmente limitada pela disponibilidade de nutrientes. Os nutrientes limitantes podem ser o silício ou o ferro no mar aberto, onde ambos elementos tendem a deixar a coluna de água na forma de sedimentos: o silício nas conchas das diatomáceas e o ferro em complexos precipitados com outros elementos, como o fósforo.

• As comunidades marinhas de águas rasas particularmente estuários e manguezais são extremamente produtivas por causa da rápida regeneração local de nutrientes e da entrada adicional de nutrientes externos dos sistemas terrestres e marinhas adjacentes. Os manguezais e os estuários são grandes exportadores tanto de carbono orgânico quanto de nutrientes minerais para os sistemas marinhos vizinhos.

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1 Os processos de regeneração de nutrientes são diferentes em sistemas terrestres e aquáticos. Ambos os sistemas apresentam transformações químicas e bioquímicas semelhantes: oxidação de carboidratos, nitrificação e oxidação quimioautotrófica de enxofre, entre muitas outras. Apesar disso, os sistemas terrestres e aquáticos diferem na base material para regeneração de nutrientes. Com base no exposto, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) As rochas ígneas (granito e basalto, por exemplo) são importantes fontes de nitrogênio para o solo através do intemperismo.

b) ( ) Os ciclos de nutrientes nos ecossistemas terrestres e aquáticos resultam de reações químicas e bioquímicas diferentes.

c) ( ) Uma importante fonte de novos nutrientes em sistemas aquáticos é o intemperismo que promove a liberação de cálcio (Ca²⁺), potássio (K⁺), sódio (Na⁺) e Magnésio (Mg²⁺).

d) ( ) Em ecossistemas terrestres, a maior parte do metabolismo do ecossistema é aeróbica, e a maioria dos elementos circula através de detritos na superfície do solo.

2 Os nutrientes frequentemente limitam a produção nos oceanos. De modo geral, a produção primária em ecossistemas marinhos está intimamente relacionada com o suprimento de nutrientes, particularmente nitrogênio, nas camadas superficiais de água. Com base no exposto, analise as sentenças a seguir:

I- Em águas profundas respiração bacteriana utiliza todo o oxigênio molecular para oxidar a amônia.

II- Áreas que possuem fortes ressurgências, apresentam baixa produtividade primária.

III- A produtividade primária dos oceanos apresenta altas taxas de fixação de carbono em mares rasos, tanto nos trópicos quanto nas altas latitudes.

Assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.b) ( ) Somente a sentença II está correta.c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 A mistura vertical da água requer muita entrada de energia para acelerar as massas de água e mantê-las em movimentos. O movimento vertical da água pode ser impedido em sistemas aquáticos quando a luz do Sol aquece a água da superfície, estabelecendo uma termoclina ou quando a

AUTOATIVIDADE

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água doce flutua sobre a água salgada mais densa. Esta última situação acontece em estuários, nas bordas do gelo em derretimento e quando a chuva extremamente densa. Com base no exposto, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

( ) Em regiões árticas e subárticas, devido à forte presença de águas geladas, a termoclina e mais pronunciada que em outras regiões do planeta.

( ) Uma situação típica de muitos lagos e lagoas de zonas temperadas é aquela em que a estratificação térmica durante o verão impede a mistura vertical.

( ) O movimento vertical da água pode ser impedido em sistemas aquáticos quando a luz do Sol aquece a água da superfície, estabelecendo uma termoclina.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V – F – F.b) ( ) V – F – V.c) ( ) F – V – F.d) ( ) F – V – V.

4 A regeneração de nutrientes em ecossistemas terrestres ocorre principalmente no solo. As plantas assimilam os elementos presentes no solo muito mais rapidamente do que são gerados pelo intemperismo do material parental. Disserte sobre como a qualidade dos detritos em ecossistemas terrestres influencia a taxa de regeneração dos nutrientes.

5 Em ecossistemas aquáticos os nutrientes são regenerados lentamente nas camadas profundas de água e sedimentos pelo movimento de nutrientes para dentro das camadas inferiores de água e depósitos de sedimentos bentônicos, a partir dos quais serão regenerados e retornarão às zonas de produtividade. Disserte sobre as diferenças entre solos e sedimentos nos processos de regeneração de nutrientes.

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UNIDADE 2

1 INTRODUÇÃO

O sucesso de um organismo, de um grupo de organismos ou de uma comunidade biótica inteira depende de um complexo de condições. Qualquer condição que se aproxime ou exceda os limites de tolerância é chamada de condição limitante ou fator limitante. Sob condições estáveis, o constituinte essencial disponível em valores que mais se aproxima da necessidade mínima tende a ser um limitante, um conceito chamado de lei do mínimo de Liebig. O conceito é menos aplicável sob condições transitórias, quando as quantidades e, portanto, os efeitos de muitos constituintes estão se modificando rapidamente.

Este Tópico 4 apresenta breves revisões sobre aspectos naturais, físicos e químicos do ambiente que possam atuar como fatores limitantes para o desenvolvimento tanto de organismos quanto de ecossistemas. Para apresentar o que é conhecido nesse campo, seriam necessários vários livros especialmente sobre ecologia fisiológica ou ecofisiologia e está além do escopo do presente trabalho.

Espécies com amplas distribuições geográficas quase sempre desenvolvem populações adaptadas localmente. Os limites de tolerância destes organismos estão ajustados às condições locais. Entretanto, em se tratando de aspectos nutricionais, o excesso de nutrientes apresenta-se tão danoso quanto a sua escassez. Situações provocadas pelo estresse antropogênico podem levar às condições de saturação e outros efeitos adversos tais como toxicidade do ambiente e na cadeia alimentar, perda de produtividade em sistemas agrícolas, e descontrole biológico no manejo de pragas. Compreender como ocorre a regulação natural do ambiente possibilita a correta gestão e uso eficiente dos recursos naturais.

TÓPICO 4 —

FATORES DE REGULAÇÃO NOS ECOSSISTEMAS

2 CONCEITO DE FATORES LIMITANTES: A LEI DO MÍNIMO DE LIEBIG

A ideia de que um organismo não é mais forte que o elo mais fraco de sua cadeia ecológica de exigências foi claramente expressa pelo Barão Justus von Liebig em 1840. Liebig foi um pioneiro nos estudos dos efeitos de vários fatores sobre o crescimento das plantas, especialmente de culturas domésticas. Ele descobriu, como os agricultores de hoje, que o rendimento dos cultivos estava frequentemente limitado não pelos nutrientes necessários em grandes quantidades, como o dióxido de carbono e água, pois estes são geralmente

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UNIDADE 2 — COMPONENTES DO ECOSSISTEMA

abundantes no ambiente, mas por alguma matéria-prima (como o zinco) necessária em quantidades diminutas, mas muito escassa no solo. Seu enunciado de que “o crescimento de uma planta depende da quantidade de material alimentar que está presente em quantidade mínima” ficou conhecido como lei de Liebig.

Um trabalho extensivo desde o tempo de Liebig mostrou que dois princípios auxiliares devem ser adicionados ao conceito para que esse seja útil na prática. O primeiro é uma limitação de que a lei do mínimo de Liebig é aplicável sob condições relativamente estáveis; ou seja, quando os fluxos médios de entrada de energia e materiais equilibram os fluxos de saída em um ciclo anual. A título de ilustração, vamos supor que o dióxido de carbono seja o principal fator limitante em um lago e, portanto, a produtividade seja controlada pelas taxas de abastecimento de dióxido de carbono vinda da degradação da matéria orgânica. Suponhamos, também, que a luz, o nitrogênio, fósforo e outros elementos vitais estejam disponíveis em excesso para o uso (portanto não são fatores limitantes). Se uma tempestade trouxesse mais dióxido de carbono para dentro do lago, a taxa de produção mudaria e dependeria também de outros fatores. Enquanto a taxa está mudando, é menos provável que haja apenas um constituinte mínimo. Em vez disso, a reação depende da concentração de todos os constituintes presentes, que nesse período de transição difere da taxa normal em que o constituinte menos abundante está sendo adicionado. A taxa de produção mudaria rapidamente conforme vários constituintes fossem sendo esgotados, até que algum constituinte, talvez de novo o dióxido de carbono, se tornasse limitante. O sistema lacustre estaria de novo operando a uma taxa controlada pela lei do mínimo.

A segunda consideração importante é a interação de fator. Assim, uma alta concentração ou disponibilidade de alguma substância, ou ação de algum fator que não o constituinte mínimo, pode modificar a taxa de uso do fator limitante. Algumas vezes os organismos podem substituir, ao menos em parte, uma substância deficiente no ambiente por outra quimicamente relacionada. Assim, onde o estrôncio é abundante, os moluscos podem, em parte, substituir o cálcio pelo estrôncio em suas conchas. Algumas plantas parecem necessitar de menos zinco quando crescem na sombra do que quando crescem a luz plena do Sol, portanto uma baixa concentração de zinco no solo seria menos limitante para as plantas na sombra que para as plantas nas mesmas condições sob luz solar plena.

2.1 CONCEITO DOS LIMITES DE TOLERÂNCIA

Não somente algo de menos pode ser um fator limitante, como proposto por Liebig (1840) mas também algo em excesso (como no caso do nitrogênio documentado no ciclo do nitrogênio no Tópico 1 desta Unidade), como em fatores tais como luz, calor e água. Assim, os organismos têm um mínimo e um máximo ecológico; a amplitude entre esses dois representa os limites de tolerância. O conceito do efeito limitante máximo, assim como mínimo, de constituintes, foi incorporado à lei de tolerância de Shelford (SHELFORD, 1913). A partir de então, muito trabalho tem sido feito na “ecologia do estresse”, de modo que os

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limites de tolerância nos quais várias plantas e animais podem existir são bem conhecidos. São de especial utilidade o que se pode chamar de teste de estresse, feitos em laboratórios e em campo, nos quais organismos são submetidos a uma série de amplitudes experimentais de condições (BARRETT; ROSENBERG, 1981). Tal abordagem fisiológica tem ajudado os ecólogos a entender a distribuição dos organismos na natureza; no entanto, isso é só uma parte da história. Todos os requisitos físicos podem estar bem dentro dos limites de tolerância de um organismo, o qual, ainda pode falhar por causa de interações biológicas, como competição ou predação. Os estudos em ecossistemas intactos devem acompanhar os estudos experimentais em laboratório, que isolam indivíduos das suas populações e comunidades.

Alguns princípios auxiliares à lei da tolerância podem ser descritos como segue: (1) os organismos podem ter uma grande amplitude de tolerância para um fator e uma estreita amplitude para outro; (2) os organismos com grandes amplitudes de tolerância a fatores limitantes provavelmente terão distribuição geográfica mais ampla; (3) quando as condições não são ótimas para uma espécie em relação a um fator ecológico, os limites de tolerância podem ser reduzidos a outros fatores ecológicos. Por exemplo, quando o nitrogênio do solo é limitante, a resistência da gramínea à seca é reduzida (é necessário mais água para evitar que murche em níveis baixos de nitrogênio do que em níveis altos); (4) na natureza, é comum os organismos não viverem em uma amplitude ótima de um fator físico em particular. Em tais casos, algum outro ou outros fatores devem ter maior importância. Por exemplo, a gramínea marinha Spartina alterniflora, que domina as marismas da costa leste dos Estados Unidos, cresce melhor em água doce que em água salgada, mas na natureza é encontrada somente em água salgada, aparentemente porque pode exudar o sal de suas folhas melhor que outras plantas enraizadas de brejo (isto é, porque esse mecanismo possibilita à gramínea marinha vencer seus competidores); (5) a reprodução é um período crítico quando fatores ambientais parecem ser mais limitantes. Os limites de tolerância de indivíduos reprodutivos, sementes, ovos, embriões, plântulas e larvas são geralmente mais estreitos que os das plantas e animais adultos não reprodutivos. Assim, uma árvore de cipreste adulto vai crescer submersa na água ou em planaltos secos, mas não poderá se reproduzir a menos que haja umidade e solo não inundados para o desenvolvimento das plântulas. Siris azuis adultos e muitos outros animais marinhos podem tolerar água salobra ou doce que tem alto conteúdo de cloreto, por essa razão são frequentemente encontrados rio acima, a alguma distância. As larvas, no entanto, não podem viver nessas águas; portanto, essa espécie não pode se reproduzir no ambiente do rio e nunca se estabelece ali. Entre outros exemplos.

Para um grau relativo de tolerância, entrou em uso uma série de termos em ecologia que usam os prefixos esteno, que significa “estreito”, e euri, que significa “amplo”. Assim:

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• Estenotérmico-euritérmico: refere-se à tolerância estreita e ampla, respectivamente, da temperatura.

• Estenoídrico-eurídrico: refere-se à tolerância estreita e ampla respectivamente, da água.

• Estenoalino-eurialinos: refere-se à tolerância estreita e ampla respectivamente, da salinidade.

• Estenofágico-eurifágico: refere-se à tolerância estreita e ampla, respectivamente, do alimento.

• Estenoécio-euriécio: refere-se à tolerância estreita e ampla, respectivamente, da seleção de habitat.

Esses termos se aplicam não somente ao nível de organismo, mas também nos níveis de comunidade e ecossistema. Por exemplo, os recifes de coral são muito estenotérmicos, ou seja, prosperam somente em uma estreita margem de temperatura. Uma queda de 2 °C prolongada é estressante, causa “branqueamento” ou perda das algas simbióticas que possibilita aos corais prosperar em águas com o nível de nutriente muito baixo.

O conceito de fatores limitantes é valioso porque abre uma oportunidade ao ecólogo para estudar ecossistemas complexos. As relações ambientais de organismos são complexas, felizmente, nem todos os fatores possíveis são importantes na mesma medida em uma situação para um organismo em particular. Se um organismo tem um amplo limite de tolerância ao fator relativamente constante presente em quantidades moderadas do ambiente, é provável que esse fator não seja limitante. Ao contrário, se é um fato conhecido que um organismo tem limites definidos de tolerância por um fator que também é variável no ambiente, então esse fator merece estudo cuidadoso, pois pode ser limitante. Por exemplo, o oxigênio é tão abundante, constante e disponível em ambientes da superfície terrestre que raramente é limitante para organismos terrestres, exceto para parasitas ou organismos que vivem no solo ou a grandes altitudes. No entanto, o oxigênio é relativamente escasso e variável na água; assim, é muitas vezes um fator limitante importante para organismos aquáticos, em especial animais.

Um exemplo de fatores limitantes no nível de ecossistema é a descoberta de que dois nutrientes minerais, ferro e sílica, limitam a produção primária em áreas muito grandes dos oceanos abertos no mundo. Menzel e Ryther (1961) estão entre os primeiros a descobrir o ferro como fator limitante em seus estudos acerca das águas oceânicas ao longo das Bermudas. Martin et al. (1991) e Mullineaux (1999) revisaram a evidência de que o ferro é limitante em quase todas as partes do oceano aberto. Como as diatomáceas precisam de sílica para suas carapaças, e como esse micronutriente está presente em concentrações muito baixas na água do mar, a sílica é limitante onde as diatomáceas são parte importante do fitoplâncton (TRÉGUER; PONDAVEN, 2000).

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3 COMPENSAÇÃO DE FATOR E ECÓTIPOS

Organismos não são subjugados pelo ambiente físico; eles se adaptam e modificam o ambiente físico para reduzir os efeitos limitantes da temperatura, luz, água e outras condições físicas de existência. Essa compensação de fator é particularmente eficiente no nível de organização de comunidade, mas também ocorre dentro das espécies. As espécies com amplas distribuições geográficas quase sempre desenvolvem populações adaptadas localmente, chamadas de ecótipos, e que têm limites de tolerância ajustados às condições locais. Os ecótipos são subespécies geneticamente diferenciadas e que estão bem adaptadas a um conjunto de condições ambientais em particular. A compensação ao longo de gradiente de temperatura, luz, pH ou outros fatores geralmente envolve mudanças genéticas de ecótipos, mas tais mudanças também podem ocorrer por ajustes fisiológicos.

As espécies que exploram um gradiente de temperatura, ou outras condições, geralmente diferem no aspecto fisiológico e, às vezes, no morfológico em diferentes partes de sua amplitude. No geral, envolve mudanças genéticas, mas a compensação de fator pode ser realizada sem alteração genética por meio de ajustes fisiológicos nas funções do órgão ou por conta de deslocamento nas relações enzima-substrato no nível celular. Os transplantes recíprocos fornecem um método conveniente de determinar a extensão na qual a alteração genética está envolvida nos ecótipos. Mcmillan (1956), por exemplo, descobriu que as gramíneas de pradaria da mesma espécie (e aparentemente idênticas) transplantadas em jardins experimentais de diferentes partes de sua amplitude responderam de maneira bastante diferente em relação a luz. Em cada caso, o tempo de crescimento e reprodução estava adaptado a área de onde as gramíneas foram trazidas. A importância da fixação genética em raças locais foi sempre esquecida na ecologia aplicada; a reposição ou o transplante de plantas e animais falham porque são usados indivíduos de regiões remotas em vez de estoque localmente adaptado. Muitas vezes o transplante também interrompe interações de espécies e mecanismos regulatórios locais.

A compensação de fator ocorre tanto ao longo dos gradientes sazonais como dos geográficos. Um exemplo amplamente estudado é o do arbusto que domina os desertos quentes e de baixa altitude no sudoeste dos Estados Unidos. Apesar do arbusto ser uma planta que realiza a fotossíntese, mesmo não adaptado às condições quentes e secas, ela pode deslocar sua temperatura ótima para cima, do inverno para o verão, por aclimatação. As altas taxas de fotossíntese são mantidas por meio de aclimatação adicional ao estresse da seca, verificado através do potencial hídricos na folha.

Em ambientes pobres em nutrientes, a reciclagem eficiente entre os autótrofos e os heterótrofos compensa a escassez de nutriente. Os recifes de coral e as florestas pluviais são exemplos previamente citados. Os nutrientes nitrogenados nas águas do Atlântico Norte apresentam teores tão baixos que são

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difíceis de ser detectados por instrumentos padronizados. Mesmo assim, ocorre a fotossíntese do fitoplâncton a altas taxas. A rápida e eficiente tomada dos nutrientes liberados pela excreção do zooplâncton e da ação bacteriana compensa a escassez geral de nitrogênio.

4 CONDIÇÕES DE EXISTÊNCIA COMO FATORES REGULATÓRIOS

Os organismos não só se adaptam ao ambiente físico no sentido de tolerá-lo, mas também usam as periodicidades naturais no ambiente físico para marcar o tempo de suas atividades e “programar” seus ciclos de vida para que possam se beneficiar de condições favoráveis. Realizam isso por meio de relógios biológicos, mecanismos fisiológicos de medida de tempo. A manifestação mais comum e, talvez mais básica, é o ritmo circadiano, (de circa = “cerca”, e dies = “dia”), ou a capacidade de cronometrar e repetir funções em intervalos de cerca de 24 horas, mesmo na ausência de situações ambientais bem definidas como a luz do dia. Quando se adicionam interações entre organismos e seleção natural recíproca entre espécies (co-evolução), a comunidade inteira se torna programada para responder à sazonalidade e a outros ritmos.

O ritmo circadiano dos seres humanos fica transtornado quando sofremos o “jet lag“ após uma longa viagem de avião. O relógio biológico é estabelecido por meio de ritmos biológicos e físicos que permitem aos organismos antecipar periodicidades diárias, sazonais, de marés e outras. Existe evidência crescente de que o ajuste real é obtido mediante oscilações celulares que operam como uma alça de retroalimentação envolvendo genes (DUNLAP, 1998). Os ritmos circadianos e seus osciladores celulares subjacentes são onipresentes em organismos biológicos, sendo usados para antecipar o melhor momento para se alimentar, florescer (no caso das plantas), migrar, hibernar, e assim por diante.

Uma situação confiável pela qual os organismos medem o tempo de suas atividades sazonais nas zonas temperadas é o comprimento do dia ou fotoperíodo. Em contraste com a maioria dos outros fatores sazonais, o comprimento do dia é sempre o mesmo para uma dada estação do ano e localidade. A amplitude do ciclo anual do comprimento do dia aumenta com aumento da latitude, fornecendo, assim, uma referência tanto latitudinal como sazonal. O fotoperíodo tem se mostrado o gatilho que dispara as sequências fisiológicas que causam o crescimento e a floração de muitas plantas; a troca de penas/pêlos, o acúmulo de gordura, a migração e a reprodução das aves e dos mamíferos; o início da hibernação ou diapausa (estágio de dormência) dos insetos. A fotoperiodicidade é acoplada com o relógio biológico do organismo para criar um mecanismo de contagem de tempo de grande versatilidade.

O comprimento do dia age por meio de um receptor sensorial, como o olho em um animal ou um pigmento especial nas folhas de uma planta, que, por sua vez, ativa um ou mais sistemas hormonais e enzimáticos integrados que

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produzem a resposta fisiológica comportamental. Apesar de animais e plantas superiores serem muito divergentes em sua morfologia, a conexão fisiológica com a fotoperiodicidade ambiental é similar.

Entre as plantas superiores, algumas espécies florescem conforme aumenta o comprimento dos dias, são as plantas de dias longos; outras que florescem em dias curtos (menos de 12 horas) são conhecidas como plantas de dias curtos. De maneira semelhante, os animais podem responder tanto ao aumento como a redução dos comprimentos dos dias. Em muitos dos organismos sensíveis ao fotoperíodo, mas não em todos, a marcação do tempo pode ser alterada por manipulação experimental ou artificial do fotoperíodo.

As aves migratórias são refratárias a estímulos por fotoperíodo por vários meses após a migração de outono. Os dias curtos do outono são aparentemente necessários para “reiniciar” o relógio biológico e preparar o sistema endócrino para responder aos dias longos. A qualquer momento após o fim do outono, um aumento artificial no comprimento do dia iniciará a sequência de troca de penas, deposição de gordura, inquietação migratória e aumento de gônada que normalmente ocorre na primavera. A fisiologia dessa resposta em aves foi documentada pela primeira vez por FARNER (1964 a 1964 b).

Também a fotoperiodicidade em certos insetos e em sementes de plantas anuais é bem definida, porque proporciona um controle de natalidade. Por exemplo, nos insetos, os dias longos do fim da primavera e começo do verão estimulam o gânglio nervoso a secretar um hormônio que começa a produzir a diapausa ou os ovos de resistência que não irão eclodir até a próxima primavera, por mais favorável que seja a temperatura, o alimento ou outras condições. Assim, o crescimento da população é suspenso antes, em vez de depois, que a oferta de alimentos se torne crítica.

Em contraste com o comprimento do dia, a chuva no deserto é bastante imprevisível, porém as plantas anuais dos desertos, que incluem o maior número de espécies nas floras de muitos desertos, usam esse fator como um regulador. Essas plantas anuais, conhecidas como efêmeras, persistem como sementes durante os períodos de seca, mas estão prontas para germinar, florescer e produzir sementes quando a umidade estiver favorável. As sementes, em muitas dessas espécies, contêm um inibidor de germinação que precisa ser lavado por uma certa quantidade de água de chuva. Esse aguaceiro fornece toda a água necessária para completar novamente o ciclo de vida até as sementes. As plantas jovens crescem com rapidez na brilhante luz do Sol no deserto que se segue à chuva. Elas começam a florescer e produzir sementes quase imediatamente. Permanecem pequenas, sem caules ou sistemas radiculares elaborados, com toda a energia dirigida para o florescimento e produção de sementes. Se essas sementes forem colocadas no solo úmido na estufa, não germinarão; no entanto, o fariam ser tratadas com aguaceiro simulado com magnitude necessária. As sementes podem permanecer viáveis no solo por muitos anos, como que “esperando” pelo aguaceiro adequado, o que explica por que os desertos apresentam floração (se tornam rapidamente coberto por flores) logo após uma chuva pesada.

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UNIDADE 2 — COMPONENTES DO ECOSSISTEMA

Fatores biológicos serão considerados na Unidade 3 nos Tópicos 1 e 2 em que tratam os aspectos relevantes a populações e comunidades biológicas.

ESTUDOS FUTUROS

A ecofisiologia é a parte da ecologia que diz respeito às respostas dos organismos individuais ou das espécies aos fatores abióticos, como a temperatura, luz, umidade, gases atmosféricos etc. Vamos abordar aqui alguns poucos fatores importantes que os ecólogos precisam apreciar para entender as relações abióticas e bióticas em níveis mais elevados da organização bioecológica.

5.1 TEMPERATURA

Comparada com a amplitude de milhares de graus conhecidos que ocor-rem no universo, a vida como conhecemos pode existir somente dentro de uma pequena faixa de cerca de 300 °C (de -200 °C até 100 °C). A maioria das espécies e das atividades estão restritas a uma faixa ainda mais estreita de temperatura. Alguns organismos, especialmente em um estágio de repouso, podem existir a temperaturas muito baixas, enquanto alguns microrganismos, principalmente bactérias e algas, podem viver e se reproduzir em nascentes hidrotérmicas, nas quais a temperatura está próxima do ponto de ebulição. A tolerância superior de temperatura para as bactérias de nascentes hidrotérmicas é de 80 °C para ciano-bactéria, comparada com os 50 °C para os peixes e insetos mais tolerantes. Em ge-ral, os limites superiores são mais críticos que os inferiores, apesar de muitos or-ganismos funcionarem de forma mais eficiente em direção aos limites superiores de suas amplitudes de tolerância. Amplitude de variação da temperatura tende a ser menor em água do que em terra, e os organismos aquáticos geralmente têm amplitudes mais estreitas de tolerância à temperatura que os animais terrestres. A temperatura, portanto, é importante como fator limitante.

A temperatura é um dos fatores ambientais mais fáceis de se medir. O termômetro de mercúrio, um dos primeiros e mais usados instrumentos de precisão científica, foi agora substituído pelos aparelhos (sensores) elétricos, como termômetros de resistência de platina, pares termoelétricos e termistores, que

5 OUTROS FATORES FÍSICOS LIMITANTES

O amplo conceito de fatores limitantes não se restringe aos fatores físicos, pois as inter-relações biológicas são tão importantes quanto esses fatores no controle da distribuição real e da abundância dos organismos na natureza.

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permitem não somente medir em lugares de difícil acesso, mas também registrar contínua e automaticamente as medidas. Além disso, os avanços na radiotelemetria tornam possível transmitir informações de temperatura do corpo de um lagarto no fundo de sua toca ou de uma ave migratória voando alto na atmosfera.

A variabilidade de temperatura é extremamente importante do ponto de vista ecológico. Uma temperatura que flutua entre 10 °C e 20 °C, com média em torno de 15 °C, não tem necessariamente o mesmo efeito nos organismos com uma temperatura constante de 15 °C. Os organismos sujeitos a temperaturas variáveis na natureza (como na maioria das regiões temperadas) tendem a ser deprimidos, inibidos ou mais vagarosos quando estão sob temperaturas constantes. Por exemplo, SHELFORD (1929), em um estudo pioneiro, descobriu que os estágios de ovos e larvas (ou pupa) do bicho da maçã (Cydia pomonella) se desenvolveram 7% a 8% mais rápido sob condições de temperatura variável do que sob uma temperatura constante, com a mesma média. Assim, o efeito estimulante das temperaturas variáveis, nas zonas temperadas pelo menos, pode ser encarado como um princípio ecológico bem aceito, especialmente porque a tendência foi conduzir trabalho experimental no laboratório sobre condições de temperatura constante.

5.2 LUZ

A luz coloca os organismos no cerne de um dilema: a exposição direta do protoplasma à luz causa morte, embora a luz do Sol seja a fonte fundamental de energia e sem a qual a vida não poderia existir. Consequentemente, muitas das características estruturais e comportamentais dos organismos estão preocupadas em resolver esse problema. De fato, como observado na discussão sobre hipótese de Gaia (Unidade 1), a evolução da biosfera tem envolvido a “adaptação” da radiação solar que a atinge, de modo que os comprimentos de onda úteis possam ser explorados, ao passo que os perigosos possam ser mitigados ou evitados. A luz, portanto, não é só um fator vital, é também um fator limitante, tanto no seu nível máximo como no mínimo. Não há, talvez, outro fator de maior interesse para os ecólogos.

Duas faixas de comprimento de onda penetram de imediato atmosfera da Terra, a faixa do visível, com algumas partes das faixas adjacentes, e a faixa de rádio de baixa frequência, com comprimentos de ondas maiores que 1 cm. Não se sabe se as ondas longas de rádio são significantes no aspecto ecológico, apesar de alguns pesquisadores declararem existir efeitos positivos em aves migratórias ou outros organismos.

Do ponto de vista ecológico, a qualidade (comprimento de onda ou cor), a intensidade (energia real medida em gramas-calorias) e a duração (comprimento do dia ou fotoperíodo) da luz são reconhecidas como importantes. Tanto os animais como as plantas respondem a diferentes comprimentos de onda de luz. A visão de cores nos animais ocorre esporádicamente em diferentes grupos taxonômicos, sendo bem desenvolvida em certas espécies de artrópodes, peixes,

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UNIDADE 2 — COMPONENTES DO ECOSSISTEMA

5.3 RADIAÇÕES IONIZANTES

aves e mamíferos, mas não em outras espécies do mesmo grupo (entre mamíferos, por exemplo, a visão de cor é bem desenvolvida somente em primatas). A taxa de fotossíntese varia com diferentes comprimentos de onda. Em ecossistemas terrestres, a qualidade da luz solar não variar o suficiente para ter um efeito diferencial importante na taxa de fotossíntese, mas quando a luz penetra na água, os vermelhos e os azuis são filtrados por atenuação, e a luz esverdeada resultante é pouco absorvida pela clorofila. As algas marinhas vermelhas (Rhodophyta), no entanto, apresentam pigmentos suplementares (ficoeritrunas), capacitando-as a usar essa energia e a viver em profundidades maiores do que seria possível para as algas verdes.

A intensidade luminosa (entrada de energia) impingida à camada autotrófica controla o ecossistema inteiro por meio de sua influência na produção primária. O relacionamento entre a intensidade luminosa e a fotossíntese tanto nas plantas terrestres como nas aquáticas segue o mesmo padrão geral de aumento linear até um nível ótimo ou de saturação de luz, seguido, em muitas instâncias, por um decréscimo nas altas intensidades da luz solar plena. No entanto, algumas plantas, ao realizarem a fotossíntese, atingem a saturação a altas intensidades e não são inibidas pela luz solar plena.

O fator compensação ocorre em relação a luz porque tanto as plantas individuais quanto as comunidades se adaptam a diferentes intensidades luminosas ao se tornarem plantas de sombra (atingindo a saturação em baixas intensidades) ou plantas de sol. As diatomáceas que vivem na areia da praia ou em planícies lodosas de maré são extraordinárias por que atingem a taxa máxima de fotossíntese quando a intensidade luminosa é menor que 5% da luz solar total. Ainda assim, essas diatomáceas são pouco inibidas pelas altas intensidades. As algas do fitoplâncton, ao contrário, são adaptadas à sombra e são muito inibidas pelas altas intensidades, o que explica o fato de o pico de produção no mar geralmente ocorrer abaixo em vez de logo na superfície.

As radiações de energia muito alta podem remover os elétrons dos átomos e fixá-los em outros átomos, produzindo com isso pares iônicos positivos e negativos, conhecidos como radiações ionizantes. A luz e a maioria das outras radiações solares não têm este efeito ionizante. Acredita-se que a ionização seja a principal causa dos danos da radiação à vida, e que a avaria é proporcional ao número de pares iônicos produzidos no material absorvente. As radiações ionizantes são produzidas pelos materiais radioativos na Terra e também são recebidas do espaço. Os isótopos dos elementos que emitem as radiações ionizantes são chamados de radionucleídeos ou radioisótopos.

A radiação ionizante no ambiente tem aumentado perceptivelmente pelos esforços humanos em usar a energia atômica. Os testes com armas nucleares injetam radionucleídeos na atmosfera que, depois, retorna à Terra como “chuva” global. Cerca de 10% da energia de uma arma nuclear é expendida em radiação

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residual. As usinas nucleares (e os processamentos de combustível e disposição de resíduos em outros locais), pesquisas médicas e outros usos pacíficos da energia atômica produzem “pontos quentes” locais e resíduos que frequentemente escapam para o ambiente durante o transporte ou o armazenamento. A falha em evitar as emissões acidentais e em resolver o problema dos resíduos radioativos são as principais razões por que a energia atômica não alcançou o seu potencial como fonte de energia para as sociedades humanas.

Das três radiações ionizantes de interesse ecológico primário, duas são corpusculares (radiações alfa e beta) é uma eletromagnética (radiação gama e a radiação X relacionada). A radiação corpuscular consiste em correntes de partículas atômicas subatômicas que transferem sua energia para qualquer material que atingem. As partículas alfas são núcleos de átomos de hélio que viajam somente alguns centímetros no ar e podem ser barradas por uma folha de papel ou a epiderme da pele humana, mas quando isso ocorre produzem uma grande quantidade de ionização no local. As partículas betas são elétrons de alta velocidade (partículas muito menores que podem viajar vários metros no ar ou até alguns centímetros para dentro do tecido e liberam a sua energia ao longo de um trecho maior). As radiações eletromagnéticas ionizantes são de comprimentos de onda muito mais curtos que a luz visível; viajam grandes distâncias e penetram na matéria imediatamente, liberando sua energia em longos trechos (a ionização é dispersada). Por exemplo, os raios gama penetram facilmente em materiais biológicos; um raio gama pode atingir um organismo sem ter nenhum efeito ou pode produzir ionização sobre um longo trecho. O efeito dos raios gama depende do número e da energia do raio, bem como da distância que o organismo está da fonte, pois a intensidade decresce exponencialmente com a distância.

A série alfa-beta-gama é de penetração crescente, mas de concentração de ionização medida no local decrescente, portanto, os biólogos classificam as substân-cias radioativas que emitem partículas alfa ou beta como emissores internos, porque seu efeito máximo provável será quando for absorvido, ingerido ou de outra forma depositado dentro ou próximo do tecido vivo. Ao contrário, a substâncias radioativas que são primariamente emissoras gama são classificadas como emissores externos, porque são penetrantes e podem produzir efeitos sem que sejam ingeridas.

Outros tipos de radiação de interesse dos ecólogos incluem raios cósmi-cos, que são radiações de fora do espaço exterior e constam de uma mistura de componentes corpusculares e eletromagnéticos. A intensidade dos raios cósmicos na ecosfera é baixa, mas eles são um grande perigo nas viagens espaciais. Os raios cósmicos e a radiação ionizante de fontes naturais radioativas no solo e na água produzem o que é chamado de radiação de fundo, à qual as biotas atuais estão adaptadas. De fato, a biota pode depender dessa radiação de fundo para manter a fluidez genética. A radiação de fundo varia de três a quatro vezes em várias partes da ecosfera; seu valor é mínimo na superfície do mar ou abaixo dela, e é máximo em grandes altitudes, como nas montanhas graníticas. Os raios cósmicos aumen-tam a intensidade com aumento da altitude, e as rochas graníticas apresentam mais radionucleídeos (que ocorre naturalmente) do que as rochas sedimentares.

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UNIDADE 2 — COMPONENTES DO ECOSSISTEMA

Um estudo do fenômeno da radiação requer dois tipos de medidas: (1) uma medida do número de desintegrações que ocorrem em uma quantidade de substâncias radioativas; e (2) uma medida da dosagem de radiação em termos de energia absorvida que possa causar ionização e avaria. A unidade básica da quantidade de substância radioativa é o curie (Ci), definida como a quantidade de material no qual 3,7 x 1010 átomos desintegram a cada segundo, ou 2,2 × 1012 desintegrações por minuto. O peso real do material que forma um curie é muito diferente para um isótopo de longa vida e decaimento lento, comparado a um decaimento rápido. Como um curie representa uma quantidade relativamente grande de radioatividade do ponto de vista biológico, são muito mais usadas unidades menores: milicurie (mCi) = 10-3 Ci; microcurie (µCi) = 10-6 Ci; nanocurie (nCi) = 10-9 Ci; e picocurie (pCi) = 20-12 Ci. O curie indica quantas partículas alfa ou beta, ou raios gama, são emitidos de uma fonte radioativa por unidade de tempo.

A dosagem, outro aspecto importante da radiação, tem sido medida em diversas escalas. A unidade mais conveniente para todos os tipos de radiação é o rad, definido como uma dose absorvida de 100 ergs (10-5 joules) de energia por grama de tecido. Roentgen (R) é uma unidade mais antiga que, de modo rigoroso, deve ser usada somente para raios X e gama. Para os efeitos em organismos vivos, o rad e o roentgen são quase a mesma coisa. O roentgen ou rad é a unidade da dosagem total. A taxa de dosagem é a quantidade recebida por unidade de tempo. Assim, se um organismo está recebendo 10 mR por hora, a dose total em um período de 24 horas seria de 240 mR por hora, ou 0,240 R/h. O tempo em que uma dose é recebida é uma consideração importante.

Em geral, os organismos superiores e mais complexos são mais facilmente prejudicados ou mortos pela radiação ionizante. Os seres humanos são um dos mais sensíveis. Doses altas únicas, liberadas em intervalos curtos (minutos ou horas), são conhecidas como doses agudas, em contraste com as doses crônicas de radiação subletal que podem ocorrer continuamente por todo o ciclo de vida.

A maioria dos estudos mostra que células em divisão rápida são as mais sensíveis à radiação (o que explica por que a sensibilidade diminui com a idade). Assim, qualquer componente que passar por crescimento rápido pode ser afetado por níveis baixos de radiação, independentemente das relações taxonômicas. Os efeitos das doses crônicas de baixo nível são mais difíceis de medir, porque podem estar envolvidos efeitos genéticos, assim como somáticos de longo prazo.

Em plantas superiores, a sensibilidade às radiações ionizantes tem sido demonstrada como diretamente proporcional ao tamanho do núcleo da célula ou, mais especificamente, o volume de cromossomos ou conteúdo de DNA. No campo, outras considerações, como a proteção das partes sensíveis em crescimento ou regeneração (quando subterrâneas), determinariam a sensibilidade relativa.

Quando os radionucleídeos são liberados no ambiente, geralmente são dispersos e diluídos, mas podem se concentrar em organismos vivos durante a transferência na cadeia alimentar, o que é classificado sob o título geral de

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TÓPICO 4 — FATORES DE REGULAÇÃO NOS ECOSSISTEMAS

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magnificação biológica. A substâncias radioativas também podem se acumular em solos, a água, sedimentos ou ar se a entrada exceder a taxa natural de decaimento radioativo; assim, uma quantidade aparentemente inócua de radioatividade pode logo se tornar letal.

A razão entre a quantidade de radionucleídeos em um organismo em relação ao ambiente é chamada de fator de concentração. O comportamento químico de um isótopo radioativo é essencialmente o mesmo do isótopo não radioativo do mesmo elemento. Portanto, a concentração observada no organismo não é o resultado da radioatividade, mas demonstra, de modo mensurável, a diferença entre a densidade do elemento em um ambiente e no organismo. Por exemplo, o iodo-131 radioativo (131I) se concentra na tireoide como um iodo não radioativo. Alguns radionucleídeos sintéticos também se concentram por causa de sua afinidade química com os nutrientes que são naturalmente concentrados pelos organismos.

5.4 ÁGUA

A água é uma necessidade fisiológica para toda a vida, e do ponto de vista ecológico, um fator limitante nos ambientes terrestres e aquáticos nos quais a quantidade pode flutuar muito ou a alta salinidade provoca a perda de água dos organismos por osmose. A chuva, a umidade, o poder de evaporação do ar e o suprimento disponível de água superficial são os principais fatores medidos.

5.4.1 Chuva

A chuva é determinada principalmente pela geografia e pelo padrão de grandes movimentos do ar ou de sistemas de condições meteorológicas. A distri-buição de chuvas durante o ano também é um fator limitante muito importante para os organismos. Por exemplo, a situação proporcionada por uma chuva com volume de 890 mm, uniformemente distribuída ao longo do tempo, é bem diferente da fornecida por 890 mm de chuva que cai durante uma parte restrita do ano. Nesse último caso, plantas e animais devem ser capazes de sobreviver a longas secas (e a enchentes súbitas). A chuva tende a ser distribuída de forma desigual entre as estações nas regiões tropicais e subtropicais, muitas vezes resultando em estações bem definidas de chuva e seca. Nos trópicos, esse ritmo sazonal de umidade regula as atividades sazonais (em especial a reprodução) dos organismos, tanto quanto o ritmo sazonal da temperatura e da luz regula os organismos que vivem nas zonas temperadas. Nos climas temperados, a chuva tende a ser mais uniformemente dis-tribuída ao longo do ano, apesar das muitas exceções.

