Produto Final Condesado Angela

198
1 SUMÁRIO 1. PLANOS DE ENSINO............................................................................................................... 3 MÓDULO I: A CONSTRUÇÃO DA POLITICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL NO BRASIL: .................. 3 bases legais e conceitos fundamentais ................................................................................. 3 MÓDULO II: ORGANIZAÇÃO DO SISTEMA ÚNICO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL ......................... 4 MÓDULO III: GESTÃO DO SISTEMA ÚNICO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL .................................... 7 MÓDULO IV: AÇÕES DA ASSISTÊNCIA SOCIAL NO PLANO BRASIL SEM MISÉRIA – PBSM..... 8 REFERÊNCIAS BIBLIOGRÁFICAS BÁSICAS............................................................................... 9 2. CONTEÚDOS........................................................................................................................ 10 MÓDULO I: A CONSTRUÇÃO DA POLITICA DE ASSISTÊNCIA SOCIAL NO BRASIL: bases legais e conceitos fundamentais ................................................................................................... 10 1. O Estado e a Política de Assistência Social: marcos legais .......................................... 10 2. Sistema Protetivo Brasileiro e a proteção social não contributiva............................. 14 2.3 A proteção social não contributiva ........................................................................... 18 3. Histórico da Política de Assistência Social no Brasil .................................................... 20 4. Conceitos básicos da Politica Nacional de Assistência Social (PNAS) .......................... 23 5. Temas transversais das políticas sociais: diversidade de gênero, raça, etnia, entre outros .............................................................................................................................. 40 Referências Bibliográficas Específicas ............................................................................ 45 MÓDULO II: ORGANIZAÇÃO DO SISTEMA ÚNICO DE ASSISTÊNCIA SOCIAL ....................... 46 I. Conceitos básicos: princípios e diretrizes do SUAS .................................................... 46 II. A proteção social no âmbito da assistência social ..................................................... 51 2.1 Proteção Social Básica: Serviços............................................................................... 52 2.2 Proteção Social Básica: Unidade de Referência ........................................................ 66 Referências Bibliográficas Específicas ............................................................................. 78 2.3 Proteção Social Especial: Serviços ............................................................................ 79 2.3.1 A Proteção Social Especial de Média Complexidade: Serviços e Programas ......... 81 2.3.2 A Proteção Social Especial de Média Complexidade: Unidades de Referência...... 88 2.3.3 A Proteção Social Especial de Alta Complexidade ............................................... 115 Referências Bibliográficas Específicas ........................................................................... 120 III. Benefício de Prestação Continuada ........................................................................ 121 3.1 Contextualização e concepção ................................................................................ 121 3.2 Caracterização do BPC (BPC Trabalho e BPC Escola)............................................... 123

description

ass.soc

Transcript of Produto Final Condesado Angela

  • 1

    SUMRIO 1. PLANOS DE ENSINO ............................................................................................................... 3

    MDULO I: A CONSTRUO DA POLITICA DE ASSISTNCIA SOCIAL NO BRASIL: .................. 3

    bases legais e conceitos fundamentais ................................................................................. 3

    MDULO II: ORGANIZAO DO SISTEMA NICO DE ASSISTNCIA SOCIAL ......................... 4

    MDULO III: GESTO DO SISTEMA NICO DE ASSISTNCIA SOCIAL .................................... 7

    MDULO IV: AES DA ASSISTNCIA SOCIAL NO PLANO BRASIL SEM MISRIA PBSM ..... 8

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS BSICAS ............................................................................... 9

    2. CONTEDOS ........................................................................................................................ 10

    MDULO I: A CONSTRUO DA POLITICA DE ASSISTNCIA SOCIAL NO BRASIL: bases legais e conceitos fundamentais ................................................................................................... 10

    1. O Estado e a Poltica de Assistncia Social: marcos legais .......................................... 10

    2. Sistema Protetivo Brasileiro e a proteo social no contributiva ............................. 14

    2.3 A proteo social no contributiva ........................................................................... 18

    3. Histrico da Poltica de Assistncia Social no Brasil .................................................... 20

    4. Conceitos bsicos da Politica Nacional de Assistncia Social (PNAS) .......................... 23

    5. Temas transversais das polticas sociais: diversidade de gnero, raa, etnia, entre outros .............................................................................................................................. 40

    Referncias Bibliogrficas Especficas ............................................................................ 45

    MDULO II: ORGANIZAO DO SISTEMA NICO DE ASSISTNCIA SOCIAL ....................... 46

    I. Conceitos bsicos: princpios e diretrizes do SUAS .................................................... 46

    II. A proteo social no mbito da assistncia social ..................................................... 51

    2.1 Proteo Social Bsica: Servios ............................................................................... 52

    2.2 Proteo Social Bsica: Unidade de Referncia ........................................................ 66

    Referncias Bibliogrficas Especficas ............................................................................. 78

    2.3 Proteo Social Especial: Servios ............................................................................ 79

    2.3.1 A Proteo Social Especial de Mdia Complexidade: Servios e Programas ......... 81

    2.3.2 A Proteo Social Especial de Mdia Complexidade: Unidades de Referncia ...... 88

    2.3.3 A Proteo Social Especial de Alta Complexidade ............................................... 115

    Referncias Bibliogrficas Especficas ........................................................................... 120

    III. Benefcio de Prestao Continuada ........................................................................ 121

    3.1 Contextualizao e concepo ................................................................................ 121

    3.2 Caracterizao do BPC (BPC Trabalho e BPC Escola) ............................................... 123

  • 2

    IV. Benefcios Eventuais ................................................................................................ 127

    V Programa Bolsa Famlia ............................................................................................. 131

    5.1. Contextualizao e concepo ............................................................................... 131

    5.2 Noes Gerais sobre o Programa Bolsa Famlia ..................................................... 132

    5.3 Condicionalidades ................................................................................................... 134

    5.4 Gesto descentralizada do Bolsa Famlia ............................................................... 137

    5.5 Controle Social do Programa Bolsa Famlia ............................................................. 138

    5.6 Fiscalizao do Programa Bolsa Famlia .................................................................. 140

    5.7 Benefcio para Superao da Extrema Pobreza na Primeira Infncia Brasil Carinhoso ...................................................................................................................... 141

    VI. Programa de Erradicao do Trabalho Infantil (PETI) .............................................. 143

    MDULO III ....................................................................................................................... 151

    GESTO DO SISTEMA NICO DE ASSISTNCIA SOCIAL ..................................................... 151

    1. Gesto compartilhada ................................................................................................... 151

    1.1 Instncias de Negociao ........................................................................................ 152

    1.2 Instrumentos de Gesto ......................................................................................... 159

    2. Gesto Oramentria e Financeira ............................................................................... 174

    2.1 Conceitos bsicos .................................................................................................... 174

    2.2 Ciclo oramentrio e os instrumentos de planejamento pblico .......................... 179

    2.3 A estruturao dos fundos de assistncia social .................................................... 180

    Referncias Bibliogrficas Especficas ............................................................................... 187

    MDULO IV - PLANO BRASIL SEM MISERIA .......................................................................... 188

    1- Contextualizao do Plano Brasil Sem Misria ............................................................. 188

    1.1 Concepo ............................................................................................................... 188

    1.2 Gesto do PBSM: atribuies e recursos ............................................................... 189

    1.3 Eixos de atuao do PBSM ...................................................................................... 190

    2. O SUAS no Plano Brasil Sem Misria: garantia de renda e assistncia social .............. 194

    2.1 Garantia de renda: aes do Plano programa Bolsa Famlias ................................ 194

    2.2 Assistncia Social .................................................................................................... 195

    2.3 Competncias dos entes federados na gesto do PBSM ........................................ 196

    Referncias Bibliogrficas ..................................................................................................... 198

  • 3

    1. PLANOS DE ENSINO

    MDULO I: A CONSTRUO DA POLITICA DE ASSISTNCIA SOCIAL NO BRASIL: bases legais e conceitos fundamentais

    CARGA HORRIA: 6 HORAS OBJETIVO Introduzir os principais elementos que conformam a construo da Poltica Nacional de Assistncia Social conceitos e bases legais - para que os trabalhadores do Sistema nico de Assistncia Social (SUAS) possam desenvolver suas atividades pautados no conhecimento terico-poltico que d com sustentao ao SUAS. EMENTA O Estado Brasileiro, as polticas sociais e seus objetivos. O modelo brasileiro de proteo social no contributiva. O espao participativo e de controle social dos Conselhos no novo modelo de gesto da assistncia social. Diretrizes da Poltica Nacional de Assistncia Social. Intersetorialidade e rede de relaes sociais. MTODOS DIDTICOS Aulas expositivas, seminrios, leituras em conjunto, trabalhos em grupo, filmes/ vdeos seguidos de debate. MTODOS DE AVALIAO Trabalhos em grupo escritos e seminrios e prticas simuladas CONTEDO PROGRAMTICO 1. O Estado e a poltica de assistncia social: marcos legais 2. Sistema Protetivo Brasileiro e a proteo social no contributiva 3. Histrico da Poltica de Assistncia Social no Brasil 4. Conceitos bsicos da PNAS

    Descentralizao poltico-administrativa Controle social e participao Matricialidade scio-familiar Rede socioassistencial Vigilncia Socioassistencial (Risco, Vulnerabilidade e Territrio) Intersetorialidade: as interfaces das polticas sociais

    5. Temas transversais das polticas sociais: Diversidade de gnero, raa, etnia, entre outros

  • 4

    MDULO II: ORGANIZAO DO SISTEMA NICO DE ASSISTNCIA SOCIAL CARGA HORRIA - 18 HORAS OBJETIVOS: Compreender a organizao do SUAS e desenvolver capacidade de leitura da realidade para lidar no trabalho cotidiano MTODOS DIDTICOS

    Aulas expositivas, seminrios, leituras em conjunto, trabalhos em grupo, filmes e vdeos seguidos de debate. Prticas simuladas.