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5.4.2 Umidade

A umidade representa quantidade de vapor de água no ar. A umidade absoluta é a quantidade real de água no ar expressa como peso de água por unidade de ar (gramas por quilograma de ar, por exemplo). Como a quantidade de vapor de água que o ar pode reter (na saturação) varia com a temperatura e a pressão atmosférica, a umidade relativa representa a porcentagem de vapor de água realmente presente, comparada com a densidade de saturação sob condições existentes de temperatura e pressão. Em geral, umidade relativa tem sido a medida mais usada no trabalho ecológico, apesar de o inverso da umidade relativa, déficit da pressão de vapor (diferença entre a pressão parcial de vapor de água na saturação e a pressão de vapor real), ser muitas vezes referido como uma medida das relações de umidade, porque a evaporação tende a ser proporcional ao déficit de pressão de vapor em vez de proporcional à umidade relativa.

Por conta do ritmo diário da umidade na natureza (alta à noite e baixa durante o dia, por exemplo), bem como das diferenças verticais e horizontais, a umidade, a temperatura e a luz ajudam a regular as atividades dos organismos e a limitar sua distribuição. A umidade é importante pelo fato de modificar os efeitos na temperatura.

5.4.3 Poder de evaporação do ar

O poder de evaporação do ar é importante do ponto de vista ecológico, especialmente para as plantas terrestres. Os animais podem, muitas vezes, regular suas atividades para evitar desidratação, mudando-se para lugares protegidos ou tornando-se ativos a noite; as plantas, no entanto, não podem se mover. Entre 97% e 99% da água que passa do solo para as plantas é perdida por meio da evaporação pelas folhas. Essa evaporação, chamada de evapotranspiração, é a característica única da energética dos ecossistemas terrestres. Quando a água e os nutrientes não são limitantes, o crescimento das plantas terrestres é bastante proporcional ao suprimento total de energia na superfície do solo. Como a maior parte da energia é calor, e como a fração que fornece o calor latente para a transpiração é quase constante, o crescimento é também proporcional à transpiração.

Apesar das muitas complicações biológicas e físicas, a evapotranspiração total está amplamente relacionada a taxa de produtividade. Por exemplo, Rosenzweig (1968) descobriu que a evapotranspiração é um descritor bastante significativo na previsão da produção primária líquida anual acima do solo (Pn) em comunidades terrestres maduras ou clímax de todos os tipos (desertos, tundras, campos e florestas); no entanto, a relação não é confiável em vegetação instável ou em desenvolvimento. A baixa correlação entre a energia assimilada e Pn nas comunidades em desenvolvimento tem lógica, pois essas comunidades não atingiram ainda as condições de equilíbrio entre os seus ambientes de energia e de água.

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A razão entre produção primária líquida e a quantidade de água transpirada é chamada eficiência de transpiração e é expressa em gramas de matéria seca produzida por 1000 g de água transpirada. Muitas espécies de produtos agrícolas (e uma grande amplitude de espécies não cultivadas) têm eficiência de transpiração de dois ou menos (ou seja, 500 gramas ou mais de água perdida por grama de matéria seca produzida). Os cultivos resistentes à seca, como o sorgo (Sorghum bicolor) e o milho-miúdo (Panicum ramosum), têm eficiência de transpiração de até quatro. No entanto as plantas do deserto podem ter menos que essa eficiência. Sua adaptação singular envolve não a habilidade de crescer sem transpiração, mas a capacidade de se tornar dormente quando não há água disponível (em vez de murchar e morrer, como seria o caso das plantas não desérticas). As plantas de deserto que perdem suas folhas e expõem somente brotos ou caules verdes durante os períodos de seca mostram uma alta eficiência de transpiração. Os cactos que empregam o tipo específico de fotossíntese, reduzem a perda de água mantendo seus estômatos (estrutura biológica responsável por trocas gasosas) fechados durante o dia.

5.4.4 Suprimento de água superficial

O suprimento de água superficial disponível está, certamente, relacionado com a chuva na área, mas existem discrepâncias por conta da natureza do substrato no qual a chuva cai. As dunas costeiras são exemplos de locais em que mesmo que ocorram chuvas abundantes na região, toda água é drenada com tanta rapidez através do solo poroso que as plantas, especialmente as herbáceas, encontram pouca água disponível na camada mais superficial desse solo. As plantas e os pequenos animais dessas áreas comportam-se como os organismos das regiões mais secas.

Além disso, o represamento artificial de água corrente através das represas ajudou aumentar a disponibilidade de suprimento hídricos local, assim como a criar recreação e energia hidrelétrica. No entanto, esse aparato de engenharia mecânica, por mais útil que seja, não deveria ser visto como substituto de práticas de uso de terra seguras como agricultura e silvicultura, que represam a água em suas fontes ou perto delas para maior utilidade. Do ponto de vista ecológico, a água como mercadoria cíclica no ecossistema é muito importante.

Ainda, o orvalho pode contribuir de forma considerável e, em áreas de baixa precipitação, de forma vital para o fornecimento de água. O orvalho e o nevoeiro baixo são importantes em florestas costeiras e desertos. O nevoeiro na costa oeste dos Estados Unidos representa até duas a três vezes mais água que a precipitação anual. Árvores altas, como a sequoia costeira (Sequoia sempervirens), interceptam o nevoeiro costeiro que se move para o continente e podem colher até 150 cm de “chuva” que pinga dos galhos.

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5.5 ÁGUA SUBTERRÂNEA

Para a humanidade, a água subterrânea é um dos recursos mais importantes, porque temos acesso, em muitas regiões, a uma grande quantidade de água além daquela que cai como chuva. As cidades e a agricultura irrigada, localizadas em desertos e outras regiões secas, são possíveis graças ao acesso a água subterrânea. Infelizmente, muito dessa água foi armazenada em eras passadas e não está sendo reposta ou está sendo reposta a uma taxa mais lenta do que está sendo explorada. A água subterrânea de regiões áridas, assim como o petróleo, é um recurso não renovável.

A água subterrânea fornece 25% da água doce usada para todos os propósitos nos Estados Unidos, e cerca de 50% da água de abastecimento. O uso da água em irrigação no país aumentou continuamente de 1965 a 1980 porque o uso da água em irrigação depende de fatores como a precipitação, disponibilidade de água, custos energéticos, preços de mercadorias agropecuárias, aplicação de tecnologia e práticas de conservação. A quantidade total de água usada para irrigação diminuiu de 1980 a 1995, embora a área total irrigada permaneça consistente em cerca de 23,5 milhões de hectares (PIERZYNSKI et al., 2000). Esses dados sugerem que fatores como práticas de conservação, uso reduzido de energia e tecnologias apropriadas podem diminuir significativamente a quantidade de água subterrânea usada em irrigação. Assim como no caso de outros capitais naturais abundantes, a água subterrânea tende a ser considerada como certa e foi muito pouco estudada até que sinais de seu esgotamento e poluição mostraram que fatores limitantes estavam envolvidos.

Os maiores estoques de água subterrânea estão em aquíferos, estratos subterrâneos por porosos muitas vezes compostos de pedra calcária, areia ou cascalho, limitados por rochas ou argila impermeáveis que mantém a água como um tanque gigante. A água entra por locais onde os estratos permeáveis estão próximos a superfície ou de alguma maneira cruzam o lençol freático superficial; a água pode sair do aquífero pelas fontes (mina d’água) ou outras descargas na superfície ou próximo dela. Onde o declive do aquífero segue em direção ao mar, vindo de áreas de recarga em altitudes maiores, a água no aquífero mais profundo fica sob pressão e jorra acima da superfície, como um chafariz ao se cavar um poço.

A entrada (chuva ou recarga do cinturão de neve) e a saída (água que retorna para o ciclo hidrológico dos rios, oceanos e atmosfera) anuais para esse enorme reservatório estão estimadas em torno de uma e 120 partes do volume total. Apesar de as retiradas totalizarem somente cerca de 1/10 do volume de recargas, alguns aquíferos mais intensamente utilizados estão localizados em regiões de baixa ou nenhuma recarga. Por exemplo, cerca de 1/4 de todas as retiradas dos aquíferos são saldos negativos (que excedem a recarga), principalmente nas regiões agrícolas do oeste dos Estados Unidos.

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O esgotamento não é a única ameaça para água subterrânea. A contaminação por substâncias químicas tóxicas pode ser uma ameaça ainda maior. Pelo menos o problema de resíduos tóxicos tem soluções tecnológicas, se a sociedades quiserem e estiverem aptas a pagar o custo de proteger seus recursos hídricos que, em longo prazo, são mais preciosos que o petróleo ou ouro. De fato, pode-se discutir a proposta de que para a civilização água doce utilizável é potencialmente um fator limitante maior que energia. Os problemas com água variam conforme a região, mas nenhuma região está livre de ter algum tipo de problema com a água. Como a água é encarada como mercadoria não comercial, a opinião pública e a intervenção política são importantes para impedir tanto esbanjamento como o completo esgotamento desse recurso. Não há dúvida de que a água doce de qualidade está se tornando um grave fator limitante para os humanos em escala global (GLEICK, 2000).

5.6 AÇÃO CONJUNTA DE TEMPERATURA E UMIDADE

Com base no conceito de ecossistema, evitamos criar a impressão de que os fatores ambientais operam independentemente uns dos outros. Este tópico tenta mostrar que a consideração dos fatores individuais é um meio de abordar os problemas ecológicos complexos, mas não é o objetivo final do estudo ecológico, que é o de avaliar a importância relativa dos vários fatores conforme operam em conjunto em ecossistemas reais. A temperatura e a umidade são tão importantes e interagem tão intimamente nos ambientes terrestres que são considerados os aspectos mais importantes do clima.

A interação entre temperatura e umidade, assim como a interação entre a maioria dos fatores, depende tanto dos valores relativos como dos valores absolutos de cada fator. Assim, a temperatura exerce um efeito limitante mais severo nos organismos tanto quando há abundância como quando há pouca umidade, ou quando em condição moderada. Do mesmo modo, a umidade é crítica em extremos de temperatura. De certa maneira, esse é outro aspecto do princípio da interação de fator. Por exemplo, o besouro-bicudo-do-algodoeiro (Anthonomus grandis) pode tolerar melhor temperaturas mais altas quando a umidade é baixa ou moderada do que quando é muito alta. A condição quente e seca no cinturão de algodão é um sinal para os fazendeiros tomarem cuidado com aumento da população de besouros. A condição quente e úmida e menos favorável para o besouro, mas, infelizmente, não tão boa para a planta do algodão.

Grandes corpos de água atenuam bastante os climas continentais por causa do alto calor latente da evaporação e das características de fusão da água, o que quer dizer que são necessárias muitas calorias de aquecimento para derreter o gelo e evaporar a água. De fato, existem dois tipos básicos de clima: (1) os climas continentais, caracterizados por temperatura e umidade extremas; e (2) os climas marítimos, caracterizados por flutuações menos extremas de temperatura e umidade, por causa dos efeitos atenuantes de grandes corpos de água (grandes lagos produzem climas marítimos locais).

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UNIDADE 2 — COMPONENTES DO ECOSSISTEMA

As classificações iniciais do clima foram baseadas principalmente em medidas quantitativas de temperatura e umidade, levando em consideração a efetividade da precipitação e da temperatura determinadas pela distribuição sazonal e valores médios. A relação entre precipitação e evapotranspiração potencial (que depende da temperatura) fornece um quadro particularmente preciso dos climas. O período de uso da umidade do solo representa o período principal da produção primária para o ecossistema e, assim, determina o fornecimento de alimento disponível para o consumidor e os decompositores durante o ciclo anual inteiro. No bioma da floresta decídua, a água provavelmente é bastante limitante apenas no fim do verão, e mais na parte sul que na parte norte do bioma. A vegetação nativa está adaptada para resistir a secas periódicas de verão, mas alguns produtos agrícolas cultivados na região não estão.

5.7 GASES ATMOSFÉRICOS

A atmosfera, na maior parte da ecosfera, é marcadamente homeostática. As concentrações atuais do dióxido de carbono (0,03% em volume) e oxigênio (21% em volume) são um tanto limitantes para muitas plantas superiores. Sabe-se que a fotossíntese em muitas plantas pode ser elevada pelo aumento moderado na concentração de dióxido de carbono, mas não é muito conhecido o fato de a redução experimental na concentração de oxigênio também aumentar a fotossín-tese. Feijões, por exemplo, aumentam sua taxa de fotossíntese em até 50% quando a concentração de oxigênio ao redor de suas folhas é reduzida a 5%. Por outro lado, gramíneas inclusive milho e cana-de-açúcar não apresentam inibição por oxigênio. A razão para inibição de plantas de folhas largas como o feijão pode es-tar relacionado com o fato de que elas evoluíram quando a concentração de dióxi-do de carbono era maior e a concentração de oxigênio era menor do que é agora.

A situação em ambientes aquáticos difere do ambiente terrestre porque as quantidades de oxigênio, dióxido de carbono e outros gases atmosféricos dis-solvem-se na água, portanto a disponibilidade para os organismos varia muito conforme a época e o local. O oxigênio é um fator limitante de suma importância, especialmente em lagos e águas com uma carga pesada de material orgânico. Apesar de o oxigênio ser mais solúvel em água que o nitrogênio, a quantidade real de oxigênio que a água pode manter sob condições mais favoráveis é muito menor que a quantidade presente na atmosfera. Assim, se 21% por volume de um litro de ar é oxigênio, haverá 210 cm² de oxigênio por litro. Em contraste, a quantidade de oxigênio por litro de água não excede 10 cm². A temperatura e o sais dissolvidos afetam muito a capacidade da água de manter o oxigênio; a so-lubilidade do oxigênio é aumentada em baixas temperaturas e reduzida em alta salinidade. O fornecimento de oxigênio na água vem de duas fontes principais: (1) por difusão do ar; e (2) por fotossíntese das plantas aquáticas. O oxigênio se difunde na água muito lentamente, a menos que tenha ajuda do vento e dos mo-vimentos da água; a penetração da luz é um fator muito importante na produção fotossintética do oxigênio. Assim, pode-se esperar variações diárias, sazonais e espaciais importantes na concentração de oxigênio nos ambientes aquáticos.

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O dióxido de carbono (CO₂), assim como o oxigênio, pode estar presente na água em quantidades variáveis. É difícil fazer afirmações gerais sobre o papel do dióxido de carbono como um fator limitante nos sistemas aquáticos. Apesar de estar presente em baixas concentrações no ar, o dióxido de carbono é extremamente solúvel na água, que também obtém grande abastecimento da respiração, da decomposição e do solo. Portanto, a concentração mínima de CO₂ parece ser menos importante que é a do oxigênio. Além disso, diferente do oxigênio, o dióxido de carbono combina quimicamente com a água para formar o H₂CO₃ (ácido carbono), que, por sua vez, reage com o calcário disponível para formar os carbonatos (CO₃) e bicarbonatos (HCO₃). Um reservatório estoque importante de CO₂ biosférico é o sistema carbonato dos oceanos. Os compostos carbonatados não só fornecem uma fonte de nutrientes, mas também agem como tamponadores, ajudando a manter a concentração do íon hidrogênio (pH) dos ambientes aquáticos perto do ponto neutro. Aumentos moderados de CO₂ da água parecem aumentar a fotossíntese e os processos de desenvolvimento de muitos organismos. O enriquecimento por CO₂, aliado ao aumento de nitrogênio e fósforo, pode ajudar a explicar a eutrofização. As altas concentrações de CO₂ podem ser limitantes para os animais, em especial porque essas altas concentrações de dióxido de carbono estão associadas às baixas concentrações de oxigênio. Os peixes respondem intensamente às altas concentrações de CO₂ e podem morrer se a água estiver muito carregada de CO₂ livre.

A concentração de íon hidrogênio, ou pH, está intimamente relacionada ao ciclo do dióxido de carbono e tem sido muito estudada em ambientes aquáticos naturais. A menos que os valores de pH sejam extremos, as comunidades compensam as diferenças em pH e apresentam uma ampla tolerância à faixa de valores que ocorre de forma natural. No entanto, quando a alcalinidade total é constante, a mudança de pH é proporcional à mudança de CO₂, portanto é um indicador útil da taxa de metabolismo total da comunidade (fotossíntese e respiração). Os solos e águas de baixo pH (ácidos) frequentemente apresentam deficiência em nutrientes e têm baixa produtividade.

5.8 MACRONUTRIENTES E MICRONUTRIENTES

Sabe se hoje que cerca da metade dos 92 elementos da tabela periódica são essenciais para plantas ou animais ou, na maioria dos casos para ambos. Como já foi dito (principalmente no Tópico 1 desta Unidade 2), os sais de nitrogênio e fósforo são de grande importância.

O potássio, cálcio, ou enxofre e o magnésio merecem consideração, bem como o nitrogênio fósforo. Os moluscos e vertebrados precisam de cálcio em grandes quantidades para o esqueleto, e o magnésio é um elemento necessário da clorofila, sem o qual nenhum ecossistema pode operar. Os elementos e seus compostos necessários em quantidades relativamente grandes são conhecidos como macronutrientes.

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UNIDADE 2 — COMPONENTES DO ECOSSISTEMA

Recentemente, há um grande interesse pelo estudo dos elementos e os compostos necessários para o funcionamento dos sistemas vivos, mas exigidos somente em quantidades muito pequenas, frequentemente como componentes de enzimas vitais. Esses elementos são chamados de elementos traço ou micronutrientes. Como as exigências mínimas parecem estar associadas igualmente ou até de maneira mais reduzida a uma ocorrência no ambiente, esses micronutrientes são importantes como fatores limitantes. O desenvolvimento de métodos modernos de microquímica, espectrografia, difracção por raio X e análise biológica tem aumentado muito nossa capacidade de medir até mesmo as menores quantidades de micronutrientes. Também, a disponibilidade de radioisótopos para muitos elementos traço tem estimulado bastante a realização de estudos experimentais. As doenças de deficiência resultantes da ausência de elementos traço são conhecidas há muito tempo.

Os sintomas patológicos foram observados em plantas e animais de laboratório, tanto domésticos como selvagens. Sob condições naturais, os sintomas de deficiência desse tipo estão algumas vezes associados a histórias geológicas peculiares, outras, a um ambiente de alguma forma deteriorado, possivelmente resultado direto de uma gestão inadequada de habitat ou paisagem pelos homens. Um exemplo de uma história geológica peculiar ocorreu no sul da Flórida. Os solos orgânicos potencialmente produtivos dessa região não atingiram expectativas para cultivos e gado, até que se descobriu que essa região sedimentar tinha escassez de cobre e cobalto, elementos presentes na maioria das outras áreas.

Dez micronutrientes são especialmente importantes para as plantas: ferro (Fe), manganês (Mn), cobre (Cu), zinco (Zn), boro (B), silício (Si), Molibdênio (Mo), cloro (Cl), Vanádio (V) e cobalto (Co). Esses elementos podem ser organizados em três grupos de acordo com as funções: (1) os que são exigidos para a fotossíntese: manganês, ferro, cloro, zinco e vanádio; (2) os que são exigidos para o metabolismo do nitrogênio: molibdênio, boro, ferro e cobalto; e (3) os que são exigidos para outras funções metabólicas: manganês, boro, cobalto, cobre e silício. Todos esses elementos, com exceção do boro, são essenciais para os animais, que também podem exigir selênio (Se), cromo (Cr), níquel (Ni), flúor (F), iodo (I), estanho (Sn) e talvez até mesmo o arsênio (As) (MERTZ, 1981). A linha divisória entre macro e micronutrientes não é clara nem é a mesma para todos os grupos de organismos; O sódio (Na) e o cloro (Cl), por exemplo, são necessários em maiores quantidades para os vertebrados do que para as plantas. O sódio, de fato, é muitas vezes adicionado à lista precedente como um micronutriente para as plantas. Muitos micronutrientes parecem vitaminas porque agem como catalisadores. Os metais traço frequentemente combinam-se com compostos orgânicos para formar os metalo-ativadores; o cobalto, por exemplo, é um constituinte fundamental da vitamina B12. Goldmann (1960) documentou um caso no qual o molibdênio era limitante para um ecossistema inteiro quando descobriu que a adição de cem partes por bilhão de molibdênio à água de um lago de montanha aumentava

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TÓPICO 4 — FATORES DE REGULAÇÃO NOS ECOSSISTEMAS

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a taxa de fotossíntese. Ele também descobriu que nesse lago em particular, a concentração de cobalto era alta o suficiente para inibir o fitoplâncton. Como no caso dos macronutrientes, excesso de micronutrientes pode ser tão limitante quanto a sua falta.

5.9 VENTO E ENCHENTE

Os meios atmosférico e hidrosférico onde os organismos vivem raramente estão parados por completo em qualquer período. As correntes na água não somente influenciam muito a concentração de gases e nutrientes como também agem como fatores limitantes no nível das espécies e também como subsídios de energia que aumentam a produtividade no nível de ecossistema. Assim, as diferenças entre as composições específicas das comunidades de um córrego e de uma pequena lagoa estão relacionadas com a grande diferença nas correntes de vento e água. Muitas plantas e animais de córrego estão morfológica e fisiologicamente adaptados para manter sua posição na correnteza e são conhecidos por ter limites de tolerância muito definidos para esse fator específico. Entretanto, o fluxo de água que age como um subsídio de energia é uma chave para a produtividade dos ecossistemas de área úmida e de maré.

No ambiente terrestre, o vento exerce um efeito limitante sobre atividades, comportamentos e até distribuição dos organismos. As aves, por exemplo, ficam quietas em locais protegidos em dias de vento. As plantas podem ser estruturalmente modificadas pelo vento, em especial quando outros fatores são também limitantes como nas regiões alpinas. Em regiões de elevada altitude o vento limita o crescimento das plantas que estão expostas a ele.

No entanto, o movimento do ar pode aumentar a produtividade da mesma maneira que o fluxo da água, como é o caso de certas florestas pluviais tropicais. As tempestades são importantes, mesmo que apenas em nível local. Os furacões transportam animais e plantas por grandes distâncias e, quando essas tempestades atingem a terra, os ventos podem mudar a composição das comunidades da floresta durante muitos anos depois. Por outro lado, em regiões secas, o vento é um fator limitante importante para as plantas, porque aumenta a taxa de perda de água por transpiração, embora as plantas do deserto tenham desenvolvido muitas adaptações para tolerar essas limitações.

6 ESTRESSE ANTROPOGÊNICO COMO FATOR LIMITANTE

Os ecossistemas naturais exibem considerável resistência, resiliência ou ambas, em caso de perturbação aguda ou severa periódica, provavelmente porque ao longo do tempo evolutivo eles se adaptaram a ela. Muitos organismos, de fato, exigem perturbações estocásticas (aleatórias) ou periódicas, como fogo ou tempestades, para persistência em longo prazo. Portanto, os ecossistemas podem se recuperar razoavelmente bem de muitas perturbações antropogênicas periódicas, como a remoção da colheita. As perturbações crônicas (persistentes

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ou continuadas), no entanto, podem ter efeitos pronunciados e prolongados, especialmente no caso de substâncias químicas industriais que são novas para o ambiente. Nesses casos, os organismos não têm história evolutiva de adaptação. A menos que o aumento de volume de resíduos altamente tóxicos, que são os atuais subprodutos das sociedades industrializadas de alta energia, sejam reduzidos eliminados em sua fonte, os resíduos tóxicos irão ameaçar cada vez mais a saúde dos humanos e do ecossistema e, nesse caso, se tornar um fator limitante importante para humanidade.

Embora qualquer classificação seja de alguma forma arbitrária, pode ser instrutivo considerar o estresse antropogênico sobre os ecossistemas segundo duas categorias: (1) estresse agudo, caracterizado pelo aparecimento repentino, aumento abrupto da intensidade e curta duração; e (2) estresse crônico, envolvendo longa duração ou recorrência frequente, mas não alta intensidade, uma perturbação “constantemente incomoda”. Os ecossistemas naturais apresentam uma capacidade considerável de lidar com estresse agudo ou se recuperar dele. Por exemplo, quando ocorre uma alta entrada de lodo de esgoto em um ecossistema de córrego que resulta na mortandade de peixes porque a decomposição bacteriana do lodo fez com que o conteúdo de oxigênio do córrego se aproximasse de zero. Uma vez que cesse o despejo de esgoto cujo colapso causou estresse agudo, o córrego iniciará o processo de recuperação. Outro exemplo de recuperação seguindo um estresse agudo e a estratégia do banco de sementes, um mecanismo de recuperação rápida que facilita a recuperação da floresta após um corte raso (MARKS, 1974).

Os efeitos do estresse crônico são mais difíceis de avaliar porque as respostas não são tão dramáticas. Pode levar anos até que todos os efeitos sejam conhecidos, como levou anos para entender a conexão entre o câncer e a radiação ionizante crônica de baixo nível. O “câncer” ambiental (crescimento desorganizado de espécies exóticas em níveis de população ou comunidade) parece oferecer uma situação análoga com respeito aos sistemas ecológicos.

De preocupação especial para a saúde humana são os resíduos industriais contendo estressores potenciais que são criações químicas novas e, portanto, fatores ambientais para os quais os organismos e ecossistemas vivos não tiveram um período de história evolutiva para adaptação ou acomodação. Pode-se esperar que a exposição crônica a esses fatores antropogênicos resulte em mudanças básicas na estrutura e função das comunidades bióticas, em especial quando ocorrem aclimatações e adaptações genéticas. Durante a transição ou período de adaptação, os organismos podem estar vulneráveis a fatores secundários, como as doenças, o que pode ter resultados catastróficos.

Um dos maiores perigos e desastres potenciais é a contaminação da água subterrânea nos aquíferos profundos que fornecem uma grande porcentagem da água para as cidades, indústria e agricultura. Ao contrário da água superficial, a água subterrânea é quase impossível de ser purificada após ter sido poluída,

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porque ela não é exposta a luz solar, ao fluxo intenso, ou a qualquer outro processo natural de purificação que limpa a água superficial. Agora, as cidades nos corações industriais não podem usar mais água subterrânea local para o abastecimento por causa da contaminação; precisam bombeá-la a um preço elevado.

A manipulação de resíduos tóxicos antes de 1980 foi considerada uma “externalidade” de negócio, sem a devida atenção. O material indesejado era simplesmente jogado fora em algum lugar, até que diversos desastres locais começaram a vir a público. A solução para o problema do lixo tóxico é a redução da fonte, ou seja, eliminar os resíduos em sua fonte por meio da reciclagem, desintoxicação e busca de materiais menos tóxicos para a manufatura (ODUM, 1989; 1997). A redução da fonte pode ser atingida pela combinação de regulamentação e incentivos.

6.1 POLUIÇÃO DO AR

A poluição do ar fornece o sinal de retroalimentação negativa que pode salvar a sociedade industrializada da extinção porque (1) fornece um sinal claro de perigo que é facilmente percebido por todos; e (2) quase todos contribuem (ao dirigir um carro, usar eletricidade, comprar um produto, e assim por diante) e sofrem com ela. Uma solução holística deve evoluir, porque tentativas de parte a parte para lidar com qualquer poluente (abordagem de uma solução para cada problema) não são apenas ineficientes, elas só deslocam o problema de um lugar ou ambiente para o outro.

A poluição do ar também fornece um exemplo de sinergismo amplificador, no qual as combinações de poluentes reagem no ambiente para produzir poluição adicional, o que agrava e muito o problema original (em outras palavras, o efeito total é maior que a soma dos efeitos individuais). Por exemplo, dois componentes do escapamento de um automóvel se combinam na presença da luz solar para produzir substâncias novas e ainda mais tóxicas, conhecidas como smog fotoquímico:

Ambas as substâncias secundárias não só causam lacrimejamento e problemas respiratórios em humanos, mas também são extremamente tóxicas para as plantas. O ozônio aumenta a respiração das folhas, matando a planta ao esgotar seu alimento. O peroxiacetil nitrato bloqueia a fotólise da água (transferência dos átomos de hidrogênio para os transportadores de hidrogênio e a liberação do oxigênio para a atmosfera) na fotossíntese, matando a planta ao cessar a produção de alimento. As variedades mais tenras de plantas cultivadas se tornam as primeiras vítimas, de modo que certos tipos de agricultura e horticultura não são mais possíveis perto de grandes cidades. Outros poluentes fotoquímicos com o nome genérico de hidrocarbonetos policíclicos aromáticos (HPA) são sabidamente cancerígenos.

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UNIDADE 2 — COMPONENTES DO ECOSSISTEMA

6.2 POLUIÇÃO TÉRMICA

A poluição térmica está se tornando um exemplo comum de estresse crônico, porque o aquecimento de baixo proveito é um subproduto de qualquer conversão de energia de uma forma para outra, como enuncia a segunda lei da termodinâmica. As usinas elétricas e outros conversores de energia emitem grandes quantidades de calor no ar e na água, por sua vez, as usinas nucleares requerem grandes volumes de água para o seu resfriamento.

Consequentemente, é necessária uma quantidade significativa de água superficial para dispersar o calor, algo na ordem de 1,5 acres/megawatts em um local temperado, ou 4.500 acres (1.822 ha) para uma usina de 3.000 megawatts de potência.

Ou uso de equipamentos de resfriamento abastecidos, como as torres de resfriamento, podem reduzir o espaço e o volume de água necessários, é claro, mas a um custo considerável, porque os combustíveis caros substituem a energia solar. Também, as torres de resfriamento podem causar impactos ambientais seu cloro ou outra substância química for usada para manter suas superfícies livres de algas.

Em geral, o aumento da temperatura da água em lagoas, lagos ou córregos seguem um gradiente subsídio-estresse, do qual resultam respostas positivas e negativas. Os aumentos moderados geralmente atuam como subsídio no sentido de que a produtividade da comunidade aquática e o crescimento de peixes pode ser aumentado, mas com o tempo, ou com o aumento da carga de aquecimento, os efeitos do estresse começam a aparecer.

6.3 PESTICIDAS

Aplicações cada vez mais intensas de inseticidas e outros pesticidas na agricultura resultaram na contaminação do solo e da água. Essa ameaça à saúde dos ecossistemas e dos humanos pode logo ser reduzida pela simples razão de que é a dependência exclusiva de venenos químicos falhou em obter controle em longo prazo, mas acabou produzindo altos e baixos no rendimento da produção. Os sistemas alternativos de controle de pragas têm sido desenvolvidos e podem reduzir brevemente a necessidade de aplicações maciças do que são, na realidade, venenos muito perigosos.

Paradoxalmente, a resiliência e adaptabilidade da natureza é a causa básica do insucesso dos inseticidas de amplo espectro o, como os organoclorados (por exemplo, o DDT) e os organofosforados (por exemplo, o malation). Com frequência excessiva, as pragas desenvolvem imunidade ou se tornam ainda mais abundantes após a dissipação ou detoxificação do pesticida, porque seus inimigos naturais foram destruídos pelo tratamento. Também uma espécie de praga que tinha sido exterminada com sucesso algumas vezes substituída por outras espécies mais resistentes, menos conhecidas e, portanto, ainda mais difíceis de lidar.

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TÓPICO 4 — FATORES DE REGULAÇÃO NOS ECOSSISTEMAS

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Os esforços para controlar pragas do algodão dão um exemplo claro da síndrome de altos e baixos. O algodão foi uma das produções mais intensamente tratadas com inseticidas; antes de 1970, até 50% de todos os inseticidas usados na agricultura dos Estados Unidos foi borrifado sobre o algodão. Na década de 1950, a pulverização aérea maciça de hidrocarbonetos colorados no vale Canete, no Peru, possibilitada pelos fundos de auxílio ao exterior dos Estados Unidos, resultou na duplicação do rendimento durante cerca de seis anos. Depois, no entanto, se seguiu uma completa falência da produção, pois as pragas se tornaram resistentes e outras espécies de insetos apareceram. O mesmo aconteceu na década de 1960 no estado do Texas, um importante produtor de algodão, como documentado em detalhe por Adkisson et al. (1982). Em ambos os casos, os rendimentos foram restabelecidos pela adoção do que é hoje conhecido como manejo integrado de pragas ou manejo de pragas com base ecológica, que envolve práticas culturais e de manejo que desencorajam as pragas, a promoção de parasitas e predadores de inseto e ervas daninhas (controle biológico), bem como engenharia biológica de plantas que produzem seus próprios inseticidas, combinado com uso prudente de pesticidas menos tóxicos de vida curta.

O novo sistema de controle confirma uma sabedoria antiga de bom senso: não vale a pena colocar todos os ovos em uma só cesta. A diversidade e a resiliência da natureza devem ser confrontadas com as diversas inovações tecnológicas, que devem ser atualizadas conforme as condições mudam e a natureza reage. Em outras palavras, a “guerra” contra as pragas e as doenças provavelmente nunca poderá ser “ganha”, mas envolve um esforço contínuo, que é um dos custos de “esvaziar a desordem”, necessário para manter uma civilização grande e complexa. Odum e Odum (2000) revisaram algumas das práticas de manejo no nível de paisagem como a superfertilização e a vulnerabilidade da monocultura à invasão de pragas; mitigar essas influências seria a última no controle ecológico dos insetos.

Na década de 1960, houve um otimismo considerável para o que Carol Williams (1967) chamou de “terceira geração de pesticidas”. A primeira geração, de acordo com a classificação de Williams, foi de pesticidas botânicos ou sais inorgânicos; a segunda geração foi de hidrocarbonetos colorados e organofosforados de amplo espectro. A terceira geração é de pesticidas bioquímicos, hormônios e feromônios (atrativos sexuais) que dirigem o comportamento e são específicos das espécies, que se adiciona ao arsenal disponível para o manejo integrado de pragas. No geral, agricultura industrial em nível mundial continua a depender demais da segunda geração.

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168

LEITURA COMPLEMENTAR

SISTEMAS AGRÍCOLAS

H.T. Odum, E.C. Odum, M.T. Brown, D. LaHart, C. Bersok,

J. Sendzimir, Graeme B. Scott, David Scienceman & Nikki Meith

1 INTRODUÇÃO

Os sistemas agrícolas são a principal fonte mundial de alimentos para a po-pulação. Estes sistemas, algumas vezes chamados agroecossistemas, normalmente consistem de várias partes e processos. Incluem: uma área de cultivo (com solos formados por processos geológicos e ecológicos prévios), produção e equipamen-tos para semeação e colheita, limpeza do terreno e safra. É necessário um mercado para comprar a produção e promover o dinheiro para a aquisição de combustíveis, fertilizantes, mercadorias e serviços que mantém funcionando o sistema.

Um agroecossistema é um sistema em que o ser humano atua como administrador e consumidor. Em um ecossistema selvagem os animais atuam como consumidores e administradores. Os organismos selvagens espalham constantemente sementes e invadem o território dos agroecossistemas. Se os fazendeiros não controlassem os agroecossistemas com pesticidas, limpando a terra, arando e outros métodos, o ecossistema selvagem se restabeleceria por si mesmo. As fazendas podem prosperar devido ao valor de trabalho realizado previamente pelo ecossistema selvagem no desenvolvimento do solo. A maioria dos fazendeiros gradualmente esgotam o solo ainda que este seja fertilizado. A rotação do solo para voltar à sucessão natural se chama usualmente ciclo sem cultivo e é um método para reestruturar o solo.

Primitiva, a agricultura de baixa energia usa o trabalho humano e de animais da fazenda sem combustível ou maquinaria elétrica. A agricultura intensiva moderna envolve um grande fluxo de combustível e maquinaria elétrica. Usa muita energia para produzir todos os bens e serviços, assim como também o processamento e transporte de produtos. Este tipo de agricultura necessita mais recursos para conseguir maior rendimento (produtos produzidos) por pessoa, por área, e por dólar. Uma das questões mais importantes de nosso tempo é saber se a agricultura será substituída por um sistema que use menos energia. Se pensou que isto poderia acontecer quando combustíveis e outros recursos fossem insuficientes e necessitassem de muito trabalho para obtê-los.

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Dois séculos atrás, a maioria das fazendas eram altamente autossuficientes com operações familiares. Um granjeiro produzia de acordo com a própria necessidade e somente vendia alguns produtos. Agora, a maioria das pessoas nas cidades compram seus alimentos de mercados altamente diversificados. Estes mercados obtêm alimentos de muitas fazendas intensivas diferentes, cada uma delas especializada e com produção em massa de alguns produtos para venda.

A agricultura intensiva "moderna" usa insumos de alto custo, tais como fertilizantes, máquinas e pesticidas. Não existem sistemas completamente autossuficientes. Todavia, há um progressivo interesse em voltar a métodos menos intensivos usados antigamente. Se isso continuar por esse rumo, a aquisição desse tipo de energia (fertilizantes, serviços etc.) decrescerá. As fazendas alternarão o uso da terra para que o solo possa reabastecer-se de nutrientes.

Os tipos mais importantes de agroecossistemas mundiais podem ser classificados em três categorias:

a) cultivo de raízes (batata, mandioca, cenoura etc.) que são os alimentos principais em muitos países de latitudes tropicais;

b) cultivo de grãos (milho, trigo, aveia, cevada, arroz, centeio) alimentos de maior produção em latitudes temperadas e em climas de monções; e

c) produção de carne (gado, carneiros, aves etc.), comum em países com economia altamente desenvolvida e em muitos países frios.

A produção de raízes é em sua maioria de carboidratos. Estes abastecem o homem com o “combustível” necessário, mas não fornece as proteínas, vitaminas etc., requeridas para uma dieta balanceada. Os grãos contêm algumas proteínas. A dieta de carnes (como nos Estados Unidos e Europa) fornecem mais proteínas do que o necessário para as necessidades básicas e, às vezes, são descritas como dietas de luxo.

2 PASTAGENS DE GADO

Na Figura 1 se mostra como opera o sistema de pastoreio. A fonte de energia renovável necessária para o sistema é o sol, o vento e a chuva. O fertilizante é acrescentado. O pasto e o trevo são utilizados para o consumo direto do gado e a produção de feno para armazenar alimento no inverno e períodos de seca. Os bens e serviços se usam em todos os processos da fazenda. Mostra-se o gado em todos seus ciclos de reprodução e procriação. Mostra-se também o rendimento.

À direita do diagrama estão os fluxos de energia do processo econômico no que circula dinheiro. As aplicações de equipamento, trabalho, fertilizantes, pesticidas, blocos de sal etc., se pagam com o dinheiro obtido com a venda do gado. Pode-se ver o dinheiro das vendas indo ao depósito de dinheiro do fazendeiro e a partir daí sendo aplicado.

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FIGURA 1 – DIAGRAMA DE UM SISTEMA DE PASTO: FONTES, FLUXOS DE ENERGIA, SUMIDOURO DE CALOR, BALANÇO DE ENTRADAS E SAÍDAS E RECICLAGEM

É necessário uma administração efetiva das terras de pastoreio para produzir a maior quantidade de gado saudável ou leite no menor tempo possível. Dois limitantes particulares requerem uma administração cuidadosa: (1) os níveis de nutrientes de muitas terras são baixos, especialmente os níveis de nitratos e fosfatos; e (2) os pastos não crescem na mesma proporção ao longo de todo o ano. Isto significa que a capacidade de pastoreio varia sazonalmente. A capacidade de abastecimento se refere à quantidade de gado que uma pastagem de gado pode suportar com todos os animais relativamente saudáveis e o pastoreio proporciona quantidade suficiente de alimento (Figura 2).

FIGURA 2 – PADRÃO ESTACIONAL DE PASTO E PRODUÇÃO DE GADO EM CLIMAS COM CHUVAS DE VERÃO. O EXCEDENTE DE VERÃO É USADO COMO FORRAGEM DE GADO NO

INVERNO

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Alguns fosfatos provêm da água de chuva, e o fosfato adicional da aplicação de fertilizante com superfosfato (que é fabricado com fosfato de rocha). Os níveis de nitrato se suplementam com fertilizante de nitrogênio e pelo crescimento de trevos fixadores de nitrogênio nos pastos. Em algumas áreas, traços dos elementos cobalto e molibdênio devem ser adicionados para prevenir enfermidades nutricionais do gado.

Um exemplo periódico de crescimento do pasto, em muitas áreas de produção de gado, se mostra na Figura 2. A produção de pasto é limitada no inverno por causa das baixas temperaturas. Os fazendeiros são capazes de aumentar seu rebanho mais do que a produção normal de pasto pode suportar, o excedente da colheita de pasto de verão e outono. Além disso, algumas áreas são irrigadas em épocas secas. Cada prática administrativa, como a adição de fertilizantes e a colheita de feno, é altamente mecanizada e requer combustíveis.

Como o custo de energia de combustíveis fósseis aumenta, alguns fazendeiros estão vendo que é mais econômico empregar uma estratégia de administração de baixa energia. Isto inclui acabar com a produção de feno quase por completo e aumentando tanto a quantidade de gado como pode suportar a capacidade de sustentação natural do pasto. Os níveis de nutrientes do solo e níveis de alimentação no inverno são monitorados cuidadosamente. Desta, maneira o gado recebe somente uma dieta de sobrevivência durante o inverno. O rendimento com esta estratégia é mais baixo, todavia, a inversão na produção é também mais baixa. Esta inversão se refere ao tempo, esforço ou dinheiro utilizado para ganhar futuros benefícios lucrativos. O retorno financeiro pode ser o mesmo ou maior que na estratégia de administração de alta energia. A administração de baixa energia requer mais mão de obra.

3 AGRICULTURA AUTOSSUFICIENTE

A Figura 3 é um modelo de agroecossistema familiar que é mais autos-suficiente que o sistema de pastoreio de gado (Figura 1). A fazenda mostrada no diagrama recebeu um prêmio pelo alto grau de autossuficiência, comparável à fa-zenda dos colonizadores pioneiros. Todavia, ela necessita de uma grande aplica-ção de energia e bens da economia principal. A economia de sobrevivência na so-ciedade atual provavelmente requer que se realizem algumas compras externas.

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FIGURA 3 – DIAGRAMA DA GRANJA TAYLOR, UM AGROECOSSISTEMA DE RELATIVA AUTOSSU-FICIÊNCIA

Existem duas notáveis diferenças entre o agroecossistema da família Taylor (Figura 3) e o sistema de pastagem do gado. (1) A fazenda da família Taylor é muito diversificada (com muitas colheitas e espécies diferentes de gado) e (2) as únicas compras feitas da economia principal são equipamentos e algum alimento para porcos. Não há necessidade de fertilizantes já que o esterco do gado é reciclado como adubo. Os Taylor não usam tratores, em seu lugar contam com bois para o cultivo e arado. Usam máquinas simples e econômicas que consomem pouco combustível fóssil. Sua fazenda produz quase toda comida necessária para a família de quatro pessoas que vivem nela. Eles exportam alimento suficiente para ser consumido por quase 16 pessoas e usam o dinheiro obtido para adquirir algumas mercadorias fora e pagar a hipoteca e os impostos do uso de sua terra. O modelo da fazenda de Taylor poderia ser comum no futuro, quando a energia se fizer cada vez mais escassa.

No passado, as fazendas industriais aumentaram muito em tamanho e requereram uma aplicação alta de energia empregando poucos trabalhadores. As fazendas no futuro poderiam ser mais diversificadas e utilizar maior quantidade de pessoas. Os habitantes produziriam principalmente para satisfazer suas próprias necessidades e exportar alguns produtos para obter dinheiro.

FONTE: ODUM, H. T. et al. Ambiente, Avaliação Energética, Economia, Micro-computadores, e Políticas Públicas. Programa de Economia Ecológica, Phelps Lab, Universidade da Florida, Gainesville, julho de 1987. Tradutores e adaptadores da versão para Internet em português: Laboratório de Engenharia Ecológica e Informática Aplicada (LEIA). Disponível em: http://www.unicamp.br/fea/ortega/eco/index.htm. Acesso em: 1° jul. 2021.

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RESUMO DO TÓPICO 4

Neste tópico, você aprendeu que:

• Não somente algo de menos pode ser um fator limitante, mas também algo em excesso. Os organismos têm um mínimo e um máximo ecológico e a amplitude entre esses dois extremos representa os limites de tolerância. Indivíduos reprodutivos, sementes, ovos, embriões, plântulas e larvas geralmente possuem limites de tolerância mais estreitos que as plantas e animais adultos não reprodutivos.

• Espécies com amplas distribuições geográficas quase sempre desenvolvem ecótipos (populações adaptadas localmente), e que têm limites de tolerância ajustados às condições locais. A compensação de fator pode ser realizada sem alteração genética por meio de ajustes fisiológicos nas funções do órgão ou por conta de deslocamento nas relações enzima-substrato no nível celular.

• Os organismos não só se adaptam ao ambiente físico no sentido de tolerá-lo, mas também usam as periodicidades naturais no ambiente físico para marcar o tempo de suas atividades e “programar” seus ciclos de vida para que possam se beneficiar de condições favoráveis.

• A temperatura é importante como fator limitante. A amplitude de variação da temperatura tende a ser menor em água do que em terra, e os organismos aquáticos geralmente têm amplitudes mais estreitas de tolerância à temperatura que os animais terrestres.

• A luz é fator vital e também um fator limitante, tanto no seu nível máximo como no mínimo. Do ponto de vista ecológico, a qualidade, a intensidade e a duração da luz são importantes. Animais e as plantas respondem a diferentes comprimentos de onda de luz.

• A ionização é a principal causa dos danos da radiação à vida. A avaria é proporcional ao número de pares iônicos produzidos no material absorvente. As radiações ionizantes são produzidas pelos materiais radioativos na terra e também são recebidas do espaço. Em geral, os organismos superiores e mais complexos são mais facilmente prejudicados ou mortos pela radiação ionizante. Células em divisão rápida são as mais sensíveis à radiação.

• A água é uma necessidade fisiológica para toda a vida, e do ponto de vista ecológico, um fator limitante nos ambientes terrestres e aquáticos nos quais a quantidade pode flutuar muito ou a alta salinidade pode provocar a perda de água dos organismos por osmose. A chuva, a umidade, o poder de evapo-ração do ar e o suprimento disponível de água superficial são os principais fatores medidos.

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• Os maiores estoques de água subterrânea estão em aquíferos, muitas vezes compostos de rocha calcária, areia ou cascalho, limitados por rochas ou argila. O esgotamento e a contaminação por substâncias químicas tóxicas são uma ameaça real para esse suprimento valioso.

• A interação entre temperatura e umidade, assim como a interação entre a maioria dos fatores, depende tanto dos valores relativos como dos valores absolutos de cada fator.

• Ambientes aquáticos diferem do ambiente terrestre porque as quantidades de oxigênio, dióxido de carbono e outros gases atmosféricos dissolvem-se na água. Apesar de o oxigênio ser mais solúvel em água que o nitrogênio, a quantidade real de oxigênio que a água pode manter sob condições mais favoráveis é muito menor que a quantidade presente na atmosfera.

• Os elementos e seus compostos necessários em quantidades relativamente grandes são conhecidos como macronutrientes. Elementos e compostos necessários para o funcionamento dos sistemas vivos, mas exigidos somente em quantidades muito pequenas, são chamados de elementos traço ou micronutrientes.

• As correntes na água não somente influenciam muito a concentração de gases e nutrientes como também agem como fatores limitantes no nível das espécies e também como subsídios de energia que aumentam a produtividade no nível de ecossistema.

• Os ecossistemas podem se recuperar razoavelmente bem de muitas perturbações antropogênicas periódicas, no entanto, podem ter efeitos pronunciados e prolongados, especialmente no caso de substâncias químicas industriais tóxicos e/ou pesticidas lançados no ambiente.

• A poluição do ar também fornece um exemplo de sinergismo amplificador, no qual as combinações de poluentes reagem no ambiente para produzir poluição adicional, o que agrava e muito o problema original (em outras palavras, o efeito total é maior que a soma dos efeitos individuais).

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1 O sucesso de um organismo ou de uma comunidade biótica inteira depende de um complexo de condições. Qualquer condição que se aproxime ou exceda os limites de tolerância é chamada de condição limitante ou fator limitante. Considerando que os organismos têm um mínimo e um máximo ecológico, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Indivíduos reprodutivos, sementes, ovos, embriões, plântulas e larvas geralmente possuem limites de tolerância mais amplos que as plantas e animais adultos não reprodutivos..

b) ( ) Estenoalino-eurialinos refere-se a tolerância estreita e ampla, respectivamente, da seleção de habitat.

c) ( ) Se um organismo tem um amplo limite de tolerância ao fator relativamente constante presente em quantidades moderadas do ambiente, é provável que esse fator não seja limitante.

d) ( ) Os ecótipos são subespécies geneticamente diferenciadas e pouco adaptadas a um conjunto de condições ambientais em particular.

2 Organismos não são subjugados pelo ambiente físico; eles se adaptam e modificam o ambiente físico para reduzir os efeitos limitantes da temperatura, luz, água e outras condições físicas de existência. Essa compensação de fator é particularmente eficiente no nível de organização de comunidade, mas também ocorre dentro das espécies. Com base no exposto, analise as sentenças a seguir:

I- A compensação de fator ocorre tanto ao longo dos gradientes sazonais como dos geográficos.

II- Em ambientes pobres em nutrientes, a reciclagem eficiente entre os autótrofos e os heterótrofos compensa a escassez de nutriente.

III- A compensação de fator depende exclusivamente de alteração genética e, portanto, sem ajustes fisiológicos.

Assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.b) ( ) Somente a sentença II está correta.c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 O amplo conceito de fatores limitantes não se restringe aos fatores físicos, pois as inter-relações biológicas são tão importantes quanto esses fatores no controle da distribuição real e da abundância dos organismos na natureza. Com base no exposto, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

AUTOATIVIDADE

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( ) Os organismos medem o tempo de suas atividades sazonais nas zonas temperadas é o comprimento do dia ou fotoperíodo.

( ) As radiações ionizantes recebidas, principalmente do espaço são a principal causa dos danos da radiação à vida na Terra.

( ) Os organismos aquáticos geralmente têm amplitudes mais estreitas de tolerância à temperatura que os animais terrestres.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V – F – F.b) ( ) V – F – V.c) ( ) F – V – F.d) ( ) F – F – V.

4 Em ambientes aquáticos as quantidades de oxigênio, dióxido de carbono e outros gases atmosféricos dissolvem-se na água, portanto a disponibilidade para os organismos varia muito conforme a época e o local. Disserte sobre como o oxigênio é um fator limitante crítico em ambientes aquáticos em termos de quantidade, solubilidade e fontes de oxigênio.

5 A utilização de inseticidas para o controle de pragas trouxe consequências desastrosas, tanto para o ambiente como para as culturas que foram objeto da utilização destas substâncias. Os estudos demonstram que além das pragas desenvolverem resistência aos pesticidas, as lavouras perdem produtividade e rendimento. Neste contexto, disserte sobre como se dá o manejo de pragas com base ecológica.

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UNIDADE 3 —

UNIDADES DE ECOLOGIA

OBJETIVOS DE APRENDIZAGEM

PLANO DE ESTUDOS

A partir do estudo desta unidade, você deverá ser capaz de:

• compreender os aspectos gerais da ecologia de populações;

• explorar os mecanismos que controlam e regulam as populações;

• compreender os aspectos gerais da ecologia de comunidades;

• analisar a comunidade biológica como uma unidade natural da organi-zação ecológica;

• estudar os estágios sucessionais recorrentes nas comunidades que resul-tam na formação dos ecossistemas;

Esta unidade está dividida em três tópicos. No decorrer da unidade, você encontrará autoatividades com o objetivo de reforçar o conteúdo apresentado.

TÓPICO 1 – ECOLOGIA DE POPULAÇÕES

TÓPICO 2 – EOLOGIA DE COMUNIDADES

TÓPICO 3 – DESENVOLVIMENTO DO ECOSSISTEMA

Preparado para ampliar seus conhecimentos? Respire e vamos em frente! Procure um ambiente que facilite a concentração, assim absorverá melhor as informações.

CHAMADA

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UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

Nas Unidades 1 e 2, foram discutidas as forças físicas e químicas que atuam como funções de força primárias. Os organismos não se adaptam de forma passiva a essas forças, mas modificam ativamente e regulam o ambiente dentro dos limites impostos pelas leis da natureza que determinam a transformação de energia e a ciclagem dos materiais. Em outras palavras, os seres humanos não são a única população que modifica e tenta controlar o ambiente. Nesta Unidade 3, vamos focar nos níveis bióticos das populações e das comunidades. As interações nesses níveis entre os sistemas genéticos e os sistemas físicos afetam o percurso da seleção natural e, desse modo, determinam não apenas como os organismos individuais sobrevivem, mas também como o ecossistema muda durante o tempo evolutivo.

Uma população é constituída de indivíduos de uma espécie numa dada área principalmente vivendo em mosaicos de habitat. O número de indivíduos de uma população pode variar com o suprimento de alimentos, a taxa de predação ou a disponibilidade de lugares para ocupar entre outros fatores ecológicos naquele habitar. As condições ecológicas variam de lugar para lugar, fazendo a dinâmica de populações diferentes. Normalmente, a distância isola populações umas das outras. As mudanças numa população inteira são a soma das mudanças em todas as suas subpopulações, mas em virtude de a dinâmica das grandes e pequenas populações diferirem, as populações subdivididas possuem propriedades únicas.

Neste Tópico 1 (Unidade 3) discutiremos aspectos gerais e as causas da variação do tamanho populacional, como esta variação afeta as grandes e pequenas populações e examinaremos as consequências da dispersão entre populações. Além disso, vamos explorar a natureza do crescimento populacional examinar os fatores que limitam o tamanho das populações mostrando como estes efeitos aumentam, tanto pelos fatores dependentes ou independentes da densidade populacional, de forma colocar um controle no crescimento.

TÓPICO 1 —

ECOLOGIA DE POPULAÇÕES

2 PROPRIEDADES DA POPULAÇÃO

Conforme descrito em Odum (1953) e Odum e Barrett (2008), define-se população como qualquer grupo de organismos da mesma espécie que ocupam um espaço particular e funcionam como parte de uma comunidade biótica que, por sua vez, é definida como um conjunto de populações que funciona como uma unidade interativa por meio de transformações metabólicas coevoluídas

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UNIDADE 3 — UNIDADES DE ECOLOGIA

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em uma determinada área de um habitat físico. Uma população tem diversas propriedades que, embora mais bem expressa como variáveis estatísticas, são propriedades únicas do grupo e não são características dos indivíduos no grupo. Algumas dessas propriedades são densidade, natalidade (taxa de nascimento), mortalidade (taxa de morte), distribuição etária, potencial biótico, dispersão e formas de crescimento “r” e “K” selecionadas. As populações também possuem características genéticas que estão diretamente relacionadas a suas ecologias, ou seja, a capacidade de adaptação, sucesso reprodutivo e persistência (possibilidade de deixar descendentes durante longos períodos de tempo).

Uma população tem características ou atributos biológicos que são compartilhados com seus organismos componentes, bem como características ou atributos de grupos singulares ao grupo ou às espécies (ALLEE, 1949). Entre os atributos biológicos das populações está a história natural (a população cresce, diferencia-se e se mantém, assim como fazem os organismos). A população também tem estrutura e funções definidas que podem ser descritas. Em contraste, os atributos de grupo, como as taxas de natalidade, mortalidade, razão etária, adaptação genética e forma de crescimento, aplicam-se apenas as populações. Desse modo, o indivíduo nasce, envelhece e morre, mas há, para ele, uma taxa de natalidade, taxa de mortalidade ou razão etária.

2.1 ÍNDICES DE DENSIDADE

A densidade populacional é o tamanho de uma população em relação a uma unidade de espaço definido. Geralmente é expressa como o número de indivíduos ou da biomassa da população por área ou volume unitário, por exemplo, 200 árvores por hectares (1 hectare = 2,471 acres), ou 5 milhões de diatomáceas por metro cúbico de água). Algumas vezes, é importante distinguir entre densidade bruta, o número (ou biomassa) por unidade de espaço total e densidade ecológica, o número (ou biomassa) por unidade de espaço do habitat (área ou volume disponível que pode ser colonizado pela população). Em geral, é mais importante saber se a população está em mudança (aumentando ou diminuindo) do que saber o seu tamanho em qualquer momento. Nesses casos, os índices de abundância relativa são úteis; eles podem ser relacionados ao tempo, por exemplo, o número de aves avistados por hora. Outro índice útil é a frequência de ocorrência, como a porcentagem dos lotes amostrais ocupados pelas espécies. Em estudos descritos de vegetação, a densidade, a dominância e a frequência são frequentemente combinados para fornecer o valor da importância para cada espécie.

2.2 DENSIDADE, BIOMASSA E RELAÇÕES TRÓFICAS

Quanto mais baixo o nível trófico, mais alta a densidade e, em um deter-minado nível, quanto maiores os indivíduos, maior a biomassa. Como organis-mos grandes apresentam taxas metabólicas mais baixas por unidade de peso do que organismos pequenos, uma biomassa populacional maior pode ser mantida

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TÓPICO 1 — ECOLOGIA DE POPULAÇÕES

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em uma determinada base de energia. Quando o tamanho e a taxa metabólica dos indivíduos na população são relativamente uniformes, a densidade expressa em relação a número de indivíduos é bastante satisfatória como medida, mas, muitas vezes, esse não é o caso.

Várias medidas e termos especiais são aplicáveis apenas a populações ou grupos de populações específicas. Os ecólogos florestais, por exemplo, usam com frequência a “área basal” (área total das secções transversais dos troncos das árvores) como medida da densidade de árvores. Entretanto, os engenheiros florestais preferem “volume sólido” (metro cúbico por hectare) como uma medida da parte comercialmente utilizável da árvore. Essa e várias outras medidas de densidade, como o conceito vem sendo definido de um modo amplo, porque todas expressam, de alguma maneira, a dimensão da biomassa por unidade de área.

2.2.1 Metabolismo e tamanho dos indivíduos: lei da potência 3/4

A biomassa presente (expressa como o peso seco total ou conteúdo calórico total dos organismos presentes a qualquer tempo) que pode ser sustentada por um fluxo constante de energia em uma cadeia alimentar depende não só de sua posição na teia alimentar, mas também do tamanho dos organismos individuais (ODUM; ODUM, 2000). Portanto, uma biomassa mais baixa de organismos menores pode ser sustentada em um nível trófico particular no ecossistema. Reciprocamente, quanto maior o organismo, maior a biomassa presente. Assim, a biomassa de bactéria presente a qualquer tempo seria muito menor que a biomassa de peixes ou mamíferos, mesmo que a energia usada possa ser a mesma para ambos os grupos. Em geral, a taxa de metabolismo em animais individuais varia de acordo com a potência 3/4 de seu peso corpóreo. Potência é a probabilidade de detectar um efeito significativo do “tratamento” quando este de fato existir.

A taxa de metabolismo por grama de biomassa em organismos muito pequenos, como algas, bactérias e protozoários, é muito mais alta que a taxa metabólica por unidade de peso de organismos grandes, como árvores e vertebrados. Em muitos casos, as partes metabolicamente importantes da comunidade não são os poucos organismos grandes e distintos, mas os muitos organismos pequenos, inclusive os microrganismos invisíveis a olho nu. Dessa forma, as pequenas algas (fitoplâncton) pesando apenas poucos quilos por hectare podem, a qualquer tempo em um lago, ter um metabolismo tão alto quanto um volume muito maior de árvores em um hectare de floresta. Do mesmo modo, alguns poucos quilos de pequenos crustáceos (zooplâncton) pastejando algas podem ter uma respiração total igual a muitas centenas de quilos de búfalos pastejando grama.

A taxa de metabolismo dos organismos, ou grupos de organismos, é frequentemente estimada medindo-se a taxa pela qual oxigênio é consumido (ou no caso da fotossíntese, produzido). A taxa metabólica de um animal tende

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aumentar como a potência 3/4 do seu peso. Uma relação similar parece existir em plantas, apesar de as diferenças estruturais entre plantas e animais tornar difícil a comparação direta. As relações entre peso corpóreo (ou volume) e respiração, por indivíduo e por unidade de peso são mostradas na Figura 1. A curva mais baixa (Figura 1B) é importante porque mostra como a taxa metabólica específica de peso aumenta conforme o tamanho do indivíduo diminui. Várias teorias a respeito dessa tendência, frequentemente chamada de lei da potência 3/4, tiveram foco em processos de difusão (os organismos maiores têm menos área de superfície por unidade de peso, por meio da qual os processos de difusão podem ocorrer).

FIGURA 1 – RELAÇÃO ENTRE A RESPIRAÇÃO E O PESO CORPÓREO (A); RESPIRAÇÃO POR UNIDADE DE PESO E MASSA CORPÓREA TOTAL (B)

FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 125)

As comparações devem ser feitas em temperaturas similares, pois as taxas metabólicas são geralmente maiores em temperaturas mais altas que em temperaturas mais baixas (exceto nos casos de adaptação à temperatura). West et al. (1999) revisaram relações de escala alométrica tanto em plantas como em animais e apresentaram o seguinte modelo geral:

Y = Y° Mᵇ

Em que “Y” é a taxa metabólica; “Y°”, uma constante característica do tipo de organismo; “M”, a massa; e “b”, o expoente de escala. Os expoentes da escala frequentemente resultam em múltiplos de 1/4.

Quando se compara organismos de um mesmo tamanho geral, as relações mostradas na Figura 1 nem sempre são mantidas. Isso é de se esperar, porque muitos fatores além do tamanho afetam a taxa metabólica. Por exemplo, vertebrados de sangue quente tem uma taxa de respiração mais alta que vertebrados de sangue frio, mesmo que ambos tenham o mesmo tamanho. No entanto, a diferença é de fato relativamente menor, quando comparada com a diferença entre um vertebrado e uma bactéria. Assim, dada a mesma quantidade de energia alimentar disponível, a biomassa de um peixe herbívoro de sangue frio em uma lagoa pode ser da mesma ordem de magnitude de um mamífero

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TÓPICO 1 — ECOLOGIA DE POPULAÇÕES

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herbívoro terrestre de sangue quente. No entanto, como mencionado no Tópico 4 da Unidade 2, o oxigênio está menos disponível na água que no ar, portanto, é mais provável de ser limitante na água. Em geral, animais aquáticos parecem ter uma taxa respiratória específica relativa ao peso menor, contrariamente aos organismos terrestres no mesmo tamanho. Tal adaptação pode muito bem afetar a estrutura trófica.

A relação da lei de potência entre as densidades populacionais e a massa corpórea em mamíferos também ocorre entre consumidores primários e secundários (MARQUET, 2000). Por exemplo, a relação para os consumidores primários (herbívoros) tem uma inclinação de -3/4, ao passo que os consumidores secundários (carnívoros) são mais inclinados.

Estudando-se as relações entre tamanho-metabolismo em plantas, muitas vezes é difícil decidir o que constitui um “indivíduo”. Assim, uma árvore grande pode ser considerada um indivíduo, mas as folhas podem agir como “indivíduos funcionais”, pelo menos quando se trata da relação tamanho-área superficial. Essa relação é similar ao índice de área foliar, que é a área da folhagem da copa por unidade de área do chão. Um estudo de várias espécies de macroalgas (algas pluricelulares grandes) mostrou que as espécies com talos finos ou estreitos (e, consequentemente, com uma alta razão superfície-volume) tinham uma taxa mais alta por grama de biomassa de manufatura de alimento, respiração e assimilação de fósforo radioativo da água que as espécies contam os mais espessos. Nesse caso, os talos, ou mesmo as células individuais, eram s funcionais, e não toda a planta, o que pode incluir numerosos talos fixados ao substrato por meio de uma única estrutura de fixação.

A relação inversa entre tamanho e metabolismo também pode ser observada na ontogênese de uma única espécie. Os ovos, por exemplo, mostram uma taxa metabólica muito mais alta por grama do que os adultos maiores. A taxa metabólica específica por peso, e não o metabolismo total do indivíduo, decresce com aumento do tamanho. Assim, um ser humano adulto requer mais alimento total que uma criança pequena, mas menos alimento por quilo de peso corpóreo.

2.2.2 Energética de escala e a lei dos retornos decrescentes

Conforme aumenta o tamanho e a complexidade do sistema, o custo energético da manutenção tende a aumentar (ODUM, 1968). Uma duplicação no tamanho geralmente requer mais que a duplicação da quantidade de energia que deve ser desviada para expulsar a entropia crescente associada com a manutenção da complexidade estrutural e funcional aumentada. Existem retornos crescentes de escala ou economias de escala associados ao incremento de tamanho e complexidade, como qualidade e estabilidade aumentadas em face dos distúrbios; no entanto, existem também retornos decrescentes de escala ou deseconomias

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UNIDADE 3 — UNIDADES DE ECOLOGIA

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de escala envolvidos nos custos crescentes para expulsar a desordem. Esses retornos decrescentes são inerentes aos sistemas grandes e complexos e podem ser reduzidos até um certo ponto, porém não podem ser inteiramente mitigados.

A lei dos retornos decrescentes se aplica a todos os tipos de sistemas. Conforme um ecossistema se torna maior e mais complexo, aumenta a proporção da produção primária bruta que deve ser respirada pela comunidade para manter seus aumentos, e a proporção que pode entrar no crescimento futuro do tamanho diminui. Quando essas entradas e saídas se equilibram, o tamanho não pode aumentar mais sem ultrapassar a capacidade de manutenção, resultando em uma sequência pulsante de “explosão e colapso”.

A deseconomia de escala é uma característica intrínseca dos ecossistemas naturais, mas alguns dos custos crescentes da complexidade são equilibrados pelos benefícios que os economistas chamam de economias de escala. O metabolismo por unidade de peso decresce conforme cresce o tamanho do organismo ou da biomassa (como em uma floresta), de modo que é possível manter mais estrutura por unidade de energia. Ao adicionar circuitos funcionais e alças de retroalimentação, pode-se aumentar também a eficiência do uso de energia, bem como a reciclagem de materiais e a resistência ou resiliência à perturbação. As propriedades da eMergia e as relações mutualísticas entre os organismos também podem desenvolver um aumento na eficiência geral (ODUM, 1996). Não importa qual seja o ajuste, a entropia total que deve ser dissipada aumenta rapidamente com qualquer aumento no tamanho, de modo que cada vez mais o fluxo total de energia (produção primária bruta e mais subsídios) deve ser desviado para manutenção da respiração e, cada vez menos energia fica disponível para um novo crescimento. Quando os custos de energia de manutenção equilibram-se com a energia disponível, o tamanho teórico máximo ou a capacidade de suporte foi atingido, além do que foram estabelecidos os retornos decrescentes de escala.

2.3 MÉTODOS PARA ESTIMAR DENSIDADES POPULACIONAIS

O índice de Lincoln é um método comum de marcação e recaptura usado para estimar a densidade da população total (número de organismos de uma espécie) em uma área definida. Esse método se baseia na captura e marcação de uma fração da população total e no uso dessa fração para fazer a estimativa da densidade da população total.

A validade desse método depende das seguintes suposições: (1) que a técnica de marcação não tenha nenhum efeito negativo na mortalidade dos s marcados; (2) que os s marcados sejam liberados no local original de captura e seja permitido se misturarem com a população com base no comportamento natural;

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TÓPICO 1 — ECOLOGIA DE POPULAÇÕES

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(3) que a técnica de marcação não afete a probabilidade de serem recapturados; (4) que as marcas (como os “brincos” de orelha) não possam ser perdidas nem passem despercebidas; (5) que não haja imigração ou emigração dos indivíduos marcados ou não marcados no intervalo de tempo entre t₁ e t₂; (6) que não haja mortalidade ou natalidade significante no intervalo entre t₁ e t₂. A violação dessas suposições afetaria, obviamente, a estimativa da densidade populacional.

O método do número mínimo de indivíduos (NMI) é outro sistema de marcação e recaptura usado para estimar as densidades populacionais em um período de tempo prolongado. Esse método foi originalmente publicado como o método do calendário de captura (PETRUSEWICZ; ANDRZEJEWSKI, 1962) usando uma história de captura (calendário) registrada para cada indivíduo, seguida de um período de intensiva remoção para “atualizar o calendário” ao término do estudo. Outros métodos entram em diversas categorias mais amplas:

1. Contagens totais: são possíveis as vezes com organismos grandes ou distintos (por exemplo bisões em planícies abertas ou baleias em uma área do mar) ou com organismos que se agregam em grandes colônias de reprodução.

2. Amostragem em quadrat ou transecção: envolve a contagem de organismos de uma só espécie em lote ou transecções de um tamanho e número apropriados para ter uma estimativa da densidade na área amostrada. Esse método se aplica a uma grande variedade de espécies terrestres e aquáticos em ambientes, que vão de florestas ao fundo do mar.

3. Amostragem por remoção: lança no eixo “Y” de um gráfico o número de organismos removidos de uma área em amostras sucessivas; no eixo “X” é lançado o número total previamente removido. Se a probabilidade de captura permanecer razoavelmente constante, os pontos recairão em uma linha reta que pode ser estendida para um ponto no eixo “X”, que indicará a remoção teórica de 100% da área (a estimativa de densidade da população).

4. Método baseado em distância: (aplicável em organismos sésseis como as árvores). O método do quadrante centrado é baseado em uma série de pontos aleatórios; a distância do indivíduo mais próximo é medida em cada um dos quatro quadrantes em cada ponto ao longo dessa série de pontos aleatórios. A densidade por unidade de área pode ser estimada pela distância média.

5. Porcentagem de valor de importância: é a soma da densidade relativa, dominância relativa e frequência relativa das espécies em uma comunidade. Densidade relativa, “A”, é igual à densidade de uma espécie dividida pela densidade total de todas as espécies x 100. Dominância relativa, “B”, é igual a área basal de uma espécie dividida pela área basal total de todas as espécies x 100. Frequência relativa, “C”, é a frequência (ocorrência), de uma espécie em um lote dividida pela frequência total de todas as espécies x 10. Assim, o valor de importância para cada espécie é igual à soma de densidade relativa, dominância relativa e frequência relativa: A + B + C. Esta combinação de densidade com dominância e frequência da ocorrência oferece um índice melhor do que só densidade com respeito à importância ou função das

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espécies em seu habitat. Uma tabela ou resumo dos valores de importância para cada três espécies (as três maiores que três polegadas de diâmetro na altura do peito) dá uma ordem de classificação para três espécies dentro de uma comunidade florestal.

Tentou-se a aplicação de muitas metodologias para estimar a densidade populacional; e metodologia de amostragem é um campo importante da própria pesquisa. Os métodos são aprendidos de maneira eficaz consultando-se os manuais de campo ou um pesquisador experiente que tenha revisto a literatura e modificado ou melhorado os métodos existentes para se adaptar a uma situação específica de campo. Não há substituto para experiência quando se trata de censo de campo.

2.4 NATALIDADE

Natalidade é a capacidade de uma população de crescer por meio da reprodução. Equivale à taxa de nascimentos na terminologia do estudo da população humana (demografia). De fato, é um termo amplo que cobre a produção de novos indivíduos de qualquer organismo, tenha ele nascido, germinado, sido chocado, ou surgido por divisão. A natalidade máxima (às vezes chamada de absoluta ou fisiológica) é a produção máxima teórica de novos indivíduos sob condições ideais (sem fatores limitantes, sendo a reprodução limitada somente por fatores fisiológicos) e é uma constante em uma dada população. A natalidade ecológica ou efetiva se refere ao crescimento populacional sob uma condição ambiental de campo específica ou real. Não é uma constante para uma população, e pode variar com a composição do tamanho e a idade da população e com as condições físicas ambientais. A natalidade é geralmente expressa como uma taxa determinada pela divisão do número de novos indivíduos produzidos por uma unidade específica de tempo (taxa de natalidade bruta ou absoluta) ou dividindo-se o número de novos indivíduos por unidade de tempo por uma unidade de população (taxa de natalidade específica).

A diferença entre a natalidade específica e bruta, ou taxa de nascimentos, pode ser lustrada como segue: suponhamos que uma população de 50 protozoários em um tanque aumente por divisão para 150 em uma hora. A natalidade bruta é 100 por hora, e a natalidade específica (taxa média da mudança por unidade de população) é 2 por hora por indivíduo (dos 50 originais). Ou ainda, suponhamos que aconteceram 400 nascimentos em um ano em uma cidade de 10 mil habitantes; a taxa de natalidade bruta é 400 por ano e a taxa de natalidade específica é 0,04 per capta (4 por 100, ou 4%). Em demografia humana, costuma-se expressar as taxas de natalidade específica em relação ao número de mulheres em idade reprodutiva em vez de população total.

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TÓPICO 1 — ECOLOGIA DE POPULAÇÕES

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2.5 MORTALIDADE

A mortalidade quantifica as mortes dos indivíduos na população. É mais ou menos a antítese da natalidade. Equivale à taxa de mortes na demografia humana. Da mesma forma que a natalidade, a mortalidade pode ser expressa como número de indivíduos que morre em um certo período (mortes por unidade de tempo), ou como uma taxa específica relacionada a unidade da população total ou qualquer parte dela. A mortalidade ecológica ou efetiva (a perda de indivíduos sobre dada a condição ambiental) como a natalidade ecológica, não é uma constante, e varia de acordo com as condições de população e ambiente. A mortalidade mínima teórica (constante para uma população), representa a perda mínima sob condições ideais ou não limitantes. Mesmo sob as melhores condições, os indivíduos morreriam de velhice determinada por sua longevidade fisiológica, que, lógico, é muitas vezes maior que a longevidade ecológica média. Muitas vezes, a taxa de sobrevivência é de maior interesse que a taxa de mortes. Se a taxa de mortes for expressa como uma fração, “M”, então a taxa de sobrevivência é: (1 – M).

Como a mortalidade varia muito com a idade, assim como a natalidade, especialmente em organismos superiores, mortalidade específicas nos mais diferentes estágios possíveis da história natural são de grande interesse, pois possibilitam aos ecólogos determinar as forças sob a mortalidade total e bruta da população. Um quadro completo da mortalidade em uma população é ilustrado sistematicamente pela tabela de vida, um instrumento estatístico desenvolvido pelos estudiosos de populações humanas. A tabela de vida consiste em várias colunas, com títulos padronizados, sendo “lx” o número de indivíduos de uma dada população (1000 ou qualquer outro número conveniente) que sobrevivem após intervalos regulares de tempo (dias, mês, ano e assim por diante, fornecidos na coluna “x”); “dx” é o número de mortes durante intervalos de tempo sucessivos; que “qx”, a taxa de mortes ou mortalidade durante os intervalos sucessivos (população inicial no princípio do período) e “ex”, expectativa de vida ao fim de cada intervalo.

Com base nas tabelas de vida são traçadas as curvas de sobrevivência. As curvas de sobrevivência são de três tipos gerais como mostra figura 2. Uma curva convexa (figura 2, Tipo III), é característica de espécies como o ser humano, nas quais a taxa de mortalidade da população é baixa até perto do fim do tempo de vida. Muitas espécies de animais grandes mostram essa curva do Tipo III de sobrevivência. No outro extremo uma curva côncava (Tipo I, figura 2) resulta quando a mortalidade é alta durante os estágios juvenis. As ostras, outros bivalves e os carvalhos são exemplos de curva de sobrevivência do Tipo I; a mortalidade extremamente alta durante os estágios larval livre-natante ou o estágio brota da bolota do carvalho, mas uma vez o indivíduo bem estabelecido em um substrato favorável, a expectativa de vida aumenta consideravelmente. Um tipo de “degraus” de curva de sobrevivência pode surgir se a sobrevivência diferir muito nos estágios sucessivos da história natural, como é geralmente o caso dos insetos holometábolos (insetos com metamorfose completa, como as borboletas). Provavelmente, nenhuma população no mundo natural tem uma taxa

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de sobrevivência de idade específica constante em todo o período de vida, mas uma curva ligeiramente côncava, aproximando-se de uma linha reta diagonal em escala semilogarítmica (Tipo II, Figura 2) é característica de muitos ratos, aves, coelhos e cervos. Nesses casos, a mortalidade é alta nos jovens, porém mais baixa e mais próxima de constante nos adultos (de um ano ou mais).

FIGURA 2 – TIPOS DE CURVAS DE SOBREVIVÊNCIA.

FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 232)

A forma da curva de sobrevivência está, muitas vezes, relacionada com o grau de cuidado parental ou outra proteção dada ao jovem. Assim, as curvas de sobrevivência das abelhas melíferas são muito menos côncavas que as curvas de gafanhotos e sardinhas (que não protegem seus filhotes). Essas últimas espécies, claro, compensam botando mais ovos (a razão entre a natalidade máxima e a realizada é alta).

O formato da curva de sobrevivência, muitas vezes, varia de acordo com a densidade da população. A curva de sobrevivência de uma população mais densa é um tanto mais côncava por causa do aumento da pressão de predação, a competição intraespecífica, entre outros fatores, que resultam em expectativas de vida mais curta. Por outro lado, indivíduos que vivem em uma área menos adensada, menos populosa, ou áreas sem manejo, oferece mais chances de vida longa, pois evitam as pressões que ocorrem em áreas mais adensadas. Para populações humanas também a alta densidade tende a não ser favorável ao indivíduo devido a ameaça a qualidade de vida. Entretanto os humanos aumentaram muito sua própria longevidade ecológica por causa da expansão do conhecimento médico, da nutrição e do saneamento adequado. Dessa forma, a curva de sobrevivência dos seres humanos aproxima-se da curva de mortalidade mínima, Tipo III, muito angulosa.

2.6 DISTRIBUIÇÃO ETÁRIA DA POPULAÇÃO

A distribuição, um atributo importante das populações, influencia tanto a natalidade quanto a mortalidade. A razão entre os vários grupos etários em uma população determina o estado reprodutivo atual da população e indica o que esperar do futuro. Geralmente, uma população que se expande com rapidez conterá uma grande proporção de indivíduos jovens; uma população

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TÓPICO 1 — ECOLOGIA DE POPULAÇÕES

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pulsante, estável, mostrará uma distribuição mais uniforme das classes etárias; e uma população em declínio terá uma grande proporção de indivíduos velhos, como ilustram as pirâmides etárias na figura 3. Uma população pode passar por mudanças na estrutura etária sem mudar seu tamanho. Existem evidências de que as populações têm uma distribuição etária “normal” ou estável para a qual a distribuição etária real tende, como foi proposto primeiro por Lotka (1925), a firmar-se em bases teóricas. Quando se atinge uma distribuição etária estável, os aumentos incomuns na natalidade ou mortalidade resultam em mudanças temporárias, com retorno espontâneo à situação estável. Conforme as nações passam de condições pioneiras de densidades expandindo rapidamente às condições maduras de populações estáveis, a porcentagem de indivíduos em classes etárias mais jovens diminui. Essa mudança de estrutura etária, com um aumento na porcentagem de indivíduos mais velhos, tem impactos profundos nas considerações de estilo de vida e econômicas, como os custos de benefícios com cuidados médicos e assistência social.

FIGURA 3 – PIRÂMIDES ETÁRIAS REPRESENTANDO, DA ESQUERDA PARA A DIREITA, UMA PORCENTAGEM GRANDE, MÉDIA E PEQUENA DE S JOVENS NA POPULAÇÃO

FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 234)

As pirâmides na Figura 3 são baseadas em nascimentos e mortes entre população e não inclui imigração de populações. De forma simplista, a estrutura etária pode ser expressa em termos de três idades ecológicas: pré-reprodutiva, reprodutiva e pós-reprodutiva. A duração relativa dessas idades em proporção ao tempo de vida varia bastante em diferentes organismos. Para os humanos, em tempos recentes, as três idades são relativamente iguais em comprimento, com cerca de 1/3 de uma vida humana caindo em cada classe. Os primeiros humanos, em comparação, tinham um período pós-reprodutivo muito mais curto. Diversos animais, notadamente insetos, têm períodos pré-reprodutivos bastante longos, um período reprodutivo muito curto, e nenhum período pós-reprodutivo. Certas espécies de cigarra (Magicicada spp.) são exemplos clássicos. Esses organismos precisam de vários anos para desenvolver-se como estágio de larva, e os adultos emergem para a vida por somente alguns dias. As ninfas de cigarras têm uma história de desenvolvimento extremamente longa (13 a 17 anos; RODENHOUSE et al, 1997), com a vida adulta durando menos que uma única estação.

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Um fenômeno conhecido como classe etária dominante foi muitas vezes observado em populações de peixes que têm uma taxa de natalidade potencial muito alta. Quando ocorre uma grande classe de ano por causa da sobrevivência alta incomum dos ovos e das larvas de peixes, a reprodução é suprimida por vários anos seguintes. Os primeiros dados sobre o arenque no Mar do Norte (HJORT, 1926) se tornaram um caso clássico. Peixes do ano de 1904 dominaram a pesca de 1909 (quando essa classe etária tinha cinco anos e era suficientemente grande para ser pescada com redes de pesca comerciais) até 1918 (quando, aos 14 anos de idade, ainda eram em maior número do que os peixes de grupos de menor idade). A situação produziu algo como um ciclo ou pulso na pesca total, que foi alta em 1909 então declinou nos anos subsequentes, pois a classe etária dominante diminuiu antes de ser substituída por outras classes. Pesquisas indicam que condições ambientais, como é o El niño, resultam em uma sobrevivência incomum que ocorre de vez enquanto.