    EMENTA Organizao do SUAS e os Servios Socioassistenciais disponibilizados pela sua rede de Servios de Proteo Social Bsica e de Proteo Social Especial. Estruturao, Organizao e funcionamento dos Centros de Referncia de Assistncia Social (CRAS) e Centro de Referncia Especializada de Assistncia Social (CREAS). Benefcio de Prestao Continuada e Benefcios Eventuais e o Programa Bolsa Famlia: organizao e funcionamento. CONTEDO PROGRAMTICO I- Conceitos bsicos: Princpios e diretrizes do SUAS NOB/SUAS II- Proteo Social Bsica 1. Concepo 2. Vulnerabilidade Social 3. Usurios 4. Servios 2.1 Servios

    Programa de Ateno Integral Famlia (PAIF) Servio de Convivncia e Fortalecimento de Vnculos por faixa etria (SCFV) Servio de Proteo Social no Domiclio

    2.2 Unidades de Referncia

    Centro de Referncia da Assistncia Social (CRAS) 2.3 Funes do CRAS a. Gesto Territorial da Proteo Social Bsica

    Articulao da Rede Socioassistencial de PSB referenciada ao CRAS e dos servios nele ofertados

    Promoo da Articulao Intersetorial Busca Ativa no Territrio do CRAS Produo de material socioeducativo

  • 5

    b. Oferta do Servio de Proteo e Atendimento Integral Famlia (PAIF) e dos outros servios socioassistenciais de proteo bsica III - Proteo Social Especial 1. Concepo e especificidades e organizao da oferta 2. Noes sobre risco pessoal e social e violao de direitos 3. Usurios 4. Servios 4.1. Mdia Complexidade

    Servios de Proteo e atendimento especializado a famlias e indivduos (PAEFI) Servio Especializado em Abordagem Social Servio de Proteo Social a Adolescentes em cumprimento de Medida Scio-

    educativa de Liberdade Assistida (LA) e de Prestao de Servios Comunidade (PSC) Servio de Proteo Social Especial para Pessoas com Deficincia, Idosos e suas

    famlias Servio Especializado para Pessoas em Situao de Rua Programa de Erradicao do Trabalho Infantil

    Concepo e organizao Fluxo dos usurios no SUAS Interface com outras polticas intersetoriais

    4.1.1 Unidades de Referncia e suas funes

    Centro de Referncia Especializado de Assistncia Social (CREAS) (MC Centro POP Centro Dia de Referncia

    4.2 Alta Complexidade Servio de Acolhimento Institucional Servio de Acolhimento em Repblica Servio de Acolhimento em Famlia Acolhedora Servio de Proteo em Situao em Calamidades Pblicas e Emergncias

    4.2.1 Unidades de Referncia da Alta complexidade e suas funes

    Acolhimento Institucional: Abrigo institucional, Casa-Lar, Casa de Passagem, Residncia Inclusiva

    Acolhimento Repblica

    IV- Benefcios de Prestao Continuada (BPC) Contextualizao e concepo Caracterizao do BPC (BPC Trabalho e BPC Escola) Processo de operacionalizao dos benefcios

    V- Benefcios Eventuais

    Contextualizao e concepo

  • 6

    Caracterizao dos Benefcios Eventuais Processo de operacionalizao dos benefcios

    VI- Programa Bolsa Famlia

    Contextualizao e concepo Noes gerais sobre do Bolsa Famlia Noes gerais dos benefcios do Bolsa Famlia Condicionalidades Gesto descentralizada do Bolsa Famlia Controle Social do Bolsa Famlia Fiscalizao do Bolsa Famlia Brasil carinhoso

    VII- Programa de Erradicao do Trabalho Infantil

    Contextualizao e concepo O PETI no Sistema nico de Assistncia Social O PETI e Programa Bolsa Famlia: uma gesto integrada

  • 7

    MDULO III: GESTO DO SISTEMA NICO DE ASSISTNCIA SOCIAL CARGA HORRIA: 8 HORAS OBJETIVOS Apresentar aos trabalhadores do SUAS os mtodos e instrumentos, as bases de dados e sistemas de informao e gerenciamento e os principais conceitos da rea de financiamento que conformam a Gesto do SUAS visando a sua preparao para desenvolvimento das suas atividades rotineiras. EMENTA Princpios e diretrizes norteadores da Poltica Nacional de Assistncia Social PNAS; gesto financeira, cofinanciamento; fundos nacional, estaduais e municipais de assistncia social; descentralizao de recursos e transferncia fundo a fundo; o papel dos estados e dos municpios (cofinanciamento, composio e atribuies dos conselhos, elaborao dos planos); negociao tripartite e bipartite; monitoramento e avaliao. MTODOS DIDTICOS Aulas expositivas, seminrios, leituras em conjunto, trabalhos em grupo, filmes/ vdeos seguidos de debate. MTODOS DE AVALIAO Trabalhos em grupo escritos e seminrios e prticas simuladas CONTEDO PROGRAMTICO

    I- Gesto compartilhada

    Instncias de Negociao

    Instrumentos de Gesto

    II- Gesto Oramentria e Financeira

    Conceitos bsicos

    Ciclo oramentrio e os instrumentos de planejamento pblico

    A estruturao dos fundos de assistncia social

  • 8

    MDULO IV: AES DA ASSISTNCIA SOCIAL NO PLANO BRASIL SEM MISRIA PBSM

    CARGA HORRIA - 6 HORAS OBJETIVOS Desenvolver as capacidades das equipes trabalhadoras da Assistncia Social para atuar na oferta e no acompanhamento dos benefcios e servios que compem o Plano. EMENTA Estratgias do Plano Brasil Sem Misria. Sua estrutura, organizao e aes previstas. Foco nas aes da Assistncia Social. Intersetorialidade entre as polticas pblicas e sociais. Servios pblicos. Transferncia de renda. Acesso s oportunidades, foco na incluso produtiva MTODOS DIDTICOS Aulas expositivas, seminrios, leituras em conjunto, trabalhos em grupo, e vdeos seguidos de debate MTODOS DE AVALIAO Trabalhos em grupo escritos e seminrios e prticas simuladas CONTEDO PROGRAMTICO I- Contextualizao do PBSM

    Concepo Gesto do PBSM: atribuies e recursos Eixos de atuao

    II. O SUAS no PBSM: garantia de renda e assistncia social

    Garantia de Renda: programa Bolsa Famlia e Beneficio de Prestao Continuada Assistncia Social

    III. Competncias dos entes federados na gesto do PBSM

  • 9

    REFERNCIAS BIBLIOGRFICAS BSICAS

    BRASIL, Presidncia da Republica. Constituio Federal. 1988. (Art.203, V)

    BRASIL, Presidncia da Republica. Lei Orgnica da Assistncia Social, Lei n 8.742, de 7 de dezembro de 1993. Revisada pela Lei 12.435/2011

    MDS-SNAS. Poltica Nacional de Assistncia Social. Braslia. 2004 ______, Norma Operacional Bsica - NOB/SUAS. Braslia. 2005 ______, Norma Operacional Bsica de Recursos Humanos do SUAS NOB-RH/SUAS.

    Braslia. 2006 BRASIL. Comisso Intergestores Tripartite. Protocolo de Gesto Integrada de servios,

    benefcios e transferncias de Renda no mbito do SUAS. Resoluo n 7, de 10 de setembro de 2009. Braslia. MDS: 2009

    BRASIL. Conselho Nacional de Assistncia Social. Tipificao Nacional de Servios Socioassistenciais Resoluo n 109, de 11 de novembro de 2009. Braslia. MDS:2009

    Concepo e gesto da proteo social no contributiva no Brasil. Braslia: Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate Fome, UNESCO, 2009. 424 p

  • 10

    2. CONTEDOS

    MDULO I: A CONSTRUO DA POLITICA DE ASSISTNCIA SOCIAL NO BRASIL: bases legais e conceitos fundamentais

    1. O Estado e a Poltica de Assistncia Social: marcos legais Para iniciarmos o nosso trabalho optamos por trazer, ainda que brevemente, uma

    reflexo sobre o Estado como a instituio mxima responsvel pela garantia da ordem e da

    justia social. Mas, sobre que Estado vamos tratar? Do Estado democrtico de direito que

    nasce na Constituio da Repblica Federal de 1988, que estabelece sua organizao

    poltico-administrativa, define suas competncias, determina os direitos e deveres de todos

    os cidados brasileiros e estabelece formas de participao popular.

    A Constituio da Repblica Federal de 1988 estabelece que a Repblica Federativa

    do Brasil, formada pela unio indissolvel dos Estados e Municpios e do Distrito Federal,

    constitui-se em Estado democrtico de direito que se organiza por meio de cinco

    fundamentos. So eles: a soberania, a cidadania, a dignidade da pessoa humana, os valores

    sociais do trabalho e da livre iniciativa e o pluralismo poltico.

    Ademais, define como objetivos fundamentais do Estado brasileiro:

    construir uma sociedade livre, justa e solidria; garantir o desenvolvimento nacional; erradicar a pobreza e a marginalizao e reduzir as desigualdades sociais e regionais; promover o bem de todos, sem preconceitos de origem, raa, sexo, cor, idade e

    quaisquer outras formas de discriminao.

    A Constituio Federal de 1988 inaugura, portanto, uma mudana para a sociedade

    ao afianar os direitos humanos e sociais como responsabilidade pblica e estatal.

    Desencadeia-se da todo um conjunto de determinaes e de definies que vo

    transformar o papel do Estado.

    A primeira mudana que pode ser verificada no Art. 6 que define os direitos sociais

    So direitos sociais a educao, a sade, a alimentao, o trabalho, a moradia, o lazer, a

  • 11

    segurana, a previdncia social, a proteo maternidade e infncia, a assistncia aos

    desamparados, na forma desta Constituio.1

    A segunda mudana pode ser verificada no Art. 194 com a definio do que seja a

    seguridade social: A seguridade social compreende um conjunto integrado de aes de

    iniciativa dos poderes pblicos e da sociedade, destinadas a assegurar os direitos relativos

    sade, previdncia e assistncia social.

    Reafirma-se o carter imperativo do papel do Estado como responsvel pela

    organizao da seguridade social que deve ser pautada pelos seguintes objetivos:

    universalidade da cobertura e do atendimento; uniformidade e equivalncia dos benefcios e servios s populaes urbanas e

    rurais; seletividade e distributividade na prestao dos benefcios e servios. irredutibilidade do valor dos benefcios; eqidade na forma de participao no custeio; diversidade da base de financiamento; carter democrtico e descentralizado da gesto administrativa, com a

    participao da comunidade, em especial de trabalhadores, empresrios e aposentados.

    Ademais, o Art. 195, estabelece que a seguridade social ser financiada por toda a

    sociedade, de forma direta e indireta, nos termos da lei, mediante recursos provenientes dos

    oramentos da Unio, dos Estados, do Distrito Federal e dos Municpios.