3 CONCEITOS BÁSICOS DE TAXA

A população é uma entidade em mudança. Mesmo quando a comunidade e o ecossistema parecem não estar mudando, densidade, natalidade, sobrevivência, estrutura etária, taxa de crescimento e outros atributos das populações componentes estão em fluxo, pois as espécies se ajustam constantemente às estações, às forças físicas e umas às outras. O estudo das mudanças no número relativo de organismos em populações e dos fatores que explicam essa mudança é chamado de dinâmica de populações. Os ecólogos estão sempre mais interessados em como e a que taxa a população está mudando do que em seu tamanho absoluto e composição a qualquer tempo. Cálculo diferencial, o ramo da matemática que trata (em parte) do estudo das taxas, é uma ferramenta importante no estudo da ecologia de populações.

Uma taxa pode ser obtida dividindo-se a mudança em alguma quantidade pelo período de tempo que passou durante a mudança; esse termo, taxa, indicaria a velocidade com a qual alguma coisa muda com o tempo. Assim, o número de quilômetros percorridos por um carro por hora é a taxa de velocidade, e o número de nascimentos por um ano é a taxa de natalidade. O “por” significa “dividido por”. Portanto a produtividade é uma taxa, não um estado estático, como a biomassa presente no local.

Costumeiramente, a mudança em alguma coisa é abreviada usando-se o símbolo ∆ (delta) na frente da letra que representa a entidade em mudança. Assim, se “N” representa o número de organismos e “t” representa o tempo, então, ∆N representa a mudança no número de organismos. Desse modo, = a taxa média de mudança no organismo por (dividido por, em relação ao) tempo. A taxa de crescimento da população é dada por , em que, a taxa média de mudança no número de organismos (taxa de crescimento dividida pelo número de organismos inicialmente presentes ou, como alternativa, pelo número médio

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TÓPICO 1 — ECOLOGIA DE POPULAÇÕES

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de organismos durante um período de tempo). Isso é muitas vezes chamado de taxa de crescimento específico e é útil quando populações de tamanhos diferentes devem ser comparadas. Se multiplicarmos por 100: [( ) x 100] torna-se taxa de crescimento percentual.

Com frequência, estamos interessados não somente na taxa média por um período de tempo, mas também na taxa instantânea teórica em intervalos de tempo particulares (ou seja, a taxa de mudança quando ∆t aproxima de zero). Na linguagem de cálculo, a letra “d” (de derivada) substitui o ∆ quando se conside-ram as taxas instantâneas. Nesse caso, as notações anteriores se tornariam: = a taxa de mudança no número de organismos por tempo em um instante particu-lar; e, = a taxa de mudança no número de organismos por tempo por em um instante particular.

A Figura 4 mostra a diferença entre uma curva de crescimento e uma curva de taxa de crescimento. As curvas de crescimento em forma de “S” e as curvas da taxa de crescimento em forma côncava são geralmente características de populações em estágios pioneiros ou início de crescimento.

FIGURA 4 – CURVA DE CRESCIMENTO POPULACIONAL (A) E CURVA DA TAXA DE CRESCIMENTO (B) PARA A MESMA POPULAÇÃO HIPOTÉTICA

FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 237)

Na Figura 4, a curva (A) mostra a densidade populacional (número de indivíduos por unidade de área) contra o tempo; a curva (B) ilustra a taxa de mudança (número de indivíduos adicionados por unidade de tempo) contra o tempo para a mesma população.

Na curva de crescimento, a inclinação (linha reta tangente) em qualquer ponto é a taxa de crescimento. Assim, no caso da população hipotética da figura 4, a taxa de crescimento esteve no ponto máximo por aproximadamente oito semanas e caiu para zero após 16 semanas. O ponto no qual a taxa de crescimento é máxima é chamada de ponto de inflexão. A notação ∆N/∆t serve para ilustrar o modelo para os propósitos comuns de medição, mas anotação dN/dt deve substitui-la na maioria dos tipos e modelos matemáticos reais.

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A taxa instantânea, dN/dt, não pode ser medida diretamente nem a dN(Ndt) ser calculada diretamente da contagem da população. A taxa pode ser aproximada, claro, fazendo-se censos em intervalos muito curtos, ligando esses pontos com linhas, determinando, então, que tipo de equação se aproxima mais da curva de crescimento real. O tipo de curva de crescimento populacional exibido pela população teria de ser conhecido. Assim, seria possível calcular a taxa instantânea com base em equações que estabelecem as curvas de crescimento que será abordado no subtópico 5.

4 TAXA INTRÍNSECA DE CRESCIMENTO

Quando o ambiente é ilimitado (espaço, alimento, ou outros organismos não estão exercendo um efeito limitante), a taxa específica de crescimento (taxa de crescimento populacional por indivíduo) se torna constante e máxima para as condições microclimáticas existentes. O valor da taxa de crescimento sobre essas condições populacionais favoráveis caracteriza uma estrutura etária populacional particular e é um índice singular do poder inerente de uma população crescer. Ele pode ser designado pelo símbolo “r”, que é o expoente na equação diferencial para o crescimento populacional em um ambiente ilimitado sob condições físicas específicas. As quatro equações a seguir demonstram a representação matemática para estas situações de sentido ecológico:

1. ( =rN); é a mesma forma usada na sessão no subtópico anterior (subtópico 3). O parâmetro “r” pode ser entendido como um coeficiente instantâneo de crescimento populacional.

2. (Nt = N₀ erᵗ); a forma integrada da exponencial. Em que “N₀” representa o número de s no tempo zero, “Nt” o número no tempo “t” e “e” a base do logaritmo natural. Ao transformar ambos os lados em logaritmo natural, converte-se a equação em uma fórmula usada para fazer cálculos reais.

3. (ln Nt = ln N₀ + rt); ou (r = ); o índice “r” pode ser calculado considerando duas medidas de tamanho da população (N₀ e NT, ou em quaisquer dois momentos durante a fase de crescimento ilimitada, e nesse caso, Nᵗ₁ e Nᵗ₂ podem ser substituídos por N₀ e N₁ e (t₂ – t₁) por “t” nas equações anteriores).

4. (r = b – d); o índice “r” na realidade é a diferença entre a taxa de natalidade específica instantânea “b” (taxa por tempo por indivíduo) e a taxa de mortalidade instantânea “d”.

A taxa de crescimento global da população sob condições ambientais ilimitadas, “r”, depende da composição etária e das taxas de crescimento específica por causa da reprodução dos grupos etários componentes. Assim, pode haver diversos valores “r” para uma espécie dependendo da estrutura da população. Quando existe uma distribuição etária estacionária e estável, a taxa de crescimento específica é chamada de taxa intrínseca de crescimento natural ou rᵐᵃx. O valor máximo de “r” é muitas vezes chamado de potencial biótico ou potencial reprodutivo, uma expressão menos específica, mas bastante utilizada.

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A diferença entre o “r” máximo (ou o potencial biótico) e a taxa de crescimento que ocorre em uma condição real de laboratório ou campo é frequentemente adotada como uma medida da resistência ambiental, que é a soma total dos fatores ambientais que impedem o potencial biótico de ser efetivado.

A natalidade, a mortalidade e a distribuição etária são todas importantes, mas cada uma delas diz pouco sobre como a população está crescendo, sobre o que aconteceria se as condições fossem diferentes e sobre qual é o melhor desempenho possível, comparado com o desempenho do dia a dia. Chapman (1928) propôs o termo potencial biótico para designar o poder reprodutivo máximo. Ele definiu potencial biótico como “a propriedade inerente ao organismo de se reproduzir, sobreviver, aumentar em números. É um tipo de soma algébrica do número de jovens produzidos a cada reprodução, do número de reproduções em um dado período de tempo, da razão sexual e sua capacidade geral de sobreviver sob determinadas condições físicas”. Com base nessa definição geral, o potencial biótico passou a significar coisas diferentes para pessoas diferentes. Para alguns, significava o poder reprodutivo nebuloso oculto na população, felizmente nunca permitido manifestar-se em sua totalidade, por causa da ação do ambiente (de outro modo, caso fosse possível, os descendentes de um par de moscas pesariam mais que a Terra em alguns anos). Para outros, significava de uma forma mais concreta, o número máximo de ovos, sementes, esporos etc., que o indivíduo mais fecundo poderia produzir, apesar de isso ter pouco significado no que se refere ao aspecto populacional, pois a maioria das populações contém indivíduos que são incapazes de atingir o máximo em produção. O índice “r” é usado também como uma expressão quantitativa de “aptidão reprodutiva” no sentido genético.

Para as curvas de crescimento (Figura 4), “r” é a taxa de crescimento específico (∆N/N∆t) quando o crescimento da população é exponencial. A equação 3 (logarítmica) o representa uma linha reta. Portanto, o valor de “r” pode ser obtido graficamente. Seu crescimento é lançado como logaritmo (ou em papel semilogarítmico), o logaritmo do tamanho da população lançada contra o tempo produzirá uma linha reta se o crescimento for exponencial; “r” é a inclinação dessa linha. Assim, quanto mais íngreme essa inclinação, mais alta taxa intrínseca do crescimento. As amplas diferenças em potencial biótico são especialmente enfatizadas quando expressas como número de vezes que a população se multiplicaria se a taxa exponencial continuasse ou como tempo necessário para duplicar a população.

As populações na natureza, em geral, crescem exponencialmente por curtos períodos quando há muito alimento e não existem efeitos de adensamento, inimigos etc., que criam padrões do tipo “explosão-e-colapso”. Sob tais condições, a população está expandindo a uma taxa extraordinária, apesar de cada organismo apresentar a mesma taxa de reprodução de antes, ou seja, a taxa de crescimento específica é constante. As florações de plâncton, a erupção das pragas ou o crescimento de bactérias no novo meio de cultura são exemplos de situações em que o crescimento pode ser logarítmico. É óbvio que esse

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crescimento exponencial não pode continuar por muito tempo. E, geralmente, nunca se realiza. As interações dentro da população e as resistências ambientais externas logo desaceleram a taxa de crescimento e tomam parte na conformação do crescimento populacional de várias maneiras.

5 CONCEITO DE CAPACIDADE DE SUPORTE

As populações mostram padrões característicos de aumento, chamados formas de crescimento populacional. Como comparação, dois padrões básicos, baseados em formas de construção aritmética de curvas de crescimento, podem ser designados: crescimento em forma de “J” e em forma de “S” ou sigmoide de crescimento. No crescimento em forma de “J”, a densidade aumenta rapidamente de forma exponencial (figura 5) e então interrompe abruptamente quando a resistência ambiental ou outro fator limitante se torna efetivo de repente. Essa forma pode ser representada por um modelo simples baseado na seguinte equação exponencial (equação 1 Subtópico 4): ( =rN).

FIGURA 5 – EXEMPLOS HIPOTÉTICOS DE (A) CURVAS DE CRESCIMENTO EM FORMA DE J (EXPONENCIAL); E (B) EM FORMA DE S (SIGMOIDE)

FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 241)

Na forma de crescimento em “S” ou sigmoide (Figura 5 B), a população aumenta devagar no início (fase de estabelecimento ou de aceleração positiva), depois com rapidez (talvez se aproximando de uma fase logarítmica), mas logo desacelera quando a resistência do ambiente aumenta em porcentagem (fase de aceleração negativa) até que o equilíbrio seja alcançado e mantido. Essa forma pode ser representada pelo modelo logístico simples: ( =rN ) x ( ). O nível superior, além do qual nenhum aumento substancial pode ocorrer, como representado pela constante “K”, é a assíntota superior da curva sigmoide e é chamada de capacidade de suporte máxima. (BARRETT; ODUM, 2000).

Quando alguns poucos indivíduos são introduzidos ou entram em uma área desocupada, (por exemplo, no início de uma estação de crescimento), várias vezes foram observados padrões característicos de aumento da população. Quan-

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do lançados em uma escala aritmética, a parte da curva de crescimento que repre-senta um aumento na população geralmente toma a forma de “J” ou de “S” (Fi-guras 5A e 5B). É interessante notar que essas duas formas básicas de crescimento são similares aos dois tipos metabólicos de crescimento descritos em organismos Individuais. Esses padrões de crescimento e desenvolvimento ilustram processos que transcendem os níveis de organização (BARRETT et al., 1997). Entretanto, não existem pontos de ajuste para o crescimento no nível de população e acima; portanto, é provável ultrapassar “K”.

A equação dada anteriormente como um modelo simples para o crescimento em forma de “J” é a mesma equação exponencial discutido no subtópico 4, que abordou a taxa intrínseca de crescimento natural, exceto que é imposto um limite em “N”. O crescimento irrestrito é interrompido de forma repentina quando acaba algum recurso da população (como alimento ou espaço), quando a geada ou algum outro fator sazonal interfere, ou quando a estação reprodutiva termina. Quando é alcançado o limite superior de “N”, a densidade pode permanecer por um tempo nesse nível, mas geralmente ocorre um declínio imediato, produzindo um padrão de relaxamento e oscilação (explosão-e-colapso) na densidade. Esse padrão em curto prazo é característico de muitas populações na natureza, como a floração de algas, plantas anuais, alguns insetos entre outros.

O segundo tipo de forma de crescimento, que também é frequentemente observado, segue um padrão em forma de “S” ou sigmoide quando a densidade e o tempo são lançados em escalas aritméticas. A curva sigmoide é resultado da ação crescente dos fatores danosos (resistência ambiental ou retroalimentação negativa) conforme a densidade da população aumenta, diferente do que ocorre no modelo em forma de “J”, em que a retroalimentação negativa é adiada até quase o fim do crescimento. Um caso simples é aquele cujos fatores danosos são linearmente proporcionais à densidade. Essa forma de crescimento é dita logística e tem a conformidade com a equação logística usada como uma base para o modelo do padrão sigmoide. A equação logística pode ser escrita de várias maneiras; a figura 6 apresenta três formas comuns (A, B e C) e a forma integrada (6D).

FIGURA 6 – REPRESENTAÇÕES MATEMÁTICAS DA EQUAÇÃO LOGÍSTICA PARA EXPRESSAR O CRESCIMENTO POPULACIONAL

FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 242)

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Em que dN/dt é a taxa de crescimento populacional (mudança no número de indivíduos por unidade de tempo), “r” é a taxa de crescimento específico ou taxa intrínseca de crescimento, “N”, o tamanho da população (número de indivíduos), “a”, uma constante de Integração definindo a posição da curva relativa à origem, e “K” é o possível tamanho máximo da população (assíntota superior) ou capacidade de suporte.

Essa equação é a mesma da exponencial apresentada na taxa intrínseca de crescimento natural do (subtópico 4), com a adição de uma das expressões (K - N) / K; (r/K) N²; ou (1 - N/K). Essas expressões são três formas de indicar a resistência ambiental criada pela própria população em crescimento, que produz um aumento na redução da taxa de reprodução potencial conforme o tamanho da população se aproxima da capacidade de suporte. Traduzindo em palavras, das equações significam que a taxa de crescimento populacional é igual a taxa máxima possível de aumento (taxa ilimitada de crescimento específico) multiplicado pelo tamanho da população e, multiplicado pelo grau de efetivação da taxa máxima ou subtraído do aumento não efetivado.

Esse modelo simples é um produto de três componentes: uma taxa cons-tante, “r”, uma medida de tamanho de população, “N”, e uma medida da porção dos fatores limitantes disponíveis não usados pela equação (1 – N/K). Apesar de o crescimento de uma grande variedade de populações (representando microrga-nismos, plantas e animais, e incluindo populações tanto de laboratório como na-turais), ter demonstrado seguir um padrão sigmoide, não decorre necessariamen-te que tais populações cresçam de acordo com a equação logística. Como Wiegert (1974) mostrou, a equação logística representa um tipo de forma de crescimento mínimo sigmoide, pois os efeitos limitantes tanto do espaço como dos recursos começam logo no início do crescimento. Na maioria dos casos, seria de se esperar menor crescimento limitado no início, seguido por uma desaceleração conforme aumenta a densidade. A Figura 7 ilustra esse conceito da logística ou sigmoide como a mais lenta e a exponencial como forma de crescimento mais rápida. Seria de se esperar que a maioria das populações seguissem um padrão intermediário.

Em populações de plantas e animais superiores, que têm histórias de vida as complicadas e longos períodos de desenvolvimento individual, é possível que haja atrasos no aumento da densidade e do impacto de fatores limitantes. Nesses casos, pode resultar uma curva de crescimento mais côncava (períodos mais longos são necessários para natalidade se tornar efetiva). Em algumas situações, as populações ultrapassam assíntota superior e passam por oscilações antes de ser estabelecerem no nível da capacidade de suporte.

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FIGURA 7 – CURVAS MOSTRANDO O CRESCIMENTO TEÓRICO EXPONENCIAL (À ESQUERDA) E LOGÍSTICO (À DIREITA) DE QUALQUER POPULAÇÃO, COM TAXAS IDÊNTICAS DE

CRESCIMENTO MÁXIMO E DENSIDADES MÍNIMAS DE MANUTENÇÃO

FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 244)

As modificações na forma de crescimento logístico incluem dois tipos de atraso do tempo: (1) o tempo necessário para um organismo começar a crescer quando as condições são favoráveis; e (2) o tempo de que os organismos necessi-tam para reagir ao adensamento desfavorável alterando as taxas de natalidade e mortalidade. A Figura 7 ilustra uma forma de crescimento logístico generalizada (à direita), representando as várias fases da curva sigmoide: mostrando atraso; crescimento logístico; ponto de ficção; resistência ambiental; e fases da capaci-dade de suporte. A fase de atraso ilustra o tempo de atraso necessário para uma população se aclimatar ao ambiente. Por exemplo, pequenos mamíferos em um novo habitat precisam fazer passagens sou escavações antes de se tornarem re-produtivamente bem-sucedidos; os peixes em um novo tanque ou lagoa devem adaptar-se à química da água antes de maximizarem a sua taxa de reprodução. Uma vez que as populações estejam aclimatadas no habitat onde os recursos, como alimento, abrigo e espaço, sejam abundantes, elas reproduzem a uma taxa exponencial (logarítmica) de crescimento.

A taxa máxima de crescimento é chamada de ponto de inflexão. Os demógrafos e os ecólogos de população procuram determinar os pontos de inflexão porque, logo após esse ponto da curva sigmoide de crescimento, a taxa de aumento começa a desacelerar (ao contrário de acelerar um pouco antes do ponto de inflexão). A razão para essa desaceleração é que um recurso, ou um conjunto de recursos, torna-se limitante no ambiente. A desaceleração do crescimento da população decorrente de recursos limitantes é chamada fase de resistência ambiental do crescimento sigmoide. Finalmente, a população atinge as condições da capacidade de suporte, quando a taxa de crescimento populacional é zero e a densidade populacional é máxima, como mostrado na Figura 7.

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As cidades de crescimento rápido e que dependem de enormes fontes externas de energia, alimento, água e suporte vital (capital natural), podem passar por ascensão e queda de vários modos, de acordo com os fatores de entrada e o grau em que cidadãos e governos podem antecipar as condições futuras e planejar de antemão. Assim, nos primeiros estágios do crescimento urbano, quando as condições econômicas são favoráveis (espaço e recursos disponíveis e baratos) e a necessidade por serviços (água, tratamento de esgoto, ruas, escolas e assim por diante) é pequena, a população cresce rapidamente (a imigração frequentemente como responsável pelo maior aumento), como em um padrão de crescimento em forma de “J”. Somente algum tempo depois (o atraso no tempo) a moradia e as escolas se tornam superpopulosas, a demanda por serviços aumenta, os impostos sobem para cobrir os custos crescentes de manutenção e começa a ser sentida deseconomia de escala em geral. Na ausência inicial de retroalimentação negativa, como o planejamento racional do uso da terra, a cidades irão crescer rápido demais para própria sobrevivência então sofreram um declínio.

Apesar da forma de crescimento logístico simples ser provavelmente restrita pequenos organismos ou organismos com história de vida simples, pode-se observar um padrão geral de crescimento sigmoide em organismos maiores.

As populações são sistemas abertos. A dispersão da população, o movi-mento dos indivíduos ou propágulos (sementes, esporos, larvas e assim por dian-te) para dentro ou para fora da população ou da área da população, suplementa a natalidade e a mortalidade na configuração do crescimento populacional. A emigração, movimento unidirecional dos indivíduos para fora, afeta a forma de crescimento local do mesmo modo que a mortalidade; a imigração, movimento unidirecional de indivíduos para dentro, age como a natalidade. A migração, sa-ída e entrada periódica de indivíduos, suplementa sazonalmente tanto a natali-dade como a mortalidade. A dispersão é influenciada por barreiras e pela força inerente ao movimento, ou vagilidade dos indivíduos ou de seus propágulos. E, claro, a dispersão é o meio de colonizar áreas desabitadas e de manter metapopu-lações. É também um componente importante no fluxo gênico e na especiação. A dispersão de pequenos organismos e propágulos passivos geralmente toma uma forma exponencial, na qual a densidade decresce por uma quantidade constante de múltiplos iguais à distância da fonte. A dispersão de grandes animais ativos desvia desse padrão e pode tomar a forma de dispersão “de distância estabeleci-da”, de dispersão em distribuição normal, ou outras formas.

6 FLUTUAÇÃO DE POPULAÇÃO E OSCILAÇÕES CÍCLICAS

Quando as populações completam seu crescimento, e a média de ∆N/∆t permanece em zero por um longo período, a densidade da população tende a pulsar ou flutuar acima e abaixo do nível da capacidade de suporte, pois as populações estão sujeitas a várias formas de controle por retroalimentação em vez de controle de pontos de ajuste. Algumas populações, em especial de insetos, espécies de plantas exóticas e pragas em geral, são irruptivas; ou seja, explodem

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em números em um padrão ascensão-e-queda. Muitas vezes, essas flutuações resultam de mudanças sazonais ou anuais na disponibilidade de recursos, mas podem ser estocásticas (aleatórias). Algumas populações oscilam tão regularmente que podem ser classificadas como cíclicas.

Na natureza, é importante distinguir entre (1) mudanças sazonais no tamanho da população, intensamente controlado pelas adaptações ao ciclo de vida associadas as mudanças sazonais em fatores ambientais; e (2) flutuações anuais. Para o propósito desta análise, as flutuações podem ser consideradas sob dois títulos: (1) flutuações controladas primariamente por diferenças anuais em fatores extrínsecos (como temperatura e chuva) que estão fora da esfera de interações da população; e (2) oscilações sujeitas a fatores intrínsecos (fatores bióticos, como disponibilidade de alimento, energia, doenças ou predação), controladas primariamente pela dinâmica populacional. Em muitos casos, as mudanças em abundância de um ano para outro parecem estar relacionadas com a variação em um ou mais fatores limitantes extrínsecos importantes, mas algumas espécies mostram tal regularidade na abundância relativa, aparentemente independentes dos sinais ambientais óbvios, que o termo ciclos parece apropriado.

Como enfatizado em tópicos anteriores, as populações se modificam e compensam as perturbações de fatores físicos. No entanto, em razão da falta de controle de ponto de ajuste, esses equilíbrios em sistemas maduros não são estados de equilíbrio dinâmico, mas balanços de estados pulsantes com amplitudes variáveis de pulsação em teoria. Quanto mais organizada e madura a comunidade, ou mais estável o ambiente físico, ou ambos, tanto menor será a amplitude das flutuações na densidade populacional ao longo do tempo.

Os humanos estão familiarizados com as variações sazonais no tamanho da população. Espera-se que, a certa altura do ano, os mosquitos e pernilongos sejam abundantes, as matas estejam cheias de aves ou os campos cheios de erva daninha. Em outras estações as populações desses organismos podem diminuir a um ponto de desaparecer. Embora seja difícil encontrar na natureza populações de animais, microrganismos e plantas herbáceas que não mostre alguma mudança sazonal em tamanho, as flutuações sazonais mais pronunciadas ocorrem em organismos que tem estações de crescimento limitado, especialmente aqueles com ciclo de vida curtos e aqueles com padrões de dispersão sazonal pronunciados (como as aves migratórias).

As irrupções populacionais ocasionais e imprevisíveis permanecem pouco compreendidas, mas surgem provavelmente quando algumas condições favoráveis como temperatura, recursos abundantes de alimento, cobertura vegetal para reduzir a predação, ocorrem em conjunto, resultando em uma explosão populacional. Ocasionalmente, as irrupções cobrem uma vasta área geográfica ou de paisagem, levando os ecólogos a formar teorias gerais sobre a regulação da população.

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6.1 TAXAS EXTRÍNSECAS

Para Maclulich, (1937) as tentativas de relacionar as oscilações de densidade populacional com os fatores climáticos pouco avançaram até agora. Palmgren (1949) e Cole (1951, 1954) sugeriram que o que aparenta ser oscilações regulares pode ser resultado de variações aleatórias nos fatores tanto biológicos como abióticos. Lidicker (1988) sugeriu que ecólogos de população adotem o modelo multifatorial de modo a compreender como muitos fatores extrínsecos e intrínsecos funcionam de modo sinérgico, para explicar as mudanças nas densidades populacionais.

Algumas espécies, no entanto, realmente parecem ser reguladas por fatores climáticos. Por exemplo, existe uma relação entre a abundância populacional de codorna de gambel (Callipepla gambelli), no sul do Arizona, e as chuvas de inverno (SOWLS, 1960). As codornas precisam de abundância de vegetação e cobertura de alta qualidade no fim do inverno e no começo da primavera para que tenham disponíveis nutrientes essenciais à reprodução. Nos anos de pouca chuva, o vicejar da vegetação de alta qualidade não aparece, e a maioria das aves deixa de reproduzir. Assim, o sucesso reprodutivo da codorna-do-deserto reflete a resposta independente de densidade à chuva.

Descobriu-se que a codorna Americana (Colinus virginianus) experimenta intensa mortalidade por causa da cobertura de neve e condições de nevasca, fatores extrínsecos que regula seus números (ERRINGTON, 1945). Errington (1963) também demonstrou que abundância populacional do rato almiscarado (Ondatra zibethicus) é afetada pela seca, porque os ratos almiscarados defendem toca em margens de riachos perto de áreas de alimentação de alta qualidade. Os períodos de seca os fazem abandonar essas tocas e procurar por novas, aumentando, assim, a sua vulnerabilidade aos predadores.

Esses exemplos demonstram como os fatores climáticos afetam as densidades de plantas e animais e servem como mecanismos extrínsecos da regulação das populações. Quando fatores climáticos (extrínsecos), aleatórios ou não, provam não ser a causa principal das oscilações abruptas, então deve-se procurar as causas dentro das próprias populações (fatores intrínsecos).

6.2 TAXAS INTRÍNSECAS

Desenvolvendo pesquisas sobre a teoria médica de estresse (a síndrome da adaptação geral) (CHRISTIAN, 1950, 1963; CHRISTIAN; DAVIS, 1964) acu-mularam evidências consideráveis tanto de campo como de laboratório para demonstrar que o adensamento em vertebrados superiores causa aumento das glândulas adrenais. Esse aumento é sintomático nas mudanças do equilíbrio neu-roendócrino, as quais, por sua vez, causam mudanças no comportamento, no po-tencial reprodutivo e na resistência a doenças ou outros estresses. Tais mudanças geralmente se combinam para causar um declínio rápido na densidade popula-cional. Essa teoria é chamada de hipótese de retroalimentação adreno-pituitária.

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Durante os anos de 1960 e 1970, Chitty (1960, 1967), Krebs e Myers (1974) e Krebs (1978) sugeriram que as derivas genéticas são responsáveis por diferenças no comportamento agressivo e na sobrevivência observadas em fases diferentes do ciclo de roedores (Figura 8) uma situação similar à das raças fortes e fracas da lagarta-de-tenda (WELLINGTON, 1960).

Outro grupo de teorias se baseia na ideia de que os ciclos de abundância são intrínsecos ao nível do ecossistema em vez de o serem ao nível de população. Certamente, as mudanças de densidade, que abrangem várias ordens de magnitude, devem envolver não somente níveis tróficos secundários, como predadores e presas (PEARSON, 1963), mas também as interações primárias planta-herbívoro. Um exemplo é o esgotamento de nutrientes e a hipótese de recuperação (figura 9) propostos para explicar os ciclos de roedores da tundra (SCHULTZ, 1964, 1969; PITELKA, 1964, 1973). Essa hipótese é baseada em evidência documentada de que o pastejo intenso durante os anos de pico e mobiliza e reduz a disponibilidade de nutrientes minerais, especialmente fósforo, de modo que o alimento passa apresentar baixa qualidade nutricional. O crescimento e a sobrevivência de adultos e jovens sofrem redução. Após dois ou três anos, a reciclagem de nutrientes é restabelecida, as plantas são recuperadas e o ecossistema pode, de novo, sustentar grandes densidades de Consumidores. Em outras palavras, o ciclo é acionado por recursos (alimento) mais do que por predadores.

FIGURA 8 – HIPÓTESE DE RETROALIMENTAÇÃO GENÉTICA DE CHITTY-KREBS

FONTE: Krebs et al. (1973 apud ODUM; BARRET, 2008, p. 254)

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FIGURA 9 – HIPÓTESE DE RETROALIMENTAÇÃO DEVIDO A QUALIDADE DO ALIMENTO

FONTE: Pitelka (1973 apud ODUM; BARRET, 2008, p. 254)

Mais recentemente, o papel dos compostos secundários de vegetais envolvidos nas interações planta-herbívoro recebeu mais atenção (HARBORNE, 1982). Por exemplo, muitos compostos secundários de plantas, ou seja, compostos usados não para metabolismo, mas principalmente para propósitos defensivos, interferem nos caminhos metabólicos, processos fisiológicos ou sucessos reprodutivos específicos dos herbívoros. Muitos desses compostos, como os taninos, tornam as plantas menos palatáveis, ao passo que outros, como os glicosídeos cardíacos, são tóxicos e amargos para os animais que se alimentam de plantas que os contém. Negus e Berger (1977) e Berger et al. (1981) identificaram compostos químicos em plantas que acionavam ou inibiam a reprodução na população natural de roedores (Microtus montanus).

Os ciclos de grande amplitude são importantes, não porque sejam particularmente comuns no mundo em geral, mas porque um estudo deles revela funções e interações que provavelmente têm aplicação geral, porém não são muito evidentes em populações cuja densidade seja menos variável. O problema da oscilação cíclica, em qualquer caso específico, pode muito bem depender da determinação de quantos ou quais fatores são primariamente responsáveis (LIDICKER, 1988) ou se as causas são tão numerosas que seria muito difícil decifrá-las. Quanto mais complexo for o ecossistema maior o número de causas envolvidas na regulação da população.

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6.3 VISÃO GERAL DO CICLO

A Figura 10 modela os três tipos básicos de flutuações em nível de população; podem ocorrer de cima para baixo (acionadas por predador), de baixo para cima (acionada por recurso), ou ambos. Os megaciclos podem ser pulsos de densidade exagerada, característicos de diversas populações, como proposto por Odum et al. (1995). Nesse sentido, a densidade é máxima atingida quando os pulsos intrínsecos, baseados em fatores biológicos, são coordenados com pulsos extrínsecos, baseados em fatores físicos.

FIGURA 10 – TRÊS TIPOS DE PULSO EM NÍVEL DE POPULAÇÃO

FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 255)

7 MECANISMOS DE REGULAÇÃO DA POPULAÇÃO INDEPENDENTE DE DENSIDADE E DEPENDENTES DE DENSIDADE

Em ecossistemas de baixa diversidade, fisicamente estressados, ou em ecossistemas sujeitos a perturbações extrínsecas irregulares ou imprevisíveis, o tamanho da população tende a ser influenciado por fatores físicos, como o clima, correntes de água, condições químicas limitantes e poluição. Em ecossistemas de alta diversidade em ambientes benignos (baixa probabilidade de estresse físico periódico, como tempestades ou fogo), as populações tendem a ser controladas biologicamente, e pelo menos em certo grau, sua densidade é autorregulada. Qualquer fator, limitante ou favorável (negativo ou positivo respectivamente) para uma população, é: (1) independente de densidade, se seu efeito (mudança em número) for independentemente do tamanho da população; ou (2) dependente de densidade, se seu efeito na população for uma função da densidade populacional. A resposta dependência de densidade é geralmente direta, porque se intensifica conforme se aproxima do limite superior (capacidade de suporte). Pode, no entanto, ser o inverso (reduzir a intensidade conforme a densidade aumenta). Os fatores dependentes de densidade diretos agem como reguladores em um motor, portanto, podem ser chamados de reguladores de

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densidade e, por essa razão, são considerados um dos principais agentes que impedem a superpopulação. Os fatores climáticos muitas vezes, mas não sempre, agem de maneira independente de densidade, ao passo que os fatores bióticos, como competição, parasitas ou patógenos muitas vezes, mas não sempre, agem de maneira dependente da densidade.

A teoria geral da regulação de população é resultado lógico da discussão anterior sobre o potencial biótico, formas de crescimento e variação em torno do nível da capacidade de suporte. Assim, o crescimento em forma de “J” tende a ocorrer quando os fatores extrínsecos ou independentes de densidade determi-nam em que ponto o crescimento desacelera ou para. A forma de crescimento em “S” sigmoide, por outro lado é dependente de densidade, por que os efeitos intrínsecos controlam o crescimento da população.

O comportamento de qualquer população que se queira selecionar para estudar depende do tipo de ecossistema do qual aquela população faz parte. Contrapor o ecossistema fisicamente controlado com o autorregulado é arbitrário e produz um modelo muito simplificado, mas é uma abordagem relevante, especialmente porque os defeitos humanos durante a maior parte do século passado foram direcionados para substituir os ecossistemas, que se mantêm por si, por monoculturas e sistemas estressados que requerem muito cuidado humano. Como o custo (em energia e em dinheiro) para exercer o controle físico e químico, aumentou, devido ao aumento da resistência das pragas a pesticidas, bem como os subprodutos de substâncias químicas tóxicas em alimentos, a água e ar se tornaram mais uma ameaça, o manejo integrado de pragas está sendo cada vez mais implementado. Uma evidência disso é o interesse crescente do manejo de pragas com base ecológica que envolve esforços para restabelecer os controles naturais, dependentes da densidade em nível de ecossistema, em ecossistemas agrícolas e florestais (ODUM; BARRETT, 2000).

O Tópico 4 da Unidade 2 mostrou como as mudanças fisiológicas e genéticas, a alternância de ecótipos no tempo, podem amortecer as oscilações e apressar o retorno da densidade a níveis mais baixos após ter ultrapassado a capacidade de suporte. No entanto, permanece a questão de como a autorregulação em nível de população evolui por meio da seleção natural no nível de indivíduos.

Wynne-Edwards (1962, 1965) propôs dois mecanismos que podem estabilizar a densidade em um nível mais baixo do que a saturação: (1) territorialidade, uma forma exagerada de competição intraespecífica que limita o crescimento mediante o controle do uso da terra; e (2) comportamento de grupo, como ordem (hierarquia ou preferência) de bicada, dominância sexual e outros comportamentos que aumentam a aptidão da prole, mas reduzem seu número. Esses mecanismos tendem a aumentar a qualidade do ambiente para o indivíduo e reduzir a probabilidade de extinção que pode resultar quando ultrapassada a disponibilidade de recursos. A importância desses traços sociais e comportamentais é difícil de testar experimentalmente e é muito discutida, em diversos trabalhos (COHEN et al., 1980).

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Os fatores independentes de densidade (extrínsecos) do ambiente, como fenômenos climáticos, tendem a causar variações, as vezes drásticas, na densidade populacional e também deslocamento nos níveis da assíntota superior ou da capacidade de suporte. Os fatores dependentes de densidade (intrínsecos), como a competição, no entanto, tendem a manter a população em estado de pulsação estável ou apressar o retorno a esse nível. Os fatores ambientais independentes de densidade têm um papel mais importante nos ecossistemas fisicamente estressados; a mortalidade e a natalidade dependentes da densidade se tornam mais importantes em ambientes benignos nos quais o estresse extrínseco é reduzido. Como em um sistema cibernético funcionando bem, o controle por retroalimentação negativa adicional é feito por interações, tanto fenotípicas como genéticas, entre as populações de diferentes espécies que são unidas pelas cadeias alimentares ou por outras relações ecológicas importantes.

Muitos elementos influenciam as taxas de crescimento populacional, mas somente fatores dependentes da densidade, cujos efeitos aumentam com aglomeração, podem colocar uma população sob controle. De importância primordial entre esses fatores são os suprimentos alimentares e lugares para viver, que são relativamente fixos em quantidade e em número. Adicionalmente, os efeitos de predadores, parasitas e doenças são sentidos mais fortemente em populações densas do que em populações esparsas. Outros fatores, como temperatura, precipitação e eventos catastróficos, alteram a taxa de mortalidade e natalidade fortemente sem conexão com a quantidade de indivíduos numa população. Assim, tais fatores independentes da densidade podem influenciar a taxa de crescimento de uma população, mas não regulam o seu tamanho.

Chitty (1960) e Wellington (1960) descreveram o modo como a qualidade de populações naturais de roedores e lagartas mudaram em relação a abundância da população. Por exemplo, parece que o sucesso reprodutivo e a sobrevivência da população diminuíam conforme as populações de roedores aumentavam em número. Do mesmo modo, a sobrevivência, o comportamento de forrageamento e o comportamento de construção de “tendas” parece decrescer em qualidade conforme abundância da população de lagartas ultrapassa as condições de capacidade de suporte. Tais fenômenos tendem a funcionar de modo dependente da densidade, fornecendo o mecanismo regulatório para essas espécies. Holling (1965, 1966) enfatizou a importância das características comportamentais em uma série de modelos matemáticos que previram com que eficiência um inseto parasita controlaria o inseto hospedeiro em densidades diferentes.

As plantas também exibem mecanismos de regulação de população dependentes de densidade, assim como fazem os animais. As populações vegetais em altas densidades passam por processos chamado autodesbaste. Quando a semeadura ocorre em altas densidades, as jovens plantas emergentes ou plântulas competem vigorosamente. Durante o crescimento, muitas mudas morrem reduzindo a densidade das mudas sobreviventes. O aumento da taxa de crescimento das plantas individuais sobreviventes resulta em uma competição contínua, levando a um declínio no número de plantas sobreviventes. Quando

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o logaritmo do peso médio da planta é lançado em gráfico como função do logaritmo da densidade populacional, os pontos dos dados ao longo da estação de crescimento geram uma linha com uma inclinação de aproximadamente –3/2. Os ecólogos chamam essa relação entre o peso médio e a densidade da planta de curva de autodesbaste. Por causa da sua regularidade entre as numerosas espécies de plantas, tal relação é também chamada de lei da potência –3/2. Em resumo, quando a densidade de plantas por metro quadrado é baixa os indivíduos podem atingir maior peso em gramas, à medida que a densidade de plantas por metro quadrado aumenta o peso dos indivíduos diminui.

8 PADRÕES DE DISPERSÃO

Os indivíduos em uma população podem estar dispersos de acordo com quatro tipos gerais de padrões de dispersão: (1) aleatório; (2) regular; (3) agregado; e (4) agregado regular. Todos esses tipos são encontrados na natureza. A distribuição aleatória ocorre quando o ambiente é muito uniforme e não há tendência a se agregar. A dispersão regular ou uniforme pode ocorrer quando a competição entre os indivíduos é severa ou quando há antagonismo positivo que promove espaçamento uniforme; e, claro, esse é também o padrão frequente em plantações e florestas de monocultura. Agregados em vários graus (indivíduos associados em grupos) representam, de longe, o padrão mais comum. No entanto, se os indivíduos de uma população tendem a formar grupos de um certo tamanho, por exemplo, manadas de animais ou clones vegetativos em plantas, a distribuição dos grupos pode ser tanto aleatória como agregada em um padrão regular. A determinação do tipo de dispersão é importante na seleção dos métodos de amostragem e análises estatísticas.

Os quatro padrões de dispersão intrapopulacional são mostrados na Figura 11. Cada retângulo contém o mesmo número de indivíduos. No caso da distribuição agregada, os grupos podem ser distribuídos em forma aleatória ou uniforme, ou seja, os próprios agregados em um padrão regular com grandes espaços desocupados (Figura 11 D).

FIGURA 11 – QUATRO PADRÕES BÁSICOS DE DISPERSÃO DE S DE UMA POPULAÇÃO

FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 259)

Ao se examinar a Figura 11, pode-se verificar que uma amostra pequena retirada das quatro populações poderia, obviamente, produzir resultados mui-to diferentes. Uma amostra pequena da população com distribuição agregada

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tenderia a dar uma densidade muito alta ou muito baixa quando o número da amostra fosse multiplicado para obter a população total. Assim, as populações agregadas necessitam de amostras maiores e técnicas de amostragem mais cuida-dosamente planejadas do que as não agregadas.

A distribuição aleatória segue a curva normal ou em forma de sino sobre a qual se baseiam os métodos estatísticos paramétricos padrões. Espera-se esse tipo de distribuição na natureza quando muitos fatores estão agindo juntos na popula-ção. Quando alguns fatores importantes estão dominando, como é o caso comum (lembrando o princípio de fatores limitantes), e quando há uma forte tendência de vegetais e animais se agruparem para, ou por causa de, funções reprodutivas e outras, há poucos motivos para se esperar uma distribuição completamente alea-tória. Para estudar essas populações, usamos estatísticas não paramétricas, que se baseiam em padrões não aleatórios de distribuição; com frequência é necessário ter amostras de campo para determinar padrões de distribuição e consequente-mente, decidir quais testes estatísticos usar quando comparar diferenças entre populações. No entanto, as distribuições não aleatórias ou “contagiosas” de orga-nismos algumas vezes são constituídas de misturas de distribuições aleatórias de grupos contendo vários números de indivíduos ou de grupos que se mostraram distribuídos de modo uniforme, ou pelo menos mais regulares do que aleatórios. Tomando-se um caso extremo, seria melhor determinar o número de colônias de formigas, usando a colônia como unidade de população, com um método de amostragem, e então determinar o número de indivíduos por colônia, do que ten-tar medir o número de indivíduos diretamente por meio de amostras aleatórias.

Foram sugeridos muitos métodos para determinar o tipo de espaçamento e o grau de agregação entre os indivíduos em uma população (em que não é autoevidente), mas há muito a ser feito para resolver esse problema. Dois métodos são mencionados como exemplos. O primeiro método consiste em comparar a frequência atual de ocorrência de grupos de tamanhos diferentes obtida em uma série de amostras com a série de Poisson, que mostra a frequência com a qual grupos com 0,1,2,3,4…n s são encontrados juntos se a distribuição for aleatória. Assim, se a ocorrência de grupos de tamanho pequeno (inclusive vazias) e grupos de tamanho grande for mais frequente e a ocorrência de grupos de tamanho médio for menos frequente do que o esperado, a distribuição é agregada. Oposto existe em uma distribuição uniforme. Podem ser usados testes estatísticos para determinar se o desvio observado em relação à curva de Poisson é significativo.

O segundo método para determinar tipo de dispersão envolve medir de fato a distância entre os indivíduos de algum modo padronizado. Quando a raiz quadrada da distância é lançada em gráfico contra a frequência, o formato do polígono de frequência resultante indica o padrão de distribuição. Um polígono simétrico (em outras palavras, uma curva normal, em forma de sino), indica distribuição aleatória; um polígono desviado para direita indica uma distribuição uniforme; e um polígono desviado para esquerda indica uma distribuição agregada (indivíduos mais próximos entre si do que o esperado). Uma medida numérica do grau de desvio pode ser computada. Esse método,

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claro, seria mais aplicável à vegetação ou animais sedentários, mas poderia ser usado para determinar o espaço entre colônias ou domicílios de animais como tocas de roedores ou ninhos de aves.

Larvas de besouros geralmente estão distribuídas de modo aleatório por todo seu ambiente uniforme, pois sua distribuição observada corresponde à distribuição de Poisson (PARK, 1934). Parasitas ou predadores solitários, (como as aranhas) às vezes apresentam uma distribuição aleatória. Isso ocorre porque esses organismos frequentemente se engajam no comportamento de busca aleatória por seus hospedeiros ou suas presas.

As árvores de florestas que alcançaram altura suficiente para formar uma parte do dossel da floresta podem mostrar uma distribuição uniforme regular, porque a competição por luz solar é tão grande que as árvores tendem a ser espaçadas em intervalos mais regulares do que aleatórios. Um milharal, um pomar ou uma plantação de pinheiros, claro, seriam exemplos ainda mais claros. Os arbustos de desertos são muitas vezes, espaçados muito regularmente, quase como se fossem plantados em fileiras, por causa da intensa competição no ambiente de baixa umidade, que pode incluir a produção de antibióticos vegetais que impedem o estabelecimento de vizinhos próximos. Um padrão similar mais regular do que aleatório ocorre em animais territoriais.

9 PRINCÍPIO DE AGREGAÇÃO E REFÚGIO

Como descrito no subtópico anterior, níveis variados de agregação são característicos da estrutura interna da maioria das populações uma vez ou outra. Essa agregação é um resultado de agregações individuais: (1) em resposta a diferenças locais do habitat ou paisagem; (2) em resposta às mudanças diárias e sazonais do clima; (3) por causa dos processos reprodutivos; ou (4) por causa das alterações sociais (em animais superiores). A agregação pode aumentar a competição entre indivíduos por recursos, como nutrientes, alimento, ou espaço, mas isso é geralmente mais que contrabalançado pelo aumento da sobrevivência do grupo por causa de sua capacidade de se defender, de encontrar recursos ou de modificar as condições do microclima ou do micro-habitat. O grau de agregação, e a densidade global, que resulta em crescimento e sobrevivência populacional ótimos varia de acordo com as espécies e condições; portanto, a subaglomeração (ou falta de agregação), assim como a superaglomeração, pode ser limitante. Esse princípio é chamado de princípio de agregação de Allee (em homenagem ao ecólogo comportamental Warder Clyde Allee).

Refugiar-se descreve um tipo especial de agregação em que grupos de animais grandes, socialmente organizados, estabelecem-se em um local favorável, central (refúgio), de onde se dispersam e para onde retornam regularmente para satisfazer suas necessidades de alimento ou outros recursos. Alguns dos animais mais bem adaptados na Terra, inclusive as aves e os humanos, usam estratégias de se refugiar.

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Em plantas, a agregação pode ocorrer em resposta ao primeiro dos três fatores acima (habitat, clima ou reprodução). Em animais superiores, agregações podem ser resultado de todos os quatro fatores, mas especialmente do comportamento social, por exemplo, pelas manadas de renas no Ártico, os grandes bandos migratórios de aves, ou as manadas de antílope da savana da África oriental, que se movem de uma área de pastejo para outra, evitando, assim o sobrepastejo em qualquer parte da savana.

Nas plantas em geral, é um princípio ecológico bem definido que a agregação seja inversamente relacionada à mobilidade dos propágulos (sementes ou esporos). Em campos abandonados, plantas com sementes não móveis (cedros, caquizeiros) estão quase sempre agregados perto de uma árvore parental ou ao longo de cercas e outros lugares onde aves ou outros animais tenham depositados as sementes em grupos. Os capins e os pinheiros que têm sementes leves espalhadas pelo vento, são comparativamente distribuídos de forma muito mais aleatória em campos abandonados. Um grupo de plantas pode resistir ação do vento bem melhor do que indivíduos isolados ou pode reduzir a perda de água de modo mais efetivo. Com as plantas verdes, no entanto, os efeitos prejudiciais da competição por luz e nutrientes geralmente superam as vantagens da agregação.

As vantagens de sobrevivência em grupos mais marcantes são encontradas em animais. Por exemplo, grupos de peixes podem resistir a certa dose de veneno introduzido na água muito melhor do que os indivíduos isolados. Os indivíduos isolados são mais resistentes ao veneno quando colocados em água anteriormen-te ocupado por um grupo de peixes do que quando colocado em água não tão “condicionada biologicamente”; nas águas previamente ocupadas, o muco e outras secreções ajudaram a combater os venenos, revelando, assim, algo do mecanismo da ação do grupo nesse caso. As abelhas são um outro exemplo do valor de so-brevivência do grupo; uma colmeia ou cacho de abelhas pode gerar e reter calor suficiente na massa para a sobrevivência de todos os indivíduos a temperatura su-ficientemente baixas para matar todas as abelhas se estivessem isoladas.

Agregações sociais reais, como a dos insetos e vertebrados sociais, em contraste com agregação passiva em resposta a algum fator ambiental comum, tem uma organização definida, envolvendo hierarquia sociais especializações individuais. Uma hierarquia social pode ser uma demonstração de domínio e subordinação entre os indivíduos, geralmente em ordem linear, como uma cadeia de comando, ou pode ser um padrão complicado de lideranças, domínio e cooperação, como ocorre em grupos bem unidos de aves insetos que se comportam quase como uma só unidade. Esses tipos de organizações sociais beneficiam a população evitando superabundância de densidade.

Entre os animais superiores, uma estratégia de agregação bem-sucedida foi chamada de refugiar-se Hamilton e Watt (1970) e Paine (1976). Refúgios são locais ou situações em que os membros de uma população explorada têm alguma proteção dos predadores e parasitas. Um grande número de indivíduos recorre a um local central favorável ou núcleo, por exemplo, um poleiro ou uma grande

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colônia reprodutiva de aves marinhas. A partir destes locais, os organismos se abastecem de forragem em um grande perímetro ou área de suporte vital, diariamente. A agregação em um local central é vantajosa, pois assegura um ganho líquido de energia pelos indivíduos quando bons locais centrais são escassos. As desvantagens dos refúgios são os estresses, como poluição por excremento e pisoteio excessivo da vegetação ou substrato no local central e o aumento no risco de predação durante a incursão de coleta de alimento ou forrageamento.

As organizações extraordinárias de insetos sociais são únicas em seus papéis especializados. As sociedades de insetos com maior desenvolvimento são encontradas entre os cupins e as formigas e abelhas. Nas espécies mais especializadas, uma divisão de trabalho é cumprida pelas três castas: reprodutores (rainhas e zangões), operárias e soldados. Cada casta é especializada para desempenhar as funções de reprodução, coleta de alimento e proteção, respectivamente. Esse tipo de adaptação leva à seleção de grupo não somente dentro de uma espécie, mas também em grupos de espécies intimamente ligadas.

O princípio de agregação (ou princípio de Allee) é relevante para a condição humana. Agregação em cidades e distritos urbanos (uma estratégia de refúgio) é obviamente benéfica, mas só até um certo ponto, em conexão com a lei dos retornos reduzidos. A exploração de combustível fóssil estendeu a dispersão de áreas de forrageamento para os confins da Terra, de modo que as cidades e outros locais centrais têm pouca energia e restrições de combustível conforme o tamanho da população refugiada. Entretanto, a poluição e o custo de manutenção se tornam cada vez mais limitantes ao passo que cresce a densidade da população humana. Assim, a cidades, como as colônias de abelhas e cupins podem ficar grandes demais para o seu próprio bem. O tamanho ótimo de uma agregação de insetos sociais é determinado pela tentativa e erro da seleção natural. Como não se pode ainda determinar objetivamente o tamanho ótimo das cidades, elas tendem a ultrapassar em tamanho e então se despovoar, quando os custos excedem os benefícios. De acordo com os princípios ecológicos, é um erro manter ou subsidiar uma cidade (com recursos federais, impostos levados, importações de combustíveis fósseis caros etc.) que cresceu demais em relação a seu suporte vital.

10 ÁREA DE AÇÃO E TERRITORIALIDADE

As forças que isolam ou espaçam os indivíduos, pares ou pequenos gru-pos em uma população são talvez não tão divulgadas como as que favorece a agregação. No entanto, tais forças são importantes para aumentar a aptidão e funcionam como um mecanismo para regular populações. Em geral, o isolamen-to é resultado de (1) competição entre os indivíduos por recursos limitantes; ou (2) antagonismo direto, envolvendo respostas comportamentais em animais su-periores e mecanismos químicos de isolamento em plantas, microrganismos e animais inferiores. Em ambos os casos, podem ter como resultado uma distri-buição aleatória ou uniforme como esboçado no subtópico 8 (Figura 11), porque vizinhos próximos são eliminados ou expulsos. Os indivíduos, pares ou grupos familiares de vertebrados e invertebrados superiores, comumente restringem

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suas atividades a uma área chamada de área de ação. Se essa área for defendida ativamente, de modo a haver pouca ou nenhuma sobreposição de uso de espaço por indivíduos antagonistas, pares etc., é chamada de território. A territorialida-de parece ser mais pronunciada em vertebrados e em certos artrópodes que têm padrões de comportamento reprodutivo complicado, envolvendo construção de ninhos, postura de ovos e cuidado e proteção de jovens.

Assim como a agregação pode aumentar a competição, mas tem vantagens compensatórias, o espaçamento de indivíduos em uma população também pode produzir a competição pelas necessidades de vida ou fornecer a privacidade necessária para os ciclos reprodutivos complexos, como em aves e mamíferos, porém, com o custo de perder as vantagens de ação cooperativa de grupo. Presumivelmente, o padrão que sobrevive por meio da evolução em um caso em particular depende de qual alternativa fornece a maior vantagem de sobrevivência no longo prazo. De qualquer modo, ambos os padrões são frequentes na natureza; e, de fato, populações de algumas espécies alternam de um para o outro. Alguns animais por exemplo, isolam-se em territórios durante a estação de reprodução, mas se agregam em bandos no inverno, obtendo, assim, as vantagens de ambos os arranjos. De novo, as idades e sexos diferentes podem mostrar padrões opostos ao mesmo tempo (adultos se isolam, jovens se agregam, por exemplo).

O papel da competição intraespecífica e das “guerras químicas” que produzem espaçamento em árvores de florestas e arbustos de deserto são mecanismos de isolamento muito difundidos entre as plantas superiores. Muitos animais se isolam e restringem suas atividades principais a áreas definidas ou áreas de ação, que podem variar dos poucos metros quadrados a muitos hectares quadrados. Como as áreas de ação frequentemente se sobrepõe, somente um espaçamento parcial é obtido; a territorialidade atinge o máximo em espaçamento. Os tamanhos das áreas de ação variam de acordo com tamanho do animal como seria de se esperar. O tamanho da área de ação do urso pardo por exemplo foi estimado média em 337.000 ha, ao passo que o tamanho da área de ação do rato-veadeiro foi definido como menos de um hectare (HARRIS, 1984).

O termo território, foi Introduzido por Howard (1948). Território é definido como a área do habitat defendida pelos indivíduos de uma espécie em particular, frequentemente um casal em reprodução, contra outros membros da mesma espécie. Territorialidade, ou seja, a defesa desse espaço de habitat é um comportamento social. A área defendida pode ser bastante grande, maior do que o necessário para o suprimento de alimentos do casal e sua prole. Na maioria dos comportamentos territoriais, a luta real por fronteiras é mantida em um nível mínimo. Os proprietários anunciam sua terra ou espaço com o canto ou exibindo-se, e os intrusos potenciais geralmente evitam entrar em domínios estabelecidos. Muitos peixes, aves e répteis tem sinais distintivos na cabeça, no tronco ou nos apêndices, exibidos para intimidar os intrusos. No caso da maioria das aves canoras migratórias, os machos chegam as áreas de nidificação antes das fêmeas e dedicam seu tempo estabelecendo, e avisando sobre seus territórios, e fazem isso

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cantando alto. O fato de que a área defendida por aves seja muitas vezes maior no início do ciclo de nidificação do que mais tarde, quando a demanda por alimento é maior, e o fato de que muitas espécies de aves, peixes e répteis territorialistas não defendem a área de alimentação sustentam a ideia de que o isolamento e o controle reprodutivo têm maior valor de sobrevivência para a territorialidade que o isolamento de um suprimento alimentar.

A territorialidade certamente afeta a aptidão genética (probabilidade de deixar descendentes), porque os indivíduos de espécies territorialistas que não podem manter os territórios favoráveis não procriam. Apesar de que manter um território seja visto como vantajoso, os custos de defesa devem ser levados em consideração. Brown (1964) explicou os custos e benefícios por meio da hipótese de defensabilidade econômica. É discutível se a territorialidade funciona para evitar superpopulação e evoluiu por essa razão como Wynne-Edwards (1962) debateu com tanta intensidade. Brown (1969) resumiu os argumentos contra essa hipótese de limitação da população, incluindo a ideia de que o custo energético para defender uma área maior do que a necessária não produziria uma vantagem seletiva. Verner (1977), por outro lado, argumentou que pode ser adaptativo ocupar um local maior do que o ditado por necessidades imediatas, porque ficariam assegurados os recursos adequados às necessidades reprodutivas no caso de seca ou outras condições severas reduzirem a disponibilidade no futuro. Um estudo experimental de Riechert (1981) sobre uma espécie territorial de aranha do deserto forneceu evidências a favor desse ponto de vista. Este autor descobriu que o tamanho do território era fixo (somente um número de aranhas poderia ocupar a área experimental), ajustado a baixas em disponibilidade de presa em tempos de grande escassez. Portanto, a densidade da população não aumentaria além de um limite superior, determinado pelo número de locais de territórios favoráveis disponíveis, não importando quanto alimento estaria disponível em tempos favoráveis. Os s incapazes de estabelecer territórios perdiam peso e eventualmente morriam (figura 12). Os donos dos territórios ocupavam os melhores sítios e eram os mais bem-sucedidos em produzir proles, especialmente sob condições difíceis (clima desfavorável e escassez de alimento). Nesse caso, era possível o potencial de territorialidade para limitar a população e selecionar os indivíduos com maior aptidão.

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FIGURA 12 – RELAÇÃO DE PESO CORPORAL GANHO OU PERDIDO DIARIAMENTE POR ARANHAS DETENTORAS DE TERRITÓRIO COMPARADAS COM S (MARGINAIS) INCAPAZES DE

ESTABELECER TERRITÓRIOS

FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 267)

No caso de aves canoras migratórias, na primavera os machos geralmente chegam ao habitat de procriação antes das fêmeas. Os cantos altos funcionam para estabelecer um território para atrair seu par. Os indivíduos capazes de estabelecer um território não têm dificuldades de atrair um par; os indivíduos incapazes de estabelecer um território (indivíduos marginais; ver Figura 12) não procriam. Outras funções que foram sugeridas para territorialidade incluem evitar a predação ou doença mediante o espaçamento de indivíduos, alocação favorável e a preservação de recursos.

11 REPARTIÇÃO E OTIMIZAÇÃO DE ENERGIA: SELEÇÃO “r” SELEÇÃO “K”

Em paralelo a repartição de energia entre “P” (produção) e “R” (respiração ou manutenção) e ao conceito de energia líquida para um ecossistema, organismos individuais e suas populações podem crescer ou se reproduzir somente se puderem adquirir mais energia do que é necessário para a manutenção. Energia de manutenção consiste na taxa de repouso ou taxa basal do metabolismo mais um múltiplo desse para cobrir a atividade mínima necessária à sobrevivência sob condições de campo. Essa energia para existência deve ser estimada por observação de tempo e energia no campo, porque varia muito se a espécie for sedentária ou ativa. A energia líquida necessária para reprodução e, portanto, para a sobrevivência das gerações futuras implica energia dedicada às estruturas reprodutivas, atividades de acasalamento, produção de prole (sementes, ovos, jovens) e cuidado parental. Por meio da seleção natural, os organismos atingem uma relação custo-benefício de entrada de energia menos a energia de custo de

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manutenção tão favorável quanto possível. Para os autótrofos, essa eficiência envolve luz utilizável, convertível em alimento, menos a energia exigida para manter as estruturas de captação de energia (folhas, por exemplo) como uma função do tempo que a energia luminosa está disponível. Para os animais, o fator crítico é a proporção de energia utilizável do alimento menos o custo energético da busca e do consumo de itens alimentares. Pode-se atingir a otimização de duas maneiras básicas: (1) minimizando o tempo com a busca ou conversão eficiente; ou (2) maximizando a energia líquida selecionando itens grandes de alimento ou fontes facilmente conversíveis de energia, por exemplo. A maioria dos modelos de otimização indica que, quanto menor a abundância absoluta do alimento, ou outra fonte de energia, maior a área de habitat forrageada e maior amplitude de itens alimentares que devem ser aceitos para otimizar as razões custo-benefício. No entanto, fatores como competição ou cooperação com outras espécies, podem alterar essa tendência.

A razão entre a energia reprodutiva e a energia de manutenção varia não somente com o tamanho dos organismos e com os padrões de história de vida, mas também com a densidade populacional e a capacidade de suporte. Em ambientes não adensados, a pressão de seleção favorece a espécie com um alto potencial reprodutivo (alta razão entre os esforços de reprodução e da manutenção). Em contraste, condições de adensamento favorecem organismos com menor potencial de crescimento, mas melhores capacidades de usar recursos escassos e competir por eles (maior investimento de energia na manutenção e sobrevivência do indivíduo). Esses dois modos são conhecidos como seleção tipo “r” e seleção tipo “K”, respectivamente (e as espécies que as exibem são designadas estrategistas “r” e “K”), baseadas nas constantes “r” e “K” das equações de crescimento descritas nos subtópicos 4 e 5 desta unidade.

Repartição ou alocação de energia entre as várias atividades de um organismo reflete balanços entre as vantagens e os custos de cada atividade na produção de mudança em rmax, a taxa intrínseca de crescimento (geneticamente determinada), para aumentar a sobrevivência ou a aptidão. A primeira consideração, claro, é sobrevivência e manutenção do indivíduo (o componente respiratório) com energia adicional alocada ao crescimento e à reprodução (o componente produção). Grandes organismos, assim como grandes cidades, devem alocar uma porção maior de sua entrada de energia metabolizada para a manutenção do que os pequenos organismos, que não têm tanta estrutura para manter. A seleção natural, aquela função de força mestre intransigente, exige que todos os organismos encontrem um balanço ótimo entre a energia gasta com sobrevivência futura e a energia gasta com a sobrevivência no presente.

A Figura 13 mostra quatro alocações hipotéticas energia líquida entre três principais atividades: (1) energia gasta para lidar com a competição com outras espécies lutando pelos mesmos recursos; (2) energia gasta para evitar ser comido (ou pastejado) por um predador; (3) energia gasta para produzir descendentes. Quando a competição e a predação têm baixo impacto, uma grande parte do fluxo de energia pode ir para reprodução e a produção de descendentes (Figura

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13A). Por outro lado, a competição ou atividades de antipredador podem tomar a maior parte da energia disponível (Figuras 13B e 13C, respectivamente). Todas as três demandas recebem aproximadamente iguais alocações no último exemplo (Figura 13D). Os exemplos A, B, C, e D podem representar quatro espécies diferentes ou quatro comunidades diferentes nas quais a pressão de seleção produza os padrões ilustrados em muitas espécies.

Como veremos no Tópico 3 (DESENVOLVIMENTO DO ECOSSISTEMA), o exemplo A representa uma situação comum em estágios pioneiros ou em colonização da sucessão, em que a relação “r” predomina; os exemplos de B a D são padrões prováveis em estágios mais maduros, quando a seleção “K” pode predominar.

ESTUDOS FUTUROS

FIGURA 13 – ALOCAÇÕES HIPOTÉTICAS DE ENEGIA PARA TRÊS PRINCIPAIS ATIVIDADES NECESSÁRIAS À SOBREVIVENCIA EM QUATRO SITUAÇÕES CONTRASTANTES (A – D) EM QUE

A IMPORTÂNCIA RELATIVA DE CADA ATIVIDADE VARIA

FONTE: Cody (1966 apud ODUM; BARRET, 2008, p. 270)

Schoener (1971), Cody (1974), Pyke et al. (1977) e Stephens e Krebs (1986), ao reverem como uma repartição e uma otimização de energia podem ser analisadas para determinar estratégias ótimas de alimentação ou forrageamento, sugerem que o problema é análogo à análise custo-benefício em economia, com o benefício sendo a aptidão aumentada e os custos sendo energia e tempo exigidos para assegurar futuros rendimentos reprodutivos. Forrageamento ótimo é definido como o retorno máximo possível de energia sob um dado conjunto de condições de forrageamento e habitat. Um predador, por exemplo, sofre pressão seletiva para aumentar a razão entre energia utilizável menos o custo de energia

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para obter uma presa ou tempo necessário para procurar, perseguir e consumir a presa. Pode-se aumentar a energia disponível para reprodução, em teoria (1) selecionando a presa maior ou mais nutritiva, ou a presa mais fácil de capturar; (2) reduzindo o tempo e o esforço de busca e perseguição.

As espécies com o potencial biótico (r) alto tendem a ser favorecidas em ambientes não adensados ou incertos sujeitos a estresses periódicos (como tempestades ou secas). As espécies com repartição de energia a favor da manutenção e a capacidade competitiva aumentada se dão melhor sob densidades “K” (saturação) ou fatores físicos estáveis (baixa probabilidade de perturbações severas) e em estágios maduros ou clímax de sucessão ecológica. Em outras palavras, as espécies que exibem crescimento de população em forma de “J” são pioneiras eficientes que podem rapidamente explorar recursos não utilizados ou acumulados há pouco tempo, e elas são resilientes às perturbações. As espécies e populações de crescimento mais lento estão mais bem adaptadas a comunidades maduras e são mais resistentes, mas menos resilientes às perturbações. A Tabela 1 resume os atributos de espécies “r” e “K” selecionadas.

TABELA 1 – ATRIBUTOS DA SELEÇÃO r E K

Atributo Seleção r Seleção K

Clima Imprevisível Previsível

Tamanho da população Variável no tempo Constante no tempo

Competição Fraca Severa

A seleção favorece

Desenvolvimento rápido

Reprodução prematuraTamanho corporal

pequenoMuitos descendentes

Desenvolvimento lentoReprodução atrasada

Tamanho corporal grandePoucos descendentes

Duração da vida Curta (< 1 ano) Curta (> 1 ano)

Estágio na sucessão Inicial Final (clímax)

Induz a Produtividade Eficiência

FONTE: Pianka (1970; 2000 apud ODUM; BARRET, 2008, p. 272)

Macarrthur (1972) notou que a seleção “K” prevalece nos trópicos relativamente não sazonais, ao passo que a seleção “r” prevalece no ambiente sazonal da zona temperada do Norte, onde o crescimento da população é marcado por crescimento exponencial seguido por declínios catastróficos durante os meses de inverno.

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TÓPICO 1 — ECOLOGIA DE POPULAÇÕES

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O tamanho da ninhada, (número de ovos ou filhotes por período reprodutivo) em aves parece não somente refletir a mortalidade e a sobrevivência, mas também o espelho da seleção “r” e “K”. As aves oportunistas (estrategistas “r”) apresentam ninhada maior do que as espécies em equilíbrio, como é o caso de aves de áreas temperadas comparadas com as de áreas tropicais.

As designações de estrategistas “r” e “K” podem ser consideradas como classificações simplificadas, porque muitas populações têm modos variáveis ou intermediários. No entanto, Pianka 1970 descobriu uma bimodalidade aparente nos organismos relativamente “r” e “K” selecionados na natureza relacionada com os tamanhos dos corpos e o tempo de geração. Ele argumentou que “uma estratégia (seja “r” ou “K”) é geralmente superior algum tipo de compromisso”.

Levins (1968) concluiu que a incerteza ambiental limita a especialização na evolução das espécies. Sob condições instáveis, para propósitos de seleção, é favorável ser um generalista, assim como ter um alto rmax. Também, sob essas condições, as comunidades podem ser organizadas apenas vagamente. A especialização e a organização podem alcançar níveis mais altos somente se a imprevisibilidade do ambiente for baixa. A que extensão podem os grupos de populações e comunidades, por sua ação combinada, reduzir as incertezas ambientais e, portanto, abrir o caminho para que a organização possa prosseguir para um nível mais alto, como acontece algumas vezes com as sociedades humanas? Essa questão permanece sem resposta.

Solbrig (1971) notou que estrategistas “r” e “K” podem ser encontrados dentro da mesma espécie. O dente-de-leão comum (Taraxacum officinale), por exem-plo, tem diversas linhagens ou variedades que diferem na mistura de genótipos que controlam a alocação de energia. Uma linhagem cresce principalmente em áre-as perturbadas e produz mais sementes menores que amadurecem no início da estação, comparada com outra linhagem encontrada em áreas menos perturbadas que aloca mais energia nas folhas e hastes e produz menos sementes que amadure-cem tarde. A última linhagem obscurece a variedade mais fecunda quando as duas estão crescendo juntas em um bom solo. Assim, a linhagem 1 é uma colonizadora mais eficiente de solo novo e se qualifica como estrategista “r”, a linhagem 2 é uma competidora mais eficiente ou estrategista “K”.

Apesar de os ambientes incertos ou perturbados favorecerem a seleção “r”, os estrategistas “K” não estão sendo de modo nenhum excluídos. Por exemplo, em comunidades adaptadas ao fogo, como o chaparral da Califórnia, as espécies de plantas de “rebrota” que alocam grandes reservas de energia às partes subterrâneas são bem adaptadas, ou até melhor, para sobreviver a fogos periódicos, pois são plantas que asseguram o futuro por meio de suas sementes (GRIME, 1977; 1979).

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UNIDADE 3 — UNIDADES DE ECOLOGIA

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12 GENÉTICA DE POPULAÇÕES

Uma compreensão da genética de populações e seleção natural é necessária para entender como as populações evoluem e como as comunidades e ecossistemas mudam no decorrer do tempo. A genética de populações e a seleção natural escoram a área de estudo frequentemente chamada biologia evolutiva ou ecologia evolutiva. A genética de populações é o estudo das mudanças na frequência gênica e genotípica dentro de uma população. Seleção natural é um processo evolutivo por meio do qual as frequências das características genéticas em uma população mudam como resultado da sobrevivência diferencial e do sucesso reprodutivo dos indivíduos que têm essas características. O registro da história da vida na Terra documenta que os atributos e características dos organismos, populações de espécies mudam ao longo do tempo. Esse processo é chamado de evolução.

Darwin (1859) foi o primeiro a documentar que o processo da seleção natural permite às populações responder a mudanças em seu ambiente, resultando na estreita conexão de um organismo com o seu ambiente natural. A genética de populações ajuda a explicar como as populações, e consequentemente as comunidades e os ecossistemas, sofrem mudanças evolutivas. A ação do ambiente sobre a variabilidade genética entre os indivíduos na população resulta em uma adaptação da população ou espécie ao seu ambiente. Adaptação se refere as características de um organismo que aumentam sua aptidão para sobreviver e reproduzir.

Com relação à forma que a seleção natural assuma, ela não pode provocar uma mudança evolutiva, a menos que haja uma variação genética na população. A seleção natural, expressa pelas mudanças em frequências genotípicas e fenotípicas nas populações, é um mecanismo de adaptação ao ambiente. A base da adaptação ao ambiente local é a variabilidade genética dos s da população. As fontes de variabilidade estão embutidas nos genes, especificamente nas moléculas de DNA. Como a informação genética está contida na molécula do DNA, portanto, qualquer variação genética que ocorra é causada por mudanças no DNA. As principais fontes de variabilidade genética são as recombinações reprodutivas de genes fornecidas por pais em populações bissexuadas e mutações herdáveis no gene ou cromossomo. O DNA é um modelo a partir do qual uma célula reproduz proteínas e outros ácidos nucleicos. Os genótipos de todos os indivíduos formam o patrimônio genético de uma população porque cada indivíduo tem uma composição genética única. A seleção natural, agindo nessa variabilidade genética, resulta em aumento de aptidão dentro do ambiente natural. A aptidão é geralmente medida como o sucesso reprodutivo total da vida de um indivíduo. Todos os genes e todos os indivíduos numa população formam seu patrimônio genético, que representa toda a variação genética da população. Quando todos os indivíduos se acasalam aleatoriamente numa população, então

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TÓPICO 1 — ECOLOGIA DE POPULAÇÕES

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todas as combinações de diferentes alelos são possíveis, embora muitas dessas combinações possam não estar presentes na população não dado tempo. Assim, a direção que a mudança toma (evolução) depende da estrutura genética dos s que sobrevivem e geram a prole reproduzida

A evolução por seleção natural ocorre quando os fatores genéticos influenciam a sobrevivência e a fecundidade. Os indivíduos que atingem a taxa reprodutiva mais altas são denominados selecionados, e sua proporção da população aumenta com o tempo. A seleção pode assumir uma de três diferentes formas, dependendo da heterogeneidade do ambiente e da taxa de variação nele. A seleção estabilizadora ocorre quando os indivíduos com fenótipos intermediários ou médios tem sucesso reprodutivo maior do que os fenótipos extremos. A seleção estabilizadora tende a pressionar a distribuição dos fenótipos numa população na direção de um ponto intermediário ótimo e opõe-se a tendência da variação fenotípica em aumentar através da mutação e do fluxo gênico entre populações. A seleção estabilizadora executa uma limpeza numa população, varrendo para fora a variação genética danosa. Quando o ambiente de uma população é relativamente imutável, a seleção estabilizadora é o modo dominante, e pouca mudança evolutiva acontece.

A seleção direcional ocorre quando os indivíduos mais ajustados têm um fenótipo mais extremo do que a média da população. Nesse caso, os indivíduos cujos fenótipos estão de um lado da média populacional produzem a maioria dos filhotes e a distribuição do fenótipo nas gerações seguintes muda em direção ao novo ótimo. Quando aquele novo ótimo é atingido, a seleção se torna estabilizadora. A seleção direcional muda a frequência dos alelos no patrimônio genético. A composição do patrimônio genético muda resposta para a seleção. A taxa dessa mudança depende do ajustamento relativo, ou sucesso reprodutivo, de indivíduos com diferentes fenótipos. Os geneticistas de população modelaram os efeitos da seleção natural na composição genética de uma população para determinar a taxa na qual a evolução pode ocorrer.

Os indivíduos com fenótipos em qualquer um dos extremos pode ocasionalmente ter um ajustamento maior do que os indivíduos com fenótipos intermediários. Esta situação leva a seleção disruptiva, que tende a aumentar a variação genética e fenotípica numa população e, no caso extremo, criar uma distribuição bimodal de fenótipos. Imagina-se que a seleção disruptiva seja incomum. Ela pode ocorrer, por exemplo, quando os indivíduos podem se especializar em um pequeno número de recursos alimentares que diferem de acordo com tamanho ou algum outro atributo. A seleção disruptiva pode também acontecer quando as interações entre os indivíduos criam alternativas para a história de vida prevalecente; por exemplo, o comportamento territorial dos grandes machos pode favorecer os pequenos machos que realizam cópulas furtivas com as fêmeas. A forte competição entre os indivíduos por um recurso preferido pode também aumentar o ajustamento de indivíduos que se especializam em algum de vários recursos alternativos.

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UNIDADE 3 — UNIDADES DE ECOLOGIA

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As diferenças nos fatores seletivos ou nas mudanças aleatórias (deriva genética e eventos fundadores) em diferentes partes da abrangência de uma população podem causar uma variação geográfica na sequência de alelos entre subpopulações. Tal variação é frequentemente encontrada entre subpopulações que estão separadas por uma barreira natural, como um rio ou uma cadeia de montanhas. Contudo, as populações não têm que ser subdivididas para que surjam diferenças genéticas nelas. Se a diferença nas pressões seletivas entre duas localidades está fortemente relacionada com a taxa do fluxo gênico entre elas, então as diferenças nas frequências de alelos podem ser mantidas por pressão natural diferencial. Esse fenômeno frequentemente resulta numa mudança gradual nas frequências dos alelos, ou algum caráter fenotípico sobre influência genética, ao longo da distância. Dessa forma, os genótipos dos indivíduos numa população também podem variar geograficamente.

Os botânicos já reconheceram a muito tempo que indivíduos de uma espécie que crescem em diferentes habitats podem apresentar formas variadas correspondentes as condições locais. Em muitos casos, essas diferenças resultam de respostas de desenvolvimento. Contudo, experimentos em algumas espécies revelaram adaptações genéticas as condições locais. No início do século XX o Botânico sueco Göte Turesson coletou semente de várias espécies de plantas que viviam em diversos habitats e cultivou-as juntas no seu jardim. Isso é denominado de um experimento de jardim comum. Ele descobriu que mesmo quando cultivadas sob condições idênticas, muitas das plantas apresentaram formas diferentes, dependendo do habitat de origem. Turesson chamou essas formas de ecótipos, um nome que persiste até o presente. Ele sugeriu que os ecótipos representam linhagens geneticamente diferenciadas de uma população, cada uma restrita a um habitat específico. Como Turesson cultivou suas plantas sob condições idênticas, ele percebeu que as diferenças entre os ecótipos deveriam ter uma base genética, e que elas deveriam ter resultado de diferenciação evolutiva dentro da espécie de acordo com o habitat.

Outro exemplo mostra como uma barreira geográfica que isola subpopula-ções uma da outra pode influenciar a variação genética. O sagui-selado (Sanguinus fusciocollis) está distribuído ao longo de ambos os lados do Rio Juruá no oeste da Bacia Amazônica no Brasil. Na área da parte baixa do rio, onde ele é largo, as popu-lações de sagui em ambos os lados da margem são geneticamente distintas. Próxi-mo à cabeceira, onde o rio é mais estreito e seu curso sinuoso pode cortar áreas de ambos os lados da bacia, os genótipos típicos das populações da margem direita do rio também aparecem na margem esquerda. Portanto, a variação genética é comum nas populações e que os organismos têm adaptações que efetivamente gerenciam essa variação para reduzir suas consequências potencialmente negativas no ajus-tamento individual. A variação genética também proporciona matéria bruta para a mudança evolutiva, que prossegue à medida que a seleção natural aumenta a frequência de genótipos mais ajustados numa população.

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TÓPICO 1 — ECOLOGIA DE POPULAÇÕES

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A genética da população tem diversas importantes mensagens acerca do estudo das populações. Primeiro cada população abriga alguma variação genética que influencia o ajustamento. Isso significa que a evolução é potencialmente um processo contínuo em todas as populações. Também significa que devemos esperar que cada organismo tenha adaptações que o auxilie a reduzir os efeitos danosos dos alelos deletérios sobre si mesmo e seus filhotes. As adaptações para assegurar intercruzamento são o tipo de mecanismo pelo qual os organismos gerenciam avaliação genética onipresente nas populações.

Segundo, as mudanças em fatores seletivos do ambiente quase sempre serão atendidas por respostas evolutivas que levarão a mudanças nas frequências dos genótipos na população. A magnitude da mudança não é sempre previsível e depende da variação genética específica presente na população em qualquer tempo. Os atributos mais continuamente variáveis, como o tamanho, têm suficiente variação genética para responder à seleção, mas o intervalo e a extensão de uma resposta podem estar limitados por respostas correlacionadas de outros atributos que tenham consequências negativas para o ajustamento. Dado tempo suficiente, as populações podem atingir algum tipo de ótimo evolutivo e se tornarem estáveis, mas não há uma boa estimativa de quanto tempo é necessário.

Terceiro, mudanças ambientais rápidas trazidas por alterações causadas por humanos no ambiente, introdução de organismos predadores ou patogênicos, fragmentação de habitats e isolamento de populações (tanto de espécies de plantas quanto de animais), ou surgimento de novidades genéticas nos inimigos frequentemente excedem a capacidade de uma população de responder à evolução. A fragmentação de habitats promove o isolamento de populações tanto de espécies de plantas quanto de animais. Essas plantas e animais isolados carregam somente uma fração da variabilidade genética da população original total, neste caso, pode ocorrer um aumento da deriva genética além de produzir a depressão de endocruzamentos. Nessas circunstâncias, o declínio de uma população em direção a extinção é uma possibilidade relevante. As mudanças nas genéticas de populações também refletem nos níveis de organização de comunidade, ecossistema e paisagem.

Embora reste muito para ser aprendido, está claro que as populações têm relações dinâmicas evolutivas com seus ambientes, particularmente com os componentes biológicos de seus ambientes (competidores, predadores e patógenos) que estão também evoluindo em resposta a outros tipos de organismos. As interações entre as diferentes espécies podem exercer efeitos poderosos na demografia e na genética das populações, influenciando a evolução e a dinâmica populacional das espécies e determinando se as espécies podem coexistir umas com as outras.

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Neste tópico, você aprendeu que:

• Uma população é qualquer grupo de organismos da mesma espécie que ocupam um espaço particular e funcionam como parte de uma comunidade biótica.

• Densidade populacional é o tamanho de uma população em relação a uma unidade de espaço definido.

• A natalidade é a capacidade de uma população de crescer por meio da reprodução. A mortalidade quantifica as mortes dos indivíduos na população. A distribuição etária da população influencia tanto a natalidade quanto a mortalidade.

• A dinâmica de populações demonstra como e a que taxa uma população está mudando e como as mudanças afetam o número relativo de organismos de uma população.

• A capacidade de suporte é a resistência ambiental ou outro fator limitante que controla o crescimento indefinido da população.

• A flutuação relativa no número de organismos de uma população está sujeita a ações de fatores extrínsecos e fatores intrínsecos. Os fatores extrínsecos estão relacionados a condições do ambiente como temperatura, chuvas, umidade entre outros; os fatores intrínsecos estão relacionados a processos bióticos como disponibilidade de alimento, energia, doenças ou predação.

• Os mecanismos de regulação de uma população podem ser dependentes ou independentes da densidade. Mecanismos independente de densidade ocorrem quando o seu efeito ou mudança no número de indivíduos de uma população for independentemente do tamanho desta população; mecanismos dependentes de densidade ocorrem se seu efeito na população for uma função da densidade populacional.

• Pressões seletivas diferentes ou mudanças aleatórias em diferentes populações resultam em variação nas frequências dos genes dentro de uma certa abrangência geográfica. Esta variação é acentuada pela subdivisão da população em barreiras para a dispersão.