    Para tratar, de modo mais objetivo, so aqui reproduzidas, as grandes determinaes

    que constam na Constituio Federal tanto as relativas Assistncia Social como as que

    tratam mais especificamente da Famlia, da Criana, do Adolescente e do Idoso.

    1. Assistncia Social: A assistncia social ser prestada a quem dela necessitar,

    independentemente de contribuio seguridade social, e tem por objetivos: (CF/ 1988)

    a proteo famlia, maternidade, infncia, adolescncia e velhice; o amparo s crianas e adolescentes carentes; a promoo da integrao ao mercado de trabalho; a habilitao e reabilitao das pessoas portadoras de deficincia e a promoo de

    sua integrao vida comunitria; a garantia de um salrio mnimo de benefcio mensal pessoa portadora de

    deficincia e ao idoso que comprovem no possuir meios de prover prpria manuteno ou de t-la provida por sua famlia, conforme dispuser a lei.

    1 Redao recente que consta na Emenda Constitucional n 64 de 4 de fevereiro de 2010

  • 12

    2. As aes governamentais na rea da assistncia social sero realizadas com recursos do

    oramento da seguridade social (...) e organizadas com base nas seguintes diretrizes:

    descentralizao poltico-administrativa, cabendo a coordenao e as normas gerais esfera federal e a coordenao e a execuo dos respectivos programas s esferas estadual e municipal, bem como a entidades beneficentes e de assistncia social;

    participao da populao, por meio de organizaes representativas, na formulao das polticas e no controle das aes em todos os nveis.

    3. Famlia, da Criana, do Adolescente e do Idoso: A famlia, base da sociedade, tem

    especial proteo do Estado.

    O Estado assegurar a assistncia famlia na pessoa de cada um dos que a integram, criando mecanismos para coibir a violncia no mbito de suas relaes.

    dever da famlia, da sociedade e do Estado assegurar criana e ao adolescente, com absoluta prioridade, o direito vida, sade, alimentao, educao, ao lazer, profissionalizao, cultura, dignidade, ao respeito, liberdade e convivncia familiar e comunitria, alm de coloc-los a salvo de toda forma de negligncia, discriminao, explorao, violncia, crueldade e opresso.

    Os pais tm o dever de assistir, criar e educar os filhos menores, e os filhos maiores tm o dever de ajudar e amparar os pais na velhice, carncia ou enfermidade.

    A famlia, a sociedade e o Estado tm o dever de amparar as pessoas idosas, assegurando sua participao na comunidade, defendendo sua dignidade e bem-estar e garantindo-lhes o direito vida. Os programas de amparo aos idosos sero executados preferencialmente em

    seus lares. Aos maiores de sessenta e cinco anos garantida a gratuidade dos transportes

    coletivos urbanos.

    O Estado promover programas de assistncia integral sade da criana e do adolescente, admitida a participao de entidades no governamentais e obedecendo aos seguintes preceitos: criao de programas de preveno e atendimento especializado para os

    portadores de deficincia fsica, sensorial ou mental, bem como de integrao social do adolescente portador de deficincia, mediante o treinamento para o trabalho e a convivncia, e a facilitao do acesso aos bens e servios coletivos, com a eliminao de preconceitos e obstculos arquitetnicos.

    a lei dispor sobre normas de construo dos logradouros e dos edifcios de uso pblico e de fabricao de veculos de transporte coletivo, a fim de garantir acesso adequado s pessoas portadoras de deficincia.

  • 13

    a lei punir severamente o abuso, a violncia e a explorao sexual da criana e do adolescente.

    Desse modo, a Constituio Federal estabelece que a Assistncia Social seja prestada

    a quem dela necessitar, independentemente de contribuio e que seja organizada com

    base na descentralizao poltico-administrativa e na participao da populao por meio de

    organizaes representativas na formulao e no controle das aes em todos os nveis.

    Conquanto a CF88 tenha sido o marco histrico da nova ordem poltica, foi em

    Dezembro de 1993, por fora das organizaes da sociedade civil e dos setores polticos e

    acadmicos comprometidos com a Assistncia Social, pressionando o governo para

    regulamentar os artigos 203 e 204 da Constituio, que a Lei Orgnica de Assistncia Social

    (LOAS) foi sancionada e publicada.

    Partindo dos preceitos constitucionais que configuram a Assistncia Social como

    sistema descentralizado, com participao popular e financiada pelo poder pblico, a LOAS

    ao regulamentar os artigos 203 e 204 ratifica e complementa:

    Os objetivos e diretrizes ali definidos. A forma de organizao e gesto das aes socioassistenciais. A distribuio de competncias entre as esferas de governo. O carter composio e as atribuies das instncias deliberativas. A estrutura de financiamento da rea.

    Desse modo, a LOAS deu incio ao processo de construo da gesto pblica e

    participativa da Assistncia Social, por meio de Conselhos deliberativos e paritrios nos

    mbitos federal, estaduais, distrito federal e municipais, bem como da realizao das

    conferncias de Assistncia Social.

    Todo esse processo de difuso e construo da poltica de Assistncia Social, como

    direito do cidado e dever do Estado, obteve em dezembro de 2003, com a IV Conferncia

    Nacional de Assistncia Social, nominada Assistncia Social como Poltica de Incluso: uma

    Nova Agenda para a Cidadania LOAS 10 anos, em comemorao aos 10 anos da LOAS,

    espao para o estabelecimento das novas bases e diretrizes para essa poltica na perspectiva

    de um Sistema nico.

    As definies legais atinentes regulamentao da Poltica Pblica de Assistncia

    Social no perodo de 2003, esto estabelecidas em trs instrumentos principais, a saber: a

  • 14

    LOAS, Lei n 8.742, de 07 de dezembro de 1993; o primeiro texto da Poltica Nacional de

    Assistncia Social (PNAS), de 1998, e as Normas Operacionais Bsicas (NOB/97 e NOB/98).

    Aprovada em 2004, pelo Conselho Nacional de Assistncia Social o novo texto da

    Poltica Nacional de Assistncia Social (PNAS/2004) representa o cumprimento das

    deliberaes da IV Conferncia Nacional de Assistncia Social, realizada em 2003.

    Incorporando as demandas da sociedade brasileira no que tange responsabilidade poltica,

    a PNAS define o novo modelo de gesto e apresenta as diretrizes para efetivao da

    assistncia social como direito de cidadania e responsabilidade do Estado.

    A Norma Operacional Bsica do SUAS (NOB/SUAS), aprovada pelo Conselho Nacional

    de Assistncia Social por meio da Resoluo n 130, de 15 de julho de 2005, apresenta os

    eixos estruturantes para a realizao do pacto a ser efetivado entre os trs entes federados

    e as instncias de articulao, pactuao e deliberao, visando implementao e

    consolidao do Sistema nico de Assistncia Social SUAS no Brasil.

    A NOB/SUAS regulamenta a operacionalizao da gesto da Poltica Nacional de

    Assistncia Social (PNAS/2004) conforme a Constituio Federal de 1988, a LOAS e legislao

    complementar aplicvel abordando, dentre outras coisas:

    a diviso de competncias e responsabilidades entre as trs esferas de governo; os nveis de gesto de cada uma dessas esferas; as instncias que compem o processo de gesto e controle dessa poltica e como

    elas se relacionam; a nova relao com as entidades e organizaes governamentais e no-

    governamentais; os principais instrumentos de gesto a serem utilizados; a forma da gesto financeira, que considera os mecanismos de transferncia, os

    critrios de partilha e de transferncia de recursos.

    Essas so, portanto, as bases legais sobre as quais se deu todo o processo de

    implementao do Sistema nico de Assistncia Social: Constituio Federal de 1988, Lei

    Orgnica de Assistncia Social (LOAS/93), Poltica Nacional de Assistncia Social (PNAS/2004)

    e Norma Operacionais Bsicas do SUAS(NOB/SUAS-2005) e NOB/RH-2006.

    2. Sistema Protetivo Brasileiro e a proteo social no contributiva 2.1 A gnese

  • 15

    Para explicar o que sistema protetivo brasileiro necessrio resgatar o percurso

    historio da assistncia social.

    Desde o Brasil colonial, a assistncia aos pobres foi marcada por: um carter

    filantrpico e caritativo, sob a liderana da Igreja e dos chamados homens bons, e tinha

    por atividade principal o recolhimento e a distribuio de esmolas. A assistncia encontrava-

    se associada tutela e ao controle dos grupos assistidos, inicialmente sob uma perspectiva

    voltada principalmente para as questes de higiene e sade da populao, confundindo-se

    com a assistncia mdica.

    A partir da segunda metade do sculo XIX, como resposta ao fim da escravido e ao

    incio do processo de industrializao, a assistncia passou a fomentar a disciplina e a

    preparao para o trabalho.

    No incio do sculo XX, como resposta ao fortalecimento das lutas sociais e

    trabalhistas, o Estado foi obrigado a ampliar sua ao na rea social, inicialmente nas

    relaes de trabalho:

    A Revoluo de 1930 conduziu a questo social para o centro da agenda pblica.

    Datam desse perodo:

    A criao do Ministrio do Trabalho, Indstria e Comrcio. A publicao da Consolidao das Leis do Trabalho (CLT). A criao dos Institutos de Aposentadoria e Penses (IAPs), como parte de um

    sistema de Previdncia Social em que o acesso aos benefcios condicionado ao pagamento de contribuio.

    Iniciou-se assim a construo de um sistema pblico de proteo social, mas de base

    contributiva. Ou seja,

    Apenas os trabalhadores formais, com carteira de trabalho assinada e que contribuam para a Previdncia Social eram assegurados pela proteo social do Estado. Aqueles que no participavam do mercado de trabalho legalmente protegido, no tinham acesso a esse sistema.

    queles que no conseguiam garantir sua sobrevivncia pelo trabalho ou pelo apoio

    familiar restavam, portanto, o provimento de amparo social pelas entidades e organizaes

    da sociedade civil. Com isso, as pessoas atendidas pelas entidades sociais eram vistas como

    pobres, carentes, incapazes para o trabalho. Eram responsabilizadas pela sua situao e

  • 16

    eram percebidas, ainda, como incapazes de lutar por seus prprios interesses e de se

    organizar politicamente.

    2.2 A institucionalizao da assistncia social

    A criao do Conselho Nacional de Servio Social (CNSS), em 1938, representa a

    primeira tentativa de regulao e fomento pblico no mbito da assistncia social no Pas.

    Sua importncia deve-se preocupao do Estado com a centralizao e organizao das

    obras assistenciais pblicas e privadas, cuja fiscalizao ficou sob sua responsabilidade a

    partir de 1943.

    Vinculado aos Ministrios da Educao e Sade e formado por pessoas ligadas ao

    campo da filantropia, indicadas e nomeadas pelo Presidente da Repblica, o CNSS tinha por

    funes:

    Organizar o plano nacional de servio social, englobando os setores pblicos e privados.

    Sugerir polticas sociais a serem desenvolvidas pelo governo. Opinar sobre a concesso de subvenes e auxlios governamentais s entidades

    privadas.

    Em 1942, foi fundada a Legio Brasileira de Assistncia (LBA), com o principal objetivo

    de prestar assistncia s famlias dos soldados mobilizados para a Segunda Guerra Mundial.

    A LBA foi instituda como um rgo de colaborao com o Estado e por este financiada. Aos

    poucos passou a atuar em todas as reas que diziam respeito assistncia social.

    Essas aes efetivavam-se por meio de benefcios e encaminhamentos aos servios,

    com base no na identificao das necessidades sociais e na garantia de direitos, mas na

    avaliao caso a caso da situao dos indivduos necessitados.

    A Constituio Federal de 1946 desencadeou no Pas um processo de democratizao

    com a descentralizao do poder da esfera federal e a garantia de autonomia aos Executivos

    e Legislativos estaduais. No entanto, na prtica, o Executivo federal continuou centralizando

    as decises polticas e oramentrias de mbito nacional. O modelo assistencial baseado na

    filantropia e na benemerncia privadas foi mantido e expandido.

    A criao de instituies assistenciais pblicas e privado-filantrpicas foi estimulada

    por todo o Pas, por meio da iseno tanto de impostos como da contribuio patronal

    Previdncia Social, cabendo ao CNSS a responsabilidade de conceder o certificado de fins

  • 17

    filantrpicos s entidades privadas. Isso resultou num emaranhado de aes e prticas sem

    unidade, coordenao e ateno aos resultados produzidos.

    Em 1969, a LBA foi vinculada ao Ministrio do Trabalho e Previdncia Social, e outras

    instituies pblicas foram criadas para atuar de forma segmentada e fragmentada, como a

    Fundao Nacional para o Bem-Estar do Menor (FUNABEM), a Central de Medicamentos

    (CEME) e o Banco Nacional de Habitao (BNH).

    Segmentada porque as aes assistenciais eram voltadas para crianas, adolescentes, idosos, gestantes, pessoas com deficincia, como segmentos isolados.

    Fragmentada porque eram aes estanques, sem articulao umas com as outras. No se baseavam em diagnsticos das demandas e necessidades coletivas, mas eram formuladas

    para atender necessidades individuais e pontuais.

    No campo da Previdncia Social, aconteceram mudanas significativas nesse perodo:

    A unificao dos Institutos de Aposentadoria e Penses (IAPs) no Instituto Nacional de Previdncia Social (INPS).

    A extenso da previdncia aos trabalhadores rurais sem exigncia de contribuio, por meio do FUNRURAL.

    A unificao do Instituto Nacional do Seguro Social (INSS) e do Instituto Nacional de Assistncia Mdica da Previdncia Social (INAMPS) no Sistema Nacional de Previdncia Social (SINPAS).

    Em 1974, devido piora das condies sociais e ao crescimento da pobreza, por

    conta da estagnao econmica e da crise do petrleo, o Governo Federal criou,

    paralelamente s outras instituies j existentes, o Ministrio da Previdncia e Assistncia

    Social (MPAS).

    A estrutura desse Ministrio contava com uma Secretaria de Assistncia Social, a qual

    foi destinada a misso de formular, em carter consultivo, a poltica de combate pobreza.

    No entanto, rompendo as barreiras impostas pelo regime militar, a sociedade brasileira

    comeou a se organizar e a lutar por mais liberdade e melhores condies de vida,

    especialmente por meio da presso e reivindicaes legitimas dos movimentos sociais.

    Nos anos da ditadura militar (1964 a 1984), a assistncia social manteve o padro

    filantrpico e benemerente, constitudo de um conjunto variado de aes pblicas e

    privadas desarticuladas e descontnuas, que funcionavam de forma complementar a outras

    polticas pblicas

  • 18

    O que pode ser observado e constatado historicamente que a poltica de assistncia

    social pouco avanou no perodo do governo militar, havendo a um hiato de aes

    destinadas ao combate pobreza e justia social.

    A Constituio Federal de 1988 inscreveu a assistncia social como poltica pblica no

    mbito da seguridade social proporcionando proteo populao brasileira por meio de

    uma srie de medidas pblicas contra as privaes econmicas e sociais, voltadas garantia

    de direitos e de condies dignas de vida.

    A Constituio Federal de 1988 foi, efetivamente, um importante marco para a

    histria brasileira. Entre inmeros avanos, ampliou os direitos sociais e muitas questes

    que antes eram vistas como problema de cada um ou coisa de pobre passaram a ser

    vistas como uma questo de todos, como responsabilidade pblica, e, portanto,

    garantidas por lei.

    Os Poderes Legislativo, Executivo e Judicirio que compem o Estado brasileiro

    compreenderam que, para proteger o cidado, preciso percorrer dois caminhos ao mesmo

    tempo:

    o caminho chamado de contributivo, que est relacionado com a proteo social para as pessoas que pagam a previdncia social. Esto protegidos os trabalhadores com carteira de trabalho assinada, os que contribuem como autnomos e os trabalhadores rurais que contriburam parcialmente para a previdncia social. Dentre os direitos sociais contributivos esto: a aposentadoria, a penso por morte e invalidez e o seguro-desemprego. o caminho conhecido como no contributivo, no est ligado ao trabalho com carteira assinada ou contribuio previdncia social, mas com a garantia de servios e direitos sociais, independentemente da vinculao social ou ao mercado de trabalho. Essas aes so financiadas a partir da redistribuio da riqueza produzida pela sociedade. Por este caminho, todos tm assegurada a garantia da proteo social, com nfase especial para idosos, crianas e adolescentes, deficientes, pessoas que no podem trabalhar ou que tm dificuldade de ingressar no mercado de trabalho. Dentre os direitos no contributivos esto: a sade, a assistncia social, a educao, a cultura, o desporto, a garantia de renda e outros.

    2.3 A proteo social no contributiva2

    2 Texto extrado do artigo SPOZATI, Aldasa. Modelo brasileiro de proteo social no contributiva: concepes fundantes In Concepo e gesto da proteo social no contributiva no Brasil. Braslia: Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate Fome, UNESCO, 2009. 424 p.

  • 19

    A Constituio Federal inaugurou uma mudana significativa para a sociedade

    brasileira ao introduzir a seguridade como um guarda-chuva que abriga trs polticas de

    proteo social: a previdncia, a sade e a assistncia social.

    O seguro social de contribuio tripartite entre Estado, patro e empregado foi

    implantando na segunda dcada do sculo XX e absorvido pela sociedade. Desse modo, a

    previdncia social um seguro social, diretamente contributivo quer pelos beneficirios para

    os quais presta assistncia, quer para os patres e para o Estado.

    A sade s foi includa e reconhecida como direito de todos na CF/88, por meio da

    constituio do Sistema nico de Sade (SUS) para todos os cidados e em todo o territrio

    nacional.

    A incluso da assistncia social na seguridade social foi uma deciso plenamente

    inovadora. Primeiro por tratar esse campo como contedo de poltica pblica,

    responsabilidade estatal. Segundo, por desnaturalizar o princpio da subsidiariedade, pelo

    qual a ao da famlia e da sociedade antecedia a do Estado.

    Uma poltica de proteo social contm o conjunto de direitos civilizatrios de uma

    sociedade, isto , uma poltica estabelecida para preservao, segurana e respeito

    dignidade de todos os cidados e cidads.

    Afirmar a existncia de um campo de proteo social no contributiva, no Brasil,

    como rea de gesto pblica, significa delimitar uma esfera de ao estatal para os trs

    entes federativos, mas significa tambm entender que essa rea se instala em um campo

    social constitudo por iniciativas histricas a advindas da paixo, mais particularmente da

    compaixo, do altrusmo e de prticas religiosas voltadas ao exerccio do amor ao prximo e

    caridade.

    As prticas privadas (...) so por natureza individualizadas, j que se vinculam s

    misses estatutrias de suas organizaes e so dirigidas a algumas pessoas. A ao pblica,

    por seus princpios, destinada a todos e tem a responsabilidade de resolver, suprir e prover

    determinadas necessidades da populao.

    Um modelo de proteo social no contributiva para o Brasil resulta no s da

    implantao de novos programas de governo, mas de mudana mais incisiva que exige do

    gestor pblico assumir um novo papel baseado na noo do cidado usurio ( e no de

  • 20

    carente ou assistido) de seus direitos e na responsabilidade do Estado em se comprometer

    com a capacidade de as famlias educarem seus filhos tratando-as como ncleos bsicos de

    proteo social.

    A CF/88 foi um marco histrico ao ampliar legalmente a proteo social para alm

    da vinculao com o emprego formal. Trata-se de mudana qualitativa na concepo de

    proteo que vigorou no Pas at ento, pois inseriu no mao jurdico da cidadania os

    princpios da seguridade social e da garantia de direitos mnimos e vitais construo social.

    Houve uma verdadeira transformao quanto ao status das polticas sociais relativamente s

    suas condies pretritas de funcionamento. So elas:

    As novas regras constitucionais romperam com a necessidade do vnculo empregatcio contributivo na estruturao e concesso de beneficirios previdencirios aos trabalhadores oriundos do mundo rural.

    Transformaram o conjunto de aes assistencialistas do passado em um embrio para a construo de uma poltica de assistncia social amplamente inclusiva.

    Estabeleceram o marco institucional inicial para a construo de uma estratgia de universalizao no que se refere sade e educao bsica. A propor novas e mais amplas fontes de financiamento aterao consagrada na criao do Oramento da Seguridade Social a CF/88 estabeleceu condies materiais objetivas para a efetivao e preservao dos novos direitos de cidadania inscritos na de seguridade e na prtica da universalizao.

    3. Histrico da Poltica de Assistncia Social no Brasil 1937/1940

    A assistncia social torna-se campo de ao governamental no Brasil com a criao do Conselho Nacional de Servio Social (CNSS). Na dcada de 1940, cria-se Legio Brasileira de Assistncia (LBA)

    1974 Cria-se o Ministrio da Previdncia Social, criado na centralidade e exclusiva ao

    federal 1988

    Promulgada a constituio que reconhece a assistncia social como dever do Estado no campo da seguridade social e no mais poltica isolada e complementar Previdncia Social.