• A agregação ocorre em resposta a diferenças locais de habitat ou paisagem, em resposta às mudanças diárias ou sazonais do clima, também devido a processos reprodutivos ou por causa de alterações sociais. A agregação pode aumentar a competição entre os indivíduos por recursos alimentares espaço, mas é geralmente contrabalançado pelo aumento da sobrevivência do grupo.

RESUMO DO TÓPICO 1

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• Em ambientes não adensados, a pressão de seleção favorece a espécie com um alto potencial reprodutivo seleção tipo “r”. Em contraste, condições de adensamento favorecem organismos com menor potencial de crescimento, mas melhores capacidades de usar recursos escassos e competir por eles seleção tipo “k”.

• A genética de populações é o estudo das mudanças na frequência gênica e genotípica dentro de uma população. Seleção natural é um processo evolutivo por meio do qual as frequências das características genéticas em uma população mudam como resultado da sobrevivência diferencial e do sucesso reprodutivo dos s que têm essas características.

• A maioria das populações apresentam acasalamento seletivo negativo, no qual os casais são geneticamente diferentes um do outro.

• A seleção pode ser estabilizadora, caso em que os fenótipos intermediários de uma população são mais ajustáveis; direcional, caso em que um ou outro fenótipo extremo é favorecido sobre os mais comuns; ou disruptiva, caso em que vários fenótipos extremos são favorecidos simultaneamente.

• Mesmo que a seleção tenda remover variações genéticas de uma população, a variação é mantida por mutação e fluxo gênico de outras populações, e por pressões seletivas variantes dentro das populações.

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1 A densidade populacional é o tamanho de uma população em relação a uma unidade de espaço definido. Geralmente é expressa como o número de indivíduos ou da biomassa da população por área ou volume unitário. Sobre os atributos biológicos das populações, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) O metabolismo total do indivíduo, decresce com aumento do tamanho..b) ( ) Em um determinado nível, quanto maiores os indivíduos, menor a

biomassa.c) ( ) A taxa metabólica por unidade de peso de organismos grandes é maior

do que em organismos pequenos.d) ( ) A densidade ecológica é o número por unidade área disponível que

pode ser colonizado pela população

2 Uma população tem diversas propriedades que, embora mais bem expressa como variáveis estatísticas, são propriedades únicas do grupo e não são características dos indivíduos no grupo. Várias medidas e termos especiais são aplicáveis apenas a populações ou grupos de populações específicas. Com base nestas definições, analise as sentenças a seguir:

I - A natalidade ecológica ou efetiva se refere ao crescimento populacional sob uma condição ambiental de campo específica ou real.

II - Por serem organismos pequenos taxa de metabolismo por grama de biomassa em algas, bactérias e protozoários é proporcional ao seu tamanho e, portanto, muito mais baixa que a taxa metabólica por unidade de peso.

III - A taxa metabólica específica de peso aumenta conforme o tamanho do indivíduo diminui.

Assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.b) ( ) Somente a sentença II está correta.c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 Os ecólogos estão sempre mais interessados em como e a que taxa a população está mudando do que em seu tamanho absoluto e composição a qualquer tempo. O estudo das mudanças no número relativo de organismos em populações é chamado de dinâmica de populações. Com base no exposto, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

AUTOATIVIDADE

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( ) Uma taxa pode ser obtida dividindo-se a mudança em alguma quantidade pelo período de tempo que passou durante a mudança.

( ) O ponto de inflexão indica que após esse ponto da curva sigmoide de crescimento, a taxa de aumento começa a acelerar até o crescimento máximo.

( ) Quando o ambiente é ilimitado a taxa específica de crescimento se torna constante e máxima para as condições microclimáticas existentes.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V – F – F.b) ( ) V – F – V.c) ( ) F – V – F.d) ( ) F – F – V.

4 A deseconomia de escala é uma característica intrínseca dos ecossistemas naturais, mas alguns dos custos crescentes da complexidade são equilibrados pelos benefícios. Disserte sobre como a lei dos retornos decrescentes interferem no tamanho teórico máximo da população.

5 Energia de manutenção consiste na taxa de repouso ou taxa basal do metabolismo mais um múltiplo desse para cobrir a atividade mínima necessária à sobrevivência sob condições de campo. Essa energia para existência deve ser estimada por observação de tempo e energia no campo, porque varia muito se a espécie for sedentária ou ativa. Neste contexto, disserte e explique como por meio da seleção natural essa repartição de energia se processa em animais e plantas.

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UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

Uma comunidade biológica é uma associação de populações que interagem. Os ecólogos caracterizam as comunidades em termos do número de espécies presentes, suas abundâncias relativas, sua organização em agremiações de espécies com habitats de alimentação semelhantes e teia alimentares retratando relações de alimentação entre as espécies.

Questões acerca de comunidades focalizam as origens evolutivas das propriedades comunitárias, as relações entre organização e estabilidade comunitária e a regulação das diversidades de espécie. Inicialmente os ecólogos descreviam as comunidades biológicas como unidades organizadas atuando como superorganismos nos quais as funções de várias espécies encontram-se conectadas como as das partes de um corpo e evoluíram de forma a intensificar seu funcionamento interdependente. Este ponto de vista requer que as comunidades sejam entidades discretas que possam ser distinguidas umas das outras, no sentido como distinguimos indivíduos em populações ou espécies diferentes numa comunidade.

Oposto a esse entendimento, outros ecólogos sugerem que uma comunidade, muito distante de ser uma unidade distinta como um organismo, é meramente uma associação fortuita de espécies cujas adaptações e requisitos as capacita a viver juntas sobre as condições específicas físicas e biológicas que caracterizam um lugar em particular. Este pensamento considera que as comunidades biológicas sejam sistemas abertos.

O debate sobre a natureza das comunidades continua atualmente. É uma questão importante porque as propriedades dos conjuntos de espécies que coexistem no mesmo lugar compõem todas as interações entre elas.

TÓPICO 2 —

EOLOGIA DE COMUNIDADES

2 EOLOGIA DE COMUNIDADES: ASPECTOS GERAIS

Para a maioria dos ecólogos, o termo comunidade significa um conjunto de espécies que ocorrem juntas no mesmo lugar. Os ecólogos também concordam que as espécies que coexistem numa comunidade podem interagir fortemente através de interações consumidor-recursos e interações competitivas. Contudo, há também muito desacordo sobre o que uma comunidade seja. Alguns ecólogos afirmam que ela seja uma unidade de organização com fronteiras reconhecíveis,

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UNIDADE 3 — UNIDADES DE ECOLOGIA

cujas estrutura e funcionamento são reguladas pelas interações entre as espécies. Alguns têm, além disso, sugerido que as comunidades são organizadas de forma aumentar sua eficiência e produtividade. Outros ecólogos olham uma comunidade como um conjunto solto daquelas espécies que podem tolerar as condições de um lugar com habitat específico, mas que não formam uma fronteira distinta onde um tipo de comunidade se encontrar com outro.

Os ecólogos que descrevem comunidades como unidades ecológicas organizadas pensam nas comunidades como superorganismos nos quais as funções de várias espécies estão conectadas como as das partes de um corpo e evoluíram de forma a intensificar o seu funcionamento interdependente. Este ponto de vista requer que as comunidades sejam entidades discretas que possam ser distinguidas umas das outras, no sentido como distinguimos indivíduos em populações ou espécies diferentes numa comunidade. O defensor mais influente do ponto de vista organicista foi o ecólogo vegetal Frederick Clements que, no início do século XX, percebeu a comunidade como uma unidade discreta com fronteiras definidas e uma organização singular. As ideias de Clements sobre comunidade estavam bem ligadas aos tipos de vegetação. Ele apontou o que é uma floresta de pinheiros ponderosa difere de uma floresta de abetos que cresce em habitats mais úmidos e de arbustos e gramíneas típicas de lugares mais secos. Ele pensou que as fronteiras entre estas comunidades poderiam ser cruzadas em poucos metros ao longo de um gradiente de condições ambientais. De fato, algumas fronteiras comunitárias, como aquelas entre florestas decíduas e pradarias no meio oeste dos Estados Unidos e entre florestas de folhas largas e florestas de acículas no sul do Canadá, são claramente definidas e são respeitadas pela maioria das espécies de plantas e animais.

Por outro lado, o Botânico Henry A. Gleason, mais ao menos no mesmo tempo, sugeriu um ponto de vista oposto ao da organização comunitária. Este autor sugeriu que uma comunidade, muito longe de ser uma unidade distinta como um organismo, é meramente uma associação fortuita de espécies cujas adaptações e requisitos as capacitam a viver juntas sobre as condições específicas físicas e biológicas que caracterizam um lugar em particular. Uma associação de plantas, ele disse, não é “um organismo, dificilmente até mesmo uma unidade vegetacional, mas meramente uma coincidência”.

O debate sobre a natureza da comunidade continua atualmente. É uma questão importante porque as propriedades dos conjuntos de espécies que coexistem no mesmo lugar compõem todas as interações entre elas. Assim, não podemos ter uma compreensão completa da ecologia até que possamos compreender a natureza da comunidade.

Cada lugar na terra (cada pradaria, lago, rocha na fronteira do mar, entre outros ambientes) é compartilhado por muitos organismos coexistências. Essas plantas, animais e micróbios estão conectados uns aos outros por suas relações de alimentação e outras interações formando um todo complexo frequentemente

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TÓPICO 2 — EOLOGIA DE COMUNIDADES

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denominado de comunidade biológica. As inter-relações dentro das comunidades governam o fluxo de energia e a reciclagem de alimentos dentro do ecossistema. Eles também influenciam os processos populacionais e, ao fazer isso, determinam as abundâncias relativas das espécies.

Os membros de uma comunidade devem ser compatíveis no sentido de que os resultados de todas as suas interações permitem a sobrevivência e reprodução da comunidade. No entanto, ainda há um debate sobre quais fatores determinam o número de espécies que podem coexistir, e por que estes variam de um lugar para outro. E ainda, é importante compreender como as interações de espécies influenciam a estrutura e a dinâmica das comunidades. As espécies assumem diferentes papéis nas comunidades, e suas abundâncias relativas refletem como elas se ajustam na teia completa de interações dentro da comunidade. Os conjuntos de espécies também mudam com o tempo, seja em resposta as perturbações ou após alguns processos dinâmicos intrínsecos.

3 CONCEITOS ESTRUTURANTES NO ESTUDO DE COMUNIDADES

A visão de que uma comunidade é um superorganismo, cujo funcionamento e organização podem ser apreciados somente quando é considerada como uma entidade completa (o conceito holístico) faz sentido. Não podemos ponderar o significado do funcionamento de um rim separado do organismo ao qual pertence, e muitos ecólogos argumentam que, analogamente, não podemos considerar as bactérias do solo sem referência aos detritos sobre os quais elas se alimentam, seus predadores e as plantas nutridas por seus dejetos. Analogamente, eles argumentam, não se pode compreender cada espécie somente em termos de sua contribuição para a dinâmica do sistema todo. E acima de tudo, as relações ecológicas e evolutivas entre as espécies intensificam as propriedades da comunidade, tal como a estabilidade do fluxo de energia e a reciclagem de nutrientes, tornando uma comunidade muito mais do que a soma de suas partes individuais.

A visão de que a estrutura e o funcionamento comunitário simplesmente expressam interações de espécies individuais que formam associações locais, e não refletem qualquer organização, propósito ou coisa semelhante acima do nível de espécie, é denominado como o conceito individualista. De acordo com esta visão, como a seleção natural atua no resultado reprodutivo do indivíduo, cada população numa comunidade se desenvolve de forma a maximizar o sucesso reprodutivo de seus próprios membros, não para beneficiar a comunidade como um todo.

Um ponto de vista intermediário aceita as premissas individualistas que a maioria das interações de espécies são antagonistas e de que as comunidades podem ser montadas desordenadamente, mas também admite a premissa holís-

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UNIDADE 3 — UNIDADES DE ECOLOGIA

tica de que alguns atributos de estrutura e funcionamento comunitário surgem somente das interações entre as espécies. Além do mais, considera que essas inte-rações são frequentemente reforçadas pela coevolução refletindo as fortes forças recíprocas da seleção que ocorre entre espécies que interagem.

3.1 COEVOLUÇÃO

A coevolução é um tipo de evolução de comunidade (uma interação evolutiva entre organismos na qual a troca de informações genéticas entre os participantes e mínima ou ausente). A coevolução é evolução conjunta de duas ou mais espécies não intercruzantes que têm uma estreita relação ecológica, como as plantas e os herbívoros, grandes organismos e seus microrganismos simbiontes ou os parasitas e seus hospedeiros. Como existem pressões seletivas recíprocas, a evolução de uma espécie na relação depende, em parte, da evolução da outra.

Numerosos fenômenos interativos ocorrem entre os conjuntos de espécies em interação. Essas interações dominam o campo da ecologia evolutiva. As interações que iniciam como uma interação competitiva entre espécies podem tornar-se interações benéficas ou mutualísticas para ambas as espécies ao longo do tempo evolutivo. As interações entre espécies parecem tornarem-se mais mutualísticas nos ecossistemas e em comunidades maduras comparadas a sistemas jovens, em estágios iniciais de desenvolvimento do ecossistema.

E a teoria da coevolução surgida em 1964 é amplamente aceita até os dias atuais. A teoria da coevolução pode ser expressa da seguinte maneira: as plantas, mediante mutações ou recombinações ocasionais, produzem compostos químicos não diretamente relacionados aos passos metabólicos básicos, isto é, relacionado ao que é chamado de química secundária, que não são desfavoráveis para o crescimento e o desenvolvimento normal. Alguns desses compostos reduzem a palatabilidade das plantas ou são tóxicos quando ingeridos pelos herbívoros. Uma planta assim protegida dos insetos fitófagos poderia, de certa maneira, ter entrado em uma nova zona adaptativa. A radiação evolutiva dessas plantas pode seguir, e o que começou com uma mutação ou recombinação ao acaso poderia eventualmente caracterizar uma família ou grupo inteiro de famílias aparentadas. Os insetos fitófagos, entretanto, podem evoluir em resposta a esses obstáculos fisiológicos, através do desenvolvimento de linhagens imunes. Portanto, conforme Palo e Robbins (1991), a resposta para as substâncias secundárias das plantas e a evolução das resistências aos inseticidas parecem estar intimamente ligadas.

Se um mutante ou recombinante apareceu em uma população de insetos que permitiu a indivíduos se alimentarem da planta previamente protegida, a seleção pode ter conduzido essa linha de insetos para uma nova zona adaptativa, possibilitando que eles se diversificassem na falta de competição com outros herbívoros. Em outras palavras, a planta e o herbívoro evoluem juntos, ou seja, a evolução de um depende da evolução do outro. A expressão retroalimentação genética tem sido usada para esse tipo de evolução, que conduz à homeorese da população e da comunidade dentro do ecossistema.

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É possível que a coevolução possa ser mais bem investigada e entendida com estudos de interação entre dois conjuntos de espécies, com frequência espécies que representam diferentes grupos taxonômicos. Beija-flores polinizadores e plantas com flores vermelhas que eles polinizam representam um exemplo clássico de coevolução. As abelhas polinizadoras são muito importantes tanto para plantas silvestres como para outras espécies de plantas. Heinrich (1979; 1980) avaliou as interações entre flores e abelhas baseado na energética. Ele mediu a produção de néctar quanto ao açúcar disponível por flor e contou número de visitas por abelhas é a taxa de remoção do néctar em relação a hora do dia e a temperatura. Diferente das borboletas, as abelhas têm uma alta taxa metabólica e precisam visitar as flores frequentemente para ter aproveitamento energético. Para atrair esses polinizadores necessários e garantir a sobrevivência, flores de várias espécies evoluíram mecanismos tanto de floradas sincronizada como de ocupação de manchas de paisagem.

Os herbívoros exercem uma forte pressão seletiva sobre as espécies de plantas que pastam (isto é, as plantas evoluem para desencorajar o pastejo). Existe uma variedade de compostos químicos conhecidos como compostos secundários, que servem para desencorajar os herbívoros. Os compostos secundários são compostos orgânicos produzidos pelas plantas e utilizados na defesa química. São compostos tantos tóxicos ou, como o tanino, compostos que tornam as plantas menos palatáveis. Esses compostos parecem representar adaptações bioquímicas e fisiológicas específicas das plantas contra as pressões seletivas causadas pelos herbívoros. Os herbívoros, por sua vez, se adaptam a essas substâncias químicas por meio de mudanças em seu próprio metabolismo genético ou fisiológico. Dessa forma, herbívoros e plantas coevoluem para aumentar a possibilidade de sobrevivência.

O pastejo também se tem mostrado como estímulo ao crescimento das plantas e o aumento da produtividade primária líquida. Assim, essa interação evoluiu para beneficiar tanto os herbívoros como as espécies selecionadas nas quais eles pastam. Essa seleção natural recíproca não é limitada para as interações entre duas espécies, como mostrado por Colwell (1973), que descreveu como dez espécies diferentes (quatro de plantas angiospermas, três de beija-flores, uma de ave e duas de ácaros) coevoluíram para produzir a fascinante subcomunidade tropical, ou seja, a coevolução pode ocorrer em vários níveis.

3.2 EVOLUÇÃO DA COOPERAÇÃO: SELEÇÃO DE GRUPO

Para considerar a incrível diversidade e a complexidade da biosfera, os cientistas postularam que a seleção natural opera além do nível de espécie e além da coevolução. A seleção de grupo é definida como uma seleção natural entre grupos ou conjunto de organismos que não necessariamente estão ligados por associações mutualistas. A seleção de grupos, em teoria conduz para a manutenção das características favoráveis às populações e comunidades, que podem ser seletivamente desvantajosas aos portadores dos genes nas populações. De forma recíproca, a seleção de grupo pode eliminar, ou manter em baixa frequência, características desfavoráveis para a sobrevivência das

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espécies, mas seletivamente favoráveis dentro das populações ou comunidades. A seleção de grupo envolve benefícios positivos que um organismo pode exercer na organização da comunidade, benefícios estes necessários para a sobrevivência contínua desses organismos.

De acordo com Huxley (1894), a luta pela existência e a sobrevivência dos mais aptos não envolvem apenas a questão “gato-come-rato”. Em vários casos, sobrevivência e reprodução bem-sucedida são baseadas em cooperação, e não em competição. Tem sido difícil explicar, pela teoria da evolução, como a cooperação e elaboradas relações mutualistas iniciam e se tornam geneticamente fixadas, porque, quando os indivíduos interagem da primeira vez, é quase sempre vantajoso para cada indivíduo interagir em seu próprio interesse em vez de cooperar. Axelrod e Hemilton (1981) analisaram a evolução da cooperação e desenvolveram um modelo baseado no jogo do dilema do prisioneiro e na teoria da reciprocidade como uma extensão da teoria genética convencional baseado em competição e sobrevivência do mais apto. No jogo do dilema do prisioneiro, dois “jogadores” decidem se devem cooperar ou não, com base nos benefícios imediatos. No primeiro encontro, a decisão de não cooperar (desertar) produz o maior prêmio para cada indivíduo, independentemente do que o outro indivíduo faz. Entretanto, se os dois decidem não cooperar, ambos ficam em uma situação pior do que se tivessem cooperado. Se os indivíduos continuarem a interagir (o “jogo” continua), a probabilidade é de que a cooperação possa ser escolhida na base de tentativa e suas vantagens sejam reconhecidas. Deduções do modelo mostram que a cooperação baseada em tal reciprocidade pode ser iniciada em um ambiente de associação e, então, desenvolver-se e persistir, uma vez totalmente estabelecida. Contatos estreitos constantes entre numerosos indivíduos, como microrganismos e plantas, aumentam as possibilidades de interação com benefício mútuo, assim como ocorrido na evolução entre as bactérias fixadoras de nitrogênio e as leguminosas.

A interação entre predador/presa e parasita/hospedeiro tende a se tornar menos negativa ao longo do tempo. Gilpin (1975) propôs a seleção de grupo no desenvolvimento de uma característica de “prudência” que conduz os predadores e os parasitas a não superexplorar suas presas e hospedeiros, pois agindo assim eles estariam extinguindo ambas as espécies envolvidas na interação. A história do vírus do mixomatose introduzido para controlar os coelhos europeus (lebres) na Austrália é um exemplo de seleção da virulência reduzida. Quando introduzido pela primeira vez, o parasita matou o coelho em poucos dias. Subsequentemente, a linhagem virulenta foi substituída por uma menos virulenta, que levou duas ou três vezes mais tempo para matar o hospedeiro. A partir disso, os mosquitos que transmitem os vírus tiverem um tempo maior para se alimentar dos coelhos já infectados. Como a linhagem não virulenta não destrói seus recursos alimentares (coelhos) tão rapidamente como a virulenta, mais e mais parasitas do tipo não virulento foram produzidos e ficaram disponíveis para transmissão para novos hospedeiros. Dessa forma, a seleção interdêmica favoreceu a linhagem não virulenta sobre a virulenta; de outra forma, tanto os parasitas com os hospedeiros seriam eventualmente extintos.

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3.3 MEDIDAS DA ESTRUTURA DA COMUNIDADE

Com relação ao debate sobre a natureza da comunidade, os ecólogos frequentemente desejam caracterizar sua estrutura e funcionamento. A estrutura da comunidade é difícil de definir e medir. Uma das medidas mais simples e reveladoras das estruturas de uma comunidade é o número de espécies que ela inclui. Essa medida é frequentemente denominada de riqueza de espécies.

Os naturalistas sabem há séculos que mais espécies vivem nas regiões tropicais do que nas zonas temperadas e boreais. Com exceção dos táxons especialmente adaptados às condições mais duras únicas das latitudes mais altas e frias, a maioria dos tipos de organismos apresentam sua diversidade mais alta nos trópicos. Por exemplo, um hectare de floresta na Amazônia Peruana contém mais de 300 espécies; toda árvore individual nesta área pertence a uma espécie diferente.

Cerca de 1 milhão e meio de espécies foram descritas e denominadas em todo o mundo; estimativas do total vão até as dezenas de milhões. Por estarem muitas das espécies se tornando raras ou extintas antes que sejam conhecidas da ciência, os ecólogos sentem uma necessidade urgente de compreender por que algumas comunidades são biologicamente mais diversas do que outras, e encontrar formas de preservar tanto desta herança natural quanto possível.

Mesmo as comunidades biológicas mais simples contêm números espantosos de espécies. Para gerenciar esta complexidade, os ecólogos frequentemente particionam a diversidade em números de espécies em cada nível trófico: produtores primários, herbívoros e carnívoros. Dentro dos níveis tróficos o método ou a localização de forrageamento distingue diferentes aglomerações de espécies: os herbívoros, por exemplo, incluem comedores de folhas, cavadores de caules, mastigadores de raízes, sugadores de néctar e cortadores de brotos.

Sempre que os pesquisadores tentam tabular a diversidade de uma comunidade ou parte de uma comunidade pela identificação de todos os indivíduos encontrados numa dada área, descobrem que umas poucas espécies são abundantes e muitas mais são raras. Esses padrões de abundância relativa são uma outra forma pela qual os pesquisadores quantificaram a estrutura das comunidades.

Os padrões regulares de estrutura da comunidade não servem de argumento a favor ou contra uma interpretação holística da comunidade, porque a organização pode resultar de atividades independentes dos, ou das interações entre os componentes de um sistema. O ponto de vista holístico argumenta que a estrutura da comunidade reflete os atributos de espécies selecionadas para realçar o funcionamento da comunidade como um todo. O conceito individualista vê a estrutura de uma comunidade como uma propriedade coletiva de seus componentes individuais, cada um dos quais se esforça para funcionar no que for melhor para si dentro da comunidade. Os ecólogos compreenderam que não é sustentável defender um ou outro ponto de vista extremo, eles agora lutam para determinar a extensão da integração comunitária e seus mecanismos biológicos.

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3.4 O TERMO COMUNIDADE TEM RECEBIDO MUITOS SIGNIFICADOS

Em todo o desenvolvimento da ecologia como ciência, o termo comunidade tem frequentemente designado um conjunto de plantas e animais que ocorre numa determinada localidade, e dominada por uma ou mais espécies proeminentes ou por algumas características físicas. Falamos, por exemplo, de uma comunidade de lago, significando todas as plantas e animais encontrados num certo lugar, dominado pelo nome da espécie da comunidade. Usado dessa forma, o termo não é ambíguo: uma comunidade que está espacialmente definida inclui todas as populações dentro de suas fronteiras. Os pesquisadores têm também um conceito de comunidade que abrange as interações entre as populações que coexistem. Isto implica um uso mais funcional do que descritivo do termo.

Quando as populações se estendem além das fronteiras arbitrariamente espaciais, ambos o conceito e a realidade da comunidade se tornam mais difíceis de definir. As migrações de aves entre regiões temperadas e tropicais conectam os diferentes conjuntos de espécies em cada área; em algumas localidades tropicais, até metade das aves presentes durante o inverno do norte são migratórias. As salamandras, que completam seu desenvolvimento larval em cursos de água e poças, mas continuam suas existências adultas nos bosques circundantes, conectam os mundos terrestre e aquático, assim como fazem as árvores quando descartam suas folhas nas correntes, e desta forma sustentam cadeias alimentares aquáticas baseadas em detritos.

A estrutura e o funcionamento comunitário misturam um conjunto com-plexo de interações, direta ou indiretamente conectando todos os membros de uma comunidade numa teia intrincada. A influência de cada população se es-tende a partes ecologicamente distantes da comunidade. As aves insetívoras, por exemplo, não comem árvores, mas elas predam muitos dos insetos que se alimen-tam da folhagem ou polinizam as flores. Os efeitos ecológicos evolutivos numa população se estendem em todas as direções através da estrutura trófica de uma comunidade por meio de sua influência nos predadores, competidores e presas.

3.5 A COMUNIDADE COMO UMA UNIDADE NATURAL DE ORGANIZAÇÃO ECOLÓGICA

Os conceitos holístico e individualista de organização comunitária predizem padrões diferentes de distribuição de espécies ao longo de gradientes ecológicos e geográficos. De um ponto de vista holístico, as espécies que pertencem a uma comunidade estão intimamente associadas umas às outras, o que implica que os limites de distribuição ecológica de cada espécie coincidiram com a distribuição da comunidade como um todo. Os ecólogos chamam este conceito de organização comunitária de uma comunidade fechada. De um ponto de vista individualista, cada espécie está distribuída independentemente de outras

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que coexistem com ela numa associação particular. Tal comunidade aberta não tem fronteiras, portanto, seus limites são arbitrários em relação as distribuições geográficas e ecológicas de suas espécies-membro, que podem estender suas abrangências independentemente para dentro de outras associações.

Se o ponto de vista de comunidade fechada fosse correto, a vegetação específica de cada área representaria uma comunidade distinta separada das outras comunidades por transições vegetacionais bem definidas. Todavia, à medida que os ecólogos estudaram as distribuições de plantas em mais detalhes, descobriram que as associações vegetais se ajustam cada vez menos ao conceito de comunidade fechada: poucas espécies tinham distribuições geográficas e ecológicas proximamente sobrepostas, e ecótonos definidos não foram encontrados. Portanto, as espécies tendem a se distribuir independentemente umas das outras ao longo de gradientes de condições ecológicas.

Conforme o conceito de comunidade fechada perdeu sustentação, os ecólogos se tornaram mais interessados num conceito aberto de organização comunitária, denominado conceito de contínuum. De acordo com este conceito, dentro de habitats amplamente definidos, como florestas, campos ou estuários, as populações de plantas e animais substituem-se umas às outras ao longo de gradientes de condições físicas. A validade do conceito de contínuum depende da forma pela qual as espécies estão distribuídas nos gradientes ecológicos. Numa análise de gradiente, a organização de comunidade fechada deveria se revelar pela presença de ecótonos definidos. Uma análise de gradiente é normalmente executada medindo-se as mudanças de espécies e as condições físicas num certo número de lugares e então plotando as abundâncias de cada espécie em função do valor daquela condição física. A abrangência de condições poderia incorporar quaisquer números de variáveis físicas, tais como umidade, temperatura, salinidade, exposição ou nível de luz.

3.6 AS RELAÇÕES DE ALIMENTAÇÃO ORGANIZAM AS COMUNIDADES

Quando uma comunidade é vista da perspectiva de um ecossistema, com foco no fluxo de energia, observa-se que as espécies ocorrem em grupos funcionais cujos membros ocupam posições tróficas, ou de alimentação, semelhantes. Assim, as plantas podem ser agrupadas juntas como produtores, todos os comedores de plantas (das formigas às Zebras) compartilham o rótulo de herbívoros, e assim por diante. Contudo, esta visão está limitada, porque ignora a variação nos números e nas histórias evolutivas das espécies que formam a comunidade.

Quando aplicamos uma perspectiva de teia alimentar para a comunidade, tendemos a enfatizar a diversidade. Embora as teias alimentares estejam também baseadas em relações funcionais, elas enfatizam as conexões entre as populações e reconhecem, por exemplo, que nem todos os herbívoros consomem todos os produtores. Como a análise de cadeia alimentar inclui informação no nível de

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espécie acerca de uma comunidade, ela tem um poder maior do que a análise de ecossistema para discriminar a estrutura da comunidade. Contudo, como a estrutura da comunidade é difícil de definir e medir, diferentes análises de teias alimentares frequentemente produzem diferentes resultados. Por exemplo, podemos questionar se uma estrutura de teia alimentar mais complexa leva a uma estabilidade dinâmica maior. Uma resposta razoável poderia ser: quando os predadores têm presas alternativas, os tamanhos de suas populações dependem menos da flutuação nos números de uma espécie de presa específica; e onde a energia pode tomar muitas vias através de um sistema, a quebra de uma via meramente desvia mais energia para outra. Ambos os fatores contribuíram para o aumento na estabilidade da comunidade. Contudo, é também razoável sugerir que, conforme as comunidades se tornam mais diversas, as espécies exercem maior influência umas nas outras através de suas várias interações; estas conexões biológicas por sua vez podem criar persistentes retardos de tempo nos processos populacionais, que tendem a desestabilizar diversos sistemas.

As relações de alimentação podem também afetar a diversidade de espécies dentro de uma comunidade. Por exemplo, quando um predador controla a população de um competidor dominante, ele pode permitir que competidores inferiores persistam porque eles evitam a predação. Assim, a diversidade de um nível trófico específico dentro de uma teia alimentar pode depender da predação pela população de níveis tróficos mais altos.

3.7 OS NÍVEIS TRÓFICOS SÃO INFLUENCIADOS DE CIMA PELA PREDAÇÃO DE BAIXO PELA PRODUÇÃO

Os predadores podem deprimir as populações de suas presas dramaticamente. Este princípio pode se aplicar igualmente bem para níveis tróficos inteiros. Segundo alguns autores a Terra é verde por que os carnívoros deprimem as populações de herbívoros, que de outra forma consumiriam a maior parte da vegetação. Este fenômeno, que realça os efeitos indiretos das interações consumidor-recurso estendidos aos níveis tróficos adicionais da comunidade, é chamada de uma cascata trófica. Quando níveis tróficos mais altos determinam o tamanho dos níveis tróficos abaixo deles, essa situação é dominada de controle top-down (“de cima para baixo”). Quando o tamanho do nível trófico é determinado pela taxa de produção de seu alimento, a situação é denominada de controle bottom-up (“de baixo para cima”).

Pesquisadores têm debatido as pressões relativas dos mecanismos de controle top-down e bottom-up há muitos anos. Por exemplo, uma interpretação alternativa para o controle top-down da abundância da vegetação na maioria dos habitats terrestres é que as partes das plantas resistem ao consumo através de vários inibidores de digestão e substâncias tóxicas. De fato, a melhor evidência do controle top-down vem dos ecossistemas aquáticos, nos quais as plantas e as algas especialmente o fitoplâncton, são altamente digestíveis.

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Leibold et al. (1997) realizaram uma pesquisa sobre as densidades de zooplâncton e fitoplâncton em lagos naturais. O resultado mostrou que o nível trófico do consumidor primário variou paralelamente com o nível trófico do produtor, um padrão que é consistente com o controle bottom-up. Contudo, quando peixes predadores foram adicionados aos lagos experimentais para diminuir a densidade do zooplâncton, a abundância de fitoplâncton aumentou na maioria dos casos, algumas vezes por um fator de mais de 10, indicando um controle top-down. Estes resultados sugerem que a produção primária determina muito genericamente os tamanhos dos níveis tróficos superiores, mais do que as interações top-down podem, contudo, ajustar os tamanhos dos níveis tróficos dentro de um intervalo mais estreito.

Outros experimentos realizados por Hansson et al. (1998) com a adição e remoção de nutrientes inorgânicos (fósforo e nitrogênio), em comunidades aquáticas de microcosmo, revelaram tanto controles bottom-up quanto top-down no tamanho de nível trófico. Os resultados mostraram que uma produção primária intensificada tende a aumentar todos os níveis tróficos sobrepostos (bottom-up). Contudo, os experimentos também mostraram que os consumidores poderiam deprimir o tamanho do nível trófico imediatamente abaixo deles e aumentar a abundância relativa de organismos dos níveis de baixo (top-down). Além do mais, a pastagem de zooplâncton mudou a dominância de organismos no nível trófico do produtor (top-down). Com baixo acréscimo de nutrientes, os flagelados e as algas foram relativamente mais abundantes do que as bactérias (bottom-up); com alta adição de nutrientes, as populações crescentes de zooplâncton deprimiram os flagelados e as algas e permitiram que as densidades bacterianas aumentassem (top-down). Quando os peixes foram adicionados a este experimento eles impediram que o zooplâncton aumentasse junto com o aumento dos nutrientes, e as algas, assim como as bactérias, responderam aos altos níveis de nutrientes (top-down).

3.8 AS ESPÉCIES NAS COMUNIDADES BIOLÓGICAS VARIAM NA ABUNDÂNCIA RELATIVA

Até este ponto falamos acerca da estrutura da comunidade sem prestar atenção para as diferenças entre as espécies. Contudo, mesmo num nível trófico específico, cada espécie ocupa uma posição ecológica distinta e tem relações ecológicas únicas. As diferenças nestas relações ecológicas frequentemente se revelam nas abundâncias das espécies. Dentro de uma comunidade específica, umas poucas espécies atingem alta abundância, elas são as dominantes na comunidade, enquanto a maioria das outras é representada por relativamente poucos indivíduos. A Figura 14 mostra uma curva representando a abundância relativa das espécies numa comunidade. Numa comunidade a maioria das espécies são relativamente raras, enquanto umas poucas são abundantes.

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Conforme o número de espécies no nível trófico aumenta, a dominância das espécies mais abundantes, isto é, a fração delas dentre todos os indivíduos da comunidade, diminui. A abundância de cada espécie parece refletir a comunidade e a abundância de recursos disponíveis para ela, assim como as influências dos competidores, dos predadores e de certas doenças.

FIGURA 14 – DISTRIBUIÇÃO DAS ABUNDÂNCIAS RELATIVAS DAS ESPÉCIES NUMA COMUNIDADE

FONTE: Ricklefs (2009, p. 382)

Da mesma maneira que muitas questões relativas à estrutura e à dinâmica das comunidades ainda carecem de compreensão, os ecólogos têm-se voltado para modelos quantitativos de padrões de diversidade comunitária na esperança de compreender os processos subjacentes que produzem esses padrões. A matemática pode servir a dois propósitos aqui. Por um lado, os ecólogos podem usar a matemática para descrever dados (abundância de espécies, neste caso) com equações simples e usar valores variados nas equações para fazer comparações entre comunidades diferentes. De outro modo, os ecólogos podem usar a lógica de um modelo matemático para investigar os processos que podem produzir as distribuições observadas. Sem entrar em muitos detalhes, vamos simplesmente dizer que os modelos de abundância relativa têm servido melhor como ferramentas descritivas do que como uma forma de elucidar os processos que determinam as abundâncias relativas.

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3.9 NÚMERO DE ESPÉCIES E ÁREA MOSTRADA

Avaliação na abundância relativa entre espécies dentro de uma comunidade pode ser descrita por uma relação estatística simples que mostra como o número de espécies aumenta com o tamanho da amostra. Como regra geral, mais espécies ocorrem em áreas maiores do que em áreas menores, demo modo que existe uma relação espécie-área. Neste sentido, tem sido uma prática comum caracterizar as relações entre os números de espécies (S) e a área (A) como funções de potência da forma:

S = cAz

Onde “c” e “z” são constantes ajustadas aos dados. As representações gráficas das relações espécie-área plotam o logaritmo do número de espécies contra o logaritmo da área. Após a transformação logarítmica, as relações espécie-área se tornam:

log S = log c + z log A, que é a equação de uma linha reta.

Conforme a área da amostra aumenta, o número de indivíduos incluídos dentro dela também aumenta, ou seja, mais e mais espécies são descobertas. A comparação entre amostras de tamanho semelhante pode contornar este problema. Quando isto é feito, as relações espécie-área persistem, mostrando que estas relações não são simplesmente artifícios. Além do mais, a inclinação “c” da relação espécie-área varia de formas previsíveis. Por exemplo, os valores de “z” obtidos de áreas continentais tendem a ser mais baixos do que aqueles obtidos para ilhas num tamanho de área comparativo. Essa diferença ocorre porque o movimento rápido de indivíduos nos continentes, onde as barreiras de dispersão não são fortes, impede a extinção local de populações dentro de pequenas áreas. Assim, áreas pequenas nos continentes têm aproximadamente a mesma riqueza de espécies que as áreas grandes, e a curva espécie-área (gerada pela equação) consequentemente é menos íngreme.

As diferenças na diversidade entre ilhas grandes e pequenas devem significar diferenças na qualidade intrínseca das ilhas devido a fatores, tais como, a heterogeneidade de habitat, que aumenta com o tamanho e consequente heterogeneidade topográfica de uma ilha, e tamanho per se, conforme ilhas maiores se tornam melhores alvos para imigrantes potenciais do continente. Além disso, as ilhas maiores sustentam populações maiores, que podem persistir por mais tempo devido à sua maior diversidade genética, distribuição mais ampla nos habitats e números grandes o bastante para impedir uma extinção estocástica. Pode ser determinado se o tamanho da ilha por si só ou a heterogeneidade de habitat é mais importante para a relação espécie-área pela comparação de biotas insulares nas quais essas medidas variem independentemente uma da outra, possibilitando que seus efeitos em separado sejam eliminados estatisticamente.

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3.10 ÍNDICES DE DIVERSIDADE E A ABUNDÂNCIA RELATIVA

Quantas espécies são encontradas numa área específica? Como a riqueza de espécies varia de um lugar para o outro? Estas questões são importantes para os conservacionistas e os gestores que precisam saber que áreas sustentam os maiores números de espécies. Assim, os estudiosos são frequentemente confrontados com problemas de compararem a diversidade de espécies de áreas ou habitats diferentes. Contudo, as diferenças nas abundâncias de espécies dentro da comunidade apresentam dois problemas práticos. Primeiro o número total de espécies incluídas numa amostra varia com o tamanho da amostra, porque, à medida que mais indivíduos são amostrados, a probabilidade de encontrar espécies raras aumenta. Dessa forma fica difícil comparar a diversidade entre áreas amostradas com intensidades diferentes meramente comparando as contagens de espécies. Também, nem todas as espécies devem contribuir igualmente para essa estimativa da diversidade total, porque seus papéis funcionais numa comunidade variam em proporção à sua abundância total.

Neste caso, uma solução formulada são os índices de diversidade, nos quais a contribuição de cada espécie é pesada sobre sua abundância relativa, que significa a proporção do número total de s numa comunidade que pertence àquela espécie. Dois desses índices são amplamente usados em ecologia: o índice Simpson e o índice de Shannon-Wiener. Ambos os índices são calculados a partir das proporções de cada espécie (pi) na amostra total de indivíduos o índice Simpson “D”, é:

D =

Para qualquer número determinado de espécies numa amostra (S), o valor de D pode Variar de 1 até “S”, dependendo da variação da abundância de espécies. Por exemplo, quando cinco espécies têm abundância iguais, cada pi é 0,20. Portanto, o valor de cada é 0,04, e D = 1/(0,04 + 0,04 + 0,04 + 0,04 + 0,04) = 1/0,20 = 5. Assim, o índice de diversidade desta amostra é 5, que é o número de espécies na mostra. Quando cinco espécies têm abundâncias diferentes, o índice de diversidade é menor do que o número total de espécies. Como mostrado na tabela 3, espécies mais raras contribuem menos para o valor do índice de diversidade do que espécies comuns.