    Cria-se o Ministrio do Bem Estar Social que, na contramo da Carta Magna, fortalece o modelo simbolizado pela LBA (centralizador, sem alterar o modelo j existente).

    1990 Primeira redao da Lei Orgnica da Assistncia Social (LOAS) que vetada no

    Congresso Nacional.

  • 21

    1993 Estabelece-se um amplo debate e negociaes de movimento nacional envolvendo

    gestores municipais, estaduais, organizaes no governamentais, tcnicos e pesquisadores com o Governo Federal e representantes no Congresso que favorece a aprovao da Lei Orgnica de Assistncia Social de 7 de dezembro/93 - (LOAS).

    Inicia-se o processo de construo da gesto pblica e participativa da assistncia social, atravs de conselhos deliberativos e paritrios nas esferas federal, estadual e municipal.

    1997 Editada a Norma Operacional Bsica (NOB) que conceitua o sistema descentralizado

    e participativo, amplia o mbito de competncia dos governos federal, municipais e estaduais e institui a exigncia de conselho, fundo e plano municipal de assistncia social para o municpio receber recursos federais.

    1998 Nova edio da NOB diferencia servios, programas e projetos, amplia as atribuies

    dos conselhos de assistncia social e cria os espaos de negociao e pactuao Comisses Intergestores Bipartites e Tripartite, que renem representaes municipais, estaduais e federais de assistncia social.

    aprovada a primeira Poltica Nacional de Assistncia Social. 2001

    criado o Cadastro nico de Programas Sociais do Governo Federal. 2003

    Cria-se o Ministrio de Assistncia Social. realizada, em dezembro a IV Conferncia Nacional de Assistncia Social. A principal

    deliberao do evento, precedida de intenso debate nacional para avaliao dos 10 anos de regulamentao da assistncia social no pas, foi pela criao do Sistema nico de Assistncia Social.

    Foi criado o Programa Bolsa Famlia, por meio de Medida Provisria, unificando os programas de transferncia de renda existentes anteriormente.

    2004 criado o Ministrio do Desenvolvimento Social e Combate Fome (MDS) que

    acelerou e fortaleceu o processo de regulamentao da LOAS com a construo do SUAS. Iniciou-se com a suspenso da exigncia da Certido Negativa de Dbitos que impedia o MDS de repassar cerca de R$ 25 milhes por ms para os municpios.

    Em outubro, aps ampla mobilizao nacional, foi editado o novo texto para a Poltica Nacional de Assistncia Social, definindo o novo modelo de gesto para a poltica de Assistncia Social.

    O Programa Bolsa Famlia institudo em lei (Lei n 10.836 de 9 de janeiro de 2004) 2005

    Realizao da V Conferncia Nacional de Assistncia Social, tendo como tema SUAS Plano10: Estratgias e Metas para a Implementao da Poltica Nacional de Assistncia Social.

    O MDS d a largada para a instituio da Norma Operacional Bsica do SUAS (NOB-SUAS), em evento que reuniu 1.200 gestores e trabalhadores sociais em Curitiba (PR).

  • 22

    O texto foi debatido em seminrios municipais e estaduais. Sua verso final foi aprovada no dia 15 de julho em plenria do CNAS.

    Publica-se, em 15 de julho de 2005, a Norma Operacional Bsica do SUAS (NOB-SUAS)

    Desenvolve-se a Rede SUAS, Sistema Nacional de Informao do SUAS. 2006

    Em dezembro de 2006 aprovada a Norma Operacional de Recursos Humanos NOB/RH/SUAS pelo Conselho Nacional de Assistncia Social (CNAS), com o objetivo de regular a gesto do trabalho no mbito do SUAS.

    2007 Disseminao da Pesquisa sobre Entidades de Assistncia Social Privadas sem Fins

    Lucrativos PEAS /IBGE. lanado o Decreto sobre os Benefcios Eventuais de que trata o Art. 22 da LOAS. aprovado o PLANO DECENAL DO SUAS SUAS PLANO 10. publicado o Decreto 6.214/2007 que regulamenta o Benefcio de Prestao

    Continuada - BPC devido pessoa com deficincia e ao idoso de que trata a Lei no. 8742, de 7 de dezembro de 1993.

    O Sistema de Monitoramento e Avaliao do MDS/SAGI e REDE SUAS/SNAS vencem o 11. Prmio de Inovao na Gesto Pblica promovido pela Escola nacional de Administrao Pblica (ENAP).

    implantado o Sistema de Acompanhamento das Aes Scioeducativas SISPETI do Programa de Erradicao do Trabalho Infantil.

    realizada a Pesquisa Contagem Nacional de Populao em Situao de Rua. lanado o Programa de Acompanhamento Monitoramento do Acesso e

    Permanncia na Escola das Pessoas com deficincia Beneficirias do BPC, o BPC na Escola.

    criada a Rede Nacional de Capacitao Descentralizada com o Programa de capacitao: Gesto Social com Qualidade, com o objetivo de formao dos agentes pblicos e sociais com cursos de forma presencial e a distncia.

    D-se Incio ao processo de Monitoramento dos CRAS - Censo CRAS 2007. Instituio da Carteira do Idoso instrumento de comprovao para o acesso ao

    benefcio estabelecido pelo Estatuto do Idoso. Adeso do SUAS Agenda Social do Governo Federal, integrado s outras polticas do

    MDS. 2008

    Incio da nova metodologia para expanso do Programa de Atendimento Integral Famlia PAIF nos CRAS, por meio de acompanhamento da Unio e estados (em ambiente web).

    Aprimoramento do Monitoramento do SUAS, por meio de Censos CRAS e tambm do Censo CREAS realizados a cada ano.

    Criao do primeiro indicador para acompanhamento dos CRAS IDCRAS. Lanado o Projovem Adolescente, no mbito do Programa Nacional de Incluso de

    Jovens.

  • 23

    Definio de programa de monitoramento e avaliao do Benefcio de Prestao Continuada por meio de sistema computadorizado

    nfase no fortalecimento do controle social e no fortalecimento das instncias de pactuao e deliberao da Poltica.

    Realizado amplo processo de qualificao de gestores sobre o BPC NA ESCOLA e sobre o Projovem Adolescente.

    D-se incio ao Levantamento Nacional das Crianas em servios de acolhimento institucional e Famlia.

    2009 Finalizao do processo de transio dos servios de educao infantil para rea da

    educao, em consonncia com a PNAS/2004 e com a Lei de Diretrizes de Base da Educao.

    criada a Rede Nacional de Monitoramento da Assistncia Social RENMAS. Nova alterao no Decreto do BPC. BPC na NOB/SUAS Portaria MDS estabelece

    instrues sobre BPC referentes a dispositivos da NOB/SUAS. Construo da Poltica Nacional para Incluso Social das Pessoas em Situao de Rua,

    em articulao com demais setores. Implantao do Cadastro Nacional do SUAS, contemplando a rede pblica e privada

    de unidades e entidades prestadoras de servio, trabalhadores e rgos pblicos do SUAS CadSUAS.

    Lanamento da coletnea CapacitaSUAS, dirigida a gestores e tcnicos da rea. lanado o curso de capacitao para todos os Conselhos Estaduais de Assistncia

    Social do Pas e seus secretrios-executivos. Aprovao da Tipificao Nacional dos Servios Socioassistenciais, publicada no

    Dirio Oficial da Unio, Resoluo n 109, de 11 de Novembro de 2009. Avano nos debates para o estabelecimento do Vnculo SUAS conforme NOB/SUAS. Aprovao do Projeto de Lei do CEBAS que altera o processo de Certificao de

    Entidades Beneficentes de Assistncia Social, pelo Senado Federal. Lei n 12.101 de 27 de Novembro de 2009.

    Projeto de Lei do SUAS (3077/08) tramita no Congresso Nacional e aprovado na Comisso de Seguridade Social e Famlia da Cmara dos Deputados.

    aprovado o protocolo de Gesto Integrada entre servios, benefcios e transferncia de renda.

    aprovada a Lei N 12.094/2009 que cria a carreira de Desenvolvimento de Poltica Sociais no mbito do Poder Executivo.

    aprovada a Lei N 12.083/2009 que dispe sobre a reestruturao do MDS, fortalecendo a Instituio.

    Realizao da pesquisa Suplemento Assistncia Social, no mbito da Pesquisa de Informaes Municipais MUNIC com disseminao dos resultados em 2010.

    4. Conceitos bsicos da Politica Nacional de Assistncia Social (PNAS)

  • 24

    Aqui vamos apresentar um conjunto de conceitos que fazem parte da linguagem

    corrente da Poltica de Assistncia Social. Ora expressam diretrizes, ou seja, estratgias que

    guiam todo o processo de implementao do Sistema nico de Assistncia Social (SUAS), ora

    expressam os princpios que nortearam a construo da Poltica Nacional de Assistncia

    Social. O importante compreender que tanto os princpios como as diretrizes foram

    construdos de acordo com a Constituio Federal de 1988 e com Lei Orgnica de

    Assistncia Social (LOAS), dando-os, portanto, legitimidade legal.

    Comecemos, ento, por duas diretrizes, que so fundamentais para a implementao

    das polticas sociais e que esto claramente definidas na CF/88. Poderamos iniciar nossas

    definies pelos princpios, uma vez que esses so valores que norteiam a formulao de

    uma poltica pblica. Contudo, optamos por iniciar com as grandes diretrizes

    descentralizao poltico-administrativa e participao popular- porque so conceitos que

    vo alm da Assistncia Social, sendo bsicos para todas as polticas pblicas sociais. Os

    princpios ou eixos fundamentais da PNAS/ 2004, viro na seqncia dessa seo.

    4.1 Descentralizao poltico-administrativa

    A descentralizao poltico-administrativa, uma das diretrizes da organizao da

    assistncia social, j estabelecida na CF/88, implica, do ponto de vista das polticas sociais, a

    transferncia de atribuies do governo federal para os Estados, o Distrito Federal e

    Municpios, cabendo a coordenao e o estabelecimento das normas gerais esfera federal

    e a coordenao e a execuo dos respectivos programas s esferas estadual e municipal,

    bem como entidades beneficentes e de assistncia social, garantindo o comando nico das

    aes em cada esfera de governo respeitando-se as diferenas e caractersticas scio-

    territoriais locais.

    Reafirmando o que a CF/88 e a LOAS preconizam, a Norma Operacional Bsica/2005

    define que,

    as aes da assistncia social so organizadas num sistema descentralizado e participativo, constitudo pelas entidades e organizaes de assistncia social, articulando meios, esforos e recursos, e por um conjunto de instncias deliberativas, compostas pelos diversos setores envolvidos na rea. Ademais estabelece que os municpios, observados os princpios e diretrizes

  • 25

    estabelecidas na Lei, fixaro suas respectivas polticas de assistncia social(NOB/2005:43)

    Desse modo, alm de declarar os estados e municpios como entes federativos

    autnomos, a CF/88 garante a soberania da autoridade poltica de cada nvel de governo

    independentemente dos demais. Nestes termos, a descentralizao poltico-administrativa

    implica a redefinio de competncias e atribuies da gesto das polticas sociais sob as

    bases institucionais de um Estado federativo. Como afirma Arretche (1998),

    Em Estados federativos, estados e municpios - porque dotados de autonomia poltica e fiscal - assumem funes de gesto de polticas pblicas ou por prpria iniciativa, ou por adeso a algum programa proposto por outro nvel mais abrangente de governo, ou ainda por expressa imposio constitucional. Assim, a transferncia de atribuies de um nvel de governo ou a adoo de um programa proposto por um nvel de governo mais abrangente supe a adeso do nvel de governo que passar a desempenhar as funes que se pretende que sejam transferidas.

    4.2 Participao e controle social So duas estratgias complementares definidas na Constituio Federal de 1988

    fundamentais para garantir o bom funcionamento do Estado democrtico de direito. Como

    veremos elas sero observadas rigorosamente na formulao e implementao das polticas

    sociais, com especial destaque para a poltica de assistncia social, objeto desse nosso curso.

    A Constituio Federal de 1988 definiu formas de participao popular como sendo:

    No poder Legislativo os cidados podem participar por meio do voto em eleies, referendos, plebiscitos, da proposio de legislao por iniciativa popular e do encaminhamento de denncias de irregularidades ao Tribunal de Contas da Unio (TCU). Ao eleger seus representantes, voc est confiando a eles o papel de lutar pelos seus direitos de cidado, o que no esgota sua participao direta.

    No Poder Judicirio a participao popular pode ocorrer por meio do jri popular com a finalidade de julgar crimes dolosos contra a vida e pelo direito de proposio de ao popular para anular atos lesivos ao patrimnio pblico.

    No Poder Executivo a participao popular ocorre por meio dos conselhos e comits de polticas pblicas, bem como da legitimidade de apresentar denncias de irregularidades perante a Controladoria-Geral da Unio (CGU).

  • 26

    Mantendo, literalmente, o texto constitucional a LOAS coloca, como uma das diretrizes

    da organizao da assistncia social, a participao da populao, por meio de organizaes

    representativas, na formulao das polticas e no controle das aes em todos os nveis.

    Essa nova cultura participativa aponta para novos temas na agenda pblica e para a

    conquista de novos espaos. Desse modo, o cidado assegura o direito de participao no

    processo de tomada de decises, e tambm no acompanhamento das polticas pblicas.

    A participao contnua na gesto pblica permite que os cidados no s atuem na

    formulao das polticas pblicas, como tambm verifiquem o real atendimento s

    necessidades da populao e fiscalizem de forma permanente a aplicao dos recursos

    pblicos. Com essa atitude de participao, acompanhamento e fiscalizao, o cidado

    exerce o controle social, interferindo no direcionamento das polticas pblicas, exigindo e

    promovendo a transparncia e o uso adequado dos recursos pblicos. Esse exerccio ocorre

    em espaos pblicos de articulao entre governo e sociedade, constituindo importante

    mecanismo de fortalecimento da cidadania.

    Participao social (ou participao popular) pode ser entendida como formas de expresso da vontade individual e coletiva da sociedade com o objetivo de contribuir com propostas de mudana e de interferir nas tomadas de deciso do poder pblico. Nesse sentido, os conselhos e as conferncias so espaos privilegiados de participao popular.

    O controle social a participao da populao na gesto pblica que garante aos cidados espaos para influir nas polticas pblicas, alm de possibilitar o acompanhamento, a avaliao e a fiscalizao das instituies pblicas e organizaes no governamentais, visando assegurar os interesses da sociedade.

    4.3 Matricialidade scio-familiar

    H algumas dcadas a famlia est em processo de mudana, particularmente no que

    se refere a sua composio e relaes internas e externas, tendo em vista as transformaes

    polticas, econmicas e culturais que o pas e o mundo capitalista vm atravessando. Em

    geral, esse processo de transformaes, incorporado muito lentamente pela legislao e

    pelas polticas pblicas, parte da dinmica das relaes cotidianas.

    Na PNAS e no SUAS, a matricialidade familiar significa que o foco da proteo social

    est na famlia, princpio ordenador das aes a serem desenvolvidas pelo poder pblico.

    Segundo a NOB-SUAS, no existe famlia como modelo idealizado e sim famlias resultantes

  • 27

    de uma pluralidade de arranjos e rearranjos estabelecidos pelos integrantes dessas famlias.

    Nesse sentido, a famlia concebida como ncleo afetivo, vinculada por laos

    consangneos, de aliana ou afinidade, onde os vnculos circunscrevem obrigaes

    recprocas e mtuas, organizadas em torno de relaes de gerao e de gnero. (NOB-

    SUAS, 2005)

    O reconhecimento da importncia da famlia como unidade/referncia no mbito da

    poltica pblica de assistncia social fundamenta-se na idia de que esta o espao primeiro

    de proteo e socializao dos indivduos e que, para que cumpra com tais funes, precisa

    ser protegida. O formato de famlia que se fala na poltica de assistncia social compreende

    relaes estabelecidas por laos consangneos, afetivos e/ou de solidariedade.

    Importa destacar que as famlias que dependem exclusivamente do trabalho

    feminino so mais vulnerveis em funo do modo como se inserem no mercado de

    trabalho, ou seja, pela execuo de atividades de baixa remunerao ou por , alta incidncia

    de trabalho informal e precrio.

    Ademais nessas famlias que so, geralmente, compostas por mulheres com filhos

    pequenos, grande a tendncia de insero precoce das crianas no mundo trabalho,

    afastando-as da escola e expondo-as a toda sorte de riscos e vulnerabilidades.

    Por todas essas razes, as famlias que dependem do trabalho feminino, chefiadas,

    via de regra, por jovens mes solteiras, vivas ou mulheres separadas requerem do Estado

    apoio e proteo social.

    As diferentes configuraes familiares, associadas feminilizao da pobreza; a

    forte presena de avs que compartilham a mesma casa, produzindo a convivncia de trs

    geraes; as formas familiares em transio decorrentes do desemprego masculino adulto;

    as famlias sem descendncia ou compostas por casais homossexuais, entre outras,

    compem um leque de questes a serem consideradas no trabalho social com famlias e na

    capacitao dos profissionais responsveis pelos programas e servios no mbito do SUAS.

    Considerando essas reflexes, conclui-se que a famlia pertence a um espao da vida

    privada, mas estabelece relaes, ao mesmo tempo conitivas e complementares, com o

    Estado, mercado, organizaes da sociedade civil, igrejas, associaes e movimentos sociais.

    A partir das questes apresentadas, dois importantes cuidados devem ser tomados

  • 28

    no trabalho social com famlias:

    No responsabilizar as famlias pelos seus problemas, dificuldades e condies de vulnerabilidade social, a fim de no reforar vitimizaes descoladas dos fatores estruturantes que condicionam/determinam as situaes por elas vivenciadas, rompendo-se com a noo de que responsabilidade dos indivduos superar as dificuldades criadas pelos efeitos perversos das polticas econmicas adotadas;

    No perder a perspectiva societria no trabalho que busca organizar atores sociais e sociabilidades coletivas para a participao social e para a luta por direitos e transformaes concretas nas condies de vida das famlias. A responsabilidade do Estado na proteo famlia est expressa no artigo 226 da

    Constituio Federal de 1988 que a reconhece como base da sociedade e como sujeito de

    direitos. Assim como o Estatuto da Criana e do Adolescente (Lei n 8.069 de 13/07/1990), a

    Lei Orgnica de Assistncia Social (Lei n 8.742 de 7/9/1993) e o Estatuto do Idoso (Lei 8.842

    de 4/1/1994) dentre outras legislaes reiteram essa posio.

    Assim, a compreenso deste conceito de fundamental importncia para gestores,

    tcnicos e conselheiros da assistncia social posto que a organizao e a prestao dos

    servios nos territrios bem como a formulao da poltica pblica de Assistncia Social so

    pautadas nas necessidades das famlias, seus membros e dos indivduos que as compem e,

    ainda, das comunidades, grupos e classe social em que se inserem.

    4.4 Vigilncia Socioassistencial

    No mbito da assistncia social, a vigilncia scioassistencial consiste na localizao,

    conhecimento e monitoramento das formas de vulnerabilidade social da populao

    presentes nos diferentes territrios.

    O objetivo central da vigilncia social conhecer o cotidiano da vida dos usurios da

    poltica de assistncia social, detectando situaes de precarizao, vulnerabilidade e risco

    social e pessoal que ameaam cidados e suas famlias.

    De acordo com a PNAS (2004), essa funo da Assistncia Social deve produzir,

    sistematizar informaes, construir indicadores e ndices territorializados das situaes de

    vulnerabilidade e risco que incidem sobre famlias/pessoas nos diferentes ciclos de vida.

    Especificamente, a vigilncia social tem como objetivos:

    identificar indivduos com reduo da capacidade pessoal, com deficincia ou em

  • 29

    abandono; identificar a incidncia de crianas e adultos vtimas de explorao, de violncia e de

    ameaas; identificar vtimas de preconceito por etnia, gnero e orientao sexual; identificar a incidncia de vtimas de apartao social que lhes impossibilite sua

    autonomia e integridade, fragilizando sua existncia; exercer vigilncia sobre os padres dos servios socioassistenciais, em especial

    aqueles que operam na forma de albergues, abrigos, residncias inclusivas, semi-residncias, moradias provisrias para os diversos segmentos etrios;

    mensurar, no territrio, as situaes de riscos sociais e violao de direitos, com base em indicadores.