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TABELA 3 – COMPARAÇÃO DOS ÍNDICES DE DIVERSIDADE PARA COMUNIDADES HIPOTÉTICAS DE CINCO ESPÉCIES COM ABUNDÂNCIAS RELATIVAS DIFERENTES

Proporção da amostra representada por espécies índices de diversidade

A B C D E D H eH

0,20 0,20 0,20 0,20 0,20 5,00 1,609 5,000,25 0,25 0,25 0,25 0,00 4,00 1,386 4,000,24 0,24 0,24 0,24 0,04 4,30 1,499 4,480,25 0,25 0,25 0,25 0,001 4,02 1,393 4,030,50 0,30 0,10 0,07 0,03 2,81 1,229 3,42

FONTE: Ricklefs (2009, p. 384)

O índice de Shannon-Wiener “H” é calculado pela equação:

H = ∑ log

Em que “H” é uma medida logarítmica da diversidade. Como no caso do índice Simpson, valores mais altos de “H” representam diversidade maior. Também no índice de Simpson o índice de Shannon-Wiener estabelece um “peso” menor para as espécies raras do que para as comuns. Como “H” é aproximada-mente proporcional ao logaritmo do número de espécies, às vezes é preferível expressar o índice como “eH”, que é proporcional ao número real de espécies. A Tabela 3 apresenta os valores de “eH”, que podemos comparar diretamente com o índice de Simpson.

Como mencionado, um outro problema ao estimar a diversidade de espécies é que o número de espécies de uma amostra tende a crescer com o número de s amostrados. Se desejamos padronizar as medidas de diversidade para comparação, devemos baseá-las em tamanhos de amostras comparáveis. Quando as amostras incluem diferentes números de indivíduos a compatibilidade pode ser atingida por um procedimento estatístico conhecido como rarefação, no qual subamostras de indivíduos, equalizadas pelo tamanho, são retiradas ao acaso da amostra total. A rarefação pode ser pensada como um meio de retratar a relação entre o número de espécies eu tamanho da amostra.

4 TIPOS DE INTERAÇÕES ENTRE ESPÉCIES

As interações entre populações provavelmente ocorrem em qualquer comunidade biótica de escala ampla, como uma grande extensão de floresta, área úmida ou campo. Para um dado par de espécies, o tipo de interação pode mudar sob diferentes condições ou durante estágios sucessivos em sua história natural. Dessa forma, duas espécies poderiam exibir parasitismo em um momento, comensalismo em outro, ou serem completamente neutras em um momento

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diferente. Comunidades simplificadas e experimentos de laboratório permitem aos pesquisadores escolher e estudar quantitativamente as várias interações. Os modelos matemáticos dedutivos, derivados de tais estudos, também permitem aos ecólogos analisar fatores geralmente não separáveis dos outros.

Modelos de equação de crescimento tornam as definições mais precisas, esclarecem o raciocínio e permitem determinar como os fatores operam em situações naturais complexas. Se o crescimento de uma população pode ser descrito por uma equação, como a equação logística, a influência de uma outra população pode ser expressa por um termo que modifica o crescimento da primeira população. Vários termos podem ser substituídos de acordo com o tipo de interação. Por exemplo, no caso de competição, a taxa de crescimento de cada população é igual para a taxa ilimitada menos os efeitos do próprio autoadensamento (que aumenta conforme sua população aumenta) menos o efeito prejudicial da espécie competidora, N2 (que também aumenta conforme aumentam os números, N e N2, ambas as espécies) ou:

Taxa de crescimento = Taxa ilimitada - Efeitos de auto-adensamento - Efeitos prejudiciais da outra espécie,

“C” sendo uma constante, que reflete a eficiência da outra espécie. Essa equação é conhecida como equação logística semelhante ao utilizada nos estudos de população, exceto pela adição do último termo, “menos os efeitos prejudiciais da outra espécie”. Existem vários resultados possíveis para esse tipo de interação. Se a eficiência competitiva, “C”, for pequena em ambas as espécies, de modo que os efeitos redutores interespecíficos sejam inferiores aos efeitos intraespecíficos (autolimitantes), a taxa de crescimento e talvez a densidade final de ambas as espécies poderá ser reduzida levemente; mas as duas espécies provavelmente poderão ser capazes de viver juntas, porque os efeitos interespecíficos redutores serão menos importantes do que a competição dentro das espécies. Também, se as espécies exibirem um crescimento exponencial, com fatores autolimitantes ausentes da equação, a competição interespecífica poderia fornecer a função niveladora que falta para a forma de crescimento da própria espécie. Entretanto se “C” for grande, a espécie que exercer o maior efeito irá eliminar seu competidor ou o pressionará em direção ao outro habitat. Dessa forma, em teoria, as espécies cujas exigências são similares não podem viver juntas porque, provavelmente, será desenvolvida uma forte competição que causará a eliminação de uma delas.

Quando ambas as espécies na interação entre populações têm efeitos benéficos mútuos, em vez de efeitos prejudiciais, um termo positivo é adicionado para a equação de crescimento. Nesses casos, ambas as populações crescem e prosperam, atingindo níveis de equilíbrio mutuamente benéficos. Se os efeitos benéficos da outra população (o termo positivo na equação) são necessários para o crescimento e a sobrevivência de ambas as populações, a relação é conhecida

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como mutualismo. Se, por outro lado, os efeitos benéficos apenas aumentam o tamanho ou a taxa de crescimento da população, mas não necessariamente para o crescimento e a sobrevivência, a relação é chamada protocooperação. Tanto no mutualismo como na protocooperação, o resultado é semelhante; o crescimento das duas populações é zero ou menor que zero sem a presença da outra população. Quando um equilíbrio é alcançado, as duas populações pulsam juntas, geralmente em uma proporção específica.

5 COMPETIÇÃO INTERESPECÍFICA E COEXISTÊNCIA

A competição, em sentido amplo, refere-se à interação entre dois organismos que disputam o mesmo recurso. Competição interespecífica é qualquer interação que afeta adversamente o crescimento e a sobrevivência de populações de duas ou mais espécies. A competição interespecífica pode tomar duas formas: (1) competição por interferência e (2) competição por exploração. A tendência de a competição produzir uma separação ecológica de espécies aparentadas ou semelhantes é conhecida como princípio da exclusão competitiva. Simultaneamente, a competição adiciona várias adaptações seletivas que aumentam a coexistência de uma diversidade de organismos em uma dada área ou comunidade.

A palavra competição é usada em situações em que influências negativas ocorrem pela escassez de recursos utilizados por ambas as espécies. A interação interespecífica é frequentemente discutida em relação a interação física direta versus competição por exploração. A competição por interferência ocorre quando duas espécies entraram em contato uma com a outra, como na luta ou na defesa de um território. A competição por exploração ocorre quando uma espécie explora um recurso em comum com outra espécie, como comida, espaço ou presa, mas sem contato direto com aquela espécie. Essa exploração indireta de recursos pode determinar uma vantagem competitiva de uma espécie sobre a outra.

A integração competitiva pode envolver espaço, alimentos ou nutrientes, luz, materiais residuais, suscetibilidade aos carnívoros, doenças e várias outras interações mútuas. Os resultados da competição são de interesse da comunidade científica e têm sido muito estudados como um dos mecanismos da seleção natural. A competição interespecífica pode resultar em um ajuste do equilíbrio entre duas espécies ou, se severa, pode fazer com que a população de uma espécie substitua outra, force a ocupar outro lugar ou, ainda, faça com que utilize outro alimento (não importando qual foi a base original da ação competitiva). Em geral, os organismos com parentesco próximo, com hábitos ou morfologias semelhantes, não ocorrem no mesmo local. Entretanto, se ocorrerem no mesmo local, usarão diferentes recursos ou serão ativos em momentos diferentes. A explicação para a separação ecológica de espécies aparentadas (ou mesmo semelhantes) ficou conhecida como princípio de Gause (GAUSE, 1932) em homenagem ao biólogo russo que foi o primeiro a observar esta separação em culturas experimentais e posteriormente definido como o princípio da exclusão competitiva assim designado por Hardin (1960).

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UNIDADE 3 — UNIDADES DE ECOLOGIA

Alguns aspectos teóricos mais amplamente debatidos da teoria da competição giram em torno do que ficou conhecido como as equações de Lotka-Volterra, assim denominada porque foram propostas como modelos por Lotka (1925) e Volterra (1926) em publicações separadas. Trata-se de um par de equações diferenciais que são úteis para a modelagem de predador-presa, parasita-hospedeiro, competição ou outras interações entre duas espécies. A respeito da competição dentro de um espaço limitado no qual cada população tem “K” definido ou nível de equilíbrio, as equações de crescimento simultâneo podem ser escritas da seguinte forma, usando a equação logística como base:

e

Em que N1 e N2 são os números de indivíduos das espécies 1 e 2, respectivamente, “α” é o coeficiente de competição indicando os efeitos inibitório os da espécie 2 sobre a espécie 1, e “β” é o coeficiente de competição correspondente, significando a inibição da espécie 1 sobre a espécie 2.

Para entender a competição, deve-se considerar não apenas as condições e os atributos das populações que podem conduzir para a exclusão competitiva, mas também as situações sob as quais as espécies semelhantes coexistem, porque em um grande número as espécies compartilham recursos comuns nos sistemas abertos da natureza.

Fatores extrínsecos como, por exemplo, o clima imposto ao ecossistema pode ter grande impacto em relação ao sucesso de uma ou de outra espécie que possa levar à exclusão competitiva. Condições de alta temperatura e umidade podem beneficiar uma espécie ao passo que outra sempre vence sob condições mais frias e secas devido às adaptações interespecíficas para suportarem as alterações sazonais. Também os fatores intrínsecos têm grande importância sobretudo quando se trata de espécies com taxas de crescimento, “r”, diferenciadas umas das outras. Sob a mesma condição de existência, espécies com maior taxa de crescimento, “r”, podem obter grande vantagem em relação a outra e, portanto, dominar promovendo a exclusão competitiva. Em situações em que a taxa de crescimento variar apenas de forma moderada entre ambos uma espécie não será capaz de eliminar a outra, ainda que haja diferenças na forma de crescimento, possibilitando a coexistência no mesmo ambiente. Neste caso, esses s podem coexistir em função de diferenças na sua morfologia ainda que haja diferença no seu tempo de crescimento máximo.

Harper (1961) concluiu que duas espécies de plantas podem persistir juntas se as populações foram controladas independentemente por um ou mais dos seguintes mecanismos: (1) exigências nutricionais diferentes (como em leguminosas e não leguminosas); (2) diferentes causas de mortalidade (como sensibilidades diferenciais ao pastejo); (3) sensibilidade a diferentes toxinas (reações diferentes a compostos químicos secundários); e (4) sensibilidade aos mesmos fatores de controle (como luz ou água) em épocas diferentes.

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TÓPICO 2 — EOLOGIA DE COMUNIDADES

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Diferenças morfológicas que aumentam a separação ecológica podem surgir em razão de um processo evolutivo o que é denominado de deslocamento de caráter, por exemplo, quando existe uma competição com espécies próximas ou espécies ecologicamente semelhantes, a amplitude dos habitats que as espécies ocupam, em geral, tornam-se restrita ao ótimo, isto é, para as condições mais favoráveis sob as quais a espécie tem, de alguma maneira, vantagens sobre seus competidores. Onde a competição interespecífica é menos severa, a competição intraespecífica produz uma escolha mais amplas de habitat.

O fato de espécies próximas estarem separadas na natureza não significa que a competição esteja operando continuamente para mantê-las separadas; as duas espécies podem ter desenvolvido exigências ou preferências diferentes que de fato, reduzem o eliminem a competição. Por exemplo, na Europa uma espécie de azaleia (Rhododrendron hirsutum) é encontrada em solos calcários, ao passo que a outra espécie (Rhododrendron ferrugineum) encontrada em solos ácidos. As exigências das duas espécies são tais que nenhuma delas pode viver, de forma alguma, no tipo oposto de solo, portanto nunca há realmente competição entre elas. A ausência de competição ativa, não significa que a competição no passado possa ser excluída como fator que originalmente produziu o comportamento de isolamento.

6 INTERAÇÕES POSITIVAS/NEGATIVAS: PREDAÇÃO, HERBIVORIA PARASITISMO E ALELOPATIA

Acredita-se que as relações positivas e negativas entre as populações tendem, eventualmente a se equilibrar de forma recíproca, e as duas são importantes para evolução das espécies e a estabilização do ecossistema.

A predação e o parasitismo são exemplos familiares de interações entre duas populações que resultam em efeitos negativos para o crescimento e para a sobrevi-vência de uma população, e positivos e benéficos para outra. Quando o predador é um consumidor primário (normalmente, um animal, e a presa ou o “hospedeiro” é um produtor primário (plantas), a interação é denominada herbivoria. Quando uma população produz uma substância prejudicial para a população competidora, o termo alelopatia é comumente usado para essa interação.

Os efeitos negativos tendem a ser pequenos do ponto de vista quantitativo quando as populações em interação tiveram uma história evolutiva comum em um ecossistema relativamente estável. Em outras palavras, a seleção natural tende a conduzir tanto para a redução dos efeitos prejudiciais como para a completa eliminação da interação, pois a contínua e severa redução da população da presa ou do hospedeiro pela população do predador ou do parasita pode conduzir à extinção de uma ou de ambas as populações. Consequentemente, o impacto severo de predação ou parasitismo é observado com mais frequência quando a interação é de origem recente (quando duas populações acabam de se tornar associadas) ou quando mudanças súbitas ou em escala ampla ocorrem no ecossistema (o que pode ter sido produzido por humanos); ou seja, no longo prazo, as interações parasita-hospedeiro ou predador-presa tendem a evoluir para a coexistência.

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UNIDADE 3 — UNIDADES DE ECOLOGIA

Nos estudos de ecologia devemos considerar a predação, o parasitismo, a herbivoria e alelopatia nos níveis de organização de populações e comunidades, em vez de considerá-los no nível de indivíduos. Predadores, parasitas e pastejadores certamente matam ou ferem os indivíduos que deles se alimentam ou sobre as quais secretam produtos químicos tóxicos, e pelo menos em algum grau, reduzem a taxa de crescimento da suas populações-alvo ou reduzem o tamanho total da população. Isso significa que essas populações seriam mais saudáveis sem os consumidores ou inibidores? Do ponto de vista com evolutivo de longo prazo, os predadores são os únicos beneficiados por essa associação? Conforme discutido nos aspectos que envolvem a regulação de populações, os predadores e parasitas ajudam a manter os insetos herbívoros em baixa densidade, assim eles não destroem seus próprios suprimentos de alimento e habitat. Os animais herbívoros e as plantas evoluíram em relações quase mutualistas.

Quando a pressão dos predadores é reduzida ou interrompida, as populações de presas tendem a irromper repentinamente. Os processos que envolvem irrupção e explosão populacional estão relacionados, via de regra, a oscilações severas que resultam quando espécies com alto potencial biótico são introduzidas em novas áreas se apoderando de recursos inexplorados e ainda da ausência de interações negativas. A irrupção populacional não se mantém indefinidamente porque o aumento no número de presas leva ao aumento da pressão interespecífica pelo consumo dos recursos comuns, como alimento, água, luz, entre outros.

Segundo Pimentel e Stone (1968), as interações negativas se tornam menos negativas com tempo se o ecossistema for estável o suficiente e diversificado quanto a espaço para permitir adaptações recíprocas. Populações de parasita-hospedeiro ou predador-presa introduzidas nos microcosmos ou mesocosmos experimentais oscilam com violência, havendo até certa probabilidade de extinção. Entretanto, conforme apontado por esses autores, à medida em que o tempo passa e se processa a seleção genética, de modo que os indivíduos conseguem sobreviver às oscilações violentas, uma homeorese ecológica evolui para uma situação na qual as duas populações podem coexistir em um equilíbrio muito mais estável. No mundo real dos humanos e da natureza, tempo e circunstâncias podem não favorecer adaptações recíprocas como essa mediante novas associações. Existe sempre o perigo de que reações negativas possam ser irreversíveis, o que conduz para a extinção do hospedeiro.

Os efeitos alelopáticos têm uma importante influência sobre taxas e sequência das espécies da sucessão vegetal, bem como sobre a composição das comunidades estáveis. As interações químicas afetam a diversidade de espécies de comunidades naturais em ambas as direções; uma forte dominância e um efeito alelopático intenso contribuem para a baixa diversidade de espécies em algumas comunidades, ao passo que uma variedade de acomodações químicas faz parte da base da alta diversidade de espécies de outras (como aspectos de diferenciação de início).

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TÓPICO 2 — EOLOGIA DE COMUNIDADES

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Tentativas têm sido feitas para generalizar a coevolução entre os herbívoros e táticas anti-herbívoras de plantas. Feeny (1975), por exemplo, argumentou que espécies de plantas raras ou efêmeras são difíceis de encontrar e, por conseguinte, estão protegidas no tempo e espaço. Além disso, afirmou que essas plantas crípticas têm desenvolvido uma diversidade de defesas qualitativas, como os venenos e as toxinas quimicamente baratas, que constituem barreiras eficientes evolutivas contra a herbivoria por herbívoros mais prováveis de encontrar as plantas crípticas. Em contraste, FEENY (op. cit.) argumentou que as espécies de plantas abundantes ou persistentes (plantas aparentes) não podem impedir os herbívoros de encontrá-las em tempos ecológicos ou evolutivos. Tais espécies aparentes parecem ter desenvolvido defesas quantitativas mais dispendiosas, como as folhas com altos teores de tanino e defesas químicas anti-herbívoras, além de adaptações, por exemplo as folhas duras e os espinhos.

7 INTERAÇÕES POSITIVAS: COMENSALISMO, COOPERAÇÃO E MUTUALISMO

Associações entre duas populações de espécies que resultam em efeitos positivos estão bastante difundidas provavelmente são tão importantes quanto a competição, parasitismo e outras interações negativas na determinação da função e da estrutura das populações e comunidades. As interações positivas podem ser consideradas em uma sequência evolutiva como segue:

1. Comensalismo (apenas uma população se beneficia).2. Protocooperação (ambas as populações se beneficiam).3. Mutualismo (ambas as populações se beneficiam e tornam-se completamente

dependentes uma da outra).

O comensalismo é um tipo simples de interação positiva e talvez represente o primeiro passo rumo ao desenvolvimento de relações benéficas. É comum, por um lado, entre plantas e animais sésseis e, por outro lado, em organismos vágeis. Praticamente todas as galerias de vermes, moluscos e esponjas contém vários organismos “hóspedes não convidados”, que necessitam do abrigo dos hospedeiros, mas, em troca, nem danificam nem são úteis. As ostras, por exemplo, algumas vezes têm um pequeno e frágil caranguejo na cavidade do manto. Esses caranguejos são geralmente comensais, embora algumas vezes eles abusem de seu status de hóspede e compartilhem os tecidos de seus hospedeiros. Vários começais não são hospedeiros específicos, mas alguns, aparentemente, são encontrados associados a apenas uma espécie de hospedeiro.

Em uma situação em que ambos os organismos ganham, por associação ou interação de algum tipo, denominamos de protocooperação. A cooperação entre as espécies, assim como descrito no princípio da agregação de Allee, pode ser encontrada em toda a natureza (ALLEE, 1951). Não se trata de uma relação de dependência, mas de benefício mútuo.

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UNIDADE 3 — UNIDADES DE ECOLOGIA

Entretanto, quando o resultado da cooperação entre as populações faz com que ambas se tornem completamente dependentes da outra, é denominado de mutualismo ou simbiose obrigatória. Frequentemente, tipos de organismos bastante diversos são associados. Na realidade, exemplos de mutualismo têm mais probabilidade de se desenvolver entre organismos com amplas diferenças de necessidades (organismos com necessidades similares estão provavelmente mais envolvidos em competição). O exemplo mais importante de mutualismo desenvolve-se entre os autótrofos e heterótrofos, o que não surpreende, já que esses dois componentes do ecossistema precisam, no final das contas, atingir algum tipo de simbiose equilibrada. Exemplos que poderiam ser rotulados como mutualistas vão além da interdependência geral das comunidades a um nível que um tipo particular de heterótrofo se tornar completamente dependente de um tipo particular de autótrofo como alimento, e o segundo torna-se dependente para proteção, ciclagem mineral ou outras funções vitais fornecidas pelo heterótrofo. O mutualismo é comum também entre microrganismos que podem digerir celulose (e outros resíduos de plantas resistentes) e animais que não têm o sistema de enzimas necessário para esse propósito. O mutualismo parece substituir o parasitismo conforme o ecossistema evolui em direção à sua maturidade, e isso parece ser importante quando algum aspecto do ambiente é limitante.

Os liquens são associações específicas entre fungos e algas, tão íntimas em termos de interdependência funcional e tão integradas morfologicamente que forma um terceiro tipo de organismo, que não se parece com nenhum dos seus componentes. Os liquens são geralmente classificados como única espécie, embora sejam compostos de duas ou mais espécies não relacionadas. Nos liquens, pode-se ver as evidências de uma evolução do parasitismo para o mutualismo. Por exemplo, em alguns dos liquens mais primitivos, o fungo de fato penetra nas células das algas e são, dessa forma, essencialmente parasitas das algas. Nas espécies mais avançadas, os micélios ou hifas dos fungos não penetram no interior das células das algas, mas os dois vivem em harmonia. O estilo de vida mutualista do líquen teve, no mínimo, cinco origens independentes em diferentes ramos das árvores genealógicas dos fungos; no mínimo 20% de todas as espécies de fungos são liquens (GARGAS et al., 1995). Uma origem tão múltipla demonstra que o mutualismo pode ser quase tão importante quanto a competição na evolução (KROPOTKIN, 1902).

É evidente que o mutualismo tem um valor de sobrevivência especial quando os recursos se encontram na biomassa, como na floresta madura, ou quando o solo ou água é pobre em nutrientes como em alguns recifes de corais ou florestas pluviais. Da mesma forma que os corais e outros complexos mutualistas heterótrofos-autótrofos muito organizados, os liquens são bem adaptados para a escassez natural e ao estresse, mas são muito vulneráveis ao estresse por poluição, principalmente poluição do ar.

Os efeitos indiretos das espécies uma sobre a outra podem ser tão importantes como a suas interações diretas e podem contribuir para a rede de mutualismo. Quando as cadeias alimentares funcionam dentro de uma cadeia alimentar, os organismos em cada ponta de uma série trófica, por exemplo, o

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TÓPICO 2 — EOLOGIA DE COMUNIDADES

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plâncton e a truta em uma lagoa, não interagem diretamente, mas se beneficiam de forma direta entre si. A truta se beneficia alimentando-se de peixes planctívoros, que são sustentados pelo plâncton, o plâncton, por sua vez, se beneficia quando a truta reduz a população de predadores de plâncton. Consequentemente, existem tanto interações negativas (predador-presa) como positivas (mutualista) em uma rede de uma teia alimentar (WILSON, 1986; PATTEN, 1991).

Todas as interações entre duas espécies, tanto as positivas como as negativas, operam em conjunto na teia alimentar nos níveis da comunidade e do ecossistema. A energética das cadeias alimentares combinada com o que ficou conhecido como o processo “de cima para baixo” e de “baixo para cima”, faz da teia alimentar um sistema funcional que é mais do que apenas uma coleção de interação entre espécies. O controle de cima para baixo (como discutido no subtópico 3.7 desta Unidade), que inclui retroalimentação por recompensa, refere-se ao papel de componentes a montante (por exemplo, o controle do herbívoro sobre as plantas e o controle do predador sobre os herbívoros). O controle de baixo para cima refere-se ao papel do nutriente e de outros fatores físicos na determinação da produção primária. Independente de qual seja o tipo de controle, ambos estão envolvidos em graus variados em toda e qualquer situação natural.

8 CONCEITOS DE HABITAT, NICHO ECOLÓGICO É GUIDA

O habitat de um organismo é o lugar onde ele vive ou lugar aonde poderia ir para encontrá-lo. Entretanto, o nicho ecológico inclui não apenas o espaço físico ocupado por um organismo, mas também seu papel funcional na comunidade (sua posição trófica, por exemplo,) e sua posição nos gradientes ambientais de temperatura, umidade, pH, solo e outras condições para a existência.

Esses três aspectos do nicho ecológico podem ser convenientemente designados como nicho espacial ou de habitat, nicho trófico e nicho multidimensional ou hipervolumétrico. Como consequência, o nicho ecológico de um organismo não apenas depende de onde ele vive, mas também inclui a soma de todas as suas exigências ambientais. O conceito de nicho é mais útil, e quantitativamente mais aplicável, em termos de diferenças entre as espécies (ou da mesma espécie em dois ou mais locais ou tempos) em uma ou algumas das principais características operacionalmente significantes. As dimensões mais quantificadas são amplitude do nicho e sobreposição do nicho com os vizinhos. Grupos de espécies com papéis e dimensões de nichos comparáveis dentro da comunidade são denominadas guildas. As espécies que ocupam o mesmo nicho em diferentes regiões geográficas são denominadas equivalentes ecológicos.

O termo habitat é amplamente usado, não apenas em ecologia como também em outros contextos. Se o habitat e o “endereço” do organismo, o nicho é a sua “profissão”, sua posição trófica na teia alimentar, como ele vive e interage com o ambiente físico e com os outros organismos em sua comunidade. O habitat também pode referir-se ao local ocupado por uma comunidade inteira. Por exemplo, o habitat da comunidade de campo com artemísia-da-areia é a série

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UNIDADE 3 — UNIDADES DE ECOLOGIA

de cordilheiras de solo arenoso que ocorrem ao longo do lado norte dos rios nas Grandes planícies, no sul dos Estados Unidos. O habitat, nesse caso, consiste principalmente em complexos físicos ou abióticos. Em outro caso, como por exemplo os percevejos aquáticos, o habitat inclui objetos vivos e não vivos. Dessa forma, o habitat de um organismo ou de um grupo de organismos assim como de uma população, pode incluir outros organismos além do ambiente a biótico.

O conceito de nicho ecológico em geral não é tão bem entendido fora do campo da ecologia. Termos como nichos são difíceis de definir e de quantificar; a melhor abordagem é considerar historicamente os componentes dos conceitos. Para Grinnell (1917, 1928), a palavra nicho foi usada para “significar o conceito final de unidade de distribuição, dentro da qual cada espécie é mantida por suas limitações estruturais e instintivas […] nenhum par de espécies no mesmo território geral pode ocupar por muito tempo o mesmo nicho ecológico”. Dessa forma, a ideia de nicho de Grinnell era principalmente em termos de micro-habitats, ou que hoje é chamado de nicho espacial. Elton (1927) foi um dos pioneiros a estudar o termo nicho com o sentido de “status funcional de um organismo em sua comunidade”. Em razão da grande influência de Elton no pensamento ecológico, foi aceito de modo geral que nicho não é, de modo algum, um sinônimo para habitar. Em função de Elton ter enfatizado a importância das relações energéticas, sua versão do conceito é denominada de nicho trófico.

Hutchinson (1957) sugeriu que o nicho poderia ser visualizado como espaço multidimensional ou hipervolume dentro do qual o ambiente permite a um indivíduo ou espécie sobreviver indefinidamente. O nicho de Hutchinson, que pode ser designado nicho multidimensional ou nicho hipervolumétrico, pode ser medido e manipulado matematicamente. Hutchinson (1965) também distinguiu entre nicho fundamental: o hipervolume abstratamente ocupado” máximo quando a espécie não é restrita pela competição ou outra interação biótica limitante; e nicho realizado: o menor hipervolume ocupado sob restrições bióticas particulares. Os conceitos de amplitude do nicho e sobreposição de nichos estão ilustrados na figura15.

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TÓPICO 2 — EOLOGIA DE COMUNIDADES

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FIGURA 15 – CURVAS DE ATIVIDADE DE DUAS ESPÉCIES JUNTAS EM UMA DIMENSÃO DE RECURSO ÚNICO ILUSTRANDO OS CONCEITOS DE AMPLITUDE DO NICHO E

SOBREPOSIÇÃO DE NICHOS

FONTE: Odum e Barrett (2008, p. 313)

Para diferenciar ainda mais o termo nicho do termo habitat devemos considerar no primeiro caso o status do organismo dentro da comunidade natural, saber algo sobre a suas atividades, especialmente sua alimentação; suas fontes de energia e repartição dos recursos; atributos relevantes da população, como a taxa intrínseca de crescimento; e, finalmente, o efeito do organismo sobre outros organismos com os quais ele entra em contato e a extensão com que modifica ou pode modificar as operações importantes no ecossistema.

O termo guilda é frequentemente usado para grupos ou agrupamentos de espécies, que têm papéis semelhantes ou comparáveis na comunidade por exemplo, vespas parasitando uma população herbívora, insetos que se alimentam de néctar, caramujos vivendo na serapilheira do solo da floresta e trepadeiras subindo no dossel da floresta tropical. A guilda é uma unidade conveniente para estudos das interações entre as espécies, mas pode ser tratada como uma unidade funcional nas análises de comunidade tornando, assim, desnecessário considerar cada espécie como uma entidade separada.

As espécies ecologicamente equivalentes, que ocupam nichos similares em diferentes regiões geográficas, tendem a ter relação taxonômica íntima em regiões contíguas, mas sem essa relação em regiões não contíguas. A composição das espécies da comunidade difere bastante em regiões de distintas floras e faunas, mas todos os ecossistemas similares cujas condições físicas sejam semelhantes desenvolvem nichos funcionais equivalentes independentemente da localização geográfica. Os nichos funcionais equivalentes são ocupados por quaisquer grupos

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UNIDADE 3 — UNIDADES DE ECOLOGIA

biológicos que se ajustem à flora e à fauna da região. Dessa forma, um ecossistema de campo se desenvolve em qualquer lugar onde exista um clima de campo, mas as espécies de capins e pastejadores podem ser totalmente diferentes, em especial quando as regiões são separadas por barreiras.

9 DAS POPULAÇÕES E COMUNIDADES AOS ECOSSISTEMAS E PAISAGENS

Duas abordagens para estudar, entender e, quando necessário, gerenciar os ecossistemas são a abordagem holística (baseada na teoria de que as entidades inteiras têm uma existência separada para além de uma simples soma de suas partes) é a abordagem reducionista (baseada na teoria de que cada sistema complexo pode ser explicado pela análise das suas partes mais simples e mais básicas).

Na abordagem holística, primeiro se delimita a área ou o sistema de interesse de forma conveniente, como um tipo de “caixa-preta”. Então, a energia e outras entradas e saídas são examinadas e são avaliados os principais processos funcionais no interior do sistema. Seguindo o princípio da parcimônia (menor esforço), examinam-se as populações e os fatores significantes do ponto de vista operacional, conforme determinado pela observação, pela modelagem ou pela perturbação do próprio ecossistema. Nessa abordagem geral, entra-se nos detalhes dos componentes das populações no interior da caixa apenas na medida da necessidade para entender ou gerenciar o sistema na sua completude.

Existem muitas coisas para serem aprendidas sobre os indivíduos e as populações em interação conforme se avança dos níveis da população e da comunidade para os níveis da organização do ecossistema e da paisagem. É obviamente impraticável estudar cada população em detalhe. As populações podem comportar-se de forma muito diferente quando funcionam em comunidades do que quando são isoladas em laboratório ou quando dentro de cercados em estudos de campo. Uma vez que componentes individuais de populações e comunidades são estudados, de que forma os remontar como ecossistema para considerar novas propriedades holísticas que podem emergir conforme as partes funcionam juntas em uma paisagem ou ecossistema intactos?

A relação entre as partes e o todo pode muito bem depender do nível de complexidade. Em um extremo, os ecossistemas sujeitados a severas limitações físicas têm relativamente poucos componentes bióticos. Tais sistemas de “pequenos-números” podem ser estudados e entendidos enfocando as partes, porque o todo é provavelmente muito próximo da soma das partes, com poucas, se houver, propriedades emergentes. Em contrapartida, os sistemas de “grandes-números” (Como as paisagens e a ecosfera) têm muitos componentes que agem sinergicamente para produzir propriedades emergentes, o todo definitivamente não é apenas a soma das partes. Estudar todas as partes separadamente está fora

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TÓPICO 2 — EOLOGIA DE COMUNIDADES

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de questão. Assim, é necessário enfocar as propriedades do todo. Em sua maioria, os ecossistemas, como delimitados na prática (por exemplo, um lago ou uma floresta), são sistemas de “números-intermediários” que podem ser mais bem estudados por abordagens em multinível.

A questão de como lidar com as partes versus o todo vem há muito tempo confundindo os filósofos e a sociedade. Cientistas de todas as disciplinas estão divididos em relação à questão do reducionismo versus holismo. A dificuldade em lidar simultaneamente com a parte e o todo é talvez mais bem refletida no conflito entre o bem individual e o bem público. Numerosas abordagens econômicas e políticas planejadas para lidar com os conflitos foram sugeridas ou tentadas, mas até agora houve pouco sucesso. Nos sistemas humanos, governantes vão e voltam durante anos alternando entre uma forte atenção ao individual e a ênfase ao bem-estar público assim, as partes (individual) e o todo (público) ganham atenção, mas não ao mesmo tempo.

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RESUMO DO TÓPICO 2

Neste tópico, você aprendeu que:

• Uma comunidade biológica é uma associação de populações que interagem entre si e com o ambiente. Os estudos das comunidades biológicas englobam a evolução das propriedades da comunidade, as relações entre organização e estabilidade comunitária e a regulação das populações.

• As comunidades são caracterizadas em termos do número de espécies presentes, suas abundâncias relativas, sua organização em agremiações de espécies com habitats semelhantes e teia alimentares que exibem as relações de alimentação entre as espécies.

• As espécies tendem a se distinguir ao longo dos gradientes de condições ecológicas, independentemente das distribuições de outras espécies, como uma estrutura de comunidade aberta.

• A estrutura da comunidade pode ser esboçada através de teias alimentares que mostram as relações de alimentação entre as espécies dentro de uma comunidade.

• Cascata trófica, também denominado efeito top-down ocorre nas comunidades biológicas quando um grupo de consumidores pode deprimir os tamanhos dos níveis tróficos imediatamente abaixo deles o que indiretamente aumenta as populações de dois níveis tróficos abaixo. Quando a produtividade de um nível trófico afeta a produtividade de níveis tróficos superiores isso é conhecido como efeito bottom-up.

• Em qualquer comunidade biológica, algumas espécies são comuns e outras

raras. As espécies mais comuns frequentemente são chamadas de dominantes. • O número de espécies numa mostra aumenta na proporção direta da

área mostrada. Este padrão resulta em parte pelo fato de áreas maiores possibilitarem o surgimento de amostras totais maiores. Por outro lado, áreas maiores são ecologicamente mais heterogêneas de modo a proporcionar oportunidades para mais tipos de habitats.

• Índices de diversidade têm sido utilizados para contabilizar as variações na abundância ao comparar a diversidade entre amostras. Como o número de espécies aumenta quando o tamanho da amostra aumenta, são usadas técnicas estatísticas para tornar amostras de tamanhos diferente comparáveis.

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1 Questões acerca de comunidades focalizam as origens evolutivas das pro-priedades comunitárias, as relações entre organização e estabilidade comu-nitária e a regulação das diversidades de espécie. O debate sobre a natureza das comunidades continua atualmente. É uma questão importante porque as propriedades dos conjuntos de espécies que coexistem no mesmo lugar compõem todas as interações entre elas. Com base no exposto, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) Interação evolutiva entre organismos na qual a troca de informações genéticas entre os participantes e mínima ou ausente é a coevolução.

b) ( ) Compostos que tornam as plantas menos palatáveis são denominado compostos primários.

c) ( ) A seleção de grupo opera ao nível de população sem qualquer interferência positiva na comunidade

d) ( ) Sobrevivência e reprodução bem-sucedida não são baseadas em cooperação.

2 Os naturalistas sabem há séculos que mais espécies vivem nas regiões tropicais do que nas zonas temperadas e boreais. Os ecólogos frequentemente desejam caracterizar a estrutura e funcionamento das comunidades biológicas. Com base nas definições medidas da estrutura da comunidade, analise as sentenças a seguir:

I - O número de espécies de uma comunidade é frequentemente denominado de riqueza de espécies.

II - Numa dada área, umas poucas espécies são abundantes e muitas mais são raras.

III - O ponto de vista holístico argumenta que a estrutura da comunidade reflete uma propriedade coletiva de seus componentes individuais.

Assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.b) ( ) Somente a sentença II está correta.c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 O termo comunidade tem frequentemente designado um conjunto de plantas e animais que ocorre numa determinada localidade, e dominada por uma ou mais espécies proeminentes ou por algumas características físicas. De acordo com os conceitos holístico e individualista de organização comunitária, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

AUTOATIVIDADE

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( ) A vegetação específica de cada área representa uma comunidade distinta separada das outras comunidades por transições vegetacionais bem definidas (comunidade fechada).

( ) Na comunidades vegetais muitas espécies têm distribuições ecológicas sobrepostas e ecótonos bem definidos.

( ) O conceito de contínuum estabelece que as populações de plantas e animais substituem-se umas às outras ao longo de gradientes de condições físicas.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V – F – F.b) ( ) F – V – V.c) ( ) V – F – V.d) ( ) F – F – V.

4 As teias alimentares estão baseadas em relações funcionais, que enfatizam as conexões entre as populações e reconhecem, por exemplo, que nem todos os herbívoros consomem todos os produtores. Disserte sobre o seja a cascata trófica e explique com exemplos do ecossistema aquático como se processa o controle top-down (“de cima para baixo”).

5 A associações entre duas populações de espécies que resultam em efeitos positivos podem ser consideradas em uma sequência evolutiva. Neste contexto, explique por que o mutualismo não se parece o parasitismo citando o exemplo dos liquens.

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UNIDADE 3

1 INTRODUÇÃO

As comunidades existem no estado de fluxo contínuo. Alguns organismos morrem e outros nascem para tomar seus lugares; a energia e os nutrientes passam através da comunidade. Contudo a aparência e composição da maioria das comunidades não varia apreciavelmente ao longo do tempo de forma contínua e autoperpetuante.

Entretanto, quando um habitat é perturbado, por exemplo, quando uma floresta é desmatada ou um recife de coral é varrido por um furacão, a comunidade lentamente se reconstrói. As espécies pioneiras adaptadas aos habitats perturbados são sucessivamente substituídas por outras espécies, conforme a comunidade atinge sua estrutura e composição originais.

A sequência de mudança iniciada pela perturbação é chamada de sucessão, e a associação última de espécie atingida é chamada de comunidade clímax. Estes termos descrevem os processos naturais que atraíram atenção dos primeiros ecólogos. Clementes (1916) esboçou as características básicas da sucessão, sustentando suas conclusões com estudos detalhados da mudança nas comunidades de plantas em diversos ambientes. Desde então, o estudo do desenvolvimento de comunidade cresceu para incluir os processos que subjazem para a mudança sucessional, às adaptações de organismos às diferentes condições da sucessão inicial e tardia e às interações entre os colonizadores e as espécies que os substituem. Os ecólogos perceberam que a sucessão é uma parte natural da dinâmica da comunidade.

TÓPICO 3 —

DESENVOLVIMENTO DO ECOSSISTEMA

2 ESTRATÉGIAS DO DESENVOLVIMENTO DO ECOSSISTEMA

Ao longo do tempo, o desenvolvimento do ecossistema, mais conhecido como sucessão ecológica, envolve mudanças na repartição de energia, na estrutura das espécies e nos processos da comunidade. Quando não é interrompida por forças externas, a sucessão é razoavelmente direcional e, portanto, previsível. Ela resulta da modificação do ambiente físico pela comunidade e por interações de competição-coexistência no nível de população, o que significa que a sucessão é controlada pela comunidade, embora o ambiente físico determine o padrão é a taxa de mudança e, muitas vezes, limite a extensão do desenvolvimento. Se as mudanças sucessionais forem determinadas por interações internas, o processo

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UNIDADE 3 — UNIDADES DE ECOLOGIA

será conhecido como sucessão autogênica (“autogerada”). Se forças externas no ambiente de entrada (como tempestades e incêndios) regularmente afetam ou controlam as mudanças, haverá uma sucessão alogênica (“gerada externamente”).

Quando um novo território se abre ou se torna disponível para colonização, a sucessão ecológica autogênica geralmente começa com um metabolismo da comunidade em desequilíbrio, em que a produção bruta, “P”, será maior ou menor do que a respiração da comunidade, “R”, e prossegue para uma condição mais equilibrada, em que “P” = “R”. A razão entre a biomassa e a produção (B/P) aumenta durante a sucessão até que seja atingido um ecossistema estabilizado, no qual o máximo de biomassa e função simbiótica entre os organismos sejam mantidos por unidade de fluxo de energia disponível.