    A vigilncia socioassistencial mecanismo essencial para a preveno do risco, do quase risco e das situaes de vulnerabilidade social existentes nos territrios e micro-territrios, pois por meio do conhecimento das situaes concretas que o SUAS pode alcanar a efetividade dos servios socioassistenciais ofertados populao atendida.

    Em sua dimenso terico-conceitual, a concepo de Vigilncia Socioassistencial

    instituda pela PNAS est ancorada em um conjunto integrado de conceitos e categorias que

    buscam instituir uma abordagem especfica para a produo de conhecimentos aplicados ao

    planejamento e desenvolvimento da poltica de assistncia social. Tal abordagem ressalta, a

    apropriao e utilizao de trs conceitos-chave que interrelacionados propiciam um

    modelo para anlise das relaes entre as necessidades e demandas de proteo social no

    mbito da assistncia social, de um lado; e as respostas desta poltica em termos de oferta

    de servios e benefcios populao, de outro. Estes conceitos-chave a partir dos quais se

    busca analisar as relaes entre necessidades e ofertas so: risco social, vulnerabilidade

    social e territrio.

    4.4.1 Risco Social

    O conceito de risco social utilizado em diversas reas do conhecimento e tem

    aplicao distinta no mbito de diversas polticas pblicas, tais como, sade, meio-ambiente,

    segurana. Via de regra, a operacionalizao do conceito, numa perspectiva objetiva, visa

    identificar a probabilidade ou a iminncia de um evento acontecer e, conseqentemente,

    est articulado com a disposio ou capacidade de antecipar-se para preveni-lo, ou de

    organizar-se para minorar seus efeitos, quando no possvel evitar sua ocorrncia. Sendo

    assim, a aplicao do conceito de risco est necessariamente associada pr-definio de

    um evento (ou de certo conjunto de eventos), tendo em vista a peculiaridade de cada rea.

  • 30

    A adoo desta perspectiva objetiva no exclui o reconhecimento e a necessidade de

    compreenso da dimenso subjetiva do risco, ou seja, a mediao psquica e cultural por

    meio da qual os indivduos e a sociedade reconhecem, avaliam e valoram os riscos. Muitas

    vezes, a no compreenso desta dimenso subjetiva pode levar ineficcia das aes

    voltadas para a preveno dos riscos ou para o enfrentamento dos eventos.

    A operacionalizao do conceito de risco exige a definio do conjunto de eventos

    em relao aos quais lhe compete diretamente desenvolver esforos de preveno ou de

    enfrentamento para reduo de seus agravos. Em relao a tais eventos necessrio

    desenvolver estudos que permitam algum tipo de mensurao da sua probabilidade de

    ocorrncia ou de identificao de sua iminncia, alm de realizar o monitoramento de suas

    incidncias.

    Constituem situaes de riscos a iminncia ou ocorrncia dos seguintes eventos, que

    devem ser prevenidos ou enfrentados:

    Violaes de direitos pertinentes proteo que deve ser assegurada pela poltica de Assistncia Social, englobando: situaes de violncia intrafamiliar; negligncia; maus tratos; violncia, abuso ou explorao sexual; trabalho infantil; discriminao por gnero, etnia.

    Fragilizao ou rompimento de vnculos familiares ou comunitrios, englobando: famlias ou indivduos em situao de rua; afastamento de crianas e adolescentes do convvio familiar em decorrncia de medidas protetivas; afastamento de adolescentes do convvio familiar em decorrncia de medidas socioeducativas; privao do convvio familiar ou comunitrio de idosos em instituies de acolhimento; indivduos dependentes submetidos a privao do convvio comunitrio, ainda que residindo com a prpria famlia.

    4.4.2 Vulnerabilidade Social

    Segundo a PNAS (2004) a vulnerabilidade se constitui em situaes ou ainda em

    identidades que podem levar a excluso social dos sujeitos. Estas situaes se originam no

    processo de produo e reproduo de desigualdades sociais, nos processos

    discriminatrios, segregacionais engendrados nas construes sociohistricas que

    privilegiam alguns pertencimentos em relao a outros.

    Para compreender e analisar as vulnerabilidades sociais deve-se, antes de tudo,

    considerar as mltiplas interaes entre a pobreza, o acesso aos direitos em sentido amplo,

    o acesso rede de servios e polticas pblicas, bem como as capacidades dos sujeitos e

  • 31

    grupos sociais acessarem e usufrurem deste conjunto de direitos, bens e servios,

    exercendo a sua cidadania.

    As relaes dos sujeitos, sejam elas individual ou coletiva, com padres de

    desenvolvimento geradores de desigualdade, tendem a produzir situaes de fragilidades

    desses sujeitos, dos seus grupos de sociabilidade e dos territrios onde se encontram

    inseridos.

    A Assistncia Social deve compreender o aspecto multidimensional presente no

    conceito de vulnerabilidade social no o associando, exclusivamente, ao conceito de

    pobreza. Vulnerabilidade deve ser entendida como uma conjugao de fatores, que

    envolvem caractersticas do territrio, fragilidades ou carncias das famlias de grupos ou de

    indivduos e deficincias na oferta e no acesso a polticas pblicas.

    A anlise das vulnerabilidades deve considerar, de um lado, a estrutura de

    oportunidades da sociedade e o grau de exposio dos sujeitos individuais ou coletivos aos

    riscos sociais em sentido amplo, e de outro, os ativos materiais, educacionais, simblicos e

    relacionais, dentre outros, que afetam a capacidade de resposta dos grupos, famlias e

    indivduos s situaes adversas (BRONZO, 2009).

    4.4.3 Territrio e territorializao dos servios socioassistenciais

    A perspectiva territorial incorporada pelo SUAS representa outra mudana

    paradigmtica de relevncia. As aes pblicas da rea da assistncia social devem ser

    planejadas territorialmente tendo em vista a superao da fragmentao, o alcance da

    universalidade de cobertura, a possibilidade de planejar e monitorar a rede de servios,

    realizar a vigilncia socioassistencial das excluses e estigmatizaes presentes nos

    territrios de maior incidncia de vulnerabilidade e carecimentos.

    O territrio a base de organizao do SUAS, mas necessrio elucidar que o

    territrio representa muito mais do que o espao geogrfico. Assim, o municpio pode ser

    considerado um territrio, mas com mltiplos espaos intra-urbanos que expressam

    diferentes arranjos e configuraes socioterritoriais.

    Os territrios so espaos de vida, de relaes, de trocas, de construo e

    desconstruo de vnculos cotidianos, de disputas, contradies e conitos, de expectativas

  • 32

    e de sonhos, que revelam os significados atribudos pelos diferentes sujeitos. tambm o

    terreno das polticas pblicas, onde se concretizam as manifestaes da questo social e se

    criam os tensionamentos e as possibilidades para seu enfrentamento.

    Considerando as profundas discrepncias e desigualdades sociais de um pas de porte

    continental como o Brasil, com os seus 5.564 municpios e DF, constitui um equvoco

    pretender homogeneizar realidades to diversas, como se observa na adoo de certas

    classificaes que medem graus de pobreza e indigncia das populaes, sem considerar a

    diversidade das realidades municipais, a comear pela populacional e as que se manifestam

    em distintas escalas inter e intra-regionais, inter e intra-urbanas.

    Apesar dos altssimos nveis de urbanizao do territrio brasileiro, no caso desse

    grande conjunto de municpios de pequeno porte3, preciso considerar ainda o recorte rural

    presente nessas realidades municipais, o que cria a necessidade de diferentes desenhos de

    polticas pblicas e a considerao de peculiaridades a serem identificadas no planejamento

    e na alocao territorial de servios e equipamentos pblicos.

    No outro extremo, tambm as cidades metropolitanas, com seus altos ndices de

    concentrao populacional possuem configuraes especficas que devem ser tratadas a

    partir de outros critrios de abordagem.

    No que se refere s desigualdades socioterritoriais, tambm as questes tnico

    raciais assumem forte relevncia e precisam ser consideradas quando se trata de conhecer

    a diversidade territorial e scioultural que caracteriza a sociedade brasileira.

    A presena de comunidades tradicionais como os quilombolas, grupos indgenas,

    populaes de pescadores e ribeirinhas espalhadas por todas as regies brasileiras, adiciona

    maior complexidade ao estudo e planejamento de servios e equipamentos, pois so muitas

    as dificuldades de mapeamento e conhecimento dessas comunidades em termos de

    localizao territorial, diversidade cultural, necessidades sociais a serem atendidas.

    A compreenso que incorpora a dimenso territorial das polticas pblicas reafirma a

    presena de mltiplos fatores sociais, econmicos, culturais nos diversos territrios, que

    levam o indivduo, a famlia e as coletividades a serem expostos a agravos e vulnerabilidades

    3 Classificao dos municpios de acordo com o Atlas do Desenvolvimento de 2002: Pequenos I (at 20.000 hab.); Pequenos II (de 20.001 a 50.000 hab.); Mdios (de 50.001 a 100.000 hab.); Grandes (de 100.001 a 900.000 hab.); Metrpoles (mais de 900.000 hab.)

  • 33

    sociais de diferentes naturezas e magnitudes.

    Desdobra-se para as polticas pblicas, e em particular para a poltica de assistncia

    social, a necessidade de compreender as particularidades de cada territrio e incorporar a

    abordagem territorial na formulao, implementao, monitoramento e avaliao das

    polticas pblicas.

    No SUAS, o princpio da territorializao da rede socioassistencial baseia-se na oferta capilar de servios, a partir da lgica de proximidade do cidado e na localizao dos servios nos territrios com incidncia de vulnerabilidades e riscos sociais e pessoais para a populao

    Com esses parmetros, os servios e benefcios socioassistenciais podem ser

    direcionados a reas territoriais prioritrias, a partir de um padro nacional de cobertura

    que respeita a diversidade das condies locais e a dinmica de suas inter-relaes.

    Os territrios, no sendo homogneos, desafiam a criatividade dos profissionais e

    gestores pblicos. Demandam estruturas operacionais que comportem e atribuam graus de

    complexidade e exibilidade aos servios socioassistenciais, garantindo, ao mesmo tempo,

    uma identidade pblica, inclusive pela adoo de nomenclatura comum em consonncia

    com a Tipificao Nacional, para que possam ganhar visibilidade social em todo o territrio

    nacional.

    preciso, pois, analisar a existncia de distintos recortes territoriais, os limites de

    um territrio em termos da acessibilidade dos servios para determinados grupos ou

    comunidades com diferentes inseres e mobilidade espacial, os microterritrios dentro de

    um grande territrio e a questo regional.

    So processos que envolvem novas articulaes intra e intermunicipais, exigindo

    estratgias diferenciadas de interveno poltico-administrativa, especialmente dos

    governos estaduais junto a municpios limtrofes, para o estabelecimento de consrcios e

    outras modalidades de arranjos urbanos e rurais, na direo da regionalizao de

    equipamentos, servios e atendimentos.

    Com o princpio da territorializao h mlitplos ganhos para a gesto e

    especialmente para a populao usuria. Os servios, sendo implementados prximos ao

    cidado, podem antecipar respostas s suas necessidades e facilitar o acesso, em uma

    perspectiva de proteo social pr-ativa. Mas para tanto, devero ser organizados a partir

  • 34

    do conhecimento do territrio, de seus recursos, de sua populao, das relaes sociais e de

    classes, da identificao das demandas sociais, das suas carncias, mas tambm das

    potencialidades locais e regionais que esses territrios contem.

    4.5 Rede socioassistencial

    Para o alcance de efetividade e completude das polticas municipais, DF e estaduais,

    em um universo amplo e diversificado de demandas, necessrio alicerar o sistema de

    gesto na formao de redes socioassistenciais e intersetoriais

    O mapeamento e anlise do conjunto de servios existentes, quanto natureza de

    atenes ofertadas, cobertura, padres de qualidade e quadro profissional disponibilizado

    fundamental, quando se tem em vista no s uma ao interligada e compartilhada, mas a

    identificao de vazios de atenes e de servios demandados.

    A construo de redes depende, em primeira instncia, do compartilhamento de

    intencionalidades, objetivos e valores. A adeso a uma rede s nasce em funo de fatores

    que consigam reunir em torno de si as expectativas, necessidades e demandas de cada um

    dos diferentes participantes.

    Perceber estas motivaes e articul-las, depende de um sistema de comunicao, de

    uma relao de horizontalidade, que agregue parceiros e interlocutores estratgicos,

    gradativamente em torno de identificaes e pautas comuns. Um sistema bem organizado e

    articulado de comunicao, com canais formais e contnuos ser sempre fundamental na

    realimentao das relaes, na revitalizao dos compromissos, sendo base para a

    capacidade de auto-regulao exigida.

    Mobilizar redes significa por em ao, de forma coordenada e deliberada, os

    territrios nos quais os indivduos se inserem. Sendo construes coletivas, decorrem de

    relacionamentos, negociaes, compatibilizao de interesses, pactuaes, movimentos de

    adeso e interao.

    Concepes sobre o papel do Estado, da sociedade civil, relaes de poder, as

    metodologias de trabalho e formas institudas de ao social tm que ser bem trabalhadas

    para a criao de alicerce comum aos pactos estabelecidos. Fruns, seminrios, oficinas,

    capacitaes conjuntas ajudam na equalizao de conceitos, na composio de linguagem

  • 35

    comum e no encontro do padro organizativo adequado a sua operao.

    A Assistncia Social, como poltica setorial, tem inicialmente um campo prprio de

    integrao entre seus servios, programas, projetos e benefcios, a serem articulados e

    racionalizados visando superao da tradicional fragmentao e pulverizao.

    Este nvel de composio de rede precisa traduzir-se, portanto, em vrias direes

    especficas na linha das atenes produzidas pelo prprio setor pblico estatal e na

    direo das aes realizadas pelo conjunto da rede pblico-privada - rgos governamentais,

    organizaes no governamentais, entidades sociais, - com base em relao jurdica

    contratual ou outros tipos de vnculos interinstitucionais.

    Mas, importante considerar, que para alm do sistema institucional e formal,

    conta-se, ainda, com ampla possibilidade de mobilizao de redes da sociedade civil. A

    gesto territorial por proximidade assumida pelo CRAS, localizando as atenes da

    assistncia social nos territrios, espaos privilegiados de sociabilidade cotidiana, encontra a

    presena ativa de redes sociais informais.

    As organizaes societrias de base ou as aes compartilhadas por diversos sujeitos

    sociais, propiciam a construo de vnculos de proximidade e de pertencimento, abrindo

    oportunidades de potencializao de redes de relaes sociais apoiadas por laos de

    parentesco, de conterraneidade, de vizinhana, de associaes polticas, importantes aos

    processos de troca e constituio de sociabilidades coletivas.

    Como locus de interao entre indivduos que se influenciam e cooperam

    mutuamente, as oportunidades interativas comumente levam construo de identidades

    coletivas ou redes construdas por meio da participao em atividades de diferentes tipos -

    comunitrias, produtivas, polticas, culturais, partidrias, e em diferentes espaos nas

    escolas, nas igrejas, nos centros comunitrios, associaes de bairro, sindicais, partidrias,

    entre outros.

    A lgica a de incentivo participao, da cooperao, da co-produo democrtica.

    Da a necessidade de respeito s diferenas e especificidades. Autonomia e diferena so os

    dois eixos formadores da concepo de rede, o que implica em uma srie de desafios

    gerenciais e operacionais. Supe investimento na confiana mtua e na co-

    responsabilizao. O desafio se pe sempre na capacidade de equacionar, e no eliminar as

  • 36

    diferenas, na direo do estabelecimento de acordos e consensos possveis em torno de

    uma agenda comum de carter pblico.

    Cabe aos gestores pblicos assumir a perspectiva de fortalecimento das relaes de sinergia entre os integrantes das redes, valorizando cada um a partir dos papis que desempenham, imprimindo direo poltica sem necessariamente se colocar em posio hierrquica de mando

    De acordo com a NOB-SUAS (2005: 94),

    Rede socioassistencial um conjunto integrado de aes de iniciativa pblica e da sociedade, que ofertam e operam benefcios, servios, programas e projetos, o que supe a articulao entre todas estas unidades de proviso de proteo social, sob a hierarquia de bsica e especial e ainda por nveis de complexidade.

    So parmetros para a organizao da rede socioassistencial:

    Oferta, de maneira integrada, de servios, programas, projetos e benefcios de proteo social para cobertura de riscos, vulnerabilidades, danos, vitimizaes, agresses ao ciclo de vida e dignidade humana e fragilidade das famlias.

    Carter pblico de co-responsabilidade e complementaridade entre as aes governamentais e no governamentais de assistncia social evitando paralelismo, fragmentao e disperso de recursos.

    Hierarquizao da rede pela complexidade dos servios e abrangncia territorial de sua capacidade face demanda.

    Porta de entrada unificada dos servios para a rede de proteo social bsica atravs de unidades de referncia e para a rede de proteo social especial por centrais de acolhimento e controle de vagas.

    Territorializao da rede de assistncia social sob os critrios de: oferta capilar de servios baseada na lgica da proximidade do cotidiano de vida do cidado; localizao dos servios para desenvolver seu carter educativo e preventivo nos territrios com maior incidncia de populao em vulnerabilidades e riscos sociais.

    Carter contnuo e sistemtico, planejado com recursos garantidos em oramento pblico, bem como com recursos prprios da rede no governamental.

    Referncia unitria em todo o territrio nacional de nomenclatura, contedo, padro de funcionamento, indicadores de resultados de rede de servios, estratgias e medidas de preveno quanto a presena ou agravamento e superao de vitimizaes, riscos e vulnerabilidades sociais. (NOB-SUAS, 2005: 95) Soma-se a essas diretrizes a importante regulamentao do artigo 3 da Lei Orgnica

    da Assistncia Social4 que define o que so entidades e organizaes de assistncia social,

    em conformidade com a PNAS e com o SUAS, qualificando a rede privada, prestadora de

  • 37

    servios, de atendimento, assessoramento e defesa de direitos.

    Nessa regulamentao reconhece-se o carter pblico das organizaes sem fins

    lucrativos, que realizam, de forma continuada, servios, programas e projetos de proteo

    social e de defesa de direitos socioassistenciais, conforme preconizado na LOAS, PNAS e

    NOB-SUAS, como parte da rede socioassistencial e da poltica de assistncia social.

    A dinmica da rede socioassistencial deve considerar o cidado e a famlia como

    sujeitos protagonistas da rede de servios, abrindo espaos para o exerccio da cidadania

    ativa no campo social e a organizao autnoma na sociedade.

    4.6 Intersetorialidade

    A LOAS, a PNAS e o SUAS reconhecem a necessria complementaridade entre os

    servios das diversas polticas sociais.

    A complexidade das necessidades e dos problemas trazidos pela situao de pobreza

    e desigualdade social da populao e pelas disparidades regionais e locais de estados, DF e

    municpios impe assistncia social, abrangncia nas respostas s questes identificadas,

    colocando-se na dependncia da integrao no s dos servios socioassistenciais, mas do

    conjunto de servios e programas das vrias polticas especficas, quer no mbito estadual,

    DF ou municipal, superando o tradicional confinamento das atenes, que recorta os

    programas sociais em reas estanques e, conseqentemente, pouco efetivas.

    A perspectiva de uma construo integrada abre a possibilidade de

    compartilhamento de conhecimentos, aes e responsabilidades, no na direo do seu

    somatrio, mas na produo de uma nova sinergia, potencializando o desempenho das

    polticas pblicas, enquanto retira cada ao especfica do seu isolamento, assegurando uma

    interveno globalizada.

    fundamental que as polticas pblicas sejam apropriadas de modo

    interdependente, com interfaces orgnicas e comprometidas com os propsitos de

    transformao social. por meio da intersetorialidade que possvel abordar de forma mais

    ampla as problemticas sociais em seu carter complexo e multidimensional. A conexo

    territorialidade/ rede/ intersetorialidade, voltada incluso social, redimensiona as

    intervenes especficas, ampliando o padro de qualidade e a efetividade das aes

  • 38

    desenvolvidas.

    Para uma atuao articulada em redes, cada vez mais abrangentes, que agreguem

    tambm as organizaes da sociedade civil e movimentos comunitrios, preciso que o

    prprio conjunto de instituies e servios pblico-estatais trabalhe em estreita parceria,

    constituindo uma referncia de racionalizao e complementaridade das iniciativas.

    Hoje, mais do que nunca, os setores pblicos esto sendo exigidos a se renovarem,

    qualificando seu nvel de prestao de atenes. As organizaes e instituies,

    particularmente as de natureza estatal, vm operando com srias dificuldades de pessoal,

    equipamentos, recursos financeiros, sendo alvo constante de crtica e de reivindicaes de

    usurios e da sociedade em geral.