A sequência completa das comunidades que se substituem mutuamente em uma determinada área é denominada de sere; as comunidades transitórias durante a sucessão são denominadas estágios serais ou estágios de desenvolvimento. O estágio seral inicial é denominado estágio pioneiro e é caracterizado por espécies sucessionais de plantas pioneiras (tipicamente anuais), as quais apresentam elevadas taxas de crescimento, tamanho pequeno, tempo de vida curto reprodução de um grande número de sementes de fácil dispersão. No estágio terminal ou de maturidade, o sistema que se estabelece é o clímax, o qual persiste, em teoria, até que seja afetado por grandes perturbações. A sucessão que começa com “P” > “R” é a sucessão autotrófica, em contraste para a sucessão heterotrófica, que começa com “P” < “R”. A sucessão sobre um substrato previamente desocupado é chamada de sucessão primária, ao passo que a sucessão que se inicia sobre um local previamente ocupado por outra comunidade é conhecida como a sucessão secundária.

Deve-se enfatizar que o estágio maduro ou estágio de clímax é mais bem reconhecido por meio do estado do metabolismo da comunidade, “P” = “R”, em vez de pela composição específica, que varia muito com a topografia, o microclima e a perturbação. Como já salientado, mesmo que os ecossistemas não sejam “superorganismos”, seu desenvolvimento apresenta muitos paralelos com a biologia do desenvolvimento de organismos individuais e com o desenvolvimento das sociedades humanas, no sentido de que progridem da “juventude” para a “maturidade”.

3 A SERE INCLUI TODOS OS ESTÁGIOS DA MUDANÇA SUCESSIONAL

A criação de qualquer novo habitat como um campo arado, uma duna de areia na borda de um lago, uma poça temporária deixada por uma chuva pesada, atrai um conjunto de espécies particularmente adaptadas para serem boas pioneiras. Essas espécies colonizadoras mudam o ambiente. As plantas, por exemplo, sombreando a superfície da terra, contribuem para os detritos no solo e alteram seus níveis de umidade. Estas mudanças frequentemente inibem o

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TÓPICO 3 — DESENVOLVIMENTO DO ECOSSISTEMA

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sucesso continuado das espécies pioneiras que as causam, mas tornam o ambiente mais adequado para as espécies que se seguem, as quais então excluem aquelas responsáveis pelas mudanças iniciais. Nesse sentido, o caráter da comunidade muda com o tempo.

A oportunidade para observar a sucessão se apresenta convenientemente em campos abandonados de várias idades. Clareiras abertas são rapidamente cobertas por diversas plantas geralmente rasteiras de crescimento rápido. Em poucos anos, as perenes herbáceas e os arbustos substituem a maioria dessas plantas menores. Os arbustos são seguidos por plantas maiores, que acabam por superpovoar e expulsar as espécies sucessionais pioneiras; finalmente os arbustos maiores são invadidos e então substituídos por diversas espécies de madeira mais dura que constituem o último estágio da sequência sucessional. A mudança vem rápido inicialmente. Entretanto a velocidade da sucessão diminui conforme as plantas de crescimento lento aparecem: em alguns casos a transição para a floresta de árvores maiores demora em média 25 anos, em outros casos a substituição pela floresta de madeiras mais duras superam os 100 anos para se apresentarem como a vegetação de clímax natural da área. A transição de um campo abandonado para uma floresta madura é somente uma das diversas sequências sucessionais que podem ter a mesma comunidade clímax num dado bioma.

3.1 A SUCESSÃO PRIMÁRIA COMEÇA EM HABITATS RECÉM-FORMADOS

A sucessão primária é o assentamento e o desenvolvimento de comuni-dades de plantas em habitats recentemente formados, inicialmente desprovidos de quaisquer plantas, como dunas de areia, fluxos de lava, rochas varridas pela erosão, deslizamentos ou áreas expostas por glaciares retrocedentes. A regenera-ção da comunidade clímax após uma perturbação é chamada de sucessão secun-dária. A distinção entre as duas não é bem definida, contudo, porque as pertur-bações variam na intensidade com a qual destrói o tecido de uma comunidade e seus sistemas de suporte físico. O tornado que vale uma grande área de floresta normalmente deixa intacta a reserva de nutrientes do solo, as sementes e as ra-ízes brotáveis, e assim a sucessão prossegue rapidamente. Por outro lado, um incêndio severo pode queimar através das camadas orgânicas do solo, destruindo centenas de milhares de anos de desenvolvimento da comunidade.

Um dos mais notáveis e bem estudados exemplos de sucessão primária é

a conversão natural de certos habitats aquáticos nos climas do norte temperado e boreal em terra seca. Os glaciares em retração deixam profundas poças onde grandes blocos de gelo formaram depressões e depois derreteram. Essas poças passam por um padrão de mudança conhecida como a sucessão de brejo. A sucessão de brejo começa quando as plantas aquáticas com raízes se estabelecem na borda de uma poça. Algumas espécies ciperáceas formas mantas sobre a superfície da água, que se estendem até para além da margem. Ocasionalmente esses mantos cobrem completamente uma poça antes que ela seja preenchida

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UNIDADE 3 — UNIDADES DE ECOLOGIA

com sedimentos, produzindo uma camada mais ou menos firme de vegetação sobre a superfície de água. Os detritos produzidos pela manta de ciperáceas se acumulam como camadas de sedimentos orgânicos no fundo da poça, onde a água estagnada contém pouco ou nenhum oxigênio para sustentar a decomposição microbiana. Geralmente esses sedimentos se transformam em turfa, que é usada por humanos como um condicionador de solo, e às vezes como combustível para o aquecimento. Conforme o pântano acumula sedimentos e detritos, os musgos e os arbustos ser estabelecem ao longo das bordas, eles próprios se adicionando ao desenvolvimento de um solo com qualidades progressivamente mais terrestres. Nas bordas dos pântanos, os arbustos podem ser seguidos por outras plantas que terminam por dar lugar às comunidades clímax de florestas arbóreas. Nessa trilha, o que começou como um habitat aquático é transformado ao longo de milhares de anos pela acumulação de detritos orgânicos, até que um solo se forma sobre a água surgindo habitat “terrestre”.

3.2 A PERTURBAÇÃO INICIA UMA SUCESSÃO SECUNDÁRIA

As aberturas no dossel de uma floresta tendem a se fechar à medida que os indivíduos da circunvizinhança tiram vantagem das novas oportunidades que elas proporcionam. Uma pequena clareira, como a deixada por um galho caído, é rapidamente tomada pelo crescimento de galhos das árvores circundantes. Uma grande clareira deixada por uma árvore, que caída pode proporcionar às plântulas do andar de baixo uma chance de atingir o dossel e conquistar um lugar permanente ao Sol. Uma grande área exposta pelo fogo pode ter que ser colonizada de novo por sementes sopradas ou carregadas para lá provenientes da floresta intacta circundante.

Mesmo quando o rebrotamento iniciar uma sequência sucessional secundária, o tamanho e o tipo da perturbação influenciam quais espécies irão se estabelecer primeiro. Algumas plantas exigem luz solar abundante para a germinação e o assentamento, e suas plântulas não toleram a competição com outras espécies. Essas espécies têm um forte poder de dispersão; elas frequentemente têm pequenas sementes, facilmente carregadas pelo vento, e podem atingir centros de grandes perturbações inacessíveis aos membros da comunidade clímax.

Os ecólogos tradicionalmente viam a sucessão como levando a uma expressão última do desenvolvimento comunitário, uma comunidade clímax. Os primeiros estudos da sucessão demonstraram que as muitas seres encontrados numa região, cada qual se desenvolvendo sob um conjunto particular de condições ambientais locais, frequentemente progride em direção ao mesmo clímax. Essas observações levaram a um conceito de comunidades maduras como unidades naturais. Porém a compreensão de que as comunidades sejam sistemas abertos, cuja composição varia continuamente ao longo de gradientes ambientais, além de vários fatores incluindo o tamanho de uma perturbação e as condições físicas durante o início da sucessão, podem resultar em comunidades clímax alternativas.

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4 A SUCESSÃO E AS MUDANÇAS NO AMBIENTE CAUSADAS PELOS COLONIZADORES

Dois fatores determinam quando uma espécie se estabelece numa sere: (1) quão prontamente ela invade um habitat perturbado ou recém-formado; e (2) sua resposta para as mudanças que ocorrem no ambiente ao longo do curso da sucessão. As plantas de crescimento rápido frequentemente produzem muitas sementes pequenas, que podem ser carregadas a longas distâncias pelo vento ou por animais. Essas plantas têm uma vantagem inicial sobre as espécies que se dispersam lentamente, e dominam os estágios iniciais de uma sere.

Num habitat que pega fogo frequentemente, muitas espécies têm sementes resistentes ao fogo ou coroas radiculares que germinam ou brotam logo após um incêndio e rapidamente restabelecem suas populações. Outras espécies se dispersam lentamente, ou crescem lentamente após o assentamento, e, portanto, se estabelecem somente mais tarde na sere.

As espécies sucessionais iniciais ou pioneiras, as vezes modificam os ambientes de forma a permitir que as espécies dos estágios tardios se estabeleçam. O crescimento de herbáceas num campo aberto sombreia superfície do solo e auxilia o solo na retenção de umidade, proporcionando condições mais satisfatórias ao estabelecimento de plantas menos tolerantes à seca. Inversamente, algumas espécies colonizadoras podem inibir a entrada de outras numa sere, ou pela competição mais efetiva, ou por limitação dos recursos, ou ainda por interferência direta.

Connell e Sltyer (1977) classificaram esse conjunto de diversos processos que governam o curso da sucessão em três categorias de mecanismos: facilitação, inibição e tolerância. Estes mecanismos descrevem o efeito de uma espécie na probabilidade de assentamento de uma segunda, e se aquele efeito é positivo, negativo ou neutro.

4.1 FACILITAÇÃO

A facilitação incorpora a visão da sucessão como uma sequência de desenvolvimento, na qual cada estágio pavimenta o caminho para o próximo, assim como uma estrutura se segue à outra estrutura à medida que o organismo se desenvolve. As plantas colonizadoras capacitam as espécies de clímax para a ocupação futura. Por exemplo, espécies que abrigam bactérias fixadoras de nitrogênio em suas raízes, para o desenvolvimento dos solos, facilitam o assentamento de plantas que tem limitações em nitrogênio.

Os solos não se desenvolvem em sistemas marinhos, mas a facilitação frequentemente ocorre quando uma espécie intensifica a qualidade de um local específico para o assentamento e o estabelecimento de uma outra. Por exemplo, hidróides intensificam o assentamento de tunicados e tanto hidróides quanto

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UNIDADE 3 — UNIDADES DE ECOLOGIA

tunicados facilitam o assentamento dos mexilhões. No sul da Califórnia, as algas que chegam primeiro, de crescimento rápido, proporcionam uma cobertura protetora densa para o restabelecimento da kelp após uma perturbação por tempestades de inverno. Em áreas experimentalmente mantidas livres de espécies das algas do início da sucessão, os peixes pastejadores rapidamente removeram o assentamento da Kelp.

4.2 INIBIÇÃO

A inibição de uma espécie pela presença de outra é um fenômeno comum tal qual estudado com respeito à competição e à predação. Uma espécie pode inibir uma outra comendo-a, reduzindo os recursos ao nível abaixo daquele que a outra precisa para subsistir ou confrontando-a com químicos nocivos ou comportamento antagonista. No contexto da sucessão, as espécies de clímax, por definição, inibem as espécies características dos estágios iniciais; estas últimas não conseguem invadir uma comunidade clímax exceto após uma perturbação. Como a inibição está tão intimamente relacionada com a substituição de espécies, ela forma uma parte integral da sucessão ordenada desde os estágios iniciais de uma sere até o clímax. Quando a inibição está atuando, a sucessão segue o assentamento de uma espécie ou outra somente através da morte e da substituição de indivíduos já estabelecidos. Assim, a mudança sucessional se move em direção à predominância de espécies de vida mais longa exclusivamente devido ao acaso.

A inibição pode fazer surgir uma situação interessante quando o resultado de uma interação de duas espécies depende de qual delas se estabelece primeiro. Os colonizadores são frequentemente sementes ou larvas, estágios sensíveis na história de vida. Assim, algumas vezes acontece que nenhuma das duas espécies pode se estabelecer na presença dos adultos competitivamente superiores da outra. Neste caso, o curso da sucessão depende da precedência. A precedência, por sua vez, pode ser estritamente aleatória, dependendo de qual espécie atinge o sítio perturbado primeiro, ou pode depender de certas propriedades da área perturbada, por exemplo, seu tamanho, localização, estação do ano e assim por diante.

4.3 TOLERÂNCIA

Através do mecanismo de tolerância, uma espécie pode invadir um novo habitat e se estabelecer independentemente da presença ou ausência de outras espécies, dependendo somente de sua própria capacidade de dispersão e das situações físicas do ambiente. A exclusão competitiva então forma a sere que se segue, isto é, as durações de vida e capacidades competitivas dos colonizadores determinam suas posições e dominância dentro da sere. Sob um mecanismo de tolerância, os estágios iniciais da sucessão são dominados por competidores que têm ciclos de vida curtos, mas que se estabelecem rapidamente. Os competidores superiores constituem as espécies de clímax, mas podem crescer mais lentamente e não expressar sua dominância da sere até que outros já tenham amadurecido e se reproduzido.

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4.3.1 Aproximando-se do clímax

A sucessão continua até que a adição de novas espécies à sere e a explosão de espécies estabelecidas não mais mudem o ambiente da comunidade em desenvolvimento. A progressão desde o desenvolvimento de formas pequenas até o desenvolvimento de formas grandes modifica as condições de luz, temperatura, umidade e nutrientes do solo. As condições mudam mais lentamente, contudo, quando a vegetação atinge a maior forma de crescimento que o ambiente pode sustentar. As dimensões da biomassa de uma comunidade clímax são limitadas pelo clima, independentemente dos eventos durante a sucessão.

Uma vez que a vegetação de floresta se estabeleceu, os padrões da inten-sidade luminosa e umidade do solo não variam, exceto em pequenos detalhes, com a introdução de novas espécies arbóreas. Por exemplo, a faia e o bordo subs-tituem o carvalho e a nogueira nas florestas de madeira dura do norte porque a suas plântulas são melhor competidoras na região sombreada do solo da floresta. Todavia, as plântulas da faia e bordo também se desenvolve bem sob seus pais, tanto quanto elas fazem sob as árvores de carvalho e nogueira que substituem. Neste ponto, a sucessão atinge o clímax; a forma de crescimento da comunidade chega a um equilíbrio com seu ambiente físico.

A composição de espécies de uma comunidade pode mudar, mesmo após a forma de crescimento clímax ser atingida. Além disso, o tempo exigido para uma sucessão ir de um habitat perturbado a uma comunidade clímax varia com a natureza do clímax e com a qualidade inicial do solo. A sucessão é mais lenta para ganhar o momentum quando ela começa sobre uma rocha nua do que quando ela começa sobre o solo recentemente exposto. Uma floresta clímax de carvalho-nogueira se desenvolverá em 150 anos sobre uma terra abandonada na Carolina do Norte. Os estágios de clímax de campo do oeste americano são atingidos entre 20 e 40 anos de sucessão secundária. Nos trópicos úmidos, as comunidades da floresta recuperam a maioria de seus segmentos de clímax em 100 anos após o desmatamento, contando com o fato de que o solo não seja explorado por fazendas ou não sofra uma exposição prolongada ao Sol e à chuva. A sucessão principal normalmente prossegue muito mais lentamente. Os métodos de datação de radiocarbono sugerem que uma floresta clímax de faia-bordo exige até 1000 anos para se desenvolver nas dunas de areia do lago Michigan.

Os ecólogos geralmente concordam que as comunidades são mais diversas e complexas nos estágios intermediários da sucessão. Contudo, não sabemos se este aumento na diversidade de uma comunidade durante seus estágios iniciais da sucessão está relacionado com uma população aumentada, uma constância maior das características físicas do ambiente ou uma heterogeneidade estrutural maior de habitat.

As propriedades biológicas de uma comunidade em desenvolvimento mudam conforme as espécies entram e saem de uma sere. À medida que uma comunidade amadurece, a relação entre biomassa e produtividade aumenta. Os

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UNIDADE 3 — UNIDADES DE ECOLOGIA

requisitos de manutenção da comunidade também aumentam até que a produção não pode mais atender a demanda, em cujo ponto a acumulação de biomassa na comunidade cessa. O fim da acumulação de biomassa não sinaliza necessariamente o atingimento de um clímax; as espécies podem continuar em invadir uma comunidade e substituir outras a despeito da biomassa da comunidade aumentar ou não. O atingimento de uma biomassa de estado estacionário de fato marca o fim de uma mudança estrutural maior na comunidade, e mudanças adicionais estão normalmente limitadas ao ajuste de detalhes.

Conforme o tamanho das plantas aumenta com a sucessão, uma propor-ção maior dos nutrientes disponíveis para comunidade vem parar nos materiais orgânicos. Além do mais, como as plantas de comunidades maduras alocam muito de sua biomassa para tecidos de suporte, que são menos prontamente di-geríveis do que o tecido fotossintético, uma proporção maior da produtividade entra nas cadeias alimentares de detritos mais do que nas cadeias alimentares de consumidores. Outros aspectos da comunidade mudam também. Os sistemas radiculares bem desenvolvidos das árvores assimilam os minerais mais rapida-mente e os armazenam num grau maior do que os sistemas radiculares das plan-tas sucessionais iniciais. Os solos da floresta retêm nutrientes mais fortemente porque as raízes das árvores os protegem da erosão. O dossel da floresta protege o ambiente próximo ao solo de temperaturas e umidade extremas, e as condições da serapilheira são mais favoráveis aos organismos detritívoros.

5 ESPÉCIES SUCESSIONAIS E SUAS ADAPTAÇÕES

A sucessão em habitats terrestres exige uma progressão regular de formas de plantas. Os habitantes iniciais e tardios usam diferentes estratégias de crescimento e reprodução. As espécies do estágio inicial capitalizam a sua capacidade de dispersão para colonizar rapidamente os habitats recém-criados ou perturbados. As espécies clímax se dispersam e crescem mais lentamente, mas sua tolerância à sombra enquanto brotos, e seu tamanho grande quando plantas maduras, fornece a elas uma vantagem competitiva sobre as espécies sucessionais iniciais. As espécies sucessionais iniciais são adaptadas para colonizar ambientes inexplorados, enquanto as plantas de comunidades clímax são adaptadas para crescer e prosperar no ambiente que criaram. A progressão de espécies sucessionais é, portanto, acompanhada por uma mudança no balanço entre adaptações que promovem a dispersão e adaptações que promovem a capacidade competitiva.

Para intensificar a sua capacidade colonizadora, as espécies serais pri-márias produzem muitas sementes pequenas que são normalmente aladas, tais como dente-de-leão, por exemplo. Suas sementes podem permanecer dormentes nos solos de florestas e de habitats arbustivos por anos, nos quais são chamados de bancos de semente, até que incêndios ou quedas de árvores criem condições de solo exigidas para sua germinação e crescimento. As sementes na maioria das

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TÓPICO 3 — DESENVOLVIMENTO DO ECOSSISTEMA

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espécies de clímax são relativamente grandes, proporcionando seus brotos com bastante nutrientes para começar a vida no ambiente altamente competitivo do chão da floresta. A sobrevivência de brotos na sombra está diretamente relaciona-da com o peso da semente.

A capacidade dos brotos em sobreviver às condições sombreadas do habitat de clímax está inversamente relacionada com a sua capacidade em crescer rapidamente na luz direta do Sol dos habitats sucessionais iniciais. Quando colocadas completamente na luz do Sol, as herbáceas sucessionais iniciais crescem dez vezes mais rápido do que as árvores tolerantes à sombra. As árvores intolerantes à sombra têm taxas de crescimento intermediárias. Assim, as plantas devem equilibrar sua tolerância à sombra e taxa de crescimento em relação as demais plantas; cada espécie deve estabelecer um compromisso com as adaptações que são melhores para sua sobrevivência na sere.

O rápido crescimento das espécies sucessionais iniciais resulta em parte de alocar uma proporção relativamente grande de biomassa de brotos para os caules e as folhas. A distribuição de tecidos de uma planta entre raízes e partes aéreas influencia essa fase do crescimento. As folhas suprem a fotossíntese e sua produ-tividade determina a acumulação líquida de tecido vegetal durante o crescimento. Assim, a alocação de uma grande proporção da produção para a biomassa aérea leva a um rápido crescimento e produção de grandes safras de sementes. Como as plantas anuais devem produzir sementes rápida e abundantemente, elas amadu-recem cedo e nunca atingem um tamanho grande. As espécies clímax alocam uma proporção maior de sua produção para os tecidos da raiz e do caule para aumentar sua capacidade competitiva; assim crescem mais lentamente.

6 COMUNIDADES CLÍMAX MANTIDAS POR CONDIÇÕES AMBIENTAIS EXTREMAS

Muitos fatores determinam a composição de uma comunidade clímax, entre elas os nutrientes do solo, a umidade, a declividade e a exposição. O fogo é uma característica importante de muitas comunidades clímax, favorecendo espécies resistentes a ele excluindo as espécies que de outra forma dominariam. As vastas florestas de pinheiros do sul, ao longo da costa do Golfo e da costa sul do Atlântico nos Estados Unidos, são mantidas por incêndios periódicos, tal qual o cerrado brasileiro é igualmente um ecossistema que inclui o fogo dentro de seus processos naturais de manutenção. Os pinheiros se adaptaram para resistir às queimas que destroem carvalhos e outras espécies de folhas largas. Algumas espécies de pinheiros nem mesmo descartam suas sementes, a menos que disparadas pelo calor de um incêndio passando por baixo. Após um incêndio, brotos de pinheiros crescem rapidamente na ausência de competição de outras espécies da parte de baixo.

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UNIDADE 3 — UNIDADES DE ECOLOGIA

Qualquer habitat que é ocasionalmente seco o suficiente para criar um perigo de incêndio, mas normalmente úmido o bastante para produzir e acu-mular uma grossa camada de detritos vegetais, é um candidato provável a ser influenciado pelo fogo. A vegetação de chaparral em habitats sazonalmente secos na Califórnia é um clímax mantido por fogo, que dá lugar a um bosque de car-valho em muitas áreas quando o fogo é bloqueado. A fronteira floresta-pradaria no meio-oeste dos Estados Unidos separa as comunidades de “clímax climático” das comunidades de “clímax de fogo” (termos que se referem aos fatores físicos dominantes que determinam sua composição de espécies). A queima frequente-mente mata os brotos das árvores de madeiras duras, mas as gramíneas perenes de pradaria brotam de suas raízes após o incêndio. A fronteira floresta-pradaria ocasionalmente se move para trás e para frente ao longo da área, dependendo da intensidade das últimas secas e da extensão dos últimos incêndios. Após perío-dos úmidos prolongados, a borda de floresta avança para dentro da pradaria, à medida que os brotos das árvores crescem e começam a sombrear as gramíneas. Uma seca prolongada seguida por um intenso incêndio pode destruir as árvores altas e permitir que as gramíneas de pradaria de disseminação rápida ocupem a posição. Uma vez que a vegetação de pradarias se estabelece, os incêndios se tor-nam mais frequentes, por causa da rápida formação da serapilheira inflamável. A invasão por espécies de floresta então se torna mais difícil. “Pagando na mesma moeda”, as florestas maduras resistem a incêndios e são raramente danificadas o suficiente para permitir a infiltração das gramíneas de pradaria. Assim, o ecótono no floresta-pradaria permanece razoavelmente estável.

A pressão de pastagem também pode modificar uma comunidade clímax. O campo pode ser transformado em arbustos pela pastagem densa. Os herbívoros podem matar ou severamente danificar as gramíneas perenes e permitir que os arbustos e os cactos, impalatáveis ao forrageamento, invadam. A maioria dos herbívoros pastam seletivamente, suprimindo espécies favorecidas de plantas e acomodando os competidores que são menos desejáveis como alimento. Nas planícies africanas, o gado pastador forma uma sucessão regular de espécies numa área, cada um usando um tipo diferente de forrageamento. Quando os gnus, os primeiros da sucessão, foram experimentalmente excluídos de algumas áreas, ondas subsequentes de gazelas preferiram se alimentar em áreas anteriormente usadas pelos gnus ou outros grandes herbívoros. Aparentemente, uma pastagem pisoteada por gnus estimula o crescimento de plantas comestíveis que as gazelas preferem, e reduz a cobertura dentro da qual os predadores e os pequenos herbívoros poderiam se esconder. No oeste da América do Norte, a pastagem permite a invasão da gramínea alienígena “trapaceira” – Bromus lectorum (uma parente da cevadilha – Bromus unioloides, que ocorre no sul do Brasil), que promove incêndios e pode conduzir a sucessão para um estado estável alternativo, isto é, uma comunidade clímax diferente.

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TÓPICO 3 — DESENVOLVIMENTO DO ECOSSISTEMA

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7 CLÍMACES TRANSITÓRIOS E CÍCLICOS

Usualmente vemos a sucessão como uma série de mudanças conduzindo ao clímax, cujo caráter é determinado pelo ambiente local. Uma vez estabelecido, uma floresta se perpetua a si mesma, e sua aparência geral não muda a despeito da substituição constante de indivíduos dentro da comunidade. Contudo, nem todos os clímaces persistem. Casos simples de clímaces transitórios incluem o desenvolvimento de comunidades animais e vegetais em poças sazonais (pequenos corpos de água que secam no verão ou congelam no inverno de zonas temperadas) e, portanto, regularmente destroem as comunidades que se estabelecem em cada um deles anualmente. A cada primavera, as poças são restabelecidas a partir de corpos de água maiores e permanentes, ou de estágios de repouso deixados por plantas, animais e microrganismos antes que o habitat desaparecesse no ano anterior, iniciando a sucessão novamente.

A sucessão reinicia sempre que uma nova oportunidade ambiental surge. A excreta de organismos mortos, por exemplo, proporciona os recursos para diversos carniceiros e detritívoros. Nas savanas africanas, as carcaças dos grandes mamíferos são devoradas por uma sucessão de carniceiros. Os primeiros são espécies grandes e agressivas que se banqueteiam elas próprias sobre as grandes massas de carne. Estas são seguidas por espécies menores, que pegam pedaços menores de carne dos ossos, e finalmente por um tipo de carniceiro que quebra os ossos para se alimentar do tutano. Os mamíferos carniceiros, os vermes e os microrganismos entram na sequência em pontos diferentes, e asseguram que nada comestível reste. Essa sucessão não tem clímax, porque todos os carniceiros se dispersam quando a festa acaba. Podemos, contudo, considerar todos os carniceiros como parte de um clímax: a comunidade inteira da savana.

Em comunidades simples, as características da história de vida específica de umas poucas espécies dominantes podem criar um clímax cíclico. Os clímaces cíclicos normalmente seguem um esquema frequentemente regular de dominância de espécie na qual o tamanho de cada estágio é determinado pela duração de vida da espécie dominante, frequentemente com um estágio com apenas um substrato. O vento ou congelamento tem as vezes conduzido a este tipo de ciclo.

O clímax cíclico é observado em regiões da Europa atingidas por fortes ventos onde colinas ou pequenos morros de terra se formam em torno de moitas aglomeradas de gramíneas. À medida que essas moitas crescem, o solo se torna melhor drenado. Conforme o solo se torna seco, os liquens de caule tomam conta do monte e excluem as gramíneas em torno do qual a moita se formou. Contudo, os líquens de caule são desgastados pela erosão do vento, e por fim abre espaço para liquens rasteiros que resistem à erosão do vento, mas por não possuírem raízes, não podem reter o solo. Finalmente, a moita é completamente desgastada e as gramíneas uma vez mais se estabelecem e renovam o ciclo.

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UNIDADE 3 — UNIDADES DE ECOLOGIA

Os padrões de mosaico de tipos de vegetação tipificam qualquer comunidade clímax onde as mortes dos indivíduos alteram o ambiente. As quedas de árvores criam clareiras na floresta e manchas de habitat que são secos, quentes e ensolarados, quando comparados com o solo da floresta sob o dossel não interrompido. Estas clareiras são frequentemente invadidas por formas serais iniciais, que persistem até que o dossel se fecha novamente. Assim, a queda das árvores cria um mosaico mutante de estágios sucessionais dentro do que seria de outra forma uma comunidade de floresta uniforme. De fato, a adaptação por espécies diferentes ao crescimento em condições específicas criadas por clareiras diferentes no dossel poderia intensificar a diversidade total de uma comunidade clímax. Ideias semelhantes foram estudadas nas regiões de entremarés de costões rochosos, onde a erosão das ondas e a predação intensa continuamente abrem novas “clareiras” de habitats.

Neste sentido, o conceito de comunidade clímax deve incluir padrões cíclicos de mudanças, padrões de mosaico de distribuição estados estáveis alternativos. Portanto este clímax é um estado dinâmico, autoperpetuante na composição, mesmo se por ciclos regulares de mudança. A persistência é a chave do clímax e o ciclo persistente define o clímax tão bem quanto um estado estacionário imutável o faz.

A sucessão realça a natureza dinâmica das comunidades biológicas. Por “colocar em xeque” seu equilíbrio natural, a perturbação nos revela as forças que determinam a presença ou ausência numa comunidade e os processos responsáveis pela regulação da estrutura de comunidade. A sucessão também realça a ideia de que as comunidades frequentemente compreendem mosaicos de manchas de estágios sucessionais, e que os estudos de comunidade devem considerar os ciclos de perturbação em muitas escalas de tempo espaço.

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POPULAÇÃO E CAPACIDADE DE SUSTENTAÇÃO

H.T. Odum, E.C. Odum, M.T. Brown, D. LaHart, C. Bersok,

J. Sendzimir, Graeme B. Scott, David Scienceman & Nikki Meith

1 INTRODUÇÃO

Nos Estados Unidos, conforme a população aumenta, o crescimento parece concentrar-se unicamente em alguns estados como Califórnia, Texas, Flórida e outros estados do "cinturão do sol". O incremento natural da população se deve a um índice de nascimentos maior que o índice de mortalidade, e as pessoas estão emigrando aos Estados Unidos de outros países; são atraídos pela combinação do padrão de vida e a estabilidade do sistema governamental norte-americano.

À medida que entramos na última década deste século, e os limites do crescimento econômico se sentem mais e mais, deve-se enfrentar dois sérios ques-tionamentos: De que maneira a população se transladará dentro de um país em sua busca por uma razoável combinação de qualidade ambiental e desenvolvi-mento econômico? Uma vez que o desenvolvimento econômico tenha alcançado o ponto máximo, a população continuará crescendo ou começará a decrescer?

2 PADRÃO DE VIDA

Se a população aumenta e os recursos não, então a quantidade de recursos por pessoa diminui. Uma pessoa terá menos recursos para cobrir suas necessidades e da sociedade. Algumas vezes se denomina padrão de vida à cota de recursos por pessoa. Uma medida disto é a eMergia usada por pessoa. Esta é uma melhor quantificação dos recursos individuais que o salário, porque inclui recursos naturais obtidos diretamente do ambiente (pesca, caça, ar, água) ou de outra pessoa (intercâmbio) sem pagamento em dinheiro.

A Tabela 1 mostra uma comparação entre países. Observe as diferenças existente entre a eMergia total usada por ano, a população total, e a proporção de eMergia por pessoa (quantificação do padrão de vida). A Austrália, com uma combinação de muitos recursos e relativamente baixa população, tem uma alta eMergia por pessoa, enquanto países como a Índia, com uma enorme população e recursos moderados, possui um padrão de vida muito menor.

LEITURA COMPLEMENTAR

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TABELA 1 – PADRÃO DE VIDA PARA DIFERENTES PAÍSES EM 1980

3 CAPACIDADE DE SUSTENTAÇÃO

A capacidade de sustentação é o número de indivíduos que qualquer área pode manter com os recursos disponíveis. No sistema humano é o número de pessoas que podem manter um padrão de vida específico (eMergia por pessoa por ano) com os recursos disponíveis. Predizer a capacidade de sustentação requer prognosticar os recursos energéticos que estarão disponíveis. A capacidade de sustentação depende dos recursos naturais e combustíveis, locais e importados.

O gráfico na Ffgura 1 mostra a capacidade de sustentação de uma área que aumenta no decorrer do tempo, enquanto existe mais energia de combustíveis em uso. A capacidade de sustentação no lado esquerdo do gráfico inicia com o número de indivíduos que pode ser mantido com fontes de energia natural renovável, esta se incrementa mais e mais ao aumentar a energia de combustíveis (local e importada).

FIGURA 1 – A CAPACIDADE DE SUSTENTAÇÃO DE UMA REGIÃO DEPENDE DA QUANTIDADE DE FONTES DE ENERGIA LOCAL RENOVÁVEL E DOS COMBUSTÍVEIS UTILIZADOS (DE ORIGEM

LOCAL OU IMPORTADOS)

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4 EFEITO DA DIMINUIÇÃO DE RECURSOS NA POPULAÇÃO

Existem muitas controvérsias entre a população científica sobre a resposta que terão os índices de natalidade, mortalidade e a tendência de imigração, quando a economia começar a se estabilizar. No futuro, se espera que a habilidade de um estado ou região de suportar uma população, com o atual padrão de vida, entre em decadência à medida que declinem os recursos disponíveis. Em outras palavras, a capacidade de sustentação diminuirá. O efeito do declínio da capacidade de sustentação da população abre algum questionamento, uma resposta pode ser encontrada no modelo de simulação na Figura 2.

FIGURA 2 – MUDANÇAS NA POPULAÇÃO DO MUNDO BASEADOS EM MUDANÇAS EM RECURSOS ECONÔMICOS

Neste modelo, os recursos controlam a saúde pública (nascimentos, mortes, epidemias) e a saúde pública controla a população. Na Figura 2, quando os recursos aumentam, também o fazem a população e a demanda de recursos energéticos não renováveis. Como os recursos estão sendo usados, mas não repostos, começam a decrescer; a população rapidamente segue a diminuição dos recursos. Resta saber se este modelo é uma visão exata do que acontecerá no futuro.

5 O PRINCÍPIO DO INVESTIMENTO COMBINADO

O crescimento e desenvolvimento econômico acarreta a importação de bens de alta qualidade, serviços e recursos energéticos que interatuem com os recursos ambientais como sol, vento, chuva e solo. Esta é uma combinação de alta qualidade de eMergia com baixa qualidade de eMergia. Os fluxos que possuem alta eMergia tem o efeito de amplificar aqueles fluxos de menor qualidade de eMergia. Na figura 3 a eMergia de alta qualidade de recursos naturais, bens, serviços e solo usado é de 58,1 x 1023 sej/ano. Este interatua com 8.2 x 1023 sej/ano de recursos renováveis gratuitos. A relação de eMergia de alta qualidade e eMergia ambiental renovável se denomina índice de investimento. O índice médio para os E.U.A. é de 7.1.

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FIGURA 3 – ÍNDICE DE INVESTIMENTO DOS ESTADOS UNIDOS EM 1980

Quando outros países se sentem tentados a investir em um estado ou região, isto pode depender do índice de investimento dentro de cada estado comparado com alternativas em outros lugares nos Estados Unidos e no mundo. Muitos países menos desenvolvidos possuem índices mais baixos que alguns estados; é dizer que possuem mais recursos para se desenvolverem que os estados que atualmente têm desenvolvimento econômico. Portanto, estes estados podem não atrair muitos investimentos, exceto em suas regiões rurais. De fato, recentes tendências indicam que existe movimento da população e indústrias de áreas mais desenvolvidas e povoadas para áreas rurais que possuem uma boa base ambiental.

FONTE: ODUM, H. T. et al. Ambiente, Avaliação Energética, Economia,Micro-computadores, e Políticas Públicas. Programa de Economia Ecológica, Phelps Lab, Universidade da Florida, Gainesville, julho de 1987. Tradutores e adaptadores da versão para Internet em português: Laboratório de Engenharia Ecológica e Informática Aplicada (LEIA). Disponível em: http://www.unicamp.br/fea/ortega/eco/index.htm. Acesso em: 1° jul. 2021.

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RESUMO DO TÓPICO 3

Neste tópico, você aprendeu que:

• A sucessão é o desenvolvimento de uma comunidade biológica após uma perturbação no ambiente natural ou a exposição de um novo substrato. A sequência específica das comunidades da sucessão é denominada de sere, e o estágio final atingido pelas plantas e animais é chamada de clímax.

• A sucessão primária, envolve uma alteração significativa do ambiente pelos colonizadores pioneiros. As alterações pouco significativas, que preservam partes da estrutura do ecossistema intacta, são acompanhadas pela sucessão secundária.

• A sequência inicial da sere depende do tipo e da extensão da alteração no ambiente, mas a condição evolutiva final sempre traduz o clima e a topografia, ou seja, numa região, as seres tendem a convergir para um clímax singular.

• Os colonizadores pioneiros tendem a se dispersar mais e crescer rapidamente; indivíduos nos estágios tardios tendem a dominar as interações diretas com outras espécies.

• Os mecanismos que governam a sucessão são três: facilitação, inibição e tolerância. Cada um desses demonstra os efeitos que uma espécie pode produzir na expectativa de colonização por outros s na sequência sucessional.

• A facilitação atua nos estágios iniciais da sucessão primária. A inibição é um atributo mais comum da sucessão secundária e pode ser resultante da dominância competitiva da espécie que chegou primeiro.

• O mecanismo de tolerância destaca as habilidades das espécies em aceitar as condições do ambiente através da sucessão e minimizar os efeitos negativos de outras espécies na sua acomodação.

• A biomassa aumenta durante a sucessão, enquanto a produção líquida e a diversidade tendem a ser maiores nos estágios iniciais.

• As espécies pioneiras tendem a ter muitas sementes pequenas que são facilmente dispersadas; as espécies dos estágios tardios têm sementes grandes, brotos tolerantes à sombreamento e crescimento lento.

• Os clímaces transitórios se desenvolvem sobre recursos e habitats provisórios.

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• Os clímaces cíclicos são frequentemente criados por condições físicas extremas, como o congelamento e ventos fortes e ocorrem em locais em que as espécies possam se estabelecer em associações com outras espécies.

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1 O desenvolvimento do ecossistema ou sucessão ecológica, envolve mudanças na repartição de energia, na estrutura das espécies e nos processos da comunidade. Sobre as etapas da sucessão ecológica, assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) O estágio seral inicial é denominado estágio pioneiro também conhecida como sucessão secundária.

b) ( ) A velocidade da sucessão aumenta conforme as plantas maiores aparecem.

c) ( ) O clímax é melhor entendido através do estado do metabolismo da comunidade do que pela composição específica.

d) ( ) espécies com pequenas sementes, facilmente carregadas pelo vento, são membros da comunidade clímax.

2 Dois fatores determinam quando uma espécie se estabelece numa sere: (1) quão prontamente ela invade um habitat perturbado ou recém-formado; e (2) sua resposta para as mudanças que ocorrem no ambiente ao longo do curso da sucessão. Com base nas definições dos enfoques das modalidades de Engenharia, analise as sentenças a seguir:

I - As espécies clímax alocam uma proporção maior de sua produção para os tecidos das folhas para aumentar sua capacidade competitiva.

II - A composição de espécies de uma comunidade não se altera após a forma de crescimento clímax ser atingida.

III - À medida que uma comunidade amadurece, a relação entre biomassa e produtividade aumenta.

Assinale a alternativa CORRETA:

a) ( ) As sentenças I e II estão corretas.b) ( ) Somente a sentença II está correta.c) ( ) As sentenças I e III estão corretas.d) ( ) Somente a sentença III está correta.

3 Muitos fatores determinam a composição de uma comunidade clímax, entre elas os nutrientes do solo, a umidade, a declividade e a exposição. Considerando que as comunidades clímax possam ser mantidas por condições ambientais extremas, classifique V para as sentenças verdadeiras e F para as falsas:

( ) A pressão de pastagem dos herbívoros não é capaz de modificar uma comunidade clímax.

( ) As florestas maduras não resistem a incêndios e são danificadas o suficiente permitindo a infiltração de gramíneas de pradaria.

AUTOATIVIDADE

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( ) O fogo é uma característica importante de muitas comunidades clímax, favorecendo espécies resistentes a ele excluindo as espécies que de outra forma dominariam.

Assinale a alternativa que apresenta a sequência CORRETA:

a) ( ) V – F – F.b) ( ) V – F – V.c) ( ) F – V – F.d) ( ) F – F – V.

4 Usualmente, vemos a sucessão como uma série de mudanças conduzindo ao clímax, cujo caráter é determinado pelo ambiente local. A sucessão reinicia sempre que uma nova oportunidade ambiental surge. Disserte sobre como a sucessão pode se processar numa comunidade animal.

5 O conceito de comunidade clímax deve incluir padrões cíclicos de mudanças, padrões de mosaico de distribuição estados estáveis alternativos. Neste contexto, disserte sobre o clímax cíclico.

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